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Resumo
Este artigo se constitui um recorte da dissertação intitulada Ensaio sobre a coexistência entre
cooperação e competição nos jogos de regras e sua repercussão na instituição escolar,
defendida no Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Estadual de Maringá
(UEM). Objetivou investigar o quanto a competição e a cooperação presentes nos jogos de
regras podem se constituir práticas de aprendizagem das relações eu-outro. Para isso
realizamos uma revisão teórica das obras de Huizinga (2010), Caillois (1990) e Piaget (1975)
que discutem o jogo como elemento da cultura em seus aspectos constitutivos; como etapa do
desenvolvimento humano e social. Argumentamos que competir e cooperar são aspectos
indispensáveis e indissociáveis para o desenvolvimento de toda cultura. Esses elementos
presentes em nossa organização social e cultural não existiriam se não houvesse a presença do
outro e do grupo com quem cooperar. Pensando no ambiente escolar, concluímos que o jogo
de regras pode contribuir com a construção de uma escola cooperativa, na medida em que
quanto mais cooperativo for um grupo; um sujeito, maiores são suas possibilidades de vitória.
Cognitivamente essas habilidades são necessárias para a inserção dos sujeitos nos grupos e
nas relações sociais. Deste modo, os jogos podem se constituir em práticas de aprendizagens
das relações eu-outro evidenciando sua fecundidade para a construção de relações dialógicas.
Supomos que, nesse movimento, o diferente pode ser vislumbrado como uma possibilidade de
pensar sobre si e sobre o outro o que consideramos indispensável para a constituição de
pedagogias que privilegiam a diferença e que levem em conta a pluralidade cultural e a
convivência democrática com o outro na instituição escolar.
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Professora da Faculdade Integrado de Campo Mourão. Mestre em Educação (UEM): Doutoranda pela
Universidade Estadual de Maringá. Bolsista CAPES/ARAUCÁRIA. Membro do Grupo de Pesquisa em
Psicopedagogia, Aprendizagem e Cultura. E-mail: pamelafaeti@hotmail.com.
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Docente do Programa de Pós-Graduação em Educação/UEM. Doutora em Educação/UNICAMP.
Psicopedagoga/CEP/Curitiba. Líder do Grupo de Estudos de Psicopedagogia, Aprendizagem e Cultura
(GEPAC/CNPq/UEM). Membro do grupo de trabalho sobre Jogos da ANPEPP/CNPq. E-mail:
gccalsa@hotmail.com
ISSN 2176-1396
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Introdução
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Nesta citação estamos apresentando o ano da primeira edição da obra seguida pelo ano da edição
utilizada neste trabalho. No decorrer do texto nos utilizaremos do ano da obra investigada. Assim também o
faremos com a obra de Caillois.
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Tanto para Huizinga (2010) como para Caillois (1990) o jogo não é visto como uma
simples atividade desenvolvida pelos seres vivos, mas se constitui em importante mediador da
produção e manifestação das culturas. Por meio do jogo evidenciam como as sociedades
surgiram, se organizaram e construíram seus valores, atitudes e crenças transmitidas e
modificadas ao longo das gerações.
Huizinga (2010, s/p), no prefácio de sua obra Homo Ludens, declara “há muitos anos
que vem crescendo em mim a convicção de que é no jogo e pelo jogo que a civilização surge
e se desenvolve”. Para ele, o jogo regula as ações e atitudes dos indivíduos nos grupos e se
constitui em espaços de relações sociais que ao se desenvolverem e se organizarem acabam
por se constituírem em instituições, com regras e valores próprios. Para eles, esses espaços
institucionais distinguem, mantém, criam e transformam as culturas dos diferentes grupos e
civilizações. Essa dupla função do jogo – transmissão e criação de regras, atitudes e papéis –
evidencia o quanto o espaço lúdico do jogo possibilita a construção de modelos simbólicos
que abrem outras possibilidades identificações aos sujeitos. Esse processo coloca em
movimento suas representações que tendem a estruturar como maneiras possíveis de ser, agir,
sentir contribuindo para a formação de culturas.
O autor destaca ainda que o jogo é vida e vida em movimento. Vida em relação com
outras vidas que também buscam sentido para sua existência em um emaranhado de sensações
e significações. Resumindo seus argumentos, o autor declara que “a antropologia e as ciências
a ela ligadas têm, até hoje, prestado muito pouca atenção ao conceito de jogo e à importância
fundamental do fator lúdico para a civilização”.
As considerações de Huizinga (2010) nos parecem próximas às afirmações de Piaget
(1975; 1994) sobre o desenvolvimento do jogo e sua função na formação dos indivíduos e
grupos. Para o autor, o jogo é fator de desenvolvimento do pensamento, da afetividade e da
moral, independente da idade dos sujeitos 4. Ou seja, é fator de desenvolvimento das formas
como o indivíduo se relaciona consigo, com os outros e com os objetos, pois promove o
processo de simbolização que enriquece o pensamento e coloca em movimento as interações
entre os sujeitos.
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É importante lembrar que para Piaget (1975) as estruturas dos jogos, embora sejam em suas obras investigados
em crianças, permanece nos sujeitos por toda a vida, pela estrutura de conservação própria da inteligência.
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Nas palavras de Caillois (1990, p. 10) “o termo 'jogo' designa não somente a
actividade5 específica que nomeia, mas também a totalidade das imagens, símbolos ou
instrumentos necessários a essa mesma actividade ou ao funcionamento de um conjunto
complexo”. A seguir apresentamos as características dos jogos a partir da sistematização feita
por Caillois (1990) em conjunto com as estabelecidas por Huizinga (2010).
O jogo pode assumir diferentes formas de acordo com as características dos grupos e
de sua organização. Por esse motivo é difícil encontrar na literatura especializada uma
definição que aborde a complexidade de tal fenômeno. Seguindo a sistematização proposta
por Huizinga (2010), optamos por elencar suas características gerais, já que acreditamos que
por esta via abrimos espaço para pensar o jogo como espaço possível para refletirmos sobre as
relações entre os sujeitos, tendo em vista seu papel na construção e organização da
simbolização e, portanto, da cultura.
Apresentando as características do jogo, Huizinga (2010) descreve como aspecto
primordial o fato de ser uma atividade livre. Isso significa que a liberdade se dá pela escolha
de seus participantes e se expande para delimitar o tempo e as circunstâncias em que o jogo
ocorrerá. Da mesma forma, caso um ou mais participantes queiram interromper o jogo ou sair
da partida, faz parte da liberdade de jogar a interrupção desse contrato lúdico. Jogar é
liberdade de escolha, pois supõe consentimento mútuo e respeito ao desejo de participar ou
não de um determinado jogo. “Chegamos, assim, à primeira das características fundamentais
do jogo: o fato de ser livre, de ser ele próprio liberdade” (HUIZINGA, 2010, p. 11).
Decorrente dessa característica Huizinga (2010, p. 11) apresenta outro aspecto
importante: o jogo não é realidade concreta. Isso porque ocorre em um mundo “paralelo” que
comporta os jogadores que optaram por estarem juntos, compartilhando dessa atividade
composta por regras específicas e previamente acordadas. “O jogo não é vida 'corrente' nem
vida 'real', pelo contrário, trata-se de uma evasão da realidade para uma esfera temporária de
atividade com orientação própria”.
Ao abordar o jogo como uma atividade que se realiza em uma dimensão paralela à
vida cotidiana que se justifica pela satisfação de interesses imediatos, individuais e, ao mesmo
tempo, coletivos, o jogo carrega consigo um código de regras que é parte indispensável do
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As palavras presentes nas citações estão mantidas de acordo com a obra dos autores.
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contrato estabelecido por seus jogadores. Mesmo quando o jogo é individual em sua
organização há códigos de conduta que visam regular e ordenar as atitudes de quem aceita o
desafio de jogar. Esse é um dos argumentos de Huizinga (2010), ao descrever como uma das
qualidades do jogo, ser um complemento para a vida dos sujeitos. Paradoxalmente, realizado
em uma realidade paralela o jogo se torna parte integrante da vida real como um mecanismo
indispensável à sua manutenção.
O jogo supõe isolamento e limitação. Isso significa que é “'jogado até o fim' dentro de
certos limites de tempo e espaço. Possui caminhos e sentidos próprios” (HUIZINGA, 2010,
p.12) que podem não ser observados e percebidos por quem o assiste como espectador, mas
que é vivido intensamente pelos jogadores. Essa demarcação do jogo como um espaço e
tempo à parte é um dos pontos principais de sua marca como formador de cultura.
O jogo pré-estabelece certos limites e possibilidades que podem ser observadas
também na realidade, como nos tribunais, nos altares, nos templos, etc., que se constituem
como espaços delimitados e compostos por regras, representações e linguagens específicas.
Os sujeitos, imersos nesses ambientes se encontram em espaços separados da vida corrente,
respeitam a sacralidade das regras, os acordos estabelecidos e comungam da construção de
outra realidade. Nesses ambientes existem figuras que assumem um papel de destaque e
orientam a conduta dos demais a partir da legislação prescrita, revestem-se da autoridade de
seu papel e usam roupas específicas que os distinguem do restante dos participantes das
cerimônias.
Os expectadores, os fiéis, os jurados também ocupam seus devidos lugares nesses
espaços, sendo este último grupo responsável pela sentença em um julgamento, como
resultado das argumentações advindas dos advogados que competem entre si para
convencerem os jurados. Desse modo, quem se saiu melhor é o vencedor. Para Huizinga
(2010), esses ritos têm suas origens localizadas nos jogos. “Tal como não há diferença formal
entre o jogo e o culto, do mesmo modo o ‘lugar sagrado’ não pode ser formalmente
distinguido do terreno do jogo. [...]. Todos eles são mundos temporários dentro do mundo
habitual, dedicados à prática de uma atividade especial”. (HUIZINGA, 2010, p. 13).
Podemos dizer que esses ambientes sociais, como outros do cotidiano, remetem a situações de
jogo, como os jogos de faz de conta e os jogos de regras vivenciados mais fortemente durante
a infância e que revivemos no dia a dia sem nos darmos conta disso.
Apresentando as características do jogo como atividade livre, desprendida da realidade
e marcada por um tempo e lugar determinados, Huizinga (2010) nos conduz a uma nova
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clubes ou “confrarias6”, “sociedades paralelas” regidas por regras, costumes, vivências que
são intimamente compartilhadas pelos sujeitos envolvidos no jogar e que os tornam membros
de uma realidade restrita, demarcada por tempo e espaço definidos e regulamentados. Ao
criar “sociedades” que se organizam paralelamente, o grupo permite a manutenção de sua
cumplicidade demonstrando o potencial coletivo do jogo.
Podemos inferir, então, que ao se manterem unidos pelos vínculos gerados na
atividade lúdica, os indivíduos criam para si “micro-sociedades” organizadas por meio de
regras construídas coletivamente e responsáveis pelo funcionamento do grupo. Neste
contexto, cada participante ocupa um papel e se torna corresponsável pela coesão interna do
grupo, unindo a necessidade de manutenção do próprio grupo às mudanças exigidas para
adaptação às novas demandas. Esse movimento de manutenção e adaptação é o que move os
diferentes grupos evidenciando, ao mesmo tempo, liberdade de permanecer e possibilidade de
cooperar, bem como rigor e flexibilidade instituídas pelos grupos em jogo. Callois (1990, p.
12) denomina esse fenômeno como um espaço entre o rigor e a margem, a vida real e o
“mundo” que se constrói ao jogar. “O primeiro é combinação exacta, relojoaria perfeita, o
segundo é elasticidade e margem de movimentos”.
Concluímos, assim, que mesmo marcado pela arbitrariedade das regras, o jogo se
constitui um espaço de construção do novo por meio da negociação entre as partes. Significa
desequilíbrio e equilíbrio intelectual, bem como exercício e construção de relações
cooperativas e competitivas entre seus membros. Como nos explica novamente Caillois
(1990, p. 28) “[o] jogo consiste na necessidade de encontrar, de inventar imediatamente uma
resposta que é livre dentro dos limites das regras”.
Porém, como adverte o autor, no jogo a vitória não significa a conquista do adversário.
O jogo pré-estabelece uma dimensão de honra e respeito para com o outro, cordialidade com
aquele que tem as mesmas possibilidades de vencer. O início de cada partida é sempre o
nascer de uma nova oportunidade para testar a si e para exercitar a relação com o outro. Nesse
movimento, o jogo se torna exercício para a construção de relações recíprocas em que o outro
é visto como um possível, igual. Para Caillois (1990, p.16), “[o] jogo supõe, sem dúvida, a
vontade de ganhar, pela utilização plena dos recursos e pela exclusão das jogadas proibidas.
Mas exige mais: é preciso ser cortês para com o adversário, dar-lhe confiança, por princípio, e
combatê-lo sem animosidade”.
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Termo utilizado pelo autor.
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empreendida pelo jogo e no jogo que nos impulsionam a pensar em sua utilização para a
construção de culturas para a cooperação e é sobre essa base que buscaremos desenvolver a
última etapa desse artigo.
Muniz (2010) em sua dissertação intitulada Os jogos cooperativos e o processo de
interação social constata que existe uma visão tradicional sobre os Jogos Cooperativos como
jogos que promovem a cooperação e a solidariedade. Em contraposição, os Jogos
Competitivos são criticados por evidenciar a dominação, a exclusão, a desonestidade, entre
outros. Desta forma, a cooperação parece ser um ideal de relação que merece louvor,
enquanto a competição é um tipo de relação que deve ser extinta, pois colabora para a
construção de valores anti-sociais. Muniz (2010) conclui seu trabalho destacando a
importância da competição, evidenciando como a essência desta atividade pode desenvolver
nos jogadores além de habilidades físicas, valores éticos, a honra, o cavalheirismo, o respeito
às regras e aos adversários: valores esses silenciados na maioria dos trabalhos que encontrou.
Para o autor a cooperação como resultado da submissão e da obediência às regras gera
nos jogadores um sentimento de “prazer fraco” que parece ser incapaz de desenvolver nesses
sujeitos o significado da importância de se agir de forma altruísta. Muniz (2010) destaca,
ainda, que situações competitivas também marcam os jogos cooperativos e nem por isso
promovem sentimentos de fracasso, desprazer, mas, podem gerar o contrário, tornar o jogo
mais atraente, dinâmico e produtivo.
Como apresentamos anteriormente, uma das características do jogo de regras é a
presença da competição entendida neste trabalho como competência indispensável para a
inserção dos sujeitos no mundo. Presente em nossa cultura, exige dos sujeitos o
aperfeiçoamento de suas habilidades e atividades, seja em nível cognitivo ou instrumental.
Diante desta crescente necessidade de atualização e mudança, a competição também
nos abre possibilidade para pensarmos em relações de cooperação em que a vitória não se
caracterize como a conquista do outro, mas vencer a si mesmo em relação com o outro. Todo
aquele que joga ou compete precisa ter como referência seu adversário ou parceiro para que
alcance a vitória. Pensando nas relações sujeito e outro, o jogo de regras (competitivo) em sua
estrutura possui valores éticos que são compartilhados entre seus jogadores e, como
mencionado pelos autores, exige lealdade e honestidade por parte de seus participantes que
antes mesmo de ganhar devem obedecer às regras estipuladas pelo o grupo.
Essas regras supõem esforço, determinação, disciplina e acordo mútuo para que o jogo
ocorra e a vitória seja possível. Embora conquistada a vitória é devida também ao adversário
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sem o qual o próprio jogo não existiria. Enquanto tal, o jogo possui “certo valor ético, na
medida em que são postas à prova as qualidades do jogador: sua força e tenacidade, sua
habilidade e coragem e, igualmente, suas capacidades espirituais, sua “lealdade”.
(HUIZINGA, 2010, p. 14),
O elemento de competição do jogo geralmente possui um fim em si mesmo. A
competição parte da necessidade de superação e mérito e cada competidor deve ofertar o
máximo de seus esforços para alcançar os melhores resultados ou a vitória. No entanto, o jogo
abre a possibilidade de superação e o vencedor pode a qualquer momento ser desafiado e
superado por um adversário. A vitória também é provisória e deve ser guardada com esmero,
enquanto não se encontre um desafiante melhor preparado. “A essência do lúdico está contida
na frase 'há alguma coisa em jogo'. Mas essa 'alguma coisa' não é o resultado material do
jogo, mas o fato ideal de se ter acertado ou de o jogo ter sido ganho”. (HUIZINGA, 2010, p.
57).
A conquista do prestígio é um dos aspectos importantes propiciados pelo jogo
competitivo e pode ser visto como um ganho coletivo na medida em que o sujeito que
conquista a vitória compartilha-a com seu grupo que a usufruem. O jogo possui um caráter
coletivo por que ninguém joga ou disputa algo sozinho, se assim o fosse, a vitória seria
manifestada por outro conceito. Ganhar é demonstrar superioridade em comparação a outro
ou outros, é sinônimo de excelência, mas quem conquista a vitória não a saboreia sozinho. A
vitória é simbolicamente uma marca que caracteriza o vencedor e sua “tribo”.
Com essas considerações podemos retomar as características descritas por Piaget
(1975; 1994) para o jogo de regras entre as quais o predomínio das relações de competição.
Para o autor, a competição é propulsora de desafios sempre crescentes na busca por se definir
quem é o melhor. Essa busca, por sua vez, promove um esforço para superação dos limites
fixados e abre possibilidades para novas formas de vermos o jogo, organizar suas regras,
pensar e repensar seus objetivos.
De outro lado, os aspectos apresentados por Huizinga (2010) nos permitem relacioná-
los também ao conceito de cooperação desenvolvido por Piaget (1975; 1994) – processo em
que o indivíduo ao participar de um jogo é exigido a coordenar diferentes pontos de vista aos
seus, em um movimento de troca e reciprocidade de ideias. Supõe relações de igualdade entre
os participantes de forma que o adversário ou parceiro são vistos como sujeitos que possuem
as mesmas condições de jogo e por isso podem disputar a partida, são dignos de serem
ouvidos e levados em consideração no jogar.
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Considerações Finais
Após discutir aspectos do jogo apresentados por Piaget (1974; 1994), Huizinga (2010)
e Caillois (1990) refletimos como os jogos são vislumbrados como espaços de
desenvolvimento que marcam a construção da identidade dos sujeitos em relação com seu
meio social e cultural. Focalizando nosso olhar para os jogos agôn (competitivos),
pontuamos que competir, vencer, perder e superar-se e aos outros, são aspectos indispensáveis
e indissociáveis para o desenvolvimento humano, social e cultural. Podemos afirmar que
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presentes em nossa cultura os jogos competitivos evidenciam a presença do outro como ponto
de referência para nosso pensamento e nossas ações.
Como marca da possibilidade de superação e construção de habilidades sociais, ao
possibilitar interações específicas do ato de jogar, o jogo competitivo tem como fundamento a
necessidade de cooperação para seu funcionamento. Nesse sentido, concluímos que cooperar
e competir tornam-se elementos complementares no jogo e podem se constituir em espaços de
potencialização do desenvolvimento individual, social e cultural.
Concluímos também que os jogos podem se constituir práticas de aprendizagens das
relações eu-outro evidenciando sua fecundidade para a construção de relações cooperativas.
Retomando o conceito de cooperação discutido por Piaget (1974; 1994) que parte da premissa
de colocar-se no lugar e no ponto de vista do outro para a construção do diálogo,
argumentamos que a competição presente no jogo de regras pode abrir espaços para a
construção dessa maneira de pensar e agir, levando em conta o outro como referência.
Cognitivamente, consideramos que essas habilidades são necessárias para a inserção
dos sujeitos nos grupos e nas relações sociais, formam condutas e modos de interação que se
baseiam na necessidade de levar em conta outros pontos de vista além do seu. Nesse
movimento, o diferente pode ser vislumbrado como uma possibilidade de pensar sobre si e
sobre o outro o que consideramos indispensável para a constituição de pedagogias que
privilegiam a diferença.
Pedagogias que levem em conta a pluralidade cultural e a convivência democrática
com o outro, o diferente, o estranho tem no jogo de regras, portanto, uma possibilidade viável
de trabalho na instituição escolar. Desde que acompanhados de uma mediação adequada do
docente consideramos a atividade com jogos de regras ações pedagógicas fecundas para a
construção de novas estratégias de ser, agir e sentir compatíveis com a construção de
interações dialógicas e democráticas.
REFERÊNCIAS
HUIZINGA. Johan. Homo ludens: o jogo como elemento da cultura: trad. João Paulo
Monteiro. 6ª ed. São Paulo. Perspectiva, 2010.
PIAGET, Jean. O juízo moral na criança [tradução: Elzon Lenardon]. São Paulo: Summius,
1994.