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UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA

unesp “JÚLIO DE MESQUITA FILHO”


FACULDADE DE CIÊNCIAS
CÂMPUS DE BAURU

JÚLIO CÉSAR CASTILHO RAZERA

O DESENVOLVIMENTO MORAL EM AULAS DE CIÊNCIAS:


EXPLORANDO UMA INTERFACE DE CONTRIBUIÇÕES

UNESP - Faculdade de Ciências, Câmpus de Bauru, março de 2011


JÚLIO CÉSAR CASTILHO RAZERA

O DESENVOLVIMENTO MORAL EM AULAS DE CIÊNCIAS:


EXPLORANDO UMA INTERFACE DE CONTRIBUIÇÕES

Relatório de tese apresentado como parte dos


requisitos exigidos para a obtenção do título de
Doutor em Educação para a Ciência, do
Programa de Pós-Graduação em Educação para
a Ciência (Área de Concentração: Ensino de
Ciências), pela Universidade Estadual Paulista
Júlio de Mesquita Filho.

Orientador: Prof. Dr. Roberto Nardi


Dados Internacionais de Catalogação

Razera, Júlio César Castilho.


O desenvolvimento moral em aulas de ciências :
explorando uma interface de contribuições / Júlio
Cesar Castilho Razera, 2011. 236 f. : il.

Orientador: Roberto Nardi

Tese (Doutorado)–Universidade Estadual


Paulista. Faculdade de Ciências, Bauru, 2011

1. Ensino de ciências. 2. Formação ética. 3.


Desenvolvimento da consciência moral.
I. Universidade Estadual Paulista. Faculdade de
Ciências. II. Título.

Índices para catálogo sistemático (cf Thesaurus Brasileiro da Educação):

1. Educação: Ensino de ciências


2. Fundamentos da educação: Formação ética
3. Fundamentos da educação: Desenvolvimento da consciência moral

Referência ABNT - NBR 6023: 2002

RAZERA, J. C. C. O desenvolvimento moral em aulas de ciências: explorando uma interface


de contribuições. 2011. 236 f. Tese (doutorado em Educação para a Ciência) - Faculdade de
Ciências, Universidade Estadual Paulista, Bauru, 2011.

AUTORIZAÇÃO

Reprodução permitida para fins


acadêmicos.
© Júlio César Castilho Razera
contato: juliorazera@yahoo.com.br
Apoio financeiro e administrativo: Pró-
Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação da
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
(PPG/UESB).
UM PERCURSO QUE ANTECEDE A PESQUISA

“Espero que o leitor me perdoe o fato de citar


pormenores de caráter pessoal; faço-o tão somente
para mostrar que as minhas conclusões não são
resultados de uma atitude precipitada”
(DARWIN, 2004, p. 27).

Juntando-se aos objetivos, procedimentos metodológicos, fundamentos teóricos e


outros elementos constitutivos que são exigidos para este tipo de trabalho acadêmico, julgo ter
relevância o perfil experiencial de quem o construiu. Conhecer quem argumenta permite ao
leitor um lugar melhor posicionado para contextualizar as interpretações sobre as discussões e
compreensões manifestadas pelo autor. Afinal, como diz Orlandi (1988, 2007), não apenas o
leitor tem suas especificidades e sua história - que permitirão uma compreensão sob condições
próprias, mas também ao sujeito-autor-analista o mesmo se aplica, ainda que (e porque) este
se ampare em dispositivos teóricos de sua escolha.
Portanto, para subsidiar o leitor na análise que fará sobre este trabalho, segue uma
breve trajetória de quem se coloca como autor-arguente.
Em 1986 concluí minha licenciatura plena em Ciências Biológicas na Universidade do
Sagrado Coração (USC). Logo em seguida, no ano de 1987, fui aprovado em dois concursos
da Secretaria de Estado da Educação de São Paulo para o cargo de professor das disciplinas
de Ciências Físicas e Biológicas, no ensino fundamental, e de Biologia, no ensino médio. Na
época, por entender que ainda não tinha experiência suficiente para trabalhar no ensino médio,
optei por me efetivar como professor de Ciências, assumindo classes de 5ª a 8ª séries. De
1987 a 1994, como professor efetivo da rede estadual de ensino, lecionei Ciências nos
municípios de Apiaí, Ubirajara, Duartina e Bauru. Durante essa época, apesar do cargo ser
para o componente curricular de Ciências, por necessidade das escolas também atuei no
ensino de Biologia para o ensino médio.
Com a experiência adquirida pela prática docente e o desejo particular de concentrar
minha atuação no ensino médio, em 1993 prestei novo concurso da Secretaria de Estado da
Educação de São Paulo para o cargo de professor de Biologia. Sendo aprovado, exonerei-me
do cargo de professor de Ciências para assumir o novo cargo. Como professor de Biologia
atuei nos municípios de Duartina e Bauru entre os anos de 1994 e 2000.
Concomitante à rede pública, no período de 1998 a 2000, também tive a oportunidade
de atuar na rede privada de ensino, numa escola de renome nacional, como professor de
Biologia para o ensino médio e cursos pré-vestibulares. Pude, então, sentir profissionalmente
algumas diferenças entre as duas redes, especialmente nos aspectos inerentes aos projetos
políticos pedagógicos de ambas. Em 2000 eu solicitei espontaneamente a minha saída da rede
privada de ensino com a convicção de que eu poderia melhor contribuir para a escola pública.
Desde o início de minha carreira profissional como docente, preocupei-me
especialmente com as diferentes situações negativas que envolviam a escola pública:
desvalorização salarial, condições precárias de trabalho, perfil dos alunos etc. Então, entre
1994 e 1995, ao participar de uma chapa eleita, atuei como conselheiro estadual do Sindicato
dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (APEOESP) em inúmeras
atividades e ações políticas em prol da escola pública da rede estadual de São Paulo. No
entanto, a minha maior preocupação era mesmo com os aspectos didático-pedagógicos de sala
de aula, local onde eu conseguia intervir de modo mais direto.
No ano de 2000, por acreditar que eu poderia ampliar essas possibilidades de
intervenção didático-pedagógica na rede pública, aceitei um convite para trabalhar na
Diretoria de Ensino de Bauru, na função de Assistente Técnico Pedagógico na área de
Biologia. Em 2001, com a implantação do Núcleo Regional de Tecnologia Educacional,
passei a atuar como Assistente Técnico Pedagógico na área de Informática Educacional até
meados de 2004. Nesse período, além de atuar em palestras e cursos diversos, auxiliei na
implementação de diversos projetos de formação continuada para professores da rede pública,
tanto na área de Biologia como na área de Informática Educacional.
O segundo semestre de 2004 marcou o início de outro ciclo profissional em minha
vida. Aprovado em concurso para o cargo de professor assistente da Universidade Estadual do
Sudoeste da Bahia (UESB), no Departamento de Ciências Biológicas, eu assumi disciplinas
na área da Educação (Prática de Ensino, Estágio Supervisionado, Seminários de Pesquisa e
Tópicos Específicos do Ensino de Biologia). De 2004 a 2007, além da área do ensino na
universidade, orientei alunos de graduação e de especialização, coordenei o Laboratório de
Ensino, coordenei e colaborei em projetos de pesquisa e de extensão, participei de bancas de
especialização, integrei o Comitê Editorial das “Edições UESB” e outras funções.
Desde a conclusão do meu curso de licenciatura até hoje, na busca de uma formação
profissional complementar e aproveitando as oportunidades surgidas, participei de diferentes
cursos: i) de curta duração, em universidades e instituições diversas (USP, UNESP, UFES,
Instituto Botânico de São Paulo, Coordenadoria de Estudos e Normas Pedagógicas, Fundação
para o Desenvolvimento da Educação), com enfoques em conteúdos “duros” e em práticas
pedagógicas nas áreas de Ciências, Biologia e Informática Educacional; ii) pós-graduação lato
sensu, nível de especialização, em Saúde Pública (USP, em 1988), Ensino de Ciências
(UNESP, em 1997), Informática na Educação (UFES, em 2003).
Nesse mesmo período (do final da graduação até o momento atual), ainda tive a
oportunidade de participar de dezenas de diferentes eventos (simpósios, congressos,
encontros) em diferentes áreas, especialmente aquelas voltadas para a educação.
Concluí meu mestrado na UNESP em 2000, cuja pesquisa desenvolvida sob orientação
do professor Dr. Roberto Nardi teve o título de “Ética em assuntos controvertidos no ensino
de ciências: atitudes que configuram as controvérsias entre evolucionismo e criacionismo”.
Em 2007, com o apoio administrativo e financeiro da UESB, afastei-me das atividades
profissionais para cursar o doutorado, que formalmente culmina com a apresentação deste
relatório de tese.
Por fim, concomitante com outros projetos, e desde o mestrado, venho desenvolvendo
ou participando de trabalhos diversos sobre questões éticas no ensino de Ciências, mais
especificamente sobre aspectos da moralidade envolvidos nos processos de ensino dessa
disciplina (RAZERA, 2006a, 2006b, 2007, 2008, 2009a, 2009b, 2009c, 2009d, 2009e, 2011;
RAZERA; NARDI, 1997, 1998, 1999a, 1999b, 2000a, 2000b, 2001a, 2001b, 2003, 2006a,
2006b, 2009a, 2009b, 2010a, 2010b). A investigação atual integra o conjunto desses nossos
trabalhos sobre o tema.
O DESENVOLVIMENTO MORAL EM AULAS DE CIÊNCIAS:
EXPLORANDO UMA INTERFACE DE CONTRIBUIÇÕES

RESUMO

Na área de Educação em Ciências encontramos diferentes argumentos que convergem para a


necessidade de maior atenção sobre as dimensões axiológicas e atitudinais do processo de
ensino e aprendizagem das disciplinas científicas. Essa demanda exige uma contínua
ampliação e aprofundamento das investigações sobre o tema, porque envolve conhecimentos
de domínios teóricos diversos que ainda são carentes nas discussões da área. À luz da
psicologia do desenvolvimento e da ética discursiva, este trabalho põe em foco um relevante
componente da dimensão atitudinal-axiológica: o desenvolvimento moral dos alunos em aulas
de Ciências. Embasados pelas perspectivas sociomorais das teorias de Jean Piaget, Lawrence
Kohlberg e Jürgen Habermas, além de outros autores alinhados com esses pressupostos,
apresentamos dados teóricos e empíricos que buscam: (i) explorar uma válida e viável
correlação de aspectos teórico-práticos laicos e racionais entre as aulas de Ciências e o
desenvolvimento moral, permitindo avanços nos conhecimentos sobre formação do
pensamento moral, crítico e científico dos estudantes em processo de ensino e aprendizagem
de Ciências; (ii) delinear o estado dos trabalhos científicos da área brasileira de Educação em
Ciências sobre o assunto desenvolvimento moral. Ao final, o nosso estudo traz evidências de
uma interface de contribuições teórico-práticas recíprocas e plausíveis que pode ser delineada
entre desenvolvimento moral e aulas de Ciências, mas ainda subestimada nas discussões da
área.

Palavras-chave: pensamento moral; pensamento crítico; assuntos sociocientíficos; Kohlberg;


Piaget.

UNESP - Faculdade de Ciências, Câmpus de Bauru, março de 2011


© Júlio César Castilho Razera
MORAL DEVELOPMENT IN SCIENCE CLASSES:
EXPLORING AN INTERFACE OF CONTRIBUTIONS

ABSTRACT

In the field of Science Education there are many arguments for more attention to the
axiological and attitudinal dimensions of the teaching and learning scientific disciplines
processes. This demand requires continuous in-depth investigation about this theme because it
involves the knowledge of various theoretical fields that have not still attracted the deserved
attention. In the light of developmental psychology and discursive ethics, the present study
focuses on a relevant component of the attitudinal-axiological dimension: the moral
development of students in Science classes. Based on the social and moral perspectives in
Jean Piaget, Lawrence Kohlberg and Jürgen Habermas’s theories, and on other authors that
share these presuppositions, we presented theoretical and empirical data in order to (i) explore
a valid and viable correlation of secular and rational theoretical and practical aspects and
components between Science classes and moral development, including an analysis of the
knowledge about moral, critical and scientific thinking of students learning Sciences
formation; (ii) delineate the status of scientific research and studies of the field of Science
Education in Brazil on moral development. Our study demonstrates the existence of an
interface of reciprocal and plausible theoretical and practical contributions between moral
development and Science classes, which has so far received little attention in the Science
Education research.

Keywords: moral thinking; critical thinking; socioscientific issues; Kohlberg; Piaget.

UNESP - Faculdade de Ciências, Câmpus de Bauru, março de 2011


© Júlio César Castilho Razera
SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO ............................................................................................................. 13

INTRODUÇÃO.................................................................................................................... 16

PARTE I - ABRANGÊNCIAS E POSICIONAMENTOS............................................... 23


1.0 - ÉTICA E MORAL - CONCEITOS E RELAÇÕES..................................................... 24
2.0 - EDUCAÇÃO E(M) VALORES: SITUANDO IDEIAS.............................................. 26
2.1 - Valores na escola................................................................................................. 26
2.2 - Educação e valores no mundo contemporâneo.................................................... 28
2.3 - A verdade como valor na dimensão educativa.................................................... 30
2.4 - A formação ético-moral sob a perspectiva da LDBEN e dos PCN..................... 35
2.4.1 - PCN de Educação Infantil....................................................................... 37
2.4.2 - PCN de 1ª a 4ª séries................................................................................ 38
2.4.3 - PCN de 5ª a 8ª séries................................................................................ 42
2.4.4 - PCN de Ensino Médio............................................................................. 43
2.4.5 - PCN+ (Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias)............. 43
2.4.6 - Documento curricular para o ensino de Ciências no ensino médio......... 44
2.5 - Destaques............................................................................................................. 45
3.0 - TEORIAS REVISITADAS: CONTRIBUTOS DAS PERSPECTIVAS
SOCIOMORAIS PARA AS AULAS DE CIÊNCIAS................................................. 47
3.1 - Os estudos de Piaget sobre moral........................................................................ 48
3.1.1 - O juízo moral na criança.......................................................................... 48
3.1.2 - Os procedimentos da educação moral..................................................... 52
3.2 - Os trabalhos de Kohlberg sobre desenvolvimento moral.................................... 57
3.2.1 - Os níveis e estágios de desenvolvimento moral ..................................... 58
3.2.2 - O desenvolvimento do educando como finalidade da educação............. 63
3.3 - A ética discursiva de Habermas........................................................................... 67
3.4 - Piaget, Kohlberg e Habermas: pontos e contrapontos......................................... 73
3.5 - Desenvolvimento moral e ética discursiva: críticas e subsistências.................... 79
3.6 - Parênteses à discussão: a Biologia, a neurociência e os aspectos ético-morais... 81
3.7 - Destaques............................................................................................................. 82

PARTE II - CORRELAÇÕES........................................................................................... 84
4.0 - AULAS DE CIÊNCIAS E DESENVOLVIMENTO MORAL: UMA
ABORDAGEM PRELIMINAR SOBRE OS ASPECTOS CORRELATIVOS........... 85
4.1 - Ciência, religião e tolerância............................................................................... 86
4.2 - Valores na ciência e nas aulas de Ciências.......................................................... 88
4.3 - Ciência, ensino de Ciências e hierarquias............................................................ 90
4.4 - A relevância do “hablar ciencia” nas aulas de Ciências..................................... 96
4.5 - O ensino de Ciências e a atuação cidadã............................................................. 102
4.6 - A natureza da ciência na educação básica: exigências e contribuições............... 103
4.7 - As controvérsias sociocientíficas e implicações ético-morais............................. 108
4.8 - Destaques............................................................................................................. 110
5.0 - DESENVOLVIMENTO MORAL E(M) AULAS DE CIÊNCIAS: EXERCÍCIOS,
SITUAÇÕES E ANÁLISES......................................................................................... 112
5.1 - Os estágios de desenvolvimento moral de Kohlberg em aulas de Ciências........ 112
5.2 - Atmosferas morais em aulas de Ciências: componentes correlativos................. 114
5.3 - Aulas de Ciências em possíveis situações preponderantes de heteronomia e de
autonomia moral.................................................................................................. 118
5.4 - Correlações e potencialidades: análise................................................................ 120
5.4.1 - As visões de Janus................................................................................... 126
5.4.2 - Os itinerários de Antígona passam pelas aulas de Ciências.................... 127
5.4.3 - Para além dos assuntos controvertidos.................................................... 131
5.4.4 - Nas entrelinhas de um discurso “científico”............................................ 134
5.4.5 - Pesquisas sobre relações coercitivas em sala de aula.............................. 135
5.5 - Destaques............................................................................................................. 138

PARTE III - AUSÊNCIAS E NECESSIDADES.............................................................. 139


6.0 - A FORMAÇÃO MORAL NOS TRABALHOS CIENTÍFICOS DA ÁREA DE
EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS...................................................................................... 140
6.1 - Documentos analisados....................................................................................... 140
6.2 - Procedimentos...................................................................................................... 141
6.3 - Resultados e discussão......................................................................................... 145
6.3.1 - Dados de uma pesquisa publicada........................................................... 145
6.3.2 - Trabalhos dos V, VI e VII ENPEC.......................................................... 146
6.3.3 - Artigos da revista Ensaio......................................................................... 152
6.3.4 - Artigos da revista Ciência & Educação.................................................. 156
6.3.5 - Artigos da RBPEC................................................................................... 161
6.3.6 - Artigos da revista Investigações em Ensino de Ciências........................ 165
6.4 - Ética e moral em dissertações e teses na área do ensino de Biologia (1972-
2004).................................................................................................................... 170
6.5 - Destaques............................................................................................................. 175
7.0 - A FORMAÇÃO MORAL NAS LICENCIATURAS EM CIÊNCIAS........................ 176
7.1 - As licenciaturas em discussão: relações entre teoria e prática e o tema moral
nas disciplinas...................................................................................................... 177
7.2 - Destaques............................................................................................................. 182

CONCLUSÕES.................................................................................................................... 184

REFERÊNCIAS................................................................................................................... 189

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA E COMENTADA..................................................... 204

GLOSSÁRIO........................................................................................................................ 218

APÊNDICES........................................................................................................................ 221

ANEXOS............................................................................................................................... 223
13

APRESENTAÇÃO

“Ele não tem o direito de me forçar a abandonar


os meus. [...] Tu serás mais odiosa silenciando do
que se disseres a todos o que eu penso”1
(SÓFOCLES, 2000, p. 79 - 80).

“As questões de pesquisa não vêm do nada. Em muitos casos, originam-se na biografia
pessoal do pesquisador e em seu contexto social”. A afirmação de Flick (2004, p. 64)
corresponde ao nosso caso. Em 1994, com sete anos de experiência no magistério, entrei2
numa classe de 2ª série do ensino médio e pus em prática os conteúdos planejados sobre o
tema Evolução para aproximadamente 30 alunos. Ao final da aula, enquanto os demais saíam
para o intervalo, um aluno aproximou-se e disse: “Professor, interessante o que o senhor falou
na aula de hoje, mas eu não acredito em nada disso. E não concordo como são dadas as aulas
sobre o assunto”. Então, conversamos nesse dia e também em outras aulas subsequentes. Nas
conversas eu procurava defender a ciência, na tentativa de despersuadi-lo. Algum tempo
depois aquele aluno deu-me de presente um livro (figura 1) com a seguinte dedicatória:
“Primeiramente gostaria de agradecer-lhe o companheirismo e a amizade que tivemos. E
espero que pela leitura deste livro o senhor possa perceber como a palavra de Deus - a Bíblia
- se harmoniza com a ciência, sendo proveitoso para ensinar” (Aluno I. S. M., 22/11/94).

Figura 1. Capa do livro e dedicatória3

Não, não deixei de ser “evolucionista” para acreditar no criacionismo e nem me deixei
convencer pelas contra-argumentações do aluno, pois bases epistemológicas sustentam

1
Diálogo de Antígona com sua irmã Ismênia sobre Creonte.
2
Em geral o trabalho será apresentado na terceira pessoa do plural. Em casos como esse, nos quais a pessoa do
pesquisador é ressaltada por envolvimento experiencial particular, será utilizada a primeira pessoa do singular.
3
Livro intitulado “A vida - qual a sua origem?: a evolução ou a criação?”, editado por Watch Tower Bible
Society of Pennsylvania (Nova York), em 1985. O nome do aluno foi intencionalmente omitido.
14

minhas ideias4 sobre o tema. No entanto, após esse evento comecei a refletir sobre as
possíveis coerções involuntárias exercidas ao ensinar Ciências. Utilizando-me, em alguns
casos, dos próprios conhecimentos científicos para tal fim, especialmente nas aulas de
assuntos controvertidos, como Evolução, por exemplo, com possibilidades de interferência no
desenvolvimento moral dos alunos. Afinal, os meus procedimentos nessas aulas poderiam ser
involuntariamente coercitivos e orientados para aquilo que Piaget, extraído de Kant, denomina
de heteronomia moral. Juntamente com esse episódio ocorrido comigo, ainda retomei
lembranças do caso Scopes5 e toda a discussão subjacente à ciência e ao ensino de Ciências
daquela época, naquele contexto (vide ANEXO A), mas que ainda perdura em nosso meio
(vide ANEXO B). Desde esse momento comecei a observar com olhos mais atentos os
diferentes aspectos que transitam entre as aulas de Ciências e a formação moral dos alunos,
especialmente sob a luz do aporte teórico do desenvolvimento.
Mais à frente, com a promulgação da LDBEN (Lei 9394/96), a publicação dos
Parâmetros Curriculares Nacionais, as leituras diversas que eu fiz sobre ética e moral e a
proposta do professor Roberto Nardi em orientar um processo investigativo sobre assuntos
controvertidos no ensino de Ciências, houve a possibilidade de problematizar e investigar
alguns aspectos inerentes à ética e à moral. Muito pouco, no entanto, para a importância e
complexidade do tema. O que me fez retornar à dimensão axiológica do ensino de Ciências no
projeto de doutorado. Eram (e ainda são) muitas as questões abertas e, evidentemente, caberia
uma escolha. Então, qual escolher? Buscando argumentos na literatura que pudessem
subsidiar meus rumos, encontrei estes dizeres de Flick:

A decisão sobre uma questão concreta de pesquisa está sempre ligada à


redução da variedade, e, assim, à estruturação do campo de estudo: certos
aspectos ganham destaque, outros são considerados menos importantes,
sendo (ao menos para o momento) deixados em segundo plano ou excluídos.
(...) É, sim, crucial que o campo e a questão de pesquisa sejam definidos de
tal forma que a última possa ser respondida com os recursos disponíveis, e
que se possa obter um plano sólido de pesquisa (FLICK, 2004, p. 65).

4
Nesse período de reforma ortográfica (acordo dos países lusófonos) optamos pelo uso das novas normas em
vigor, exceto para as citações diretas que permanecem como nos respectivos documentos originais.
5
Não são poucos os casos em que as controvérsias entre evolução e criacionismo fizeram penetrar suas
discussões no âmbito educacional, em interferências ou decisões - até com amparos legais - sobre aquilo que os
professores poderiam ou não “ensinar” e o que os alunos poderiam ou não “aprender” sobre o tema em questão.
O primeiro e famoso episódio ocorreu em 1925 no Tennesse, Estados Unidos, onde o professor John Scopes foi
a julgamento por ensinar a teoria da evolução. Desde 1920 havia se tornado ilegal o ensino dessa teoria nas
escolas americanas. Em 1960 a insólita história do professor Scopes foi transformada em filme originalmente
chamado Inherit the Wind. Dirigido por David Greene, no Brasil o nome do filme recebeu a tradução de
“Herdeiros do Vento”.
15

Não vou esconder dos leitores a vontade que tive de trabalhar um conjunto grande de
variáveis, já que o tema é complexo e envolve uma multiplicidade delas. No entanto, isso
inviabilizaria a pesquisa. A escolha foi pelo recorte, acreditando-se na geração de
conhecimentos - ainda que parciais - capazes de juntar-se a outros diversos para fins de
contribuir com a área de Educação em Ciências. Com orientação do professor Roberto Nardi,
decidi por uma exploração teórico-empírica sobre uma interface contributiva entre aulas de
Ciências e desenvolvimento moral dos alunos, como veremos ao longo do texto.
Em relação aos princípios e noções de ensino formal sobre os quais este trabalho foi
pensado, não haverá dificuldades do leitor identificar a perspectiva escolhida: o
desenvolvimento do pensamento crítico e autônomo do aluno em bases laicas e racionais.
Nesta sucessão de esclarecimentos também cabe uma justificativa sobre as epígrafes
colocadas no início de cada tópico. Assumimos um posicionamento contrário à educação
moral com bases na mera transmissão verbal (ou por meio da escrita). Então, pode parecer
paradoxal que as epígrafes apareçam, pois, como diz Menin (2003, p. 61), “todos sabemos
que o fato de ouvirmos belas histórias ou guardarmos belas frases não nos torna melhores, por
si só”. Concordamos e justificamos que as epígrafes não se constituem simples frases de
efeito, mas denotam expressões de autores reconhecidos sobre as quais procuramos exprimir
correspondências simbólicas ou reflexivas com os conteúdos subsequentes.
Ao finalizar esta apresentação, voltemos ao problema de pesquisa. A origem foi na
minha prática docente. Isso não significa dizer que este trabalho tenha se restringido a essa
preocupação individual ou pela busca de respostas imediatas que pudessem dar conta de
aplicações também imediatas. A busca foi pela compreensão teórica de um fenômeno que não
se limita a uma prática particular ou individualizada. Essa ressalva é necessária para sanar
dúvidas quanto a seguinte preocupação encontrada em Alves-Mazzotti e Gewandsznadjer
(2004, p. 144): “se o pesquisador permanece no nível de sua prática específica e de seus
interesses individuais, sem uma tentativa de teorização que permita estender suas reflexões a
outras situações, pouco ou nada contribui para a construção do conhecimento”.
Conscientes das opções assumidas e necessidades científicas impostas pela
complexidade deste tipo de trabalho, apresentamos na sequência o nosso relatório de tese;
ressaltando-se, por fim, que utilizaremos discussões orientadas por teorias previamente
escolhidas e que sob essa óptica devem ser contextualizadas e interpretadas. Há outras
possibilidades? A resposta é, sem dúvida, afirmativa. Contudo, a construção que se segue está
estruturada em tais referenciais, sem a ilusão do esgotamento de outras possibilidades.
16

INTRODUÇÃO

“Há uma diferença entre 'tolerar' que você não


tenha as mesmas convicções que eu - sejam
religiosas, políticas ou outras - e 'acolher' suas
convicções. Porque acolher significa que eu
recebo na qualidade de alguém como eu”
(CORTELLA; LA TAILLE, 2005, p.11).

Há pesquisadores que argumentam sobre a necessidade de prestarmos maior atenção,


do que se é dado atualmente, aos aspectos atitudinais e axiológicos no ensino escolar das
disciplinas científicas, isto é, aos aspectos culturais, sociais, morais, emotivos, procedimentais
e outros que também se fazem presentes no ensino e aprendizagem de Ciências. Nós nos
apresentamos como um deles.
Os argumentos de Acevedo (2006) e de Solbes (2009), a seguir, constituem dois
exemplos de preocupação sobre as dimensões atitudinais e axiológicas inerentes ao ensino e
aprendizagem de Ciências. Outros exemplos que denotam essas inquietações aparecem em
discussões diversas difundidas na literatura (KOLSTØ, 2001; SETTELMAIER, 2002;
FOUREZ, 2003; SADLER, 2003; SIMMONS; ZEIDLER, 2003; ZEIDLER; LEWIS, 2003;
ZEIDLER, 2003; SADLER; ZEIDLER, 2004, 2005; VÁZQUEZ et al., 2004; ACEVEDO et
al., 2005; ALLCHIN, 2006; GIL PÉREZ; VILCHES, 2006; KOLSTØ et al., 2006; LEMKE,
2006; SADLER, 2006; HAMBURGER et al., 2007; PRAIA et al., 2007; REIS, 2007;
VÁZQUEZ; MANASSERO, 2007a, 2007b; FISCHMANN, 2008; REIS; GALVÃO, 2008;
VÁZQUEZ; MANASSERO, 2008; ACEVEDO, 2009a, 2009b), notadamente em temas a
envolver história e filosofia da ciência e abordagens que relacionam Ciência, Tecnologia,
Sociedade e Ambiente (CTSA).
De acordo com Acevedo (2006), difunde-se na área de Educação em Ciências que uma
maior bagagem de conhecimentos científicos contribui para a percepção, a qualidade e a
justificativa de tomadas de decisão que envolvem os assuntos tecnocientíficos. Assim, um
bom conhecimento sobre a natureza da ciência - ainda que seja numa perspectiva limitada -
também auxilia nessa contribuição, pois pode permitir melhores análises e raciocínios em
questões polêmicas envolvidas. Esses dois elementos qualificados como relevantes ao ensino
de Ciências (conhecimentos científicos e de epistemologia da ciência) são denominados de
fatores epistêmicos por Acevedo. O autor argumenta que esses fatores têm recebido uma
crescente atenção na área, mas, em contrapartida, uma menor atenção tem-se dado aos
aspectos de crença, de religião, de sentimentos, de moral, de interesses, de política, de cultura
17

(referentes à atitude e à axiologia), aos quais denomina de fatores não-epistêmicos, “ainda que
isso não exclua alguma relação com o epistêmico” (ACEVEDO, 2006, p. 371). Acevedo
defende que uma atenção maior deve ser dada a esses fatores não-epistêmicos, porque
também estão inclusos na base dos raciocínios e argumentos nas tomadas de decisão sobre as
questões tecnocientíficas.
Solbes (2009) apresenta-nos uma outra linha de discussão, mas com argumentos que
indicam inquietações similares a aquelas de Acevedo (2006). As dificuldades de
aprendizagem de Ciências dos alunos da escola básica não se restringem a deficiências
conceituais, segundo Solbes (2009), porque o processo de aprendizagem conceitual ocorre em
consonância com aspectos diversos, isto é, os metodológicos, as estratégias de raciocínio dos
alunos, as relações de afetividade, o clima da aula e as motivações. Não são apenas os
conceitos científicos que entram em cena na aprendizagem, afirma Solbes (2009), mas
também um conjunto de aspectos atitudinais que pode atuar em prol ou contra a aprendizagem
de Ciências. Atitudes que podem ser sobre a aprendizagem da ciência (interesse do aluno em
compreendê-la), sobre a ciência (curiosidade, rigor, espírito crítico), sobre as implicações
sociais da ciência etc. Para o autor existem ideias, crenças e valores que obstaculizam ou
favorecem a aprendizagem e devem ser levados em consideração. Quando obstaculizam, são
elementos de difíceis mudanças. Nesse caso, para uma aprendizagem conceitual também é
exigido trabalhar as dimensões procedimentais e axiológicas. A inserção de conteúdos de
história da ciência e abordagens relacionando CTSA6 são ferramentas úteis nesse processo,
salienta Solbes.
Entendemos que o conjunto de discussões sobre as dimensões axiológicas e atitudinais
do ensino e da aprendizagem de Ciências ainda é discreto (especialmente no Brasil), mas
tende a ampliar-se na área de Educação em Ciências, porque o tema tem relevância,
complexidade e implicações que ainda demandam investigações teóricas e empíricas com
possibilidades de expandir os limites preponderantes das atuais discussões.
As dimensões axiológicas agrupam valores estéticos, políticos e éticos. Os três estão
inseridos na educação (GORDILLO et al., 2000), ampliando a complexidade e as exigências
de quem trabalha com o tema nas áreas educacional e de pesquisa. Na pesquisa, no entanto,
esse caráter de complexidade e de exigências não impede de optarmos pela exploração e

6
Uma das conclusões apresentadas na 4ª Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação revela
inquietudes de perspectiva atitudinal e axiológica em relação à ciência, que podemos transpor para a sua
aprendizagem na escola: “valorização dos aspectos culturais e humanísticos da ciência”, “favorecer a
interculturalidade na relação entre ciência e os demais conhecimentos” e “devem ser promovidos o
reconhecimento e a valorização de saberes populares e tradicionais no processo de construção do conhecimento e
nas políticas de popularização da C&T” (DAVIDOVICH et al., 2010, p. 51).
18

compreensão de apenas um dos grupos da dimensão axiológica: os valores éticos. E dentro


desse grupo posicionarmos o foco para o desenvolvimento moral dos alunos, porque os
fundamentos teórico-práticos desse processo podem prestar relevante auxílio na compreensão
acerca da construção do pensamento crítico e do raciocínio moral que atuam, por exemplo,
em favorecimento ou em obstáculo às mudanças conceituais e atitudinais apontadas por
Solbes (2009).
Os processos que envolvem o pensamento crítico e o raciocínio moral estão
intimamente entrelaçados, tanto na prática como na teoria. Ainda que haja difusão de
trabalhos sobre ética e desenvolvimento moral na literatura, a interação entre essas duas
construções - pensamento crítico e raciocínio moral7 - ainda permanece aberta a novas
investigações na área de Educação em Ciências (SIMMONS; ZEIDLER, 2003, p. 82). Os
nossos propósitos inserem-se no rol dessas possibilidades de investigação sobre o
desenvolvimento moral dos alunos em aulas de Ciências. Atende, ainda, a uma das
reclamações de Acevedo (2006) de se dar mais atenção aos fatores não-epistêmicos. Nesse
nosso caso, a um dos aspectos da moral.
Com Piaget (1994), afirmamos que a moral é aprendida ao longo da vida, em todos os
ambientes, seja resultado de um ensino intencional ou involuntário, de forma consciente ou
inconsciente (vide no ANEXO C história em quadrinhos de Henfil que ilustra com humor e
inteligência esse fenômeno).
A escola está inclusa dentre esses ambientes de ensino e aprendizagem da moral (vide
ANEXO D). É equivocado pensar que os professores não têm relevante papel a desempenhar
na educação moral, porque essa deveria ser função apenas da família. Ainda que outras
instituições participem, não há como excluir a escola e os professores desse papel (LA
TAILLE, 2009, p. 234). Como diz Reboul (1984), todo professor, mesmo que este ignore o
fato, também é professor de moral. Apontando alguns trabalhos como referência, Vinha e
Tognetta (2009, p. 529) ressaltam que “as escolas inevitavelmente influenciam de modo
significativo na formação moral das crianças e jovens”.
No espaço intramuros da escola, além de outras oportunidades que não serão aqui
discutidas, há processos de formação moral dos alunos ocorrendo em todos os componentes
curriculares. Esse é, portanto, um tipo de formação implementado em todas as salas de aula,
seja de forma explícita ou implícita, intencional ou involuntária, a envolver direta ou

7
“Pensamento crítico”, “pensamento moral” e “pensamento científico” são descritores que aparecem num
mesmo nível na estrutura das relações hierárquicas do Thesaurus Brasileiro da Educação. São três processos que
envolvem o desenvolvimento cognitivo e moral.
19

indiretamente todos os sujeitos, mas de modo especial os alunos, pois estão em fases
relevantes de desenvolvimento. É uma formação moral que pode ter vieses teóricos e práticos
diversos, que apontam para diferentes fins, princípios, domínios e técnicas, isto é, podem ou
não atuar em prol de uma formação orientada para a autonomia e construção do espírito
crítico. “Querendo ou não, todas as escolas atuam na formação moral de seus alunos; nem
todas o fazem, no entanto, na direção da autonomia” (MENIN, 2003, p. 60).
Na perspectiva piagetiana o desenvolvimento do raciocínio moral de cada pessoa
depende da aprendizagem e das interações sociais ocorridas ao longo da vida, pois não é
processo completamente inato ou apenas resultado de maturação neurológica (LA TAILLE,
2009, p. 228). Nesse caso, tanto a aprendizagem como as interações podem favorecer ou
prejudicar o desenvolvimento moral. Aproveitamos de Vinha e Tognetta (2009, p. 529), entre
outros autores que compartilham os mesmos pressupostos extraídos de Piaget, para a
afirmação complementar de que “quanto mais o ambiente oferecido for cooperativo, maior o
desenvolvimento da autonomia, e; quanto mais autoritário, maiores os níveis de
heteronomia”.
Seguindo nessa linha de argumentação, e buscando aproximações com o que foi
exposto no início, podemos trazer as aulas de Ciências à discussão. Acreditamos que as aulas
de Ciências encerram características de um ambiente peculiar, cujas interações atitudinais e
axiológicas implicam tanto o desenvolvimento moral como a aprendizagem cognitiva dos
alunos. Esse nosso entendimento refere-se às potencialidades de mobilização do raciocínio
moral e do pensamento crítico que subjazem diversas situações específicas de aula de
Ciências: em possíveis confrontos entre conhecimento científico e senso comum, em
compreensões e difusões acerca dos métodos, do status e da natureza da ciência, em
tratamentos de assuntos sociocientíficos controversos, nas relações entre “verdade” e teoria
em ciência, nas dimensões ético-discursivas que permeiam a construção e difusão do
conhecimento científico, além das relações humanas e dos princípios e métodos de ensino e
aprendizagem envolvidos, entre outros.
Esta introdução não é exaustiva, mas já contém elementos suficientes para justificar a
implementação de um estudo referencial sobre o desenvolvimento moral dos alunos em
aulas de Ciências que explore os aspectos teórico-práticos de ambos - desenvolvimento
moral e aulas de Ciências - e tente avançar os limites que preponderam nas atuais discussões.
Assim, embasados pelas perspectivas sociomorais das teorias de Piaget (1994, 2003),
Kohlberg (1992) e Habermas (1987a, 1987b, 1999, 2003), além de outros autores que se
alinham a esses pressupostos, neste trabalho apresentamos dados, análises e argumentos que
20

buscam (i) explorar uma interface de aspectos teórico-práticos laicos e racionais entre o
desenvolvimento moral e as aulas de Ciências, permitindo avanços nos conhecimentos
sobre formação do pensamento moral, crítico e científico dos estudantes em processo de
ensino-aprendizagem de Ciências; (ii) delinear o estado dos trabalhos científicos da área
brasileira de Educação em Ciências sobre o assunto desenvolvimento moral.
A nossa expectativa, ao final, é que o estudo sobre o desenvolvimento moral em aulas
de Ciências e o respectivo estado dos trabalhos da área configure a existência de uma
interface de contribuições teórico-práticas recíprocas, plausíveis e viáveis entre o
processo de desenvolvimento moral dos alunos e as aulas de Ciências, que merece maior
atenção da área.
Em suma, temos um panorama de inquietação sobre as dimensões atitudinais e
axiológicas do ensino e aprendizagem de Ciências, que leva a exigências de ampliação e
aprofundamento de pesquisas sobre o tema, porque as pesquisas ainda são discretas,
envolvem conhecimentos de domínios teóricos diversos (Filosofia, Sociologia, Psicologia,
Neurociência) e podem conter relevantes subsídios para a nossa área. O desenvolvimento
moral dos alunos em aulas de Ciências é um dos assuntos desse contexto abertos à
investigação. Esse panorama encerra problemas passíveis de investigação, como estas duas
questões que optamos resolver: (1) Tendo-se por base as perspectivas sociomorais de Piaget,
Kohlberg e Habermas, que contribuições correlativas podemos delinear (esboçar, projetar)
entre o desenvolvimento moral dos alunos e as aulas de Ciências? (2) O que os trabalhos
científicos da área, no Brasil, apresentam sobre o assunto desenvolvimento moral? A hipótese
que esperamos confirmar refere-se à existência de uma interface de contribuições teórico-
práticas recíprocas, plausíveis e viáveis entre o processo de desenvolvimento moral dos
alunos e as aulas de Ciências, que ainda é subestimada nas discussões e merece maior atenção
da área.
Para darmos conta de nossos propósitos, estruturamos o trabalho em três partes:
“Abrangências e posicionamentos”; “Correlações” e “Ausências e necessidades”.
Basicamente, as três partes estão assim organizadas:
I - Abrangências e posicionamentos: Traz um alinhamento de ideias e de argumentos
que tomamos das áreas de Educação e de Psicologia do Desenvolvimento. Inicia com um
conjunto de conceitos e abordagens gerais sobre ética, moral e educação em valores e termina
com uma revisitação específica às teorias de Piaget, Kohlberg e Habermas. Essa trajetória
delineia aspectos axiológicos e atitudinais que entendemos válidos e pertinentes para a
educação escolar atual (orientações dirigidas para a autonomia e emancipação das pessoas).
21

Agrega ideias (e ideais) contextuais - das mais gerais às mais específicas, incluindo
componentes legais e de orientações extraídos da LDBEN e dos PCN - sobre as quais
retomamos em posicionamento posterior em relação às aulas de Ciências.
II - Correlações: Nesta parte do trabalho prepondera uma análise teórica, realizada
com a justaposição de subsídios encontrados em Piaget, Kohlberg (área da Psicologia) e
Habermas (área sociológica da Ética Discursiva) e as argumentações (diretas ou denotadas)
em prol das necessidades axiológicas do ensino de Ciências difundidas na literatura (de
Educação e da nossa área). Além de agregar algumas especificidades a essas argumentações
em prol das necessidades axiológicas do ensino de Ciências, a análise projeta uma efetiva
aproximação entre aspectos do desenvolvimento moral e das aulas de Ciências. São
apresentados exercícios de situações diversas em que elementos de princípios, conteúdos e
procedimentos de duas áreas distintas - Educação em Ciências e Psicologia do
Desenvolvimento - tomam um delineamento de correspondências potenciais tanto para as
aulas de Ciências como para o desenvolvimento moral dos alunos.
III - Ausências e Necessidades: Refere-se a uma parte empírica necessária para
atingir integralmente o conjunto dos objetivos traçados. O empreendimento empírico
apresenta um estado de conhecimento sobre o assunto formação moral em trabalhos
científicos da área brasileira de Educação em Ciências, permitindo um posicionamento de
relevância e de tendência quanto aos aspectos do desenvolvimento moral e da ética discursiva,
além de apresentar um conjunto de descritores que permite visualizar de modo abrangente as
questões de ética e de moral que aparecem nesses trabalhos.
Para finalizar este tópico introdutório, três ressalvas são apresentadas. A primeira
confirma que este trabalho não procura explorar (ou resultar em) modelos de ensino e nem
tem a intenção de avaliar pessoas, mas em identificar e analisar potenciais subsídios
correlacionados a ambos os processos: formação moral dos alunos e aulas de Ciências. Assim,
concordamos com La Taille (1994, p. 81) quando se refere aos trabalhos de Piaget (e que
aproveitamos para também estendermos essa sua afirmação para os demais referenciais que
utilizamos): “limitar-se a transformar a teoria de Piaget em técnicas de sala de aula é dela tirar
pouco proveito. E [...] corre-se o risco de acreditar que se resolvem as questões de autonomia
intelectual e moral através de métodos pedagógicos”. Afinal, também estão em jogo relações
sociais bastante amplas e profundas que o pedagógico ajuda, mas não dá conta totalmente.
A segunda refere-se a opções tomadas por nós. Num trabalho como este, no qual são
apresentadas e defendidas ideias subjacentes a princípios e noções de educação e de moral,
não há dúvidas que as escolhas e decisões tomadas por nós implicam valores e ideologias
22

(como ocorre em qualquer outra pesquisa). Antes de tornar explícitas as nossas bases
ideológicas sobre esse ponto e também para acalmar os ânimos daqueles que se preocupam,
como nós mesmos, sobre as possibilidades de prejuízos ao campo científico que possam
surgir, nos apropriamos de uma citação que representa nossa linha de pensamento.

Quando psicólogos como Dewey, Skinner, Neill y Montessori se


comprometeram na tarefa de inovar a educação, desenvolveram não somente
um discurso de princípios psicológicos mas uma ideologia. Isso não foi
assim devido a uma atitude dogmática ou anticientífica que sustentaram
como psicólogos, mas porque a prescrição de uma prática educativa não
pode ser derivada só de uma teoria psicológica ou científica. Adicionalmente
aos pressupostos teóricos acerca de como as crianças aprendem ou se
desenvolvem (o componente teórico psicológico), as teorias educativas
incluem pressupostos acerca do que é educacionalmente bom ou valioso.
Chamar de ideologia uma estrutura de pensamento educativo é indicar que
constitui uma justa combinação sistemática de uma teoria de fatos
psicológicos e sociais com um conjunto de princípios de valor
(KOHLBERG; MAYER, 1984, p. 57).

A terceira é consequência da segunda. Ao optarmos pelo viés teórico-prático com


ênfase na laicidade e na razão, que entendemos subsidiar um projeto emancipador por meio da
educação escolar, temos consciência de que deixamos de fora outros aspectos não menos
importantes que subjazem a construção da moralidade (biológicos, afetivos, emocionais etc.).
Um estudo que se embasa numa determinada teoria não necessariamente exclui outros estudos
que utilizam outras teorias sobre o mesmo assunto. Nesse caso, com referenciais alinhados ou
não a esses que optamos trabalhar, outras investigações podem se juntar em contribuições. O
que seria frutífero para avanços da área de Educação em Ciências.
23

PARTE I
ABRANGÊNCIAS E POSICIONAMENTOS

A verdade dividida

A porta da verdade estava aberta


mas só deixava passar
meia pessoa de cada vez.

Assim não era possível atingir toda a verdade,


porque a meia pessoa que entrava
só conseguia o perfil de meia verdade.
E sua segunda metade
voltava igualmente com meio perfil.
E os meios perfis não coincidiam.

Arrebentaram a porta. Derrubaram a porta.


Chegaram ao lugar luminoso
onde a verdade esplendia os seus fogos.
Era dividida em duas metades
diferentes uma da outra.

Chegou-se a discutir qual a metade mais bela.


Nenhuma das duas era perfeitamente bela.
E era preciso optar. Cada um optou
conforme seu capricho, sua ilusão, sua miopia.

(de Carlos Drummond de Andrade,


publicado em “Contos Plausíveis”,
pela José Olympio, Rio de Janeiro, 1985)
24

1.0 - ÉTICA E MORAL: CONCEITOS E RELAÇÕES

“A ética é daquelas coisas que todo mundo sabe o


que são, mas que não são fáceis de explicar,
quando alguém pergunta” (VALLS, 1994, p. 7).

Em razão das especificidades deste nosso estudo, já que optamos trabalhar o


desenvolvimento moral numa abordagem cognitivo-construtivista, não vemos necessidade de
revisitar analítica e extensivamente a literatura sobre ética e moral. Acreditamos que uma
breve retomada acerca dos conceitos8 de ética e moral e as possíveis relações com a religião já
sejam suficientes para nossos posicionamentos iniciais acerca do assunto.
Os conceitos de moral e de ética podem trazer variações na literatura, além de,
algumas vezes, também serem tratados como sinônimos - ambos “referindo-se a um conjunto
de regras de conduta consideradas como obrigatórias”. A presença de dois vocábulos é
explicada pelas suas origens do latim e do grego (LA TAILLE, 2006, p. 25). Se analisados
pela etimologia, Chauí (1997, p. 340) menciona que “a palavra costume se diz, em grego,
ethos - donde, ética - e, em latim, mores - donde, moral”. Ética e moral estariam ligadas,
assim, ao conjunto de costumes e tradições de uma sociedade. Dessa forma, são considerados
valores e obrigações para a conduta de seus membros. Entretanto, a autora faz a ressalva de
que a língua grega possui outra palavra que precisa ser escrita, em português, com as mesmas
letras que a palavra costume: ethos. Assim, em grego existem duas vogais para pronunciar e
grafar nossa vogal e: uma vogal breve (episilon) e uma vogal longa (eta). Ethos escrito com a
vogal longa significa costume; porém, escrita com a vogal breve significa caráter, índole,
temperamento. O segundo sentido estaria ligado às características individuais determinantes
das ações das pessoas, incluindo os seus vícios e suas virtudes, ou seja, ao senso moral e
consciência ética individuais. Assim, ambas as palavras, ética e moral, mantêm uma relação
de afinidade etimológica, mas diferem no conceito. Em suma, a ética seria a teoria; a moral, o
objeto dessa teoria, como uma ciência específica e seu objeto de estudo.
Assim, no campo da ética e da moral os problemas teóricos e os problemas práticos se
apresentam em diferentes planos. No entanto, concordamos com Vázquez (2005, p. 19) ao
dizer que, apesar desses dois planos, os problemas teóricos e práticos “não estão separados
por uma barreira intransponível”. Afinal, “as soluções que se dão aos primeiros não deixam
de influir na colocação e na solução dos segundos [...]; por sua vez, os problemas propostos
pela moral [...] constituem matéria de reflexão”.
8
Sobre outros conceitos ou definições de termos utilizados por nós, vide Glossário na parte final deste trabalho.
25

De toda uma discussão mais prolongada que se poderia fazer sobre os conceitos de
ética e moral, entendemos que para os propósitos deste trabalho podemos nos apropriar dos
seguintes conceitos trazidos por Vázquez (2005): “ética é a ciência da moral” (p. 23),
enquanto “moral é um sistema de normas, princípios e valores, segundo o qual são
regulamentadas as relações mútuas entre os indivíduos ou entre estes e a comunidade” (p. 84).
Ao comentar sobre esse conceito de moral, Vázquez afirma que as regras e normas têm
características históricas e sociais e devem ser acatadas livremente e com consciência e não
por meio de imposições externas. Esses argumentos estão alinhados ao pensamento de Piaget
(1994, p. 23): “Toda moral consiste num sistema de regras, e a essência de toda moralidade
deve ser procurada no respeito que o indivíduo adquire por essas regras”.
Este nosso trabalho versa sobre a Educação em Ciências e tem nas suas bases os
pressupostos de racionalidade e laicidade. No entanto, já fomos questionados algumas vezes
se, por se tratar de um tema que envolve moral, o nosso estudo não traria vínculos
implicitamente religiosos, cujos vieses seriam, então, interferentes negativos à investigação
científica implementada. Ainda que possam articular-se, entendemos que não há uma relação
obrigatória e exclusiva entre moral e religião. Não se pode confundir moral com religião.
De algumas alternativas disponíveis na literatura sobre essa questão, optamos por
Vázquez para, com ele, brevemente ratificarmos nosso posicionamento entre moral e religião.
Vázquez (2005, p. 91-92) explica que a moral não tem origem na religião, pois é anterior a
ela. Homens primitivos viviam sem religião, mas tinham suas regras de convivência - uma
forma embrionária de moralidade. Portanto, moral é possível sem a religião e não depende da
religião, ainda que possa articular com o religioso em nossos dias.
Por fim, e ainda utilizando as palavras de Vázquez (2005, p. 23), ressaltamos que
“não existe uma moral científica, mas existe - ou pode existir - um conhecimento da moral
que pode ser científico. Aqui, como nas outras ciências, o científico baseia-se no método, na
abordagem do objeto”. Dentro desse plano conceitual encontra-se o nosso trabalho, cuja
preocupação está voltada para um evento específico da moralidade: o processo psicológico de
desenvolvimento moral dos alunos em aulas de Ciências, considerado dentro da tríade “escola
pública9 - laicidade - racionalidade”.

9
Enfatizamos a escola pública porque é espaço de formação geral e tem acesso não restritivo. Diferente, por
exemplo, de escolas confessionais, de escolas privadas ou de escolas técnicas.
26

2.0 - EDUCAÇÃO E(M) VALORES: SITUANDO IDEIAS

“Eu não tenho dúvida de que a educação e a


escola cada vez mais precisarão tratar da crise
ética para não cair na armadilha de apenas
responder à mera queixa moral em relação à
conduta” (CORTELLA; LA TAILLE, 2005, p.
11).

As discussões sobre educação e valores apresentam uma diversidade de caminhos que


não se esgotam neste trabalho. Mesmo assim, acreditamos que o recorte das discussões a
seguir expõe um estado situacional da literatura, cujas ideias servem de auxílio para iniciar o
embasamento de nossas escolhas e posicionamentos sobre formação moral. Outras obras
também poderiam ser utilizadas para o mesmo intento. Algumas delas, aliás, aparecem
mencionadas no final deste trabalho, na lista de bibliografia consultada.

2.1 - Valores na escola

As necessidades éticas de reconhecimento e respeito da dignidade da pessoa humana


emergem nas relações interpessoais. O fundamento da ética centra-se nas exigências de “não
ferir a dignidade pessoal dos outros sujeitos quando interpelados pela minha ação”.
Obrigatoriamente a educação escolar ocorre em ambiente relacional, sendo uma modalidade
de ação interpessoal “que, por sua natureza, pressupõe uma intervenção sistemática na
condição do outro”. A escola pratica um processo interventivo, que corre riscos constantes de
“atingir a identidade e a dignidade do outro” (o aluno). Por essa razão, “a exigência da
eticidade assume dimensão de radicalidade na prática educativa”. Afinal, a educação escolar
atinge individualmente as pessoas mais frágeis “diante da intervenção vinda do outro, no caso,
o educador e seus apoios institucionais”. Sob a perspectiva da ética, então, o que está em
pauta na escola “é um processo de formação que jamais se reduz ao processo de instrução, de
ensino, de treinamento, de adestramento. Pois não se trata apenas de lidar com um saber”
(SEVERINO, 2010, p. 631).
Não existe saber desligado de valores. Portanto, ensinar disciplinas diversas como
Português, Matemática, Ciências, entre outras, “é revelar determinados valores que se
abrigam na organização epistemológica e metodológica de cada área do saber”. E quando
falamos em valores, também nos referimos às respectivas atitudes morais que perpassam os
relacionamentos interpessoais (RIOS, 2010, p. 658).
27

Se a escola não tem como se eximir do tratamento de valores, então podemos


questionar: Que valores deve a escola trabalhar, já que tem na heterogeneidade uma de suas
características? Como educar em valores na escola?
A escola se caracteriza pela heterogeneidade, mas isso não deve implicar a
relativização de valores. A característica de heterogeneidade da escola não impede “que se
possa encontrar um pequeno número de valores que constitua uma base ética comum, a saber:
a justiça, o respeito pelo outro, a equidade, o respeito pela verdade”. Esses valores seriam,
então, considerados universais, ou seja, susceptíveis de serem aplicados a todos e em todas
situações. Tais valores, extraídos dos estudos de Kohlberg, são, inclusive, aqueles que
aparecem na base da Declaração Universal dos Direitos do Homem (MARCHAND, 2001),
Para a segunda questão acima, encontramos em Menin (2002) argumentos que
acreditamos relevantes na busca de respostas. A base de seus argumentos está nos valores e
respectivas ações humanas para o bem, para o moralmente correto. Nesse caso, analisa duas
possibilidades: i) posições rígidas que apontam para a transmissão de valores considerados
fundamentais; ii) posicionamentos relativistas, nos quais a educação de valores deve ocorrer
“de forma assistemática, não-planejada, nos seus mais diversos espaços” (p. 93).
Há casos em que os professores assumem explicitamente esse papel de ensinar
valores. Estrategicamente, então, transmitem normas prontas e ainda cobram “estudo e
obediência” dos alunos a elas. É uma forma de doutrinação, da mesma forma como ocorreu,
por exemplo, durante a ditadura militar no Brasil. No entanto, afirma Menin (2002, p. 95), que
essa prática de educação em valores por meios impositivos e doutrinários podem até ser
aceitos, mas “valores impostos por uma autoridade são aceitos por temor enquanto perdurar o
controle dessa autoridade e deixam de ser assumidos como valores no momento em que a
força do controle é enfraquecida”. Por outro lado, complementa a autora, a educação em
valores nas escolas pode ocorrer de maneira relativista, de um tipo se laisser faire ou se
laisser aller. “Assim, podem existir, na mesma escola, professores que incentivam a
cooperação entre alunos, outros a competição10; alguns teriam aversão às mais variadas
formas de violência, enquanto outros seriam tolerantes” (MENIN, 2002, p. 95).
Afinal, como ensinar valores? Em que se basear? A psicologia poderia centrar-se nas
respostas possíveis a essas duas questões. No entanto, outra questão surgiria: Os professores
da educação básica conhecem e utilizam teorias psicológicas quando trabalham educação
moral? Mencionando pesquisa de Shimizu (1998), Menin (2002, p. 96) responde

10
Sobre “Ensinar a competir” na escola pública, vide interessante reportagem da revista Veja (ANEXO F).
28

negativamente. Resultados apontam que, em geral, são utilizadas “opiniões do senso comum
para decidir o que é moral, imoral ou como educar moralmente”. Em tom crítico, a autora
assim resume acerca dessa ideia difundida de que a educação moral tem pouca ou quase
nenhuma relevância na escola por causa da origem e preponderância de influências familiares
e religiosas: “é como se houvesse a crença que, em moral, a família é tudo e a escola, nada”.
De acordo com Menin (2002), os dois posicionamentos analisados - doutrinário e
relativista - comentem erros e são ineficazes. E pergunta: “existem outras posições?” (p. 96).
Estudos diversos sobre educação moral apontam alguns caminhos. Há diferentes
abordagens para a educação moral, cada qual com sua especificidade, princípios, conceitos e
elementos teórico-práticos.
Assim como nós, a autora baseia-se especialmente nos estudos de Piaget para construir
seus argumentos em prol da educação em valores na escola. Utilizando esse referencial, em
resumo, podemos afirmar que “a educação moral ou educação em valores não poderia jamais
se dar na forma de imposição de valores [... e] os meios usados no ensino são tão
fundamentais quanto os fins” (MENIN, 2002, p. 96-97).
A educação com fins voltados para a autonomia, portanto, não se respalda em coação,
coerção, imposição, autoritarismo, transmissões de “verdades” acabadas etc. Nesse caso,
apontamos juntamente com Menin a necessidade da escola criar situações que possibilitem
diálogo, reflexões, críticas e escolhas próprias dos alunos.
Esse posicionamento extraído de Piaget não é relativista, pois “há uma clara opção
pela autonomia moral como melhor, racional e moralmente falando, que a heteronomia”,
como veremos mais adiante. No entanto, já podemos deixar algumas reflexões, no formato
das seguintes questões, agora com o foco deslocado para as aulas de Ciências: Podemos
encontrar aulas de Ciências caracterizadas pelo ensino impositivo de conceitos prontos e
verdades absolutas? Pode o ensino de Ciências em sala de aula ocorrer de modo relativista, do
tipo se laisser aller ou se laisser faire, e sem planejamento psicopedagógico embasado para o
aprendizado específico dessa disciplina? Se assim for, num ou noutro, parece-nos que o erro e
a ineficácia apontados nos argumentos de Menin se repetem.

2.2 - Educação e valores no mundo contemporâneo

Os argumentos a seguir são extraídos de Goergen (2005), que centraliza suas


discussões na educação em valores do mundo contemporâneo. O autor parte do conceito de
valor para expor, sob o ponto de vista histórico, as vertentes individualista, social, pós-
29

moderna e teórico-crítica da formação do sujeito moral. Afinal, todo esse trabalho perpassa a
educação.
Apesar de tema complexo, não há como negar que a preocupação ética tem dimensão
universal, sendo presente em todos os âmbitos da vida humana. No entanto, há “uma curiosa
ambigüidade entre o discurso ético que se dissemina e ocupa todos os espaços e a efetiva
importância que se dá à ética no campo prático” (GOERGEN, 2005, p. 984). Goergen critica
o que chama de menosprezo dispensado à ética, ainda que se reconheça a importância da
relação entre ética, moral e educação. Tanto no currículo escolar como no seu cotidiano,
“constatamos que a ética ocupa um lugar bastante singelo, muitas vezes restrito a um recorte
disciplinar ou, quando muito, a uma atividade transversal” (GOERGEN, 2005, p. 985). O que
orienta um modelo de educação que consiste na transmissão de valores fixos e inapeláveis de
geração em geração. “As crianças e jovens são levados a reconhecer a autoridade e seguir
seus mandamentos” (GOERGEN, 2005, p. 995). E se na escola, em geral, os estudantes são
educados para obedecer às normas e, de forma heterônoma, aceitá-las, isso nos remete a
pensar que essa instituição não vem se servindo de pressupostos orientados para uma
formação crítica.
Habermas, então, aparece com a sua ideia de educação moral focada na melhoria das
condições sociais. Desenvolve sua teoria com fundamentos numa nova compreensão da razão,
do ser humano e da sociedade: a ética do discurso. Habermas concorda com Kant que o
mundo da moral é o mundo da autonomia do ser humano, mas discorda dele por entender que
as decisões são sempre das pessoas afetadas por elas. Uma decisão a ser tomada com base
num entendimento alcançado mediante um diálogo em condições iguais de racionalidade. “É
pelo diálogo e não individualmente que devemos chegar à conclusão se uma norma moral é
correta ou não”. Transferindo-se tal abordagem para a educação moral, vislumbram-se
conteúdos e atitudes didáticas voltados para “o processo de desenvolvimento da liberdade, da
emancipação e da responsabilização dos educandos”. Nesse caso, não há espaço para
doutrinação, mas para um processo discursivo argumentativo que resulta gradativamente em
autonomia pessoal e responsabilidade social (GOERGEN, 2005, p. 1002-1004).
Em resumo, o ser humano só é ou só pode ser um sujeito moral se for realmente livre
para decidir e assumir conscientemente essa responsabilidade. “Do ponto de vista do
educador, pode-se dizer que sua influência educativa deve contribuir para um sujeito
consciente e autônomo, capaz de decidir que atitudes tomar que, na busca da felicidade,
preservem tanto interesses individuais quanto sociais” (GOERGEN, 2005, p. 1007).
30

2.3 - A verdade como valor na dimensão educativa

A preocupação com os rumos tomados pela sociedade contemporânea é observada na


literatura em diversas discussões. Dentre elas, incluem-se aquelas que inserem o relevante
papel da educação como referencial de esperança para um mundo mais justo, digno e
harmonioso. Dentro dessa perspectiva, na qual a educação é inserida na construção de um
futuro ética e moralmente modificado para melhor, encontramos nos argumentos e reflexões
de Jares (2005) e La Taille (2009) subsídios de interesse para o ensino de Ciências, porque
ambos colocam a verdade como valor a ser buscado na dimensão educativa escolar.
Ao analisar o atual panorama sócio-político mundial, com seus sérios problemas e
conflitos, Jares (2005, p. 126) coloca a Educação como sede principal na promoção de
esperança, justiça e dignidade, em virtude do potencial de seu trabalho sobre a busca da
verdade. “Educar a partir da e para a verdade” é um de seus pressupostos. Para Jares (2005, p.
196), “precisamos de uma pedagogia de esperança que nos guie na direção do crítico caminho
da verdade”. E complementa, afirmando que “a esperança se constrói por meio da busca da
verdade”.
La Taille (2009) também trilha por esse mesmo caminho, mas com o diferencial de
conter consistentes argumentos, análises e reflexões fundados na Psicologia Moral. Com esse
embasamento, podemos encontrar em sua obra, intitulada “Formação ética: do tédio ao
respeito de si”, relevantes subsídios que dirigem nossa atenção para uma efetiva aproximação
entre o ensino escolar de Ciências e a formação ético-moral. Uma aproximação teoricamente
orientada pela autonomia que, por exemplo, pode atuar em prol do processo de compreensão
crítica da ciência e da atividade científica por parte do aluno em sala de aula.
No conjunto dessa obra, que tem como referência teórica e fonte inspiradora um outro
trabalho seu anterior (LA TAILLE, 2006), o autor faz abordagens correlativas entre o plano
ético e o plano moral, isto é, entre a “vida boa” e “os deveres” (ser justo, generoso, digno). No
plano ético entram em discussão a dimensão contextual contemporânea, intitulada de “cultura
do tédio” por causa de sua predominância pessimista, e a dimensão educacional, chamada de
“cultura do sentido”. O plano moral segue com o mesmo formato, cujas abordagens passam
pela “cultura da vaidade” e, depois, pela “cultura do respeito de si”. Nas discussões que faz de
ambos os planos, La Taille segue a mesma lógica de contraposição: primeiro analisa as
características da sociedade atual, depois discute os aspectos educacionais para mudanças do
status quo. Em suma, o autor nos apresenta uma leitura do presente em que sobressai na nossa
sociedade a cultura do tédio, da vaidade, do pessimismo. A persistir esse panorama
31

configurado pela cultura do tédio, não encontramos expectativa de um futuro modificado para
melhor, pois essa expectativa somente é possível na cultura do sentido, por meio da educação
ético-moral.
Pesquisas diversas mostram que a maioria das pessoas é heterônoma, isto é, tendem a
apenas aderir às idéias e valores que circulam no meio social em que vivem. Nesse caso, uma
mudança de perspectiva para um futuro melhor estaria implicando a formação moral para a
autonomia: “somente uma cultura do sentido pode vencer uma cultura do tédio” (LA
TAILLE, 2009, p. 79). Para tanto, a formação moral no contexto da escola e das disciplinas
torna-se relevante. Essas ideias passam pelo potencial das escolas e das disciplinas escolares
na perspectiva de mudanças, pois em qualquer cenário de futuro a educação aparece como
atividade inconteste para que a cultura do sentido seja manifestada.
Concordamos com La Taille ao dizer que cabe à escola tomar parte na formação moral
de seus alunos e não apenas ficar restrita a transmitir conhecimentos, sem aproveitar-se deles
com vistas a melhoria do futuro. Afinal, “os próprios conhecimentos transmitidos na escola
são portadores de sentido que transcendem a especificidade de cada matéria. A escola é uma
verdadeira usina de sentidos, [...] e não há outra instituição social de que se possa dizer o
mesmo” (LA TAILLE, 2009, p. 81).
Para a escola e, em especial, para a busca da verdade como valor, devemos nos voltar
para a construção daquilo que La Taille chama de “cultura do sentido”, pois ela não existe
sem educação para o sentido. E para falar de uma educação para o sentido, o autor enfatiza a
relevância da busca de um valor em especial: a verdade. Ainda que haja limitações, erros e
ilusões quando mencionamos o termo “verdade”, o empenho nessa busca é investimento para
a cultura do sentido, ou seja, a formação moral também perpassa por esse valor (da verdade).

Em suma, eleger a verdade como valor não somente é um bem em si mesmo


para a procura de sentido para a vida: a capacidade de a ela chegar é também
ferramenta necessária para se situar com um mínimo de precisão em um
universo político de tantas mensagens dúbias, de tantas afirmações
imprecisas, de tantas análises confusas, de tantas promessas duvidosas, e
também de claras tentativas de enganação. Para sobreviver em tal ambiente
equívoco, se faz necessário a chamada capacidade de crítica, não entendida
como disposição a julgar negativamente, mas sim como vontade de passar o
que se ouve, se vê, se pensa e se diz pelo crivo da razão, para debelar
possíveis erros, possíveis mentiras, possíveis ilusões. Não há crítica
honesta sem amor à verdade (LA TAILLE, 2009, p. 91, grifo nosso).

Baseado em Williams (2006), La Taille aponta dois obstáculos que dificultam a busca
da verdade: os interiores e os exteriores. Os obstáculos exteriores são inerentes aos objetos e
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os interiores são inerentes ao sujeito. Sobre a superação dos obstáculos exteriores, que se
referem a objetos de pesquisa, a psicologia não tem o que auxiliar. Esse auxílio pode ser dado,
no entanto, na superação dos obstáculos interiores, relacionados ao sujeito. Sobre esses
obstáculos, La Taille diz que podem ser de três tipos, os quais a educação pode ajudar a
superá-los: lacunas no conhecimento, fragilidade ou insipiência das ferramentas intelectuais e
ausência de determinadas virtudes.
a) Lacunas no conhecimento: Para que um sujeito busque a verdade (ou confirme o
que é transmitido) sobre algum evento ou fenômeno, ele precisa lidar com dados e
informações diversas, ou seja, há necessidade não apenas de apropriar-se de conhecimentos
específicos, mas também correlacioná-los e observá-los de maneira crítica para resolver o seu
problema. Para La Taille (2009, p. 97), compete essencialmente às instituições educacionais a
tarefa de trabalhar com essas lacunas e “fazer que as pessoas possuam conhecimentos
variados”, especialmente no campo científico e filosófico.
b) Ferramentas intelectuais: Ter somente conhecimentos não é suficiente para
desvendar verdades. De acordo com La Taille, além de conhecimentos (conteúdos) é
necessário que os indivíduos também mobilizem formas precisas de raciocínio (formas).
“Para raciocinar, ou seja, para produzir conclusões fiáveis, o ser humano dispõe de duas
ordens de ferramentas intelectuais: as operações e os procedimentos”.
Sobre as operações, o autor baseia-se no sentido piagetiano de “ações interiorizadas
reversíveis, [...] porque todo pensar é uma ação”. As operações são ferramentas da mente que
usamos para estruturar e promover ajustes na lógica de nosso raciocínio. “Não houvesse
operações, não haveria critérios que nos permitissem afirmar que um raciocínio é válido ou
não. A lógica [...] garante consistência, objetividade e possibilidade de comunicação” (LA
TAILLE, 2009, p. 101).
Nesse caso, trabalhar operacionalmente com a verdade implica aprendizagem sobre as
possibilidades de falhas nas nossas observações e conclusões para que não sejam precipitadas
e falhas ou contaminadas, por exemplo, por ilusões de óptica ou por equívocos de construção
de lógica. Em discussões que envolvem a natureza da ciência temos diversos exemplos
ilustrativos desses problemas.
Sobre os procedimentos, são sequências de ações para se chegar a determinados
resultados, que podem ou não ser interiorizadas. Podemos dizer que, enquanto a operação
corresponde à lógica interna do pensamento, os procedimentos correspondem aos passos por
ele percorridos. Para auxiliar o entendimento entre ambos, pode-se fazer uma analogia
interessante ao dizer que “a operação está para a teoria como o procedimento está para o
33

método”, pois, como sabemos, os métodos de pesquisa são criados e utilizados para verificar a
validade de teorias. “Logo, se não há busca da verdade possível sem postura teórica,
tampouco é possível chegar a ela sem procedimentos adequados” (LA TAILLE, 2009, p.
104).
Isso posto, La Taille insere aspectos que entendemos sejam elementos úteis aos
propósitos correlacionais que vislumbramos para o ensino de Ciências.

[...] embora variados procedimentos possam ser criados pelos alunos para
dar vida prática a suas operações e chegar a verdades múltiplas, na maioria
das vezes eles são ensinados pela escola. Melhor dizendo: aqueles atinentes
à ciência são apresentados pela escola. Ou deveriam.
Aqui devemos voltar ao alerta de Rosseau: para que os alunos não sejam
coagidos a se limitarem a acreditar nas verdades produzidas pelos cientistas,
é preciso que tenham acesso aos variados procedimentos por intermédio dos
quais os pesquisadores colocam à prova suas teorias. Não se trata de
desconfiança em relação a eles, mas sim da necessidade de se apoderar, na
medida do possível, dos procedimentos que eles criam e empregam para
chegar a suas respectivas verdades (LA TAILLE, 2009, p. 105).

Para La Taille (2009, p. 105), não existe procedimento geral possível de ser aplicado a
todos os problemas. Cada um deles tem um correspondente. Contudo, quando é implementado
um trabalho com o aluno que envolve busca da verdade, não há como excluir o ensino de
procedimentos. “Trata-se de mostrar a ele [aluno] que a busca da verdade depende de uma
‘disciplina’ da reflexão, disciplina essa que se traduz pela criação e emprego de
procedimentos”. Acaba-se demonstrando, então, que a busca da verdade não é tarefa fácil e
que sua realização leva em conta a lógica e os procedimentos correspondentes dessa busca.
Para reforçar esses argumentos, o autor fala sobre os resultados positivos obtidos da
iniciação à pesquisa científica que dá a seus alunos, pois eles trabalham com teoria, métodos e
procedimentos. E complementa dizendo que as escolas básicas, guardando as devidas
proporções, poderiam fazer o mesmo.
c) Virtudes: A tese é de que sem determinadas virtudes, mesmo tendo mobilizado
conhecimentos, operações e procedimentos, a pessoa não se dispõe a buscar a verdade,
satisfazendo-se mais facilmente “com ideias prontas, com fatos não comprovados, com
preconceitos de toda ordem, com reflexões brumosas e afirmações peremptórias”. (LA
TAILLE, 2009, p. 106). Nesse caso, a verdade entendida como valor requer virtudes de boa-
fé, exatidão, paciência, simplicidade e humildade para buscá-la. Apoiando-se em Comte-
Sponville (1995), La Taille diz que uma pessoa dotada de boa-fé busca e respeita a verdade.
As virtudes decorrem de desenvolvimento pela aprendizagem, porque não são inatas e
nem correspondentes a traços de personalidade biológica. O que coloca a escola em evidência,
34

porque é instituição em que o amor e o respeito pela verdade são (ou deveriam ser)
fundamentais, desde o nível infantil até a universidade. “Um professor que não seja inspirado
pelo mesmo amor [à verdade, que também os cientistas devem ter] é, além de pessoa
inconsequente e alienada, um possível cúmplice de possíveis imposturas: como pode ele sem
critérios de veracidade, ensinar o que quer que seja?” (LA TAILLE, 2009, p. 109).
De acordo com os argumentos de La Taille (2009, p. 110), a verdade implica exatidão.
Exatidão entendida “como apreço pela clareza, pela precisão, pelo rigor, pelo controle”.
Portanto, quem se inspira na verdade sabe que ideias vagas, raciocínios lacunares, frases
obscuras são obstáculos à sua busca. Pode-se ter uma opinião, mas que não se confunde com
verdade. Nesse ponto, o autor chama nossa atenção para algumas estratégias de aula que tanto
podem corresponder a ricos modelos de exatidão como permanecerem somente no nível de
troca de opiniões e, nesse caso, ajudando a fortalecer o relativismo em detrimento da verdade.
Vê-se, portanto, que a forma, a estratégia de aula tem papel relevante nessa questão da busca
da verdade e, ainda, que as aulas de Ciências encaixam-se igualmente nesse papel por causa
das características de seu objeto, ou seja, a ciência.
Ao discutir as estratégias de aula, La Taille retoma as ideias de Piaget acerca das
relações de coação e de cooperação, com a ressalva de que as relações de cooperação
defendidas por Piaget não excluem aulas expositivas. Da mesma forma que o método ativo
envolvendo as relações de cooperação não é garantido, por si só, no simples fato de promover
discussões entre alunos. Relações de cooperação, na perspectiva piagetiana, devem apresentar
as seguintes características que convergem para a participação simétrica dos membros: saber
ouvir os outros; procurar expressar-se de forma clara; avisar sobre possíveis mudanças de
ideia; usar os mesmos conceitos. Essa perspectiva, aliás, contém similaridades com as ideias
apresentadas na teoria habermasiana da ética do discurso. Então, fica esclarecido que
convencimento é diferente de imposição e, consequentemente, ambos implicam aspectos
antagônicos em relação à moralidade, mais especificamente ao desenvolvimento moral.
Ainda que tenhamos priorizado aspectos pontuais a envolver verdade, valor e ensino,
demonstra-se em La Taille (2009) uma abordagem provocadora de muitas reflexões dessa
temática, tanto para investigadores da área de Educação em Ciência como para o trabalho do
professor em sala de aula.
35

2.4 - A formação ético-moral sob a perspectiva da LDBEN e dos PCN

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9.394/96 - LDBEN) foi


promulgada no Brasil em 1996. Nos anos seguintes foram publicados pelo Ministério da
Educação os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN). Em 1997 foram publicados os PCN
de 1ª a 4ª séries; em 1998 surgiram os PCN de Educação Infantil e de 5ª a 8ª séries; em 1999,
o PCN do Ensino Médio; e em 2002 foram publicados os PCN+, também direcionados para o
ensino médio. O conjunto desses documentos legais e de orientação curricular traz abordagens
diretas ou indiretas sobre a formação moral nos diferentes níveis de ensino.
No artigo 32, inciso II, que trata sobre o Ensino Fundamental, a LDBEN menciona
que um dos objetivos desse nível de ensino é a formação básica do cidadão, que se fará
mediante “a compreensão do ambiente natural e social, do sistema político, da tecnologia, das
artes e dos valores em que se fundamenta a sociedade; o desenvolvimento da capacidade de
aprendizagem, tendo em vista a aquisição de conhecimentos e habilidades e a formação de
atitudes e valores”. O artigo 35, inciso III, da mesma lei, determina que o Ensino Médio terá
como uma de suas finalidades “o aprimoramento do educando como pessoa humana,
incluindo a formação ética e o desenvolvimento da autonomia intelectual e do pensamento
crítico”.
Apesar de polêmicos, especialmente por causa da inserção de propostas não discutidas
amplamente pela comunidade educacional interessada na época, entendemos que os PCN
apresentam uma perspectiva educacional positiva quanto à preocupação de inclusão da ética e
da moral no processo de formação escolar. Os PCN, impulsionados ou não por necessidades
emergentes advindas da dinâmica social contemporânea, estabelecem que as capacidades
éticas, entre outras, deverão ser adquiridas pelos alunos no processo de aprendizagem escolar.
Indicam, nesse caso, sobre a necessidade de ampliar no âmbito da educação escolar a noção
de conteúdo para além de conceitos e fatos, incorporando neles valores, normas, atitudes e
procedimentos.
O projeto educacional expresso nos Parâmetros Curriculares Nacionais
demanda uma reflexão sobre a seleção de conteúdos, como também exige
uma ressignificação, em que a noção de conteúdo escolar se amplia para
além de fatos e conceitos, passando a incluir procedimentos, valores, normas
e atitudes. Ao tomar como objeto de aprendizagem escolar conteúdos de
diferentes naturezas, reafirma-se a responsabilidade da escola com a
formação ampla do aluno e a necessidade de intervenções conscientes e
planejadas nessa direção (BRASIL, 1997a, p. 51, grifo nosso).
36

Os documentos do Ministério da Educação trazem de forma clara a responsabilidade


da escola com a formação integral do aluno, com intervenções fundamentadas. Entretanto, o
que acontece é que, na maioria das vezes, os conteúdos não recebem tratamento adequado
para esse fim. “Em geral, o que a escola faz, ao discutir o currículo, é se propor a atender, na
melhor das hipóteses, ao desenvolvimento do raciocínio lógico do estudante e, com isso,
deixa-se de lado a formação moral da pessoa do estudante” (BICUDO, 1982, p. 14).
Os PCN trazem, ainda, que “a questão central das preocupações éticas é a da justiça
compreendida pelos valores de igualdade e eqüidade” A proposta é que “a ética seja expressa
nos princípios de respeito mútuo, justiça, diálogo e solidariedade”. Fundamentados por esses
princípios, os PCN reforçam a ideia de que “o aluno pode aprender a resolver conflitos em
situações de diálogo, pode aprender a ser solidário [...], pode aprender a ser democrático
quando tem oportunidade de dizer o que pensa, submeter suas idéias ao juízo dos demais e
saber ouvir as idéias dos outros” (BRASIL, 1997c, p. 26).
Em suma, o que vemos por intermédio desses específicos documentos normativos e de
orientação curricular ilustra o que nos aponta Goergen (2001, p. 55) sobre o florescimento da
“idéia da necessidade da restauração moral”. No entanto, o autor traz uma preocupação
relevante, que compartilhamos, acerca da natureza dessa moral pretendida: “quais podem ser
os princípios orientadores do comportamento humano?”
A preocupação de Goergen refere-se às inúmeras possibilidades que surgem para o
tratamento da ética e da moral, especialmente na área educacional. E dentre os diferentes
caminhos possíveis, aponta aqueles a serem evitados: “Certamente, não é através de um
projeto voluntarista de rearmamento moral dos indivíduos, do esforço a favor de um
ressurgimento do culto ao dever através de uma pedagogia altruísta de virtudes cidadãs”
(GOERGEN, 2001, p. 55).
Parece-nos que os princípios teóricos que nortearam a temática da ética e da moral nos
PCN distanciam-se desse caminho. No entanto, concordamos com Goergen de que é preciso
ficar atento. Afinal, para trabalhar ética no currículo escolar é preciso conhecer os
pressupostos filosóficos das propostas, “é preciso ter clareza a respeito do que é ética e do que
é moral, [além de] superar a tranqüila ingenuidade de que a moral é um objeto de ensino cujos
conteúdos são aceitos consensualmente” (GOERGEN, 2001, p. 56).
Com as ressalvas apresentadas por Goergen e, ainda que críticas possam ser feitas
acerca de diferentes aspectos relacionados a esses documentos (origem, construção,
divulgação no sistema educacional, interpretação etc.), concordamos com os princípios
teóricos elementares de formação ético moral neles contidos. Afinal, para quem defende,
37

como nós, a busca e consolidação da autonomia e emancipação dos alunos pelo caminho da
racionalidade na educação escolar não pode renegar os princípios de respeito mútuo, justiça,
diálogo e solidariedade.
Por fim, apresentamos na sequência um conjunto de dados empíricos (quantitativos e
qualitativos) sobre as diferentes versões dos PCN, para que o leitor tenha um panorama mais
claro sobre os aspectos de formação ético-moral contidos nesses respectivos documentos.
Então, vejamos11.

2.4.1 - PCN de Educação Infantil

O documento completo referente aos PCN de Educação Infantil (crianças de zero a


seis anos) é composto destes três respectivos volumes: “Introdução”; “Formação Pessoal e
Social”; “Conhecimento de Mundo”. Verificamos todos.
No primeiro volume, intitulado “Introdução” (BRASIL, 1998a), encontramos:
a) Oito inserções da palavra “ética”12: em abordagens ou correlacionamentos a
envolver princípios, cidadania, escola, construção de valores e desenvolvimento da criança
(seis vezes); em títulos de obras apresentadas na lista de referências bibliográficas (duas
vezes).
b) Seis inserções da palavra “moral”: correlacionando ação da escola e da família com
os cuidados e preocupações com a moral (duas vezes); em títulos de obras mencionadas nas
referências bibliográficas (quatro vezes).
No segundo volume, “Formação Pessoal e Social” (BRASIL, 1998b), encontramos:
a) Quatro inserções da palavra “ética”: em abordagens que correlacionam ética, escola
e criança (duas vezes); em títulos de obras apresentadas na lista de referências bibliográficas
(duas vezes).
b) Sete inserções da palavra “moral”: em abordagens sobre a escola ser espaço de
inserção da criança em relações éticas e morais, correlacionando moral e justiça e
mencionando juízo moral e as fases de heteronomia e autonomia moral no desenvolvimento
da criança (cinco vezes); em títulos de obras das referências bibliográficas, incluindo-se “O
juízo moral na criança”, de Piaget (duas vezes).

11
Os respectivos dados foram coletados de cópias eletrônicas dos PCN (arquivos em PDF), por meio das
ferramentas de busca do Adobe® Reader® , versão 9.3.0.
12
A categorização que apresentamos tem outras possibilidades, pois os documentos apresentam discussões
diversas nas quais os termos “ética” e “moral”, por vezes, aparecem associados a mais de um contexto. Nesse
caso, optamos por categorizá-los de acordo com as abrangências e especificidades em que aparecem.
38

A seguir, dois exemplos de excertos em que os termos aparecem: “A instituição de


educação infantil é um dos espaços de inserção das crianças nas relações éticas e morais que
permeiam a sociedade na qual estão inseridas” (p. 11); “Do ponto de vista do juízo moral,
nessa faixa etária, a criança encontra-se numa fase denominada de heteronomia, em que dá
legitimidade a regras e valores porque provêm de fora, em geral de um adulto a quem ela
atribui força e prestígio. Na moral autônoma, ao contrário, a maturidade da criança lhe
permite compreender que as regras são passíveis de discussão e reformulação, desde que
haja acordo entre os elementos do grupo” (p. 14).
No terceiro volume, “Conhecimento de Mundo” (BRASIL, 1998c), encontramos:
a) Uma inserção da palavra “ética”: em abordagem sobre a formação ética na escola.
b) Duas inserções da palavra “moral”: em alerta para que a escola evite uma formação
moralizante; a obra “O juízo moral na criança”, de Jean Piaget, é mencionada.

2.4.2 - PCN de 1ª a 4ª séries

O documento completo referente aos PCN de 1ª a 4ª séries compõe-se de 10 volumes,


respectivamente intitulados: “Introdução aos Parâmetros Curriculares Nacionais”; “Língua
Portuguesa”; “Matemática”; “Ciências Naturais”; “História e Geografia”; “Arte”; “Educação
Física”; “Apresentação dos Temas Transversais e Ética”; “Meio Ambiente e Saúde”;
“Pluralidade Cultural e Orientação Sexual”. Analisamos os volumes referentes à
“Introdução”, “Ciências Naturais”, “Apresentação dos Temas Transversais e Ética”, “Meio
Ambiente e Saúde” e “Pluralidade Cultural e Orientação Sexual”.
Em “Introdução aos Parâmetros Curriculares Nacionais” (BRASIL, 1997a),
encontramos:
a) 19 inserções da palavra “ética”: referindo-se ao título de um dos temas transversais
(quatro vezes); em correlações entre escola, ética e cidadania (13 vezes); em títulos de obras
apresentadas na lista de referências bibliográficas (duas vezes).
b) Oito inserções da palavra “moral”: em correlações entre escola, desenvolvimento
moral e autonomia (cinco vezes); em títulos de livros nas referências bibliográficas (três
vezes).
Exemplos de excertos em que os termos aparecem no documento: “Apresenta-se para
a escola, hoje mais do que nunca, a necessidade de assumir-se como espaço social de
construção dos significados éticos necessários e constitutivos de toda e qualquer ação de
cidadania” (p. 27); “A ação pedagógica contribui com tal desenvolvimento, entre outras
39

formas afirmando claramente seus princípios éticos, incentivando a reflexão e a análise


crítica de valores, atitudes e tomadas de decisão” (p. 47); “Ainda que na escola se destaque
a autonomia na relação com o conhecimento - saber o que se quer saber, como fazer para
buscar informações e possibilidades de desenvolvimento de tal conhecimento, manter uma
postura crítica comparando diferentes visões e reservando para si o direito de conclusão, por
exemplo -, ela não ocorre sem o desenvolvimento da autonomia moral (capacidade ética) e
emocional que envolvem auto-respeito, respeito mútuo, segurança, sensibilidade, etc.” (p.
62).
No volume “Ciências Naturais” (BRASIL, 1997b), encontramos:
a) 10 inserções da palavra “ética”: referindo-se a um dos nomes dos temas transversais
(duas vezes); correlacionando ética, escola e cidadania (uma vez); em citação de um dos
objetivos do Ensino Fundamental (uma vez); em abordagens sobre CTSA (seis vezes).
b) Nenhuma inserção do termo “moral”.
Exemplos de excertos: “[Um dos objetivos do Ensino Fundamental é] desenvolver o
conhecimento ajustado de si mesmo e o sentimento de confiança em suas capacidades afetiva,
física, cognitiva, ética, estética, de inter-relação pessoal e de inserção social, para agir com
perseverança na busca de conhecimento e no exercício da cidadania” (p. 7); “É importante
que se supere a postura ‘cientificista’ que levou durante muito tempo a considerar-se ensino
de Ciências como sinônimo da descrição de seu instrumental teórico ou experimental,
divorciado da reflexão sobre o significado ético dos conteúdos desenvolvidos no interior da
Ciência e suas relações com o mundo do trabalho” (p. 22).
No volume “Apresentação dos Temas Transversais e Ética” (BRASIL, 1997c),
encontramos:
a) 92 inserções da palavra “ética”: em títulos e subtítulos do capítulo e em menções ao
nome do tema transversal (27 vezes); em menção sobre um dos objetivos do Ensino
Fundamental (uma vez); em reflexões e discussões filosóficas e (ou) políticas (17 vezes); em
abordagens sobre os conteúdos de ética e de moral (17 vezes); correlacionando ética,
autonomia, racionalidade e democracia (três vezes); correlacionando escola, cidadania e
formação ética (cinco vezes); em discussões sobre os conceitos de ética e de moral (oito
vezes); em discussão sobre as tendências entre ética e currículo (oito vezes); em obras listadas
nas referências bibliográficas (seis vezes).
b) 154 inserções da palavra “moral”: em títulos e subtítulos do volume (quatro vezes);
em menções diretas ao desenvolvimento da autonomia moral (23 vezes); em reflexões e
discussões filosóficas e (ou) políticas (43 vezes); em discussões sobre os conceitos de ética e
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de moral (oito vezes); correlacionando diretamente a relevância da escola na formação moral


(12 vezes); correlacionando-se moral e racionalidade (oito vezes); na apresentação de
tendências teóricas diversas sobre moral (17 vezes); em menção sobre um dos objetivos do
Ensino Fundamental (uma vez); em abordagens sobre os conteúdos de ética e de moral (21
vezes); em obras listadas nas referências bibliográficas (17 vezes).
Exemplos de excertos: “Defende-se a importância da escola na formação ética das
novas gerações, na perspectiva da transversalidade, situando-a no contexto das diversas
influências que a sociedade exerce sobre o desenvolvimento das crianças” (p. 45); “Como o
objetivo deste trabalho é o de propor atividades que levem o aluno a pensar sobre sua
conduta e a dos outros a partir de princípios, e não de receitas prontas, batizou-se o tema de
Ética, embora freqüentemente se assuma, aqui, a sinonímia entre as palavras ética e moral e
se empregue a expressão clássica na área de educação de educação moral” (p. 49, grifo do
documento); “De fato, alguns poderão pensar que a escola, por várias razões, nunca será
capaz de dar uma formação moral aceitável e, portanto, deve abster-se dessa empreitada.
Outros poderão responder que o objetivo da escola é o de ensinar conhecimentos acumulados
pela humanidade e não preocupar-se [sic] com uma formação mais ampla de seus alunos.
Outros ainda, apesar de simpáticos à idéia de uma educação moral, poderão permanecer
desconfiados ao lembrar a malfadada tentativa de se implantar aulas de Moral e Cívica no
currículo” (p. 51); “Mesmo reconhecendo tratar-se de uma questão polêmica, a resposta
dada por estes Parâmetros Curriculares Nacionais é afirmativa: cabe à escola empenhar-se
na formação moral de seus alunos. Por isso, apresenta-se uma proposta diametralmente
diferente das antigas aulas de Moral e Cívica e explica-se o porquê” (p. 51); “[...] a
qualidade do ensino é condição necessária à formação moral de seus alunos. Se não promove
um ensino de boa qualidade, a escola condena seus alunos a sérias dificuldades futuras na
vida e, decorrentemente, a que vejam seus projetos de vida frustrados” (p. 55); “A conquista
da autonomia não é imediata [...], é preciso que fique claro que um sujeito, ao alcançar a
possibilidade de exercer a autonomia moral, não necessariamente torna-se autônomo em
todas as situações da vida. Os contextos sociais e afetivos em que está inserido podem
contribuir ou mesmo impedir a autonomia moral” (p. 58); “Durante muito tempo, pensou-se
que educação moral deveria ocorrer pela associação entre discursos normatizadores,
modelos edificantes a serem copiados, repressão, interdição e castigo. Hoje, sabe-se que o
desenvolvimento depende essencialmente de experiências de vida que o favoreçam e
estimulem” (p. 58); “[...] uma criança a quem nunca se dá a possibilidade de pensar, de
argumentar, de discutir, acaba freqüentemente por ter seu desenvolvimento intelectual
41

embotado, nunca ousando pensar por si mesma, sempre refém das ‘autoridades’ que tudo
sabem por ela. [...] uma criança a quem nunca se dê a possibilidade de se afirmar, de ter
êxito nos seus menores empreendimentos, uma criança sempre humilhada, dificilmente
desenvolverá alguma forma de respeito próprio. Ora, sendo que o desenvolvimento moral
depende da afetividade, notadamente do respeito próprio, e da racionalidade, e sendo que a
qualidade das relações sociais tem forte influência sobre estas, a socialização também tem
íntima relação com o desenvolvimento moral. Sendo que as relações sociais efetivamente
vividas, experienciadas, têm influência decisiva no processo de legitimação das regras, se o
objetivo é formar um indivíduo respeitoso das diferenças entre pessoas, não bastam belos
discursos sobre esse valor: é necessário que ele possa experienciar, no seu cotidiano, esse
respeito, ser ele mesmo respeitado no que tem de peculiar em relação aos outros” (p. 58);
“Se o objetivo é formar alguém que procure resolver conflitos pelo diálogo, deve-se
proporcionar um ambiente social em que tal possibilidade exista, onde possa, de fato,
praticá-lo. Se o objetivo é formar um indivíduo que se solidarize com os outros, deverá poder
experienciar o convívio organizado em função desse valor. Se o objetivo é formar um
indivíduo democrático, é necessário proporcionar-lhe oportunidades de praticar a
democracia, de falar o que pensa e de submeter suas idéias e propostas ao juízo de outros. Se
o objetivo é que o respeito próprio seja conquistado pelo aluno, deve-se acolhê-lo num
ambiente em que se sinta valorizado e respeitado. Em relação ao desenvolvimento da
racionalidade, deve-se acolhê-lo num ambiente em que tal faculdade seja estimulada. A
escola pode ser esse lugar. Deve sê-lo” (p. 59).
Em “Meio Ambiente e Saúde” (BRASIL, 1997d), encontramos:
a) 14 inserções da palavra “ética”: em menção ao nome do tema transversal (uma vez);
em abordagem sobre a formação ética (duas vezes); em menção sobre um dos objetivos do
Ensino Fundamental (uma vez); em reflexões e discussões filosóficas e (ou) políticas (seis
vezes); correlacionando ética e conteúdos de Meio Ambiente (uma vez); correlacionando ética
e conteúdos de saúde (duas vezes); em obra citada na lista de referências bibliográficas (uma
vez).
b) Uma inserção da palavra “moral”: em menção aos princípios da Educação
Ambiental escolar, de acordo com a Conferência Intergovernamental de Educação Ambiental
de Tbilisi de 1977.
Exemplos de excertos em que aparecem no documento as palavras “ética” e (ou)
“moral”: “A questão ambiental, no ensino de primeiro grau, centra-se principalmente no
desenvolvimento de valores, atitudes e posturas éticas, e no domínio de procedimentos, mais
42

do que na aprendizagem de conceitos” (p. 43); “Nesse contexto, falar de saúde implica levar
em conta, por exemplo, a qualidade da água que se consome e do ar que se respira, [...]
envolve aspectos éticos relacionados ao direito à vida e à saúde, direitos e deveres, ações e
omissões de indivíduos e grupos sociais, dos serviços privados e do poder público” (p. 66).
Em “Pluralidade Cultural e Orientação Sexual” (BRASIL 1997e), encontramos:
a) 22 inserções da palavra “ética”: em título do capítulo e nome do tema (duas vezes);
correlacionando com sexualidade (uma vez); correlacionando com saúde (uma vez); em
reflexões filosóficas (doze vezes); em menção sobre um dos objetivos do Ensino Fundamental
(uma vez); em abordagem sobre formação ética na escola (três vezes); correlacionando
diretamente com pluralidade cultural (duas vezes).
b) Duas inserções da palavra “moral”: em reflexão filosófica do tema (uma vez); em
abordagem sobre sexualidade (uma vez).
Exemplos de excertos: “No âmbito instrumental, [...o tema] exige do professor
atitudes compatíveis com uma postura ética que valoriza a dignidade, a justiça, a igualdade e
a liberdade” (p. 39); “Não se pode exigir do professor uma isenção absoluta no tratamento
das questões ligadas à sexualidade, mas a consciência sobre quais são os valores, crenças,
opiniões e sentimentos que cultiva em relação à sexualidade é um elemento importante para
que desenvolva uma postura ética na sua atuação junto dos alunos” (p. 84); “O professor
deve manifestar a compreensão de que as manifestações da sexualidade infantil são
prazerosas e fazem parte do desenvolvimento saudável de todo ser humano. É necessário
cuidado para não humilhar ou expor os alunos: tais manifestações não devem ser
condenadas ou julgadas segundo doutrinas morais” (p. 103).

2.4.3 - PCN de 5ª a 8ª séries

Os PCN referentes ao Ensino Fundamental de 5ª a 8ª séries são compostos dos


seguintes volumes, assim intitulados: “Arte”; “Educação Física”; “Ciências Naturais”;
“Matemática”; “Português”. Analisamos apenas o volume “Ciências Naturais” (BRASIL,
1998d). Nele, verificamos:
a) 10 inserções da palavra “ética”: em abordagens sobre CTSA (cinco vezes); em
menção sobre um dos objetivos do Ensino Fundamental (uma vez); relacionando ética e saúde
(uma vez); em citação do nome de um dos temas transversais (uma vez); relacionando ciência
e ética (uma vez); em abordagem sobre professor e conteúdo (uma vez).
b) Uma inserção da palavra “moral”: em abordagem sobre sexualidade.
43

Exemplo de excerto: “O professor de Ciências, antes de mais nada um educador da


criança e do jovem brasileiro, reconhece os conteúdos tratados em Ética quando contribui
para os estudantes desenvolverem a solidariedade, o respeito mútuo, a justiça e o diálogo
com autoconfiança. É importante reconhecer que a aprendizagem de Ciências pode envolver
sentimentos de ansiedade e medo do fracasso, o que, sem dúvida, é uma conseqüência tanto
do que é escolhido para se ensinar, do modo como é ensinado, como também de atitudes
apreendidas no grupo social que freqüenta, ou, ainda, de pais e professores que não se
sentem à vontade com a Ciência” (p. 52).

2.4.4 - PCN de Ensino Médio

Nos PCN do Ensino Médio (BRASIL, 1999), na parte referente às bases legais do
documento (parte I), encontramos:
a) 34 inserções da palavra “ética”: em abordagem sobre a formação ética na escola (17
vezes); em correlações com conteúdos de Ciências, Matemática e suas Tecnologias (três
vezes); em título e subtítulo do documento (duas vezes); em reflexões filosóficas e políticas
(12 vezes).
b) Sete inserções da palavra “moral”: em reflexões filosóficas correlacionadas à
educação (seis vezes); referindo-se ao trabalho de Piaget sobre a autonomia moral e
intelectual (uma vez).
Exemplos: “Alteram-se, portanto, os objetivos de formação no nível do Ensino Médio.
Prioriza-se a formação ética e o desenvolvimento da autonomia intelectual e do pensamento
crítico” (p. 15); “Como princípio educativo, a ética só é eficaz quando desiste de formar
pessoas ‘honestas’, ‘caridosas’ ou ‘leais’ e reconhece que a educação é um processo de
construção de identidades. Educar sob inspiração da ética não é transmitir valores morais,
mas criar as condições para que as identidades se constituam pelo desenvolvimento da
sensibilidade e pelo reconhecimento do direito à igualdade a fim de que orientem suas
condutas por valores que respondam às exigências do seu tempo” (p. 69, grifos do
documento).

2.4.5 - PCN+ (Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias)

Os PCN+ são compostos de três volumes, assim intitulados: “Linguagens, Códigos e


suas Tecnologias”; “Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias”; “Ciências
44

Humanas e suas Tecnologias”. Ao analisarmos o volume “Ciências da Natureza, Matemática


e suas Tecnologias” (BRASIL, 2002), encontramos:
a) 36 inserções da palavra “ética”: inserida na palavra “bioética” (uma vez); em
abordagens gerais sobre os aspectos éticos no ensino escolar (três vezes); em abordagens
sobre CTSA (32 vezes).
b) uma inserção da palavra “moral”: em abordagem sobre genética.
Exemplos: “Da mesma forma, aspectos biológicos, físicos, químicos e matemáticos,
presentes nas questões tecnológicas, econômicas, ambientais ou éticas das relações
interpessoais e do sistema produtivo e dos serviços, serão tratados como contexto em que se
desenvolve o conhecimento científico, e não em separado, como apêndices ou aplicações de
uma ciência básica” (p. 24); “Pode haver especificidades nos aspectos éticos envolvendo,
por exemplo, a física das radiações, a química da poluição, a biologia da manipulação
gênica, ou a matemática do cálculo de juros, mas o conhecimento disciplinar é, em qualquer
caso, recurso essencial para um desígnio humano comum” (p. 25); “[...] tais conhecimentos
permitem que os alunos sejam introduzidos no debate das implicações éticas, morais,
políticas e econômicas das manipulações genéticas, analisando-as e avaliando os riscos e
benefícios para a humanidade e o planeta” (p. 49); “Para isso, os temas selecionados devem
ter relevância científica e cultural. Isso significa que, além das justificativas relativas às
aplicações e à linguagem, sua importância está em seu potencial explicativo, que permite ao
aluno conhecer o mundo e desenvolver sentidos estéticos e éticos em relação a fatos e
questões desse mundo” (p. 119).

2.4.6 - Documento curricular para o ensino de Ciências no ensino médio

Em documento publicado pelo Ministério da Educação, intitulado “Orientações


curriculares para o ensino médio: ciências da natureza, matemática e suas tecnologias”
(BRASIL, 2006), encontramos:
a) 20 inserções da palavra “ética”: na apresentação do documento (duas vezes); em
discussões gerais (sete vezes); em discussões sobre Genética (quatro vezes); em discussões
sobre CTSA (seis vezes); em abordagem sobre energia nuclear (uma vez).
b) uma inserção da palavra “moral”: em discussão sobre genética.
A seguir, apresentamos alguns excertos que trazem os termos “ética” e (ou) “moral”
extraídos de Brasil (2006), que se dirigem para a educação em Ciência: “Cabe estimular o
aluno a avaliar as vantagens e desvantagens dos avanços das técnicas de clonagem e da
45

manipulação do DNA, considerando valores éticos, morais, religiosos, ecológicos e


econômicos” (p. 24); “[...] dá oportunidade aos alunos para pesquisar em diferentes fontes,
visitar instituições, entrevistar especialistas, organizar as suas idéias, realizar julgamentos
críticos e exercitar posturas éticas” (p. 28); “No que diz respeito à formação do educando
como cidadão e como personalidade ética e crítica, a Biologia tem grande contribuição a
dar” (p. 38); “A formação ética e o pensamento crítico podem ser estimulados, em Biologia,
pela exposição do aluno a questões...” (p. 38); “[...] que permitam ao professor avaliar o
desenvolvimento da consciência crítica e a condição argumentativa dos alunos, sua formação
ética e suas posições quanto aos valores pessoais e sociais” (p. 41); “Autonomia crítica:
aumenta quando o aprendizado se expande para fora de assuntos puramente científicos,
como avaliar o caráter ético do conhecimento científico e tecnológico, avaliar o papel do
desenvolvimento tecnológico, compreender aparatos tecnológicos e seu impacto na vida
social e assim por diante. Isso requer participação ativa e compreensão da complexidade do
mundo em transformação” (p. 60, grifo do documento); “[...] a construção de um
conhecimento químico em estreita ligação com o meio cultural e natural, em todas as suas
dimensões, com implicações ambientais, sociais, econômicas, ético-políticas, científicas e
tecnológicas” (p.107).

2.5 - Destaques

• A educação em valores é uma inquietação presente na literatura da área educacional geral.


• A prática educativa escolar é processo interventivo que lida com saber e valores, com riscos
de atingir a identidade e dignidade dos mais fragilizados.
• Reclamações são encontradas na literatura acerca do lugar sem destaque dispensado
atualmente à ética e à moral no processo educativo escolar.
• Não há como educar sem a presença de valores. Não há como excluir a escola da formação
moral (educação moral ou educação de valores).
• Que valores ensinar na escola? Como ensinar? Em que bases teóricas? Essas são algumas
das questões relevantes que também podemos transpor para a especificidade da Educação em
Ciências.
• Estudos clássicos ou contemporâneos das áreas de Psicologia, Filosofia, Sociologia, entre
outras, contêm subsídios teórico-práticos capazes de orientar nossas escolhas sobre o tema.
• Há uma diversificação nas abordagens teóricas sobre educação moral, mas nenhuma delas
apresenta características de completude ou com isenções de críticas.
46

• Os métodos, estratégias ou meios extremados de educação moral que caracterizam ou


trazem alguma imposição ou relativismo não fortalecem o processo de autonomia dos alunos.
• Tanto a LDBEN como os diferentes PCN publicados fazem menções sobre as necessidades
formativas da moral na escola.
• No conjunto dos PCN, justiça, respeito mútuo, diálogo e solidariedade aparecem como
princípios ético-morais a explorar no ensino escolar.
• Alguns indicativos para o ensino de Ciências que podemos extrair das orientações
curriculares (gerais e específicas) contidas nos PCN13: i) educação é processo de
desenvolvimento; ii) os objetivos e metodologias devem envolver a autonomia do aluno; iii) a
participação do aluno deve ser ativa; iv) o uso de estratégias de diálogo e argumentações que
prezem a equidade, a justiça, a solidariedade e o respeito mútuo são relevantes; v) os
professores devem considerar em aula os diferentes tipos de conhecimento e não apenas o
científico.
• A educação tem papel relevante quanto às possibilidades de um mundo mais justo, digno e
harmonioso, sendo a “busca da verdade” um dos elementos-chave (valor de estofo especial) a
ser perseguido / trabalhado nas escolas. No entanto, não é possível buscar e aproximar-se da
verdade sem posicionamento teórico e procedimentos adequados.
• Há necessidades de avanços em diferentes frentes para superar a retórica e, ao mesmo
tempo, subsidiar de forma clara, consciente e teoricamente referenciada a formação moral na
escola. É tema complexo que merece mais estudos, debates e investigações empíricas,
especialmente na área de Ensino de Ciências.

13
A análise das inserções dos termos subsidiou a elaboração dessa nossa breve categorização.
47

3.0 - TEORIAS REVISITADAS: CONTRIBUTOS DAS PERSPECTIVAS


SOCIOMORAIS PARA AS AULAS DE CIÊNCIAS

“Um dos maiores problemas da educação é o


seguinte: de que modo unir a submissão sob uma
coerção legal com a faculdade de se servir de sua
liberdade? Pois a coerção é necessária! mas como
posso eu cultivar a liberdade sob a coerção?”
(KANT apud VINCENTI, 1994, p. 19).

Na literatura encontramos teorias com diferentes abordagens, ideias ou concepções


sobre formação moral. Entre elas, podemos brevemente citar: i) formação moral como
socialização: teoria sociológica que descreve a formação moral como um processo racional e
laico, no qual os sujeitos recebem os valores e normas da sociedade (a ordem moral é um fato
social exterior ao indivíduo e tem a função de regulação social), ou seja, a obediência dos
sujeitos às regras sociais se dá em ambiente orientado pela disciplina e aceitação externa das
normas que a sociedade impõe (vide DURKHEIM, 2000, 2002); ii) formação moral como
clarificação de valores: traz concepções relativistas sobre os valores e uma abordagem
pedagógica que se fundamenta em auxiliar o sujeito a encontrar e compreender os seus
próprios valores, para que possam se comprometer com eles (vide RATHS et al., 1967); iii)
formação de hábitos virtuosos: é a formação da moral por meio de experiências e vivências
que perpassam uma linha de conduta virtuosa (vide PETERS, 1984); iv) formação moral
como construção da personalidade moral: baseia-se numa educação voltada para um
processo de construção de si mesmo em relação com o meio (vide PUIG, 1998); v) formação
moral com enfoque dimensional: traz uma abordagem que postula a inclusão de aspectos e
contextos diversos à formação moral, porque as pessoas trazem e se relacionam com todo esse
conjunto e não apenas um único (vide NUCCI, 2003); vi) formação moral como abordagem
pela narrativa: fundamenta-se na aprendizagem por intermédio de histórias individuais ou
coletivas nas quais os personagens vivem conflitos e escolhas morais (vide TAPPAN;
BROWN, 1989; DAY; TAPPAN, 1996).
Por ocasião de nossas escolhas, revisitamos apenas o conjunto de teorias referenciais
que configura uma perspectiva de formação moral como processo de desenvolvimento (aliada
a orientações da ética discursiva). Assim, recortes das teorias de Piaget, Kohlberg e Habermas
são apresentados na sequência, naquilo que acreditamos fundamentos úteis para nossos
propósitos: apropriação de elementos teórico-práticos que se posicionam numa interface de
48

subsídios contributivos tanto para as aulas de Ciências como para o desenvolvimento moral
dos alunos.

3.1 - Os estudos de Piaget sobre moral

Os estudos de Piaget sobre moralidade são referenciais imprescindíveis para aqueles


que discutem ou investigam sobre o tema. Na sequência, apresentamos uma breve
sistematização de duas obras de Piaget (1994, 2003) sobre moral: “O juízo moral na criança”
e “Os procedimentos da educação moral”.

3.1.1 - O juízo moral na criança

Depois de ler pela primeira vez “O juízo moral na criança” (PIAGET, 1994), lembro-
me de retornar ao prefácio de La Taille, no qual algumas de suas falas, à época, me marcaram:
“[...] é um clássico da literatura psicológica”; “Quem quiser seguir a trilha das pesquisas e
reflexões que JM [O juízo moral na criança] suscitou deverá instruir-se sobre, entre outras, a
teoria de Kohlberg”; “[JM] ajuda-nos a prosseguir pensando a moralidade humana”. Iniciei
este item com essas lembranças porque hoje posso confirmar o quanto a obra clássica de
Piaget influenciou-me nessa temática e fez-me buscar em Kohlberg, em Habermas e também
em outras teorias originais ou de interlocutores, as compreensões sobre questões de
moralidade que tanto me incomodavam em minhas aulas de Ciências, especialmente após o
evento da aula de evolução relatado logo no início deste trabalho.
Basicamente o que Piaget apresenta em “O juízo moral na criança” são os estágios de
heteronomia e autonomia moral. Esses dois conceitos, extraídos de Kant, referem-se à forma
de obediência às normas ou regras estabelecidas. Assim, heteronomia moral é a obediência
motivada por controle externo, geralmente por interesse egocêntrico (por exemplo, medo de
castigo), enquanto autonomia moral é a obediência motivada por controle interno, na escolha
consciente de um princípio aceito como válido, mas mutável se for justo (por exemplo, em
prol da vida) e cuja responsabilidade social vem acompanhada por essa consciência na
escolha.
O conjunto da obra compreende importante relato de pesquisa sobre a gênese do juízo
moral infantil. Após entrevistas clínicas com crianças de cinco a doze anos, Piaget (1994)
acaba concluindo que o processo de julgamento moral da criança passa por duas fases
distintas: a moral heterônoma e a moral autônoma.
49

A primeira fase é marcada por normas morais entendidas pela criança como leis
sagradas e não passíveis de modificações. Nesse caso, a criança interpreta a norma ao pé da
letra, como se a origem da ordem surgisse e ficasse encerrada na própria norma. Para a
criança nessa fase, será mais culpado, por exemplo, aquele que mentir sobre algo de tamanho
maior, mesmo por engano ou por distorção da realidade.
A segunda fase é marcada por um entendimento das normas como elementos sociais
de regulação entre as pessoas. Nesse caso, a criança (em torno de onze anos, doze anos) já
consegue se ver integrante ativo na dimensão do universo moral, sendo capaz de manter
relações de reciprocidade com os demais. Portanto, a criança passa de uma obediência passiva
sobre normas inquestionáveis para uma relação que perpassa o acordo racional e o respeito
mútuo.
Piaget (1994) observou em suas pesquisas que as fases de heteronomia e de autonomia
moral ocorrem junto aos respectivos estágios pré-operatório e operatório, em decorrência da
capacidade de uso da razão na fase de autonomia moral, ou seja, da mera crença ou do
simples acreditar em algo que venha do seu exterior (do adulto, por exemplo), a criança passa
para uma fase em que procura de forma consciente a justificação contida nas normas.
De acordo com La Taille (1994, p. 81) o que Piaget nos revela com suas experiências é
que “o universo moral não é exterior à constituição do sujeito epistêmico e psicológico; ao
contrário”, pois a moralidade “têm influência direta sobre os processos integrantes da natureza
humana”. Portanto, “o princípio da igualdade, condição necessária ao exercício da
cooperação, passa a ter uma justificativa cientifica, pois sem esta liberdade não há
desenvolvimento intelectual e moral”.
Tanto na dimensão da inteligência como na da moral, Piaget vê que a imposição e a
coerção (ainda que estejam presentes na primeira fase) são elementos de relações humanas
que não conseguem levar à autonomia. Pelo contrário, esses são elementos que apenas
reforçam a heteronomia e o respectivo egocentrismo. A cooperação, o diálogo, o acordo
mútuo, para Piaget, são os elementos-chave para favorecer o desenvolvimento da autonomia
moral.
Essas observações de Piaget nos fazem refletir sobre as relações sociais experenciadas
pelas crianças nos diferentes ambientes em que vivem e se relacionam com outras crianças e
também com os adultos, incluindo a escola. De acordo com os pressupostos piagetianos, a
depender de relações de coação ou de cooperação poderá haver interferências no
desenvolvimento moral (e também intelectual) da criança.
50

Para autores diversos que estudam a teoria moral piagetiana, entre eles Freitas (2002),
o psicólogo suíço teve forte influência de Kant. Abordando esse tema, Freitas (2002)
demonstra qual foi a intenção de Piaget no que diz respeito à moral. Para tanto, baseia-se no
método da análise estrutural de Ramozzi-Chiarottino para a análise dos textos escritos por
Piaget sobre moral. Em seus argumentos, são destacadas três partes: o projeto do jovem
Piaget; as razões de seus escritos sobre o juízo moral; explicação sobre o caminho que se
percorre para chegar na consciência moral autônoma. Interessa-nos especificamente as duas
últimas.
Desde que publicou Recherche, em 1918, Piaget “aspirava propor uma teoria sobre a
moral”, afirma Freitas (2002). “O juízo moral na criança” pode ter sido uma “tentativa de
submeter as suas idéias sobre a moral a uma verificação empírica”. Com isso, Piaget pretendia
dirimir dúvidas interpostas por divergências advindas de autores como Kant, Durkheim e
Bovet, entre outros.

Em vários textos, ele contrapõe, de um lado, Immanuel Kant e Émile


Durkheim e, de outro, Pierre Bovet: para Kant e Durkheim, o respeito é
conseqüência da lei moral, ou seja, é na medida em que o indivíduo obedece
a lei moral que ele é respeitado; segundo Bovet, o respeito às pessoas é
condição prévia da lei moral, visto que o indivíduo atinge o respeito à Lei
através das pessoas. Piaget procura dirimir as divergências em torno dessa
questão submetendo-a ao método genético. Nós podemos compreender,
então, o seu livro O julgamento moral na criança como um estudo
psicogenético sobre as relações entre o respeito e a lei moral (FREITAS,
2002, p. 304).

Assim, buscando estudar as normas e regras em relação às motivações de obediência,


aos aspectos de respeito, mentira e reconhecimentos de autoridade, Piaget coloca em prática
suas famosas entrevistas clínicas para, basicamente, tentar responder à seguinte questão:
“Como a criança chegará à autonomia moral, se todo dever tem origem em pessoas adultas?”
Estuda, então, como as crianças se comportam em relação às regras de jogos infantis. E faz
uma comparação, pois as regras de jogos são elaboradas pelas próprias crianças enquanto as
regras morais vêm dos adultos.
Entre outros aspectos, o que Piaget queria observar era o respeito desenvolvido na
criança no ambiente interativo com seus pares. Consegue diferenciar duas relações sociais: a
coação e a cooperação. Encontra semelhanças de seus resultados com a teoria kantiana de
duas morais: a heteronômica e a autonômica. Com um diferencial: Piaget observa que se
desenvolve um processo evolutivo de um para outro tipo de moral, isto é, da heteronomia
moral para a autonomia moral.
51

O que se vê nos estudos de Piaget é o que pesquisadores, como Freitas (2002, p. 305),
entre outros, chamam de “um paralelismo entre o desenvolvimento da lógica e da moral no
ser humano”, tendo o ambiente social um papel relevante no processo de ambos.
Em suma, nos experimentos de Piaget, as crianças de até aproximadamente dois anos
não acusaram perceber a existência de regras (anomia moral). Após esse período, o que se
apresentou a Piaget foi uma prevalência do respeito unilateral da criança para o adulto. Uma
obediência proveniente da coação social, com a criança valorizando as regras e normas
porque estas se ligam à presença dos adultos. O que não significava, na prática, que as
crianças seguiam as regras impostas. A essa fase Piaget denominou de realismo moral, pois a
moral era vista pela criança como algo exterior a ela, isto é, que vinha de fora para dentro.
Esse respeito unilateral, segundo diversos autores, como Freitas (2002), não deve ser
visto como desrespeito ou algo evitável, pois é fase necessária ao processo de
desenvolvimento moral. O que não se admite, no entanto, é que essa prática de unilateralidade
coercitiva ultrapasse esse período preliminar a ponto de não dar condições ou prejudicar o
processo evolutivo moral da criança. Nesse ponto, podemos retomar e reconhecer como
legítimas as preocupações de Kant (apud VINCENTI, 1994, p. 19) que colocamos na epígrafe
deste tópico.
Pelas pesquisas de Piaget, são os efeitos de uma cooperação entre os indivíduos
colocados como iguais que propiciam o respeito mútuo. Ao lado desse resultado de pesquisa
de Piaget também se posicionou Habermas, como veremos mais adiante.
Na relação de cooperação há um processo de empatia que faz as crianças enxergarem
as regras de maneira diferente: agora a regra não vem mais do exterior, por meio da
autoridade do adulto; ela pode ser construída coletivamente; pode ser justa ou injusta e, sendo
assim, pode ser modificada sem que isso seja visto como transgressão.
Piaget trabalhou em suas experiências somente com o que chamou de reciprocidade
espontânea. Uma condição que sozinha não basta, mas que é necessária para que a
reciprocidade normativa (moral) ocorra. A autonomia moral, para Piaget, dá um status
perfeito e completo ao indivíduo em termos de sociedade.
Se em Kant todo o ser humano tem a capacidade de agir eticamente, em Piaget todo o
ser humano pode tornar-se capaz de ação moral na interação social. Piaget baseia-se em Kant
e consegue, com sua teoria científica e por meio da racionalidade, comprovar a existência do
homem ético.
Sobre esse lado da racionalidade da teoria piagetiana, mais uma vez retomamos os
comentários do professor La Taille no prefácio de “O juízo moral na criança”:
52

Não se pode reduzir a moral a tais contágios [afetivos]. A inteligência


também participa. E não somente participa como é presença essencial tanto
para - no plano social - procurar evitar as diversas formas de barbárie, como
- no plano pessoal - evitar deixar-se levar a toda hora por puras vontades e
instintos. Vale dizer que o “fortalecimento do ego”, que inclui a
racionalidade, é condição sine qua non do equilíbrio social e pessoal
(PIAGET, 1994, p. 14).

3.1.2 - Os procedimentos da educação moral

Muito tempo se passou desde que Piaget apresentou no V Congresso Internacional de


Educação Moral, ocorrido em Paris no ano de 1930, o trabalho que agora discutimos
(PIAGET, 2003). No entanto, as diferenças geográficas e o lapso de muitas décadas não
anulam ou minimizam a relevância da respectiva obra sobre o tema, que se completou e expôs
toda sua consistência dois anos mais tarde na publicação de “O juízo moral na criança”, um
dos livros clássicos no meio científico que brevemente (apenas as ideias nucleares)
expusemos anteriormente.
Como trabalhar a educação moral na escola? É basicamente sobre esse questionamento
que Piaget (2003) trata nesse artigo, cujos fundamentos foram extraídos de seus estudos
teóricos e empíricos implementados na época. E a resposta é rápida:

Quaisquer que sejam os fins que se proponha alcançar, quaisquer que sejam
as técnicas que se decida adotar e quaisquer que sejam os domínios sob os
quais se aplique essas técnicas, a questão primordial é a de saber quais são as
disponibilidades da criança. Sem uma psicologia precisa das relações das
crianças entre si e delas com os adultos, toda a discussão sobre os
procedimentos de educação resulta estéril (PIAGET, 2003, p. 2).

Segundo Piaget (2003), é necessário antes de qualquer opção sobre métodos ou


procedimentos conhecer como se dá ou se comporta a estrutura biológica e psicológica das
crianças sobre a questão da moralidade. Dito de outra forma, antes de tudo a pedagogia
sempre deve levar em consideração a própria criança. Os seus estudos teóricos e
experimentais dão um norte para as discussões. Vejamos.
Moral não é completamente inata, é aprendida. Existem dois tipos de moral:
heterônoma e autônoma. A primeira relaciona-se ao respeito unilateral, refere-se a aspectos de
autoridade e coerção do adulto sobre a criança, a segunda está relacionada ao respeito mútuo,
a aspectos de cooperação entre as próprias crianças. Essas duas morais coexistem: “Não há
exagero em se falar de duas morais que coexistem na criança e que as características de
53

heteronomia e da autonomia conduzem a avaliações e comportamentos muito diferentes”


(PIAGET, 2003, p. 8).
Para Piaget (2003, p. 9), não há que se preocupar em posicionamentos entre uma
moral religiosa e uma moral laica, pois “tanto numa como noutra se encontram traços
pertencentes à moral do respeito unilateral e outros pertencentes à moral da cooperação. Só
difere a motivação”. Com isso, ele trata a questão de forma objetiva no terreno da psicologia.
Surge um outro questionamento: como trabalhar educação moral sabendo-se da
coexistência dessas duas morais na criança? Piaget classifica as técnicas gerais da educação
moral em três tipos possíveis: i) autoridade e liberdade; ii) os procedimentos verbais da
educação moral; iii) os métodos ativos de educação moral.
Sobre o primeiro tipo (relações entre autoridade e liberdade), um dos mais
conhecidos e difundidos, as características circunscrevem os aspectos do respeito unilateral,
ou seja, as regras que vêm de fora são impostas. “Comum na pedagogia familiar, embora
dificilmente único, esse procedimento encontra sua aplicação mais sistemática no domínio da
disciplina escolar tradicional”. Seja de onde vier (de Deus, dos adultos, dos pais, dos
professores), as regras vindas de fora são impostas. “Que se apóie sobre uma moral religiosa
ou sobre uma moral laica, o procedimento é o mesmo: para a criança, com efeito, pouco
importa que as regras emanem de Deus, dos pais ou dos adultos, em geral, se elas são
recebidas de fora e impostas de uma vez por todas” (PIAGET, 2003, p. 10-11). Chamamos a
atenção do leitor nesse ponto, ao qual voltaremos a discutir com maior profundidade mais à
frente, pois também é possível incluir a ciência e o seu respectivo ensino formal nas bases de
neutralidade, status hierárquico na escala de importância do conhecimento perante outros
tipos etc. que comumente se fecham nessas relações com a criança.
Ainda sobre a questão da autoridade nesse tipo de procedimento que discute
autoridade e liberdade, Piaget retoma criticamente alguns aspectos de Durkheim (2000, 2002),
cuja teoria sobre a educação moral se baseia em três elementos: i) o espírito de disciplina, no
qual a moral é um sistema de regras impostas e que devem ser respeitadas; ii) a ligação aos
grupos sociais, na qual a moral implica o elo social; iii) a autonomia da vontade, autonomia
aqui com significados de aceitação da pressão social, pois importa mais o social que o
indivíduo. Este deve sempre se submeter ao social. Nesse caso, o que se apresenta, de acordo
com a ótica de Piaget, é a heteronomia moral.
Não se pode esquecer que na criança coexistem os dois tipos de moral e pode até a
moral heterônoma ter o seu papel num certo momento ou situação, mas a busca do respeito
mútuo, na construção do sujeito autônomo, deve ser um objetivo se nos voltamos para os
54

processos emancipatórios dos sujeitos. Diz Piaget (2003, p. 14) que “o respeito mútuo é uma
espécie de forma limite de equilíbrio para a qual tende o respeito unilateral, e pais e
professores devem fazer tudo o que for possível, segundo cremos, para converterem-se em
colaboradores iguais à criança”. Nesse caso, não podemos negligenciar um ou outro tipo de
respeito. Nos questionamentos sobre uma possível liberdade absoluta, sem nenhum tipo de
coação, Piaget deixa sem respostas, mas não descarta que o respeito unilateral se faça presente
numa fase inicial do processo de construção da moralidade. O que não significa querer a sua
permanência nos procedimentos formais de ensino ao invés de seu desenvolvimento.
Sobre a segunda técnica, ou seja, os procedimentos verbais de educação moral, a
referência é o ensino pela fala, pelas palavras, nos diferentes tipos de “lições de moral”.
Também tem suas bases na heteronomia, pois a lição de moral traz uma verdade pronta para a
criança, que é sempre coagida a recebê-la de fora. “Queiramos ou não, os métodos orais
repousam sempre sobre um fundo de respeito unilateral” (PIAGET, 2003, p. 18). É um
método puramente verbal ao qual Piaget também tece críticas por causa de sua ineficácia ou
até mesmo pelo efeito contrário que pode tomar no rumo desse procedimento, a depender das
características do responsável pela implementação. Circunstâncias de rejeição, relações
emocionais afetadas entre professor e aluno, ou entonações inadequadas inseridas na história
contada em classe (configurada como lição de moral), por exemplo, pode trazer resultados
contrários aos esperados.
Uma outra questão que se faz para esse tipo de procedimento diz respeito à inserção
das lições de educação moral nas matérias disciplinares. É o caso dos diferentes conteúdos
servirem para os propósitos da educação moral, isto é, o ensino de História, Geografia,
Ciências etc. converterem-se em espaços para discussões e desenvolvimentos morais. Sobre
isso, Piaget fez algumas ressalvas. Vejamos.

Aqui não é lugar para discutir a questão de se a história ou outras ciências


podem servir ou não aos fins morais. Se qualquer disciplina científica, a
história não é mais que as outras, não deve ser desviada da pura pesquisa da
verdade, nos parece impossível negar ao historiador, como homem que é, o
direito de julgar os fatos que ele tenha estudado e mesmo de tirar deles a
lição que desejar. Pelo contrário, uma objeção freqüentemente feita é a de
que se não se der mais lições de moral, esta corre o risco de não aparecer em
nenhum outro lugar: cada professor, levado por sua própria matéria, deixa
para mais tarde o cuidado de extrair a significação humana e o ano se passa
sem discussões morais. Colocando desse lado essa dificuldade, devemos
confessar que uma conversação organizada sobre as composições das
crianças ou dos fatos da história, da geografia e da literatura é suscetível de
fundir-se muito melhor com as preocupações do aluno e de mostrar-se,
assim, mais vantajosa que um ensinamento sistemático e isolado de moral.
55

Mas isso depende unicamente de quanta atividade se concede às crianças na


preparação das conversações (PIAGET, 2003, p. 18).

Como vimos, o autor critica mas não radicaliza num único ponto. Mesmo com os
procedimentos verbais de educação moral tendo bases na heteronomia, há casos ou situações
cujas inserções, quando cuidados são tomados (isso é imprescindível), tornam-se pertinentes.
Diz Piaget (2003, p. 9): “Queremos apenas ressaltar, no momento, que mantidas as justas
proporções a ‘lição moral’ não deve ser proscrita. Porém, ela não desenvolverá
produtivamente a não ser por ocasião de uma vida social autêntica e no interior da própria
classe”.
A terceira técnica refere-se aos “métodos ativos” de educação moral, que propõem
matérias ensinadas sem a imposição externa. A “escola ativa” da qual Piaget fala é aquela
onde as crianças possam fazer experiências morais.
São três os aspectos que dão base a esses métodos: i) a educação moral não se
constitui numa matéria específica de ensino, ou seja, em todas as atividades a educação moral
está ocorrendo; ii) os trabalhos se caracterizam pelo coletivo, são realizados em grupo, num
processo de cooperação; iii) as descobertas ocorrem pelos alunos e não por transferência de
conteúdo ou informação do adulto, no caso, o professor.
“Se, realmente, o desenvolvimento moral da criança ocorre em função do respeito
mútuo [...], a cooperação no trabalho escolar está apta a definir-se como o procedimento mais
fecundo de educação moral”. Em complementação a esse aspecto, no procedimento da escola
ativa, está o posicionamento de uma educação moral não constituinte de uma matéria de
ensino específica, pois a educação é um todo e as atividades que são executadas na escola, em
cada uma das disciplinas, “supõem um esforço do caráter e um conjunto de condutas morais,
assim como supõe uma certa tensão da inteligência e mobilização de interesses” (PIAGET,
2003, p. 20 - 21).

Esteja ocupada em analisar regras de gramática, a resolver um problema de


matemática, ou a documentar um ponto da história, a criança que trabalha
“ativamente” é obrigada, não só diante de si como diante do grupo social que
é a classe ou da “equipe” da qual faz parte, a comportar-se de modo muito
diferente do aluno tradicional que escuta uma lição ou realiza um “dever”
escolar (PIAGET, 2003, p. 20).

A educação moral está sendo implementada na ocupação de todas as disciplinas, pode


ocorrer a qualquer instante no decorrer das aulas, mas será que os professores estão
conscientes e preparados profissionalmente, com bases teóricas e experimentações práticas
consistentes, para atuar no percurso desse procedimento da docência? Essa é mais uma
56

questão que levantamos e que cremos úteis discutir com um pouco mais de ênfase, na
trajetória desse nosso trabalho, mais adiante.
Nos procedimentos da escola ativa, Piaget dá relevância aos questionamentos dos
alunos. Questionamentos que não podem estar ausentes das aulas ou ser interrompidos por
explicações reduzidas e unilaterais, por exemplo, pelo conhecimento científico em nome de
provocar mudanças conceituais em prol de apenas e tão somente uma opção, a da ciência,
mesmo que ela se explique a fortiori. As crianças devem antes experimentar, expor suas
ideias, entender por si mesmas, ampliando-se o universo delas com opções que só ela poderá
escolher. E escolherá tanto melhor para si quanto forem as oportunidades disponibilizadas.
Também aqui abro parênteses para que se atente o leitor sobre as possíveis relações entre as
aulas de Ciências e o desenvolvimento moral quando aparecem diminuídas essas
oportunidades aos alunos nas situações em que se trabalha com objetivos de uma educação
científica na qual nitidamente sobressaem as verdades absolutas, as neutralidades, os
desinteresses éticos, sociais, políticos e econômicos dos cientistas etc. Voltaremos a essa
discussão posteriormente, pois ainda que lacunas estejam aparentes aí emana um dos
elementos nucleares da nossa tese.
Até esse momento vimos que Piaget nos ofereceu uma discussão sobre os
procedimentos da educação moral sob dois pontos de vista: dos fins da educação
(emancipatórios ou mantenedores do status quo) e das técnicas gerais de educação moral. O
terceiro e último enfoque na sequência das discussões refere-se aos domínios da moral. E
Piaget é incisivo:

Qualquer que seja o domínio em que se estenda a educação moral, o método


ativo busca sempre: 1 - não impor pela autoridade aquilo que a criança possa
descobrir por si mesma; 2 - em conseqüência, criar um meio social
especificamente infantil no qual a criança possa fazer as experiências
desejadas (PIAGET, 2003, p.24).

Na discussão sob o ponto de vista dos domínios da moral, o texto de Piaget traz os
seguintes exemplos: i) a formação do caráter e o cultivo da bondade; ii) veracidade e
objetividade; iii) a educação das tendências instintivas; iv) responsabilidade e justiça; v)
educação cívica e social; vi) educação internacional. Não serão por nós comentados todos
esses, mas somente alguns.
O trecho propositalmente longo a seguir expõe as ideias de Piaget tomando-se os
aspectos de veracidade e objetividade, que também subsidiarão nossas discussões sobre as
relações entre aulas de Ciências e formação moral. Nesta leitura, pede-se que o leitor
57

permaneça atento e exercite nas respectivas linhas, entrelinhas e contextos alguns dos
elementos associados à difusão mistificada de verdade absoluta, de ciência neutra etc., que
discutiremos à frente. Vejamos.

Tudo que sabemos atualmente da psicologia da criança parece demonstrar


que o pensamento infantil não comporta espontaneamente nem a
objetividade em geral, nem a veracidade. Com efeito, a função primitiva do
pensamento é assegurar a satisfação dos desejos, mais que adaptar o eu à
realidade objetiva [...]. É pelos outros e em função de uma colaboração
organizada que nós renunciamos à nossa fantasia individual para ver a
realidade tal qual ela é e para dar primazia à veracidade sobre o jogo ou a
mentira. Ora, a criança é naturalmente egocêntrica e enquanto não tiver
conseguido socializar seu pensamento, ela não compreenderá nem o valor da
verdade nem “a fortiori” a obrigação da veracidade.
Como conduzir seu espírito aos valores da verdade? Os conselhos dos
adultos e as melhores lições serão suficientes para se chegar a essa
consciência? A experiência nos mostra o contrário: mesmo que a criança
aceite os deveres relativos à veracidade e sinta-se culpada nos casos de
infração às regras, ela não chega a incorporar em sua personalidade uma lei
que não compreende internamente e continua a ser dominada pelas
tendências naturais de sua mentalidade. Só a colaboração entre crianças e a
prática da discussão organizada dão a cada um o significado da objetividade.
Só a ação mútua faz a criança compreender o que a mentira é em realidade e
qual o valor social da veracidade (PIAGET, 2003, p. 27).

De forma abreviada separamos as seguintes teses de Piaget que, direta ou


indiretamente, dão suporte aos nossos argumentos em prol de uma interface de aproximação
entre aulas de Ciências e formação moral: i) “a educação moral é solidária a toda a
pedagogia”; ii) “tanto a recompensa como a punição são incontestavelmente a marca da
heteronomia [...]. O esforço autônomo rejeita tais procedimentos” (PIAGET, 2003, p. 31).
Por fim, o texto de Piaget segue nas discussões de procedimentos sob o ponto de vista
dos domínios da moral. Seja em temáticas e (ou) objetivos educacionais diversos, que
obrigatoriamente incluem a educação moral, Piaget defende que antes de tudo a pedagogia
sempre leve em consideração a própria criança. Os caminhos, estratégias, métodos ou
procedimentos surgem depois disso.

3.2 - Os trabalhos de Kohlberg sobre desenvolvimento moral

Processos investigativos e de mensuração sobre moral hoje são possíveis porque têm
bases experimentais e teóricas bastante sólidas, devendo-se a transformação da moralidade em
objeto de pesquisa em grande parte aos estudos de Piaget e, mais tarde, de maneira mais
estruturada e completa, aos trabalhos de Lawrence Kohlberg. Para Lind (2000, p. 400), foi
58

Kohlberg, dando sequência aos trabalhos de Piaget, por intermédio de sua pesquisa inovadora,
que “abriu a possibilidade de um conhecimento científico sobre uma educação moral
sistemática que vá além da doutrinação moral de um lado e do relativismo moral
desinteressado de outro”.
Piaget e Kohlberg (este último, numa fase posterior) não concentraram seus estudos na
conduta moral, ou seja, não se interessaram no que os sujeitos faziam ou fariam (ações ou
atitudes) diante de uma situação, mas nas razões dadas e declaradas dos porquês (juízos de
valor) da conduta adotada. Para ambos, as análises das razões eram mais reveladoras do que
as análises de condutas, pois uma criança e um adulto podem ter conduta semelhante diante
de uma mesma situação (não roubar mercadorias de um supermercado, por exemplo), mas as
razões podem ser diferentes e, nessa diferença, indicar os níveis ou estágios de juízo moral de
cada um (talvez a criança por causa do medo de castigo e o adulto pelo reconhecimento
consciente e racional da lei). No entanto, com algumas ressalvas sobre “um grande número de
variáveis dentro da situação social ou na personalidade do indivíduo que tem influência sobre
essas condutas” (KOHLBERG; CANDEE, 1992, p. 532), parece haver indicativos nas
próprias pesquisas de Kohlberg e de outros pesquisadores sobre a presença de relações entre
conduta e juízo moral.
Kohlberg (1992), em sequência aos trabalhos de Piaget, e com um grau de maior
profundidade nos seus estudos sobre moralidade, considera três níveis hierárquicos de
desenvolvimento moral, cada qual com dois estágios. Inicialmente, Kohlberg trabalhou com
pessoas de 10 a 16 anos. Com auxílio de outros pesquisadores, posteriormente ampliou esse
quadro, tanto na idade dos sujeitos como no acompanhamento deles.

3.2.1 - Os níveis e estágios de desenvolvimento moral

No primeiro nível, denominado de Pré-Convencional, o valor moral reside em regras


externas acerca do bem e do mal, do justo e do injusto, os quais são interpretados levando-se
em consideração as consequências físicas ou hedonísticas da ação ou do poder físico de quem
enuncia as regras. No estágio I desse nível, as ações são qualificadas como boas ou más,
dependendo do que tais ações vão acarretar para si próprio. Respeita-se uma autoridade, que
seria inquestionável. Algumas respostas típicas desse estágio apresentadas por Kohlberg e
Mayer (1984): “Eu o faria (ou o fiz) para me evitar problema”; “Eu o faria (ou o fiz) porque
se ele (o adulto ou superior) ordena, suas boas razões terá”. No estágio II do nível Pré-
Convencional, as ações denominadas corretas satisfazem as necessidades próprias ou talvez as
59

de outros. Caracteriza-se pela consciência do relativismo do valor segundo as necessidades e


perspectivas de cada sujeito: “Você faz por mim e eu faço por você”; “Eu vou primeiro e vejo
por mim mesmo. Se você me ajuda, eu o ajudarei alguma vez”.
O segundo nível é o Convencional. Consiste na moral voltada para manter a ordem
convencionada pela sociedade. O valor moral está centrado na conformação da ordem
convencional e na satisfação de expectativas de outros. O estágio III, que faz parte desse
nível, o moralmente bom liga-se à aprovação dos outros: “Lógico que eu ajudaria a outra
pessoa. Ficaria pensando sobre como se sentiria. Qualquer pessoa decente poderia ajudá-
lo”. O estágio IV é caracterizado pela manutenção das normas, respeitando-se as regras e as
autoridades: “Olha, supõe-se que um deve ajudar ao outro. Isso é como uma regra. Se a gente
não cumpre esse dever, a sociedade não funciona”. Levando-se em consideração apenas as
características pautadas no ajuste ou conformação à sociedade, percebe-se uma aproximação
desse nível com os propósitos da formação moral como socialização, como veremos mais
adiante.
O terceiro e último nível é o Pós-Convencional, caracterizado por distinguir valores e
princípios válidos independentemente da autoridade. Em outras palavras, o valor moral
centra-se na conformidade de consciência com valores de direitos e deveres compartilhados e
compartilháveis. No estágio V, que inicia esse nível, as leis não são mais válidas apenas por
que são leis, entrando o consenso e a consciência de relatividade entre os valores e as regras:
“Há uma lei que a gente deve acatar. Todos nós temos a obrigação de trabalhar através do
sistema que acolhemos para mudar as leis que nos parecem más. Quando se comete uma
injustiça, o melhor é tratar de remediá-la através do sistema”. No último estágio (VI), é
moralmente correto seguir princípios fundamentados em critérios universais de justiça. A
orientação como critério nas escolhas funda-se sobre os princípios de justiça, respeito à vida,
igualdade econômica, social e jurídica etc. Portanto, a orientação transcende as regras de
ordem social dada para por a ênfase nos princípios da racionalidade nas escolhas éticas: “A lei
deveria estar subordinada aos mais elevados princípios de justiça. Deveria atuar de acordo
com esses princípios super ordinários mais do que pelo interesse de manter simplesmente a
conformidade da lei”.
Sobre esse último estágio, por não conseguir resultados experimentais mais
contundentes, foi posteriormente retirado por Kohlberg como realidade empírica, mas
mantido teoricamente como ideal a ser atingido no desenvolvimento moral.

Continuamos com a postulação [do estágio VI] porque entendemos nossa


60

teoria como um intento de reconstruir racionalmente a ontogênese de


raciocínio da justiça, uma tarefa que requer um estágio final da classe de
desenvolvimento que estamos estudando. Em outras palavras, um estágio
final com um princípio organizador nos ajuda a definir a área de atividade
humana em estudo (KOHLBERG, 1992, p. 272).

Kohlberg (1992, p. 188-189) ainda apresentou para cada estágio as seguintes


perspectivas sociais: i) Não há consideração dos interesses de outros; não se faz o
relacionamento de dois pontos de vista; faz-se consideração física dos fatos no lugar dos
interesses psicológicos dos outros; há confusão entre a perspectiva da autoridade com a sua
própria; ii) Consciência de que todo mundo tem seus interesses e o correto é relativo, no
sentido individualista; iii) Consciência de sentimentos compartilhados que tem preferência
sobre os interesses individuais; há relacionamento de dois pontos de vista; não se considera a
perspectiva do sistema generalizado; iv) Há distinção entre o ponto de vista da sociedade e os
motivos interpessoais; há consideração sobre as relações individuais segundo o lugar que
ocupam no sistema; v) Consciência individual racional dos valores e direitos anteriores aos
contratos e compromissos sociais; integra perspectivas por mecanismos formais de acordo e
imparcialidade; consideração dos pontos de vista legal e moral, sabendo-se que um pode
entrar em conflito com o outro; vi) Reconhecimento racional sobre a natureza da moralidade
ou o fato de que as pessoas são fins em si mesmas e devem ser tratadas como tais.
Piaget e Kohlberg, ambos baseando-se na universalidade dos princípios morais e tendo
a justiça como critério de regulação moral, concluíram em seus trabalhos que: a) a
personalidade moral compreende não somente aspectos afetivos, mas também cognitivos, que
podem ser claramente diferenciados, mas não separados um do outro; b) esses aspectos se
desenvolvem em sequência progressiva e diferenciada (em estágios); c) esse desenvolvimento
é influenciado pela aprendizagem formal.
Tanto para Piaget como para Kohlberg, a educação formal tem papel relevante no
desenvolvimento moral, pois a passagem para estágios superiores de moral (orientação para a
autonomia moral) não é naturalmente inevitável, ou seja, os indivíduos podem falhar em
alcançar os níveis ou estágios superiores do raciocínio moral. Nesse caso, o fim do educador
que busca o desenvolvimento não é a aceleração do desenvolvimento, mas alcançar no
processo de crescimento dos alunos os estágios superiores. E mais do que isso. É “evitar o
retardamento ou o atraso dos estágios” em relação à faixa etária (KOHLBERG; MAYER,
1984, p. 94). Então, para a educação escolar contribuir no processo de desenvolvimento
moral, resumidamente, pode-se mencionar o trabalho de colaboração e de mediação do
professor, no lugar do individualismo e da autoridade unilateral ou da imposição, ou seja, a
61

presença da cooperação, do respeito e do estímulo à consciência dos princípios universais de


justiça (dimensão da autonomia moral) no lugar de qualquer tipo de coerção ou coação
(dimensão da heteronomia moral).
Há diversos trabalhos de Kohlberg e de seus colaboradores que apresentam os tipos de
diálogos entre professores e alunos, ou entre os respectivos pesquisadores e os alunos, em
investigações que buscam detectar ou potencializar o desenvolvimento moral em sala de aula,
utilizando-se os clássicos dilemas. O trabalho de Blatt e Kohlberg (1975) é um dos exemplos.
Traz, ao final, interessantes trechos desses diálogos e comentários (vide ANEXO E). Nesses
diálogos ficam nitidamente caracterizados os aspectos de respeito e do estímulo à consciência
dos princípios universais de justiça (dimensão da autonomia moral), no lugar de qualquer tipo
de coerção ou coação (dimensão da heteronomia moral), com a efetiva colaboração e
mediação do professor.
Kohlberg sustenta que há maior facilidade de desenvolvimento moral quando a
intervenção educativa envolve a exposição ao próximo estágio mais alto daquele que o aluno
se encontra, criando-se um grau de conflito ou discrepância que se constituirá numa
experiência efetiva para a mudança. A criação desse conflito requer a aplicação ativa do nível
de pensamento que possui o aluno a situações problemáticas, controvertidas. Para Kohlberg,
isso implica: i) atenção ao atual estágio de pensamento da criança; ii) fazer corresponder o
estímulo com o estágio, por exemplo, exposição a modos de raciocínio próprios de um estágio
por cima do atual da criança; iii) fazer surgir entre as crianças um conflito genuíno e de
desacordo em relação a situações problemáticas (diferente da educação tradicional
transmissiva de “respostas certas” ou “boas condutas”); iv) expor as crianças a estímulos
sobre os quais podem ser ativos, nos quais a resposta às situações-estímulo esteja associada
com um feedback natural.
Georg Lind, um dos pesquisadores que mais tem atuado na linha dos trabalhos de
Piaget e Kohlberg, desde 1974, também corrobora em seus estudos a relevância do aspecto
educacional no processo de desenvolvimento moral. Afirma que “quantidade e qualidade da
educação é condição necessária e indispensável para o desenvolvimento da competência
moral”. Baseia-se em pesquisas realizadas em várias partes do mundo: “Em todas as
investigações, independe do país, foi encontrada uma estreita relação entre o nível de
capacidade moral e o número e qualidade de informação educativa” (LIND, 2003, s/n).
A seguir (quadro 1), uma síntese relacionando os níveis e estágios de desenvolvimento
moral e algumas respostas típicas para cada estágio (KOHLBERG; MAYER, 1984, p. 30-33;
KOHLBERG, 1992, p. 188-189).
62

Quadro 1. Síntese dos níveis e estágios de desenvolvimento moral de Kohlberg


Bases dos níveis dos juízos morais Estágios do desenvolvimento Respostas típicas
I. Nível Preconvencional. 1. Orientação Obediência, Castigo. "Eu o faria (ou o fiz) para me evitar
problema".
O valor moral reside em rótulos e Deferência egocêntrica à autoridade
regras culturais externas acerca do ou ao poder superior ou ao "Eu o faria (ou o fiz) porque se ele
bom e do mal, do justo e do injusto, prestígio, ou eludindo situações (o adulto, o superior) ordena, suas
os quais são interpretados em problemáticas ou desagradáveis. boas razões terá".
termos de consequências físicas ou Responsabilidade objetiva.
hedonísticas da ação (castigo,
recompensa, retribuição de favores)
ou simplesmente em termos do
poder físico de quem enuncia as
regras.

2. Orientação Egoísta-Ingênua. "Eu vou primeiro e vejo por mim


mesmo. Se você me ajuda, talvez eu
Neste estágio, a ação correta é o ajudarei alguma vez".
aquela que instrumentalmente
satisfaz as necessidades próprias e
ocasionalmente as necessidades de
outros. Igualitarismo ingênuo e
orientação sobre o intercâmbio e a
reciprocidade através de fórmulas
como "Você faz por mim e eu faço
pra você". Consciência do
relativismo do valor segundo as
necessidades e perspectivas de cada
sujeito.

II. Nível Convencional 3. Orientação sobre a concordância "Lógico que eu ajudaria a outra
interpessoal pessoa. Ficaria pensando acerca de
O valor moral reside no como se sentiria. Qualquer pessoa
desempenho de papéis bons ou Neste estágio a conduta orienta-se decente poderia ajudá-lo".
corretos, na manutenção e sobre a busca da aprovação, a
conformação da ordem complacência e a ajuda a outros.
convencional e em satisfazer as
expectativas de outros. Neste nível, Conformidade com a conduta
julgam-se as intenções e, portanto, majoritária, definida por meio de
aparece a responsabilidade imagens estereotipadas e aprovadas,
subjetiva. porque são desejáveis.

4. Orientação sobre a manutenção "Olha, supõe-se que um deve ajudar


da autoridade e da ordem social. ao outro. Isto é como uma regra. Se
a gente não cumprisse esse dever, a
A conduta orienta-se sobre o sociedade não poderia funcionar".
"cumprimento do dever", o respeito
à autoridade e à manutenção da
ordem social.
63

Quadro 1. Síntese dos níveis e estágios de desenvolvimento moral de Kohlberg (cont.)


Bases dos níveis dos juízos morais Estágios do desenvolvimento Respostas típicas
III. Nível Pós-Convencional 5. Orientação Contratual-Legalista "Há uma lei que a gente deve acatar.
Todos temos a obrigação de
Os valores e princípios morais são Consciência do relativismo dos trabalhar através do sistema que
validados e aplicados valores e opiniões pessoais, mas temos acolhido para mudar as leis
independentemente da autoridade agora com ênfase nas regras e que nos parecem más. Quando se
ou conformidade dos membros do procedimentos para a busca do comete uma injustiça, o melhor é
grupo, ainda que esses valores consenso. O dever é definido em tratar de remediá-la através do
sejam vistos como compartilhados. termos de contrato, evita-se em sistema".
Em outras palavras, o valor moral geral a violação do preceito ou
reside na conformidade de direitos de outros. Há, pois, o
consciência com valores de direitos reconhecimento de um elemento
e deveres compartilhados ou arbitrário nas regras e expectativas
compartilháveis. na busca do acordo.

6. Orientação de Consciência e "A lei deveria estar subordinada aos


Princípio. mais elevados princípios de justiça.
Deveria atuar de acordo com esses
Orientação sobre os princípios princípios super ordinários mais do
(justiça, respeito à vida, igualdade que pelo interesse de manter
econômica, social e jurídica etc.) simplesmente a conformidade da
como critério nas escolhas, lei".
apelando à universalidade e à lógica
empregada. Respeito mútuo e
confiança com a consciência como
agente diretivo. Portanto, esta
orientação transcende as regras da
ordem social dada, para pôr a ênfase
nos princípios da racionalidade nas
escolhas éticas.

3.2.2 - O desenvolvimento do educando como finalidade da educação

O subtítulo deste item também é nome de outra obra de Lawrence Kohlberg, escrito
com a colaboração de Meyer14, que não chegou a ser traduzida para o português. No entanto,
e juntamente com as demais, tornou-se referência para a área educacional. Ainda que críticas
tenham surgido sobre alguns dos aspectos, princípios ou ideias que aparecem em suas obras,
como veremos em outro momento deste nosso trabalho, isso não minimiza a relevância de seu
legado, tornando-o ainda atual para muitos dos debates que envolvam as áreas da educação e
do desenvolvimento humano. Aliás, Kohlberg, ao longo do tempo, aproveitando-se de
diálogos travados com outros pesquisadores (incluindo Habermas) e aberto a posicionamentos
que acreditava fossem pertinentes, não se limitou a apenas defender-se das críticas, pois
processou ajustes e aperfeiçoamentos em suas teses (figura 2).

14
Kohlberg escreveu muitas de suas obras em parceria com outros pesquisadores, seus seguidores, ex-alunos etc.
64

Figura 2. Da esquerda para a direita: Georg Lind, Ann Higgins, Kohlberg e Jim Rest15

Na apresentação que fazem do livro “O desenvolvimento do educando como


finalidade da educação”, que traduziram para a língua espanhola, os professores Preciado e
Mattos dizem que provavelmente seja “o texto sobre teoria da educação mais difundido em
língua inglesa durante a década passada e também o mais importante trabalho sobre teoria
educativa que se produziu desde El Proceso de la Educación, de Jerome Bruner” (p. 15). Os
dois trabalhos são respostas a dois momentos diferentes dos Estados Unidos. Enquanto Bruner
respondia às necessidades educativas de avançar científica e tecnologicamente, por razões de
hegemonia pós-Sputinik, Kohlberg preocupava-se com a evolução americana que trazia ao
seu lado situações de crise e de reivindicações diversas - um quadro que, portanto, não podia
mais se sustentar somente com a formação científica e tecnológica. A formação ética surgiu
como preocupação e necessidade programática, a qual Kohlberg apresentou e defendeu por
meio de seus pressupostos especialmente fundados teórica e experimentalmente na psicologia
do desenvolvimento humano, com fortes influências piagetianas e outras (Dewey, Mead,
Loevinger, por exemplo).
A retomada dessa obra de Kohlberg e Meyer (1984), assim como as demais que se
apresentam neste nosso trabalho, não representa nenhum desejo de criar um modelo
pedagógico kohlberguiano, ou próprio, ou alternativo, ou que consista em padrão (algo em
torno disso até já foi tentado por alguns pesquisadores), mas que sua construção científica e
ideológica nos sirva para refletir e analisar nosso próprio meio educativo, ou melhor, as aulas

15
Conferência em Educação Moral realizada em Fribourg, Suiça, em 1982 (fonte: www.uni-konstanz.de/ag-
moral/about.htm). Reprodução da foto permitida pelo professor Georg Lind.
65

de Ciências - as quais nos preocupamos de maneira mais específica. Diante disso, há muito
que depreender sobre esse importante aporte teórico.
Antes das discussões sobre o conteúdo em si, e para efeito de expor o design estrutural
da obra, são os seguintes itens constitutivos de “O desenvolvimento do educando como
finalidade da educação”: Introdução; As três correntes da ideologia educacional
(Romantismo; Transmissão cultural; Progressismo); Teorias psicológicas subjacentes às
ideologias educacionais; Componentes epistemológicos das ideologias educacionais; Posições
de valor ético subjacentes às ideologias educacionais; A falácia da neutralidade valorativa; Os
valores e a ideologia da transmissão cultural; A falácia do relativismo dos valores; Os valores
e a ideologia romântica; Postulados de valor do progressismo; Estratégias para a definição de
objetivos educacionais e a avaliação das experiências educacionais; A estratégia do “talego
[saco] de virtudes”; A racionalidade da psicologia industrial; A estratégia filosófico-evolutiva;
O desenvolvimento como finalidade da educação; Resumo e conclusões.
Logo de início, após enfatizar a importância dos fins educacionais e defender o papel
da investigação empírica para os rumos do processo, Kohlberg já se posiciona em prol da
última das “três estratégias que prevalecem para a definição de objetivos e para relacioná-los
aos fatos da investigação”. Então, entre (i) traços desejáveis (talegos de virtudes); (ii) predição
do êxito (psicologia industrial); (iii) evolutivo-filosófica, diz: “sustentamos que a estratégia
evolutivo-filosófica para obter os objetivos educacionais, que emerge dos trabalhos de Dewey
e Piaget, é um marco teórico de referência que suporta a crítica lógica e é consistente com
atuais resultados da investigação científica” (KOHLBERG; MAYER, p. 38).
Ciente de que sua escolha sobre a teoria psicológica cognoscitiva-evolutiva é uma
ideologia educacional, mas de cunho racional e progressista que contrasta com as demais,
Kohlberg se propõe a apresentar seus argumentos. Mais especificamente, dentre outras
discussões, sustentará que “uma noção alternativa de que a finalidade da escola deveria ser a
estimulação do desenvolvimento humano é uma concepção exeqüível, cientificamente,
eticamente e na prática, e oferece [...] nova ordem para a psicologia educacional”
(KOHLBERG; MAYER, p. 39).
Sobre as três correntes da ideologia educacional, mesmo incorrendo em reduções
indesejáveis16, resumiremos assim os pressupostos kohlberguianos sobre elas:
i) Romantismo: centra-se na criança (paidocentrismo), o que vem do íntimo é o mais
importante elemento do desenvolvimento; a criança possui um “eu” que se torna relevante; o

16
Kohlberg cita os seguintes autores nos três itens: Rosseau, Freud e Gessel, Neill e Summerhill, Stanley Hall
(Romantismo); Bereiter e Engelmann (Transmissão cultural) e Dewey (Progressimo).
66

“eu” é o fato primário; a escola atuaria para desenvolver e controlar aquilo que vem desse
íntimo.
ii) Transmissão cultural: raiz na tradição acadêmica ocidental, baseia-se em transmitir
o passado às novas gerações (internalização de conhecimentos, destrezas, regras)
iii) Progressismo: base nas filosofias pragmáticas funcional-genéticas; educação
estimula ativamente o desenvolvimento de uma estrutura não inata, em estágios cada vez mais
elevados.
Porque Kohlberg defende essa última linha de pensamento, e também porque
encontramos neste trecho alguns princípios dentre os quais os leitores serão chamados a
refletir conosco mais adiante, seguem outras características.

O educador progressista acentua os vínculos essenciais entre o


desenvolvimento cognitivo e moral; assume que o desenvolvimento moral
não é puramente afetivo e que o desenvolvimento cognitivo é uma condição
necessária, ainda que não suficiente, para o desenvolvimento moral. O
desenvolvimento do pensamento lógico e crítico, central para a educação
cognitiva, encontra seu maior significado em um amplo conjunto de valores
morais. O progressista também pontua que o desenvolvimento moral emerge
da interação social em situações de conflito social. A moralidade não é nem
a internalização de valores culturalmente estabelecidos, nem o
desenvolvimento de impulsos espontâneos e emocionais; é a justiça, a
reciprocidade entre o indivíduo e outros em seu ambiente social
(KOHLBERG; MAYER, p. 45).

Uma atenção especial dispensamos aos seguintes elementos teóricos do progressismo


trazidos por Kohlberg: uma maior ou mais rica estimulação conduz avanços mais rapidamente
através dos estágios; um grau moderado ou ótimo de conflito ou discrepância constitui a
experiência mais efetiva para a mudança estrutural; a facilitação do desenvolvimento envolve
a exposição ao próximo nível mais alto de pensamento e o conflito requer a aplicação ativa do
nível de pensamento que possui a criança a situações problemáticas (p. 50).

(...) É impossível para os professores não se comprometer em juízos de


valor e decisões. Uma escola na qual o professor é neutro com relação aos
valores não significa preocupação pela liberdade da criança (...). Em
contrapartida, ele pode criar uma escola na qual os juízos de valor do
professor e as decisões que se tomem envolvam democraticamente os
estudantes (KOHLBERG; MAYER, p. 74-75)

Podemos resgatar na literatura algumas das aplicações das teorias de Kohlberg


tentadas nas escolas, como por exemplo, no caso da escola Cluster, nos Estados Unidos. Não
entraremos nesses detalhes. No entanto, podemos dizer que Kohlberg era convencido de que a
escola dá oportunidade não apenas de ensinar democracia, por exemplo, mas de ensinar e
67

praticar ao mesmo tempo, e com resultados melhores para o desenvolvimento moral. Esse
aspecto que envolve a participação da escola no desenvolvimento moral é corroborado em
trabalhos de Lind (2003), entre outros.
Para dar ênfase ao aspecto inclusivo da escola no processo de desenvolvimento moral,
destacamos - por concordarmos - as seguintes afirmações de Hersh e colaboradores (1996, p.
182-183): i) “O prático da educação moral deve estar disposto a lutar com a complexidade”;
ii) “O desenvolvimento de um raciocínio moral para estágios mais elevados, em sentido lato,
envolve técnicas de discussão eficazes e uma capacidade de pensar mais crítica”; iii)
“Necessitamos ter o cuidado de não igualar o comportamento moral com uma ‘melhor
disciplina’ ou com o enfoque de fatos virtuosos”.

3.3 - A ética discursiva de Habermas

Às discussões sobre moral apresentadas, até então, também inserimos as teorias da


ética discursiva porque contém ideias complementares ou de entrelaces com as anteriores,
especialmente sobre as ideias de verdade, liberdade e justiça que estão nas estruturas do
discurso difundidas por Habermas (1987a, 1987b, 1999, 2003). Vejamos.
Na sociedade analisada por Habermas existem duas esferas de mundo que deveriam se
complementar: o mundo vivido e o mundo sistêmico. No sistêmico prevalecem os meios da
ação racional instrumental para obtenção dos fins. No vivido, a linguagem constitui a ação
racional comunicativa como meio para comunicação, interação e entendimento dos membros
sociais. No entanto, Habermas observa que o mundo vivido vai aos poucos sendo colonizado
pelo mundo sistêmico, isto é, o dinheiro e o poder (da economia e da política) vão
substituindo e tomando o espaço da ação comunicativa. O que causam algumas patologias no
mundo moderno. Portanto, onde deveria estar presente a ação comunicativa vemos a ação
instrumental. E alastrando-se por vários segmentos da sociedade.
Entre os pressupostos habermasianos apresentam-se interessantes inserções e reflexões
sobre a moral. Em suas preocupações aparecem os valores éticos que, equivocadamente, se
reduziram à técnica, excluindo-se assim a decisão por intermédio do diálogo. A racionalidade
instrumental, ao desviar-se de seu específico caminho, isolou o indivíduo nas formas de
pensar e agir. Habermas quer resgatar o espaço da racionalidade comunicativa na esfera de
decisão, porque suas convicções são de que as ideias de verdade, liberdade e justiça estão
inseridas nas estruturas do discurso.
68

Segundo Habermas, o agir comunicativo baseia-se em pretensões de validade e não de


poder. De acordo com Flecha e colaboradores (2001), os pós-estruturalistas não diferenciam
validade e poder. Habermas, sim. Para ele, são dois pressupostos diferentes: nas pretensões de
poder entra a imposição; nas pretensões de validade entra o diálogo (argumento da força
versus a força do argumento).
Na Teoria da Ação Comunicativa, Habermas coloca a argumentação no lugar da ação
teleológica. Por meio da linguagem, busca-se o consenso de uma forma livre de toda coação
externa e interna. Nesse caso, a base de toda interação é o entendimento mútuo pela
argumentação e simetria de participação.

Quem participa convictamente numa argumentação tem necessariamente de


partir do princípio de que a situação comunicativa é, em princípio, garante
dum acesso público, de iguais direitos de participação, autenticidade dos
participantes, ausência de coacção na tomada de posições, etc. Os
intervenientes só se conseguem persuadir reciprocamente, se partirem do
pressuposto pragmático de que o seu sim e não se deixam determinar em
exclusivo pelo imperativo do melhor argumento (HABERMAS, 1999, p.
131).

Para Habermas (1999, 2003), nos discursos são encontrados os seguintes


componentes: (a) coordenação das ações; (b) interação orientada por normas sociais
estabelecidas ou a se estabelecerem; (c) revelação de algo: vivências, sentimentos, temores,
necessidades, intenções. Dessa forma, pode-se pretender que algo seja bom ou verdadeiro
impondo a força ou entrando num diálogo no qual os argumentos dos outros podem mudar
sua opinião. No primeiro caso, há uma pretensão de poder; no segundo, uma pretensão de
validade. Quando vencem as pretensões de poder, se aplica o argumento da força. Quando se
abrem às pretensões de validade, se impõe a força dos argumentos: “coação sem coação do
melhor argumento”.

Na argumentação, o oponente e o proponente disputam uma competição com


argumentos para convencer um ao outro, isto é, para chegar a um consenso.
Essa estrutura dialética de papéis prevê formas erísticas para a busca
cooperativa da verdade. Para fim da produção do consenso, ela pode valer-se
do conflito entre os competidores orientados para o sucesso, na medida que
os argumentos não funcionem como meios do influenciamento recíproco -
no Discurso, é apenas de uma maneira ‘isenta de coações’, isto é,
internamente, através de mudanças de atitude racionalmente motivadas, que
a coação do melhor argumento se comunica às convicções (HABERMAS,
2003, p. 194-195).
69

Assim, o discurso apresenta aspectos intersubjetivos e lógico-argumentativos: é forma


de comunicação que tem objetivo de fundamentar as pretensões de validade das opiniões e as
normas de interação. Por meio da linguagem, busca-se o consenso de uma forma livre de toda
coação externa e interna. A base de toda interação é o entendimento mútuo pela argumentação
e simetria de participação.

Do ponto de vista da teoria da intersubjetividade, a autonomia não quer dizer


o poder discricionário de um sujeito que dispõe de si próprio como sua
própria propriedade, mas sim a independência de um indivíduo possibilitada
mediante as relações de reconhecimento recíproco, que só pode existir
juntamente com a independência simétrica do Outro. O caráter intersubjetivo
de liberdade e de razão prática torna-se evidente quando analisamos os
papéis que uma expressão como ‘respeito’ assume no jogo da linguagem da
moral (HABERMAS, 1999, p. 144).

De acordo com Habermas (1999), todas as morais giram em torno de princípios


embasados em igualdade de tratamento, em solidariedade e em bem-estar geral. Essas são as
noções primordiais que se referem “às condições de simetria e às expectativas de
reciprocidade da acção comunicativa, ou seja, que se podem encontrar nas imputações
recíprocas e nas assunções comuns de uma prática quotidiana orientada para a comunicação”
(p. 20). Nesse caso, a estratégia de um discurso ético revela-se com um formato moralmente
favorável, pois

o discurso oferece precisamente uma forma de comunicação mais exigente e


que transcende as formas concretas de vida, pela qual as pressuposições da
acção orientada para a comunicação são generalizadas, abstraídas e
ampliadas, no sentido do seu alargamento a uma comunidade de
comunicação ideal e inclusiva de todos os sujeitos dotados da capacidade de
linguagem e de acção (HABERMAS, 1999, p. 21).

Em suma, temos na teoria ético-discursiva de Habermas: a totalidade pensada em três


mundos diferentes, isto é, dos objetos, das normas, das vivências subjetivas, as seguintes
formas de ação para cada mundo: instrumental, normativa, reflexiva; a ação comunicativa
perpassa e integra os três mundos; uma substituição do modelo monológico de Kant para o
dialógico; um deslocamento da centralidade: do sujeito epistêmico para o grupo;
intersubjetividade e linguagem apresentam-se como elementos imprescindíveis.

A chamada 'ética da discussão', elaborada por Jürgen Habermas e Karl Otto


Apel enquadra-se nesta perspectiva da descentralização com relação ao
sujeito. Ambos os autores se colocam na perspectiva da tradição ética
70

kantiana com a pretensão de superar as suas deficiências. Habermas e Apel


concordam com Kant que o mundo da moral é o mundo da autonomia do ser
humano, portanto, das leis que o homem cria para si mesmo, mas discordam
de Kant no tocante à interpretação do que significa criar suas próprias leis
(GOERGEN, 2005).

A moralidade em Habermas é pensada e elaborada no contexto do discurso prático,


afastando-se do imperativo categórico kantiano para aproximar-se de um processo que é
argumentativo, numa situação ideal de diálogo, baseando-se nos seguintes princípios morais
básicos: justiça e solidariedade.
Entre as perspectivas morais de Habermas e de Kohlberg há pontos convergentes e
divergentes, como veremos mais à frente. Em meio a essas argumentações sobre a ética do
discurso, vamos brevemente adiantar uma característica de convergência entre ambos.
Dissemos um pouco antes que existem diversos trabalhos de Kohlberg e de seus
colaboradores que apresentam trechos de diálogos travados entre professores e alunos, ou
entre os respectivos pesquisadores e os alunos, em investigações que buscam detectar ou
potencializar o desenvolvimento moral em sala de aula, utilizando-se dos clássicos dilemas.
Mencionamos o trabalho de Blatt e Kohlberg (1975), que agora retomamos e reproduzimos
alguns trechos e comentários (quadro 2) para o próprio leitor fazer suas observações:

Quadro 2. Trechos de diálogos apresentados em Blatt e Kohlberg (1975, p. 155-161)


[...]
Aluno E: Bem, eu não iria tão longe a ponto de espancá-lo e tomar seu carro. Ele ainda pode precisar dele. (Conversa de espancar alguém).
Sr. B: Então o que você está dizendo é que o valor deste homem, que ele achava mais importante era sua propriedade. Sua propriedade era
mais importante para ele do que a vida de alguém. Você disse que juridicamente ele estava certo. Certo? (Aceitação). Pode-se dizer
moralmente ele estava certo? (Respostas indistinguíveis.) O que você entende por moral? Alguém pode nos dizer o que se entende por
moral?
Aluno C: É - não há uma lei, mas -
Sr. B: Que tipo de lei pode estar envolvido? Não é um direito legal, embora possa ser, não tem que ser. Que tipo de direito é esse? O que
você estava dizendo antes, da sua mãe? O que ela disse?
Aluno B: A lei de Deus.
Sr. B: A lei de Deus diz o que sobre matança?
Aluno B: “Não matarás”.
Os alunos B e F: A lei de Deus é a lei moral.
Sr. B: O que você quer dizer?
Aluno B: Porque esta é a lei deste país e as leis morais de Deus são para todos.
Sr B: Ah, então o que você está dizendo - você escutou o que ele está dizendo? Poderia repetir o que você disse? É muito importante.
Aluno B: A lei de Deus é para todos e não há leis diferentes em países diferentes, por isso a
lei de Deus, suas leis morais são para todos.
Aluno D: As leis de Deus incluem mais pessoas do que as leis aqui, sim.
[...]
Sr. B: Ele estava fazendo certo? Você concorda com ele? Ele diz que o Sr. Jones estava fazendo o certo do ponto de vista moral.
Aluno B: Mas ele saiu da lei de Deus, indo contra a lei. Não furtarás.
Sr. B: Então o que você está dizendo é -
Aluno D: Há um problema. Ainda é roubar.
[...]
Aluno B: Como eu disse, para que eles não façam isso de novo.
Sr. B: Você acha que, dada a mesma situação, se ele ficar de castigo, ele não faria a mesma coisa outra vez? Certo?
Aluno B: Eu acho isso também.
[...]
Sr. B: O homem que se recusou a dar a Sr Jones o carro, ele agiu perfeitamente bem?
Aluno B: Ele poderia fazer qualquer coisa que quisesse fazer com o próprio carro. (Aceitação).
[...]
Aluno C: Sim, mas a lei não diz que você pode roubar quando a vida de alguém está envolvida. A lei diz que você não pode roubar.
Sr. B: Então, o que você está dizendo é que, de acordo com a lei, não faz qualquer diferença quando você roubar. Roubar é roubar e é errado.
Certo? (Refrão de “certo”).
71

Quadro 2. Trechos de diálogos apresentados em Blatt e Kohlberg (1975, p. 155-161) (cont.)


Aluno A: Ele errou ao levar o carro.
Aluno C: Você tem que ter uma razão para o que você roubar.
Sr. B: Suponha que você rouba quando está com fome. Você rouba comida, você está com fome, você não tem nenhum dinheiro.
Aluno A: Isso é contra a lei.
[...]
Aluno A: Mas eu estou dizendo que é contra a lei. Você pegou algo que não era seu.
Sr. B: Tudo bem, deixe-me perguntar “Qual é o propósito da lei?” (Duas ou três respostas: “Para proteger”). Para proteger as pessoas e seus
bens. Neste caso, suponha que você tem aqui uma pessoa cuja vida corre perigo. Você diz que a função da lei é proteger o povo. Tudo bem.
Agora, ele tem que proteger a vida -
[...]
Sr. B: Então o que você está dizendo é que as circunstâncias não fazem diferença. Roubar é roubar, não importa o quê. (Refrão de “Não”.
Outro coro de “Sim”). Defendam-se.
Aluno A: Eu não vou mudar a minha mente. Por que deveria fazer a diferença? Diga-me uma boa razão. Isso é como dizer a um médico que
ele deveria tirar a vida de um homem para que ele possa salvar a vida de seu melhor amigo. Como o melhor amigo precisa de um coração,
ele vai sair e matar alguém.
[...]
Aluno A: Ele tinha um bom motivo, mas isso não significa que está certo.
Sr. B: Que tipo de razão você está falando? (Argumentos).
Aluno E: Uma razão moral.
Aluno B: Legalmente ele está errado, moralmente ele tem razão. (Argumentos).
Aluno A: Não estamos discutindo moral, estamos discutindo lei.
Sr. B: Eu quero que você considere a ambos, moral e lei. Sr Jones é levado perante o juiz. Qual a punição deve ter Sr Jones e por quê?
Aluno I: A multa, cerca de cem dólares.
Sr. B: Tudo bem, qual é a finalidade da pena? Qual é a função da pena?
Aluno A: Você não vai fazê-lo novamente.
Sr. B: Tudo bem este é um deles. Qualquer outro motivo?
Aluno A: Para fazer a outra pessoa se sentir bem.
Sr. B: Então o que você está dizendo é - eu não entendo por quê?
Aluno A: Como se alguém mata o seu filho ou sua mãe, ou pai, ou amigo, e eles são punidos, talvez vai fazer você se sentir melhor.
Sr. B: Ok, então o que você está dizendo é que nós -
Aluno A: Satisfazer o homem.
Sr. B: Satisfazer o homem, e temos uma boa razão. Para impedir que outros -
Aluno A: Proteger os direitos das pessoas.

O objetivo e a estruturação do professor são semelhantes ao que ocorreu na primeira sessão, mas há a sustentação de um diálogo espontâneo.
O aluno A, embora sem vontade de mudar a sua escolha, parece mover-se para aceitar a ideia de que há boas razões para isso, mas ele insiste.
“Nós não estamos discutindo moral, estamos discutindo a lei”.

Habermas entende que a razão moral não é uma razão monológica, mas uma razão
dialógico-comunicativa. Assim sendo, será pelo diálogo intersubjetivo que se chegará à
conclusão sobre a correção ou não das normas. Para Habermas, as argumentações servem para
tematizar e examinar as pretensões de validez e não de poder. Assim, é o consenso que dá
autoridade à norma. Por meio do agir comunicativo, isto é, pelo discurso, que se buscam
consensos sobre o que oralmente é melhor para cada um e também para todos. (GOERGEN,
2005).
Segundo Gonçalves (1999), o modelo de Habermas traz, entre outros, os seguintes
pressupostos que podem servir de subsídio ao trabalho docente: mobilização do potencial
racional para o entendimento e caminhos para proporcionar a formação crítica dos alunos. A
autora ressalta que nesse processo: i) o grupo se auto-governa e deve estar livre e isento de
coação; ii) cada um oferece ao outro a possibilidade de críticas e interpretações; iii) o caminho
a ser percorrido é imprevisível e de construção; iv) é tentativa permanente para elevar o nível
de argumentação dos participantes. Portanto, em Habermas encontramos diferenças em
72

relação a propostas educacionais que atualmente alguns defendem e que se distanciam dos
princípios e pressupostos desse e dos referenciais usados neste nosso trabalho. Há algumas
linhas de pensamento, por exemplo, que defendem “ensinar a competir” (vide ANEXO F).
Com bases na teoria ético-discursiva de Habermas, cabe-nos refletir: Afinal, nas aulas
atuais de Ciências vemos prevalecer que tipo de ação, a comunicativa ou a instrumental? Não
apenas pela nossa prática como educador, mas juntando-se aos nossos estudos e análises de
resultados diversos difundidos na literatura, a resposta inicial e reduzida dirige-nos para a
“ação instrumental”. Então, se confirmada essa resposta, que efeitos vêm causando ao ensino
e à aprendizagem de Ciências? E se a prevalência fosse da “ação comunicativa”?
As respostas podem estar inseridas numa das análises realizadas por Freitag. Vejamos.

A ação comunicativa permite que os autores movimentem-se


simultaneamente em três registros, relacionando-se diferentemente com os
objetos da natureza, com as pessoas na sociedade e com as pulsões e os
fantasmas de sua interioridade. Graças à competência comunicativa, os
indivíduos fazem afirmações sobre fatos (da natureza), julgam as ações e as
normas (existentes na sociedade) e dão expressão aos seus sentimentos e
vivências. Por isso mesmo, a ação comunicativa é mais rica, mais complexa
e abrangente, porque permite que o indivíduo se situe no mundo, com o qual
interage em vários registros. É no interior de processos interativos, voltados
para o entendimento, para a autocompreensão, para a compreensão dos
outros, que se constitui o indivíduo, o sujeito consciente de si e de suas
ações, responsável pelo que faz, incluindo-se os efeitos desejados e
indesejados de sua ação (FREITAG, 1992, p. 240).

A teoria de ação comunicativa de Habermas inclui perspectivas interdisciplinares. No


que tange à perspectiva psicológica, a teoria da ação comunicativa traz princípios que
explicitam as ocorrências processuais de “individualização do sujeito, que, para construir um
ego autônomo ou uma realidade própria, passa por processos de aprendizagem cognitiva,
moral e linguística”. Nesse caso, o que ocorrem são “verdadeiras descentrações, que facilitam
ao sujeito distinguir entre mundo subjetivo e objetivo e, no mundo objetivo, entre natureza e
sociedade”. Portanto, para a efetivação das situações dialógicas exigidas são necessários
sujeitos autônomos (FREITAG, 1992, p. 242), ou que no processo de ensino sejam dadas, no
mínimo, essas oportunidades de desenvolvimento para a autonomia.
A teoria da ação comunicativa contém uma dimensão que abrange procedimentos de
hermenêutica. Sobre essa dimensão, Habermas (2003, p. 43) assinala três implicações.
Em primeiro lugar, os intérpretes devem renunciar à qualquer superioridade ou
posicionamento privilegiado do observador, pois todos se envolvem nas negociações acerca
do sentido e da validez dos procedimentos. Todos se empenham num processo de crítica
73

recíproca e de entendimento mútuo, não havendo decisões prévias sobre quem tem de
aprender de quem.
Em segundo lugar, na atitude performativa que assumem, os intérpretes não apenas
renunciam ao posicionamento de superioridade acerca de seu domínio de objetos, como
também se confrontam com a questão de “como superar a dependência de sua interpretação
relativamente ao contexto”. Nenhum deles pode estar antecipadamente seguro “de que eles
próprios e seus sujeitos de experiência partem do mesmo fundo de suposições e práticas”.
Em terceiro lugar, “a linguagem quotidiana se estende a proferimentos não-descritivos
e a pretensões de validez não cognitivas”. No dia-a-dia estamos mais frequentemente de
acordo ou em desacordo “sobre a correção de ações e normas, sobre a adequação de
avaliações e padrões e sobre a autenticidade ou a sinceridade de uma auto-representação do
que sobre a verdade de proposições”. Por isso, Habermas diz que “o saber que empregamos
quando dizemos algo a alguém é mais abrangente do que o saber estritamente proposicional
ou relativo à verdade”. Então, para a compreensão do que é dito, “os intérpretes têm que
alcançar um saber que se apóia em pretensões de validez adicionais”. Isso ocorre porque
“uma interpretação correta não é simplesmente verdadeira, como é o caso de uma proposição
relatando uma interpretação correta”, mas uma interpretação correta deve ser conveniente a,
ou adequada a que todos alcancem.
Essas três consequências resultam no fato de que ‘compreender o que é dito’ exige a
participação e não a mera observação (HABERMAS, 2003, p. 43).

3.4 - Piaget, Kohlberg e Habermas: pontos e contrapontos

Com os estudos que fizemos e auxílio de interlocutores, vamos brevemente extrair


alguns pontos e contrapontos entre as teorias de Piaget, Kohlberg e Habermas. Há princípios
convergentes e divergentes entre Piaget, Kohlberg e Habermas. Os princípios convergentes
são utilizados na estruturação de nossas argumentações. Antes, porém, inserimos brevemente
Kant e Durkheim, relevantes pensadores sobre a moral que antecederam as teorias de Piaget,
Kohlberg e Habermas.
Para Kant, os dois mundos em que a razão atua se decompõem em natureza e
sociedade. A moralidade surge, então, da indeterminação, da liberdade, da vontade
(legisladora). O instrumento de julgamento é o imperativo categórico kantiano, que se orienta
pela “dignidade da vida humana”, ou seja, respeito mútuo: “Age de tal modo que a máxima de
74

tua vontade possa sempre valer simultaneamente como um princípio para uma legislação
geral”.
Em Kant, o sujeito (epistêmico) ganha status e centralidade. Atribui-se à razão a
competência de criar a ciência e instituir a moral (quadro 3).

Quadro 3. Síntese sobre a Razão Teórica e Razão Prática em Kant

Razão Teórica Razão Prática


Faculdade a priori Faculdade a priori
Relaciona-se ao mundo da natureza Relaciona-se ao mundo social
Permite conhecer as leis que regem o mundo da Desvenda as leis do mundo social, regido pela vontade
natureza e liberdade dos homens
O homem deve conhecer o mundo da natureza O homem deve agir no mundo social
Escapa da vontade humana É definida pela vontade humana
Mundo do “ser” Mundo do “dever ser”
Valem os julgamentos científicos Valem os julgamentos morais
Reino da necessidade, contingência, determinação Reino da liberdade, do possível, da indeterminação

Entre Kant e Piaget, tendo-se como base os argumentos de Freitag (1989, 1992),
construímos a síntese a seguir (quadro 4).

Quadro 4. Diferenças básicas entre ideias de Kant e Piaget


Kant Piaget
Perspectiva filosófica, epistemológica Perspectiva psicológica, genética, experimental
Categorias a priori, origem externa à experiência Resultados de uma gênese
Liberdade: é pressuposto não explicado Liberdade: é o coroamento de um bem sucedido
processo de construção das estruturas da moralidade
Situa a moralidade no sujeito moral Inscreve a moralidade no sujeito empírico concreto
Moralidade sob a forma de imperativo categórico Moralidade enquanto processo de tomada de
consciência da regra social e de sua natureza
Moralidade começa com a liberdade, mas termina com Moralidade começa com a sujeição e inconsciência à
a sujeição ao imperativo do dever lei (heteronomia) e termina com a consciência e
liberdade do sujeito em relação a essas leis (autonomia)
Crença na capacidade de autodeterminação do sujeito
Raízes na faculdade da razão
Recusa radical de qualquer forma de heteronomia

Na literatura encontramos outros autores que também apresentam, de forma pertinente,


esse exercício de comparação entre alguns aspectos e (ou) princípios teóricos de Kant e
Piaget. Destacamos a seguir algumas anotações de Menin (2003):

Piaget concorda com Kant que pode haver no ser humano duas tendências
morais: a autonomia e a heteronomia. Porém, como psicólogo, mostrará que
essas duas morais são construídas durante o desenvolvimento da criança e
que a evolução de uma sobre a outra dependerá de vários fatores,
principalmente os ligados às formas de relações sociais em que a criança
estiver submersa (p. 42)
75

[...] Reciprocidade, para Kant, vimos que é um princípio, um imperativo:


‘Age como se a máxima de sua ação se devesse tornar, pela tua vontade, em
lei universal da natureza’. Reciprocidade, para Piaget, é um modo de se
relacionar com os outros no qual todos têm as mesmas oportunidades e
chances de participação e de interação no grupo, seja num grupo, num jogo,
no trabalho, nas discussões políticas, na vida... (p. 49).

Após breve aproximação entre os pensamentos de Kant e Piaget, trazemos agora


Durkheim, que entra brevemente nessa discussão como contraponto e, ao mesmo tempo, base
para um específico princípio da formação moral: a laicidade. A teoria de Durkheim (2000) é
complexa e não há aqui interesse em discutir todos os seus aspectos, princípios ou
fundamentos. A base em que o autor sustenta sua discussão está no deslocamento de locus da
formação moral, que passa do religioso para o social. Assim, há um consequente
desligamento entre moral e religião na escola: “trata-se de saber como é possível ensinar a
moral sem o apoio de nenhuma espécie de religião revelada, nem tampouco de qualquer
teologia racional” (p. 276).

Para que a regra seja obedecida tal como convém que seja obedecida, nós
devemos nos submeter a ela não para evitar penas ou para obter
recompensas, mas simplesmente porque a regra assim ordena, e por respeito
à própria regra, porque ela se apresenta a nós como respeitável. Em uma
palavra, como diz a consciência pública, há que cumprir o dever porque é
o dever, por respeito ao dever (DURKHEIM, 2000, p. 278, grifo nosso).

Chega-se a um aspecto nos argumentos de Durkheim que pode ilustrar um dos


contrapontos de Piaget a esse pensamento. Diz respeito ao “espírito da disciplina e a
obediência à autoridade” e “a adesão ao grupo social”. Para Piaget, essas dimensões
durhkeimianas estão fixadas na heteronomia moral, porque estão centradas na coerção social
sobre o indivíduo e na aceitação dessa pressão social. Diz Durkheim (2000, p. 280): “É
necessário que (a criança) compreenda que existe, acima dela, algo ante o qual deve se
inclinar, regras às quais deve obedecer simplesmente porque são ordens”. E complementa
logo a seguir: “[A sociedade] ultrapassa o indivíduo no espaço, mas o ultrapassa também
desde o ponto de vista da riqueza moral. Por conseguinte, nas consciências individuais há
menos civilização, menos moralidade que na totalidade”. Nas próprias palavras de Durkheim,
“a ciência, a arte, a religião, todas as crenças, todas as idéias da técnica econômica, industrial,
comercial, tudo isso está na sociedade; tudo isso nos ultrapassa, tudo isso nos transborda por
todos os lados” (DURKHEIM, 2000, p. 281).
76

Na proposta de Durkheim (2000, 2002), apesar de também fundada em critérios


racionais e leigos, a competência do julgamento moral é anulada no sujeito, pois a sociedade é
absoluta e julga o que é certo e o que é errado. A questão pedagógica, nesse caso, tem o foco
na promoção da obediência às regras e no ajuste e adaptação do sujeito à sociedade, tendo-se
como base os seguintes elementos de moralidade: espírito de disciplina, adesão ao grupo
social e autonomia (aqui entendida como submissão às regras sociais e aceitação da coerção
do grupo; diferente da ideia de Piaget, em que o sujeito se emancipa da coerção do grupo). O
objetivo, portanto, não está na dignidade e integridade do sujeito, mas na preservação do
organismo social. Nesse caso, como diz Freitag (1989, s.p.17), “não há margem para a
liberdade do sujeito, não há conflitos morais, não há princípios que orientem a ação
individual, pois tudo já se encontra pré-estruturado, definido, inexoravelmente objetivado e
rotinizado”.
Diz Freitag (1989) que entre Kant e Durkheim, Piaget fica mais próximo de Kant.
Vejamos a síntese apresentada a seguir (quadro 5).

Quadro 5. Síntese entre ideias de Durkheim e Piaget

Durkheim Piaget
Indistinção entre sociedade ideal e de fato Diferenciam-se sociedade concreta e a ideal
Assimila o dever ao bem (agir bem é obedecer bem) Essa assimilação fortalece a subordinação, está no
campo da heteronomia
Autonomia: processo que resulta da consciência da Autonomia: processo de maturação e descentração, em
obediência à regra e na aceitação inquestionada da que o sujeito se emancipa da coerção do grupo
coerção do grupo
Adesão ao grupo Cooperação recíproca entre iguais
Educação moral: objetivo é disciplina e obediência às Educação moral: passagem do nível heterônomo de
regras (adaptação à sociedade) obediência às regras para o nível de autonomia
(emancipação)
Só admite uma forma de moral para cada tipo de Existência de vários tipos de moral válidos
trabalho simultaneamente
Explica o fato social da solidariedade como uma Explica a reconstrução da regra e do mundo social na
realidade objetiva, decorrente da divisão de trabalho consciência moral da criança no decorrer da
psicogênese
Fatos sociais se sucedem, caracterizando a evolução Estágios de consciência se constroem e se reconstroem
histórica das sociedades pela criança num permanente trabalho de pensamento e
do conceito
Inserção do papel constituinte do social na formação do pensamento e da moralidade (laicidade)

Entre Piaget e Kohlberg, há mais pontos convergentes do que divergentes. Ambos se


fundamentam na psicogênese e dão tratamento científico à moralidade, por intermédio de uma
fundamentação empírica e teórica.

17
O próprio artigo informa modo de citá-lo, com paginas entre 7 e 44, mas o texto não tem paginação impressa.
77

Já comentamos que Piaget trabalhou com crianças até 12 anos e Kohlberg com uma
faixa etária maior (adolescentes, jovens e adultos, de todas as culturas, classe e profissões).
Piaget usou entrevistas clínicas em suas experiências; Kohlberg, um sofisticado método quali-
quantitativo. Piaget detectou três estágios (anomia, heteronomia e autonomia); Kohlberg, três
níveis com seis estágios (universais e com sequência invariável). Ambos, fundamentando as
bases morais nos princípios de respeito e justiça, observaram que os estágios detectados
caracterizavam-se por evoluir em direção à conscientização e autonomia.
Piaget e Kohlberg utilizaram os conceitos de Kant para autonomia e heteronomia
moral, ou seja, referiram-se à forma de obediência e não às normas ou regras (heteronomia
moral: obediência motivada por controle externo, por interesse; autonomia moral: obediência
motivada por controle interno, na escolha de um princípio aceito como válido). Segundo La
Taille (2006, p. 14), em ambos “o papel da razão é privilegiado e a autonomia é possível”.
Isso é coerente, porque “a noção de autonomia só faz sentido na esfera racional”.
Entre Kohlberg e Kant, destacamos o seguinte comentário de Menin:

O estágio 6, também pós convencional, seria aquele que corresponderia a um


julgamento propriamente moral e autônomo. Inspirado em Kant, Kohlberg
descreve o julgamento desse estágio como aquele inspirado em princípios
éticos mais que em contratos sociais. Basicamente, os princípios de justiça,
igualdade, liberdade e dignidade de toda e qualquer vida humana seriam os
critérios para se julgar a ‘corretude’ de uma ação (MENIN, 2003, p. 56).

Entre Habermas e Piaget, podemos destacar que o estruturalismo genético auxiliou


Habermas na fundamentação de sua teoria: i) interlocutores competentes – deixa de ser
pressuposto e passa a ser conhecimento assegurado pela experiência; ii) situação dialógica
ideal, livre de coerção – situações experimentais realizadas; iii) radicalismo democrático: na
interação com o grupo, a criança constrói e reconstrói as regras sociais – padrões de justiça,
igualdade e solidariedade são praticados sem a intervenção de adultos; iv) linguagem –
centralidade também nas experiências de Piaget e Kohlberg.
Habermas não utilizou apenas as teorias de Piaget, mas também de Kohlberg. Buscou
nos pressupostos teóricos desses dois autores apoio para a ação comunicativa. Com sua teoria,
Habermas conseguiu relacionar ontogênese e filogênese.
Segundo Bannwart Júnior (2003), quando assume os estágios da consciência moral
como representante teórico, estruturado e conectado pela lógica do desenvolvimento,
Habermas sinaliza uma trajetória que pode ser orientada. Nesse caso, assume-se que a
aprendizagem escolar é indispensável para as crianças perceberem os conflitos morais e
78

adquirirem competências cognitivas para viabilizar a passagem do agir comunicativo para o


estágio do Discurso.
Kohlberg procurou passar da ontogênese para a filogênese, ou seja, tentar relacionar os
estágios da consciência moral com as perspectivas sociomorais. Se Kohlberg deduziu dos
estágios da consciência moral (ontogênese) as perspectivas sociomorais (filogênese),
Habermas, ao contrário, mostrou que, “para justificar as perspectivas sociomorais
(filogênese), estas devem estar ligadas à compreensão da descentração do mundo,
compreensão essa que passa pela ontogênese da perspectiva do falante” (BANNWART
JÚNIOR, 2003).
A teoria da ética discursiva que Habermas difunde insere-se e apóia-se no processo
dos estádios de Kohlberg e, como o próprio afirma, ainda traz uma perspectiva de
complementaridade à teoria kohlberguiana: “a ética do Discurso também pode complementar
a teoria de Kohlberg na medida em que remete, de sua parte, para uma teoria do agir
comunicativo” (HABERMAS, 2003, p. 147).
Piaget, Kohlberg e Habermas defendem e (ou) baseiam-se no racionalismo,
cognitivismo e construtivismo. Apesar de não centrar seus estudos especificamente na
finalidade pedagógica, ainda assim Piaget, Kohlberg e Habermas trazem indicativos
relevantes para essa área. Para a educação escolar contribuir no processo de desenvolvimento
moral, resumidamente pode-se mencionar o trabalho de colaboração e de mediação do
professor, no lugar do individualismo e da autoridade unilateral ou da imposição, ou seja, a
presença da cooperação, do respeito e do estímulo à consciência dos princípios universais de
justiça (dimensão da autonomia moral), no lugar de qualquer tipo de coerção ou coação
(dimensão da heteronomia moral).
A correlação entre cognição e moralidade comprovada por Piaget e Kohlberg nos leva
a pensar que a escola deve educar “para o pensamento e não maioritariamente para o
conhecimento, ou seja, mais para o desenvolvimento de instrumentos de assimilação e de
construção do que, propriamente, para o ensino direto de conteúdos” (LOURENÇO, 2002,
p.161). Potencialmente a escola pode ser um espaço de promoção do desenvolvimento moral,
porque coloca em contato pontos de vista diferentes e quando permite a participação na
criação de regras e no exercício do poder e da responsabilidade (BAGÜES, 2003). No
entanto, “a escola constrói uma moral, muito frequentemente, mais de heteronomia que de
autonomia” (MENIN, 2003, p. 61).
Toda essa formação prática para a moralidade é exequível nos espaços escolares, na
prática pedagógica, nas disciplinas, nos conteúdos e em todas as situações. No entanto, uma
79

atenção é exigida nesse processo para não reduzir o trabalho da moral em sala de aula em
puro verbalismo ou moralismo, mas em uma prática inserida no tratamento de conteúdos, em
relações cooperativas e justas com os alunos (MENIN, 2002).

3.5 - Desenvolvimento moral e ética discursiva: críticas e subsistências

A literatura nos mostra que as teorias escolhidas por nós, para embasar os nossos
argumentos, não passaram imunes pelas críticas. O que não tira o mérito e as incontestáveis
contribuições delas para o conhecimento atual sobre o assunto.
Chilton (2002) é, por exemplo, um daqueles que tecem críticas às teorias de
Habermas. O autor diz que “busca o simultâneo resgate e reconhecimento do pós-
modernismo, situando-o como participante de uma estrutura dialética – a ‘ciência
reconstrutiva’ de Habermas” (p. 285), sendo os pressupostos de Kohlberg utilizados na
organização do posicionamento teórico do autor. Chilton faz a defesa do pós-modernismo
contra a acusação de relativismo e de auto-negação.

“Mas como pode Habermas provar que a sua compreensão dos pressupostos
argumentativos é correta? Aqui ele se volta ao que denomina “ciência
reconstrutiva”, uma lógica dialética em que a correção dos pressupostos
argumentativos deve provar-se na prática. Se o cético for capaz de formular
uma objeção ao argumento ético sem enredar-se numa contradição
performativa, então os pressupostos devem ser revistos para levar em conta
essa objeção, e o argumento ético decorrente deve ser alterado de modo
correspondente. A argumentação ética é assim reconhecida como
contingente, já que nunca podemos provar a exatidão dos pressupostos
argumentativos – embora a menos, e até que alguém consiga contorná-los, a
utilização do método da contradição performativa permita demonstrar, na
prática e para todos, a sua correção e a do sistema moral a que apela”
(CHILTON, 2002, p. 290).

Sobre as teorias de Kohlberg, há autores que tecem críticas em alguns aspectos


pontuais, como o princípio da universalidade dos estágios morais e a desconsideração do meio
e da afetividade no processo. Ainda que tenha respondido aos críticos e recebido auxílio de
outros autores, a crítica sobre esse aspecto ainda não se mostra totalmente esgotada.
Além da questão da universalidade, Kohlberg ainda sofreu outras críticas. Algumas
delas justas, analisadas e consertadas pelo autor. Outras, no entanto, injustas pelo não
entendimento das posições e dos argumentos de Kohlberg.
As teorias de Kohlberg também foram alvo de críticas das mulheres, por intermédio
dos trabalhos de Carol Gilligan, por causa do posicionamento ético feminino (ética do
80

cuidado) ter sido representado em estágio mais baixo que o da moralidade de justiça dos
homens (BIAGGIO, 2006; SETTELMAIER, 2002).
No entanto, as teorias de Kohlberg sobreviveram às críticas. Se assim não fosse, não
estaria a atrair novas pesquisas e pesquisadores sobre o desenvolvimento moral. E mais, os
fundamentos kohlberguianos ainda são frequentemente utilizados. Além de Georg Lind (na
Alemanha), podemos mencionar outros pesquisadores que seguiram ou ainda seguem a linha
da abordagem do desenvolvimento moral-cognitivo de Piaget e Kohlberg. Dentre eles,
destacamos especialmente Angela Biaggio (no Brasil) e Orlando Martins Lourenço (em
Portugal). Esses foram destacados por nós porque estudamos suas obras. No entanto, a
literatura nos informa um número maior de pesquisadores que, de alguma forma, se
aproveitaram (ou ainda se aproveitam) das obras de Piaget e Kohlberg para o embasamento de
seus estudos, tanto teóricos como empíricos (cf. BIAGGIO, 2006 e LOURENÇO, 2002).
Para finalizar este breve item, duas considerações. A primeira refere-se a apresentação
de algumas conclusões dos estudos de Georg Lind, da Universidade de Konstanz, na
Alemanha. Em seus estudos, tira as seguintes conclusões:

- cognição ou competência moral realmente existe, isso significa que a


existência e relevância podem ser demonstradas empiricamente. Esses
conceitos nos ajudam a entender melhor o comportamento (moral) do
indivíduo e as relações entre ideais morais por um lado e competência moral
por outro;
- que as capacidades morais estão significativamente relacionadas a uma
multiplicidade de notáveis fenômenos da vida (comportamento violento,
delinqüência, escolha de carreira, orientação política, aprendizagem etc.);
- que, ao contrário de Piaget-Kohlberg, o desenvolvimento moral-cognitivo
não ascende invariavelmente, pois pode sofrer uma regressão considerável
se a intensidade educacional cessa antes de alcançar um nível crítico de
capacidade moral;
- que, com exceção da hipótese de sequência invariante, todas as suposições
centrais da teoria de Kohlberg são válidas nos países industrializados e nos
países do leste europeu;
- e que a quantidade e qualidade da educação é uma condição necessária
e indispensável para o desenvolvimento da competência moral. Em todas
as investigações, independente do país, foi encontrada uma estreita relação
entre o nível de capacidade moral e o número e qualidade de informação
educativa (LIND, 2003, s.p., grifos nossos).

A segunda consideração refere-se ao não prejuízo das críticas aos trabalhos de Piaget,
Kohlberg e Habermas para os nossos propósitos, pois acreditamos que o núcleo das teorias, o
qual nos pautamos, permanece útil e válido em nossos argumentos.
81

3.6 - Parênteses à discussão: a Biologia, a neurociência e os aspectos ético-morais

Este item foi inserido porque há pesquisadores que contestam, dizendo que a moral
tem componentes inatos. Não nos cabe entrar nessa discussão, mas apenas dizer que as
relações de aprendizagem e desenvolvimento moral, nos contextos que apresentamos neste
trabalho, permanecem preservados.
De modo breve podemos dizer que a Biologia não foi construída para fornecer normas
éticas específicas, mas não podemos ignorar que os aspectos biológicos também podem nos
ajudam a compreender a construção dessas normas éticas. Os conhecimentos que temos
atualmente sobre os processos evolutivos nos capacitam a fazer escolhas mais eticamente
apropriadas. No entanto, “na maioria das vezes, tomamos nossa decisão ao aplicar
automaticamente as regras tradicionais de nossa cultura. Somente quando há conflito entre
várias regras é que fazemos uma análise racional” (MAYR, 2008, p. 333-346).
Darwin, de acordo com Mayr (2008), tinha conhecimento de que a inculcação de uma
crença durante a infância adquire quase a natureza de um instinto. Essa doutrinação levaria à
aceitação sem questionamento que podem ser encontradas em diferentes culturas. Portanto, a
educação ética é relevante e deve ser discutida, analisada, investigada. Tudo dependerá do que
queremos, do que acreditamos ser o caminho melhor.
A mente evoluiu, mas a moralidade, assim como o comportamento, ainda decorrem de
aprendizagem. A aprendizagem, hoje, ocorre em mente que evoluiu e está mais apta a
aprender do que outrora.
Pode-se dizer que há uma parte inata referente à aprendizagem que existe e que sofreu
um processo evolutivo. Esse argumento, no entanto, não significa dizer que já esteja nessa
parte inata todo o aprendizado ou que a aprendizagem seja pouco importante, mas que essa
estrutura, evolutivamente está mais apta a aprender.
Citando resultados encontrados por Pinker (1997, 2004), Lopes e Vasconcelos (2008,
p. 125) afirmam que:

O postulado de que existem módulos inatos, guiando atitudes e preferências,


não quer dizer que a aprendizagem é pouco importante. Mas significa que a
capacidade de aprendizagem, ou o próprio ato de aprender “... é possibilitado
pelo mecanismo inato projetado para efetuar o aprendizado. Afirmar que
existem vários módulos inatos é afirmar que existem várias máquinas de
aprender inatas, cada qual aprendendo segundo uma lógica específica”.

Com essa perspectiva baseada na psicologia evolucionista, conclui-se que “o que


evoluiu foi a mente e não o comportamento”. Os autores apontam que isso ocorre porque o
82

comportamento não é determinação somente de genes, mas de uma interação a envolver


genes, anatomia e fisiologia cerebral, educação escolar e não escolar, interações sociais e
estímulos diversos recebidos pelos indivíduos ou impostos a eles. “Desse modo, as raízes
biológicas da natureza humana expressa nos genes demonstram ser um significativo elo entre
evolução e comportamento” (LOPES; VASCONCELOS, 2008, p. 126).
Especificamente sobre o julgamento moral, há estudos da neurociência, como de
Greene (2005), Greene e Haidt (2002) e Greene e colaboradores (2008), que trazem
contribuições relevantes para a área da psicologia moral, pois indicam que fatores inatos
também contribuem para o julgamento moral, além de outros como o afeto e o raciocínio. No
entanto, ressaltamos o que dissemos de início: os resultados de tais pesquisas não prejudicam
os argumentos de correlação entre aulas de Ciências e desenvolvimento moral que aqui
levantamos.

3.7 - Destaques

• Moral não é completamente inata, decorre de aprendizagem. Piaget relata dois estágios de
moral: heteronomia - obediência motivada por controle externo, geralmente por interesse
egocêntrico (por exemplo, medo de castigo) - e autonomia - a obediência motivada por
controle interno, na escolha consciente de um princípio aceito como válido, mas mutável se
for justo (por exemplo, em prol da vida) e cuja responsabilidade social vem acompanhada por
essa consciência na escolha.
• As fases de heteronomia e de autonomia moral ocorrem juntamente aos estágios de
desenvolvimento intelectual.
• O estágio de heteronomia moral não deve ser visto como algo evitável, pois é fase
necessária; o que não se admite é que essa prática de unilateralidade coercitiva persista nas
práticas sociais a ponto de prejudicar o processo evolutivo moral da criança.
• A imposição e a coerção são elementos de relações humanas que não conseguem levar à
autonomia, pois reforçam a heteronomia. Cooperação, diálogo, acordo mútuo são elementos-
chave para favorecer o desenvolvimento da autonomia moral.
• Piaget dá relevância aos questionamentos dos alunos, que não podem estar ausentes das
aulas ou ser interrompidos por explicações reduzidas e unilaterais, por exemplo, pelo
conhecimento científico em nome de provocar mudanças conceituais em prol de apenas e tão
somente uma opção, a da ciência, mesmo que ela se explique a fortiori. As crianças devem
83

antes experimentar, expor suas ideias, entender por si mesmas, ampliando-se o universo delas
com opções que só ela poderá escolher.
• A ação mútua faz a criança compreender o que a mentira é e qual o valor social da verdade.
• Os estudos de Kohlberg ampliam os estágios de desenvolvimento moral: No nível Pré-
Convencional o valor moral reside em regras externas acerca do bem e do mal, do justo e do
injusto. No nível Convencional a moral está centrada na conformação da ordem convencional
e na satisfação de expectativas de outros. O nível Pós-Convencional caracteriza-se pela
distinção de valores e princípios válidos independentemente da autoridade.
• Piaget e Kohlberg, ambos baseando-se na universalidade dos princípios morais e tendo a
justiça como critério de regulação moral, concluíram em seus trabalhos que o
desenvolvimento moral é influenciado pela aprendizagem formal.
• O desenvolvimento moral não é puramente afetivo e o desenvolvimento cognitivo é uma
condição necessária, ainda que não suficiente, para o desenvolvimento moral. Esses vínculos
essenciais entre o desenvolvimento cognitivo e moral devem ser explorados em aula em prol
dos alunos.
• Os pressupostos da ética discursiva de Habermas apresentam convergências com o
desenvolvimento moral, busca de autonomia e construção de um espírito crítico, também
presentes nas teorias de Piaget e de Kohlberg.
• Pode-se pretender que algo seja bom ou verdadeiro (moral) impondo a força (heteronomia)
ou entrando num diálogo (autonomia) no qual os argumentos dos outros podem mudar sua
opinião. No primeiro caso, há uma pretensão de poder (heteronomia moral); no segundo, uma
pretensão de validade (autonomia moral). Quando vencem as pretensões de poder, se aplica o
argumento da força (desfavorável ao desenvolvimento moral). Quando se abrem às pretensões
de validade, se impõe a força dos argumentos: “coação sem coação do melhor argumento”.
• O discurso ético é forma de comunicação que tem objetivo de fundamentar as pretensões de
validade das opiniões e as normas de interação. Por meio da linguagem, busca-se o consenso
de uma forma livre de toda coação externa e interna.
• Piaget, Kohlberg e Habermas defendem e (ou) têm suas bases no racionalismo, cognitivismo
e construtivismo, em princípios morais de justiça, solidariedade, verdade.
• Se a inculcação durante a infância adquire quase a natureza de um instinto (aceitação sem
questionamentos), como apresenta Darwin, o ensino de Ciências tratado com procedimentos
de inculcação fará com que a ciência também tenda a adquirir semelhante natureza instintiva,
ou seja, o conhecimento científico terá/receberá um caráter acrítico. O ensino de Ciências
tratado com procedimentos de inculcação não servirá de estímulos ao desenvolvimento moral.
84

PARTE II
CORRELAÇÕES

Canção Amiga

Eu preparo uma canção


em que minha mãe se reconheça,
todas as mães se reconheçam,
e que fale como dois olhos.

Caminho por uma rua


que passa em muitos países.
Se não me vêem, eu vejo
e saúdo velhos amigos.

Eu distribuo um segredo
como quem ama ou sorri.
No jeito mais natural
dois carinhos se procuram.

Minha vida, nossas vidas


formam um só diamante.
Aprendi novas palavras
e tornei outras mais belas.

Eu preparo uma canção


que faça acordar os homens
e adormecer as crianças.

(de Carlos Drummond de Andrade,


publicado em “Novos Poemas”,
pela José Olympio, Rio de Janeiro, 1948)
85

4.0 - AULAS DE CIÊNCIAS E DESENVOLVIMENTO MORAL: UMA


ABORDAGEM PRELIMINAR SOBRE OS ASPECTOS CORRELATIVOS

“Tais implicações vão desde os problemas


escaldantes e controvertidos do aborto, eutanásia
e pena de morte, por exemplo, aos que decorrem
do progresso científico e tecnológico, como os da
clonagem de seres humanos ou da observação de
embriões, para referir apenas alguns casos. A
suposição é que o estudo do desenvolvimento
moral pode ajudar-nos a ver tais questões de um
modo mais informado e científico e, em
conseqüência, a advogar decisões mais
esclarecidas e morais” (LOURENÇO, 2002, p.
15).

Questões de ética e de moralidade inevitavelmente fazem parte das aulas de Ciências,


deixando os professores expostos constantemente ao tratamento desses problemas (FRAZER;
KORNHAUSER, 1986). Muitos são os temas que trazem polêmica e necessariamente
envolvem aspectos de dimensão axiológica e atitudinal: eutanásia, aborto, alimentos
transgênicos, clonagem, sexualidade, origem e evolução do homem, clitoridectomia, meio
ambiente, reprodução (figura 3).

Figura 3. Tira que ilustra as questões éticas da Educação em Ciência18

Essa característica de envolvimento do ensino de Ciências com questões éticas e


morais aparecem em discussões diversas na literatura. Na sequência, escolhemos e
destacamos algumas dessas discussões para iniciarmos uma aproximação entre as ideias
contidas nos respectivos argumentos que envolvem o ensino de Ciências e as perspectivas
sociomorais das teorias de Piaget, Kohlberg e Habermas (e outros autores que se alinham a

18
Reprodução autorizada pelo autor, o cartunista Laerte.
86

essas ideias). Posteriormente, apresentamos dados, análises e argumentos que buscam


demonstrar uma válida e viável correlação que vemos estabelecer entre o aporte teórico-
prático laico e racional do desenvolvimento moral e as aulas de Ciências, permitindo avançar
nos conhecimentos que envolvem ensino-aprendizagem de Ciências em sala de aula para
estudantes em processo de formação intelectual e moral. Por fim, iremos delinear o estado
sobre a inserção de aspectos referentes à formação moral em pesquisas da área de Educação
em Ciências no Brasil, a fim de posicioná-las quanto ao tema.
Os tópicos que trazem diferentes aspectos éticos e morais que implicaremos o
desenvolvimento moral abordam os seguintes temas: “Ciência, religião e tolerância”;
“Diferenças entre ciência e ensino de Ciência nas questões éticas e morais”; “A dominância
hierárquica da ciência e os respectivos impactos na sociedade e processo educacional
escolar”; “Os discursos em aula sobre a ciência e as possíveis interferências na aprendizagem
intelectual e moral”; “As exigências cognitivas e morais para um ensino de Ciências que visa
à atuação cidadã”; “O ensino sobre a natureza da ciência e seus respectivos impactos à
educação científica e evolução moral dos alunos”; “As controvérsias dos assuntos
sociocientíficos em aula e a construção de um pensamento crítico e moralmente autônomo”.
Apesar de separados em itens, há nítidos pontos de convergências e entrelaces entre os
argumentos apresentados. A separação em itens teve intenções meramente didáticas de
apresentação.

4.1 - Ciência, religião e tolerância

Os argumentos e ideias apresentados por Fischmann (2008), a seguir, foram por nós
escolhidos porque são úteis em determinados pontos de nossa discussão, especialmente sobre
as questões de laicidade.
A autora nos coloca que há diferentes possibilidades de análises para compreender as
relações entre ciência e Estado laico, como é o caso do Brasil. Relações essas que, por vezes,
não são cordiais ou pacíficas, “mas, ao contrário, freqüentemente marcada[s] por acusações de
heresia dirigidas a cientistas que chegavam, em suas investigações, a achados distintos do que
pregavam dogmas ou a doutrina da Igreja Católica” (FISCHMANN, 2008, p. 42).
Fischmann faz uma análise exploratória, buscando apontar vertentes dessa conturbada
relação, convidando o leitor ao debate que, segundo ela, é necessariamente interdisciplinar.
Para tanto, entrelaça seus argumentos a artigos da Declaração Universal dos Direitos
Humanos, de 1948.
87

A racionalidade é ponto central dos pressupostos apresentados pela autora. E esse é


um dos aspectos fundamentais também em nossa construção argumentativa. Sobre esse
aspecto, Fischmann, ao apresentar ciência e religião como duas manifestações humanas,
destaca que :
[...] tratar a religião como manifestação humana não é desrespeito a qualquer
religião, mas reconhecimento da limitação humana, que é também a desta
pesquisadora, que se pode valer apenas da argumentação racional ao operar
na esfera pública, que é onde se dá o debate científico; portanto, é uma
apresentação feita em termos do que racionalmente posso alcançar,
independentemente daquelas que sejam minhas crenças pessoais, em
especial por dirigir-me, aqui, a outros dos quais posso pedir adesão racional
apenas ao diálogo e no limite do que é proposto neste âmbito de um simples
artigo (FISCHMANN, 2008, p. 43).

Lembra a autora que a Declaração Universal dos Direitos Humanos insere num mesmo
artigo (artigo 18) o direito à liberdade de pensamento e de consciência, com o direito à
liberdade de religião. Portanto, em espaço público, seja individual ou coletivamente, a
ninguém deve ser imposto crenças aos outros.
Então, num mundo caracterizado pela diversidade, tolerância e respeito são elementos
a serem buscados. Elementos esses que têm implicações também com a produção de
conhecimento na busca da verdade. Aproveitando-se dos argumentos de Bobbio (1992, p. 46),
são apresentadas três razões que colocam a tolerância como fator relevante na busca da
verdade, “no tema da ciência e da relação entre cientistas, bem como para analisar a
possibilidade de diálogo com as religiões, no âmbito das garantias proporcionadas a todos
pelo caráter laico do Estado”.
A primeira razão não teria a ver diretamente com a verdade, pois a tolerância estaria
pautada apenas em suportar o outro, como simples estratégia do mais forte ou mais astuto
para não deixar o outro, de quem discorda, crescer ou, ainda, por necessidade de não ver o
outro se rebelar.
A segunda razão refere-se à universalidade da tolerância como método de convivência
civil. Um entendimento buscado por meio da argumentação ao invés da força e coerção. Nas
palavras de Bobbio (1992, p. 207 apud FISCHMANN, 2008), “recusa consciente da violência
como único meio para obter o triunfo das próprias idéias”.
A terceira razão é baseada no princípio moral, do respeito à liberdade da pessoa. “Se o
outro deve chegar à verdade, deve fazê-lo por convicção íntima e não por imposição. [...] a
tolerância [...] é a única resposta possível à imperiosa afirmação de que a liberdade é um bem
88

demasiadamente elevado para que não seja reconhecido, ou melhor, exigido” (BOBBIO,
1992, p. 209 apud FISCHMANN, 2008).
Dessa forma, a tolerância torna-se base para que a verdade seja alcançada no confronto
de diferentes visões, pois apresenta-se “como necessidade inerente à natureza da verdade – e,
evidentemente, de toda elaboração científica e da própria ordenação da comunidade
acadêmica” (FISCHMANN, 2008, p. 47).
Essa exposição de argumentos nos leva a relacionar tolerância com o fazer científico,
porque a ciência se vale de uma lógica de cooperação, de debate e de críticas na busca da
verdade e não de simples adesão. A ciência trabalha hipóteses e argumentos que se estendem
numa faixa de termos da seguinte espécie: aceitável – inaceitável; provável – improvável;
plausível – implausível etc. Diferente das religiões, que não se valem dessa lógica.

Enquanto a lógica que é utilizada, buscada e aperfeiçoada pelo mundo


científico é a da cooperação e do debate, buscando aproximações da verdade
pelo escrutínio das idéias, no sentido “multiverso” proposto por Bobbio, e no
qual a tolerância como prática é indissociável da aproximação da verdade, a
lógica dos mundos religiosos será de outra ordem, plural como são as
identidades e manifestações religiosas, algumas vezes na dependência da
submissão e portanto operando com o domínio, se não de seres humanos uns
sobre os outros, de idéias e doutrinas sobre o conjunto dos seus adeptos
(FISCHMANN, 2008, p. 47).

Por fim, cabe ressaltar que o termo tolerância apresentado nos argumentos acima tem
base na Declaração Mundial de Princípios Sobre a Tolerância (UNESCO, 1995, item 1.4):
“[...] praticar a tolerância não significa tolerar a injustiça social [...], significa que toda pessoa
tem a livre escolha de suas convicções e aceita que o outro desfrute da mesma liberdade. [...]
Significa também que ninguém deve impor suas opiniões a outrem”.
Trazendo tais argumentos, ideias e princípios para a Educação em Ciências, podemos
inferir que, mesmo nas diferenças de objetivos que se colocam entre a ciência e o seu ensino
em sala de aula, a lógica da relação entre tolerância e busca da verdade traz relevantes
subsídios ao trabalho docente, especialmente em possibilidades de oferecer ao aluno uma
lógica que o fará mais crítico de si próprio diante de todos os seus conhecimentos.

4.2 - Valores na ciência e nas aulas de Ciências

Entendemos que Ciência e ensino de Ciências apresentam ambos aspectos de ética e


de moral, mas com diferenças relevantes entre si. Nesse caso, estamos de acordo com Valente
89

(2000) quando diferencia os sistemas de valores e crenças envoltos na ciência e no ensino de


Ciências, afirmando que ambos apresentam-se em planos e níveis de lógica diferentes. A
autora faz um agrupamento em quatro níveis: a) o que se pensa sobre a ciência e o que se
pensa sobre a educação; b) as crenças que envolvem a própria ciência (inteligibilidade do
mundo) e a educação (escolha do currículo e o valor a atribuir ao ensino das ciências); c)
escolha dos tópicos considerados mais relevantes dentro do próprio ensino das ciências; d)
métodos, estratégias e procedimentos de ensino, que refletem valores filtrados pelo professor
a incidir no modo como se ensina.
No ensino de disciplinas científicas esses valores estão envoltos, por exemplo, na
maneira como se ensina energia e reprodução, ou em relatos de experiências com pessoas ou
animais, ou em polêmicas nas relações entre a ciência e a cultura, a ciência e a religião, o
ambiente e o homem e muitos outros. Em cada um deles encontramos oportunidades para
relevantes reflexões ético-morais (VALENTE, 2000).
Esses valores, no entanto, nem sempre são considerados, podendo levar a
reducionismos que aproximam ciência e o seu ensino a crenças de neutralidade ou de
verdades absolutas. Nesse caso, se os valores e crenças não são identificados ou examinados,
“impõem-se como crença geral, tornam a ideologia que os sustenta poderosa e envolta no
manto diáfano da neutralidade ou da verdade indiscutível” (VALENTE, 2000, p. 1).
Essa desconsideração, por vezes, é sustentada pela excessiva tarefa que os professores
têm no desempenho de suas funções, aos poucos recursos disponíveis e à ideia de que
professor de Ciências deve ensinar somente ciências e não entrar nas questões complexas de
valores.
A ideia de verdade que a ciência transporta também traz implicações axiológicas que
os professores de Ciências devem atentar.

A ideia de ciência transporta consigo a ideia de uma verdade (ainda que


provisória), não resultante apenas da actividade social mas também de
“verdades objectivas” do mundo natural. Por isso não é compatível com
qualquer forma de relativismo conceptual, uma forma de relativismo em que
a variedade de crenças e valores é uma consequência não de haver verdades,
sendo a verdade aquilo que assim é considerado por uma dada sociedade.
Importa distinguir entre a fonte de uma ideia por um lado e a verdade por
outro. Isto é, distinções entre as causas de uma crença e as evidências
associadas às crenças (VALENTE, 2000, p. 2, grifos do autor).

As relações entre ciência e sociedade fazem parte de um outro aspecto a ser


enfatizado, corroborando o que a literatura traz amplamente difundido, de que a ciência deve
ser acessível a todos e não apenas ficar restrita a poucos expertos. No entanto, sem abrir mão
90

da razão e um “adversário do dogmatismo”. Como diz Allègre (1997 apud VALENTE, 2000),
a ciência não é um dogma, pois se se transformasse nisso deixaria de ser ciência, mas muitos
continuam a ter dela, ciência, uma visão bastante dogmática.
Todos esses argumentos traz implicações de responsabilidade para o ensino de
Ciências, que Valente (2000, p. 7, grifo do autor), assim resume.: “Para além de ensinar a
própria ciência, o seu fazer-se e o seu corpo de conhecimento, é preciso ajudar a integrar a
ciência nas nossas crenças e convicções”.
Em resumo, entendemos que o ensino de Ciências tem elementos de complexidade,
quanto às questões éticas e morais, que exigem permanente reflexão. Dentre os diversos,
destacamos um que envolve o desenvolvimento moral: as discussões de conhecimentos
científicos entre cientistas e as discussões de conhecimentos científicos nas salas de aula têm
suas peculiaridades de forma e de conteúdo (de um lado, pares adultos e com níveis
intelectuais e morais teoricamente desenvolvidos, tratam o assunto numa gradação única e
elevada e se reúnem com objetivos não formativos; de outro lado, relações entre professor
adulto e alunos - crianças, adolescentes e jovens -, que devem tratar o assunto em gradações
diversas, a respeitar níveis psicobiológicos, e pautados por objetivos formativos quanto ao
intelecto e ao desenvolvimento moral).

4.3 - Ciência, ensino de Ciências e hierarquias

Há muitas maneiras de construir uma interpretação da realidade. Todavia, a científica


atualmente predomina. Assim como no século XIII a “ortodoxia dominante” era o
Cristianismo, hoje é a ciência que se apresenta como uma “ortodoxia dominante” nas
interpretações dos fenômenos e na construção da realidade, apagando as contribuições da
filosofia, da arte e da religião nesse processo (HEGENBERG, 1969, p. 9). Apesar desse poder
aparente dado à ciência, ela não é capaz de apresentar uma verdade global e universal que seja
infalível (FOUREZ, 1995). A ciência nos propõe enunciados verificáveis, mas não verdades
imutáveis. Por outro lado, a ciência não se propõe a resolver questões de escolha de valor,
ainda que ela própria levante esses tipos de problemas (GRANGER, 1994).
Essas perspectivas sobre a ciência dificilmente aparecem no “universo científico
escolar”, pois a exigência está mais em encontrar respostas do que na capacidade de pensar
sobre esses problemas (OLIVEIRA, 2005, p. 69). Configura-se, nesse caso, um obstáculo
indesejável para o aprendiz.
91

Integrar a ciência e o seu ensino por intermédio dessa perspectiva é mais uma
exigência que recai sobre os professores. Quando “os alunos aprendem a elaborar razões que
lhes permitem aceitar ou rejeitar as formas de atuação que existem em seu meio, são capazes
de descobrir aspectos da realidade objetiva e subjetiva que antes lhes passavam
despercebidos” (SASTRE; FERNANDEZ, 1998, p. 167).
Na perspectiva de favorecimento do desenvolvimento moral, espera-se do professor
um esforço consciente e deliberado a fim de que aos alunos seja permitido “fazer a mente
deles próprios” à luz de todas as evidências abordadas (LEWIS, 1986). Ensinar Ciências a fim
de propiciar o desenvolvimento moral subentende, portanto, trabalhar as intenções, os
contextos de valores e ideologias que se fizeram presentes na história e que ainda se fazem em
todas as situações interpessoais e de conteúdo, incluindo a sala de aula. Nesse caso, cabe
discutirmos também sobre as ideologias inseridas nos discursos de aula, às vezes, não
percebidos e não correlacionados com aspectos de formação moral (vide ANEXO G).
Na história mundial, as relações de poder e autoridade poderiam se tornar lição
poderosa para todos os nossos alunos. Mostraria a eles como constantemente “nós somos
influenciados e afetados pelas autoridades institucionalizadas (igreja, governo, sistemas de
ensino, ciência) e autoridades individuais (pastores, políticos, professores, cientistas), na
medida em que confiamos nelas”. No entanto, temos que ter a capacidade de, como membros
da sociedade, avaliar as ações dessas autoridades. “Avaliar as questões de poder e autoridade,
direitos e deveres envolve raciocínio moral”, o que nos remete a buscar aportes teóricos que
nos auxilie a lidar com essas questões nas escolas. Nesse caso, conhecer as teorias sobre
desenvolvimento moral se torna bastante útil, pois seus estudos postulam que “o objetivo
primário da educação deve ser o desenvolvimento do raciocínio moral”. “Assim, a melhor
forma de facilitar os alunos na avaliação de autoridade seria o de promover a progressão da
fase de moral, isto é, proporcionar um ambiente educativo que incentiva o desenvolvimento
do raciocínio pós convencional”. Há outras linhas teóricas que também oferecem aportes
sobre moralidade, que focalizam algumas especificidades sobre essa temática, e que podem se
juntar no auxílio de constituir competências necessárias para avaliar a autoridade (SADLER;
ZEIDLER, 2003, p. 262).
Retomando o que brevemente mencionamos no início deste tópico acerca do impacto
de autoridade da ciência sobre a sociedade e as implicações para o ensino nas escolas,
podemos complementar com Sadler e Zeidler (2003):
92

Os estudantes tendem a ver a ciência como uma autoridade monolítica e em


aceitar passivamente o poder de sua autoridade, devido sua posição firme e
de suas tradições estabelecidas de sucessos passados [...]. Ciência resume
conhecimento - e a criança em idade escolar ouve frases que entram em sua
mente ditas por educadores bem intencionados de que “conhecimento é
poder!” [...] “O poder da sugestão!” A ciência tende a ser vista como uma
autoridade acima de tudo, sugerindo aos alunos inconscientes e muitos
adultos que o conhecimento gerado pelo empreendimento científico deve ter
importância e, por isso, ou sua utilidade deve ser boa (SADLER; ZEIDLER,
2003, p.263).

O ensino de Ciências não deve ser instrumento para essa confirmação equivocada. Os
alunos, como dito anteriormente, devem aprender a avaliar as autoridades, requerendo para
isso o uso de raciocínio moral. “Portanto, para satisfazer os objetivos da educação científica,
os educadores de ciências devem lidar com questões morais e atender ao desenvolvimento
moral dos alunos” (SADLER; ZEIDLER, 2003, p. 263). Erros da ciência do passado podem
ser usados para exemplificar abusos de autoridade. Casos diversos contendo impactos que
relacionam ciência e sociedade têm potenciais pedagógicos no desenvolvimento de
habilidades do raciocínio crítico, porque nesses casos podem ser destacados e discutidos os
erros e os respectivos raciocínios falaciosos que podem levar à bad science. Sadler e Zeidler
(2003) trazem os seguintes exemplos: a) Estudos antigos de frenologia e craniologia; b)
Testes de inteligência e raças; c) Experiências de Tuskegee sobre sífilis entre pessoas de raças
diferentes; d) Estudos parciais e conduzidos por indústrias do cigarro sobre os efeitos do
tabaco; e) Efeitos da radiação e os experimentos iniciais com as bombas atômicas; f)
Utilização generalizada de DDT; g) CFC e a degradação de ozônio; h) Espécies exóticas.
Esses casos envolvem o uso de autoridade e exemplos de aceitação e de resistência.
Em ambos os casos os conhecimentos científicos foram utilizados (ou omitidos) e as questões
morais também estiveram envolvidas. Os cidadãos devem ser capazes de fazer essas
distinções. E isso nos remete novamente ao ensino em geral e, em especial, o de Ciências. Os
autores defendem que esses e outros casos de bad science possuem elementos que, se
aproveitados em discussões de aula, possibilitam a promoção do desenvolvimento moral dos
alunos.
Em todos esses casos podemos traçar paralelos com o processo de desenvolvimento
moral. Vemos na teoria de Piaget que os indivíduos passam por uma fase inicial de
heteronomia moral, caracterizada pela aceitação cega às solicitações da autoridade de um
adulto. Isso ocorre porque na mente da criança o certo e o errado são determinados pelos
adultos. Essa obediência hetorônoma tem paralelos junto às pessoas que tomam posição
93

acrítica e de fé cega em relação à ciência. “Em nossa sociedade, declarações atribuídas à


ciência tem mais peso do que aquelas que não”. As teorias de Piaget e Kohlberg sugerem que
as crianças sejam mobilizadas para estágios mais avançados de desenvolvimento moral,
capacitando-as a avaliar as situações por meio de um quadro mais amplo que distancie da
aceitação por motivos externos ou outras imposições. Afinal, indivíduos em fases de
desenvolvimento moral mais avançadas mobilizam considerações diversas, incluindo questões
de justiça universal e reciprocidade (SADLER; ZEIDLER, 2003, p. 280).
Transportando-se essa ideia para as aulas de Ciências, teremos a oportunidade de
formar alunos que neguem a autoridade monolítica da ciência. Isso não pode ser entendido
que o objetivo do ensino de Ciências nas escolas seja de negar a ciência e os seu respectivos
conhecimentos produzidos.
Concordamos com Sadler e Zeidler sobre a seguinte ressalva que fazem:

No ensino da ciência, a correlação com os estágios avançados de


desenvolvimento moral está na capacidade dos alunos de negar a autoridade
monolítica da ciência. Nós não estamos tentando recomendar que o objetivo
do ensino de ciências deve ser para derrubar a ciência. Estamos, no entanto,
sugerindo que aos alunos sejam dados a oportunidade de se libertarem da
dependência cega da ciência. Para compreender inteiramente o poder e os
benefícios potenciais da ciência, os alunos devem também estar conscientes
de suas deficiências e desvantagens. A maioria dos resultados e produtos da
ciência não tem consequências devastadoras como as relatadas neste capítulo
[exemplos de bad science], mas os alunos devem ter as habilidades
necessárias para julgar o mérito da atividade científica e descoberta
independente da autoridade do nome carrega (SADLER; ZEIDLER, 2003, p.
281).

A defesa que os autores fazem, e que concordamos, é que os professores tenham a


responsabilidade de trabalhar a ciência como ela se apresenta, ou seja, com falhas e com
triunfos. Infelizmente podem existir cientistas e professores de Ciências que aproximam
demasiadamente e de forma acrítica, por meio de discursos diversos, a verdade absoluta da
ciência. Os livros didáticos também atuam nesse sentido, pouco auxiliando na formação
crítica e no desenvolvimento moral dos alunos.
Sadler e Zeidler (2003) não propõem que os estudos de bad science substituam outras
abordagens no processo de ensino, mas que se constituam uma ferramenta a mais para os
professores relacionarem ciência e sociedade, com potencialidades de atuação sobre o
raciocínio moral dos alunos. Além disso, também podem ser usados em sala de aula para
abordar o caráter experimental da ciência. Por isso, esses casos reais deveriam ser mais
utilizados. Estudantes de Ciências e os cidadãos em geral precisam estar cientes de que todos
94

os conhecimentos podem mudar, mas um conhecimento científico é muito bem apoiado. “Os
estudantes não podem desenvolver uma compreensão dessas realidades sem pensamento
crítico (avaliação de argumentos, suposições e conclusões) ou raciocínio moral (discernir o
certo e o errado, o justo e o injusto)” (SADLER; ZEIDLER, 2003, p. 281). Assim, introduzir
esses casos proporciona uma excelente oportunidade para os alunos utilizarem e
desenvolverem o pensamento crítico e o raciocínio moral em sala de aula de Ciências, além
de outras possibilidades sobre questões relacionadas à natureza da ciência. Esses casos se
aproximam das sugestões de Kohlberg, porque se assemelham de dilemas morais capazes de
estimular o desenvolvimento moral. E incluem um elemento a mais. Enquanto nos casos dos
dilemas de Kohlberg os conteúdos em si não são projetados para interferir sobre o raciocínio,
esses casos integram conteúdo real em processo no ambiente imediato. Os desafios propostos
à discussão são reais e não fictícios.
Ao nos apoiarmos em objetivos de educação voltados para o desenvolvimento do
pensamento crítico, do raciocínio moral e da argumentação, não podemos apenas apresentar a
ciência como fato verdadeiro. “Como podemos esperar que os alunos avaliem criticamente as
informações se elas forem apenas apresentadas com ‘fatos’, afirmando-se enfaticamente que
são verdadeiras?” (SADLER; ZEIDLER, 2003, p. 282).
A ciência ainda é a saída, pois encontra na racionalidade a posição mais consistente
não somente da crítica, mas na capacidade de reversão do quadro de pessimismo difundido
por segmentos pós-modernos. E a escola, por meio da educação formal (aqui inserimos com
notável potencial o ensino de Ciências), tem papel relevante nesse processo. Desde que
trabalhe a ciência como a ciência é, como está sendo utilizada na disputa de poderes
hegemônicos, como se diferencia dos demais tipos de conhecimentos, como pode fazer parte
do bem estar de todos, como é um bem de apropriação acessível ao qual podemos discutir e
escolher (ou não) como conhecimento instrumental de emancipação da humanidade.
Parece algo paradoxal dizer que na ciência e no ensino de Ciências encontramos a
saída para a ruptura de uma dominação, sendo a própria ciência responsabilizada por essa
mesma dominação, como nos apresenta Goergen (2001, p. 8): “Aquilo que um dia foi
imaginado como um porvir glorioso no final das contas não deixou o homem mais feliz. Livre
da submissão religiosa e guiado unicamente por sua razão, o homem seria dono de seu
destino, imaginava-se”. No entanto, tornou-se ela mesma em nova forma de alienação (ou
melhor, nós a tornamos assim).
Essas e outras questões (que obrigatoriamente envolvem aspectos éticos), para serem
discutidas e (ou) implementadas, carecem de elementos que a educação formal estimula (ou
95

não?). Nesse caso, a saída para uma nova humanidade que contempla a razão (e não
simplesmente aniquila, como alguns desejam) ainda se apresenta nos processos de educação
formal. Como diversos autores afirmam, entre eles Goergen (2001, p. 9), “a mudança de
mentalidade, o nascer de uma nova consciência precisam ser estimulados através do processo
educativo, educação e formação ética se tocam, necessariamente”. E isso não pode ser apenas
retórica, não pode cair em discurso vazio. Nesse caso, o tratamento do conhecimento
científico na escola não pode ocorrer de forma autoritária ou brutalizada, ignorando-se de
partida os demais tipos de conhecimento que os estudantes trazem consigo de outros lugares.
Acreditamos, juntamente com Vinha e Tognetta (2009), que, apesar das intenções ou
discursos contrários, não vem ocorrendo na educação escolar as devidas oportunidades para o
desenvolvimento moral dos alunos. O que vemos ainda é um ambiente escolar em que
predomina a submissão à autoridade e obediência acrítica ao que o professor diz.

Todavia, uma educação pautada na submissão à autoridade e na obediência


acrítica às regras, sem a compreensão das necessidades ou dos princípios que
as embasam, principalmente por conformismo e pelo temor de situações
constrangedoras ou de punições, poderá modificar ações (externamente),
mas dificilmente contribuirá para integrar ou situar os valores morais em um
lugar central na personalidade, o que acarretaria em atitudes mais
autônomas, isto é, coerentes com estes valores independentemente das
pressões do meio exterior. Auxiliar na aprendizagem dos alunos e, ao mesmo
tempo, favorecer seu desenvolvimento sociomoral podem aparentar serem
problemas diferentes, mas não o são. Esta dissociação é equivocada, pois são
sistemas solidários, visto que os eventos de desavenças pessoais e os de
aprendizagem estão incorporados, fundem-se. A obtenção de relações
equilibradas e satisfatórias (o que não significa que os conflitos estarão
ausentes) não são frutos de um dom gratuito ou de desenvolvimento
maturacional; mas sim, decorrentes de um processo de construção e
aprendizagem. A criança ou jovem não irá aprender por si mesmo uma
questão que é muito complexa e para a qual não foram previstas boas
intervenções e oferecidas situações que lhe auxiliassem a aprender o que
necessita. Porém, raramente se percebe a preocupação das instituições
escolares com as possibilidades pedagógicas dos conflitos, sendo que seus
esforços nesta área estão mais voltados para conseguir um “bom
comportamento” do aluno (muitas vezes por medo ou conformismo) e para a
contenção do conflito do que para a aprendizagem (VINHA; TOGNETTA,
2009, p. 537).

Se os alunos tiverem bases formativas sólidas na criticidade, por meio de uma


mobilização do potencial de estímulo ao favorecimento do desenvolvimento moral que o
ensino de Ciências oferece, os efeitos desse aprendizado se incorporam ao conjunto de
saberes dos indivíduos capazes de quebrar um ciclo que vemos transmitidos, por exemplo, nos
moldes em que Tardiff aponta:
96

Em seu trabalho, um professor se serve de sua cultura pessoal, que provém


de sua história de vida e de sua cultura escolar anterior; ele também se apóia
em certos conhecimentos disciplinares adquiridos na universidade, assim
como em certos conhecimentos didáticos e pedagógicos oriundos de sua
formação profissional; ele se apóia também naquilo que podemos chamar de
conhecimentos curriculares veiculados pelos programas, guias e manuais
escolares; ele se baseia em seu próprio saber ligado à experiência de
trabalho, na experiência de certos professores e em tradições peculiares ao
ofício de professor (TARDIFF, 2000, p. 13).

Portanto, quando os professores atuam, suas crenças são reativadas para solucionar
problemas. É um círculo vicioso: o que se aprende ao longo do tempo, torna-se útil e
aplicável. Portanto, desde criança deve-se tratar essa questão do desenvolvimento moral:
cooperação, justiça, diálogo etc.

4.4 - A relevância do “hablar ciencia” nas aulas de Ciências

Abrimos este tópico apresentando brevemente uma pesquisa de opinião CNT/Sensus,


divulgada pela revista Veja19, em que foram apresentados, entre outros, os seguintes
resultados: i) 61% dos pais entrevistados sabem que os professores fazem discursos
politicamente engajados e doutrinadores a seus filhos; ii) a maioria dos professores reconhece
que doutrinam mesmo as crianças e acham que essa é sua missão principal.
Os resultados dessa pesquisa não se distanciam das discussões, a seguir, sobre os
discursos e seus aspectos subjacentes ao ensino e aprendizagem de Ciências. Sobre esse tema,
damos especial relevância ao trabalho de Lemke (1997) sobre os problemas de comunicação
entre professores e alunos, que acabam reforçando uma visão equivocada de ciência no
universo escolar.
Juntando-se a outros pesquisadores da área, Lemke (1997, p. 139-141) afirma que o
ensino de Ciências não vem cumprindo com eficácia o papel de apresentar a ciência como
uma das formas de se falar acerca do mundo. Pelo contrário, “hoje em dia o ensino de ciências
contribui com demasiada frequência a favorecer a ‘mística’ da ciência”. O autor refere-se à
proclamação que se faz da ciência como “a forma em que se é o mundo”, como já
mencionamos anteriormente. E complementa, afirmando que, “não somente ensinamos
ciências, mas comunicamos, frequentemente sem darmos conta, um conjunto de atitudes
daninhas acerca da ciência”. Essa ocorrência se dá, muitas vezes, nas atitudes positivas e de

19
Revista semanal brasileira, da editora Abril, edição número 33, ano de 2008, páginas 76 a 87.
97

sucessos dos cientistas que os professores tentam transmitir aos alunos, na tentativa de fazê-
los gostar da ciência. Essa atitude, no entanto, não é benéfica, pois ajuda a reforçar uma
mística especial sobre a ciência que apenas favorece os interesses de uma pequena elite. “É
uma elite tecnocrática: administradores que tratam de controlar a tomada de decisões
apelando às descobertas dos especialistas”. Com isso, acabam afastando o entendimento dos
alunos de que eles também podem atuar e intervir em tais decisões e que essa tarefa não é
apenas dos especialistas.
De acordo com Lemke (1997, p. 141), a tendência que o ensino de Ciências tem de se
opor sistematicamente ao senso comum acaba debilitando a confiança dos alunos, servindo-se
apenas para consolidar a submissão “ao que os detentores do poder dizem que, segundo ‘os
expertos’ temos que fazer”. Nesse caso, temos que “aprender como ensinar contra essa
‘mística’ da ciência”.
A preocupação não pode se restringir apenas a conteúdo, mas também a “como”
ocorre o ensino de Ciências. E isso inclui “a forma em que falamos de ciência” (LEMKE,
1997, p. 142). Afinal, a forma como ocorre o ensino de Ciências também traz consequências
para a construção de uma ideia de ciência nos estudantes. Se mal utilizada em sala de aula, a
linguagem pode estabelecer uma falsa ideia da dimensão científica (figura 4).

Figura 4. Charge sobre o uso possível da ciência no discurso do professor20 (Fonte: BIZZO, 1993)

As ciências, assim como ocorre com outras atividades humanas especializadas, têm
uma linguagem própria que combina conteúdo e estilo. Para Lemke (1997, p. 143), o estilo
(na escrita ou na oralidade) utilizado na linguagem científica reforça o efeito de

20
Tradução: “A evolução biológica é um processo cujo progresso culmina com vosso professor sobre este
tablado (cátedra)”.
98

distanciamento entre a ciência e os seus agentes ou atores. Refere-se, entre outros, à


preferência de emprego gramatical da voz passiva e de substantivos abstratos derivados de
verbos. Essa estratégia contém traços sutis de um estilo, cujo efeito cumulativo “é dar uma
imagem da ciência como uma simples descrição da maneira em que é o mundo, mais que uma
atividade social e humana, um esforço para dar sentido ao mundo”.
Após apresentar uma lista contendo nove normas estilísticas da linguagem científica,
Lemke (1997, p. 146) tece críticas quando elas assim chegam à sala de aula, pois é um tipo de
estilo que limita o interesse e a compreensão dos estudantes acerca da ciência, reforçando a
mística em torno dela: “Essas regras são a pauta de uma linguagem torpe e alienante. [...] Elas
conduzem a que os alunos e as pessoas em geral suponham artificial e enganosamente que a
ciência permanece de alguma maneira fora do mundo da experiência humana” (LEMKE,
1997, p. 146).
O autor acredita que na maior parte do tempo os alunos não seguem o significado
completo do que o professor está dizendo sobre os assuntos de ciência. Em pesquisa que
realizou, concluiu que os alunos são mais capazes de captar aquilo que o professor está
falando quando o discurso é mais familiar e mais humano. Esses momentos são de
oportunidade para deixar a mística da ciência de lado.
Com a apresentação desses argumentos fundados nos trabalhos de Lemke não
queremos dizer que a questão da mística da ciência esteja encerrada apenas nos aspectos de
estilo, mas que também fazem parte desse processo e merecem preocupação. Mesmo porque -
e esse é um dos pilares fundamentais de nosso trabalho - tais aspectos de comunicação da
ciência em aula também envolvem prejuízos ao desenvolvimento moral dos alunos. Nesse
caso, além das aulas de Ciências não se prestarem aos interesses de moralidade que poderiam
favorecer os alunos (no sentido de construção de autonomia e perspectiva de emancipação,
por exemplo), estariam se prestando a interesses de uma pequena elite tecnocrática.
Vimos, então, que a forma ou estilo de comunicação no ensino de Ciências pode
reforçar dois conjuntos de crenças sobre a ciência: a ideologia da verdade objetiva e a
ideologia da verdade especial da ciência. No primeiro caso, de antemão, cria-se a imagem de
que existem fatos sobre os quais não se pode contra-argumentar ou de que a ciência produz
fatos estabelecidos, permanentes e incontestáveis. No segundo caso está a oposição entre
ciência e senso comum, colocando-se por detrás o perigo de ensinar “de uma maneira muito
sutil” que a ciência é “uma verdade especial, disponível somente para os especialistas, e que é
extremamente incompreensível para o homem comum”, ou seja, apresenta-se a ciência como
matéria difícil e feita somente por cientistas que, por sua vez, seriam pessoas de “uma casta
99

especial”, com habilidades especiais e inteligência excepcional que a média dos alunos nunca
terá (LENKE, 1997, p. 150).
Da elite tecnocrática mencionada por Lemke não fazem parte os professores e nem os
cientistas, mas aqueles pequenos grupos que tomam decisões por todos nós com justificativas
ou apelos “científicos”. No entanto, por caminhos que subjazem a mística da ciência, tanto os
professores como os cientistas, por vezes de forma inconsciente, tomam parte na manutenção
desse estado. Por meio de uma mística, a ciência é ensinada “como o paradigma de todo o
conhecimento especialista, é uma verdade objetiva, superior e especial [...]. A educação
científica, gostemos ou não, realiza o trabalho de imposição desses mitos à maioria” (LENKE,
1997, p. 161).
Gérard Fourez também aparece nessa mesma linha de preocupação de Lemke. Para
Fourez (1995), na ânsia de legitimar a ciência os professores muitas vezes omitem os traços,
componentes ou vestígios históricos e situacionais da origem, da fonte daquilo que não
podemos chamar de verdade, mas somente de válido para aquela situação, naquele momento e
para aquele grupo social. O ensino de Ciências pode, assim, trazer nos seus discursos dois
tipos de véus ideológicos: o de primeiro grau (atuante na dimensão da autonomia moral) e o
de segundo grau (atuante na dimensão da heteronomia moral), ou seja, um aceitável e outro a
ser evitado. O discurso ideológico de primeiro grau é aquele pelos quais as representações de
sua construção aparecem de forma mais nítida, são facilmente detectadas. O discurso de
segundo grau é aquele cujos “traços históricos dessa construção quase desaparecem e se
pretende, prática ou teoricamente, implícita ou explicitamente, que a noção seja objetiva e
eterna”. Esse último tipo de discurso é “profundamente manipulador”, pois apresenta como
naturais as opções que são particulares. Portanto, os discursos ideológicos de primeiro grau
tornam-se aceitáveis, porque aparecem neles a consciência da parcialidade de sua construção.
Em contrapartida, os de segundo grau são inaceitáveis para a promoção do desenvolvimento
moral, pois se pautam em omissão ou tentativa de generalização (FOUREZ, 1995, p. 187).
Baseados nos argumentos de Fourez (1995), podemos assim exemplificar os dois
casos: Quando alguém diz “João Paulo II declarou que a teoria da evolução – o processo de
seleção natural dos seres vivos identificado por Charles Darwin em 1859 – é mais do que
uma simples hipótese” ou “O Vaticano reconhece que o homem e o macaco têm o mesmo
antepassado”21, os elementos ideológicos nitidamente estão expostos nas proposições (as
fontes das asserções ou ideias são apresentadas). Não são, por isso, discursos manipuladores.

21
Frases extraídas de: REVISTA ISTO É. O papa da ciência, n. 1461, out. 1997, p. 30 - 34.
100

Mas se alguém diz “Precisamos encarar o fato de que a teoria da evolução serve ao
propósito de Satanás. Crer na evolução significa promover os interesses dele e ficar cego
diante dos maravilhosos propósitos do Criador”22 ou, ainda, “A idéia de que a teoria da
evolução contraria as escrituras é muito ignorante”23, encontramos nessas afirmações a
omissão de sua construção, de sua parcialidade, dando o entendimento de alguma lei geral.
Seria, portanto, uma ideologia de segundo grau.
Ainda sobre os discursos, mas agora com outro viés, encontramos nos trabalhos de
Fritz Oser alguns pontos que também podemos inserir como complementação dessas
discussões. Em suas pesquisas, Oser (1995) identificou diferentes níveis de discurso em
situações cotidianas na escola. Os discursos éticos de sua teoria apresentam cinco níveis
hierarquizados, cada qual com suas características: I) Evitação (nível mais baixo - a
responsabilidade somente se encontra de forma vaga e não se considera como algo que requer
ação urgente; o professor trata de evitar o problema, pois não acredita que as crianças sejam
capazes de responsabilizar-se); II) Delegação ou busca de segurança (tendência de desviar a
responsabilidade; os professores parecem que jogam para ver quem pode mais, tentando
fortalecer sua posição e conseguir indiretamente seus próprios interesses); III) Tomada de
decisões unilaterais (o professor deve ser o líder e deve atuar sem cerimônias); IV) Discurso
incompleto (considera-se o ponto de vista dos demais envolvidos); V) Discurso completo
(participação coletiva na tomada de decisão).
Alguns professores, por exemplo, decidem por um nível mais baixo em algumas
situações, enquanto outros professores podem preferir por um tipo particular de tomada de
decisão de nível mais elevado. Oser menciona o discurso moral de nível completo como a
forma mais estruturada de solucionar um conflito no âmbito da autonomia moral.

Esse nível superior de discurso é uma forma de equilíbrio entre a ética do


cuidado, da justiça e da veracidade, na qual o professor não somente
pressupõe boa vontade, racionalidade e autonomia em todas as pessoas
envolvidas, mas centra-se na participação real. Os professores que se
comprometem com esse nível sabem que o procedimento de buscar a melhor
solução moral é mais importante que o resultado imediato. [...] Esses
professores são mais que observadores e mais que instrutores ou formadores.
[...] eles controlam o processo correto no lugar de se concentrar em
conseguir o melhor resultado [...] e trabalham para uma decisão comum
(OSER, 1995, s.p.).

22
Frase extraída de: WATCH TOWER BIBLE AND TRACT SOCIETY. A vida - qual sua origem? A evolução
ou a criação? Pennsylvania: WTBTS, 1985, p. 248.
23
Frase extraída de: REVISTA ISTO É. O papa da ciência, n. 1461, out. 1997, p. 30-34.
101

O autor afirma que não pode haver na escola educação moral dirigida à autonomia, ao
estímulo do desenvolvimento moral, sem uma formação intensiva dos professores. Para ele, a
formação dos professores atinge apenas a preparação para a tomada de decisões naquilo que
denomina de nível II de discurso.
Como se vê, a forma de comunicação, de discurso que se utiliza em sala de aula, deve
ser uma preocupação de pesquisadores e educadores, pois se constitui em elemento relevante
na construção do ideário sobre ciência nos alunos. Podem até mesmo afastar muitos dos
alunos dela. Sobre esse aspecto nós concordamos, mas ampliamos esse quadro com a inclusão
de elementos de moralidade extraídos das teorias por nós elegidas como subsidiárias de um
projeto de emancipação (livre de tutela ou de algum tipo de coerção externa). Não
defendemos nada além dos conteúdos de ciência em sala de aula. Não defendemos, por
exemplo, que se ensine o senso comum ou os conhecimentos religiosos nas aulas de Ciências,
como alguns podem de forma equivocada pensar - isso seria ingenuidade de nossa parte, além
disso, se assim pensássemos, incorreríamos no mesmo equívoco de favorecimento ao elitismo
tecnocrático e às dificuldades impostas ao desenvolvimento moral, cuja ruptura ensejamos.
Para que os argumentos em aulas de Ciências tragam favorecimentos ao raciocínio
crítico dos alunos, a formação do professor é relevante. “Sem formação é difícil para o
professor participar eficazmente do processo de construção de discurso e fazer da atividade
uma experiência de aprendizagem significativa”. Aspectos discursivos devem receber atenção
no ensino da ciência e as faculdades de Ciências também devem atuar na capacidade de
argumentar de forma eficaz, porque “no processo dialógico encontra-se a oportunidade de
raciocinar, de criticar e justificar, ou seja, para discutir”. “O argumento não é uma atividade
periférica ou marginal da educação científica, mas que merece estar no seu núcleo”. O
discurso compartilhado, e que tem como pano de fundo as questões éticas, leva à mobilização
cognitiva que favorece o desenvolvimento moral dos alunos. “No entanto, como e onde o
argumento poderia ser gerado na aula de ciências?”. Afinal, essa é uma tarefa difícil e
complexa. Pelas características de inserção de aspectos científicos, éticos e morais, os
assuntos sociocientíficos são úteis na produção de argumentos diversos, dentre os quais
possivelmente surgirão argumentos falaciosos que os professores terão oportunidade de
identificar e trabalhar. “Quais são esses tipos de erros e como podem ser identificados?”.
Nesse caso, é relevante que os professores conheçam as falácias mais comuns e as fontes
desses erros e consigam traduzir em mudanças de ideias e pensamentos dos respectivos
alunos. Nesse caso, a qualidade da argumentação é relevante e influencia a qualidade do
raciocínio crítico (ZEIDLER et al., 2003, p. 97-100).
102

Zeidler e colaboradores (2003) apresentam cinco fatores principais que influenciam


negativamente a qualidade do raciocínio científico: 1) considerar ser um argumento válido
que se baseia em premissas erradas; 2) a falta de um marco conceitual e a seleção de
informações coerentes com as suas reivindicações e ignorar informações que podem ser
inconsistentes (ou falsificadas), levando a um tipo de viés de confirmação; 3) ter “fé cega” nas
provas (predisposição para a confirmação): aquilo que é coerente com as crenças iniciais do
estudante torna-se mais convincente do que aquilo que contraria as suas crenças iniciais; 4)
amostragens e fontes inadequadas de provas: os alunos tendem a confiar em pessoas que
consideram experientes ou autoridades; 5) alteração de argumentos e provas: os alunos não
consideram apenas as provas que lhes são apresentados, mas eles inadvertidamente
modificam os fatos, pressupostos, ou premissas do problema ou argumento.
Por fim, muitos são os professores de Ciências que atuam em suas aulas afastando-se
de aspectos que envolvem a moralidade com a justificativa de sentirem medo do ensino de
valores, porque o tema está fora de seus domínios ou porque os valores não fariam parte do
núcleo da disciplina ensinada (ALLCHIN, 2006, p. 82). Por mais que queiramos, não
ensinamos apenas as disciplinas escolares, pois sempre ultrapassamos os seus limites quando
discursamos sobre elas. Portanto, no ensino de qualquer disciplina escolar temos
possibilidades de interferir de modo favorável ou desfavorável no desenvolvimento do
educando acerca de suas capacidades “usadas para construir o pensar”. [...] “A atitude do
professor ensina. O gesto do professor fala” (RIOS, 2010, p. 659).

4.5 - O ensino de Ciências e a atuação cidadã

Na literatura encontramos autores diversos, entre eles Gil-Pérez e Vilches (2006, p.


41), a defender com autoridade a importante participação dos cidadãos em tomadas de decisão
que requerem conhecimentos científicos. Uma participação, portanto, que “requer um mínimo
de formação científica que faça possível a compreensão dos problemas e das opções – que
pode e deve ser expressa com uma linguagem acessível”.
No entanto, como requerer a participação dos cidadãos se lá na formação escolar essa
oportunidade for limitada ou mesmo ausente? Como possibilitar o acesso à ciência se lá na
formação escolar ocorrer um processo de distanciamento entre ciência e estudantes? Como
ensinar a ser crítico, se tivermos, por exemplo, um ensino de Ciências com características de
imposição ou de transmissão de um conhecimento científico como produto acabado e cujo
resultado é uma verdade absoluta?
103

Assim como Gil-Pérez e Vilches (2006, p. 42), também nós entendemos que este é “o
principal aporte da ciência à cultura cidadã: a contribuição no desenvolvimento do espírito
crítico”. Acreditamos que uma das relevantes contribuições do ensino de Ciências está na
formação do espírito crítico dos estudantes, que, assim, crescerão com o aprendizado (talvez
não totalmente consolidado, mas mesmo assim numa trajetória nesse sentido) da criticidade. E
essa oportunidade escolar potencializa, por exemplo, a diferenciação entre conhecimento
científico e dogmas, conhecimento científico e senso comum etc.
Gil Pérez e Vilches (2006) criticam aqueles que colocam em dúvida ser possível uma
educação em Ciências com objetivos voltados para a formação de cidadania. Argumentam de
forma crítica que além de ser possível vale a pena o esforço para esse investimento. “Não
constitui nenhuma ingênua pretensão, mas uma necessidade fundamentada” (p.50). Essa
crítica se direciona para uma linha de pensamento que não acredita na possibilidade de uma
participação mais atuante das pessoas em tomadas de decisão fundamentadas por
conhecimentos científicos porque isso requereria assimilação de conhecimentos específicos e
de um nível elevado e inacessível aos não especialistas.
Isso não se confirma, pois essa participação vincula apenas um mínimo de
conhecimentos específicos que são acessíveis para o exercício de uma cidadania. Além disso,
possuir conhecimentos profundos e especializados sobre determinados problemas, por si só,
não garante tomadas de decisão acerca deles, porque há uma exigência de “enfoques que
contemplem os problemas numa perspectiva mais ampla”. Os não especialistas podem
contribuir, então, sobre essas perspectivas e interesses mais amplos, requerendo para isso de
apenas “um mínimo de conhecimentos científicos específicos sobre a problemática estudada”.
(PRAIA et al., p. 143).

4.6 - A natureza da ciência na educação básica: exigências e contribuições

A literatura traz diferentes críticas sobre o ensino de Ciências, especialmente em


relação à transmissão de uma equivocada ideia de ciência. Entre outros, Gil Pérez e
colaboradores (2001, p. 128-129) apresentam as seguintes deformações que, segundo os
autores, expressam, no seu conjunto, uma imagem ingênua do que é a ciência; uma imagem já
consolidada, tornada um “estereótipo socialmente aceite” e que a “própria educação científica
reforça ativa ou passivamente”: i) concepção empírico-indutivista e ateórica, destacando-se
“o papel ‘neutro’ da observação”; ii) visão rígida (algorítmica, exata, infalível), tendo-se a
ideia de um método científico como se fosse uma mera sequência mecânica de etapas a
104

seguir; iii) visão aproblemática e a-histórica, ou seja, uma ideía de ciência dogmática e
fechada, sem vínculos com os problemas, a sua evolução, as dificuldades etc.; iv) visão
exclusivamente analítica, esquecendo-se das relações entre as partes e os conhecimentos
mais amplos; v) visão acumulativa de conhecimento linear, vi) visão individualista e
elitista da ciência, fundada no preconceito de que o conhecimento científico é para poucos
expertos; vii) imagem descontextualizada e socialmente neutra da ciência, que transmite a
ideia de que a ciência está “acima do bem e do mal”.
A educação científica deve promover a superação de uma distorção da natureza da
ciência. Aquela distorção que apresenta o trabalho científico como uma atividade
descontextualizada e alheia a interesses e conflitos. Deve fomentar a alfabetização científica e
tecnológica dos cidadãos por intermédio de uma certa imersão na cultura científica e
tecnológica, fundamental para a formação de cidadãos críticos que, no futuro, participarão na
tomada de decisões. O enriquecimento do currículo do ensino das ciências que reflita as
propostas precedentes, reiteradamente postas em prática com estudantes e com professores em
formação, é um bom exemplo da incidência positiva que pode ter a clarificação da Natureza
da Ciência (e a tecnologia), se essa clarificação não se limitar a uma mera exposição verbal de
determinadas características, mas abrir caminho a uma autêntica imersão numa cultura
científica e tecnológica (PRAIA et al., 2007).
Para um ensino mais adequado e eficaz sobre a natureza da ciência, Acevedo (2009b)
orienta que os professores devem ser capazes de: a) orientar os alunos em atividades de
indagação, de argumentações dialógicas; b) trabalhar com questões sociocientíficas
controvertidas; c) utilizar a história e filosofia da ciência.
Acevedo e colaboradores (2005, p. 2) apontam que a Didática das Ciências tende
considerar com maior força “que um dos objetivos mais importantes da educação científica é
que os estudantes do Ensino Básico e do Secundário cheguem a adquirir uma melhor
compreensão da natureza da ciência”. É um objetivo que, apesar de antigo, renova-se
periodicamente com a inserção de novos elementos em discussões sobre “as razões que se têm
dado para o implementar”.
Há diversas linhas de investigação na área que trazem variados argumentos sobre a
relevância da compreensão da natureza da ciência. Alguns desses argumentos, de acordo com
Acevedo e colaboradores (2005, p. 2-3), apoiam-se de forma acrítica e sem levar em
consideração o conjunto de investigações realizadas. Os autores ressaltam que o objetivo de
inserir a natureza da ciência na educação básica “não é formar filósofos nem sociólogos da
ciência, mas ajudar a compreender melhor a ciência e a tecnologia contemporâneas”. Os
105

métodos, portanto, devem ser bem discutidos e analisados, sendo que “os métodos para
ensinar NdC [natureza da ciência] têm-se, recentemente, mostrado eficazes quando abordam
alguns dos seus aspectos básicos de maneira explícita e reflexiva”.
Acevedo e colaboradores (2005) mencionam a tese de Sadler (2003) para exemplificar
a existência de aspectos diversos associados à compreensão da natureza da ciência, e que às
vezes até preponderam, quando os alunos tomam suas decisões acerca de um tema
sociocientífico que envolve suas crenças pessoais. Alguns desses fatores que influenciam
estão relacionados com os aspectos morais, emocionais, religiosos, culturais, sociais e
políticos. Há uma linha de investigação (entre outros, vide ACEVEDO, 2006; VÁZQUEZ;
MANASSERO, 2007a, 2007b) sobre a tomada de decisão em questões científicas de interesse
social que traz resultados e considerações favoráveis em relação ao uso dos aspectos
atitudinais e emocionais no ensino de Ciências. Trabalhos de Sadler (2003), Zeidler (2003) e
Sadler e Zeidler (2004) também adicionam aos aspectos atitudinais e emocionais os aspectos
morais como relevantes nas resoluções dos assuntos sociocientíficos.
Nesse caso, “a tomada de decisões é, sem dúvida, uma importante capacidade que
pode ser educada”, mas tomando-se os devidos cuidados com todos esses fatores envolvidos.
Além disso, “é bastante ingênuo pensar na existência de uma única NdC, pelo que qualquer
descrição da NdC, só pode aspirar a refletir de maneira parcial e enviesada a ciência e a
tecnociência do presente” (ACEVEDO et al., 2005, p. 5 e 7).
A história da ciência nos mostra que existiram, e ainda existem, tipos diferentes de
ciência. Por exemplo, não desapareceu totalmente aquela ciência clássica, de gabinete, de
laboratório, de gênio individual. Existem, ainda, a ciência institucional e acadêmica das
universidades, a ciência e a alta tecnologia ligadas à indústria e ao exército e, por último, a
tecnociência contemporânea. O sistema científico e tecnológico atual reúne todos esses tipos
diferentes coexistindo no presente (VÁZQUEZ et al., 2004).
A sala de aula de Ciências, nesse caso, não pode ficar restrita a um ensino que leve em
consideração apenas a natureza da ciência acadêmica que dominava no passado, ampliando-se
as exigências e, por consequência, as dificuldades para o ensino da natureza da ciência, pois
atualmente convivem com ela outras formas, como a tecnociência. A depender do que se
pretende, entra a ênfase de uma ou de outra. Educação para melhorar as tomadas de decisão
no mundo (participação cidadã): “possivelmente é mais importante conhecer os aspectos da
natureza da tecnociência que os da ciência acadêmica”. Educação para pequenas decisões do
cotidiano: “certamente é essencial uma melhor compreensão da natureza correspondente à
tecnologia do tipo menos sofisticado”. Educação para satisfação de necessidades estéticas
106

pessoais: “poderia ser mais interessante o conhecimento da natureza da ciência acadêmica”. E


assim por diante. “Poucas propostas sobre estas questões costumam aparecer nos artigos de
Didática das Ciências a ponto de delimitar o problema da transposição didática da NdC para a
ciência escolar” (ACEVEDO et al., 2005, p. 7).
O que se vê nessa discussão é uma exigência que vislumbra aumentar o valor da
educação científica para todos os alunos, incluindo-se aqueles que não ingressarão em
carreiras científicas ou técnicas. Lemke (2006, p. 6) chama atenção para a Didática das
Ciências, que deve entender melhor i) os aspectos emocionais e intelectuais envoltos nos
alunos sobre o “assombro pelos fenômenos naturais”; ii) “como promover o pensamento
crítico”; iii) como trabalhar em conjunto ciência e outras formas de conhecimento; iv) “como
a educação científica pode trazer contribuições essenciais à alfabetização multimídia geral e
as habilidades de pensamento crítico dos estudantes”.
Para tanto, o ensino das disciplinas científicas deve prestar uma especial atenção para
além dos conteúdos: aspectos morais, afetivos, sociais, dentre outros, que podem influenciar
no aprendizado crítico, não alienante e não impositivo, mas sim significativo e duradouro dos
conhecimentos científicos.
Um ensino subjacente à ética é reivindicado nas aulas de Ciências. No entanto, a
questão a refletir pode se resumir ao que Reis (2007, p. 37) coloca, e que já vimos em
discussões anteriores: “Como ensinar ética nas aulas de Ciências?” O autor que pergunta
também responde com uma possibilidade concreta: a discussão de estudos de caso.

A discussão de estudos de caso sobre as implicações sociais e morais de


práticas científicas e tecnológicas controversas na área da biotecnologia
revela-se extremamente eficaz na estimulação de interacções sociais na sala
de aula, na construção de conhecimentos sobre as temáticas em causa e as
inter-relações entre a ciência, a tecnologia e a sociedade e, ainda, no
desenvolvimento cognitivo e moral dos alunos [...]. A chave deste progresso
reside nos conflitos sócio-cognitivos estabelecidos entre os alunos, ou seja,
no confronto interpessoal e intrapessoal de ideias. A discussão dos diferentes
pontos de vista facilita a partilha de informações, a construção de
conhecimento e a modificação dos raciocínios através da descoberta de
inconsistências lógicas. (REIS, 2007, p. 39)

Em todas essas discussões em que há uma vertente humanista, exige-se configuração


diferente do que tradicionalmente perdura. Aos professores, por exemplo, uma das exigências
recai passar para uma compreensão que ultrapassa a visão internalista da ciência. Referindo-se
especificamente em relação à saúde e à alimentação, mas que entendemos se estender a todos
os temas científicos, Galvão e Praia (2009, p. 633) apontam que os professores “deverão
107

aprender a ensinar as ciências por meio [...] do uso de estratégias de ensino/aprendizagem


inovadoras, voltadas para o desenvolvimento de conceitos, valores e atitudes (e não apenas de
conceitos isolados e ausentes de sentido social)”.
Ainda que essas perspectivas apontem um conjunto de relações sociais envolvidas na
ciência, no seu discurso empirista a ciência pública ainda aparece com pretensões de mostrar-
se “como universalista, desinteressada, imparcial, objetiva, descrente e igualitária”
(VÁZQUEZ et al., 2007, p. 337). Todas essas questões que envolvem a natureza da ciência
são elementos relevantes a considerar na educação científica. No entanto, e levando-se em
consideração as teorias do desenvolvimento psicobiológico vigentes na educação escolar, o
ensino de Ciências também deve prestar atenção às capacidades de aprendizagem dos alunos,
de acordo com as suas diferentes faixas etárias.

O princípio mais geral vigente em toda a educação é a gradação dos


objetivos e conteúdos curriculares, segundo o desenvolvimento
psicobiológico dos estudantes, de forma que exista uma sincronia entre as
exigências do currículo e as capacidades de aprendizagem da maioria dos
estudantes. As grandes teorias do desenvolvimento psicoevolutivo destacam
o progresso gradual das capacidades pessoais, de modo que o princípio
didático de ensinar procedendo do simples ao complexo conduz à apreciação
do valor que tem as ideias mais simples de Natureza da Ciência, que seriam
as mais adequadas para os mais jovens. Assim, pois, a gradação da
complexidade das questões a tratar em aula implica adaptação à idade e à
etapa de estudos dos alunos, devendo-se construir sequências de conteúdos
que vão desde os elementos mais básicos (aproximações descritivas simples
da comunidade tecnocientífica) até as relações mais complexas e
problemáticas da comunidade tecnocientífica, incluindo as controvérsias que
derivam delas (VÁZQUEZ et al., 2007, p. 351).

Afinal, há uma diferença entre ensinar Ciências para crianças, adolescentes, jovens e
adultos, porque cada qual está numa faixa de desenvolvimento, tanto intelectual como moral.
Nessas diferentes faixas de desenvolvimento que se encontram os aprendentes há diferentes
graus de crenças, desde as mais simples até mais complexas, que exigem tratamentos
diferenciados em relação a métodos e técnicas de ensino.

A educação científica nos níveis obrigatórios é dirigida a estudantes de


diversas idades e interesses e suas finalidades devem ser mais formativa que
intelectual ou acadêmica. Como qualquer aprendizagem, o ensino da
Natureza da Ciência deve avançar desde as crenças mais simples até as mais
complexas, de modo que as aparentemente mais simples e menos polêmicas
são necessárias para uma sequenciação adequada nas distintas etapas da
educação científica dos estudantes mais jovens (VÁZQUEZ et al., 2007, p.
352).
108

Outro aspecto de relevância a levar em consideração refere-se ao contexto do aluno e


as respectivas finalidades do ensino de Ciências. Tais relações entre os contextos e as
finalidades exigem um ensino, por exemplo, da natureza da ciência que se adapte a uma
coerência. A finalidade propedêutica que é necessária para a formação de cientistas difere da
finalidade formativa geral de crianças (VÁZQUEZ, et al., 2007).

4.7 - As controvérsias sociocientíficas e implicações ético-morais

O ensino de Ciências é visto como um microcosmo da sociedade que deve implicar,


entre outras formas de pensar, as seguintes características que abrangem o raciocínio moral
nas questões sociocientíficas: processos de investigação; discurso; conflito; argumentação;
negociação; compromisso; tomada de decisão; acordo. Esta é uma lista de características
associadas com questões sociocientíficas que implica dilemas morais e, por conseguinte,
amplia exigências aos professores. As controvérsias de contextos CTSA, por meio dos seus
dilemas e respectivos raciocínios morais, servem ao objetivo de facilitar o pensamento crítico
e o desenvolvimento da autonomia. Professores que tomam a decisão de usar essas discussões
objetivando ativar o raciocínio moral dos alunos podem se beneficiar da heterogeneidade e
diversidade em suas salas e entender que esse compromisso pode fazer parte de um conjunto
de estratégias integradas para ser utilizada ao longo do ano letivo (ZEIDLER; KEEFER,
2003).
Os assuntos sociocientíficos não apresentam composição, discussões e conclusões
simples. Envolvem princípios e conceitos científicos, estão sujeitos à discussão pública e
envolvem questões econômicas, políticas, morais e éticas (SADLER; ZEIDLER, 2004).
Trabalhar com esses assuntos em aula, portanto, requer bases teórico-práticas diversas para
que se tornem frutíferos quanto ao desenvolvimento moral e intelectual. Aos professores não
são exigidos que sejam especialistas em dilemas morais ou avaliação do desenvolvimento
moral dos alunos para exercer eficazmente sua profissão. No entanto, os conhecimentos
teórico-práticos subjacentes ao desenvolvimento moral podem subsidiá-los em sua tarefa, se
os fins forem pautados na formação da autonomia e na construção do pensamento crítico dos
alunos.
Se os objetivos são esses, as aulas de Ciências devem proporcionar aos alunos
oportunidades “ricas e variadas” para “estimular e desenvolver as habilidades do raciocínio
moral dos alunos”. A análise individual e em grupo de questões sociocientíficas é uma das
estratégias possíveis, pois proporciona um ambiente favorável para os alunos desenvolverem
109

o pensamento crítico e o raciocínio moral. Utilizando-se a estratégia baseada nas questões


sociocientíficas, “os alunos serão confrontados com múltiplas perspectivas de problemas
morais que envolvem pontos de vista e de informação discrepantes e, às vezes, em
contradição com seus próprios pontos de vista”. Esse ambiente de aula possibilita a
construção conjunta e compartilhada do conhecimento científico, além de promover o
pensamento crítico e o raciocínio moral dos alunos (SIMMONS; ZEIDLER, 2003, p. 83).
Em sala de aula, a discussão de assuntos sociocientíficos pode ajudar os alunos na
compreensão de conceitos científicos e no desenvolvimento de suas capacidades de tomada de
decisão, porque esses assuntos mobilizam tanto o raciocínio intelectual como o raciocínio
sobre aspectos éticos e morais envolvidos. Os assuntos sociocientíficos se constituem,
portanto, em estratégia de grandes potencialidades para a aprendizagem dos alunos: facilitam
a apropriação de conhecimentos científicos envolvidos, uma visão de natureza da ciência que
contempla interações com a sociedade e o desenvolvimento de capacidades intelectuais e de
atitudes relacionadas à comunicação, reflexão e argumentação (HILÁRIO; REIS, 2009).
Entre as atividades do ensino de Ciências que envolvem os assuntos sociocientíficos,
segundo Kolstø (2001), deve-se implementar, entre outros, conteúdos que levem os alunos a
capacitar-se criticamente a fim de orientá-los a lidar com os confrontos entre suas crenças e os
conhecimentos coerentes e de consenso da ciência.
Sobre as questões sociocientíficas encontramos resultados de pesquisa que corroboram
necessidades acerca da moralidade que implicam o ensino de Ciências. Vejamos.
Investigação realizada por Sadler e Zeidler (2005) confirma evidências de que alunos
utilizam um conjunto combinado de diferentes tipos de raciocínio (racionalista, intuitivo,
emotivo, moral) na resolução de questões sociocientíficas. Esse resultado confirma que as
aulas de Ciências são ambientes que devem considerar todos esses aspectos e não apenas o
ensino e a aprendizagem conceitual de conteúdos.
Kolstø e colaboradores (2006) investigaram 89 estudantes de Ciências com substancial
habilitação acadêmica no domínio da ciência. Quiseram analisar que critérios os alunos
utilizariam em suas avaliações sobre textos com questões sociocientíficas. Em grupos de dois
e três foi solicitado que avaliassem as afirmações científicas em artigos que livremente
escolheram. Ao analisar os textos dos alunos, os pesquisadores identificaram 13 diferentes
critérios focando adequação empírica e teórica, a integralidade das informações apresentadas,
os aspectos sociais e estratégias de manipulação. O número de critérios utilizados e a
qualidade da sua aplicação variada indicam que a análise crítica de textos que contém essa
dimensão científica precisa ser enfatizada na formação de professores de ciências.
110

Estudos empíricos de Vázquez e Manassero (2008, p. 277-278) mostram resultados de


declive no interesse sobre o aprendizado de ciência na escola desde os estudantes de faixa
etária menor até os maiores. Os autores dizem que, no decorrer do tempo, “os estudantes
diminuem drasticamente suas atitudes acerca de Ciência e Tecnologia”, e que a solução
“depende de uma especial e vigorosa atenção aos aspectos atitudinais, afetivos e emocionais
em aulas de Ciências”. Nesse caso, um currículo de ensino de Ciências modificado, voltado
para orientações humanísticas, poderia ajudar a reverter esse quadro24.

4.8 - Destaques

• Questões de ética e de moralidade inevitavelmente fazem parte das aulas de Ciências, mas
carecem de aportes teórico-práticos que aprofundem as argumentações, especificamente, em
prol do desenvolvimento moral dos alunos.
• Em espaço público, seja individual ou coletivamente, a ninguém deve ser imposto crenças
aos outros. O direito à liberdade de pensamento e de consciência, com o direito à liberdade de
religião é item contemplado na Declaração Universal dos Direitos Humanos.
• Ciência e ensino de Ciências apresentam aspectos de ética e de moral em planos e níveis de
lógica diferentes.
• A ideia de verdade que a ciência transporta traz implicações atitudinais e axiológicas que os
professores de Ciências devem atentar. Impor, discutir, ficar neutro, somente transmitir
informações, auxiliar os alunos ou deixá-los pensar o que quiserem? Esses são alguns
caminhos possíveis, mas nem todos se dirigem em prol do desenvolvimento moral.
• A história traz episódios que demonstram como nós somos influenciados e afetados por
autoridades institucionalizadas. Aulas de Ciências podem explorar esses episódios para fins
de mobilizar a capacidade de avaliar as ações dessas autoridades.
• A preocupação das aulas de Ciências não pode se restringir apenas ao conteúdo, mas
também aos discursos e à forma de falar sobre ciência. Discursos inserem elementos que
podem favorecer ou prejudicar tanto a aprendizagem de Ciências como o desenvolvimento
moral.

24
Aqui relembramos a nota inserida na Introdução, extraída de Davidovich e colaboradores (2010, p. 51), sobre
uma das conclusões da 4ª Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação em relação à ciência e que
são passíveis de transposição para o ensino de Ciências: “valorização dos aspectos culturais e humanísticos da
ciência”, favorecimento da “interculturalidade na relação entre ciência e os demais conhecimentos” e promoção
do “reconhecimento e a valorização de saberes populares e tradicionais no processo de construção do
conhecimento e nas políticas de popularização da C& T”.
111

• Há uma diversidade de estudos sobre os discursos. Parte desses estudos trazem


classificações ou organizações discursivas relevantes ao ensino de Ciências, pois inserem
elementos axiológicos e atitudinais úteis e inerentes ao processo de ensino e aprendizagem
das disciplinas científicas (em todos os níveis).
• Para fins de cidadania, uma das relevantes contribuições das aulas de Ciências está na
formação do espírito crítico dos estudantes.
• O ensino eficaz sobre a natureza da ciência requer dos professores explorar em aula:
atividades de indagação e argumentações dialógicas; questões sociocientíficas controvertidas;
a história e filosofia da ciência.
• Em sala de aula, os assuntos sociocientíficos se constituem em estratégia de grandes
potencialidades para a aprendizagem e o desenvolvimento moral dos alunos (inserem-se em
pressupostos kohlberguianos de estímulos provocados por dilemas morais, com benefícios de
conteúdos reais). No entanto, as potencialidades dos assuntos sociocientíficos se estendem
para além dessas especificidades dilemáticas.
• Ciência versus religião, busca da verdade, senso comum, natureza da ciência, prática
científica, assuntos sociocientíficos controvertidos e linguagens / discursos sobre ciência são
itens que se apresentam em aulas de Ciências com possibilidades correlacionais à formação de
um espírito crítico e autonomia intelectual e moral. Isso traz exigências de reflexão e
embasamentos teórico-práticos em favor do aluno.
• Zeidler e colaboradores (2005) entendem que a dimensão tradicional da abordagem CTSA
no ensino deve explorar mais o âmbito pedagógico envolvido (discurso, argumentação,
aspectos culturais, morais, epistemológicos etc.) e não apenas apontá-los nos respectivos
assuntos. Esse também é o nosso entendimento. Uma das razões, aliás, de implementarmos
este trabalho.
112

5.0 - DESENVOLVIMENTO MORAL E(M) AULAS DE CIÊNCIAS: EXERCÍCIOS,


SITUAÇÕES E ANÁLISES

“Se se respeita a natureza do ser humano, o ensino


dos conteúdos não pode dar-se alheio à formação
moral do educando. Divinizar ou diabolizar a
tecnologia ou a ciência é uma forma altamente
negativa e perigosa de pensar errado. De
testemunhar aos alunos, às vezes com ares de
quem possui a verdade, um rotundo desacerto”
(FREIRE, 1996, p. 19).

Exemplificamos com Solbes (2009) e Acevedo (2006), logo no início deste nosso
trabalho, uma preocupação sobre a educação em valores a ser dispensada nos processos de
ensino e de aprendizagem de Ciências. Vimos, ainda, a área de Educação em Ciências
apresentar argumentos diversos que, direta ou indiretamente, acabam nos remetendo a
possíveis contribuições que implicam valores e, em especial, incidem no tema do
desenvolvimento moral. Com o aporte teórico de Piaget, Kohlberg e Habermas, retomamos e
ampliamos as argumentações em prol das necessidades atitudinais e axiológicas no ensino de
Ciências, agora direcionando nossas discussões para as contribuições correlacionais que
entendemos existir entre os elementos teórico-práticos do desenvolvimento moral e da ética
discursiva e os elementos que compõem as aulas de Ciências.
Para auxiliar em nossos propósitos, utilizamos os seguintes procedimentos: i)
exercício de justaposição entre os estágios morais apresentados por Kohlberg e alguns
discursos possíveis em aulas de Ciências; ii) organização de dois ambientes com “atmosferas
morais”, que agregam elementos sociomorais das teorias de Piaget, Kohlberg e Habermas e
elementos correlatos de aulas de Ciências extraídos do conjunto de discussões anteriores; iii)
exercícios de correlação entre diferentes discursos reais ou hipotéticos a envolver aulas de
Ciências e os elementos das atmosferas morais que compõem os dois ambientes; iv) análise
do conjunto de exercícios implementados.

5.1 - Os estágios de desenvolvimento moral de Kohlberg em aulas de Ciências

Para execução deste exercício de correlação entre os estágios de desenvolvimento do


juízo moral de Kohlberg e as aulas de Ciências, aproveitamos o quadro elaborado pelo autor
(vide páginas 62 e 63) e adaptamos a primeira e terceira coluna com uma caracterização
referente às aulas de Ciências (quadro 6).
113

Quadro 6. Desenvolvimento moral em Kohlberg e aulas de Ciências


Bases dos níveis dos juízos morais Estágios do desenvolvimento Ensino de Ciências
(Discursos e ideias referenciais
possíveis e característicos para
cada estágio)
I. Nível Preconvencional. 1. Orientação, Obediência, Castigo. “A evolução biológica é um
processo cujo progresso culmina
O valor moral reside em rótulos e Deferência egocêntrica à autoridade com vosso professor sobre esta
regras culturais externas acerca do ou ao poder superior ou ao cátedra, que me faz superior a
bom e do mal, do justo e do injusto, prestígio, ou eludindo situações vocês” (professor).
os quais são interpretados em problemáticas ou desagradáveis.
termos de consequências físicas ou Responsabilidade objetiva. “Se ele, adulto, disse que isso
hedonísticas da ação (castigo, ciência, então é verdade” (aluno).
recompensa, retribuição de favores)
ou simplesmente em termos do
poder físico de quem enuncia as
regras.
2. Orientação Egoísta-Ingênua. “Quem responder corretamente,
No ensino escolar, a ciência é vista como eu ensinei sobre o caso do
e difundida como autoridade Neste estágio, a ação correta é gene gay, ganhará ponto a mais na
monolítica. aquela que instrumentalmente nota” (professor).
satisfaz as necessidades próprias e
ocasionalmente as necessidades de “Estou precisando de nota, então
outros. Igualitarismo ingênuo e tenho que responder como o
orientação sobre o intercâmbio e a professor quer” (aluno).
reciprocidade através de fórmulas
como “Você faz por mim e eu faço
pra você”. Consciência do
relativismo do valor segundo as
necessidades e perspectivas de cada
sujeito.

II. Nível Convencional 3. Orientação sobre a concordância “Eu trabalho com educação sexual
interpessoal na minha aula, porque os alunos
O valor moral reside no gostam da liberdade que eu dou a
desempenho de papéis bons ou Neste estágio a conduta orienta-se eles” (professor).
corretos, na manutenção e sobre a busca da aprovação, a
conformação da ordem complacência e a ajuda a outros.
convencional e em satisfazer as
expectativas de outros. Neste nível Conformidade com a conduta
se julgam as intenções e, portanto, majoritária, definida através de
aparece a responsabilidade imagens estereotipadas e aprovadas,
subjetiva. porque são desejáveis.

No ensino escolar, a ciência é vista 4. Orientação sobre a manutenção “Eu não penso que o
e difundida como processo, mas da autoridade e da ordem social. homossexualismo seja uma doença
com compreensão parcial em genética, mas vou concordar para
questões de seu papel social, A conduta orienta-se sobre o não contrariar o professor e criar
responsabilização e capacidade “cumprimento do dever”, o respeito polêmica” (aluno)
interventiva. à autoridade e à manutenção da
ordem social.
114

Quadro 6. Desenvolvimento moral em Kohlberg e aulas de Ciências (cont.)


Bases dos níveis dos juízos morais Estágios do desenvolvimento Ensino de Ciências
(Discursos e ideias referenciais
possíveis e característicos para
cada estágio)
III. Nível Pós-Convencional 5. Orientação Contratual-Legalista “Nas aulas de Ciências, tenho que
ensinar ciência, mas isso não
Os valores e princípios morais são Consciência do relativismo dos impede que as discussões
validados e aplicados valores e opiniões pessoais, mas extrapolem se isso ajudar no
independentemente da autoridade agora com ênfase nas regras e desenvolvimento cognitivo e moral
ou conformidade dos membros do procedimentos para a busca do dos alunos” (professor).
grupo, ainda que esses valores consenso. O dever é definido em
sejam vistos como compartilhados. termos de contrato, evita-se em “Há respeito no grupo. Posso opinar
Em outras palavras, o valor moral geral a violação do preceito ou e debater com igualdade de
reside na conformidade de direitos de outros. Há, pois, o participação”. Ninguém impõe. Ao
consciência com valores de direitos reconhecimento de um elemento ouvir todos, posso repensar minhas
e deveres compartilhados ou arbitrário nas regras e expectativas ideias” (aluno).
compartilháveis. na busca do acordo.

Preponderância de uma consciência


crítica e autônoma sobre a ciência 6. Orientação de Consciência e “A ciência deve ser compreendida,
(sua construção, seu papel social, as Princípio. seguindo-se a própria consciência
capacidades interventivas dos crítica” (professor).
sujeitos não expertos etc.). Orientação sobre os princípios
(justiça, respeito à vida, igualdade “Compreendo criticamente a ciência
econômica, social e jurídica etc.) e, assim, posso atuar e fazer minhas
como critério nas escolhas, escolhas de forma consciente,
apelando à universalidade e à lógica levando-se em consideração
empregada. Respeito mútuo e aspectos individuais e coletivos”
confiança com a consciência como (aluno).
agente diretivo. Portanto, esta
orientação transcende as regras da
ordem social dada, para pôr a ênfase
nos princípios da racionalidade nas
escolhas éticas.

5.2 - Atmosferas morais em aulas de Ciências: componentes correlativos

Com bases em todas as nossas discussões anteriores (das áreas de Educação, Educação
em Ciências e da Psicologia do Desenvolvimento) e, em especial, no aporte das perspectivas
sociomorais das teorias e respectivas ideias compartilhadas sobre o tema, organizamos dois
ambientes com “atmosferas morais” distintas que contemplam (e conjugam) elementos de
fins, princípios, conteúdos e procedimentos teórico-práticos do desenvolvimento moral e da
ética discursiva, aos quais agregamos elementos correlatos e afins de aulas de Ciências.
A organização dos dois ambientes foi inspirada no conceito de “atmosfera moral” de
Kohlberg. Cada um deles reúne um conjunto de características correlacionadas entre
elementos de perspectivas sociomorais das teorias e elementos afins provenientes de diversas
115

argumentações da área de Educação em Ciências. Um conjunto de características que pode


atuar no reforço da heteronomia moral e prejuízos ao ensino de Ciências ou orientar a busca
de autonomia moral e favorecer a aprendizagem de Ciências (quadro 7).

Quadro 7. Atmosferas morais em aulas de Ciências


Atmosfera de autonomia moral Atmosfera de heteronomia moral

• Cultura do sentido (educação do sentido e expectativa de • Cultura do tédio (perda de expectativa de um futuro
um futuro modificado para melhor). modificado para melhor).

• Universalismo ético. • Relativismo ético.

• Eleição da verdade como valor a ser buscado (não • Não eleição da verdade como valor a ser buscado
satisfação com ideias prontas, com fatos não comprovados, (satisfação fácil com ideias prontas, com fatos não
com preconceitos de toda ordem, com reflexões brumosas e comprovados, com preconceitos de toda ordem, com
afirmações peremptórias). reflexões brumosas e afirmações peremptórias).

• Lacunas do conhecimento são identificadas e trabalhadas • Lacunas do conhecimento não são identificadas e nem
(ênfase não apenas na apropriação de conhecimentos trabalhadas (ênfase na apropriação acrítica de conhecimentos
específicos, mas nas capacidades de correlação e observação específicos, sem mobilização das capacidades de correlação e
crítica na resolução de problemas). observação crítica na resolução de problemas).

• Ensino não divorciado de reflexão ética sobre os conteúdos • Ensino com preponderância na descrição instrumental,
desenvolvidos no interior da ciência. teórico ou experimental da ciência, divorciado de reflexão
ética sobre os conteúdos desenvolvidos no interior da ciência.

• Não predomínio de discursos normatizadores e nem de • Predomínio de discursos normatizadores ou de modelos


modelos edificantes a serem copiados. edificantes a serem copiados.

• Preponderância de cooperação, diálogo e acordo mútuo. • Preponderância de repressão, castigo, imposição e coerção.

• Atitudes compatíveis com uma postura ética, que valoriza a • Atitudes que não valorizam a dignidade, a justiça, a
dignidade, a justiça, a igualdade e a liberdade. igualdade e a liberdade.

• Possibilidades do aprendizado se expandir para fora de • Aprendizagem restrita a assuntos puramente científicos
assuntos puramente científicos, em prol da autonomia crítica. (desfavorável para a autonomia crítica).

• Obediência motivada por controle interno na escolha • Obediência motivada por controle externo, por interesse
consciente de um princípio aceito como válido, mas mutável egocêntrico (por exemplo, medo de castigo).
se for justo (por exemplo, em prol da vida).

• Entendimento das normas morais como elementos sociais • Entendimento das normas morais como leis sagradas e não
de regulação entre as pessoas, passíveis de modificações. passíveis de modificações.

• Relações sociais orientadas pelo acordo racional sobre as • Relações de obediência passiva sobre as normas, entendidas
normas e respeito mútuo. como inquestionáveis.

• Regras e respeito construídos coletivamente. • Regras e normas provenientes da coação social (respeito
unilateral - da não autoridade para a autoridade).

• Métodos “ativos” de educação moral. • Métodos “passivos” de educação moral.

• Não traz uma verdade pronta para a criança, nem ela é • Traz uma verdade pronta para a criança, que é coagida a
coagida a recebê-la de fora. recebê-la de fora.

• Relevância aos questionamentos dos alunos; não são • Não relevância aos questionamentos dos alunos;
interrompidos por explicações reduzidas e unilaterais. predomínio de explicações reduzidas e unilaterais.

• Condução da criança ao espírito dos valores sociais da • Não condução da criança ao espírito dos valores sociais da
verdade por meio da colaboração entre os pares e da prática verdade; discussão organizada não praticada.
da discussão organizada.
116

Quadro 7. Atmosferas morais em aulas de Ciências (cont.)


Atmosfera de autonomia moral Atmosfera de heteronomia moral

• Não prevalência de procedimentos de recompensa ou • Prevalência de procedimentos de recompensa ou punição.


punição.

• Orientação teórico-prática do nível pós-convencional. • Orientação teórico-prática do nível pré-convencional.

• Uso de argumentos discursivos com pretensões de validade. • Uso de argumentos discursivos com pretensões de poder.

• Simetria de participação nas argumentações e discussões. • Assimetria de participação nas argumentações e discussões.

• Mobilização do potencial racional para o entendimento e • Não mobilização do potencial racional para o entendimento
formação crítica dos alunos. e despreocupação com a formação crítica dos alunos.

• Oportunidades para o grupo se auto-governar. • Ausência de oportunidades para o grupo de auto-governar.

• Oferecimento ao outro de possibilidade de críticas e • Ausência de oferecimento ao outro de possibilidade de


interpretações. críticas e interpretações.

• Tentativas permanentes para elevar o nível de argumentação • Ausência de tentativas para elevar o nível de argumentação
dos participantes. dos participantes.

• Diálogos baseados em princípios de justiça e solidariedade. • Ausência de diálogos baseados em princípios de justiça e
solidariedade.

• Prevalência da ação comunicativa. • Prevalência da ação instrumental.

• Tolerância. • Intolerância.

• Uso de princípios, procedimentos e conteúdos da educação • Não aproveitamento de princípios, procedimentos e


em Ciências que possibilitem a reflexão ética (assuntos conteúdos da educação em Ciências que possibilitem a
sociocientíficos, história e filosofia da ciência...). reflexão ética (assuntos sociocientíficos, história e filosofia
da ciência...).

• Ideia de verdade provisória e processual da ciência. • Ideia de verdade absoluta e produto acabado da ciência.

• Respeito aos níveis psicobiológicos do aprendiz e • Despreocupações com os níveis psicobiológicos do


harmonização com o ensino de Ciências. aprendiz e não harmonização com o ensino de Ciências.

• Não hierarquização da ciência perante as outras áreas de • Hierarquização da ciência perante as outras áreas de
conhecimento. conhecimento.

• Não difusão da ideia de ciência como uma autoridade • Difusão da ideia de ciência como uma autoridade
monolítica. monolítica.

• Consciência de que todos os conhecimentos podem mudar. • Inconsciência de que todos os conhecimentos podem
mudar.

• Compreensão crítica e não relativista sobre os diferentes • Compreensão acrítica e relativista sobre os diferentes tipos
tipos de conhecimento. de conhecimento.

• Capacidade de avaliação crítica de argumentos, suposições • Avaliação acrítica de argumentos, suposições e conclusões
e conclusões sobre os diferentes tipos de conhecimento que sobre os diferentes tipos de conhecimento que coexistem com
coexistem com o científico. o científico.

• Tratamento do conhecimento científico de forma não • Tratamento do conhecimento científico de forma autoritária
autoritária ou brutalizada. ou brutalizada.

• Conhecimentos divergentes do científico, que os estudantes • Conhecimentos divergentes do científico, que os estudantes
trazem consigo de outros lugares, não rechaçados trazem consigo de outros lugares, previamente rechaçados ou
previamente e nem ignorados com desdém. ignorados com desdém.
117

Quadro 7. Atmosferas morais em aulas de Ciências (cont.)


Atmosfera de autonomia moral Atmosfera de heteronomia moral

• Preocupações e cuidados com o “hablar ciência” (com a • Despreocupações e descuidos com o “hablar ciência” (com
forma e estilo de comunicação). a forma e estilo de comunicação).

• Discursos com véus ideológicos de primeiro grau. • Discursos com véus ideológicos de segundo grau.

• Discursos de nível completo (equilíbrio entre a ética do • Discursos de evitação dos problemas ou com tendências de
cuidado, da justiça e da veracidade, na qual o professor não desvios da responsabilidade sobre a formação ético-moral.
somente pressupõe boa vontade, racionalidade e autonomia
em todas as pessoas envolvidas, mas centra-se na
participação real e decisão comum).

• Mobilização para um posicionamento crítico dos estudantes • “Fé cega” dos estudantes sobre “suas provas” não
sobre os diferentes tipos de “provas” (para uma predisposição trabalhada (continuidade da predisposição acrítica para a
crítica dos estudantes sobre as suas crenças iniciais). confirmação das crenças iniciais do estudante).

• Ensino e aprendizagem orientados para o exercício de • Ensino e aprendizagem não orientados para o exercício de
cidadania (preparação para tomadas conscientes de decisão). cidadania (não preparação para tomadas conscientes de
decisão).

• Difusão de imagem de ciência processual e humana • Difusão de imagem ingênua do que é a ciência
(contextualizada e socialmente não neutra; concepção não (descontextualizada e socialmente neutra; concepção
empírico-indutivista e nem ateórica; visão problemática, empírico-indutivista e ateórica; visão aproblemática, a-
histórica, não exclusivamente analítica, nem acumulativa de histórica, exclusivamente analítica, acumulativa de
conhecimento linear). conhecimento linear, individualista e elitista).

• Ideia de que não existe apenas uma única natureza da • Ideia de existência de uma única natureza da ciência e aulas
ciência e aulas de Ciências não restritas a um ensino que de Ciências restritas a um ensino que apenas considera a
apenas considera a natureza da ciência acadêmica que natureza da ciência acadêmica que dominava no passado.
dominava no passado.

• Compreensão que ultrapassa a visão internalista da ciência. • Compreensão que não ultrapassa a visão internalista da
ciência.

• Ideias, princípios, procedimentos e conteúdos em prol de • Ideias, princípios, procedimentos e conteúdos em prol de
uma ciência acessível (disciplina de acesso não restrito a uma ciência inacessível (disciplina difícil e acesso restrito a
expertos para tomadas de decisão). expertos para tomadas de decisão).

• Não utilização do conhecimento científico como • Uso do conhecimento científico como instrumento de
instrumento de opressão, coerção ou coação. opressão, coerção ou coação.

• Finalidades e princípios formativos amplos e não • Finalidades e princípios meramente propedêuticos do


meramente propedêuticos do ensino de Ciências. ensino de Ciências (confundindo-se com formação de
cientistas).

• Uso de controvérsias de contextos CTSA, por meio dos seus • Não utilização de temas polêmicos em aula ou uso de
dilemas e respectivos raciocínios morais, com objetivos de controvérsias de contextos CTSA sem objetivos de mobilizar
mobilizar o pensamento crítico e a evolução da autonomia o pensamento crítico e o desenvolvimento da autonomia.
moral e intelectual.

• Uso de estratégias que se beneficiam da heterogeneidade e • Não aproveitamento da heterogeneidade e diversidade em


diversidade em aulas de Ciências, com objetivos voltados em aulas de Ciências para compor estratégias em prol da
prol da evolução do raciocínio moral dos alunos. evolução do raciocínio moral dos alunos.

• Os alunos são confrontados com múltiplas perspectivas de • Os alunos não são confrontados com as múltiplas
problemas morais que envolvem pontos de vista e de perspectivas de problemas morais que envolvem pontos de
informação discrepantes e, por vezes, em contradição com vista e de informação discrepantes e, por vezes, em
seus próprios pontos de vista. contradição com seus próprios pontos de vista.
118

O ambiente constituído pela atmosfera de autonomia moral apresenta uma


configuração preponderante de elementos teórico-práticos que resulta em clima de maior
favorecimento para os alunos, tanto para o desenvolvimento moral, que é base do processo de
emancipação, como para a compreensão, análise crítica e construção do conhecimento
científico.
Sobre o quadro anterior, fica a ressalva da intencionalidade de trabalharmos com os
dois extremos de um processo que é mais extenso. Optamos, no entanto, por situações
preponderantes de heteronomia e de autonomia para dar ênfase aos nossos argumentos. Não
se deve confundir, portanto, como um processo dicotômico de inexistência de elementos entre
ambos os processos.

5.3 - Aulas de Ciências em possíveis situações preponderantes de heteronomia e de


autonomia moral

Na sequência apresentamos alguns discursos25 inerentes a aulas de Ciências, que


utilizamos para dar continuidade aos nossos propósitos de esboçar / projetar correlações com
os aportes teórico-práticos do desenvolvimento moral e da ética discursiva.

Discurso 1: “Noventa por cento vêm com aquela ideia de que está tudo errado aquilo que o professor
falou, porque aprendeu em casa com a mãe e com a avó que Deus criou o universo. Até um tempo
atrás eu fazia um terrorismo dentro da sala de aula. Quando eu falava sobre a teoria da evolução eu
perguntava aos alunos quem era adepto à teoria religiosa. Então, de setenta a oitenta por cento
levantavam a mão. E quando eu perguntava quem acreditava na teoria evolucionista, da origem do
homem pelo ancestral do macaco, tinha uma meia dúzia que levantava a mão. Mas isso por falta de
informação talvez, ou por ter tido uma informação errada. Então, eu fazia um terrorismo com eles”
(Resposta de professor de Biologia de escola particular em entrevista sobre evolução versus criação
nas aulas. Dados extraídos de pesquisa realizada por SOUZA, 2008).

Ações possíveis Características da atmosfera moral (implicações


para a evolução moral e aprendizagem de Ciências)
“Fazer um terrorismo dentro da sala de aula” que Reforço de heteronomia moral e prejuízos ao ensino de
resulte ação de imposição ou coação para aceitação do Ciências:
conhecimento científico. • Uso do conhecimento científico como instrumento de
opressão, coerção ou coação.
• Tratamento do conhecimento científico de forma
autoritária ou brutalizada.
• Atitudes que não valorizam a dignidade, a justiça, a
igualdade e a liberdade.
• Regras e normas provenientes da coação social
(respeito unilateral - da não autoridade para a
autoridade).

25
Os enunciados de situações reais foram extraídos de pesquisas diversas, cujos autores autorizaram a
reprodução e inserção em nosso trabalho.
119

“Fazer um terrorismo com eles” com o sentido Busca de autonomia moral e em prol da aprendizagem
metafórico de usar estratégias de brain storm, a fim de de Ciências:
mobilizar o pensamento crítico para efeitos de • Uso de estratégias que se beneficiam da
subversão dos conhecimentos de senso comum dos heterogeneidade e diversidade em aulas de Ciências,
alunos. com objetivos voltados em prol da evolução do
raciocínio moral dos alunos.
• Os alunos são confrontados com múltiplas
perspectivas de problemas morais que envolvem pontos
de vista e de informação discrepantes e, por vezes, em
contradição com seus próprios pontos de vista.

Discurso 2: “Às vezes os alunos me perguntam: “Professor, o que o senhor quer que eu escreva?
Porque eu acredito que Deus criou tudo, mas o senhor está me falando da evolução e eu preciso tirar
nota. Eu entendi as duas coisas, mas eu acredito em uma apenas” (Professor de Biologia de escola
particular. Resposta de entrevista sobre evolução versus criação nas aulas. Dados extraídos de pesquisa
realizada por SOUZA, 2008).

Ações possíveis Características da atmosfera moral (implicações


para a evolução moral e aprendizagem de Ciências)
Aluno demonstra apenas interesses e ideias Reforço de heteronomia moral e prejuízos ao ensino de
egocêntricas. Ciências:
• Compreensão acrítica e relativista sobre os diferentes
tipos de conhecimento.
• Prevalência de procedimentos de recompensa ou
punição.
• Orientação teórico-prática do nível pré-convencional.
Professor não trabalha com o questionamento do aluno. Reforço de heteronomia moral e prejuízos ao ensino de
Ciências:
• Ensino e aprendizagem não orientados para o
exercício de cidadania (não preparação para tomadas
conscientes de decisão).
• Não mobilização do potencial racional para o
entendimento e despreocupação com a formação crítica
dos alunos.
Professor aproveita e trabalha com os questionamentos Busca de autonomia moral e em prol da aprendizagem
e argumentos do aluno, com objetivos de mobilização de Ciências:
de sua capacidade crítica. • Mobilização do potencial racional para o
entendimento e formação crítica dos alunos.
• Possibilidades do aprendizado se expandir para fora
de assuntos puramente científicos, em prol da
autonomia crítica.

Discurso 3: “A gente programa em função do livro, embora a gente tenha uma sequência básica.
Começa pela célula, tecido, órgão e sistemas. Eu gosto muito de 7ª série, porque estuda o corpo
humano, numa sequência lógica” (Os dados referem-se a respostas dadas por professores, por meio de
entrevista, em pesquisa sobre representações sociais de corpo humano realizada por SHIMAMOTO,
2006).

Ações possíveis Características da atmosfera moral (implicações


para a evolução moral e aprendizagem de Ciências)
Professor que se programa apenas em função do livro. Reforço de heteronomia moral e prejuízos ao ensino de
Ciências:
• Discurso normatizador ou de modelo edificante.
• Finalidades e princípios meramente propedêuticos do
ensino de Ciências (confundindo-se com formação de
cientistas).
120

Ensino de conteúdo por meio de “uma sequência Reforço de heteronomia moral e prejuízos ao ensino de
linear”: começa pela célula, tecido, órgão e sistemas”. Ciências:
• Discursos normatizador ou de modelo edificante a ser
copiado.
• Ensino e aprendizagem não orientados para o
exercício de cidadania (não preparação para tomadas
conscientes de decisão).
• Imagem ingênua de ciência (descontextualizada e
socialmente neutra; concepção empírico-indutivista e
ateórica; visão aproblemática, a-histórica,
exclusivamente analítica, acumulativa de conhecimento
linear, individualista e elitista).
• Ideia de existência de uma única natureza da ciência e
aulas de Ciências restritas a um ensino que apenas
considera a natureza da ciência acadêmica que
dominava no passado.
• Compreensão que não ultrapassa a visão internalista
da ciência.

5.4 - Correlações e potencialidades: análise

No primeiro exercício as respostas típicas que aparecem nos trabalhos de Kohlberg


foram trocadas por cenas discursivas de aulas de Ciências correspondentes a cada estágio.
Os dois discursos do primeiro estágio, tanto do professor como do aluno, apresentam
componentes de juízos morais que caracterizam, segundo Kohlberg, uma autoridade
egocêntrica de poder superior e o respectivo respeito e obediência da criança pelo adulto, por
motivações externas (porque é adulto, porque é ciência, porque é autoridade).
Os dois discursos do segundo estágio também se apresentam no nível inferior do
desenvolvimento moral, pois ambos contêm componentes de juízo moral orientados por troca
de favores ou satisfação de necessidades próprias. Kohlberg chama isso de “igualitarismo
ingênuo”.
Os discursos do terceiro e quarto estágios têm componentes que ilustram uma
evolução em relação aos anteriores, mas ainda assim estão no nível que Kohlberg chamou de
Convencional, porque há uma busca de aprovação ao ajudar o outro e porque ajudar o outro
tem uma conformidade de aprovação social desejável. Ainda nesses casos, a consciência não é
de autonomia moral plena.
Os quatro discursos do quinto e sexto estágios apresentam componentes de juízo moral
elevados. De acordo com Kohlberg, nesse nível de juízo os valores e princípios morais são
internalizados, conscientes e orientados por critérios de justiça, respeito à vida, igualdade,
busca da verdade etc. Esse é um nível de desenvolvimento, portanto, que permite a
emancipação do sujeito.
121

Ainda que apresente lacunas, é um quadro que exercita nossa reflexão sobre o
processo de desenvolvimento moral dos alunos em aulas de Ciências. Representa uma parcela
de contribuição do ensino de Ciências para o processo de desenvolvimento moral dos alunos.
No entanto, não apenas o ensino de Ciências pode contribuir para o desenvolvimento moral
dos alunos, mas vislumbramos uma via de mão dupla nesse processo. Os exercícios seguintes
dão apoio a esse nosso entendimento.
Na justaposição entre as perspectivas sociomorais das teorias de Piaget, Kohlberg e
Habermas e as diversas argumentações que expusemos da área de Educação (em valores e em
Ciências), extraímos um conjunto de elementos característicos e correlacionais relevantes para
os nossos propósitos. Esse procedimento permitiu apontar correspondências que organizamos
nos dois ambientes com “atmosferas de heteronomia e de autonomia moral”. Os dois
ambientes subsidiaram os exercícios com os enunciados de aulas de Ciências.
Esses exercícios não permitem (e nem têm a finalidade de) avaliações ou mensurações
de condutas. São fragmentos discursivos extraídos de determinadas situações e sem apresentar
o contexto ampliado em que foram obtidos. Também não são exaustivos. No entanto, trazem
diferentes elementos que nos permitem ilustrar algumas correlações entre os pressupostos
teórico-práticos do desenvolvimento moral, da ética discursiva e do ensino de Ciências.
Ao conjunto de análises sobre os exercícios anteriores podemos juntar um trecho de
artigo que discute o Big Bang, pois encontramos nele argumentos sobre criticidade que são
inerentes aos nossos. Afinal, como expusemos no início de nosso trabalho, apoiando-nos em
Simmons e Zeidler (2003), os processos que envolvem pensamento crítico e raciocínio moral
estão intimamente entrelaçados e a interação entre essas duas construções permanece aberta a
análises.

Duvidar de algo, científico ou não, é direito de todos. Claro que as teorias da


física moderna são cada vez mais estranhas para um público não acostumado
com a maneira como os cientistas geram e apresentam suas idéias. O que é
importante é ser crítico em relação ao que lê e procurar discutir cada vez
mais com outras pessoas que também gostem do mesmo assunto. Se você
duvida do que a física atual está propondo como teoria procure conversar
sobre o tema não apenas com aqueles que concordam com o que você pensa
(o que é muito natural) mas principalmente com aqueles que pensam de
modo diferente de você. Sempre que souber de uma palestra de divulgação
sobre esse assunto compareça, perca a vergonha e pergunte. Lembre-se que
você não é obrigado a ter uma resposta para cada questão levantada. Isso é,
dentro dos limites possíveis do conhecimento atual, obrigação do
profissional que está fazendo a palestra. Seja crítico mas lembre-se: ciência
não é feita baseada em "opiniões". Não adianta dizer "eu não acredito nisso".
É preciso provar que a teoria que está sendo proposta, por mais estranha que
122

pareça, possui ou algum erro matemático ou alguma contradição física. É


assim que se faz ciência (BRASIL, 2008, s.p.).

O trecho acima traz um conjunto de elementos que consideramos emblemáticos,


porque ilustram ocorrências ou ideias que podem ser encontradas em aula e que também
poderiam ser analisadas diante das duas atmosferas morais: “a dúvida é direito de todos”; “a
ciência não pode ser cada vez mais estranha para os leigos”; “o importante é ser crítico”; “a
ciência não é baseada em opiniões”; “é preciso ter provas ou argumentos fundamentados na
ciência”. Dito de outra forma: os alunos podem duvidar (e duvidam de diversos
conhecimentos científicos), devem ser críticos e basearem seus argumentos não apenas em
meras opiniões. No entanto, se a ciência ensinada estiver distante deles, em ambiente de
reforço da heteronomia moral, como poderão fazer uma leitura crítica dos conhecimentos
científicos e, ainda, construírem seus argumentos balizados cientificamente? Esse
questionamento permite algumas discussões.
Em primeiro lugar, os alunos estão em processo de desenvolvimento, possivelmente
em estágios (cognitivos e morais) preliminares ou intermediários que só permitem a emissão
de opiniões com baixo grau de criticidade ou respaldadas acriticamente no aprendizado
familiar, religioso, midiático etc. Em segundo lugar, somente podem ser críticos se oferecidas
oportunidades reais para isso, em ambientes com atmosfera de autonomia moral. Em terceiro
lugar, não conseguirão ser críticos se a ciência continuar estranha para eles ou se continuarem
com ideias de ciência vinculadas à neutralidade, verdades absolutas, conhecimento de acesso
restrito a expertos etc. Pode alguém ser crítico em ambiente de heteronomia moral? Como
aprender Ciências em meio a discursos que preponderam elementos de heteronomia moral
sobre a ciência? Entendemos que ser crítico e aprender Ciências de forma significativa são
processos contíguos e implicam autonomia moral. Não se aprende ciência em ambiente de
heteronomia moral. Não se aprende a ser crítico e autônomo em ambiente de heteronomia
moral. No ambiente de heteronomia moral predomina a ideia de ciência que não difere de
dogmas.
À luz das perspectivas sociomorais das teorias de Piaget, Kohlberg e Habermas e
subsídios reflexivos dos exercícios anteriores, recuperamos a charge extraída de Bizzo (1993)
para ilustrar os nossos argumentos. Agora, com adaptações de continuidade da mesma charge
para expor algumas possibilidades de aprendizagem dos alunos, diante do referido discurso
(figuras 5 e 6).
123

Figura 5. Retomada da charge sobre discurso de evolução

Figura 6. Possíveis consequências do discurso do professor sobre os alunos

Não são cientistas adultos que estão nas aulas, mas crianças, adolescentes ou jovens
em estágios preliminares ou intermediários de desenvolvimento cognitivo e moral. Eles se
apresentam para aprender Ciências, para exercitar suas capacidades críticas e também para
desenvolver cognitiva e moralmente. São processos correlativos, cujos procedimentos de
ensino interferem em todos eles.
Em um dos tópicos anteriores deste trabalho, vimos em Lemke (1997), por exemplo,
como a maneira de falar sobre ciência pode difundir ideias equivocadas e envolver a
moralidade.
Ao ensinar o conteúdo do currículo de ciências e os valores que
frequentemente o acompanham, a educação científica, muitas vezes sem
notar, também perpetua uma certa “mística da ciência”. Essa mística tende a
fazer que a ciência apareça ante os alunos como dogmática, autoritária,
impessoal e, ainda, inumana. [...] Isso aliena os alunos a respeito da ciência.
[...] Analisar como professores e alunos falam sobre ciência em aula pode
nos ajudar a compreender como se perpetua essa mística, que é nociva, e o
que podemos fazer a respeito (LEMKE, 1997, p.13).

A preocupação do ensino de Ciências deve permanecer nos conteúdos e


conhecimentos científicos. Não discordamos. No entanto, não em ambiente de reforço à
124

heteronomia moral, pois nele há perda de oportunidade de provocar tanto o desenvolvimento


cognitivo como moral, trazendo prejuízos à compreensão e construção do conhecimento
científico perante os demais tipos e também ao processo de autonomia moral.
Por que privar o aluno, por si ou com auxílio e cooperação (base da autonomia moral)
dos demais (colegas e professores), de passar por um processo de construção conceitual?
Trabalhar somente com o que a comunidade científica aceita atualmente é um reforço à ideia
de ciência como produto e não como processo, reduzindo-se possibilidades de
desenvolvimento da aprendizagem, tanto no âmbito da cognição como da moral.
Os alunos comumente encerram ideias, conceitos e conhecimentos embasados no
senso comum, muitas vezes construídos com a contribuição de familiares, amigos, instituições
religiosas. Na sala de aula, descartar tudo isso? Por que os argumentos de excluir os
conhecimentos diversos que fazem parte dos problemas dos alunos, se serão eles que
auxiliarão no desenvolvimento crítico dos alunos?
Não se é ingênuo a ponto de defender que se inicie e se termine com o senso comum
numa aula de Ciências, mas também não se pode querer abreviar um tempo de aprendizagem
que pertence somente ao aluno ao finalizar ou dar resultado pronto a aquilo que o aluno vai
continuar aprendendo ao longo de sua vida.
Não se imagina o ensino da astrologia nas aulas de Ciências. Também não se imagina
o ensino do criacionismo. A evolução deve ser ensinada. Assim ocorrerá com sexualidade,
células-tronco, alimentos transgênicos, Big Bang, inseminação artificial, conceitos de vida e
morte etc. O caráter de controvérsia que envolve esses e outros assuntos, como vimos, pode
servir-se como estratégia em prol do desenvolvimento moral dos alunos.
Enfatizamos que não há aqui defesa contrária ao ensino de conteúdos e conhecimentos
de ciência em sala de aula. Não defendemos o ensino do senso comum ou de conhecimentos
religiosos nas aulas de Ciências, como alguns podem de forma equivocada pensar. Apenas
encontramos maiores possibilidades de uma aprendizagem significativa e crítica de Ciências
se for levado em conta o processo de desenvolvimento moral dos alunos. E isso envolve
(saber) trabalhar (e comunicar) tipos diferentes de conhecimentos.
As imposições unilaterais de ideias ou o desprezo da ideia do outro, mesmo que seja
executada de modo involuntário, já são elementos que se colocam como interferentes ao
desenvolvimento moral e à aprendizagem de Ciências. Se as aulas de Ciências considerarem
ou oferecerem entendimento ao aluno de que somente a ciência é “a” forma de conhecer o
mundo, desprezando-se meramente a existência dos demais tipos de conhecimento, a
tendência será de continuidade desse pensar acrítico. Se as aulas de Ciências trabalharem
125

conteúdos por meios impositivos, ainda que os seus fins estejam na justificativa “preciso
ensinar o conhecimento científico”, essa orientação teleológica, que difere da orientação
deontológica, já implica obstáculos à autonomia moral. No entanto, se as ideias forem
apresentadas e debatidas com simetria de participação e busca de validação do conhecimento
por meios da criticidade, o relativismo acrítico tenderá a perder espaço. Em qualquer desses
casos vemos implicações para a aprendizagem de Ciências, para o desenvolvimento da
autonomia moral e para a construção do pensamento crítico, resultando em vantagens ou
desvantagens que impactam todo o conjunto desses processos. Entendemos que o impacto
ocorre em todos os processos porque estão dispostos numa interface na qual os diferentes
elementos são correlativos.
Nossos exercícios ilustram como os pressupostos teórico-práticos do desenvolvimento
moral e da ética discursiva podem orientar as aulas de Ciências e vice-versa.
Um subsídio das bases teórico-práticas do desenvolvimento moral e da ética discursiva
para as aulas de Ciências: o debate orientado e caracterizado por simetria de participação, sem
a presença de elementos característicos da heteronomia moral potencializa a ampliação de
uma visão crítica de ciência e auxilia na comparação com os demais tipos de conhecimento.
Essa “atmosfera” potencializa (não necessariamente em prazo imediato, mas no processo
formativo como um todo) comparações desimpedidas e livres de obstáculos da imposição, por
exemplo, entre os graus de criticidade e de fundamentações em que tais conhecimentos são
construídos, difundidos e apropriados pelos sujeitos do debate, da sociedade, de grupos de
cientistas, de grupos religiosos etc. Não há elementos potenciais de promoção de
distanciamento entre os alunos e a ciência.
Um subsídio das aulas de Ciências - bases em visão desmistificada e destituída de
características de neutralidade e de conhecimento como produto acabado ou de difícil acesso
para os leigos - para o desenvolvimento moral e ética discursiva: esse tipo de ensino é
efetivado em “atmosfera” ausente de unilateralidade, mera transmissão ou imposição, isto é,
apresenta características e elementos estimulantes ao desenvolvimento do raciocínio moral.
Não há elementos potenciais de promoção de distanciamento entre os alunos e a ciência.
Nessa interface, a inversão de um corresponde a inversão do outro. O prejuízo de um
obstaculiza o outro, pois há uma correlação mútua (um mutualismo válido e exequível) entre
componentes do desenvolvimento moral e da aprendizagem em aulas de Ciências.
Um prejuízo provocado pela formação moral heterônoma para o ensino de Ciências: a
ausência de debate orientado / caracterizado por simetria de participação e a presença de
autoritarismo, de uso do conhecimento científico como forma de poder obstaculiza a
126

ampliação de uma visão crítica de ciência e dos demais tipos de conhecimento. Essa
“atmosfera” é impeditiva (não necessariamente em prazo imediato, mas no processo
formativo) de comparações entre os graus de criticidade e de fundamentações em que tais
conhecimentos são construídos, difundidos e apropriados pelos sujeitos do debate, da
sociedade, de grupos de cientistas, de grupos religiosos etc. Há elementos potenciais de
distanciamento entre os sujeitos da aprendizagem escolar e a ciência.
Um prejuízo provocado pelas aulas de Ciências - bases em visão mistificada da
ciência, com a difusão de características de neutralidade e de conhecimento como produto
acabado - no desenvolvimento moral: esse tipo de ensino é efetivado em “atmosfera” de
unilateralidade, de transmissão de conhecimento e de imposição, ou seja, com características e
elementos desestimulantes ao desenvolvimento do raciocínio moral, pois é ambiente em que
prepondera reforço de heteronomia moral. Há elementos potenciais de distanciamento entre
os sujeitos da aprendizagem escolar e a ciência.

5.4.1 - As visões de Janus

Em síntese, podemos extrair dessas discussões duas situações diferentes (ou uma única
situação com possibilidades divergentes de interpretação ou ação). Assim como fez Latour
(2000) na sua análise de ciência, na qual procura demonstrar a relevância dos contextos
sociais para o entendimento da atividade científica, também nós utilizamos a personagem
mitológica de Janus Bifronte26 para dar continuidade aos nossos argumentos (figura 7).

Vejo uma atmosfera de Vejo uma atmosfera de


heteronomia moral, a autonomia moral, a contemplar
contemplar componentes que componentes de busca de
reforçam a heteronomia moral autonomia moral e em prol da
e trazem prejuízos ao ensino de aprendizagem de Ciências
Ciências

Figura 7. As duas visões de Janus Bifronte

26
Personagem da mitologia romana com duas faces que miravam para lados opostos. Dizem que uma face
olhava para o passado e a outra para o futuro. Assim, ambas sempre enxergavam coisas diferentes.
127

A face da esquerda de Janus mira o passado e vê um conjunto de ideias que


entendemos superadas, mas ainda persistentes sobre ciência, aulas de Ciências e formação
moral. A face da direita de Janus mira o futuro e vê um conjunto de ideias que entendemos
mutuamente profícuas para a ciência, aulas de Ciências e formação moral.
A mesma face de Janus que vê no passado a difusão de ideia de ciência acabada, como
produto, é aquela que também vê a formação moral como socialização. A mesma face de
Janus que vê no passado um professor impositivo e coercitivo diante de seus alunos, ainda
que não intencional, é aquela que também vê a ciência como matéria de difícil aprendizagem.
E ainda vê na mesma imagem essa “ciência difícil” tornar-se um instrumento que é usado para
atribuir poder ao adulto, ao experto. A mesma face de Janus que vê no passado um ambiente
escolar de predominância moral heterônoma é aquela que também vê os alunos apreenderem
uma ciência que está longe de seus domínios; uma ciência que é apenas de expertos.
Por outro lado, a mesma face de Janus que mira o futuro e vê na escola a ciência ser
trabalhada como processo humano é aquela que também vê a educação moral baseada no
desenvolvimento e na dimensão ética discursiva. A mesma face de Janus que mira o futuro e
vê um professor dialógico, preocupado em trabalhar os conteúdos científicos por meio de
estratégias que estimulam a autonomia moral dos alunos, é aquela que também vê a ciência
acessível e utilizada por todos em argumentos decisórios (figura 8).

Eu vejo a ciência usada na escola como Eu vejo a ciência ser trabalhada na


instrumento de poder e coerção, como escola como subsídio para a
instrumento que reforça a heteronomia autonomia moral dos alunos e vice-
moral dos alunos. Nessa imagem, versa. Nessa imagem, professor e
professor e alunos estão separados e a alunos estão juntos em ações
ciência está distante deles, pois é colaborativas e dialógicas e a
trabalhada como matéria difícil e para ciência, como conhecimento
poucos expertos. Então, os alunos construído criticamente, aproxima-se
tendem a optar pelo senso comum, pois cada vez mais dos alunos. Então,
é mais simples e de seu cotidiano. eles podem comparar com o senso
comum e outros tipos de
conhecimento.

Figura 8. O desenvolvimento moral em aulas de Ciências nas visões de Janus

5.4.2 - Os itinerários de Antígona passam pelas aulas de Ciências

Com estratégia semelhante a aquela de Freitag (1992), que utilizou de personagens da


dramaturgia de Sófocles (2000) para discutir a questão da moralidade e, assim, traçar
possíveis itinerários de acordo com diferentes orientações teóricas (especialmente Piaget,
128

Kohlberg e Habermas), também nós ousamos nessa tentativa. Não com personagens de
Sófocles, mas com dois cenários simulados de aulas de Ciências (quadros 8 e 9). Esse
exercício traz subsídios para nossa análise.

Quadro 8. Primeiro cenário simulado de uma aula de Ciências


Aula: Tema controvertido qualquer (células-tronco, gene gay, evolução, transgênicos, educação sexual etc.).
Professor: - É ciência o que digo, então, não se questiona. O que vocês trazem como conceitos e conhecimentos
acerca desse tema tem bases apenas em senso comum ou dogmas que vieram de ensinamentos errados de seus
pais. Nesse caso, o que faremos é o seguinte: mudar isso em vocês. O que vocês sabem não têm valor aqui nas
aulas de Ciências, porque já sabemos o que e como vocês pensam sobre tudo. E está tudo errado. Não tem nem
como discutir essas coisas, pois aqui só vou ensinar o que é científico, o que é verdade. [E o professor ainda
complementa em pensamento: Farei um terrorismo se algum dos alunos questionar ou vir com aquelas histórias
ridículas de família, de religião, de sua cultura etc.].
Aluno 1: [Pensa consigo mesmo: Essa ciência é difícil mesmo de entender. O professor falou, então, está falado
e pronto. Como eu não entendo a ciência, prefiro ficar com o que eu já sei. Só preciso da ciência para a prova do
fim de bimestre mesmo. É só decorar].
Aluno 2: [Pensa consigo mesmo: Como o professor ousa a falar assim de meus pais, da minha religião. Estou
com ódio desse professor. Se eu não estivesse com medo dele... E essa tal de ciência que fique lá com os seus
cientistas malucos].
Aluno 3: [Pensa consigo mesmo: Entendo o que o professor diz: somente a ciência é que diz a verdade. Além
disso, a ciência é neutra e o que hoje ela nos traz é resultado pronto e acabado. Então, não se discute mesmo].
Aluno 4: [Pensa consigo mesmo: Tenho dúvidas, mas nem vou perguntar. O professor pode fazer o que já fez
com outros colegas que perguntaram. Eles vão rir de mim. Então, deixa pra lá].
Observador externo27: - Aula de Ciências é para ensinar ciência. Não se pode dar espaço para outros tipos de
conteúdo ou de conhecimento nas aulas de Ciências. O procedimento do professor pode até estar equivocado,
mas é só uma questão de constrangimento que nada tem a ver com o conteúdo ensinado. Ele se apóia
corretamente na delimitação: ciência (devo ensinar) versus não-ciência (não devo ensinar). Os fins justificam os
seus meios.

Quadro 9. Segundo cenário simulado de uma aula de Ciências


Aula: Tema controvertido qualquer, com orientações teóricas do desenvolvimento sociomoral.
Professor: - Ciência é processo humano. É falível, mas ainda assim produz conhecimentos com alto grau de
criticidade, de discussão, de verificação, de ajustes no tempo etc. Não é matéria difícil e exclusiva dos cientistas.
Nós podemos e devemos nos apropriar de conhecimentos científicos, no mínimo, para que possamos tomar parte
em discussões e decisões que dizem respeito ao nosso próprio mundo. Esse tema que vamos tratar tem
explicações diversas, vindas da religião, da cultura, mas nós veremos pelo lado da ciência. Podemos discutir e
comparar com os outros conhecimentos diversos, sem constrangimentos, sem medos e com participação
equitativa para melhor entendermos essas diferenças entre ciência e as demais áreas de conhecimento. [E o
professor, provavelmente, complementa em pensamento: Não é missão fácil, nunca saberei com certeza o que
virá pela frente, mas essa será a minha maneira de agir – de colaboração].
Aluno 1: Se é assim, se a ciência não é difícil, quero entendê-la e saber utilizá-la não somente nas provas
bimestrais.
Aluno 2: Agora estou começando a entender algumas diferenças e divergências entre o que aprendo nas aulas de
Ciências e o que aprendo em outros locais.
Aluno 3: Entendo o que o professor diz: A ciência não é a forma de conhecer e relatar o mundo, mas uma das
formas mais críticas, testadas e discutidas de fazer isso. Ela não é neutra e, de alguma forma, podemos intervir
nela.
Observador externo: - Aula de Ciências é para ensinar ciência para crianças, adolescentes e jovens que, não
necessariamente, serão cientistas. Não se pleiteia dar espaço equitativo para outro tipo de conteúdo ou
conhecimento nas aulas de Ciências, mas um espaço do discurso prático capaz de superar a acriticidade.
Questões de conduta e de constrangimento nos remetem à moralidade, que interfere na aprendizagem do
conteúdo científico ensinado. O professor não se apóia apenas na delimitação “ciência (devo ensinar) versus não-
ciência (não devo ensinar)”, mas também em orientações sociomorais.

27
Esse conjunto de ideias transmitido pelo observador externo foi extraído de situação real.
129

As simulações dos dois cenários anteriores podem ser reduzidas e incipientes, mas
ilustram alguns elementos de formação moral e aulas de Ciências em formatos e
consequências silenciosos e até mais duros como na tragédia “Antígona”, de Sófocles.
Diz Freitag num determinado trecho de sua análise condicionante sobre a metáfora de
Antígona:
Vimos, contudo, especialmente com auxílio de Piaget e Kohlberg, que
Antígona, por si só, não tinha as competências (cognitivas, morais e
lingüísticas) para iniciar, sozinha, um discurso prático no sentido dado por
Habermas, pois ainda não tinha atingido a autonomia moral (segundo Piaget)
ou a moralidade pós-convencional (segundo Kohlberg) que lhe permitiriam o
distanciamento e o questionamento das duas leis em vigor em Tebas
(FREITAG, 1992, p. 271).

Paralelamente aos nossos dois cenários anteriores, também podemos admitir que os
alunos não têm competências cognitivas, morais e linguísticas para iniciar o discurso prático
habermasiano, pois se supõe que ainda estejam no estágio de heteronomia moral (segundo
Piaget) ou no nível pré-convencional (segundo Kohlberg). Isso não permite que observem e
analisem criticamente os distanciamentos e diferenciações entre conhecimento científico e os
demais. Por outro lado, seguindo-se por esse mesmo tipo de exemplo condicionante, o
professor seria, teoricamente, o personagem com as devidas e necessárias competências
(cognitivas, morais e linguísticas) para não somente iniciar mas conduzir um discurso prático,
o que resultaria (não obrigatoriamente de forma imediata, mas, no mínimo, com preparações
de “terreno”) aproximar dos alunos, por reflexão e ação deles próprios, uma aprendizagem
significativa do conhecimento científico (no sentido ausubeliano).
Os nossos dois cenários intencionalmente contrastam. Em qual deles temos elementos
correlativos entre ensino-aprendizagem de Ciências e formação moral? Em ambos podemos
identificá-los. No entanto, cada cenário encerra perspectivas correlacionais mútuas, mas
divergentes entre si. O primeiro cenário encerra perspectivas de manutenção da heteronomia
moral e prejuízos à aprendizagem de Ciências. O segundo cenário, no mínimo, traz
potencialidades para o desenvolvimento da autonomia moral e para a aprendizagem de
Ciências (análise crítica, capacidade para comparações com maior grau de complexidade
etc.).
Nos dois cenários, tanto no modo inter como no modo intra, observamos a ocorrência
de correlações que são recíprocas. No primeiro cenário, por exemplo, heteronomia moral leva
à ideia indesejável de ciência e a ideia indesejável de ciência reforça a heteronomia moral. No
130

segundo cenário, autonomia moral leva à ideia mais próxima de ciência e esse modo de
pensar sobre a ciência-processo humano potencializa favoravelmente a autonomia moral. No
modo inter-ambiente, a correlação é de oposição, ou, no mínimo, de afastamento: Cenário um
afasta-se do cenário dois e vice-versa.
Ao fazer defesa da teoria de Kohlberg, Lourenço afirma:

Ir longe no desenvolvimento moral seria, por exemplo, atingir o que


Kohlberg designou de moralidade pós-convencional: um nível de moralidade
que nunca resolveria os conflitos de interesses, necessidades e desejos dos
diversos intervenientes sem primeiro ter em conta todos os pontos de vista
ou perspectivas envolvidas no conflito; balancear e sopesar, depois, cada um
desses pontos de vista ou perspectivas; e proceder, por fim, à sua
hierarquização, em conformidade com os tais princípios que não são apenas
normas para acção, mas razões para a própria acção. É razoável supor que
uma solução tomada nestes termos apresente forte probabilidade de ser
muito mais justa e, portanto, mais moral, do que uma outra que não tenha em
conta estes três aspectos (LOURENÇO, 2002, p. 33-34).

Transpondo-se as ideias defendidas acima para as especificidades a envolver aulas de


Ciências: deve sair de cena o ensino transmissivo, informativo, autoritário e dogmático do
conhecimento científico no intuito de vislumbrarmos uma cena em que, tendo-se o
desenvolvimento moral como pano de fundo, o conhecimento científico terá maiores
probabilidades de ser entendido como tal. Então, num exercício de reconstrução da fala de
Lourenço (2002), poderíamos dizer que: Ir longe no desenvolvimento moral traria benefícios
à aprendizagem significativa do conhecimento científico, pois, por exemplo, ao atingir (aqui
poderíamos mudar para “buscar”) o que Kohlberg designou de moralidade pós-convencional,
não poderíamos resolver os conflitos pessoais ou interpessoais sobre o embate entre senso
comum, dogmas e conhecimento científico sem primeiro ter em conta todos os pontos de vista
ou perspectivas envolvidas nesse tipo de conflito; balancear e sopesar, depois, cada um desses
pontos de vista ou perspectivas; e proceder (ou deixar que se proceda, porque o processo é de
construção e não se acaba ali), por fim, suas escolhas (cada qual, agora, tendo novos
elementos advindos de partilhas e colaborações coletivas). É razoável supor que uma solução
tomada nesses termos de justiça e, portanto, favorável ao desenvolvimento moral, também
favoreça (não vemos como desfavorecer) a aprendizagem do conhecimento científico.
131

5.4.3 - Para além dos assuntos controvertidos

Neste momento de nossas argumentações, algumas ressalvas nos parecem necessárias.


A primeira delas refere-se ao embate “evolução versus criação”. Porque utilizamos a
controvérsia entre evolucionismo e criacionismo em alguns de nossos exercícios, já ouvimos
de críticos mais apressados acusações de defendermos ideias criacionistas ou outras contrárias
à ciência. Cabe ressaltar, então, que não se trata aqui neste trabalho de uma suposta defesa
camuflada do chamado “tratamento balanceado ou equitativo” entre a teoria da evolução e os
pressupostos do criacionismo (ideia baseada em promulgação de uma lei americana - Act 590,
de 1981, no Estado de Arkansas - que, em resumo, determinava um mesmo espaço nas aulas
escolares para o ensino da evolução e do criacionismo). Não é essa a ideia que defendemos.
Trata-se de usar as controvérsias (não há como negar a existência delas) para
instrumentalizar os estudantes em favor de uma formação crítica a permitir, nesse processo
baseado no desenvolvimento moral (direcionamentos para a autonomia moral), que os
estudantes, por eles mesmos, percebam e estabeleçam as diferenças existentes entre os
diferentes tipos de conhecimento. Acreditamos, assim, que o conhecimento científico possa
tomar o seu devido lugar nas comparações com dogmas ou outros tipos de conhecimento que,
por vezes, têm suas bases presas na imposição, na coerção, na verdade absoluta, na
acriticidade.
Tratar o conhecimento científico nesse mesmo nível heteronômico é igualar-se aos
demais. Abrir à discussão participativa (e não ao “ensino do criacionismo” – termos esse que
parece reduzir-se à transmissão de conteúdo) é permitir que se escolha com mais elementos
críticos no processamento cognitivo e moral. Repetimos o que dissemos em outras
oportunidades: os alunos não são cientistas, não são adultos, não estão em estágios ou fases
adiantadas em termos do desenvolvimento cognitivo e moral. Sendo assim, as tentativas de
apenas transpor o embate científico dos expertos ou do mundo dos adultos – que são
preponderantemente coercitivos e impositivos, ou seja, heterônomos – para as salas de aula,
apenas servirão para, no mínimo, manter os alunos numa posição afastada do conhecimento
científico e, assim, mantenedoras de seus dogmas e senso comum.
As discussões aqui tratadas por nós não estão no âmbito das controvérsias em si, seja
em favor ou contra a algo, mas em como isso vem interferindo nos aspectos cognitivos e
morais dos estudantes e, por consequência, na própria aprendizagem deles em relação à
ciência.
132

Mais uma vez, repetimos: entendemos que o conhecimento científico obterá ganhos de
aprendizagem nas comparações (ainda que não imediatamente processadas) com outros tipos
de conhecimento se estiverem suas bases ancoradas na autonomia moral. O entendimento que
temos é, por exemplo, que a compreensão da teoria da evolução torna-se facilitada se não
tratada no mesmo nível dos dogmas e dos produtos acabados e dos conhecimentos acríticos
(ou com graus menores de criticidade) como é o caso do criacionismo.
Ou será que estamos equivocados e a imposição acabará com as controvérsias e
contribuirá de maneira promissora para o ensino de Ciências? Ou será que impor o
conhecimento científico às crianças e aos adolescentes basta para que aprendam e avancem
criticamente acerca do senso comum? Nesse caso, não estaríamos promovendo algo similar
como uma troca de dogmas por outros “dogmas”?
Na sequência abaixo, extraímos de publicações diversas alguns exemplos de citações
pró-criacionistas (itens a, b, c) e pró-evolucionista (item d). E se chegassem assim às salas de
aula em que se encontram crianças?

a) [...] A equívoca ciência nos mostra um caos, [...] não explicam a origem da vida e, quando tentam
fazê-lo, o fazem de forma ridícula (BOLETIM INFORMATIVO, 1999, p.1).

b) [...] Precisamos encarar o fato de que a teoria da evolução serve ao propósito de Satanás. [...]
Deveríamos sentir a mais forte indignação diante da doutrina da evolução e de seu originador, uma
vez que a intenção é privar-nos da vida eterna (WATCH TOWER..., 1985).

c) A idéia de que a teoria da evolução contraria as escrituras é muito ignorante (REVISTA ISTO É,
1997, p. 31);

d) [O ensino do criacionismo] é propaganda enganosa. É um caso que deveria ser visto como de
defesa do consumidor. Os alunos deveriam procurar o Procon28.

Sobre os fragmentos acima, não entraremos nos méritos de diferenciação entre os


conhecimentos oriundos da ciência e da religião. Sobre esses conflitos, a literatura é vasta e
apresenta pertinentes construções argumentativas (entre outros, vide FREIRE-MAIA, 1997a,
1997b; EL-HANI; SEPULVEDA, 2001; SEPULVEDA; EL-HANI, 2004; SAMPAIO, 2006;
FONSECA, 2008). Desviando-se intencionalmente dessas discussões mais difundidas entre
evolucionismo e criacionismo e, também, sem entrar no mérito (ou demérito) de cada
perspectiva, mas ressaltando-se apenas as contundências e imposições que elas carregam (ou
se fazem presentes nas argumentações violentas ou coercitivas de uma contra a outra), há uma

28
Depoimento inserido em: GAZIR, A. Escolas do Rio vão ensinar criacionismo. Folha de São Paulo (on line),
2004 (vide ANEXO B).
133

preocupação nossa de como o embate chega e é trabalhado nas salas de aula. Para a linha
argumentativa que traçamos, queremos apenas que os leitores identifiquem as semelhanças no
formato contundente e impositivo dos discursos de ambos os lados, que assim também podem
chegar às salas de aula.
A segunda ressalva que se faz necessária refere-se à dimensão ampliada que nossos
argumentos tomam, para além dos debates de assuntos sociocientíficos. O debate de assuntos
sociocientíficos pode subsidiar o desenvolvimento moral, por causa de seu conteúdo
controverso que facilita a emersão de aspectos inerentes à ética. No entanto, entendemos que
a contribuição do ensino de Ciências para a formação moral vai além da estratégia de aula
desse tipo, pois envolve não apenas quem planeja, implementa e media o debate, mas também
de conhecimentos teóricos sobre formação moral que são multidisciplinares e devem ser
buscados, por exemplo, no campo da psicologia do desenvolvimento humano.
As discussões de questões sociocientíficas podem contribuir para a formação moral na
perspectiva do desenvolvimento moral. Não negamos esse potencial de contribuição. No
entanto, defendemos a existência de um quadro maior de potencialidade das aulas de Ciências
para a formação moral, com a perspectiva cognitivo-desenvolvimentista, que não se restringe
aos dilemas ou assuntos controvertidos do ensino de Ciências. É uma contribuição de maior
abrangência que se faz presente na interface das duas áreas, como vimos na exposição das
características de mutualismo. Portanto, não há uma via de mão única nesse processo, como
alguns pesquisadores argumentam, pois não apenas o ensino de Ciências contribui para o
desenvolvimento moral como também os elementos e princípios que fundam as perspectivas
sociomorais (encontradas especialmente em Piaget, Kohlberg e Habermas) são contributos
relevantes para o ensino de Ciências.
A terceira ressalva recai sobre uma possibilidade pragmática, mas não menos relevante
que se apresenta substanciada em nossas argumentações. A ideia que defendemos sobre a
interface de mutualismo entre ensino-aprendizagem de Ciências e formação moral possibilita
sair de generalizações e retóricas encontradas em diferentes trabalhos e, assim, dar sentido,
clareza e explicação assentada em teorias do desenvolvimento sociomoral a discursos até
então vagos como, por exemplo: “O ensino de Ciências deve promover a formação ética e
moral dos estudantes”; “O ensino de Ciências é relevante para a formação integral do aluno”;
“A educação em ciência deve levar em consideração os aspectos cognitivos, sociais, afetivos e
morais”.
134

5.4.4 - Nas entrelinhas de um discurso “científico”

Em meio a esses argumentos, peço licença aos leitores para apresentar uma
experiência por mim vivenciada, e que fortalece a necessidade de reflexões e de fundamentos
para discernimento sobre a sutileza das entrelinhas de quem se apropria de uma situação de
equívoco do senso comum. Refiro-me à apropriação dessa ideia de ciência que ensejamos
desmistificar, mas que é utilizada para veicular e reforçar outras ideias também equivocadas.
Explico brevemente a seguir.
Interessado na forma e no conteúdo dos argumentos que seriam apresentados ao
público, participei como ouvinte de um seminário sobre “Criação e Evolução” realizado num
determinado colégio confessional. O anúncio no jornal destacava, então, um largo currículo
científico do palestrante (pós-doutorado no exterior, doutorado em Física com projeto de
pesquisa aprovado pela FAPESP etc.), o que fez aumentar em mim o interesse pelo evento.
No conjunto, foram três dias de palestras. Cada uma de duas horas e meia de duração,
aproximadamente. Participei da primeira. No auditório estavam aproximadamente 120
pessoas. Na sua maioria, estudantes e professores. Antes do início da palestra, instigados a se
identificarem pelo apresentador, soube-se que no meio dos presentes estavam
aproximadamente 40 professores da rede pública de ensino.
O palestrante fez um alerta inicial de que não se tratava ali de confronto entre ciência e
religião. Não falaria sobre religião, mas apenas de ciência. Sobre o conteúdo, confrontaria e
explicitaria cientificamente os posicionamentos entre criacionismo e evolucionismo. O que se
viu, então, foi uma explícita defesa daquilo que chamava de “criacionismo científico”,
utilizando-se “a força da ciência” para embasar seus argumentos.
O conteúdo era confuso, num ir e vir que sempre terminava na “vitória do
criacionismo sobre o evolucionismo”. Chamou-me a atenção a forma de apresentação dos
argumentos: uso de ideia falsa e equivocada da ciência em diversos momentos e estratégia de
sedução nos seus discursos (a todo instante repetiu que se tratava de uma posição científica,
mencionou diversos nomes de cientistas criacionistas, fez uso do indutivismo ingênuo etc.).
Começou com uma “aula sobre ciência”, distinguindo conceitualmente teoria, fato, hipótese,
mas inserindo definições falsas e não menos confusas. Essa era a minha avaliação. No
entanto, a forma que apresentava suas argumentações seduzia a platéia. Enfim, a ideia de
ciência veiculada para corroborar os seus argumentos nitidamente aproveitava-se do senso
comum. Utilizou-se da ideia de senso comum de ciência para descaracterizar e desmoralizar a
135

evolução. Não apresentou fontes ou origens de seus argumentos, o que me fez retomar
lembranças dos véus ideológicos apresentados por Fourez (1995). Não apresentou elementos
de coerção explícita, mas sim de sedução e de direcionamento acrítico. A forma de sua
apresentação, utilizando-se de técnicas de sedução, e aproveitando-se da ideia mistificada de
ciência que perdura no senso comum, conseguiu distorcer e omitir, por exemplo, a
característica do senso crítico da ciência.
O que nos preocupa, com tudo isso é a forma coercitiva aplicada e utilizada para se
ensinar isso ou aquilo a crianças, adolescentes e jovens em processo de formação cognitiva e
moral. O que nos importa não é meramente o posicionamento da ciência perante os
conteúdos, especialmente dos temas polêmicos, mas, porque o objeto deste estudo foca o
ensino de Ciências, o problema está em “Como os assuntos - especialmente os polêmicos -
são trabalhados em sala de aula?” Porque, como dissemos anteriormente, há consequências
para as crianças, os adolescentes e os jovens no processo de mudança conceitual - do senso
comum para o científico. O “como” desse processo envolve, por exemplo, interferências no
desenvolvimento moral, à luz das perspectivas sociomorais que especialmente perpassam
Piaget, Kohlberg e Habermas. Pudemos observar isso no conjunto de argumentos anteriores.

5.4.5 - Pesquisas sobre relações coercitivas em sala de aula

Em princípio, o conjunto de nossos argumentos pode causar impressão de


anacronismo, pois o tempo dos castigos e punições na escola já é passado. Recorremos, então,
a algumas pesquisas divulgadas na última década a demonstrar que o tema ainda não está
completamente resolvido, merecendo nossa atenção no âmbito geral e, em nosso caso,
também no âmbito das especificidades do ensino de Ciências. Vejamos.
Viecili e Medeiros (2002) investigaram os comportamentos de alunos de escola
pública do ensino fundamental, com históricos de fracasso escolar e sem históricos de
fracasso escolar, e os comportamentos de coerção e estimulação positiva dos professores em
relação a cada um desses grupos. Três professores e dez crianças entre oito e 12 anos
participaram do estudo. Em resumo, os dados dessa pesquisa trazem evidências que: i) alunos
com história de fracasso escolar e alunos sem esse histórico comportam-se de modo
diferenciado em sala de aula; ii) os professores utilizam coerção e estimulação positiva
diferentemente com ambos os grupos (punem mais os alunos com histórico de fracasso e
reforçam positivamente mais os alunos sem o histórico); iii) alunos sem histórico de fracasso
136

são mais solicitados a participar das atividades propostas em sala de aula do que os alunos
com o histórico.
A pesquisa de Viecili e Medeiros (2002) demonstra que a coerção ainda é elemento
presente na sala de aula, podendo ter efeitos prejudiciais à formação moral e intelectual do
aluno, como vimos em Piaget, Kohlberg, Habermas e outros autores que se alinham aos
argumentos deles.
Os autores da pesquisa apresentam, ao final, um interessante questionamento que
concordamos e assim se resume: Os licenciandos aprendem nos seus cursos que o ensino
escolar não deve ser coercitivo, mas será que não falta formação complementar sobre
técnicas, estratégias e procedimentos de como ensinar sem coagir?
Em pesquisa realizada junto a alunos de 8ª série do ensino fundamental, Cabral,
Carvalho e Ramos (2004) verificaram que a falta de respeito mútuo, a falta de compreensão
do professor, a falta de incentivo, a falta de diálogo quando o aluno tem vergonha de falar
com o professor e o autoritarismo do professor são algumas das maiores dificuldades no
relacionamento entre professor e aluno durante as aulas.
Os mesmos alunos investigados apontaram ainda os seguintes fatores que facilitam o
relacionamento entre professor e aluno: um bom diálogo; relacionamento por igual; a
disciplina; a amizade entre ambos; quando o aluno estuda, escuta o professor, presta atenção,
faz tudo o que o professor manda, resolve exercícios, faz as tarefas, tira nota boa, se interessa
com relação ao conteúdo, respeita o professor, se esforça em aprender; o fato do professor: ser
simpático, entender o aluno, dedicado em sua função, ser educado, dar atenção ao aluno, ser
humilde, estar disposto a ajudar o aluno, esclarecer a matéria, demonstrar confiança no aluno.
Questionados se os professores usam de autoridade ou autoritarismo, verificou-se
entre os alunos que: 38,6% citaram que os professores usam de autoritarismo; 35,1% dizem
que raramente o professor ajuda os alunos que têm mais dificuldade. Sobre se o professor é
acessível ao aluno, verificou-se que para 73,7%, raramente o professor é acessível ao aluno.
Ao mesmo questionamento “se usam de autoridade ou autoritarismo em sala de aula”,
os professores afirmaram que: “o diálogo é a melhor solução para os problemas que surgem”
(Professor 1); “muitas vezes uso do autoritarismo para dominar a sala, pois só assim os alunos
colaboram” (Professor 2); “às vezes é preciso usar o autoritarismo” (Professor 3); “uso de
autoridade; procuro junto com os alunos encontrar um caminho mais apropriado para o acesso
ao conhecimento” (Professor 4); “autoridade, pois o autoritarismo não funciona” (Professor
5); “autoridade, pois o professor que usa de autoritarismo geralmente é arrogante, prepotente e
busca impor suas opiniões e decisões, o professor que age com autoridade demonstra bom
137

senso, respeita a opinião dos alunos, tem domínio do assunto e dessa forma conquista a
confiança e o respeito dos alunos” (Professor 6).
Pesquisa de Arcipreste (2001) com alunos e professores universitários de um curso de
Arquitetura coletou, entre outros, os seguintes discursos que nos auxiliam em nossos
argumentos e reflexões: “O professor impõe, de certa forma o que para ele tem mais valor no
projeto” (Aluno 36 A); “(...) eu coloco completamente o meu gosto, entendeu assim, não
tenho nenhuma dúvida: acho jeca [...] isso eu acho cafona!” (Professor IA); “Ao contrário do
óbvio, os professores dão mais atenção para os projetos mais bem resolvidos no começo do
que para os que realmente precisam de orientação” (Aluno 36A); “Às vezes eu notei isso,
varias vezes assim: você começa às vezes a criticar, a mostrar as inconsistências, o aluno não
aceita, assim, ele não dá conta da crítica né, de mudar, e começa a levar a coisa às vezes pro
lado pessoal, não, o (nome do professor) não gosta do meu trabalho, o (nome do professor)
não gosta de mim” (Professor IIA).
Dados e análises de pesquisa realizada por Rosa-Silva, Lorencini Júnior e Laburú
(2010), com professora de Ciências, também nos oferece aspectos relevantes aos nossos
propósitos. Os pesquisadores relatam assim algumas partes de suas observações:

Na cena que revela um contexto conflituoso ocorrido na 5ª C, a professora,


ao refletir sobre a ação, lembrou-se do aluno Wel da 7ª B. Ao dar liberdade
ao aluno para que ele se expresse por meio de perguntas, ela ouve-lhe
tentando aproximar-se dele para analisar o seu trabalho, para fazer uma
avaliação dele. A professora passa a enxergar o estudante Wel com “outros
olhos”: “de um aluno horrível, relaxado, mau, [que] não gosta de estudar,
matando aula e tal” para o aluno que se expressa oralmente. Desse modo,
ela fica atenta ao perfil do estudante para valorizá-lo em aula (p. 73).

É interessante notar que à medida que a professora evita condutas negativas


que poderiam constranger os alunos no momento de eles exporem as suas
reflexões nas interações discursivas, o aluno Wel começa a percebê-la de
outro modo: “olha, professora, depois daquele dia que nós começamos a
fazer perguntas e vi que eu trabalhei na oficina de sexualidade [ministrada
por alunos da UEL] e tudo o que eu aprendi, ou que nós vimos juntos, eu vi
que estava certo também, eu notei que a senhora é dez”, pois ele pode
relacionar o que estudou em sala de aula com uma situação diferenciada de
aprendizagem (oficina de sexualidade promovida pela UEL) (p. 73-74).

A professora tem a intenção de livrar-se da impressão negativa que criou


contra o Jai - ele é “terrível” - e ajudá-lo por meio de uma conversa
amistosa. Nesse sentido, ela discute conosco sobre o plano de ação, a seguir.
Profª: [...] o Jai é um líder e pode manipular a aula do jeito que ele quiser.
Pesquisadora: Que estratégia você pensa pra resolver esse problema? Profª:
Não adianta ir com autoridade pra cima do Jai. Pesquisadora: Com
autoridade não resolve? Profª: Com ditadura, com dureza de coração, não
138

adianta. Eu acho que eu vou ter que conquistar o Jai, novamente.


Pesquisadora: Por meio de quê? Profª: De afeto (p. 74).

[...] a professora responde aos questionamentos levantados; passa a


considerar o aluno ativo no processo de aprendizagem e reconhece que o
analisa de forma equivocada, ou seja, constata que o equívoco estava na sua
concepção de aluno e não no aluno. A professora dá-se conta de que o pouco
desenvolvimento das habilidades cognitivas dos alunos não poderia
influenciar nas suas concepções de aluno “bom” ou “ruim”. Outro ponto que
a ajudou a reestruturar as suas concepções foi o fato de comparar situações
que experimentou nas duas séries, que para ela tinham perfis opostos,
enquanto a 7ª B era “disciplinada”, a 5ª C, “indisciplinada” (p. 77).

5.5 - Destaques

• Por meio de argumentos e exercícios de situações diversas, buscamos evidências que nos
permitissem esboçar / projetar que as aulas de Ciências podem potencializar favoravelmente a
formação moral à luz das perspectivas sociomorais e vice-versa.
• A formação moral como desenvolvimento e como dimensão ética do discurso – que se
baseiam e se objetivam na busca de autonomia e na emancipação – também podem, ambas, no
conjunto de seus princípios e elementos, constituir um corpo teórico orientador para as aulas
de Ciências, pois potencializa a aprendizagem crítica e próxima de um entendimento real da
ciência.
• A preocupação do ensino de Ciências deve permanecer nos conteúdos científicos, mas não
em atmosferas de reforço da heteronomia moral.
• Discussões sobre formação moral e aulas de Ciências não encerram preocupações vazias ou
já bem resolvidas. Pelo contrário, envolvem diferentes aspectos que tornam a questão bastante
complexa e ainda aberta as pesquisas de nossa área.
139

PARTE III
AUSÊNCIAS E NECESSIDADES

O homem; as viagens O homem funde a cuca se não for a Júpiter


proclamar justiça junto com injustiça
O homem, bicho da Terra tão pequeno repetir a fossa
chateia-se na Terra repetir o inquieto
lugar de muita miséria e pouca diversão, repetitório.
faz um foguete, uma cápsula, um módulo
toca para a Lua Outros planetas restam para outras colônias.
desce cauteloso na Lua O espaço todo vira Terra-a-terra.
pisa na Lua O homem chega ao Sol ou dá uma volta
planta bandeirola na Lua só para tever?
experimenta a Lua Não-vê que ele inventa
coloniza a Lua roupa insiderável de viver no Sol.
civiliza a Lua Põe o pé e:
humaniza a Lua. mas que chato é o Sol, falso touro
espanhol domado.
Lua humanizada: tão igual à Terra.
O homem chateia-se na Lua. Restam outros sistemas fora
Vamos para Marte — ordena a suas máquinas. do solar a col-
Elas obedecem, o homem desce em Marte onizar.
pisa em Marte Ao acabarem todos
experimenta só resta ao homem
coloniza (estará equipado?)
civiliza a dificílima dangerosíssima viagem
humaniza Marte com engenho e arte. de si a si mesmo:
pôr o pé no chão
Marte humanizado, que lugar quadrado. do seu coração
Vamos a outra parte? experimentar
Claro — diz o engenho colonizar
sofisticado e dócil. civilizar
Vamos a Vênus. humanizar
O homem põe o pé em Vênus, o homem
vê o visto — é isto? descobrindo em suas próprias inexploradas entranhas
idem a perene, insuspeitada alegria
idem de con-viver.
idem.

(de Carlos Drummond de Andrade,


publicado em “As impurezas do Branco”,
pela José Olympio, Rio de Janeiro, 1973)
140

6.0 - A FORMAÇÃO MORAL NOS TRABALHOS CIENTÍFICOS DA ÁREA DE


EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS

“No ensino da ciência, os princípios e valores


surgem em questões tão diversas, como a natureza
e estatuto da ciência, questões de gênero, e o lugar
da história da ciência no ensino da ciência. Eles
invadem as origens do universo em geral, e a
humanidade em particular. Eles tecem críticas
sobre comportamentos adequados em relação ao
ambiente, questionam o fato de a ciência ser uma
atividade digna de mérito, pretendem saber aquilo
que se considera um bom ensino da ciência, e se os
princípios e valores devem ser ensinados ou
simplesmente referidos por alto” (POOLE, 1995,
p. 15).

Nesta parte empírica da nossa tese delineamos o estado dos trabalhos científicos
(ensaios, relatos de experiência e relatos de pesquisa) da área brasileira de Educação em
Ciências sobre formação moral com viés no desenvolvimento e ética discursiva. Além dessa
especificidade, o empreendimento empírico apresenta um conjunto de descritores que permite
visualizar de modo abrangente diversas questões de ética e de moral que aparecem nesses
trabalhos.

6.1 - Documentos analisados

Inicialmente apresentamos resultados abreviados de uma pesquisa publicada


(RAZERA; NARDI, 2006a), que contém dados extraídos de anais dos quatro primeiros
Encontros Nacionais de Pesquisa em Educação em Ciências - ENPEC (realizados em 1997,
1999, 2001 e 2003) e de periódicos nacionais e internacionais da área: Ciência & Educação
(de 1995 a 2004); Investigações em Ensino de Ciências (de 1996 a 2005); Revista Brasileira
de Pesquisa em Educação em Ciências (de 2001 a 2003); Enseñanza de las Ciencias (de 1983
a 1998); Revista Electrónica de Enseñanza de las Ciencias (de 2002 a 2005).
Posteriormente à apresentação dessa pesquisa, analisamos as atas dos três últimos
Encontros Nacionais de Pesquisa em Educação em Ciências - ENPEC (de 2005, 2007 e
2009) e os seguintes periódicos nacionais: Ciência & Educação (de 1998 a 2010), Ensaio -
Pesquisa em Educação em Ciências (de 1999 a 2010), Revista Brasileira de Pesquisa em
141

Educação em Ciências (de 2001 a 2010) e Investigações em Ensino de Ciências (de 1996 a
2010)29.
Por fim, utilizamos e analisamos as informações apresentadas por Teixeira (2008) em
dissertações e teses na área do ensino de Biologia (de 1972 a 2004).

6.2 - Procedimentos

Da pesquisa publicada em 2006 (RAZERA; NARDI, 2006a), reproduzimos alguns


resultados preliminares sobre o assunto desenvolvimento moral em trabalhos da área de
Educação em Ciências. Sobre a investigação atual, os procedimentos para os trabalhos
científicos dos ENPEC e dos periódicos são descritos a seguir.
Realizamos uma busca eletrônica nos trabalhos científicos disponíveis nas atas dos V,
VI e VII Encontros Nacionais de Pesquisa em Educação em Ciências - ENPEC para detectar
a presença e, consequentemente, permitir análise dos seguintes descritores que demarcamos
de nosso interesse: “Piaget”; “Kohlberg”; “Ética”; “Moral”; “Habermas”; “Durkheim”.
As buscas em atas do V ENPEC foram realizadas em mídia CD Rom. As buscas em
30
atas dos VI e VII ENPEC , no sítio da internet da ABRAPEC - Associação Brasileira de
Pesquisa em Educação em Ciências. Para essa tarefa utilizamos o software Adobe® Reader®
versão 8.1.2 para extração de dados dos V e VI ENPEC e versão 8.1.4 para extração de dados
do VII ENPEC, pois os arquivos eletrônicos dos trabalhos científicos apresentavam-se
disponíveis em extensão pdf.
Após cada trabalho aberto individualmente nos softwares mencionados, a ferramenta
de pesquisa/busca era acionada (figura 9).

29
Meios e estratégias diferentes foram utilizados neste nosso mapeamento atual em relação à pesquisa publicada
em 2006.
30
As buscas foram realizadas nos seguintes períodos: V ENPEC (ISSN 1809-5100) - entre 08/10/2008 e
25/10/2008; VI ENPEC (ISSN 9788-5993-7258-6) - entre 08/05/2009 e 21/05/2009; VII ENPEC (ISSN 2176-
6940) - entre 12/12/2009 e 19/12/2009. Os trabalhos do VII ENPEC foram verificados antes da elaboraçao das
atas. Nesse caso, a busca foi realizada na relação de trabalhos aceitos para apresentação no evento, publicada no
sítio da internet da ABRAPEC.
142

Figura 9. Pesquisa nas atas do V ENPEC (à esquerda) e VI ENPEC (à direita)

Com a finalidade de não restringir as buscas dos termos de interesse (descritores),


foram utilizadas as seguintes estratégias: i) não marcação das opções de busca por palavras
inteiras e nem pela diferenciação entre letras maiúsculas ou minúsculas; ii) as palavras foram
digitadas parcialmente e sem acentuação (Exemplos: “piage”, “kohlber”; “mora”; “etic”;
“durk”; “haber”). Isso possibilitou o encontro de todas as palavras relacionadas / associadas
com os termos de interesse de nosso estudo, ou seja, também suas derivações apareceram nos
resultados e puderam ser analisadas, como “desmoralizar”; “imoral”; “morais”, “moralidade”,
“moralismo”, “éticos”, “eticamente”, “piagetiano”, “kohlberguiano”; habermasiano etc. As
demais palavras que também apareciam no resultado de busca, mas que não se associavam /
não se relacionavam aos termos de nosso interesse (por exemplo, “estética”; “genética”;
“magnética”; “moradores”; “demorada”), foram obviamente descartadas da análise.
Todas os termos de interesse foram localizados um a um no corpo do trabalho, com
auxílio da própria ferramenta, para análises diversas (utilização, significação, correlações com
a temática exposta, referência, contexto de abordagem etc.) que permitissem configurar um
estado do conjunto de trabalhos sobre a formação moral com viés do desenvolvimento e ética
discursiva - incluindo posicionamentos de relevância e de tendência da temática e uma
visualização de modo abrangente sobre outras questões diversas de ética e de moral presentes
nos trabalhos.
Em todos os trabalhos, os termos de interesse inicialmente buscados foram, pela
ordem: “Piaget”, “Kolhberg”, “ética” e “moral”31. Quando os termos “ética” ou “moral” eram
detectados, a busca estendia-se então para “Habermas” e “Durkheim”. Fechando-se a
estratégia com esse formato, todos os trabalhos que apresentaram direta ou indiretamente
abordagens envolvendo ética e (ou) moral puderam ser detectados, anotados e analisados

31
Mesmo quando omitidas do texto, todas as menções sobre os termos de interesse detectados e analisados
também incluem as suas respectivas variações e (ou) derivações.
143

(vide APÊNDICE A). Por conseguinte, assuntos subjacentes à formação moral, formação
ética, desenvolvimento moral, autonomia moral, ética discursiva habermasiana e teorias
morais de Piaget, Kohlberg e Durkheim também puderam ser analisados.
Ressalvamos que este formato não possibilitou detectar os termos de nosso interesse
nos abstracts, títulos de obras das referências bibliográficas ou trabalhos publicados em
línguas estrangeiras cujas grafias não correspondiam com as letras digitadas em português
(Exemplo: a palavra “ética” foi detectada na referência em versão portuguesa da obra de
Gérard Fourez, mas não na versão francesa, intitulada “La construction des Sciences. Les
logiques des inventions scientifiques. Introduction à la Philosophie et à l’Éthique des
Sciences”, pois “etic” quando digitada na ferramenta de busca não identifica “étique” - letras
não correspondentes na grafia de ambas).
A pesquisa em periódicos seguiu os mesmos procedimentos e estratégias de busca das
atas dos ENPEC:
a) Busca eletrônica nos artigos da revista Ensaio - Pesquisa em Educação em
Ciências, publicados e disponíveis no sítio da internet. Utilização do software Adobe®
Reader® versão 9.3. Após cada trabalho aberto individualmente, a ferramenta de pesquisa do
software era acionada (figura 10)32. Todos os termos de interesse e respectivas observações
foram anotados em planilhas para a realização da análise (vide APÊNDICE B).

Figura 10. Procedimento de busca realizada na revista Ensaio

32
As buscas realizadas na revista Ensaio (ISSN 1983-2117) ocorreram entre 18/03/2010 e 30/08/2010, em
<http://www.portal.fae.ufmg.br/seer/index.php/ensaio>. Ferramenta de busca do site da revista não foi utilizada.
144

b) Busca eletrônica nos artigos publicados e disponíveis no sítio da internet da revista


Ciência & Educação. Utilização do software Adobe® Reader® versão 9.3. Após cada trabalho
aberto individualmente, a ferramenta de pesquisa/busca era acionada (figura 11)33.

Figura 11. Procedimento de busca realizada na revista Ciência & Educação

c) Busca eletrônica nos artigos da Revista Brasileira de Pesquisa em Educação em


Ciências, disponível no sítio da internet da ABRAPEC34. Utilização do software aplicativo
Adobe® Reader® versão 9.3 para identificação e localização dos termos no corpo do texto.
d) Busca eletrônica nos artigos da revista Investigações em Ensino de Ciências,
disponível na internet35. Utilização do software aplicativo Adobe® Reader® versão 9.3.0 para
identificação e localização dos termos no corpo do texto.
Para facilitar as nossas recorrentes buscas por dados complementares, os trabalhos
receberam as seguintes identificações: V ENPEC (de V1 a V681); VI ENPEC (de VI1 a
VI666); VII ENPEC (de VII1 a VII693); ENSAIO (de E1 a E147); CIÊNCIA & EDUCAÇÃO
(de C1 a C309); INVESTIGAÇÕES EM ENSINO DE CIÊNCIAS (de I1 a I211); RBPEC (de
R1 a R191). As letras iniciais referem-se aos nomes dos documentos analisados. Os números
sequenciais que aparecem após as letras referem-se a um posicionamento fixo de cada
trabalho em nossas planilhas. Não seguem obrigatoriamente a sequência em que são
apresentados em seus respectivos locais originais.

33
As buscas realizadas na revista Ciência & Educação (ISSN 1516-7313) ocorreram entre 29/04/2010 e
25/08/2010, em <http://www2.fc.unesp.br/cienciaeeducacao/archive.php>.
34
As buscas realizadas na RBPEC (ISSN 1806-5104) ocorreram de 28/05/2010 a 15/09/2010, em
<http://www.fae.ufmg.br/abrapec/revista/index.html>.
35
As buscas realizadas em Investigações em Ensino de Ciências (ISSN 1518-8795) ocorreram entre 15/06/2010
e 25/09/2010, em <http://www.if.ufrgs.br/ienci/>.
145

6.3 - Resultados e discussão

6.3.1 - Dados de uma pesquisa publicada


Os dados a seguir foram reproduzidos de pesquisa publicada por Razera e Nardi
(2006a):

i) No conjunto dos títulos e das respectivas referências bibliográficas de 977


trabalhos (comunicações orais e painéis) apresentados nos quatro primeiros
eventos do ENPEC (Encontro Nacional de Pesquisa em Educação em
Ciências), no Brasil, no período compreendido entre 1997 e 2003, não foi
detectado nenhum trabalho com abordagens ou discussões sobre ética no
ensino de Ciências. Nas referências bibliográficas desses trabalhos não
foram encontrados registros das obras de Piaget (1994) ou Kohlberg (1992),
respectivamente “O juízo moral na criança” e “Psicologia do
desenvolvimento moral”: as duas obras referenciais sobre desenvolvimento
moral [escolhidas por nós].

ii) A análise dos trabalhos submetidos ao III ENPEC (2001), realizada por
Greca, Costa e Moreira (2002), demonstrou uma forte tendência de pesquisa
em temas vinculados ao ensino, currículo e formação de professores,
havendo poucos trabalhos de investigação na aprendizagem e na avaliação.
Nessa análise, os autores detectaram e fizeram breve menção de algumas
lacunas temáticas nas pesquisas apresentadas no evento, algumas delas
subjacentes aos aspectos éticos, por exemplo, violência na escola,
segregação e tratamento diferenciado entre homens e mulheres.

iii) Das 1.483 referências bibliográficas mencionadas nos 64 artigos da


Revista Brasileira de Pesquisa em Educação em Ciências (RBPEC), desde o
primeiro exemplar de 2001 até o volume 3, número 1, de 2003, nenhuma fez
citação às obras de Piaget e Kohlberg. Por intermédio da ferramenta de
localização automática do aplicativo Adobe® Acrobat Reader versão 5.0,
foram rastreados os nomes de Piaget e Kohlberg, além das palavras ética,
moral, valor, liberdade, justiça, respeito e cooperação, em versões nas
línguas portuguesa, inglesa e francesa. Em francês, nenhuma delas foi
encontrada. Em inglês, apenas a palavra justiça foi encontrada uma vez. Em
português, a palavra ética apareceu em duas oportunidades e as palavras
moral e liberdade, uma. Em nenhum dos artigos, entretanto, essas palavras
foram citadas ou utilizadas no contexto específico do ensino de Ciências.

iv) Nos 16 números distribuídos em 10 volumes, entre 1995 e 2004, os 155


artigos publicados na Revista Ciência & Educação apresentaram 585
palavras-chave (ou unitermos). A palavra ética apareceu uma vez,
relacionando-se diretamente ao processo da ciência e não ao ensino de
Ciências. As palavras valores, atitudes e educação moral também
apareceram única vez cada uma. De todos os artigos da revista, nesse
período, apenas em um deles houve referência aos trabalhos de Piaget sobre
desenvolvimento moral associado ao ensino de Ciências, mas com
discussões centradas nos aspectos sócio-emocionais. Esse artigo não fez
menção aos estudos de Kohlberg.

v) A Revista Investigações em Ensino de Ciências, no período entre 1996 e


2005, nos seus 28 números distribuídos em 10 volumes, publicou 113 artigos
146

com 321 palavras-chave. Em nenhum deles houve abordagem direta ou


indireta sobre aspectos do desenvolvimento moral no ensino de Ciências.
Nos artigos também não apareceram citações ou referências sobre Piaget ou
Kohlberg. A ferramenta de localização automática do Microsoft Internet
Explorer®, na versão 6.0, foi utilizada nesse rastreamento.

vi) Uma busca eletrônica (também com auxílio do web browser mencionado
anteriormente) nos 612 títulos de artigos publicados entre 1983 e 1998 na
Revista Enseñanza de las Ciências, disponibilizados na internet, não
detectou a presença de nenhuma das seguintes palavras, nas versões em
português, espanhol, inglês e francês: ética, moral, desenvolvimento moral,
respeito, justiça e liberdade.

vii) Na Revista Electrónica de Enseñanza de las Ciencias, entre 2002 e


2005, em 61 artigos distribuídos nos 10 números, de 4 volumes, foram
citadas 257 palavras-chave. Dessas, nenhuma relacionada à ética, à moral,
ao desenvolvimento moral ou a outra qualquer inerente a essa temática.

viii) Duarte (2002), por intermédio de consulta às teses de mestrado e


doutorado, além de atas de congressos e publicações em revistas nacionais e
estrangeiras, identificou os seguintes problemas e/ou temas que têm marcado
as pesquisas em ensino de Ciências, em Portugal, nessas duas últimas
décadas: Concepções Alternativas; Mudança Conceitual; Trabalho Prático;
Resolução de Problemas; Ciência, Tecnologia e Sociedade; Literatura
Científica; Atitudes e Expectativas de Alunos; Formação de Professores;
Linguagem e Comunicação; História da Ciência; Contextos Informais;
Temas Transdisciplinares. Das 166 referências mencionadas por Duarte
(2002), apenas uma delas incidiu em abordagem aos aspectos éticos no
ensino de Ciências (RAZERA; NARDI, 2006a, p. 54-56).

Essa pesquisa nos deu indicativos preliminares de que os trabalhos, então analisados à
época, apresentavam uma lacuna sobre o tema ética e moral, incluindo o desenvolvimento
moral. A própria pesquisa mencionou o trabalho de Greca, Costa e Moreira (2002) que fez
menção acerca dessa e de outras lacunas temáticas em pesquisas apresentadas especificamente
no III ENPEC. O resultado geral da pesquisa de Razera e Nardi (2006a) demonstrou que essa
lacuna foi, até então, mantida no conjunto dos trabalhos da área (levando-se em conta a
amostra analisada à época).
Com técnicas, procedimentos e meios diferentes, esta nossa investigação atual
apresenta uma quantidade maior e complementar de dados sobre o estado do tema na área
brasileira de Educação em Ciências.

6.3.2 - Trabalhos dos V, VI e VII ENPEC


A tabela 1 e o gráfico 1 apresentam uma síntese dos dados quantitativos dos trabalhos
dos V, VI e VII ENPEC.
Tabela 1. Levantamento quantitativo sobre termos de interesse nos três últimos Encontros Nacionais de Pesquisa em Educação em Ciência (ENPEC)

(*) Enquanto a coluna de frequência das demais categorias apresenta a porcentagem (frequência relativa percentual), nessas três últimas categorias são apresentadas as
147

médias (aritméticas simples) de presença do termo por artigo correspondente (ex: média de presença do termo “Ética” por artigo em que o termo aparece).
Nota: Os totais excluem links quebrados, que não abriram após 3 tentativas ou apresentaram problemas técnicos diversos.
148

Gráfico 1. Os termos ética e (ou) moral nos trabalhos dos V, VI e VII ENPEC (em %)

Entre os três ENPEC, houve uma tendência de curva crescente no percentual de


trabalhos com a presença dos termos ética e (ou) moral e, como consequência, uma curva
decrescente no percentual de trabalhos sem a presença dos mesmos termos (gráfico 1).
Os dados estatísticos apresentados na tabela 1 permitiram algumas inferências prévias,
como: i) na média, pelo menos um dos quatro primeiros termos buscados (“Piaget”,
“Kohlberg”, “ética” e “moral”) apareceu em mais de 40% do total de trabalhos, com
estabilidade desse percentual nos três eventos (média final: 43,2%); ii) entre os quatro
primeiros termos buscados (“Piaget”, “Kohlberg”, “ética” e “moral”), “ética” foi aquele em
que apareceu com maior frequência; “moral” e “Piaget” apareceram em seguida, mas com
percentuais abaixo da metade do percentual de “ética”; iii) quando observados os termos
referentes aos nomes dos autores de nosso referencial teórico (“Piaget”, “Kohlberg” e
“Habermas”) em conjunto com os termos “ética” e (ou) “moral” (itens g, h, i), o percentual foi
pequeno para cada um deles (média final abaixo de 1%); iv) a obra clássica de Piaget, “O
juízo moral na criança”, apareceu em quatro trabalhos; v) somando-se os três eventos, o termo
“Kohlberg” foi mencionado em dois trabalhos e “Habermas”, em 15 trabalhos.
O exame qualitativo dos termos de interesse (nossos descritores) possibilitou análises
mais amplas do que as estatísticas após a localização de cada um deles no corpo do trabalho.

• Usos, contextos e locais de inserção dos termos


a) “Piaget”: Em abordagens, justificativas, noções e conceitos sobre mudanças
conceituais, desenvolvimento cognitivo, desenvolvimento moral, construtivismo,
interacionismo e outros eventos relacionados ao autor ou suas pesquisas; em obras do autor
citadas no corpo e (ou) nas referências bibliográficas dos trabalhos; em títulos de obras
listadas nas referências bibliográficas; em nome de editora portuguesa listada nas referências
bibliográficas.
149

b) “Ética”: Em abordagens gerais sobre CTSA; em abordagens específicas sobre


Educação Ambiental, Genética e Sexualidade; em menções sobre a importância da História e
Filosofia da Ciência para o ensino; em menções gerais sobre a importância do ensino de
Ciências para a cidadania; em nome de área de conhecimento; em relações com conteúdos e
temas diversos do ensino de Ciências, sem fazer parte do núcleo temático discutido, ou seja,
em generalizações ao abordar genética, células-tronco, alimentos transgênicos,
biodiversidade; em conjunção com a palavra moral; em menções gerais sobre a formação
integral do aluno; em nome de evento científico (simpósio, congresso); em termos adjetivados
(ética religiosa, ética protestante, ética política, antropo-ética, ética ecológica, ensino ético,
juízos éticos); em referências aos PCN e seus respectivos temas transversais; em título de
periódico científico; em título de obra listada nas referências bibliográficas; em
procedimentos de pesquisa (Comitê de Ética, anonimato dos sujeitos, consentimentos para
entrevista); em inserções de objetivos e (ou) importâncias para o ensino de Ciências; em
respostas de sujeitos de pesquisa; em categorização de dados; em menções sobre os trabalhos
de Paulo Freire (práxis ético-político-ideológico-econômico-social); em menções sobre a
LDBEN; em menções sobre as responsabilidades éticas inerentes ao professor (escolha de
livro didático, conduta em classe); em menções retóricas diversas (“cidadão ético”; “escolha
ética”; “aspectos éticos” etc.).
c) “Moral”: Em objetivos e (ou) responsabilidades para a educação formal; termo
correlacionado à importância e compromisso do ensino de Ciências; em menções sobre os
aspectos intrínsecos do ensino formal; em conjunção com a palavra ética em argumentos
diversos; termo integrante de respostas de sujeitos de pesquisa; em categorização de dados;
em menção a aspectos religiosos; em menção ao papel dos professores; em menção aos
aspectos da ciência e dos cientistas; em título de obra listada nas referências bibliográficas;
em menção aos PCN e temas transversais; em abordagens específicas sobre Educação
Ambiental; em discussões sobre Educação Sexual (gêneros, tabus, imoralidades, valores,
noções de corpo); em referências à inteligência moral de Gardner; em nome de ONG; em
abordagens diversas a envolver CTSA; em menção à crise de valores da Humanidade; em
termos adjetivados diversos (“valores morais”, “atualização moral”, “desgaste moral”,
“concepções moralistas”, “práticas morais”); em críticas sobre o ensino contemporâneo
(formação inadequada dos sujeitos); em menções retóricas diversas.
d) “Kohlberg”: Apareceu em dois trabalhos. Em um deles (V400), referindo-se a
artigo publicado de nossa autoria, sobre as possibilidades de o ensino de Biologia contribuir
150

para o desenvolvimento moral dos estudantes. No outro (VI345), Kohlberg foi apenas citado
em lista com outros pesquisadores que seguem pressupostos do desenvolvimento humano.
e) “Habermas”: Em abordagens sobre formação de professores - citação das obras da
teoria da ação comunicativa; em menção à teoria crítica ou escola de Frankfurt; em técnica de
debate, com citação da obra “Consciência moral e agir comunicativo”; em abordagens de
outras temáticas ou contextos (validação para uso de livros didáticos, processos colaborativos)
não relacionados à ética discursiva com a conformidade de nossos pressupostos.
f) “Durkheim”: Em nenhum dos trabalhos apareceu em contextos de formação moral.

• Os três trabalhos com as maiores citações dos termos “ética” e “moral”


a) Trabalho com 49 citações do termo “ética” e 20 citações do termo “moral”
(VII262): Analisou implicações éticas em conflitos religiosos das aulas de Evolução, por meio
de um mapeamento realizado nos seis primeiros ENPEC e periódicos da área. Mencionou em
seus argumentos que esses tipos de conflitos gerados pelo ensino de ‘Origem e Evolução dos
Seres Vivos’ “não são um tema persistente na comunidade que pesquisa o ensino de Biologia,
sendo de suma importância a análise de formas de abordagens que não firam princípios éticos
e educacionais”. Por fim, discutiu possíveis contribuições do MNI (princípio dos magistérios
não-interferentes), de Gould, “para essa questão, como uma forma de abordagem ético-
metodológica válida nesse contexto”.
b) Trabalho com 30 citações do termo “ética” e 24 citações do termo “moral”
(VII452): O objetivo foi “evidenciar os conceitos-chaves desenvolvidos por Fourez e avaliar
suas implicações ao Ensino de Ciências”. A discussão centrou-se em “argumentos e reflexões
que nos posicionam a olhar para o ensino de Ciências sob a perspectiva da moralidade
apresentada na epistemologia de Fourez”.
c) Trabalho com 26 citações do termo “ética” e nove citações do termo “moral”
(VI527): Defendeu a “necessidade da abordagem e discussão da vertente educacional da
Bioética” na formação inicial de professores de Ciências.

• Trabalhos com menções a Kohlberg


Kohlberg foi mencionado em dois trabalhos. O primeiro (VI345), com o tema
“formação do professor”, mencionou Kohlberg numa lista de pesquisadores que organizam as
estruturas cognitivas em etapas sequenciais de desenvolvimento. O segundo fez menção a um
artigo de nossa autoria (V400) sobre as possibilidades que defendemos de o ensino de
Biologia servir-se também para o desenvolvimento moral dos alunos.
151

• Trabalhos com menções a “O juízo moral na criança”


“O juízo moral na criança” foi mencionado em quatro trabalhos. No primeiro (V195),
em contexto não ligado diretamente ao desenvolvimento moral, mas especificamente sobre
assimilação de informações. O segundo (V307), em temática sobre educação ambiental
emancipatória, teceu comentários sobre a construção da moral na criança e fez elos com
trabalhos de Paulo Freire sobre construção do conhecimento e consciência crítica. O terceiro
(VI522) utilizou a obra para fundamentar seus argumentos de que a identidade do indivíduo
tem apoio numa dupla transação: uma externa, do sujeito com o mundo exterior, e outra
interna, do sujeito consigo mesmo. O quarto trabalho (VII429) apresentou discussão teórica
sobre a relevância do laboratório de Ciências “no processo ensino-aprendizagem e no
desenvolvimento da autonomia intelectual e moral da criança”. Trouxe argumentos fundados
em Piaget de que o professor, para organizar atividades experimentais, deve incentivar
atitudes questionadoras e propiciar a autonomia moral e intelectual dos alunos.

• Excertos com os termos “ética” e (ou) “moral”36


“A escola deve propiciar ao sujeito o exercício da ética ambiental, educacional e
social [...], várias teorias corroboram para este pensamento” (VI590); “A preparação da
cidadania visa desenvolver no aluno habilidades para enfrentar desafios, ao mesmo tempo em
que se pretende resgatar valores éticos e morais” (VI565); “No ensino de temas relevantes, os
parâmetros a serem avaliados já não se restringem ao domínio conceitual, mas abarcam novas
competências às quais o professor de ciências não está acostumado: julgamento moral,
coerência lógica, argumentação baseada em evidências, capacidade comunicativa, etc.”
(VI626); “Piaget defendia o trabalho com grupos considerando que ele favorecia a autonomia
moral e intelectual. A interação entre pares contribui para o desenvolvimento de relações de
respeito mútuo e do senso de justiça” (VI434); “[Trabalhar a química da sala de aula] como
um todo, não só os conceitos químicos fundamentais para compreender o mundo à nossa
volta, mas também aspectos éticos, morais, sociais, econômicos e ambientais a eles
relacionados” (VI106); “[No modelo construtivista o professor] cria situações,
proporcionando condições em que possa se estabelecer a reciprocidade intelectual e
cooperação ao mesmo tempo moral e racional” (VI279).

36
Neste item, alguns excertos sofreram pequenas alterações ou adaptações, mas sem interferências nas ideias.
152

• Sobre “Formação moral”, “formação ética” e “desenvolvimento moral”

Quadro 10. Contexto dos descritores em trabalhos dos ENPEC


Trabalho: VII262
Tema / Assunto: Ensino de evolução.
Palavras-chave: Ensino de Biologia. Evolução biológica. Criacionismo. Ética. Princípio MNI.
Autoria principal: Brasileira.
Contexto dos descritores: Formação moral faz parte de novas demandas da escola; [Cita P. Goergen:]
A educação moral é possível e necessária na escola; [Citou P. Reis:] Formação moral é possível
também nas discussões de questões controvertidas; [Citou PCN:] Ensino de Ciências que trata
conhecimentos científicos de forma não neutra e absoluta contribui para uma formação moral e ética.
Trabalho: VII377
Tema / Assunto: Educação ambiental.
Palavras-chave: Educação ambiental. Dinâmicas. Jogos.
Autoria principal: Brasileira.
Contexto dos descritores: [Citou R. P. Brenelli:] O jogo é importante atividade na educação, que
permite o desenvolvimento afetivo, motor, cognitivo, social e moral e a aprendizagem de conceitos;
[Citou V. Dohme:] A educação deve possibilitar o desenvolvimento também ético.
Trabalho: VII429
Tema / Assunto: Atividades de laboratório.
Palavras-chave: Laboratório de Ciências. Epistemologia genética. Autonomia Moral. Autonomia
intelectual.
Autoria principal: Brasileira.
Contexto dos descritores: Atividades de laboratório podem contribuir para o desenvolvimento da
autonomia intelectual e moral da criança; Educação moral está intrinsecamente ligada à formação
intelectual [Citou Piaget].
Trabalho: VI457
Tema / Assunto: Formação de professores.
Palavras-chave: Formação docente. Necessidades formativas. Química.
Autoria principal: Brasileira.
Contexto dos descritores: Aparece na fala de um professor, afirmando que gosta de poder colaborar
com a formação moral dos alunos.
Trabalho: VI40
Tema / Assunto: PCN.
Palavras-chave: Competências e habilidades. Formação docente. Políticas públicas.
Autoria principal: Brasileira.
Contexto dos descritores: Nas tomadas de decisão inserem-se relevantes componentes aprendidos em
processo de formação moral.
Trabalho: VI345
Tema / Assunto: Formação de professores.
Palavras-chave: Ensino de Física. Formação inicial de professores de Física. Análise de discurso.
Desenvolvimento profissional de professores. Estrutura curricular.
Autoria principal: Brasileira.
Contexto dos descritores: O desenvolvimento moral se estrutura em etapas, das menos para as mais
complexas [Em citação de citação].

6.3.3 - Artigos da revista Ensaio


A tabela 2 e o gráfico 2 apresentam uma síntese dos dados quantitativos dos trabalhos
da revista Ensaio.
Tabela 2. Levantamento quantitativo sobre termos de interesse na revista Ensaio

(*) Enquanto a coluna de frequência das demais categorias apresenta a porcentagem (frequência relativa percentual), nessas três últimas categorias são apresentadas as
153

médias (aritméticas simples) de presença do termo por artigo correspondente (ex: média de presença do termo “Ética” por artigo em que o termo aparece).
Nota: O total não inclui 7 artigos, por causa de links quebrados - não abriram após 3 tentativas - ou somente disponibilizaram os resumos.
154

Gráfico 2. Os termos ética e (ou) moral na revista Ensaio (em %)

O conjunto de artigos publicados na revista Ensaio apresentou variações na curva de


tendências: entre 1999 e 2004, a curva oscilou, mas com tendência decrescente no percentual
de trabalhos com a presença dos termos ética e (ou) moral; após crescimento em 2005,
manteve regularidade de queda no percentual de trabalhos com a presença dos termos até
2010 (gráfico 2).
Os dados estatísticos apresentados na tabela 2 permitiram algumas inferências prévias,
como: i) de 1999 a 2010, houve uma oscilação decrescente no percentual de artigos com a
presença de pelo menos um dos quatro primeiros termos buscados (“Piaget”, “Kohlberg”,
“ética” e “moral”), com a média final de 45%.; ii) entre os quatro primeiros termos buscados
(“Piaget”, “Kohlberg”, “ética” e “moral”), exceto “Kohlberg”, houve oscilação daquele em
que apareceu com maior frequência; iii) quando observados os termos de nosso referencial
teórico em conjunto com os termos “ética” e (ou) “moral” (itens g, h, i), o percentual foi
pequeno para cada um deles (média final abaixo de 2%); iv) Não apareceram mencionados
Kohlberg, Durkheim e a obra “O juízo moral na criança”, de Piaget; v) Habermas foi
mencionado em um artigo não correlacionado com ética discursiva.

• Usos, contextos e locais de inserção dos termos


a) “Piaget”: Em menções sobre teoria psicogenética, estruturas cognitivas, construção
de conceitos em crianças, construtivismo; em títulos de livro; em menção a nome de editora.
b) “Ética”: Em abordagens gerais sobre CTSA ou temas sociocientíficos; em
abordagens específicas sobre Educação Ambiental e Genética; em contexto de defesa do uso
de narrativas, porque envolve aspectos éticos e morais; fazendo-se menção ao processo
educacional ou ao trabalho docente (decisões éticas do professor, compromisso ético do
155

professor, atitude ética do educador, necessidades pedagógicas da escola, função de professor,


ética e valores estéticos no processo educativo, reflexão ética, postura ética do professor;
dimensão ética do fazer docente); em citações da obra de Fourez; em menções sobre PCN e
temas transversais; em menções de procedimentos de pesquisa (comitê de ética, anonimato
dos sujeitos); em título de livro; em preocupações éticas sobre ciência e conhecimento
científico.
c) “Moral”: Em ideias gerais, superficiais e (ou) retóricas (progresso científico não é
moral, obstáculo moral, superioridade moral do homem, códigos morais da civilização); em
abordagens sobre a formação de valores morais no sistema educacional cubano; em
discussões sobre crenças e religião; em menções sobre os efeitos morais das drogas; em título
de livro; em referências à relação pesquisa-pesquisador; em abordagem sobre valores morais e
saberes docentes (citou Tardiff); em discussões sobre gênero e cor; em citação sobre
“progresso moral” (citou Bachelard); em abordagens sobre relações de saber e moralidade.

• Os três artigos com as maiores citações dos termos “ética” e “moral”


a) Artigo com 46 citações do termo “ética” e três citações do termo “moral” (E59):
Com o tema “formação de professores e produção de conhecimentos dos alunos”, expôs
dados sobre a compreensão de idéias, atitudes, valores e crenças dos alunos. Defendeu a
melhoria da qualidade das aulas para formação de alunos críticos e atuantes na sociedade.
b) Artigo com 21 citações do termo “ética” e uma citação do termo “moral” (E133):
Com o tema “formação de professores”, investigou os tipos de reflexões que os professores
constroem em discussões sobre construção histórica e social do conhecimento científico. Em seus
argumentos, sinalizou que o debate epistemológico estimulou reflexões diversas, incluindo a
dimensão ético-política da ciência.
c) Artigo com cinco citações do termo “ética” e uma citação do termo “moral” (E140):
Com o tema “paradigmas e implicações para a educação”, abordou princípios e pressupostos
dos paradigmas Tradicional e Emergente correlacionados à educação. Por causa dos atuais
problemas sociais, argumentou em prol de uma educação que vise à construção de um
conhecimento mais humano e diversificado.

• Excertos com os termos “ética” e (ou) “moral”


“[O indivíduo deve] ser capaz de entender que a relação CTS envolve aspectos morais,
éticos e sociais” (E6); “O uso das narrativas, no ensino de ciências, apresenta condições para
156

explorar a relação CTS, na medida em que pode propiciar reflexões acerca dos aspectos éticos
e epistemológicos da ciência e da tecnologia, além de dar a dimensão da presença da ciência e
da tecnologia na sociedade” (E6); “Esta contribuição pode ser acrescida da necessidade de
que todo docente tenha compromisso ético com o conhecimento e que a sua ação docente
aponte na direção da contextualização e da articulação destes saberes específicos com o
processo de formação crítica e reflexiva do educando” (E43); “Através das declarações dos
alunos, colhidas durante as atividades que compõem esta pesquisa, percebemos uma forte
influência de crenças e valores morais e familiares” (E59); “As implicações sociais, políticas
e éticas destes avanços, foram trabalhadas, de modo contextualizado durante as aulas de
biologia, com alunos do Ensino Médio. Este trabalho destina-se à área de formação de
professores e aos mecanismos de produção de conhecimentos pelos alunos” (E59); “[Citando
Fourez, diz que] alfabetização científica implica a capacidade de refletir sobre deliberações
éticas e políticas e diferenciar de reflexões técnicas” (E89).

• Sobre “Formação moral”, “formação ética” e “desenvolvimento moral”

Quadro 11. Contexto dos descritores em trabalhos da Ensaio


Trabalho: E55
Tema / Assunto: Educação superior.
Palavras-chave: Não constam.
Autoria principal: Estrangeira.
Contexto dos descritores: O sistema educacional cubano preocupa-se com a formação integral,
incluindo a educação moral.
Trabalho: E79
Tema / Assunto: Educação ambiental.
Palavras-chave: Ensino de ciências. Ambientes naturais brasileiros. Valores estéticos.
Autoria principal: Brasileira.
Contexto dos descritores: [Citou Piaget:] O desenvolvimento da inteligência e da formação dos
valores morais obedecem às mesmas relações lógicas.
Trabalho: E132
Tema / Assunto: Formação de professores.
Palavras-chave: Formação de professores. Gestão educacional. Ensino de ciências.
Autoria principal: Brasileira.
Contexto dos descritores: [Citou J. C. Libâneo:] Os professores precisam ter consciência de que
também são responsáveis pela formação ética dos alunos.

6.3.4 - Artigos da revista Ciência & Educação


A tabela 3 e o gráfico 3 apresentam uma síntese dos dados quantitativos dos trabalhos
da Ciência & Educação.
Tabela 3. Levantamento quantitativo sobre termos de interesse na revista Ciência & Educação

(*) Enquanto a coluna de frequência das demais categorias apresenta a porcentagem (frequência relativa percentual), nessas três últimas categorias são apresentadas as
157

médias (aritméticas simples) de presença do termo por artigo correspondente (ex: média de presença do termo “Ética” por artigo em que o termo aparece).
Nota: O total não inclui 3 artigos, porque os links não disponibilizaram os textos completos.
158

Gráfico 3. Artigos com presença e ausência dos termos ética ou moral em Ciência & Educação (em %)

O conjunto de artigos publicados na revista Ciência & Educação apresentou variações


na curva percentual de artigos com a presença dos termos ética e (ou) moral, com oscilações
entre a linha de 40% (gráfico 3).
Sobre as estatísticas apresentadas na tabela 3, destacamos alguns resultados: i) Em
quase 60% dos artigos apareceu pelo menos um dos quatro primeiros termos buscados
(“Piaget”, “Kohlberg”, “ética” e “moral”); ii) entre os quatro primeiros termos buscados,
“ética” preponderou com a frequência maior; iii) quando observados os termos de nosso
referencial teórico em conjunto com os termos “ética” e (ou) “moral” (itens g, h, i), o maior
percentual médio foi para artigos que apresentaram os termos Piaget, ética e moral (3,3%); iv)
em três artigos apareceram mencionados “O juízo moral na criança”, de Piaget; v) Durkheim
não apareceu citado em nenhum artigo.

• Usos, contextos e locais de inserção dos termos


a) “Piaget”: Em abordagens e discussões sobre construtivismo, interdisciplinaridade,
teorias cognitivas, psicogênese; em nome de editora.
b) “Ética”: Em abordagens e discussões sobre formação de professor, Educação
Ambiental, controle ético da ciência, prática docente ética, aprendizagens que facilitam a
formação ética, inclusão, CTSA, genética,; tecnociência; assuntos controvertidos, formação
ética e cidadã na escola, história da ciência, estratégias pedagógicas de leitura, estratégias
pedagógicas de filmes; em menção aos trabalhos de Fourez; em discussões filosóficas
diversas; em menções a comitês de pesquisa; em citações dos PCN e temas transversais.
c) “Moral”: Em abordagens e discussões sobre aspectos morais da produção da
ciência, Educação Ambiental, formação moral cidadã, carências de moralidade, estratégias e
159

implicações pedagógicas em atividades de Física; em título de livro; em menções específicas


ao desenvolvimento moral e autonomia moral (com citações de trabalhos de Puig e La Taille).
d) Kohlberg: Em citação indireta, tendo como fonte uma obra de La Taille.
e) Habermas: Em menções e discussões sobre repercussões éticas da modernidade,
desenvolvimento científico e poder político, soberania popular e consciência ecológica.

• Os três artigos com as maiores citações dos termos “ética” e “moral”


a) Artigo com 23 citações do termo “ética” e 13 citações do termo “moral” (C8):
Relatou pesquisa sobre educação em valores na educação ambiental em livros didáticos de
Ciências. Parte dos resultados expôs a predominância do valor do conhecimento científico
sobre as demais formas de conhecimento, que implicam a educação ambiental.
b) Artigo com 15 citações do termo “ética” e 27 citações do termo “moral” (C77):
Com o tema “valores em Educação Ambiental”, apontou necessidades de valores em prol do
meio ambiente e da vida. Ao final, ressaltou a relevância de estratégias educativas que
envolvem as dimensões éticas e morais em conjunto com as de cognição, afetividade e ação.
c) Artigo com 49 citações do termo “ética” e 2 citações do termo “moral” (C309):
Texto teórico com abordagens sobre as relações entre ciência e ética. Num dos trechos,
discutiu a dominação da ciência e as consequências deletérias para os indivíduos e sociedade.

• Artigos com menções a Kohlberg


Um artigo (C77) fez menção ao nome de Kohlberg, por intermédio de fonte
secundária: “Kohlberg desenvolveu a teoria de estágios de desenvolvimento do juízo moral,
em que a psicogênese da moralidade é vista nos mesmos esquemas da psicogênese do
pensamento lógico”.

• Artigos com menções a “O juízo moral na criança”


Três artigos fizeram menções à obra de Piaget. O primeiro (C8), com temática de
Educação Ambiental, apoiou-se em pressupostos piagetianos de desenvolvimento do juízo
moral (fonte primária) para justificar que a autonomia moral, de alguma forma deve ser
propiciada e ou trazida para os espaços educativos. O segundo (C77), também com temática
de Educação Ambiental, fez menção à obra de Piaget e de seus respectivos pressupostos por
intermédio de fonte secundária. O terceiro (C279) abordou atividades de Física. Utilizou
bases teóricas do desenvolvimento moral em pesquisa sobre o potencial das atividades de
Física para o desenvolvimento socioemocional das crianças.
160

• Excertos com os termos “ética” e (ou) “moral”


“[Cita Morin sobre a exigência de] formação de uma consciência moral - seja do
cientista, seja do cidadão - visando ao controle ético e político da atividade científica” (C2);
“A vocação da escola deveria ser o compromisso com a formação de cidadãos críticos [...], ao
mesmo tempo em que se pretende resgatar valores éticos e morais” (C54); “[A escola deve]
avançar nossas práticas, procurando promover uma educação em ciências que contribua
verdadeiramente para a construção da autonomia moral e intelectual de nossos estudantes”
(C108); “As disciplinas clássicas do currículo são importantes, porém insuficientes para dar
conta de questões que angustiam a maioria da população. Após estudo, reflexão e organização
de vários educadores, temas diversos como: ética, saúde, orientação sexual, educação
ambiental, trabalho e consumo, entre outros, foram incluídos nas grades curriculares, devendo
estes impregnar toda a prática educacional” (C111); “De modo consistente com investigações
anteriores sobre a tomada de decisões em questões sociocientíficas, os fatores mais influentes
foram os valores morais e pessoais, assim como os aspectos culturais, sociais e políticos,
relacionados com as questões colocadas. [...] Investigação com estudantes universitários
mostra que as considerações morais, os sentimentos, as emoções e as intuições têm grande
influência nas decisões que se tomam sobre estas questões” (C170); “Recomendamos também
a utilização combinada de métodos, de forma a contemplar tanto o desenvolvimento cognitivo
quanto a formação ética do cidadão” (C215); “Além da aprendizagem dos conteúdos
específicos, a escola tem a responsabilidade pela formação integral dos alunos, estando aí
inseridas as questões éticas” (C215).

• Sobre “Formação moral”, “formação ética” e “desenvolvimento moral”

Quadro 12. Contexto dos descritores em trabalhos da Ciência & Educação


Trabalho: C2
Tema / Assunto: Natureza da ciência em sala de aula.
Palavras-chave: Concepções dos professores. Ensino de ciências. Epistemologia. Natureza da ciência.
Autoria principal: Brasileira.
Contexto dos descritores: [Citou E. Morin:] O impacto da ciência e da tecnologia sobre a sociedade
exige a formação de uma consciência moral, tanto do cientista como do cidadão.
Trabalho: C8
Tema / Assunto: Educação ambiental em livros didáticos.
Palavras-chave: Educação ambiental. Educação em valores. Livro didático de Ciências Naturais.
Ensino Fundamental.
Autoria principal: Brasileira.
Contexto dos descritores: Os temas transversais (PCN) assinalam o retorno da educação moral como
prioridade.
161

Quadro 12. Contexto dos descritores em trabalhos da Ciência & Educação (cont.)
Trabalho: C40
Tema / Assunto: Educação ambiental.
Palavras-chave: Ensino de Ecologia. Ambientes naturais. Dimensão estética. Aulas de campo.
Autoria principal: Brasileira.
Contexto dos descritores: [Citou Piaget:] O desenvolvimento da inteligência e a formação dos
valores morais obedecem às mesmas relações lógicas.
Trabalho: C56
Tema / Assunto: Estudos culturais de povos indígenas.
Palavras-chave: Conhecimento tradicional. Conhecimento indígena. Multiculturalismo. Kaiowá /
Guarani.
Autoria principal: Brasileira.
Contexto dos descritores: Educação e formação moral e espiritual inserem-se nos aspectos
necessários para a conservação ambiental.
Trabalho: C66
Tema / Assunto: Formação de professores.
Palavras-chave: Atividades de investigação. Ambiente virtual de aprendizagem. Estudos de caso.
Autoria principal: Brasileira.
Contexto dos descritores: [Citou P. Freire:] Uma formação mais crítica, reflexiva, ética e
investigativa eleva a qualidade na formação de professores.
Trabalho: C77
Tema / Assunto: O trabalho com valores em Educação Ambiental.
Palavras-chave: Educação ambiental. Conteúdo valorativo da Educação Ambiental. Educação em
valores. Valores éticos e estéticos em Educação Ambiental.
Autoria principal: Brasileira.
Contexto dos descritores: Necessidade de elaboração de programas educacionais com inserção de
educação moral baseada em princípios e valores de justiça e igualdade, sem caráter de imposição;
Educação moral deve considerar o papel ativo do sujeito; A perspectiva piagetiana baseia-se nos
métodos ativos de educação moral. Puig defende a educação moral como construção da personalidade
moral.
Trabalho: C183
Tema / Assunto: Formação de professores.
Palavras-chave: História da Ciência. Formação de professores.
Autoria principal: Estrangeira.
Contexto dos descritores: Uma formação multidisciplinar deve contemplar também uma formação
cultural, pessoal, social e ética.
Trabalho: C279
Tema / Assunto: O conhecimento físico.
Palavras-chave: Educação moral. Autonomia. Cooperação.
Autoria principal: Brasileira. Professora de ensino médio.
Contexto dos descritores: [Citou Piaget:] O desenvolvimento moral deve ser considerado na atuação
do professor no relacionamento adulto-criança; A criança não pode construir autonomia moral sem
autonomia intelectual e vice-versa, portanto um proposta do conhecimento físico passa por uma
abordagem da educação moral na escola.

6.3.5 - Artigos da RBPEC


A tabela 4 e o gráfico 4 apresentam uma síntese dos dados quantitativos dos trabalhos
da RBPEC.
Tabela 4. Levantamento quantitativo sobre termos de interesse na RBPEC
162

(*) Enquanto a coluna de frequência das demais categorias apresenta a porcentagem (frequência relativa percentual), nessas três últimas categorias são apresentadas as
médias (aritméticas simples) de presença do termo por artigo correspondente (ex: média de presença do termo “Ética” por artigo em que o termo aparece).
Nota: O total não inclui 2 artigos, por causa de links quebrados - não abriram após 3 tentativas.
163

Gráfico 4. Artigos com presença e ausência dos termos ética ou moral em RBPEC (em %)

O conjunto de artigos publicados na RBPEC mostrou oscilação da curva percentual de


artigos com a presença dos termos ética e (ou) moral, mas com tendência crescente (gráfico
4).
Sobre as estatísticas apresentadas na tabela 4, destacamos: i) na média, pelo menos um
dos quatro primeiros termos buscados (“Piaget”, “Kohlberg”, “ética” e “moral”) apareceu em
mais de 40% do total de artigos, com pico de 75% em 2007; ii) entre os quatro primeiros
termos buscados (“Piaget”, “Kohlberg”, “ética” e “moral”), as maiores frequências foram
revezadas entre “ética” e “Piaget”; iii) quando observados os termos de nosso referencial
teórico em conjunto com os termos “ética” e (ou) “moral” (itens g, h, i), o percentual foi nulo
para todos eles, ou seja, em nenhum artigo houve presença conjunta desses termos; iv) a obra
clássica de Piaget, “O juízo moral na criança”, apareceu em mencionada em um trabalho; v)
Kohlberg, Habermas e Durkheim não foram mencionados.

• Usos, contextos e locais de inserção dos termos


a) “Piaget”: Em abordagens e discussões sobre construtivismo, esquemas de
assimilação, psicogênese, desenvolvimento da criança; em título de livro; em vinculações às
teorias de Vergnaud; em nome de editora.
b) “Ética”: Em abordagens e discussões sobre bioética, caso Dolly, educação sexual,
genética, saúde, formação ética na escola, educação para a democracia, CTSA, produtos da
ciência, desenvolvimento ético do educando, conduta docente, aspectos éticos da sociedade,
Educação Ambiental, código de ética da ciência, saberes éticos dos docentes, cidadania e
dimensões éticas dos cidadãos; em título de livro; em menções aos trabalhos de Fourez; em
menções aos PCN.
164

c) “Moral”: Em abordagens e discussões sobre educação moral na escola, temas


transversais, estratégias pedagógicas lúdicas e de cooperação.

• Os três artigos com as maiores citações dos termos “ética” e “moral”


a) Artigo com 14 citações do termo “ética” e 5 citações do termo “moral” (R78): De
autoria estrangeira e tema “educação pela ciência e sobre ciência”, discutiu o ensino de
Ciências com abordagem CTSA, pois envolve três universos (educação em ciência, educação
pela ciência e educação sobre ciência) e tem bases em ideias, princípios e valores inerentes à
cidadania.
b) Artigo com quatro citações do termo “ética” e cinco citações do termo “moral”
(R177): Ensaio teórico que discutiu ações educacionais orientadas por cooperação e projeto
político-pedagógico emancipatório.
c) Artigo com três citações do termo “ética” e três citações do termo “moral” (R156):
De autoria estrangeira (artigo publicado em inglês37), abordou o movimento CTSA na
preparação da cidadania e desenvolvimento humano.

• Artigos com menções a “O juízo moral na criança”


Um artigo (R180) mencionou a obra de Piaget em abordagem sobre atividades lúdicas
em grupo em favor do desenvolvimento de noções de autonomia e reciprocidade.

• Excertos com os termos “ética” e (ou) “moral”


“Desenvolver no educando o sentido ético-social diante dos problemas ambientais”
(R7); “[Cita Libâneo para dizer que] “o ensino é processo social, e, portanto, integra múltiplas
interações sociais em que encontramos dimensões políticas, ideológicas, éticas, pedagógicas,
frente às quais se formulam objetivos, conteúdos e métodos segundo as opções assumidas
pelo educador” (R63); “O ensino sobre ciência que tem em conta o ethos da ciência actual
constitui um foco importante da aprendizagem CTS não só pelo seu papel como suporte da
aprendizagem do conteúdo científico com sucesso (educação em ciência), mas também por
razões utilitárias, democráticas, culturais e morais – razões de cidadania” (R78); “A formação
do cidadão através da ciência, principal meta da educação pela ciência [...] assenta no actual
reconhecimento do valor cultural e ético da tecnociência e tem como aspecto central um
ensino mais humanista” (R78); [Cita Benevides para dizer que] a educação moral “se dá pelo

37
Porque diversos artigos da RBPEC foram publicados em língua inglesa, estendemos nossas buscas por termos
em inglês (exemplo: digitação das letras “eth” para possibilitar o encontro de “ethics”).
165

ensino e aprendizagem de um conjunto de valores, que se realiza não apenas por vias
intelectuais, mas, especialmente, por uma consciência ética que supõe tanto a razão quanto os
sentimentos” (R145); “A aprendizagem cooperativa requer a utilização de práticas
pedagógicas que favoreçam a interação social em sala de aula, propiciando além do
desenvolvimento cognitivo do aluno, a construção de atitudes éticas e sociabilidade humana”
(R171).

• Sobre “Formação moral”, “formação ética” e “desenvolvimento moral”

Quadro 13. Contexto dos descritores em trabalhos da RBPEC


Trabalho: R7
Tema / Assunto: Educação ambiental.
Palavras-chave: Não constam.
Autoria principal: Brasileira.
Contexto dos descritores: Há necessidade de desenvolver no educando o sentido ético-social dos
problemas ambientais.
Trabalho: R15
Tema / Assunto: Educação ambiental.
Palavras-chave: Não constam.
Autoria principal: Brasileira
Contexto dos descritores: Há necessidade de ajudar a desenvolver uma consciência ética para
preservação ambiental.
Trabalho: R45
Tema / Assunto: Avaliação de livros didáticos.
Palavras-chave: Evaluación. Libros de texto. Ciencias.
Autoria principal: Estrangeira.
Contexto dos descritores: Os temas transversais trazem orientações sobre educação moral.
Trabalho: R133
Tema / Assunto: Interdisciplinaridade.
Palavras-chave: Trabalho Interdisciplinar. Ensino de Ciências Naturais e Humanas. Formação de
professores. Ensino médio. Sociedade sustentável.
Autoria principal: Brasileira.
Contexto dos descritores: Sob a perspectiva da sustentabilidade da sociedade, torna-se necessário que
professores também trabalhem a formação ética dos alunos.
Trabalho: R145
Tema / Assunto: Democracia no ensino de Ciências.
Palavras-chave: Ensino de Ciência. Democracia. Currículo. CTS. Alfabetização Científica e
Tecnológica.
Autoria principal: Brasileira.
Contexto dos descritores: [Citou M. V. Benevides:] A educação moral também se realiza por meios
intelectuais e racionais.

6.3.6 - Artigos da revista Investigações em Ensino de Ciências


A tabela 5 e o gráfico 5 apresentam uma síntese dos dados quantitativos dos trabalhos
da Investigações em Ensino de Ciências.
Tabela 5. Levantamento quantitativo sobre termos de interesse na revista Investigações

(*) Enquanto a coluna de frequência das demais categorias apresenta a porcentagem (frequência relativa percentual), nessas três últimas categorias são apresentadas as
médias (aritméticas simples) de presença do termo por artigo correspondente (ex: média de presença do termo “Ética” por artigo em que o termo aparece).
166
167

Gráfico 5. Artigos com presença e ausência dos termos ética ou moral em Investigações (em %)

O conjunto de artigos publicados na revista Investigações em Ensino de Ciências


apresentou oscilações na curva percentual de artigos com a presença dos termos ética e (ou)
moral, com tendência crescente (gráfico 5).
Sobre as estatísticas apresentadas na tabela 5, destacamos alguns resultados, como: i)
Na média, em 50% dos artigos apareceu pelo menos um dos quatro primeiros termos
buscados (“Piaget”, “Kohlberg”, “ética” e “moral”); ii) entre os quatro primeiros termos
buscados, “Piaget” preponderou com a frequência maior; iii) quando observados os termos de
nosso referencial teórico em conjunto com os termos “ética” e (ou) “moral” (itens g, h, i), o
maior percentual médio foi para artigos que apresentaram os termos Piaget, ética e moral
(2,4%); iv) em dois artigos apareceram mencionados “O juízo moral na criança”, de Piaget; v)
Habermas apareceu mencionado em quatro artigos, Kohlberg e Durkheim apareceram citados
em um artigo.

• Usos, contextos e locais de inserção dos termos


a) “Piaget”: Em abordagens e discussões sobre sociointeracionismo, epistemologia,
teorias psicogenéticas, generalidades sobre aprendizagem, concepções alternativas,
construtivismo; em vinculações a trabalhos de Vergnaud; em vinculações a trabalhos de
Ausubel; em nome livro; em nome de editora.
b) “Ética”: Em abordagens e discussões sobre Educação Ambiental, o papel ético da
ciência, formação ética dos alunos, CTSA, bioética, genética, ética no ensino escolar, ética do
professor; em menções sobre comitê de ética de pesquisa.
168

c) “Moral”: Em abordagens e discussões sobre tarefas dos professores, implicações


morais da teoria Gaia, desmoralização atual do professor, lições de moral na escola,
conhecimentos morais, a “atualidade moral” (de Chevalard); em menções específicas ao
desenvolvimento moral (de autor estrangeiro que tem trabalhos que expressam preocupações
sobre o tema); em menções ao trabalho de nossa autoria.
d) Kohlberg: Artigo de nossa autoria.
e) Habermas: Em abordagens e discussões sobre racionalidade da ciência, teoria
crítica, modernidade.
f) Durkheim: Em abordagens e discussões sobre representações sociais.

• Os três artigos com as maiores citações dos termos “ética” e “moral”


a) Artigo com 50 citações do termo “ética” e 91 citações do termo “moral” (I81): De
nossa autoria, demonstrou a existência de lacuna em pesquisas da área sobre ética e
desenvolvimento moral.
b) Artigo com 22 citações do termo “ética” e três citações do termo “moral” (I16):
Com o tema “Educação Ambiental”, analisou a dimensão ética e estética no ensino de
florestas tropicais em disciplinas de ecologia.
c) Artigo com 13 citações do termo “ética” e cinco citações do termo “moral” (I91):
De autoria estrangeira, abordou o impacto das controvérsias sociocientíficas recentes nas
concepções e práticas de professores de Ciências.

• Artigos com menções a Kohlberg


Artigo de nossa autoria (I81).

• Artigos com menções a “O juízo moral na criança”


Dois artigos fizeram menções à obra de Piaget. O primeiro (I81), de nossa autoria. O
segundo (I33), utilizou os pressupostos piagetianos do desenvolvimento moral para embasar a
relevância das atividades experimentais e lúdicas e o conhecimento que o professor deve ter
sobre a influência das regras do adulto sobre a criança nesse processo.

• Excertos com os termos “ética” e (ou) “moral”


“[Cita Morin para dizer que] “os múltiplos poderes atribuídos às tecnociências
contemporâneas exigem a formação de uma consciência moral - seja do cientista, seja do
cidadão - visando ao controle ético e político da atividade científica” (I10); “Com a
169

velocidade crescente dos avanços tecnológicos os desafios de natureza ética, filosófica,


prática e teórica se multiplicam, gerando reflexos e modificações nos segmentos da pesquisa,
do cuidado e do ensino-aprendizagem” (I46); “Somente nas relações cotidianas é que se
consegue fazer com que o ser humano coloque em prática a ética, a tolerância e o amor ao
próximo que devem necessariamente acompanhar a disseminação do conhecimento” (I56);
[Cita Sarmento para dizer que ] “as solicitações que são colocadas aos professores são das
mas variadas espécies e afetam todos os domínio, do cognitivo ao afetivo e emocional, do
psicomotor ao sociomoral” (I155); “As discussões em sala de aula a respeito da tecnologia -
nos seus aspectos éticos, estéticos, mercadológicos, epistemológicos - representam importante
caminho para dimensionar o conhecimento biológico na sociedade contemporânea” (I188).

• Sobre “Formação moral”, “formação ética” e “desenvolvimento moral”

Quadro 14. Contexto dos descritores em trabalhos da Investigações


Trabalho: I20
Tema / Assunto: Ensino de Fisiologia.
Palavras-chave: Educação científica. Ensino por pesquisa. Aprendizagem significativa. Homeostasia.
Autoria principal: Brasileira.
Contexto dos descritores: No ensino científico faz-se necessário uma formação ética e emancipatória
dos alunos.
Trabalho: I68
Tema / Assunto: Modelos didáticos.
Palavras-chave: Modelos didáticos. Ensino de Ciências. Formação de professores.
Autoria principal: Brasileira.
Contexto dos descritores: Os conhecimentos escolares devem contribuir para o desenvolvimento
intelectual e ético dos alunos e na transformação da realidade.
Trabalho: I81
Tema / Assunto: Ética no ensino de Ciências.
Palavras-chave: Ética. Desenvolvimento moral. Temas controvertidos. Multiculturalismo.
Autoria principal: Brasileira.
Contexto dos descritores: Existe interação entre desenvolvimento moral e evolução intelectual; Há
necessidade de reflexão sobre algumas das correlações e inerências entre ensino de Ciências e
desenvolvimento moral; Observa-se um preocupante ausência de discussões sobre ética e
desenvolvimento moral na área; Professor também é responsável pelo desenvolvimento moral de seus
alunos; As discussões sobre temas controvertidos contemplam as possibilidades de contribuir para a
formação ética e moral do estudante; Formação ética e o desenvolvimento da autonomia intelectual e
do pensamento crítico são contemplados nos PCN. [Citações de Piaget e Kohlberg].
Trabalho: I91
Tema / Assunto: Controvérsias sociocientíficas.
Palavras-chave: Ensino das ciências. Ciência, tecnologia e sociedade (CTS). Controvérsias sócio-
científicas. Concepções. Práticas lectivas.
Autoria principal: Estrangeira.
Contexto dos descritores: [Citou W. Doise:] O desenvolvimento moral e ético dos alunos é uma das
principais finalidades do ensino das ciências. Desenvolvimento moral dos alunos também pode ser
feita através da clarificação de valores.
170

6.4 - Ética e moral em dissertações e teses na área do ensino de Biologia (1972-2004)

Para as discussões que seguem neste item, utilizamos informações extraídas de


Teixeira (2008), de uma investigação realizada sobre o estado da arte de pesquisas em ensino
de Biologia, na qual o autor analisou 351 dissertações e teses brasileiras defendidas entre
1972 e 2004.
Na lista que Teixeira (2008) apresentou sobre os títulos, resumos e palavras-chave de
todos esses trabalhos, verificamos que: i) A palavra “ética” apareceu em 12 trabalhos: no
título de 3 trabalhos, nas palavras-chave de 2 trabalhos e no resumo de 12 trabalhos; ii) A
palavra “moral” apareceu em 7 trabalhos: no título de 1 trabalho e no resumo de 7 trabalhos;
iii) As palavras “ética” e “moral” apareceram em 3 trabalhos.
Algumas informações de contextos e situações em que as palavras “ética” e “moral”
apareceram são apresentadas a seguir (quadros 15 e 16).

Quadro 15. O termo “ética” em dissertações e teses sobre o ensino de Biologia (de 1972 a 2004)
Referência do Trechos de inserção do termo (abrangência: título, Situações ou contextos de uso
trabalho resumo e palavras-chave)
Dissertação: No resumo: “Mediante a combinação destes Dimensões ético-profissonais no
LUZ (1982) aspectos, estabelece três dimensões (cognitiva, tratamento da Botânica.
metodológica e ético-profissional) como sendo
necessárias ao currículo da Botânica”.
Dissertação: No resumo: “O ensino atual de Biologia não tem Aspectos éticos envolvidos na
FERRAZ (1997) contemplado os avanços tecnológicos assim como a produção científica.
análise das implicações sociais e éticas da produção
científica”; “Debates e reflexões éticas sobre
problemas atuais e relevantes para a sociedade
permitem orientar nossos alunos quanto à tomada de
decisões de forma consciente e ao encaminhamento
de soluções para nossos problemas cotidianos”.
Dissertação: No título: “Ética em assuntos controvertidos no Postura ética do professor e as
RAZERA (2000) Ensino de Ciências: perspectivas ao desenvolvimento possíveis interferências ao
moral nas atitudes que configuram as controvérsias desenvolvimento moral dos alunos.
entre Evolucionismo e Criacionismo”; No resumo:
“Todavia, a presença de elementos sintáticos nos
enunciados dos professores, somados à ausência de
determinadas percepções éticas subjacentes a
contextos fora do eixo ciência-religião, mostrou-nos
[...]”. Nas palavras-chave: “Ética; Ensino de
Biologia; Temas Polêmicos; Evolução;
Criacionismo”.
Dissertação: No título: “Biologia e Ética: um estudo sobre a Questões éticas em relação à
ALVES (2003) compreensão e atitudes de alunos do Ensino Médio Genética.
frente ao tema Genoma/DNA”. No resumo: “A
produção científica e tecnológica das últimas décadas
tem modificado o homem e o mundo em que vive. As
implicações sociais, políticas e éticas destes avanços,
que afetam a sociedade, foram trabalhadas [...]”.
171

Quadro 15. O termo “ética” em dissertações e teses sobre o ensino de Biologia (de 1972 a 2004) (cont.)
Referência doTrechos de inserção do termo (abrangência: título, Situações ou contextos de uso
trabalho resumo e palavras-chave)
Dissertação: No título: “Educação Científica, Genética e Ética: a Questões éticas em relação à
CANAL (2003) abordagem de temas contemporâneos no Ensino de Genética.
Biologia”. No resumo: “Temas contemporâneos
relacionados às pesquisas recentes da Genética
Molecular estão inseridos em contextos sociais
econômicos e éticos”; “Procurou-se verificar de que
maneira os alunos do Ensino Médio interagem com a
programação proposta, com destaque para os
seguintes aspectos: interesse, motivação e
envolvimento que os conteúdos, questões e atividades
propostos podem suscitar entre os alunos com as
novas informações sobre conhecimentos e técnicas
em Genética Molecular, identificando-se dificuldades
conceituais e possíveis caminhos para a superação
das mesmas; posicionamento assumidos pelos alunos
diante de questões que envolvem discussões sobre
Ciência e Ética e sobre as relações entre Ciência,
Tecnologia e Sociedade”; “Partiu-se da hipótese de
que a programação de ensino que focalize avanços
científicos recentes e suas implicações econômicas,
sociais, políticas e éticas pode ser: (a) interessante
para os alunos do Ensino Médio [...]”.
Tese de Livre No resumo: “Explora as relações entre Relações entre ciência, ética e
Docência: Ciência/Ética/Cidadania tomando como referência o cidadania.
BIZZO (1994) cenário escolar”. Nas palavras-chave: “História da
Ciência; Reprodução Sexual; Eugenia; Ciência;
Ética; Cidadania; Ensino de Ciências”.
Dissertação: No resumo: “Para isso faz-se necessário que os Aspectos éticos envolvidos na
BONATTO (1991) professores conheçam, e considerem em todas as Educação Ambiental.
disciplinas, os fundamentos das relações ecológicas
da natureza, a integração do saber formal, e o
exercício de discussões que reconsiderem as funções
de valores éticos-sociais, tais como o bom e o mau, a
justiça, a identidade, a cidadania, a verdade e muitos
outros”.
Dissertação: No resumo: “Buscou-se no relato apresentar a Aspectos éticos envolvidos na
FERRAZ (2002) seqüência de estratégias educacionais que Educação Ambiental.
envolveram atividades de autoconhecimento dos
estudantes, orientação e análise de problemas no
âmbito do tema de pesquisa escolhido, estímulo à
capacidade crítica individual e coletiva, à ética e aos
valores humanos”.
Tese: No resumo: “[...] verificou-se o limitado alcance da Questões éticas em relação à
ROSA (2000) contribuição destas práticas para a formação crítica Genética.
e responsável dos futuros profissionais, frente às
complexas implicações sociais e éticas da moderna
Genética Humana”.
Dissertação: No resumo: “O conhecimento científico, CTSA e implicações éticas.
SILVA (2001) especificamente o da Biologia, traz consigo
implicações sociais, políticas e éticas que devem ter
lugar no ensino desta disciplina. Este trabalho
propõe investigar como estudantes do Ensino Médio
apreendem a dimensão ética dos saberes biológicos à
luz de princípios preconizados pela Bioética, bem
como a importância da contextualização destes
saberes a partir das relações entre Ciência e
Sociedade”.
172

Quadro 15. O termo “ética” em dissertações e teses sobre o ensino de Biologia (de 1972 a 2004) (cont.)
Referência do Trechos de inserção do termo (abrangência: título, Situações ou contextos de uso
trabalho resumo e palavras-chave)
Dissertação: No resumo: “[...] questões relacionadas à influência Aspectos éticos envolvidos na
PINHEIRO (1999) da Química no cotidiano das vidas das pessoas, Educação Ambiental.
integração do conteúdo químico propriamente dito
com o contexto social, e ainda se está sendo possível
através deste ensino, contribuir para a formação de
um profissional de Biologia com certo discernimento
de ética, moral, respeito aos problemas ambientais, e
principalmente de seu papel de cidadão dentro da
nossa sociedade”.
Dissertação: No resumo: “Vale ressaltar que, apesar das diversas Aspectos éticos envolvidos na
LOPES (2004) visões de EA, os conceitos apresentados apontam a Educação Ambiental.
EA como instrumento de transformação social,
atitude individual e coletiva, desenvolvendo no
indivíduo valores éticos, bem como a condição de
cidadão. Com relação aos alunos, observamos os
seguintes pontos convergentes: os valores morais
(éticos) têm relação com todas as disciplinas [...]”.

Quadro 16. O termo “moral” em dissertações e teses sobre o ensino de Biologia (de 1972 a 2004)
Referência do Trechos de inserção do termo (abrangência: título, Situações ou contextos de uso
trabalho resumo e palavras-chave)
Dissertação: No título: “Ética em assuntos controvertidos no Postura ética do professor e as
RAZERA (2000) Ensino de Ciências: perspectivas ao desenvolvimento possíveis interferências ao
moral nas atitudes que configuram as controvérsias desenvolvimento moral dos alunos.
entre Evolucionismo e Criacionismo”. No resumo:
“O objetivo deste trabalho centrou-se na verificação
das atitudes que configuram o ensino de Biologia nas
controvérsias entre evolucionismo e criacionismo,
com as respectivas implicações pedagógicas
inerentes ao processo de desenvolvimento moral”;
“[...] as representações mostraram elementos
sintáticos de atitudes benéficas à autonomia moral”;
“[...] os discursos denotaram desaprovação a fatores
que pudessem inibir ou perturbar o processo de
desenvolvimento moral”; “[...] falhas na formação
docente, contribuindo negativamente no processo de
desenvolvimento moral dos alunos e nos propósitos
de uma educação mais progressista em relação à
consolidação de cidadania”.
Dissertação: No resumo: “Os Parâmetros Curriculares Nacionais Aspectos morais envolvidos na
COVA (2004) (PCN) recomendam que, ao tratar de assuntos Educação Sexual.
relacionados à sexualidade, o tópico Orientação
Sexual seja incluído[...] de modo a não disseminar
preconceitos. Porém, a orientação sexual é um tema
polêmico, tanto no que diz respeito a questões morais,
quanto no campo científico, no qual se encontra um
grande número de controvérsias”; “Em vista dessa
necessidade, realizamos uma enquête com
professores de Biologia da rede pública estadual da
cidade de Salvador (BA), para investigar seus
julgamentos morais sobre a diversidade de
orientações sexuais e suas visões sobre o
desenvolvimento da orientação sexual”; “Entre os
professores estudados, predominaram julgamentos
morais positivos sobre a homossexualidade,
principalmente entre os mais jovens [...]”.
173

Quadro 16. O termo “moral” em dissertações e teses sobre o ensino de Biologia (de 1972 a 2004) (cont.)
Referência do Trechos de inserção do termo (abrangência: título, Situações ou contextos de uso
trabalho resumo e palavras-chave)
Dissertação: No resumo: “[...] questões relacionadas à influência Aspectos morais envolvidos na
PINHEIRO (1999) da Química no cotidiano das vidas das pessoas, Educação Ambiental.
integração do conteúdo químico propriamente dito
com o contexto social, e ainda se está sendo possível
através deste ensino, contribuir para a formação de
um profissional de Biologia com certo discernimento
de ética, moral, respeito aos problemas ambientais, e
principalmente de seu papel de cidadão dentro da
nossa sociedade”.
Tese: No resumo: “Deste estudo foram retiradas quinze Aspectos morais envolvidos na
SILVEIRA (1997) concepções, sendo três do período grego, duas do Educação Sexual.
romano, quatro da idade média e seis da Idade
Moderna, que foram divididas em concepções
biológicas e morais. As concepções biológicas
estavam relacionadas com o ato sexual, a
menstruação, a fecundação, a masturbação e a
amamentação. As concepções morais, com a
virgindade e o aborto”; “[...] quatro concepções
morais não foram superadas”.
Dissertação: No resumo: “A 1ª representação - de entorno - dá Aspectos morais envolvidos na
FERREIRA (2004) ênfase aos elementos próximos, tudo aquilo que Educação Ambiental.
rodeia os espaços ocupados pelo ser humano e que
necessita ser conhecido. A 2ª representação -
comportamentalista moralista - relaciona-se também
ao entorno, porém associado a atitudes e
comportamentos diante desse meio”; “[...] a
pedagogizante moralista (conscientizar as crianças
para salvar o meio ambiente); a idealista
(conscientizar para mudar o comportamento e agir
para preservar) [...]”.
Dissertação: “Com relação aos alunos, observamos os seguintes Aspectos morais envolvidos na
LOPES (2004) pontos convergentes: os valores morais (éticos) têm Educação Ambiental.
relação com todas as disciplinas [...]”.
Dissertação: No resumo: “[...] a agricultura e seus Aspectos morais envolvidos na
RIPOLL (2001) “superalimentos”, que possibilitarão acabar com a divulgação científica por
fome, além do comércio e das práticas de intermédio da mídia.
manipulação de entidades vivas, tidas como “coisas
do demônio”, “imorais” e “lucrativas”.

Em suma, temos indicativos suficientes para um delineamento de estado da área de


Educação em Ciências quanto à mobilização investigativa geral sobre ética / moral e
específica sobre formação moral (com os fundamentos do desenvolvimento).
Por um lado, podemos dizer que a nossa expectativa era encontrar uma lacuna maior
do que a constatada no decorrer do mapeamento dos trabalhos acerca da presença dos
descritores ética e moral no conjunto de discussões. Quanto à estatística, estávamos
enganados. Por outro lado, esses dados não são suficientes para anular a nossa expectativa,
apontada logo no início, de lacunas e de necessidades investigativas da área sobre as
174

especificidades do desenvolvimento moral em aulas de Ciências, com especial atenção à


interface de contribuições teórico-práticas recíprocas e plausíveis entre ambos os processos. A
confluência entre os dados obtidos no estado dos trabalhos e os argumentos referentes aos
aspectos interfaciais de contribuição correlativa entre aulas de Ciências e formação moral,
remete-nos a confirmar que esse assunto ainda carece de maior atenção da área.
Formação moral não tem aparecido como objeto ou questão de pesquisa na área,
apesar de aparecer em abordagens indiretas e esparsas em diferentes tipos de trabalhos. Por
consequência, especificidades relacionadas ao processo de desenvolvimento moral dos alunos
em aulas de Ciências, especialmente à luz de Piaget, Kohlberg e Habermas, também estão
inclusas nessa relevante lacuna investigativa da área.
Encontramos trabalhos teóricos e empíricos consistentemente fundamentados sobre
diversos temas e em diferentes linhas que compõem a área. Contudo, vislumbramos uma
carência no material acerca de dados, análises e argumentos teoricamente balizados e
aprofundados a correlacionar aulas de Ciências e desenvolvimento moral. No material
analisado encontramos diferentes trabalhos que mencionaram a relevância das aulas de
Ciências para a formação ética e moral (ou, ainda, “para a formação integral do aluno”), mas
sem discussões aprofundadas ou analíticas que explicitassem possíveis aspectos teórico-
práticos correlacionais acerca dessa relevância.
Os termos “ética” e (ou) “moral” apareceram em percentual não desprezível no
conjunto de trabalhos publicados pela área. Em parcela significativa deles, no entanto, sem
orientações teórico-metodológicas a dar consistência às abordagens. Foram encontradas
menções ao “raciocínio moral”, à “formação moral”, ao “desenvolvimento moral” ou à
“autonomia moral” apenas de modo superficial, ou seja, sem exposição teórica fundante sobre
o assunto. Entre outras possibilidades dedutivas, esse resultado dá margens a reflexões sobre
desconhecimentos teóricos do assunto ou dificuldades em aproximar os estudos de moralidade
de outras áreas para a área de Educação em Ciências ou, ainda, que a nossa área não vem
observando a relevância da formação moral como objeto relevante de pesquisa.
Por fim, fazemos a ressalva de que não se pode criticar os méritos de nenhum dos
trabalhos analisados. Todos têm seus méritos inquestionáveis. Também não houve ou haverá,
de nossa parte, qualquer cobrança infundada de possíveis convergências dos ensaios, relatos
de experiência e de pesquisa para a temática que aqui discutimos. Portanto, fica esse
esclarecimento de que nosso trabalho não traz intenções de questionar o que está efetivado
nas publicações, mas apenas de observar a existência dessa lacuna sobre o tema “formação
moral” em trabalhos científicos da área e apresentar argumentos que possam servir para
175

discussões ou investigações futuras ou, ainda, para fundamentar aquilo que parte dos
trabalhos já traz, de modo explícito ou implícito, sobre as relações entre ética, moral e ensino-
aprendizagem de Ciências. Lembrando-se que o conjunto geral de dados demonstrou que
“ética” e (ou) “moral” apresentam tendência crescente de presença em trabalhos da área.

6.5 - Destaques

• A área de Educação em Ciências ainda carece de mobilização investigativa que tenha como
foco temático ou assunto principal a formação moral.
• Há menções diversas que denotam a relevância da “formação moral”, do “desenvolvimento
moral” e da “autonomia moral” no ensino de Ciências, mas em discussões não centrais.
• No conjunto dos trabalhos os descritores “ética” e “moral” aparecem associados a ideias
diversas e difusas que nos colocam a refletir sobre o papel e as exigências do ensino de
Ciências na abrangência do assunto e, por consequência, tais resultados abrem diversas
possibilidades de investigação.
• Há tendência crescente de presença dos termos “ética” e (ou) “moral” em trabalhos da área.
• Uma quantidade maior de trabalhos - teóricos e empíricos - sobre formação moral no ensino
de Ciências poderia trazer contribuições relevantes para a área de Educação em Ciências.
• Trabalhos que abrangem ou abordam temáticas sobre CTSA, Educação Ambiental e
Assuntos Controvertidos preponderam entre os demais nas inserções dos descritores “ética” e
“moral” (em percentuais gerais e em contextos que denotam formação moral).
176

7.0 - A FORMAÇÃO MORAL NAS LICENCIATURAS EM CIÊNCIAS

“O educador democrático deve guiar-se por um


conjunto de princípios éticos e psicológicos que
deve apresentar abertamente a seus alunos,
convidando-os tanto a sua crítica como a sua
compreensão” (KOHLBERG; MAYER, 1984, p.
100).

Expondo sobre o contexto norte americano, Chickering (2010) argumenta que as


faculdades e universidades geralmente se pautam pela meritocracia e ignoram resultados
relacionados ao desenvolvimento moral e ético, além de outras dimensões do
desenvolvimento pessoal. Diz o autor que o ensino superior precisa mais do que “cultivar o
intelecto”, focar exclusivamente o conteúdo ou a transferência de informação. O mundo atual
exige que a formação escolar, incluindo a universitária, dê mais atenção ao desenvolvimento
moral e ético e também das outras dimensões do desenvolvimento pessoal. Chickering (2010)
aponta que “com poucas e notáveis exceções”, não se tem utilizado ou levado a sério teorias
que subsidiam esse tipo de formação relacionado ao desenvolvimento humano, como as de
Jane Loevinger, sobre o desenvolvimento do ego, e de Lawrence Kohlberg, sobre o
desenvolvimento moral e cognitivo.
Para Chickering (2010), as relações humanas preponderantes em todo o mundo ainda
estão alocadas em níveis baixos se comparadas com as respectivas fases de desenvolvimento
apresentadas pelas teorias de Loevinger (impulsividade, auto-proteção, conformismo) e das
teorias de Kohlberg (pré-convencionais e convencionais). É necessário, segundo o autor,
trabalharmos em busca de níveis mais elevados (autonomia, criticidade, consciência) se
quisermos viver num mundo melhor do que o atual.
Entendemos que não há como desvincular as nossas discussões e análises sobre o
assunto “desenvolvimento moral” da formação de professores de Ciências. Entre outras, estas
são questões que poderíamos apresentar: Será que as licenciaturas da área trabalham os
aspectos da formação moral no ensino de Ciências? Se não, por quê? Se sim, em que
disciplinas e (ou) situações? Que indicativos de tendência formativa podemos encontrar nas
ementas das disciplinas pedagógicas das licenciaturas da área (preponderância formativa
quanto ao pensamento moral, pensamento crítico, pensamento científico ou outros)? O que as
ementas das disciplinas de psicologia da educação, didática e práticas de ensino poderiam nos
revelar sobre essa lacuna teórico-metodológica sobre o assunto desenvolvimento moral dos
177

trabalhos científicos? Na literatura sobre as licenciaturas em Ciências, que discussões ou


argumentos poderíamos juntar a nossos resultados e análises?
Lembramos ao leitor que essas não são questões centrais de nossa pesquisa. No
entanto, consideramos que são perguntas relevantes a conter respostas que poderiam
complementar os nossos propósitos de estudo sobre o desenvolvimento moral nas aulas de
Ciências.

7.1 - As licenciaturas em discussão: relações entre teoria e prática e o tema moral nas
disciplinas

No decorrer do tempo, a literatura vem apresentando constantes discussões que


abrangem as licenciaturas em Ciências com diferentes vieses. Resgatamos algumas dessas
discussões acerca, especialmente, da estrutura curricular dos cursos e das relações
(educacionais e de poder) entre as disciplinas de conteúdo “duro”, das áreas pedagógicas e as
de práticas de ensino/estágio que fazem parte dos programas dessas licenciaturas e as
respectivas implicações.
O tema é complexo, os materiais são muitos e diversos, por isso optamos por alguns
recortes que exemplificam os problemas das licenciaturas até chegarmos em pontos mais
específicos e inerentes aos nossos propósitos - correlações entre os temas de formação de
professores e do desenvolvimento moral.
Iniciamos com o problema da estrutura das licenciaturas que traz consequências à
formação e identidade do futuro professor. Sobre esse aspecto, destacamos o relato de Brando
e Caldeira (2009).
Tendo-se como ponto de partida a atual estrutura dos cursos de licenciatura em
Ciências, que, muitas vezes, propiciam ao aluno identificar-se mais como pesquisador nas
áreas de Biologia, Física ou Química do que como professor ou pesquisador em ensino,
apesar da escolha inicial ser por um curso de formação de professor, Brando e Caldeira
(2009), por intermédio de uma investigação realizada com licenciandos em Ciências
Biológicas, nos trazem dados interessantes, entre eles, que no referido curso “a estrutura
curricular não articula áreas específicas com pedagógicas e o exercício de transposição
didática fica restrito a uma das áreas somente” (BRANDO; CALDEIRA, 2009, p. 170).
Esse problema estrutural aparece em outros trabalhos. Dentre eles, destacamos o relato
de Larocca (2007), porque apresenta resultados e análises específicas sobre a disciplina de
Psicologia da Educação, que, de modo especial é inerente aos propósitos de nossa temática.
178

Os dados dessa pesquisa, obtidos de licenciados egressos e em exercício profissional,


alunos dos últimos anos, coordenadores de curso e professores de Prática de Ensino e Estágio,
colocam em evidência os seguintes aspectos para a disciplina de Psicologia da Educação:
desarticulação entre teoria e prática e entre formação e realidade; insuficiência da carga
horária nas licenciaturas; insatisfação com a organização e condução do ensino de Psicologia
da Educação; desvínculos entre a Psicologia da Educação e o conhecimento específico de
cada curso (LAROCCA, 2007, p. 299).
Segundo a autora da pesquisa, a relevância da articulação do ensino de Psicologia com
as outras áreas de conhecimento e disciplinas específicas dos cursos é reconhecida. No
entanto, a prática disciplinar encontra várias dificuldades, que se associam a “problemas
relativos à diminuição da carga horária, pouca valorização nos cursos e expectativas de que o
ensino de Psicologia cumpra o papel de prescrever comportamentos para a solução de
problemas de ordem prática”. A Psicologia da Educação deveria, no entanto, ser considerada
“como uma unidade dialética [...], num ir e vir entre o domínio da ciência Psicologia, que
fornece as teorias, e o domínio da Educação, que é prática social que desejamos ver
transformada com a interferência dos professores que se formam nas licenciaturas”. Nesse
caso, a defesa que se faz é “de que a Psicologia da Educação deve assumir-se como disciplina
teórico-prática [...] na formação dos professores, para que adquira o sentido de trabalho vivo e
não artificial”. Larocca acredita “que esse é um desafio dos mais importantes que nós
formadores ainda temos a perseguir”, mas destaca que antes é importante “buscarmos a
superação das limitações institucionais e curriculares para alcançarmos uma contribuição mais
viva da Psicologia da Educação” (LAROCCA, 2007, p. 300-304).
A dicotomia entre teoria e prática existente na disciplina de Psicologia da Educação,
no processo de formação docente, também aparece em resultados relatados por Lima (2006):
“As ementas que norteiam a formação em Psicologia dos futuros professores [...] são
apresentadas de forma bastante genérica”. A autora revela que encontrou “algumas equipes de
formadores que propõem conteúdos com ênfase num determinado teórico em detrimento de
outros”. Essa é uma prática que, segundo a autora, acaba trazendo prejuízos no exercício da
docência (LIMA, 2006, p. 91),
Optamos por destacar acima três trabalhos recentes que abordam aspectos estruturais e
de relações de disciplinas e conteúdos nas licenciaturas. No entanto, as relações dicotômicas e
as respectivas necessidades de articulação entre teoria e prática nas disciplinas que compõem
as licenciaturas aparecem em diversos trabalhos teóricos ou relatos de pesquisa. Em trabalho
publicado há mais de 15 anos, já se questionava: “Não há dúvidas de que as unidades de
179

conteúdos específicos e as de conteúdos pedagógicos estarão presentes na organização


curricular. Mas como agrupar esses conteúdos? É só uma junção? [...] Em que momento do
curso?” (VIANA, 1992, p. 59-60).
Os debates continuaram, em discussões mais específicas sobre determinadas
disciplinas, com características integradoras, ou em discussões mais gerais e com a inserção
de outros vieses. Vejamos o posicionamento de alguns outros autores que abordam o tema.
De acordo com Marandino (2003, p. 176-180), “a Prática de Ensino das áreas das
Ciências [...] deve promover a articulação dos saberes específicos com aqueles pedagógicos”.
A autora, no entanto, ressalta sobre as dificuldades encontradas: “a quantidade de temas e a
complexidade da articulação entre o campo pedagógico e o científico implicam em vários
desafios para o seu desenvolvimento através de uma disciplina”. Um desses desafios estaria
em definir “quais são os conteúdos fundamentais que devem fazer parte da disciplina Prática
de Ensino nas áreas das Ciências”.
Para o rompimento das tradicionais dicotomias, Amorim (2001, p. 47), ao referir-se
especificamente sobre o ensino de Biologia, apontou que “a rede tecida nas relações entre
formas e conteúdos” encontra possibilidades nas abordagens em CTSA.
Em algumas universidades surgiram novas disciplinas para tentar minimizar os
problemas de dicotomia entre teoria e prática, como pudemos observar nas listas de ementas e
disciplinas pedagógicas. Relatos sobre essas disciplinas apareceram divulgados na literatura,
como vemos em Santos e Infante-Malachias (2008), discorrendo sobre a “Resolução de
Problemas”, do curso de “Licenciatura em Ciências da Natureza”, da Escola de Artes,
Ciências e Humanidades (EACH) da Universidade de São Paulo, ou em Mohr e Ferreira
(2006), em trabalho no qual expõem e analisam a atividade de “Prática Pedagógica como
Componente Curricular” introduzida no novo Currículo do Curso de Ciências Biológicas da
Universidade Federal de Santa Catarina.
Essa característica das licenciaturas envolverem grupos distintos de conteúdos e
disciplinas acaba, por vezes, implicando relações de poder que se dirigem até mesmo sobre o
locus de formação. De questões, como, por exemplo, “Qual grupo de conteúdos ou disciplinas
é mais relevante na formação de professores de Ciências?”, passa-se a outras, como esta: “A
formação de professores de Ciências deveria ocorrer em quais núcleos universitários: de
Ciências, de Educação, em ambos ou em algum específico?” Assim, os debates seguem.
Candau, em texto publicado em 1997, defende a relevância dos conteúdos específicos
nessa relação com os conteúdos pedagógicos. Diz que “A competência básica de todo e
qualquer professor é o domínio do conteúdo específico. Somente a partir deste ponto é
180

possível construir a competência pedagógica” (CANDAU, 1997, p. 46). O autor assume a


preponderância desse tipo de conteúdo nas licenciaturas, mas ressalta que recai sobre eles,
então, a articulação com o pedagógico e a superação de barreiras interdepartamentais das
universidades, por meio de núcleos interdisciplinares.
Por outro lado, há autores que defendem não somente a relevância das disciplinas
pedagógicas, mas a formação do professor em faculdades de educação, como expressam
Amaral e Oliveira (2008). Ambos acreditam que a formação pedagógica é de responsabilidade
das faculdades de educação, porque essas se constituem em ambientes privilegiados para
discussões teóricas e práticas pedagógicas, além de serem locais históricos de “práticas,
saberes, conhecimentos e lutas em defesa dos professores e de sua formação” (p. 14).
Libâneo e Pimenta (1999) também são autores de trabalhos a favor da formação de
professores em faculdades de educação, mas em curso específico de pedagogia a ser realizado
naquilo que denominaram “Centro de Formação, Pesquisa e Desenvolvimento Profissional de
Professores”.
Anteriormente dissemos que a inserção da disciplina de Psicologia nas discussões
recai sobre um interesse particular na construção dos argumentos que construímos. Com
similar interesse procuramos e detectamos na literatura trabalhos teóricos e relatos de
pesquisa com abordagens específicas sobre a Educação Moral nas licenciaturas. Na sequência,
apresentamos uma síntese de três desses trabalhos.
O primeiro, refere-se a uma pesquisa que buscou responder questões sobre a formação
do licenciando (não apenas de área de Ciências) em relação à Educação Moral e à Ética.
Apesar de ser um estudo localizado (análise de dez currículos de licenciatura de uma única
universidade e análise de 29 questionários respondidos por licenciandos do Colégio de
Aplicação, os quais cursavam as disciplinas de Prática de Ensino), a pesquisadora nos
apresenta resultados interessantes.

Dentre os dez currículos analisados apenas no de Educação Física existia a


disciplina “Filosofia e Educação Física” no currículo antigo, “Bases
Epistemológicas e Axiológicas da Educação Física” e uma disciplina
intitulada “Ética e Bioética na Educação Física” no currículo novo.
Acreditávamos, ainda, que os professores das disciplinas “Filosofia da
Educação” e “Psicologia de Educação” poderiam abordar algumas questões
concernentes ao problema da Educação Moral/Ética. Buscamos as ementas
destas disciplinas. Nada foi encontrado sobre tais temas nas ementas
(LONGO, 2008, p. 99).
181

Ao encontrar deficiências das licenciaturas sobre os aspectos de educação moral,


Longo (2008) ressalta que essas deficiências observadas no currículo e nas salas de aula dos
cursos de licenciatura prejudicam os futuros professores no tratamento de dilemas que
ocorrerão em sala de aula. Afinal, complementa a autora, “todos os professores são incitados a
lidarem com tais dilemas cotidianamente, o que faz com que desejem informações e
argumentos teóricos para fundamentarem seu agir ante a formação moral de seus alunos”
(LONGO, 2008, p. 109). E conclui à frente: “A hipótese inicialmente levantada de que a
formação dos licenciandos no que se refere aos conteúdos específicos da problemática da
ética era insuficiente foi corroborada”. Ou seja, a pesquisa ratificou com dados empíricos que
existe mesmo uma carência de conteúdos filosóficos e psicológicos necessários para que os
futuros professores possam lidar com os dilemas morais recorrentes na prática pedagógica
(LONGO, 2008, p. 124).
O segundo trabalho é de Lins (2003). Com argumentos fundados em prol da ética e da
moral como “pilares de toda atividade educacional” (p. 360), a autora defende que
“questionamentos sobre o agir do educador devem servir de referência para a sua formação,
alguns destes em âmbito universal, relativos a valores essenciais do ser humano, enquanto
outros serão mais específicos, ligados a contextos sócio-culturais” (LINS, 2003, p. 357).
Sendo assim, a autora propõe maiores reflexões sobre a formação moral e ética no na
formação do professor, pois a ética e a moral obrigatoriamente fazem parte de qualquer
processo formativo: “Dizer que se trata de uma formação moral e ética é sustentar que
somente a partir de uma consciência de valores e de comportamentos coerentes a estes haverá
o processo educativo”. (LINS, 2003, p. 360). No decorrer de seu trabalho, a autora apresenta
algumas possibilidades e propostas para a formação ética e moral do professor-educador.
O terceiro trabalho é da mesma autora anteriormente citada, juntamente com outros
colaboradores. Nesse, a discussão recai sobre as dificuldades enfrentadas pelos professores
em decorrência de uma formação inadequada. Lins e colaboradores (2007, p. 257) consideram
que as dificuldades enfrentadas pelos professores no ensino de ética por meio de situações de
sala de aula “podem ser provenientes da ausência de uma formação adequada em seus cursos
de preparação concernente à Educação Moral/Ética”. Tomando-se os resultados de uma
investigação que realiza, complementam:

No que diz respeito aos professores, as observações revelam que eles têm
uma grande dificuldade para lidar com o tema, tanto conceitualmente como
do ponto de vista didático. Parece-nos que eles precisam ter um preparo um
pouco mais adequado no que se refere à introdução de Temas Transversais
simultaneamente aos conteúdos de suas disciplinas, inclusive quanto à Ética,
182

apesar da instituição destes pelos PCN desde 1997. [...] Uma possível
proposta é examinar a possibilidade do retorno de uma disciplina
específica na grade das escolas de preparação para os futuros
professores, sobre o tema de ética e moral. Além disto a Ética deve
continuar a ser trabalhada dentro do conteúdo das demais disciplinas
(LINS et al., 2007, p. 274).

Ao iniciarmos o fechamento desse item, fazemos a ressalva de que os assuntos


referentes à formação de professores são complexos e exigentes de discussões mais amplas
daquelas que aqui apresentamos. No entanto, lembramos aos leitores que os nossos propósitos
não recaem especifica e profundamente a problemas da formação de professores. Mas
também não se ausentam deles, pois, como vimos, os aspectos teóricos de investigações,
como estes que desenvolvemos nesta tese, poderão ser úteis em ações formativas dos
professores. Afinal, como nos diz Marandino (2003, p. 175), “a formação de professores de
ciências não pode prescindir da discussão sobre os temas de pesquisas no campo do Ensino de
Ciências”. Além disso, destacamos que a preocupação com os aspectos de desenvolvimento
moral que estão inseridos nas aulas de Ciências faz parte daquilo que Acevedo (2009a) chama
de “conhecimento didático do conteúdo”. De acordo com o autor, o conhecimento didático
do conteúdo integra as crenças, atitudes, disposições e sentimentos dos professores acerca da
matéria que ensinam e como influem esses aspectos nos conteúdos que selecionam e a
maneira de ensiná-los.
Esteja a relevância no âmbito das disciplinas de conteúdos específicos, no âmbito das
disciplinas pedagógicas ou em ambas, se o ensino de Ciências não dialogar com a Educação
Moral e a Educação Moral não dialogar com o ensino de Ciências, seja em que espaço for (o
melhor seria em todo e qualquer espaço disponível), não vislumbramos avanços.
Distanciamentos e barreiras formadas entre as diversas disciplinas das licenciaturas não
potencializam a formação do professor para o tema.

7.2 - Destaques

• Se levadas em consideração diferentes teorias, de modo geral as relações humanas


preponderantes ainda estão alocadas em níveis baixos de desenvolvimento moral.
• Além de focar conteúdos específicos, o ensino superior também deve se preocupar com
conteúdos de formação moral.
• Não há como desvincular o assunto formação moral das licenciaturas.
183

• Notadamente as disciplinas de Prática de Ensino de Ciências são responsáveis por promover


a articulação entre conteúdos específicos e pedagógicos. Como será que vêm fazendo essa
articulação especificamente em relação aos aspectos teórico-práticos de formação moral?
• Há pesquisas que revelam deficiências nas licenciaturas sobre a formação moral.
• Será que as ementas das licenciaturas trazem elementos que nos indicam a presença de
trabalhos sobre educação moral?
• Será que as ementas das disciplinas de Prática de Ensino ou de Estágio Supervisionado
trazem elementos que indiquem, de forma enfática, ser a formação moral uma efetiva
preocupação no ensino de Ciências?
• Discussões sobre as relações entre formação moral e ensino de Ciências deveriam estar
incluídas no conjunto de problemas que se apresentam nas licenciaturas.
• Se as licenciaturas não exploram as correlações entre formação moral e ensino de Ciências,
uma das hipóteses possíveis é que os professores ficam desamparados em fundamentos,
estratégias e procedimentos para fins de desenvolvimento moral dos alunos.
184

CONCLUSÕES

“Certamente, o melhor que podemos oferecer aos


nossos alunos é a oportunidade e capacidade para
desenvolver a abertura de espírito! Este talvez seja
o imperativo categórico de todos os educadores de
ciência” (ZEIDLER; LEWIS, 2003, p. 259).

Logo na introdução deste trabalho nós nos colocamos como um daqueles que têm
preocupações sobre os aspectos atitudinais e axiológicos no ensino e aprendizagem das
disciplinas científicas. Sob influência dessas preocupações, e orientados especialmente pelas
perspectivas morais encontradas nas teorias de Piaget, Kohlberg e Habermas, propusemos esta
investigação teórica e empírica dos aspectos correlacionais entre aulas de Ciências e
desenvolvimento moral, porque nossas observações preliminares davam conta da
possibilidade desse evento correlativo existir e ainda ser subestimado pelo conjunto de
trabalhos da nossa área (Educação em Ciências). Portanto, haveria possibilidades de
avançarmos nos conhecimentos sobre o assunto.
Ao término deste nosso estudo vimos evidências diversas que confirmam a existência
de contribuições correlativas válidas, plausíveis e viáveis estabelecidas entre elementos do
aporte teórico-prático laico e racional do desenvolvimento moral (e que associamos à
elementos da ética discursiva) e das aulas de Ciências; uma correlação de mutualismo
interfacial que ainda aparece subestimada nas abordagens e discussões de trabalhos nacionais
da área e que merece nossa atenção.
Esse nosso entendimento se dá pelas possibilidades contributivas recíprocas que
levantamos em nossas discussões e análises: contribuições que transitam em via de mão
dupla, ou seja, ao potencializar o desenvolvimento moral dos alunos, as aulas de Ciências
também potencializam a aprendizagem de Ciências e vice-versa (ao potencializar a
aprendizagem de Ciências, por meio de seus diversos pressupostos teórico-práticos que
subjazem a moralidade, o desenvolvimento da autonomia crítica e moral dos alunos também é
potencializado).
Aulas de Ciências contêm componentes teórico-práticos diversos que influenciam o
desenvolvimento moral dos alunos. O desenvolvimento moral contém componentes teórico-
práticos que influenciam a aprendizagem de Ciências. Potencialmente ambos, de modo
concomitante, podem ser beneficiados (figura 12).
185

Figura 12. Interface de contribuições mútuas entre Formação Moral e Aulas de Ciências

Portanto, aulas de Ciências que, por diferentes motivos, não levam em consideração
princípios, conteúdos e procedimentos teórico-práticos do desenvolvimento moral perdem
oportunidades de subsídios potenciais em favor da aprendizagem de Ciências.
Os dados e análises deste nosso estudo evidenciam que aulas de Ciências inseridas em
atmosfera de heteronomia moral são obstáculos tanto para a aprendizagem de Ciências como
para a evolução moral dos alunos. Por outro lado, a atmosfera de autonomia moral amplia as
possibilidades de uma aprendizagem mais consciente e crítica em Ciências, além de favorecer
a autonomia moral e a emancipação dos alunos. Uma consciência crítica e racional que pode
atuar sobre conteúdos e conhecimentos científicos, a fim de melhor entendê-los no seu
processo de construção e diferenciá-lo dos demais tipos de conhecimentos (sem que haja
exclusão antecipada de qualquer tipo de conhecimento que os alunos trazem consigo e nem a
obrigação deles em aceitar esse ou daquele tipo de conhecimento por algum tipo de ação
impositiva externa). Como se vê, esses argumentos não se afastam da relevância dos
conteúdos e conhecimentos científicos.
O conjunto de aspectos que envolvem a autonomia moral e a construção do
pensamento crítico não contém características que fazem aproximar das ideias de ciência
como produto neutro, absoluto, verdadeiro e inquestionável. Na perspectiva do
desenvolvimento moral e da ética discursiva, o ensino memorístico, as avaliações punitivas,
os conteúdos compartimentados e descontextualizados e a aceitação acrítica e (ou) coercitiva
do conhecimento científico em detrimento do senso comum também não são contemplados.
Mesmo que as considerações dos alunos inicialmente estejam distantes do
conhecimento científico, não será em ambiente que reforça a heteronomia moral, como vimos
nos diferentes exercícios anteriores, que mudanças ocorrerão. Por outro lado, em ambiente de
autonomia moral, com preponderância de diálogo, cooperação e busca compartilhada de um
senso crítico racional, haverá favorecimentos aos alunos nas suas tomadas de decisão. Sem
186

laissez-faire, sem coação, sem imposição, seja explícita ou velada, pois as opções de escolha
sempre estarão – e assim deverão permanecer – com os alunos. O exercício da consciência
crítica e racional permite ao aluno um melhor entendimento sobre o processo de construção
do conhecimento científico, auxiliando-o na comparação e diferenciação dos demais tipos de
conhecimentos e, portanto, nas suas escolhas. Atividade crítica que deve permear desde o
interior da ciência até o seu ensino e aprendizagem, pois auxilia a compreensão da ciência. A
busca da consciência crítica e racional, nesse caso, tende a jogar a favor da compreensão do
conhecimento científico.
No ambiente de heteronomia moral, a ciência tende a ser trabalhada como dogma.
Mesmo ao se trabalhar a ciência como processo, a forma heterônoma contrapõe-se, torna-se
incoerente, ou seja, obstaculiza a aprendizagem. Torna-se conhecimento fragilizado: conteúdo
e discurso não se completam. Entram em choque na interação. Como podemos falar, por
exemplo, que a ciência é processo humano por meio de uma fala restritiva e coercitiva? Num
ambiente de heteronomia moral, até mesmo o ensino da ciência em abordagens CTSA
encontra obstáculos, por causa das incoerências entre conteúdo e discurso.
Aulas de Ciências em perspectiva de heteronomia moral resultam em aprendizagem
não significativa, não consistente. O estímulo ao desenvolvimento moral oferece
potencialidades mais consistentes para a compreensão de conteúdos e conhecimentos
científicos, porque a atmosfera de autonomia estimula níveis mais elevados de raciocínio
crítico, moral e emancipatório. Em ambiente no qual a autonomia moral é buscada, o sujeito
escolhe sua opção não por medo de castigo ou para obedecer ao adulto ou ao outro. Além
disso, haverá maiores probabilidades de escolher a melhor opção. Entende-se a opção
científica como processo humano. Diferencia-se a opção científica das verdades dogmáticas.
Ao aceitá-lo, saber-se-á isso.
Na interface entre aspectos teórico-práticos do desenvolvimento moral e das aulas de
Ciências há uma dimensão diferente daquela que se apresenta em outras teorias de formação
moral. Por exemplo, em alguns pontos da formação moral criticados por Piaget, como no caso
da disciplina e adesão do grupo às regras sociais por meio de aceitação unilateral
(perspectivas teóricas de Durkheim). Trocando-se o elemento “sociedade” pelo elemento
“ciência”, teríamos nesse exercício uma situação teórica similar de disciplina e adesão dos
alunos aos conteúdos e conhecimentos científicos por meio de aceitação unilateral, ou seja,
sem mobilização de criticidade.
As aulas de Ciências na escola básica não são para formar cientistas, mas para compor
uma formação que tem caráter geral em que conteúdos e conhecimentos científicos são
187

utilizados para aprender e refletir sobre os seus graus de criticidade no processo de


construção, oportunizando a criticidade perante todos os tipos de conhecimento. Dito de outra
forma, as aulas de Ciências integram um meio formativo relevante para o aluno aprender a
pensar com crescente grau de criticidade - uma das características do conhecimento científico.
As ideias que apresentamos se encaixam nestas três situações: i) Para alunos que farão
ciência (futuros cientistas): auxílio em tomadas de decisões sobre as atividades e práticas
científicas; ii) Para alunos que não farão ciência: auxílio no entendimento, compreensão e
atuação cidadã em tomadas de decisões que envolvem o conhecimento científico; iii) Para
alunos que atuarão no ensino de Ciências: auxílio na formação de professores mais
preocupados e atentos aos aspectos éticos e morais envolvidos na área.
Existem trabalhos da área que denotam preocupações subjacentes à moral e à ética.
Contudo, observamos no material analisado uma carência de dados, análises e argumentos
teoricamente balizados e aprofundados a correlacionar aulas de Ciências e desenvolvimento
moral. Encontramos diferentes trabalhos que chegam a mencionar a relevância das aulas de
Ciências para a formação ética e moral ou, ainda, para a formação integral do aluno
(contemplando aspectos para além dos conteúdos específicos da matéria), mas sem
aprofundamentos referenciados que explicitassem essa relevância. Entendemos que esses
trabalhos ganham possibilidades de lastro com o conjunto de argumentos que aqui
expusemos. Nesse caso, possíveis explicações retóricas ou tautológicas perdem espaço para
argumentos referenciados. Ou, ainda, ganham reforço e consistência aqueles trabalhos que
apresentam referências diversas (por exemplo, referências de interlocutores que denotam
preocupações ou argumentam sobre o tema, mas que não apresentam trabalhos teóricos ou
empíricos sobre formação moral).
Entendemos que formação moral é tema que merece um número maior de
investigações na área de Educação em Ciências. A ausência de pesquisas não pode ser
imputada à falta de necessidades ou de aspectos correlacionais entre educação moral e ensino
de Ciências e nem por falta de aportes teóricos capazes de tratar sobre o assunto. Os nossos
argumentos inserem-se nessa temática pelo viés teórico do desenvolvimento moral, mas não
conseguem preencher todas as lacunas. Lacunas que podem esconder subsídios relevantes
para a área de Educação em Ciências. A trajetória que seguimos, ao trazer Piaget, Kohlberg e
Habermas (centralidade na autonomia moral e bases em normas e regras) para junto dos
processos de ensino e aprendizagem de Ciências, não consegue dar conta da complexidade do
tema, mas, no mínimo, insere novos elementos de reflexão e de possibilidades sobre os
processos interativos entre o raciocínio moral, o pensamento crítico e o pensamento científico
188

que compõem a estrutura de aprendizagem dessa matéria escolar. Por outro lado, ressaltamos
que este trabalho não traz problemas já totalmente resolvidos pela área. Ainda que no pano de
fundo apareçam exemplos ou exercícios que contemplem problemas que as pesquisas já
tratam em difusão (natureza da ciência, assuntos sociocientíficos controvertidos, CTSA, entre
outros), acreditamos que a inserção de componentes da ética discursiva e do desenvolvimento
moral retoma e consolida pontos relevantes sobre o processo de formação intelectual e moral
dos alunos em aulas de Ciências.
Antes de finalizarmos, apresentamos as seguintes informações complementares, a fim
de dirimir possíveis dúvidas dos leitores sobre os nossos propósitos e (ou) ideias subjacentes
com esta tese: i) ideias não desvinculadas das preocupações com os conteúdos das aulas de
Ciências; ii) nenhuma proposta de fazer outra defesa a não ser da racionalidade da ciência e
da relevância dos conhecimentos científicos; iii) se a educação moral é um processo inevitável
em sala de aula, defesa de uma educação moral em prol da aprendizagem de Ciências,
teoricamente embasada em princípios racionais, laicos e de emancipação; iv) discussões e
argumentos com foco especial na psicologia do desenvolvimento humano, que podem se
alinhar às contribuições trazidas pela História e Filosofia da Ciência; v) o conceito de
“verdade” que aparece ao longo do texto não é unívoco e deve ser compreendido nos
contextos dos respectivos autores e (ou) argumentos apresentados; v) as perspectivas teóricas
aqui defendidas não se prestam a pretensões de gerar soluções simplistas e nem prescrições
(não pode ser entendido como impossibilidades de aplicação educacional no cotidiano das
aulas, mas aí já entraríamos numa outra dimensão que, por opção, nos ausentamos neste
trabalho); vi) ao contemplar perspectivas com bases racionais, o nosso estudo distancia-se das
respectivas disfunções biológicas ou anomalias patológicas de comportamento e
personalidade.
Por fim, este é um trabalho inserido num plano de preocupação atitudinal e axiológica
(o desenvolvimento moral) que envolve aulas de Ciências (cognição e conteúdo de matéria
específica). A intenção do cenário que construímos é de enriquecimento, pois acrescenta em
favor da consistência do ensino de Ciências em ideais de um processo educacional voltado
para a paz, a verdade, a justiça, a solidariedade, a esperança e ao espírito democrático.
Especialmente encontramos na educação em Ciências um papel relevante quanto a essas
possibilidades. Além disso, somos levados a pensar se tudo o que discutimos neste trabalho
também não implica diretamente (no mínimo, subjaz) um outro contexto escolar ampliado e
atual a envolver manifestações de bulling, de desprezos dos alunos pelas matérias de ensino,
de sentimentos negativos à instituição escolar etc.
189

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204

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA E COMENTADA

A lista a seguir contempla obras consultadas no decorrer deste nosso trabalho. Apesar
de não constarem de citações ou menções no corpo do texto, a leitura crítica destas obras
também serviu de relevante suporte e orientação para a construção de um panorama sobre a
temática que desenvolvemos. Nelas encontramos autores que defendem perspectivas teórico-
práticas diversas sobre a moral. Algumas estão embasadas em pressupostos que convergem
com os nossos referenciais, mas outras se apresentam com diferentes graus de divergência.
Após os dados referenciais de cada uma delas, compartilhamos com o leitor uma breve
abordagem de seus aspectos gerais ou daqueles de interesse para o nosso trabalho.

ACEVEDO, J. A.; VÁSQUEZ, A.; MARTÍN, M.; OLIVA, J. M.; ACEVEDO, P.; PAIXÃO, M. F.;
MANASSERO, M. A. Naturaleza de la ciencia para la participación ciudadana: una revisión crítica. Revista
Eureka sobre Enseñanza y Divulgación de las Ciencias, Cádiz, v. 2, n. 2, p. 121-140, 2005. (Os autores são de
instituições educacionais e de centros de investigação da Espanha e Portugal. A abordagem segue a linha CTSA,
enfatizando-se as contribuições que o ensino de ciências podem trazer para as tomadas de decisão no meio
social, cujas necessidades formativas inserem aspectos de educação moral - desenvolvimento do raciocínio
moral).

ADINOLFI, V. T. S. Discurso científico, poder e verdade. Revista Aulas, Campinas, n. 3, mar. 2007. (A autora
discute os aspectos de poder envolvidos no discurso científico, especialmente quando produzem sentidos de
verdade e, ainda, quando apagam os sinais de história. Bases teóricas que serviram de referenciais: Foucault,
Orlandi, Possenti e Boaventura Santos).

AMORIM NETO, R. C.; ROSITO, M. M. B. Freire, Dussel e Kohlberg: da vulnerabilidade à autonomia.


Contrapontos, Itajaí, v. 7, n. 3, p. 615-627, 2007. (Os autores articulam e buscam pontos de contato entre as
teorias de Freire, Dussel e Kohlberg nas reflexões que fazem sobre algumas das questões de educação moral a
envolver os conceitos de autonomia e vulnerabilidade).

APEL, K.-O. Estudos de moral moderna. Petrópolis, RJ: Vozes, 1994. (Obra de um dos autores mais conhecidos
sobre a temática da moral. Neste livro estão reunidos cinco estudos sobre a fundamentação filosófica da ética. A
ressaltar a explicação dada sobre o problema da racionalidade ética, sobre o desenvolvimento moral e os
aspectos éticos discursivos).

ARAÚJO, U. F.; PUIG, J. M.; ARANTES, V. (Org.). Educação e valores: pontos e contrapontos. São Paulo:
Summus, 2007. (Cada autor tece argumentos sobre o tema e, posteriormente, dialogam e trocam
questionamentos sobre os seus pontos de vista).

ARROYO, M. G. A função social do ensino de ciências. Em Aberto, Brasília, ano 7, n. 40, p. 3-11, out./dez.
1988. (O artigo discute os aspectos dicotômicos entre ciência-técnica e cultura e o reducionismo prejudicial
apresentado pelo ensino de ciências sobre a produção do conhecimento científico).

ARTETA, J.; CHONA, G.; FONSECA, G.; IBÁÑEZ, X. MARTÍNEZ, S. La clase de ciencias y la formación en
valores. Enseñanza de las Ciencias, Barcelona, número extra, p. 1-5, 2005. (O artigo apresenta um relato de
pesquisa, do tipo estudo de caso, sobre os valores universais e específicos do ensino de ciências que se
promovem em sala de aula, de acordo com os próprios professores. Nesta pesquisa, estudos de Adela Cortela
serviram como referenciais para as análises, cujas conclusões corroboram o relevante espaço que o ensino de
ciências representa para a educação moral).

AZEVEDO, N. A. P. R. Atmosfera moral da escola: condições para a promoção do desenvolvimento ético.


2004. 486 f. Tese (Doutorado em Educação e Desenvolvimento) - Faculdade de Ciências e Tecnologia,
Universidade Nova de Lisboa, Lisboa, 2004. (Com base nos conceitos de atmosfera moral, comunidade justa e
205

escola ética, a autora desenvolve sua tese orientada pela seguinte questão: Como é que a escola proporciona
condições para esse desenvolvimento?)

BANDURA, A. Social cognitive theory of moral thought and action. In: KURTINES, W. M.; GEWIRTZ (Eds.).
Handbook of moral behavior and development. Hillsdale, NJ: Erlbaum, 1991. p. 45-103. (O conhecido autor
argumenta sobre mecanismos de auto-regulação com possibilidades de integrar pensamento e ação moral).

BARBA, B. Razonamiento moral de principios en estudiantes de secundaria y de bachillerato. Revista Mexicana


de Investigación Educativa, México, DF, v. 6, n. 13, p. 501-523, set-dez. 2001. (O autor apresenta resultados de
avaliação do desenvolvimento de moral em estudantes universitários e de ensino médio do México).

BARBA, B. Educación y valores: una búsqueda para reconstruir la convivencia. Revista Mexicana de
Investigación Educativa, México, DF, v. 10, n. 24, p. 9-14, 2005. (O autor - professor e investigador da
Universidade Autônoma de Aguascalientes, México - apresenta argumentos em prol das preocupações
pedagógicas atuais a envolver a educação de valores na escola e a necessidade de ampliar as investigações sobre
essa temática. Ressalta, ainda, no decorrer de seu texto, que os mesmos aspectos de valores e de ideologia que
estão presentes no ensino também estão presentes na investigação).

BARROSO, J. H. La educación moral condorcetiana. Revista Fuentes, Sevilla, n. 7, 2006. (Apresentam-se


algumas análises críticas sobre os escritos do Marquês de Condorcet acerca da educação moral - fundada em
empirismo racional que combina sensibilidade e racionalidade).

BENNATO, M. A.; ORAISÓN, N. M. La intervención ético-pedagógica en la formación docente: una propuesta


para su tematización y aplicación. Comunicaciones Científicas y Tecnológicas, Universidad Nacional del
Nordeste (Argentina), 2003. (As autoras destacam a relevância de intervenções pedagógicas que impliquem a
educação moral e apresentam resultados de pesquisa que demonstram aspectos favoráveis sobre essa
possibilidade).

BERKOWITZ, M. W. Educar la persona moral en su totalidad. Revista Iberoamericana de Educación, Madrid,


n. 8., p. 73-101, 1995. (O autor, com atuação na docência de Psicologia e na direção do Centro de Estudos Éticos
da Universidade de Marquette, Estados Unidos, colaborou em diferentes trabalhos junto a Kohlberg e Power.
Diante das necessidades e exigências que cercam a educação moral, Berkowitz questiona sobre as rivalidades
entre as diversas teorias que equivocadamente aparecem no meio científico. Segundo o autor, essa não deveria
ser a questão principal, pois cada uma das teorias traz suas contribuições que se somam no tratamento de uma
temática complexa. Nenhuma delas dará conta sozinha de esgotamento, pois são diferentes modelos que não se
apresentam, em nenhum dos casos, num modelo globalizador. Nessa linha de argumentos, o texto ainda resgata
pontos e contrapontos entre os posicionamentos que subjazem algumas das teorias sobre moralidade).

BERNET, J. T. Educación y valores controvertidos: elementos para un planteamiento normativo sobre la


neutralidad en las instituiciones educativas. Revista Iberoamericana de Educación, Madrid, n. 7, p. 93-120,
1995. (Discute-se sobre a neutralidade perante os assuntos controvertidos em aula e o respectivo posicionamento
do professor. Não se defende diretamente a neutralidade do professor, mas que este se decida previamente com
objetivos morais).

BIAGGIO, A. M. B. Kohlberg e a “comunidade justa”: promovendo o senso ético e a cidadania na escola.


Psicologia: Reflexão e Crítica, Porto Alegre, v. 10, n. 1, p. 47-69, 1997. (A autora descreve a experiência de
Kohlberg, denominada de “comunidade justa”, aplicada de forma especial na Escola Cluster e, ao mesmo tempo,
discute-se as possibilidades de programas desse tipo no Brasil).

BIAGGIO, A. M. B. Universalismo versus relativismo no julgamento moral. Psicologia: Reflexão e Crítica,


Porto Alegre, v. 12, n. 1, p. 5-20, 1999. (Angela Biaggio foi uma das maiores difusoras dos trabalhos de
Kohlberg no Brasil. Neste artigo, a autora analisa alguns estudos sobre o julgamento, especialmente quanto às
questões controvertidas entre universalismo e relativismo. Posicionamentos e críticas de Rest, Lourenço,
Eckensberger e Sarey são levantados sobre essa temática).

BIAGGIO, A. M. B.; VARGAS, G. A. O.; MONTEIRO, J. K.; SOUZA, L. K.; TESCHE, S. L. Promoção de
atitudes ambientais favoráveis através de debates de dilemas ecológicos. Estudos de Psicologia, Natal, v. 4, n. 2,
p. 221-238, 1999. (Os autores relatam uma pesquisa na qual propuseram, por meio de uma intervenção educativa
com base em debates, promover atitudes ambientais favoráveis em adolescentes. Os resultados finais
demonstram que a técnica teve eficácia somente para os ativos participantes nas discussões implementadas).
206

BOAVIDA, J.; SANCHES, M. D. F. Educación, ética y posmodernidad. Educación XX1, Madrid (Revista de la
Faculdad de Educación), n. 4, p. 167-187, 2002. (Os autores apresentam argumentos e reflexões sobre a prática
educativa nas necessidades cada vez mais complexas ante a crise social contemporânea, não se descartando o
relevante papel que o desenvolvimento moral tem para a busca da emancipação dos sujeitos. Na discussão, os
autores resgatam e discutem diferentes teorias ou posicionamentos de autores como Kant, Piaget, Kohlberg,
Lipovetsky, Lyotard, Cortina e Habermas).

BOTERO, P. A.; GARZÓN, S. M.; OSTOS, D.; RAMIREZ, A. Desarrollo moral en la infancia: aspectos
básicos. Biblioteca Virtual, Artículos Educativa & Desarrollo (Associación Colombiana para el Avance de las
Ciencias del Comportamiento, 2003. Disponível em: <http://www.abacolombia.org.co>. (Assim como em vários
outros estudos, as autoras desse artigo explicitam as teorias de Piaget e Kohlberg sobre o desenvolvimento
moral).

BRANCO, M. L. A construção da autonomia moral: o contributo da teoria do desenvolvimento do ego de Jane


Loevinger. Paidéia, Ribeirão Preto, v. 13, n. 25, 2003. (A autora comenta a teoria de Loevinger, que combina as
abordagens cognitivo-desenvolvimentista e psicanalítica, propondo “o entendimento da autonomia moral como
resultado de uma dialética” oriunda dessa “separação-indução”. No decorrer do texto, resgatam-se, ainda, as
teorias de Piaget e Kohlberg e apresenta-se a teoria de Loevinger como um passo além dessas).

BUSCATO, M. De onde vem nossa moral. Revista Época, Rio de Janeiro, Editora Globo, edição 499, 10 dez.
2007. (A jornalista apresenta estudos de alguns neurocientistas que investigam a origem da moral, cujos
resultados sugerem um senso de moral inato e instintivo nos seres humanos. A seguir, destacamos o trecho final
dessa matéria:“Mas, se os seres humanos vêm “equipados de fábrica” com um senso moral, por que não
vivemos num mundo perfeito, em que todos fazem o bem uns aos outros? O pesquisador Marc Hauser, da
Universidade Harvard, responde com um conceito emprestado do estudo da linguagem, desenvolvido pelo
americano Noam Chomsky. A tese de Chomsky é que todos os seres humanos nascem sabendo as estruturas
fundamentais da linguagem, que seriam comuns a todas as línguas. Mas o idioma que cada um falará dependerá
do ambiente e da cultura onde cresceu. Segundo Hauser, o mesmo ocorreria com a moral. Todos os seres
humanos nascem com esse senso codificado em seu cérebro. A estrutura seria a mesma. Mas sua interpretação
mudaria de acordo com os valores do ambiente. A ciência começa a nos mostrar de onde vem a moral. Mas isso
não nos exime da responsabilidade de ensiná-la, praticá-la e vigiar os que se desviam dela”).

BUSCATO, M. A moral serve como guia intuitivo da ação. Revista Época, Rio de Janeiro, Editora Globo,
edição 499, 10 dez. 2007. (A jornalista entrevista o psicólogo americano Joshua Greene, cujas descobertas
apontam para um senso moral inato nos seres humanos).

CABANILLAS, P. O. El problema del sujeto de la educación. Educación, San Marcos (Universidad Nacional
Mayor de San Marcos), ano 1, n. 1, p. 31-41, maio 2004. (O artigo refere-se à atividade docente frente aos
inúmeros problemas, especialmente de conduta e compromissos morais que se relacionam à natureza do sujeito.
Nos argumentos, aparecem, por exemplo, uma contextualização/explicitação dessa natureza do sujeito em áreas
da neurociência e das ciências naturais).

CALDEIRA, E. O indivíduo na cultura produtiva: repensando a dimensão ética/educativa no contexto do


trabalho. Educação, Porto Alegre, ano XXVII, v. 52, n. 1, jan./abr. 2004. (A autora é docente do Programa de
Pós-Graduação da Univali. O seu artigo aponta as dificuldades de valorização das identidades pessoal e
profissional do sujeito, encontrando-se em Kohlberg, Heller, Piaget, Vigotski, Dewey, Habermas e Resende
relevantes aportes teóricos sobre competências elegidas como essenciais à sobrevivência pessoal e
organizacional).

CAMARENA, M. T. Y. Sujeto de la eticidad y formación valoral. Educar - Revista de Educación, México, n. 4,


jan.-mar., 1998. (O texto comenta sobre o interesse do México no incremento da educação moral e traz reflexões
sobre as perspectivas futuras do educando no seu papel frente à sobrevivência da condição humana).

CANASTRA, F. Uma abordagem narrativa da experiência moral: o relato de uma experiência, em contexto de
formação inicial de professores. Revista Iberoamericana de Educación, Madrid, 2002. Disponível em:
<http://www.rieoei.org/experiencias33.htm>. Acesso em: 15 mar. 2007. (O autor reitera algumas críticas às
teorias de Kohlberg e apresenta na abordagem narrativa um novo enfoque no campo do desenvolvimento moral).
207

CHEDIAK, K. A. Implicações filosóficas do evolucionismo para a compreensão da moral. In: MARTINS, R. A.


et al. (Eds.). Filosofia e história da ciência no Cone Sul: 3º encontro. Campinas: AFHIC, 2004. p. 267-273. (A
autora trata sobre a relação filosófica entre moral e evolução. Argumenta que essa relação não implica a negação
do indeterminismo e nem a negação da fundamentação da racionalidade para a moral: “considerar que há para a
moral uma dimensão teórica não nega necessariamente a tese do evolucionismo. [...] Na verdade, a concepção
evolucionista da moral talvez possa cooperar para superação filosófica da oposição entre racionalismo e
empirismo e a correspondente oposição entre razão e sentimento”).

CONDE, S. L. La formación de sujetos con una moral democrática. Educar - Revista de Educación, México, n.
4, jan.-mar., 1998. (A autora discute o papel da escola na formação de uma moral que chama de democrática,
utilizando-se de princípios teóricos extraídos de diferentes autores, incluindo Piaget, Kohlberg, Puig e Turiem).

CONDORCET, J. -A. -N. C. Cinco memórias sobre a instrução pública. Tradução de Maria das Graças de
Souza. São Paulo: Editora Unesp, 2008. (Obra clássica deste autor iluminista, na qual aponta suas visões e
propostas teóricas para a instrução pública, a destacar a quinta memória intitulada “Sobre a instrução relativa às
ciências”).

CORRIGAN, D.; DILLON, J.; GUNSTONE, R. (Eds.). The re-emergende of values in Science Education.
Roterdã, Holanda: Sense Publishers, 2007. 277p. [ISBN: 90-8790-035-x] (Livro composto por uma coletânea de
17 trabalhos que, direta ou indiretamente, abordam questões sobre valores no ensino de Ciências, demonstrando
a relevância da temática na área).

CORTINA, A. La educación del hombre y del ciudadano. Revista Iberoamenricana de Educación, Madrid, n. 7,
p. 41-63, jan./abr. 1995. Disponível em: <http://www.rieoei.org/oeivirt/rie07.htm> (A conhecida autora discute e
tece severas críticas sobre as formas que os fundamentos teóricos foram utilizados pelas constituições de países
de língua hispânica, notadamente em relação aos conceitos de justiça. No final de seu artigo, Adela Cortina
conclui: “La educación del hombre y del ciudadano ha de tener en cuenta, por tanto, la dimensión comunitaria
de las personas, su proyecto personal, y también su capacidad de universalización, que debe ser dialógicamente
ejercida, habida cuenta de que muestra saberse responsable de la realidad, sobre todo de la realidad social,
aquel que tiene la capacidad de tomar a cualquier otra persona como un fin, y no simplemente como un medio,
como un interlocutor con quien construir el mejor mundo posible”).

CORTINA, A. La dimensión pública de las éticas aplicadas. Revista Iberoamericana de Educación, Madrid, n.
29, p. 45-64, 2002. (A autora discute qual deve ser o papel das éticas aplicadas no processo de decisão da esfera
pública. Para isso, analisa criticamente diferentes teorias sobre educação moral).

DESSANDRE, S. A. B. A educação moral possível: o conflito como estratégia para a autonomia. 2003. 123f.
Dissertação (Mestrado em Psicologia) - Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro,
2004. (No capítulo 2 de sua dissertação, a autora discute a formação moral nas escolas, revisando brevemente os
diferentes pressupostos e princípios da educação moral trazidos pela literatura da área - “socialização”;
“clarificação de valores”; “desenvolvimento”; “formação de hábitos virtuosos”; “construção da personalidade
moral”).

DIAS, A. A. Educação moral e autonomia na educação infantil: o que pensam os professores. Psicologia:
Reflexão e Crítica, Porto Alegre, v. 18, n. 3, p. 370-380, 2005. (A autora analisa concepções de autonomia na
educação moral de professores, com resultados que demonstram necessidades acerca de fundamentações teóricas
para as ideias ou práticas vigentes).

DIAS, F. C. Durkheim e a sociologia dá educação no Brasil. Em Aberto, Brasília, ano 9, n. 46, p. 33-48, 1990.
(O autor resgata os pensamentos de Durkheim e suas influências na trajetória educacional brasileira. Entre as
obras mencionadas e analisadas nesse trabalho está “A Educação Moral” que, segundo o autor, teve peso menor
que outras obras de Durkheim no Brasil).

DIAS, M. G. B. B.; SALTZSTEIN, H. D.; MILLERY, M. Raciocínio moral em interação social: um estudo
sobre sugestionabilidade. Estudos de Psicologia, v. 4, n. 2, p. 199-219, 1999. (Os autores relatam uma pesquisa
realizada ao mesmo tempo em Recife e Nova Iorque com crianças de seis a doze anos, buscando-se por meio de
histórias com dilemas a sugestionabilidade deles).

DURKHEIM, É. L’évolution pédagogique em France. Québec: Bibliothèque Paul-Émile Boulet de l’Université


du Québec à Chicoutini, 2002. (Edição eletrônica do livro original póstumo de 1938. De todo o conteúdo da
208

obra, o nosso interesse voltou-se especialmente para o capítulo XIII, “Conclusion (suite et fin) l’enseignement de
la nature les sciences”. De acordo com Durkheim, o ensino de ciências tem seu papel de subsidiar a educação
moral. Essa ideia de Durkheim tem bases positivistas que preponderavam à época).

DUSKA, R. WHELAN, M. O desenvolvimento moral na idade evolutiva: um guia a Piaget e Kohlberg. São
Paulo: Loyola, 1994. (Os autores expõem, em linguagem simplificada, as teorias de desenvolvimento moral de
Piaget e Kohlberg. Obra de interesse para quem quer compreender os trabalhos de ambos).

ECHEVERRÍA, J. Filosofía de la ciencia. Madrid: AKAL, 1995. 215 p. (Livro clássico do conhecido filósofo
espanhol. Apresenta e discute diferentes aspectos sobre a ciência e a atividade científica, incluindo capítulos de
interesse ao nosso tema: capítulo III - “Ciência e valores” e capítulo IV - “O pluralismo axiológico da ciência”).

ERAZO, E. D. Contexto de crisis de sentido y su relación con el desarrollo moral en la escuela colombiana.
Revista Latinoamericana de Ciencias Sociales, Niñez y Juventud, Manizales, v. 2, n. 2, 2004. (Diante da
potencialidade da escola em dinamizar processos de desenvolvimento moral, e respaldando-se em referenciais
sobre a temática, o autor enfatiza as necessidades de implementações de projetos pedagógicos que coadunem o
desenvolvimento da autonomia e a sensibilidade moral dos alunos colombianos).

ESCRIVÁ, M. V. M.; PÉREZ-DELGADO, E.; VILAR, M. M.; PORCAR, A. M. Instrumentos para medir la
cognición y el afecto em el desarrollo moral: adaptación en el población española. In: CONGRESO
IBEROAMERICANO DE PSICOLOGÍA, 2., 1998, Madrid. Libro de resúmenes y trabajos completos, Madrid:
Colégio Oficial de Psicólogos, 1998. (Os autores utilizam e analisam instrumentos - Definning Issues Test e
Interpersonal Reactivity Index - para medir a cognição e a afetividade no desenvolvimento moral em população
espanhola).

FAIGENBAUM, G.; CASTORINA, J. A.; HELMAN, M.; CLEMENTE, F. El enfoque piagetiano en la


investigación del juicio moral: alternativas frente al naturalismo y al relativismo. In: CASTORINA, J. A. (Org.)
et al. Cultura y conocimientos sociales: desafíos a la psicología del desarrollo. Buenos Aires: Aique Educación
Grupo Editor, 2007. p. 89 - 116. (ISBN 978-987-06-0096-1). (Os autores criticam pesquisas que abordam
trabalhos de Piaget sem os devidos cuidados teóricos ou de forma superficial. Também defendem os trabalhos de
Piaget contra críticas sem consistências).

FÁVERO, A. M. Por uma pedagogia da autonomia moral: as conexões entre as teorias da moralidade de
Piaget e Habermas. 2005. 154f. Dissertação (Mestrado em Educação) - Universidade Federal do Rio Grande do
Sul, Porto Alegre, 2005. (O estudo aborda as possibilidades práticas da educação moral na pedagogia
contemporânea, baseando-se no entrelace teórico de Piaget e Habermas, especialmente quanto ao
desenvolvimento da consciência moral, a estrutura comunicativa do desenvolvimento moral e a educação moral).

FERNANDES, J. V. Saberes, competências, valores e afectos necessários ao bom desempenho profissional do/a
professor/a. Lisboa: Plátano, 2001. (O autor é sociólogo e educador, com atuação na formação de professores. A
obra trata da educação axiológica na escola, tendo-se a emancipação como princípio e os paradigmas
interculturais e da complexidade como referenciais. De acordo com o autor, o desenvolvimento moral na escola
deve ser integrado e articulado entre as dimensões cognitiva, afetiva e axiológica).

FERNANDEZ, A. Inteligência moral: mente, cérebro e o Direito. Jus Navigandi, Teresina, ano 9, n. 803, 14 set.
2005. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/ texto.asp?id=7294>. (O autor é pós-doutorado em Teoria
Social, Ética e Economia. Discutem-se os aspectos da neurociência no caso das discussões morais e as
respectivas implicações vinculadas ao problema de interpretação e aplicação do Direito. Os argumentos e
reflexões apresentados são referenciados, entre outros, por autores como Joshua Greene e Jorge Moll).

FERNANDEZ, A. C.; ESCANDELL, M. C. Contra el mito de la neutralidad de la ciencia: el papel de la historia.


Enseñanza de las Ciencias, Barcelona, v. 4, n. 2, p. 163-166, 1986. (Os autores seguem a linha de outros
pesquisadores que questionam o papel do ensino de ciências frente à transmissão de uma visão deformada para a
construção conceitual de ciência. Nesse caso, subsídios podem ser encontrados na história e na formação de uma
consciência crítica atrelada aos valores subjacentes à educação).

FERREIRA, S. D. O construtivismo na teoria da justiça como eqüidade de John Rawls. 2005. 98f. Dissertação
(Mestrado em Filosofia Transcendental e hermenêutica) - Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria,
RS, 2005. (Aborda o modelo filosófico de argumentação, com foco na moralidade, daquilo que Rawls chama de
209

construtivismo kantiano. Capítulos desse trabalho trazem, por exemplo, reflexões sobre “construtivismo moral” e
“construtivismo na teoria da justiça”).

FONSECA, L. C. S. Religião popular: o que a escola pública tem a ver com isso? - pistas para repensar o ensino
de Ciências. 2005, 246 f. Dissertação (Educação)- Universidade Federal do Rio de Janeiro, Niterói, 2005.
(Abordagens sobre as tensões entre ciência e religião.com enfoques específicos dados ao evolucionismo e
criacionismo e propostas para superação desse conflito por meio da dialogicidade. A autora utiliza autores
diversos para fundamentar seus argumentos, entre eles, Morin).

GARRITZ, A. Naturaleza de la ciencia e indagación: cuetiones fundamentales para la educación científica del
ciudadano. Revista Iberoamericana de Educación, Madrid, n. 42, p. 127-152, 2006. (Diante de diversos
questionamentos e ceticismos que cercam a educação científica voltada para a cidadania, o autor propõe uma
maneira de incorporar nos livros didáticos o desenvolvimento da compreensão da natureza da ciência).

GOERGEN, P. Educação moral: cenários, perspectivas e perplexidades. Educação & Sociedade, Campinas, v.
28, n. 100, p. 737-762, 2007. (O autor aprofunda o debate sobre moral, defendendo a tese de que a educação
moral não deve centrar-se na “disciplinarização”, mas na “formação dialógica do sujeito moral”, tendo-se a
justiça como o princípio de regulação).

GONÇALVES, M. A. S. Identidade do Eu, consciência moral e estágios do desenvolvimento: perspectivas para


a educação. Psicologia da Educação, São Paulo, n. 19, p. 73-89, 2004. (A autora relaciona o conceito de
formação da identidade do Eu com teorias do desenvolvimento moral. Nesse caso, defende-se que “conhecer as
possibilidades e os limites do desenvolvimento e da formação moral pode auxiliar o professor a lidar com os
conflitos que surgem na escola, de forma a possibilitar ao aluno a construção de identidade moral em nível pós-
convencional”).

GONÇALVES, M. A. S.; PIOVESAN, O. M.; PRESTES, L. F.; LINK, A. Ações educativas e formação ética no
ensino fundamental. In: CONGRESSO LUSO-AFRO-BRASILEIRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS, 8., Coimbra, A
questão social no novo milênio, Coimbra: Centro de Estudos Sociais, 2004. (De acordo com os autores deste
trabalho, a escola enfrenta problemas graves em relação aos valores. Questionam o que fazer. Como
contribuição, trazem reflexões sobre as possibilidades de se introduzir a formação ética no currículo escolar, com
bases na construção da autonomia moral, cooperação, respeito mútuo e responsabilidade).

GORE, J. Reconsideración de la enseñanza de valores: el papel de la educación cívica. In: CONFERENCIA


DEL CONSORCIO CÍRCULO DEL PACÍFICO, 22., 2000, México. La educación para el siglo XXI... México:
ANUIES, 2000. p. 105-116. (Coleción Biblioteca de la Educación Superior - Série Memórias). (O autor é diretor
geral do Departamento de Educação e Capacitação de Nueva Gales del Sur, Austrália. Apresenta, como ele
próprio diz, uma classificação em três tipos de valores, relacionando-os ao comportamento, aos procedimentos e
substantivos. Dentro dessas categorias, desenvolve suas reflexões sobre a temática. Tece críticas aos trabalhos de
Kohlberg, porque não proporciona um panorama completo do desenvolvimento moral. Nesse caso, talvez o autor
tenha a ideia de que alguma teoria algum dia conseguirá tal intento).

GRANERO, M. C. Educación, filosofía y diálogo: el programa de filosofía para niños de Matthew Lipman.
Apuntes Filosóficos, Caracas, v. 15, n. 28, 2008. (A autora discute a obra de Lipman, que defende a relevância da
filosofia como uma disciplina dinâmica na educação para o desenvolvimento da consciência crítica, baseada no
diálogo, reflexões sobre valores, contra a doutrinação, numa linha de similitudes com princípios teóricos de
Piaget, Kohlberg e Habermas).

GRIESSE, M. A. Ética empresarial e responsabilidade social corporativa à luz da teoria de julgamento moral, de
Lawrence Kohlberg. Impulso, Piracicaba, v. 14, n. 35, p.33-48. (A autora, que é PhD em Educação pela
Universidade de Frankfurt, trata sobre as relações entre ética e ciências econômicas. Apesar do enfoque voltado
para a área empresarial, há argumentações interessantes que inserem os subsídios dados pela teoria de Kohlberg
acerca da responsabilidade social apoiada nos seus princípios éticos universais).

GUIMARÃES, M. A.; CARVALHO, W. L. P. Contribuições do ensino de ciências para o desenvolvimento


moral. Educação Unisinos, São Peopoldo, v. 13, n. 2, p. 162-168, 2009. (Com ênfase na resolução de dilemas
sociocientíficos, e utilizando-se de perspectivas teóricas de Piaget e Kohlberg, os autores apresentam argumentos
sobre algumas contribuições possíveis do ensino de ciências para o desenvolvimento moral dos estudantes).
210

HERRERO, M. T. VILARRASA, G. S. Los sentimientos en el ámbito de la moral. Educação e Pesquisa, São


Paulo, v. 29, n. 2, p. 219-234, jul./dez. 2003. (Aproveitando-se de resultados de uma pesquisa, as autoras
defendem uma articulação entre os aspectos de afetividade e de moralidade na resolução de conflitos no âmbito
pedagógico, com fins de ampliar as possibilidades de desenvolvimento dos estudantes).

HOLMES, P. Psicologia genética e teoria do discurso: a fundamentação evolutiva da democracia em Habermas.


Cadernos de Ética e Filosofia Política, São Paulo, v. 8, n. 1, p. 61 - 86, 2006. (O texto analisa a psicologia
genética de Jean Piaget e a teoria do desenvolvimento moral de Kohlberg como bases consistentes da Teoria de
Ação Comunicativa de Habermas e, consequentemente, possibilidades ampliadas para compreender as crises de
democracia e de legitimidade nos meios sociais).

KAWASAKI, C. S. Ensino de Biologia e ética: a conexão possível. In: MARANDINO, M.; SELLES, S. E.;
FERREIRA, M. S.; AMORIM, A. C. R. Ensino de Biologia: conhecimentos e valores em disputa. Niterói: Eduff,
2005. p. 76-81. (A autora defende que o ensino de Ciências apresenta um relevante papel acerca de questões
éticas a envolver o fazer ciência que não tem sido aproveitado a contento. Refere-se ao potencial de debates e
questionamentos a envolver ciência e ética que podem ser usados para o favorecimento do desenvolvimento do
pensamento crítico dos estudantes).

KNÜPPE, L. La construción moral y la ética en la infancia. Revista Electrónica Diálogos Educativos, Chile, n.
8, 2004. (Texto com abordagens básicas sobre a relevância da educação moral e ética no processo educativo
escolar infantil. Bases teóricas em Piaget e Kohlberg).

KOEHLER, S. M. Violência psicológica: um estudo do fenômeno na relação professor-aluno. In: CONGRESO


INTERNACIONAL LA NUEVA ALFABETIZACIÓN: UN RETO PARA LA EDUCACIÓN DEL SIGLO
XXI. 2003. Madrid. Educación y Futuro Digital, 2004. Disponível em:
<http://www.cesdonbosco.com/revista/congreso03.asp> (A autora discute sobre os diferentes tipos de violência
nas relações entre professor e aluno, especialmente a psicológica. Apresenta resultados de uma investigação
sobre a temática).

KONZEN, A. A. et al. (Coord.). Pela justiça na educação. Brasília: MEC / FUNDESCOLA, 2000, 735p. (A
obra agrega diversos trabalhos que, no conjunto, tratam sobre aspectos educacionais fundados em princípios de
justiça e de valores para as necessidades democráticas. Especificamente no 1º capítulo, escrito por Luis Henrique
Beust, são apresentados referenciais da psicologia e da filosofia que permitem subsídios aos pressupostos gerais
defendidos. Dentre eles, destacam-se as obras clássicas de Piaget e Kohlberg).

LA TAILLE, Y. A dimensão ética na obra de Piaget. Idéias, São Paulo (FDE / Secretaria de Educação de São
Paulo), n. 20, p. 75-82, 1994. (Neste artigo de 1994, o conhecido autor analisa a dimensão ética, nos níveis
temático e teórico, da obra “O juízo moral na criança”, de Piaget. No final, La Taille adverte sobre os perigos do
reducionismo que se pode fazer nas leituras das obras de Piaget: “limita-se a transformar a teoria de Piaget em
técnicas de sala de aula e dela tirar pouco proveito”).

LA TAILLE, Y. Desenvolvimento moral: a polidez segundo as crianças. Cadernos de Pesquisa, São Paulo, n.
114, p. 89-119, nov. 2001. (O autor tem diversos trabalhos sobre a moralidade, que é uma de suas principais
linhas de investigação na área da psicologia. O presente artigo traz resultados de quatro pesquisas empíricas que
culminam em algumas considerações teóricas que mostram a relevância da virtude polidez na educação moral a
ser implementada na escola, pois esta também implicaria o universo moral da criança).

LA TAILLE, Y.; SOUZA, L. S.; VIZIOLI, L. Ética e educação: uma revisão da literatura educacional de 1990 a
2003. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 3-, n. 1, p. 91-108,2004. (Os autores trazem o estado da arte de
dissertações, teses e artigos que tratam sobre a relação, direta ou indireta, entre ética e educação. Conclui-se que
o número de trabalhos sobre o assunto é crescente, mas ainda pequeno e insuficiente diante da complexidade dos
problemas envolvidos no tema).

LA TAILLE, Y. Desenvolvimento humano: contribuições da psicologia moral. Psicologia USP, São Paulo, v.
18, n. 1, p. 11-36, mar. 2007. (Apresentam-se argumentos sobre a inexistência de possibilidades da articulação
entre as dimensões afetiva e intelectual nas teorias psicológicas da moral e, paralelamente, analisa-se o
sentimento da vergonha no processo de desenvolvimento humano).

LEPRE, R. M. Educação moral e construção da autonomia. Psicopedagogia OnLine, São Paulo, 2006.
Disponível em: <http://www.psicopedagogia.com.br/artigos/artigo.asp?entrID=790>. (Baseando-se em Piaget,
211

Kohlberg e Puig, a autora defende a educação escolar que promove o desenvolvimento moral, possibilitando-se a
construção de autonomia do aluno).

LEPRE, R. M.; MENIN, M. S. S. Educação moral na escola: caminho para a construção da cidadania.
Disponível em: <http://www.artigocientifico.com.br/uploads/artc_1148701843_ 70.doc>. Acesso em
23/11/2009. (Neste artigo, as autoras trazem uma reflexão sobre educação moral na escola e as respectivas
consequências na formação de alunos autônomos).

LHULLIER, L. A. Autoritarismo, autoridad y conciencia moral. Psicología Política, São Paulo, n. 11, p. 69-84,
1995. (A autora defende a perspectiva sócio-histórica e crítica para melhor compreender os fenômenos do
autoritarismo. Nas discussões sobre autonomia e consciência moral, os seus referenciais giram especialmente em
torno de Apel e Kohlberg).

LIMA, J. F. L. O sujeito, a racionalidade e o discurso pedagógico da modernidade. Interações, São Paulo, v. 7,


n. 14, p. 59-84, 2002. (O texto traz argumentos sobre a racionalidade científica na compreensão do sujeito ante a
modernidade que influenciou as teorias pedagógicas. Como o próprio autor apresenta, o estudo busca no
pensamento iluminista os conteúdos estruturantes da pedagogia moderna. Nesse contexto, os aspectos da
moralidade ganham relevância).

LIMA, V. A. A. De Piaget a Gilligan: retrospectiva do desenvolvimento moral em psicologia um caminho para


os estudos das virtudes. Psicologia: Ciência e Profissão, Brasília, v. 24, n. 3, p. 12-23, 2004. (Baseados nos
estudos dos autores que aparecem no título de seu trabalho, a autora destaca que no desenvolvimento moral não
somente aparece a virtude da justiça, mas também outras como, por exemplo, a generosidade).

LIND, G. Moral dilemma discussion revisited: the Konstanz method. Europe’s Journal of Psychology, Londres,
fev. 2005. Disponível em: <http://www.ejop.org/archives/2005/02/moral_ dilemma_d.html>. (O autor compara e
analisa dois métodos de mensuração para o desenvolvimento moral: o método clássico de Blatt e o KMDD -
Konstanz Method Dilemma Discussion).

LOURENÇO, O. Além de Piaget? Sim, mas primeiro além de sua interpretação padrão. Análise Psicológica,
Lisboa, v. 16, n. 4, p. 521-552, 1998. (O autor argumenta que os estudos de Piaget, em diferentes casos, são
equivocadamente interpretados, criando-se superficialidades ou falsos isolamentos em relação a outras teorias do
desenvolvimento humano. Portanto, há que se ter cuidados e ir além da interpretação padrão sobre Piaget para
melhor compreender, e até mesmo criticar, suas obras. Uma linha de argumentos semelhantes é também
encontrada em Castorina et al., 2007).

LYRA, V. B. O desenvolvimento moral humano: perspectivas e contribuições da teoria de Lawrence Kohlberg.


Contrapontos, Itajaí, v. 7, n. 3, p. 601-613, 2007. (A autora do artigo apresenta uma revisão sobre os trabalhos de
Kohlberg, incluindo um breve resumo das fases de desenvolvimento moral e da experiência da “comunidade
justa” aplicada na escola Cluster).

MACEDO, L. (Org.). Cinco estudos de educação moral. 3. ed. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2003 (Coleção
Psicologia e Educação). (A coletânea refere-se a cinco textos sobre educação moral dos seguintes autores: Jean
Piaget, Maria Suzana de Stefano Menin, Ulisses Ferreira de Araújo, Yves de La Taille e Lino de Macedo. Cada
qual traz algumas específicas contribuições à temática).

MAGALHÃES, J. A formação da consciência crítica e o ensino de ciências. Revista Acadêmica Multidisciplinar


Urutágua, Maringá (UEM), ano 1, n. 4, 2002. (A autora, que é socióloga, desenvolve a temática da Educação
para Cidadania, na qual insere o relevante papel das disciplinas de conteúdo científico na sua implementação.
Uma das questões que apresenta refere-se às relações entre formação de consciência crítica e o ensino de
ciências. Os seus argumentos em prol do desenvolvimento da consciência crítica são guiados pela defesa do uso
da racionalidade nas possibilidades de apropriação e ampliação de visão de mundo).

MAIA, H.; MAZZOTTI, T. É possível ensinar ética nas escolas? Revista da Faced, Salvador (UFBA), n. 10, p.
113-124, 2006. (Os autores, professores de Programas de Pós-Graduação da UNESA, enfatizam a necessidade
de ampliar investigações que focalizem as possibilidades de ensinar ética nas escolas, notadamente porque os
dias atuais requerem posicionamentos diante, por exemplo, dos avanços científicos e tecnológicos que atingem a
todos nós. Nos argumentos que apresentam, questionam desde as propostas dos PCN até a omissão da escola e as
dificuldades dos professores na implementação desse tipo de ensino. No texto, ainda resgatam e discutem
pressupostos teóricos de Piaget, Kohlberg e Habermas).
212

MALIANDI, R. Ética discursiva y ética aplicada: reflexiones sobre la formación de profesionales. Revista
Iberoamericana de Educación, Madrid, n. 29, p. 105-128, 2002. (O autor destaca a relevância da formação de
profissionais, incluindo-se aspectos morais que se relacionem a uma ética aplicada. Discorre sobre a proposta de
Apel, mas sugere uma variante desta que dê conta dos aspectos relacionados à ética educacional).

MARTÍNEZ, J. M. R. Desarrollo del juicio moral en bachilleres de aguascalientes. Revista Mexicana de


Investigación Educativa, México, DF, v. 10, n. 24, p. 43-66, 2005. (O autor relata uma pesquisa realizada com
universitários venezuelanos. Com o DIT - Defining Issues Test, instrumento de mensuração com base nas teorias
kohlberguianas - foram identificados e analisados os níveis e estágios de desenvolvimento moral dos alunos).

MARTINS, E. C. O conceito de emancipação como uma nova meta educativa na formação humana. Educação e
Filosofia, Uberlândia, v. 7, n. 14, p. 39-59, 1993. (O autor português discute e coloca em reflexão os conceitos
de emancipação, autonomia e liberdade que se fazem presentes nas propostas educativas. Para tanto, resgata
diferentes contextos históricos e autores que trabalharam esses conceitos).

MARTINS, L. C.; BRANCO, A. U. Desenvolvimento moral: considerações teóricas a partir de uma abordagem
sociocultural construtivista. Psicologia: Teoria e Pesquisa, Brasília, v. 17, n. 2, p. 169-176, 2001. (Os autores
defendem a necessidade de se levar em consideração os aspectos socioculturais, cognitivos e afetivos nas
abordagens sobre desenvolvimento moral).

MASSI, P. A. Una educación experiencial para desarrollar la democracia en las instituiciones educativas. Revista
Iberoamericana de Educación, Madrid, n. 8, p. 41-72, 1995. (O autor apresenta uma experiência com a
finalidade de desenvolver os princípios democráticos nas escolas. Para tanto, defende que os alunos devem
participar como protagonistas no processo de aprender / conhecer).

MATTHEWS, M. R. Historia, filosofía y enseñanza de las ciencias: la aproximación actual. Enseñanza de las
Ciencias, Barcelona, v. 12, n. 1, p. 255-277, 1994. (O renomado professor da Universidade de Auckland, Nova
Zelândia, argumenta em seu artigo a favor da história e filosofia no ensino de ciências. No decorrer do texto,
inclui a psicologia da aprendizagem na discussão sobre o desenvolvimento cognitivo para o entendimento de
crenças e resistências que permeiam o ensino científico).

MEJÍA, M. Q.; MONTOYA, E. V. Justificaciones y sentimientos morales de jóvenes universitarios y jóvenes


desplazados acerca de las acciones justas e injustas. Acta Colombiana de Psicología, Bogotá, v. 10, n. 1, p. 99-
110, 2007. (Relato de pesquisa sobre as justificações e os sentimentos morais explicitados sobre justiça em ações
valoradas por universitários. Segundo as autoras, crenças, valores e princípios estão presentes na expressão dos
sentimentos dos jovens sobre a justiça. A investigação buscou bases teóricas especialmente em Habermas, Rawls
e Kohlberg).

MILNITSKY-SAPIRO, C. Teorias em desenvolvimento sociomoral: Piaget, Kohlberg e Turiel - possíveis


implicações para a educação moral na educação médica. Revista Brasileira de Educação Médica, Rio de Janeiro,
v. 24, n. 3, p. 7-15, out./dez. 2000. (A autora é doutora em Psicologia do Desenvolvimento Moral, pela
University of Illinois at Chicago, e colaboradora em trabalhos de Turiel e Nucci. Nesse artigo são apresentadas
“as três principais teorias em desenvolvimento social e moral no campo da psicologia” e suas respectivas
implicações para a Educação Médica, notadamente em relação às questões de autonomia e o consentimento
informado).

MOREIRA, L. P. Durkheim e Feyerabend: duas concepções antagônicas de educação. Aprender - Caderno de


Filosofia e Psicologia da Educação, Vitória da Conquista, ano 4, n. 6, p. 139-152, 2006. (A autora expõe as
contraposições entre Durkheim e Feyerabend sobre as suas respectivas ideias e princípios educacionais,
mencionando-se notadamente os aspectos da educação científica).

MORGADO, J. C.; FERREIRA, J. B. Globalização e autonomia: desafios, compromissos e incongruências. In:


MOREIRA, A. F.; PACHECO, J. A. (Orgs.) Globalização e educação: desafios para políticas e práticas. Porto,
Portugal: Porto Editora, 2006. p.61-86. (Coleção Currículo, Políticas e Práticas, n. 26). (Os autores apresentam
reflexões sobre as relações contemporâneas que envolvem as tendências de globalização, os aspectos de
autonomia e o papel da educação escolar nesse processo de rápidas mudanças observadas no mundo).

MORIN, E. Los siete saberes necesarios para la educación del futuro. Paris: UNESCO, 1999. (Interessou-nos,
de forma especial, os capítulos seis e sete dessa obra, respectivamente intitulados “Enseñar la comprensión” e
213

“La ética del género humano”. O conhecido autor faz uma discussão da ética sob o ponto de vista da
complexidade que cerca esse e outros temas subjacentes às questões da educação humana).

MORISSETTE, D.; GINGRAS, M. Como ensinar atitudes: planificar, intervir, avaliar. Porto/Lisboa: Asa, 1994.
(Os autores, atuantes em ensino universitário e no Ministério de Educação do Canadá, ocupam-se na abordagem
teórica e prática dos aspectos afetivos no ensino e na aprendizagem escolar).

MUÑOZ, C. S. Los valores en la educación. Educar - Revista de Educación, México, n. 4, jan.-mar., 1998. (No
âmbito da temática, o autor traz reflexões sobre algumas das principais teorias que subsidiam a educação moral:
clarificação de valores, desenvolvimento moral, ensino de virtudes).

NIETZSCHE, F. W. A genealogia da moral. 3. ed. São Paulo: Escala, 2009. (Coleção Grandes Obras do
Pensamento Universal). (Uma das obras clássicas do autor, que, de modo incisivo e contundente, constrói uma
versão própria e crítica sobre a origem da moral).

NAVARRO, S. P. El uso informatizado del cuestionario de problemas sociomorales (DIT) del Rest. Pixel Bit,
Sevilha, Universidad de Sevilla, n. 20, jan. 2003. Disponível em: <http://www.sav.us.es/pixelbit/
pixelbit/articulos/n20/n20art/art2001.htm>. Acesso em: 21 jan. 2007. (O professor da Universidad del Pais
Vasco descreve o uso da informática, por meio de um programa denominado DITcor 1.0, para facilitar a
aplicação da ferramenta DIT, criada por Rest.

NUCCI, L. Psicologia moral e educação: para além de crianças “boazinhas”. Educação e Pesquisa, São Paulo, v.
26, n. 2, p.71-89, 2000. (Apesar das reivindicações educativas em prol da educação do caráter, especialmente nos
Estados Unidos, o autor questiona programas desse tipo e oferece sugestões “que levem em conta as complexas
interações entre valores morais e não morais e que ultrapassem a mera doutrinação das crianças conforme os
valores da sociedade”).

OLIVEIRA, A. M. O processo educativo e a construção dos valores morais e sociais: uma questão
interdisciplinar. Educação: Teoria e Prática, Rio Claro, v. 2, n. 3, p. 19-24, 1994. (Por intermédio das teorias
sociomorais com bases cognitivas em Piaget e Kohlberg, a autora discute sobre o processo de formação moral na
escola).

OLIVEIRA, M. B. A crise e o ensino de ciências. Educação & Sociedade, Campinas, v. 19, n. 62, p. 151-172,
1998. (Apesar de publicado em 1998, o artigo pode ser considerado atual. O professor Oliveira defende que o
espírito crítico existente no interior da prática científica seja estendido para o ensino de Ciências. Mereceu de
nós uma especial atenção o item que, por si só, já define seu objetivo e relevância: “A atitude crítica na ciência e
sobre ciência”).

OLIVEIRA, M. N. Para inspirar confiança: considerações sobre a formação moral em Kant. Trans/Form/Ação,
São Paulo, v. 29, n. 1, p. 69-77, 2006. (O autor - professor da Universidade Federal de Ouro Preto - trata da
formação moral em Kant, que ensejava uma preocupação de vida livre ao homem. O texto apresenta uma
interessante abordagem sobre os pressupostos kantianos sobre a temática da moralidade).

OLIVEIRA, R. J. Ética e educação: a formação do homem no contexto de crise da razão. Revista Brasileira de
Educação, Rio de Janeiro, n. 2. p. 33-41, 1996. (Neste ensaio, o autor discute o papel da educação em meio ao
contexto contemporâneo de crise da razão que afeta a modernidade. Apresenta para reflexão bases teóricas
fundadas especialmente no processo de argumentação de Perelman e Habermas).

OLIVEIRA, R. J. Ética e humanização do homem: desafios para uma educação pluralista. Perspectiva,
Florianópolis, v. 16, n. 29, p. 153-173, 1998. (Com objetivos voltados para a formação do homem por meio de
uma educação pluralista, e tendo como base a teoria de argumentação de Chaim Perelman, o autor coloca em
discussão alguns dos princípios éticos da modernidade, propiciando reflexão e caminhos alternativos para a
educação de valores no mundo contemporâneo).

OLIVEIRA, R. J. Ética na escola: (re)acendendo uma polêmica. Educação & Sociedade, Campinas, ano XXII, n.
76, p. 212-231, 2001. (O texto aborda alguns princípios teóricos referentes à ética e questiona determinadas
concepções e práticas pedagógicas que permeiam o tema).

OSORNIO, F. L. M. La adopción de perspectivas como elemento central del desarrollo moral: su relación con la
cooperación en el aula. In: CONGRESO NACIONAL DE INVESTIGACIÓN EDUCATIVA, 9., 2007, Mérida,
214

México. Memórias... México: Consejo Mexicano de Investigación Educativa, 2007. Disponível em:
<http://www.comie.org.mx/ congreso/memoria/v9/ponencias/at06/PRE1178240916.pdf>. (A autora apresenta a
síntese de análise crítica das teorias de Piaget, Kohlberg, Selman e Turiel e resultados de uma pesquisa com
estratégias que promovem ou evitam as atitudes cooperativas em aula. Nas suas análises críticas, a autora aponta
que as teorias de Piaget e Kohlberg aparecem superadas por focar apenas no aspecto cognitivo da moralidade).

OTERO, M. J. N. La educación de la afectividad en los escritos de Augusto Mijares. Revista de Pedagogia,


Caracas, v. 25, n. 74, p. 401-426, 2004. (Com bases na necessidade de harmonizar a educação intelectual e a
educação da afetividade, a autora busca aporte nas propostas de Mijares. O pesquisador venezuelano defende a
inserção da afetividade na educação escolar, juntando-se aos demais elementos que fazem parte da formação
integral do indivíduo).

PÉREZ, M. M. Educación moral como pedagogía del sentido: una reivindicación del juicio reflexionante en la
ética. Revista Latinoamericana de Estudios Educativos, México, v. 34, n. 2, p. 29-45, 2004. (A autora
brevemente descreve os pressupostos sociomorais de Kant, Piaget, Kohlberg e Habermas. Aponta as resistências
sobre o modelo excessivamente centrado no cognitivismo nas aplicações em educação e sugere uma
aproximação dos pressupostos kantianos como possível mediação entre a ética deontológica clássica e as
propostas neoaristotélicas enfocadas de maior abrangência sobre as responsabilidades).

PETRALANDA, I. et al. Etica en la educación científica y tecnológica: experiencia en la Faculdad de Ciencias


de la Universidad Central de Venezuela. Enseñanza de las Ciencias, Barcelona, número extra, p. 1-6, 2005. (O
grupo de autores avalia as possibilidades do ensino de valores numa disciplina denominada “Ética e investigação
científica e tecnológica”. Os resultados apontam, entre outros, para aproximações concretas entre ética e ensino
de ciências, favorecendo interesses de alunos e professores, mas com a requisição de mudanças de paradigma
nas estratégias usuais, no sentido de se voltar mais para o desenvolvimento de habilidades dialógicas e
argumentativas)

PIZZI, J. O conteúdo moral do agir comunicativo. São Leopoldo: Unisinos, 2005. (O autor é professor da
Universidade Católica de Pelotas, RS. Nesse livro, faz-se uma análise sobre o procedimentalismo. De acordo
com Pizzi, o mundo da vida é conceito complementar do agir comunicativo, sendo que os estudos de Habermas e
Adela Cortina constituem contribuições relevantes para o resgate da racionalidade. Nesse caso, a racionalidade
do conteúdo moral aparece reorganizada nos contextos comunicativos).

POSADA, C. V. Influencia de Piaget en el estudio del desarrollo moral. Revista Latinoamericana de Psicologia,
Colômbia, v. 30, n. 2, p. 223-232, 1998. (A autora analisa as concepções de Piaget acerca da moral e as
respectivas influências dos pressupostos piagetianos sobre os trabalhos de Kohlberg e Habermas).

PUIG, J. M. Construcción dialógica de la personalidad moral. Revista Iberoamericana de Educación, Madrid, n.


8, p. 103-120, 1995. (Puig apresenta neste artigo a sua perspectiva teórica denominada de construção da
personalidade moral, após tecer críticas sobre os aspectos restritos dos principais paradigmas de educação
moral).

REGO, S. Sobre a classificação de indivíduos em estágios de acordo com a teoria de desenvolvimento moral de
Lawrence Kohlberg. Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 10, n. 4, p. 1082-1083, 2005. (O autor
contesta dados e argumentos de uma determinada pesquisa, publicada no mesmo periódico, por utilizar de forma
superficial e/ou equivocada a teoria de Kohlberg na metodologia para mensurar o desenvolvimento moral e,
ainda, na difusão de alguns conceitos e princípios).

REMBERT, R. B. Socrates, discussion and moral education. International Review of Education, New York, v.
41, n. 1-2, p. 97-108, 1995. (Ao analisar algumas obras referenciais, entre elas, “Diálogos sobre educación
moral”, de John Wilson e Barbara Cowell, o autor defende neste artigo que a noção socrática do valor moral da
discussão ainda é proveitosa e pode ser utilizada nos dias atuais).

RIJO, A. G. La enseñanza y el aprendizaje de los valores en la educación deportiva. Revista Internacional de


Medicina y Ciencias de la Actividad Física y el Deporte, Madrid, v. 5, n. 18, p.89-99, 2005. (O autor utiliza-se
de pressupostos teóricos sobre educação moral extraídos de Buxarrais, Diaz-Aguado e Puig, entre outros, para
argumentar em prol de uma educação desportiva moral, ou seja, que transcenda um papel meramente motriz
dessa disciplina).
215

ROSA, D. L. A escola e a formação do sujeito moral: possibilidades e limites da instituição escolar. Revista da
FACED, Salvador, n. 5, p. 13-26, 2001. (Como o próprio título traz, a autora deste artigo apresenta limites e
possibilidades da escola na formação moral. É cética sobre a perspectiva desse tipo de formação, mas coloca a
escola como espaço possível de educação guiada por princípios éticos).

RUBIO, S. A. Valores en la enseñanza y formación en valores. Educar - Revista de Educación, México, n. 4,


jan./mar. 1998. (A autora, como ela própria menciona no texto, tem os seguintes propósitos: evidenciar e
documentar alguns dos valores manifestados no ensino-aprendizagem e esboçar uma proposta de formação de
professores nesse campo).

RUEDA, J. L. M.; MEDINA, G. A. S. Formación de la consciencia moral: desafío para la educación superior.
Actualidades Pedagógicas, Colômbia, n. 49, p. 23-32, jul./dez. 2006. (Ambos os autores são professores e
membros de grupos de pesquisa da Universidad de La Salle. Utilizando-se de pressupostos teóricos de Piaget,
Kohlberg e Freire, busca-se a construção de uma proposta pedagógica com bases nos princípios morais de justiça
social e possibilidades de aplicação em estudantes universitários de Bogotá).

RUIZ, M. J. F. Reflexões sobre a moralidade infantil. Revista Iberoamericana de Educación, Madrid, p. 1-19,
2003. Disponível em: <http://www.rioei.org/edu_val13.htm>. (Como o próprio título do artigo sugere, a autora
apresenta algumas reflexões sobre a moralidade infantil, a envolver os papéis desempenhados pela escola,
família, mídia etc. Para tanto, revisa e se utiliza de referenciais que perpassam Kant, Piaget, Kohlberg e La
Taille, entre outros).

RUIZ, P. O. La educación moral como pedagogía de la alteridad. Revista Española de Pedagogía, Madrid, v.
LXII, n. 227, jan./abr. 2004. (O autor propõe o que chama de pedagogia da alteridade como um novo paradigma
da educação moral. Para subsidiar seus argumentos, baseia-se principalmente em Levinas).

SCHMELKES, S. Educación y valores: hallazgos y necesidades de investigación. Educar - Revista de


Educacón, México, n. 4, jan.-mar. 1998. (A autora lista uma série de justificativas sobre as exigências do sistema
educativo relacionadas com a formação de valores e as necessidades de investigações sobre essa temática).

SCHMELKELS39, S. La formación valoral y la calidad de la educación. In: SEMINARIO SOBRE


EDUCACIÓN Y VALORES, Cidade do México: Instituto de Fomento a la Investigación Educativa, 2004. (A
autora defende uma tese em que não há possibilidade de educação de qualidade sem incluir a formação de
valores e, igualmente, não pode existir uma educação de valores sem uma educação de qualidade. Para tanto,
resgata discussões de autores conhecidos na literatura sobre educação moral).

SILVA, J. G. A. O processo argumentativo na (re)significação de concepções éticas/morais. 2006. 183f.


Dissertação (Mestrado em Psicologia) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2006. (Utilizando-
se de técnicas de mensuração da Psicologia do Desenvolvimento Moral, a autora relatou tendências de relação
crescente das capacidades argumentativas de adolescentes entre os níveis mais elevados do raciocínio moral.
Nesse caso, apesar de outros elementos também presentes no processo, os níveis mais altos de raciocínio moral
apresentam relevantes contribuições para as capacidades de gerar contra-argumentos nos adolescentes, com a
consideração de outras alternativas diferentes de seus pontos de vista inicias).

SILVA, M. O. No desvelar de polêmicas contemporâneas, o desafio do ensino de Biologia. 2007. 146f.


Dissertação (Mestrado em Educação) - Universidade Federal de Uberlândia, Uberlândia, 2007. (A autora analisa
dados empíricos de contribuição dos temas polêmicos no ensino de Biologia. Os resultados demonstram que os
assuntos polêmicos auxiliam o pensamento crítico dos alunos).

SILVA, M. O.; CICILLINI, G. A. O potencial das discussões polêmicas nas aulas de Biologia. In: SEMANA
ACADÊMICA, 5., Anais... Uberlândia: Universidade Federal de Uberlândia, 2008. (As autoras, por meio de
resultados de investigação realizada com alunos, enfatizam sobre o potencial que existe no uso das discussões de
temas polêmicos em prol do ensino escolar de Biologia).

SILVA, M. V. O declínio dos paradigmas da modernidade e as experiências pós-modernas: tudo que é sólido
desmancha no ar? Educação e Filosofia, Uberlândia, v. 18, n. 35/36, p. 127-144, jan./dez. 2004. (Em seu texto, a
autora, que é professora da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Uberlândia, apresenta uma

39
O sobrenome da autora também aparece em outra obra com o formato de Schmelkes. Todas as menções de
autoria estão em conformidade com o que apresentam os artigos originais.
216

contextualização da pós-modernidade e, em seguida, pontos e contrapontos de algumas características dessa


abordagem em relação às possibilidades do sujeito - “que não está morto” - na construção de projetos coletivos).

SILVA, S. R. Instrução pública e formação moral: a gênese do sujeito liberal segundo Condorcet. Campinas:
Autores Associados, 2004. (O autor destaca os pressupostos educativos iluministas de Condorcet. Ressaltamos
os capítulos quatro e cinco, que incluem discussões sobre educação moral, razão e instrução pública e as visões
que o Marquês tinha sobre as relações entre ciências e o ensino da moral).

SILVA, S. R. Razoabilidade, pluralismo e educação segundo John Rawls. Educação On-Line, Rio de Janeiro
(PUCRJ), n. 2, p. 1-11, 2006. (O texto traz discussões sobre as escolhas de concepções morais inseridas na
educação escolar. Aponta como relevantes os pressupostos de Rawls, porque segue princípios de autonomia
encontrados em Piaget e Kohlberg, entre outros).

SOUZA, L. S.; CARVALHO, A. M. P. Ensino de ciências e formação da autonomia moral. Enseñanza de las
Ciencias, Barcelona, número extra, p. 1-5, 2005. (Os autores relatam brevemente uma pesquisa sobre atitudes de
alunos de 3ª e 4ª séries em situação de trabalho de classe em grupo. Artigo resumido e sem detalhes sobre os
referenciais seguidos).

TAVARES, M. Racionalidade comunicativa e desenvolvimento humano em Jürgen Habermas: bases de um


pensamento educacional. Revista Lusófona de Educação, n. 1, p. 172-179, 2003. (Na resenha que faz sobre essa
obra, o autor destaca e enfatiza algumas das relevantes contribuições teóricas de Habermas para a educação
escolar no que se refere à ética do discurso).

TEIXEIRA, L. C. Ética e subjetividade: indagações em Habermas e Rorty. Estudos de Psicologia, Natal, v. 8, n.


1, p. 147-153, 2003. (A autora é professora de graduação e de mestrado em Psicologia da Universidade de
Fortaleza. O artigo aborda as concepções de Habermas e Rorty, considerando-se as relações entre ética e
subjetividade e inserindo-se nas discussões aspectos diversos relacionados aos ideários iluministas para a
modernidade).

TOGNETTA, L. R. P.; MENIN, M. S. S.; VINHA, T. P. (Coords.). CONGRESSO E PESQUISA EM


PSICOLOGIA E EDUCAÇÃO MORAL: CRISE DE VALORES OU VALORES EM CRISE?, 1., 2009.
Campinas. Anais eletrônicos... Campinas: Unicamp/FE, 2009. Disponível em:
<http://www.fe.unicamp.br/coppem/Anais_1COPPEM.pdf>. (Expõe trabalhos diversos e atuais sobre educação
moral).

VALDIVIA, I. M. A. La formación de valores como propósito educativo: reflexiones teóricas para la


instrumentación de programas de orientación sociomoral en la escuela. Revista Pedagogía Universitaria, Cuba,
v. 3, n. 3, p. 1-10, 1998. (Neste artigo, a autora faz algumas reflexões sobre a formação moral no ambiente
escolar, utilizando-se como base diferentes teorias. De acordo com seus argumentos, as possibilidades concretas
existem, apesar das dificuldades na implementação de propostas que se voltem para uma educação integral dos
alunos).

VALENTE, M. O. A educação para os valores. In: ABREU, I.; MOURÃO, C.; PIRES, E. L. O ensino básico em
Portugal. Porto: ASA, 1989. p. 133-172. (A autora destaca neste capítulo da obra o contexto português,
apresenta alguns questionamentos e traz argumentos que envolvem duas teorias sobre educação moral:
“clarificação de valores” e “desenvolvimento moral”).

VALENTE, M. O. Ensino das ciências e cidadania. In: ENCONTRO DE ENSINO DAS CIÊNCIAS, 8., 2001,
Ponta Delgada, Actas... Ponta Delgada: Universidade dos Açores, 2001. p. 29-42. (A autora é docente da
universidade de Lisboa. O texto refere-se a uma conferência proferida pela autora no evento mencionado logo
acima. Argumenta-se sobre a natureza da ciência, o ensino das ciências e os sistemas de valores e crenças
envolvidos nas concepções relacionadas à cidadania moderna. Uma parte significativa dos argumentos
apresentados faz referências a Poole, 1995, também mencionado neste nosso relatório de tese).

VAÑO, A. C. (Coord.). Orientación, tutoría y psicopedagogía. Alicante: Cefire de Elda, 2002 (ISBN: 84-699-
8899-9). (O livro traz uma coletânea de trabalhos com abordagens psicopedagógicas diversas. Especificamente o
capítulo II, intitulado “Educación en valores y resolución de conflictos” traz oito artigos sobre educação moral.
São eles: i.“Educar en valores”, de José Cantillo Carmona; ii. “Los dilemas morales: un método para la
educación en valores”, de Grup Xibeca; iii. “Actividades de resolución de conflictos” e iv. “Actividades para la
elaboración de unas normas de convivencia en la clase, de Leandro Oseguera Lomeña e Julia Rebolloso
217

Sánchez; v. “Educación emocional y prevención de la violencia”, de Augustín Caruana Vaño; vi. “Técnicas de
resolución de conflictos en educación infantil”, de María Pérez Torreblanca e María José Esteve Sarrió; vii.
“¿Me conozco a mi mismo?”, de Rosa María Mira Martínez; viii. “Los dilemas morales y su aplicación en el
aula como recurso para prevenir la violencia”, de Pedro Juan Chico).

VASCONCELLOS, M. D. A sociologia da educação na França: um percurso produtivo. Educação & Sociedade,


Campinas, v. 24, n. 83, p. 553-573, 2003. (A autora é professora de Sociologia da Educação na Universidade de
Lille. O seu artigo resgata os trabalhos de Durkheim, num viés que enfoca as relações entre educação e
sociedade na França, com preocupações também voltadas para a ciência e a política).

VÁSQUEZ, G. H. Ética comunicativa y educación para la democracia. Revista Iberoamericana de Educación,


Madrid, n. 8, p. 65-91, 1995. (O autor utiliza as teorias de Habermas para embasar as suas discussões sobre a
educação que objetiva os princípios da democracia).

VÁSQUEZ, J. F. D. La educación moral durkheimiana y la crisis de la esfera educativa en el mundo tardo-


moderno. Nómadas - Revista Crítica de Ciencias Sociales y Jurídicas, Madrid, v. 17, n.1, 2008. (Baseando-se
em Durkheim, o autor apresenta seus argumentos sobre a crise que a área educacional enfrenta no mundo,
especialmente em relação à autoridade do professor. Segundo o autor, a realidade atual requer mudanças na
forma de pensar a educação. Num dos itens abordados nesse texto está o pensamento de Durkheim sobre o papel
que o ensino de ciências pode desempenhar na educação moral).

VENTURI, G. O universalismo ético: Kohlberg e Habermas. Lua Nova - Revista de Cultura e Política, São
Paulo, n. 36, p. 67-84, 1995. (São analisadas as obras de Kohlberg e Habermas sobre o aspecto do universalismo
ético que ambos defendem).

VILARRASA, G. S.; MARIMON, M. M. Nuevas perspectivas sobre el razonamiento moral. Educação e


Pesquisa, São Paulo, v. 26, n. 2, p. 123-135, 2000. (Apresentam-se os enfoques teóricos de Gilligan e Kohlberg
que, segundo as autoras, podem ser vistos como complementares ao invés de opostos. Com esses dois enfoques
que se complementam, os resultados de uma investigação também são analisados).

VILARRASSA40, G. S.; MARIMÓN, M. M.; HERRERO, M. T. Razonamiento moral y educación. Educar,


Espanha, v. 22-23, p. 155-170, 1998. (As autoras são professoras do Departamento de Psicologia da Universitat
de Barcelona. A tese que defendem neste trabalho é que a inclusão de aspectos sentimentais na resolução de
conflitos subsidia o desenvolvimento do raciocínio moral, guiando-se a níveis mais elevados na perspectiva de
justiça e solidariedade).

VILCHES, A.; GIL-PÉREZ, D. Educación, ética y sostenibilidad. Educação: Temas e Problemas, Évora,
Portugal, Itajaí, n. 3, p. 11-15, 2007. (Nas reflexões que apresentam, os autores defendem que a construção de
um futuro de mundo sustentável deve ter por base a educação e a ética. Portanto, há que se considerar uma
concepção mais ampla de educação do que apenas o perfil de ensino que se vê atualmente).

VILLELA, E. C. RAITZ, T. R. Um estudo sobre os estados morais em Kohlberg. Contrapontos, Itajaí, v. 7, n. 3,


p.629-641, 2007. (As autoras são doutoras em Educação e atuantes em programas de pós-graduação. Neste
artigo, aproveitam-se dos níveis e estágios de desenvolvimento moral da teoria de Kohlberg, para fundamentar
reflexões e buscas de compreensão sobre o desenvolvimento da consciência democrática).

WILSON, J.; COWELL, B. Diálogos sobre educación moral. Bilbao, Espanha: Desclée De Brouwer, 1999.
(Colección Aprender a Ser). (Os autores, com publicações diversas e referenciais sobre a temática, apresentam
relevantes aspectos da educação moral sob a forma de uma história dialogada entre personagens platônicos.
Destaques especiais para o capítulo 6, nos itens “Los peligros de los enfoques doctrinarios” e “La necesidad de
una investigación científica y de un trabajo arduo”. Uma obra que mereceu críticas positivas de outros autores
que trabalham com a moralidade, entre eles, Lawrence Kohlberg).

ZERPA, C. E.; RAMIREZ, J. J. Un instrumento de medición del desarrollo para estudiantes universitarios:
Defining Issues Test (DIT). Revista de Pedagogia, v. 25, n. 74, p. 427-450, 2004. (Os autores utilizam e
analisam o DIT em avaliação de raciocínio moral, com bases em Kohlberg. Concluem que o instrumento é
consistente, confiável e com validade científica).

40
O sobrenome da autora também aparece em outra obra com o formato de Vilarrasa. Todas as menções de
autoria estão em conformidade com o que apresentam os artigos originais.
218

GLOSSÁRIO

Aspectos (teórico-práticos): Adaptado do léxico (FERREIRA, 1999), termo usado para


designar um conjunto de atributos, qualidades, condições ou componentes teórico-práticos
com que um fenômeno, um assunto etc. (em nosso caso, o desenvolvimento moral em aulas
de Ciências) pode ser visto, observado ou considerado (vide Perspectiva).

Atmosfera moral: O conceito de atmosfera moral foi introduzido por Kohlberg. Refere-se ao
clima social mais ou menos favorável para a realização com êxito de programas de educação
moral. Reflete a sua preocupação com o contexto social no qual se processa a psicogênese da
moralidade (FREITAG, 1992, p. 220). É um meio social onde as relações entre as pessoas
estão orientadas para a figura da pessoa e não para a posição ou estatuto que ela ocupa. Um
meio é considerado atmosfera justa e moral quando estimula a participação e a construção,
nunca a mera obediência ou a submissão (LOURENÇO, 2002).

Aulas (de Ciências): “Conjunto de atividades próprias do processo de ensino-aprendizagem


[de Ciências], desenvolvido no período em que professor e aluno interagem” (BRASIL,
1981).

Consciência (das regras): “A compreensão que as crianças têm das mesmas: o que elas são,
para que servem, de onde vêm, quem as faz, se podem ser mudadas...” (MENIN, 2003, p. 44,
ao referir-se sobre o conceito dado por Piaget).

Consciência moral: Grau de obrigação que a pessoa tem de respeitar e cumprir normas e
princípios morais. Na perspectiva da aprendizagem como socialização, “a consciência moral é
sobretudo a interiorização de normas morais que são aprovadas socialmente”. Na perspectiva
do desenvolvimento, “a consciência moral é o resultado de uma contínua interação entre a
pessoa e o seu meio social; a construção pessoal é sempre enfatizada” (LOURENÇO, 2002, p.
321).

Constrangimento: No âmbito da moral, é uma “designação utilizada para caracterizar a


moral heterônoma e a sua orientação para a obediência e para o respeito unilateral”
(LOURENÇO, 2002, p. 322).

Descritor: “Palavra ou expressão utilizada em indexação e tesauro para representar, sem


ambigüidade, um determinado conceito” (FERREIRA, 1999). Os descritores que utilizamos
nesta nossa pesquisa são termos ou conceitos indexados no Thesaurus Brasileiro da Educação
(Brased).

Elemento: Tudo que entra na composição, que faz parte de alguma coisa (FERREIRA, 1999).

Emancipação: Na perspectiva moderna, refere-se à construção de uma personalidade humana


livre de coerção externa por meio da maioridade racional. Emancipar-se, nesse caso, é tornar-
se independente e livre do domínio do outro. (A literatura traz diferentes posicionamentos e
discussões acerca do conceito de emancipação. Entre outros, vide obras de Immanuel Kant,
Marquês de Condorcet, Theodor Adorno, Jean Piaget, Lawrence Kohlberg, Jüergen
Habermas, Paulo Freire, Boaventura de Souza Santos).
219

Escola ativa (método ativo de educação): “Escola ativa baseia-se na idéia de que as
matérias a serem ensinadas à criança não devem ser impostas de fora, mas redescobertas pela
criança por meio de uma verdadeira investigação e de uma atividade espontânea. Atividade se
opõe, assim, à receptividade”. Envolve cooperação, auto-governo e decorre em atividades em
qualquer disciplina e não numa específica (PIAGET, 2003, p. 19).

Imperativo categórico: “Proposição que expressa uma ordem absoluta, i. e., uma ordem que
deve ser cumprida sem condição” (FERREIRA, 1999). Em Kant, “designa um critério de
verificação para a maior ou menor justiça e moralidade das ações”, com as características de
ser universalizável e de tratar o outro como fim em si mesmo e não como meio
(LOURENÇO, 2002, p. 317).

Interface: Com as devidas adaptações aos nossos propósitos, utilizamos o termo baseados no
significado do léxico: Conjunto de elementos comuns entre duas ou mais áreas de
conhecimento ou de interesse. Também pode ter o significado de meio que promove a
comunicação ou interação entre dois ou mais grupos (FERREIRA, 1999).

Justiça: “Um dos princípios substantivos de moralidade; advoga uma orientação


deontológica, [...] estipula que se trate o outro como um fim, não como um meio, ou então que
se tratem as pessoas de modo igualitário. É o princípio moral central na obra de Kohlberg,
Kant, ou Rawls, entre outros” (LOURENÇO, 2002, p. 341).

Máxima: “É um princípio de ação, um motivo racional para agirmos” (MENIN, 2003, p. 38).

Moral: “A moral é um sistema de normas, princípios e valores, segundo o qual são


regulamentadas as relações mútuas entre os indivíduos ou entre estes e a comunidade, de tal
maneira que estas normas, dotadas de um caráter histórico e social, sejam acatadas livre e
conscientemente, por uma convicção íntima, e não de uma maneira mecânica, externa ou
impessoal” (VÁZQUEZ, 2005, p. 84). A moral se posiciona num plano ideal e “tende a
transformar-se em moralidade devido à exigência de realização que está na essência do
próprio normativo” (VÁZQUEZ, 2005, p. 66).

Moralidade: A moralidade se coloca num plano real, constituindo-se num “componente


efetivo das relações humanas concretas [...]. “É a moral em ação, a moral prática e praticada”.
Por causa das dificuldades em diferenciar os dois conceitos, pode-se utilizar somente o termo
moral, desde que se englobe nele os dois planos: “o normativo ou prescritivo e o prático ou
efetivo” (VÁZQUEZ, 2005, p. 66).

Normas morais: “No contexto de desenvolvimento moral em geral, esta expressão designa
um conjunto de regras de caráter normativo, não roubar ou não mentir, por exemplo, que
constituem critérios para a ação moral, mas que são distintas dos princípios éticos ou morais.
No contexto da teoria de Kohlberg em particular, essa expressão refere-se também a um
conjunto relativamente pequeno de considerações morais, tais como considerações afetivas
[...] ou de obediência [...], que os sujeitos invocam para justificar a escolha de determinados
valores quando são confrontados com certos dilemas morais” (LOURENÇO, 2002, p. 341).

Orientação moral deontológica: “Expressão utilizada para designar a orientação moral das
pessoas que tendem a julgar o valor moral das ações em si mesmas, não importa quais sejam
as suas consequências” (LOURENÇO, 2002, p. 325). A justiça e o tratamento igualitário são
princípios fundamentais desse tipo de orientação.
220

Orientação moral teleológica: “Conceito que se refere a um tipo particular de orientação


moral a defender que a correção de uma determinada ação moral está nas consequências que
produz, como, por exemplo, no seu maior bem para o maior número de pessoas”
(LOURENÇO, 2002, p. 353).

Perspectiva (teórico-prática): Aspecto teórico-prático sob o qual uma coisa se apresenta (em
nosso caso, o desenvolvimento moral em aulas de Ciências com subsídios de dados teóricos e
empíricos); panorama; ponto de vista (adaptado de FERREIRA, 1999).

Princípios morais: “Conjunto relativamente pequeno de enunciados de caráter ético, gerais,


abstratos, formais e prescritivos, como, por exemplo, trata o outro como um fim em si mesmo,
não como um meio, e que constituem os critérios últimos de justiça e de moralidade, sendo,
em consequência, a justificação final das normas morais e sociais existentes” (LOURENÇO,
2002).

Racionalidade comunicativa: Em Habermas, é a racionalidade mediada pela linguagem e


comunicação nas tomadas de decisão, buscando-se o entendimento mútuo por meio do
discurso e senso crítico. Contrapõe-se à razão instrumental (mas sem a intenção de eliminá-
la). Insere-se mundo vivido.

Racionalidade instrumental ou técnica: “Essa racionalidade define-se pela relação meios-


fins, ou seja, pela organização de meios adequados para atingir determinados fins ou pela
escolha entre alternativas estratégicas com vistas à consecução de objetivos” (GONÇALVES,
1999, p. 127). Preponderante no mundo sistêmico.

Relativismo ético: Perspectiva teórica que afirma a impossibilidade de estabelecer


hierarquias de valores morais e que, portanto, “nenhum sistema ético pode proclamar que é
superior a outro”. Nessa perspectiva, “as normas e os valores variam não só de pessoa para
pessoa, como também de cultura para cultura” (LOURENÇO, 2002).

Universalismo ético: Conceito que se opõe ao conceito de relativismo ético. Na perspectiva


do universalismo ético existe “um certo número de princípios morais que podem ser
universalizáveis, ou seja, que deviam ser seguidos por todos, sempre e em quaisquer
circunstâncias, já que tais princípios pretendem assegurar os direitos individuais
fundamentais” (LOURENÇO, 2002).

Valor: “Caráter do que, de modo relativo (ou para um só ou para alguns) ou de modo
absoluto (para todos), é tido ou deve ser tido como objeto de estima ou de desejo”
(FERREIRA, 1999). Aquilo que uma pessoa, grupo de pessoas ou de culturas entendem digno
de ser alcançado para orientar as ações. A teoria de Kohlberg traz o valor como questão
central (LOURENÇO, 2002).

Valores morais: “Refere-se a tudo o que é susceptível de orientar a ação e o pensamento em


situações normativas ou prescritivas. No contexto da teoria de Kohlberg em particular, este
termo designa o curso de ação escolhido pela pessoa quando responde a alguns dos dilemas
que constam da sua entrevista de juízo moral. Nesta teoria, os valores morais são
considerados uma categoria de conteúdo, não uma categoria estrutural” (LOURENÇO, 2002).
221

APÊNDICES

APÊNDICE A - Planilha de análise (parte inicial referente a trabalhos do VI ENPEC)


Ficha mista de análise - delineamento do VI ENPEC (modalidade “Comunicação Oral”)
Id. Seção Artigo Nº de presença do termo Excertos / Contextos / Ideias
(VI) Piag Kohlb Ética Moral Haber Durkh em que os termos aparecem
1 1 1 - - - - - - Link quebrado.
2 1 2 - - - 2 - - “lição moral”; “ensinamento moral” (dimensões que as
narrativas dos professores envolvem / dimensão utilitária das
narrativas).
3 1 3 - - - - - -
4 1 4 - - - - - -
5 1 5 - - - - - -
6 1 6 - - 2 1 - - “A ética do cuidado de si como prática da liberdade. In:
Foucault, Michael. Ditos e escritos: ética, sexualidade,
política” (título de livro na lista de referências).
“...em algumas ocasiões pode ser vista como uma rejeição
cínica, arrogante, ou mesmo ingênua de formas opressivas de
regulação moral e política” (citação de Giroux sobre
formação de professores e conceitos de dominação
hegemônica e resistência).
7 2 1 - - 3 - - - “princípios éticos”; “autogestão e ética nas relações
sociais”; “novos padrões de conduta baseados em uma nova
relação ética, com enfoque ambiental” (inserção em conceitos
de meio ambiente e/ou enfoque ambiental, em citações de
autores diversos).
8 2 2 - - 1 - - - “...ao se pensar a alfabetização científica: o entendimento
das relações existentes entre ciência, tecnologia, sociedade e,
mais recentemente, meio-ambiente; a compreensão da
natureza da ciência e dos fatores éticos e políticos...” (Sobre
aspectos da alfabetização científica; com enfoque CTSA).
9 2 3 - - 1 - - - (Nome de livro na lista de referências).
10 2 4 - - - - - -
11 2 5 - - - - - -
12 2 6 - - 1 - - - (Nome de livro da lista de referências).
13 3 1 8 - - - - - (Nenhuma citação relacionada ao objeto moralidade. O termo
aparece na lista de referências e em discussões diversas sobre
mudança conceitual, adaptação ao meio, equilibração etc.).
14 3 2 - - - - - - Link quebrado.
15 3 3 - - 1 - - - “dimensão ético-política” (inserida em citação sobre as
dimensões da prática docente).
16 3 4 - - 1 - - - (Nome de livro da lista de referências).
17 3 5 - - 1 - - - “...em direcção a considerações CTS mais amplas, no
domínio da ética e dos valores”. (Citação de autor sobre
enfoque CTSA).
18 3 6 - - - - - -
19 4 1 - - 1 - - - “A prática do ensino de ciências é enriquecida pelas
informações (e reconstruções) colhidas da história da ciência,
podendo humanizar as ciências e aproximá-las dos interesses
pessoais, éticos, culturais e políticos da comunidade...”
(Citação de autor sobre enfoque da História da Ciência).
20 4 2 - - 1 - - - “A primeira idéia de sífilis foi associada a uma entidade
nosológica de fundo ético-místico em que as doutrinas
religiosas a encaravam como um castigo baseadas em sua
forma de transmissão e a enfermidade foi associada a
aspectos astrológicos”. (Citando Fleck sobre a evolução da
idéia da sífilis).
21 4 3 - - - - - -
22 4 4 - - - - -
23 4 5 - - - - - -
24 4 6 - - - - - -
25 5 1 - - - - - -
26 5 2 - - 9 1 - - “relação ética”; “valores éticos”; “ética preservacionista”;
“imposição de nova ética”; “novas dinâmicas éticas e
morais”; “postura ética”; “ética compartilhada por todos - a
ética da responsabilidade” (Correlacionando conceitos de
Educação Ambiental, empresas e responsabilidade social);
“Modernidad, medio ambiente y ética...” (Nome de livro na
lista de referências).
“...novas dinâmicas éticas e morais das organizações
modernas...” (Sobre Educação Ambiental em empresas).
222

APÊNDICE B - Planilha de análise (parte inicial referente a trabalhos da Ensaio)

Ficha mista de análise - revista Ensaio


Id. v./n. Título Nº de presença do termo Excertos / Contextos / Ideias
(E) artigo Piag Kohlb Ética Moral Haber Durkh em que os termos aparecem
1 1/1 O prof - - - - - -
2 1/1 Expli 2 - - - - - - “...ideias de Piaget e Garcia (1987), discutem como
significações para novas entidades são construídas através da
ação...”
- Na referência: Piaget e Garcia (1987) Vers une lógique dês
significations. Genève: Murionde.
3 1/1 Model 14 - - - - - Construção de conhecimento; psicogênese; estruturas
cognitivas.
4 1/1 Estud - - - - - - Texto integral indisponível - artigo não analisado.
5 1/1 Como 4 - - - - - Construtivismo / Psicogênese: “...construção de estruturas
(Piaget e Garcia, 1989)”.
Nome de livro: “BLISS, J. (1995). Piaget and after: the case of
learning science. Studies in Science Education, 25, 139-172”.
Na referência: “PIAGET, J. and GARCIA, R. (1989).
Psychogenesis and the History of Science. New York:
Columbia University Press”.
6 2/1 Nar - - 3 1 - - -Ética: CTS (genética); defesa de narrativas: “...a relação CTS
envolve aspectos morais, éticos e sociais”; “O uso das
narrativas, no ensino de ciências, apresenta condições para
explorar a relação CTS, na medida em que pode propiciar
reflexões acerca dos aspectos éticos...”
-Moral: “...a relação CTS envolve aspectos morais...”
7 2/1 Racio 8 - - 2 - - -Piaget: Estruturas cognitivas piagetianas; respostas morais a
experimentos; uso de estratégias piagetianas de entrevista etc.
Nas referências: Piaget, J. (1973). La Causalidad Física en el
Niño. Madrid: Morata. (Tradução de: La representation du
monde chez l’enfant, 1927); Piaget, J. e Inhelder, B. (1967).
De la Lógica de Niño a la Lógica del adolescente. Buenos
Aires: Paidós. (Tradução de: De la Logique de l’enfant a la
logique de L`adolescent, 1955).
-Moral: categoria de análise de respostas de alunos: “Com
relação à explicação dada ao fenômeno da flutuação dos
corpos, tínhamos a expectativa de que poderiam ocorrer as
seguintes possibilidades: respostas baseadas no tamanho, no
peso, na densidade, além de respostas animistas e morais...”
8 2/1 Estru - - - - - - Texto integral indisponível - artigo não analisado.
9 2/1 As no 1 - - - - - Construtivismo: “...a idéia de construção do conhecimento
está presente na obra de vários autores, como Piaget...”
10 2/1 As ilh - - 2 - - - Sobre decisões éticas e normas de ação (elaboração de
projetos): “É o momento de levantar as normas e/ou leis que
regem situação, do ponto de vista técnico, ético ou comercial,
bem como as normas definidas pela cultura”;
“...correspondendo a decisões éticas e políticas...”
11 2/2 Uma a - - 13 - 5 - -Ética: Relaciona ciência e ética; cita Fourez; CTS; ética com
bases filosóficas.
-Habermas aparece sobre relação entre técnica e ciência,
dominação etc.
12 2/2 Repo - - - - - -
13 2/2 Arg - - - - - -
14 2/2 Form - - 1 2 - - -Moral: [sobre Dolly;genoma] “Para enfrentar os
questionamentos de ordem ética, moral, religiosa...”; sobre a
demoralização do professor: “...desmoralização de uma
profissão...”
15 2/2 Ana - - - - - -
16 3/1 Dife - - - - - -
17 3/1 Mod - - - - - -
18 3/1 Alfa - - - - - -
19 3/1 A atu - - - - - -
20 3/1 Mud 3 - - - - - Ref. a estruturas cognitivas - sem menções a moralidade.
21 3/2 A rup - - - - - -
22 3/2 Alfa - - 3 1 - - Argumentos baseados em Fourez (questões éticas da ciência,
progresso científico não relacionado à moral).
23 3/2 A com - - - - - - link quebrado
24 3/2 A his - - - 2 - - Sobre aspectos morais em disputas acadêmicas - ausência de
menções ao des. moral e às nossas referências.
25 3/2 Alfa - - - 2 - - Relacionando burguesia-trabalho-sociedade. Ausência de
menções relacionadas ao nosso interesse
223

ANEXOS

ANEXO A - O caso do professor John Scopes

41
O jornal “The Onion”, de 20 de julho de 1925, com a repercussão do caso Scopes

O professor John Scopes (de camisa branca, à esquerda) a caminho do tribunal e um dos textos utilizados
42
por ele em suas aulas (página 193 do livro Hunter's Civic Biology, de 1914) .

41
Reproduzido com a permissão do THE ONION. Copyright © 2008, by ONION, INC.www.theonion.com.
42
Reprodução autorizada por Douglas O. Linder, professor da University of Missouri-Kansas City School of
Law (http://www.law.umkc.edu/faculty/projects/ftrials/scopes/scopes.htm).
224

ANEXO B - Jornais “The Denver Post” (2000)43 e “Folha de São Paulo” ( 2004)44

43
Fonte: MOORE, Randy. The revival of creationism in the United States. Journal of Biological Education, v.
35, n. 1, p. 17-21, 2000.
44
Versão on-line da Folha de São Paulo, com artigo de Augusto Gazir sobre a introdução do ensino do
criacionismo nas escolas estaduais do Rio de Janeiro.
225

ANEXO C - Quadrinho de Henfil, publicada na revista mensal Fradim45, número 16, em


1976, editada no Rio de Janeiro pela editora Codecri.

Reprodução das falas dos quadrinhos

1. Tô adorando morar na Urca! Pena que a praia lá seja cheia de pretos! Um horror...
2. Estou com uma empregada ótima! A negrinha é limpa, acaba a cozinha e vai pro
quarto...
3. Macumba? Eu, heim? Vou lá me meter com estas ignorâncias de preto...
4. Ronaldo vai se casar, sabia? Ela é de família, branca...
5. O Rex está enorme! É a segurança da casa. Menina, ele não pode ver preto! Uma beleza!
Dá cada corrida na negrada e...
6. Ô Rossana! Ele também é filho de Deus, minha filha! Onde é que você aprendeu isto?

45
Sobre os personagens e as temáticas da revista, vide: IZIDRO, S. C. Os Fradins de Henfil, Agâque, São Paulo,
v. 2, n. 2, out. 1999.
226

ANEXO D - Tira do cartunista Laerte contendo sátira de uma possível relação ética
entre professor e aluno (ambiente de heteronomia moral)46

46
Reprodução autorizada pelo autor, o cartunista Laerte.
227

ANEXO E - Trechos originais e traduzidos47 de diálogos apresentados em pesquisa de


Blatt e Kohlberg (1975, p. 155-161)
Dilemma:
There was a case in court the other day about a man, Mr Jones, who had an accident in his house. His child, Mike, was wounded in the chest.
He was bleeding heavily, his shoes and pants were soaked with blood. Mike was scared. He began screaming until he finally lost
consciousness.
His parents were scared, too. His mother began screaming, crying. She thought her child was dying. The father no longer hesitated; he lifted
Mike up, ran down the stairs and went outside in hopes of getting a cab and going to the hospital. He thought that getting a cab would be
quicker than calling an ambulance. But, there were no cabs on the street and Mike's bleeding seemed worse.
Suddenly, Mike's father noticed a man parking his car. He ran up and asked the man to take him to the hospital. The man replied, ' Look, I
have an appointment with a man about an important job. I really must be on time. I'd like to help you but I can't.' So Mr Jones said, ‘Just give
me the car.’ The man said, ' Look, I don't know you. I don't trust you.' Mr Jones told Mrs Jones to hold Mike. She did. Then Mr Jones
punched the man. beat him up, took his keys and drove away toward the hospital. The man got up from the street, called the police, and took
them to the hospital. The police arrested Mr Jones for car theft and aggravated battery.

Eleven-Year-Old — Common Man — 15th Session

Mr Blatt: What is the problem? Was the man legally wrong for refusing to drive Mr Jones and Mike to the hospital?
Student A: It's his car, he doesn't have to drive.
Mr B: Well, Mike was hurt. You said no, he's not legally responsible, because, why not?
Student A: Because it's his car.
Mr B: It's his car. It's his property, and he has the right of property and he can legally —
Student B: But a life is at stake.
Mr B: Okay. It's not so easy. Like here is property, but here is life, so the conflict here is between life, Mike's life, or that man's car.
Student B: But if Mike died, then that guy could be charged with murder, because, you know...
Student C: No, he couldn't. (Argument over whether he could or could not be charged with murder.)
Mr B: But do you people think this man has a right, a legal right, to refuse to give Mr Jones the car?
Student D: Does that man have children; he probably has to support a family, he's got a family, he can't just —
Student E: So? He can always find a job —
Mr B: The question is, do you think that the man who had the job, wouldn't he understand if you came up to him and said, 'Look, I was here,
I wanted to be on time, but I saw this boy bleeding, and I wanted to help him out.' Don't you think he would understand? (Chorus of ‘yes’
and ‘no’.)
Student F: No, because if you're supposed to go on the job —
Student G: You could make him show some proof.
Student F: Bring the kid there when he's well.
Mr B: All right. This man, who refused to give the car was not legally wrong. You couldn't take him to court. But do you think he was
wrong in any way? (Chorus of ‘yes’).
Student B: He was just all wrong because if that kid died, I don't know what he'd be charged with, but he'd be charged with something.
There's something, I don't know what it is, but there's something they could charge him with.
Mr B: I don't know if they could charge him legally, but you're right; there's something very wrong with that, because what is this man
doing? Which is more important: property or life? (Chorus of 'life'.) Why? (Confused answers, on the principle that life is irreplaceable.) Life
is something you can't replace, right? Everybody wants to live. Now this guy, what was he putting first, life or a job? What do you think is
more important, losing a job and maybe getting another one, or saving a life? (Answers: ' saving a life.') Helping to save a life. But this guy
refuses to help Mr Jones and Mike out, to take them to the hospital. What was he doing? He was putting his property before somebody else's
life? (Answers: 'saving a life'.) Helping to save a life. But this guy you to lend me your car, Til bring it back.' The guy said,' No, I don't trust
you.'
Student A: Well, he didn't know Mr Jones, maybe he didn't trust him.
Student D: What did he look like?
Student A: Yeah, I wouldn't trust nobody with my car.
Student H: Well, I would trust him if I knew him. (Confused comments about whether they would or would not trust somebody with their
car.)
Student B: Would you care if you trust him or not?
Student E: Well, I wouldn't go so far as to beat him up and to take his car. He might still need it. (Conversation on beating up somebody.)
Mr B: So what you're saying is, this man's value, what he thought was most important was his property. His property was more important to
him than somebody else's life. You said legally he was right. Right? (Agreements.) Can you say morally he was right? (Undistinguishable
answers.) What do you mean by morally? Can somebody tell us what is meant by morally?
Student C: It's — there's not a law but —
MrB: What kind of a law may be involved? It's not a legal law, although it may be, it doesn't have to be. What kind of law is it? What were
you saying before, about your mother? What did she say?
Student B: God's law.
Mr B: God's law, what does it say about killing?
Student B: Thou shalt not kilL
Students B and F: God's law is moral law.
Mr B: What do you mean?
Student B: Cause this is the laws of this country and God has moral laws for everybody.
Mr B: Oh, so what you're saying is — did you listen to what he's saying? Would you repeat what you said? It's very important
Student B: God's law is for everyone and there's different laws in different countries, so God's law, his moral laws are for everyone.
Student D: God's laws include more people than laws down here, yes.

47
Tradução nossa.
228

Mr B: Now what you're saying is that God's laws are for all people regardless of where you live. And so, they're universal laws, right?
They're for the whole universe, is what you're saying. All right Now you said, from the legal point of view he was right from a moral point of
view he was wrong. He had a legal right to refuse his property but no moral right to do so. Now what about Mr Jones? Was Mr Jones
justified from a legal point of view, in beating up the man and taking his car? (Chorus of' no'.) Why not?
Student B: Because there's a law that like, that guy's car, you know, he can say whatever he likes about it, he has a right to do what he wants
with it, but with the moral law [Mr Jones] was doing pretty good.
Mr B: He was doing right? Do you agree with him? He says that Mr Jones was doing right from a moral point of view.
Student B: But it still went outside God's law, going against the law. Thou shalt not steal.
Mr B: So what you're saying is —
Student D: There's a problem. It's still stealing.
Student F: Yes, he should have asked him. If the man said no, that should have been the answer.
Mr B: Did he have a moral right to beat up the man and take his car? (Chorus of' no'.) Why not?
Student F: He didn't have no right to do it.
Student B: There's another moral law...
Mr B: Now, Mr Jones was brought before the judge. Should the judge consider the circumstances and let Mr Jones off free — (Chorus of
'yes') or should he give him punishment and what punishment and why?
Student B: I'd give him a week. (Argument in which the following is distinguishable: Mr B : 'Why would you give him ? Student F : 'Yes,
he didn't hurt the guy.' Student I: ' It still was a car theft'. Student F : ' He's got to get out and support his family again.').
Mr B: What is the reason for punishment? Why do you think he needs to be punished? And, should he be punished for what he did or to
teach him next time not to do something like that?
Student B: Well, it [wouldn't] teach him to do that
Student D: No, he'll go out and do it again if you don't —
Student B: If your son was bleeding and you can't say if it happens again, if you're going to do the same thing.
Mr B: What did you — what were you about to say?
Student F: He couldn't help it; he couldn't stand there; by the time some help came he could have been dead.
Mr B: So what you're saying is, you wouldn't give him a big punishment?
Student D: I wouldn't give him one at all. Why not?
Student D: Look, he couldn't help it that much for saving a life. He couldn't just stand there and—
Mr B: What you're saying is to understand the situation he was in, the circumstance that he has a boy who was dying, his son was dying in
his hands. And you would understand that he didn't steal to be greedy, he did it to save a life, and you'd understand this and you'd let him off
because what he was doing, saving a life, was moral. Is that right? (Chorus of 'yes'.) Now about punishment — Why do we give punishment?
Why do we punish criminals?
Student B: Like I said, so they won't do it again.
Mr B: Do you think that given the same situation, if he would get punishment, he'd do the same thing again? Well?
Student B: I think he would, too.
Student F: He'd probably go and be hysterical.
Mr B: Is it a matter of being hysterical or a matter of saving a life again?
Student B: He'd be out of his mind.
Mr B: He'd save a life again. Even if you were in your right mind — And therefore, punishing him would not really teach him a lesson,
would it?

Comment:
The experimenter in the early portion of the transcript is endeavouring to get the students to sense a conflict between the legal and the moral.
He endeavours to get students to see that the reasons which lead them to feel that the law is not the deciding element, reasons are general or
moral, that they can relate to a more universal moral law, and involves the experimenter in attempting to translate the Stage 2 and Stage 3
thinking of the children into a Stage 4 level which is also compatible with Stage 5 reasoning and to develop a set of distinctions (moral
versus legal, etc) in terms of which there is some possibility of consensus across levels. This pattern of teaching, effective with the Study 1
children, may have been oriented to too high a stage and too high a level of abstraction for this group.

Fifteen-Year-Old — Disadvantaged — 15th Session

Mr Blatt: Would you have done that?


Student A: No. (Unclear.)
Mr B: One at a time. Go ahead. What?
Student A: He should have called the ambulance. He can't make nobody do something he don't want to do. (Inaudible rejoinder.)
Mr B: Was the man who refused to give Mr Jones the car, was he perfectly okay in what he did?
Student B: He could do anything he wanted to do with is own car. (Agreements.) And still, he could just go along. Or he could have helped
the man if he wanted to, but only if he wanted to.
Mr B: All right. Mr Jones stole the car. Does Mr Jones have the legal right to beat up the man and take his car?
Student B: He doesn't have the legal right, no.
Mr B: No. Because this guy has a right to property and Mr Jones obviously has no right to hurt this guy. Now, what was involved on his
side? What was Mr Jones' problem? (Chorus of ' the boy'.) And there was a case of life, right? (Chorus of * right'.) This guy's right to
property conflicts with this guy's right to life.
Student C: Yes, but the law doesn't say you can't steal unless somebody's life is involved. The law says you can't steal.
Mr B: So what you're saying is, according to the law it doesn't make any difference when you steal. Stealing is stealing, and wrong. Okay?
(Chorus of'right'.)
Student A: He was wrong to take the car.
Student C: You got to have a reason for what you steal.
Mr B: Suppose you steal when you're hungry. You steal food, you're hungry, you don't have any money.
Student A: That's against the law.
Student C: There a reason for it
Student A: You get caught, I bet you get put in jail, don't you? Stealing a car. that's the same thing.
Student B: But this man had a real good reason for stealing the car.
Student A: What is a good reason for you doesn't have to be a good reason for somebody else.
Student B: If you were bleeding and your father was running around with you trying to get somebody to take you to the hospital and you
know good and well that you want your father to hit that dude and take that car, wouldn't you?
229

Student A: No!
Student B: Yes, you would. You'd be laying there, bleeding to death, wouldn't you? You'd let your own self die?
Student A: But I'm saying that it's against the law. You took something that wasn't yours.
Mr B: All right, let me ask you, ' What is the purpose of the law?' (Two or three answer, ' To protect'.) To protect people and their property.
In this case suppose you have here a person whose life is hi danger. You say the function of the law is to protect the people. All right. Now, it
has to protect life —
Student A: But what about the property part? What about the other person. He has to be protected, too.
Mr B: You're saying that it's not only this guy who has to be protected, it's also the other guy that has to be protected. Okay, but suppose this
guy's right to property interferes with this guy's right to life. Is property and life the same?
Student A: That car may depend on that other man's life. too. He has to get a job. If he don't get it, he might die. You have to see what a
person thinks is more valuable, a life or a car.
Mr B: So what you're saying is. circumstances don't make a difference. Stealing is stealing, no matter what. (Chorus of 'No'. Another chorus
of 'Yes'.) Defend yourself.
Student A: I will not change my mind. Why should it make a difference? Tell me one good solid reason why it should. That's just like telling
a doctor that he should take a man's life so he can save his best friend's life. Like bis best friend needs a heart so he's going to go out and kill
somebody.
Student D: It's wrong. I'd rather my friend died. Taking somebody else's heart to have his friend's life—
Mr B: But there you're depriving someone of life. You're saying that property equals life?
Student A: He had a good reason but that doesn't mean it's right
Mr B: What kind of reason are you talking about? (Argument.)
Student E: A moral reason.
Student B: Legally it's wrong, morally it's right. (Argument.)
Student A: We are not arguing moral, we're arguing legal.
Mr B: I want you to consider both, moral and legal. All right Mr Jones is brought before the judge. What punishment should Mr Jones get
and why?
Student I: A fine, about a hundred dollars.
Mr B: All right, what's the purpose of punishment? What's the function of punishment?
Student A: So you won't do it again.
Mr B: All right this is one. Any other reason?
Student A: To make the other person feel good.
Mr B: So what you're saying is — I don't understand why?
Student A: So, like, if somebody kills your child, or your mother, or father, or friend, and they get punished it'll make you feel better,
maybe.
Mr B: Okay, so what you're saying is that we —
Student A: Satisfy the man.
Mr B: Satisfy the man, and we have a good reason. To prevent others —
Student A: Protecting people's rights.

In this class, the discussion centres around Student A's position that taking the car was unjustified. Student A's position is a mixture of Stage
1 (It's still stealing, I'll bet you get put in jail) and Stage 2 (You can't make somebody do something he don't want to do). His view is that
apart from law and punishment everything is arbitrary (in a Stage 2 sense). 'What is a good reason for you doesn't have to be a good reason
for someone else,' ' You have to see what a person thinks is more valuable, a life or a car.' The teacher as well as the other students attempt to
convince him that there are good reasons independent of the law which may be formulated at a Stage 2 or 3 level, and that you should think
of the ' morally right' and of ' good reasons' as well as the legally right. The teacher's purpose and structuring is similar to that in the first
session, but there is a sustained spontaneous dialogue. Student A, though unwilling to shift the content of his choice seems to move toward
accepting the notion that there are good reasons, though he insists,' We are not arguing moral, we are arguing legal.'

--------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------

Dilema:

Outro dia houve um caso em um tribunal sobre um homem, o Sr. Jones, que sofreu um acidente em sua casa. Seu filho, Mike, foi ferido no
peito. Ele estava sangrando muito, os sapatos e as calças estavam encharcados de sangue. Mike estava com medo. Ele começou a gritar até
que finalmente perdeu a consciência.
Seus pais também estavam com medo. Sua mãe começou a gritar e a chorar. Ela pensou que seu filho estava morrendo. O pai não hesitou;
pegou Mike, desceu as escadas e foi para fora na esperança de conseguir um táxi e ir ao hospital. Ele pensou que conseguir um táxi seria
mais rápido do que chamar uma ambulância. No entanto, não havia táxi na rua e o sangramento de Mike parecia pior.
De repente, o pai de Mike viu um homem estacionando um carro. Ele correu e pediu ao homem para levá-lo ao hospital. O homem
respondeu: “Olha, eu tenho um compromisso com uma pessoa sobre um trabalho importante. Eu realmente devo estar lá na hora certa. Eu
gostaria de ajudá-lo, mas não posso”. Então, Sr. Jones disse: “Então, apenas empresta o carro”. O homem disse: “Olha, eu não te conheço. Eu
não confio em você.” O Sr. Jones pediu para sua esposa, Sra. Jones, segurar Mike. Ela o fez. Então o Sr. Jones deu um soco no homem,
pegou as chaves dele e partiu em direção ao hospital. O homem levantou-se da rua, chamou a polícia e a levou para o hospital. A polícia
prendeu o Sr. Jones por roubo de carro e agressão.

Sessão 15 - Onze Anos - Homem Comum

Sr. Blatt: Qual é o problema? O homem estava legalmente errado por se recusar a levar Sr Jones e Mike para o hospital?
Aluno A: É o seu carro, ele não tem que dirigir.
Sr. B: Bem, Mike ficou ferido. Você disse que não, ele não é legalmente responsável, porque, por que não?
Aluno A: Porque é o seu carro.
Sr. B: É o seu carro. É sua propriedade, e ele tem o direito de propriedade e ele pode legalmente -
Aluno B: Mas a vida está em jogo.
Sr. B: Certo. Não é tão fácil. Aqui é a propriedade, mas aqui é a vida, então o conflito que temos é entre a vida, a vida de Mike, ou o carro do
homem.
Aluno B: Mas se o Mike morre, então o cara poderia ser acusado de homicídio, porque, você sabe...
230

Aluno C: Não, ele não poderia. (Discussão se o homem poderia ou não ser acusado de homicídio).
Sr. B: Mas você acha que as pessoas, como este homem, têm direito, um direito legal de se recusar a dar o carro ao Sr. Jones?
Aluno D: Será que o homem tem filhos, ele provavelmente tem que sustentar uma família, ele tem uma família, ele não pode simplesmente -
Aluno E: E então? Ele sempre pode encontrar um emprego -
Sr. B: A questão é, você acha que o homem que daria o trabalho não iria entender se você chegasse e falasse: ‘Olha, eu queria estar aqui, eu
queria estar na hora marcada, mas eu vi o sangramento do menino e quis ajudá-lo’. Você não acha que ele entenderia? (Refrão de “sim” e
“não”).
Aluno F: Não, porque se você está comprometido a ir ver o trabalho -
Aluno G: Você poderia fazer ele mostrar alguma prova.
Aluno F: Levar a criança lá, quando estivesse bem.
Sr. B: Tudo bem. Este homem, que se recusou a dar o carro, não era legalmente errado. Você não poderia levá-lo ao tribunal. Mas você acha
que ele estava errado de alguma forma? (Refrão de “sim”).
Aluno B: Ele estava todo errado, porque se o garoto morre, eu não sei do que ele seria acusado, mas ele seria acusado de algo. Há algo, eu
não sei o que é, mas há algo de que eles poderiam acusá-lo.
Sr. B: Eu não sei se eles poderiam acusá-lo na forma da lei, mas você está certo, há algo muito errado com isso, porque o que este homem
estava pensando? Qual é mais importante: a propriedade ou a vida? (Coro de “Vida”). Por quê? (Respostas confusas sobre o princípio de que
a vida é insubstituível). A vida é algo que você não pode substituir, certo? Todo mundo quer viver. Agora esse cara, o que ele estava
colocando em primeiro lugar, a vida ou um emprego? O que você acha que é mais importante, perder o emprego e talvez conseguir um outro,
ou salvar uma vida? (Respostas: “Salvar uma vida”). Ajudar a salvar uma vida. Mas esse cara se recusa a ajudar o Sr. Jones a levar Mike ao
hospital. O que ele estava fazendo? Ele tinha que colocar em primeiro lugar a sua propriedade ou salvar uma vida? (Respostas: “Salvar uma
vida”). Ajudar a salvar uma vida. Mas esse cara que você pede para emprestar o carro e depois trazê-lo de volta diz: “Não, eu não confio em
você”.
Aluno A: Bem, ele não conhecia o Sr. Jones, talvez ele não confiava nele.
Aluno D: Com quem ele se parece?
Aluno A: Sim, eu não confio em ninguém com o meu carro.
Aluno H: Bem, eu confio se eu o conheço. (Comentários confusos sobre confiar ou não em alguém com o carro.)
Aluno B: Você se importaria de confiar nele ou não?
Aluno E: Bem, eu não iria tão longe a ponto de espancá-lo e tomar seu carro. Ele ainda pode precisar dele. (Conversa de espancar alguém).
Sr. B: Então o que você está dizendo é que o valor deste homem, que ele achava mais importante era sua propriedade. Sua propriedade era
mais importante para ele do que a vida de alguém. Você disse que juridicamente ele estava certo. Certo? (Aceitação). Pode-se dizer
moralmente ele estava certo? (Respostas indistinguíveis.) O que você entende por moral? Alguém pode nos dizer o que se entende por
moral?
Aluno C: É - não há uma lei, mas -
Sr. B: Que tipo de lei pode estar envolvida? Não é um direito legal, embora possa ser, não tem que ser. Que tipo de direito é esse? O que
você estava dizendo antes, da sua mãe? O que ela disse?
Aluno B: A lei de Deus.
Sr. B: A lei de Deus diz o que sobre matança?
Aluno B: “Não matarás”.
Os alunos B e F: A lei de Deus é a lei moral.
Sr. B: O que você quer dizer?
Aluno B: Porque esta é a lei deste país e as leis morais de Deus são para todos.
Sr B: Ah, então o que você está dizendo - você escutou o que ele está dizendo? Poderia repetir o que você disse? É muito importante.
Aluno B: A lei de Deus é para todos e não há leis diferentes em países diferentes, por isso a
lei de Deus, suas leis morais são para todos.
Aluno D: As leis de Deus incluem mais pessoas do que as leis aqui, sim.
Sr. B: Agora o que você está dizendo é que as leis de Deus são para todas as pessoas, independentemente de onde você mora. E assim, elas
são leis universais, certo? Elas são para todo o universo, é o que você está dizendo. Tudo bem, você disse que do ponto de vista jurídico ele
estava certo, mas do ponto de vista moral ele estava errado. Ele tinha o direito legal de recusar a sua propriedade, mas não tem o direito
moral de fazê-lo. Agora, o que acontece com o Sr. Jones? Foi justo do ponto de vista jurídico o Sr. Jones espancar o homem e pegar o carro?
(Refrão de "não"). Por que não?
Aluno B: Porque não há uma lei que, assim como, o carro do cara, você sabe, pode dizer o que quiser sobre isso, ele tem o direito de fazer o
que quiser com ele, mas com a lei moral [Sr Jones] estava fazendo certo.
Sr. B: Ele estava fazendo certo? Você concorda com ele? Ele diz que o Sr. Jones estava fazendo o certo do ponto de vista moral.
Aluno B: Mas ele saiu da lei de Deus, indo contra a lei. Não furtarás.
Sr. B: Então o que você está dizendo é -
Aluno D: Há um problema. Ainda é roubar.
Aluno F: Sim, ele deveria ter perguntado a ele. Se o homem disse que não, que deveria ter sido a resposta.
Sr. B: Será que ele tem o direito moral de espancar o homem e levar o seu carro? (Refrão de "não"). Por que não?
Aluno F: Ele não tinha nenhum direito de fazê-lo.
Aluno B: Há uma outra lei moral...
Sr. B: Agora, Sr Jones foi levado perante o juiz. Caso o juiz considere as circunstâncias, deve deixar o Sr. Jones livre? - (Coro do "sim") ou
que pena e que castigo e por quê?
Aluno B: Eu daria a ele uma semana. (Argumento em que o seguinte é distinguível: Sr B: “Por que você daria a ele?”. Aluno F: “Sim, ele
não feriu o rapaz”. Aluno I: “Ainda assim, é um roubo de carro”. Aluno F: “Ele tem que sair e sustentar sua família novamente”).
Sr. B: Qual é o motivo para a punição? Por que você acha que ele precisa ser punido? E, ele deve ser punido pelo que fez ou ensiná-lo da
próxima vez a não fazer uma coisa dessas?
Aluno B: Bem, não [se] ensiná-lo a fazer isso.
Aluno D: Não, vai sair e fazer isso de novo, se você não -
Aluno B: Se o seu filho estiver sangrando, você não pode dizer se isso acontecer novamente, se você está indo fazer a mesma coisa.
Sr. B: O que você - o que você estava prestes a dizer?
Aluno F: Ele não poderia ajudá-lo, ele não poderia ficar lá, esperando chegar alguma ajuda, ele poderia ter morrido.
Sr. B: Então o que você está dizendo é que você não iria lhe dar uma punição severa?
Aluno D: Eu não lhe daria nenhum. Por que não?
Aluno D: Olha, ele não poderia ajudar muito para salvar uma vida. Ele não podia ficar ali e-
Sr. B: O que você está dizendo é compreender a situação em que estava, a circunstância de que tem um menino que estava morrendo, seu
filho estava morrendo em suas mãos. E você entenderia que ele não roubou para ser ganancioso, ele fez isso para salvar uma vida, e você
231

entender isso e você deixá-lo fora porque o que ele estava fazendo, salvar uma vida, era moral. É isso mesmo? (Refrão de “sim”). Agora,
sobre o castigo - Por que dar a punição? Por que punir os criminosos?
Aluno B: Como eu disse, para que eles não façam isso de novo.
Sr. B: Você acha que, dada a mesma situação, se ele ficar de castigo, ele não faria a
mesma coisa outra vez? Certo?
Aluno B: Eu acho isso também.
Aluno F: Ele provavelmente vai ficar furioso.
Sr. B: É uma questão de ser furioso ou uma questão de salvar uma vida outra vez?
Aluno B: Ele estaria fora de seu controle.
Sr. B: Ele ia salvar uma vida novamente. Mesmo se você estivesse no seu juízo perfeito - e, portanto, puni-lo não seria realmente ensinar
uma lição a ele, não é?

Comentário:

O pesquisador, na parte inicial da transcrição, está se esforçando para levar os alunos a perceberem um conflito entre o legal e o moral. Ele se
esforça para levar os alunos a verem que as razões que os levam a sentir que a lei não é o elemento decisivo são de caráter geral ou de moral
que eles podem relacionar com uma lei moral universal, e envolve o pesquisador na tentativa de traduzir os estágios 2 e 3 pensando que as
crianças estão dentro do estágio 4 que também é compatível com raciocínios do estágio 5 e desenvolver um conjunto de distinções (moral
versus jurídica, etc) em termos de que há alguma possibilidade de consenso entre os diferentes níveis. Este padrão de ensino, eficaz com o
Estudo 1 da criança, pode ter sido orientado para um estágio muito alto e também para um nível alto de abstração para este grupo.

Sessão 15 - Quinze Anos - Desvantagens

Sr. Blatt: Você teria feito isso?


Aluno A: Não. (Não esclareceu).
Sr. B: Um de cada vez. Vá em frente. O quê?
Aluno A: Ele deveria ter chamado a ambulância. Ele não poderia forçar ninguém a fazer algo que ele não quisesse fazer. (Tréplica
inaudível).
Sr. B: O homem que se recusou a dar a Sr Jones o carro, ele agiu perfeitamente bem?
Aluno B: Ele poderia fazer qualquer coisa que quisesse fazer com o próprio carro. (Aceitação). E ainda, ele poderia apenas ir junto. Ou ele
poderia ter ajudado o homem se ele quisesse, mas só se ele quisesse.
Sr. B: Tudo bem. Sr Jones roubou o carro. Será que o Sr. Jones tem o direito de espancar o homem e levar o seu carro?
Aluno B: Ele não tem o direito legal, não.
Sr. B: Não. Porque esse cara tem o direito de propriedade e o Sr. Jones, obviamente, não tem o direito de ferir esse cara. Agora, o que estava
envolvido nesse caso? Qual era o problema de Sr Jones? (Refrão de “O menino”). E houve um caso de vida, certo? (Refrão de “certo”). Esse
caso é de conflito de propriedade com o direito à vida.
Aluno C: Sim, mas a lei não diz que você pode roubar quando a vida de alguém está envolvido. A lei diz que você não pode roubar.
Sr. B: Então, o que você está dizendo é que, de acordo com a lei, não faz qualquer diferença quando você roubar. Roubar é roubar e é errado.
Certo? (Refrão de “certo”).
Aluno A: Ele errou ao levar o carro.
Aluno C: Você tem que ter uma razão para o que você roubar.
Sr. B: Suponha que você rouba quando está com fome. Você rouba comida, você está com fome, você não tem nenhum dinheiro.
Aluno A: Isso é contra a lei.
Aluno C: Há uma razão para isso.
Aluno A: Se for pego, eu aposto que você é colocado na cadeia, não é? Roubar um carro é a mesma coisa.
Aluno B: Mas este homem tinha um motivo muito bom para roubar o carro.
Aluno A: O que é uma boa razão para você não tem que ser uma boa razão para alguém.
Aluno B: Se você está sangrando e seu pai corre por aí com você, tentando arrumar alguém para levá-lo ao hospital, você sabe muito bem
que você vai querer que seu pai bata naquele cara e tire o carro dele, não é?
Aluno A: Não!
Aluno B: Sim, você o faria. Você ficaria deitado ali, sangrando até a morte, não é? Você ia deixar morrer o seu próprio ego?
Aluno A: Mas eu estou dizendo que é contra a lei. Você pegou algo que não era seu.
Sr. B: Tudo bem, deixe-me perguntar “Qual é o propósito da lei?” (Duas ou três respostas: “Para proteger”). Para proteger as pessoas e seus
bens. Neste caso, suponha que você tem aqui uma pessoa cuja vida corre perigo. Você diz que a função da lei é proteger o povo. Tudo bem.
Agora, ele tem que proteger a vida -
Aluno A: Mas e quanto à parte da propriedade? E sobre a outra pessoa. Ele tem que ser
protegida também.
Sr. B: Você está dizendo que não é só esse cara que tem que ser protegido, é também o outro cara que tem que ser protegido. Ok, mas
suponha que esse cara com direito à propriedade interfira com o direito da vida do outro cara. Uma propriedade e a vida são as mesmas
coisas?
Aluno A: Esse carro pode depender da vida do outro homem também. Ele tem que conseguir um emprego. Se ele não fizer isso, ele poderia
morrer. Você tem que ver o que uma pessoa pensa que é mais valioso, uma vida ou um carro.
Sr. B: Então o que você está dizendo é que as circunstâncias não fazem diferença. Roubar é roubar, não importa o quê. (Refrão de “Não”.
Outro coro de “Sim”). Defendam-se.
Aluno A: Eu não vou mudar a minha mente. Por que deveria fazer a diferença? Diga-me uma boa razão. Isso é como dizer a um médico que
ele deveria tirar a vida de um homem para que ele possa salvar a vida de seu melhor amigo. Como o melhor amigo precisa de um coração,
ele vai sair e matar alguém.
Aluno D: É errado. Eu prefiro o meu amigo morto.
Sr. B: Mas aí você vai privar alguém da vida. Você está dizendo que a propriedade é igual a vida?
Aluno A: Ele tinha um bom motivo, mas isso não significa que está certo.
Sr. B: Que tipo de razão você está falando? (Argumentos).
Aluno E: Uma razão moral.
Aluno B: Legalmente ele está errado, moralmente ele tem razão. (Argumentos).
Aluno A: Não estamos discutindo moral, estamos discutindo lei.
Sr. B: Eu quero que você considere a ambos, moral e lei. Sr Jones é levado perante o juiz. Qual a punição deve ter Sr Jones e por quê?
Aluno I: A multa, cerca de cem dólares.
232

Sr. B: Tudo bem, qual é a finalidade da pena? Qual é a função da pena?


Aluno A: Você não vai fazê-lo novamente.
Sr. B: Tudo bem este é um deles. Qualquer outro motivo?
Aluno A: Para fazer a outra pessoa se sentir bem.
Sr. B: Então o que você está dizendo é - eu não entendo por quê?
Aluno A: Como se alguém mata o seu filho ou sua mãe, ou pai, ou amigo, e eles são punidos, talvez vai fazer você se sentir melhor.
Sr. B: Ok, então o que você está dizendo é que nós -
Aluno A: Satisfazer o homem.
Sr. B: Satisfazer o homem, e temos uma boa razão. Para impedir que outros -
Aluno A: Proteger os direitos das pessoas.

Nesta aula, a discussão gira em torno da posição do aluno A de que ter o carro era injustificada. A posição do aluno A é uma mistura de
estágio 1 (Ainda é roubar, eu aposto que você é colocado na prisão) e estágio 2 (Você não pode obrigar alguém a fazer algo que ele não quer
fazer). Sua visão é que fora da lei a punição é arbitrária (um sentido do estágio 2). “O que é uma boa razão para você pode não ser uma boa
razão para outra pessoa”, “Você tem que ver o que uma pessoa pensa que é mais valioso, uma vida ou um carro”. O professor, assim como os
outros alunos tentam convencê-lo de que há boas razões independentes da lei, que podem ser formuladas nos estágios 2 ou 3, e que você
deve pensar no “moralmente correto” e em “boas razões” bem como o legalmente direito. O objetivo e a estruturação do professor são
semelhantes ao que ocorreu na primeira sessão, mas há a sustentação de um diálogo espontâneo. O aluno A, embora sem vontade de mudar a
sua escolha, parece mover-se para aceitar a ideia de que há boas razões para isso, mas ele insiste. “Nós não estamos discutindo moral,
estamos discutindo a lei”.
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ANEXO F - Revista VEJA (edição 2035, ano 40, n. 46, p. 11-15, nov. 2007)
Entrevista: Eric Nadelstern

Ensinar a competir
À frente de uma reforma radical nas escolas de Nova York, o professor diz que, quanto mais meritocracia, melhor fica o ensino.
"Para fazer de uma escola um exemplo de excelência, é preciso dar incentivos concretos a quem trabalha nela, tal qual em qualquer empresa"

Reportagem de Monica Weinberg

O americano Eric Nadelstern, 57 anos, tem um cargo pouco usual para alguém que trabalha com escolas públicas. Ele é CEO na Secretaria de
Educação da cidade de Nova York, de onde comanda uma das reformas mais radicais já feitas tendo como alvo uma rede tão grande de escolas
públicas. Desde 2002, quando o empresário Michael Bloomberg assumiu a prefeitura de Nova York, é de Nadelstern a função de implantar nas
escolas um novo modelo cujos pilares são a competição e a recompensa baseada no mérito, tal qual no melhor setor privado. Os especialistas dizem
que a reforma implementada por ele merece a atenção de governantes, educadores e também dos pais, pelos bons resultados já colhidos. Resume
Nadelstern: "Temos uma escola de século XXI com a cara do século XIX. Precisamos de coisa melhor". Com uma carreira de 35 anos em escolas
públicas de Nova York, onde já deu aulas e exerceu todos os cargos possíveis na hierarquia, poucas pessoas entendem tanto do assunto quanto ele.
Por essa razão, Nadelstern é convidado para dar palestras no mundo inteiro. Casado e pai de uma filha, também professora, ele concedeu a VEJA a
seguinte entrevista.

Veja – É mesmo possível transformar escolas de má qualidade em bons colégios ou é melhor fechá-las, como ameaça Michael Bloomberg, prefeito
de Nova York?

Nadelstern – É possível. O primeiro passo é mudar radicalmente a velha cultura que abomina a competição e a meritocracia no ambiente escolar. A
ausência de competição e de honra ao mérito é predominante não só em colégios de países em desenvolvimento, como o Brasil, mas também em
escolas americanas. Em quase quarenta anos como professor e pesquisador do assunto, sempre me causou perplexidade o fato de que, mesmo em
um país como os Estados Unidos, alguns dos conceitos mais fundamentais na sociedade sejam tratados nas escolas como pecados capitais. É preciso
superar esse ranço para, aí sim, começar a sonhar com melhorias no ensino.

Veja – Quais medidas se revelaram mais eficazes em sua própria experiência?

Nadelstern – De saída, concluímos que não dá para ter bom ensino sem reunir na escola um grupo de profissionais obcecados por acertar. Isso é
algo que certamente não aparece por geração espontânea, pelo idealismo puro e simples. Para contar com uma tropa de gente decidida a fazer de
determinada escola um exemplo de excelência, é preciso antes de tudo lhe dar incentivos concretos, tal qual ocorre em uma empresa privada. Não
me refiro aqui apenas ao aumento de salário, que também ajuda, mas sobretudo a uma política de premiar com mais dinheiro diretores e
professores que alcancem os melhores resultados. A Coréia do Sul já fez isso com sucesso e estamos colocando a idéia em prática agora em Nova
York. Com a velha isonomia salarial, passamos uma mensagem equivocada do menor esforço, segundo a qual dar a alma ao trabalho não faz
nenhum sentido. Queremos estimular justamente o contrário.

Veja – Isso gerou protestos nas escolas?

Nadelstern – Às vezes. Mas o fato é que se foi o tempo dos relatórios subjetivos produzidos por burocratas do ensino, que dependiam do humor do
avaliador. Chamavam atenção pelo festival de adjetivos e pela escassez de substantivos. Em sociedades modernas tão afeitas às estatísticas, não há
por que não aferir a qualidade dos professores atribuindo-lhes notas numa escala numérica. As pessoas podem reclamar, mas o número é algo
irrefutável. Aplicamos provas aos alunos. Se a classe de um professor vai mal numa série de testes, é um sinal de que ele está falhando. Por outro
lado, quando há um consistente avanço nas notas, temos em mãos um poderoso indicador do seu talento ao lecionar. São essas as escolas que, no
caso de Nova York, recebem bônus no orçamento. Cabe ao diretor fazer o rateio do prêmio, tendo pesado o mérito de cada um para o resultado
final. Ele é o gerente de fato.

Veja – Que tipo de interferência do estado, afinal, contribui para o progresso de uma escola?

Nadelstern – Como em outros setores da economia, também em uma rede de escolas públicas não faz sentido que o governo seja o todo-poderoso,
a quem elas devam consultar sobre a compra de uma borracha ou um vazamento no teto. No novo sistema, os diretores recebem dinheiro da
prefeitura e são livres para administrar a escola como julgarem melhor. Como esperar que os diretores sejam gestores tão eficazes quanto os das
grandes empresas se os privamos de poder? É ilógico. Por essas e outras, as escolas públicas americanas costumam ser lembradas pelos magos da
administração como exemplos de ineficiência e atraso. Com a autonomia, a história é outra. Antes dela, apenas 13% do dinheiro que deveria chegar
às escolas seguia esse destino. O restante era consumido com a burocracia ou desaparecia nos ralos da corrupção. Depois que a gestão ficou nas
mãos dos diretores, 70% do dinheiro está nas escolas. A meta é chegar a 90%. Com isso, estou convencido de que o estado não tem talento nem o
dever de intervir no miúdo, mas é, sim, seu papel estabelecer um conjunto eficiente de regras para estimular o bom ensino – e, claro, cobrar os
resultados.

Veja – Como exatamente o governo pode cobrar bom desempenho de uma escola?

Nadelstern – Damos a autonomia e, em troca, o diretor assina um contrato com a prefeitura em que se compromete a fazer seus estudantes
alcançarem uma determinada média de notas, a reduzir a evasão, a combater a repetência, e por aí vai. Se as escolas não cumprem tais metas,
recebem menos dinheiro do que as demais que mostram avanço nos indicadores. Nas escolas em que o resultado é sempre péssimo, não há saída
senão demitir os diretores. No mundo privado, não causa espanto que alguém de alto escalão seja mandado embora por incapacidade de gestão. Na
escola pública, isso ainda é visto como uma injustiça. Para mim, é mais um sinal de que as escolas têm muito a aprender com as empresas.

Veja – Como atrair os melhores profissionais para as escolas públicas?

Nadelstern – A política de dar bônus por desempenho é uma medida que, por si só, já enche os olhos dos bons profissionais do mercado.
Evidentemente, um ambiente de trabalho em que ficarão equiparados à mediocridade não lhes é atraente. Outro ponto fundamental, de novo, é o
fato de as escolas serem autônomas, e não mais tão dependentes do estado. É claro que um bom executivo se sentirá mais desafiado com esse
cenário. Também é possível fisgar os melhores profissionais ao colocá-los em funções estratégicas pelas quais serão bem remunerados. Estou certo
de que um de nossos trunfos foi ter conseguido recrutar alguns dos melhores acadêmicos de universidades como Harvard e Princeton e, ainda que
em menor proporção, trazer gente do setor privado para as escolas. Alguns deles estão dando aulas de ciências em escolas localizadas em áreas
234

menos nobres e mais violentas. Ninguém em sã consciência hoje pode abrir mão de um bom ensino de ciências, senão vai ficar para trás. É também
contra isso que estamos lutando ao contratar os melhores acadêmicos do país.

Veja – O que seus estudos e a própria experiência mostram sobre o combate ao crime nas escolas?

Nadelstern – Esse está longe de ser um problema exclusivo da cidade de Nova York, tampouco de países pobres, como o Brasil. Tenho observado
nas últimas décadas o modo como os diversos educadores e governantes lidam com a criminalidade no ambiente escolar e cheguei a duas
conclusões sobre o que ajuda a erradicá-la. Primeiro, é preciso adotar medidas de segurança na escola, ainda que isso pareça estranho a algumas
pessoas. Defendo minha posição com base em fatos, e não em ideologia. Em escolas de Nova York antes dominadas por gangues, a violência
despencou desde a década de 90, quando foram instalados detectores de metais na entrada e elas recrutaram agentes de segurança treinados para
lidar com essa situação. Em outra frente, uma medida eficaz de mais longo prazo é reduzir o tamanho das classes e das próprias escolas.

Veja – O senhor acha viável transformar um sistema público de escolas gigantes e classes lotadas em uma rede de pequenos colégios?

Nadelstern – Esse é um processo que pode consumir décadas, mas, sim, está no campo do possível. Defendo isso com base em pesquisas segundo
as quais, de todos os fatores, o tamanho da escola é o que mais influencia as chances de um aluno em Nova York concluir o ensino médio e chegar à
universidade. Não estou dizendo que todas as escolas de grande porte são ruins, nem que as pequenas são sempre oásis de bom ensino, mas, na
média, é essa a realidade – e os pais devem estar informados sobre isso ao matricular seus filhos. Do ponto de vista prático, é evidente que não é
viável para um governo sair por aí comprando terreno para construir mais escolas. É possível, no entanto, transformar uma escola grande em várias
pequenas, fazendo uso do mesmo prédio. Cada uma delas passa a ter diretor próprio, uma equipe de professores e funcionamento de escola
pequena.

Veja – E por que exatamente isso é bom?

Nadelstern – Em primeiro lugar, porque num ambiente menor os pais passam a participar mais, segundo nos mostra uma pesquisa sobre o
assunto. Hoje as famílias estão, em geral, alheias ao que se passa na escola. De um lado, porque não lhes sobra tempo. De outro, porque têm
dificuldade em ser recebidas nas escolas – o que só atrapalha. Outro ponto a favor das escolas menores é que, nelas, os professores passam a
conhecer um pouco melhor as necessidades de seus alunos. Uma de minhas cruzadas é justamente criar nos colégios uma nova cultura, de modo
que as aulas não sejam tão dissociadas das reais demandas dos estudantes.

Veja – Como aproximar uma escola da realidade de seus alunos?

Nadelstern – Insisto, de novo, na necessidade de aplicar provas aos estudantes, nesse caso com o objetivo de saber o detalhe do detalhe sobre o
que eles aprenderam até aquele momento do ano. Criamos seis testes anuais com essa finalidade. Isso mesmo: a idéia é fazer monitoramento
permanente. Acredito que só aí é possível ao professor dar uma boa aula, mais de acordo com as necessidades dos alunos. Infelizmente, o que
observo sobre a maioria das escolas nos Estados Unidos é que, em se tratando de ensino, oferta e demanda ainda andam, basicamente, separadas.
O professor fala sobre Platão para estudantes que desconhecem os fundamentos da Grécia antiga. Em aulas sobre a I Guerra, quase ninguém sabe
onde fica a Europa. Não tem como dar certo. Se os alunos ignoram o básico, vamos lhes dar primeiro isso.

Veja – De que modo o senhor acha que dar prêmios em dinheiro aos melhores estudantes, como ocorre em Nova York, pode ajudar a melhorar esse
cenário?

Nadelstern – A competição empurra as pessoas para a frente. Nas escolas, as crianças a encaram como uma gincana, na qual, para sair
vencedoras, precisam estudar mais. Esse é o objetivo. Os alunos gostam. Os pais adoram. Mas sindicalistas e intelectuais lunáticos reclamam. Se a
sociedade como um todo cultua os rankings, não vejo por que ser diferente no ambiente escolar, no qual supostamente se dá uma espécie de treino
para a vida real. Premiar é, afinal, uma maneira de jogar luz sobre um conjunto de bons hábitos que devem servir de modelo para os outros.

Veja – Como atrair para as escolas públicas 350 milhões de dólares do setor privado, a exemplo do que ocorreu em Nova York?

Nadelstern – Lição número 1: não dá para bater à porta de Bill Gates com um diagnóstico de 1 000 páginas sobre a educação pública e esperar
que ele tenha tempo e disposição para lançar-se numa longa e enfadonha discussão teórica. O que funciona é chegar com um projeto curto, de
execução palpável e custos definidos. Essa é a linguagem do mercado. Repetimos sempre nos Estados Unidos que a diversidade é a pedra
fundamental de uma sociedade livre e democrática – e, por essa razão, estamos em busca de perfis distintos de escola. Ao passar o chapéu nas
empresas, comecei a falar em um novo "portfólio" de colégios, e não mais em diversidade. Funcionou. Um país mais pobre como o Brasil certamente
poderia se beneficiar mais desse tipo de prática.

Veja – Apesar de todos esses esforços, os indicadores de ensino em Nova York ainda são ruins...

Nadelstern – Os resultados na educação são sempre lentos, mas acho que, diante disso, avançamos a uma velocidade bastante razoável. Há cinco
anos, 50% dos estudantes concluíam o ensino básico em Nova York. Hoje, são quase 60%. Ou seja: 20% mais gente. É um indicador de que
seguimos na direção correta. Estou bastante atento ao que outros países estão fazendo para melhorar. Essa é uma obrigação de qualquer homem
público no mundo globalizado. Meu diagnóstico geral é que as escolas ainda têm a cara do século XIX em sociedades do século XXI. Elas continuam
afeitas à decoreba, encaixotadas em grades curriculares ultrapassadas e incapazes de preparar as crianças para olhar os problemas da atualidade de
modo abrangente e desprovido de preconceito. Os pais devem cobrar, sim, porque, no que diz respeito à escola pública, seus filhos são reféns de um
serviço que se situa entre o mediano e o ruim; o velho e o antiquado. Por tudo isso, estou convicto de que as escolas precisam de um bom banho de
modernidade.
235

ANEXO G - Reportagens da Revista VEJA48,49


Prontos para o século XIX

Muitos professores e seus compêndios enxergam o mundo de hoje como ele era no tempo dos tílburis. Com a
justificativa de "incentivar a cidadania", incutem ideologias anacrônicas e preconceitos esquerdistas nos alunos
Monica Weinberg e Camila Pereira

Tema para reflexão: vale a pena usar chocadeiras artificiais para acelerar a produção de frango? Deu-se com isso o início de uma das aulas de geografia no
Colégio Ateneu Salesiano Dom Bosco, de Goiânia, escola particular que aparece entre as melhores do país em rankings oficiais. Da platéia, formada por alunos às
vésperas do vestibular, alguém diz: "Com as chocadeiras, o homem altera o ritmo da vida pelo lucro". O professor Márcio Santos vibra. "Você disse tudo! O homem se
perdeu na necessidade de fazer negócio, ter lucro, exportar." E põe-se a cantar freneticamente Homem Primata / Capitalismo Selvagem / Ôôô (dos Titãs), no que é
acompanhado por um enérgico coro de estudantes. Cena muito parecida teve lugar em uma classe do Colégio Anchieta, de Porto Alegre, outro que figura entre os
melhores do país. Lá, a aula de história era animada por um jogral. No comando, o professor Paulo Fiovaranti. Ele pergunta: "Quem provoca o desemprego dos
trabalhadores, gurizada?". Respondem os alunos: "A máquina". Indaga, mais uma vez, o professor: "Quem são os donos das máquinas?" E os estudantes: "Os
empresários!". É a deixa para Fiovaranti encerrar com a lição de casa: "Então, quem tem pai empresário aqui deve questionar se ele está fazendo isso". Fim de aula.
Os dois episódios, ambos presenciados por VEJA, não são raridade nas escolas brasileiras. Ao contrário. Eles exemplificam uma tendência prevalente entre
os professores brasileiros de esquerdizar a cabeça das crianças. Parece bobagem, uma curiosidade até pitoresca num mundo em que a empregabilidade e o sucesso na
vida profissional dependem cada vez mais do desempenho técnico, do rigor intelectual, da atualização do pensamento e do conhecimento. Não é bobagem. A
doutrinação esquerdista é predominante em todo o sistema escolar privado e particular. É algo que os professores levam mais a sério do que o ensino das matérias em
classe, conforme revela a pesquisa CNT/Sensus encomendada por VEJA. Pobres alunos.
Eles estão sendo preparados para viver no fim do século XIX, quando o marxismo surgiu como uma ideologia modernizante, capaz não apenas de explicar
mas de mudar o mundo para melhor, acelerando a marcha da história rumo a uma sociedade sem classes. Bem, estamos no século XXI, o comunismo destruiu a si
próprio em miséria, assassinatos e injustiças durante suas experiências reais no século passado. É embaraçoso que o marxismo-leninismo sobreviva apenas em Cuba,
na Coréia do Norte e nas salas de aula de escolas brasileiras. As chocadeiras produzem os frangos vendidos a menos de 5 reais nos supermercados brasileiros, e isso
propicia a dose mínima de proteína a famílias que, de outra forma, estariam mal nutridas. A realidade não interessa nas aulas como a do professor Márcio Santos. O que
interessa? Passar a idéia de que as máquinas tiram empregos. Elas tiram? Tiraram no começo dos processos de robotização e automação de fábricas nos anos 90. Hoje,
sem robôs e máquinas, os empregos nem sequer seriam criados. Mas dizer isso pode desagradar ao espírito do velho barbudo enterrado no novo Cemitério de Highgate,
em Londres. Os professores esquerdistas veneram muito aquele senhor que viveu à custa de um amigo industrial, fez um filho na empregada da casa e, atacado pela
furunculose, sofreu como um mártir boa parte da existência. Gostam muito dele, fariam tudo por ele, menos, é claro, lê-lo – pois Karl Marx é um autor rigoroso, complexo,
profundo que, mesmo tendo apenas uma de suas idéias ainda levada a sério hoje – a Teoria da Alienação –, exige muito esforço para ser compreendido. "A salada
ideológica resulta da leitura de resumos dos grandes pensadores", diz o filósofo Roberto Romano. Gente que vê maldade em chocadeiras e mal em empresários que
usam máquinas em suas fábricas no século XXI não pode ter lido Karl Marx. É de supor que não tenham lido muito, quase nada. Mas são esses senhores que ensinam
nossos filhos nas melhores escolas brasileiras – sem, diga-se, que os pais se incomodem com isso.
A pesquisa CNT/Sensus ouviu 3 000 pessoas de 24 estados brasileiros, entre pais, alunos e professores de escolas públicas e particulares. Sua conclusão
nesse particular é espantosa. Os pais (61%) sabem que os professores fazem discursos politicamente engajados em sala de aula e acham isso normal. Os professores,
em maior proporção, reconhecem que doutrinam mesmo as crianças e acham que isso é sua missão principal – algo muito mais vital do que ensinar a interpretar um
texto ou ser um bamba em matemática. Para 78% dos professores, o discurso engajado faz sentido, uma vez que atribuem à escola, antes de tudo, a função de "formar
cidadãos" – à frente de "ensinar a matéria" ou "preparar as crianças para o futuro". Muito bonito se não estivessem nesse processo preparando os alunos para um mundo
que acabou e diminuindo suas chances de enfrentar a realidade da vida depois que saírem do ambiente escolar. Para atacar um problema, o primeiro passo é
reconhecer sua existência. Esse é o mérito da pesquisa CNT/Sensus.
Adversária do exercício intelectual, a ideologização do ensino pode ser resultado em parte também do despreparo dos professores para o desempenho da
função. No ensino básico, 52% lecionam matérias para as quais não receberam formação específica – 22% deles nunca freqüentaram faculdade. Para esses, os chavões
de esquerda servem como uma espécie de muleta, um recurso a que se recorre na falta de informação. "Repetir meia dúzia de slogans é muito mais fácil do que estudar
e ler grandes obras. Por isso, a ideologização é mais comum onde impera a ignorância", diz o historiador Marco Antonio Villa. A questão não é exatamente nova na
educação. Meio século atrás, a filósofa alemã Hannah Arendt já alertava para o equívoco de fazer das aulas um lugar para a doutrinação ideológica, qualquer que fosse o
matiz. Em A Crise na Educação, ela dizia: "Em vez de (o professor) juntar-se a seus iguais, assumindo o esforço da persuasão e correndo o risco do fracasso, há a
intervenção ditatorial, baseada na absoluta superioridade do adulto". Ao refletirem sobre o atual cenário, os especialistas concordam com a idéia central da filósofa. Está
claro, e a própria experiência mostra isso, que o viés político retira da escola aquilo que deveria, afinal, ser seu atributo número 1: ensinar a pensar – verbo cuja origem,
do latim, significa justamente pesar. Diz o sociólogo Simon Schwartzman: "O verdadeiro exercício intelectual se faz ao colocar as idéias e os juízos numa balança, algo
que só é possível com uma ampla liberdade de investigação e de crítica".
Não é o caso na maioria das salas de aula. Muitos professores brasileiros se encantam com personagens que em classe mereceriam um tratamento mais
crítico, como o guerrilheiro argentino Che Guevara, que na pesquisa aparece com 86% de citações positivas, 14% de neutras e zero, nenhum ponto negativo. Ou
idolatram personagens arcanos sem contribuição efetiva à civilização ocidental, como o educador Paulo Freire, autor de um método de doutrinação esquerdista
disfarçado de alfabetização. Entre os professores brasileiros ouvidos na pesquisa, Freire goleia o físico teórico alemão Albert Einstein, talvez o maior gênio da história da
humanidade. Paulo Freire 29 x 6 Einstein. Só isso já seria evidência suficiente de que se está diante de uma distorção gigantesca das prioridades educacionais dos
senhores docentes, de uma deformação no espaço-tempo tão poderosa que talvez ajude a explicar o fato de eles viverem no passado.
Entre as figuras históricas e da atualidade mais citadas em classe está, como não poderia deixar de ser, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. As
referências a Lula são contidas. O presidente brasileiro obtém aprovação menor entre os professores, segundo relatam os estudantes, do que aquela com que a
sociedade brasileira em geral o brinda. Ele tem 70% de avaliação positiva dos brasileiros, mas na boca dos professores esse índice cai para 30% – com 27% de citações
negativas e 43% de neutras. Ressalte-se aqui que é um ponto louvável para os mestres o fato de, como mostram os números relativos a Lula, eles não fazerem
proselitismo eleitoral em classe – mesmo que seja preciso relevar o fato de o ditador venezuelano Hugo Chávez ter merecido 51% de citações positivas. A neutralidade e
o comedimento em relação a Lula desautorizam a interpretação de que os professores tentam direcionar o voto dos alunos, o que seria desastroso. É sinal de que sua
pregação, mesmo equivocada, se mantém no nível das idéias – o que é excelente.
"Eu e todos os meus colegas professores temos, sim, uma visão de esquerda – e seria impossível isso não aparecer em nossos livros. Faço esforço para
mostrar o outro lado", diz a geógrafa Sonia Castellar, que há vinte anos dá aulas na faculdade de pedagogia da Universidade de São Paulo (USP) e escreveu Geografia,
um dos best-sellers nas escolas particulares (livro que tem dois de seus trechos comentados por VEJA na reportagem seguinte). "Reconheço o viés esquerdista nos
livros e apostilas, fruto da formação marxista dos professores. Mas não temos nenhuma intenção de formar uma geração de jovens socialistas", diz Miguel Cerezo,
responsável pelo conteúdo publicado nas apostilas do COC (de onde foram extraídos quatro trechos comentados pela revista). À luz de outra pesquisa em profundidade
feita pelo Ibope em colaboração com a revista Nova Escola, editada pela Fundação Victor Civita, os professores da rede pública revelam que, para eles, o principal
problema da sala de aula é, de longe (77%), a ausência dos pais no processo educativo. Repousam na colaboração entre pais e professores a correção dos rumos do
ensino no país e a aceleração da curva de melhora de desempenho que começa a se desenhar. A questão do excesso de ideologização é um desses problemas que
podem ser abordados em conjunto por pais e professores. Demanda para o diálogo existe. O advogado Miguel Nagib fundou, há quatro anos, em Brasília, a ONG Escola
Sem Partido, com o objetivo de chamar atenção para a ideologização do ensino na sala de aula. Nagib se incomodou com os sinais do problema na escola particular de
sua filha, então com 15 anos, onde o professor de história gostava de comparar Che Guevara a São Francisco de Assis. Foi ao colégio reclamar. Diz Nagib: "As escolas
precisam ficar sabendo que muitos pais não concordam com essa visão".

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WEINBERG, M.; PEREIRA, C. Prontos para o século XIX - Você sabe o que estão ensinando a ele? VEJA,
edição 2074, ano 41, n. 33, p. 76-84, 20 ago. 2008.
49
IOSCHPE, G. A neutralidade como dever. VEJA, edição 2074, ano 41, n. 33, p. 86-87, ago. 2008.
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Você sabe o que estão ensinando a ele?

Uma pesquisa mostra que para os brasileiros tudo vai bem nas escolas. Mas a realidade é bem menos rósea: o
sistema é medíocre
Monica Weinberg e Camila Pereira

Vamos falar sem rodeios. Em boa parte dos lares brasileiros, uma conversa em família flui com muito mais vigor e participação quando se decide a
assinatura de novos canais a cabo, o destino das próximas férias ou a hora de trocar de carro do que quando se discute sobre o que exatamente o Júnior está
aprendendo na escola. Quando e se esse assunto é levantado, ele se resumirá às notas obtidas e a algum evento extraordinário de mau comportamento, como ter sido
pego fumando no corredor ou ter beliscado o traseiro da professora de geografia. O quadro acima é um tanto anedótico, mas tem muito de verdadeiro. De modo geral,
com as nobilíssimas exceções que todos conhecemos, os pais brasileiros de todas as classes não se envolvem como deveriam na vida escolar dos filhos. Os mais
pobres dão graças aos céus pelo fato de a escola fornecer merenda, segurança e livros didáticos gratuitos. Os pais de classe média se animam com as quadras
esportivas, a limpeza e a manifesta tolerância dos filhos quanto às exigências acadêmicas muitas vezes calibradas justamente para não forçar o ritmo dos menos
capazes. Uma pesquisa encomendada por VEJA à CNT/Sensus traduz essa situação em números. Para 89% dos pais com filhos em escolas particulares, o dinheiro é
bem gasto e tem bom retorno. No outro campo, 90% dos professores se consideram bem preparados para a tarefa de ensinar. Como mostra a Carta ao Leitor desta
edição, sob sua plácida superfície essa satisfação esconde o abismo da dura realidade – o ensino no Brasil é péssimo, está formando alunos despreparados para o
mundo atual, competitivo, mutante e globalizado. Em comparações internacionais, os melhores alunos brasileiros ficam nas últimas colocações – abaixo da
qüinquagésima posição em competições com apenas 57 países.
A reportagem que se vai ler pretende chamar atenção para as raízes dessa cegueira e contribuir para que pais, professores, educadores e autoridades
acordem para a dura realidade cuja reversão vai exigir mais do que todos estão fazendo atualmente – mesmo os que, como é o caso em especial dos pais, acreditam
estar cumprindo exemplarmente sua função. Em Procura da Poesia, o grande Carlos Drummond de Andrade provê uma metáfora eficiente do que o desafio de melhorar
a qualidade da educação exigirá da atual geração de brasileiros: "O que pensas e sentes, isso ainda não é poe-sia". Uniformizar, alimentar, dar livros didáticos aos jovens
e perguntar como foi o dia na escola é fundamental, mas isso ainda não é educação para o século XXI. "Chega mais perto e contempla as palavras. Cada uma tem mil
faces secretas sob a face neutra e te pergunta, sem interesse pela resposta, pobre ou terrível, que lhe deres: Trouxeste a chave?", continua nosso maior poeta, morto em
1987. Outra metáfora exata. Os jovens estudantes são como as palavras, com mil faces secretas sob a face neutra e esperando as chaves que lhes abram os portais de
uma vida pessoal e profissional plena.
Isso só se conseguirá, como mostra a pesquisa encomendada por VEJA, quando o otimismo com o desempenho do sistema, que é também compartilhado
pelos alunos, for transformado em radical inconformismo. A fagulha de mudança pode ser acendida com a constatação de que as escolas que pais, alunos e professores
tanto elogiam são as mesmas que devolvem à sociedade jovens incapazes de ler e entender um texto, que se embaralham com as ordens de grandeza e confiam
cegamente em suas calculadoras digitais para não apenas fazer contas mas substituir o pensamento lógico. Mais uma vez abusa-se do recurso da generalização para
que o mérito individual de alguns poucos não dilua a constatação de que o complexo educacional brasileiro é medíocre e não se enxerga como tal. Quando um conselho
de notáveis americanos fez a célebre condenação do sistema de ensino do país ("parece ter sido concebido pelo pior inimigo dos Estados Unidos..."), as pesquisas de
opinião mostravam que a maioria dos americanos estava plenamente satisfeita com suas escolas. A comissão viu mais longe e soou o alarme. Agora no Brasil o mesmo
senso de realidade e urgência se faz necessário, como resume Claudio de Moura Castro, ensaísta, pesquisador e colunista de VEJA: "Uma crise, uma crise profunda. Só
isso salva nossa educação".

A neutralidade como dever

"A pesquisa CNT/Sensus publicada nesta edição corrobora esse quadro: só 18% dos professores da escola pública
dizem que seu discurso em sala de aula é politicamente neutro. Setenta e quatro por cento escolhem ‘formar cidadãos’
como missão do professor – apenas 8,4% dizem que é ‘ensinar a matéria’. Os resultados são praticamente idênticos
nas escolas particulares"

Gustavo Ioschpe

Sabendo que, em uma população de 190 milhões de habitantes, temos mais de 50 milhões de alunos no ensino básico e aproximadamente 100 milhões de
pais desses alunos e apenas 2 milhões de professores, e sabendo que vivemos em uma democracia, a pergunta que se impõe a todo professor, diretor, secretário
municipal, estadual ou ministro da Educação do país de agora em diante é: como se pode justificar que uma minoria imponha sobre a maioria a sua visão da educação?
Em uma sociedade democrática, quem decide que tipo de educação será oferecido no sistema público: o público ou as corporações do setor? Como se justifica que
professores e administradores escolares ditem uma política educacional à revelia dos desejos expressos da sociedade brasileira? A educação para a cidadania não
pressupõe, afinal, o respeito à vontade coletiva e a valorização da sabedoria popular?
Quando se discutem as razões pelas quais nosso sistema escolar não consegue ensinar a maioria dos alunos a ler e a escrever ou a realizar operações
aritméticas simples, muitos supostos fatores vêm à baila: o salário dos professores, a condição da infra-estrutura das escolas, o descaso da sociedade etc. Essa análise
parte do pressuposto de que todos os atores do processo educacional estão engajados no mesmo projeto, o que não é verdade. Seguimos ignorando um problema que
me parece cada vez mais crucial: o ensino acadêmico é percebido pelos nossos professores como uma tarefa desimportante do processo educacional. Quando instado,
em pesquisa da Unesco, a apontar as finalidades mais importantes da educação, o professorado brasileiro disse o seguinte: com 72% dos votos, a campeã foi "formar
cidadãos conscientes". A segunda mais lembrada foi "desenvolver a criatividade e o espírito crítico" (60,5%). Lá atrás, na rabeira, apareceram "proporcionar
conhecimentos básicos" (8,9%) e "transmitir conhecimentos atualizados e relevantes" (17%). No mesmo levantamento, 73% dos professores concordaram com a
afirmação que segue: "O professor deve desenvolver a consciência social e política das novas gerações". Cinqüenta e cinco por cento rejeitam a idéia de que "a atividade
docente deve reger-se pelo princípio da neutralidade política". Mais de 75% dos professores acham que a igualdade é um valor superior à liberdade. A pesquisa
CNT/Sensus publicada nesta edição corrobora esse quadro: só 18% dos professores da escola pública dizem que seu discurso em sala de aula é politicamente neutro.
Setenta e quatro por cento escolhem "formar cidadãos" como missão do professor – apenas 8,4% dizem que é "ensinar a matéria". Os resultados são praticamente
idênticos nas escolas particulares.
É triste constatar que o pendor atingiu o nível de formação de políticas públicas e, como tal, virou uma questão sistêmica. Na avaliação que o MEC faz dos
livros didáticos que serão escolhidos para todas as escolas do país, a obra ganha pontos se mostrar preocupação com a questão da cidadania. Não apenas na área de
humanas, mas também em ciências e matemática. Na avaliação de livros didáticos de ciências do ensino fundamental, por exemplo, há seis itens. Um deles é "cidadania
e ética". Lá está dito que o livro deve incentivar a "valorização do debate sobre direitos do trabalhador e do cidadão" e que se deve atentar "à relação entre conhecimento
popular e científico, com respeito e valorização de ambos". Não sei muito bem o que isso quer dizer, mas imagino que, se perguntarem a um aluno numa prova a razão
da existência das chamadas "estrelas cadentes", ele tirará 10 se responder que é para atender aos três desejos da vizinha. Se complementar dizendo que os três desejos
são uma conquista da cidadania, aí então será 10 com louvor.
Acho que a formação política de cada um é sua prerrogativa individual, sujeita apenas à interferência dos pais. Não é para ser condenada ou legitimada na
escola. Mesmo que os pais não pratiquem sua prerrogativa, isso não dá ao professor o direito de se assenhorear da tarefa. Não acredito que a maioria dos professores
brasileiros, com seu baixo preparo intelectual, tenha condições de oferecer ao aluno a exposição complexa e multifacetada que as questões inerentes à formação da
cidadania exigem. Vira panfletagem. Também não acredito no poder do discurso dissociado da prática. Se essas razões são válidas para qualquer tipo de escola, creio
que as regras devessem ser ainda mais rigorosas para as escolas públicas, nas quais o aluno não tem condições de optar por escola diferente. Aqui o texto de referência
é de Max Weber, em "Wissenschaft als Beruf" (A Ciência como Vocação). Falando sobre o dever de neutralidade dos professores universitários – creio que não lhe
passaria pela cabeça que pudesse ocorrer como no Brasil de hoje a politização de alunos de 10 anos de idade –, Weber disse: "Só se pode exigir do professor que tenha
a integridade intelectual para ver que uma coisa é declarar fatos, determinar as relações matemáticas ou lógicas ou a estrutura interna de valores culturais; outra coisa é
responder a questões sobre o valor da cultura e seus componentes individuais e como alguém deve agir na comunidade cultural e em associações políticas. Se ele
perguntar por que não deve lidar com os dois tipos de problema em sala de aula, a resposta é: porque o profeta e o demagogo não pertencem ao espaço acadêmico.
(...)" Uma discussão político-ideológica profícua pressupõe a igualdade de poder entre os participantes. A relação professor-aluno é totalmente assimétrica: se o aluno
questionar as convicções de seu mestre, correrá o risco de sofrer represálias, enquanto o oposto é impossível. Pela mesma razão que o estado é laico, as aulas do
estado também deveriam ser politicamente neutras.

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