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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

INSTITUTO DE QUÍMICA DE SÃO CARLOS


FERMENTAÇÃO NA INDÚSTRIA DE ALIMENTOS

Determinação da concentração de glicose em leite de baixo teor de


lactose e leite integral por método enzimático e determinação de açúcares
redutores pelo método de Somogyi - Nelson

Alunas:
Larissa Foltran (9784099)
Marina Cassab (9784078)

São Carlos, setembro de 2019


INTRODUÇÃO

A lactose é um açúcar presente e característico do leite de vaca. No leite


cru ela representa 40% do total de sólidos e é o responsável pelo sabor
levemente adocicado. Ademais, é o único dos açúcares comuns não
encontrados em plantas.1

A hidrólise da lactose pela β-galactosidase (ou lactase) gera produtos com


baixo teor de lactose que são indicados para pessoas intolerantes ou utilizados
na produção de doces devido à baixa cristalização. Sendo assim, a reação que
ocorre nos leites deslactosados é ilustrada na Figura 1.2

Figura 1 - Reação que ocorre nos leites deslactosados.2


O leite deslactosado se diferencia do integral em relação à presença da
D-glicose e D-galactose. Essa diferenciação pode causar alterações
organolépticas uma vez que o poder edulcorante da galactose e glicose é maior
que o da lactose, conforme visualizado na Tabela 1. Sendo assim, o leite
deslactosado é mais doce.2

Tabela 1 - Poder edulcorante dos açúcares.2

Dessa forma, pode-se usar a presença desses monossacarídeos para


estudar a diferença entre os leites e para isso usou-se dois métodos. O primeiro
baseia-se na determinação da glicose pelo método da glicose-oxidase. O
mecanismo de reação baseia-se na oxidação da glicose catalisada pela glicose
oxidase, gerando como subproduto a água oxigenada. Esse subproduto reage
com o reativo de trabalho que contém 4-aminofenazona ou 4-aminoantipirina e
fenol, gerando como subproduto um complexo colorido que absorve em 505 nm.
Dessa forma, utilizando um fotômetro é possível realizar a quantificação da
glicose nos diferentes leites a partir dos princípios da Lei de Beer. É importante
ressaltar que no leite integral não se espera a presença da glicose uma vez que
não ocorreu a hidrólise ilustrada na Figura 1.3

O segundo método baseia-se na determinação de açúcares redutores que


são aqueles que apresentam a extremidade anomérica livre e disponível para
participar de uma reação de oxidorredução em meio alcalino. No caso, o grupo
aldeído do açúcar redutor reduz o íon cúprico do reativo de Somogyi (reagente
I) a óxido cuproso. Em seguida, o óxido cuproso reage com o ânion arseno-
molibdato (reagente II) produzindo um composto de coloração azul. Essa
coloração azul apresenta o máximo de absorbância em 540 nm. Sendo assim,
utiliza-se esse comprimento de onda para realizar o estudo da amostra uma vez
que a intensidade de absorção é proporcional a concentração de açúcares
redutores. A reação em questão é ilustrada na Figura 2.3

Figura 2 - Determinação de açúcares redutores por Somogyi-Nelson.


No caso em questão, todos os açúcares estudados acima são redutores,
sendo assim é possível determinar a concentração de lactose no leite integral e
comparar com a concentração de glicose e galactose no leite deslactosado.

OBJETIVOS

Os objetivos da prática consistem na utilização de dois métodos diferentes


(enzimático e de oxidorredução) para estudar a conversão de lactose em glicose
e galactose no leite.
PROCEDIMENTO EXPERIMENTAL

 Preparo das amostras:

Primeiramente transferiu-se 25 mL da amostra de leite integral e de leite


com baixo teor de lactose para dois tubos de centrífuga de 50 mL, identificando
cada um dos tubos. Em seguida, precipitou-se a caseína com 5 mL de HCl 0,3
M e deixou-se o tubo por 10 minutos em banho de gelo. Em seguida, as amostras
foram centrifugadas a 5000 rpm por 20 minutos e o sobrenadante transferido
para um béquer de 50 mL para a neutralização da solução (pH=7) com NaOH
0,5 M utilizando-se um potenciômetro. A solução neutralizada foi transferida para
um balão volumétrico de 50 mL e o volume completo com água destilada.

 Determinação da glicose pelo método da Glicose-Oxidase/Peroxidase

A solução preparada anteriormente foi diluída em uma proporção de 1:5.


Em três tubos de ensaio foram pipetados 3 mL do reativo de trabalho e a solução
foi incubada em banho maria a 37 ºC por 10 minutos. Foram adicionados 20 uL
das amostras diluídas 1:5 (integral e deslactosado) e para o branco adicionou-
se 20 uL de água destilada. Os três tubos foram incubados por 10 minutos a 37
ºC e em seguida realizou-se a leitura no espectrofotômetro a 505 nm contra o
branco.

 Determinação de açúcares redutores pelo método de Somogyi-Nelson

Colocou-se 0,5 mL da amostra de cada um dos leites (integral e


deslactosado) diluídos na proporção de 1:50 e 1:100 e 1 mL do reagente SNI em
tubos de ensaio previamente identificados. Os tubos foram agitados e colocados
em banho maria em ebulição por 6 minutos. Após este período os tubos foram
colocados em banho de gelo até atingirem a temperatura ambiente. Então
adicionou-se 1 mL do reagente SNII e agitou-os. Em seguida foram deixados em
repouso por 5 minutos. Por fim, adicionou-se 10 mL de água destilada em cada
tubo e misturou-os por inversão. Após isto a absorbância foi medida a 540 nm
contra o tubo “Branco”.

Vale ressaltar que para a realização do tubo branco realizou-se o mesmo


procedimento. No entanto, não se adicionou as amostras de leite.
RESULTADOS E DISCUSSÃO

Foi realizado o estudo comparativo entre os leites integral Ninho Forti+


(fabricação: 29/03/19, validade: 29/08/19, lote: 90881209A1) e Ninho Forti+ Zero
Lactose (fabricação: 11/06/19, validade: 11/10/19, lote: 91621209A1) com
relação ao teor de açúcares livres.

Inicialmente, realizou-se a precipitação das proteínas do leite com solução


ácida para obtenção apenas do soro límpido com os açúcares solúveis em
solução, evitando, assim, interferências na medição de absorbância, já que a
espectrofotometria é muito sensível. Após a separação total da parte sólido
precipitada, retirou-se o soro com auxílio de pipeta, transferiu-o para um balão
volumétrico de 50 ml, realizou-se a diluição inicial, partindo desta as diluições
1:5, 1:50 e 1:100 a serem utilizadas nas próximas etapas.

O primeiro método de avaliação consistiu na determinação da


concentração dos açúcares livres em ambos os tipos de leite pela medida da
intensidade da absorbância da amostra, que foi colocada em contato com o
reativo de trabalho, cuja composição é: 89,7% de água; 5% de 4-aminofenazona
0,025 mol/L; 5% de fenol 0,055 mol/L; 0,3% de reativo enzimático (glicose
oxidase; peroxidase). A técnica chama-se Glicose-Oxidase/Peroxidase, tendo
sido já explicada anteriormente na Introdução.

Basicamente, trata-se de uma metodologia enzimática, que apresenta alta


sensibilidade nos resultados. A glicose, em presença de oxigênio, acaba
sofrendo oxidação pela ação da enzima gli-oxidase, produzindo peróxido de
hidrogênio; este, por sua vez, reage com a 4-aminofenazona e o fenol, a fim de
produzir uma substância que emite na faixa do visível, resultando em uma
intensidade de absorção de radiação proporcional à concentração de glicose
contida na amostra original de leite. Essa metodologia é utilizada para a
determinação glicêmica sanguínea, principalmente, em pacientes diabéticos,
pela facilidade e praticidade do método.

A correlação entre a absorção (A) e a concentração (c) é dada pela lei de


Beer-Lambert, apresentada a seguir, na qual ε representa a absortividade molar
da substância e l, o caminho percorrido pela radiação no meio que contém o
composto, que corresponde à largura da cubeta utilizada:

𝐴 = 𝜀 . 𝑐. 𝑙

A solução utilizada para essa etapa foi a diluída em proporção 1:5, logo
terá que ser levado em consideração o fator de diluição ao final das contas.
Como o reativo de trabalho é padronizado e vendido com proporções bem
definidas, possui um fator de conversão que é fornecido pelo fabricante, não
sendo necessária a construção de uma curva de calibração para obter tão valor.
Seguindo apenas uma relação com os valores obtidos para o padrão e a
amostra, temos, para o leite integral (cl) e o com baixo teor de lactose (sl),
respectivamente:
𝐴𝑝 𝑐𝑝 𝑐𝑝 𝑐𝑝
= → 𝑐𝑎 = . 𝐴𝑎 , = 𝐹𝑐
𝐴𝑎 𝑐𝑎 𝐴𝑝 𝐴𝑝
𝑐𝑎 = 𝐹𝑐 . 𝐴𝑎 , 𝐹𝑐 = 402
𝑐𝑐𝑙 = 402 . 0
𝑐𝑐𝑙 = 0
𝑐𝑠𝑙 = 402 . 0,539
𝑚𝑔 𝑚𝑔
𝑐𝑠𝑙 = 216,7 . 5.50 = 54170 𝑜𝑢 541,7
𝑑𝑙 𝑚𝑙
541,7 𝑚𝑔 → 25 𝑚𝑙
𝑥𝑠𝑙 → 100 𝑚𝑙
𝑥𝑠𝑙 = 2,17𝑔%

Como esperado, o leite deslactosado apresentou maior resultado de teor


de glicose, uma vez que passou por processo de quebra da lactose durante sua
produção, o que liberou moléculas de glicose e galactose no meio, como já
explicado. A absorbância observada para o leite integral deixa claro a ausência
de glicose, pois apresentou valor muito próximo de zero, sendo desconsiderada
nos cálculos, enquanto que o teor de glicose calculado é muito próximo do
apresentado na embalagem do produto (2,2 g%). Abaixo, segue a Figura 3, que
mostra as informações dos rótulos do leite integral (à esq.) e do zero lactose (à
dir.):
Figura 3: Tabela nutricional dos leites integral (à esq.) e zero lactose (à dir.).

Ambos possuem o mesmo teor de açúcares, pois o processo de


deslactosação não muda a quantidade dos carboidratos, mas sim, a forma com
que se apresentam. Ademais, o leite com baixo teor de lactose apresenta, na
composição dos açúcares totais, glicose e galactose, ao invés de lactose, sendo
uma proporção equimolar dos dois açúcares, uma vez que a hidrólise de lactose
produz uma molécula de cada. O valor calculado corresponde apenas ao
conteúdo de glicose na amostra, muito próximo do fornecido pelo fabricante para
o caso do leite zero lactose. Enquanto que, para o leite integral, observou-se
ausência do monossacarídeo, explicado pela existência apenas de lactose.

Comparando com as concentrações encontradas, há certa semelhança,


sendo a variação atribuída à precipitação inicial e também à preparação das
diluições, o que leva a erro cumulativo. As informações nutricionais do leite
integral são referentes a uma quantidade de 200ml, tendo sido levado em
consideração apenas meia porção, que é o correspondente ao valor encontrado
nos cálculos.

Prosseguindo, fez-se a preparação do método Somogyi-Nelson, que


consiste na determinação de açúcares redutores. Isso significa que são
detectados apenas as cadeias de monossacarídeos aqueles com grupo
carboxílico livre na extremidade do carbono anomérico, sendo passível de
oxidação. Foi preparada, previamente, a curva de calibração da técnica, que
resultou no seguinte Gráfico 1:
Curva de calibração - Somogyi-Nelson
1.4

1.2 y = 2.1469x + 0.114


R² = 0.9365
1

0.8
Abs

0.6 Abs

0.4 Linear (Abs)

0.2

0
0 0.1 0.2 0.3 0.4 0.5 0.6
Concentração (mg/mL)

Gráfico 1: curva de calibração do método Somogyi-Nelson.

Utilizando os valores, calculou-se a melhor reta, que forneceu uma


equação de reta, com coeficiente de correlação entre os pontos adequado aos
cálculos posteriores.

A Tabela 2 elucida os valores de absorção obtidos para as amostras de


leite integral e deslactosado para ambas as diluições, de 1:50 e 1:100:

Tabela 2 – Dados de Absorção para método Somogyi-Nelson

Diluição Absorbância
1:50 0,206
Com lactose
1:100 0,161
1:50 0,423
Sem lactose
1:100 0,221

De acordo com a observação da Tabela 1, é possível ver que a absorção,


em um mesmo fator de diluição para ambas as amostras, mostra-se duas vezes
maior para o leite deslactosado. Fato esse que deverá ser comprovado por meio
de cálculos numéricos.

De acordo com os valores de absorção obtidos nas leituras feitas das


amostras de leite integral e deslactosado, correspondentes a y na equação de
reta, foi possível determinar os valores de concentração de açúcares redutores.
Assim como na etapa de determinação do conteúdo de glicose pelo método
GOD/POD, será levado em consideração apenas o coeficiente linear da
equação, uma vez que assim será mantida a proporcionalidade entre
concentração e absorbância; o valor do coeficiente linear seria comparável ao
valor obtido para o branco, porém o calculado tem valor muito elevado. Isso pode
ser explicado pela falta de pontos mais próximos da concentração zero, o que
gerou maiores desvios na intersecção da reta para com o eixo das ordenadas.
Sendo assim, passos para determinação das concentrações estão elucidados a
seguir, para leite integral (cl) e zero lactose (sl) em fator de diluição 1:50:

0,206 = 2,1469𝑐𝑐𝑙
𝑐𝑐𝑙 = 0,09595 . 50.50 𝑚𝑔 = 240 𝑚𝑔
240 𝑚𝑔 → 25 𝑚𝑙
𝐶𝑐𝑙 → 100 𝑚𝑙
𝐶𝑐𝑙 = 959,5 𝑚𝑔%

0,423 = 2,1469𝑐𝑐𝑙
𝑐𝑠𝑙 = 0,197 . 50.50 𝑚𝑔 = 492 𝑚𝑔
492 𝑚𝑔 → 25 𝑚𝑙
𝐶𝑠𝑙 → 100 𝑚𝑙
𝐶𝑠𝑙 = 1970 𝑚𝑔%
𝐶𝑠𝑙 959,5
= = 2,05
𝐶𝑐𝑙 1970

É sabido que, segundo a estrutura molecular da lactose, esta apresenta


apenas uma extremidade redutora de íons metálicos, enquanto que tanto a
glicose quanto a galactose são considerados açúcares redutores. Logo, o leite
deslactosado apresentaria sinal duas vezes mais intense que o leite integral
convencional, uma vez que possui uma mistura equimolar entre os dois
monossacarídeos redutores. É possível comprovar essa relação seja pela
proporção dos sinais observadas para as duas amostras quanto pelas
concentrações determinadas, como calculadas acima, sendo isso um indicativo
de eficiência do método tanto de detecção utilizado pelos alunos, quanto do
processo de hidrólise da lactose, porque promoveu liberação desses
monossacarídeos redutores.

Ao final, foi realizado um breve teste sensorial para avaliação das


diferenças gustativas entre os dois tipos de leite. Notou-se que o leite
deslactosado apresenta sabor mais adociado que o produto convencional, sendo
este fato explicado pela capacidade edulcorante da lactose em relação à glicose
e galactose livres. Como mostrado na Tabela 1, em Introdução, a lactose possui
baixo poder edulcorante quando comparada aos monossacarídeos, por isso a
versão hidrolisada apresenta, no paladar, sensorial mais doce que o normal.

CONCLUSÕES

Foram exploradas técnicas para a determinação de teor de açúcares


presentes em leite bem como metodologias para a confirmação do teor de
hidrólise da lactose em produtos deslactosados, no caso o leite.

Os leites estudados apresentaram resultados como os esperados, tendo


o leite tipo zero lactose demonstrado alto teor de glicose e galactose, o que
significa alta taxa de conversão do dissacarídeo em suas subunidades.
Além disso, as técnicas referentes à determinação da concentração dos
açúcares demonstraram-se bem eficientes e práticas, reforçando conteúdos
aprendidos em sala, como lei de Beer-Lambert, atuação da β-galactosidase,
açúcares redutores e conceitos de bioquímica.

Produtos como o analisado nesse trabalho representam uma


preocupação crescente das empresas de alimentos, que querem disponibilizar
produtos de qualidade para pessoas com restrições alimentares, abrangendo
cada vez mais essa parte da população.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

[1] Carminatti, Claudimir Antonio. Ensaios de hidrólise enzimática da


lactose em reator a membrana utilizando beta-galactosidade
Kluyveromyceslactis. 2001. 79 f. Dissertação (Mestrado) - Curso de Engenharia
Química, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2001.
[2] Fennema O. R. ; Damodaran, S. ; Parkin, K. L. Química de Alimentos
de Fennema – 4ª ed. - Editora Artmed, 2010.

[3] Nitschke, M. Apostila de laboratório. 2019.

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