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UNIVERSIDADE CATÓLICA PORTUGUESA

ESCOLA DE DIREITO DO PORTO

DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO

Critério de correção
Exame época ordinária - 5 de janeiro de 2018

Hipótese prática 2 - 7 valores

Factos revelantes:

• Em janeiro de 2013 - constituiu-se o grupo microniano que, alegando discriminação


por parte do Governo Central em relação às populações daquela região, pegou em
armas na tentativa de derrubar aquele governo.
• Desde janeiro de 2014 o governo central de Alfabetânio não exerceu qualquer
controlo sobre aquela parcela de território.
• 24 de fevereiro de 2015 - líder do grupo armado microniano, Juvenal Gambuzo,
declara unilateralmente a independência do novo estado de Micro naquela zona
norte de Alfabetânio
• Cinco dias após a declaração, Estado Macro decide estabelecer relações
diplomáticas com o Estado Micro
• Perante esta decisão, Estado Alfabetânio afirma: corte das relações diplomáticas;
intromissão; violação do direito internacional.
• outubro de 2016 - Estado Micro apresentou o seu pedido de admissão à ONU;
votação entre 180 Estados devidamente representados no dia 02 de novembro na
Assembleia Geral: 50 desses Estados votaram contra a admissão; 9 abstenções;
restantes Estados votaram a favor.
• Estado Caracoli (votou contra a admissão de Micro): alega que a admissão de Micro
à ONU em nada altera a sua posição; que Micro tem reduzidas dimensões territoriais
e populacionais; Micro não é, nem pode ser, um Estado.
• Ministro dos Negócios Estrangeiros de Micro declara: “A estadualidade de Micro é
inquestionável. Nem tão pouco a admissão, ou não, à Organização das Nações
Unidas pode ser confundida com aquela. A existência do Estado de Micro não está
condicionada pela decisão de um qualquer Estado ou Organização Internacional.”

Questão- Comente os factos descritos à luz do direito internacional:

• Janeiro 2013 - Grupo microniano: movimento de insurgência/ beligerância –


existência de um conflito armado, controlo de uma parcela territorial (desde janeiro
2014 – governo central não controla), controlo territorial exercido durante um
determinado período de tempo;
• Problematização da insurgência como situação objetiva – personalidade jurídica
temporária e limitada do movimento insurgência;
• 24 de fevereiro de 2015: declaração unilateral de independência – discussão sobre
a verificação dos elementos de manifestação de estadualidade (população
permanente, território definido, governo efetivo, capacidade relacional,
independência e respeito pelo princípio da autodeterminação dos povos);
Convenção de Montevideu;
• Licitude da declaração de independência; base de sustentação/ na origem da
declaração poderá ser ilícita (violação de normas ius cogens) – ex: Parecer do TIJ
sobre a Declaração Unilateral de Independência do Kosovo;
• Estado Macro decide estabelecer relações diplomáticas com o Estado Micro –
reconhecimento do Estado: ato jurídico unilateral (estabelece relações – capacidade
relacional); problematização do reconhecimento do Estado como direito, como ato
discricionário, mas limitado ou condicionado (limites ao reconhecimento);
nomeadamente, limite em causa - respeito pelo princípio da não ingerência em
assuntos internos de outro Estado - proibição de reconhecimentos prematuros (5
dias após declaração unilateral de independência) – violação de norma ius cogens
(ex: reconhecimento do Panamá como Estado pelos EUA poucos dias após a sua
Declaração unilateral de Independência – Panamá/Colômbia)
• outubro de 2016 - pedido de admissão de Micro à ONU:
- Condições de admissão – art. 4.º CNU; Processo de admissão - Parecer do TIJ
sobre a admissão à ONU; carácter essencial da condição de estadualidade.
- Votação, dia 02 de novembro – artigo 18.º CNU; 180 Estados presentes e
vontantes - 50 votos contra; 9 abstenções; 121 votos a favor.
- Admissão aprovada (2/3)
• Estado Caracoli (votou contra a admissão de Micro) não reconhece Micro como
Estado e refere as suas reduzidas dimensões territoriais e populacionais – elementos
de manifestação estadual população permanente e território; não patamares
mínimos de população e território para estadualidade; caso dos microestados; não
reconhecimento – teoria constitutiva do reconhecimento do Estado;
• Declaração do Ministro dos Negócios Estrangeiros de Micro – teoria declarativa do
reconhecimento do Estado.
• Valorização da menção expressa à legislação aplicável, exemplos históricos e
jurisprudência.

Hipótese prática 3 - 7 valores

• A, B, C, D, E, F, G e I – Estados signatários (def. Assinatura, art. 10º, 18º 78º CV)

• Definição de ratificação e adesão

• Classificação de declaração de F – reserva; definição art. 2º, n.º 1 al. d) CV +


condição de eficácia de manifestação de consentimento em ficar vinculado (art.
30, n.º 4, al. a) e c) CV)

o Logo, ratificação de F não é eficaz até ter ocorrido aceitação.

• G – objecção qualificada (art. 20º, n.º 4, al. b) e art. 21º, n.º 3 CV);
o Opcional e valorizado: apreciação de conteúdo da reserva é feita a título
subjectivo, objectivamente é admissível. Caso fosse efectivamente
inadmissível, vício de nulidade da reserva não afectaria consentimento
em ficar vinculado de F a não ser que fosse demonstrada a essencialidade
da aceitação da reserva para F.

• H adere – mesmos efeitos de ratificação, não tem como efeito aceitação tácita
de reserva de F até que sejam decorridos 12 meses após adesão (art. 20º, n.º 5
CV)

• Aceitação de A constitui F em parte no Convenção e, simultaneamente, constitui


quinta manifestação de consentimento em ficar vinculado.

o Neste momento, relações de tratado entre A e F conforme alteração


conferida pela reserva – art. 21º, n.º 1, a) e b); entre D, E, G, H e A
conforme redacção do tratado (reserva é eficaz apenas entre partes e
não produz efeitos para Estados que não a tenham aceite expressamente
a não ser que decorridos 12 meses da notificação da mesma – art. 20º,
n.º 5 e 21º, n.º 2 CV ); tratado não vigora entre F e G.

• Nada referido quanto a natureza de assinatura de B ou possibilidade de assinar


de forma simplificada pelo que a assinatura de B não tem natureza de assinatura
simplificada (art. 12º); logo, B era mero signatário. Apesar de não ter
manifestado consentimento para ficar vinculado ao Tratado, tem a obrigação de
não o privar de objecto e fim antes da entrada em vigor – cfr. art. 18º CV.
UNIVERSIDADE CATÓLICA PORTUGUESA
ESCOLA DE DIREITO DO PORTO

DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO

Critério de correção
Exame época recurso - 23 de janeiro de 2018

Hipótese prática 2 - 7 valores

• Enquadramento factual relevante


• Repressão de população em larga escala – problematização de violação de norma
ius cogens (respeito auto-determinação)
• Libertadores de Pessegueiro (LP) - movimento de insurgência/ beligerância –
existência de um conflito armado, controlo de uma parcela territorial exercido
durante determinado período de tempo (desde março 2015 – governo central não
retoma controlo de território e LP controla movimentos de entrada e saída e
administra território);
• Problematização da insurgência como situação objetiva – personalidade jurídica
temporária e limitada do movimento insurgência; alcance jurídico de actos de
reconhecimento de insurgência.
• Junho de fevereiro de 2015: declaração unilateral de independência – discussão
sobre a verificação dos elementos de manifestação de estadualidade (população
permanente, território definido, governo efetivo, capacidade relacional,
independência e respeito pelo princípio da autodeterminação dos povos e
densificação dos mesmos); Convenção de Montevideu. Estadualidade no contexto
de exercício de AD – critério de governo interpretado de forma menos estrita (incluir
precedentes).
• Declarações de Casanova: ausência de reconhecimento por Pessegueiro – não
verificação de efeitos associados a responsabilidade internacional. Alperce poderá
ser responsabilizado ao abrigo de 10º, n.º 2 PARI pelos actos cometidos por LP;
• Licitude da declaração de independência; origem da declaração poderá ser ilícita
(violação extrema de de normas ius cogens) – ex: Parecer do TIJ sobre a Declaração
Unilateral de Independência do Kosovo. Problematização de secessão remedial.
• Declarações de Neocate: Laranja reconhece o Estado de Alperce ao instalar
embaixada no mesmo. Ato jurídico unilateral (estabelece relações – capacidade
relacional); problematização do reconhecimento do Estado como direito, como ato
discricionário, mas limitado ou condicionado (limites ao reconhecimento);
nomeadamente, limite em causa - respeito pelo princípio da não ingerência em
assuntos internos de outro Estado contrabalançado por proibição de assistência a
atos desrespeitadores de normas ius cogens e obrigação de cooperação para por fim
aos mesmos; problematização da proibição de reconhecimentos prematuros (1 mês
após declaração unilateral de independência). Questão da consolidação dos
elementos de estadualidade considerado o pouco espaço de tempo descrito nos
factos.
• Neocate não reconhece, porém, o governo com base em teoria de legitimidade –
crítica e enquadramento.
• Dezembro de 2015 - pedido de admissão de Alperce à ONU:
- Condições de admissão – art. 4.º CNU; Processo de admissão - Parecer do TIJ
sobre a admissão à ONU; carácter essencial da condição de estadualidade.

• Valorização da menção expressa à legislação aplicável, exemplos históricos e


jurisprudência.

Hipótese prática 3 – 7 valores

• Definição do conceito de convenção/tratado para efeitos de aplicabilidade da


Convenção de Viena de 1969 (CV69)- menção de todas as disposições
pertinentemente aplicáveis da CV69
• Distinção entre forma solene e forma simplificada de prestação da manifestação de
consentimento em ficar vinculado ao tratado por parte de um Estado
• Caracterização do tratado em causa – multilateral, aberto – mas requisito da língua
oficial oxis - problematização da admissibilidade da adesão do Estado da Roterlândia
(língua oficial não é oxis)
• Estado da Martilândia presta o consentimento em ficar vinculado a 06 de maio de
2016, de forma simplificada – requisitos para a possibilidade de o fazer (art. 11.º);
• Os demais Estados signatários assinam sob reserva da ratificação (14.º) e verificam-
se adesões – Estados que não participaram nas negociações (15.º)
• Estado do Cadistão ratifica e formula reserva
– definição, fundamento e efeitos – 2.º; 19.º e segs.
- nomeadamente, Cadistão não é parte no tratado na data em ratifica; necessidade
de aceitação por, pelo menos, um Estado
- aceitação expressa ou tácita – tácita: 12 meses após a sua formulação pelos Estados
que anteriormente já haviam prestado o seu consentimento em ficar vinculados; e
aceitação tácita após 12 meses contados da data da manifestação do consentimento
em ficar vinculado pelos Estados que manifestarem este consentimento
posteriormente) – 20.º, n.º 4, 5.
- não aceitação expressa por nenhum Estado - Cadistão é parte quando ocorre
aceitação tácita de Martilândia a 11/11/2017 (12 meses após formulação da reserva)
- restantes Estados terão igual prazo para aceitar expressamente ou objetar – findo
o prazo – aceitação tácita (contagem do prazo supra).
• Ratificação de Flamengal acompanhada de declaração interpretativa (distinta da
reserva) – vinculação em 12/11/2016
• Adesão do Estado da Audislónia – vinculação em 10/05/2017
• Em 10/12/2017, Audislónia comunica declaração:
- primeira parte: declaração de Flamengal como declaração interpretativa e não
reserva; não objeção a reserva.
- segunda parte:
(i) suscita a compatibilidade da reserva de Cadistão com o objeto e fim do tratado
(art. 19.º).
Problematização dos limites materiais das reservas; valorização da discussão quanto
à nulidade da reserva por contradição com o objeto e fim do tratado e possíveis
efeitos quanto à oponibilidade da disposição à qual foi aposta a reserva e quanto à
validade ou regularidade da prestação do consentimento em ficar vinculado pelo
tratado do Estado que formula reserva proibida.
(ii) possibilidade da declaração de Audislónia constituir uma objeção simples à
reserva de Cadistão (distinção entre objeção simples e qualificada e efeitos).
Considerando uma objeção, poderia fazê-lo nesta data, pois dispunha do prazo de
12 meses contados da sua adesão (20.º, n.º5).
• Adesão de Nanin – vinculação a 05 de janeiro de 2018.
• Tratado entra em vigor com a terceira manifestação de consentimento em ficar
vinculado – 24.º, n.º 1
- primeira manifestação – Martilândia
- segunda manifestação – Flamengal
- terceira manifestação – Audislónia
Tratado entra em vigor a 10/05/2017 com a adesão de Audislónia (Cadistão apenas
é parte quando ocorrer aceitação tácita da sua reserva – primeira aceitação tácita a
11/11/2017)
• Nessa data, vigora entre Martilândia, Flamengal e Ausilónia. Para os restantes
Estados entrará em vigor quando manifestam o consentimento – 24.º, n.º 3 (e no
caso do estado reservatário – quando reserva aceite)
• Relação bilaterais:
- para os estados que não formularam reservas – princípio do cumprimento integral
do tratado
- entre o estado reservatário e os restantes (os estados que aceitaram ou aceitarão
tacitamente no termo do prazo de 12 meses, no caso de não se verificar objeção
nesse período – prazo de 12 meses para Nanin objetar ainda decorre; e para o estado
que objetou simplesmente): tratado entra em vigor; não aplicabilidade da disposição
sobre a qual incide a reserva – art. 21.º.

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