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TCC - Juliana Matrone Final
TCC - Juliana Matrone Final
CURSO DE PSICOLOGIA
ATIBAIA–2017
FAAT FACULDADES
CURSO DE PSICOLOGIA
ATIBAIA–2017
CURSO DE GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA
Termo de aprovação
JULIANA CICERO MATRONE
___________________________________________________________________
Professor Mestre. Émerson Domingues da Silva.
Para:
Todos os seres que buscam, de alguma forma, melhorar suas relações para a construção de um
planeta mais sustentável, tanto biologicamente como emocionalmente.
AGRADECIMENTO
Meu singelo e maior agradecimento vai para meu herói, meu pai, que sem sua ajuda
não seria possível esta jornada, e eu não a teria concluído com êxito. Agradeço-o pela vida,
pelo incentivo e por acreditar em mim, apoiando-me, incondicionalmente, em minhas
escolhas. Obrigada, André Matrone, por tudo e principalmente pelo seu amor.
Durante o percurso desta jornada, encontrei-me com pessoas muito especiais que
contribuíram e me ajudaram a caminhar, tornado-a mais festiva e mais colorida. Gostaria de
agradecer aos meus amigos, que fazem parte da minha vida, e a preenche com muita alegria,
sabedoria e acolhimento, tendo dessa forma contribuído de forma direta e indireta. Agradeço a
todos que compartilharam desta experiência, principalmente ao Paulo Macedo, que se tornou
um irmão e companheiro, e esteve presente em todos os dias desta jornada. Foi muito
importante caminhar ao seu lado, e poder perceber o quanto nós nos ajudamos, e
amadurecemos ao longo desses cinco anos que passamos juntos. Foi uma excelente
experiência e uma troca verdadeira. Que venham muitos mais anos como estes! Não poderia
deixar de mencionar uma amiga querida, que foi minha primeira amizade desde o início dessa
caminhada, Roberta Vavassori - tivemos momentos inesquecíveis, obrigada por ser quem é. E
agradeço também a Amanda Dávila, que surgiu no final desta jornada, mas foi crucial para
conclusão deste trabalho, me ajudando de uma forma serena e muito profissional. Obrigada!
Agradeço a todos os professores que contribuíram com o meu despertar,
principalmente a professora Paula Andrada, que se tornou minha referência de
profissionalismo, e de uma forma delicada, humana e profunda ampliou minha percepção do
mundo, mostrando-me uma visão mais crítica, política e social da psicologia. Obrigada
professora, por me mostrar na prática a importância da nossa profissão. Agradeço a
professora Márcia Coutinho, que surgiu como um passarinho, cantarolando, e me encheu de
esperança e demonstrou que essa profissão pode e deve ser muito mais humanizada. Obrigada
professora, pela linda mensagem que sua presença e sua forma de ser me trouxeram: levarei
para sempre comigo. Agradeço a professora Tatiana Gomez, que me fez compreender
inicialmente a fenomenologia, me mostrando um olhar diferenciado para com o outro e para
com o mundo. Agradeço ao meu orientador, que apesar dos contra tempos, me direcionou na
construção de um bom trabalho. Obrigado Émerson Silva, pela dedicação.
E por fim, sou grata a mim: por permitir iniciar e concluir essa jornada, a estar
receptiva a tantas informações, e aprendendo a enxergar o mundo de uma forma muito mais
ampla e contextualizada. Por me apaixonar pela profissão e acreditar que ela possa me dar
subsídio para ir à busca de um mundo com menos desigualdade social e mais coletividade.
RESUMO
Esta pesquisa busca compreender quais são os fenômenos que levam as pessoas escolherem
como estilo de vida a convivência coletiva. Para ser realizada a compreensão, foi utilizada a
ferramenta Análise de Discurso Oral, coletados do documentário: Ecovilas Brasil –
Caminhado para sustentabilidade do ser. O trabalho teve como intenção verificar a produção
de sentidos para cada entrevistado, que são moradores e vivenciam a experiência de conviver
em Ecovilas – Comunidades Intencionais. O foco da pesquisa foi realizar a articulação do
discurso dos moradores com os autores da Fenomenologia. Tal articulação se fez necessária
para que seja possível compreender este fenômeno da escolha de viver coletivamente, uma
vez que, são elementos da realidade de muitas pessoas que acabam sendo responsáveis pela
construção de um dado histórico em nossa sociedade. A questão central, que ficou evidente
nas entrevistas, é que todos os entrevistados acreditam que seja possível viver de maneira
contrária à sociedade vigente, no entanto as questões mobilizadoras que provocam a decisão
de tentar algo novo são bem centrais e peculiares a cada sujeito.
This research aims to understand the phenomena which lead people to choose the collective
way of living. In order to achieve this goal, it was used the oral speech analysis of the
documentary "Ecovilas Brasil – Caminhado para sustentabilidade do ser”. Thisessay has had
the intention to verify the meaning produced by the speech of each interviewee, who is
experiencing living in Ecovillages – International Communities. The focus of the research
was to articulate the speech of the local residents with the authors of Phenomenology. This
articulation was necessary to make this phenomenon of collective living possible to be
understood, considering itan element of many people reality and it ends up being responsible
for building up a historical data in our society. The main idea, which was highlighted during
the interviews, was that all interviewees believe in the possibility of living in a contrary way
of the present society. However, the questions that teased the decision of trying something
new are the central point and peculiar for each one.
INTRODUÇÃO 10
CONSIDERAÇÕES FINAIS 38
REFERÊNCIAS 40
INTRODUÇÃO
Elegia 1938
Trabalhas sem alegria para um mundo caduco,
onde as formas e as ações não encerram nenhum exemplo.
Praticas laboriosamente os gestos universais,
Sentes calor e frio, falta de dinheiro, fome e desejo sexual [...]
O estudo da Permacultura permite um grande avanço para aqueles que têm acesso a
recursos rurais de forma coletiva, de forma independente do governo e das
empresas, para desenvolver sistemas que antecipam o futuro e ajudam a sociedade a
rever o projeto cultural da civilização atual.
Então nestes espaços nomeados como Ecovilas é necessário que haja lugar para a
diversidade e para erros e conflitos, pois é por meio destes acontecimentos, que se promove o
reconhecimento de que em uma dinâmica, a semelhanças e a diferenças e são tensões
simultâneas - uma vez que, as comunidades intencionais necessitam da diversidade para
12
1
executarem uma “autoridade natural” em diferentes questões e campos das atividades
comunitárias. (HOLMGREN, 2013).
A concepção da análise tem diversas justificativas, uma delas é o meu interesse
pessoal de viver fora desse mecanismo de convivência ao qual estamos habituados. Portanto,
senti-me atraída por querer compreender a experiência de quem vive de forma sustentável e
coletivamente, além de querer me aprofundar teoricamente com a experiência de se viver em
uma Ecovila.
Outro ponto é o fato de conhecer outras pessoas que estão no processo de transição,
que escolheram sair desse molde de sociedade capitalista para uma integração em Ecovilas -
que tem como objetivo vivenciar na prática outros mecanismos de sociedade – e essa
aproximação já vem mudando a forma de relação destas pessoas com o mundo e com as
outras pessoas. Despertou-se em mim, então, um desejo de emparelhar o olhar da psicologia
fenomenológica-existencial com a experiência da escolha de se viver em uma comunidade
intencional, e assim, compreender o processo desta escolha.
Como a Psicologia, e mais especificadamente a Fenomenologia, tem o propósito de
provocar reflexões e lançar diferentes formas de se compreender um fenômeno, a análise
poderá contribuir para que os leitores possam levantar suas próprias reflexões e formas de
lidar com suas relações, principalmente para as pessoas que vêm refletindo e buscando outras
formas de convivência. Assim sendo, esse estudo poderá contribuir para pessoas que estão no
processo de transição e para os que já se integraram nesse formato de relação que ocorrem e
se estabelecem no convívio de uma Ecovila. Deste modo, o tema pode ser empreendido nos
mais diversos contextos e práticas psicológicas e, as pesquisas podem ampliar a compreensão
do (a) profissional de Psicologia acerca dos fenômenos que existem e vêm acontecendo na
sociedade. Tendo em vista, o presente estudo, pergunto-me: o que leva escolher viver em uma
comunidade intencional?
O fato de existirem outras maneiras de se relacionar e viver, que é contrária a
representação da sociedade capitalista, nos permite outra justificativa para a construção do
estudo, pois é interessante para a psicologia estudar as formas de organização social, uma vez
que, o homem está modificando as formas de relações tanto com a economia, como com o
meio ambiente e as pessoas.
É importante esclarecer que a sociedade capitalista é entendida como uma condição
imposta. Segundo Santos (2006 p. 2-3):
1
A “autoridade natural” entende-se como reconhecimento no âmbito de uma comunidade da capacidade
particular de um indivíduo em algum campo que justifique aceitar a sua opinião como tendo um peso maior
(naquele campo).
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Devido a isso, existe uma vontade pessoal em compreender mais a fundo a experiência
de se escolher viver em uma Ecovila, pois, vivemos por meio de uma dinâmica imposta pela
sociedade, cuja, estimula a competitividade, muitas vezes, levando-nos a crer que esta é a
única forma de nos relacionarmos com o mundo. Indago-me, então, a refletir, e não concordo
com esse mecanismo naturalizado. Portanto, buscarei através da análise compreender como as
pessoas estão vivenciando e reinventando formas de convivência, estabelecendo outros
valores, para os quais, creio eu, que haja uma preocupação com as relações humanas. Buscam
construir vínculos afetivos e estabelecer um espaço com compromissos sociais, humanitários,
ambientais, econômicos e solidários, dentre tantos outros. Saber que esses movimentos
existem e vêm sendo desenvolvidos, faz com que me sinta envolvida, e com esperança para
acreditar e querer compreender as relações humanas que permeiam esse contexto.
A relevância da análise para o meio social está exatamente na realidade das pessoas
que vivem a experiência de morar em uma comunidade intencional, e também para pessoas
que buscam outras formas de vivências. O estudo destina-se a esses públicos, uma vez que, o
mesmo é composto pelas pessoas que estão inseridas numa sociedade buscando e/ou
reinventando outras formas de se relacionar. Contextualizar a dimensão do fenômeno que
será analisado nessa pesquisa é uma forma de compreender o quanto ela se faz presente na
sociedade, e como essa realidade pode, ou não, afetar as relações de quem escolhe viver em
uma Ecovila, e como essas escolhas impactam a sociedade.
Assim, podemos concluir que este estudo poderá contribuir para a ampliação dos
conhecimentos relevantes na concepção de uma realidade alternativa, que tem sido construída
através dos movimentos das Ecovilas. Então, o estudo poderá ampliar a compreensão das
relações que permeiam esse contexto, entendendo como se da a escolha de se viver e
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compartilhar a vida dentro de uma comunidade intencional, e como funciona este movimento
na prática, que acabam nos modificando e construído novos paradigmas.
Para se alcançar o propósito do estudo, os procedimentos a serem adotados baseiam-se
em um levantamento histórico do surgimento das Ecovilas; o porquê do surgimento desse
movimento; como elas se estruturam; e em especial: a utilização da Permacultura como
ferramenta para a organização dos espaços e do convívio humano, uma vez que a mesma é
adotada pelas Ecovilas.
Portanto, o leitor desse estudo encontrará no primeiro capítulo uma introdução
histórica do surgimento das Ecovilas, a fim de contextualizá-lo no que se refere ao surgimento
deste movimento, como se organizam e como atuam na sociedade.
No segundo capítulo falarei da Permacultura: como ela auxilia o planejamento e
organização do coletivo e como ela surgiu. No terceiro capitulo farei uma articulação da
análise obtida pelo documentário com o material teórico da fenomenologia existencial, mais
especificadamente a teoria heideggeriana que poderá enriquecer o tema pesquisado.
1 COMUNIDADES, ECOVILAS E PSICOLOGIA
Neste primeiro capítulo, tenho como objetivo explorar brevemente sobre a construção
histórica dos acontecimentos realizados durante o processo de civilização, que acabou
ocasionando no surgimento das Ecovilas. Essa construção tem a finalidade de contextualizar o
leitor acerca do surgimento destes movimentos, que resultaram em mudanças, tanto no
ambiente físico, quanto no social, e no cultural.
Segundo Cunha (2012), Ecovilas, é um dos diversos movimentos que visam quebrar
os paradigmas e formas que construímos de relação com o mundo, pois os movimentos vêm
reinventando outras formas de relação com as pessoas, na economia, na natureza, na cultura e
na política. Portanto, buscaremos por meio de um estudo bibliográfico realizar um breve
levantamento, como forma de estruturação do motivo do surgimento destas comunidades
intencionais, que apesar de ser um movimento recente, possui aspectos ligados a construção
de comunidades antigas.
De acordo com Silva (2013), podemos resgatar o entendimento que o homem tinha
sobre a natureza. Para isso é preciso retroceder para um período em que os homens se
relacionavam com a terra através de suas crenças. Naquele período, a natureza para os povos
europeus se apresentava através do imaginário coletivo como uma entidade associada ao
mundo sagrado e ao gênero feminino. Sendo assim, todos os fenômenos naturais eram
relacionados ao poder divino. O autor pontua ainda, o quanto a disseminação da igreja, e as
crenças com relação ao poder da natureza sobre o homem começaram a ser modificadas. A
noção do homem como dominador da natureza e da mulher foram apoiadas e encorajadas pela
tradição judaico-cristã, que adere à imagem de um deus masculino.
Por isso, a relação do homem com a natureza sai da esfera divina de submissão,
iniciando uma transição, em que os seres se tornam passivos com relação à atribuição dos
fenômenos naturais a entidades divinas: “ao passo que a visão de natureza como selvagem e
perigosa deu origem à ideia de que ela tinha de ser dominada pelo homem” (CAPRA, 1982, p.
37 apud SILVA, 2013, p 27).
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Vê-se, também que junto com o processo de globalização há, ao mesmo tempo, a
dominação da natureza e a dominação de alguns homens sobre outros homens, da
cultura européia sobre outras culturas e povos, e dos homens sobre as mulheres por
todo o lado. Não faltaram argumentos de que essa dominação se dava por razões
naturais, na medida em que certas raças seriam naturalmente inferiores. A
modernidade européia inventou assim a colonialidade e a racionalidade (base da
escravidão moderna) e, assim essa tríade – modernidade-colonialidade-racionalidade
– continua atravessando, até hoje, as práticas sociais e de poder (PORTO-
GONÇALVES, 2006, p. 25. Apud SILVA, 2013, p 29).
Silva ainda aponta que em razão dos acontecimentos históricos que ocorreram no
processo civilizatório, um dos acontecimentos que foram mais importantes para a
compreensão do surgimento das Ecovilas, foi o início da contracultura - movimento esse que
se propagou na década de 1960 e contribuiu para uma mudança cultural da sociedade,
tornando-se um marco de protesto pela liberdade, gerando um sentimento de repugnância
contra a cultura ocidental.
Um dos motivos que mobilizou os representantes deste movimento contra a vigente
sociedade da época e sua maneira de se organizar, era a expansão exacerbada do consumo e o
aumento dos problemas ambientais, resultantes de um tipo de desenvolvimento econômico
sustentado pelos princípios da dominação e da exploração (SILVA, 2013). Silva, ainda
esclarece que:
Ainda sob o olhar de Silva, chegamos ao ponto em que no período entre 1960 e 1970
surgiram esses movimentos contestatórios, e com isso, iniciaram-se novas formas de viver em
sociedade e de se relacionar com a natureza, a política, e a economia, o que foi permitido
através da fundação e a disseminação de experimentos de organização social.
Portanto, o conceito de Ecovilas e comunidades intencionais estão entrelaçados aos
mecanismos de estruturação que surgiram de forma não espontânea com relação aos padrões
sociais dominantes, e podem referir-se tanto às práticas mais ancestrais, como as comunidades
cristãs na Roma Antiga, quanto as mais recentes, como as comunidades hippies2. (CUNHA,
2012)
Cabe ressaltar, que as Ecovilas são herdeiras das comunidades intencionais surgidas
após a metade do século XX, e possui uma ligação que contém a “tentativa de definição de
outro tipo de vivência em sociedade, como o exemplo do socialismo utópico” (CUNHA,
2012, p. 46). Acerca deste aspecto Silva acrescenta também que:
Com isso, vêm á tona outros objetivos, preocupações e influências, aspectos esses, que
tomarão proporções ao longo do movimento “como as críticas à família, à educação formal,
ao Estado, à crença no pacifismo, à valorização do hedonismo, da subjetividade, da busca pela
espiritualidade” (SILVA, 2013, p. 78). O autor supramencionado ressalta que com esses novos
rumos de comportamento, a relação com o trabalho, a autogestão, a organização coletiva do
espaço e dos meios de produção, temas esses que se somaram e se tornaram uma “crítica ao
2
O aumento da autoconsciência critica por parte da juventude no período do Pós-guerra levou, nos EUA, ao
aparecimento dos “hippies”- jovens bastante politizados que, negando os valores burgueses norte-americanos
hegemônicos, procurava de alguma forma “desligar-se” daquela sociedade. (SILVA, 2013).
18
cientificismo e uma busca por uma relação social com a natureza diferente daquela tornada
hegemônica na modernidade, fundamentada basicamente no princípio da dominação.”
(SILVA, 2013, p. 78).
De acordo com Cunha (2013), estes movimentos são até hoje a base e o objetivo de
uma Ecovila, que podemos definir como comunidades intencionais, que de forma não
espontânea se tornam um grupo, se juntam para conviver e se organizarem, a fim de
promoverem menos impacto na natureza, terem uma relação de troca com as pessoas que
permeiam esse espaço, a sociedade local que está em seu entorno e outras comunidades
intencionais, se apropriando e utilizando de uma economia mais justa, que não visa o lucro e
sim a distribuição justa de seus excedentes. (CUNHA, 2012).
O foco de produção dessas comunidades está voltado para autossuficiência, entendido
aqui segundo os autores David Holmgren e Bill Mollison (2013. p, 165) como:
Portanto, o trabalho que se deve ter, está pautado na busca da troca dos excedentes
que é produzido em cada Ecovila com a sociedade local, a fim de usufruir o excedente da
produção como moeda de troca com outros coletivos, outras comunidades e até outras pessoas
que possam estar contribuindo com o que eles têm para oferecer. Isto não se restringe somente
a produtos orgânicos, mas também a mão de obra e serviços em geral, promovendo uma nova
forma de se relacionar com a economia, buscando assim manter a renda per capta dentro da
região (HOLMGREN, 2013).
Faz-se necessário apontar o envolvimento da permacultura dentro do contexto das
comunidades intencionais. Ortega, (2013, p. 8), contribui dizendo que,“a Permacultura
nasceu de um estudo sobre as culturas humanas que conseguiram permanecer por longo
tempo sem destruir seu meio em diversos lugares e períodos da História da Humanidade”.
Portanto, este entendimento torna-se um guia para estes grupos, que hoje vêm criando e
vivendo, essa realidade. O tema da permacultura e sua apropriação e inserção nas Ecovilas
será mais detalhado no capítulo seguinte, em que teremos como pretensão, compreender
melhor a permacultura no contexto da Ecovila.
2 CULTURA SEU SURGIMETO E CONTRIBUIÇÃO NA
ORGANIZAÇÃO DAS ECOVILAS
Após passar anos protestando contra a situação de degradação, percebi que meus
oponentes não iriam mudar, por esta razão, em 1972 decidi me separar da sociedade,
limpei um terreno, construí uma casa, fiz uma pequena horta, um jardim, plantei
algumas árvores e decidi viver ali isolado. Pensei que através da história, muitos
homens desgostosos com a sociedade haviam decidido fazer o mesmo. Contudo, não
demorei muito em dar-me conta que eu não poderia ficar isolado e deixar que os
bastardos destruíssem tudo, assim resolvi regressar e lutar. Demorei um tempo em
pensar como
20
Em 1974 Bill Mollison realizou uma parceria com o David Holmgren, com a intenção
de desenvolver o conceito de “permacultivo”. A junção entre os dois autores foi crucial, e os
seus trabalhos iniciais deram as ideias da agricultura permanente, mais peso e amplitude, de
maneira que, gradualmente, o permacultivo passou a ser considerado como um sistema de
design integrado, apto em sistematizar vários aspectos (tanto técnicos como éticos) e se
ajustar a diferentes contextos sociais e geográficos, pretendendo, com estas atitudes,
promover uma cultura permanente, que acabou resultando na construção da permacultura 4
(SILVA, 2013).
Todos os materiais que estes dois autores produziram começaram a ser publicados e
reconhecidos a partir de 1978. Após estas publicações surgiram diversos grupos interessados
em se aprofundar e compreender melhor o que estes dois autores estavam construindo.
(SILVA, 2013).
Com isso, estas pessoas começaram a se encontrar regulamente com a intenção de
“criar redes, articular-se politicamente, realizarem alguma ação prática ou mutirão de
trabalho, trocar informações, sementes, mudas, e diversas outras atividades” (SILVA, p. 161).
Bill Mollison, em 1979, fundou o: Permaculture`s Institute. – Hoje é considerado
como uma das maiores, e mais importantes organizações permaculturais em nível mundial.
Desde sua fundação formou mais de quarenta mil pessoas e além de formar pessoas, é
responsável por iniciativas que buscam promover investimentos éticos e formas de economia
e finanças alternativas. Trabalham também com o programa Tree Tithe Programme, que
contribuem voluntariamente os ganhos com as publicações sobre permacultura as revertendo-
os em programas de reflorestamento. (SILVA, 2013).
Portanto, a partir dos anos 80 o movimento permacultural expandiu-se mundo à fora,
mas somente em 1984 fundaram um curso básico, resultando no essencial modelo para a
formação de novos praticantes e instrutores. Cabe ressaltar que este curso foi à principal
estratégia empregada para expandir a permacultura, que posteriormente proporcionou uma
3
Depoimento retirado do documentário “In grave danger of falling food”, 1989. (SILVA, 2013, P. 161).
4
É possível notar, desta forma, o emprego de dois significados distintos para o termo “cultura”. O primeiro está
atrelado ao seu sentindo etimológico, dizendo respeito, exclusivamente, ao “cultivo” agrícola. Já o segundo
significado, notadamente antropológico (e de uso mais genérico), relaciona-se ao conhecimento acumulado, ás
ideias, ás crenças, aos sistemas éticos, aos hábitos, modos de vida, etc (SILVA, 2013, P. 162).
21
Bill Mollison e David Holmgren colocam o cuidado com a terra como um dos
princípios centrais dentro da permacultura, pois para os permacultores o cuidado com a terra
abrange diversos sentidos, a começar pela necessidade em manter a sanidade dos solos que
são fonte de vida, mantendo a conservação ativa dos ecossistemas e utilizando de maneira
ética os recursos e bens naturais. Portanto para Holmgren (2013), a permacultura fornece
ferramentas importantes que proporcionam uma relação mais equilibrada com o ambiente e
com as pessoas.
Holmgren (2013) evidencia que é importante “continuar elaborando formas criativas
para colocar a terra sob um controle de estruturas coletivas, em lugar de tomar como natural a
5
No caso da criação permacultural do espaço, a palavra design costuma apresentar um significado mais amplo e
profundo do que a tradução imediata “desenho” (em português). Como substituto, poderia se pensar no termo
“projeto”, que se aproxima um pouco mais do sentindo que comporta o termo original. (SILVA, 2013, P. 184).
24
propriedade privada que acompanha nossa cultura industrial ocidental” (HOLMGREN, 2013,
p. 76).
Silva (2013) discorre sobre a importância do envolvimento pessoal e coletivo dos bens
em comum, e diz que o cuidado com a terra resulta diretamente das necessidades básicas
humanas como: alimentação, abrigo, educação e saúde, e que estas necessidades esbarram
com o segundo principio permacultural, que é o cuidado com as pessoas.
Holmgren diz que: “as necessidades e aspirações humanas, ao serem colocadas no
centro das atenções, convertem a permacultura em uma filosofia de caráter ambiental-
humanista” (apud, SILVA, 2013, p.187).
Para Mollison (1994), a espécie humana e a única que promove certo impacto no
planeta, modificando-opor meio de práticas destrutivas em grande escala. A permacultura
pretende auxiliar, ensinando as pessoas a terem mais autonomia, permitindo que elas criem
recursos e possam prover suas necessidades básicas independentemente de governos e/ou
empresas. (apud, SILVA, 2013, p.187)
Portanto, para Holmgren (2013), o cuidado com as pessoas inicia-se individualmente e
depois se expande em círculos crescentes, esbarrando gradativamente na família, na
comunidade e na bio-região. Segundo o autor supramencionado “os limites para as melhorias
materiais são tanto estruturais e internas a nós mesmos, bem como externas, políticas e
ambientais” e acrescenta dizendo que “para poder contribuir com um bem maior, é preciso
antes estar saudável e seguro” (HOLMGREN, 2013, p.60).
E por último temos o terceiro princípio: compartilhar os excedentes, que para o autor
Mollison, (2002, p. 03 apud SILVA, 2013, p.188) “Leva à simples decisão de cooperar e
tomar parte de funções de apoio na sociedade, promovendo uma interdependência que
valoriza a contribuição do individuo ao invés de formas de oposição ou competição”. Ou seja,
quanto maior o armazenamento de um lado, maior a insuficiência de outro. Quanto maior a
partilha de excedentes, maior igualdade social e equilíbrio ecológico (SILVA, 2013).
Outro ponto que Silva (2013) irá discutir e que é de grande importância, é a escolha
que Bill Mollison e David Holmgren tiveram na implementação da permacultura como uma
metodologia de luta, que busca diminuir a desigualdade social. Segundo Silva (2013, p. 190,
191):
Podemos entender então que as comunidades intencionais são uma das maneiras de
colocar em prática todos estes recursos, é a ideologia que a permacultura propõe. Portanto,
tendo em vista que este estudo pretende compreender o surgimento das Ecovilas, e quais os
motivos que levam as pessoas a almejarem outras formas de estar no mundo. Buscando
integrar os conceitos da permacultura no cotidiano, permitindo-os outras maneiras de se
relacionarem. Por esse motivo é possível esclarecer a construção deste capítulo, que traz de
forma resumida a estrutura do pensamento e construção dos mecanismos holísticos da
permacultura, e como eles se cruzam e se relacionam com as comunidades intencionais. É
importante evidenciar uma colocação de Holmgren (2013) que esclarece:
Santos (2015), contribui, afirmando que a permacultura pode auxiliar nessa busca, pois
ela é “uma ideologia com princípios norteadores e métodos práticos, que contribuem para um
processo de ressignificação” (SANTOS, 2015, p. 60).
Segundo a autora, esses métodos podem ser implantados em diversos lugares como em
escolas, áreas públicas, ambiente urbano e propriedades rurais. No entanto faz-se necessário
que ele seja executado em lugares em que haja um grupo de pessoas empenhadas em
reunirem-se para formar uma comunidade ou um coletivo com o foco da integralidade,
podendo executar esses ensinamentos da permacultura na produção de insumos, em espaços
culturais, educativos e nas comunidades intencionais - tanto rurais como urbanas - ou todas as
intenções em coexistência, que é o caso das Ecovilas. (SANTOS, 2015)
Neste ponto, será possível discutir com mais detalhes no próximo capítulo, a fim, de
construir uma articulação entre as concepções dos autores existenciais e as informações e
reflexões colhidas no documentário. Portanto, a presente pesquisa se voltará à compreensão
das experiências das pessoas que já vivem ou estão no processo de transição para as
comunidades intencionais, que acabam colocando em prática outros modelos de sociabilidade
e formas de relacionarem-se com a natureza. Ou seja, será por meio das falas retiradas das
26
Neste capítulo irei utilizar o discurso oral de moradores de ecovilas, que foi coletado
por meio do documentário -“ECOVILAS BRASIL – Caminhando para sustentabilidade do
ser”, com o propósito de compreender a produção de sentidos por meio dos testemunhos
construídos, das experiências, de escolher viver em uma comunidade intencional. O objetivo
deste estudo são os depoimentos gravados em 2009, durante a produção do Vídeo-
documentário.
Segundo os autores Junior & Amaral (2015), a realização destas observações são
importantes e cruciais para a compreensão de um dado momento histórico que vem ocorrendo
e se solidificando em nossa sociedade. Nas palavras dos autores mencionados fica evidente o
quanto: “Os discursos são tomados como práticas sociais, historicamente construídas, que
constituem os sujeitos e seus respectivos objetos” (JUNIOR & AMARAL, 2015, p. 2).
Para Junior & Amaral (2015), os depoimentos coletados que sustentam este trabalho
estão relacionados com as perspectivas de linguagem, cultura, identidade e depoimento, dos
seguintes moradores, de dez comunidades intencionais existentes no Brasil, que são: Diogo
Alvim morador da Ecovila Terra Uma; Mariana Devoto, moradora da Ecovila El Nagual;
Damaris Regina,moradora da Comunidade Dedo Verde; Fernando Neubauer,morador da
Ecovila Tibá; Djalma Nery,morador da Estação Permacultural Veracidade; Romeu
Leitemorador da Vila Yamaguishi; Francesco Pommesening,morador da Instituto Arca verde;
Luiz Aquiles,morador da Ecovila karaguatá; Angelina Ataíde, moradora da Comunidade
Piracanga; Ana Claudia Fugikaha,moradora da Ecovila Tibá; Bruno Perel morador da
Comunidade Dedo Verde; Maria Sagnoli - ; Marcos Molz - ; Pavita Machado - ; Pren Milam,
moradores da Comunidade Osho Rachama.
Portanto, será por meio da análise discursiva dos depoimentos coletados e transcritos,
que foram gravados em áudio e vídeo para a construção do documentário, que possibilitará
entrar em contato com a experiência destas pessoas que vem historicamente modificando as
28
relações estabelecidas na sociedade, e é por meio da voz destes sujeitos, à luz da Análise
Descritiva, que será possível levantar uma reflexão acerca de como é para estas pessoas
viverem em um coletivo. Também consideramos para a pesquisa, uma articulação teórica,
com autores da fenomenologia, enquanto facilitadora da disseminação do fenômeno que a
pesquisa busca compreender, ou seja, será por meio do confronto das informações coletadas e
o aporte teórico que será estabelecida uma inter-relação entre as bases teóricas e práticas deste
fenômeno.
Irei discorrer brevemente sobre a metodologia da Análise de Discurso, a fim de
esclarecer e evidenciar a construção da compreensão que a pesquisa pretende realizar. Os
autores Junior & Amaral, contribuem apontando que um dos elementos fundamentais para
entender as relações sociais, e que sistematiza a organização cultural do sujeito é a linguagem.
Segundo os autores mencionados “A Análise de Discurso, oferece-nos um campo vasto de
subsídios para essa discussão, justamente, por servir de ponte de ligação entre a língua e sua
exterioridade constitutiva”. (JUNIOR & AMARAL, 2015, p. 8).
Para Orlandi (1999, p. 15, apud, JUNIOR & AMARAL, 2015, p. 8 - 9), é por meio
desse tipo de estudo que:
Se pode conhecer melhor aquilo que faz do homem um ser especial com sua
capacidade de significar e significar-se, pois a Análise de Discurso concebe a
linguagem como mediação necessária entre o homem e a realidade natural e social.
Nessa concepção, inúmeras são as possibilidades que nos permitem alcançar, através
de uma análise discursiva, o fio que nos conduz ao indivíduo, ao social e, com ele, à
História.
Portanto, segundo o entendimento dos autores Junior & Amaral (2015), será por meio
desta metodologia, e do entendimento de que a Análise de Discurso, não procura o sentido
verdadeiro nas palavras, mas consideram que é por meio da história e as condições da
linguagem entre os sujeitos que se torna possível caminhar para diferentes compreensões.
Nas palavras dos autores supramencionados é:
Tendo em vista esta breve compreensão da Análise de Discurso, cabe ressaltar o que
será realizado a seguir, portanto será feito uma análise dos trechos coletados do documentário
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a ser esclarecido, é que foi por meio da compreensão das falas que esses conceitos foram
selecionados para a articulação.
É importante deixar claro que não se tratam de modos de existir estagnados, mas sim,
dinâmicos e característicos do homem. Sendo assim, em um modo inautêntico de existir, o
homem não tem plenitude na realização das suas possibilidades, já que isso só acontecerá
quando este, gradualmente, conquista um estado autêntico de existência (BRUNS E
TRINDADE, 2003). É isso que buscarei analisar nos discursos a seguir. Segundo as falas
coletadas no documentário, foi possível correlacioná-las com estes temas existências.
Vejamos a seguir:
solicitude do ser-com caracteriza a relação de abertura entre uma presença e outra, portanto,
podemos dizer que a solicitude é imprescindível para a constituição ontológico-existencial.
Uma vez que, a presença compreende o seu próprio ser, na medida em que compreende
também o ser da outra presença reciprocamente. Sendo assim, podemos esclarecer esta
relação na fala da autora mencionada, que evidenciam a importância da convivência e de
como ela promove um reconhecimento do próprio existir no mundo.
25:46 “A gente vê que esta questão de ser sustentável, ela tem cada
vez mais em camadas, cada vez mais a gente percebe não estar sendo
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porque tenho amigos me enxergando, estão vendo que não estou legal
e estão me puxando e me enxergando e me ajudando.”
estado de ânimo tão peculiar leva o homem a empreender o caminho em direção à conquista
da autenticidade.
Portanto, podemos resgatar a reflexão realizada inicialmente evidenciando que a
solicitude promovida pela convivência, o ser-com, no mundo, acaba auxiliando na busca da
autenticidade, uma vez que, o homem se encontra no mundo, no entanto, conforme vai
conquistando a autenticidade vai também voltando sua atenção para si. Escolhe a si como
possibilidade de ser-no-mundo. Desta maneira, é de um modo não-linear, mas, gradual, que o
homem pode aproximar-se do existir autêntico e ora do inautêntico.
No entanto o que se mostra, é que a convivência possibilita a conquista dessa
existência autêntica, ou seja, a relação que se estabelece nesta forma de convivência, acaba
promovendo que a solicitude seja autêntica e auxilie no processo de ser-si-mesmo (BRUNS E
TRINDADE, 2003).
Tendo em vista tais aspectos, podemos compreender que o homem partilha com os
outros o espaço que lhe circunda. Segundo Roberto (2009), é nesta relação com o outro em
que o homem se encontra a si mesmo e aos outros, pois sem o outro de nada adianta existir,
ou seja, o homem está neste mundo, convive com os outros, se relaciona com os outros
homens. Nas palavras do autor mencionado “Ser lançado no mundo possibilita ao Dasein
mergulhar na aventura da partilha deste mundo com os outros” (ROBERTO, 2009, p s/n).
Este trecho possibilita para que possamos relacionar com a escolha das pessoas de
buscarem, por meio da convivência, construir uma nova forma de se relacionarem com elas
mesmas, com os outros, com as coisas e com o mundo. E que fazem isso por meio do projeto
de construção das ecovilas, ou seja, a proposta das ecovilas é trabalhar com todas estas
questões. Portanto o que se mostra como fenômeno, são as pessoas abraçando a ideia de
construírem um espaço, em que as decisões são tomadas coletivamente, que as tarefas e as
trocas são sempre realizadas respeitando a opinião de todos. No entanto, a real busca é
individual, e a busca pelo ser-si-mesmo e pela autenticidade, é que acabam por promoverem a
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Sendo assim, nestas falas, podemos perceber que nem sempre a fala, o discurso do
sujeito está sendo autêntico. Segundo os autores Bruns e Trindade, (2003), eles esclarecem
que embora a linguagem possibilite o desvelar do ser, não necessariamente o faz, pois, esse
desvelamento irá depender do modo de existência do homem no mundo. Portanto, podemos
notar que nestas falas existe uma forma de se manifestar por meio da tagarelice. Segundo os
autores mencionados essa forma encobre a voz do ser, que é o discurso, no entanto, nestas
mesmas falas podemos supor a manifestação da existência autentica, uma vez que ela se
apresenta nas pausas, movido pela angústia aquieta-se e lhe é dado, então, ouvir a “voz do
ser” ou “a voz da consciência”, ou seja, é neste momento, que o discurso se apresenta e “a voz
do ser” pode vir a ser pronunciada, e a linguagem se expressa autenticamente. Verifica-se esse
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fato, quando o sujeito se mostra perdido e buscando em sua fala, dar sentido a escolha de ter
um lugar seguro para crescer, viver e morrer, e também perdido, com relação a ter que buscar
as respostas vivenciando na prática as questões que movem a busca por um novo existir que
faz sentido, que seja autêntico e que quebre os padrões já existentes de convívio social.
Podemos supor, por meio da compreensão realizada das falas dos sujeitos, que o
fenômeno comum entre os moradores das comunidades intencionais está presente na busca de
uma existência mais autêntica, buscada através desta forma alternativa de configuração social
que estão construindo, nomeada como Ecovila. Essa configuração acaba se tornado uma
ferramenta que auxilia na busca pela autenticidade. Pois percebemos por meio das
articulações realizadas, que para Heidegger, a busca pela autenticidade está presente na
relação com o outro e no movimento de angústia do próprio existir.
Podemos resgatar um trecho do texto que evidencia a importância da relação com o
outro para ir de encontro à autenticidade, pois o que se mostra, é que a convivência possibilita
a conquista dessa existência autêntica, ou seja, a relação que se estabelece nesta forma de
convivência, acaba promovendo que a solicitude seja autêntica e auxilie no processo de ser-si-
mesmo (BRUNS E TRINDADE, 2003).
O texto também mostra que, além do auxílio da convivência, existe também o contato
com a angústia, em que o sujeito elabora questões próprias de sua inautenticidade no mundo,
e com isso entra em contato com a angústia do existir, e essa angústia acaba tornando-se uma
ferramenta para ir de encontro à autenticidade. Portanto, fica evidente que o homem começa
a sentir que o mundo não mais o satisfaz totalmente, que lhe falta algo em seu movimento de
atração pelo mundo, e quando ele inicia o contato com o seu ser autêntico - e isso ocorre por
meio de se assumir a si mesmo como referência para seu existir - essa possibilidade de ser-si-
mesmo tem o início de sua conquista a partir do momento em que toma consciência da sua
angústia e busca trabalhar e se permitir entrar em contato com seu existir, e com isso buscar
modos de existir mais autênticos (BRUNS E TRINDADE, 2003).
Essas duas formas de busca pela autenticidade se encontram presentes dentro dos
coletivos formados nas comunidades intencionais, e podemos supor que o fenômeno que
pretendia se encontrar com a presente pesquisa mostrou-se presente, revelando que o que leva
as pessoas a escolherem saírem das condições de vidas que se encontram, para emergirem em
uma construção de uma comunidade intencional, é essa busca por um existir mais autêntico.
Os motivos que justificam essa tomada de decisão podem ser diversos, mas o fenômeno
central e a busca por uma vida que faça sentido, é a busca pela autenticidade. É importante
colocar que a autenticidade pode ser alcançada em outros espaços, porém a Ecovila
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potencializa esse contato com ser-si-mesmo, uma vez que todos que estão presentes neste
contexto buscam a mesma coisa.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
A pesquisa nos permitiu entrar em contato com uma nova forma de nos relacionarmos
em sociedade, uma vez que foi focado em compreender como este movimento, conhecido
como Ecovila, surgiu, como ele se organiza e qual o fenômeno que leva as pessoas a adotarem
esse modo de existência no mundo. Para responder estas questões, foi escolhido compreender
a fala de moradores de dez comunidades espalhadas pelo Brasil.
A ferramenta utilizada para coleta destes dados foi extração das experiências dos
moradores por meio dos discursos contidos no documentário Ecovilas Brasil – Caminhando
para a sustentabilidade do ser, que permitiu entrar em contato com a realidade e a percepção
de cada um acerca da experiência que escolheram vivenciar. O método de análise para a
realização da articulação do fenômeno percebido com o material teórico foi à utilização da
Análise de discurso.
Portanto, o trabalho teve como linha de raciocínio o aprofundamento na história das
ECOVILAS, para compreender melhor o passado, e quais foram as questões que motivaram a
construção deste modo de vida. Buscamos compreender, também, o presente destas
comunidades, tentando entender como eles se organizam e o que almejam para futuro.
O que percebemos, é que este movimento das ecovilas, por mais recente que seja,
estão vinculados com outros movimentos que ocorreram ao longo da nossa civilização, e que
se manifestaram como uma resposta para os acontecimentos da época.
Durante os estudos realizados sobre as comunidades intencionais, entramos em
contato com a permacultura, que é uma das ferramentas utilizadas pelas ecovilas, pelo fato de
ser uma das teorias desenvolvida para auxiliar na organização destes espaços. Por esse fato,
nos preocupamos em se aprofundar um pouco e compreender sucintamente essa teoria para
entender como ela contribuiu nas relações estabelecidas dentro e fora das comunidades.
E finalmente, iniciamos a articulação dos dados obtidos e das falas extraídas do
documentário, com a teoria fenomenológica existencial - mais especificadamente o
pensamento filosófico heideggeriano - por meio da Análise de Discurso foi possível entrar em
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contato com vários temas existências apontado por Heidegger. E de forma geral, o fenômeno
que se encontra com o objetivo, e que a pesquisa tinha como interesse em compreender, era de
fato, a busca pela autenticidade.
Essa busca mostra-se em dois momentos distintos: um deles é o motivo que leva as
pessoas a escolherem mudar a forma como se relacionam no mundo, pelo fato de perceberem
que a vida que estão vivendo encontra-se sem sentido, e a ideia de viver em um coletivo se
apresenta como uma nova forma de experimentar um novo caminho. Esse tipo de
autenticidade se apresenta pela angústia e a busca interna do ser-si-mesmo e é um processo
que se inicia antes do sujeito de fato estar convivendo em um coletivo, no entanto se torna um
dos impulsos que o leva ao encontro deste coletivo.
Em um segundo momento, a pesquisa mostrou também que muitas pessoas escolhem
inicialmente, viver em uma comunidade intencional por outros motivos, por exemplo, estarem
mais envolvidas com a permacultura, a agroecologia, a bioconstrução, a política, entre outros.
Porém, ao entrarem em contato com a convivência, acabam vivenciando a experiência
autêntica de solicitude que se torna uma ferramenta que auxilia o homem em sua busca
interna do ser-si-mesmo.
Sendo assim podemos sugerir que o fenômeno central é a busca pela autenticidade do
existir, e essa busca se dá individualmente, porém o coletivo auxilia e fornece ferramentas
para o homem alcançar o conhecimento interior de si próprio, provocando-o a entrar em
contato com a responsabilidade de se estar no mundo de forma autêntica.
Portanto, é relevante esclarecer que a trajetória utilizada é uma possibilidade, não
tendo a pretensão de esgotar o que se interroga, envolvendo uma postura de abertura e
seriedade de modo a entender que a interpretação e a articulação realizada dos discursos
obtidos, têm a intenção de ampliar a compreensão dos aspectos da existência humana a que se
lançou. Então, conclui-se que esta pesquisa alcança uma compreensão acerca do fenômeno
pesquisado, ou seja, lança luz a aspectos que, no início encontravam-se obscuros, mas que foi
se desvelando e mostrando o quanto se faz necessário mais estudo e envolvimento da
psicologia nas comunidades intencionais.
REFERÊNCIAS