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ConScientiae Saúde

ISSN: 1677-1028
conscientiaesaude@uninove.br
Universidade Nove de Julho
Brasil

Lino de Oliveira, Marcela; Romano de Paula, Taís; Batista de Freitas, João


Evolução histórica da assistência de enfermagem
ConScientiae Saúde, vol. 6, núm. 1, 2007, pp. 127-136
Universidade Nove de Julho
São Paulo, Brasil

Disponível em: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=92960115

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Evolução histórica da assistência
de enfermagem
Marcela Lino de Oliveira
Enfermeira graduada – Uninove.
São Paulo [Brasil]

Taís Romano de Paula


Enfermeira graduada – Uninove.
São Paulo [Brasil]

Editorial
tais_depaula@hotmail.com

João Batista de Freitas


Enfermeiro mestre e doutrando – Unifesp;
Docente do curso de enfermagem – Uninove.
São Paulo [Brasil]

Ponto de vista
Artigos
para os autores
Neste estudo, realiza-se revisão bibliográfica do proces-

Instruções
so de evolução histórica da assistência de enfermagem
abordando três momentos históricos que marcaram o
desenvolvimento da profissão: o surgimento da enfer-
magem moderna, com Florence Nightingale, das teorias
de enfermagem e da Sistematização da Assistência de
Enfermagem (SAE), mencionando as atuais tendências re-
lacionadas à tentativa de padronização da linguagem com
a utilização das classificações dos diagnósticos de enfer-
magem pela Nursing American Diagnoses Association
(Nanda), com propostas de intervenções de enfermagem
definidas na Nursing Interventions Classification (NIC),
e os respectivos resultados de enfermagem, na Nursing
Outcomes Classification (NOC).

Palavras-chave: Enfermagem. História da enfermagem.


Processos de enfermagem.

ConScientiae Saúde, São Paulo, v. 6, n. 1, p. 127-136, 2007. 127


1 Introdução Outro importante período da história da
enfermagem que abordaremos diz respeito às
Nosso objetivo neste estudo é descrever teorias de enfermagem. Segundo Cianciarullo
fatos da evolução histórica da assistência de en- (2001), até o fim da década de 1950, pouco se fez
fermagem que mudaram o rumo do processo de em relação à ciência da enfermagem. A partir
cuidar. Uma vez que todos nós possuímos uma daí, parece ter havido um consenso entre os en-
história de vida, o mesmo se pode vislumbrar em fermeiros pela busca de conhecimentos especí-
relação às profissões. Daí a importância de os pro- ficos da profissão, organizados e sistematizados
fissionais conhecerem a origem de sua especiali- em teorias e modelos de estruturas, visando a
dade. Neste estudo, abordaremos três momentos descrever, explicar e predizer fenômenos vin-
históricos na evolução da assistência de enfer- culados à disciplina de enfermagem.
magem: o surgimento da enfermagem moderna Almeida e Rocha (apud GOMES; DONOSO,
com Florence Nightingale (1820-1910), seu alvo- 1999) enfatizam que a procura pela autonomia e
recer científico com as teorias de enfermagem e, pela especificidade da enfermagem possibilita-
finalmente, a implantação da Sistematização da ram a construção de um corpo de conhecimen-
Assistência de Enfermagem (SAE) e suas tendên- tos científicos, que teve início no fim da década
cias atuais. Para Azeredo (2004), a enfermagem
de 1960, estendeu-se por todos os anos de 1970 e
evoluirá e será, no futuro, o que seus profissio-
chegou à atualidade, em sua expressão mais re-
nais fizerem dela. Será a exata dimensão do so-
cente e dominante, na enfermagem ocidental.
nho e da determinação de seus integrantes. Das
Para Bastos e Mendes (2005), o reconhe-
lutas pioneiras de seu desenvolvimento foi-nos
cimento da necessidade de desenvolver um
legado não apenas um sonho, mas também sua
sistema de trabalho que concretize a proposta
concretização, numa demonstração de talento,
de promover, manter e restaurar o nível de saú-
dedicação e fé, que reconhecemos e absorvemos
de do cliente surgiu nas últimas três décadas.
de nossos mestres e que pretendemos transmitir
Nesse período, teve origem o processo de en-
aos nossos pósteros.
fermagem, que, para Horta (1979), foi o motivo
Geovanini e colaboradores (2002) ressal-
que levou a enfermagem a atingir sua maiori-
tam que a retomada do passado vem demonstrar
dade. “Nesse contexto, a SAE é legitimada como
que as práticas de saúde são tão antigas quanto
marco teórico da prática da enfermagem [...]”
a humanidade, pois são inerentes à própria con-
dição de sobrevivência. Segundo Kawamoto e (BASTOS; MENDES, 2005, p. 30).
Fortes (1997), por muitos séculos a enfermagem As últimas tendências relacionadas à
foi exercida, de maneira empírica, pelas mães, SAE são os diagnósticos, as intervenções e os
por sacerdotes, feiticeiros e religiosos. resultados de enfermagem, com classificações
No entanto, apenas no século XX os con- publicadas, respectivamente, pela Nursing
ceitos sobre enfermagem sofreram importan- American Diagnoses Association (Nanda), com
tes modificações sob influência de Nightingale. propostas de intervenção de enfermagem defi-
Acerca dessa questão, Oguisso (2005) relata que, nidas na Nursing Interventions Classification
não obstante o treinamento e a atividade de (NIC), e os respectivos resultados, na Nursing
cuidar de feridos e doentes existirem antes de Outcomes Classification (NOC). Sobre esses
Nightingale, sua forte personalidade, visão e ha- sistemas ressaltam Dochteman e Bulechek
bilidade prática para organização conseguiram (2003) que, no futuro, os enfermeiros poderão
dar à enfermagem os poderosos fundamentos, registrar, em um banco de dados, toda assis-
os princípios técnicos e educacionais e a elevada tência que prestarem. Todas essas informações,
ética que impulsionaram a profissão e criaram por sua vez, estarão disponíveis aos futuros
oportunidades impensáveis anteriormente. profissionais da área.

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Cianciarullo (2001) afirma que aquele 3 Nightingale e o surgimento da
que tem o cuidado por profissão demonstra o enfermagem moderna
desvelo pela conservação da vida. A enferma-
gem é uma profissão que se dedica, de modo Daher, Santo e Escudeiro (2002) relatam
específico, à conservação da integridade, à re- que, no início do século XIX, ganha espaço o pa-
paração daquilo que constitui obstáculo à vida. radigma cientificista na tentativa de superar a
O domínio, a abrangência do campo de enfer- concepção mágico-religiosa vigente até então. É
magem, exige preparo amplo, busca constante nesse período que o nome de Nightingale ganha
importância na área da enfermagem a partir da
de aprimoramento pessoal e de competência
sistematização de um campo de conhecimentos,
profissional.
instituindo-se “uma nova arte e uma nova ci-

Editorial
ência”, para a qual é preciso educação formal,
organizada sobre bases científicas.
2 Metodologia
Alcântara e colaboradores (2005) enfati-
zam que o trabalho de Nightingale constituiu
Este artigo foi produzido como base em
um marco para a história da enfermagem mo-
uma pesquisa bibliográfica descritiva, tendo sido
derna. Atuou como enfermeira civil e voluntá-
utilizadas publicações dos últimos dez anos.

Ponto de vista
ria na Guerra da Criméia (1854-1856), e, antes
Para Severino (2002), depois de definido o de sua chegada à região do conflito, os soldados
tema do trabalho e formulado o problema e a encontravam-se no maior abandono. Poucos
hipótese, o próximo passo é o levantamento de detinham os conhecimentos básicos para agir
informações com documentação existente sobre diante das emergências impostas, tanto que,
o assunto, desencadeando-se uma série de pro- durante essa guerra, a mortalidade entre os sol-
cedimentos para busca e localização metódica dados chegou a 40%.
dos documentos que dizem respeito ao tema Para Geovanini e colaboradores (2002) a
enfermagem passa a atuar, de maneira siste-

Artigos
discutido. Segundo Parra Filho e Santos (1998),
método é o caminho a ser trilhado pelos pesqui- mática, quando Nightingale é convidada, pelo
sadores na busca do conhecimento. Para Pádua Ministro da Guerra da Inglaterra, para aten-
(2000), a pesquisa pode ser definida como toda der os soldados feridos em combate na Guerra
atividade de busca, indagação, investigação e da Criméia. Figueiredo (2002) destaca que
inquirição da realidade. Nightingale partiu com 38 voluntárias para

para os autores
Scutari, na Turquia, onde assumiu as atividades
Best (apud LAKATOS; MARCONI, 2002)

Instruções
de assistência aos feridos, apesar da resistência
declara que uma pesquisa descritiva é aquela
do exército britânico.
que delineia o tema, abordando também quatro
As concepções teórico-filosóficas de enfer-
aspectos: descrição, registro, análise e interpre-
magem desenvolvidas por Nightingale tiveram
tações de fenômenos atuais, objetivando seu
como base observações sistematizadas e regis-
funcionamento no presente. A partir da defini-
tros estatísticos extraídos de sua experiência
ção do objeto de estudo, do tema, dos problemas prática no atendimento diário a doentes. Dessa
de pesquisa e do levantamento de hipóteses, vivência, foram obtidos quatro conceitos fun-
iniciou-se a pesquisa em fontes de informa- damentais: ser humano, meio ambiente, saúde
ções relevantes acerca do assunto, obtidas de e enfermagem. Esses conceitos, considerados
bibliotecas públicas (Bireme e Universidade revolucionários para sua época, foram revistos
de São Paulo [USP]), do Conselho Regional de e ainda hoje se identificam com as bases huma-
Enfermagem de São Paulo (Coren-SP) e de li- nísticas da enfermagem, tendo sido revigorados
vros, sites, teses, monografias e periódicos. pela teoria holística.

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Segundo Oguisso (2005), as condições sa- Chinn e Kramer, Hickman, Carraro (apud
nitárias do hospital de Scutari eram as piores CARVALHO; DAMASCENO, 2003) defendem
possíveis, com excesso de feridos, muitos deita- que as teorias de enfermagem promovem a
dos no chão, poucos sanitários, falta de supri- identidade profissional, pois constituem a base
mentos para alimentação ou higiene e escassez na qual o profissional de enfermagem se apóia
de roupas, o que obrigava os pacientes a conti- para explicar seu trabalho.
nuar com seus uniformes sujos de sangue e ter- Para Cianciarullo (2001), as reflexões e a
ra. Oguisso ressalta ainda que, em dois meses, observação da prática conduziram à conclusão
Nightingale pôs ordem no hospital de campa- de que, no universo da enfermagem, os fenô-
nha, o que lhe valeu a reputação de administra- menos e os conceitos centrais eram os seres hu-
dora e reformadora de hospitais; em seis meses, manos, o ambiente, a saúde e a própria enfer-
ela havia reduzido a mortalidade entre os feri- magem, ou seja, a ação profissional. Todos os
dos a 2%. modelos conceituais ou teorias foram construí-
Para Alcântara e colaboradores (2005), dos pelo relacionamento desses conceitos, e sua
com Nightingale são introduzidas preocupa- publicação data, majoritariamente, das décadas
ções com o ambiente proporcionado ao pacien- de 1960 e 1970.
te: a necessidade de luz, ar fresco, silêncio e, Com objetivo de proporcionar maior com-
principalmente, higiene. preensão das teorias de enfermagem, discorre-
remos sobre algumas delas a seguir.

4 O surgimento das teorias


de enfermagem 4.1 Hildegard E. Peplau e a teoria
do relacionamento interpessoal
Segundo Cianciarullo (2001), a enferma-
gem sempre se fundamentou em princípios, Segundo Potter e Perry, a teoria de Peplau
crenças, valores e normas tradicionalmente (1909-1999) está centrada no relacionamento in-
aceitas. A evolução da ciência, que possibilitou terpessoal, que é construído nos diversos está-
a compreensão da importância de pesquisar gios de desenvolvimento pelos quais as pessoas
para constituir o saber, levou os enfermeiros a passam. No caso do profissional de enferma-
questionar esses preceitos tradicionais. No pe- gem, ele se esforça para desenvolver um relacio-
ríodo de 1950, esse questionamento aumentou, namento de confiança com o paciente e, à medi-
fazendo surgir a necessidade de se desenvolver da que essa confiança aumenta, o profissional
um corpo de conhecimento específico, o que se- ajuda o paciente a identificar os problemas e a
ria possível somente pela elaboração de teorias encontrar as soluções potenciais. Belcher e Fish
próprias. (2000) ressaltam, ainda, que, para Peplau, a en-
Rolim, Pagliuca e Cardoso (2005) afirmam fermagem pode ser encarada como um processo
que a teoria no campo da enfermagem foi fun- interpessoal, pois envolve a interação entre dois
damentada na prática profissional. Para Fialho e ou mais indivíduos que proporciona o incenti-
colaboradores (2002), as teorias constituem um vo para o processo terapêutico.
modo sistemático de olhar o mundo para descre-
vê-lo, explicá-lo, prevê-lo ou controlá-lo. É des-
sa forma que a teoria de enfermagem é definida 4.2 Dorothea Orem e a teoria do déficit
como uma conceitualização articulada e comu- de autocuidado
nicada da realidade, inventada ou descoberta,
com a finalidade de descrever, explicar, prever Orem (apud FOSTER; BENET, 2000) afirma
ou prescrever o cuidado de enfermagem. que, quando capazes, os indivíduos cuidam de

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si mesmos. Entretanto, se a pessoa for incapaz mento ideal (exigência de autocuidado), a enfer-
de proporcionar o autocuidado, o profissional de magem é exigida (FOSTER; BENET, 2000).
enfermagem providenciará a assistência neces-
sária. Para as crianças, os cuidados de enferma-
gem são requeridos quando os pais ou responsá- 4.3 Martha Elizabeth Rogers e a teoria
veis não são capazes de propiciar a quantidade e humanística e humanitária
a qualidade de cuidado necessário.
Potter e Perry (1998) afirmam que o ob- De acordo com Potter e Perry (1998),
jetivo da teoria de Orem é ajudar o paciente a Martha Elizabeth Rogers (1914-1994) considera o
conseguir cuidar de si mesmo. A assistência de paciente de maneira global, o que ela chama de
um profissional de enfermagem é necessária “homem unitário”, e em constante desenvolvi-

Editorial
quando o paciente está incapacitado de aten- mento e mudança. Nesse processo, o profissio-
der às próprias necessidades biológicas, psico- nal de enfermagem interage com ele e o ajuda
lógicas, de desenvolvimento e sociais. Cabe ao a alcançar o máximo bem-estar. A enfermagem
profissional determinar se o paciente está im- está relacionada a todas as pessoas, saudáveis
possibilitado de atender a essas necessidades, o ou doentes, ricas ou pobres, jovens ou idosas;
que deve ser feito para reverter essa situação e estejam elas em casa, na escola, no trabalho, nos

Ponto de vista
avaliar até que ponto o paciente consegue reali-
locais de diversão, nos hospitais, nos asilos ou
zar o autocuidado.
nas clínicas.
Segundo Foster e Benet (2000), a teoria de
Falco e Lobo (2000) relatam que, para
enfermagem do déficit de autocuidado (teo­ria
Rogers, a enfermagem é uma ciência humanís-
geral) de Orem é composta de três teorias inter-
tica e humanitária, dirigida à descrição e expli-
relacionadas:
cação do ser humano em sua totalidade siner-
Teoria do autocuidado – Diz respeito ao
gística e ao desenvolvimento de generalizações
desempenho ou à prática de atividades que os
hipotéticas e princípios preventivos básicos
indivíduos realizam em benefício próprio para

Artigos
para a prática reconhecida.
manter a vida, a saúde e o bem-estar. Quando
o autocuidado é efetivamente realizado, ajuda
a manter a integridade estrutural e o funciona-
mento humano, contribuindo para o seu desen-
4.4 Madeleine M. Leininger e a teoria
volvimento. da enfermagem transcultural

para os autores
Teoria do déficit do autocuidado – Trata-

Instruções
se do núcleo da teoria geral de enfermagem de Para Leininger (apud GEORGE, 2000), a
Orem, definindo quando a enfermagem é ne- enfermagem transcultural é um subcampo ou
cessária, ou seja, ela é exigida quando um adul- ramo que trata do estudo comparativo e da aná-
to é incapaz ou tem limitações na provisão de lise de culturas no que diz respeito à enferma-
autocuidado efetivo continuado. gem e às práticas de cuidados de saúde-doença,
Teoria dos sistemas de enfermagem – com o objetivo de proporcionar um serviço de
Apresenta o sistema de enfermagem, delineado atendimento de enfermagem, significativo e efi-
pelo profissional de enfermagem e elaborado caz, para as pessoas, de acordo com seus valo-
com base nas necessidades de autocuidado e na res culturais e seu contexto de saúde-doença.
capacidade de o paciente desempenhar as ativi- George (2000) afirma, ainda, que Leininger
dades de autocuidado. Se houver déficit nesse construiu sua teoria da enfermagem transcultu-
processo, isto é, se existir um déficit entre o que ral com base na premissa de que as pessoas de
o indivíduo pode fazer (ação de autocuidado) e cada cultura têm a sua maneira de experimen-
o que precisa ser feito para manter o funciona- tar e perceber o atendimento de enfermagem e

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podem relacionar essas experiências e sensações geram, no ser humano, necessidades que se ca-
com suas crenças e práticas gerais de saúde. racterizam por estados de tensão, conscientes
ou inconscientes, que o levam a buscar satisfa-
zê-las para manter seu equilíbrio dinâmico no
4.5 Jean Watson e a teoria do cuidado tempo e no espaço, e, quando essas necessidades
transpessoal não são atendidas, ou o são de forma inadequa-
da, trazem desconforto que, se for prolongado,
Jean Watson (apud TALENTO, 2000) diz pode causar doenças.
que a enfermagem está voltada, principalmen-
te, para os cuidados que derivam da perspectiva
humanística combinados com a base de conhe- 5 O processo de enfermagem
cimentos científicos. Para que o profissional de
enfermagem desenvolva filosofias humanísticas Para Dell’Acqua e Miyadahira (2002), o
e sistemas de valores imprescindíveis à forma- processo de enfermagem é um método para or-
ção sólida da ciência do cuidado, é necessário ganização e prestação do cuidado na área. Na
que adquira amplo conhecimento nas artes li- literatura há outras denominações, como SAE
berais. Watson afirma ainda que esse conheci- e Metodologia da Assistência de Enfermagem
mento auxilia o profissional de enfermagem a (MAE), termos empregados genericamente para
expandir sua visão de mundo, além de desen- se referir à forma de organizar a assistência. Já
volver o pensamento crítico. O desenvolvimen- para Paul e Reeves (2000), esse é o esquema sub-
to dessas ferramentas é necessário à ciência do jacente que propicia ordem e direção ao cuidado
cuidado, que se concentra mais na promoção da de enfermagem. É a essência da prática da en-
saúde do que na cura da doença. fermagem, é o “instrumento” e a metodologia
Talento (2000) destaca ainda que, em sua da profissão, que auxiliam o profissional tanto
teoria, Watson propõe sete pressupostos sobre na tomada de decisões quanto na prevenção e
a ciência do cuidado e dez fatores de cuidados na avaliação das conseqüências.
primários para a formação da estrutura de sua Segundo Barros, Maria e Abrão (2002), o
teoria, dos quais os três primeiros formam o processo de enfermagem tem-se constituído
fundamento filosófico para a ciência do cui- como instrumento facilitador do desempenho
dado. Para Watson, esses três fatores formam: prático e do trâmite da documentação do pa-
1) sistema de valores humanístico-altruísta, 2) ciente. Por meio desse processo, os profissionais
cultivo da fé-esperança, e 3) cultivo da sensibi- da área organizam a informação disponível e
lidade para si e para os outros. determinam as intervenções que devem ser es-
tabelecidas para atender às necessidades dos
pacientes. Paul e Reeves (2000) destacam que
4.6 Horta e a teoria das necessidades esse processo também dá condições para que
humanas básicas seja avaliada a qualidade do atendimento de
enfermagem, a competência e a responsabilida-
Horta (1979) ressalta que essa teoria foi de do profissional da área.
desenvolvida a partir de conceitos da moti- Dell’Acqua e Miyadahira (2002) afirmam
vação humana, de Abraham Harold Maslow que o processo de enfermagem foi delineado
(1908-1970), que se fundamenta nas necessida- de maneira diferente por diversos autores, mas
des humanas básicas. Para Horta, o ser huma- existem elementos comuns: histórico, diagnós-
no, por suas características, é também agente de tico, planejamento, implementação e evolução
mudanças no universo dinâmico, no tempo e da enfermagem. Para a realidade brasileira,
no espaço. Afirma ainda que os desequilíbrios como proposto por Horta (1979), a operacio-

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nalização do processo ocorre por meio de seis para identificar um problema ou estabelecer um
fases que compreendem o histórico, o diagnós- diagnóstico de enfermagem, a atenção do pro-
tico, o plano assistencial, o plano de cuidados fissional deve estar voltada não somente para os
ou prescrição, a evolução e o prognóstico de sinais e sintomas da doença, mas também para
enfermagem. seus efeitos na vida do paciente.
O primeiro passo desse processo, o his- Marin, Messias e Ostroski (2004) ressal-
tórico de enfermagem, é o roteiro sistematiza- tam que, atualmente, existem vários sistemas
do para levantamento de dados. O segundo é de enunciado dos diagnósticos de enfermagem,
o diagnóstico de enfermagem, que permite a porém o sistema mais comumente utilizado foi
identificação das necessidades da pessoa que desenvolvido pela Nanda.
precisa ser atendida e a determinação, pelo pro-

Editorial
fissional, do grau de dependência desse atendi-
mento. O terceiro é o plano assistencial, em que 7 Sistema NIC
ocorre a determinação global da assistência de
enfermagem que o ser humano deve receber em Para Dochteman e Bulechek (2003), o im-
razão dos diagnósticos estabelecidos. O quarto pulso para iniciar o trabalho sobre as interven-
é a prescrição de enfermagem – a implemen- ções deu-se, em parte, com as atividades da

Ponto de vista
tação do plano assistencial pelo roteiro diário,
Nanda, visto que um profissional de enferma-
que coordena a ação da equipe de enfermagem.
gem, ao formular um diagnóstico, tem o dever
O quinto passo, a evolução de enfermagem, é
de fazer algo sobre ele. Afirmam ainda que, an-
o relato diário das mudanças sucessivas que
tes do desenvolvimento da NIC, a enfermagem
ocorrem no paciente. O sexto e último passo,
não possuía nenhuma linguagem padronizada
o prognóstico de enfermagem, é a estimativa
que comunicasse os tratamentos que os profis-
da capacidade do paciente em atender às suas
sionais dessa área executavam.
necessidades básicas após a implementação do
Segundo Barros, Maria e Abrão (2002), o
plano assistencial.

Artigos
sistema NIC é uma linguagem padronizada de
tratamentos que os profissionais da área de en-
fermagem utilizam, incluindo cuidados diretos
6 Diagnósticos
e indiretos ao paciente.
de enfermagem Nanda
De acordo com Dochteman e Bulechek
(2003, p. 34), a NIC denomina e descreve as inter-

para os autores
Para Marin, Messias e Ostroski (2004), o

Instruções
diagnóstico de enfermagem é a etapa da SAE venções que os enfermeiros executam como “[...]
que tem recebido maior atenção dos profissio- qualquer tratamento, baseado em julgamento
nais da área, uma vez que sua formulação ade- clínico e conhecimento que a enfermeira executa
quada direciona o planejamento, a implementa- para melhorar os resultados a serem alcançados
ção e a evolução do cuidado. pelo paciente/cliente”. Barros, Maria e Abrão
Segundo Barros, Maria e Abrão (2002), (2002) descrevem que cada intervenção é com-
o diagnóstico de enfermagem é definido pela posta de um título, uma definição e um conjunto
Nanda como julgamento clínico sobre as res- de atividades em forma de lista que o profissio-
postas individuais, familiares ou comunitárias nal pode escolher, identificando, assim, as inter-
aos atuais ou potenciais problemas de saúde, e venções que serão feitas. Essas incluem aspectos
é por meio desse diagnóstico que as interven- tanto psicossociais quanto fisiológicos.
ções são planejadas e executadas para atingir Segundo McCloskey e Bulechek (2004),
resultados pelos quais os enfermeiros são res- as intervenções da NIC estão relacionadas aos
ponsáveis. As autoras ainda enfatizam que, diagnósticos de enfermagem da Nanda, aos

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problemas do sistema Omaha e aos resultados sando por um intenso processo de transfor-
da Nursing Outcomes Classification (NOC). mação no que se refere tanto a padrões e va-
lores quanto à formação de sua base científica.
Atualmente, com sua base de conhecimentos
8 Sistema NOC científicos delimitados pelas teorias de enfer-
magem surgidas por volta da década de 1950 e
De acordo com McCloskey e Bulechek (2004), a partir da SAE, a maior preocupação dos pro-
percebeu-se, muito cedo, que, além dos diagnósti- fissionais pesquisadores da área é o desenvol-
cos e das intervenções, uma terceira classificação, vimento de linguagens padronizadas e univer-
a dos resultados esperados para os pacientes, seria salmente aceitas, como a da Nanda, NIC e NOC,
também necessária para completar as exigências que facilitem a implementação do processo de
que compõem a documentação de um encontro cuidar. Por meio desses sistemas que se encon-
clínico de enfermagem. tram interligados, o profissional de enferma-
Para Barros, Maria e Abrão (2002), a ava- gem consegue determinar os diagnósticos do
liação dos resultados de enfermagem não se ba- paciente, as intervenções que lhe são cabíveis
seia apenas em dados laboratoriais, morte, aces- de acordo com esses diagnósticos e quais são
so ou conveniência. A enfermagem tem incluído os resultados esperados para cada intervenção
dados relacionados ao conhecimento do pacien- aplicada. É necessário que esses sistemas sejam
te, ao comportamento, à segurança, ao uso de difundidos entre os profissionais da área e que
recursos, à manutenção de atividades diárias estes os executem em seu cotidiano, para que a
– categorias que podem ser influenciadas mais assistência prestada ao paciente seja padroniza-
pelo cuidado de enfermagem que pelo cuidado da e mais bem documentada em todas as insti-
médico, e que raramente aparecem nos instru- tuições de saúde.
mentos de avaliação dos serviços de saúde.
Segundo McCloskey e Bulechek (2004), a
NOC, publicada em 1997, contém 190 resultados Historical evolution of the
dispostos em ordem alfabética. Cada um traz nursing assistance
uma definição, uma lista de indicadores que po-
dem ser usados para avaliar o estado do pacien- The main purpose of this research will be to
te em relação ao resultado, uma escala Likert de follow the nursing process development up,
cinco pontos para medir o estado do paciente through three historical moments wich sym-
e uma lista resumida da bibliografia utilizada bolize the improvement of nursing profession:
para elaborar o resultado. the Origin of Modern Nursing (by Florence
Barros, Maria e Abrão (2002) enfatizam Nightingale), the Nursing Theories and the
que os resultados são as mudanças, favoráveis Systematic of Nursing Assistance, also this re-
ou não, no atual ou potencial estado de saúde search is going to look forward the attempties
das pessoas, grupos ou comunidades, que po-
to standardize the nursing language or tech-
dem ser atribuídas a anteriores ou atuais cui-
nical terms of nursing, by using the Nursing
dados. O que se quer saber é se o paciente teve
American Diagnoses Association terms, the
benefício ou não com o cuidado prestado.
Nursing Interventions Classification solutions
and the considerations of Nursing Outcomes
Classification.
9 Considerações finais

É, sem dúvida, notável que, ao longo dos Key words: History of nursing. Nursing.
últimos dois séculos, a enfermagem vem pas- Nursing process.

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Recebido em 6 nov. 2005 / aprovado em 4 fev. 2006

Para referenciar este texto


OLIVEIRA, M. L. de; PAULA, T. R. de; FREITAS, J. B.
de. Evolução histórica da assistência de enfermagem.
ConScientiae Saúde, São Paulo, v. 6, n. 1, p. 127-136, 2007.

136 ConScientiae Saúde, São Paulo, v. 6, n. 1, p. 127-136, 2007.

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