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Curso Teoria e Prática do Design Instrucional

Janeiro de 2018

O Design Instrucional e suas etapas

Régis Tractenberg

1. Definição

O Design Instrucional, ou DI, é “o processo sistemático e reflexivo de traduzir princípios de


cognição e aprendizagem para o planejamento de materiais didáticos, atividades, fontes de
informação e processos de avaliação” (Smith e Ragan, 1999).

Essa metodologia se distingue de outras formas de criação de materiais e projetos educacionais


pelo seu caráter metódico e cuidadoso aplicado aos processos de análise, planejamento,
desenvolvimento e avaliação. Sua prática orienta-se por resultados de pesquisas principalmente
nas áreas de Educação, Psicologia e Comunicação. Trata-se de uma abordagem sistêmica, que
pondera múltiplos fatores que influenciam a implementação de uma iniciativa de educação ou de
treinamento. Mais adiante serão analisados alguns desses fatores.

O DI possui quatro propósitos básicos:

a) Criar processos e materiais didáticos eficazes, isto é, que atinjam seus objetivos
pedagógicos.

b) Estes materiais e processos devem ser eficientes, consumindo o menor tempo possível.

c) Devem ser agradáveis para os aprendizes.

d) Precisam ser viáveis em seu custo-benefício.

Segundo Smith e Ragan (1999), as vantagens do DI incluem:

 Situar o foco do processo de ensino-aprendizagem no aluno.

 Integrar o trabalho de designers instrucionais, designers gráficos, instrutores, gerentes e


outros profissionais por meio de um processo de trabalho sistemático.

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 Facilitar o desenvolvimento de soluções alternativas às práticas usuais em um


determinado campo de ensino.

 Levar à convergência dos objetivos, atividades e avaliações.

O DI pode ser utilizado por qualquer pessoa que precise criar alguma forma de instrução. Sua
prática não está restrita aos designers instrucionais, profissionais especializados em todas as
etapas dessa metodologia. É essencial também a professores, coordenadores de cursos, gerentes
de projetos educacionais, editores, especialistas na produção de mídias, profissionais de RH,
dentre outros.

1.1 Aprendizagem, educação, instrução e treinamento

Existem muitas definições para o que seja aprendizagem, conforme a filosofia educacional ou a
teoria adotada. Em DI a aprendizagem costuma ser definida como “o processo pelo qual um
organismo muda seu comportamento em função de suas experiências”, ou ainda “o processo da
experiência sendo transformada em conhecimento”. São exemplos de aprendizagem: uma criança
que toma um choque na tomada e nunca mais coloca seu dedo lá; ou um jovem que viaja pelo
mundo, adquire novos conhecimentos e muda sua forma de pensar e agir perante povos de outras
culturas. No quadro a seguir, Romiszowski (1999) situa a instrução entre outras formas de
aprendizagem:

Existem Existem objetivos de aprendizagem específicos?


procedimentos e
materiais para
favorecer a
aprendizagem?

Sim Não

Sim Instrução Visitas a museus, teatro, biblioteca etc.


Aulas, cursos, livros, CD-ROMs
etc.

Não Projetos Aprendizagem incidental


Estágios, pesquisas

Quadro 1. Uma definição de instrução. Romiszowski, 1999.

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Por educação entendem-se todas as experiências criadas para que as pessoas aprendam. Isso
inclui a instrução, e as formas de aprendizagem em que não há objetivos claros e predefinidos.

Quando existem objetivos predefinidos e um método para alcançá-los, chamamos isso de


instrução, que toma a forma de cursos e materiais didáticos em geral. O termo instrução não é
sinônimo de treinamento. A instrução pode ter finalidades acadêmicas ou de capacitação
profissional e adotar abordagens didáticas as mais diversas.

As outras formas de aprendizagem também têm valor: estágios ou visitas a ambientes educativos
ampliam a cultura e favorecem a aprendizagem diversificada, que dificilmente poderia se dar em
contextos estruturados. A aprendizagem incidental (ou “informal” como tem sido chamada
atualmente), por sua vez, representa o modo pelo qual desenvolvemos novos conhecimentos em
boa parte da vida, isto é, sem qualquer planejamento ou intenção educativa, fora de contextos
especiais e sem materiais didáticos.

Todos os tipos de aprendizagem são importantes e precisam estar presentes na vida de uma
pessoa. Instrução é apenas uma categoria voltada a iniciativas focalizadas em objetivos bem
definidos, que seriam alcançados de modo mais difícil ou mais lento por meios não formais.

Por fim, o termo treinamento se refere a iniciativas para aquisição de competências para o
trabalho. Inclui todo tipo de instrução voltado ao uso de algum equipamento ou método
específico, ou ainda a determinada ocupação laboral. Também é utilizado para designar a
aprendizagem relacionada à prática psicomotora, principalmente em esportes e na aprendizagem
de atividades militares.

1.2 Níveis do planejamento educacional

A instrução encontra-se no plano mais elementar do planejamento educacional e diz respeito aos
materiais didáticos (livros, apostilas, vídeos, tutoriais digitais), e às atividades educacionais
(palestras, aulas, cursos, módulos online etc.).

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Os métodos do design instrucional podem ser aplicados também a propostas curriculares no


mapeamento de objetivos de aprendizagem amplos. O quadro a seguir mostra a hierarquia entre
os diferentes níveis do planejamento educacional:

Nível de planejamento Exemplo

Social Leis de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira;


Parâmetros Curriculares Nacionais.

Organizacional Filosofia educacional de base construtivista, adotada no


Colégio X.

Curricular Currículo do Colégio X para os alunos do ensino médio /


currículo de Física para o ensino médio.

Instrucional Livro didático ou aula de Física em que o professor leva


seus aprendizes a inferir as leis da termodinâmica.

Neste curso, o TPDI, manteremos nosso foco de estudos no nível do planejamento instrucional e
usaremos a definição de Gellevij (2001):

Instrução é conseguir, por meio de um método, que um aprendiz, dentro de um sistema e sob
certas condições, alcance um objetivo de aprendizagem pré-definido.

Tal definição reflete as etapas que estudaremos a seguir.

2. Etapas do Design Instrucional

O trabalho de um designer instrucional consiste em responder a três grandes perguntas:

 Aonde vamos? (os objetivos da instrução)

 Como chegaremos lá? (as estratégias e as mídias instrucionais)

 Como saberemos quando chegarmos? (a avaliação)

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Existem muitos modelos que representam as etapas do processo de DI. O modelo ADDIE é bem
simples e um dos mais utilizados. Sua sigla significa:

 Analize (analisar)

 Design (planejar)

 Develop (desenvolver)

 Implement (implementar)

 Evaluate (avaliar)

2.1 Analisar

A fase de análise corresponde ao exame e à descrição do problema instrucional a ser solucionado.


A expressão “problema instrucional” refere-se a uma diferença entre o desempenho atual e o
desempenho desejado para um determinado público-alvo. Esse desempenho pode ser acadêmico
ou profissional.

É muito importante para um designer instrucional saber que o desempenho insatisfatório nem
sempre se deve à falta de competências. Diversos outros fatores influenciam o desempenho
humano, tais como: baixa motivação, equipamentos de trabalho inadequados ou processos de
trabalho ineficientes e mal definidos.

É um erro comum das organizações criar cursos ou materiais didáticos na expectativa de resolver
problemas que não podem ser completamente atendidos por iniciativas de educação ou
treinamento. Em muitos casos, a solução exige ações integradas de treinamento e comunicação,
além de mudanças em práticas organizacionais.

Quando a falta de conhecimento ou de competências é um elemento real e precisa ser atendido


para o aprimoramento do desempenho, seja este profissional ou acadêmico, então isso é o que se
chama de “problema instrucional”.

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Para resumir

O designer instrucional precisa compreender os problemas com que se depara e diferenciar os


aspectos organizacionais e administrativos dos aspectos instrucionais.

Um exemplo:

O Colégio X caiu 23 posições na classificação geral do vestibular e a diretoria deseja melhorar esta
situação.

Após cuidadoso diagnóstico, um consultor experiente em DI identificou o seguinte:

Problemas organizacionais: a) os professores estão insatisfeitos com seus salários e não se


dedicam o suficiente; b) a coordenadora educacional não ouve as sugestões dos professores para
melhorar o ensino no colégio; e c) os alunos, por modismo e falta de conhecimento, concentraram
suas inscrições nos cursos universitários mais populares e disputados.

Problemas instrucionais:

a) após a saída de dois bons professores de Matemática e Física a qualidade do ensino nessas duas
disciplinas se tornou deficiente. Análise Combinatória e Termodinâmica foram os assuntos que
revelaram maior queda de desempenho perante as provas de vestibulares anteriores;

b) os alunos também mostram pouco interesse nos estudos, pois não compreendem como tudo
poderá lhes ser útil algum dia.

Considere o exemplo acima. Adiantaria mudar apenas os livros didáticos ou contratar novos
professores? Provavelmente não. Uma solução com chances de sucesso precisaria atender a vários
elementos: um designer instrucional poderia propor mudanças na didática de Matemática e Física;
um psicólogo poderia orientar melhor os alunos, permitindo-lhes dar mais sentido aos estudos;
finalmente a escola poderia estudar formas de aumentar os salários e encaminhar as propostas de
melhoria no currículo para atender, assim, às expectativas de seus professores.

Mesmo quando existe de fato um problema que pode ser atendido por meio de instrução, é
preciso que esta seja bem planejada. Outro erro comum é a implementação de medidas

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desproporcionais ou inadequadas ao problema. Por exemplo: um curso online com 200 telas
animadas, que só podem ser acessadas diante do computador, pode ser uma solução pior que um
guia impresso de consulta rápida acessível durante o trabalho.

Por esse motivo é necessário analisar fatores como o contexto, as características dos aprendizes e
os objetivos de aprendizagem, no intuito de fundamentar decisões a respeito de uma solução
viável e com boas chances de sucesso.

Uma vez definidos os problemas organizacionais e identificados os problemas instrucionais


procedemos com:

A análise do contexto de aprendizagem que inclui fatores como a infraestrutura tecnológica,


verbas disponíveis, elementos restritivos, prazos, políticas organizacionais, cultura local etc.;

A análise do público-alvo que verifica as características cognitivas dos aprendizes, seu


conhecimento prévio e competências relacionadas ao assunto em questão, características sociais
e motivacionais etc.;

A análise dos objetivos de aprendizagem que decompõe objetivos gerais em objetivos específicos
e subobjetivos, para permitir que sejam identificados os tipos de aprendizagem necessários para
se criar uma solução instrucional completa sem lacunas nem excessos no conteúdo.

São perguntas-chave do DI na fase de análise:

 Levantamento de necessidades: qual é o problema? Que tipos de habilidades e conhecimentos


se pretende ensinar/promover?

 Análise do contexto: quais as condições?

 Análise do público-alvo: quem são os aprendizes?

 Análise dos objetivos: o que os aprendizes devem se tornar capazes de fazer?

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2.2 Planejar

Na etapa de planejamento, determinam-se as estratégias que serão aplicadas para atender ao


problema instrucional, a fim de estimular as aprendizagens identificadas como necessárias.

Nessa fase selecionam-se os mediadores (professores, tutores etc.), as mídias e as tecnologias que
melhor atendem à instrução em seu contexto.

No planejamento, selecionam-se ainda os métodos de ensino/aprendizagem como: presencial ou


a distância, supletivo (dar informação) ou generativo (propor desafios), em grupos ou
individualizado, estratégias motivacionais etc. O conteúdo é sequenciado em disciplinas, unidades,
lições e atividades.

As fases de análise e planejamento da solução costumam ser sistematizadas em um documento


chamado “projeto instrucional”.

Além dos aspectos educacionais, a criação de materiais didáticos ou a implementação de


programas de educação ou treinamento significa bastante trabalho. Iniciativas de grande
envergadura exigem projetos gerenciais que tratam de questões como o cronograma de tarefas a
cumprir, a composição da equipe de desenvolvimento, orçamento, riscos etc. Com frequência o
designer instrucional desempenha o papel de gerente de projeto devido à sua formação
abrangente e visão de conjunto sobre o propósito geral da instrução.

São perguntas-chave do DI nesta fase:

 Quais são as estratégias mais adequadas para promover os diferentes tipos de


aprendizagem?

 Como motivar os aprendizes?

 Quais são as mídias e as metodologias mais adequadas?

 Devem ser usadas abordagens generativas e/ou supletivas?

 Como deve ser sequenciada a instrução?

 Como os aprendizes serão agrupados?

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2.3 Desenvolver

Na fase de desenvolvimento, os materiais instrucionais e as atividades de aprendizagem são


criados. Conforme o caso, será necessário capacitar professores, comprar equipamentos ou
recursos didáticos que existam no mercado.

É comum fazer protótipos ou rascunhos dos produtos para fins de testes. Diversos modelos de DI
enfatizam a necessidade da “avaliação formativa”, isto é, a avaliação dos materiais e dos métodos
instrucionais ao longo de todas as etapas do desenvolvimento. Existem quatro métodos básicos
para a avaliação formativa: a revisão do planejamento, a validação pelos futuros alunos, a
validação por especialistas e a avaliação contínua durante a implementação (Smith e Ragan, 1999).

São perguntas-chave do DI nesta fase:

 Os produtos em desenvolvimento estão de acordo com o plano instrucional?

 Como podem ser melhorados antes de sua implementação?

2.4 Implementar

Em seguida, a instrução é oferecida (promovida, realizada) aos aprendizes conforme definido no


plano instrucional. Com a finalidade de fazer ajustes e correções, é comum oferecer a instrução a
um grupo-piloto antes de aplicá-la em grande escala.

É pergunta-chave do DI nesta fase:

 A instrução está sendo implementada corretamente?

2.5 Avaliar

Por fim, os resultados da instrução são analisados em sua efetividade em face dos objetivos
propostos inicialmente. Isso se chama “avaliação somativa”. Com tais resultados, os processos e os
materiais didáticos podem ser revisados e melhorados.

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São perguntas-chave do DI nesta fase:

 Qual a efetividade dos resultados de aprendizagem?

 Como melhorar processos e materiais didáticos para as próximas implementações?

Referências:

Gellevij. M. (2001). Disciplina ´Principles of learning and instructional design´ Universidade de Twente, (não
publicado).

Romiszowski, A.J. (1999). Designing Instructional Systems: Decision making in course planning and
curriculum design. London: Kogan Page.

Smith, P.L., & Ragan, T.J. (1999). Instructional design. (2nd ed.). Toronto: John Wiley & Sons.

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