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INSTITUTO DE EDUCAÇÃO
DEPARTAMENTO DE PSICOLOGIA
PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO E APRENDIZAGEM I (2019.2)
Atividade Avaliativa II
No Brasil, a condição social é um fator que influencia na hierarquização dentro das
escolas, dado que muitos alunos que são limitados economicamente sofrem de exclusão. Na
história de Ângela, a pobreza trouxe consequências como a culpabilização da sua reprovação e
a associação da escassez com a ausência de capacidade intelectual. Desse modo, o que muitos
profissionais da educação têm argumentado é que o problema do fracasso escolar em algumas
crianças decorre da miséria, deixando para segundo plano o preconceito ainda existente, ou
seja, o foco norteia-se nos fatores extra-escolares como condição econômica, fome e
desnutrição. Por consequência disso, as causas intra-escolares salientadas no currículo,
programas e avaliações do desempenho dos alunos são camufladas e entendidas como
desnecessárias para a problematização da má-educação. Em um momento da história, conta-se
que uma psicóloga avaliou a Ângela e inferiu que os motivos dos problemas dela baseavam-se
apenas nos conflitos familiares, constatando assim como as escolas são propagadoras de
exclusão, mas ao mesmo tempo colocam-se isentas de uma filosofia que visa o desempenho
saudável de todos os indivíduos.
Pierre Bordieu, sociólogo francês, aborda em seu livro, A reprodução: elementos para
uma teoria do sistema de ensino, a teoria da reprodução social, que, em suma, trata-se da
tendência que os sujeitos possuem de atuar por meio das estruturações e posicionamentos
sociais, nos quais estão previamente inseridos. Desse modo, é notável que a lógica de Bordieu
evidencia-se na realidade de Ângela, quando ela declara que sua infância foi semelhante a do
seu pai, uma vez que ambos tiveram de assumir precocemente papéis não destinados à criança,
pois ele também teve que se responsabilizar pelos cuidados dos seus irmãos desde cedo. Diante
disso, é evidente que a sociedade contemporânea brasileira está submetida à falta de mobilidade
social e isso define o escasso acesso às oportunidades de ascensões sociais das camadas mais
pobres.
Visto que Cícera, mãe de Ângela, não havia sido alfabetizada durante sua infância,
matricula Ângela em uma escola para que essa possa ter a educação que sua progenitora não
teve. De acordo com a pesquisadora, "A qualidade que as atividades de preparação para a
alfabetização geralmente têm - uma repetição interminável de exercícios e perguntas
descontextuadas e até mesmo absurdas sobre localização espacial e temporal, partes do corpo,
noção de tamanho etc.", (PATTO, 1987, p. 311) é possível entender que a teoria empirista-
associacionista estava sendo utilizada na educação dos alunos desse colégio. Sendo assim, essa
proposta de ensino se conecta muito bem com a passividade intelectual em relação ao aluno, na
qual o professor determina que o estudante seja um simples receptor de informações, utilizando-
se de métodos de condicionamento e reforço para que a disciplina seja apreendida e copiada.
Além disso, Paulo Freire cita o conceito de "educação bancária'", que ele pressupõe uma relação
vertical entre o educador e o educando, sendo o educador "bancário" quem realiza "depósitos"
em seus educandos, que os absorvem acriticamente. Tal proposta foi nociva a Ângela visto que
houve pouca participação e muita competição dentro da sua sala de aula.
Como citado acima, desde o princípio, Ângela ao adentrar na escola foi subjugada à um
sistema de ensino empirista-associacionista que trabalha a reprodução e a não criticidade.
Diante de tal conjuntura, a menina foi estigmatizada não somente pela abordagem educacional,
que potencializa o caráter inerte do indivíduo, mas pelas próprias educadoras que tornavam
explícitas suas opiniões pessoais, de cunho preconceituoso sobre Ângela e sua família, fato
evidenciado nas falas que as professoras dirigem à pesquisadora, alegando que a família, o
contexto histórico e social, eram fatores irrefutáveis para o fracasso da menina. O conto da
escritora brasileira, Ruth Rocha, Quando a escola é de vidro, relata a história de uma escola em
que cada criança possuía um respectivo pote de vidro, o qual deveriam permanecer durante as
aulas para não se movimentarem em demasia. Esse conto pode ser associado com o contexto
de vida da Ângela, pois de uma forma (in)direta foi submetida desde o começo a um pote de
vidro, a qual, evidentemente, ela não cabia simplesmente por ter sido, desde o início,
estigmatizada, e, consequentemente, não seguir o mesmo padrão de desenvolvimento dos seus
colegas de sala.
REFERÊNCIAS:
DEMARTINI, G. R. Articulação entre Paulo Freire e Herbert Marcuse para uma educação
sexual humanizadora. 2015. 142 f. Dissertação (Mestrado em Educação) Faculdade de Ciências
Humanas, Universidade Federal de São Carlos, Sorocaba, 2015.