Você está na página 1de 30

Древняя и Новая Романия 300

Anselmo Vasconcellos, Raquel Villela Alves


Anselmo Vasconcellos
Escola Estadual de Teatro Martins Pena
Professor,
Ator de cinema, teatro e televisão
romania.03@mail.ru

Raquel Villela Alves


Jornalista, apreciadora da arte
romania.03@mail.ru

УДК: 821.134.3(81)

A COMÉDIA NO BRASIL

Resumo: Usando o vasto material histόrico-literário, o artigo dá informação completa


sobre o desenvolvimento do género da comédia no Brasil através dos séculos.
Palavras-chave: comédia, teatro, literatura brasileira

Anselmo Vasconcellos, Raquel Villela Alves


Anselmo Vasconcellos
Martins Pena Theatre State School,
Professor
Brazilian cinema, theatre and television actor
romania.03@mail.ru

Raquel Villela Alves


Journalist, art amateur
romania.03@mail.ru
Древняя и Новая Романия 301

COMEDY IN BRAZIL

Summary: The articleusing large historical and literary material gives complex
information about the evolution of genre of comedy in Brazil through centuries.
Keywords: comedy, theatre, Brazilian literature

A comédia precisou de alguns séculos de maturação no Brasil para se firmar como


gênero de respeito no meio teatral, a exemplo do que ocorreu em todo o mundo. É o que será
mostrado a partir de agora. Serão observados os movimentos teatrais de forma ampla, com
filtro especial sobre a cena cômica e buscando relação com os grandes movimentos do teatro
mundial, quando for o caso.
Foram consideradas as iniciativas desde o início da civilização brasileira, mesmo
admitindo que sejam experiências teatrais rudimentares, conforme pondera o crítico teatral e
estudioso do teatro brasileiro Décio de Almeida Prado (1917-2000):
Se por teatro entendermos espetáculos amadores isolados, de fins religiosos ou
comemorativos, o seu aparecimento coincide com a formação da própria nacionalidade, tendo
surgido com a catequese das tribos indígenas feita pelos missionários da recém-fundada
Companhia de Jesus. Se, no entanto, para conferir ao conceito a sua plena expressão,
exigirmos que haja uma certa continuidade de palco, com escritores, atores e público
relativamente estáveis, então o teatro só terá nascido alguns anos após a Independência, na
terceira década do século XIX.

Teatro como recurso de catequese


O que se sabe sobre o teatro brasileiro no período colonial (Século XVI) vem
principalmente de escritos dos padres jesuítas Fernão Cardim (1540-1625) e José de Anchieta
(1534-1597). Cardim registrou o que viu e Anchieta foi autor de textos para serem encenados.
É arriscado estabelecer datas exatas com o material histórico disponível, mas uma referência
mínima para o início das atividades teatrais no Brasil é o ano de 1567, quando Anchieta
viabilizou a encenação da peça Pregação Universal, em São Paulo de Piratininga.
Coube a Anchieta o mérito de escrever as primeiras peças genuinamente brasileiras,
classificadas como autos. O padre era espanhol e, além do idioma natal, escreveu em latim,
português e tupi-guarani. Dos vários autos que teria elaborado apenas oito chegaram aos dias
atuais. A linguagem teatral serviu para transmitir aos indígenas a religião e a cultura dos
colonizadores, daí a pouca preocupação com o acabamento artístico. Valia mais o conteúdo,
Древняя и Новая Романия 302

carregado do embate entre o Bem e o Mal, como ocorria em peças europeias da época. Outra
marca dessas peças eram situações de humor, mantidas por Anchieta. Para criar momentos
cômicos, jogou com palavras e mudança de idioma.
Nem todos os valores europeus eram transpostos com facilidade para a cultura indígena
pelo teatro. É o caso do adultério, denunciado pela Igreja. Os índios sabiam do
relacionamento de suas mulheres com outros homens da tribo e até apreciavam observá-los.
Assim também queimar uma pessoa, que os padres associavam à punição no Inferno, era
costume de algumas tribos antropofágicas.

Comédia em versão indígena


Fernão Cardim relatou, em carta de 1585, a viagem que fez na condição de secretário
com o padre visitador Cristóvão Gouveia. Falou do acolhimento festivo nas comunidades
visitadas, com comida, música, canto e teatro. Nessa carta encontramos «o primeiro ator
brasileiro a merecer as honras de uma citação nominal», de acordo com Almeida Prado. Esse
ator era o índio Ambrósio Pires e sua especialidade era fazer rir. Sua popularidade permite
imaginar a facilidade com que a comédia se instalou no Brasil. É ela que emoldura o registro
do primeiro talento teatral brasileiro. Consta que o comediante foi levado a Lisboa a convite
dos jesuítas.
Ambrósio interpretava o anhangá, que na mitologia tupi-guarani era o espírito do mal
ou diabo. Via-se aí uma versão indígena do personagem cômico que tanto agradava o público
europeu. O diabo era uma figura divertida nos espetáculos medievais e depois na italiana
Commedia del’Arte, personificado no Arlequim. Pelo relato do padre «nem faltou um
Anhangá, scilicet diabo, que saiu do mato: este era o índio Ambrósio Pires» (silicet é palavra
latina que se traduz por «isto é»). «A esta figura fazem os índios muita festa por causa de sua
formosura, gatimanhos e trejeitos que faz: em todas as suas festas metem algum diabo, para
ser deles bem celebrada».
A partir da obra de Anchieta, dos registros do padre Cardim e da visão crítica de
Almeida Prado, é possível reunir os fundamentos da encenação e da dramaturgia jesuítica.
Como proposta geral, havia o aspecto lúdico do teatro e a sua conexão a uma festa religiosa
maior, com espaço para o profano e o divertido. Entre os principais recursos cênicos e
dramáticos estavam diálogos ocasionais, deslocamento constante no espaço, figuras
simbólicas, cenário quase sempre natural, papéis interpretados por alunos de vários níveis e
com inclusão dos indígenas, comunicação de natureza sensorial (música e dança) e o diabo
como fonte de comicidade.
Древняя и Новая Романия 303

O primeiro comediógrafo
Após Anchieta, a atividade teatral perdeu fôlego e um grande vazio cênico se estendeu
por todo o século XVII e primeira metade do século XVIII. As raras exceções vieram de
ambientes escolares e de eventos cívicos comemorativos. Em 1641 foi encenada uma comédia
no Rio de Janeiro para celebrar a restauração da monarquia portuguesa. O casamento de
Carlos II, da Inglaterra, com a infanta D. Catarina, de Portugal, teria inspirado a apresentação
de outras comédias, em Salvador, em 1662.
Outra exceção nas atividades teatrais, e dessa vez com informações mais consistentes, é
um interessante achado na historiografia cômica. O baiano Manuel Botelho de Oliveira
(1637-1711), o primeiro brasileiro a ter um livro publicado, foi também o primeiro
comediógrafo nascido no Brasil. «Nenhuma boa vontade, contudo, nos autoriza a incluir o
autor em nossa literatura dramática», assevera o historiador e crítico teatral Sábato Magaldi.
«As comédias foram escritas em espanhol, observando modelos hispânicos e não nos parece
que tenham sido representadas. O gênero que lhe foi atribuído (‘descante cômico reduzido em
duas comédias’) negaria até a pretensão de que se destinassem ao palco».
Rigor técnico à parte, a obra de Botelho de Oliveira tem seu valor histórico. Ao que
tudo indica, o artista queria crescer nos meios teatrais e, para isso, teria mesmo de buscar
espaço fora do Brasil. Aqui não havia estrutura teatral. E nem gráfica, já que a impressão só
foi possível após a vinda da família real portuguesa ao país. Seu livro foi publicado em
Portugal, sob o título Parnaso. Reunia todas as suas poesias e duas comédias: Amor, Engaños
y Celos e Hay Amigo para Amigo.
Ambas usavam a fórmula das comedias espanholas – ciúmes, traições e quiproquós – e
foram escritas à sombra de peças existentes. A primeira é similar à La más Constante Mujer,
de Juan Perez Montalvan e a segunda é uma réplica a No Hay Amigo para Amigo, de
Francisco de Roja Zorilla. É aí, na pouca criatividade do autor, que a crítica faz algum
sentido. Magaldi, porém, reconhece que «a delicadeza de sentimentos e a finura e a elegância
de alguns diálogos permitem supor que, se fossem outras as condições do meio, o autor
poderia ter feito teatro para um público ocioso e cultivado». Botelho de Oliveira era erudito,
bacharel pela Universidade de Coimbra e poliglota: escrevia versos em latim, português,
espanhol e italiano.

Depois da catequese, a diversão


A grande tônica das peças do período colonial pós-jesuítico parece ter sido a diversão,
na mistura de dança, música e encenações. A comicidade era garantida, conforme relato de
Древняя и Новая Романия 304

um viajante francês (1717-1718), selecionado por Almeida Prado. Fala de jovens religiosas
preparadas para apresentar canções jocosas: «dado o sinal, cada uma delas cantava uma
canção, e essa mixórdia de instrumentos e vozes em desacordo nos provocou grande vontade
de rir». Tais apresentações seriam mais bem definidas como parateatrais pela falta de
estrutura e técnica.
Há também registros de apresentações de comédias ou atos cômicos, que Almeida
Prado ressalta serem «naquele sentido ibérico que se traduz em português moderno pela
denominação genérica de peça de teatro». Na época, de fato, não se delimitava claramente o
cômico e o trágico em peças europeias, que exerceram algum tipo de influência no Brasil. A
comedia espanhola e as tramas francesas, por exemplo, acolhiam na mesma trama conquistas
e desventuras, diversão e riso, independentemente da temática predominante.
Um artista de destaque no período foi Antônio José da Silva, o Judeu (1705-1739).
Nascido no Rio de Janeiro, partiu para Lisboa em 1712 e não retornou mais. Foi queimado na
Inquisição, sob acusação de práticas judaizantes. Escreveu peças líderes de sucesso em
Portugal e que, segundo alguns historiadores, foram encenadas também no Brasil. Sabia
articular bem a comicidade e valia-se da sátira para criticar a sociedade portuguesa da época.
Em sua primeira peça, Vida do Grande Dom Quixote e do Gordo Sancho Pança, Sancho era
crítico, malcriado e não devia honrarias nem submissão a D. Quixote. Na peça Medeia, o
Judeu explora a condição do ator como boneco e, partindo para o nonsense, seu personagem
Sacatrapo sai a procurar a própria cabeça, que se separou do corpo.

Governo apóia o teatro


O apoio do poder público ao teatro se evidenciou em 1771, com um alvará que
aconselhava «o estabelecimento de teatros públicos bem regulados, pois deles resulta a todas
as nações grande esplendor e utilidade». Ajudou na regularidade da atividade teatral ao criar
endereço fixo para as encenações, liberando artistas da necessidade de buscar espaço em
igrejas ou em residências suntuosas.
Antes dependente da Igreja, as artes cênicas passaram a se desenvolver nos círculos de
riqueza e poder. A construção de teatros começou por Salvador, sede do Vice-Reinado, seguiu
pela rota do ouro e das pedras preciosas, em Vila Rica (atual Ouro Preto) e Cuiabá e pelos
importantes centros políticos e econômicos de Rio de Janeiro, Recife e Porto Alegre. Eram
edifícios pequenos, conhecidos como Casa de Ópera.
Na virada para o século XIX era grande o esforço de profissionalização da classe teatral.
A cidade do Rio, que já era o centro da vida teatral brasileira, ganhou um impulso inesperado
Древняя и Новая Романия 305

com a instalação da família real portuguesa, em 1808. D. João VI gostava de artes e, como
considerou de baixa qualidade a produção na colônia, tomou medidas para reverter a situação.
Para o teatro houve duas principais decisões. Uma foi com os edifícios teatrais,
aprimorando algo já iniciado. Em decreto de 1810, D. João VI determinou que «se erija um
teatro decente e proporcionado à população e ao maior grau de elevação e grandeza em que
hoje se acha pela minha residência nela». O Teatro São João ficou pronto três anos depois e
acolheu as diversos manifestações teatrais, entre as quais comédia, farsa, vaudeville e burleta.
Outra decisão do rei foi trazer atores de companhias portuguesas. A brasileiros
couberam apenas papéis secundários. Não se investiu na formação de atores, ao contrário de
outras artes, onde havia recomendação especial para o ensino. O melhor exemplo é a Missão
Artística Francesa, que trouxe pintores, paisagistas e escultores para desenvolver suas
criações e repassar técnicas a pessoas com talento na colônia. Chegou ao Brasil em 1816 e um
dos artistas mais famosos foi Jean Baptiste Debret (1768-1848), que por 15 anos retratou
paisagens brasileiras e dedicou-se ao magistério artístico.

Independência também no teatro


Após a euforia cultural instalada com a corte portuguesa, o teatro perdeu força, pois os
interesses nacionais se direcionaram para a política e culminariam na independência do Brasil.
Para preservar a cena teatral, a realeza trouxe uma companhia inteira de Portugal, com
integrantes dispostos a se fixarem no país. À frente estava a renomada atriz trágica Ludovina
Soares da Costa (1802-1868). Seus trabalhos ajudaram a conferir continuidade profissional ao
teatro.
Um ator português de destaque, remanescente das primeiras companhias, foi Victor
Porfírio de Borja, especialista em papéis cômicos. A aprovação popular era grande, mas,
pelos critérios de então, Porfírio não era páreo para os intérpretes da tragédia, «o único gênero
teatral a conferir nobreza artística a seus participantes», revela Almeida Prado. A maioria das
incursões cômicas nos grandes teatros cumpria a finalidade específica de oferecer alívio
temporário à plateia, mergulhada na densidade dos temas. Eram os entremezes, inseridos entre
os atos das peças principais, as tragédias, ou ao final dessas, sem compromisso com enredo. A
proposta era divertir, com cenas curtas, engraçadas e despretensiosas.
A ideia de povo livre e de nação independente foi interpretada no meio teatral como
oportunidade de se emancipar do formato português. Significava brigar por uma cena
tipicamente brasileira. Três artistas se sobressaíram e cravaram seus nomes na história do
Древняя и Новая Романия 306

teatro: João Caetano dos Santos (1808-1863), Luís Carlos Martins Pena (1815-1848) e
Domingos José Gonçalves de Magalhães (1811-1882).
João Caetano constituiu, em 1833, a primeira companhia teatral apenas com atores
brasileiros. Ele próprio era ator e conjugava atuação com outras funções, como ensaiador e
empresário. Sua temática preferida era tragédia, mas também abriu espaço para comédias.
Encenou, em março de 1838, a primeira peça escrita e encenada por brasileiros. Foi Antonio
José, ou o Poeta e a Inquisição, uma tragédia escrita por Gonçalves de Magalhães.

Nasce a comédia brasileira de costumes


Meses depois, em 4 de outubro de 1838, a companhia de João Caetano levou aos palcos
O Juiz de Paz na Roça, a primeira peça cômica de Martins Pena. Tinha apenas um ato, mas já
desenvolvia uma trama completa e inspirada na realidade brasileira. O autor usava a língua do
povo e situações de seu cotidiano com um viés satírico. Estava inaugurada nossa comédia
popular, a comédia de costumes.
O jovem comediógrafo de 22 anos agradou o público de imediato, mas parece não ter
vislumbrado um futuro promissor no teatro, a ponto de dedicar-se a ele com exclusividade.
No mesmo ano, assumiu funções públicas no Ministério dos Negócios Estrangeiros.
Felizmente para a cena brasileira, continuou também com seu projeto artístico e escreveu
outras 19 comédias e seis peças trágicas. Não teve com as tragédias o mesmo reconhecimento
obtido com as comédias. Aos 33 anos de idade, Martins Pena contraiu tuberculose.
Trabalhava em Londres e tentou regressar ao Brasil, mas faleceu a caminho, em Portugal.
Martins Pena criou personagens cômicos marcantes, identificados com o campo ou com
a cidade. Os tipos rurais, os caipiras, tornavam-se engraçados pelo jeito ingênuo e tosco de
ser. Nos urbanos, a comicidade estava em acentuar desvios de caráter ou de comportamento e
traços profissionais, personificados em comerciantes desonestos, falsos eruditos e malandros,
entre outros. Usou o humor para alfinetar vícios, profissões indignas, tráfico de negros, modas
e outros costumes da sociedade.
Não faltou quem o criticasse, principalmente por suas peças serem curtas e as
abordagens, superficiais. Seu foco não era mesmo aprofundar perfis psicológicos. Tendia
mais para o entretenimento, para a diversão ligeira, mas captou com olhar arguto os costumes
da sociedade carioca. Suas peças não eram longas, de fato, alinhadas aos padrões da época
para esse gênero teatral. Criou uma estrutura intermediária entre o entremez e uma peça
clássica. Um fato que truncava a brasilidade do trabalho de Martins Pena era a presença de
atores portugueses nas encenações. O sotaque lusitano causava alguma dissonância na plateia.
Древняя и Новая Романия 307

Havia em Martins Pena um traço contracultural, que o levou a enxergar um novo filão e
nele investir. Sua ousadia não foi suficiente para transpor todas as barreiras que separavam a
comédia brasileira das obras de elite, as tragédias, mas permitiu elevar seu patamar. Sua
fórmula para fazer rir era simples, inovadora e eficiente. Serviu de referência para artistas que
o sucederam, que criaram versões a partir do modelo iniciado. Sua obra possui valor
documental por retratar uma época da história brasileira. Traz, ainda, um sutil questionamento
ético, que o meio teatral depois adotaria como importante recurso.
Pouco antes de Martins Pena, outros brasileiros escreveram peças cômicas, também
com temática nacional e cunho popular. Um deles foi Manuel de Araújo Porto-Alegre (1806-
1879), aluno de Jean Baptiste Debret e notabilizado como o primeiro caricaturista brasileiro.
Apenas uma das várias comédias que teria escrito sobreviveu ao tempo. É A Estátua
Amazônica, que satiriza a notícia da descoberta de uma pedra com inscrições hieroglíficas no
Rio Negro.
O rigor histórico nos leva a registrar ainda as peças de Joaquim José Teixeira (1811-
1895), O Triunfo da Imprensa e Um dos Muitos, que, cronologicamente, seriam as primeiras
comédias brasileiras. Ambos os comediógrafos não figuram com destaque na história da
comédia brasileira porque suas peças não chegaram aos palcos, ao contrário da obra de
Martins Pena.

Dramaturgia sobrevive entre romances e poesias


Seria de se esperar que a trilha aberta por João Caetano e Martins Pena desencadeasse
uma farta sequência de novos talentos e ampliasse o vigor de nossa produção cômica. Não foi
assim. O país não tinha estrutura artística suficiente para acolher a melhoria técnica da classe
teatral. Faltava tradição dramática e escolas para formar profissionais. Os atores, em geral,
eram mal pagos, muitas vezes discriminados e sujeitos à censura.
A comédia amargava a condição de gênero teatral inferior, mas curiosamente
apresentou resultados mais interessantes que a tragédia. Era inegável o pendor dos autores
brasileiros para a comédia e a obra de Martins Pena foi um bom ponto de partida. Muitas
peças teatrais continuaram a ser escritas, embora os grandes escritores preferissem o romance
e a poesia, com os quais se deram muito bem.
Joaquim Manuel de Macedo (1820-1882), autor doprimeiro romance brasileiro, A
Moreninha, transitou pelo teatro com dez peças, aí incluídas cinco comédias e duas sátiras
políticas. A obra primava pelo realismo, generalizações de condutas e de situações, em lugar
de casos concretos e específicos, como em Martins Pena. Preocupava-se com a ética e
Древняя и Новая Романия 308

apresentou um trabalho refinado, com melhores resultados na literatura que no teatro. Mesmo
assim, várias peças suas arrancaram aplausos da plateia e suas comédias guardam um belo
retrato dos costumes cariocas. As mais conhecidas são O Fantasma Branco, a primeira delas,
datada de 1856, e A Torre em Concurso, de 1863, enaltecida por críticos pelo elevado padrão
dramático.
O desenvolvimento da comédia brasileira esbarrava no baixo nível de algumas
produções, carregadas de situações execráveis e linguagem de baixo calão. Contra essa
condição se insurgiram alguns expoentes literários da época, entre os quais Joaquim Maria
Machado de Assis (1839-1908), um dos mais brilhantes escritores brasileiros. Infelizmente,
sua contribuição para o teatro foi limitada. Deixou-nos algumas comédias, de agradável
leitura, mas que não são a melhor expressão de seu talento. No palco, suas personagens
careciam de energia psicológica e dinamismo teatral para empolgar plateias.

O trio nordestino da comédia


José Martiniano de Alencar (1829-1877) engrossava a fileira de intelectuais
empenhados em elevar o nível de nossas obras teatrais. Queria algo além do filão popular e
grosseiro das comédias da época, como observa a especialista em teatro, Vilma Áreas1. Diz
ela que «sua comédia derivou, segundo seu próprio depoimento, de seu desejo de moralizar o
teatro». É de José de Alencar O Demônio Familiar, a mais aclamada comédia brasileira da
segunda metade do século XIX e uma das melhores já produzidas no Brasil.
Alencar buscou inspiração em Molière para escrever comédias. Sentia falta de uma
referência forte no Brasil e disse a respeito de seus antecessores:
O primeiro, Pena, muito conhecido pelas suas farsas graciosas, pintava até certo ponto
os costumes brasileiros; mas pintava-os sem criticar, visava antes ao efeito cômico do que ao
efeito moral; as suas obras são antes uma sátira dialogada, do que uma comédia. Depois de
Pena veio o Sr. Dr. Macedo, que, segundo supomos, nunca se dedicou seriamente à comédia;
escreveu em alguns momentos de folga duas ou três obras que foram representadas com muito
aplauso.
Juntamente com o cearense José de Alencar, outros dois artistas nordestinos garantiram
o viço da comédia brasileira entre o fim do século XIX e início do século XX: o baiano
Joaquim José de França Júnior (1838-1890) e o maranhense Artur Nabantino Gonçalves de
Azevedo (1855-1908). Os dois eram muito mais afetos ao teatro. Alencar ganhou

1
Vilma Áreas faz um interessante resumo da comédia, desde a Grécia até a atualidade, no livro Iniciação à
Comédia, de 1990. A Jorge Zahar Editora informou que o livro está «esgotado e fora de catálogo».
Древняя и Новая Романия 309

reconhecimento maior em romances, explorando bem um tema querido pela intelectualidade


da época, a brasilidade, que resultou em primorosas obras literárias, como O Guarani.
Para o crítico Sábato Magaldi «Caiu o Ministério! e As Doutoras, entre outros textos,
sustentam a reivindicação para França Júnior do título de melhor comediógrafo do Brasil».
Sua linha criativa seguiu em paralelo à de Martins Pena. Ambos se abasteceram dos costumes
sociais da capital do império e se esbaldaram em ridicularizar seus excessos. A principal
diferença é que França Júnior era um artista mais completo e mais contundente em suas
abordagens. Não poupava nada nem ninguém e pintou a sociedade com tons bem mais fortes
e acentuados, em comparação à leveza cômica de Martins Pena. Esse traço do autor o fez
resvalar, algumas vezes, pelo atalho da vulgaridade temática.
«Não resistimos à tentação de considerar Artur Azevedo a maior figura da história do
teatro brasileiro», declara Magaldi. «Não certamente, o maior dramaturgo, mas a
personalidade que melhor encarna nossos vícios e nossas virtudes, o talento nacional típico».
Artur Azevedo foi um dos maiores defensores do teatro brasileiro e seu talento conferiu
energia aos palcos na virada do século. Aos 18 anos, já desfrutava a fama com A Baronesa de
Caiapó, paródia de A Grã Duquesa de Gerolstein, de Jacques Offenbach. O próprio autor
disse que «todo o Rio de Janeiro foi ver a peça, inclusive o Imperador, que assistiu, dizem, a
umas vinte representações consecutivas...». Suas comédias A Capital Federal e O Mambembe
figuram com realce na dramaturgia brasileira. O autor tinha facilidade em se conectar com o
público e prender sua atenção do início ao fim da peça.

Ganha força o teatro de revista


Artur Azevedo é referência na transição entre a comédia de costumes, nascida e
robustecida com Martins Pena, e o teatro de revista. Revista era um teatro musicado, de
conteúdo cômico, importado da França e da Espanha, que ganhou feições próprias no Brasil e
se popularizou a partir do final do século XIX. Fincado na realidade, assumiu traços distintos
em suas três grandes fases.
A primeira encenação do teatro de revista foi em 1859, no Rio, com As Surpresas do
Sr. José da Piedade, de Justiniano de Figueiredo Novaes. Algumas décadas, contudo, foram
necessárias para a proposta cair no gosto popular. Artur Azevedo teve competência artística
para aproveitar o momento histórico propício à popularização dessa variante cômica e foi o
grande nome de sua primeira fase. Autor de quase uma centena de peças, adotou o texto como
principal recurso cênico em suas revistas. Encenada no início de cada ano, fazia a
Древняя и Новая Романия 310

retrospectiva de fatos reais do ano anterior em cenas curtas e independentes entre si, com
críticas divertidas, versos e alegorias. A peça era um noticiário cômico.
A comédia de costumes não deixou de ocupar nossos palcos, até porque já estava
definitivamente incorporada ao repertório teatral brasileiro. Só não era mais uma novidade e,
por isso, abriu espaço para acolher mais essa vigorosa expressão do humor. O teatro brasileiro
vivia a era do riso farto, que se estendeu das últimas décadas do século XIX até meados do
século XX.

Um século de comédia
A plateia orientava a produção teatral no Brasil nas décadas anteriores e posteriores à
virada do século. O povo queria rir e lotava os teatros para se deliciar com a graça ligeira dos
espetáculos. A cena brasileira foi, por isso, dominada pela comédia popular. Os intelectuais
revelavam pouco entusiasmo por tais peças, pois viam nelas um componente comercial, baixa
investigação artística e uma tênue e perigosa fronteira com a vulgaridade. A crítica decorria
não tanto da comicidade em si, mas da abordagem superficial de temas, tanto os relativos a
emoções pessoais e coletivas como os problemas sociais. Grandes questões nacionais, como o
abolicionismo, encontraram melhor guarida na literatura.
O pensamento da elite foi vencido pela vontade popular. O teatro tornou-se a diversão
das massas e se expandiu muito nas camadas sociais tradicionalmente com menos acesso a
espetáculos. O Teatro Trianon, no Rio, tinha seus 1.000 lugares sempre ocupados e peças
novas a cada semana. Era essencial uma organização prática do trabalho e a especialização
dos atores em certos papéis.
Os ganhos sociais com tal condição são inquestionáveis, mas houve perdas. As
profundas reflexões de artistas sobre o conjunto da obra cênica, que sacudiram convicções
estéticas e temáticas em países da Europa e na Rússia, chegaram ao Brasil de forma apenas
residual e com atraso. Demorou para que fossem conhecidas no Brasil as ideias de
Stanislawski, Appia, Craig e outros.
O Rio espelhava, a seu modo, a efervescência cultural de Paris. Nos palcos parisienses
pululavam o cancã, a ópera-bufa e a opereta. Aqui sua melhor tradução foi o teatro de revista,
que entrava em sua segunda fase, atendendo aos anseios da sociedade por atividades teatrais
mais afinadas com a crescente boemia. A especialista Neyde Veneziano entende que foi «um
teatro que contribuiu para a nossa descolonização cultural, que fixou nossos tipos, nossos
costumes, nosso modo genuíno do 'falar à brasileira'».
Древняя и Новая Романия 311

A popularização do teatro
Também de Paris veio o cinema, por iniciativa do empresário de entretenimento
Paschoal Segreto (1868-1920), que montou a primeira sala de exibição no Rio, o Salão
Novidades de Paris. Viabilizou a exibição cinematográfica no Brasil em 1896, no ano
seguinte à apresentação pelos irmãos Auguste e Louis Lumière. Era um espaço de tempo
curtíssimo para os padrões da época. O cinema não desbancou a popularidade do teatro
porque Segreto administrou bem as duas formas de diversão. Deixou o cinema para as elites e
massificou o teatro, ao incentivar a comédia ligeira e introduzir as sessões teatrais, que
baratearam o custo do ingresso.
Muitos artistas contribuíram para a riqueza cômica dos palcos cariocas. O maranhense
Antônio Maximiano Coelho Netto (1864-1934) foi um deles. Escreveu cerca de 30 peças e
deixou como marca própria a visão poética e uma abordagem mais intelectualizada do humor,
embora tivesse habilidade para avançar em várias tendências, inclusive a do riso fácil das
farsas. Nas ruas e nas casas, Coelho Netto colheu farto material para criticar relacionamentos,
superstições e padrões sociais.
Outro destaque foi o carioca João Paulo Emílio Cristóvão dos Santos Coelho Barreto
(1881-1921), o João do Rio. Valia-se muito do paradoxo como ferramenta cômica. Sua
característica temática era a futilidade em ambientes sociais e os movimentos decadentistas2.
Em termos de público, poucas peças tiveram a repercussão de Forrobodó, da
Companhia de Operetas, Burletas e Revistas do Teatro São José. Foi um fenômeno teatral.
Estreou em 1911 e consta que foi apresentado mais de 1.500 vezes consecutivas. «As 22
sessões semanais de Forrobodó lotavam com meses de antecedência, algo inédito na história
das diversões públicas da cidade», registra o pesquisador Antonio Herculano Lopes. A peça
falava de um roubo de galinhas do dono de um clube musical e de um quiproquó na entrada
desse clube. Levou ao palco as palavras erradas e os hábitos da classe pobre do Rio. Foi
escrita pelos jornalistas Luís Peixoto e Carlos Bittencourt, com música de Chiquinha
Gonzaga.

Influências mundiais sobre o teatro brasileiro


No início do século XX, era comum a vinda ao Brasil de companhias teatrais da França,
Itália e Portugal. Quando a Europa entrou na I Grande Guerra Mundial (1914-1918), o fluxo
cultural foi interrompido e o Brasil apoiou-se em temas e valores nacionais para seguir

2
Decadentismo foi uma corrente estética que criticava a decadência em que o mundo estava mergulhado.
Древняя и Новая Романия 312

adiante. A crítica humorística a fatos políticos e sociais continuou, acrescida de ufanismo


sobre o grande potencial do Brasil.
Uma obra emblemática do período é Onde Canta o Sabiá, de Gastão Tojeiro (1880-
1965), encenada a partir de 1921. Trazia o forte nacionalismo do pós-guerra e ingredientes
típicos da comédia de costumes: a vadiagem e a malandragem no funcionalismo público.
Tojeiro, que escreveu mais de 100 peças cômicas, vinha de um sucesso anterior, O Simpático
Jeremias, interpretado, a partir de 1918, por Leopoldo Fróes (1882-1932), considerado o
grande ator da época.
Ator competente e mestre na improvisação, Fróes foi também empresário e seu eixo
temático era a comédia de costumes de cunho nacionalista. Seu entusiasmo pelas questões
teatrais extrapolou os palcos. Tinha uma preocupação estrutural com a arte e com os artistas.
Uma iniciativa sua bem conhecida foi a criação, com amigos, do Retiro dos Artistas, existente
até hoje no Rio.
A conexão com movimentos culturais da Europa intensificou-se com a ida de
intelectuais brasileiros ao exterior. O continente recuperava-se da guerra e ganhava vida com
as grandes vanguardas culturais. O intercâmbio foi mais forte em São Paulo, pois muitos
artistas pertenciam a famílias ricas. A condição financeira privilegiada dos paulistas decorria
da economia cafeeira, que fez a população da pacata capital do estado mais que triplicar nos
últimos cinco anos do século XIX. Ao lado da economia, expandiu-se a cultura.

Renovação cultural
Os brasileiros deixaram-se contagiar pela obsessão pelo novo que crescia na Europa e
formataram algo igualmente inovador em São Paulo: a Semana de Arte Moderna, em
fevereiro de 1922. O rebelde movimento abriu espaço para a literatura e as artes plásticas, mas
deixou de fora o teatro. É curioso que assim tenha sido, já que era forte a crítica de
intelectuais sobre o padrão teatral vigente. Sem contar que a proposta da Semana, tipicamente
contracultural, era favorável à comédia, que dava o tom das peças do período. Parecia fácil
manter a essência do que o público queria – rir – e elevar a qualidade artística das
apresentações.
Para Décio de Almeida a explicação está na pouca disposição da classe teatral para
provocar mudanças nos esquemas estereotipados de enredos e de personagens que
dominavam a cena brasileira. «Se tal não sucedeu, culpa não cabe, é bom frisar, aos
modernistas, que tentaram em vão, durante anos, forçar as portas da cidadela conservadora em
que se convertera o palco brasileiro».
Древняя и Новая Романия 313

Só muito tempo depois é que um dos organizadores da Semana de 22 voltou-se às artes


cênicas. Foi na segunda fase do modernismo, de tom mais político. Em 1937, Oswald de
Andrade escreveu O Rei da Vela, onde utilizou a figura de um agiota para exaltar ideias
marxistas e criticar, com humor, a dinâmica sócio-econômica do país. Oswald de Andrade era
apaixonado pelo teatro desde a adolescência, com especial predileção pelas sátiras. Foram
necessários outros 30 anos para que a peça, pouco convencional, saísse do papel. Foi
encenada pela primeira vez em 1967, mostrando o vigor da arte em plena ditadura militar.

Sensualidade e exuberância nos palcos


Em paralelo ao movimento renovador da arte promovido pela intelectualidade
brasileira, os produtores teatrais mantiveram a proposta de rir da realidade com uma nova
versão de revista. Sob influência da companhia francesa Ba-ta-clan, na década de 20,
realçaram a sensualidade feminina. As atrizes, ou vedetes, mostravam pernas e seios, em
quadros com música e dança. Os espetáculos cresceram em luxo e exuberância, com luzes,
cores e fantasias. Grandes atores e músicos emprestaram seu talento para o sucesso teatral do
período. Foi a terceira fase da revista, também chamada féerie (encantamento, em francês).
Nos bastidores, o destaque continuou com Paschoal Segreto, acrescido agora de Manoel
Pinto, que iniciou em 1924 a fase dos grandes espetáculos, continuado por seu filho, Wagner
Pinto. Os três eram mestres do entretenimento e mesclaram o teatro com outras diversões
populares. Marchinhas carnavalescas fizeram estreias no teatro de revista e cantores de
sucesso no rádio protagonizaram peças.
Um exemplo dessa integração cultural é Maria do Carmo Miranda da Cunha (1909-
1955), a Carmem Miranda. Conquistou fama com sua voz e, com facilidade, migrou para o
teatro e para o cinema. Entre as grandes intérpretes, algumas se especializaram numa variação
da revista, o teatro rebolado: Consuelo Leandro, Íris Bruzzi, Renata Fronzi, Mara Rúbia,
Wilza Carla, Elvira Pagã e a irreverente Dercy Gonçalves, que estruturou seu sucesso no
humor escrachado, com palavras de baixo calão. Na música, brilharam compositores e
cantores como Lamartine Babo, Noel Rosa, Ary Barroso e Dorival Caymmi.
Na caracterização teatral do período, é relevante também o aspecto político-social. Nos
anos de relativa paz mundial – entre as duas grandes guerras – o Brasil viveu uma agitação
política como poucas vezes em sua história, com consequências nefastas na vida cultural.
Houve a Revolução Constitucionalista (1932), a Revolta Comunista (1935), o golpe do Estado
Novo (1937) e a Insurreição Integralista (1938). A censura se intensificou e limitou a obra
Древняя и Новая Романия 314

teatral, que não podia mais criticar política, fatos cotidianos e valores morais. O humor
ligeiro, sem maiores questionamentos, só para divertir, tronou-se perfeito.

Espaço para grandes talentos individuais


Na era de estrelismo, que marcou as primeiras décadas do século XX, importava menos
a qualidade do texto e mais a força interpretativa do personagem central e a comicidade de
seus gestos e de sua voz. Não havia diretor e o talento individual, embora evidenciado por
astros e estrelas, não era garantia única de sucesso. Era preciso agilidade na produção de
textos, já que cada peça ficava, em média, uma semana em cartaz. Os ensaios não
costumavam durar mais que quatro dias e todo o elenco precisava ser competente para lidar
com a improvisação e sustentar o interesse da plateia.
Um forte exemplo de artista de apoio que se consagrou com brilho próprio é Cacilda
Becker Iáconis (1921-1969). Atriz profissional desde 1948, era da equipe de Leopoldo Fróes
e foi, por algum tempo, o principal nome feminino do teatro brasileiro. Sua irmã, Cleyde
Yáconis, com quem trilhou os primeiros passos teatrais, também seguiu no time de elite da
cena brasileira.
Em primeiro plano, e alguns anos antes, começou a brilhar Procópio Ferreira, nome
artístico de João Álvaro de Jesus Quental Ferreira (1898-1976). Procópio e Fróes não foram
apenas atores. Escreveram e produziram a maioria dos textos aplaudidos pelas massas,
lançavam efeitos cômicos de improviso, garantiam a dinâmica da peça e davam sentido ao
conjunto cênico.
Procópio Ferreira foi um dos mais pródigos atores brasileiros, com mais de 400 peças
encenadas em seis décadas de carreira. Lançou o teatro de frases, com expressões marcantes
para acentuar fatos ou comportamentos. Encenava vários gêneros teatrais, mas foi a comédia
Deus lhe Pague que lhe deu notoriedade.
A peça trazia um mendigo intelectualizado, revoltado contra a sociedade, e revela um
novo momento nos palcos brasileiros, que se abriam para as ideias socialistas de Karl Marx
(1818-1883). De autoria de Joracy Camargo (1898-1973), estreou em 1932 e foi a primeira
peça brasileira encenada no exterior. Joracy escreveu outras 50 comédias, quase todas de
grande sucesso.
Fora do eixo Rio-São Paulo, sobressaiu o paraibano Ariano Suassuna e sua harmoniosa
síntese entre cultura popular nordestina, fé católica e arte renascentista. Escreveu sua primeira
peça em 1947, mas as mais conhecidas vieram depois. O Auto da Compadecida, uma das
mais populares entre grupos amadores e profissionais de teatro, é de 1955. O Santo e a Porca,
Древняя и Новая Романия 315

estruturado na fórmula de O Avarento, de Molière, foi escrita em 1957. Ambas são comédias
no melhor estilo de Suassuna.

Além da comédia
Enquanto a comédia dominava a cena brasileira, intelectuais do palco buscavam
alternativas ao teatro de «fazer rir». Entre eles estavam Álvaro e Eugenia Moreyra, que
criaram, em 1927, o Teatro de Brinquedo, de duração efêmera, e depois a Companhia de Arte
Dramática. Suas propostas dramáticas, paradoxalmente, não excluíam o humor. Adão, Eva e
outros membros da família... era uma comédia.
Alcance mais amplo obteve Pachoal Carlos Magno (1906-1980) com o Teatro do
Estudante do Brasil (TEB), criado em 1938, no Rio. Fortaleceu o trabalho do encenador,
apresentou peças internacionais relevantes, realizou festivais pelo país afora e despertou em
estudantes bem-nascidos de todo o Brasil o interesse em produzir teatro de qualidade. De
quebra, elevou o nível cultural da plateia, que recebia os parentes dos jovens atores. O TEB
foi precursor da modernidade do teatro brasileiro e lapidou talentos, como Sérgio Britto,
Miriam Pires e Agildo Ribeiro.
Outra lufada de renovação veio com OsComediantes, a partir de 1940, no Rio. Apesar
do nome, o grupo buscava a reforma estética para qualquer gênero teatral. Consolidou a
proposta do TEB, valorizou a atuação em equipe em contraponto ao estrelismo e substituiu o
improviso pela peça ensaiada e bem estruturada. Preferiram o somatório de talentos
individuais, que exigia um atuante diretor, e introduziram um trabalho mais intelectualizado,
onde o texto era analisado e compreendido com rigor estrutural. Sua fórmula de gestão teatral
oferecia mais estabilidade ao grupo.
Para não cometer a injustiça de subestimar o talento de artistas do ciclo anterior, é
essencial ressalvar que o improviso é o requinte dos grandes comediantes, um bem escasso e
de valor inestimável. O problema é o risco acentuado de deixar uma companhia teatral na
dependência de artistas singulares.
A iniciativa de Os Comediantes foi bem acolhida e há consenso entre especialistas de
que inauguraram a modernidade no teatro brasileiro. Em sua profissionalização contaram com
o apoio do polonês Zbigniew Ziembinski (1908-1978), fugido da guerra e conhecedor da
metodologia europeia de teatro.
São Paulo dominou a onda reformista, tendo como expoente o industrial italiano Franco
Zampari e seu lendário Teatro Brasileiro de Comédia (TBC). Começou como uma casa de
espetáculos, em 1945, abrindo espaço para grupos amadores, entre eles o Grupo de Teatro
Древняя и Новая Романия 316

Experimental (GTE), de Alfredo Mesquita e o Grupo Universitário de Teatro (GUT), de


Décio de Almeida Prado.
Em 1948, o TBC redirecionou o foco. Queria um padrão internacional para o teatro
brasileiro e contratou o diretor italiano Adolfo Celi. Autores e técnicos tinham que ser
estrangeiros. O TBC sustentou a alta qualidade ao longo de sua existência e fechou as portas
em 1964. A desestruturação começou no final da década de 50, quando Zampari criou a
Companhia Cinematográfica Vera Cruz. Vieram conflitos financeiros e de elenco. No TBC
formaram-se Paulo Autran, Cleide Yáconis, Sérgio Cardoso e outros atores, que depois
criaram companhias menores.

O absurdo em palcos brasileiros


O teatro do absurdo, que crescia em terras estrangeiras (veja item específico no bloco de
Comédia no Mundo) cativou o dramaturgo Nelson Rodrigues (1912-1980), que conheceu o
sucesso teatral com Vestido de Noiva, de 1943, dirigido por Ziembinski e considerada por
alguns críticos como inaugural do moderno teatro brasileiro.
O absurdo, com traços de comicidade, estava em sua peça Doroteia (1949). A
protagonista era uma jovem, que nasceu morta aos cinco meses, mas seguia vida normal
porque nunca lhe informaram a trágica ocorrência. Descobriu o fato após uma crise familiar e
retornou ao ventre materno. Seu noivo era uma botina, guardada numa caixa.
O absurdo estimulou jovens artistas em abordagens teatrais menos convencionais e deu
visibilidade à pesquisa do escritor mineiro Guilhermino Cesar. Ele trouxe de volta à cena, na
década de 60, a obra de Qorpo Santo, um artista não reconhecido em sua época. Qorpo Santo
ou QS era o nome artístico de José Joaquim de Campos Leão (1829-1883), que escreveu suas
16 peças em um intervalo de seis meses, durante um provável surto místico ou psicótico. As
personagens revelam agressividade, total incoerência e forte componente sexual. Acredita-se
que nenhuma delas tenha sido encenada na época. Os registros apontam como primeira
montagem a de um grupo de estudantes de Porto Alegre, em 1966.
A intenção de Qorpo Santo, no entender de Almeida Prado, teria sido a de escrever
comédias nos moldes de Martins Pena, «só que o enfraquecimento da censura moral e
artística leva algumas destas pretensas farsas a extremos de crueldade ou de incongruência
que podem se assemelhar às da vanguarda moderna». QS passou a ser visto por artistas
brasileiros como uma figura à frente de seu tempo, pioneiro das ousadias cênicas apresentadas
por Alfred Jarry em Ubu Rei (1896) e precursor do teatro do absurdo.
Древняя и Новая Романия 317

Teatro com ideologia


Nessa mesma época, surgiu em São Paulo uma histórica iniciativa, o Teatro de Arena,
que funcionou de 1953 a 1972. Era um espaço, criado por José Renato Pécora, para jovens
autores e atores nacionais desenvolverem seu talento, o que não era possível no TBC. O
ambiente físico era inovador, com assentos dispostos em torno do palco, mas a principal
marca foi o direcionamento político das produções.
Em sua primeira e curta fase, o Arena se esmerou em oferecer espetáculos com bom
acabamento estético. Não tardou em incorporar a ideologia do Partido Comunista Brasileiro
(PCB), dando início à fase política, que o caracterizou. «A tática dos militantes do PCB é
penetrar o Arena e fazer preponderar o pensamento marxista. Para isso, seguem para lá
Vianninha e Guarnieri», escreveu o crítico Clovis Levi3. Oduvaldo Vianna Filho (1936-1974)
e Gianfrancesco Guarnieri (1934-2006) coordenavam as atividades, juntamente com Augusto
Boal (1931-2009) e, claro, José Renato. Era um time de alto nível. O Arena ecoava o
nacionalismo, o esquerdismo e o populismo em peças que apelavam para a luta de classes.
Refletiu com vigor o panorama social, tornando secundária a preocupação estética dos
espetáculos.
A dimensão política do Arena era mais propícia à encenação de conteúdos sérios. A
comédia apareceu com menos frequência, mas com igual qualidade, por iniciativa de Boal.
Foi ele o autor de Revolução na América do Sul, de 1960, peça em tom farsesco e técnica
expressionista, inspirada em Bertolt Brecht. A intenção era sair da reprodução fiel e mexer
nas profundezas da mente e da trama econômica, com distanciamento emocional. Nas
palavras de Almeida Prado, a montagem «ajustava-se perfeitamente ao temperamento de
Boal, pronto a exagerar, a desfigurar o adversário para melhor combatê-lo por meio do riso».
O núcleo inicial do Arena começou a se desfazer no início da década de 60. Oduvaldo
Vianna Filho deixou o grupo em 1961 e com Milton Gonçalves, também ator da companhia,
criou no Rio, o Centro Popular de Cultura (CPC), aliado à União Nacional dos Estudantes
(UNE). O CPC atraiu outros grandes nomes, como Leon Hirzman e Flávio Migliaccio.
Assumidamente, o grupo queria o teatro para plantar ideais revolucionários, com mais política
e menos arte.
Orientação artística similar foi conduzida pelo Teatro Oficina, de São Paulo, que
estreou em 1958 sob direção de Amir Haddad, depois Augusto Boal, Antônio Abujamra,

3
Clovis Levi escreveu o livro «Teatro brasileiro: um panorama do século XX». Foi autor e diretor de peças em
que critica a arbitrariedade do poder e dedicou-se também à vida acadêmica. Na atualidade é professor e dirige
um grupo teatral em Portugal.
Древняя и Новая Романия 318

Maurice Vaneau e, por fim, José Celso Martinez Correa, que colocou o grupo no mais alto
patamar do teatro brasileiro. Com técnica apuradíssima, o Oficina foi um reduto de grandes
profissionais.
O governo de Juscelino Kubitscheck também investiu no teatro. Criou o Teatro
Nacional da Comédia – TNC e nele manteve uma companhia teatral fixa, por meio do Serviço
Nacional do Teatro. Queria formar público para o teatro e montar peças com padrão
internacional. Objetivos louváveis com fracos resultados. Sem a vibrante energia criadora do
Arena, do CPC e do Oficina, o TNC teve dificuldades para cativar plateias.
Seu único sucesso de público foi Pedro Mico, de Antonio Callado (1917-1997), que
estreou em 1957. Falava de exclusão social, da condição do negro e da mulher, com efeitos
cômicos. Foi a primeira peça a buscar inspiração em uma favela do Rio e misturou vícios e
virtudes de um típico malandro. Foi dirigida por Paulo Francis, protagonizada por Milton
Moraes e contou com a curiosa incursão teatral de Oscar Niemeyer, responsável pela
cenografia. Callado era muito ligado a temas nacionais e, anos mais tarde, revelou-se opositor
ao regime militar, sendo preso duas vezes. A companhia produziu mais uma peça marcante,
Rastro-Atrás, de Jorge Andrade, a última antes de fechar as portas. O TNC permaneceu de
1956 a 1967 e, destoante de sua denominação, produziu poucas comédias.

Sob o efeito da censura


A tomada de poder pelos militares, em 1964, surpreendeu os intelectuais dedicados à
revolução. A ditadura durou duas décadas e foi responsável por muita repressão, prisões e
exílios de artistas, incluindo os do teatro. Defender interesses políticos de esquerda
significava correr imenso risco de ser silenciado à força. Aos atos deploráveis de censura,
juntaram-se outros, de profunda comicidade, como narra Clovis Levi: «a polícia invadiu
vários teatros, algumas vezes tentando prender Sófocles e Brecht. (...) Até Tennessee
Williams foi censurado».
É interessante que «logo após 1964 a comunidade teatral conheceu um período de
inesperada euforia, imaginando que poderia desempenhar uma importante função como centro
de oposição ao regime», relata Almeida Prado. A mais simbólica combinação de talento e
resistência veio em 1965. Vianninha, Denoy de Oliveira e Paulo Pontes, entre outros, criaram
o Teatro Opinião, no Rio, com apoio do Oficina. Apostavam em produções com mais apuro
estético que o CPC e em bem elaborados protestos contra a ditadura. A primeira peça,
Liberdade, Liberdade, de Millôr Fernandes e Flávio Rangel (1934-1988), estreou com
sucesso em 1965 e seguiu circuito nacional, algumas vezes mutilada pela censura.
Древняя и Новая Романия 319

Um intenso movimento de contracultura se alastrava mundo afora e teve o ápice em


1968. Fora do país, contestações, protestos contra regimes ditatoriais e reviravoltas sociais.
No Brasil, muita revolta e protestos. A manifestação mais relevante foi a Passeata dos Cem
Mil, na cidade do Rio, que uniu políticos, estudantes, artistas e intelectuais contra a ditadura
militar.
A resposta oficial não tardou. Veio com o sinistro AI-5, o Ato Institucional nº 5 (1968-
1978), que fixou limites e deixou a critério do governo «outras restrições ou proibições ao
exercício de quaisquer outros direitos públicos ou privados». Em outras palavras, os
governantes podiam tudo, pois se atribuíram poderes absolutos. Vozes rebeldes foram
sufocadas pela intensificação da censura. O teatro, dessa vez, foi mais atingido. A forte
repressão tornou bastante árdua a tarefa de escrever textos e produzir peças, mas não impediu
a resistência.
A convite de José Celso Martinez, o Living Theatre veio de Nova Iorque ao Brasil, em
1970, para apoiar a arte revolucionária. Realizou intenso trabalho em favelas de São Paulo.
Queria encenar nas ruas para ficar mais próximo da sociedade oprimida e, de quebra, menos
sujeito à censura. Mesmo assim seus artistas foram presos, em Ouro Preto (MG) e expulsos
do país, por ordem do então presidente Emílio Garrastazu Médici. O fato teve repercussão
internacional e passou uma ideia da mordaça aplicada à classe artística no Brasil.
Entre outros atos dos «anos de chumbo» estão o exílio de Boal em 1969 e de José Celso
em 1974; Flávio Rangel teve a cabeça raspada na rua; Cacilda Becker foi demitida de seu
programa na TV Bandeirantes; teatros foram atacados a bomba; o elenco de Roda Viva (de
Chico Buarque) foi espancado; Marília Pêra e Rodrigo Santiago tiveram que andar nus pela
rua. Muitas peças eram censuradas depois de produzidas, como Calabar, de Ruy Guerra e
Chico Buarque, em 1973. Foi produzido por Fernando Torres e Fernanda Montenegro e
marcaria a estreia profissional de Anselmo Vasconcellos. Após o ensaio geral, o espetáculo
foi censurado e sua estreia, adiada sine-die, nunca ocorreu.
A classe teatral sofreu, mas sobreviveu entre as brechas existentes, valendo-se de
metáforas, dizeres indiretos ou cifrados. Clovis Levi é bastante crítico em relação a algumas
opções teatrais do período: «uma parcela de artistas seguia uma vida omissa, fazendo o
chamado teatro digestivo, que não ameaçava o regime, e que, pelo contrário, ajudava-o a se
sustentar dentro da filosofia do ‘pão e circo’».
Houve artistas militantes que, de fato, se acovardaram e até admitiram tal atitude
posteriormente, mas foi «uma parcela de artistas». É temerário fazer generalizações e
considerar como digestivas ou alienantes todas as produções de conteúdo não político. O
Древняя и Новая Романия 320

distanciamento de várias décadas permite que hoje se identifique com mais clareza os avanços
do período. O Brasil consolidou seu padrão de qualidade frente às produções teatrais mundiais
e introduziu novos temas nos palcos, não apenas por causa das medidas repressivas, mas
porque o povo se cansara da insistente e densa abordagem política. A evidência veio com
Plínio Marcos, em 1967, e o sucesso com seus dramas pessoais em Dois Perdidos numa Noite
Suja.

Comédia sobrevive à repressão


A diversificação temática ajudou a comédia a se reinventar e sobreviver aos tempos de
diminuta liberdade artística. A busca de enredos alternativos à política fez o inconformismo se
entrelaçar com tabus sociais para falar do direito de minorias, de puritanismo e
comportamentos empoeirados pela tradição. Era uma forma de luta possível e menos
arriscada. Outro recurso foi a modificação da linguagem em cena. Em vez das ssutilezas e
insinuações adotadas até então, valia a palavra direta, sincera, obscena. Era para chocar, criar
surpresa e incitar o riso.
Jorge Andrade (1922-1984) avançou na comicidade na fase mais madura de sua
carreira, com peças inspiradas nas tradicionais famílias paulistas, como Senhora na Boca do
Lixo (1963) e Ossos do Barão (1964). Ele fez rir de dramas pessoais, onde ricos empobreciam
sem deixar de ostentar riqueza e novos ricos transitavam pela elite social com questionáveis
padrões de requinte. Ossos do Barão virou telenovela, em 1973.
O Rei da Vela, de Oswald de Andrade – engavetado desde 1937 – ganhou eloquente
encenação do Oficina, em 1967. Usou linguagem e humor típicos do modernismo e
incomodou até os críticos do regime, pois assumia o atraso do país e atacava a burguesia e
não a ditadura. Marcou a entrada do Tropicalismo, um dos mais fortes movimentos
contraculturais brasileiros, ao lado do próprio modernismo. O reposicionamento da arte
brasileira acontecia, dessa vez, no teatro, que ficara fora da Semana de 1922.
Millôr Fernandes, em sua sólida e fértil carreira orientada pelo deboche inteligente,
abriu espaço para o teatro, mais uma vez, embora sua preferência sempre tenha sido a análise
cômica do cotidiano na forma de literatura e desenhos. Sua peça É... (1977) mexe com o
relacionamento afetivo e sexual de homens e mulheres maduros e confronta posturas
tradicionais com a permissividade então alardeada.
No campo dos intérpretes, destaque para o brilho crescente de Marília Pera, com a
mescla de drama e comédia em duas peças antológicas. Uma delas foi Fala Baixo Senão eu
Grito (1969), de Leilah Assumpção, que utiliza ficção e realidade para mostrar um ladrão no
Древняя и Новая Романия 321

quarto de uma jovem recatada. Em vez de roubá-la, passou a noite toda em conversa com ela.
Apareceu a Margarida, de Roberto Athayde, transforma a plateia em classe escolar para ouvir
a professora discorrer sobre temas variados, como sexualidade reprimida e dilemas morais.

Irreverência e androginia contra a ditadura


Na linha de quebra de tabus e ruptura ideológica, a referência teatral maior do período
foi o Dzi Croquettes, grupo formado em 1972, no Rio. Sua identidade visual era hilária. Os
atores usavam saltos altos, maquiagem carregada, roupas femininas e sensuais, sem abrir mão
de suas barbas, bigodes e pernas peludas. A mensagem era inspirada no homossexualismo e
impregnada de irreverência, exagero, duplo sentido e tom farsesco.
As peças eram visualmente chamativas, bem produzidas, com elementos do teatro de
revista e do show de cabaré. O humor era inteligente e elegeu como alvo preferencial a
repressão sexual, a censura e a ditadura. Gente computada como você foi a primeira peça do
grupo, liderado pelo cenógrafo norte-americano Lennie Dale e que contava ainda com o autor
Wagner Ribeiro de Souza e artistas que cantavam, dançavam e atuavam: Cláudio Gaya,
Cláudio Tovar, Ciro Barcelos, Reginaldo de Poli, Rogério de Poli, Bayard Tonelli, Paulo
Bacellar, Benedictus Lacerda, Carlinhos Machado e Eloy Simões.
O sucesso foi imediato. O público gostou, a crítica também e estimulou o grupo a
expandir fronteiras para o Velho Continente. Fez longas e exitosas temporadas no Le Palace,
de Paris e participou do filme Le Chat et La Souris, de Claude Lelouch. A mensagem forte do
Dzi Croquettes estimulou a criação de grupos gays no Brasil, em especial na Bahia. Com a
marca da contracultura, exerceu profunda influência no ambiente artístico e é considerado
precursor de uma vertente cômica que prosperou nos anos seguintes e teve o auge em meados
dos anos 80: o besteirol.
Древняя и Новая Романия 322

Liberdade para o comediante


Uma produção teatral que também trazia rudimentos do besteirol foi a releitura de
Desgraças de uma Criança, de Martins Pena, com direção de Antonio Pedro Borges, de 1973.
Os atores improvisavam com liberdade e o texto servia como mero pretexto paraousadias
criativas. O comediante saía da estrutura da peça, criavapequenos solos inusitados, os
«apartes» ou «janelas», e dialogava com o público. Apartes geniais foram criados por Marco
Nanini, um dos atores da peça.
António Pedro alimentava osinstintos de improvisação e a criação de nonsenses. Há
semelhança entre sua proposta e a doitaliano Dario Fo. Ambos recorrem a grandes e férteis
expressões livres dos comediantes antigos e propõem que o «teatro tenha como única regra
não ter regra nenhuma». Ainda nos anos 70, Antonio Pedro dirigiu e adaptou O Bravo
Soldado Sweik, uma comédia de guerra sobre um herói sem caráter. A encenação seguia as
mesmas premissas de liberdades, citações e irreverências. O espetáculo, muito bem recebido,
foi uma criação coletiva de Pedro Paulo Rangel, Vinicius Salvatori, Betina Vianny, Anselmo
Vasconcellos, Silvia Sangirardi, Caíque Botkay e Luís Paulo Nenen. O sonoplasta era o
jovem Pedro Cardoso.
Nos anos 80, Antonio Pedro fundou, com boa parte desses atores, a companhia teatral
Tem Folga na Direção. Inspirado na comédia Judas em Sábado de Aleluia, de Martins Pena,
montou o premiado espetáculo Cabra Marcado para Correr. O nome fazia analogia a um
documentário de Eduardo Coutinho, famoso na época: Cabra Marcado para Morrer. A boa
acolhida levou a companhia a publicar um anúncio pago no jornal: «Cabra Marcado Para
Correr. A crítica gostou, mas é bom!»
O grupo montou ainda um clássico de Bertold Brecht: Santa Joana dos Matadouros,
uma insolência musicale circense que virou Tá Ruço no açougue. O elenco se atropelava no
palco em gags e quebras memoráveis e se valia da lógica das chanchadas4.

Asdrúbal, a explosão da irreverência


Outro destaque teatral com a marca do besteirol veio dos jovens do Asdrúbal Trouxe o
Trombone. O grupo reuniu Regina Casé, Hamilton Vaz Pereira, Luiz Fernando Guimarães,
Nina de Pádua, Patrícia Travassos, Evandro Mesquita, Perfeito Fortuna e Gilda Guilhon.

4
Chanchada era um humor popular, caricato e ingênuo, que marcou as produções cinematográficas da mais
famosa companhia cinematográfica do Brasil, a Atlântida. Pegava carona em sucessos americanos. Sansão e
Dalila, por exemplo, virou Nem Sansão nem Dalila e Matar ou Morrer se tornou Matar ou Correr. Mesclava
zombaria aos trejeitos norte-americanos com piadas nacionais, no estilo malandro carioca. Quando passou a
explorar o erotismo, deu origem às pornochanchadas, muito atacadas pelos críticos.
Древняя и Новая Романия 323

Apostaram no riso solto e despretensioso, que tocava não na realidade do país e sim em
questões pessoais. Desprezaram a estrutura clássica das peças teatrais e fizeram montagens
livres, orientadas pela irreverência.
O grupo surgiu em 1974 com um nome intencionalmente sem sentido, que evidenciava
seu descaso com modelos prontos e unanimidades. Asdrúbal Trouxe o Trombone era uma
espécie de código familiar que Regina Casé e seu pai, o artista Geraldo Casé (1928-2008),
usavam para sair discretamente de algum local depois que algo ou alguém tornava o ambiente
desagradável.
A força interpretativa desses jovens fez história na comédia brasileira. A proposta,
simples e inovadora, conquistou público e crítica. Sua obra prima foi Trate-me Leão, de 1977,
peça que falava da juventude da zona sul do Rio, ou seja, deles próprios. Resultou da criação
coletiva, uma de suas marcas. Todos participavam ativamente de todas as fases do processo
artístico: criação, produção e apresentação. O grupo acabou em 1984 e seus integrantes
continuaram com êxito em carreiras solo no teatro, TV e cinema.

Censura perde força


A fase mais dramática da censura acabou quando o AI-5 foi revogado, em 1978. Os
militares permaneceram no poder até 1986, quando o governo civil foi restabelecido, mas a
classe artística já recuperava fôlego. A censura ficou mais branda e passou a servir
basicamente para classificar as obras. Peças até então proibidas foram liberadas. A mais
emblemática foi Rasga Coração, de Oduvaldo Vianna Filho, encenada em 1979. Símbolo da
luta contra a censura, havia vencido o concurso de dramaturgia do Serviço Nacional do Teatro
(do Governo Federal) em 1972 e foi imediatamente proibida.
A fase era boa para a comédia. Em 1979 estreava em São Paulo o espetáculo Quem tem
medo de Itália Fausta?, escrito e interpretado por Miguel Magno (1951-2009) e Ricardo de
Almeida (1954-1988). A peça transitava por períodos e estilos da cena nacional e brincava
com a seriedade com que Itália Fausta olhou para o teatro brasileiro para modernizá-lo. Itália
foi a grande atriz trágica brasileira na primeira metade do século XX.
O espetáculo seguia também na linha do besteirol, nome que entrou no linguajar teatral
pela primeira em 1980, conforme relatou Flávio Marinho, autor do livro «Quem tem medo do
besteirol?». Diz ele que Macksen Luiz, crítico da revista IstoÉ, usou essa palavra da gíria
carioca para se referir à comédia musical As 1001 Encarnações de Pompeu Loredo, sobre
situações mal resolvidas com o poder. A peça marcou a estreia de Jorge Fernando como
Древняя и Новая Романия 324

diretor e foi escrita por Mauro Rasi (1949-2003) e Vicente Pereira (1950-1993), dupla com
longa atuação em enredos cômicos.
A maioria dos artistas que deram vida ao besteirol não gostavam da denominação
porque transmitia uma falsa ideia de precariedade na produção e no conteúdo. Há quem
considere que tenha sido batizado pelo preconceito intelectual da crítica.

Os elementos do besteirol
Há uma visível identificação do besteirol com as chanchadas. Os dois movimentos
gostam de liberdades, citações e recriações, sem medo do ridículo, que é trabalhado ao
extremo. Traz a força absoluta da interpretação, já que os textos por si sós não traduzem toda
a comicidade que transborda em cena. Os atores precisam dominar profundamente a arte da
encenação cômica. Não por acaso, os bem-sucedidos no besteirol desenvolveram consistente
carreira artística.
No besteirol, autor e ator se confundem e o diretor tem como tarefa principal emendar e
dar sentido de conjunto às ideias que derivam da criação coletiva. «Seu humor é inteligente,
exige da plateia uma certa dose de informação para ser melhor usufruído», observa Flávio
Marinho. Ele define o besteirol como um conjunto de esquetes, interpretado por uma dupla de
atores ou atrizes, com amplo uso de paródias, fina ironia do comportamento social e conteúdo
extraído principalmente de filmes, teatro e TV.
O movimento teve mais expressividade no Rio de Janeiro e muitos de seus integrantes
permanecem na trilha da comédia. Um deles é Pedro Cardoso, que, em dupla com Felipe
Pinheiro (1960-1993), realizou trabalhos expressivos e conheceu o sucesso já no primeiro
espetáculo, Bar, doce Bar, de 1982. É o caso também de Miguel Falabella, que deu vida a
peças hilariantes, principalmente em parceria com Guilherme Karam. Um dos maiores
sucessos de público e crítica foi As Sereias da Zona Sul, de 1988, com textos dele próprio e de
Vicente Pereira.
O sucesso dos intérpretes se completava com o apoio de gente talentosa nos bastidores,
todos polivalentes nas funções teatrais, como Luiz Augusto Rescala, o Tim Rescala, nome
certo para garantir qualidade na trilha sonora das produções. Destaque também para Thaís
Portinho, pela atitude precursora em relação ao tema. Apostou no estreante Mauro Rasi e
protagonizou a primeira peça escrita por ele, o monólogo Se Minha Empregada Falasse, em
1978. Trazia a essência da contracultura e o jeito leve e brincalhão de cutucar temas densos.
Древняя и Новая Романия 325

A comédia experimental
As produções contestatórias do besteirol tinham certa ligação com o teatro experimental
e sua busca por inovações em linguagem, música, iluminação e cenografia. O vigor da
proposta continuou a inspirar artistas e grupos. Um deles foi a Companhia Tragicômica Jaz-
o-Coração, liderada por Buza Ferraz (1950-2010), que durou de 1977 a 1979 e montou duas
comédias: O Triste Fim de Policarpo Quaresma, de Lima Barreto e Mistério Bufo, de Dario
Fo. A combinação consistente de interpretação e elementos cênicos projetou o grupo de
jovens atores.
Em 1980, Louise Cardoso coordenou seus alunos de teatro na montagem de uma peça,
que levou o mesmo nome do grupo: Diz Ritmia. Evandro Mesquita e Patrícia Travassos, que
haviam deixado o Asdrúbal em 1981, fizeram algo parecido. Levaram sua turma de teatro a
montar uma peça, que também batizou o grupo: Banduendes por acaso Estrelados. Esses
grupos, mesmo que de efêmera duração, ajudavam a consolidar a postura libertária daquela
geração jovem.
A fase pós-censura valorizou também elementos visuais e favoreceu a adoção de
elementos do circo nos palcos. O Teatro da Praia, no Rio, abrigou a série Terror na Praia, a
partir de 1992, sob orientação de Vicky Militello, de família circense. Eram espetáculos com
uma peça curta e uma segunda parte de variedades. Havia melodramas circenses, com enredos
absurdos e exagerados, estética de filme de terror classe B e estímulo à participação da
plateia, relata Antonio Pedro Borges, especialmente para este livro. «Nós mesmos, quando
não estávamos em cena, íamos para a plateia, incitando o público a reagir, interferir e vaiar».
O elenco trazia ainda Anselmo Vasconcellos e Luca de Castro.
A dinâmica participativa e o ritmo intenso de produção, com um espetáculo novo toda
semana, foram um sucesso e ajudaram a formar artistas. «Havíamos descoberto uma nova-
velha forma de treinamento para atores», revela Antonio Pedro, que, em 1995, replicou a
fórmula no Tuerj (Teatro da Universidade do Estado do Rio de Janeiro). Conta ele:
Resolvemos ressuscitar o Teatro de Terror, com o sugestivo nome de Teatro nas
Concha, agora sem o Ato Variado e com a clara intenção de treinamento. Da primeira leitura
à estreia fazíamos no máximo cinco ensaios. Eram espetáculos com mais de quarenta pessoas
em cena, com cenários de papelão, figurinos do nosso acervo, luz, som, fumaça e muitos
defeitos especiais. Era impossível não improvisar, mas era obrigatório contar a história, com
nós mesmos provocando o caos na plateia, sempre lotada de estudantes. Fizemos nove
espetáculos em oito meses, com os mais experientes ajudando a garotada a superar os
obstáculos. Assim, um garoto sem nenhuma experiência teatral, em oito meses, já tinha
Древняя и Новая Романия 326

passado por nove experiências perigosas e significativas. Quem tinha o dom, adquiriu
repertório para se afirmar como comediante.
Na linha que une comédia e circo, um dos mais bem acabados exemplos é o premiado
grupo Parlapatões, Patifes & Paspalhões, formado em 1991 e ainda em atividade. Começaram
a fazer espetáculos nas ruas de São Paulo e migraram para os teatros, com êxito crescente.
Abusam da diversão, ironia e irreverência, improvisam, integram-se à plateia e arrancam boas
gargalhadas. Sob a direção de Hugo Possolo, o grupo conta ainda com Alexandre Roit, Jairo
Mattos, Arthur Leopoldo Silva e Raul Barreto.

Contadores de piadas
No ambiente do riso, as obras teatrais coletivas conviviam com as apresentações
individuais do gênero one man show. Na prática, tratava-se de um contador de piadas com
refinamento cênico. José Vasconcelos é considerado pioneiro, tendo feito suas primeiras
apresentações em palcos na década de 60. Antes, cravou seu nome na historiografia televisiva,
ao produzir e atuar no primeiro programa de humor da TV brasileira, a Toca do Zé, da TV
Tupi, em 1952.
Juca Chaves decidiu fazer graça a partir de uma base melódica. É músico e se
especializou em trovinhas musicalizadas, recheadas de tiradas cômicas, leves e debochadas.
Outro ilustre contador de piadas é Ary Toledo, que transita entre sátiras políticas e fatos de
amplo conhecimento popular. Brinca com gordos, magros, sogras, homossexuais. Na época
da ditadura militar era ator no Teatro de Arena e chegou a ser preso. Foi liberado em seguida,
pois foi capaz de seduzir com o humor até mesmo as pessoas que o prenderam.
Chico Anysio e Jô Soares investiram em comicidade no teatro e principalmente na TV,
com uma grande variedade de personagens. Na abertura dos programas televisivos e nos
shows teatrais deixavam de lado papéis pré-definidos e falavam com o público sem quaisquer
artifícios, sendo eles próprios. Essa atitude os aproximava da stand up comedy (veja item
específico em Comédia no Mundo).

Comédia em pé
A stand up comedy foi o elemento novo nos palcos brasileiros em meio à diversidade de
obras cômicas no princípio do século XXI. Aqui se chamou comédia em pé. Os artistas
acomodaram o repertório nacional no formato original norte-americano, com o mesmo humor
despojado, ausência de adereços cênicos e inspirado em temas identificados pela plateia em
seu cotidiano.
Древняя и Новая Романия 327

O pioneirismo oscila entre dois grupos, um do Rio e outro de São Paulo. O do Rio
surgiu em 2005, com Cláudio Torres Gonzaga, Fábio Porchat, Fernando Caruso e Paulo
Carvalho. É o Clube da Comédia em Pé, que mantém uma sequência ininterrupta de
apresentações desde 2007 e adota a prática de acrescentar um humorista convidado a cada
aprerentação. O clube possui até dogmas, que incluem a proibição de se criar personagens e a
exigência de que os textos sejam da autoria do intérprete, entre outros.
O paulista formou-se após a encenação da peça Mondo Cane, que já incorporava traços
de stand up. No elenco estavam Marcelo Mansfield, Rafinha Bastos e Marcela Leal, que
radicalizaram o que chamaram «humor de cara limpa». Convidaram Oscar Filho, Márcio
Ribeiro e Henrique Pantarotto e criaram o Clube da Comédia Stand Up. A primeira
apresentação foi em 2005.
A comédia em pé segue com grande acolhida do público, em teatros sempre lotados.
Talvez só não tenha se expandido mais pela elevada exigência ao comediante. A habilidade
interpretativa do ator é colocada à prova, dia após dia, diante de uma plateia ávida pelo riso. E
é preciso conquistar o público de imediato, pois as falas são sempre curtas, de no máximo 15
minutos.
A comédia em pé tem forte conexão com o mundo real e uma grande capacidade de
transformar em gargalhada uma rotina incômoda, uma situação irritante, um problema
complexo. Isso explica o sucesso da comédia na atualidade e em qualquer época da história
do teatro no Brasil e no mundo.

O público e suas opções de diversão


É útil observar que a mesma pessoa que navega na blogosfera, vai ao cinema ou assiste
a uma peça de teatro. Isso quer dizer que a mente da pessoa capta o conteúdo de todos esses
ambientes. Quando os produtores de diversões fazem o mesmo, ou seja, integram elementos
desses espaços, acrescentam um fator a mais de interesse do público.
A integração pode se dar em termos de conteúdo, de estrutura da mensagem ou de
público. A conexão de conteúdo ocorre quando a linguagem própria de um ambiente é
transposta para outro, como na projeção de imagens de vídeo em peça de teatro. O fenômeno
youtube é a transposição para a internet de uma mensagem até então produzida por
profissionais e própria da TV ou do cinema.
A estrutura da mensagem está relacionada com o modelo mental e, nos tempos atuais,
sofre forte influência da internet. Um usuário da web encontra na rede uma farta variedade de
informações distribuídas de forma que ele escolha aquelas que deseja aprofundar. Permite
Древняя и Новая Романия 328

uma montagem modular de várias pequenas ideias em vez de um único e amplo conceito. É a
chamada linguagem por níveis, que o teatro já começou a adotar, em especial a comédia
quando trabalha vários blocos pequenos de ideias interligadas de forma ágil.
A integração de públicos costuma incluir conteúdos comuns. Um exemplo está nos
clubes de comédia recém citados. Seus artistas atuam nos palcos e em televisão. O elenco do
Rio atua em humorísticos da TV Globo há muito tempo. O paulista estreou em 2008 na TV
Bandeirantes com o CQC (Custe o Que Custar), versão brasileira do Caiga Quien Caiga, da
produtora argentina Eyeworks - Quatro Cabezas e presente em vários países, como Espanha,
Chile, Portugal e Israel. O CQC, inclusive, pode ser considerado uma derivação conceitual da
stand up porque é um humor de cara limpa. De forma parecida trabalha o Pânico na TV, de
2003, que interliga outro veículo de comunicação, o rádio. A proposta nasceu no programa
Pânico, da rádio Jovem Pan, com o apresentador Emílio Surita.
O fato é que a audiência da TV leva gente para o teatro e ficar perto do artista numa sala
teatral estimula o público a vê-lo em programas televisivos ou a interagir com ele em redes
sociais. É forte o apelo das celebridades. Um artista de sucesso é garantia de teatros lotados,
seja em cenas trágicas ou cômicas.

A comédia hoje
Para entender a sobrevivência da comédia nos palcos é importante considerar o
significado do teatro para a sociedade. As pessoas saem de casa basicamente em busca de
diversão e de relacionamentos sociais. No passado, as opções de lazer eram mais reduzidas e
os espetáculos teatrais serviam também como espaço privilegiado para reflexões e para as
pessoas se atualizarem com o que se passava na coletividade ou no mundo.
Com o passar do tempo, outras fortes opções surgiram. Veio o cinema, a televisão e
agora, o mundo do entretenimento inclui jogos eletrônicos e redes sociais entre outras
possibilidades. O teatro sobrevive porque no ramo da diversão o processo que ocorre é de
acumulação e não de substituições. Sempre haverá atrações diferentes para atender à
diversidade de pessoas e à alternância de seus interesses.
No Brasil, a atividade cênica atual não tem sido usada para tratar ideologias densas
porque o país atingiu uma maturidade democrática que previne tensões sociais severas e, por
consequência, acaba não gerando pendências para serem discutidas nos palcos. O Brasil vive
um bom momento, a classe teatral não sofre restrições do poder constituído, a população
brasileira está mais rica e, portanto, mais propensa a consumir produtos culturais.
Древняя и Новая Романия 329

A comédia atravessa os tempos atuais com o mesma essência de seus primórdios. O


comediante só precisa revestir a fração de comicidade com falas e visual contemporâneos. Os
elementos que criam laços mentais com o público têm um caráter universal e são sedutores
convites para o espetáculo do riso, que conecta quem quer rir e quem faz rir. A comédia
atravessa uma boa fase porque é fonte de diversão leve e revigoradora. Até peças sérias têm
buscado toques de humor para serem mais bem aceitas. É tempo de rir. E de fazer rir.

Você também pode gostar