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À primeira vista, falar de saúde e doença num campo das ciências humanas,
a história, pode soar estranho aos ouvidos da maioria das pessoas. Elas estão
acostumadas a ouvir falar desses fenômenos em ambientes específicos, como hospitais,
postos de saúde, etc, e em situações limites, quando o organismo ou o corpo apresentam
sinais que levam a preocupação, dizendo de outro modo, quando a doença começa a se
instalar e causar problemas à vida do vivente humano. Assim, falar de doença e saúde é
falar de temas caros á existência humana, que tematizam no fundo, questões sobre a
vida e morte presentes em uma história e numa cultura.
Mas, não é uma tarefa fácil para o vivente, apesar de possuir a capacidade
de criar normas, estabelecer uma relação menos danosa com o seu meio vital
adequando-o aos seus valores. Segundo Portocarrero, a dificuldade resulta da tensa
relação entre vivente e meio: o organismo institui normas escapando de uma
estabilidade plena, pois a capacidade de inventar é um de seus atributos; por outro lado,
a vida é variação de formas e está imbricada com as exigências do meio (Portocarrero,
p. 134, 2012). Desse modo, para obter êxito nessa empreitada o vivente tem à sua
disposição uma capacidade singular de inventar maneiras de lidar com as novidades
oriundas do meio; assim, a instituição de normas pelo vivente vai ao encontro da
necessidade de atenuar o impacto do meio sobre seu organismo, buscando de forma
perene, o equilíbrio com ele.
De acordo com Portocarrero, “o organismo é um ser vivo que não tem uma
harmonia preestabelecida com o meio. A normatividade – a instituição de novas normas
– é própria do ser vivo, é constitutiva da vida” (Portocarrero, p. 130, 2012). A vida,
portanto, seria então a provocação do vivente, por meio de desafios e situações limites,
para que este manifeste a sua possibilidade de criação e invenção de um viver adequado.
Este parece ocorrer por meio da harmonização das necessidades e demandas do vivente
com a imprevisibilidade do meio em que está inserido. Assim, a harmonia entre
demandas do organismo e os desafios impostos pelo meio é o objetivo do vivente para
levar uma vida saudável.
A saúde, então, pode ser pensada como a ação do organismo de lidar com as
mudanças e incertezas que o meio lhe coloca se valendo de sua capacidade de instaurar
normas e não sendo gravemente afetado pelos desafios impostos pela vida. Isso é
possível quando o corpo do vivente se encontra em perfeitas condições orgânicas, pois
de acordo com Canguilhem “o estado fisiológico identifica-se com o estado são”, pois é
este estado que “pode admitir uma mudança para novas normas”; neste sentido, “o
homem é são, na medida em que é normativo em relação às flutuações de seu meio”
(Canguilhem, 1966, p.165-166).