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SUMÁRIO

1. As formações do inconsciente................................................................................3

2. A técnica analítica......................................................................................................5

3. Psicanálise de crianças.............................................................................................7

Referências.......................................................................................................................9

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TEORIAS E TÉCNICAS PSICOLÓGICAS –
A PSICANÁLISE

Desde que foi criada no final do século XIX por Freud, a clínica
psicanalítica já passou por diversas transformações e adaptações.
Isso porque os discípulos de Freud (que não foram poucos) buscaram
formas de torna-la mais científica e objetiva. No entanto, vamos ver que
algumas de suas técnicas e objetivos ainda são bastante semelhantes
àqueles utilizados pelo pai da Psicanálise. Vamos aqui conhecer um
pouco sobre os aspectos práticos da clínica psicanalítica com adultos e
crianças e compreender de que forma o trabalho do manejo das questões
inconscientes funciona no cotidiano do profissional. Para compreender
isso, é importante antes de mais nada falar um pouco sobre como o
inconsciente se manifesta.

1. AS FORMAÇÕES DO INCONSCIENTE

O inconsciente é inacessível a nós! Quando Freud chegou a essa


conclusão, ainda estruturando sua primeira tópica, ele percebeu que na
verdade o que o analista e o analisando poderiam ter acesso seria apenas
às manifestações do inconsciente, ou seja, as formas pelo qual a pulsão
“escapava” da repressão da barreira do recalcamento (que visa conter
os impulsos inconscientes, mas não é totalmente infalível). Desta forma,
além desta pulsão se manifestar a partir dos sintomas (o que Freud já
havia percebido ao tratar as histéricas), ela também podia aparecer de
forma “não patológica”, no cotidiano do sujeito.
As formações inconscientes são então estas elaborações simbólicas,
que encobrem conteúdos inconscientes. Podem se apresentar a partir
de diversas formas, a partir de atos, falas ou imagens normalmente
inesperados e sem um planejamento cognitivo prévio. Aqui falaremos de
três exemplos de formações inconscientes estudadas por Freud: os atos
falhos, os chistes e os sonhos.
Em duas de suas obras, A Psicopatologia da Vida Cotidiana (1901/1977)
e Conferências Introdutórias à Psicanálise (1916-1917/2014) Freud fala
um pouco sobre os atos falhos. Atos falhos para Freud se constituem
em fenômenos psíquicos que ocorrem não apenas em neuróticos, mas

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qualquer indivíduo saudável, caracterizado por supostos enganos, lapsos,
que ocorrem por uma razão inconsciente. Alguns desses exemplos seriam:
os lapsos de leitura, lapsos de audição, lapsos de memória, lapsos verbais,
perdas de objetos e outros tipos de engano.
Os chistes têm uma origem semelhante aos atos falhos e aos sonhos,
mas possuem uma característica particular que é a sua conotação
de humor. Servem como uma forma de liberar pensamentos inibidos,
conteúdos inconscientes a partir de um tom de anedota, ou do uso da
ironia, do humor como forma de expressão (FREUD, 1905/1980). Atos
falhos e chistes tendem a se apresentar em um âmbito social, muitas
vezes podendo causar situações de embaraço ao sujeito. Diferentemente
da mais importante manifestação do inconsciente estudada por Freud,
que tende a possuir um caráter bastante particular e muitas vezes até
obscuro: os Sonhos.
A interpretação dos sonhos foi uma das principais descobertas que
Freud fez no percurso da construção de sua teoria e técnica. Não é a toa
que a publicação de sua obra em 1900 é considerada o marco inicial da
Psicanálise (mesmo tendo esta começado quase 15 anos antes). Isso
porque Freud achou, a partir dos sonhos, uma forma de acessar conteúdos
inconscientes importantes. Ele inclusive declara a máxima em sua obra: O
sonho é a realização dos desejos inconscientes (Freud, 1900/1987).
A partir do trabalho de interpretação dos sonhos de seus pacientes
e também dos seus próprios sonhos, Freud foi percebendo que estes
estão repletos de símbolos, que na verdade encobrem os conteúdos
do inconsciente. Desta forma, quando lembramos de um sonho, já não
lembramos de seu conteúdo real, mas sim de partes dele, já que além
do mesmo trazer símbolos, ele também passa pelo recalcamento (o
que faz com que à medida em que a gente acorde, parte do sonho já
fique esquecido). O sonho lembrado é chamado por Freud de conteúdo
manifesto. O sonho real, do qual só temos acesso a fragmentos já
distorcidos, é chamado de conteúdo latente.
Esta distorção do conteúdo dos sonhos tende a acontecer a partir
de dois mecanismos de defesa do ego: a condensação e o deslocamento.
Na condensação, ocorre a funde elementos que estão a um nível latente
com traços comuns num só. Por exemplo, colocamos na figura de uma
pessoa características físicas de outras, ou psicológicas, ou profissionais,
transformando aquele ser em um mix de vários outros. Já o deslocamento
representa a retirada de intensidade de elementos que possuem alto valor
psíquico e criando, a partir de elementos com baixo valor psíquico, novos
valores. Um exemplo disso seria sonhar que está matando um grande

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amigo, quando na verdade seu desejo inconsciente seria fazer isso com
outra pessoa, por exemplo, seu pai. Esses desejos colocados a partir de
imagens era o grande enigma dos sonhos.

2. A TÉCNICA ANALÍTICA

Se toda a prática analítica se dá em busca de compreender e manejar


melhor as questões do inconsciente, há de se convir que é necessário
formas específicas de acesso a seus conteúdos, procurando ao máximo
minimizar os efeitos da resistência. Freud começou a perceber o poder
da resistência ainda no início de sua clínica, quando passou a observar
alguns comportamentos de seus pacientes em análise, que diziam que
não conseguiam recordar alguns eventos. As recordações esquecidas
não haviam se perdido, mas mantinham-se detidas por uma força, a qual
ele denominou de resistência. E esta resistência trabalhava em prol da
barreira do recalcamento.
Recalcamento consiste em um adensamento de energia que impede a
passagem dos conteúdos inconscientes para o pré-consciente. Não é uma
barreira infalível (o que podemos perceber claramente a partir do estudo
dos sintomas e das outras manifestações do inconsciente que acabamos
de tratar). No entanto, ela tem um papel imprescindível, pois evita o risco
extremo que o Eu correria ao satisfazer inteiramente e diretamente a
exigência pulsional.
Para tentar manejar a resistência Freud precisou aperfeiçoar sua
técnica. Aquilo que começou com a hipnose, foi aos poucos (e com a
participação direta de seus próprios pacientes) evoluindo até chegar
à técnica primordial da Psicanálise: a livre associação. Freud percebeu
que os pacientes eram capazes de contar fatos importantes mesmo sem
estarem em estado alterado de consciência (como na hipnose). Bastava
arrumar formas de diminuir suas resistências. Então ele saiu de um modelo
mais estruturado trabalho para uma forma mais livre, baseada em um
único comando dado ao paciente: “fale livremente sobre o que lhe vier à
mente”.
A forma não estruturada de enquadrar a sessão psicanalítica foi
definida por Freud como um dos pilares da sua clínica. Para acompanhar
a livre associação do paciente, o analista deveria ao máximo despir-
se de todo e qualquer julgamento, e adotar uma postura ao qual Freud

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denominou de atenção flutuante. Por isso, ainda hoje, mesmo com algumas
modificações ao longo dos anos, o psicanalista tende a ser menos diretivo,
deixando que o analisando conduza a sessão e fazendo pontuações
apenas quando julga necessário (algum conteúdo importante que possa
emergir).
Para facilitar o trabalho da livre associação e minimizar influências
externas, principalmente aquelas relacionadas à figura do analista em
si, Freud também criou um cenário específico de trabalho, que continha
um outro elemento emblemático da Psicanálise: o divã. A posição de um
móvel reclinável e de costas para o analista servia para o paciente se
sentir mais livre e relaxado. Busca quebrar as resistências ou defesas
causadas pelo contato direto com o olhar do psicanalista. Hoje em dia
a ida ao divã não acontece de imediato, logo nas primeiras sessões. Ela
é um processo trabalhado em conjunto, analista e paciente, e marca a
entrada em análise de fato.
Além do divã, outro ponto importante do setting analítico é o tempo.
A psicanálise não funciona pela perspectiva do tempo cronológico, mas
sim pelo tempo do inconsciente. Por isso, a duração das sessões e do
tratamento em si são variáveis, dependem do caso, do investimento do
paciente. Na verdade, Freud vai afirmar que o trabalho analítico nunca
termina, mesmo quando o sujeito não frequenta mais as sessões com o
analista. Sob essa questão do tempo, existe também uma controvérsia
muito grande para profissionais de outras áreas que é a ideia do tempo
lógico.
O manejo do tempo foi um dos grandes destaques da obra de
Lacan, e este muitas vezes costumava estabelecer alguns cortes no
meio das sessões de seus pacientes (encerrava a sessão literalmente).
Esta técnica aparentemente estranha, tinha como objetivo ultimo fazer
o paciente pensar. Normalmente era usada quando esta trazia algum
ponto importante para análise, mas que talvez naquele momento ele não
desse continuidade. O encerramento da sessão provocava no sujeito um
sentimento de surpresa, as vezes revolta, mas que o fazia refletir sobre o
conteúdo apresentado.
Todo esse trabalho técnico só era possível, no entanto, a partir do
estabelecimento daquilo que Freud denominou de transferência. Freud
foi descobrindo a transferência ao longo de sua clínica, principalmente
quando algumas pacientes começaram a se apaixonar por ele. Este
sentimento despertado, na verdade não era direcionado ao homem Freud,
mas sim ao psicanalista e tinham a ver com outras figuras de destaque
na vida dessas mulheres. Freud percebeu que algum tipo de sentimento

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seria despertado no processo analítico, fosse ele positivo ou negativo. E
ao invés de evita-lo, era importante utilizá-lo com instrumento de trabalho
em prol da análise.
A transferência no setting analítico consiste basicamente nos
sentimentos (positivos ou negativos) do paciente que são deslocados para
a figura do analista. Como já foi dito anteriormente, é a base da relação
terapêutica, mas não se limita a ela. Possuímos relações transferenciais
com pessoas nos mais diversos contextos, simpatizamos, antipatizamos,
criamos aproximações e distanciamentos muitas vezes baseados em
sentimentos que “aparentemente aquelas pessoas nos despertam”, mas
que na verdade encobrem questões do nosso próprio inconsciente.
Na análise, a transferência não ocorre apenas por parte do
paciente. O analista também é tomado por sentimentos despertados
por seus analisandos. Este movimento inverso, o qual também deve ser
cuidadosamente manejado (para que não interfira no processo analítico)
é chamado de contratransferência. Transferência e contratransferência
são partes integrantes tanto da análise com adultos, quanto com a de
crianças, que abordaremos a seguir.

3. PSICANÁLISE DE CRIANÇAS

A clínica analítica com criança teve seu ponto de partida com


Freud. Curiosamente, no entanto, o pai da Psicanálise não fazia análise
de crianças. Apesar de atribuir boa parte dos sintomas dos adultos à
questões ligadas à infância, Freud achava que crianças ainda não eram
capazes de entrar em análise. Tanto que o único caso clínico de Freud
na verdade não era diretamente atendido por ele; ele fazia orientações
ao pai da criança. Mas o “caso Hans, da Fobia de uma criança de cinco
anos” pode ser considerado um marco para o desenvolvimento posterior
da Psicanálise com crianças.
O pai de Hans procurou Freud com a queixa de que seu filho estava
sofrendo de fobia de cavalos, se estendendo para outros objetos como
carroças, tendo pânico de viagens também. Hans até os 3 anos vivia
normalmente, começando a manifestar curiosidades sexuais relativa aos
órgãos genitais, a diferença entre os sexos, além de comportamentos
masturbatórios, que eram fortemente repudiados pela mãe. O nascimento
da irmã também foi um fator importante nesse período.

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Freud associou a fobia do garoto a todo esse turbilhão pulsional
que estava vivendo, principalmente ao conflito edípico pelo qual estava
começando a passar. O cavalo que era seu objeto de temor, na verdade,
simbolizava o pai e a angústia de castração que esse representava. Freud
deu orientações ao pai de como lidar com estas questões e a fobia foi aos
poucos melhorando.
Freud nunca mais tratou nenhuma criança. A clínica analítica com
crianças veio ganhar força a partir de seus discípulos que se debruçaram
em achar formas de acessar o inconsciente infantil. Dentre aqueles que se
aventuraram nessa jornada, podemos destacar duas grandes pioneiras:
Anna Freud e Melanie Klein. Ambas atuaram na clínica infantil em meados
da década de 20, mas traçaram trajetórias bastante diversas, a partir de
interpretações diferenciadas da obra freudiana.
Anna Freud, filha de Freud, era pedagoga de formação, e devido a
essa influência e a uma aproximação com os teóricos da Psicologia do
Ego, construiu sua prática com ênfase nos aspectos conscientes dos
comportamentos das crianças. Seu objetivo analítico era promover a
adaptação do comportamento ao contexto social, buscando a eliminação
ou pelo menos diminuição dos sintomas. Adota uma perspectiva
desenvolvimental, tomando muitas vezes o sintoma como um aspecto
constituinte da imaturidade da criança, devendo ser tratado a partir do
estabelecimento de uma relação transferencial positiva e de orientação
aos pais.
Melanie Klein, por sua vez, adotou uma perspectiva mais analítica
no tratamento com crianças, ao utilizar os conceitos fundamentais da
psicanálise freudiana como fundamento de sua prática (CALZAVARA,
2013). Para Klein, o sintoma é uma manifestação do inconsciente da
criança, e como tal, não deve ser simplesmente suprimida ou ignorada.
Pelo contrário, cabe ao analista fazê-lo vir à tona, o que se dá a partir
do estabelecimento da transferência (seja ela positiva ou negativa). Klein
utiliza principalmente o jogo infantil como instrumento de seu trabalho.
O jogo infantil, junto com o desenho e a interpretação de sonhos, são
alguns dos recursos usados na psicanálise com crianças. A análise de
sonhos era bastante utilizada por Anna Freud para tratar seus pacientes
infantis. Ela dizia que os sonhos infantis normalmente refletiam suas
atividades cotidianas, aquilo que tinham feito ao longo do dia, mas repletos
de conteúdos emocionais (ABERASTURY, 2012).
Já as brincadeiras, introduzidas principalmente por Melanie Klein, bem
como a intepretação de desenhos e outros materiais expressivos, serve

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como mecanismo de expressão de sentimentos, emoções, conteúdos e
histórias que talvez não fossem acessados a partir da linguagem oral. Isso
porque todos estes recursos funcionam como mecanismos que facilitam
a projeção (conceito analítico que representa o mecanismo de defesa no
qual os atributos pessoais de determinado indivíduo, sejam pensamentos
inaceitáveis ou indesejados, sejam emoções de qualquer espécie, são
atribuídos a outra pessoa ou objeto).

REFERÊNCIAS

1. ABERASTURY, A. (2012) Psicanálise da criança: teoria e técnica. Trad:


Ana Lucia Leite de Campos. 8ª edição. Porto Alegre: Artmed.
2. CALZAVARA, M. G. P. (2013). Anna Freud e Melanie Klein: o sintoma
como adaptação ou solução? Tempo psicanalítico, Rio de Janeiro, v.
45.1, p. 323-338.
3. FREUD, S. (1977). A psicopatologia da vida cotidiana. In Obras
psicológicas completas de Sigmund Freud (Edição Standard Brasileira).
Rio de Janeiro: Imago.(Trabalho original publicado em 1901).
4. FREUD, S. Os chistes e sua relação com o inconsciente [1905]. In:___.
Edição standard brasileira das obras psicológicas completas. Rio de
Janeiro: Imago, 1980. v. VIII.
5. FREUD, S. (2014). Obras completas, volume 13: Conferências
introdutórias à psicanálise (Sergio Tellaroli, Trad.). São Paulo:
Companhia das Letras. (Trabalho original publicado em 1916-1917).
6. FREUD, S. (1900). A interpretação dos sonhos. In: Edição standard
brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud. 2.ed.
Rio de Janeiro, Imago, 1987. v. 4, 5.

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