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SOBRE OMEDO DE DESEJAR

Das mutações ocorrentes nas emoções e as consequências dessas transformações.

Os desdobramentos dos elementos constituintes da vida mental provocam naturalmente


certa instabilidade que demanda de aprendizado em seu manejo para que seja possível
manter um bom funcionamento da mente. Uma experiência emocional que possa gerar um
componente psíquico podeentão se desdobrar em outro elemento que muitas vezes
representa seu contrário. Uma mente inundada por insegurança, por exemplo, pode gerar
hostilidade. Na descrição da síndrome de Estocolmo,onde o sujeito é submetidoa um
tempo prolongado de ameaça,ele passa então a apresentarafinidadeou até carinho por seu
agressor. Dessa maneira uma manifestação psíquica gera uma outra como defesa,
configurando assim num conjunto, que é tomado como um complexocom certa coerência.
Esses elementos componentes articulam-se entre si em váriasvinculações,de subordinação
ou não, que por conta dissosão de difícil compreensão racional.A relação entre desejo e
medo é um bom exemplo dessa ordem de reveses sofrido nas experiências emocionais. O
medo parece ser um subproduto do desejo e essa afirmação torna-se fato na medida em que
passa a ser possível perceber que aquele que não deseja nada não teme coisa alguma.
Ainda que seja o medo da morte gerado pelo desejo de viver, a relação entre esses dois
elementos da vida psíquica são inseparáveis quando examinados. Dentro dessa perspectiva
o medo estabelece elemento constitucional do funcionamento mental daquele que está
sendo conduzido pela cautela. Sendo assim, a mente que se encontre saudável terá o medo
comointegrante do instinto de autopreservação que é manifestado pelo desejo de viver.
Esse medo deve originar certa ansiedade, reação à percepção do perigo externo. Por se
tratar de um instinto, vai para além do campo racional e pode,com isso, nos orientar,
alertando, inclusive, para aquilo que se pronunciapra além do que é percebido pelos órgãos
dos sentidos, pra além das aparências.No entanto, existe outra ordem de relações
estabelecidas entre medo e desejo, que não se encontram no âmbito saudável. Em sua
TEORIA GERAL DAS NEUROSES publicada em 1917, Sigmund Freud (1856-1939)
propõe dois tipos de ansiedade."É possível, no princípio, trabalhar o tema da ansiedade,
por um tempo considerável, sem absolutamente pensar nos estados neuróticos. De
imediato, os senhores me entenderão, quando eu descrever essa espécie de ansiedade
como ansiedade ‘realística’, em contraste com ansiedade ‘neurótica’." (Freud, 1917).
Enquanto na ansiedade realística o medo é gerado por uma causa externa real e anuncia
assim capacidade da saúde mental, a ansiedade neurótica acontece por conta de uma
desordem no curso do desenvolvimento do pensar, que encontra entraves no andamento de
seus desdobramentos.
Freud formou-se em medicina neurológica, apesar dissoestruturouo que chamamos de
psicanálise a partir da percepção de que grande parte dos pacientes que atendia, não
conservava a origem de suas enfermidades no corpo físico, mesmo que se manifestassem
ali. Através de exames clínicos,Freud não conseguia diagnósticos no âmbito
fisiológico,sendo que aconstituição biológica, em suas funções conservavaum
funcionamento coeso, no entanto, a dor e o incômodo ainda jaziam presentes na queixa do
paciente. Em sua obra AS NEUROPSICOSES DE DEFESA de 1894, Freud designou a
ordem patológica que percebia em seus pacientes, o nome de neurose e nesse caso, mais
especificamente, histeria de conversão. Algo que advinha da dimensão do psíquico, mas se
manifestava no corpo."Na histeria, a representação incompatível é tornada inócua pela
transformação de sua soma de excitação em alguma coisa somática. Para isso eu gostaria
de propor o nome de conversão." (Freud, 1894)
Bem, embora essa proposta tenha sido publicada em 1894, quando a psicanálise ainda
engatinhava, mesmo hoje essa intuição freudiana nos serve como um excelente
instrumento para pensar os processos que desencadeiam as patologias mentais. Ora, é
indiscutível o fato de que a dor quando surge no corpo, tem maior poder de
convencimento, tantopara nós mesmos quantopara ooutro. Por outro lado, enquanto
aafliçãoé psíquica, se encontrando na ordem do não sensorial e não podendo contar com os
órgãos dos sentidos para confirmá-la, fica então desacreditada. Um conflito interno com
aiminênciade transbordar os limites emocionais do eu psíquico e manifestar-se no corpo
físico.
Aqui também estamos tratando, antes de tudo, de algo que configura-se como extensão do
conflito entre um medo e um desejo. Uma ordem de conflitos que pode promover severas
perturbações no funcionamento mental com a geração de inúmeros sintomas. Freud em seu
ESBOÇO DE PSICANÁLISE, publicado em 1940 propõe que “Os sintomas das neuroses,
poder-se-ia dizer, são, sem exceção, ou uma satisfação substitutiva de algum impulso
sexual ou medidas para impedir tal satisfação, e via de regra, são conciliações entre as
duas, do tipo que ocorre em consonância com as leis que operam entre contrários, no
inconsciente.”(Freud, 1940). Sem poder tornar-se consciente desse conflito que subtrai
suas energias sorrateiramente, o sujeito vive certa batalha inconsciente que acaba por
revelar-se nos vínculos. Toma certa prática especial nas relações onde passa a odiar como
forma de distanciamento e proteção daquilo que defato desejatanto. Desenvolvede tal
modo um quadro obsessivo, se envolvendocrescentemente com aquilo que na realidade
foge compulsivamente. Temos assim um quadro do qual Freud denominou, de 'neurose
obsessiva'. Enquanto essa modalidade de neurose projeta-se no mundo externo, a 'histeria
de conversão', em contrapartida, faz do sujeito uma vítima de si mesmo. Instigado por certa
culpa, pode se tornarservil á aquele do qual mantém grande ódio. Essesentimento de culpa
do paciente histérico, quando em seu maior nível, é que deve sofrer certa conversão do
plano psíquico para o nível orgânico. Dessa forma, passa a representar-se numa patologia
no corpo, ou seja, uma doença física ondeo sujeito pode encontrar certa via para se
autopunir. Essa dor física, por mais que seja penosa ainda deve ser menor do que a culpa
que carrega. Se antes avia descrédito sobre sua enfermidade, agora fisicamente doente,
pode convencer o outro, assim como convencer-se a si mesmo do seu sofrimento.
Freud introduziu a teoria da repressão a partir da observação dessa ordem de
experiências."A teoria da repressão é a pedra angular sobre a qual repousa toda a
estrutura da psicanálise." (Freud, 1914). Das tentativas de vinculação com a realidade
externa que tiveram desfechos mal resolvidos, são então geradores do movimento de
repressão. O reprimido, junto com os elementos instintuais, estaria contido no nível
inconsciente da mente. "O reprimido está condenado, pelas instâncias censoras do “eu”, a
viver nas profundezas do inconsciente. Mas, amiúde, tenta emergir na personalidade
consciente provocando, assim, os sintomas da neurose." (Martino, 2012). Segundo Freud
as neurose estão para as perversões como curso oposto do mesmocaminho, pois quando
uma satisfação da libido primitiva, não pudera ser atendidas, pode suscitar uma fixação
perversa de satisfação, que na medida em que é reprimida cria uma formação substituta: o
sintoma. "Portanto, os sintomas se formam, em parte, às expensas da sexualidade
anormal; a neurose é, por assim dizer, o negativo da perversão". (Freud, 1905)
No caso clínico do Homem dos Ratos, publicado em 1909 com o título de NOTAS SOBRE
UM CASO DE NEUROSE OBSESSIVA, o pai da psicanálise expõe as características da
neurose obsessiva comparada à histeria. Propõe que a manifestação da neurose obsessiva
pode ser considerada assim como na forma da histeria, no entanto, numaconfiguraçãomuito
mais compreensível por revelar-se de forma externa, enquanto a histeria leva o processo
psíquico para uma conversão somática. Porém, os pacientes que apresentam esse quadro,
diferentes dos histéricos, dificilmente procurapsicoterapia ou quando o faz, já se encontram
num quadro avançado.Os aspectos fundamentais dos transtornos apresentados pelo
Homem dos Ratos"eram medos de que algo pudesse acontecer a duas pessoas de quem ele
gostava muito: seu pai e uma dama a quem admirava." (Freud, 1909). Freud propõe que o
neurótico não pode perceber as conexões importantes que estabelece, pois as resistênciaso
enganam pelas forças reprimidas, ondeo que se revela é o medo, nunca o desejo. Depois de
ter sido reprimido o desejo, é difícil para o sujeito admitir que tenha de fato desejado, ou
que possavoltar a desejar, no entanto nunca deixou de fazê-lo. Isso acontece com o
paciente de Freud relatado no caso. Ele negava que os medos relacionados à morte do pai
correspondessem a um desejo (agora reprimido) de que o pai morresse."Conforme a teoria
psicanalítica, eu lhe disse, todo medo correspondia a um desejo primeiro, agora
reprimido; por conseguinte, éramos obrigados a acreditar no exato contrário daquilo que
ele afirmara. Isto também se ajustaria a uma outra exigência teórica, ou seja, a de que o
inconsciente deve ser o exato contrário do consciente." (Freud, 1909).
Testemunhamos assim a infindável e inexorável peleja entre o amor e o ódio.
Simultaneamente, quando o ódio ocupa o topo da consciência, o amor se mantém
encoberto, de forma latente, e vice-versa. Contudo, mesmo estando num estado latente,
ainda assim, mantém-se muito intenso e definindo “escolhas” na vida do sujeito. Paralisado
pela impossibilidade na proibição de integrar amor e ódio, o estado de ambiguidade
provoca sintomas de formas diversas configurando um complexo estado transtornado de
funcionamento mental. Um complexo que foi gerado por umaexperiência peculiar, onde
àquilo que um dia constituiu um desejoproibido torna-se exatamente o que desperta o
maior anseio, mas agora de forma inconsciente. Esse desejo, por ser inconsciente, amiúde é
impulsionado à ação (atuação) para sua concretização. No entanto, a consolidação tropeça
na proibição, gerando assim o medo que vincula-se ao objeto desejado. Podemos afirmar
com isso que o medo é filho do desejo.
Essa configuração também aparece como base da teoria das posições elaborada por
Melanie Klein (1882-1960), onde propõe ela que no ego primitivo, presente no início da
vida do bebê, existe uma tendência de divisão do seio em objeto bom e objeto mau, como
sendo dois objetos separados. Essa seria expressão do conflito inato entre amor e ódio e
das ansiedades que dessa experiência decorrem."O bebê projeta seus impulsos de amor e
os atribui ao seio gratificador (bom), assim como projeta seus impulsos destrutivos e os
atribui ao seio frustrador." (Klein, 1952) Dessa maneira o seio bom que é desejado é
separado do seio mal que é temido, quando na realidade trata-se de um só, um objeto total.
Uma experiência que longe de se restringir ao âmbito da primeira infância, configura-se
num funcionamento que amiúde experimentamos na vida adultaquando nos colocamos
frente à uma decisão (de - cisão) de grande importância. Desejamos um caminho, mas
tememos que o outro seja melhor opção.
Ora, ainda que estejamos aqui tratando de revisão teórica, minha experiência na prática
clínica mostrou com clareza a relação existente entre o medo e o desejo, confirmando
assim essa proposta da teoria psicanalítica, que por sua vez também não fora desenvolvida
de outro lugar que não fossem as experiências clínicas. Nos casos em queatendi,em que o
paciente sofrera de abuso sexual na infância, por mais aterrorizante que tenha sido a
experiência, ainda assim sentira algum prazer, pelo fato do estimulo de áreas erógenas,
hipersensíveis. Por conta disso, agora, quando adulto o paciente sente medo de que ele
abuse de crianças, pois o registro da experiência prazerosa ficara gravada e então é
revivida de forma reativa, ou seja, de maneira inversa. Acontece que por conta da
experiência traumática que viveu,hoje ele deseja, por mais que não deseje desejar e passa a
ter medo do desejo que sente.
Porém, a despeito da força do impulso que arrasta para a ação com o objetivo de realização
do desejo, o que na verdade pode acalmar o conflito está na possibilidade de
reconhecimento do que se deseja e não da consumação, que geraria mais culpa ainda. "A
ideia é que o desejo é um fluxo muito forte de libido (energia psíquica) e carrega em si
muito dos conteúdos impensados e impregnados de um narcisismo prematuro. Assim, um
pensamento que tenha nascido dessa forma, prematuro, já agia no funcionamento da
mente, mesmo sem ainda poder ser chamado de pensamento." (Martino, 2011)
Na relação entre pais (ou cuidadores) e filhos a relação entre desejo e medo revela-se de
grande influência.Isso pelo fato de que a criança passa por um longo período de
dependênciados pais ou aquele que cuidou dela. Assim, não seria absurdo afirmarque "a
forma como o bebê é desejado (mesmo antes de nascer), definirá certos traços em sua
personalidade que perdurarão por muito tempo, se não, por sua vida toda."(Martino,
2011). Existe nessa experiência o perigo de que satisfações frustradasda vida dos pais
sejam oferecidas ao filho com a incumbência de satisfazê-las. Dessa forma, o que um dia
fora um desejo nos pais, pode se tornar um medo nos filhos."Um medo de frustrar aqueles
que cuidaram dele e viver um dolorido sentimento de incompetência." (Martino, 2011).
Bem, o reconhecimento do sentimento é o que pode levar ao pensar e não é surpresa o fato
de que isso coincide com a capacidade de adiar a ação. Sobre isso, Freud escreve em 1911
em sua obra FORMULAÇÕES SOBRE OS DOIS PRINCÍPIOS DO FUNCIONAMENTO
MENTAL, que “O pensar foi dotado de características que tornaram possível para o
aparelho mental tolerar uma tensão intensificada de estímulo, enquanto o processo de
descarga era adiado.” (Freud, 1911). Isso equivale dizer que o reconhecer é aterrorizante e
o medo de reconhecer se faz novamente presente, relacionando-se ao desejo. Trata-se de
uma moção interna que leva a abrir mão da satisfação do prazer que se encontra na
realização do desejo. A psicanálise nos ensina com muita propriedade sobre o fato de que
para que exista o pensar é necessário desistir da satisfação imediata, na tolerância quanto
às frustrações.
Na proposta de WilfredR. Bion, um dos mais importantes nomes da psicanálise
contemporânea, o desejodo analista, juntamente com a memória e a ânsia por entender é
fator prejudicial para o desenvolvimento da análise, obstruindo o fluxo saudável do
processo psicoterapêutico. "No processo de psicoterapia, o desejo do psicoterapeuta de
resolver o problema do paciente, ou mesmo de gratificá-lo por algum motivo, ou ainda o
desejo de curá-lo, são prejudiciais ao desenvolvimento do tratamento." (Martino, 2015).
Bion refere-se a uma disciplina que aos poucos torna-se natural, conforme o
desenvolvimento da maturidade emocional do analista.Para Bion,não é “suficiente
‘esquecer’: é necessário umato positivo de abstenção de memória e desejo” (Bion, 1970).
No lugar da memória, do desejo e da compreensãoo que entra é o desenvolvimento do“ato
de fé” de que a verdade e a realidade última existem, e isso requer capacidade em tolerar
frustrações.Segundo Bion, se o psicanalista for permissivo com a intromissão de memórias
sobre o paciente, dos desejos do analista e da ansiedade de compreensão sobre os fatos à
qualquer custo"ele irá prejudicar sua capacidade analítica. Todo aquele que esteja
acostumado a lembrar o que os pacientes falam e a ficar querendo seu bem-estar, terá
dificuldade de avaliar o dano infligido à intuição analítica, inseparável de toda e qualquer
memória e qualquer desejo." (Bion, 1970)
A busca pela realização do desejo por mais que se mostre prazerosa, é exatamente a
responsável pelo conflito. Portanto, todo esforço para apaziguar e assim reduzir a
intensidade do desejo deve converter-se na diminuição do medo.Arthur Schopenhauer
(1788 —1860) que segundo o próprio Freud é o filosofo precursor da psicanálise, nos
alerta sobre a Vontadeque nos aprisiona. Mesmo não querendo ter vontade ainda assim ela
persiste, se transformando num medo de agir conforme essa mesma vontade.No
pensamento de Schopenhauer, a Vontade tem a primazia em relaçãoao intelecto e à razão
humana, quesão produtos das manifestações da Vontade, existindo para justificá-la.
Segundo Schopenhauer a vontade é a essência imutável dohomem e sua razão não tem
poder para determinar uma mudança no querer da vontade.A vontade tem origem no
desconforto e tem seu retorno na mesma dor. Assim como propõe em O MUNDO COMO
VONTADE E REPRESENTAÇÃO."Tal veemência excessiva do querer é já de per si e
diretamente, uma fonte constante dedor. Primeiramente porque qualquer querer, como tal,
nasce da necessidade, portanto, da dor." (Schopenhauer, 1818). Dessa maneira, toda a
busca pela diminuição do desejo converte-se em redução da dor.Sendo que as experiências
mais afortunadas são aquelas em que nos sentimos livre das ânsias e desejos desmedidos.
Assim como coloca Schopenhauer:
"Por meio da felicidade que então provamos, torna-se-nos possível julgar da beatitude do
homem cuja vontade não está, como no êxtase da estética, acalmada apenas por breve
instante, mas para sempre, quando está de fato consumado, salvo na derradeira centelha
que serve para manter a vida corpórea e que desaparecerá com ela."(Schopenhauer,
1818)
O desejo está na dimensão material da vida corpórea, que nasce, permanece por algum
tempo, crescendo e se desenvolvendo, produz alguns efeitos nos fenômenos e então passa a
definhar gradativamente, até a morte. Essa parte da existência é de pouca importância para
o que é da alma, que por sua vez, não se presta aos atributos materiais do espaço ou da
temporariedade. Não está aqui ou lá. Não tem passado, nem futuro. O medo de perder é
produto do desejo de ter, masenquanto aquele que deseja ter teme perder, aquele que ama
terá pra sempre. O grande problema é que só se aprende amar na falta do objeto amado.
Aquele que ama abre mão do desejo de "ter" o outro em nome do "ser" para o outro."É
então, pela capacidade de tolerar o vazio e desapego do desejo, que se abre a
possibilidade para desenvolver a disposição para amar." (Martino, 2015). Isso diz respeito
a uma constante batalha, pois aquilo que o corpo busca para se satisfazer não interessa à
alma e na realidade só faz por desvalorizá-la. Por outro lado, aquilo que nutri a alma está
justamente na renuncia dos prazeres do corpo.
O BhagavadGita, que faz parte das escrituras védicas da Índia antiga trata da busca pelo
exercício no desapego, para a expansão da consciência. No quinto capítulo é revelada a
“Sabedoria do Desapego”, ondeKrsna, a Personalidade Suprema de Deus, orienta seu
companheiroArjuna, em nummomento de insegurança que,“quem a tudo renuncia,
jubiloso, alcança, já agora, a mais alta paz do espírito; mas quem espera vantagem das
suas obras é escravizado por seus desejos”.Um texto que transcende a aplicabilidade
religiosa se estendendo no âmbito filosófico e também psicanalítico, já que trata da
experiência do desprendimento e da capacitação da tolerância às frustrações.
"No BhagavadGita é retratado um diálogo simbólico, representando o funcionamento
interno de cada um de nós, onde o guerreiro Arjuna representaria o “eu humano” (que em
algumas traduções se lê ego), cujo reino foi usurpado, e Krishna estariarepresentando o
“eu divino” plenamente realizado, que convida Arjuna a fazer a sua auto-realização,
derrotando seus parentes, que se recusam a devolver seu trono." (Martino, 2015). Um
modelo muito bem aplicável nofuncionamento da mente, onde a narração retrata a renuncia
do desejo e em consequência disso, tambémos medos.Em contrapartida, manter-se ligado
ao desejo é viver de ilusões já que a realidade não é definida pela vontade do humano. Por
conta disso é necessária a capacitação para o desprendimento daquilo que se encontra na
dimensão do real concreto, num exercício do desapego da materialidade através da
renúncia do que satisfaz o corpo, mas empobrece e nos distancia da alma. Numa relação
afetiva a confirmação sensorial deve, dentro dessa perspectiva, ser substituída pelo vínculo
simbólico, que dispensa a confirmação compulsiva pelos órgãos dos sentidos. O simbólico
vai para alémda morte, já que é possível se manter vinculado com aqueles que já
morreram.

Bion, W. R. (1970).ATENÇÃO E INTERPRETAÇÃO. Imago, Rio de Janeiro, 1973.

Freud, S. (1894). AS NEUROPSICOSES DE DEFESA. Ed. Imago. Rio de Janeiro.

_____ (1905).TRÊS ENSAIOS SOBRE A TEORIA DA SEXUALIDADE. Ed. Imago. Rio de Janeiro.

_____ (1909). NOTAS SOBRE UM CASO DE NEUROSE OBSESSIVA - O HOMEM DOS RATOS. Ed. Imago. Rio de Janeiro.

_____ (1914).A HISTÓRIA DO MOVIMENTO PSICANALÍTICO. Ed. Imago. Rio de Janeiro.

_____(1915).O RECALQUE In: ESCRITOS SOBRE A PSICOLOGIA DO INCONSCIENTE. Ed. Imago. Rio de Janeiro.

_____(1917). TEORIA GERAL DAS NEUROSES. Ed. Imago. Rio de Janeiro.

_____ (1940).ESBOÇO DE PSICANÁLISE. Ed. Imago. Rio de Janeiro.

Klein, M. (1969). ALGUMAS CONCLUSÕES TEÓRICAS SOBRE A VIDA EMOCIONAL DO BEBÊ. Em M. Klein, P. Heimann, S.
Isaacs& J. Riviere (Orgs.), Os progressos da psicanálise. Rio de Janeiro: Zahar. (Original publicado em 1952)

Martino, R. D. O LIVRO DO DESAPEGO - 1. ed.- São José do Rio Preto, SP: Vitrine Literária Editora, 2015.

_______. PRIMEIROS PASSOS RUMO À PSICANÁLISE- 1. ed. -- São José do Rio Preto, SP : Vitrine Literária Editora, 2012.

_______.PARA ALÉM DA CLÍNICA - 1. ed. São José do RioPreto, São Paulo: Editora Inteligência 3, 2011.

Prabhupada, A. C. BhaktivedantaSwami. O BHAGAVAD-GITA - Como Ele É. Editora: The Bhaktivedanta Book Trust. 1976.

Schopenhauer, A.O MUNDO COMO VONTADE E COMO REPRESENTAÇÃO, (livro 4), São Paulo: Unesp, 2005 – tradução de Jair
Barboza.(Original publicado em 1818)

Prof. Renato Dias Martino

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