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PSICOLOGIA SOCIAL
Volume I

FÉLIX NETO
ISBN: 978-972-674-613-3
Félix Neto

PSICOLOGIA SOCIAL

Volume I

Universidade Aberta

1998
© Universidade Aberta
Fotografias: José Tomás

Copyright © UNIVERSIDADE ABERTA – 2000


Palácio Ceia • Rua da Escola Politécnica, 147
1269-001 Lisboa – Portugal
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e-mail: cvendas@univ-ab.pt

TEXTOS DE BASE (cursos formais) N.º 136


ISBN: 978-972-674-613-3

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FÉLIX FERNANDO MONTEIRO NETO
É docente da faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do Porto desde 1977,
onde exerce desde 1993 as funções de Professor Catedrático do Grupo de Psicologia. É licenciado em
Psicologia pela Universidade de Paris VII (1975); possui o "Diplôme d'É tudes Approfondies" em
Antropologia Normal e Patológica pela "École des Hautes Études en Sciences Sociales" (1980) e em
Psicologia Social pela Universidade do Porto (1985). Obteve a Agregação em Psicologia pela Universidade
de Coimbra (1990).
É coordenador europeu de um programa Erasmus em Ciências Comportamentais, do Centro de
Psicologia da Cognição e da Afectividade da JNICT e do Mestrado em relações Interculturais da Região
Norte da Universidade Aberta. É Vice-Presidente da Sociedade Portuguesa de Psicologia e Professor
Convidado de diversas universidades europeias.
É autor dos seguintes livros, entre outros:
• A emigração portuguesa vivida e representada: contribuição para o estudo dos projectos migratóri-
os. Porto: Secretaria de Estado das Comunidades Portuguesas (1986).
• Tomada de consciência dos determinantes das preferências profissionais: teoria e método. Lisboa:
Universidade Aberta (Co-autor com Étienne Mullet), (1988).
• Solidão, embaraço e amor. Porto: Centro de Psicologia Social (1993).
• Psicologia da migração portuguesa. Lisboa: Universidade Aberta (1993).
• Estudos de Psicologia Intercultural: nós e os outros. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian (1997).
• Psicologia Social (volume I). Lisboa: Universidade Aberta (1997).
É autor de mais de cem artigos que versam sobre Psicologia Social e Psicologia Intrercultural em diversas
revistas nacionais e estrangeiras da especialidade.

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Ao André

Joana

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ÍNDICE BREVE

VOLUME I

I DOMÍNIO DA PSICOLOGIA SOCIAL

11 SELF

III CRENÇAS DE CONTROLO E ATRIBUIÇÕES

IV ATITUDES

V REPRESENTAÇÕES SOCIAIS

VI PRECONCEITO E DISCRIMINAÇÃO

VOLUME 11

VII GÉNERO

VIII ATRACÇÃOINTERPESSOAL

IX RELAÇÕES ÍNTIMAS

X SOLIDÃO

XI INFLUÊNCIAS SOCIAIS

XII COMPORTAMENTO EM GRUPOS

XIII COMPORTAMENTO COLECTIVO

GLOSSÁRIO

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VOLUME I

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11 ÍNDICE

23 I DOMÍNIO DA PSICOLOGIA SOCIAL

31 1. Introdução

35 2. O que é a Psicologia Social?

37 2.1 Tentativa de definição

40 2.2 Tópicos da Psicologia Social

44 2.3 Relações com outros campos

48 2.4 Níveis de análise

53 3. Esboço Histórico da Psicologia Social

55 3.1 O longo passado do pensamento sócio-psicológico

59 3.2 As origens da Psicologia Social

60 3.2.1 Corrente francesa

63 3.2.2 Corrente anglo-saxónica

66 3.3 Evolução da Psicologia Social

79 4. A Psicologia Social como Ciência

82 4.1 A investigação científica

84 4.2 Objectivos científicos da Psicologia Social

86 4.3 O processo de investigação em Psicologia Social

88 4.4 Meta-análise

91 5. Teorias em Psicologia Social

94 5. 1 Teorias da aprendizagem

94 5.1.1 Mecanismos de aprendizagem

II
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95 5.1.2 Contribuições

96 5.2 Teorias cognitivas

96 5.2.1 Princípios básicos

98 5.2.2 Contribuições

99 5.3 Teoria dos papéis

99 5.3.1 Princípios básicos

10 1 5.3.2 Contribuições

102 5.4 Uma comparação de teorias

105 6. A Psicologia Social Contemporânea

107 6.1 Uma ciência em ebulição

109 6.2 Uma plêiade de investigadores

111 6.3 Empregos em Psicologia Social

113 7. Perspectivas Internacionais

117 Aplicações: O estudo da caverna dos ladrões

119 Sumário

121 Para ir mais longe

123 Actividades propostas

125 11 SELF

133 1. Introdução

137 2. O Self em Psicologia Social

141 3. Definindo o Self: Autoconceito

144 3.1 Componentes do autoconceito

147 3.2 Autoconceito de trabalho

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149 3.3 Auto-esquemas

152 3.4 Memória autobiográfica

153 3.4.1 Egocentração

154 3.4.2 Beneficiação

154 3.4.3 Conservadorismo cognitivo

155 3.5 Origens do self

155 3.5.1 Avaliação reflectida

156 3.5.2 Comparação social

157 3.5.3 Comparação temporal

158 3.5.4 Autopercepção

158 3.6 O self num contexto cultural

159 3.6.1 A importância de um grupo para o sentido do self

160 3.6.2 Self e cultura: Identidade social através das culturas

167 4. Avaliando o Self: Auto-estima

169 4.1 Avaliação da auto-estima

170 4.2 Desenvolvimento da auto-estima

171 4.3 Auto-estima e comportamento

172 4.4 Variações na auto-estima

172 4.4.1 Adolescência

173 4.4.2 Experiências

173 4.4.3 Identidade étnica de grupos minoritários

176 4.5 Autodiscrepâncias

178 4.6 Autoconsciência

178 4.6.1 Estados de autoconsciência

182 4.6.2 Diferentes tipos de autoconsciência

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185 4.6.3 Autoconsciência e o uso do álcool

186 4.6.4 O que é que causa diferenças individuais na


autoconsciência?

186 4.7 Protecção da auto-estima

187 4.7.1 Manipulação de auto-avaliações

187 4.7.2 Processamento selectivo de informação

188 4.7.3 Comparação social selectiva

188 4.7.4 Compromisso selectivo com identidades

191 5. Relacionando o Self: Auto-Apresentação

193 5.1 O self nas interacções sociais

194 5.2 Motivos da auto-apresentação

195 5.3 Auto-apresentação e embaraço

196 5.3.1 Embaraço, uma forma de ansiedade social

199 5.3.2 Modelo multifacetado do embaraço

201 5.3.3 Antecedentes, respostas e estratégias de confronto com o


embaraço

206 5.3.4 Implicações sociais do embaraço

207 5.4 Tácticas de auto-apresentação

211 5.5 Estilo de auto-apresentação: Autovigilância

215 Aplicações: Tomada de consciência dos determinantes das


preferências profissionais

218 Sumário

221 Para ir mais longe

222 Actividades propostas

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225 IH CRENÇAS DE CONTROLO E ATRIBUIÇÕES

233 1. Introdução

237 2. A Ilusão do Controlo

241 3. Locus de Controlo

243 3.1 Popularidade e definição

246 3.2 Diferenças comportamentais

250 3.3 Investigação intercultural

251 3.3.1 Comparações nacionais

252 3.3.2 Comparações com grupos étnicos e minoritários

254 3.4 Desejo de controlo

257 4. Reacções à Perca de Controlo

259 4.1 Teoria da reactância

259 4.2 Desânimo aprendido

262 4.3 Dependência auto-induzida

263 5. Atribuições

266 5.1 O que é uma atribuição?

266 5.1.1 Definição

266 5.1.2 Tipos de atribuições

267 5.1.3 Avaliação das atribuições

268 5.2 Teorias

268 5.2.1 Causalidade e psicologia ingénua

269 5.2.2 Inferências correspondentes

272 5.2.3 Covariação e esquema causal

277 5.2.4 Atribuições de sucesso e de fracasso

281 5.3 Aplicações da teoria da atribuição

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281 5.3.1 Violação

283 5.3.2 Desemprego

284 5.3.3 Acidentes

284 5.3.4 Relações interpessoais

285 5.4 Erros de atribuição

285 5.4.1 Diferenças entre actor e observador

288 5.4.2 Erro jillldamental

289 5.4.3 Complacência na atribuição de causalidade

291 5.4.4 Efeitos temporais na atribuição

291 5.5 Atribuição e relações intergrupais

295 5.6 Atribuições e diferenças culturais

299 6. Norma de Internalidade

301 6.1 Definição de norma de internalidade

303 6.2 A internalidade na sociedade portuguesa

307 7. Níveis de Análise Distintos, mas Relacionados?

311 Aplicações: Estilo atribucional

313 Sumário

315 Para ir mais longe

316 Actividades propostas

317 IV ATITUDES

325 1. Introdução

331 2. Sinopse Histórica

335 3. O que são as Atitudes?

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337 3.1 Modelos de atitudes

341 3.2 Características

344 3.3 Funções psicológicas das atitudes

347 4. Atitudes e Noções Conexas

349 4.1 Crenças

349 4.2 Opiniões

351 4.3 Valores

353 4.4 Ideologia

355 5. Formação das Atitudes

357 5.1 Fontes de aprendizagem

359 5.2 Condicionamento clássico

362 5.3 Condicionamento operante

363 5.4 Aprendizagem social

364 5.5 Aprendizagem por experiência directa

364 5.6 Observação do próprio comportamento

367 6. Medida das Atitudes

369 6.1 Análise de conteúdo de comunicações

370 6.2 Escala de avaliação com um item

370 6.3 Escala de distância social

371 6.4 Escala de Thurstone

375 6.5 Escala de Likert

376 6.6 Escala de Guttman

380 6.7 Diferenciador semântico

382 6.8 Medidas indirectas

389 7. Atitudes e Comportamento

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391 7.1 O dilema da consistência atitude-comportamento

392 7.2 Condições metodológicas da predição atitude-comportamento

395 7.3 Modelos teóricos de predição do comportamento

395 7.3.1 A abordagem de variáveis moderadoras

398 7.3.2 As teorias da acção reflectida e do comportamento


planificado

404 Aplicações: Atitudes políticas e comportamento

407 Sumário

409 Para ir mais longe

410 Actividades propostas

413 V REPRESENTAÇÕES SOCIAIS

421 1. Introdução

427 2. Origens

435 3. Noção

443 4. Representações e Comunicação Social

449 5. Análise Psicossociológica da Representação Social

451 5.1 A representação-produto

452 5.1.1 Informação

452 5.1.2 Atitude

454 5.1.3 Campo de representação

455 5.2 A representação-processo

455 5.2.1 Objectivação

459 5.2.2 Ancoragem

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463 6. Áreas de Investigação

467 7. Variações sobre Representações Sociais

469 7.1 Representações sociais e educação

470 7.1.1 Representações da escola através dos seus agentes

471 7.1.2 Representações recíprocas professor-aluno

472 7.2 Estudo experimental das representações sociais: Teoria do núcleo


central

475 7.3 Representações sociais da emigração

482 Aplicações: Representações e práticas sociais da sida

486 Sumário

487 Para ir mais longe

488 Actividades propostas

491 VI PRECONCEITO E DISCRIMINAÇÃO

499 1. Introdução

505 2. Definições: Preconceito, Discriminação e Grupos Minoritários

513 3. Algumas Categorias de Preconceito

515 3.1 Racismo

517 3.2 Sexismo

519 3.3 Heterossexismo

521 3.4 Idadismo

523 4. A face Mutante do Preconceito

531 5. Génese do Preconceito e da Discriminação

533 5.1 Abordagens históricas

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535 5.2 Abordagens socioculturais

535 5.3 Abordagens situacionais

536 5.4 Abordagens psicodinâmicas

537 5.4.] Frustração e agressão

538 5.4.2 Diferenças de personalidade

543 5.5 Abordagens cognitivas

543 5.5.1 Categorização social

546 5.5.2 O poder dos estereótipos

55] 5.5.3 Atribuiçüo

552 5.5.4 Crenças sociais

553 5.6 Alvo do preconceito

554 5.7 Quadro integrador de teorias

557 6. Consequências do Preconceito e da Discriminação

559 6.1 Reacções das vítimas de preconceito

561 6.2 Consequências do racismo sobre o racista

563 7. Redução do Preconceito e da Discriminação

565 7.1 Tomada de consciência

565 7.1.1 Tomada de consciência da pertença a U/71 grupo minoritário

567 7.1.2 Tomada de consciência das distinções

567 7.1.3 O assimilador cultural

569 7.2 A hipótese do contacto

573 7.3 Para além da hipótese do contacto

574 7.4 Contacto vicariante através dos meios de comunicação social

576 Aplicações: Estratégias para mudar atitudes negativas

581 Sumário

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583 Para ir mais longe

584 Actividades propostas

587 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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I. DOMÍNIO DA PSICOLOGIA SOCIAL

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TÁBUA DE MATÉRIAS

1. Introdução

2. O que é a Psicologia Social?

2.1 Tentativa de definição

2.2 Tópicos da Psicologia Social

2.3 Relações com outros campos

2.4 Níveis de análise

3. Esboço Histórico da Psicologia Social

3.1 O longo passado do pensamento sócio-psicológico

3.2 As origens da Psicologia Social

3.2.1 Corrente francesa

3.2.2 Corrente anglo-saxónica

3.3 Evolução da Psicologia Social

4. A Psicologia Social como Ciência

4.1 A investigação científica

4.2 Objectivos científicos da Psicologia Social

4.3 O processo de investigação em Psicologia Social

4.4 Meta-análise

5. Teorias em Psicologia Social

5.1 Teorias da aprendizagem

5.1.1 Mecanismos de aprendizagem

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5.1.2 Contribuições

5.2 Teorias cognitivas

5.2.1 Princípios básicos

5.2.2 Contribuições

5.3 Teoria dos papéis

5.3.1 Princípios básicos

5.3.2 Contribuições

5.4 Uma comparação de teorias

6. A Psicologia Social Contemporânea

6.1 Uma ciência em ebulição

6.2 Uma plêiade de investigadores

6.3 Empregos em Psicologia Social

7. Perspectivas Internacionais

Aplicações: O estudo da caverna dos ladrões

Sumário

Para ir mais longe

Actividades propostas

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Objectivos de aprendizagem

o estudo deste capítulo deve permitir ao aluno:


• Perspectivar uma definição da Psicologia Social;

• Esboçar a história da Psicologia Social;

• Definir o método científico;

• Identificar os objectivos científicos da Psicologia Social;

• Descrever as teorias da aprendizagem social em Psicologia Social;

• Descrever as teorias cognitivas em Psicologia Social;

• Descrever a teoria dos papéis em Psicologia Social;

• Estabelecer pontos de comparação entre as teorias;

• Evidenciar características actuais da Psicologia Social.

o homem é por natureza um animal social; um indivíduo que é associaI


naturalmente e não de modo acidental, ou está abaixo da nossa consideração
ou é mais que um ser humano... A sociedade é algo por natureza que precede
o indivíduo. Alguém que não possa ter a vida comum ou que seja tão auto-
suficiente que não necessite de tal, e por isso não participe na sociedade, ou é
uma besta ou um deus.

Aristóteles

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1. Introdução

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Nós, os seres humanos somos animais sociais. Vivemos em grupos, sociedades
e culturas. Organizamos as nossas vidas em relação com outros seres humanos
e somos influenciados pela história, pelas instituições e pelas actividades. Se há
quem exalte ou quem condene a sociedade, não restam dúvidas de que os
outros desempenham grande importância nas nossas vidas. No fundo, o estudo
das pessoas enquanto animais sociais é o que a Psicologia Social aborda.

O seu domínio é geralmente apresentado como sendo novo, o que é correcto,


na medida em que a Psicologia Social contemporânea, tal como hoje a
conhecemos, conta menos de cem anos. Em 1979 Cartwright avançou que
90% de todos os psicólogos sociais que tinha havido ainda estavam então
vivos. Muito provavelmente nos anos noventa essa percentagem ainda está
certa. Contudo, muitos dos problemas com que actualmente se confrontam os
psicólogos sociais são os mesmos com que se confrontaram as pessoas através
da história das civilizações. Muitos dos fenómenos examinados pelos
psicólogos sociais são quase sempre aspectos universais do comportamento
social. Uma viagem por avenidas da compreensão de tais comportamentos
reveste-se de importância e de fascínio.

Servir de guia no passeio através de incursões por alguns destes fenómenos é o


objectivo fuleral deste livro.

Existe em Amesterdão o Museu de Vicente Van Gogh onde ressalta o


contraste entre o tranquilo contexto em que se insere e a tumultuosa vida dum
gênio. A 23 de Dezembro de 1888 Vicente Van Gogh corta com uma navalha
parte da sua orelha esquerda, lava-a com cuidado, embrulha-a e leva-a a uma
prostituta chamada Raquel, pedindo-lhe para "conservar este objecto
cuidadosamente" (Runyan, 1981, p. 1070). Após este acontecimento
dramático seguiram-se outros até que o artista se suicidou dois anos mais
tarde.

Levanta-se a questão de se saber porque ê que Van Gogh efectuou este acto.
Runyan (1981) passa em revista 13 explicações que foram sendo avançadas ao
longo dos anos para tentar responder a essa questão. Uma dada acção pode
ser explicada de diversos modos. Precisamente o objectivo do questionamento
científico é escolher as vias alternativas para explicar o comportamento.

Neste livro seguiremos a via psico-social de explicação do comportamento.


Trata-se apenas de um dos olhares científicos que permitem compreender o
comportamento. O estudo do comportamento humano é também encarado por

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outras disciplinas como seja a sociologia, a antropologia, a história, a
economia, as ciências políticas e a biologia. A focalização dos problemas e as
metodologias utilizadas diferenciam as diversas ciências do comportamento. A
Psicologia Social é um domínio distinto na abordagem do comportamento
humano, mesmo se contraiu empréstimos e aprendeu com as diversas ciências
do comportamento.

Este primeiro capítulo tem por objectivo delimitar o domínio da Psicologia


Social. Em primeiro lugar tentaremos definir o domínio psico-social, enquanto
campo de investigação específica; seguidamente, traçaremos um esboço
histórico da disciplina para se apreenderem as suas origens e evolução; serão
depois apresentadas algumas orientações teóricas e metodológicas neste
domínio do saber, e, enfim, referiremos alguns aspectos de como hoje em dia
se apresenta a Psicologia Social.

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2. O que é a Psicologia Social?

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Há várias maneiras de responder à questão "O que é a psicologia social?" Uma
delas é avançar uma definição formal do campo. Outra é fazer uma lista
pormenorizada de tópicos investigados pelos psicólogos sociais. Uma outra é
comparar e contrastar a psicologia social com campos conexos. Ainda uma
outra é situar os seus níveis de análise.

2.1 Tentativa de definição

A apresentação de uma definição de um campo de estudo nunca é uma tarefa


fácil. Há sempre o perigo de se apresentar uma visão enviesada da disciplina e
de se negligenciarem aspectos importantes. Estes perigos, espreitando
qualquer pessoa que tente auscultar de perto uma disciplina para a
compreender no seu conjunto, estão presentes como nunca o estiveram antes.
Nos anos 90 a explosão do conhecimento científico a que se vem assistindo
durante este período contribui para que a síntese de qualquer disciplina se
torne ainda mais perigosa. Por exemplo, Derek Bok, presidente da famosa
Universidade de Harvard, observou que foram necessários 275 anos para esta
instituição coleccionar o primeiro milhão de livros e somente 5 anos para
acumular o seu último milhão (Bok, 1986).

Esta situação explosiva que toca as ciências nos nossos dias, abrange também
a Psicologia Social. No decurso dos últimos anos surgiram novos temas de
estudo, foram criadas novas revistas, foram sugeridas novas aplicações. Com
este pano de fundo, fácil é concluir a via perigosa e, porventura temerária, por
que envereda a pessoa que pretenda apresentar uma introdução à disciplina de
Psicologia Social.

Apesar destas dificuldades consideramos importante a sua apresentação para


permitir ao leitor uma familiarização com o domínio. Longe de nós, porém, a
estultícia de tentar apresentar a disciplina de modo completo e definitivo.

Definir formalmente a grande maioria dos domínios científicos é uma tarefa


complexa. No caso vertente da Psicologia Social, as dificuldades ampliam-se
devido a duas ordens de factores: a) a diversidade do domínio e b) a sua rápida
taxa de mudança. Daí que tenhamos optado por apresentar, entre a
multiplicidade de definições avançadas na literatura especializada, a de Allport
para quem a Psicologia Social tenta "compreender e explicar como os

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pensamentos, sentimentos e comportamento dos indivíduos são influenciados
pela presença actual, imaginada ou implicada de outros" (Allport, 1985, p.3).

Pode-se efectivamente conceber a psicologia social em termos de entradas


para o indivíduo e de saídas do indivíduo. Na definição apresentada, as
entradas são as presenças actuais, imaginadas ou implicadas de outras pessoas;
as saídas são os pensamentos, sentimentos e comportamentos do indivíduo.

Vamos tentar ilustrar a definição de Psicologia Social de Allport por meio do


comportamento de uma pessoa numa situação embaraçosa. Imagine uma das
suas colegas de curso, chamada Carla, que sempre residiu numa vila do norte e
só veio habitar para o Porto para ingressar na Faculdade. Desde a sua chegada
ao Porto a Carla tem sentido a solidão, pois considera que ainda não tem
amizades na cidade. Acontece que a Carla encontrou ao meio-dia na cantina
universitária um colega de curso, o Joaquim, com quem nunca estabelecera
conversação, mas cujos olhares já se tinham entrecruzado nas aulas teóricas. A
dado momento o Joaquim convida-a para o baile da queima das fitas que teria
lugar essa noite. Antes da Carla esboçar qualquer tipo de resposta verbal
entorna a bebida com que acompanhava a refeição, salpicando alguns colegas
que estavam sentados ao lado. O que é que a Carla sentiu nesta situação?
Muito provavelmente sentiu uma série de emoções, tais como embaraço e
vergonha.

Imagine-se este mesmo comportamento de entornar uma bebida quando a


Carla fala com um antigo amigo ou com o seu irmão. Entre as três situações
muito provavelmente a Carla sentiria mais embaraço na primeira situação em
que tinha presente um colega que não conhecia bem e que estava muito
interessada em conhecer melhor. Trata-se de um exemplo aparentemente banal
para todas as pessoas, excepto para a Carla. Que pensamentos, sentimentos e
comportamentos (saída) resultam de entornar uma bebida na presença de
alguém por quem se sente atracção? Muito provavelmente a presença do
Joaquim provocará na Clara pensamentos ("ele pensa que sou uma estúpida"),
sentimentos (embaraço, vergonha) e comportamentos (pedir desculpa).

Se a presença de outras pessoas influencia pensamentos, sentimentos e


comportamentos, na definição de Allport transparece também que as outras
pessoas podem influenciar-nos mesmo sem estarem fisicamente presentes. A
presença imaginada ou implicada de outras pessoas afecta o comportamento.
Por exemplo, quando a Carla acordar na manhã seguinte ainda pode sentir

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embaraço ao relembrar o acontecimento referido. Na figura 1.1 encontram-se
esquematizadas diferentes possibilidades.

Entradas: Presença de Outras Pessoas


Presença Actual Presença Presença
Imaginada Implicada
o Joaquim e a Carla Mais tarde a Carla o Joaquim pode não
encontram-se. Esta pode imaginar a estar presente, mas
entorna a bebida. presença do Joaquim deixou na sala de aula
o seu caderno de
apontamentos

Saídas: A Reacção do Indivíduo

IL \1/ ~

Pensamentos Sentimentos Comportamentos


"Ele pensa que sou Embaraço. Carla pede desculpas
uma estúpida" Vergonha

Figura 1.1- A Psicologia Social como uma relação de entrada/saída


(definição de Allport)

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Sem dúvida que as pessoas têm influenciado outras ao longo dos séculos e
têm-se admirado desta influência. Arte, literatura, filosofia e religião são
alguns dos produtos desta admiração. Todavia, nos últimos cem anos
ocorreram duas mudanças importantes. Em primeiro lugar, há cerca de cem
anos os cientistas começaram a aplicar o método científico à compreensão do
comportamento social humano. Este desenvolvimento tornou eventualmente
possível a psicologia social, tal como hoje a conhecemos. Discutiremos mais
adiante o método científico. Diga-se por agora muito simplesmente que a
abordagem científica procura descobrir relações causa-efeito, inferindo-as da
observação objectiva e da experimentação.

Um segundo desenvolvimento trouxe a psicologia social para a cena: as


modernas viagens e as comunicações de massa multiplicaram as relações
sociais e as potencialidades para a interacção social. Há avaliações que
sugerem que em média o norte-americano tem para cima de 1000 relações
informais com outras pessoas (Milardo, 1992). Para além disso não
conhecemos todas as tentativas para nos influenciarem quotidianamente
através da televisão, rádio, cinema, revistas, jornais, etc. Estas mudanças
tomaram a psicologia social fundamental.

2.2 Tópicos da Psicologia Social

Uma outra maneira de responder à questão "O que é a Psicologia Social?" é


descrever os tópicos que ocupam os psicólogos sociais. Quer seja adoptada a
definição de AlIport, quer outra, é claro que a Psicologia Social cobre um
vasto domínio existindo muitos tópicos que são abarcados por ela. Por
exemplo, uma revisão das publicações nas principais revistas de psicologia
social efectuada nos Estados Unidos só em 1979 (Smith, Richardson e
Hendrick, 1980), mostrou que os psicólogos sociais publicaram 55 estudos
sobre a atribuição, isto é, como é que as pessoas percepcionam as causas do
comportamento dos outros, enquanto 50 publicações descrevem as atitudes e a
mudança de atitudes. Um exemplo específico de uma questão neste tópico é:
qual é a relação entre atitudes políticas e o comportamento de votar? 44
estudos relacionam-se com o desenvolvimento social e de personalidade. Uma
questão específica relacionada com este tópico é: quais são os factores que na
infância levam ao preconceito nos adultos? 41 estudos abordam processos
cognitivos inserindo-se aqui, por exemplo, estudos sobre o modo como

40
© Universidade Aberta
classificamos e categorizamos as características da personalidade dos outros.
Outros tópicos com popularidade incluem diferenças individuais, papéis
sexuais e diferenças sexuais, agressão, atracção interpessoal, comportamento
de ajuda, comunicação não verbal, conformidade e condescendência,
sobrepovoamento e distância interpessoal, processos grupais, lei e crime,
percepção da pessoa, autoconsciência, influência social, interacção social,
stress e emoção.

Tópico Número de publicações

Agressão 24

Ajuda 24

Assuntos de disciplina 16

Atitudes e mudança de atitude 50

Atracção e afiliação 31

Atribuição 55

Auto - apresentação 8

Autoconsciência 13

Comparação social 4

Comunicação não -verbal 21

Conformidade e condescendência 11

Desenvolvimento social e da personalidade 44

Dissonância 7

Distância inter-pessoal e superpovoamento 16

Equidade, justiça distributiva e troca social 12

Negociação e formação de alianças 12

41
© Universidade Aberta
Influência social 13

Interacção social 15

Investigação intercultural 8

Investigação em lei e crime 12

Investigação em questões de personalidade I1

Locus de controlo 6

Papéis sexuais e diferenças sexuais 26

Percepção da pessoa 15

Personalidade e diferenças individuais 39

Processos cognitivos 41

Processos de grupo 23

Psicologia populacional e ambiental 10

Questões étnicas e raciais 9

Questões metodológicas 19

Realização 19

Satisfação vital 5

Stress, emoção e activação 17

Vítimas 5

Total 642

Fonte: Adaptado de Smith, Richardson, Hendrick, 1980.

Quadro 1.1 - Principais Tópicos da Psicologia Social, 1979

Os psicólogos sociais abordam pois uma ampla gama de comportamentos


humanos e essa lista tem vindo a aumentar cada vez mais. É óbvio que muito

42 © Universidade Aberta
embora os psicólogos sociais reconheçam a existência de uma perspectiva
ampla na sua disciplina, os seus focos de interesse na investigação limitam-se a
pontos restritos. Estas áreas do comportamento humano podem ser divididas
em três grupos: fisiológico, cognitivo-atitudinal, e de realização.

Num grupo submetido a uma determinada situação podem-se medir as


mudanças fisiológicas ocorridas nos seus elementos, como, por exemplo, a
pressão arterial, a temperatura, a adrenalina. Os psicólogos sociais têm
utilizado estas medidas no estudo de contextos sociais. Por exemplo, para se
mostrar que o sobrepovoamento é activante, têm-se comparado as mudanças
psicológicas que ocorrem em grupos muito grandes com grupos mais
pequenos. Estudos deste tipo têm mostrado que o número de pessoas num
contexto está associado com o aumento das medidas da activação (Evans,
1979). Também se têm utilizado estas medidas noutras áreas. Por exemplo, em
determinadas condições, como quando estamos sós, temos tendência a
estarmos mais conscientes das sensações corporais; já noutras condições,
como quando outros indivíduos estão na nossa presença, temos a tendência a
estar conscientes de menos mudanças.

Os psicólogos sociais têm-se ocupado tradicionalmente das atitudes das


pessoas, das opiniões, das crenças, dos valores, dos sentimentos, das
representações sociais. Este domínio inclui, entre outros, estudos sobre as
intenções de voto nas eleições, os estereótipos atribuídos a outros grupos, o
impacto dos valores parentais nos filhos, a conformidade no sexo masculino ou
feminino.

Um outro domínio de medida é constituído pela habilidade das pessoas em


realizar tarefas. São exemplos deste domínio, estudos que avaliam a realização
após uma experiência agradável ou desagradável, os efeitos da pressão grupal
sobre a produtividade do indivíduo, resolução de problemas em grupo sob
diferentes estilos de liderança. Os estudos clássicos sobre os efeitos da
presença das outras pessoas recorreram muitas vezes a medidas de realização.

Em suma, os psicólogos sociais investigam numerosos tópicos. Certos tópicos


de investigação perduram, outros cessam (cf. Jones (1985) para uma discussão
do que determina essas mudanças). Seja como for, o interesse pela
investigação é muito, como poderá ser verificado ao longo deste livro.

43
© Universidade Aberta
2.3. Relações com outros campos

A Psicologia Social· mantém uma relação proxlma com varIOS campos, em


especial com a Sociologia e a Psicologia. Segundo Moscovici (1984), a
Psicologia Social distingue-se quer da Sociologia quer da Psicologia pela
mesma característica. As duas últimas põem em relação um sujeito (individual
ou colectivo, segundo ocaso) e um objecto (meio, estímulo), ao passo que na
psicologia social a relação dual (sujeito-objecto) é substituída por uma relação
ternária: sujeito individual (ego), sujeito social (alter) e objecto (físico, social,
imaginário ou real). É pois introduzida uma mediação constante entre o sujeito
e o objecto que se traduz em modificações do pensamento e do
comportamento de cada um.

Como vimos anteriormente, a psicologia social cobre uma vasta área do


comportamento. Mas apesar de se adoptar uma definição ampla como a de
Allport, ela não abrange todas as instâncias do comportamento. Em geral, a
ênfase no social distingue a psicologia social da psicologia e a ênfase no
individual distingue-a da sociologia.

A Psicologia é o estudo científico do indivíduo e do comportamento


individual. Muito embora este comportamento possa ser social, não o é
necessariamente. Habitualmente os psicólogos abordam o indivíduo fora do
contexto social ocupando-se de vários processos internos como seja
percepção, aprendizagem, memória, inteligência, motivação e emoção. Uma
explicação psicológica para o estranho facto de Van Gogh ter cortado a sua
orelha avançada por Runyan é sua culpabilidade por causa da atracção
homossexual por Gaugin. A automutilação do artista é vista como uma auto-
castração simbólica para castigar impulsos inaceitáveis. Uma outra explicação
psicológica avançada por Runyan pode ser o facto do pensamento do artista
estar perturbado por alucinações horrorosas levando-o a um estado psicótico.

A Sociologia é o estudo científico da sociedade humana. Os sociólogos


analisam o comportamento humano num contexto mais amplo. Abordam
tópicos tais como instituições sociais (família, religião, política), estratificação
dentro da sociedade (classes sociais, raça, e etnicidade, papéis sexuais),
processos sociais básicos (socialização, desvio, controlo social), e a estrutura
de unidades sociais (grupos, redes, organizações formais, burocracias). Dão
maior importância às normas que guiam o comportamento, resultado de
pressões externas. Uma explicação sociológica para o comportamento de Van
Gogh leva em conta o seu papel desviante. Identificou-se com outros párias

44
© Universidade Aberta
o comp0l1amento social
OCOlTe em qualquer lugar,
como, por exemplo, num
Jogo de crIanças, nos
preparativos para uma
manifestação, ou numa
procissão.

45
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SOCiaiS,incluindo prostitutas. A sua automutilação e a dádiva a Raquel
denotou a sua aceitação de um papel de pária social.

A Psicologia Social estabelece a ponte entre a psicologia e a sociologia.


Efectivamente há quem a perspective como um campo interdisciplinar.
Psicólogos e sociólogos contribuem para o conhecimento psicossocial. Os
psicólogos sociais para explicar o comportamento recorrem a factores
individuais e sociológicos. Para eles, se os processos intrapsíquicos
desempenham um papel determinante no comportamento de uma pessoa, o
contexto social desse comportamento fornece-lhe os estímulos sociais,
motivos e objectivos.

É uma ampla tarefa a identificação dos factores que influenciam as actividades


de um indivíduo em relação a outros, pois o comportamento social resulta de
diferentes causas. Entre as mais importantes são de referir: 1) o
comportamento e as características das outras pessoas; 2) a cognição social
(pensamentos, atitudes, recordações acerca das pessoas que nos rodeiam); 3)
variáveis ecológicas (influências directas ou indirectas do meio físico), 4)
contexto sócio-cultural em ·que ocorre o comportamento social, e 5) aspectos
da nossa natureza biológica relevante para o comportamento social
(Georgoudi e Rosnow, 1985).

Várias explicações psicossociais são avançadas por Runyan (1981) para o


comportamento de Van Gogh. Uma delas baseia-se na hipótese da frustração-
agressão. O artista poderia sentir-se frustrado por dois acontecimentos que
precederam o acto: a) o seu irmão Theo, com quem tinha muita intimidade
ficou noivo para se casar, e daí que Van Gogh sentisse ameaçado o seu
relacionamento com o irmão; b) a sua amizade com Paul Gaugin estava
agitada e Gaugin partira de França. Vicente pode ter experienciado estes
acontecimentos sociais como frustrantes. Esta frustração pode ter suscitado
agressão que se manifesta sob a forma do seu comportamento autopunitivo.

Uma outra explicação psico-social pode basear-se no facto das pessoas


imitarem o comportamento de outras pessoas (Bandura, 1977). Vicente teve
oportunidade de assistir às corridas de toiros em Arles, França. Quando o
toureiro faz bem o seu trabalho, a multidão pode-o autorizar a cortar a orelha
do touro. Tradicionalmente o toureiro mostra a orelha à multidão e oferece-a à
sua mulher favorita. O artista pode ter imitado à sua maneira o toureiro dando
a sua própria orelha a uma prostituta.

46
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Auto-retrato de Vicente van Gogh após haver cortado parte da sua orelha. Qual a
razão deste estranho comportamento? Os psicólogos sociais examinam os processos
intrapsíquicos e os estímulos sociais externos que determinam o comportamento da
pessoa.

A questão que inevitavelmente se levanta é a seguinte: "perante esta


multiplicidade de explicações, qual é a correcta?" O que é que efectivamente
levou Vicente a cortar a orelha? Cada explicação assinala factores que podem
ter contribuído para essa dramática acção. As explicações avançadas pelos
psicólogos, sociólogos e psicólogos sociais para o comportamento de Van
Gogh são o resultado de se situarem a diferentes níveis de análise. A
explicação para um determinado comportamento depende do nível de análise
focalizado pelo investigador.

47
© Universidade Aberta
2.4. Níveis de análise

Mas a descrição que fizemos até aqui pode parecer demasiado simplista para o
leitor. Acontece que as coisas são bem mais complicadas. Podemos encontrar
várias psicologias sociais diferentes e múltiplas explicações para as
experiências humanas e as acções. Encontram-se duas variantes principais em
Psicologia Social, a Psicologia Social Sociológica (PSS) e a Psicologia Social
Psicológica (PSP), sem se prestarem muita atenção recíproca (Wilson e
Schafer, 1978). Se ambas têm áreas em comum, também diferem na
focalização central e nos métodos de investigação. A focalização nuclear da
psicologia social psicológica tende a centrar-se no indivíduo e no modo como
ele/ela responde a estímulos sociais (Quadro 1.2). Variações no
comportamento pensa-se serem devidas à interpretação das pessoas dos
estímulos sociais ou diferenças nas suas personalidades. Mesmo quando os
psicólogos sociais psicológicos estudam a dinâmica de grupos tendem a
explicar estes processos ao nível individual, enquanto a psicologia social
sociológica tende a focalizar variáveis societais mais amplas, tais como o
estatuto sócio-económico, os papéis sociais e as normas culturais (Stryker,
1989). Assim os psicólogos sociais sociológicos estão mais interessados em
fornecer explicações para problemas societais, tais como pobreza, crime e
desvio.

Se na PSP se recorre frequentemente a expenencias laboratoriais, na PSS


utiliza-se muitas vezes a observação participante em que o investigador se
insere na instituição ou no grupo fazendo a descrição por dentro. Os métodos
de investigação mais frequentemente utilizados pela Psicologia Social
Sociológica (PSS) e pela Psicologia Social Psicológica (PSP) são apresentados
no quadro 1.3. Os membros dos dois grupos em geral estudam, leccionam e
trabalham em locais diferentes; lêem e escrevem em manuais e revistas
diferentes; têm carreiras diferentes; e podem aderir a pontos de vista diferentes
de ciência. Tendo a PSS e a PSP histórias diferentes, têm também "heróis"
diferentes. Nas fileiras da PSP contam-se Lewin, Festinger, Schachter, Asch,
Campbell e Allport; nas da PSS Mead, Goffman, French, Homans e Bales. Seja
como for, na peugada do espírito pragmático de Lewin não importa tanto aos
psicólogos sociais donde é que vêm as suas ideias quanto como funcionam
bem para explicar o pensamento e o comportamento social.

48
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Psicologia Social Psicológica Psicologia Social Sociológica

A focalização central é no indivíduo A focalização central é no grupo ou na


sociedade

Os investigadores tentam compreender o Os i n vesti gadores tentam


comportamento social mediante a análise compreender o comportamento social
de estímulos imediatos, estados psicológicos mediante a análise de variáveis societais,
c traços de personalidade tais como estatuto social, papéis sociais e
normas sociais

o objcctivo principal da invcstigação é a o objcctivo principal da investigação é a


predição do comportamento descrição do comportamento

A experimentação é o principal método de Inquéritos e observação participante são os


investigação principais métodos de investigação

Quadro 1.2 - Duas Psicologias Sociais: Diferenças entre a Psicologia Social


Psicológica e a Psicologia Social Sociológica

Há várias razões para se proceder ao estudo das duas psicologias sociais. A


primeira é que ambas as abordagens fornecem informação complementar
acerca dos mesmos problemas. Ainda são pertinentes as observações
efectuadas por Visscher nos anos 50 a este propósito: "Tenha-se cuidado em
que estas duas abordagens, a do psicólogo e a do sociólogo desenvolvam
investigações complementares num plano estritamente positivo" (Visscher,
1954, p. 745). Cada uma destas abordagens tem os seus pontos fortes e fracos.
A sua combinação contrabalança algumas das fraquezas de cada perspectiva
com as forças da outra. Por exemplo, a limitação dos métodos experimentais
dos psicólogos em situações sociais controladas é compensada pela
focalização dos sociólogos nos meios sociais naturais. As abordagens
combinadas propiciam uma compreensão mais fecunda de um assunto que
qualquer abordagem só por si.

Em segundo lugar, em última instância, as duas abordagens convergem. Todas


as teorias da psicologia social tentam compreender os indivíduos no seu
contexto social. Todas reconhecem implícita ou explicitamente, a influência
recíproca do indivíduo e da sociedade na construção social da realidade. Cada

49
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vez há uma maior interacção dos assuntos e dos métodos das duas psicologias
SOCIalS.

Psicologia Social Psicológica Psicologia Social Sociológica

Experiências de laboratório (46%) Investigação por inquérito (387é)

Investigação por inquérito (139'0) Investigação bibliotecária (19%)

Estudos de campo (12%) Estudos de campo (l97é)

Experiências de campo (12%) Experiências de laboratório (1390)

Experiências naturais (8 o/c) Experiências de campo (590)

Investigação bibliotecária (6o/c) Experiências naturais (5%)

Investigação de arquivo (2%) Outras (l9'o)

Outras (l o/i;)

Fonte: Adaptado de Wilson e Schafer, 1978.

Quadro 1.3 - Técnicas de investigação utilizadas pela Psicologia Social Psicológica


e pela Psicologia Social Sociológica

Em terceiro lugar, a atenção ao mundo subjectivo do indivíduo é a única


contribuição da psicologia social que é partilhada pela psicologia social
sociológica e pela psicologia social psicológica (Cartwright, 1979). Ambas as
perspectivas acentuam o meio percepcionado pelo indivíduo e não tanto o
meio actual. Ambas as psicologias sociais se focalizam nas interpretações
cognitivas da realidade e nos comportamentos subsequentes com base nestas
interpretações. Nas aplicações para este capítulo será apresentada investigação
que postula uma estratégia integrada das duas abordagens.

Sendo o comportamento variado e as suas causas diversas, não é de admirar


que em psicologia social se recorra a diferentes níveis de análise. Certos
autores (e. g., Breakwell e Rowett, 1982; Doise, 1982) esboçaram uma análise
de diferentes níveis. Por exemplo, Doise (1982) sintetizou essas explicações

50
© Universidade Aberta
distinguindo quatro I11ve1s: no primeiro é abordado o estudo dos
processos"psicológicos" ou "intra-individuais" que deveriam dar conta do
modo como o indivíduo organiza a sua experiência do mundo social. A este
nível o psicólogo social interessa-se, por exemplo, pelos processos que
permitem a um indivíduo ter uma opinião global sobre alguém, a partir da
integração de diferentes traços de personalidade que lhe são apresentados. Um
segundo nível tem em conta a dinâmica de processos "inter-individuais" e
"intra-situacionais" que ocorrem entre indivíduos. É disso exemplo o estudo da
atribuição de intenções a outrem. O terceiro nível faz intervir diferenças de
"posições" ou "de estatutos sociais" para dar conta de modulações de
interacções situacionais. Está-se a este nível, por exemplo, quando uma
argumentação convence mais facilmente um indivíduo porque quem a
apresenta tem um estatuto social mais elevado. Enfim, o quarto nível mostra
como determinadas "crenças ideológicas universalistas" induzem
representações e condutas diferenciadoras, ou até mesmo discriminatórias. Os
trabalhos de Lemer (1980) permitem ilustrar este nível. Segundo Lemer, as
pessoas têm uma profunda convicção de que "o mundo é justo " e o que
acontece às pessoas que sofrem é merecido.

Muito embora os diferentes níveis de análise tenham sido apresentados de


modo linear e de certo modo estático, é de referir que numa dada situação
podemos encontrar mais de um nível. Por exemplo, a realização de um
indivíduo pode ser afectada negativamente quando se efectua no contexto de
um grupo (nível 3), o que leva esta pessoa a efectuar a comparação social
(nível 2) com determinados elementos deste grupo ou a mudar a percepção de
si próprio ao repensar na sua realização (nível 1). Por conseguinte, diversos
níveis de análise podem imbricar-se uns nos outros, se bem que estes diferentes
níveis se associem a fenómenos diferentes. Ou, por outras palavras, se pode
haver diferentes níveis de análise numa mesma situação, tal é revelador de
vários processos psicológicos nesta situação social.

Se os níveis de análise podem ser diversos, os psicólogos sociais estão, no


entanto, unidos na crença de que os aspectos sociais do comportamento
humano podem ser compreendidos através do estudo sistemático. Este
conhecimento pode permitir predizer o comportamento social e, talvez,
melhorá-lo, contribuindo para uma qualidade de vida mais satisfatória dos seus
semelhantes.

Nesta secção referiu-se que a psicologia social abordava de modo científico as


causas do comportamento da pessoa em contexto social. Fizemos a distinção

51
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entre a abordagem da psicologia social e de outras clencias e foram
mencionados quatro níveis de análise utilizados nas diferentes investigações e
teorias. Mas como se chegou aí? O que é que levou a psicologia social a
enveredar por uma orientação científica e metodológica rigorosa para estudar
os diversos temas agora em moda? É este questionamento que nos propomos
abordar na próxima secção.

52
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3. Esboço histórico da Psicologia Social

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Página intencionalmente em branco

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Ebbinghaus (1908, p. 1) escrevera que a "Psicologia tem um longo passado
mas só tem uma breve história". Os psicólogos sociais têm aplicado
incessantemente esta afirmação à sua própria disciplina.

Efectivamente, a Psicologia Social é um dos campos mais novos da psicologia,


sendo ela própria uma disciplina jovem. Atribui-se frequentemente como data
de nascimento da psicologia científica, em geral, o ano de 1879, ano em que o
primeiro laboratório de psicologia foi fundado em Leipzig, Alemanha, por
Wilhelm Wundt. Se bem que as raízes da psicologia social estejam
historicamente distantes, tais como as da psicologia em geral, o seu
reconhecimento como um domínio separado só aconteceu algumas décadas
mais tarde.

Não há um consenso nos manuais de Psicologia Social quanto à apresentação


do aspecto histórico da disciplina. Se alguns ignoram pura e simplesmente este
aspecto, outros consagram-lhe uma secção de um capítulo ou até um dos
primeiros capítulos.

Abordar-se-á o aspecto histórico da Psicologia Social tendo em conta algumas


das suas bases filosóficas, que constituem a pré-história da disciplina, as suas
origens e, enfim, concentraremos a nossa atenção nalguns dos principais
acontecimentos que marcaram a sua evolução.

Se já Platão aproximava o indivíduo e a sociedade, se Rousseau analisou a


influência das instituições sociais sobre a psicologia dos indivíduos, não pode
ainda dizer-se que estes autores sejam psicólogos sociais.

Quando viu o dia verdadeiramente a Psicologia Social? É difícil responder,


pois ela é o resultado de uma evolução que se operou progressivamente.
Abordaremos seguidamente tão somente alguns pontos essenciais para permitir
ao leitor conhecer as origens da psicologia social, e assim compreender melhor
a disciplina tal como hoje existe (para apresentação mais completa do aspecto
histórico desta disciplina, ver, e.g., AlIport, 1985; Hilgard, 1987; Jones, 1985;
Sahakian, 1982).

3.1 O longo passado do pensamento sócio-psicológico

A Psicologia Social começou a esboçar-se enquanto centro de interesse


científico em finais do século XIX e nos alvores do século XX. Todavia já

55
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antes encontramos autores que se referiram às relações entre o psiquismo e a
vida colectiva.

Fazer um apanhado das fontes da Psicologia Social é uma tarefa bastante


árdua, pois toda uma plêiade de pensadores, de filósofos se debruçaram sobre
os problemas do homem em sociedade. Como nos lembra G. Allport (1985), a
história da filosofia não pode ser esquecida na medida em que até há um século
todos os psicólogos sociais eram filósofos e muitos filósofos eram psicólogos
SOCIaIS.

o recurso à história neste domínio faz correr dois riscos. Por um lado, se se
visa ser exaustivo, a exposição pode tornar-se pesada; por outro lado, a
selecção acarreta injustiças. Não pretendendo a exaustividade nem podendo
deixar de efectuar uma selecção, só nos arriscamos pejos caminhos do
passado, na medida em que nos parece importante dar uma espessura temporal
a esta disciplina.

Como já se evocou, os filósofos gregos foram provavelmente os primeiros


teóricos em psicologia social. Platão e Aristóteles, em particular, focalizaram a
atenção do homem ocidental na sua natureza social.

De Platão até ao século passado todos as teorias sobre a natureza social do


homem diziam respeito à teoria do Estado. Por essa razão, G. Allport (1985)
considerava que até então a psicologia social era em grande parte um ramo da
filosofia política.

Múltiplas questões foram colocadas e respondidas de modo diverso pelos


filósofos ao longo dos tempos. Graumann (1996) sintetiza cinco questões
centrais desse pensamento social:

1. Se as pessoas são concebidas como indivíduos, cada uma sendo


única ou fundamentalmente semelhante às outras.

2. Se a pessoa é vista com uma função da sociedade ou, pelo


contrário, a sociedade é vista como um produto e função dos
indivíduos que a compõem.

3. Se a relação entre indivíduo e sociedade é uma questão com


sentido ou é uma expressão de uma ideologia escondida.

4. Se a natureza dos seres humanos é fundamentalmente egoísta e


necessita de técnicas e processos de educação para possibilitar as

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vidas das pessoas em grupos ou estados, ou se os seres humanos são
sociais "por natureza", sendo as boas ou más influências que os
tornam sociais ou anti-sociais.

5. Se homens e mulheres são agentes livres e responsáveis ou são


determinados por forças naturais e sociais.

As respostas avançadas ainda são controversas no pensamento contemporâneo


e tornaram-se suposições para as abordagens sócio-psicológicas.

Platão (427-347 a. C.) expõe na República que os Estados se formam porque o


indivíduo não é auto-suficiente e necessita da ajuda de muitos outros. Se os
homens formam grupos sociais é porque precisam deles. Platão tinha, por
conseguinte, uma visão utilitária das interacções humanas e dos
reagrupamentos. Platão perguntava-se: "Qual é a melhor forma de governo?"
Ele raciocinava que a partir do momento em que as pessoas se juntam para
satisfazer as suas necessidades, a especialização das tarefas poderia ajudar. O
equilíbrio para uma sociedade depende do lugar que ela saiba dar a três
actividades: artesanal, guerreira e à da magistratura.

Para além desta sua perspectiva sobre a sociedade, Platão considera que o
espírito humano tem três componentes: comportamental, afectivo, e cognitivo
que se localizam no abdómen, no tórax e na cabeça. Muito embora as ideias
anatómicas de Platão tenham sido banidas, muitos psicólogos sociais ainda
encontram útil esta tricotomia dos fenómenos. Várias abordagens psico-sociais
diferem na atenção que prestam a estes três aspectos do funcionamento
humano. Isto é notório na natureza das atitudes.

Em contraste com a perspectiva utilitarista de Platão, Aristóteles (384-322


a.c.), na Política, vê as pessoas como "animais políticos", gregários por
instinto. Aristóteles pensa que a interacção social é necessária para o
desenvolvimento normal dos seres humanos. É este seu instinto gregário que
leva o homem a afiliar-se com os outros. Quer Aristóteles quer Platão
acreditam que os indivíduos diferem nas suas habilidades. Uns têm disposições
inatas para a liderança e outros para serem seguidores.

Muito mais tarde, Hobbes (1588-1679) escreveu uma ficção intelectual sobre
a origem de um estado hipotético, o Leviatã. Para Hobbes a motivação social
não se coloca em termos de Philia, como para Aristóteles, uma vez que os
homens não têm tendência a amar-se, mas o seu estado natural é a guerra
contra todos. A tão célebre frase "hama hamíní lupus" condensa bem esta

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premissa. Hobbes desenvolveu uma análise dos processos interpsicológicos
que levam o homem à socialização: paixão de ambição, paixão de dominação,
sentimento de insegurança. Este pensador coloca assim os alicerces da análise
psico-social na medida em que procura nas bases do comportamento, as bases
da sociedade.

Há um certo consenso entre os psicólogos sociais e os sociólogos em


considerar Hobbes um dos verdadeiros precursores dos estudos do homem em
sociedade. Gardner Murphy (Klineberg, 1963) foi até ao ponto de o considerar
o primeiro psicólogo social.

Para Rousseau (1712-1778) as condições SOCIaiS transformam


verdadeiramente o homem. Segundo Stoetzel (1963) Rousseau foi o primeiro
autor que não se contentou em afirmar, mas que procurou analisar a influência
das instituições sobre a psicologia dos indivíduos. No "Discurso sobre as
ciências e as artes" (1750), defendia que as ciências e as artes corromperam o
homem, como toda a civilização. O argumento nuclear do "Contrato Social"
(1762) era que a natureza não destinava o homem à vida em sociedade, tendo
vivido o homem durante milénios só e independente.

Bentham (1748-1832) defendeu que todo o comportamento humano é


motivado pela procura de prazer, princípio conhecido como hedonismo. Por
isso, por extensão, todo o comportamento social é hedonista. As pessoas, nas
suas interacções, procuram maximalizar os seus benefícios e minimizar os seus
custos. Como nos lembra Graumann (1996), muitas das teorias modernas de
condicionamento e de motivação têm como ideias subjacentes a satisfação
individual (reforço, recompensa, redução de tensão, de dissonância, de
incerteza... ), são variações do princípio de prazer ou utilidade.

Para Fourier (1792-1837), socialista utópico, a sociedade ideal, o falanstério


assentava nas "paixões humanas". Essa sociedade ideal constrói-se a partir de
uma boa utilização das paixões humanas e não da sua correcção ou repressão.
"É necessário, pois, reestruturar a sociedade, a partir de um conhecimento que
chamaríamos hoje psico-social, e de que Fourier teve claramente a ideia, para
trazer a harmonia psicológica" (Stoetzel, 1963, p. 15).

Um dos teóricos mais conhecidos nas ciências sociais é Karl Marx (1818-
1883) cujos escritos se focalizaram em particular nas instituições sociais.
Segundo Marx, o comportamento social é determinado pelas condições
económicas. Por exemplo, uma economia feudal suscitaria um determinado

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padrão de pensamentos, sentimentos e de acções entre os cidadãos, ao passo
que uma estrutura comunista levaria a um padrão muito diferente. Segundo
esta perspectiva, para mudar o modo das pessoas pensarem, sentirem e agirem
é fundamental mudar antes as instituições económicas. Note-se que, segundo a
psicologia social moderna, indivíduos e instituições económicas influenciam-se
mutuamente, não se estando, pois, sÓ' em face de uma influência unívoca.

Acrescentemos, enfim, aos autores que acabámos de evocar, dois alemães -


Moritz Lazarus (1824-1903) e Heyman Steinthal (1823-1899) - fundadores
em 1860 de uma Revista de Psicologia dos Povos (Zeitschrift fur
Volkerpsychologie). Para eles, o "povo" era uma realidade espiritual, mas
colectiva, cujo espírito não é um mero produto, pensando descobrir os
processos mentais dos chamados povos primitivos através do estudo dos
mitos, línguas, religiões e artes. Foram inspiradores do seu compatriota Wundt
(1832-1920), fundador da psicologia experimental, que também publicou sobre
este assunto dando uma maior autonomia à consciência individual.

Nenhum dos autores que acabámos de evocar conceberam a psicologia social


como disciplina independente. Todavia as perspectivas dos autores assinalados
são suficientes para ilustrar a existência de dois temas da "psicologia social
pré-científica" (Stoetzel, 1963): a) as disposições psicológicas individuais
produzem as instituições (e.g. Platão, Aristóteles, Hobbes, Fourier); b) as
condições sociais influenciam os comportamentos dos indivíduos (e. g.,
Rousseau, Marx).

3.2 As origens da Psicologia Social

Se os pensadores a que acabamos de fazer referência analisam as interacções


entre o indivíduo e a sociedade, não se pode ainda dizer que sejam psicólogos
sociais. É difícil situar o nascimento da psicologia social, pois esta disciplina
vai aparecer como resultado de um evolução progressiva.

o húmus propício à eclosão de uma abordagem específica da psicologia social,


encontramo-lo na confluência de duas correntes: uma francesa e outra anglo-
saxónica.

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3.2.1 Corrente francesa

Comte (1798-1857), que inventou o termo "sociologia" e fez muito para situar
as ciências sociais na famí1ia das ciências, foi o primeiro autor a ter concebido
a ideia de uma Psicologia Social. Esta afIrmação pode parecer surpreendente
num primeiro momento quando se conhece o desprezo de Comte em relação à
Psicologia.

Duas das suas contribuições são geralmente conhecidas. A primeira é a famosa


"lei dos três estádios" que nos chama a atenção para a emergência gradual das
ciências do estádio teológico (em que os acontecimentos são explicados e
personifIcados pelos deuses), metafísico (em que os acontecimentos são
explicados por poderes impessoais e pelas leis da ciência) até ao positivo (em
que os acontecimentos são explicados pela sua invariabilidade e constância). A
segunda é a sua classifIcação das ciências fundamentais abstractas. Comte faz a
distinção entre ciências abstractas que tratam de fenómenos irredutíveis, de
acontecimentos fundamentais e primários, e ciências concretas que tratam de
fenómenos compósitos, de "seres" concretos e das aplicações das ciências
abstractas. Entre as ciências concretas encontra-se a geologia, a metereologia,
a botânica, a zoologia e a educação. Na fIgura 1.2. podemos ver as ciências
abstractas tendo em conta a sua emergência. Se isto é geralmente conhecido,
já não se conhece tanto o facto de Comte lá pelo fIm da sua vida andar à
procura de uma "Verdadeira Ciência Final" edifIcada simultaneamente na
biologia e na sociologia. A esta "Verdadeira Ciência Final" chama-lhe "Moral
Positiva". Comte viu-se obrigado a inventar a "Moral Positiva", pois
necessitava de uma ciência que tratasse dos indivíduos e do modo como os
indivíduos combinam influências biológicas e societais. Esta "Moral Positiva"
considera, por um lado, os fundamentos biológicos do indivíduo segundo o
enfoque da moderna psicofIsiologia, e, por outro lado, aborda o indivíduo num
contexto cultural e social, o que 'constitui a perspectiva da psicologia social
actual (Allport, 1985). Comte levantou um problema que tem sido alvo de
atenção dos psicólogos sociais: como é que o indivíduo pode ser
simultaneamente a causa e a consequência da sociedade? Ou se quisermos
utilizar uma linguagem dos nossos dias: qual é a influência da sociedade sobre
o indivíduo e, inversamente, qual é a influência do indivíduo nos processos
sociais?

60 © Universidade Aberta
Lógico Físico Psíquico

Matemática Astronomia Física Química Biologia Sociologia Moral

Psicologia

Social

Psicologia

Fisiológica

Fonte: Allport 1985.

Figura 1.2 - Hierarquia das Ciências Abstractas de Comte

A concepção de Comte que acaba de se expor é, segundo Allport (1985), um


acontecimento negligenciado de relevância histórica. Por isso esse autor
considera mesmo que se fosse possível designar um só fundador da Psicologia
Social, essa honra incumbiria a Comte. É contudo difícil afIrmar com certeza
absoluta qual foi o fundador de uma disciplina. No entanto não se pode negar
que a influência de Comte tenha sido importante e de que mereça ser citado
numa perspectiva histórica.

É todavia a Gabriel Tarde (1843-1904) e a Gustave Le Bon (1841-1931) que


se deve um real desenvolvimento da Psicologia Social.

É sobejamente conhecida a controvérsia teórica que opôs o discípulo de


Comte, Émile Durkheim (1855-1917) a Tarde. Durkheim defende a posição de
Comte segundo a qual o social é rigorosamente irredutível ao individual. Esta

61
© Universidade Aberta
posição de Durkheim vai entrar em choque com a de Tarde que muito embora
não negasse aos fenómenos sociais uma certa especificidade, alicerçava-os na
alternância de dois fenómenos propriamente psicológicos, a invenção e
sobretudo a imitação. A invenção bastante rara, é fruto de individualidades
poderosas que deste modo asseguram o progresso. A imitação assegura a
unidade e a estabilidade sociais. Uma sociedade pode definir-se como "um
grupo de homens que se imitam".

A ciência social, para este autor, é uma interpsicologia, pois deve procurar pôr
em evidência os diferentes modos segundo os quais as pessoas interagem.

Para além do conceito de imitação que terá um papel importante na ulterior


teoria da Aprendizagem Social, recorde-se a formulação precursora de Tarde a
propósito do papel dos meios de comunicação de massa na formação da
opinião pública nos processos de influência da comunicação em duas etapas.
Os efeitos das mensagens cristalizam-se em determinados indivíduos, num
primeiro momento que, por sua vez, constituem pólos de irradiação de
influência. Esta teoria será reformulada de modo mais elaborado por Katz e
Lazarsfeld.

Gustave Le Bon é autor de numerosas obras de psicologia e de filosofia


sociais. A mais célebre é a Psicologia das Multidões que Le Bon deu a lume
em 1895. Segundo Le Bon, a multidão modifica o indivíduo, pois dota-o de
uma "alma colectiva". Esta alma faz com que os indivíduos, na situação da
multidão, sintam, pensem e ajam de modo completamente diferente do que
sentiriam, pensariam agiriam cada um isoladamente.

Fez ressaltar algumas características psicológicas. Em primeiro lugar a


multidão obedece à lei da unidade mental. Além disso, a multidão coloca os
indivíduos perante emoções rápidas, simples, intensas e mutáveis. Enfim,
adopta um raciocínio rudimentar qualitativamente inferior ao dos indivíduos
que a compõem. Estes comportamentos são explicados por Le Bon por uma
causa interna, o contágio mental, e uma externa, a existência de líderes.

É facilmente reconhecida a influência que teve sobre esta obra o psiquiatra


francês Charcot que em finais do século XIX fizera experiências sobre a
hipnose e a sugestão.

A obra de Le Bon é julgada de modo ambivalente: brilhante e superficial. A


noção de multidão não é claramente delimitada, misturando os grupos, os

62
© Universidade Aberta
agregados, a multidão e a massa. Por outro lado deixa transparecer uma
desconfiança em relação à influência das massas e das ideias democráticas.

Todavia, com este livro, Le Bon abriu um capítulo importante, o do


comportamento colectivo (rumor, opinião pública, propaganda, pânico,
revoluções sociais..... ) que foi posteriormente abordado, muito embora
descontinuamente por psicólogos sociais muito conhecidos como Allport,
Cantril, Smelser...

A influência de Le Bon foi tão marcante que, como muito bem observa
KJineberg, "quando o termo "psicologia social" é usado pelo leigo, ele
geralmente pensa em "psicologia das multidões" no sentido utilizado por Le
Bon (1963, p. 14).

Alguns dos principais tópicos da psicologia das multidões foram inseridos na


Psicologia Social quando a análise experimental se tornou acessível. No tópico
da influência social podem-se reconhecer marcas do que outrora fora
compreendido como efeitos de sugestão, contágio e imitação (Moscovici,
1985).

Um dos fundadores do domínio que tem sido negligenciado é o engenheiro


agrónomo francês Ringelmann que efectuou investigação nos anos 80 do
século dezanove, mas que só foi publicada em 1913. À semelhança de
Triplett, cuja investigação será referida mais adiante, Ringelmann também
levantou a seguinte questão: como é que a presença de outras pessoas
influencia a realização de um indivíduo? Ringelmann descobriu que, em
comparação com o que as outras pessoas faziam por elas mesmas, a realização
individual diminuía quando trabalhavam conjuntamente em tarefas simples
como puxar uma corda ou empurrar uma carroça (Kravitz e Martin, 1986;
Ringelmann, 1913). A investigação de Ringelmann está na origem dos
modernos estudos de psicologia social sobre preguiça social. Quase um século
mais tarde Latané e seus associados (1979) concluiram que o fenômeno de
preguiça social está vivo, o grupo produzindo reduções na realização
individual.

3.2.2 A corrente anglo-saxónica

Nos países anglo-saxónicos, e em particular nos Estados Unidos,


frequentemente se fixam como datas para as origens, 1898 para a primeira

63
© Universidade Aberta
experiência em Psicologia Social e 1908 para os dois primeiros manuais.
Efectivamente ambos os "primeiros" estão errados, mas também não se reveste
de muito sentido substitui-los por outros "primeiros". Só para memória refira-
se que em 1896 Vierkandt publicou um livro de psicologia social Natllrvolker
und Kulturvolker: Ein Beitrag ZlIr Sozialpsychologie. Em 1898, apareceram
também na Europa duas obras onde surge o termo de Psicologia Social. Em
França apareceram, em 1898, os Étlldes de Psychologie Sociale de Gabriel
Tarde, e na Alemanha, nesse mesmo ano Gustav Ratzenhofer escrevia uma
obra alemã Die Soziologische Erkentniss e intitulava uma parte do seu livro
"Social-Psychologie". Este sociólogo alemão fazia entrar na Sociologia
considerações sobre os indivíduos e as suas motivações. Procurava nos
"interesses humanos" os factos de base para a explicação sociológica. Logo no
dealbar do século XX surgem ainda dois textos que tratam de psicologia
social, escritos por Bunge (1903) e Orano (190 I). Por seu lado Haines e
Vaughan (1979) mostraram, que há outras experiências antes de 1898
merecendo ser consideradas sócio-psicológicas, sobretudo no contexto dos
estudos de sugestibilidade de Binet e Henri (e.g. Binet e Henri, 1894). Ainda
antes, como já referimos, Ringelmann efectuou investigações sobre a
produtividade de grupo.

Robert Zajonc (1969) faz uma comparação impressionante entre a data das
primeiras medidas científicas e a do primeiro estudo experimental em
Psicologia Social: a primeira medida científica precedeu a primeira medida
psico-social em vinte e um séculos.

Foi efectivamente em 1898 que Triplett publicou a experiência sobre os efeitos


da competição sobre o desempenho humano. Triplett tinha observado que os
ciclistas rodavam mais depressa com outra pessoa do que quando rodavam
sozinhos. Para investigar esta observação trouxe ao laboratório 40 crianças
dos 10 aos 12 anos e pediu-lhes que enrolassem um anzol o mais rápido que
pudessem. Os sujeitos desempenhavam a tarefa sozinhos e depois competindo
aos pares. Triplett verificou que o desempenho foi melhor na situação de
competição.

O estudo de Triplett representa um marco auspicioso. A questão que ele se


colocava no virar do século XIX ainda fascina os psicólogos sociais. As
pessoas obtêm melhor desempenho sós ou acompanhadas? Em 1924, Floyd
Allport fez a distinção entre facilitação social (a influência do grupo nos
movimentos do indivíduo) e rivalidade (o desejo de ganhar). Em 1965 Robert
Zajonc escreveu um artigo clássico sugerindo que a mera exposição à presença

64
© Universidade Aberta
de outras pessoas aumenta o desempenho das respostas dominantes (isto é,
bem aprendidas), mas interfere com o desempenho das respostas não
dominantes (isto é, novas). A investigação sobre a facilitação social ainda
continua.

Apesar da experiência de Triplett nota-se que a Psicologia Social não foi muito
experimental nos seus primórdios. Especulações e descrições salientavam-se
mais que testes científicos.

o sociólogo Edward Ross (1866-1951) publica em 1908 uma obra tendo por
título "Psicologia Social". Ross já tinha publicado em 1901 uma obra sobre o
"Controlo Social" em que considerava a Psicologia Social como o estudo das
interrelações psíquicas entre o homem e o meio que o rodeia. Fortemente
influenciado por Tarde, Ross procurava aplicar as leis da sugestão e da
imitação a diversos acontecimentos do passado e do presente: moda, opinião
pública, etc.

Neste mesmo ano é publicada, na Inglaterra, por William McDougaIl a obra


"Introdução à Psicologia Social". O autor delineia uma introdução psicológica
à sociologia e mostra como é que os factos sociais se alicerçam na Psicologia.
Baseou-se amplamente no ponto de vista que o comportamento social resulta
de um pequeno número de tendências inatas ou instintos. Através da teoria
dos instintos estamos perante uma abordagem individualista na Psicologia
Social. As teses de McDougall espalharam-se amplamente. O seu livro foi
reeditado 14 vezes em treze anos e foi utilizado para ensinar nos Estados
Unidos. A influência considerável que teve na evolução da Psicologia Social
deveu-se sobretudo aos remoinhos que levantou e não tanto ao valor das suas
concepções que são rejeitadas na actualidade por quase todos os psicólogos
sociais. É pois claro que o domínio da Psicologia Social não tinha ainda
assumido a sua forma moderna nessa altura.

Note-se, no entanto, que já nestas duas obras o cisma entre a psicologia social
psicológica e a psicologia social sociológica se fazia sentir, sendo claramente
diferentes os temas abordados e os autores citados. Em contraste, o texto de
Floyd AIlport sobre a Psicologia Social está muito mais próximo da orientação
da Psicologia Social contemporânea. Para F. AIlport o comportamento social é
influenciado por muitos factores em que se incluem a presença dos outros e as
suas acções. O texto discute a investigação que já tinha sido realizada, como
por exemplo, a habilidade em reconhecer as emoções das outras pessoas
mediante as expressões faciais, a conformidade social e o impacto do público

© Universidade Aberta 65
na realização de tarefas. Estes tópicos ainda são alvo de discussão hoje em dia.
Este texto de Allport foi o primeiro livro de base em psicologia social que
permitiu a inclusão desta disciplina no programa permanente de estudos dos
departamentos de Psicologia das universidades americanas (HiJgard, 1987). A
psicologia social foi projectada da rampa de lançamento e já nada a podia
parar no seu movimento.

Se não houve garrafas de Champagne que foram abertas numa data bem
precisa para saudar a chegada da Psicologia Social ao campo científico, pode-
se, todavia, dizer que durante o primeiro quartel deste século ela já tinha
emergido.

3.3 Evolução da Psicologia Social

Os anos que se seguiram à publicação do texto de F. Allport foram um período


de crescimento rápido para a Psicologia Social. O ideal de transformar a
Psicologia Social numa disciplina empírica já tinha sido aceite em finais dos
anos 20, começo dos anos 30. Desenvolveram-se técnicas de investigação e
expande-se o trabalho efectuado. Alguns dos marcos históricos da Psicologia
Social são apresentados no Documento 1.1. Antes de especularmos sobre os
"marcos" que podem ter ocorrido desde 1985 esperemos mais alguns anos.

1880 Ringelmann efectua investigação sobre realização num grupo

1896 Vierkandt escreve o primeiro livro dedicado à psicologia social.

1895 Le Bon discute o comportamento da multidão.

1898 Gabriel Tarde publica Études de Ps)'chologie Sociale.

Norman Triplett publica uma experiência que demonstra que a actividade


física pode ser afectada pela mera presença de outras pessoas.

1908 McDougall e Ross publicam dois textos de Psicologia Social.

1918-20 w. r. Thomas e F. Znanniecki publicam um estudo em cinco volumes, The


Polish Peasallt in Europe and America, que faz com que a atitude se torne

66 © Universidade Aberta
um conceito central em Psicologia Social.

1921 O Journal of Abnormal Psychology torna-se o Journal of Abnormal and


Social Psychology que foi a primeira revista dedicada explicitamente à
publicação de artigos em Psicologia Social.

1924 Floyd AIlport publica o Manual de Psicologia Social.

1925 Bogardus desenvolveu a escala de distância social para medir as atitudes


das pessoas em relação a vários grupos étnicos. Pouco depois surgem os
métodos de avaliar as atitudes preconizados por Thurstone (1928) e por
Likert (1932).

1929 Murchison e Dewey fundam o Journal of Social Psycholog)'.

1933 Katz e Braly publicam o estudo com estudantes universitários de Princeton


sobre os estereótipos raciais. Terminam as experiências de Elton Mayo e
da sua equipa na Western Electric Corporation. O inquérito de Hawthorne
- nome pelo qual ficaram conhecidos estes trabalhos - descobre a
importância do pequeno grupo na indústria.

1934 George Herbert Mead publica Mind, Self and Societ)' que sublinha a
interacção entre o self e os outros.

Richard LaPiere investiga inconsistências entre atitudes (preconceito


racial) e comportamentos relacionados (discriminação) num contexto de
campo.

1. L. Moreno desenvolve um sistema para codificar as interacções


indivíduo-grupo.

1935 É publicado o Handbook of Social Psychology editado por Murchison,


acontecimento que, segundo Jones (1985) marcou o fim da "era pré-
experimental" em Psicologia Social.

1936 Muzafer Sherif utiliza o efeito auto-cinético para estudar as normas


sociais.

George GaIlup desenvolveu métodos de sondagens de opinião.

Fundação da Society for the Psychological Study of Social Issues que


promove o estudo de problemas sociais importantes.

67
© Universidade Aberta
1937 1. L. Moreno funda a revista Sociol7letr)' dedicada ao estudo dos processos
grupais que se tornará mais tarde Social Psychology Quarterl)'.

1938 Kurt Lewin propõe a teoria do campo em Psicologia.

1939 Lewin, Lippitt, White publicam os resultados das suas investigações sobre
a conduta de grupos, funcionando em diferentes climas, no que diz
respeito ao tipo de liderança exercida.

John Dollard e os seus associados apresentam a teoria da frustração-


agressão.

1941 Neal Miller e John Dollard em Social Learning and 1I1Iitation apresentam
uma teoria que aplica os princípios do behaviorismo ao domínio do
comportamento social.

1943 Theodore Newcomb publica o estudo do Bennington College que mostra


como as atitudes podem modificar-se em função da adesão a diferentes
grupos de referência.

1945 Lewin funda o Research Center for Group DYl1al7lics.

1946 Fritz Heider publica o seu artigo Attitudes alld Cognitive Organization
que está na origem das teorias da consistência cognitiva florescentes na
década de 50 e que continuam a ter papel relevante na Psicologia Social
contemporânea.

1950 Completa-se a investigação de Adorno e da sua equipa sobre a


Personalidade Autoritária. Este tipo de pessoas manifestam submissão à
autoridade, preconceito em relação às minorias étnicas.

1951 Solomon Asch demonstra que os indivíduos se conformam com uma


maioria quando as suas crenças são postas em questão.

1954 Gordon Alpport publica The Nature of Prejudice, uma análise importante
do preconceito intergrupal e dos estereótipos.

1957 Leon Festinger propõe a teoria da Dissonância Cognitiva, um modelo que


enfatiza a necessidade de consistência entre cognição e comportamento.

1958 Fritz Heider lança os alicerces da teoria da atribuição com a publicação da


Psicologia das Relações Interpessoais.

68
© Universidade Aberta
1960 O Journa1 of Abnormal and Social Psychology divide-se em duas
publicações separadas, uma Journal of Abnorl1lal Ps)'Chology e outra
Journal of Personality and Social Psychology.

1961 Moscovici publica La Psychanalyse, son Image et son Public obra que
estimula uma ampla série de trabalhos sobre as representações sociais.

1962 Schachter e Singer defendem a teoria de que as emoções são função quer
da activação fisiológica quer das regras sociais sobre o modo como esta
activação deveria ser etiquetada.

1963 Milgram publica sobre a obediência, mostrando que os sujeitos obedecerão


às ordens de um experimentador para administrar intensos choques
e1éctricos a outro ser humano.

Campbell e Stanley publicam um capítulo intitulado Experimental and


quasi-experil71ental designs for research teaching mostrando como
investigação de qualidade sobre problemas sociais importantes pode ser
efectuda fora do laboratório.

1964 Berkowitz lança a sua série Advances in Experimental Social Psychology.

1965 Jones e Davis publicam um artigo que estimula a investigação sobre a


atribuição e a cognição social.

Jones funda o Journal of Experimelltal Social Psyclzology.

Zajonc publica os seus trabalhos sobre facilitação social.

1966 Cria-se na Europa a Associação Europeia de Psicologia Social


Experimental, incluindo países da Europa Ocidental e Oriental.

1967 Harold Kelley publica Teoria da Atribuição em Psicologia Social. A


investigação sobre a atribuição é um tópico dominante nos anos 70.

1968 Latané e Darley começam os seus trabalhos sobre o comportamento de


ajuda.

1969 Alan Wicker desafia os psicólogos sociais para demonstrarem melhor as


relações entre atitudes e comportamentos.

1971 O apelo a interesses mais aplicados dá os seus frutos e o Journal of

69
© Universidade Aberta
Applied Social Ps)'cholog)' é fundado por Streufert.

1973 Gergen critica a disciplina sobre o seu aspecto histórico e pouco científico.

1975 É publicado o primeiro volume de Personalit)' and Social Ps)'cholog)'


Bulletin.

1980 Harry Triandis et ai. editam a obra Handbook of Cross-Cultural


Ps)'chology em seis volumes.

1981 Alice Eagly e a sua equipa começam a efectuar uma série de meta-análises
sobre comparações de género no comportaamento social que reabrem o
debate sobre diferenças de género.

1985 É publicada a terceira edição do Handbook of Social Psychology, editado


por Gardner Lindzey e Elliot Aronson.

(Esperaremos alguns anos para especularmos sobre os marcos que ocorreram desde 1985 na
medida em que a passagem do tempo determina os acontecimentos que modelam o campo de
modo significativo)

Documento 1.1- Alguns marcos históricos da Psicologia Social

Nos anos trinta surge a publicação de trabalhos de três figuras de primeira fila
da história da Psicologia Social: Levy Moreno (1892-1974), Muzafer Sherif
(1906-1990) e Kurt Lewin (1890-1947). Em 1934 Moreno desenvolveu o
sistema sociométrico para analisar as interacções indivíduo-grupo. Segundo
Sahakian (1982) deve atribuir-se a Sherif (1936) o primeiro programa de
investigação com cariz experimental. Interessou-se pelo estudo de normas
sociais, isto é, regras que suscitam os comportamentos das pessoas.

Por vezes há pessoas que podem mudar a direcção de todo um domínio do


saber. Darwin e Mendel alteraram a moderna biologia; Galileu e Newton
alteraram a trajectória da física; Freud revolucionou a psicologia clínica. Se no
domínio da psicologia social não há tais gigantes, contudo se alguma figura de
primeiro plano influenciou a orientação geral do domínio foi muito
provavelmente Kurt Lewin. Lewin formou-se como psicólogo na Alemanha e
trabalhou no Instituto de Psicologia de Berlim. Emigrou para os Estados
Unidos em 1933, tendo-se dado conta de que os Nazis fariam a vida

70 © Universidade Aberta
Kurt Lewin

impossível a alguém que não partilhasse as suas ideias políticas.

Kurt Lewin formulou a "teoria do campo" segundo a qual o comportamento


humano deve ser considerado como uma função das características do
indivíduo em interacção com o seu meiD (Lewin, 1936). Na resposta à questão
sobre o que é que determina o comportamento humano, Freud acentuou os
processos psicológicos internos ao indivíduo; Marx sublinhou as forças
externas; Lewin optou por ambos os factores: factores internos e externos
influenciam o comportamento humano. Esta perspectiva de Lewin constitui
uma versão temporã do que hoje se chama de perspectiva interaccionista
(Blass, 1984). Esta abordagem combina a psicologia da personalidade com a
psicologia social, que tradicionalmente têm sublinhado respectivamente
diferenças entre indivíduos e diferenças entre situações. Este namoro, não
frívolo, mas tornado sério entre os dois domínios da psicologia, tem suscitado
uma área fundamental de investigação (Snyder e Ickes, 1985).

Como, por exemplo, persuadir as pessoas a comerem alimentos mais


nutritivos? Durante a Segunda Guerra Mundial, Lewin procurou pôr em
evidência qual o tipo de técnica de persuasão que seria mais eficaz para
convencer as senhoras a contribuírem para o esforço de guerra mediante a
compra de refeições mais baratas, mas apesar disso mais nutritivas, para
proteger a saúde das suas famílias, fazendo com que os elementos do agregado
familiar consumissem mais leite e, para salvaguardar o bem-estar dos recém-

71
© Universidade Aberta
nascidos, alimentando-os com óleo de fígado de bacalhau e com sumo de
laranja (Lewin, 1947). Os resultados mostraram que a discussão activa das
maneiras de confeccionar boa alimentação era superior à escuta passiva de
informação. As senhoras que participavam num grupo de discussão referiram
mais tarde maiores mudanças em relação a hábitos alimentares saudáveis que
as que ouviam uma lição. Esses resultados puderam ser aplicados a inúmeros
problemas da vida quotidiana. O esforço pioneiro de Lewin e de seus
colaboradores em aplicar os princípios teóricos a estudos de problemas sociais
constitui um referencial básico que norteou a psicologia social e ainda perdura.
No Documento 1.2 pode-se apreciar o pensamento influente de Lewin.

Seria da maior desventura se a tendência para a psicologia teórica fosse


enfraquecida pela necessidade de tratar com grupos naturais no estudo de certos
problemas de psicologia social. Não deveríamos ficar cegos, contudo, ao facto de
que este desenvolvimento oferece grandes oportunidades, bem como ameaças à
psicologia teórica. O maior défice da psicologia aplicada tem sido o facto que, sem
ajuda teórica própria, teve de seguir o custoso, ineficaz e limitado método de
ensaios e erros. Muitos psicólogos que trabalham hoje no domínio aplicado estão
vivamente conscientes da necessidade de cooperação íntima entre psicologia teórica
e aplicada. Tal pode ser efectuado em psicologia, como tem sido efectuado em
física, se o teórico não olhar para os problemas aplicados com aversão intelectual
ou com medo dos problemas sociais, se o psicólogo aplicado compreender que não
há nada tão prático como uma boa teoria.

Fonte: Lewin, 1944, Constructs in psychology and psychological ecology. Universit)' of 101m
Studies in Child Welfare, 20, 23-27.

Documento 1.2 - Perspectiva de Kurt Lewin sobre a distinção entre psicologia pura
e aplicada

Em suma, tendo em conta a influência de Lewin que se fez sentir a vanos


níveis, não é surpreendente que várias pessoas o considerem como sendo o pai
da psicologia social contemporânea. A este título, o Journal of Social Issues
consagrou à sua obra em 1992 o número 2 do volume 48.

Em cada década do século vinte os interesses da investigação foram-se


modificando e ampliando. Durante os anos 40 e 50 a expansão do campo

72
© Universidade Aberta
continua em várias direcções. Presta-se atenção à influência dos grupos e da
pertença aos grupos sobre o comportamento individual e abordam-se as
relações entre vários traços da personalidade e comportamento social. As
atitudes são também um domínio de estudo prioritário neste período. Em
comparação com o período precedente (até aos anos trinta), o interesse dos
investigadores já não estava tanto centrado na medida das atitudes quanto na
explicação das mudanças de atitudes. Em finais dos anos 50, Festinger propôs
a teoria da dissonância cognitiva (postula que as pessoas encontram
insatisfatórias as incoerências entre duas cognições, ou entre os seus
pensamentos e o seu comportamento, e procuram reduzi-las mudando quer os
seus pensamentos quer os seus comportamentos) que focalizou a atenção dos
investigadores não só nos anos 50, mas igualmente nos anos 70. Hoje em dia,
ainda são efectuadas investigações neste domínio. Também em finais desta
década, Fritz Heider brindou a disciplina com o que ficou chamado de
"psicologia ingénua" em que se examina como as pessoas atribuem um sentido
à sua vida e tentam controlar o meio. Nesta mesma década a experimentação
tornou-se o método predominante de investigação (Adair, 1980).

Nos anos 60 o campo da psicologia social expandiu-se de modo acentuado. Os


psicólogos sociais fizeram incidir a sua atenção em áreas de investigação, tais
como porque é que obedecemos à autoridade, como é que efectuamos
julgamentos acerca do comportamento das pessoas, como negociamos e
resolvemos conflitos, como nos atraímos e fazemos amigos, porque é que
espectadores muitas vezes não ajudam em situações de emergência. No
Canadá, Wallace Lambert, Robert Gardner e outros autores dedicaram-se ao
estudo de aspectos psico-sociais do bilinguismo. Nesta década também
continuou a investigação em áreas de interesse social, tais como agressão,
preconceito e mudança de atitudes.

Ainda nos anos 60 psicólogos sociais europeus, como Serge Moscovici em


França e Henri Tajfel na Grã-Bretanha, lançaram as bases de uma psicologia
social diferente da desenvolvida nos Estados Unidos, que era vista como
estando muito impregnada nos sistemas de valores individualistas desse país
(Moghaddam, 1987). A psicologia social europeia colocou a partir daí uma
maior ênfase que a norte-americana no estudo das relações interpessoais e na
investigação de tópicos, como a influência do grupo minoritário, controlo
social, aspectos sócio-psicológicos da economia política e da ideologia (Taylor
e Moghaddam, 1987).

Apesar de nos anos 60 se assistir a um crescimento notório no domínio, surge

© Universidade Aberta 73
a crise de confiança levando psicólogos sociais a enveredarem por debates de
extrema vivacidade. É discutida a ética dos procedimentos utilizados na
investigação (Kelman, 1967), a validade dos resultados (Rosenthal, 1966), e
até que ponto é possível generalizar os resultados no tempo e no espaço
(Gergen, 1973). Grande parte deste debate tinha subjacente a reacção contra a
experimentação no laboratório, metodologia dominante no domínio. Ao invés,
os defensores dessa metQdologia consideravam-na ética, os resultados válidos
e suceptíveis de serem generalizados (McGuire, 1967).

Durante os anos 70, para além de se continuarem linhas de estudo dos anos
anteriores, foram postos em cena novos tópicos ou foram investigados com
um enfoque novo e mais sofisticado. Entre os mais importantes assinale-se a
atribuição, papéis sexuais e discriminação sexual, psicologia ambiental.

Encontrámos duas tendências que atravessam os anos 70 e 80: influência


crescente da perspectiva cognitiva e a ênfase na vertente aplicada. Se os
factores cognitivos, como as atitudes, as crenças, os valores têm sido uma área
de investigação privilegiada em Psicologia Social, como se disse, esses tópicos
têm sido olhados de uma nova forma recentemente. Muitos investigadores
julgam que o entendimento de uma ampla gama de fenómenos sociais pode ser
enormemente aumentada caso se adopte uma estratégia em que se procurem
compreender antes de mais os processos cognitivos que lhe são subjacentes
(Markus e Zajonc, 1985). Através desta perspectiva, procura-se saber como
opera a memória, como ocorre o raciocínio e como é integrada a informação
pela mente humana em processos sociais complexos, como por exemplo, nos
estereótipos e nas decisões de grupo.

Nas duas últimas décadas tem-se também verificado um crescente interesse


pela investigação aplicada. Hoje, muitos psicólogos sociais concordariam com
o lema de Lewin: "O mundo é o meu laboratório". Uma plêiade crescente de
psicólogos sociais têm aplicado os seus conhecimentos e competências aos
domínios da saúde, dos processos legais, do funcionamento das organizações.
Esta tendência reflecte, em parte, o facto de que as teorias na disciplina estão
suficientemente desenvolvidas para poderem ser aplicadas a problemas sociais
importantes. Esta tendência pode também ser o reflexo de uma procura de
"relevância" nas ciências sociais.

Pode-se verificar no quadro 1.4 o modo como os psicólogos SOCIaIS


americanos vêem a sua disciplina. Segundo esse inquérito, no futuro os dois
tópicos mais populares na investigação serão os da abordagem cognitiva e os

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da psicologia social aplicada. A grande maioria dos sujeitos pensa que a
Psicologia Social será mais útil na vida quotidiana.

Para além da influência da perspectiva cognitiva e da vertente aplicada, que na


nossa opinião também irão obter ainda uma maior expressão no futuro, duas
outras perspectivas vão ocupar mais os psicólogos sociais, a saber, o estudo
do papel do afecto e uma maior sensibilização à variação cultural.

Categoria Percentagem *
Psicólogos sociais mais importantes

Leon Festinger (mudança de atitude) 79

Fritz Heider (cognição social/teoria da atribuição) 43

Harold Kelly (teoria da atribuição) 30

Solomon Asch (conformidade) 11

Stanley Schacter (atribuição e emoções) 11

Necessidades mais importantes da Psicologia Social

Providenciar integração teórica 54

Desenvolver uma linguagem objectiva (teoria) para descrever 23


os fenómenos sociais

Desenvolver uma melhor metodologia de investigação 7

Criar um clima mais receptivo para a investigação social 11


aplicada

Providenciar um conjunto efectivo de critérios para avaliar a 5


investigação

75
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o rigor da predição irá aumentar?
o rigor irá aumentar até a um ponto em que as predições serão 23
semelhantes às predições da ciência física

o rigor aumentará mas não tanto 66

o rigor não aumentará de forma significativa 11

A Psicologia Social será mais útil na vida quotidiana?

A Psicologia Social será tão indispensável na resolução dos 26


problemas sociais como o é hoje a biologia na agricultura

Nunca será tão indispensável, mas falando em geral, a 6


psicologia social será mais útil na vida quotidiana do que é
hoje

Tópicos mais populares na investigação previstos para a


próxima década

Tópicos relacionados com uma abordagem cognitiva 73

Tópicos relacionados com psicologia social aplicada 40

Tópicos de dinâmica de grupos 14

*As percentagens não podem totalizar 100 porque os sujeitos podiam escolher várias
respostas.

Fonte: Lewicki, 1982.

Quadro 1.4 - Como é que os psicólogos sociais vêem a sua disciplina

Em resposta, pelo menos em parte, ao aumento de interesse por varIOS


aspectos do pensamento social, muitos investigadores têm chamado a atenção
para a focalização no impacto do lado emocional das nossas vidas (Schwartz,
1990; Neto, 1992). Para além disso, um volume crescente de investigação tem-
se focalizado nas complexas interacções entre afecto e cognição.

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Os psicólogos sociais estão-se também a tornar mais sensíveis ao impacto da
cultura no comportamento social. Aperceberam-se que os princípios que
influenciam um grupo podem não se aplicar noutro país, nem mesmo a todos
os grupos dentro do mesmo país. Dado que o mundo se está tornando cada
vez mais interdependente, os psicólogos sociais pensam que o seu campo deve
tornar-se cada vez mais internacional e multicultural.

Tais tendências não significam que todos ou quase todos os psicólogos sociais
desertem dos laboratórios, e que todas as suas publicações tenham um cariz
aplicado imediato. Com o aparecimento de novas tendências emergirão outros
interesses na investigação e outras técnicas. Suceda o que suceder no campo
da Psicologia Social, ela permanecerá activa na prosecussão da sua
contribuição para o bem-estar humano.

A síntese da história da Psicologia Social que acabámos de delinear é


indubitavelmente limitada e selectiva. Também não estava nas nossas
perspectivas efectuar um estudo exaustivo e sistemático da história desta
disciplina, pois não tínhamos como objectivo primordial a pesquisa histórica,
mas tão somente um bosquejo do passado da Psicologia Social. Refira-se ainda
que já existem alguns textos de história da Ciência em que se analisa o
percurso histórico da Psicologia Social (e. g. Sahakian, 1974; Schellengerg,
1978). Este último autor descreveu, em particular, as contribuições de quatro
grandes mestres para o domínio da Psicologia: S. Freud, G. H. Mead, B.
Skinner e K. Lewin.

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4. A Psicologia Social como ciência

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Os psicólogos SOCIaIS querem compreender as pessoas e ajudá-las a
remediar problemas humanos. Escritores, artistas, músicos, filósofos e
muitas outras categorias de pessoas também querem compreender e ajudar
os outros. Frequentemente essas pessoas propiciam uma compreensão da
natureza humana. Os psicólogos sociais diferenciam-se na medida em que
enveredam por uma abordagem científica para os seus assuntos.

Pode-se entender por ciência um corpo organizado de conhecimentos que


advêm da observação objectiva e de testagem sistemática. A palavra
ciência refere-se a todas as áreas que podem ser estudadas de modo
sistemático e objectivo e não a um assunto particular.

As ciências naturais, como a biologia, a botânica, a física, a química e a


zoologia tentam explicar observações acerca da natureza e do mundo
físico. As ciências comportamentais, como a antropologia, a etologia, a
psicologia e a sociologia, abordam observações acerca de actividades,
como sejam operações mentais e respostas motoras, de animais e de seres
humanos. A expressão ciências sociais refere-se às ciências
comportamentais e disciplinas afins (economia, ciência política) que
abordam actividades das pessoas inseridas em comunidades humanas. A
Psicologia Social investiga as acções de indivíduos e de indivíduos dentro
de grupos, sendo assim uma ciência comportamental e social.

No âmbito das ciências, as teorias ajudam-nos a compreender como e


porque é que as coisas acontecem. O termo "teoria" designa para os
cientistas uma descrição de relações entre símbolos que representam a
realidade (Hall e Lindzey, 1978). Por exemplo, a atitude é um símbolo
abstracto utilizado para representar a realidade de que indivíduos têm
preferência por certos objectos específicos. Não pode ver ou tocar uma
atitude, pois não é real, mas utiliza-se o conceito de atitude para
representar coisas que são reais, tais como a preferência por um campo de
futebol relvado em relação a um pelado. Aplica-se o termo construto
quando um símbolo abstracto numa teoria é definido em termos de
acontecimentos observáveis. O construto locus de controlo, discutido no
capítulo 3, é muitas vezes definido em termos de resposta a um
questionário. Todas as teorias contêm aspectos que não podem ser
provados como verdadeiros em sentido absoluto, na medida em que são
abstractos. No entanto, todas as teorias apresentam objectivos comuns.

81
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I
4.1 Investigação científica

A psicologia social utiliza o método científico para estudar o


comportamento social. Mesmo se não existe consenso dentro da filosofia
da ciência sobre como se efectua a investigação científica, poucos autores
discordam que o método científico implica observação sistemática,
desenvolvimento de teorias que explicam essas observações, uso de teorias
que engendram predições acerca de observações futuras e revisão de
teorias quando as predições não estão certas. É este processo que assegura
que todas as pessoas que se movem dentro de uma disciplina falem a
mesma linguagem.

A recolha de observações pelos cientistas implica que eles sigam um certo


número de regras estabelecidas. Mas a ciência não se limita a ficar por
observações precisas, exigindo explicações. São precisamente as teorias
que nos ajudam a explicar o que se observa. Uma teoria consiste na
formação de regras gerais tendo por alicerce observações específicas
efectuadas. A esta passagem de observações específicas a regras gerais ou
teorias chama-se indução lógica. Por exemplo, poder-se-ia propor uma
teoria segundo a qual as pessoas preconceituosas têm e fazem amigos que
também são preconceituosos. Ter-se-ia antes de mais de se saber até que
ponto há evidência a favor desta teoria, após o que se poderia decidir se a
teoria é verdadeira ou falsa.

Mas uma teoria não se formula só para explicar observações precisas. Deve
também poder explicar e sugerir novas observações que se podem utilizar
para testar a teoria. Uma teoria deve ser capaz de fazer predições acerca de
fenómenos com recurso à lógica dedutiva. Ou, por outras palavras, uma
teoria deve poder gerar hipóteses susceptíveis de serem testadas. Pode-se,
por exemplo, deduzir a hipótese de que os homens que têm preconceitos
contra as mulheres tenderão a ter amigos do sexo masculino que também
são sexistas. Pode-se igualmente deduzir que as pessoas que têm
preconceitos em relação aos emigrantes terão amigos que têm preconceitos
em relação a emigrantes. Para se poder testar a validade de uma hipótese
ou de ambas necessitamos antes de mais de ter à nossa disposição alguma
medida fidedigna do tipo específico de preconceito. Só depois podemos
verificar se a relação entre pessoas com preconceitos e os seus amigos era
como se tinha previsto. No caso positivo teríamos encontrado uma
evidência a favor da teoria; no caso negativo, ter-se-ia obtido evidência
contra a teoria.

O conhecido filósofo da clencia Karl Popper mostrou que uma teoria


científica não pode logicamente ser provada como verdadeira, mas pode

82
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ser refutada. Popper defende que para uma teoria ser científica deve, em
princípio, ser capaz de refutação empírica. Uma teoria nunca pode ser
aceite como verdadeira, pois não há garantia que no futuro será a mesma
que no passado.

A ciência cresce e muda constantemente. Uma ciência como a Psicologia


Social, apesar de ser jovem, tem-se caracterizado por revisões contínuas
das questões de investigação, dos métodos e das teorias.

o que é que faz que uma teoria seja "boa"? O valor de uma teoria depende
de um certo número de qualidades (Ryckman, 1985; Shaw e Costanzo,
1982). Em primeiro lugar, uma teoria deverá estar em concordância com
dados conhecidos, incorporando o que se encontrou acerca do
comportamento humano. Em segundo lugar, uma teoria é compreensiva,
tentando compreender e explicar um amplo leque de comportamentos. Em
terceiro lugar, uma teoria é parcimoniosa, não contendo mais que os
elementos necessários para explicar o assunto em questão. Um quarto
critério para uma boa teoria é se se pode testar, fornecendo meios
mediante os quais hipóteses específicas e predições podem ser suscitadas e
subsequentemente testadas por investigação. Se uma teoria não permite
suscitar predições que se possam testar, nesse caso a sua validade empírica
nunca pode ser avaliada de modo satisfatório. Um quinto critério para uma
teoria é o seu valor heurístico, isto é, em que medida estimula o
pensamento e a investigação e desafia outras pessoas a desenvolverem e
testarem teorias opostas. Finalmente, a utilidade ou valor aplicado de uma
teoria é um atributo importante.

Os psicólogos sociais interessam-se pelas teorias porque desejam ajudar a


sociedade a viver melhor. As teorias podem ajudar as pessoas aumentando
a compreensão, aumentando a sensibilização e dando acesso a novos
modos de se comportar.

Os psicólogos sociais tentam apreender os padrões da vida social e criar


termos para que as pessoas possam comunicar sobre eles. As teorias
permitem compreender e comunicar esta compreensão aos outros. Por
exemplo, vários psicólogos sociais preocupam-se com questões ecológicas.

As teorias podem também servir para sensibilizar, para identificar os


factores susceptíveis de influenciar a vida quotidiana e para prestar atenção
às consequências das suas acções. Apesar das teorias não permitirem
efectuar predições com precisão, podem ser extremamente úteis para
sugerir eventuais cenários e os seus motivos. É assim possível preparar
melhor o futuro com a ajuda dessas sugestões.

83
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Os psicólogos sociais tentam elaborar teorias que aumentem na pessoa a
tomada de consciência de deficiências na vida quotidiana e permitam guiá-
la para opções mais satisfatórias. A utilização de teorias pode assim libertar
as pessoas de determinados constrangimentos do dia a dia. Vários
psicólogos sociais esperam que as pessoas se abram a ideias novas quando
confrontadas com teorias novas. Uma teoria com estas possibilidades foi
chamada de generativa (Gergen, 1978). Esta teoria dá às pessoas a
possibilidade de se interrogarem sobre o que acreditavam antes e permite
optar por novas relações em vez de conservarem crenças dogmáticas.

4.2 Objectivos científicos da Psicologia Social

De um modo geral os psicólogos sociais tentam associar as suas teorias


com traballios empíricos. Procura-se assim proporcionar informação sobre
os padrões de comportamento social, predizer acontecimentos futuros e
aumentar a força da teoria pela sua demonstração. Nesta secção
abordaremos os objectivos centrais da investigação em psiéologia Social
que se podem condensar em quatro: descrição, explicação, predição e
controlo.

O primeiro objectivo da investigação social é descrever os fenómenos que


se observam. A descrição emana naturalmente da colecção sistemática de
factos e de observações acerca de qualquer fenómeno.

Para se ilustrar como a investigação sistemática pode permitir uma melhor


compreensão dos aspectos da vida social consideremos o problema da
brutalidade policial. Não faltam exemplos do abuso do poder policial. Qual
é a reacção do público perante a brutalidade policial?

Com o intuito de se estudar este problema foi entrevistada uma amostra


aleatória de sujeitos nos Estados Unidos (Gamson e McEvoy, 1970). Às
pessoas interrogadas eram pedidas, entre outras, opiniões sobre as
seguintes questões: 1) a polícia não tem razão em bater em manifestantes
que não estão armados, apesar destes injuriarem a polícia; 2) a polícia
utiliza muitas vezes mais força do que seria necessário; 3) uma pessoa que
insulta um polícia tem razão em se queixar se lhe batem. Os investigadores
classificaram os sujeitos em dois grupos: os que estavam de acordo em
criticar a violência policial e os que não se opunham.

Os resultados deste estudo mostraram que entre os Brancos nos Estados


Unidos, só 27% se opunham à violência policial. Não havia quase nenhuma

84
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oposlçao à violência policial nas pessoas com mais de 50 anos, com
desafogo financeiro e nos republicanos. Todavia entre os Negros, isto é,
aqueles que mais sofriam da violência policial, 69% opunham-se à violência
policial em cada um dos casos citados acima. Estes sentimentos eram
partilhados pelas pessoas brancas jovens e instruídas.

Estes resultados sugerem que uma das principais razões da brutalidade


policial nos Estados Unidos é que é aprovada pela maioria. Os resultados
também sugerem informações que podem ser utilizadas para promover a
mudança social. O facto de se viver sob o signo da democracia não confere
à maioria o direito de perseguir a minoria impunemente. Há recursos legais
e políticos que podem ser accionados quando a minoria é o alvo principal
da brutalidade policial. Finalmente, para mudar a situação parece que as
pessoas jovens e instruídas podem desempenhar um papel importante.

O segundo principal objectivo da Psicologia Social é a explicação que


pressupõe a identificação das relações causais que produzem
comportamentos particulares. Uma coisa é descrever padrões de
comportamento e outra é desenvolver teorias para explicar o que se
observou. Se, por exemplo, num grupo de pessoas observamos que há
significativamente mais homens altos que baixos exibindo comportamentos
homossexuais, pode-se tentar explicar esta observação teorizando que o
crescimento físico pode ser um factor que causa a homossexualidade
masculina.

Mas a teoria pode estar errada. A melhor medida de uma teoria é a sua
capacidade em fazer predições certas. Efectivamente a predição é o
terceiro objectivo principal da Psicologia Social. A sociedade defronta-se
com problemas importantes para os quais predições fidedignas seriam
preCIOsas.

Assiste-se a um aumento da incidência da violação. A expenencia de


violação parece ter efeitos acentuados no sentido da segurança das vítimas,
na auto-estima, nas relações interpessoais, etc. Uma questão importante
que se levanta é a de se saber quanto tempo esses efeitos poderão perdurar.
Uma vítima de violação está amedrontada do ponto de vista psicológico
para toda a vida ou é susceptível de recuperar dentro de alguns dias ou de
algumas semanas? Kilpatrick, Resick e Veronen (1981) tentaram responder
a essa questão. Administraram uma bateria de testes psicológicos a vítimas
de violação um mês depois da experiência, novamente seis meses depois e
um anos depois. Os resultados foram comparados com os de uma amostra
de pessoas que não tinham experienciado a violação. Os resultados foram
simultaneamente decepcionantes e prometedores. Encontrou-se que

85
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comparativamente com as não-vítimas de violação, as vítimas mostravam
efeitos acentuados da experiência ao longo do tempo do estudo. Mesmo
um ano depois apresentavam mais medo, ansiedade, suspeição e confusão
que as não vítimas. A violação pode assim ter efeitos a longo termo. Os
resultados indicaram também que a intensidade dos efeitos diminuía ao
longo do tempo. O estudo mostrou que os efeitos da violação não são
necessariamente duradoiros. Encontram-se de um modo geral melhoras de
bem-estar.

As teorias e as predições ajudam a compreender os motivos da ocorrência


de fenómenos comportamentais. O quarto objectivo da Psicologia Social é
controlar quando ou se ocorrem fenómenos comportamentais. Para
mostrar a desejabilidade deste objectivo eis um exemplo. A maior parte das
pessoas estão de acordo que é desejável reduzir o número de mortes
devidas a acidentes de automóvel. A partir do momento em que
investigações mostraram que a utilização dos cintos de segurança poderia
diminuir os ferimentos em acidentes de automóvel, pode-se querer fazer
com que as pessoas utilizem os cintos. Para se atingir esse objectivo seria
necessário dispor de uma descrição das pessoas que utilizam os cintos e em
que circunstâncias são mais susceptíveis de os porem. A partir daí pode-se
desenvolver uma teoria para explicar as observações feitas e assim poderão
ser identificadas as razões sócio-psicológicas que fazem com que as
pessoas ponham os cintos de segurança. Com base na teoria e nas
predições efectuadas os psicólogos sociais podem recomendar
superiormente programas educativos que chamem a atenção para as
consequências nefastas de não se utilizarem os cintos de segurança. Caso
após a introdução desses programas se verifique uma diminuição de
acidentes fatais de automóvel, poder-se-ia concluir que esta acção contribui
para controlar a taxa de mortes devidas a acidentes de automóvel.

Em resumo, a investigação pode fornecer informação fidedigna sobre a


sociedade, explicá-la, permitir predições e controlar a ocorrência de
fenómenos comportamentais. Uma vez que já examinámos os principais
objectivos da Psicologia Social, antes de explorarmos as principais teorias
deste domínio, passamos a fazer uma descrição do processo de
investigação.

4.3 O processo de investigação em Psicologia Social

Os psicólogos sociais para estudarem de modo eficaz o comportamento


social, devem planear meticulosamente e executar os seus projectos de
investigação. Este processo científico pode sintetizar-se em sete etapas.

86
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A primeira etapa no processo de realização de um estudo é seleccionar um
tópico de investigação. É necessário desenvolver uma ideia acerca do
comportamento que valha a pena explorar. As ideias de investigação não se
desenvolvem num vácuo social. As mais variadas fontes podem servir ao
cientista para ter ideias. A inspiração pode advir da investigação de
alguém, de um incidente nas notícias quotidianas, ou até mesmo de alguma
experiência pessoal ocorrida na vida do investigador. Geralmente os
psicólogos sociais investigam tópicos que são relevantes para as suas
próprias vidas e para a sua cultura.

Após a escolha de um tópico de investigação, a segunda etapa é a busca da


documentação de investigação que permite delimitar os estudos anteriores
efectuados sobre o tópico. Os resultados destes estudos anteriores
modelam em geral o decurso da investigação actual. Em muitos casos
reveste-se de grande dificuldade separar de modo claro as etapas 1 e 2.
Poderá acontecer que não se tenha ainda fixado um tópico de investigação
até se efectuar a procura da documentação. Acompanhar os novos
desenvolvimentos no domínio em que se está a efectuar a investigação, ao
mesmo tempo que se está a conduzir a própria investigação, é uma tarefa
que ocupa muito do tempo dos psicólogos sociais, como aliás de todos os
cientistas. Hoje em dia a busca da documentação, num primeiro momento,
está enormemente facilitada pelo recurso a base de dados do computador.

Uma vez que os cientistas sociais se colocaram ao corrente do


conhecimento actual sobre o tópico escolhido, a terceira etapa no processo
de investigação consiste na formulação de hipóteses. As hipóteses são
expectativas específicas sobre a natureza das coisas decorrentes de uma
teoria. São as implicações lógicas da teoria.

Após o desenvolvimento de hipóteses a quarta etapa consiste na escolha de


um método de investigação que permitirá testar as hipóteses. Os dois
principais métodos utilizados pelos psicólogos sociais nas suas
investigações são o correlacional e o experimental. A escolha do método é
muitas vezes determinada pelo local onde se realiza a investigação. A
investigação psico-social ocorre geralmente num de dois contextos: o
laboratório, um meio controlado, e no campo, um contexto natural. A
maior parte da investigação de laboratório recorre ao método experimental,
ao passo que a maior parte da investigação de campo é correlacionaI.

Após se haver completado o planeamento da investigação, passa-se à


recolha dos dados. Existem três técnicas básicas de recolha dos dados: 1)
auto-avaliações, 2) observações directas e 3) informação de arquivo. A
recolha de dados por meio de auto-avaliações permite medir estados

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subjectivos importantes, tais como percepções das pessoas, emoções,
atitudes. Todavia a desvantagem dos dados de auto-avaliação é de que se
baseiam em que as pessoas descrevem de modo certo estes estados
internos o que nem sempre podem ou querem fazer. Dada esta
desvantagem, muitos investigadores preferem observar directamente o
comportamento das pessoas. Esta técnica é amplamente utilizada em
estudos experimentais. Finalmente, os investigadores recorrem algumas
vezes a documentos existentes ou a arquivos para recolher informação que
pode ser valiosa sobre uma dada cultura.

Quando os dados foram recolhidos, a sexta etapa no processo de


investigação é efectuar a análise de dados. Na psicologia social
contemporânea esta etapa exige um conhecimento aprofundado de
procedimentos estatísticos e de programas de computador. As duas
espécies básicas de estatísticas utilizadas pelos psicólogos sociais são
descritivas e inferenciais. As estatísticas descritivas permitem fazer um
sumário e uma descrição do comportamento ou das características de uma
amostra particular de participantes num estudo, ao passo que as estatísticas
inferenciais vão para além de uma descrição e permitem fazer inferências
acerca de uma ampla população de que foi extraída a amostra. As
estatísticas inferenciais são utilizadas para avaliar a probabilidade de que
uma diferença encontrada nas pessoas estudadas também seria encontrada
se alguém da população participasse no estudo. Os psicólogos sociais
aceitam geralmente uma diferença estatisticamente significativa se a
probabilidade de ter ocorrido por mero acaso for menos de um em vinte,
isto é, uma probabilidade de menos de cinco por cento.

A sétima e última etapa no processo de investigação é apresentar o


relatório dos resultados. Tal pode efectuar-se publicando artigos em
revistas científicas, fazendo apresentações em congressos, ou informando
pessoalmente outros investigadores na disciplina. Mediante a difusão destes
resultados pode haver o aperfeiçoamento no trabalho e a compreensão do
comportamento social é enriquecida.

4.4 Meta-análise

Um dos problemas com que se defrontam muitas vezes os investigadores é


que o processo de investigação conduz frequentemente a resultados
contraditórios de um estudo para outro. Se, por exemplo, em nove estudos
se encontra que as raparigas sentem mais a solidão que os rapazes e que
em cinco estudos não aparecem diferenças segundo o sexo, que conclusões

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se podem tirar? No passado os investigadores utilizavam muitas vezes a
abordagem das "regras da maioria" para resolver essas discrepâncias. Neste
caso limitavam-se a contar o número de estudos em que se tinha
encontrado ou não um determinado efeito psicológico e concluíam então
que o efeito existia se ocorresse na maioria dos estudos. Para permitir
comparações mais sofisticadas, nos últimos quinze anos os investigadores
têm recorrido a técnicas denon:1Ínadas de meta-análise (Schmidt, 1992). A
meta-análise é uma técnica estatística que permite aos investigadores
combinar informação de muitos estudos empíricos sobre um tópico e
avaliar objectivamente a fidelidade e o tamanho global do efeito
(Rosenthal, 1984). Dado que em muitos estudos se podem encontrar
pequenas diferenças entre os grupos que não atingem os níveis estatísticos
de significação, a meta-análise pode determinar se estes pequenos efeitos
são efectivamente reais ou simplesmente erro de medida. Os procedimentos
de meta-análise têm sido particularmente úteis no estudo das diferenças
sexuais no comportamento social, como veremos no capítulo 7.

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5. Teorias em Psicologia Social

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Os psicólogos sociais desenvolveram muitas ideias diferentes sobre a vida
social. À questão "Que teoria deve ser utilizada para as investigações em
psicologia social?", não existe uma resposta simples, dado que nenhuma teoria
permite explicar de modo adequado todos os fenómenos sociais. O mesmo
acontece em todos os domínios científicos (por exemplo, a teoria da
relatividade de Einstein não pode explicar o fenómeno da aceleração dos
corpos em queda livre). Certas teorias são globais ou gerais, enquanto que
outras são mais particulares e restritas na sua aplicação e predições. Entre as
principais posições teóricas amplas em Psicologia Social figuram as teorias da
aprendizagem, as teorias cognitivas e as das regras e papéis. As teorias da
aprendizagem têm as suas origens nos princípios básicos do behaviourismo que
salientou o condicionamento clássico e a aprendizagem através de reforço ou
recompensa. As teorias cognitivas têm as suas origens na psicologia da gestalt.
Focalizam-se nos processos cognitivos que estão subjacentes às nossas
percepções e julgamentos acerca de nós próprios e dos outros em situações
sociais. A terceira orientação, mais com pendor sociológico, põe em evidência
a ideia de que os pensamentos e os comportamentos dos indivíduos são o
resultado de interacções que têm com outras pessoas e do significado que elas
dão às interacções e papéis.

No seio destas três orientações teóricas gerais é possível desenvolverem-se


modelos mais limitados, por vezes chamados mini-teorias, que tentam explicar
um leque mais restrito do comportamento humano. Aliás a tendência actual em
psicologia social é utilizar mini-teorias próprias para fenómenos precisos, tais
como o amor romântico ou a solidão. Muitas dessas teorias mais limitadas
serão apresentadas nos capítulos subsequentes. Propomo-nos mostrar aqui que
a orientação teórica adaptada pelo investigador conduzi-Io-á a colocar certas
questões acerca do comportamento que se está a estudar. Consoante os
princípios básicos da teoria a que o investigador recorre, focalizar-se-á no
indivíduo ou no meio, em circunstâncias passadas ou presentes, em
comportamentos limitados ou em acontecimentos globais.

Para ilustrar que tipo de questões podem ser colocadas, consoante a teoria por
que se enverede, recorreremos ao caso do Manuel e da Maria. Conheceram-se
e apaixonaram-se quando ambos frequentavam a Universidade, o Manuel
estudante de Economia e a Maria de Psicologia. O Manuel era oriundo da
classe média e tentava melhorar a sua situação na vida através de um árduo
trabalho como estudante. A Maria é oriunda da classe alta e aspirava a ajudar
crianças com dificuldades. Mesmo se os pais de ambos não viam o noivado

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com muitos bons olhos, casaram-se após a conclusão dos respectivos cursos.
Com o decorrer do tempo, os pais do Manuel e da Maria foram-se entendendo
melhor com a nova falllilia e o Manuel até assurrúu a orientação da empresa
dos pais da Maria. Maria dedicou-se ao cuidado de três filhos e, quando
cresceram, pôde enfim concretizar um velho sonho. Abriu um consultório para
tratamento de crianças com dificuldades psicológicas. Trata-se de uma história
aparentemente banal. Ora factos inscritos no quotidiano das pessoas são
objecto de grande interesse por parte dos psicólogos sociais.

5.1 Teorias da aprendizagem

Durante muitos anos, as teorias da aprendizagem foram a orientação


dominante em Psicologia. O seu núcleo é a ideia de que o comportamento de
uma pessoa é determinado pela aprendizagem anterior. A teoria da
aprendizagem tornou-se popular nos anos 1920, estimulada pelos trabalhos
sobre associação ou condicionamento "clássico" do psicólogo russo Ivan
Paviov e do americano John Watson. Posteriormente, Clark Hull e B. Skinner
exploraram os princípios do reforço. Esta abordagem, aplicada ao
comportamento social por Albert Bandura e outros autores, chamou-se de
aprendizagem social.

5.1.1 Mecanismos de aprendizagem social

Há três mecanismos gerais mediante os quais as pessoas aprendem coisas


novas. Um é através da associação ou condicionamento clássico. Nas
experiências de Pavlov cães aprendiam a salivar ao som de uma campainha
porque era-lhes apresentada corrúda sempre que a campainha tocava.
Posteriormente salivariam ao som da campainha mesmo na ausência de corrúda
porque associavam a campainha com corrúda. Associações similares são
suscitadas nas pessoas que vivem no mundo social. Por exemplo, a palavra
"Nazi" é geralmente associada a crimes horrorosos. Aprendemos que os Nazis
são maus porque aprendemos a associá-los a algo de horroroso.

o segundo mecanismo de aprendizagem é o reforço. As pessoas aprendem


através de recompensas e de castigos. Por exemplo, as crianças aprendem a

94
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regular o seu comportamento social porque, em parte, os pais reforçam de
modo selectivo comportamentos desejáveis, usando reforços tais como
sorrisos e rebuçados. Ao inverso, comportamentos emitidos pela criança que
não são desejáveis para os outros, como seja gritar ou bater, são seguidos por
reforços negativos, tais como olhares carrancudos ou reprimendas. Pouco a
pouco a criança aprende quais são os comportamentos aceitáveis e os que o
não são.

o terceiro principal mecanismo é a aprendizagem observacional ou imitação.


Uma parte importante do comportamento humano é adquirido através de
instrução directa e por observação do comportamento dos outros (Bandura e
Walters, 1963; Miller e Dollard, 1941). As pessoas aprendem muitas vezes
atitudes sociais a comportamentos através da simples observação de atitudes e
comportamentos de modelos. Crianças e jovens podem adquirir as suas
atitudes políticas ouvindo simplesmente as conversas dos pais aquando de
campanhas eleitorais. A imitação pode ocorrer na ausência de qualquer reforço
externo, através da simples observação do modelo.

5.1.2 Contribuições

A aplicação dos princípios da aprendizagem no estudo do comportamento


social suscitou um interesse continuado em psicologia social (Lott e Lott,
1985). As teorias da aprendizagem têm-se utilizado para explicar muitos
fenómenos sócio-psicológicos, como a atracção interpessoal, a agressão, o
altruísmo, o preconceito, a formação de atitudes, a conformidade e a
obediência. Por exemplo, Byrne (1971) propusera que gostamos das pessoas
que são semelhantes a nós numa série de dimensões porque tal semelhança é
agradável.

Nalgumas dessas áreas a teoria da aprendizagem é a orientação teórica


dominante a que se tem recorrido. Todavia noutras só é utilizada de modo
periférico.

As teorias da aprendizagem têm sido particularmente úteis na estimulação, por


parte dos investigadores, da procura de acontecimentos ambientais ligados às
acções das pessoas. Estes teóricos defendem que uma melhor compreensão do
efeito de acontecimentos ambientais torna possível prever a sua influência. É
então possível assegurar um controlo sobre acontecimentos influenciando as

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© Universidade Aberta
pessoas a terem vontade de agIr de determinado modo em detrimento de
outro.

Tentando aplicar a teoria do reforço às relações entre o Manuel e a Maria, o


teórico estaria atento aos padrões de reforço. Porque é que a Maria decidiu
casar-se com o Manuel? Por dinheiro? Pela fama? Pelo calor emocional?
Decisões ulteriores na vida do casal também seriam interpretadas tendo em
conta os reforços eventuais.

5.2 Teorias cognitivas

As teorias da aprendizagem são muitas vezes criticadas por terem uma "caixa
negra" para o comportamento humano. É salientado o que entra na caixa
(estímulo) e o que sai da caixa (resposta), mas é prestada pouca atenção ao
que se passa dentro da caixa. Os elementos do interior - emoções e cognições
- são a principal preocupação das teorias cognitivas. A ideia principal das
teorias cognitivas para a Psicologia Social é que o comportamento de uma
pessoa depende do modo como percepciona a situação social.

5.2.1 Princípios básicos Se as experiências de PavIov


da aprendizagem, os teóric
Uma ideia central para esta orientação é que as psicólogos da Gestalt. Psicólo
pessoas tendem
saber como que os processo
espontaneamente a agrupar ou a categorizar objectos. Uma segunda éideia
mundo
central é que percepcionamos imediatamente algumas coisas comoexterior.
sendo Para ele
salientes (figura) e outras como estando atrás (fundo).acontecimentos como "todos d
Geralmente
percepcionamos os estímulos coloridos, em movimento, barulhentos, únicos,
próximos, como figura, e os estímulos suaves, monótonos, estacionários,
quietos, longínquos, como fundo.

96
© Universidade Aberta
Os dois princípios, isto é, que agrupamos e categorizamos espontaneamente as
coisas que percepcionamos e que prestamos particular atenção aos estímulos
mais salientes, não são só centrais para a nossa percepção de objectos físicos.
São também centrais para a nossa percepção do mundo social. Estes princípios
cognitivos são importantes para o modo como interpretamos o que as pessoas
sentem, querem e que tipo de pessoas são. Essas interpretações concretizam-
se, por exemplo, através da expressão de intenções, motivações, atitudes,
traços e personalidade.

Os princípios cognitivos estudam como é que as pessoas processam a


informação. No domínio da Psicologia Social a investigação sobre cognição
social aborda o modo como processamos informação social acerca de pessoas,
de situações sociais e de grupos. A investigação sobre a cognição social tem
sido efectuada em três áreas: percepção social, memória social e julgamentos
sociais. Em primeiro lugar uma pessoa percepciona um estímulo social, depois
deve armazenar de alguma forma uma representação desse estímulo na
memória, para mais tarde o utilizar para fazer julgamentos sociais.

Ao nível perceptivo os psicólogos sociais interessam-se em como certas


estruturas cognitivas nos ajudam a prestar atenção a vastas quantidades de
informação acerca das outras pessoas e das situações sociais. Ao nível da
memória social, os psicólogos sociais examinam como é que os indivíduos
armazenam informação acerca de pessoas e de acontecimentos sociais. As
representações que as pessoas têm nas suas cabeças acerca de pessoas e de
acontecimentos chamam-se esquemas. Os esquemas representam o
conhecimento integrado que temos a respeito do nosso meio social. A
investigação sobre a memória social focalizou-se no modo como as pessoas
recuperam informação quando dela necessitam. Ao nível dos julgamentos
sociais, os psicólogos sociais examinam os modos como as pessoas integram
ou juntam informação para chegar a inferências e conclusões acerca do mundo
social.

Uma outra direcção de investigação cognitiva em que a Psicologia Social tem


sido fértil é o estudo de atribuições causais, isto é, os modos como as pessoas
usam a informação para determinar as causas do comportamento social. No
âmbito desta perspectiva teórica as pessoas são vistas como cientistas
ingénuos que consideram ao mesmo tempo várias fontes de informação para
efectuar conclusões sobre as causas do comportamento. Por exemplo, porque
é que se pensa que alguém acabou o namoro? Porque é que uma vítima de
violação resiste com sucesso ao atacante e outra não faz esforço?

© Universidade Aberta 97
5.2.2 Contribuições

As teorias cognitivas permitem explicar situações que parecem numa primeira


abordagem incompreensíveis. Suponha que acaba de tomar conhecimento da
sua nota da primeira chamada em psicologia social: 14. Para si é uma boa nota,
pois não estudou muito. No mesmo instante ouve uma estudante que está ao
seu lado a ver as pautas soltando um grito de dor e uma série de insultos.
Pergunta-lhe tranquilamente a sua nota e ela responde de modo agressivo: "14,
um verdadeiro desastre... " Como é que a mesma nota pode suscitar efeitos tão
diferentes em duas pessoas? É este tipo de fenómenos, entre outros, que as
teorias cognitivas tentam explicar. Para esta abordagem a resposta está na
percepção do resultado do exame e do que ele representa para a estudante, e
não na nota em si, ou no aspecto objectivo do estímulo.

Muitos dos estudos a que se fará referência nos capítulos seguintes estão de
alguma forma ligados à orientação cognitiva. Por exemplo, uma aplicação
directa desta orientação tem sido a investigação sobre como é que as pessoas
formam impressões de outras pessoas. Os psicólogos sociais, seguindo a
tradição da gestalt, examinaram como é que o nosso conhecimento dos traços
individuais é combinado para formar impressões globais das pessoas
(Burnstein e Schul, 1982). Muitas teorias das mudanças de atitudes também
estão baseadas nos princípios cognitivos. As teorias da consistência cognitiva
postulam, por exemplo, que estamos motivados para conservar cognições de
acordo com outra cognição ou com um comportamento consistente.

No caso do Manuel e da Maria a teoria cognitiva prestaria atenção ao seu


conhecimento e ao significado que têm para eles várias experiências. Em
consonância também com as teorias da aprendizagem, focaliza-se
fundamentalmente a atenção num indivíduo. Todavia, diferentemente das
teorias da aprendizagem, as teorias cognitivas levariam o investigador a tomar
em consideração os modos como cada um dos elementos se vêem. Poder-se-
ia, por exemplo, examinar como é que um elemento do casal explica o
comportamento do outro. As atribuições são efectuadas em termos de traço de
personalidade ou de situações? Que crenças tem cada elemento acerca do
outro e de outras pessoas que para ele são significativas? Em geral a
orientação cognitiva não olha tanto para os acontecimentos actuais quanto
para os pontos de vista de cada elemento acerca desses acontecimentos.

98 © Universidade Aberta
I

5.3 Teoria dos papéis

A Psicologia Social tem as suas raízes não só na Psicologia, como também na


Sociologia. Efectivamente há autores que encaram a Psicologia Social como
um domínio de encruzilhadas entre as disciplinas da Psicologia e da
Sociologia. Aulas com o título de Psicologia Social são muitas vezes
asseguradas nas Faculdades de Psicologia e de Sociologia. Consideremos pois
uma abordagem sociológica para a Psicologia Social examinando a teoria dos
papéis. Ainda que seja possível delinear o seu começo nas concepções dos
papéis teatrais há mais de dois milénios em autores gregos, foi George Herbert
Mead (1913) que tornou o conceito de papel popular na sua análise do self
em relação com as pessoas que nos rodeiam.

5.3.1 Princípios básicos

Embora se esteja a utilizar o termo teoria do papel, não se trata efectivamente


de uma teoria única. Trata-se de uma rede ligada de hipóteses e de um
conjunto bastante amplo de construtos (Shaw e Costanzo, 1982). De modo
diferente das teorias da aprendizagem, esta abordagem presta pouca atenção
aos determinantes individuais do comportamento. Por exemplo, raramente
recorre a conceitos de personalidade, atitudes, motivação. Em vez disso, o
indivíduo é visto como um produto da sociedade em que vive e como um
indivíduo que contribui para essa sociedade. Por isso, em contraste com as
teorias mais psicológicas que apresentamos anteriormente, a teoria dos papéis
dá mais atenção a amplas redes sociais.

o termo "papel" é central para esta abordagem. Pode definir-se como a


posição ou função que uma pessoa ocupa no seio de um determinado contexto
social (Shaw e Costanzo, 1982). Uma pessoa pode desempenhar
simultaneamente muitos papéis. Por exemplo, pode dar consigo a desempenhar
o papel de estudante universitária, de irmã, de namorada, de jogadora de
futebol... Estes vários papéis são guiados por determinadas expectativas que
os outros têm acerca do comportamento. Por exemplo, os estudantes podem
ter expectativas de papéis para os professores, esperando que estejam a certa
hora na sala de aula, que sejam peritos num dado assunto, que digam algo de
compreensivo. Esses papéis também são guiados por normas que são
expectativas mais generalizadas acerca do comportamento, internalizadas no

99
© Universidade Aberta
As pessoas realizam uma série de papéis todos os dias.

decurso da socialização. Por exemplo, temos normas gerais acerca das


interacçães adequadas entre as pessoas investidas de autoridade e as
subordinadas que se desenvolveram a partir da experiência de papéis mais
específicos. E, como já teve certamente ocasião de experimentar, os papéis
muitas vezes entram em conflito uns com os outros. Conflitos de papéis
ocorrem quando uma pessoa ocupa diversas posições com exigências
incompatíveis (conmto interpapel) ou quando um só papel tem expectativas
que são incompatíveis (conflito intrapapel). Por exemplo, uma estudante está a
fazer serão para preparar um exame para o dia seguinte e o seu namorado
telefona-lhe para irem até uma discoteca. Essa estudante pode experienciar um
conflito interpapel, pois os papéis de estudante e de namorada não podem ser
preenchidos ao mesmo tempo. Uma estudante experienciaria um conflito
intrapapel se tivesse de escolher entre estudar para um exame a efectuar no dia
seguinte e concluir um trabalho de grupo que também tem de ser concluído
para o dia seguinte.

100
© Universidade Aberta
5.3.2 Contribuições

o conceito de papel tem sido amplamente utilizado em Psicologia Social.


Neste domínio frequentemente se recorre a termos como modelo de papel,
jogo de papel, tomada de papel. Este conceito dá conta da possível mudança
de comportamento das pessoas quando a sua posição na sociedade muda.

A teoria dos papéis suscitou várias investigações e mini-teorias em psicologia


social. As investigações sobre as normas sociais (Sherif, 1935) e sobre os
processos de comunicação (Shannon e Weaver, 1949) constituem posições
teóricas que fazem apelo a conceitos ligados à teoria dos papéis.

o conceito de doença mental pode ser revisto a partir da teoria dos papéis.
Acredita-se geralmente que o doente mental é o produto de uma personalidade
perturbada que tem problemas profundos e duradoiros, nada tendo a ver com a
situação. Todavia, segundo a teoria dos papéis, a doença mental é muitas
vezes aprendida quase como alguém aprende um papel numa peça de teatro.
Há doentes mentais que agem de modo a provocar efeitos particulares
correspondentes a regras institucionais (Szasz, 1960). A pessoa que dá entrada
num hospital psiquiátrico aprende a desempenhar o papel de um doente
mental. A não aprendizagem destas regras acarreta castigos institucionais. Isto
foi ilustrado por Braginsky, Braginsky e Ring (1969) que mostraram que os
doentes psiquiátricos são capazes de modificar o seu comportamento para
parecerem mais ou menos doentes.

Mais recentemente as ideias da teoria dos papéis têm contribuído para o


incremento do estudo do autoconceito. Mesmo se o autoconceito não é novo
em Psicologia Social, como veremos, tem-se prestado ultimamente mais
atenção ao seu desenvolvimento. Assim, modelos de autoconsciência referem
em que condições nos tornamos mais conscientes de nós próprios. O conceito
de autovigilância dá conta da tendência de algumas pessoas a observarem o
modo como são percepcionadas pelas outras. A área da gestão da impressão
aborda o modo como as pessoas tentam criar impressões específicas e
positivas acerca delas próprias (Schlenker, 1980). O trabalho sobre este tópico
tem mostrado que as pessoas se comprometem activamente em estratégias
comportamentais, para dirigir a impressão das outras pessoas a respeito de si
próprias.

Aplicando a teoria do papel ao caso do Manuel e da Maria ter-se-ia em conta


os papéis que desempenham. Poder-se-ia considerar a transição do Manuel e

101
© Universidade Aberta
da Maria de filho e filha para marido e esposa. Quais são os comportamentos
do Manuel como marido, como dirigente da empresa e como pai? Haverá um
conflito para Maria entre os papéis de esposa, mãe e psicoterapeuta? Também
se poderiam abordar os autoconceitos do casal. Como se vê o Manuel
passando da classe média para a classe alta, de filho para pai? Dentro da teoria
dos papéis poder-se-ia abordar a relação do casal como um conjunto de
posições, de expectativas de papel.

5.4 Uma comparação de teorias

As três teorias acabadas de apresentar diferem nas questões que tratam e nas
questões que ignoram. Também diferem em relação às variáveis que
consideram importantes e às que consideram irrelevantes. Efectivamente, cada
teoria faz diferentes suposições acerca do comportamento social.

Passaremos agora a comparar as três teorias em quatro dimensões: 1) os


conceitos centrais da teoria; 2) os comportamentos sociais primários
explicados pela teoria; 3) as suposições básicas da teoria sobre a natureza
humana; e 4) os factores que segundo a teoria produzirão mudança no
comportamento de uma pessoa. No quadro 1.5 está patenteada esta síntese
comparativa das três teorias para cada uma destas dimensões.

Cada uma das orientações teóricas passadas em revista enfatiza conceitos


diferentes. Para as teorias da aprendizagem, o comportamento social
observável é explicado pelas relações entre estímulo e resposta e a aplicação
do reforço. As teorias cognitivas acentuam a importância das cognições e, de
uma maneira mais geral, da estrutura cognitiva como determinante do
comportamento. A teoria do papel enfatiza papéis e normas, definidos pelas
expectativas dos membros do grupo em relação à realização.

Muito embora haja algum grau de coincidência, as três teorias diferem em


relação aos comportamentos explicados. As teorias da aprendizagem
focalizam-se na aquisição de novos padrões de resposta e no impacto das
recompensas e dos castigos na interacção social. As teorias cognitivas
abordam os efeitos das cognições sobre a resposta da pessoa a estímulos
sociais, e tratam também das mudanças nas crenças e nas atitudes. A teoria do
papel sublinha o papel do comportamento e a mudança de atitude que resulta
dos papéis que se têm.

\02
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As três perspectivas teóricas diferem nas suas suposições acerca a natureza
humana. As teorias da aprendizagem vêem os actos das pessoas, o que
aprendem e como o fazem, como determinados fundamentalmente pelos
padrões de reforço. As teorias cognitivas acentuam que as pessoas
percepcionam, interpretam e tomam decisões acerca do mundo. As teorias do
papel supõem que as pessoas são enormemente conformistas. Vêem as pessoas
como agindo de acordo com as expectativas de papéis que têm os membros do
grupo.

As três teorias diferem também nas suas concepções do que provoca mudança
no comportamento. As teorias da aprendizagem defendem que a mudança no
comportamento resulta de mudanças no tipo, quantidade e frequência de
reforço recebido. As teorias cognitivas sustentam que a mudança no
comportamento resulta de mudanças nas crenças e atitudes, para além de
postular que mudanças nas crenças e atitudes são muitas vezes o resultado de
esforços para resolver inconsistência entre cognições. A teoria do papel
defende que para mudar o comportamento de alguém, é necessário mudar o
papel que a pessoa ocupa. Diferente comportamento resultará quando a pessoa
muda de papéis, porque o novo papel acarretará diferentes pedidos e
expectati vaso

A Psicologia Social hodiernia pode recorrer a diversas teorias para


compreender o comportamento social. Cada teoria faz-nos caminhar por uma
vereda algo diferente. Consoante a teoria por que se enverede, podemos
observar aspectos diferentes do comportamento social.

Ao longo dos anos, os psicólogos sociais verificaram que os assuntos que


estudaram não podem ser completamente compreendidos por uma das grandes
teorias do passado. Por isso desenvolveram teorias mais específicas que tentam
dar conta de fenómenos com uma amplitude limitada. Estas teorias continuam
todavia a ser o reflexo de orientações teóricas básicas. As teorias da
aprendizagem, cognitivas e dos papéis desempenharam e ainda desempenham
um papel importante em psicologia social. Hoje em dia a abordagem cognitiva
é a mais popular junto de teóricos e de investigadores. Todavia as outras duas
posições teóricas {Continuam a exercer uma influência de relevo nesta
disciplina.

103
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Teoria

Dimensão Teorias da Teorias cognitivas Teoria do papel


aprendizagem

Conceitos centrais Estímulo-resposta, Cognições, Papel


Reforço Estrutura cognitiva

Comportamentos Aprendizagem de Formação e mudança Comportamento no


primários explicados novas respostas; pro- de crenças e de papel
cessos de troca atitudes

Suposições acerca da As pessoas são As pessoas são As pessoas são


natureza humana hedonistas; os seus seres cognitivos que conformistas e com-
actos são determinados agem com base nas portam-se de acordo
por padrões de suas cognições com expectativas
reforço de papéis

Faetcres que praiuzem Mudança na quan- Estado de inscon- Mudança nas ex-
mudança no compcrta- tidade, tipo, ou sistência cognitiva pectativas de papéis
mento frequência de reforço

Quadro 1.5 - Comparação de três teorias em Psicologia Social

Uma outra tendência a que se vem assistindo é a tendência a combinar e


integrar ideias de diferentes tradições teóricas. As teorias mais recentes em vez
de se focalizarem exclusivamente no comportamento ou nos pensamentos e
cognições, procuram compreender o interrelacionamento entre
comportamento, pensamento e cognições.

Uma ilustração do aumento de complexidade teórica e empírica a que se vem


assistindo foi posta em evidência mediante a análise comparativa de todos os
artigos publicados no prestigiado Journal of Personality and Social
Psychology em 1968, 1978 e 1988 em diversas dimensões (Reis e Stiller,
1992). Esta análise revelou uma tendência contínua de 1968 a 1988 para os
artigos publicados nessa revista terem em conta uma base mais vasta da
literatura anterior, implicarem mais sujeitos por estudo e mais estudos por
artigo, utilizarem métodos estatísticos mais sofisticados, apresentarem mais
quadros e exigirem relatórios escritos que eram cerca de duas vezes e meia
maiores que os anteriores.

J04 © Universidade Aberta


6. A Psicologia Social Cnmporânea

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Até aqui neste capítulo definiu-se a psicologia social, delineou-se um rápido
panorama histórico da disciplina e apresentaram-se as principais influências
teóricas no domínio. Nesta secção parece revestir-se de interesse abordar
aspectos da psicologia social tal como ela hoje em dia existe, para além da
diversidade de tópicos que já foi apresentada.

6.1 Uma ciência em ebulição

o período actual caracteriza-se por uma explosão dos conhecimentos, das


descobertas e das publicações (Bok, 1986). Neste panorama a psicologia
social constitui um dos domínios mais importantes na investigação em
psicologia, em particular, e nas ciências sociais, em geral. Cada ano que
transcorre são conduzidos e publicados milhares de estudos em diversas
revistas especializadas em psicologia social. Se nos limitarmos ao domínio da
psicologia social verifica-se que existem pelo menos 21 revistas científicas que
se apresentam por ordem alfabética no quadro 1.6.

Basic and Applied Social Psychology

British Journal of Social Psychology

European Journal of Social Psychology

Journal of Social and Clinicai Psychology

Journal of Applied Social Psychology

Journal of Experimental Social Psychology

Journal of Language nd Social Psychology

Journal of Personality

Journal of Personality and Social Psychology

Journal of Social and Personal Relationships

Journal of Social Behavior and Personality

107
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Journal of Social Issues

Journal of Social Psychology

Les Cahiers Internationaux de Psychologie Sociale

Personality and Social Psychology Bulletin

Revista de Psicología Social

Revista de Psicología Social y Personalidad

Revue Internationale de Psychologie Sociale

Social Behavior and Personality

Social Cognition

Social Psychology Quarterly

Quadro 1.6 - Revistas científicas em psicologia social por ordem alfabética

Várias observações emergem da leitura deste quadro. Em primeiro lugar


verifica-se que a grande maioria das publicações importantes aparecem em
revistas americanas. Efectivamente entre todas as revistas referidas só cinco
(British Journal of Social Psychology, European Journal of Social
Psychology, Les Cahiers Intenationaux de Psychologie Sociale, Revue
Internationale de Psychologie Sociale, Revista de Psicologia Social) são
oriundas da Europa e uma da Nova Zelândia (Social Behavior and
Personality). Para além disso, as três principais revistas, segundo Social
Science Citation Index são, por ordem decrescente, Journal of Personality
and Social Psychology, Journal of Experimental Social Psychology e
Personality and Social Psychology Bulletin, todas elas revistas americanas
(Feingold, 1989). Acontece também que há muitos investigadores americanos
que também publicam em revistas europeias. Ou, por outras palavras, a
imagem que é reflectida pela publicação em revistas científicas é que a
psicologia social americana tem um peso preponderante no domínio.

Em segundo lugar, na lista apresentada só aparecem duas revistas em francês


(Les Cahiers Internationaux de Psychologie Sociale et la Revue

108
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Internationale de Psychologie Sociale) e duas em espanhol (Revista de
Psicología Social e Revista de Psicología Social y Personalidad). À
semelhança do que acontece em todos os domínios científicos, a língua inglesa
é a língua de eleição no domínio da psicologia social.

Em terceiro lugar, a psicologia social aparece sobretudo ligada à psicologia,


como já se referiu. Das 21 revistas em psicologia social mencionadas, só duas
são publicadas sob a responsabilidade de sociólogos (Social Psychology
Quarterly e JOltrnal of Language and Social Psychology).

Se acrescentarmos à lista de revistas apresentadas aquelas que não se limitam a


publicar artigos de cariz psico-social, mas que estão abertas a publicações
dessa índole, facilmente nos apercebemos que o número de artigos que cada
ano são publicados neste domínio ascende a vários milhares. A psicologia
social está pois em ebulição.

6.2 Uma plêiade de investigadores

Há um quarto de século o dominio da Psicologia Social era constituído por um


monopólio reduzido de investigadores. Hoje em dia são cada vez mais
numerosos os investigadores que apresentam contribuições de valor para esta
ciência. A eminência científica dentro de um campo é um construto que se
pode operacionalizar de diversas maneiras. Por exemplo, Gordon e Vicari
(1992) contabilizaram os investigadores mais citados em oito livros de
introdução à psicologia social. No quadro 1.7 são apresentados os 20
investigadores mais citados, bem como a respectiva frequência. Os resultados
deste estudo sugerem que os autores mais frequentemente citados (muito
especialmente os dez mais frequentemente citados) permaneceram
relativamente estáveis ao longo dos últimos quinze anos.

109
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Nome Frequência de citações

E. Jones 153

H. Kelley 149

L. Festinger 135

E. Hatfield 115

E. Berscheid 109

J. Darley 108

B. Latané 100

S. Schachter 100

S. Milgram 98

E. Aronson 95

M. Snyder 92

R. Petty 88

l. Berkowitz 86

A. Eagly 78

R. Cialdini 75

s. E. Taylor 73

A. Bandura 72

1. Cacioppo 72

R. Nisbett 72

S. Asch 70

Fonte. Gordon e Vicari (1992).

Quadro 1.7 - Os vinte investigadores mais citados nos principais manuaiS de


psicologia social

110 © Universidade Aberta


6.3 Empregos em Psicologia Social
O domínio da psicologia social representa um sector muito popular no âmbito
da psicologia, muito em particular nos Estados Unidos. Um estudo efectuado
junto dos membros da American Psychological Association (APA) mostra
que entre 1960 e 1976, 10% dos diplomados (doutoramento) em psicologia
nos Estados Unidos tinham a especialidade de psicologia social (Howard,
Blumstein e Schwartz, 1986). Dado ter havido um grande número de novos
sectores que recentemente se abriram à psicologia, esta percentagem diminuiu
um pouco no último decênio e situava-se à volta de 6% em 1984. Durante os
últimos 25 anos o número de diplomados em psicologia social situou-se na
terceira posição, atrás da psicologia clínica e da psicologia experimental. Por
conseguinte, a psicologia social constitui um domínio de estudo muito popular
em psicologia.

Que tipos de emprego são obtidos pelas pessoas formadas em psicologia


social? O quadro 1.8 indica os sectores de emprego e faz uma comparação
com a psicologia em geral. A maioria dos empregos em psicologia social é
obtida ao nível do ensino e da investigação (62,7%), em postos de professores
ou de cientistas em meio universitário ou secundário. Esta é a percentagem
mais elevada em todos os sectores de estudo em psicologia. Os sectores
privados e governamentais atraem igualmente uma percentagem elevada de
diplomados.

Parece provável que num futuro próximo novas áreas de investigação aplicada
em psicologia social suscitarão novos empregos para os psicólogos sociais.
Por exemplo, o recente aumento na investigação sobre psicologia da saúde,
psicologia ambiental, psicologia do sistema legal e factores psicossociais de
desordens clínicas, tais como depressão e solidão, suscitam promessas de
emprego para os psicólogos sociais, estudos sobre a saúde, estudos do meio,
estudos legais, e psicologia clínica.

As competências de um psicólogo social podem ser exercitadas em muitas


espécies de trabalho: investigação de mercado, sondagens de opinião pública,
avaliação da investigação nos negócios e no governo (isto é, investigação que
avalia os efeitos de novos programas), e análise estatística de dados
comportamentais.

Muitos dos psicólogos sociais que trabalham em meios académicos partilham o


seu tempo entre ensinar, ficar ao corrente da nova investigação e efectuar
investigação. A focalização no ensmo, estudo e investigação é,

l11
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indivitavelmente polarizada pelo assunto que os psicólogos sociais consideram
ser um dos mais fascinantes no mundo: o comportamento social humano.

Psicologia Psicologia
Social

Ensino e investigação 33.9 62.7


(Universidades ou escolas secundárias)

Sector escolar 3.7 3.9

Meios organizados com serviços humanos 24.5 5.9

Prática privada 22.0 1.0

Sectores privado e governamental 13.0 26.5

Fonte: Howard et al. (1986).

Quadro 1.8 - Percentagens de diplomados (com doutoramento) em Psicologia e em


Psicologia Social, trabalhando a tempo completo, nos principais
sectores

112
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7. Perspectivas internacionais

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Como nos pudemos já aperceber, se as raízes da psicologia social
emergiram na Europa, grande parte da sua história tem sido amplamente
dominada por investigadores dos Estados Unidos. Uma das razões
importantes para esta mudança foi o crescimento do fascismo na Europa
nos anos trinta. Efectivamente podemos ver os Estados Unidos como
constituindo o primeiro entre três "mundos" em que os psicólogos têm
levado a cabo investigação e prática (Moghaddam, 1987; 1990). Esse país
é o principal produtor do conhecimento psicológico. O segundo mundo é
constituído por outras nações industrializadas, como Canadá, Grã-
Bretanha, Austrália, França e Rússia. Em certos aspectos o segundo
mundo é tão produtivo como o primeiro, mas a sua influência é maior entre
os países que aí se inserem e no terceiro mundo. O terceiro mundo
compreende países em desenvolvimento, tais como Índia, Nigéria e Cuba.
Se o primeiro mundo exporta conhecimento psicológico para o segundo e
terceiro mundos, é por sua vez pouco influenciado pela psicologia dos
outros dois mundos. O terceiro mundo é sobretudo importador de
conhecimento psicológico.

Os psicólogos nos três "mundos" estão cada vez mais a ser sensíveis até
que ponto a psicologia do primeiro e segundo "mundos" é relevante para as
sociedades do terceiro mundo (Moghaddam, 1987). Vem-se assistindo
cada vez mais a investigações efectuadas em colaboração em que
experiências psico-sociais são levadas a cabo em diferentes culturas dos
diferentes "mundos". A psicologia social do "segundo mundo", que se vem
desenvolvendo na Europa, apresenta alguns traços que a distinguem. A
partir dos anos 60 a psicologia social europeia, tendo como chefes de
orquestra Henri Tajfel na Grã-Bretanha e Serge Moscovici em França,
enveredou por uma psicologia social diferente da dos Estados Unidos que
estava apegada ao sistema de valores individualistas desse país
(Moghaddam, 1987). A psicologia social europeia conseguiu desenvolver
áreas próprias de interesse.

O trabalho de Tajfel e de seus colegas sobre identidade social,


categorização social e relações intergrupais e de Moscovici e de seus
colegas sobre polarização de grupo, influência minoritária e representações
sociais tornaram-se temas relevantes da Psicologia Social nas duas últimas
décadas não só na Europa, mas também noutras partes do mundo (Taylor e
Moghaddam, 1987). Hoje em dia há uma grande e activa troca de ideias
entre os psicólogos sociais em todos os países (Rosenzweig, 1992). Uma
das principais questões suscitadas por esta troca de informação diz respeito
a aspectos do comportamento humano que são culturalmente específicos,
tendo em conta as condições existentes numa determinada cultura e os que

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são devido à herança humana partilhada. Tudo leva a crer que nos anos
vindouros surja uma ciência mais rica, fecundada por cruzamentos de ideias
e de dados de diversas culturas.

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APLICAÇÕES: O ESTUDO DA CAVERNA DOS LADRÕES

Em muitos problemas de investigação as abordagens da psicologia social


sociológica e da psicologia social psicológica juntaram-se de modo
profícuo. Apresenta-se seguidamente um exemplo de uma investigação de
campo em que se combinaram as abordagens das duas disciplinas. Muzafer
Sherif, um psicólogo a que já nos referimos, e Carolyn Sherif, uma
socióloga, e seus colegas efectuaram um elaborado estudo de campo para
investigar as relações intergrupais (Sherif, Harvey, White, Hood, e Sherif,
1961). Os autores exploraram a formação de grupos, o conflito intergrupal,
e técnicas para reduzir o conflito. Os seus sujeitos de investigação foram
rapazes com 10 e 11 anos que frequentavam um campo de férias e que não
estavam cientes da sua participação na experiência.

Na primeira fase da experiência os autores examinaram a formação de


grupos, a atracção dos membros de um grupo em relação aos membros do
seu próprio grupo (endogrupo), e normas do endogrupo. Os rapazes eram
distribuídos por um dos dois grupos sem conhecerem a existência do outro
grupo. Em cada grupo as actividades dos rapazes demonstraram a
formação da coesão do endogrupo. Cada grupo escolheu um nome (as
Águias e as Serpentes) e desenvolveram uma hierarquia de grupo,
actividades especiais, desportos favoritos, e símbolos de identificação, tais
como uma bandeira do grupo. Para além disso, cada grupo desenvolvia um
conjunto de normas de comportamento: um grupo desejava ser visto como
duro, enquanto que o outro grupo desejava ser visto como bem
comportado. Esta formação de normas do endogrupo apareceu sem que a
equipa de experimentadores fizesse qualquer encorajamento ou
comentário.

Quando as Águias e as Serpentes souberam da existência um do outro, os


membros sentiram imediatamente competição intergrupal. Os grupos
suscitaram encontros espontâneos um com o outro com interacções
competitivas. Os resultados desta competição fortaleciam os laços do
endogrupo e o desenvolvimento de sentimentos de hostilidade em relação
ao outro grupo. Estes sentimentos aumentavam em cada encontro
intergrupal. Por exemplo, depois de um jogo em que as Águias tinham
perdido, as Serpentes queimaram a bandeira das Águias. As Águias
roubaram então a bandeira das Serpentes. Este acto por sua vez provocou
um ataque de surpresa à cabana das Águias, que suscitou um ataque ainda

© Universidade Aberta 117


mais destruidor à cabana das Serpentes. Mediante as interacções, o
exogrupo era visto cada vez de modo mais acentuado com estereótipos
negativos.

Na segunda fase da experiência os autores testaram várias técnicas para


reduzir o conflito intergrupal que se havia desenvolvido. Em primeiro
lugar tentaram simplesmente o contacto entre os grupos, mas verificaram
que só o contacto não era suficiente para reduzir o conflito. Os grupos
utilizaram o contacto meramente como uma oportunidade para aumentar o
nível de hostilidade entre eles.

A técnica que finalmente obteve sucesso para reduzir o conflito foi a


introdução de objectivos supraordenados, objectivos que cada grupo
desejava realizar, mas que não podia realizar só sem a cooperação do outro
grupo. Um desses objectivos era o restabelecimento da água para o campo
após o corte de linhas de água. Os dois grupos trabalharam conjuntamente
para encontrar o corte e repararam a linha. Uma série de tais encontros em
que a cooperação era requerida para alcançar objectivos comuns obteve
sucesso na redução da hostilidade e na criação de sentimentos positivos.
Tal foi indicado por mudanças nas escolhas de amizade no endogrupo e no
exogrupo.

Nesta experiência combinaram-se técnicas quer da psicologia social


sociológica quer da psicologia social psicológica. Os autores utilizaram
técnicas de observação e entrevistas em profundidade correntemente
utilizadas em sociologia e combinaram-nas com a técnica dos
questionários estandardizados a que frequentemente recorrem os
psicólogos. A subjectividade inerente aos processos de observação foi
compensada pelo rigor de medidas estandardizadas. Os problemas
resultantes da artificialidade destas medidas estandardizadas foi atenuada
mediante a fecundidade dos dados de observação e de entrevistas.

o estudo da Caverna dos Ladrões ilustra o interesse partilhadopor todos


os psicólogos sociais pelos pontos de vista subjectivos das pessoas. O
estudo chama a atenção para as mudanças que ocorreram ao longo do
tempo nas perspectivas dos membros de um grupo sobre as dos membros
do outro grupo. Os experimentadores estudaram a formação de grupos
segundo as perspectivas dos próprios sujeitos. Tiveram também a
possibilidade de observar as mudanças das atitudes e dos comportamentos
dos sujeitos em relação aos membros do endogrupo e do exogrupo. Enfim,
este estudo combinou níveis de análise psicológicos e sociológicos.
Sentimentos entre os grupos foram medidos através das observações das
atitudes e comportamentos individuais e, ao mesmo tempo, explicações

118
© Universidade Aberta
para os comportamentos foram procuradas nas relações estruturadas dos
grupos.

o estudo da Caverna dos Ladrões ilustra como a sensibilidade à


perspectiva dos participantes pode ser realizada num contexto
estandardizado. Dados qualitativos e quantitativos podem ser utilizados
para se complementarem. Este notável estudo integrativo ilustra também
como se podem combinar as vantagens das duas psicologias sociais.

SUMÁRIO

o objectivo deste capítulo foi o de introduzir o domínio da psicologia


social. Uma análise científica do comportamento social permite ter uma
visão esclarecida dos diversos fenómenos que nos preocupam. Há vários
modos de caracterizar a psicologia social: 1) a psicologia social pode
definir-se como o estudo de como as pessoas influenciam os pensamentos,
sentimentos e acções de outras pessoas; 2) a disciplina tem vários tópicos
fundamentais; 3) a psicologia social tem relações próximas com outras
ciências sociais, especialmente com a sociologia e a psicologia; 4) embora
enfatizem diferentes questões, quer psicólogos quer sociólogos
contribuíram para a psicologia social. A psicologia social psicológica e a
psicologia social sociológica devem tendencialmente ser abordadas em
conjunto, pois cada uma complementa a outra e cada uma tem fraquezas
que as forças da outra podem compensar em parte. Ambas as perspectivas
também convergem na sua focalização no comportamento humano
individual e ambas prestam atenção ao mundo subjectivo do indivíduo.

Ainda que a interpretação do comportamento social remonte a vários


milénios, o estudo científico deste último é recente. Como a própria
psicologia, a psicologia social tem as suas raízes no questionamento
filosófico. As ideias acerca do indivíduo no contexto social beneficiam de
contribuições de pensadores como Platão, Aristóteles, Hobbes, Rousseau,
Bentham e Marx, para só se referirem alguns.

o húmus propício à eclosão de uma abordagem específica da psicologia


social encontramo-lo na confluência de duas correntes: uma francesa e
outra anglo-saxónica. Comte defendeu que as ciências se desenvolvem em
estádios, em termos da sua capacidade em dar interpretações dos
fenómenos que não requeiram explicações religiosas, e a psicologia social
foi uma das últimas ciências a emergir. A psicologia social é necessária na

119
© Universidade Aberta
medida em que fornece uma explicação para a integração de forças sociais,
biológicas e interpessoais, dentro de um só indivíduo. A moderna
psicologia social é uma síntese de teoria e de dados científicos. As
primeiras experiências em psicologia social foram efectuadas em finais do
século dezanove e desde então uma grande quantidade de investigação deu
à psicologia social uma sólida base científica. A disciplina, uma vez
lançada, desenvolveu-se a um ritmo fulgurante.

A investigação em psicologia social foi fortemente influenciada pelo


"espírito do tempo" (Zeitgeist) de cada década da história do século vinte
na América e noutros locais. Duas tendências recentes do campo são a
influência crescente da perspectiva cognitiva e uma ênfase em aplicar as
descobertas da psicologia social a um vasto leque de problemas práticos.
Para além de prevermos que estas tendências continuarão no futuro,
também prevemos uma maior focalização no papel do afecto e numa
perspectiva intercultural.

A Psicologia Social é simultaneamente uma clencia comportamental e


social. É aceite como ciência na medida em que obedece a todos os
requisitos do método científico: descrição, explicação, previsão e controlo.

Há três orientações teóricas principais na actual Psicologia Social: as


teorias da aprendizagem, as teorias cognitivas e a teoria do papel. As
teorias da aprendizagem postulam uma relação estímulo-resposta entre
meio e comportamento social. As teorias da aprendizagem defendem que
os seres humanos percepcionam activamente e interpretam os estímulos no
seu meio para criar sentido nas interacções sociais. A teoria do papel
procura explicar o comportamento social através de uma análise de papéis,
de expectativas de papéis e de conflito de papéis.

Hoje em dia a psicologia social tomou-se um sector de investigação em


ebulição. Numerosos tópicos são estudados e várias mini-teorias foram
formuladas para o explicar. A psicologia social oferece também
possibilidades de emprego relativamente interessantes ao estudante que
pretenda fazer carreira neste domínio. No futuro um maior número de
psicólogos sociais trabalharão em campos aplicados, tais como em
psicologia da saúde, psicologia ambiental e psicologia legal.

Ao nível das aplicações é referido um exemplo de como a psicologia social


sociológica e a psicologia social psicológica deveriam ser estudadas
conjuntamente porque cada uma complementa a outra e cada uma tem
desvantagens que podem ser compensadas em parte pelas vantagens da
outra.

120
© Universidade Aberta
PARA IR MAIS LONGE

No final de cada capítulo serão fornecidas publicações importantes e


recentes susceptíveis de dar mais informação sobre tópicos discutidos em
cada capítulo. Apresentam-se, no entanto, aqui algumas obras de referência
que podem servir de introdução à maior parte das áreas de investigação no
domínio.

Algumas obras básicas de referência

BERKOWITZ, L. (Ed.),

Advances in experimental social ps}'chology (série


anual). New York: Academic Press.

BICKMANN, L. (Ed.),

Applied social psychology (série anual). Berverley


Hills: Sage.

FESTINGER, L. e KATZ, D.

1974 A pesquisa na psicologia social, Rio de Janeiro:


Fundação Getúlio Vargas.

LÉVY, A.

1965 Psychologie sociale: Textes fondamentaux anglais


et américains. Paris: Dunod.

STOETZEL, J.

(1963) La Psychologie sociale. Paris: Flammarion.

ROSENZWEIG, M. R. e PORTER, L. W: (Eds.).

Annual Review of Psychology (série anual). PaIo


Alto, CA: Annual Reviews, Inc.

[21
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TAlFEL, H. (Ed.)

1984 The social dimension: European development in


social psychology (2 vols.). Cambridge e Paris:
Cambridge University Press e Éditions de la
Maison des Sciences de I'Homme.

TRIANDIS, H. c., LANIBERT, W. W., BERRY, H. W., LONNER, W. l,


HERON, A., BRISLIN, R. e DRAGUNS, l (Eds.)

1980/1981 Handbook of cross-cultural psychology ( 6 vols.).


Boston: Allyn and Bacon.

ZAlONC, R.

1974 Psicologia social: Do ponto de vista experimental.


São Paulo: E.P.U.

Referências espec(ficas para este capítulo

ALLPORT, G.

1985 The historical background of social psychology. In


G. Lindzey e E. Aronson (Eds.), Handbook of
Social Psychology (VoI. 1, 1-46). New York:
Random House.

Este artigo já apareceu na primeira edição do Handbook em 1954, e também,


de modo abrcviado, na terceira edição dc 1985. Trata-se da fonte mais
frequentcmcntc citada da história da psicologia social, escrita por um dos
psicólogos sociais mais conhecidos.

CARLSMITH, l., ELLSWORTH, P. e ARONSON, E.

1976 Methods of research 11l social psychology.


Reading, MA: Addison-Wesley.

Este livro dá-nos conta de como efectuar investigação em psicologia social.

122
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JONES, E.

1985 Major developments in social psychology during


the past four decades. In G. Lindzey e E. Aronson
(Eds.), Handbook of Social Psychology (VoI. 1,
47-107). New York: Random House.

Trata-se de um complemento necessário ao capítulo de Allport referido mais

acima, sendo revistos os recentes desenvolvimentos da psicologia social na

América do Norte.

MOSCOVICI, S.

1984 Le domaine de la psychologie sociale. In S.


Moscovici (Dir.), Psychologie sociale (pp. 5-22).
Paris: Presses Universitaires de France.

Neste sucinto, mas rico e denso texto é apresentado o olhar psicossocial, e

uma síntese de teorias e métodos da psicologia social.

SHAW, M. e COSTANZO, P.

1982 Theories of social psychology (2a ed.). New York:


Mcgraw-Hill.

DEUTSCH, M. e KRAUSS, R.

1965 Theories 111 social psychology. New York: Basic


Books.

Cada um destes livros apresenta uma descrição pormenorizada das principais

teorias da psicologia social. Embora o livro de Deutch e Krauss não esteja

actualizado, tornou-se uma síntese clássica do domínio.

ACTIVIDADES PROPOSTAS

1) O texto distingue a psicologia social da psicologia e da sociologia. A


literatura também analisa a vida. Como é que distinguiria entre
conhecimentos acerca da natureza humana e da vida social que advêm da
literatura dos que advêm da psicologia social?

123 Ii
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2) Escolha um acontecimento importante na história da Psicologia Social e
desenvolva-o com o recurso a referências bibliográficas adequadas.

3) Desenvolva uma teoria acerca de um tópico que ache interessante e


planeie um estudo para testar a sua hipótese. Que considerações tomaria
em conta para escolher os sujeitos? Como saberia se tinha uma boa teoria?

4) Efectue o inquérito seguinte:

INQUÉRITO SOBRE A ORIENTAÇÃO DA PSICOLOGIA SOCIAL

A. A maior parte do comportamento social é aprendido através de


reforço e imitação.

B. Pensamento e memória são importantes nas interacções sociais.

C. A sociedade é extremamente importante nos comportamentos


socIaIs.

D. Grande parte do comportamento social é influenciado por factores


biológicos.

Administre esse inquérito a uma dúzia de colegas e amigos. Peça a cada


sujeito para escolher a afirmação que representa melhor a psicologia social.

Qual a orientação que foi mais popular? Porquê? Há probabilidades de


encontrar um par de afIrmações populares. Não há uma orientação que
domine hoje em dia a psicologia social. As duas primeiras orientações, a
aprendizagem social I) e cognitiva 2) são as mais populares entre os
próprios psicólogos sociais. A terceira abordagem é sociológica e a última
é biológica. Estas não são tão activamente utilizadas pelos psicólogos
sociais actuais. Concordam os seus sujeitos com os interesses da
investigação dos psicólogos sociais?

5) O pioneiro da psicologia social, Kurt Lewin, disse que "nada é tão


prático como uma boa teoria." Porque é que uma teoria pode ser
considerada prática?

6) Como é que defenderia que a ênfase intercultural na psicologia social é


também uma ênfase prática?

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11. SELF

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TÁBUA DE MATÉRIAS

1. Introdução

2. O Self em Psicologia Social

3. Definindo o Self: Autoconceito

3.1 Componentes do autoconceito

3.2 Autoconceito de trabalho

3.3 Auto-esquemas

3.4 Memória autobiográfica

3.4.1 Egocentração

3.4.2 Beneficiação

3.4.3 Conservadorismo cognitivo

3.5 Origens do self

3.5.1 Avaliação reflectida

3.5.2 Comparação social

3.5.3 Comparação temporal

3.5.4 Autopercepção

3.6 O self num contexto cultural

3.6.1 A importância de um grupo para o sentido do self

3.6.2 Self e cultura: Identidade social através das culturas

4. Avaliando o Self: Auto-Estima

4.1 Avaliação da auto-estima

129
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4.2 Desenvolvimento da auto-estima

4.3 Auto-estima e comportamento

4.4 Variações na auto-estima

4.4.1 Adolescência

4.4.2 Experiências

4.4.3 Identidade étnica de grupos minoritários

4.5 Autodiscrepâncias

4.6 Autoconsciência

4.6.1 Estados de autoconsciência

4.6.2 Diferentes tipos de autoconsciência

4.6.3 Autoconsciência e o uso do álcool

4.6.4 O que é que causa diferenças individuais na

autoconsciência?

4.7 Protecção da auto-estima

4.7.1 Manipulaçào de auto-avaliações

4.7.2 Processamento selectivo de informação

4.7.3 Comparação social selectiva

4.7.4 Compromisso selectivo com identidades

5. Relacionando o Self: Auto-Apresentação

5.1 O self nas interacções sociais

5.2 Motivos da auto-apresentação

5.3 Auto-apresentação e embaraço

5.3.1 Embaraço, umaforma de ansiedade social

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5.3.2 Modelo multifacetado do embaraço

5.3.3 Antecedentes, respostas e estratégias de confronto com o


embaraço

5.3.4 Implicações sociais do embaraço

5.4 Tácticas de auto-apresentação

5.5 Estilo de auto-apresentação: Autovigilância

Aplicações: Tomada de consciência dos determinantes das


preferências profissionais

Sumário

Para ir mais longe

Actividades propostas

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Objectivos de aprendizagem

o estudo deste capítulo deve permitir ao aluno:


• Discutir a introdução do self em Psicologia Social;

• Definir o self e como surge;

• Distinguir as concepções independentes e interdependentes do self;

• Ilustrar o desenvolvimento da auto-estima e o modo como afecta o


nosso comportamento;

• Analisar as consequências das autodiscrepâncias;

• Identificar os modos como a autoconsciência influencia o nosso


modo de pensar e de sentir;

• Descrever técnicas de protecção da auto-estima contra os ataques;

• Analisar o desejo de impressionar os outros;

• Descrever as consequências de uma auto-apresentação fracassada;

• Verificar a influência da autovigilância no comportamento;

• Apresentar urna técnica que permite a tomada de consciência dos


determinantes das preferências profissionais.

Consciousness of self give us the power to stand outside the rigid chain of
stimulus and response, to pause, and by this pause to throw some weight on
either side, to cast some decision about what the response will be.

Rollo May

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1. Introdução

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Aconteceu-lhe porventura encontrar-se numa festa muito buliçosa e ouvir alguém
do outro lado da sala referir o seu nome? Se tal lhe aconteceu, teve experiência
do chamado fenómeno do sarau-cocktail isto é, a capacidade em apreender um
estímulo relevante para si próprio num meio complexo (Moray, 1959). Se para
os psicólogos cognitivistas o fenómeno denota que as pessoas são selectivas na
sua percepção dos estímulos, para os psicólogos sociais tal ilustra também que o
self não é só mais um estímulo social. Pode tratar-se do mais importante objecto
da nossa atenção.

Neste capítulo propomo-nos examinar a natureza do self que engloba as


características que uma pessoa reclama como sendo suas e às quais dá um valor
afectivo. O seu estudo tem sido objecto de análise em Psicologia Social. Pode,
todavia, causar admiração a um leitor menos precavido que o estudo do self
ocupe os psicólogos sociais. Ao longo da história, filósofos, poetas e estudiosos
da personalidade apresentaram o self como sendo um aspecto estável da
personalidade humana. Ao invés, os psicólogos sociais acham que o self pode, de
certo modo, ser maleável, mudando de uma situação para outra. Dentro desta
perspectiva, o self tem diferentes rostos (Markus e Kunda, 1986).

Como se verá, o self é uma construção social que se forma mediante a interacção
com outras pessoas. O self constitui a base das interacções sociais. Mas o self é
não só definido no processo da interacção social, como também afecta um amplo
leque de comportamentos sociais. Por exemplo, julgamentos sobre outras
pessoas, o modo como comunicamos com elas, são comportamentos que podem
ser influenciados pelo modo como nos vemos a nós próprios.

Efectivamente, nas duas últimas décadas, um dos fenómenos mais citados em


Psicologia Social é o self. Se numa primeira aproximação tal pode parecer
paradoxal, relembre-se que a Psicologia Social focaliza-se no indivíduo dentro do
contexto social. Grupos e organizações podem contribuir para a emergência do
self, no entanto só o indivíduo tem self. Sendo assim, o self social é o domínio
natural do psicólogo social.

Passaremos aqui em revista alguns dos aspectos que os psicólogos SOCiaIS


conhecem acerca do self. Assim, após a evocação da questão da utilização do
self em Psicologia Social, serão abordados três aspectos do self. Um primeiro
aspecto a abordar é o relativo ao autoconceito cognitivo e a questão de como é
que as pessoas chegam à compreensão dos seus próprios comportamentos. Um
segundo aspecto a considerar será a auto-estima, a componente afectiva, e a
questão do modo como as pessoas se avaliam a elas próprias. Um terceiro

135
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aspecto relaciona-se com a auto-apresentação, a manifestação comportamental
do self, é a questão de como é que as pessoas se apresentam às outras. Como se
verá, o self é multifacetado. Finalmente ilustraremos, enquanto aplicação, uma
técnica que permite que o sujeito assuma um papel activo na descoberta de um
aspecto específico do self, os determinantes das preferências profissionais. Antes
de passarmos a desenvolver esses tópicos relembre-se todavia que tópicos de
capítulos ulteriores, tais como solidão, atitude e comportamento, amor e várias
formas de influência social dependem mais ou menos duma compreensão do self
social.

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2. O Self em Psicologia Social

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Desde há séculos que diversos pensadores têm abordado a natureza do self.
Platão considerou o self equivalente à alma e sentiu que era o lugar da sabedoria.
Buda acreditou que cada um de nós cria o seu próprio sentido de identidade
pessoal, mas esta autocompreensão é muitas vezes distorcida e incompleta.
Descartes baseou o self na nossa capacidade em pensar, Hume considerou o self
como equivalente com experiências de percepção, e Kant notava que o self não é
tanto a nossa perspectiva de quem acreditamos que somos como do que somos
realmente (Baumeister, 1987; Hattie, 1992).

o self ajuda-nos a compreender o nosso comportamento. Ele pode efectivamente


ajudar a percepcionar-nos como uma pessoa com certas atitudes, valores ou
comportamentos. Esta noção será todavia tão útil quando se tenta fazer um
estudo científico do comportamento social? Desde finais do século dezanove,
podemos entrever três tipos de respostas dadas pelos investigadores a esta
questão.

Estranhamente poder-se-ia qualificar o final do século dezanove e o início do


século vinte de "idade de ouro" do self. Com efeito, foi nesta época que foram
introduzidas várias teorias do self que são geralmente aceites. A psicologia
(James, 1890), a sociologia (Cooley, 1902; Mead, 1934) e a psiquiatria (Freud,
1949) registaram progressos de vulto. Globalmente, os primeiros teóricos do self
sublinharam a importância deste conceito em psicologia social. Cada um deles
exprimia à sua maneira a ideia de que não só nos conhecemos através dos outros,
como também que a nossa compreensão dos outros depende do conhecimento
que temos de nós próprios.

Um artigo publicado em 1913 por John Watson pôs fim à idade de ouro do self.
Watson defendia que o self não pode ser medido e que não deveria, por
conseguinte, ser objecto de estudo científico. Como podemos estar seguros de
que o que um indivíduo nos diz a respeito do seu autoconceito é verdadeiro? É
impossível saber com precisão o que se passa na cabeça de uma outra pessoa.
Vários autores não hesitaram em aliar-se à crítica de Watson e durante os
decénios que se seguiram, o seIf foi votado ao esquecimento.

Nas décadas de sessenta e setenta a investigação sobre o self floresceu na


psicologia clínica. Todavia, só no começo dos anos setenta um número crescente
de psicólogos sociais, levados pelos seus estudos empíricos sobre a cognição
humana, enveredou por se focalizar no self. Hoje em dia, na psicologia social
contemporânea, o self e construtos conexos constituem materiais importantes de
explicação do comportamento social. O movimento humanista que sublinhou a

139
© Universidade Aberta
importância determinante do desenvolvimento pessoal na vida de um indivíduo
contribuiu em grande parte para este ressurgimento (Rogers, 1951). Há até
numerosos teóricos da aprendizagem que chegaram a reconhecer a utilidade do
self enquanto conceito teórico (Bandura, 1982).

Este breve sobrevoo histórico faz ressaltar três pontos. O primeiro é que o auto-
conceito não é certamente indispensável para a psicologia social e que é possível
analisar o comportamento social sem recorrer a ele. Em segundo lugar, vários
teóricos defendem que mesmo que não seja indispensável, o autoconceito pode
ser muito útil. Em terceiro lugar, o uso científico do autoconceito suscita vários
problemas em psicologia social. Efectuaram-se progressos recentes no domínio
da medida; por exemplo, foi elaborada uma medida não verbal que reduz os
problemas de desejabilidade social (Ziller, 1973), recorreu-se a medidas
espontâneas do auto-conceito (McGuire, e Padawer-Singer, 1976), e a medidas
indirectas (Geller e Shaver, 1976), algumas das quais serão abordadas no
decurso deste capítulo. Os problemas identificados por Watson não estão todavia
ainda resolvidos. Entre eles, há a questão de se saber se as pessoas nos dizem o
que pensam realmente delas próprias ou simplesmente o que crêem que
queremos saber.

Seja como for, não restam dúvidas que a noção de self ocupa hoje em dia um
lugar de destaque na investigação em Psicologia Social. Para o verificar basta ter
em conta a lista de trabalhos em que o self aparece como prefixo, como, por
exemplo: self-awareness (autoconsciência), self-concept (auto-conceito), self­
consciousness (autoconsciência), self-control (autocontrolo), self-disclosure
(auto-revelação), self-efficacy (auto-eficácia), self-esteem (auto-estima), self­
image (auto-imagem), self-monitoring (autovigilância) , self-perception
(autopercepção), self-regulation (auto-regulação), self-schenw (auto-esquema),
self-serving' (autocomplacência), self-verification (autoverificação). Haverá
todavia uma definição que abarque toda esta riqueza de conceitos? É óbvio que
não há uma só resposta e o breve apanhado histórico efectuado já é susceptível
de nos fazer sentir isso. Nas secções seguintes examinaremos mais em pormenor
a natureza do self.

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3. Definindo o Self: autoconceito

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Quem sou Eu? Cesse de ler alguns minutos e escreva numa folha branca as dez
características que pensa que o (a) descrevem. As respostas dadas incluem os
aspectos do self que são mais salientes para si. Talvez essa lista demonstre que
existem diferentes tipos de processos de definição do self, isto é, diferentes
maneiras de se definir.

o conceito de self foi discutido em pormenor por muitos teóricos, tais como
William James (1890), Charles Cooley (1902/1922), George Herbert Mead
(1934) e Harry Sullivan (1953). Se bem que esses autores realcem mais certos
aspectos do self, todos eles concordam sobre a construção social do self. Temos
uma concepção do self por causa das nossas interacções com outras pessoas. A
internalização destas interacçães sociais faz parte do que pensamos sobre nós
próprios. O autocoTlceito pode ser definido como o conjunto de pensamentos e
sentimentos que se referem ao self enquanto objecto (Rosenberg, 1979). É
importante referir que o autoconceito não constitui necessariamente uma visão
"objectiva" do que somos, mas antes um reflexo de nós próprios tal qual nos
percepcionamos. Por exemplo, o autoconceito de um estudante pode incluir
pensamentos tais como "Tenho 18 anos", "Sou um rapaz", "Sou alguém que
gosta de ajudar o próximo".

William James

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3. 1 Componentes do autoconceito

Visto haver múltiplos elementos que podem fazer parte do autoconceito,


diversos investigadores preocuparam-se em definir um número limitado de
categorias.

Há mais de cem anos William James (1890) descreveu a dualidade básica que
está no âmago da nossa percepção do self. Em primeiro lugar, o self é composto
pelos nossos pensamentos e crenças acerca de nós próprios, o que James
denominou o "conhecido", ou mais simplesmente o "mim". O conceito de James
do "mim" contém três componentes distintos. Há o self material que inclui o
corpo, o vestuário, a casa e todas as outras possessões. O self espiritual inclui os
traços de personalidade, atitudes, valores e percepções sociais. Finalmente, o self
social inclui o que amigos, pais, namorado(a), etc. conhecem de mim próprio.
James (1890) sugeriu haver tantos "selves" sociais quantas classes de pessoas
que têm uma imagem de nós na sua cabeça.

Em segundo lugar, o self é também o processador activo de informação, o


"conhecedor", ou o "eu". Em termos modernos, referimo-nos ao aspecto
conhecido do self como o autoconceito ou a definição do self, e ao aspecto
conhecedor do self como consciência. Estes dois processos psicológicos
combinam-se para criar um sentido coerente da identidade. O seu self é
simultaneamente um livro, repleto de conteúdos fascinantes recolhidos ao longo
do tempo, e o leitor do livro que num dado momento pode ter acesso a um
determinado capítulo ou acrescentar um novo.

Até que ponto o autoconceito das pessoas se refere às diferentes categorias de


James? Para responder a esta questão é necessário poder medir o autoconceito
(L'Écuyer, 1978). Com o intuito de obter uma radiografia das características de
uma pessoa particular, os psicólogos desenvolveram a técnica "Quem Sou Eu?"
(Bugenthal e Ze]en, 1950; Gordon, 1968; Kuhn e McPartland, 1954; Neto,
1985). A resposta a esta questão permite obter o autocol1ceito espontâneo, isto
é, a pessoa fornece uma descrição de si própria sem ser orientada pelo
experimentador sobre as dimensões que considera importantes. A utilização
deste método tem subjacente que as pessoas referirão o que consideram mais
saliente para elas.

144
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Mim, o seif conhecido:

características que cremos possuir;

o seif como um objecto de reflexão

Self social:
Self material: Self espiritual: o que amigos, namorado,
o corpo de uma pessoa, traços de personalidade, pais, professores, etc.,
possessões físicas atitudes, valores, conhecem de mim
percepções sociais

Figura 2.1- O self conhecido conceptualizado por William James (1890)

145
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Temas Tipos de seIf Percentagem

1. Relações com os outros

(Ex. :"Tenho boas relações")


Social 59

2. Julgamentos, gostos ou actividades

(Ex.: "Jogo futebol ")


Espiritual 58

3. Comportamentos e sentimentos habituais

(Ex.: Tenho bom humor")


Espiritual 52

4. Aparência física

(Ex.: "Sou uma pessoa bonita")


Material 36

5. Liberdade de acção

(Ex.: "Sou uma pessoa que decide por si quais as minhas

actividades)
Espiritual 23

6. Sentimento de valor moral

(Ex.: "Tenho respeito por mim")


Espiritual 22

7. As reàcções dos outros em relação a mim

(Ex.: Sou uma pessoa popular")


Social 18

8. As possessões materiais

(Ex.: Possuo um automóvel")


Material 5

9. Unidade ou falta de unidade da pessoa

(Ex.: "Sou uma pessoa confusa")


Espiritual 5

Adaptado de Gordon, 1968.

Quadro 2.1 - Percepções de alunos do secundário sobre diferentes categorias do seu


autoconceito

Por exemplo, Gordon (1968) utilizou o "Quem Sou Eu?" com alunos do
secundário. O quadro 2.1 apresenta alguns dos resultados do seu estudo. Pode­
se notar que uma grande percentagem de sujeitos menciona as suas relações com
os outros (59%), os seus gostos (58%), bem como as suas emoções (52%) e a
sua aparência física (36%) como sendo aspectos inerentes a eles próprios. Estes

146
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resultados vão no sentido da poslçao de James. Efectivamente, é possível
classificar as respostas dos sujeitos segundo as categorias propostas por James.
Deste modo, os elementos 4 e 8 fazem parte do self material; os itens 1 e 7
agrupam-se no self social; enquanto que os outros enunciados do quadro 2.1
fazem parte do self espiritual.

3.2 Autoconceito de trabalho

Nem sempre damos a mesma resposta à questão "Quem Sou Eu?", dado que só
se pode ter acesso cognitivamente a uma parte do self de cada vez. Recolheu
informação sobre si durante muitos anos, por isso o seu autoconceito de
trabalho inclui somente os atributos que são activados pela situação social
actual (Markus e Kunda, 1986; Markus e Nurius, 1986).

Quando as pessoas respondem à questão "Quem Sou Eu?", geralmente referem o seu nome
("Chamo-me Manuel"), características físicas ("Tenho 22 anos"), características demográficas
("Vivo no Porto"), traços e crenças ('Tenho facilidade em fazer amigos"), e interesses e
actividades ("Gosto de ir ao cinema"). Para além disso, as pessoas tendem também a mencionar
características que as diferenciam das outras. Segundo esta perspectiva, o jovem à direita
deveria ser mais susceptível de referir o seu sexo quando se descreve.

© Universidade Aberta 147


A saliência de certas características no autoconceito espontâneo pode ser
influenciada pelo meio. O autoconceito reflectirá muitas vezes características da
identidade que tornam as pessoas distintas das que as rodeiam. O autoconceito
de trabalho inclui geralmente as características menos comuns. Por exemplo,
crianças mencionavam mais frequentemente o seu sexo de modo espontâneo
quando provinham de famílias em que esse sexo era minoritário (McGuire e
McGuire, 1981). Assim, ser do sexo feminino era uma característica
particularmente importante do autoconceito espontâneo para meninas que
provinham de famílias em que o sexo masculino era maioritário. Pelo contrário,
se uma menina provinha de uma família com um maior número de meninas, ela
era muito menos susceptível de mencionar que era uma rapariga na sua
autodescrição.

O autoconceito espontâneo pode também ser influenciado pelas circunstâncias


imediatas. Por exemplo, encontrou-se que crianças que eram mais altas ou mais
baixas que a média mencionavam mais frequentemente a sua altura que as
crianças de altura média (McGuire e Padawer-Singer, 1976). Neste mesmo
estudo entre as crianças que nasceram em países estrangeiros, 44% mencionavam
os lugares de nascimento, enquanto que só 7% das crianças nascidas no país de
residência o fizeram. O autoconceito também pode ser influenciado pelo meio
cultural mais amplo. Características políticas e sociais podem afectar as auto-
representações, como se ilustra no documento 2.1. Num estudo efectuado com
migrantes portugueses foram evidenciadas as auto-representações e a sua
estruturação (Neto, 1985). Do perfil das representações, pelo menos, as
referências migratórias, o estatuto social, a identidade portuguesa, as referências
ao regresso, categorias que estão mais relacionadas com identidade social, devem
a sua emergência à situação migratória. As três dimensões mais importantes da
identidade postas em evidência, por meio do recurso a análises multidimensionais
foram as referências identificatórias sociais, nacionais e as psicológicas.

Quer crianças judias quer árabes vivem em Israel, mas as suas condições são muito
diferentes. As crianças judias fazem parte do grupo religioso predominante, ao passo
que as crianças árabes fazem parte de um grupo mais marginalizado nessa sociedade.
Daí que mesmo se a sua nacionalidade é a mesma, se possa esperar que estes dois
grupos de crianças tenham auto-representações um pouco diferentes. Esta questão foi
analisada num estudo em que se avaliou o autoconceito de 740 adolescentes judios e
750 adolescentes árabes frequentando escolas judias e árabes em Israel (Hofman, Beit-
Hallahmi, e Hetz-Lazarowitz, 1982).

148
© Universidade Aberta
Nalguns aspectos estes dois grupos eram semelhantes, reflectindo características que
adolescentes de todos os grupos e países têm. Contudo, noutros aspectos diferiam. Os
elementos mais proeminentes das auto-representações nos judeus eram o auto-elogio e
a satisfação de vida. Nas crianças árabes sobressaíam factores, tais como auto-crítica,
religião e relações com os colegas. Em geral os adolescentes árabes tinham auto-
representações menos favoráveis, o que seria talvez reflexo do seu estatuto mais
marginal dentro da sociedade israelita.

Documento 2.1- Auto-representações de crianças judias e árabes

Definimo-nos a nós próprios, por conseguinte, pelo menos em parte, tendo em


conta as nossas diferenças em relação a outras pessoas, o que ilustra a
importância dos factores sociais do autoconceito. O nosso autoconceito
armazena uma vasta quantidade de informação acerca das nossas experiências e
relações sociais. Todavia qualidades que nos diferenciam de outras pessoas
tendem a ser mais salientes que os nossos atributos mais comuns.

3.3 Auto-esquemas

As auto-representações não são só descrições de superfície que se utilizam


quando alguém nos pergunta quem somos. Para além disso, as crenças sobre o
self podem afectar a maneira como vemos o mundo e como retemos informação
acerca de experiências e acontecimentos. Avanços no estudo da cognição
humana fornecem uma perspectiva nova importante. Esquemas são colecções
organizadas de informação acerca de algum objecto. Por isso um auto-esquema é
um tipo especial de esquema construído com tudo o que conhecemos, pensamos
e sentimos acerca de nós próprios. Para Hazel Markus (1977, p. 64) os auto-
esquemas são "generalizações cognitivas acerca do self, derivadas da experiência
passada que organizam e guiam o tratamento de informação que se refere a si
próprio contida nas experiências sociais do indivíduo". Como qualquer outro
esquema, um auto-esquema não só organiza, como também guia o
processamento de informação. Isto significa que os nossos auto-esquemas
podem influenciar as nossas percepções, memória e inferências acerca de nós
próprios (Fiske e Taylor, 1991).

149
© Universidade Aberta
Do mesmo modo que as pessoas podem ter diferentes autoconceitos, também
podem ter diferentes auto-esquemas. Bazel Markus (1977) conduziu uma
experiência para investigar os efeitos de auto-esquemas sobre o processamento
de informação. Um amplo grupo de estudantes universitários avaliaram-se em
primeiro lugar a eles próprios em termos da sua independência e dependência.
Com base nessas avaliações, aos sujeitos que se consideraram independentes,
dependentes, e que não se consideravam particularmente independentes ou
dependentes foi-lhes pedido para participar numa experiência de laboratório
supostamente não relacionada com as avaliações feitas. Markus (1977) formulou
a hipótese de que os sujeitos esquemáticos seriam capazes de decidir mais
depressa se as palavras relevantes dos seus auto-esquemas os descrevessem a
eles próprios do que os aesquemáticos, porque ter um esquema faria com que
fosse mais fácil para eles processar informação relevante para os esquemas.

Os adjectivos associados com dependência (e.g., tolerante) e independência (e.g.,


assertivo) foram apresentados no ecrã um de cada vez, e davam-se instruções aos
sujeitos para carregar no botão lia mim" se a palavra fosse autodescritiva e no
botão "não a mim" se a palavra não fosse autodescritiva. Como se pode ver na
figura 2.2, e como se esperava, os sujeitos esquemáticos independentes fizeram
julgamentos mais depressa acerca de palavras relacionadas com independência, e
os sujeitos esquemáticos dependentes fizeram julgamentos mais depressa acerca
de palavras relacionadas com dependência. Os aesquemáticos levaram o mesmo
tempo a responder acerca de ambos os conjuntos de traços.

A independência foi uma dimensão utilizada para ilustrar a operação dos auto-
esquemas. Muitas outras dimensões poderiam considerar-se. Efectivamente
qualquer atributo específico pode ser relevante para o autoconceito total de
algumas pessoas, não o sendo para outras. As pessoas podem pensar-se como
sendo masculinas ou femininas, liberais ou conservadoras, introvertidas ou
extrovertidas. Crianças e adultos descrevem-se referindo características físicas,
psicológicas e sociais (Bart e Damon, 1986). O auto-esquema do peso corporal
também já foi abordado (Markus, Hamil, e Sentis, 1987).

150
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2,5

Latência
(segundos)

2,0

Independente Dependente Sem esquemas

O
Tipo de auto-esquema

'---"""""---'...ZJj Palavras independentes Palavras dependentes

Figura 2.2 - O efeito de auto-esquemas no processamento de informação

Os auto-esquemas não se limitam só a material verbal. Parte do nosso


autoconceito implica imagens visuais. Por exemplo, as pessoas são mais
susceptíveis de se lembrarem de fotografias delas próprias mais intimamente
parecidas com a sua auto-imagem física do que de fotografias que são mais
discrepantes com essa auto-imagem, mesmo se todas as fotografias foram feitas
na mesma altura (Yarmey e Johnson, 1982). Há, pois, uma variedade de modos
em como a maneira como nos vemos a nós próprios afecta a maneira como
vemos o mundo.

O autoconceito na medida em que abarca muitos auto-esquemas é multifacetado


(Sande et al., 1988). Poder-se-ia, porventura, esperar que perante tal diversidade
de auto-esquemas experienciássemos uma confusão de identidade. Há, no

15t
© Universidade Aberta
entanto, dois motivos que contradizem isso. O primeiro tem a ver com o facto de
que à semelhança dos cientistas que integram as suas hipóteses numa só teoria,
os indivíduos transportam os seus auto-esquemas conjuntamente num
autoconceito, talvez organizado numa história de vida coerente (Epstein, 1973;
Gergen e Gergen, 1988). O segundo motivo tem a ver com a autocomplexidade
definida pelo número de identidades distintas que uma pessoa tem (amigo,
namorado, estudante, jogador de futebol, etc.) que propicia um amortecedor
contra agentes de stress. As pessoas com um autoconceito complexo acham ser
relativamente mais fácil absorver as contrariedades da vida (Linville, 1985). Se
uma pessoa só tem uma ou duas identidades principais, qualquer acontecimento
único pode ter um impacto na maior parte dos aspectos do autoconceito. A
mulher que se vê sobretudo como esposa, por exemplo, pode ficar arrasada se o
seu casamento acaba. Quando o papel de "esposa" já não está mais disponível,
uma grande parte do seu autoconceito, da sua identidade também acaba. Pelo
contrário, a pessoa que tem uma representação mais complexa do self pode estar
mais protegida contra acontecimentos negativos que envolvam somente um ou
dois dos vários papéis. A mulher que se vê não só como esposa, mas também
como mãe, engenheira, amiga e nadadora, terá outros papéis a que se agarrar se
o papel de esposa já não está disponível.

3.4 Memória autobiográfica

Os auto-esquemas afectam também o modo como relembramos o passado. Sem


memória autobiográfica, isto é, as nossas lembranças da sequência de
acontecimentos que tocaram a nossa vida (Rubin, 1986), não teríamos auto-
representações. Quem seríamos nós se não pudéssemos lembrar-nos dos pais,
dos colegas de infância, dos lugares onde vivemos, da experiência havida com
pessoas em determinados locais? Se as lembranças configuram as nossas auto-
representações, veremos nesta secção que as auto-representações também
configuram as nossas lembranças (Ross, 1989).

Greenwald (1980) propôs que o self actua como um ego totalitário que processa
a informação de modo enviesado. Este autor identificou três viés principais:
egocentração, beneficiação e conservadorismo cognitivo.

152
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3.4.1 Egocentração

A egocentração descreve a tendência para o julgamento e a memona se


focalizarem no self. Acontecimentos que afectam o self são lembrados melhor
que informação que não é relevante para o self. Actores assumem a honra
injustificada para acontecimentos em que eles próprios e outras pessoas
estiveram envolvidos. Por exemplo, perguntou-se a casais até que ponto cada
cônjuge tinha contribuído para cuidar dos filhos, para resolver conflitos, para
tomar decisões importantes e para limpar a casa (Ross e Sicoly, 1979). Em média
cada cônjuge reclamou que tinha efectuado a contribuição principal cerca de
7090 das vezes. Trata-se efectivamente de uma impossibilidade lógica reflectindo
o viés egocêntrico.

Para além destas tendências egocêntricas há a crença que as pessoas têm de


controlar acontecimentos que ocorrem meramente por acaso. Esta ilusão de
controlo foi demonstrada quando uma série de moedas foram lançadas ao ar.
Foram lançadas de modo que nos primeiros dez arremessos alguns sujeitos
perdessem mais, enquanto que outros ganhariam. No fim dos ensaios, qualquer
que fosse o seu sucesso nos primeiros dez arremessos, todos os sujeitos
ganharam e perderam 50 por cento das vezes. Todavia os sujeitos que ganharam
mais frequentemente nos primeiros ensaios prediziam que fariam melhor numa
centena de arremessos futuros enquanto que os que então perderam mais eram
menos optimistas acerca dos ganhos futuros (Langer e Roth, 1975).

A egocentração também se manifesta no viés do falso consenso, isto é, a


tendência geral para as pessoas acreditarem que a maior parte das outras pessoas
se comporta e pensa como nós (Ross, Greene e House, 1977; van der Plight,
1984). O efeito do falso consenso pode explicar porque é que os consumidores
de drogas são muitas vezes defensivos quando confrontados com o seu
comportamento. Na sua opinião o uso de drogas não é um assunto de grande
importância porque "toda a gente o faz". Ainda outra forma de egocentração no
autoconhecimento é a crença que tem a maior parte das pessoas que são
melhores que a média em qualquer categoria ou traço socialmente desejável
(Felson, 1981b).

153
© Universidade Aberta
I
I
,I
'I
3.4.2 Beneficiação

Este processo opera quando tiramos conclusões acerca de nós próprios a partir
das nossas acções. Para mantermos um conceito positivo do self, chamamos a
nós o sucesso e negamos a responsabilidade pelo fracasso. A "beneficiação"
(beT1Tlefectance) é um viés de aUfocomp!acência que preserva o nosso sentido de
competência. Por exemplo, quando os estudantes tiram boas notas, dizem que os
exames foram elaborados de modo correcto. Mas quando as notas são fracas não
assumem a responsabilidade do seu fracasso e consideram o exame (ou o
examinador) incapaz de avaliar as suas capacidades (Arkin e Maruyama, 1979).
Um outro exemplo é-nos dado a propósito da negação de responsabilidades por
parte do agressor. Numa variante do procedimento utilizado por Milgram (1963)
para estudar a obediência, Harvey, Harris e Barnes (1975) levaram sujeitos que
desempenhavam o papel de professores a administrarem (pelo menos
acreditavam que administravam) fortes descargas eléctricas aos seus "alunos",
enquanto outros sujeitos acreditavam que só administravam choques ligeiros. Os
sujeitos declararam-se menos responsáveis da dor aparente dos seus "alunos"
quando se julgava que os choques eram violentos do que quando julgavam que
eram ligeiros. Para além disso, atribuiram-se menos responsabilidade pela forte
dor dos seus "alunos" do que fizeram terceiras pessoas em posição de
observadores. Este viés de autocomplacência será reexaminado mais adiante no
capítulo sobre atribuição. Diga-se tão só que muitas vezes este viés tem sido
apresentado como universal. Ora ele é efectivamente bastante específico a certos
elementos da cultura ocidental. Numa série de investigações efectuadas no Japão
(Markus e Kitayama, 1991) não foi evidenciado nenhum viés de autovalorização
na comparação social. Produziu-se simplesmente o inverso, um forte viés de
auto-apagamento.

3.4.3 Conservadorismo cognitivo

O conservadorismo cognitivo significa que os nossos autoconceitos tendem a


resistir à mudança. A maior parte das vezes as pessoas colocam-se em situações
susceptíveis de reforçar os seus auto-esquemas existentes, procurando confirmar
informação e evitar situações que possam suscitar informação inconsistente.

Este viés foi demonstrado por sujeitos que entrevistaram outra pessoa (Snyder e
Swann, 1978). O modo como os sujeitos colocavam as questões permitiu-lhes
confirmar hipóteses prévias acerca da pessoa entrevistada. Por exemplo, se um

154
© Universidade Aberta
sujeito pensava que a pessoa entrevistada era introvertida, fazia-lhe questões do
seguinte teor: "O que é que não gosta em festas barulhentas?" A resposta era
então interpretada em apoio da crença prévia do sujeito de que a pessoa
entrevistada era introvertida. Do mesmo modo, selecciona-se informação para
confIrmar expectativas sobre o self de uma pessoa (Mishel, Ebbersen, e Zeiss,
1973).

Apesar da tendência a resistir à mudança, os nossos autoconceitos, atitudes e


valores podem mudar com o tempo. Quando tal acontece, as pessoas mantêm a
sua imagem de consistência distorcendo a sua memória das suas atitudes
anteriores, lembrando-as como estando mais perto das atitudes actuais do que
realmente estavam (Bem e McConnel, 1970). A memória aparece como sendo
maleável e é reconstituída para permitir que uma pessoa mantenha uma
perspectiva consistente do seu self.

3.5 Origens do self

Examinaremos de seguida factores que podem contribuir para o desenvolvimento


do self.

3.5.1 Avaliação reflectida

O autoconceito inclui crenças acerca das nossas características e uma avaliação


de cada característica, quer se trate de aspectos positivos ou negativos. Muitos
de nós pretenderíamos que o nosso autoconceito não estivesse dependente do
que os outros dizem, todavia uma fonte de informação central acerca do
autoconceito são as reacções que as pessoas têm em relação a nós. Prestamos
muita atenção ao que outras pessoas signifIcativas para nós, tais como amigos,
pais, professores, dizem a nosso respeito. Por isso o nosso julgamento sobre nós
próprios reflecte de muitas maneiras a avaliação dos outros a nosso respeito.
Cooley (1902) afIrma que aprendemos acerca de nós próprios através dos
outros. Utilizou a analogia de um espelho ou "olhar-se num espelho". As pessoas
que estão à nossa volta agem como um espelho social, reflectindo e dizendo-nos
quem somos.

155
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As avaliações ref/eetidas são percepções das pessoas sobre o modo como outras
pessoas as vêem. A importância das avaliações reflectidas para modelar o
autoconceito tem sido ressaltada por investigação que mostra que as auto-
avaliações estão geralmente correlacionadas de modo positivo com' o que as
pessoas pensam dos outros (Shrauger e Schoeneman, 1979). Por exemplo,
pediu-se a crianças para avaliarem a sua própria atractividade física (uma medida
do seu autoconceito) e também para avaliar como pensavam que os seus colegas
os avaliariam (uma medida da avaliação reflectida) (Felson, 1985a). Em
consonância com a noção de avaliação reflectida, as avaliações dos indivíduos
estavam correlacionadas positivamente com a sua estimativa das avaliações dos
seus colegas. Tal sugere que as autopercepções das crianças baseavam-se, pelo
menos parcialmente, no modo como as outras crianças as viam.

Todavia, a informação dos outros nem sempre é percepcionada de modo


totalmente correcto. As nossas atitudes, valores e outras partes dos nossos auto-
esquemas podem fazer com que haja uma distorção da informação recebida.

3.5.2 Comparação social

Como é que um estudante pode decidir em que medida é inteligente? O que lhe é
transmitido pelos pais, professores, os resultados de um teste de inteligência ou
outras fontes externas são susceptíveis de fornecer alguma informação. Um
segundo modo de se avaliar a inteligência é através da comparação do seu nível
de inteligência com o dos colegas. A comparação social pode permitir avaliar as
nossas habilidades, pensamentos, sentimentos e traços comparando-nos com
outros. Festinger (1954), um dos teóricos que mais influenciou a moderna
psicologia social, desenvolveu a teoria da comparação social para explicar este
processo. A sua teoria afIrma que na ausência de um padrão físico ou objectivo
de exactidão, procuramos as outras pessoas como meio para nos avaliarmos.

A investigação mostra que muitas vezes as pessoas escolhem comparar-se com


outras pessoas semelhantes quando se avaliam. Por outras pessoas semelhantes,
entende-se pessoas que condizem em dimensões que estão relacionadas com a
comparação em questão (Goethals e Darley, 1987). Idade, sexo e habilidade
atlética geral podem ser factores relevantes para um jogador junior de futebol
efectuar comparações. Não se vai comparar com uma criança de seis anos ou
com um famoso jogador profissional em pleno auge da sua carreira.

156
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A utilização do sexo como critério para se escolher os outros para comparação
tem-se revelado uma dimensão particularmente importante de comparação. Por
exemplo, quando se pedia a sujeitos numa experiência para escolher uma pessoa
com quem gostariam de comparar a sua realização, ambos os sexos exprimiam
geralmente uma preferência mais forte por alguém do mesmo sexo (SuIs, Gaes e
Gastorf, 1979; Zanna, Goethals e Rill, 1975).

As comparações com os outros podem pôr em evidência comparações positivas,


também podem salientar que as pessoas são piores que outras. As crianças
podem ser especialmente vulneráveis a estas comparações negativas, uma vez
que o seu autoconceito se está a desenvolver. Por exemplo, verificou-se que
irmãos de crianças sobredotadas tinham problemas relacionados com auto-estima
e ansiedade que poderiam resultar da comparação com o seu irmão(ã)
sobredotado(a) (Comell e Grossberg, 1986).

3.5.3 Comparação temporal

As pessoas podem também auto-avaliar-se efectuando comparações entre o seu


self presente e o seu self passado, isto é, efectuando comparações temporais
(Albert, 1977). Frequentemente as pessoas efectuam comparações entre a sua
realização passada e actual. As avaliações efectuadas com base nas tendências
temporais podem ser fonte de satisfação quando a realização melhorou
(Campbel1, Fairey e Fehr, 1986).

Para certas pessoas, como por exemplo, pessoas idosas, as comparações


temporais podem acentuar a deterioração nas suas capacidades e na sua saúde.
Comparações desse género podem suscitar uma baixa da auto-estima e ter
efeitos depressivos, muito especialmente quando essa deterioriação é
permanente.

Note-se, enfim, que quando se efectuam comparações temporais pode haver uma
relativa distorção. As pessoas podem ter esquecido até que ponto mudaram. As
pessoas podem ser "historiadores revisionistas" na medida em que têm a
capacidade de reescrever as suas histórias pessoais do modo que lhes convém
(Ross e McFarland, 1988).

157
© Universidade Aberta
3.5.4 Autopercepção

Uma outra fonte de informação acerca do self baseia-se nas inferências e


observações que as pessoas fazem quando observam o seu próprio
comportamento. A teoria da autopercepção propõe que as pessoas conhecem as
suas próprias atitudes, emoções e outros estados internos, parcialmente
inferindo-os de observações do seu próprio comportamento e ou de
circunstâncias em que este comportamento ocorre (Bem, 1972). Suponha que o
João começa a falar com a Rita, que nunca vira antes, num bar onde só se
encontram os dois. Se o João observa que tem a boca seca, se sente perturbado e
embaraçado pode ser levado a pensar que tendo em conta o modo como está a
reagir deve gostar da Rita. Esta sua atitude positiva em relação à Rita pode ter
sido inferida a partir da observação do seu comportamento.

A teoria da autopercepção tem implicações importantes para a motivação


humana. Quando se paga às pessoas para fazerem algo, elas não gostam tanto
desse trabalho como quando elas o fazem e não são pagas ou quando iniciam elas
próprias a acção (Deci e Ryan 1980). Realizar uma acção sem razões externas
claras leva o autor a inferir que deve ter valores que levem a este
comportamento.

3.6 O self num contexto cultural

o nosso sentido do self combina aspectos privados ou internos de uma pessoa e


aspectos mais públicos ou sociais de alguém que se identifica com vários grupos,
como sejam grupos culturais, raciais, religiosos, políticos, sexuais, etários e
profissionais, para só referir alguns. Os aspectos mais privados do self fornecem-
nos um sentido de identidade pessoal, ao passo que os aspectos mais públicos do
self propiciam-nos um sentido de identidade social (Tajfel e Turner, 1979).

Um sentido do self mais privado e separado dos outros tem sido sugerido como
sendo típico das culturas ocidentais, ao passo que um sentido do self mais
socialmente integrado, tem sido apresentado como sendo mais típico das culturas
orientais. Contudo, já se referiu que alguns dos primeiros teóricos do self
avançaram a ideia de que o self é fundamentalmente social. As outras pessoas,
amigos, farrulia e antepassados foram vistos por William James (1890), por
exemplo, como uma parte importante do self. Para além disso, o

158 © Universidade Aberta


i

desenvolvimento de um sentido do self foi visto como ocorrendo só através de


interacção com outras pessoas e com a sociedade (Cooley, 1902; Mead, 1934).
E hoje em dia os que enveredam por uma perspectiva sócio-cultural vêem o self
como "propriedade da cultura" (Sampson, 1991). É sobre esta fonte social da
nossa identidade que nos focalizaremos nesta secção.

3.6.1 A importánci(/ de um grupo para o sentido do self

Uma das teorias com grande influência que apareceu em Psicologia Social desde
a crise dos anos 70 foi a Teoria da Identidade Social (Tajfel, 1982; Tajfel e
Turner, 1979). Esta teoria sublinha que a pertença grupal é muito importante
para o autoconceito de uma pessoa. A sua identidade social é aquela parte do seu
autoconceito que advém de ser membro de grupos sociais e da identificação com
eles. Distingue-se da identidade pessoal que engloba os aspectos únicos e
individuais do seu autoconceito. Por outras palavras, é a parte do seu sentido de
self que advém do conhecimento de que faz parte de grupos particulares na
sociedade. Alguns destes grupos são escolhidos por si, tais como quando decide
candidatar-se a determinada Faculdade. Mas também se pode ser membro de
grupos de modo involuntário: nascemos neles ou fomos a eles adstrictos pela
sociedade. Por exemplo, não escolhemos o nosso grupo sexual, etário ou de
meio cultural de origem.

Muitas vezes o nosso sentido de valor do self está ligado ao grupo a que
pertencemos ou com que nos identificamos. Por exemplo, a auto-estima dos
adeptos de uma equipa de futebol pode aumentar ou diminuir com a vitória ou a
derrota da sua equipa. Assim, uma proposição fundamental da teoria da
identidade social é a de que os indivíduos procuram manter ou realizar uma
identidade social positiva e distintiva. Em primeiro lugar, estamos preocupados
com que o nosso grupo se possa distinguir de outros grupos, o que nos assegura
uma identidade. Em segundo lugar, estamos também preocupados com que os
nossos grupos sejam avaliados positivamente em relação a outros grupos
existentes na sociedade.

Para se estabelecer se o nosso grupo tem uma identidade social pOSItIva ou


negativa usa-se a comparação social intergrupal. Comparamos o estatuto e o
respeito do nosso grupo com outros grupos na sociedade. Se se pretender avaliar
a importância do estatuto de um grupo para uma pessoa podemos observar a sua

159
© Universidade Aberta
reacção quando se ouve alguém num lugar público dizer algo negativo a respeito
de um grupo a que se pertence. No caso desse grupo aparecer conotado com
uma identidade social negativa, a teoria sugere que o indivíduo está motivado
para a melhorar. Tal envolve muitas vezes uma identidade em competição com
outros grupos e pode levar ao preconceito e a conflitos. Os teóricos da
identidade social caracterizariam os numerosos movimentos nacionalistas e
étnicos que têm ocorrido no mundo como exemplos de luta por uma identidade
social avaliada de modo positivo e separado (e. g., Taylor e Moghaddam, 1987).
A identidade social tem implicações no domínio do preconceito e da
discriminação que examinaremos noutro capítulo.

A teoria da identidade social tem gerado uma grande quantidade de investigação


(Augoustinos e Walker, 1995). Um exemplo desse trabalho é o desenvolvido
com a Escala Colectiva de Auto-Estima (Luthanen e Crocker, 1992). O objectivo
desta escala é medir sentimentos a respeito de grupos sociais a que o indivíduo
pertence. A escala avalia a auto-estima em relação à pertença a grupos sociais.
Os items tratam do modo como os sujeitos se sentem acerca dos grupos sociais a
que pertencem, como se sentem acerca das suas contribuições para estes grupos,
como é que os outros avaliam estes grupos e quão importante é para a sua
identidade ser membro desses grupos.

3.6.2 Self e cultura: Identidade social através das culturas

Um dos aspectos mais importantes da identidade social de uma pessoa é a sua


cultura que tem sido definida como o sistema organizado de significações,
percepções e crenças partilhadas por pessoas que pertencem a um grupo
particular (Neto, 1997). A compreensão partilhada de uma cultura passa de
geração em geração e simultaneamente modela e é modelada por cada geração
suceSSIva.

A possibilidade de que o self seja uma construção cultural, podendo variar


interculturalmente, tornou-se um alvo de investigação teórica e empírica na
década passada. A questão central foi levantada em primeiro lugar por
Shweder e Bourne (1984): "0 conceito da pessoa varia interculturalmente?" A
resposta que deram a essa questão, com base em investigação no estado de
Orissa, foi que as pessoas acreditam ser alteradas pelas relações sociais em que
entram e descrevem-se não tanto em termos de traços duradoiros, mas em
termos de relações sociais.

160
© Universidade Aberta
Em duas análises do self e da cultura é apresentado um amplo exame desta
questão (Triandis, 1989; Markus e Kitayama, 1991). São aí esboçadas
diferenças nos pensamentos e sentimentos auto-referentes e tendo em conta
ênfases culturais que diferem em independência e individualismo, por uma
lado, e interdependência e colectivismo, por outro lado.

Ponto de vista individual Ponto de vista colectivista

o self deve ser independente do grupo. o auto-conceito é dependente do grupo.


o auto-conceito é sobretudo definido por o auto-conceito é prioritariamente
atributos internos. detinido pelos papéis e pelas relações
sociais.

As pessoas são socializadas por forma a As pessoas são socializadas por forma a
serem únicas, a validarem os seus pertencerem e ocuparem o seu lugar e
atributos internos, a promoverem os seus envolverem-se em grupos adequados e a
próprios objectivos e a dizerem o que "lerem as mentes dos outros".
pensam.

A auto-estima baseia-se na capacidade de A auto-estima baseia-se na capacidade


se auto-exprimir e na capacidade de de cada um se ajustar ao grupo,
validar atributos internos. restringir os seus próprios desejos e
manter a harmonia social.

Figura 2.3 - Influência do individualismo-colectivismo na estrutura do self

A Figura 2.3 esboça o modo como as diferenças culturais a propósito do


individualismo-colectivismo influenciam a estrutura do autoconceito. Note-se
que o self enquanto tópico de investigação tem interessado sobretudo
cientistas sociais de culturas individualistas. Tenha pois presente que

161
© Universidade Aberta
resultados apresentados neste capítulo são sobretudo susceptíveis de serem
generalizados a culturas com uma orientação individualista.

Triandis (1989) refere as distinções entre o self privado (a avaliação do self


por si próprio), o self público (a avaliação do self por um outro generalizado) e
o self colectivo (a avaliação do self por um grupo de referência particular).

Triandis defende que a probabilidade de que um indivíduo escolha cada um


destes três aspectos do self varia segundo as culturas. Nas culturas
individualistas (e.g., os Estados Unidos) o self privado tende a ser mais
complexo e mais saliente que o self colectivo, e por isso é mais susceptível de
ser escolhido. Nas culturas colectivistas (e.g., Japão, China) o self colectivo
tende a ser mais complexo e mais saliente que o self privado, e por isso é mais
susceptível de ser escolhido. Investigação empírica tem apoiado este quadro.
Trafimow et aI. (1991) mostraram que as autocognições privadas e colectivas
eram representadas de modo independente na memória e que os sujeitos de
culturas individualistas (Estados Unidos) relembravam mais cognições acerca
do self privado e menos acerca do self colectivo que sujeitos de uma cultura
colectivista (e.g., China).

Outras investigações focalizaram-se em documentar as consequências destas


diferenças. Triandis et aI. (1990) utilizaram sujeitos de cinco culturas
conhecidas como sendo a priori diferentes nos seus níveis de colectivismo
(Estados Unidos, Grécia, Havai, Hong-Kong e China) e cinco métodos para
explorar aspectos do self. Encontraram que a perspectiva do self obtida de
membros de culturas colectivistas mostrava maior percepção de homogenidade
do endogrupo que do exogrupo, comportamento mais íntimo e submisso em
relação ao endogrupo, maior ênfase em valores que promovem o bem-estar do
endogrupo do que o self obtido de membros de culturas individualistas.
Encontraram também que referências a si próprios como membros de uma
categoria social eram muito mais elevadas para as respostas dos chineses do
que para as das outras culturas. As percentagens médias de respostas
colectivas em amostras de culturas asiáticas variavam entre 20 e 52% e em
amostras europeias e americanas entre 15 e 20%. Em Portugal encontrou-se
que a percentagem de respostas ligadas ao self colectivo era de 15% (Neto,
1995) o que denota individualismo.

Markus e Kitayama (1991) avançaram uma perspectiva relacionada de cultura


e de self. Ao invés da teoria compreensiva de diferenças interculturais de
Triandis (1989), Markus e Kitayama focalizaram-se só num aspecto, de como

162
© Universidade Aberta
as pessoas se vêem a elas próprias, em particular, no grau de separação versus
ligação com os outros. Fizeram a distinção entre dois tipos de self: um self
independente, em que o self é uma entidade separada e autónoma; e um self
interdependente, em que o self é fundamentalmente ligado aos outros e guiado,
pelo menos em parte, pelas percepções do~ pensamentos, sentimentos e acções
dos outros. Defenderam que as culturas ocidentais promovem o
desenvolvimento de um self independente, ao passo que muitas das culturas
não ocidentais promovem o desenvolvimento de um self interdependente. No
documento 2.2 é apresentada a experiência do self na cultura japonesa.

Devos (1985) discutiu a expenencia do self na cultura japonesa, onde está


intimamente ligado à interacção social e às relações sociais. Segundo Azuma, Hess
e Kashi wagi (1981), as crianças japonesas são disciplinadas desde tenra idade para
uma consciência dos efeitos das suas acções nas outras pessoas. Deste modo, as
pessoas japonesas tornam-se altamente sensíveis à culpa interpessoal, e também à
vergonha social, muito embora Devos pense que esta última é menos importante
que a culpa internalizada sentida por um indivíduo acerca dos efeitos das suas
acções sobre os outros.

Culpa internalizada e consciência das consequenclas interpessoais do


comportamento formam uma base importante da percepção japonesa do self.
Segundo Devos, as pessoas japonesas encontram a derradeira satisfação na
"pertença" e em estar conscientes da sua pertença. Pertença significa que podem
evitar a dolorosa autoconsciência associada à existência como um indivíduo
separado, e em vez disso encontram um lugar no âmbito da identidade grupal.
Obviamente tal não significa que as pessoas japonesas não são indivíduos com os
seus próprios pensamentos e ideias, pois todo o ser humano é assim. Mas significa
que muitos destes pensamentos são conservados de modo muito privado, no caso de
perturbarem um pouco o equilíbrio social; e que o sentido pessoal da identidade do
indivíduo está muito mais fortemente enraizado nas relações sociais e no
comportamento social apropriado.

Documento 2.2 - A experiência do self na cultura japonesa

Para Markus e Kitayama (1991) estas auto-representações divergentes têm


consequências específicas para a cognição, a motivação e o comportamento.
Investigações empíricas estão dando os primeiros passos na documentação
destas consequências, particularmente em relação à cognição. Por exemplo,
Markus e Kitayama (1991) apresentaram resultados de um estudo em que

163
© Universidade Aberta
estudantes dos Estados Unidos mostraram assimetrias nos julgamentos da
semelhança self-outro em favor do self, isto é, o self era julgado como sendo
menos semelhante ao outro do que o outro ao self, ao passo que estudantes
indianos mostraram a assimetria oposta. Do mesmo modo, Cousins (1989)
encontrou que estudantes japoneses e americanos diferiam nos seus padrões de
auto-descrição consoante o contexto interpessoaI. Inicialmente utilizou a
versão usual do "Quem sou eu?". Como era esperado, encontrou-se que os
americanos referiam muitos mais traços psicológicos para se descreverem,
enquanto que os japoneses forneciam mais exemplos de comportamentos em
papéis específicos (e.g., alguém que nada muitas vezes). Cousins modificou
então o "Quem sou eu?" pedindo aos sujeitos para se descreverem como se
estivessem numa série de contextos específicos: por exemplo, em casa, com os
seus amigos, etc. Nestas condições o padrão e respostas foi invertido. Os
estudantes japoneses descreviam-se por meio de atributos psicológicos, ao
passo que os estudantes americanos referiam-se a preferências e desejos.
Cousins conclui que a necessidade dos americanos em preservar um
autoconceito independente levava-os a afirmar que, embora pudessem
comportar-se de um certo modo num contexto particular, tal não reflectiria
necessariamente o seu self "real". Os sujeitos japonenses, por outro lado, eram
mais capazes de se caracterizarem a eles próprios quando é especificada a
natureza da sua interdependência. Estes resultados ilustram algumas das
consequências cognitivas do self independente e interdependente.

Parece pois haver algum apoio para a distinção entre auto-representações


independentes e interdependentes em estudos acabados de referir, se bem que
nenhum deles incluísse uma medida dos valores sancionados pelos sujeitos.
Alguma evidência encontramo-la numa série de estudos de Gudykunst que se
focalizou no conceito de auto vigilância a que nos referiremos mais adiante
neste capítulo. Gudykunst et aI. (l992a, 1992b) propuseram que a escala de
Snyder só media o tipo de autovigilância que se espera em culturas
individualistas. Após a condução de entrevistas com sujeitos japoneses e
chineses, Gudykunst et aI. elaboraram uma nova escala de autovigilância. Pode
assim ser mostrado que os sujeitos americanos e britânicos tinham resultados
mais elevados nos itens que mediam vigilância do próprio comportamento da
pessoa, enquanto que os sujeitos japoneses e chineses obtinham resultados
mais elevados em itens que mediam vigilância do comportamento dos outros,
em vista a determinar um comportamento socialmente apropriado. Para além
disso, mostrou-se que estas diferenças eram mais fortes para os que sancionavam
valores interdependentes do que para os que sancionavam valores independentes.

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Em suma, os estudos actuais mostram que se todas as culturas parecem ter um
conceito do self, elas variam na compreensão deste conceito. Diversos estudos
interculturais convergem em apontar que a conceito do self e a importância
que se lhe atribui não se pode universalizar a todas as culturas não ocidentais.

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4. Avaliando o Self: auto-estima

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Que pensa de si próprio(a)? É capaz de fazer determinadas coisas tão bem
como as outras pessoas? Está satisfeito(a) com a sua aparência e com a sua
personalidade? Nunca se sente inútil? É optimista quanto ao seu futuro?
Passemos pois do conceito cognitivo de si próprio, à auto-estima, componente
mais afectiva do self.

o conceito de auto-estima é um dos que ocorre com muita frequência na


literatura sobre auto-representações. A auto-estima refere-se à avaliação de si
próprio(a), seja de modo positivo ou negativo, e contém julgamentos sociais
que as pessoas internalizaram. Também abarca numerosos auto-esquemas; as
pessoas avaliam-se a elas próprias de modo favorável nalguns aspectos, mas
não noutros (Fleming e Courtney, 1984).

Ao passarmos a abordar a auto-estima, movemo-nos da informação factual


contida no nosso autoconceito ("Sou estudante de Psicologia") para também
se incluírem as avaliações ligadas a esta informação ("E gosto de ser estudante
de Psicologia"). Em termos cognitivos podia-se dizer que passamos de
"cognições frias" para "cognições quentes" (T.B. Rogers, 1980). É óbvio que
autoconceito e auto-estima não são totalmente independentes. Não se pode
valorizar algo a não ser que já se tenha uma ideia clara do que é. E,
inversamente, ter uma ideia clara de algo inclui certamente sentimentos
avaliativos disso. Ambos estão ligados.

Nesta secção abordaremos sete questões. 1) Como é avaliada a auto-estima?


2) Como é que a auto-estima se desenvolve? 3) Como é que auto-estima e
comportamento se relacionam? 4) Há variações na auto-estima? 5) Quais são
as consequências das autodiscrepâncias? 6) Como é que a autoconsciência
influencia os modos de pensar e de sentir? 7) Que técnicas utilizamos para
proteger a nossa auto-estima?

4.1 Avaliação da auto-estima

A nossa auto-estima global depende do modo como avaliamos as nossas


identidades de papéis específicos, isto é, conceitos do self em papéis
específicos (e.g., estudante, amigo, filha) e as qualidades pessoais. Avaliamos
cada uma delas como sendo relativamente positivas ou negativas. Por
exemplo, pode considerar-se um estudante competente e um tenista
incompetente. Segundo a teoria, o nosso nível global de auto-estima é o

169
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produto destas avaliações individuais, com cada identidade pesada segundo a
sua importância (Rosenberg, 1965).

Habitualmente estamos inconscientes do modo preciso como combinamos e


pesamos as avaliações das nossas identidades específicas. Se pesamos as
identidades avaliadas positivamente como mais importantes, podemos manter
um elevado nível global de auto-estima ainda que admitindo uma certa
fraqueza. Se damos um grande peso às identidades avaliadas negativamente,
teremos baixa auto-estima global mesmo se temos muitas qualidades de valor.

Dispõe-se de diversas medidas da auto-estima, mas provavelmente uma das


mais populares seja a escala elaborada por Rosenberg (1965). Segundo
Rosenberg, os resultados desta escala permitem prever emoções e
comportamentos das pessoas. Por exemplo, quando o teste foi administrado a
doentes internados em hospitais psiquiátricos, aqueles que obtiveram
resultados baixos em auto-estima eram também infelizes. Os resultados da
auto-estima correspondiam também às percepções de pessoal de enfermagem
que avaliaram como sendo deprimidos os pacientes com baixa auto-estima.

4.2 Desenvolvimento da auto-estima

Como se desenvolve a auto-estima? As raízes da auto-estima mergulham na


infância. Segundo Gordon Allport (1961), a auto-estima torna-se uma parte
importante da auto-consciência entre os 2 e 3 anos. Por essa altura as crianças
começam a exercer controlo sobre elas próprias e sobre os outros objectos.
Se fracassam constantemente ou são frustradas nas suas tentativas de
autonomia, a sua auto-estima ressente-se. Erik Erikson (1963) propôs um
processo semelhante no segundo estádio de desenvolvimento de "autonomia
versus vergonha e dúvida."

Investigadores que examinaram os estilos educativos de crianças referem uma


forte influência das primeiras experiências sobre a auto-estima (Baurnrind,
1967, 1991). Quando os pais dão liberdade às crianças ou quando lhes
explicam as razões que estão por trás das restrições, a auto-estima desenvolve-
se. As crianças com maior auto-estima provêm de famílias com estilos
educativos "indulgentes" ou "autoritativos" (democráticos). Os pais
indulgentes envolvem-se com dificuldade com os seus filhos, mas permitem-
lhes fazer as suas próprias escolhas. Os pais autoritativos também se envolvem

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com os seus filhos, mas mantêm regras e dão maIs assistência. Os paIs
autoritativos explicam as razões das suas regras e permitem às cnanças
questionar as suas restrições.

Por outro lado, as crianças com a auto-estima mais baixa são originárias de
famílias que são "autoritárias" ou "negligentes". Os pais autoritários exigem
submissão inquestionável e não se envolvém com os seus filhos. Os pais
negligentes não exigem uma disciplina estricta nem se envolvem com os seus
filhos (Lambom, et aI., 1991; Barros, 1994).

Outros estudos sugerem uma ampla gama de experiências que podem afectar a
auto-estima. Por exemplo, uma baixa auto-estima na idade adulta pode
desenvolver-se a partir de experiências infantis desagradáveis, tais como medo
de castigo, preocupações com as notas escolares, ou a percepção de que uma
pessoa é feia (Kaplan e Pokomy, 1970). Outras experiências negativas da
infância associadas a uma baixa auto-estima incluem a hospitalização de um
dos pais por doença mental, um outro casamento de um dos pais, ou a morte
de um pai (Kaplan e Pokorny, 1971).

4.3 Auto-estima e comportamento

A auto-estima tem uma grande influência na vida quotidiana. As pessoas com


elevada auto-estima muitas vezes comportam-se de modo bastante diferente
das pessoas com baixa auto-estima. A investigação indica que alta auto-estima
está associada com implicação social activa e propiciadora de conforto, ao
passo que baixa auto-estima é um estado debilitante (Rosenberg, 1979; Wylie,
1979).

Crianças, jovens e adultos com elevada auto-estima são sociáveis e populares


com os seus colegas, confiam mais nas suas próprias opiniões e julgamentos e
estão mais seguras das percepções de si próprias (Campbell, 1990). São mais
assertivas nas suas relações sociais, mais ambiciosas, e obtêm melhores
resultados académicos. Durante os anos de escola os sujeitos com auto-estima
mais elevada participam mais em actividades extra-curriculares, são escolhidos
mais frequentemente para papéis de liderança, mostram maior interesse nos
assuntos públicos, e têm maiores aspirações profissionais. Quando submetidos
a testes psicológicos aparecem como sendo mais saudáveis, mais bem
adaptados, e relativamente isentos de sintomas. As pessoas adultas com

171
© Universidade Aberta
elevada auto-estima experienciam menos stress a seguir à morte de um(a)
cônjuge e confrontam-se de modo mais eficaz com os problemas daí
decorrentes (Johnson, Lund, e Dimond, 1986). Pessoas idosas com elevada
auto-estima experienciam menor ansiedade perante a morte (Simões e Neto,
1994).

Em contextos escolares os estudantes com baixa auto-estima envolvem-se


menos em discussões na turma e nos grupos formais e usualmente não acedem
à liderança. As pessoas com baixa auto-estima são infelizes e vêem-se a elas
próprias como fracassadas. Uma vez que prevêem fracasso no futuro, não
tentam tarefas difíceis e abandonam o que apresenta obstáculos (Coopersmith,
1967; Ickes e Layden, 1978; Rosenberg, 1965). Pode acontecer que uma
atitude derrotista envolva uma pessoa num círculo vicioso. Perante
expectativas de fracasso, as pessoas com baixa auto-estima sentem-se ansiosas,
mas esforçam-se pouco quando se aproximam desafios vitais importantes.
Perante o fracasso, um resultado provável perante tal atitude negativa,
culpabilizam-se, sentem-se ainda mais incompetentes e mantêm os seus baixos
níveis de auto-estima (Brockner, 1983).

4.4 Variações na auto-estima

Muito embora os níveis de auto-estima sejam relativamente estáveis, pode no


entanto haver variações. Muitas vezes essas variações ocorrem durante alguns
minutos, outras vezes durante anos.

4.4.1 Adolescência

Os acontecimentos da adolescência podem abanar a auto-estima. Tanto a


transição para o terceiro ciclo do básico como o início da puberdade podem
ser traumáticos. O crescimento físico rápido e outras mudanças podem causar
grandes estragos na imagem corporal e lançar desordem na auto-estima. As
raparigas que amadurecem mais cedo e os rapazes que amadurecem mais tarde
parecem sofrer mais no seu desenvolvimento social, incluindo na sua auto-
estima. Alguns destes efeitos podem ainda persistir na idade adulta. Mas
mesmo aqueles que amadurecem com os seus colegas podem sofrer uma baixa
na auto-estima quando deixam o grau mais elevado da escala do segundo ciclo

172
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e entram na escala mais baixa na nova hierarquia do terceiro ciclo (EccIes et
aI., 1989). Contudo, de modo gradual, a auto-estima recompõe-se e continua a
aumentar até à idad~ adulta.

4.4.2 Experiências

Sem auréola de surpresa a investigação mostra que as boas avaliações dos


professores, dos experimentadores ou dos(as) namorados(as) levantam a auto-
estima, e as más avaliações baixam-na, pelo menos temporariamente (Metalsky
et aI., 1993). Acontecimentos negativos, tais como a morte de um amigo
íntimo também podem baixar a nossa auto-estima (BeardsaI1 e Dunn, 1992).
Por outro lado, experiências positivas reforçam a nossa auto-estima, como por
exemplo, experiências como aprender a nadar, gostar da universidade
(Coleman et aI., 1993). Mesmo circunstâncias que produzem um aumento ou
abaixamento temporário no nosso estado de espírito podem produzir um efeito
correspondente na nossa auto-estima (Esses, 1989).

4.4.3 Identidade étnica de grupos minoritários

Muitas vezes tentamos aumentar a nossa auto-estima à custa dos outros.


Fazemos tal sobreavaliando os grupos e os membros dos grupos com que nos
associamos, isto é, que formam a nossa identidade social. e subavaliando
outros grupos e os seus membros. Penelope Oakes e John Turner (1980)
encontraram, por exemplo, que sujeitos experimentais que mostravam
favoritismo em relação ao seu próprio grupo também experienciavam uma
maior auto-estima.

Os membros de minorias étnicas podem ter problemas especIais no


desenvolvimento da auto-estima positiva. Por causa de preconceitos, os
membros de grupos minoritários podem ter uma imagem negativa deles
próprios como reflexo das avaliações das outras pessoas. Quando fazem
comparações sociais dos seus sucessos económicos, profissionais e educativos
com os da maioria, podem comparar-se de modo desfavorável. Por isso poder-
se-á defender que membros de grupos minoritários interpretarão as suas
realizações como evidenciando a sua falta de valor e de competência.

Será essa hipótese verdadeira? Centenas de estudos procuraram determinar se

© Universidade Aberta 173


o estatuto minoritário debilita a auto-estima na América (Wylie, 1979; Porter e
Washington, 1979). Surpreendentemente a grande maioria dos estudos
oferecem pouco apoio para a conclusão que as minorias étnicas têm uma auto-
estima substancialmente mais baixa. Há estudos que indicam que as minorias
negras têm uma auto-estima tão alta ou um pouco mais alta que os brancos
(Rosenberg e Simmons, 1972; Rotheram-Barus, 1990).

Um modo como as minorias étnicas se têm confrontado com a intolerância é


mediante a redescoberta da sua própria herança étnica e a rejeição activa dos
estereótipos negativos da sociedade (Sandstrom, 1991). A identidade étnica
que é um tipo de identidade social, é o sentido de identificação pessoal de um
indivíduo com um determinado grupo étnico (Hutnik, 1991). A identidade
étnica de uma pessoa é um estado de espírito e a sua aquisição requer muitas
vezes um esforço considerável.

Jean Phinney (1989) propôs um modelo de formação da identidade étnica em


três estádios (quadro 2.2). No estádio 1, o estádio da identidade étnica não
examinada, as pessoas em situação minoritária muitas vezes não examinaram
pessoalmente as questões da identidade étnica, e podem ter interiorizado
inconscientemente estereótipos da cultura dominante nos seus próprios
autoconceitos. Uma consequência negativa da internalização destas crenças
sociais depreciativas no autoconceito é que as pessoas podem experienciar
auto-aversão (Clark e Clark, 1947; Taylor, 1992). Em contraste com os que
ignoram as questões de etnicidade, algumas pessoas no estádio 1 podem ter
sido expostas a atitudes étnicas positivas por parte de outras pessoas, mas não
pensaram muito simplesmente nestes assuntos.

No estádio 2, busca de identidade étnica, as pessoas têm uma experiência que


expulsa temporariamente as suas perspectivas antigas do mundo, tornando-se
receptivas à exploração da sua própria etnicidade. Na maior parte dos casos o
motor da procura da compreensão mais profunda da sua identidade étnica é
uma experiência pessoal com o preconceito (Sanders Thompson, 1991). Seja
qual for o desencadeador, este estádio implica muitas vezes um intenso
período de busca, em que as pessoas tentam destruir a antiga identidade
negativa e substituÍ-la por uma nova identidade positiva. Enquanto imersas
nesta busca, as pessoas são susceptíveis de consumir de modo apaixonado a .
literatura étnica e de participar em acontecimentos culturais. Durante o estádio
2, os membros dos grupos minoritários também podem desenvolver uma
identidade antagonista, em que rejeitam activamente os valores da cultura
dominante e denigrem os membros do exogrupo dominante.

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© Universidade Aberta
o terceiro estádio é uma compreensão mais profunda e uma avaliação da
etnicidade da pessoa, identidade étnica realizada. Neste estádio final do
desenvolvimento da identidade, confiança e segurança na nova identidade
étnica encontrada permite que as pessoas sintam um sentido profundo de
orgulho étnico juntamente com uma nova compreensão do seu lugar na cultura
dominante. São capazes de identificar e de internalizar os aspectos da cultura
dominante que são aceitáveis (por exemplo, segurança financeira,
independência) e revoltar-se contra os que são opressores (por exemplo,
racismo, sexismo). O desenvolvimento de uma identidade étnica positiva
funciona, pois, não só como protectora de minorias denegridas da continuação
do racismo no seu país, mas também permite-lhes utilizar esta identidade social
positiva para prosseguir os objectivos da sociedade dominante. Estas
transformações criam uma elevada auto-estima e um autoconceito estável
(Cross, 1991).

Estádio 1: Identidade étnica não examinada

Falta de exploração da etnicidade, em virtude da falta de interesse ou de ter adoptado


simplesmente opiniões sobre etnicidade de outras pessoas.

Estádio 2: Busca de identidade étnica

Envolvimento na exploração e na procura da compreensão do sentido da própria etnicidade,


muitas vezes por causa de algum incidente crítico que focalizou a atenção no estatuto da
minoria na cultura dominante.

Estádio 3: Identidade étnica realizada

Sentido claro e confiante da sua própria identidade; capaz de identificar e de internalizar os


aspectos da cultura dominante que são aceitáveis e revoltar-se contra os que são opressores.

Fonte: Phinney, ] 989.

Quadro 2.2 - Estádios na fonnação da identidade étnica

175
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Em suma, a auto-estima é uma disposição relativamente estável,
correlacionada muitas vezes com outros indicadores de adaptação psicológica.
Experiências infantis, em especial os estilos educativos dos pais, criam um
padrão para a auto-estima aquando da idade adulta. Todavia a auto-estima
também fluctua com as circunstâncias. As mudanças físicas da puberdade,
acontecimentos vitais significativos, a identificação com os grupos étnicos e
mesmo estados de espírito efémeros podem modificar o modo como nos
sentimos acerca de nós próprios.

4.5 Autodiscrepâncias

Mais acima já escreveu as dez características que oCa) descrevem como pensa
ser actualmente: o seu autoconceito actual. Se se sente com coragem escreva
mais quatro listas de características: 1) o self que gostaria de ser, englobando
todas as esperanças e objectivos (o self ideal); 2) as características que outras
pessoas importantes (e.g., os seus pais) desejam que atinja (o self ideal para os
outros); 3) as características que sente dever ter em termos de um sentido de
dever, responsabilidade, e obrigações para os outros (o self devido); e 4) as
características que outras pessoas imp0l1antes sentem que deve ter (o self devido
aos outros). Estas quatro listas representam autoguias, ou padrões pessoais.

Com base na teoria da autodiscrepância (Higgins, 1989), podem-se usar estas


listas para predizer não só o nível de auto-estima, como também o seu bem-
estar emocional. Há investigação que sugere que as consequências específicas
dependem da autoguia que fracassou em realizar-se (Higgins et a1., 1985,
1986) (quadro 2.3). Há, em primeiro lugar, a possibilidade de discrepâncias
entre o self actual e self devido. No caso do seu autoconceito ser incompatível
a) com os seus próprios sentimentos de responsabilidade ou b) com as
obrigações que impendem sobre si por parte de outra pessoa significativa
sentirá culpa, vergonha. Em casos extremos poderá sofrer de desordens
relacionadas com a ansiedade. Em segundo lugar, há a possibilidade de
discrepâncias entre o self percepcionado e o self ideal. Se a sua primeira lista
não se ajusta bem a) com os seus próprios ideais, esperanças e aspirações ou
b) com as obrigações que impendem sobre si por parte de outra pessoa
significativa pode sentir-se desiludido, frustrado e não realizado. Em casos
extremos, a desagradável concretização que tais sonhos não poderão realizar-
se poderá levá-lo à depressão.

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Gordon Flett e os seus colegas (1991) encontraram apoio experimental para
algumas destas ideias. Estes investigadores mediram auto-estima e depressão
junto de sujeitos que apresentavam diferentes graus de perfeccionismo
socialmente prescrito (ideais dos outros). Os sujeitos com altos níveis de
perfeccionismo socialmente prescrito mostravam uma tendência significativa
para a depressão e baixos níveis de auto-estima. Pagamos, pois, um preço por
tentarmos obter para nós os ideais dos outros.

Todos vivemos com alguma discrepância entre o nosso autoconceito e as


nossas autoguias. Levanta-se todavia a questão de se saber porque é que nem
todos sofremos de depressão e ansiedade. Segundo Higgins (1989) as
consequências emocionais da autodiscrepância dependem de dois factores: a
quantidade e a acessibilidade. Quanto maior seja a quantidade de discrepância,
mais intenso será o desconforto emocional, e quanto mais conscientes
estejamos desta discrepância mais intenso será o desconforto. Tendo em conta
que uma certa quantidade de discrepância está presente em todos nós, o que é
que influencia o segundo factor, ou seja, a acessibilidade desta discrepância?
Uma resposta a esta questão pode ser dada pela teoria da autoconsciência que
será abordada seguidamente.

Discrepância Estado emocional Desordem

Deveres próprios Agitação por auto-crítica (culpa) Ansiedade

Deveres dos outros Agitação por medo e ameaça (vergonha) Ansiedade

Ideais próprios Desânimo por falta percepcionada de auto-


realização (desilusão) Depressão

Ideais dos outros Desânimo por perca antecipada de afecto


social (falta de orgulho) Depressão

Fonte: Higgins, 1989.

Quadro 2.3 - Efeitos de discrepâncias com o autoconceito: As emoções e possíveis


desordens associadas com quatro tipos de autodiscrepâncias

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4.6 Autoconsciência

A auto-focalização, isto é, em que medida a atenção de uma pessoa está


dirigida para dentro de si em oposição para fora de si, para o meio (Fiske e
Taylor, 1991), está ligada à memória e à cognição. Só nos podemos focalizar
em nós próprios se relembrarmos acontecimentos passados relevantes e
processarmos informação actual relevante. Um breve período de
autofocalização é susceptível de melhorar o autoconhecimento. Passemos pois
a descrever como é que estes processos operam.

Tendo em conta toda a atenção que temos estado a dar ao pensamento sobre o
self, poderemos perguntar até que ponto as pessoas pensam mais acerca de si
próprias do que, por exemplo, das suas fanulias, dos seus estudos ou dos
programas de televisão preferidos. Talvez fique surpreendido do pouco tempo
que gastamos a pensar sobre nós próprios. Pediu-se a 107 pessoas com idades
variadas (de 19 a 63 anos) para registarem o que estavam a pensar em diversas
ocasiões durante o dia (Csikszentmihalyi e Figurski, 1982). A escolha dessas
ocasiões não era feita pelos participantes, mas sim pelos investigadores que
equiparam os sujeitos com material electrónico que tocava aproximadamente
cada duas horas entre as sete e trinta da manhã e as dez e trinta da noite.
Quando os sujeitos ouviam o toque, interrompiam o que estavam a fazer,
escreviam o que estavam a pensar no momento e preenchiam um pequeno
questionário. Com base num total de 4 700 observações, somente 8% dos
pensamentos registados eram sobre o self. A atenção dos sujeitos estava muito
mais focalizada em actividades específicas que ocupavam o seu tempo, como
trabalho, tarefas quotidianas ou que não tinham nenhuns pensamentos. Ainda
com mais interesse é que quando os sujeitos pensavam sobre eles próprios,
referiam que se sentiam relativamente infelizes e que desejavam fazer outra coisa.

4.6.1 Estados de autoconsciência

Será a autofocalização desagradável? Se assim for, tal deve-se a que nos tornamos
conscientes de modo acentuado da autodiscrepância? Robert Wicklund e seus
associados pensam que a resposta a essa questão é positiva (Duval e Wicklund,
1972; Wicklund, 1975). Segundo a sua teoria da autoconsciência, geralmente não
estamos autofocalizados; no entanto certas situações levam-nos de modo previsível
a voltarmo-nos para o interior e a tornarmo-nos objectos da nossa própria atenção.

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Quando estamos perante um espelho ou um público, tornamo-nos o objecto da nossa
própria atenção. Se os espelhos são susceptíveis de produzir autoconsciência privada,
já os públicos provocam autoconsciência pública.

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Sabe-se que certos tipos de contextos sociais aumentam a autoconsciência. A
autoconsciência pode ser induzida pelo facto de nos vermos num espelho, de
ouvirmos a nossa voz gravada, de sermos fotografados, de estarmos num
contexto não habitual, ou de estarmos em minoria num grupo. Por exemplo,
um estudante que faz uma exposição nas aulas práticas está muito
provavelmente mais consciente da sua aparência física do que habitualmente.

Segundo Wicklund a autoconsciência induz um processo de auto-avaliação em


que as pessoas começam a focalizar-se até que ponto o seu comportamento se
compara com normas, regras ou padrões que se integram no autoconceito.
Muitas vezes esta auto-avaliação revela uma discrepância entre a sua condição
habitual ou comportamento e os seus padrões ou objectivos. Esta comparação
pode pois ser frequentemente uma experiência desagradável. É óbvio que se a
comparação do self com o padrão é positiva, as pessoas poderão então sentir-
se bem e até procurar mais auto-reflexão. Perante o desconforto, as pessoas
têm dois recursos: comportar-se de modo a reduzir a discrepância ou fugir do
estado de autoconsciência. A escolha efectuada depende se as pessoas esperam
poder reduzir com sucesso a sua discrepância. No caso positivo, fazem
condizer o seu comportamento com o padrão; no caso negativo, fogem da
situação de autofocalização e tentam parar de pensar sobre si próprios (Carver
e Scheier, 1981).

Várias investigações apoiam as predições. Por exemplo, Duval, Wicklund e


Fine (in Duval e Wicklund, 1972) mostraram como a autofocalização leva a
um comportamento de fuga. A uma parte dos sujeitos foi-lhes comunicado que
eram criativos e inteligentes, enquanto que aos outros foi-lhes dito o contrário.
Após a informação dos resultados do teste, pediu-se aos sujeitos para
esperarem por outro experimentador numa sala vizinha para participarem
numa experiência sobre os processos perceptivos. O primeiro experimentador
conduzia-os a essa sala, mas o seu colega não estava lá. Os sujeitos eram então
convidados a esperarem cinco minutos. Metade dos sujeitos esperavam em
frente de um espelho e com uma câmara de video virada para eles, enquanto
que os outros sujeitos esperavam sem os indutores da consciência de si
próprios. Os sujeitos a quem tinha sido dada informação que tinham tido
resultados baixos no teste e que estavam auto-focalizados deixaram o
laboratório mais depressa que os sujeitos que ou acreditavam que tinham tido
bons resultados no teste ou que não estavam auto-focalizados. Este
comportamento foi interpretado como mostrando que os baixos resultados
eram contraditórios com os padrões próprios e que o desconforto era mais

180
© Universidade Aberta
intenso para os sujeitos não tendo oportunidade de agir em vista a reduzir a
contradição entre a realização e os padrões internos, escolheram fugir da
situação.

Gibbons (1978) demonstrou um efeito semelhante mediante a manipulação da


autoconsciência com um espelho. Estudantes universitários preencheram um
teste para avaliar a culpabilidade sexual, onde estavam incluídas questões
sobre as atitudes em relação à pornografia. Semanas mais tarde, os sujeitos
leram passagens pornográficas de uma novela e notavam a leitura em várias
escalas, incluindo como tal era agradável. Os sujeitos que leram a passagem e
a avaliaram diante de um espelho mostraram maior consistência entre atitudes
previamente testadas em relação à pornografia e as avaliações da leitura que os
que não estavam diante do espelho.

A presença de um espelho focalizaria a atenção dos indivíduos num padrão


interno relativamente ao comportamento moralmente apropriado. Assim, os
estudantes copiarão menos num exame se se suscitar neles a autoconsciência
(Diener, e Walbom, 1976), as crianças violarão menos a ordem dada por um
adulto (Beaman, Klentz, Diener e Svanum, 1979), os adultos sentir-se-ão mais
implicados e prontos a ajudarem uma vítima (Duval, Duval e Neely, 1979).

Os padrões internos provêm das outras pessoas e relacionam-se com a


moralidade e a realização. Uma pessoa que está autoconsciente pode também
tornar-se mais consciente dos padrões das outras pessoas. Estudos mostram
que os sujeitos autofocalizados são mais capazes de tomarem a perspectiva
dos outros (Stephenson e Wicklund, 1983). Na área das atribuições, a atenção
autodirigida aumenta a aceitação da responsabilidade pessoal para os
resultados positivos, mas pode diminuir a aceitação da responsabilidade para
os resultados negativos (Cohen et aI., 1985). Tal é especialmente verdadeiro
com pessoas com elevada auto-estima que revelam o maior grau de
autocomplacência nas suas atribuições (Brown, 1988).

Mas não foi só o facto de se considerar a autoconsciência como uma variável


manipulada através de vários indutores que contribuiu para o aumento do
interesse por este domínio da investigação nas últimas décadas. A auto-
consciência, para além de poder ser induzida por agente situacionais, é
objecto de diferenças de certo modo estáveis entre os indivíduos.

181
© Universidade Aberta
4.6.2 Diferentes tipos de autocol1sciência

Assim, se se podem pôr em evidência no laboratório determinantes situacionais


do estado de autoconsciência, também se reconhece que existe um continuum
de diferenças entre os indivíduos relativamente à disposição à autoconsciência.
Certas pessoas estariam de modo crónico autoconscientes, enquanto que
outras o não estariam. Para investigar esta possibilidade da autoconsciência ser
um traço de personalidade Alan Fenigstein, Michael Scheier e Alan Buss
(1975) construíram um questionário (chamado Escala de Autoconsciência).
Este questionário compõe-se de 23 itens cuja análise factorial pôs em
evidência três factores: autoconsciência privada, autoconsciência pública e
ansiedade social.

A autoconsciência privada diz respeito à capacidade de prestar atenção aos


sentimentos e pensamentos pessoais (exemplo: "Penso muito sobre mim
próprio"); autoconsciência pública define-se como uma consciência geral do
próprio enquanto objecto social que tem um efeito sobre os outros (exemplo:
"Preocupo-me com a maneira como me apresento"); finalmente, a ansiedade
social define-se pelo mal-estar em presença dos outros (exemplo: "Sinto-me
ansioso quando falo perante um grupo").

A autoconsciência privada e pública referem-se a um processo de atenção


centrada no próprio, enquanto que a ansiedade social desponta como reacção a
este processo.

A estabilidade da estrutura factorial da escala foi confirmada nas adaptações


para a língua alemã (Heinemann, 1979), para a língua holandesa (Vleeming e
Engelse, 198]), para a língua francesa (Rimé e Le Bon, 1984) e para a língua
portuguesa (Neto, 1986b). Tal é indicativo das qualidades da escala construída
pelos citados autores americanos e da pertinência dos construtos que tenta
abarcar.

Muito embora os SUjeItos autoconscientes privada e publicamente estejam


nalgum sentido atentos a eles próprios, os seus diferentes modos de estar auto-
atentos deveriam acarretar diferentes espécies de comportamentos e
efectivamente há evidência para tal.

Fenigstein (] 979) examinou como é que as pessoas reagem quando são


rejeitadas pelos outros. Uma estudante esperava numa sala com outras duas
pessoas que eram "compadres" do experimentador. As pessoas "compadres"

Ix2
© Universidade Aberta
falavam só entre elas e ignoravam o sujeito. Noutra condição, os "compadres"
eram simpáticos e respondiam ao sujeito. Os sujeitos eram informados que na
experiência principal estariam num grupo de três e poderiam escolher ficar
com as duas pessoas que já tinham encontrado, ou que podiam escolher um
novo par de estudantes. Cerca de cinquenta por cento dos sujeitos que tinham
uma autoconsciência baixa escolheram afiliar-se com um novo par quando
tinham sido ignorados. Oitenta e cinco por cento dos sujeitos com uma
autoconsciência pública alta procuraram novas afiliações quando tinham sido
ignorados. Quando os "compadres" não tinham ignorado os sujeitos, estes
escolhiam predominantemente ficar com os companheiros, quer os sujeitos
apresentassem alta ou baixa autoconsciência. Resultados elevados na dimensão
autoconsciência pública estão pois ligados a uma maior sensibilidade à rejeição
de um grupo.

Noutro estudo perguntou-se a estudantes universitárias quanta maquilhagem


utilizavam, quanto tempo passavam a maquilhar-se e as suas atitudes em
relação ao uso da maquilhagem (Miller e Cox, 1982). As estudantes com
autoconsciência alta eram mais susceptíveis de utilizar maquilhagem, passavam
mais tempo a maquilhar-se e tinham atitudes mais positivas em relação à
maquilhagem do que aquelas com autoconsciência pública baixa.

Encontrou-se também que pessoas com elevada autoconsciência pública eram


capazes de predizer melhor as reacções que suscitarão dos outros (Tobey e
Tunnel, 1981), mais conformistas às pressões sociais (Froming e Carver,
1981), mais sociáveis (Cheek e Buss, 198 I) e mais susceptíveis de se
desviarem de situações embaraçantes (Froming, Corley, e Rinker, 1990) que
aquelas com baixa autoconsciência pública.

Num estudo experimental com o intuito de se tentar validar a escala de


autoconsciência pública, Glen Hass (1984) pediu a pessoas para desenharem
um E nas suas testas (ver figura 2.4). As pessoas baixas em autoconsciência
pública eram mais susceptíveis de desenharem um E de uma perspectiva
interna (lado direito da figura 2.4). Os seus E podiam ser lidos se se vissem
num espelho. As pessoas altas em autoconsciência pública desenharam um E
que um observador podia ler (lado esquerdo da figura 2.4). Hass obteve os
mesmos resultados quando as pessoas desenharam um E na presença de uma
câmara de video, um símbolo da atenção dos outros (os espectadores). A
importância da componente social da autoconsciência pública é ilustrada pelo
facto de que a direcção em que as pessoas desenharam o E não estava
relacionada com os resultados numa medida de autoconsciência privada.

© Universidade Aberta
Figura 2.4 - Um teste simples de autoconsciência pública: score elevado à esquerda,
score baixo à direita

Por outro lado, Turner (1978) e Franzoi (1983) mostraram que os SUjeItos
com resultados altos na autoconsciência privada assinalavam mais adjectivos
para os descreverem do que faziam os que tinham resultados baixos, tais
resultados sugerindo que os primeiros dispõem de mais informação sobre si
mesmos. Em relação com a veracidade das auto-descrições, Scheier, Buss e
Buss (1978) encontraram uma correlação entre as auto-avaliações da
agressividade e o comportamento agressivo maior nos sujeitos com valores
altos na autoconsciência privada que naqueles com valores baixos.

As pessoas com um traço elevado de autoconsciência mostram maIOr


consistência entre atitudes e comportamento (Scheier e Carver, 1977),
manifestam mais a tendência para partilhar informações pessoais e íntimas com
colegas (Franzoi e Davis, 1985). As pessoas altas em autoconsciência privada
tendem também a estar mais conscientes das mudanças nos seus estados
internos corporais (Scheier, Carver, e Gibbons, 1979). Tem sido mesmo
sugerido que tais pessoas tendem a ser mais saudáveis porque podem
reconhecer o stress nos seus corpos e providenciar antes que o stress seja
fisicamente prejudicial (Mullen e SuIs, 1982).

Com base nestes estudos pode-se concluir que altos níveis de autoconsciência
privada estão associados com um conhecimento dos seus estados internos
melhor, mais pormenorizado e preciso.

184 © Universidade Aberta


4.6.3 Autoconsciência e uso do álcool

Se a autoconsciência se reveste de interesse em si mesma, tem também várias


aplicações práticas. Uma das aplicações mais interessantes refere-se ao uso do
álcool.

Hull e seus associados estudaram os efeitos do álcool sobre a autoconsciência


(Hull e Young, 1983; Hull, Young, e Jouriles, 1986). Hull propõe que é
porque o álcool reduz a autoconsciência que as pessoas podem usá-lo para
tratar com a informação negativa acerca delas próprias. Em consonância com a
discussão da secção precedente, Hull propôs que as pessoas com elevada
autoconsciência privada, na medida em que estão de modo mais penetrante
conscientes como encontram os padrões internos, podem ser especialmente
vulneráveis ao uso de drogas e de álcool.

Vários estudos apoiaram a teoria de Hull. Numa experiência Hull e Young


(1983) raciocinaram que as pessoas que tendem a ter elevada autoconsciência
quererão beber mais álcool após fracasso, porque é doloroso focalizar-se em si
mesmo após falhar. Foi administrado um teste de QI a sujeitos do sexo
masculino. As questões eram difíceis de modo que os sujeitos não podiam
estar seguros de terem respondido bem. Seguidamente, a metade dos sujeitos
foi-lhes dito que tinham respondido muito bem, enquanto que aos outros foi-
lhes comunicado que tinham respondido muito mal. Então os sujeitos passaram
para outra sala, para participar numa segunda experiência sobre a percepção
da prova de bebidas alcoólicas. Os sujeitos tinham de avaliar uma série de
vinhos. Hull e Young não estavam tanto interessados no modo como os
sujeitos avaliavam os vinhos como quanto vinho bebiam enquanto estavam a
efectuar a tarefa de avaliação. Os resultados dependeram do traço de
personalidade de autoconsciência que tinha sido avaliado previamente. As
pessoas com elevada autoconsciência beberam mais vinho após o suposto
fracasso que após o sucesso no teste de QI. A presumível razão é que elas
queriam escapar do pensamento autofocalizado sobre as implicações do seu
fracasso. As pessoas com uma baixa autoconsciência, contudo, beberam quase
a mesma quantidade de vinho apesar do sucesso ou fracasso prévio.

Num estudo de campo chegou-se a conclusões semelhantes (Hull, Young, e


Jouriles, 1986). Neste estudo examinou-se se a redução da autoconsciência
após fracasso estava relacionada com o consumo de álcool nos adolescentes.
Questionários sobre a quantidade de consumo de bebidas alcoólicas foram
administrados a uma vasta amostra de estudantes do ensino secundário com a

185
© Universidade Aberta
garantia de que a informação prestada seria estritamente confidencial. Fo.i
também administrado aos alunos a mesma escala de autoconsciência privada
(Fenigstein et aI., 1975) e foram questionados sobre a sua realização
académica e as atitudes dos pais e colegas sobre o uso do álcool. Os resultados
indicaram que a associação entre o uso do álcool e a realização académica era
significativamente maior nos alunos que tinham uma autoconsciência elevada
que nos que a tinham baixa. Assim, os alunos autoconscientes tendiam a beber
mais se a sua realização académica era fraca do que os sujeitos com
autoconsciência mais baixa. As análises estatísticas mostraram que esta relação
era independente dos efeitos dos comportamentos e atitudes dos colegas e dos
pais.

4.6.4 O que é que causa diferenças individuais na autoconsciência?

Em princípio toda a investigação consagrada à autoconsciência privada e


pública tentou determinar quais os efeitos que têm diferentes níveis de cada
traço sobre a cognição, o afecto e o comportamento. Mas porque é que alguns
de nós prestam atenção aos aspectos privados ou públicos do self, ao passo
que outros ignoram em princípio estas duas facetas do self? Não tem nada a
ver com a inteligência (Carver e Glass, 1976). Experiências de vida
significativas durante os anos de formação foram avançadas como uma
explicação possível (Buss, 1980), mas ainda não há evidência para apoiar ou
refutar esta hipótese. Em relação a efeitos culturais sobre o nível de
autoconsciência há alguma evidência que individualistas têm maiores níveis de
autoconsciência privada que colectivistas (Oyserman, 1993). Estas diferenças
são susceptíveis de estarem relacionadas com o facto de haver nas culturas
individualistas uma maior focalização no self como tendo necessidades e
desejos pessoais distintos. Apesar desta possível inlluência cultural, os
psicólogos sociais hoje em dia conhecem muito mais acerca das consequências
das diferenças na autoconsciência do que acerca das suas causas.

4.7 Protecção da auto-estima

As pessoas estão motivadas a proteger a sua auto-estima, seja ela alta ou


baixa. A maior parte das pessoas têm uma alta auto-estima e querem

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retroacção de auto-engrandecimento. Algumas pessoas têm uma auto-estima
baixa e para verificar as suas auto-avaliações querem retroacção de auto-
depreciação.

As pessoas utilizam várias técnicas para manter a sua auto-estima (McCall e


Simmons, 1978). Examinaremos quatro: manipulação de avaliações,
processamento selectivo de informação, comparação social selectiva e
compromisso selectivo com identidades.

4.7.1 Manipulação de avaliações

Escolhemos associar-nos com pessoas que partilham a nossa perspectiva do


self e evitamos fazê-lo com pessoas que a não partilham. Por exemplo, pessoas
com auto-perspectivas negativas procuram pessoas que pensam mal delas
(Swam e Predmore, 1985).

Uma outro modo de manter a auto-estima é interpretar as avaliações das


outras pessoas como sendo mais favoráveis ou desfavoráveis do que são. Por
exemplo, estudantes universitários passavam um teste de analogias e
subsequentemente era-lhes dada uma retroacção positiva, negativa ou
nenhuma retroacção sobre a sua realização (Jussim, Coleman, e Nassau,
1987). Cada estudante completava então um questionário. Os estudantes com
alta auto-estima percepcionavam a retroacção, fosse ela positiva ou negativa,
como sendo mais positiva que os estudantes com baixa auto-estima.

4.7.2 Processamento selectivo de informação

Um outro modo de protegermos a nossa auto-estima é prestar mais atenção às


ocorrências que são consistentes com a nossa auto-avaliação. Por exemplo,
sujeitos com alta ou baixa auto-estima realizaram uma tarefa; dizia-se-lhes que
tinham tido sucesso ou fracasso na tarefa. Na auto-avaliação posterior as
avaliações de todos os sujeitos estavam enviesadas. Os sujeitos com alta auto-
estima que tinham tido sucesso aumentaram as suas avaliações o que não
sucedeu com os sujeitos com baixa auto-estima. Os sujeitos com baixa auto-
estima que fracassaram, deram deles próprios avaliações mais baixas, ao passo
que o não fizeram os sujeitos com alta auto-estima (Schlenker, Weigold, e

187
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Hallam, 1990). A memória também trabalha na protecção da auto-estima. As
pessoas com alta auto-estima lembram actividades boas, responsáveis e bem
sucedidas mais frequentemente, ao passo que as pessoas com baixa auto-
estima são mais susceptíveis de relembrar as actividades más, irresponsáveis e
mal sucedidas.

4.7.3 Comparação social se/eetim

Quando não dispomos de padrões objectivos para nos avaliarmos a nós


próprios, recorremos à comparação social (Festinger, 1954), como já se
referiu. Escolhendo com cuidado as pessoas com que nos comparamos,
podemos adicionalmente proteger a nossa auto-estima. Geralmente
comparamo-nos com pessoas que são semelhantes em idade, género,
profissão, classe social, capacidades e atitudes (SuIs e Miller, 1977; Walsh e
Taylor, 1982). Uma vez que as pessoas fazem uma comparação social, tendem
a sobreavaliar os seus padrões relativos (Felson, 1981). Por exemplo, só 2%
de pessoas se avaliavam "abaixo da média" como pais, cônjuges, e filhos ou
filhas, ou nas qualidades de confiança, inteligência e vontade de trabalhar
(Heiss e Owens, 1972). Estas últimas pessoas eram provavelmente pessoas
com baixa auto-estima.

4.7.4 Compromisso seleetivo eom identidades

Ainda uma outra técnica implica comprometermo-nos mais com auto-


conceitos que fornecem retroacção consistente com a auto-avaliação e
afastarmo-nos dos que fornecem retroacção que a ameaça. Tal protege a auto-
estima global porque a auto-avaliação está baseada mais nas identidades e
qualidades pessoais que consideramos mais importantes.

As pessoas tendem a enaltecer a auto-estima dando mais importância a


identidades (religiosas, raciais, profissionais, familiares) que consideram
particularmente admiráveis (Hoelter, 1983). Aumentam ou diminuem também
a identificação com um grupo social quando o grupo se torna uma fonte
potencial de auto-estima maior ou menor (Tesser e Campbell, 1983). Os
estudantes estavam mais aptos a usar roupas que mostravam afiliação

188
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universitária após uma vitória de futebol que após uma derrota. Identificavam-
se também mais com a sua escola quando descreviam as vitórias que as
derrotas, por isso enaltecendo ou protegendo a sua auto-estima (Cialdini et al.,
1976).

As quatro técnicas descritas para proteger a auto-estima retratam os seres


humanos como processadores activos de acontecimentos sociais. As pessoas
não aceitam passivamente avaliações sociais nem permitem que a auto-estima
seja ferida pelas crueldades do mundo social. Nem os sucessos nem os
fracassos afectam directamente a auto-estima. As técnicas descritas
testemunham a ingenuidade humana na selecção e modificação dos sentidos
dos acontecimentos ao serviço da auto-estima.

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5. Relacionando o Self: auto-apresentação

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Todos nós sabemos que, por vezes, tentamos impressionar alguém de um
modo muito particular. Quando nos apresentamos para sermos
entrevistados em vista a obtermos um emprego tentamos fazer crer
deliberadamente à pessoa que nos entrevista que possuímos as qualidades
que pensamos serem requeridas pelo novo emprego. E há todas as razões
para pensarmos que não somos os únicos a estar neste caso, pois outras
pessoas farão provavelmente o mesmo em situações idênticas.

Os psicólogos sociais utilizam o termo auto-apresentação para referir os


processos pelos quais as pessoas tentam controlar as impressões que os
outros formam. A ideia de que as pessoas são como actores num teatro
representando perante um público é uma velha ideia, se bem que só
recentemente encontrasse um lugar no estudo científico do comportamento
social.

Focalizaremos a nossa atenção em fundamentos teóricos que estão na base


da auto-apresentação, nos motivos que as pessoas têm para se auto-
apresentarem, nas emoções que sentem quando essas tentativas falham, nas
estratégias de auto-apresentação e, enfim, numa característica de
personalidade que pode afectar a auto-apresentação - a auto-vigilância.

5. 1 O self nas interacções sociais

Cooley (1902/1922) e Mead (1934), autores que se inscrevem na corrente


do interaccionismo simbólico sublinharam que os participantes nas
interacções sociais tentam tomar o papel do outro e ver-se a si próprios da
maneira como os outros os vêem. Este processo permite simultaneamente
conhecer o modo como se aparece aos outros e guiar o comportamento
social para ter o efeito desejado.
Erving Goffman delineou analogias com o mundo do teatro na formulação
da sua teoria da apresentação do self na vida quotidiana (Goffman, 1959,
1967). Sugeriu que a vida social é como uma representação teatral em que
a representação de cada participante é delineada tanto pelo efeito no
público como pela expressão aberta do self. Os participantes desempenham
papéis e tentam manter as suas identidades sociais mediante auto-
apresentações que sejam apropriadas. Goffman defendeu que nas
interacções sociais cada pessoa segue um papel, à semelhança do que
acontece numa peça, isto é, um padrão de comportamentos verbais e não
verbais cuidadosamente escolhidos que expressam o self do sujeito. A
principal característica do papel é a aparência, o valor social positivo
obtido da interacção.

193
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o objectivo da interacção social não é manter a aparência. Manter a
aparência é uma condição para que a interacção social continue. Incidentes
que ameacem a aparência de um participante ameaçam também a
sobrevivência da relação. É por isso que quando acontecimentos desafiam
a aparência de um participante, iniciam-se correctivos para impedir que o
embaraço possa interferir na conduta.

A análise da auto-apresentação de Goffman assenta em observações


cuidadosas das interacções quotidianas. Inspirou muita investigação psico-
social para identificar como e quando é que as pessoas utilizam estratégias
de auto-apresentação (Schlenker, 1980; Tedeshi, 1981).

Por seu lado Alexander sugeriu também que a auto-apresentação é uma


faceta fundamental da interacção social (Alexander e Rudd, 1981). As
identidades tendem a ser situadas, isto é, as identidades são muitas vezes
apropriadas com a base para a interacções unicamente em certas
situações. A relação professor-aluno que se verifica numa sala de aulas não
é apropriada quando as duas pessoas se encontram num café. Geralmente
sente-se um certo desconforto até que uma variação das identidades
respectivas acabe na nova situação. Há assim uma negociação das
identidades de uma pessoa com a outra. No caso da negociação falhar,
professor e aluno podem evitar-se. Reconhecem que a situação social que
os envolve na situação não se vai desenvolver.

As três teorias da auto-apresentação que acabamos de evocar estão em


consonância ao considerar que as outras pessoas estão sempre a formar
impressões a nosso respeito e utilizam estas impressões para orientar as
suas interacções connosco.

5.2 Motivos da auto-apresentação

Na gestão da impressão foram identificados dois componentes: Impressão­


motivação e impressão-construção (Leary e Kowalski, 1990). A
impressão-motivação refere-se até que ponto se está motivado para
controlar o modo como os outros nos vêem, para criar uma impressão
particular nas mentes dos outros. A impressão-construção implica a
escolha de uma imagem particular que se quer criar e alterar o
comportamento de outra pessoa para modos específicos em vista a realizar
este objectivo. Leary e Kowalski (1990) propuseram que a impressão-
motivação resulta de três motivos primários: o desejo de obter
recompensas sociais e materiais, para manter ou para aumentar a auto-

194
© Universidade Aberta
estima, e para facilitar o desenvolvimento de uma identidade. Transmitir a
impressão certa pode fornecer recompensas sociais, tais como aprovação,
amizade, e poder e pode também levar a um aumento de recompensas
materiais, tais como uma subida de ordenado (Schlenker, 1980). Por
exemplo, ser visto como uma pessoa competente pode ter como resultado
um aumento de ordenado ou melhores condições de trabalho. Produzir a
impressão certa pode suscitar estima pelo aumento das reacções dos
outros (cumprimentos, elogios). A auto-apresentação pode também ser o
meio de criar ou de reforçar uma identidade. Estes três motivos gerais
funcionam geralmente conjuntamente. Comportamentos de auto-
apresentação que obtêm recompensas também aumentam auto-estima e
ajudam a estabelecer identidades desejadas. Pode, todavia, haver
excepções, como, por exemplo, as impressões que suscitam resultados
valorizados implicam por vezes a apresentação de si próprio de modo
desfavorável, diminuindo, por conseguinte, a auto-estima.

o grau em que as pessoas estão motivadas para controlar o modo como os


outros as vêem é afectado por uma variedade de variáveis situacionais e
disposicionais. A motivação para a gestão da impressão que se dá é maior
em situações que envolvem objectivos importantes (tais como amizade,
aprovação, recompensas materiais, etc.) em que os indivíduos se sentem
insatisfeitos com a imagem que projectam (auto-discrepância). A
impressão-motivação é mesmo mais forte quando uma pessoa se sente
dependente ou poderosa que controla recursos importantes ou após um
fracasso ou um incidente embaraçante (Leary e Kowalski, 1990). Um
modelo de auto-apresentações é delineado na figura 2.5.

Esta combinação de motivos fornece uma poderosa base para a utilização


de tácticas de auto-apresentação. Todavia antes de referirmos essas
tácticas, abordaremos o embaraço, enquanto elo entre as nossas emoções e
as nossas auto-apresentações, aspecto para que Goffman já chamara a
atenção.

5.3 Auto-apresentação e embaraço

Uma auto-apresentação bem sucedida é uma condição sine qua non para
toda a interacção social. Cada um de nós investe pois quer na sua própria
apresentação quer na de outrem. Uma auto-apresentação bem sucedida
suscita uma auto-imagem positiva (Jones, Rhodewalt, Berglas e Skelton,
1981). Se o papel é mal desempenhado, o sujeito "perde a face". Há então
divergência entre a identidade que este tenta apresentar e a identidade

© Universidade Aberta 195


resultante. A pessoa em causa encontra-se numa situação difícil. O
embaraço é uma emoção desagradável quando cremos que não podemos
representar um papel de modo coerente numa situação pública.

5.3.1 Embaraço, umafonna de ansiedade social

O embaraço é geralmente visto como uma forma de ansiedade social


intimamente relacionado com a timidez, a ansiedade em público e a
vergonha (Buss, 1980; Schlenker, e Leary, 1982). A ansiedade social tem
sido definida de modo variado. Por exemplo, para Schlenker e Leary (1982,
p. 642) a ansiedade resulta da perspectiva ou presença de avaliação pessoal
em situações sociais reais ou imaginadas.

Embora existam diferenças entre as emoções SOCiaIS previamente


referenciadas, uma característica comum é a dificuldade de auto-
apresentação. Isto é, há uma preocupação com a avaliação e as reacções
dos outros (Edelmann, 1981).

Diversos autores (Buss, 1980; Schlenker e Leary, 1982) têm notado uma
ligação entre a timidez e a ansiedade em público, por um lado, e a vergonha
e o embaraço, por outro lado.

Para Buss (1980) a timidez e a ansiedade em público são traços que


parecem ser consistentes ao longo do tempo e das situações. A timidez
surge quando há uma discrepância antecipada entre a auto-apresentação de
uma pessoa e o seu padrão para a auto-apresentação ou quando a resposta
de um sujeito depende em grande parte das respostas dos outros (Neto,
1996a). Por seu lado, a ansiedade em público surge quando as respostas de
uma pessoa são orientadas sobretudo por planos internos e em nada ou
muito pouco por respostas dos outros. Poder-se-ia assim dizer que a
timidez e a ansiedade em público surgem respectivamente quando é
antecipada em encontros contingentes ou não contingentes uma
discrepância entre o padrão de uma pessoa para a sua auto-apresentação e a .
sua auto-apresentação actual.

A distinção entre vergonha e embaraço é mais confusa na literatura do que


a distinção entre timidez e ansiedade em público. Para certos autores
vergonha e embaraço são muitas vezes idênticos (English, 1975; Izard,
1971). Já Buss (1980) apesar das semelhanças notadas entre vergonha e

196 © Universidade Aberta


Motivos primários para a auto-apresentação Anteceden tes di sposicionai s/s ituaci onais

Para obter recompensas sociais ou materiais A impressão é relevante para os objectivos de


uma pessoa
(aprovação, amizade; poder, estatuto, dinheiro) (o comportamento é visível; a pessoa está
dependente de um alvo)

Para manter ou elevar a auto-estima Os objectivos são altamente valorizados Tentativas para
(elogio; sentir que se fez hoa impressão) (recursos escassos; elevada competição; elevada construir a
+ necessidade de aprovação; o alvo tem poder c -+ impressão
estatuto) desejada

Para criar ou reforçar uma identidade Grande discrepância entre auto-imagens

© Universidade Aberta
(indica posse de identidade características habituais e desejadas
relevantes (fracassos prévios; sentir que os outros têm uma
imagem negativa a nosso respeito)
Fonte: Adaptado de Leary e Kowalski, 1990

Figura 2.5 - Motivação para a gestão da impressão

-o
-.j
embaraço assinala diferenças: o embaraço implica por vezes o corar e o
riso, não sendo o caso da vergonha; o embaraço é acompanhado
geralmente de um sentimento de asneira, enquanto que a vergonha de
pesar; um acidente social (um "faux pas") resulta em embaraço, enquanto
que o facto de ser apanhado a efectuar um acto imoral provavelmente
suscitará vergonha.

Geralmente a vergonha refere-se a um sentimento de autocensura ou de


auto-repugnância. O embaraço surge provavelmente quando é
percepcionada uma discrepância entre a auto-apresentação de uma pessoa e
o seu padrão para a auto-apresentação (Asendorpf, 1984).

Os resultados de quatro estudos experimentais de Babock e Sabini (1990)


sugerem que vergonha e embaraço são emoções semelhantes, embora
distintas. São semelhantes na medida em que retlectem uma preocupação
com a identidade e estão mais intimamente ligadas à violação de algum
padrão que a julgamentos de intenção. Todavia a natureza do padrão
violado é diferente para a vergonha e para o embaraço. A vergonha reflecte
um desvio de um ideal objectivo e universal do que é ser uma pessoa de
valor. O embaraço reflecte um desvio da concepção do indivíduo do seu
carácter ou pessoa. Os autores fazem assim ressaltar experimentalmente
que a distinção entre violação da pessoa e violação de um ideal é o
elemento importante que contribui para as experiências de vergonha e de
embaraço.

O embaraço é a consequência negativa de um fracasso em apresentar uma


imagem desejada aos outros que vemos como avaliadores da nossa
realização. O facto de pretendermos apresentar-nos de modo favorável
leva-nos a tentar proteger essa imagem quando está ameaçada e a remediar
subsequentemente a situação mediante o restabelecimento de uma imagem
mais favorável. É precisamente porque o embaraço é um sinal de fracasso
social que tem um efeito dramático na situação social.

Tem havido diversas tentativas para conceptualizar o processo subjacente


ao embaraço. Todas elas tendem a enfatizar a necessidade de considerar
tanto o acto social, definido como sendo potencialmente embaraçante para
o actor, como o sentimento subjectivo do embaraço experienciado pelo
actor (Edelmann, 1985a). Nesse sentido, o embaraço obriga o actor a fazer
avaliações cognitivas tanto do evento social como das consequências
fisiológicas e comportamentais desse evento. Tais conceptualizações do
embaraço sobrepõem-se claramente com as conceptualizações de emoção.
Na literatura que trata das emoções, diferentes autores concordam com a
existência de três componentes: sensação subjectiva, manifestações

198
© Universidade Aberta
vegetativas do corpo e manifestações comportamentais observáveis
(Crosnier et aI., 1986). Distintos modelos de emoções tendem a assumir
haver menos de dez emoções que podem ser distinguidas de modo
fidedigno com base na expressão facial (e.g. Ekman et aI., 1972), muito
embora os teóricos difiram quanto ao seu número exacto. Tornkins (1962)
e Izard (1971), por exemplo, incluem a vergonha como uma emoção
básica, sendo o argumento mais forte para a sua inclusão a presença do
corar (BulI, 1983). Todavia o corar é visto como a marca do embaraço e
menos susceptível de estar associado à vergonha (Buss, 1980).

Pode ser, portanto, útil considerar o embaraço em relação com a literatura


das emoções que tende a adoptar um ponto de vista conglomerado (ou
síndrome). Scherer (1982) sugere que existem cinco componentes para
qualquer emoção: 1) avaliação pré-cognitiva e cognitiva; 2) reacção
fisiológica; 3) componentes motivacionais e componentes de preparação
para a interacção; 4) expressão motora; 5) estado emocional subjectivo.
Também Leventhal (1979) vê as experiências emocionais como sendo
construídas ao longo do tempo e incorporando aspectos subjectivos,
expressi vos e psicofisiológicos.

Um modelo que interliga componentes e processo foi sugerido como


explicação para a experiência do embaraço (Edelmann, 1985a, 1987).

5.3.2 Modelo multifacetado do embaraço

o modelo proposto por Edelmann pressupõe uma complexa interacção de


acontecimentos e de avaliações destes acontecimentos e não tanto uma
clara sequência de acontecimentos. Para esta perspectiva as respostas
emocionais podem ser inatas, mas os estímulos evocadores, as avaliações
subsequentes e as estratégias de confronto são aspectos aprendidos.

Os principais temas do modelo podem sintetizar-se do seguinte modo:

1. Nas situações sociais os indivíduos tentam controlar imagens do

autoconceito perante audiências reais ou imaginadas. Tal

pressupõe:

a) que o actor esteja consciente de um objectivo particular


ou padrão;

b) que o actor esteja tocado pelo evitamento de percas


significativas de aprovação social.

199
© Universidade Aberta
Dado esse padrão, uma ruptura da rotina social, como um "faux
pas", uma inconveniência, acidente ou transgressão, terá como
resultado a criação de uma impressão indesejada na imagem
projectada do actor.

A consciência de uma discrepância entre o estado presente e o


padrão conduz à auto-focalização.

A presença de uma audiência, seja ela real ou imaginada, focaliza


a atenção mais na autoconsciência pública do que na
autoconsciência privada.

2. Um certo número de consequências comportamentais estão


associadas com o aumento da auto-atenção pública que resulta
de uma ruptura observada da rotina social. A autofocalização em
aspectos específicos pode ter como efeito a intensificação da
experiência do embaraço.

3. Como é difícil esconder o embaraço, determinadas estratégias


remediativas podem ser adoptadas para recuperar a aprovação
social perdida e restaurar a imagem pública do actor.

Na figura 2.6 podem-se ver as principais características do processo do


embaraço.

o ponto de partida do modelo que se tem vindo a apresentar é a avaliação


do estímulo que pode ser externa ("Qual é o modo apropriado de me
apresentar num determinado contexto social?") e/ou interna ("Qual é o meu
padrão pessoal de me apresentar?"). Esta avaliação cognitiva pode ter
como consequência respostas fisiológicas, comportamentais e a experiência
subjectiva do embaraço. A predominância da avaliação externa ou interna
dependerá das características do meio que provavelmente contribuem para
aumentar a autofocalização, como seja um espelho ou um público ou de
diferenças individuais na auto-atenção (elevada autoconsciência pública).

Estratégias de confronto com o embaraço podem ser suscitadas após uma


avaliação inicial de estímulos e das reacções da pessoa a esses
acontecimentos.

Os três estádios do modelo reflectem largamente os antecedentes, as


respostas fisiológicas/motoras e as consequentes estratégias de confronto
evocadas pelo actor com o evento do embaraço.

200
© Universidade Aberta
5.3.3 Antecedentes, respostas e estratégias de confronto com o embaraço

Geralmente os acontecimentos embaraçosos estão ligados a um passo em


falso, uma inconveniência, uma transgressão que suscita na imagem
projectada do actor uma impressão que ele não deseja.

ESTíMULOS EVOCADORES RESPOSTAS EMOCIONAIS RESPOSTA DE CONFRONTO

1 I I
ACONTECIMENTO EXTERNO

(passo em falso. inconveniênCia.'/

acid te) /
1

COMPORTAMENTAL REAVALIAÇÃO das tentativas de

PLANO DAS TENTATIVAS DE

CONFRONTO

(b) diferenças in- SUBJECTIVA a) comportamental


dividuais na auto- b) verbal

atenção
(c) factores do meio

que afectam a auto­

focalização

ACONTECIMENTO INTERNO

infomlaçães corporais. faciais. mais padrões

pessoais

REAVALIAÇÃO

dos estímulos evocadores +

resposta emociona!

Fonte: Edelmann, 1987

Figura 2.6 - As componentes do modelo do processo de embaraço

A maior parte dos estudos que avançaram uma classificação dos


acontecimentos embaraçantes em categorias fizeram-no tendo por base
acções ou situações enquanto causas do embaraço.

© Universidade Aberta 201


Modigliani (1968) distinguiu as seguintes classes de acontecimentos
embaraçosos:

1. Situações em que a pessoa fica desacreditada pela sua auto­


apresentação através de algum disparate cometido
inadequadamente, como por exemplo o escorregar e Cair num
lugar público.

2. Situações em que a pessoa se encontra incapaz em responder de


modo adequado a um acontecimento inesperado que ameaça
impedir o calmo fluxo de interacção, como, por exemplo, prestar
atenção a algum estigma físico de um interlocutor.

3. Situações em que o actor perde o controlo da sua auto­


apresentação não tendo um papel bem definido, como, por
exemplo, quando somos apresentados a um vasto grupo de
pessoas.

4. Situações em que há um embaraço empático, isto é, a pessoa


observa outra que parece estar numa situação embaraçosa. É um
exemplo disso, o facto de alguém com quem estamos se
comportar de modo não adequado.

5. Situações em que o indivíduo se encontra envolvido em


incidentes com conotações sexuais não adequadas, como por
exemplo entrar numa casa de banho ocupada por um elemento
do outro sexo.

Num estudo efectuado em Portugal (Edelmann e Neto, 1989) pediu-se a


120 estudantes (40% do sexo masculino e 60% do sexo feminino) que
tentassem relembrar-se de uma experiência embaraçosa que lhes tivesse
ocorrido nas semanas passadas. As categorias mais frequentes foram: 1)
Fazer um julgamento como cumprimentar alguém por erro, dar uma
resposta errada a uma questão, ou entrar numa sala errada, com 27% das
respostas; 2) Encontrar alguém, falar com alguma pessoa que se desejava
evitar, com 15%; e 3) ser alvo da crítica/riso das outras pessoas, com 13%.

Apresentado o tipo de acontecimentos que causa embaraço vejamos agora


as reacções que acompanham o embaraço. No inquérito efectuado numa
amostra portuguesa, a que já nos referimos, as reacções específicas ao
embaraço caracterizavam-se por corar, aumento da temperatura, aumento
do ritmo cardíaco, tensão muscular, rir, desvio do olhar e tocar a face.

A ocorrência de um acontecimento embaraçante pode suscitar no actor um


certo número de estratégias para recompor a sua imagem pública.

202 © Universidade Aberta


I
I1

o quadro 2.4 fornece as frequências com as quais cada reacção verbal foi
mencionada na amostra portuguesa. As estratégias verbais para lidar com
o embaraço foram divididas em oito categorias derivadas da análise teórica
feita por Austin (1970), Scott e Lymann (1968), Tedeschi e Reiss (1981),
Schlenker (1980, 1982) e Semin e Manstead (1983). A característica mais
notável dos resultados é que dois terços dos sujeitos da amostra portuguesa
tanto especificaram que não responderiam verbalmente como falharam em
indicar uma resposta verbal. Para aqueles que indicaram que dariam uma
resposta verbal, não houve nenhuma resposta em especial que fosse
utilizada com regularidade.
A falta de especificação de tentativas verbais de confronto com o embaraço
é um pouco surpreendente devido à literatura extensiva sobre estratégias
remediativas verbais (Austin, 1970; Scott e Lyman, 1968; Tedesch e Reiss,
1981; Schlenker, 1980, 1982; Semin e Manstead, 1983), embora seja
consistente com investigações anteriores sobre as tentativas verbais para
lidar com o embaraço (Edelmann e Iwawaki, 1987; Edelmann et aI., 1987).
É possível que de facto os sujeitos dêem uma resposta verbal na altura em
que estejam embaraçados, mas não sejam capazes de recordá-la durante o
preenchimento do questionário; também é possível, no entanto, que as
tentativas verbais não sejam as mais eficazes para o confronto com o
embaraço.

Respostas verbais %

Não especificado 59,2

Não responderia verbalmente 6,7

Desculpa 3,3
Comentar os próprios sentimentos 4,2

Exclamação 8,3
Explicação 3,3

Desculpa+explicação 1,7

Explicação+justificação

Justificação 1,7

Gozar 1,7

Fonte: Neto, 1992b.

Quadro 2.4 - Respostas verbais como tentativas de confronto com o embaraço


(apresentam-se as percentagens obtidas na respectiva categoria).

© Universidade Aberta 203


o quadro 2.5 fornece as frequências das estratégias não-verbais do actor
para lidar com o embaraço na amostra portuguesa. As categorias foram
combinadas de acordo com a parte do corpo mencionada, isto é, face,
olhos, corpo (gestos, movimentos), comportamento motor (orientação,
locomoção) e postura. Note-se que mais de um quarto dos sujeitos
evocaram o sorriso como estratégia não verbal de confronto com o
embaraço. Efectivamente o humor protege a identidade após um incidente
embaraçoso (Kane, SuIs e Tedeschi, 1977). Martin e Lefcourt (1983)
mostraram empiricamente que o humor reduz o impacto do stress.

Reacções não-verbais 0/[

Face 31.7

SOrTir 28,3

Olhos 18,3

Procurar o contacto ocular 1,7

Evitar o contacto ocular 12,5

Corpo 5,0

Comportamento motor 8,3

Postura 5,0

Fonte: Neto, I 992b.

Quadro 2.5 - Reacções não-verbais como tentativas para encobrir ou esconder o


embaraço

No documento 2.3 são examinadas semelhanças e diferenças interculturais


no embaraço.

O embaraço ocorre à volta do mundo quer nas culturas ocidentais quer nas
orientais. Tem sido observado em países africanos, em Samoa e no Bali (Eibl-
Eibesfelt. 1972), e investigadores têm estudado o embaraço na Alemanha, na
Espanha, na Grécia, na Itália, no Japão, em Portugal e no Reino Unido

204 © Universidade Aberta


(Edelmann, et aI.. 1989; Edelmann e Iwawaki, 1987; Edelmann e Neto, J 989).
A mensagem emergente destas investigações é clara: há uma notável
semelhança no embaraço nas diferentes culturas. Apesar da sua língua, religião,
clima, nível de industrialização. sentem o embaraço quando acontecimentos
indesejados revelam informações indesejadas acerca de si próprios às outras
pessoas.

Foram recolhidos dados através de um questionário junto de estudantes


universitários de Portugal e do Reino Unido, com o intuito de comparar as auto-
avaliações das respostas fisiológicas/comportamentais associadas ao embaraço,
das tentativas de confronto e das reacções do observador ao embaraço do actor,
nas duas culturas (Edelmann, e Neto, 1989).

o quadro geral que emerge dos resultados é que apesar de existirem


semelhanças entre as nações nas reacções, nas tentativas de conti'onto com o
embaraço e nas reacções dos observadores, existem também algumas variações
notáveis e interessantes.

Conforme dados anteriores de amostras europeias e japonesas o embaraço é


caracterizado dentro da amostra portuguesa por uma subida de temperatura,
uma aumento do ritmo cardíaco, tensão muscular. sorrisos. Corar, como um
caso específico da mudança de temperatura, foi referido com maior frequência
pela amostra do Reino Unido, e a aversão ao olhar fixo foi uma resposta
específica desta amostra. A aversão ao olhar fixo foi também raramente referida
em outras amostras europeias e japonesa (Edelmann e Iwawaki, 1987;
Edelmann et a!., 1989). Se as reacções de embaraço correspondem à ocorrência
natural ou ao embaraço induzido em laboratório nos sujeitos portugueses
necessita de ser visto. Certamente que no Reino Unido. sorrir ou rir e evitar o
contacto ocular estão associados com o embaraço em estudos de laboratório
(Edelmann e Hampson, 1979, 1981).

As variações entre as amostras de Portugal e do Reino Unido em vanaveis


associadas à reacção de embaraço fornecem diferenças culturais interessantes.
A amostra portuguesa refere que os sujeitos experienciam o embaraço
significativamente mais intenso do que o experienciado pela amostra do Reino
Unido. Scherer et a!. (1983), e Edelmann et a!. (1989) também referem
emoções significativamente menos intensas nas suas amostras britânicas em
relação às outras nações. Estes dados tendem a apoiar a literatura sobre a
expressão emocional britânica, a qual se baseia amplamente nos estereótipos.
Conforme Harper, Weins e Matorazzo (1978) indicam, os britânicos são
apontados pela sua "atenuação da emoção". É interessante notar que a amostra
portuguesa refere maior sucesso na tentativa de controlar o embaraço do que a
amostra do Reino Unido.

Documento 2.3 - Semelhanças e diferenças interculturais no embaraço

© Universidade Aberta 205


5.3.4 Implicações sociais do embaraço

Geralmente tentamos comportar-nos de modo socialmente apropriado para


assegurar que uma determinada imagem desejada de nós próprios seja
apresentada aos outros (Goffman, 1959). Parece pois plausível que o medo
do embaraço possa constranger o nosso comportamento, agindo como um
mecanismo de controlo social. Procuraremos ilustrar o modo como o
embaraço pode agir como um mecanismo de controlo social, mediante o
exame do papel desempenhado pelo embaraço na inibição do
comportamento de dádiva e de procura de ajuda.

Em qualquer situação em que se corra o risco de apresentação de modo


discrepante com o desejado, pode-se inibir a dádiva e a procura de ajuda.
Mais particularmente o embaraço aumentará e, por consequência, a dádiva
de ajuda diminui em presença de vastos públicos. Um resultado que tem
sido frequentemente posto em evidência é que a inibição social é produzida
pela presença de um público: quanto maior é o público, menor ajuda
prestarão as pessoas. Numa revisão da literatura sobre o tamanho do grupo
e dádiva de ajuda, Latané e Nida (1981) citam 56 comparações de dádiva
de ajuda por pessoas que estavam sós com pessoas que eram testadas na
presença de "compadres" ou acreditavam que outras pessoas estavam
presentes. Em 48 destas comparações, havia menos dádiva de ajuda na
condição de grupo. Três quartos das pessoas testadas sozinhas prestavam
ajuda, em comparação com metade das que eram testadas na presença de
outras pessoas. Entre as explicações avançadas para este fenômeno (Latané
e Darley, 1970), para além da influência social e da difusão de
responsabilidade, tem sido referido que os públicos podem inibir a dádiva
de ajuda quando as pessoas têm medo que o seu comportamento possa ser
visto pelos outros e assim ser avaliado de modo negativo. Neste caso as
pessoas temem as consequências embaraçantes de efectuarem julgamentos
errôneos acerca da situação.

Outros factores que contribuem para a inibição social da dádiva de ajuda


são situações ambíguas, situações embaraçantes e quando o pedido de
ajuda é efectuado por uma pessoa deficiente desfigurada. Pelo contrário, a
dádiva de ajuda pode aumentar no caso do pedido ser efectuado apôs um
acontecimento embaraçante realizado pela pessoa que dá ajuda.

Do mesmo modo o embaraço aumentará e, por conseguinte, a procura de


ajuda diminuirá em público, perante vastos públicos, no caso de a pessoa
que ajuda ser fisicamente atractiva, uma criança. Pelo contrário, o
aparecimento de embaraço por parte da pessoa que procura ajuda pode
aumentar a ajuda recebida. A possibilidade das pessoas ajudarem mais

206
© Universidade Aberta
alguém embaraçado que procura ajuda foi examinado por Levin e Arluke
(1982). Os resultados de dois estudos experimentais sugeriram que o
comportamento de ajuda dependia das condições em que ocorre o
embaraço. Na primeira experiência verificou-se que espectadores prestavam
mais ajuda a um indivíduo quando perdia temporariamente a compostura
que quando efectuava a tarefa de modo socialmente aceitável. Os
resultados da segunda experiência estabeleceram os limites das obrigações
dos membros em relação à outra pessoa. Como na primeira experiência, a
pessoa recebia mais ajuda dos espectadores quando experienciava
embaraço. Já quando a pessoa embaraçada falhava em recompor-se, recebia
de modo significativo menos ajuda que quando não tinha mostrado
embaraço.

O medo do embaraço pode, pois, desempenhar um papel importante na


possibilidade de se dar ajuda aos outros ou de se procurar ajuda. Um modo
frequente do embaraço se tornar conhecido no mundo social é através do
que as pessoas farão para o evitar. No capítulo sobre influência social
referiremos estudos que envolvem o medo do embaraço. Veremos, por
exemplo, que as pessoas negarão a clara evidência dos seus sentidos
(experiência de Asch), obedecerão a uma autoridade até limites insanos (a
experiência de Milgram). Trata-se de resultados experimentais, mas que
presumivelmente reí1ectem factos do mundo real. Um aspecto em que os
efeitos do embaraço têm sido documentados no mundo real é no domínio
do uso de contraceptivos por adolescentes. Um cliché que ressalta no
cinema e na televisão é o embaraço que suscita a adolescentes a compra de
preservativos. Mas infelizmente trata-se de mais do que de um cliché, sendo
efectivamente tal comportamento embaraçante. Gravidez indesejada e
srDA podem ser os custos pagos por algumas pessoas que não enfrentam o
embaraço (Herold, 1981).

5.4 Tácticas de auto-apresentação

Há várias tácticas específicas que as pessoas podem utilizar para se


apresentarem aos outros. Foram identificadas cinco tácticas principais de
auto-apresentação, diferindo no atributo particular que a pessoa está a
tentar ganhar (Jones e Pittman, 1982). Estas cinco tácticas são insinuação,
intimidação, autopromoção, exemplificação e súplica (quadro 2.6).

207
© Universidade Aberta
Estratégia Técnica Objectivo

Insinuação Lisonjear e concordar Ser vÍsto como simpático

Intimidação Ameaçar Ser visto como perigoso

Autopromoção Jactar-se Ser visto como competente

Exemplificação "Blasonar" Ser visto como moralmente puro

Súplica Rogar Ser visto como fraco

Fonte: Jones e Pittman, 1982.

Quadro 2.6 - Tácticas de auto-apresentação

Insinuação

A insinuação é definida como "uma classe de comportamentos estratégicos


ilicitamente designados para influenciar uma pessoa particular sobre a
atractividade das qualidades pessoais de si próprio" (Jones e Wortman,
1973, p. 2). Por outras palavras, o objectivo principal do insinuador é ser
visto como uma pessoa simpática. Tácticas frequentes consistem em
cumprimentar outras pessoas, ser um bom ouvinte, ser amigável, fazer
favores e conformar-se nas atitudes e comportamento. O insinuador
assume, de modo correcto, que tendemos a gostar das pessoas cujas
atitudes e valores aparecem semelhantes aos nossos (cf. capítulo sobre
atracção interpessoal a publicar em 2° volume).

Intimidação

O intimidador tenta projectar uma identidade como sendo uma pessoa forte
e perigosa. Através de olhares ameaçantes, de palavras zangadas, de
ameaças de violência, os intimidadores tentam ganhar condescendência
induzindo medo nos outros (Jones e Pittman, 1982). Um intimidador tipo é
um ladrão com uma arma, mas há outras situações que envolvem tentativas
de intimidação: atletas de equipas contrárias, pais com filhos, talvez
professores com estudantes. É óbvio que as ameaças não são muito
agradáveis, podendo levar a outra pessoa a fugir da situação. É por essa

208
© Universidade Aberta
razão que Jones e Pittman sugerem que a intimidação pode ser utilizada a
maior parte das vezes nas relações que são em certos aspectos não
voluntárias e em que não se pode escapar facilmente.

o objectivo da pessoa que intimida é suscitar medo.

Autopromoção

Esta táctica envolve tentativas da parte de um actor para realizar uma


identidade como sendo uma pessoa competente e inteligente. Enquanto
que, quer a insinuação, quer a autopromoção envolvem comunicações
auto-valorizantes, diferem nas identidades que as pessoas procuram
estabelecer com cada comportamento. Os insinuadores querem que os
outros gostem deles, já os autopromotores querem respeito para as suas
capacidades (Jones e Pittman, 1982). As tácticas de autopromoção são
particularmente importantes para obter um objectivo imediato, tais como o
ingresso num curso ou emprego de difícil acesso.

© Universidade Aberta 209


Um estudo de Godfrey, Jones e Lord (1986) exammou como é que o
comportamento das pessoas varia dependendo se pretendem insinuar ou
autopromover. Antes de encetar uma discussão com outras pessoas, alguns
sujeitos eram instruídos para tentar fazer com que a outra pessoa gostasse
deles (condição insinuação). A outros sujeitos foi-lhes dito para tentarem
que a outra pessoa os respeitasse (autopromoção). A discussão era gravada
em vídeo e o comportamento dos sujeitos era avaliado por um conjunto de
juízes. As gravações em vídeo revelaram que os insinuadores
comportavam-se "reactivamente" na medida em que permitiam que os
outros indivíduos conduzissem a conversa enquanto que os insinuadores
riam, inclinavam a cabeça, e concordavam com a pessoa. Ao invés, os
autopromotores actuavam "pro-activamente" na medida em que
comandavam a conversa discutindo as suas várias realizações. Os
resultados indicaram também que a preparação com uma semana de
antecedência não influenciava o modo como se comportavam quer os
insinuadores quer os autopromotores. Por consequência, parece que tais
tácticas já estão bem estabelecidas nos reportórios da maior parte das
pessoas.

Exemp/ificação

Consiste em acções que a pessoa utiliza para ganhar respeito e admiração


dos outros projectando uma imagem de moralidade, de integridade e de
dignidade (Jones e Pittman, 1982). O exemplificador tem como objectivo
último modificar o comportamento do público alvo. Através de uma
actuação admirável uma pessoa amplifica um determinado código, norma
ou padrão de conduta que deveria orientar o comportamento de todas as
pessoas. Certos papéis sociais acarretam a responsabilidade de ser
exemplos para os outros. Os pais são modelos para os seus filhos, os
párocos para os seus paroquianos e os supervisores para os seus súbditos.

Súplica

Uma última táctica é a súplica que faz com que uma pessoa pareça fraca e
dependente. Pode ser a única táctica disponível para aquela pessoa que não
dispõe dos recursos requeridos pelas tácticas precedentes (simpatia, poder,
competência aparente, valor moral aparente). Esta táctica funciona porque
há normas espalhadas na nossa cultura que vão no sentido de que as

210 © Universidade Aberta


pessoas necessitadas devem ser ajudadas. Estas normas são mais salientes
quando a dependência não aparece como sendo da responsabilidade do
sujeito como, por exemplo, uma pessoa que nasceu deficiente em oposição
a uma pessoa que se tornou alcoólico. Mas é óbvio que demasiada súplica
tem os seus custos. Por um lado, as pessoas fracas raramente podem estar
seguras de que os outros viverão em conformidade com essas normas e,
por outro lado, a fraqueza não é muito atractiva.

As cinco tácticas de auto-apresentação podem ser utilizadas pela mesma


pessoa em situações diferentes. Por consequência, mesmo se uma pessoa
pode ser "especialista" numa ou noutra táctica, é muito provável que cada
um de nós utilize cada uma dessas tácticas em diversas ocasiões. É também
possível que se usem elementos de mais de uma táctica na mesma ocasião.

Refira-se, enfim, que as tácticas referidas têm como objectivo influenciar o


modo como os outros nos vêem, mas também podem mudar o modo como
nos vemos. Podem influenciar o nosso autoconceito (Rhodewalt e
Agustsdottir, 1986). Nuns casos, a táctica de auto-apresentação escolhida
pode tornar certos aspectos do self mais salientes e mais susceptíveis de
influenciar o comportamento futuro da pessoa. Noutros casos, o enveredar
por um comportamento discrepante com o self pode suscitar uma mudança
no sentido em que o self é percepcionado.

5.5 Estilo de auto-apresentação: Autovigilância

Todos nós recorremos a estratégias de auto-apresentação. Contudo


algumas pessoas são mais susceptíveis de enveredarem por auto-
representações estratégicas que outras. Segundo Mark Snyder (1974,
1987), estas diferenças estão relacionadas com um traço de personalidade
denominado de autovigilância ("self-monitoring") que é a tendência para
usar pistas de auto-apresentação das outras pessoas para controlar as suas
próprias auto-apresentações. As pessoas com elevada autovigilância estão
conscientes das impressões que suscitam nas interacções sociais e são
sensíveis às pistas sociais a propósito de como se deveriam comportar em
diferentes situações. Percepcionam-se como flexíveis e podem não agir em
consonância com os seus sentimentos interiores quando a situação lho
reclama. Ao invés, às pessoas com baixa auto vigilância falta-lhes a
habilidade e a motivação para regular as suas auto-apresentações
expressivas. Os seus comportamentos expressivos são o reflexo dos seus
estados interiores permanentes e momentâneos. Por consequência, tendem

211
© Universidade Aberta
a comportar-se mais de modo consistente com a sua própria auto-imagem
do que como pensam que a situação lhe reclama.

Com o intuito de se medir este construto foi elaborada uma escala (Snyder,
1974; Snyder e Gangestad, 1986). Num estudo com esta escala, Snyder
demonstrou que os actores profissionais tinham valores mais elevados em
autovigilância que estudantes universitários.

Os psicólogos sociais discordam se a escala de autovigilância mede um só


traço global ou representa uma combinação de dois ou mais traços
específico,;. Por exemplo, há investigadores que apontam três factores na
escala de autovigilância. Um parece ter a ver com a habilidade em
representar; outro tem a ver com a orientação para os outros (ser tocado
pelas avaliações dos outros); e o último refere-se à extroversão ou
sociabilidade (Briggs, Cheek e Buss, 1980; Gabrenya e Arkin, 1980;
Lennox e Wolfe, 1984). Estas análises factoriais sugerem que seria melhor
abandonar a noção de auto vigilância e focalizarmo-nos nestes vários
componentes. Sugerem que a escala é um instrumento imperfeito porque
não mede uma coisa, mas várias coisas.

Snyder respondeu a essas críticas, defendendo que muito embora haja


subfactores dentro da escala de auto vigilância, apesar disso a escala mede
um só traço latente. Esta conclusão foi baseada em análises estatísticas
muito sofisticadas de respostas à escala. Além disso, com base nestas
análises, Snyder propôs uma revisão da escala original com vinte e cinco
itens, tirando alguns itens que não se relacionavam com o que ele pensa ser
o único traço latente (Gangestad e Snyder, 1985). Mesmo assim, há ainda
evidência que a escala revista contém dois factores, um tendo a ver com a
habilidade para representar em público e outro com a orientação para os
outros (Briggs e Cheek, 1988; Neto, 1993a, 1994). Seja como for, a
investigação tem demonstrado que um leque variado de comportamentos
sociais são influenciados por características individuais medidas pela escala
de autovigilância. Por exemplo, poder-se-ia esperar que as pessoas com
elevada auto vigilância prestassem atenção às outras pessoas e as pessoas
com baixa auto vigilância prestassem atenção a elas próprias. Estas
diferenças ocorrem efectivamente, mesmo nos padrões de linguagem. Foi
evidenciado (Ickes, Reidhead, e Patterson, 1986) que as pessoas com baixa
autovigilância eram mais susceptíveis de falar na primeira pessoa (eu, meu,
minha, etc) que as pessoas com alta autovigilância. Estas eram mais
susceptíveis de falar em terceira pessoa (ele, ela, seu, sua, etc). Tais
diferenças sugerem que as pessoas com alta auto vigilância estão mais
atentas às acções e reacções dos outros, e as pessoas baixas em
autovigilância preocupam-se mais com elas próprias.

212 © Universidade Aberta


Estas diferenças na atenção reflectem-se também nas escolhas interpessoais
que as pessoas fazem. As pessoas com alta auto vigilância tendem a
escolher um companheiro (por exemplo, para jogar ténis) com base no
modo como essa pessoa joga; as pessoas com baixa auto vigilância são mais
susceptíveis de escolher um companheiro com base no modo como gostam
dessa pessoa (Snyder, Gangestad, e Simpson, 1983). A explicação baseia-
se no ênfase na situação (quero jogar ténis contigo) versus o ênfase nos
sentimentos pessoais acerca dessa pessoa (quero jogar ténis contigo). Os
resultados desta e doutras investigações evidenciam que as pessoas com
baixa auto vigilância são mais comprometidas com as pessoas, ao passo que
as pessoas altas em autovigilância são mais comprometidas com situações.

Há também estudos que têm mostrado que as pessoas com elevados valores
em autovigilância são mais susceptíveis de mudar o seu comportamento
para seguir a situação que a pessoa com valores baixos. Se uma situação
apela para a conformidade, as pessoas com valores elevados em
auto vigilância tendem a conformar-se com a opinião do grupo, mas se a
situação apela para a independência, tornam-se não conformistas (Snyder e
Monson, 1975). Ao invés, as pessoas com valores baixos em auto vigilância
parecem estar motivadas a manter as opiniões e comportamentos mesmo
em situações em que essas opiniões e comportamentos possam ser custosos
(Danheiser e Graziano, 1982). Como seria de esperar, as pessoas com
valores altos em autovigilância possuem maiores habilidades sociais, são
mais susceptíveis de iniciar interacções sociais e mais atentas a pistas
sociais em situações ambíguas. Aprendem mais depressa comportamentos
sociais apropriados e são melhores na compreensão de comportamentos
não-verbais. Segundo as palavras de Snyder as pessoas com elevada
auto vigilância têm um sentido pragmático do self, definindo a sua
identidade, em grande parte, em termos de situações sociais e de papéis que
desempenham.

Poderá haver duas razões diferentes por que as pessoas com elevada
auto vigilância modificam o seu comportamento para se ajustar às
expectativas e às pressões da situação. Tem-se efectuado a distinção entre
estratégias de evitamento/proteção e de aquisição/agressão (Arkin et aI.,
1986). Pessoas com valores altos em autovigilância que adoptam uma
orientação de evitamento/proteção tendem a estar inseguras, a ter uma
auto-estima baixa e a ser tímidas; os que adoptam a orientação
aquisi<;ão/agressão não estão nesse caso (Briggs e Cheek, 1988; Wolfe et
aI., 1986). Por consequência, as pessoas com valores elevados em
auto vigilância podem ser motivadas quer pelo evitamento quer pela
aquisição.

© Universidade Aberta 213


À primeira vista poderá parecer que a autovigilância é muito semelhante ao
construto de autoconsciência discutido previamente. Contudo investigação
de Carver e Scheier (1981) indica que os dois construtos, embora estejam
relacionados, medem algo de diferente: a autovigilância focaliza-se mais nas
habilidades de auto-apresentação; a autoconsciência focaliza-se mais na
auto-atenção. As pessoas com elevada autoconsciência focalizam-se mais
na auto-atenção. As pessoas com elevada autovigilância não são somente
altas em autoconsciência, utilizam também a consciência para orientar o seu
comportamento social.

Apresentaremos seguidamente uma técnica que permite que o SUjeIto


assuma um papel activo num aspecto específico do autoconceito, isto, é, na
descoberta dos determinantes das suas preferências profissionais. A
propósito desta técnica Reuchlin escreveu: "Poder-se-ia dizer que esta
técnica constitui um instrumento de auto-análise de um certo insconsciente
que não é necessariamente o inconsciente freudiano ou o inconsciente
adleriano" (in Mullet e Neto, 1988, p. 9).

214 © Universidade Aberta


APLICAÇÕES: TOMADA DE CONSCIÊNCIA DOS

DETERMINANTES DAS PREFERÊNCIAS PROFISSIONAIS

A técnica descrita na obra de Mullet e Neto (1988) tem por objectivo


permitir que adolescentes e jovens adultos tomem consciência: a) das
relações entre certos determinantes clássicos (e.g., prestígio, ordenados,
saídas profissionais) e o seu sistema de preferências profissionais; b) dos
pontos fortes e fracos do seu sistema de informações; e c) da estrutura
interna das suas representações profissionais. Esta técnica pode ser
utilizada também para promover uma melhor compreensão entre pais e
filhos, ou entre cônjuges, quando se trata de problemas relativos à
orientação escolar e profissional.

A técnica, podendo ser utilizada em conjunto (ou independentemente de)


provas de interesses não pretende ser mais do que um instrumento
educativo que visa o favorecimento, em momento oportuno, da maturação
das preferências.

o principal objectivo do M/81 é estimular a consciência, tendo-se


verificado em trabalho anterior (Le Cao, Moulin e Mullet, 1988) que esse
objectivo é atingido. Podem encontrar-se exemplos pormenorizados da sua
utilização em Francequin-Chartier, Rieu-Fichot e Mullet (1988); Mullet,
Chami, Francequin-Chartier, Munoz-Sastre, Neto e Rieu-Fichot (1991);
Mullet e Neto (1991).

o princípio da técnica é muito simples. Trata-se de uma tarefa de


julgamento com critérios múltiplos a serem executados por cada um dos
jovens interessados. A tarefa consiste na emissão e comparação de
julgamentos proferidos sobre um conjunto de pares de profissões. Numa
primeira fase, o indivíduo deve assinalar, perante cada par, a profissão que
menos gostaria de exercer mais tarde (ou seja, qual das profissões rejeita) e
depois, reexaminando o mesmo conjunto de pares de profissões, deverá
indicar qual das duas é mais susceptível, na sua opinião, de satisfazer um
dado critério (ordenados altos, prestígio... ). As duas séries de julgamentos
(globais e parciais) são comparadas e é a força de associação entre elas que
permite definir a importância atribuída ao(s) aspecto(s) considerado(s).

A prova é composta por 21 profissões, de acordo com três critérios: nível


de qualificação, domínio de interesse (literário, artístico, científico,
desportivo, altruísta... ) e a atracção exercida, no geral, sobre os jovens. O

© Universidade Aberta 215


conjunto das profissões seleccionadas é diversificado e inclui as profissões
cuja escolha ou rejeição não foi sistemática, por parte de jovens do ensino
secundário. Estas 21 profissões foram combinadas 2 a 2 por um
procedimento de tiragem ao acaso, constituindo-se 42 pares de profissões,
as quais aparecem 4 vezes.

A prova pode ser administrada pelo educador (professor ou psicólogo) ou


pelo próprio jovem, em conjunto com ele, que após a emissão dos
julgamentos de preferência, selecciona os aspectos (2, 3 ou mesmo os 12)
pelos quais mais se interessa.

Note-se que a lógica da técnica que acaba de ser apresentada, afasta-se, em


vários pontos de vista, da lógica de muitas técnicas psicométricas ou psico-
pedagógicas clássicas de que aqui só se fará referência a três:

a) O quadro de referência ao qual se reporta cada resultado não é


uma população de resultados obtidos por indivíduos diferentes ao
longo de uma mesma dimensão, mas sim uma população de
resultados obtidos pelo mesmo indivíduo a propósito de diferentes
dimensões diferentes. O que importa é a comparação da importância
que o adolescente atribui ao prestígio, aos rendimentos, às saídas
profissionais, etc... naquilo que constituem as suas preferências. O
adolescente não é avaliado em relação aos outros, mas sim em
relação a si próprio. Podem ser constituídas padronizações, mas a
sua informação é de outra índole. Trata-se de uma técnica
psicológica em sentido estrito.

b) A técnica não tem por objectivo indicar, em caso algum, para


cada jovem, a ou as profissões para as quais ele tem um interesse
razoável em encaminhar-se. Ela visa favorecer, a propósito das
preferências profissionais, uma interrogação e um trabalho sobre si
próprio, uma discussão com o outro. Não se trata assim tanto de
preparar o aluno para escolher uma profissão, para elaborar um
projecto profissional, como de criar nele as condições de formação
dessa escolha ou desse projecto.

c) A técnica não tem por objectivo informar acerca das profissões,


mas de suscitar uma pesquisa ulterior de informação, pesquisa
orientada ao longo de certos eixos: saídas profissionais, encontros...
A técnica permite pôr em relevo as forças e as fraquezas do sistema
de informações que cada adolescente possui, e a partir daí, orientar
melhor a busca de informação.

216 © Universidade Aberta


Esta técnica pode ser utilizada para estudar casos individuais, famílias,
amostras de populações. Nesta última perspectiva propusemo-nos estudar o
efeito de três variáveis diferenciais clássicas, o sexo, a categoria sácio-
profissional dos pais, o meio geográfico (rural-urbano) sobre o impacto de
certos determinantes das preferências profissionais de 789 adolescentes
frequentando a escola secundária (Mullet, e Neto, 1988). Neste estudo
verificou-se de uma maneira geral que as raparigas tendem a preferir
nitidamente os trabalhos que elas julgam ser mais femininos, mais
prestigiosos, mais susceptíveis de oferecer possibilidades de promoções,
mais susceptíveis de oferecer rendimentos mais altos e possibilidades de
encontros. Os rapazes tendem a preferir nitidamente os trabalhos que
julgam susceptíveis de oferecer os rendimentos mais altos, que julgam ser
os mais prestigiosos, os mais favoráveis do ponto de vista da promoção.

De uma forma ainda geral, os alunos de meio favorecido, tendem mais do


que os outros, a dar uma certa importância às possibilidades de iniciativa.
Eles estão menos hesitantes em designar os trabalhos que sabem que são
mais dificilmente acessíveis quer pelo facto do sucesso escolar, quer pelo
facto do custo e duração dos estudos exigidos. Sempre de uma forma geral,
os alunos do meio rural tendem, mais do que os outros, a preferir trabalhos
que julgam oferecer-lhes o máximo de possibilidades de promoção e de
contactos sociais. Em geral, notar-se-á que se presta pouca atenção aos
atributos acessibilidade quanto ao custo, iniciativa-rotina, intelectual-
manual e mesmo saídas profissionais.

Numa perspectiva intercultural, Neto, Mullet e Henry (1988) estudaram o


impacto de diferentes determinantes, Prestígio, Ordenados, Intelectual-
Manual..., sobre as preferências profissionais de adolescentes portugueses e
franceses com 14-15 anos de idade. Encontraram-se diferenças sensíveis no
impacto de quatro dos determinantes estudados. Como fora previsto pelos
autores, o determinante Ordenados (e correlativamente Prestígio) tem mais
impacto nas preferências profissionais dos adolescentes portugueses. Estes
preferem mais que os franceses as profissões que julgam serem melhor
remuneradas e isto pode explicar-se tendo em conta o relativamente fraco
nível de vida em Portugal. Como fora igualmente previsto pelos autores, o
determinante possibilidades de Promoção profissional tem também mais
impacto nos adolescentes portugueses. Os jovens portugueses preferem
mais que os franceses as profissões que julgam oferecerem mais
possibilidades de promoção. Isto pode explicar-se pelo facto da menor taxa
de escolarização em Portugal onde a promoção passa mais pelo trabalho.
Uma quarta diferença diz respeito ao determinante Intelectual-Manual. As

217
© Universidade Aberta
preferências dos Portugueses vão mais para as profissões julgadas maIS
manUaIs.

Este estudo foi efectuado com uma vasta amostra de adolescentes


portugueses escolarizados em Portugal e com adolescentes franceses
escolarizados em França, tendo sido controlados os efeitos das variáveis
sexo e nível sócio-cultural dos pais. Contudo uma fracção da população
dos adolescentes portugueses vive e está escolarizada em França. Que é
que neles determina as suas preferências profissionais? O impacto dos
determinantes citados mais acima será parecido ao dos Franceses ou ao dos
Portugueses? Por outros termos, que factor cultural vai predominar, o
ligado ao grupo de pertença (português) ou o ligado ao meio de vida e de
acolhimento (francês)?

Encontraram-se diferenças no impacto dos determinantes Prestígio,


Ordenados, Promoção e Intelectual-Manual. Os adolescentes portugueses
escolarizados em França vivem em famílias cujos ordenados são
relativamente mais elevados do que em Portugal sem todavia atingir o nível
médio em França. É portanto bastante natural que o impacto deste
determinante seja, nesta população, intermediário. O mesmo raciocínio
pode ser aplicado ao caso do determinante Promoção; os jovens
portugueses têm acesso ao sistema escolar francês, na mesma condição que
os jovens franceses. Infelizmente, esses jovens não têm aí tanto sucesso
escolar. Pelo contrário, no que diz respeito ao Prestígio, a situação não é
melhor do que a que poderiam viver em Portugal; os seus pais ocupam na
sua grande maioria empregos mais ou menos abandonados pelos Franceses.
Por conseguinte, é lógico que o impacto deste determinante seja neles tão
elevado ou até mais elevado do que se verifica em Portugal. Enfim, os
adolescentes portugueses que vivem em França, uma sociedade
tecnologicamente mais avançada que Portugal, preferem menos que os
jovens portugueses empregos manuais, estando desta vez muito próximos
dos jovens franceses.

SUMÁRIO

Desde Willliam James que os psicólogos têm chamado a atenção para a


importância do self. A Psicologia Social contemporânea reconhece a
importância do self. O termo autoconceito refere-se a todos os nO;5sos
pensamentos acerca de quem somos. O autoconceito tem muitas
componentes que podem ser afectadas pela proeminência de certas

218
© Universidade Aberta
características ambientais. O autoconceito de trabalho inclui somente
atributos que são activados pela situação social actual, e as estruturas
cognitivas que organizam esta informação são denominadas auto-esquemas.
Os auto-esquemas são pois generalizações cognitivas acerca do self que
têm influência no modo como organizamos e nos lembramos de
acontecimentos.

A memória de acontecimentos vitais desempenha um papel relevante nas


auto-representações. Em primeiro lugar a memória autobiográfica é
egocêntrica, as pessoas têm a tendência a sobreavaliar o alcance do seu
próprio papel nos acontecimentos passados. Para além deste viés, é também
de referir a beneficiação, isto é, o self é percepcionado como sendo
responsável pelos bons resultados, mas não pelos maus, e o
conservadorismo em que há uma resistência à mudança cognitiva.

Diversas fontes podem contribuir para o self das pessoas. A avaliação


reflectida refere-se às percepções que as pessoas têm de avaliações dos
outros acerca delas próprias. As pessoas podem também aprender acerca
delas próprias mediante comparações sociais com outros semelhantes sobre
atributos relacionados com a realização. A comparação da realização
presente de uma pessoa com a realização passada também pode ser uma
fonte do autoconceito. Através das autopercepções as pessoas efectuam
inferências acerca de si próprias mediante observação do seu
comportamento e das circunstâncias em que ocorre.

A teoria da identidade social sugere que os grupos a que pertencemos


formam uma parte importante da nossa identidade. Estamos motivados para
obter uma identidade social positiva e distinta. Os grupos culturais são uma
fonte importante de identidade social e podem determinar a nossa
compreensão do self. As culturas podem variar em termos de terem uma
concepção do seif independente ou interdependente.

A auto-estima refere-se à avaliação positiva ou negativa que temos de nós


próprios. A maior parte das pessoas tenta manter uma auto-estima positiva.
A auto-estima global depende das avaliações das identidades de papéis
específicos. As pessoas com auto-estima mais elevada tendem a ser mais
populares, assertativas, ambiciosas, com melhor sucesso académico, mais
bem adaptadas, e mais felizes. As práticas educativas e outros
acontecimentos significativos nas nossas vidas podem afectar a nossa auto-
estima.

A teoria da autodiscrepância prediz que a nossa auto-estima também é


influenciada pelo fosso que percepcionamos existir entre o nosso self actual

219
© Universidade Aberta
e as varIas autoguias, ou padrões que temos para nós próprios. Alguns
destes padrões provêm do que pensamos que as outras pessoas esperam de
nós, alguns vêm dos nossos objectivos.

Não gastamos todo o nosso tempo a pensar sobre nós próprios. Todavia.há
condições que podem suscitar um estado de autoconsciência, durante o
qual focalizaremos a atenção nalgum aspecto do self e comparar-nos-emos
com algum padrão interno. Há também evidência que algumas pessoas
estão cronicamente mais atentas a elas próprias que às outras, e que essa
autoconsciência crónica pode estar dirigida quer para aspectos privados
(crenças, atitudes e valores) quer para aspectos públicos (aparência). A
autoconsciência está associada com o uso e abuso do álcool.

Podemos recorrer a numerosas técnicas para proteger a auto-estima. Mais


especificamente procuramos avaliações reflectidas consistentes com as
nossas próprias perspectivas, processamos informação selectivamente,
escolhemos com cuidado as pessoas com quem nos comparamos e
atribuímos maior importância a qualidades que fornecem uma retroacção
consistente.

As pessoas enveredam muitas vezes por estratégias de auto-apresentação


para influenciar a impressão que causam nas outras pessoas. Entre as
teorias da auto-apresentação incluem-se o interaccionismo simbólico, a
perspectiva de Goffman da apresentação do self e a teoria das identidades
situadas. Dois motivos primários para a auto-apresentação são o agradar ao
público e construção social, pelo que as pessoas tentam obter consenso dos
outros para confirmar uma identidade desejada.

o embaraço é geralmente visto como uma forma de ansiedade social, tal


como a timidez, a ansiedade em público e a vergonha. O embaraço surge
quando é percepcionada uma divergência entre a auto-apresentação de uma
pessoa e o seu padrão para a auto-apresentação. Edelmann propôs um
modelo multifacetado que interliga componentes e processo como uma
explicação para a expressão do embaraço. Os três estádios do modelo de
Edelmann reflectem largamente os antecedentes, as respostas
fisiológicas/motoras e as consequentes estratégias remediativas evocadas
pelo actor para lidar com o evento do embaraço. Em qualquer situação em
que se corra o risco de apresentação de modo discrepante com o desejado,
pode-se inibir a dádiva e a procura de ajuda.

Tácticas específicas de auto-apresentação incluem insinuação, intimidação,


autopromoção, exemplificação e súplica.

220
© Universidade Aberta
As pessoas diferem na sua motivação e habilidade em controlar a sua auto­
apresentação. As pessoas altas em autovigilância estão conscientes das
impressões que suscitam e são sensíveis às pistas sociais acerca de como as
pessoas deveriam comportar-se em diferentes situações. Às pessoas baixas
em auto vigilância falta-lhes quer a habilidade quer a motivação para regular
a sua auto-apresentação expressiva e tendem a comportar-se de modo
consistente com a sua própria auto-imagem e não tanto com a situação.

A função do procedimento educativo M/81 reside numa tomada de


consciência pessoal em relação aos determinantes das preferências
profissionais. Esta técnica não pretende ser mais do que uma das
componentes possíveis de um conjunto de técnicas educativas com vista ao
favorecimento da maturação das preferências profissionais.

PARA IR MAIS LONGE

BERKOWITZ, L. (Ed.)

1988 Advances in experimental social psychology, vol.


21. New York: Academic Press.

Este volume apresenta capítulos com muito interesse a propósito da teoria e da

investigação sobre o seU' em psicologia social.

BUSS, A.

1980 Seif-consciousness and social allxiety. San


Francisco: Freeman.

A obra apresenta uma teoria da autoconsciência, bem como implicações da

teoria para a investigação e para uma melhor compreensão do self, da

personalidade e do comportamento social.

FISKE, S. T. e TAYLOR, S. E.

1991 Social cognitioll (2 a ed.). New York: McGraw-Hill.

Trata-se de uma revisão enciclopédica da literatura sobre cognição social

efectuada por dois peritos no domínio. Inclui um capítulo sobre cognição

social e sclf que aborda com mais pormenor material discutido neste capítulo.

© Universidade Aberta 221


LEARY,M.R.

1995 Self-presentation: lmpression management and


interpersonal behavior. Dubuque, IA: Brown &
Benchmaark.

o texto propicia uma análise dos modos como o comportamento humano é


afectado pela atenção das pessoas às suas impressões públicas. O autor
demonstra que longe de ser um indicador de insegurança ou de vaidade, um
certo grau de atenção às impressões públicas de uma pessoa é essencial para
uma interacção social com sucesso.

MULLET, E. e NETO, F.

1988 Tomada de consclencia dos determinantes das


preferências profissionais: Teoria e método.
Lisboa: Universidade Aberta.

É apresentado o quadro teórico e metodológico de um método que permite a


tomada de consciência dos determinantes das preferências profissionais. São
também apresentados exemplos de utilização do método ao nível individual,
familiar e populacional.

SNYDER,M.

1987 Public appearances/private realities: The


psychology of self-monitoring. San Francisco:
Freeman.

Este livro apresenta uma perspectiva integradora sobre o que teorias,


investigação e aplicações da autovigilância nos dizem acerca de nós próprios e
dos papéis da realidade e da ilusão na identidade pessoal e na interacção
social.

ACTIVIDADES PROPOSTAS

1) Examine o seu próprio self. Guarde um registo das suas características


pessoais durante vários dias. °
seu comportamento é consistente em todas
as circunstâncias, ou muda dependendo com quem está e do que está a
fazer? Concordaria com William James de que temos muitos "selves"?

2) Qual é a diferença entre auto-conceito e auto-estima?

222 © Universidade Aberta


I
[I

3) Pode pensar numa ocasião em que esteve de acordo com pessoas que se
opunham à sua maneira de pensar porque temeu ficar embaraçado(a) se se
opusesse a elas? Descreva.

4) Dê exemplos da sua própria experiência de pessoas que tentam seguir as


seguintes estratégias: insinuação, intimidação, autopromoção,
exemplificação, súplica.

5) Em que profissões seria útil ter uma elevada autovigilância?

6) A técnica M/81 descrita na obra de Mullet e Neto (1988) tem por


objectivo permitir que adolescentes e jovens adultos tomem consciência: a)
das relações entre certos determinantes clássicos (e. g., prestígio,
ordenados, saídas profissionais) e o seu sistema de preferências
profissionais; b) dos pontos fortes e fracos do seu sistema de informações,
e c) da estrutura interna das suas representações profissionais. Esta técnica
pode ser utilizada também para promover uma melhor compreensão entre
pais e filhos, ou entre cônjuges, quando se trata de problemas relativos à
orientação escolar e profissional.

Mostre a aplicabilidade e o interesse de uma extensão familiar da técnica


M/81 através da análise do caso de uma pessoa jovem do 9° ano de
escolaridade. Em primerio lugar proceda à apresentação geral do caso e em
seguida apresente a análise e interpretação dos dados provenientes da
administração familiar.

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111. CRENÇAS DE CONTROLO E ATRIBUIÇOES
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TÁBUA DE MATÉRIAS

1. Introdução

2. A Ilusão do Controlo

3. Locus de Controlo

3.1 Popularidade e definição

3.2 Diferenças comportamentais

3.3 Investigação intercultural

3.3.1 Comparações nacionais

3.3.2 Comparações com grupos étnicos e minoritários

3.4 Desejo de controlo

4. Reacções à Perda de Controlo

4.1 Teoria da reactância

4.2 Desânimo aprendido

4.3 Dependência auto-induzida

5. Atribuições

5.1 O que é uma atribuição?

5.1.1 Definição

5.1.2 Tipos de atribuições

5.1.3 A valiação das atribuições

5.2 Teorias

5.2.1 Causalidade e psicologia ingénua

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5.2.2 Inferências correspondentes

5.2.3 Covariação e esquema causal

5.2A Atribuições de sucesso e de fracasso

5.3 Aplicações da teoria da atribuição

5.3.1 Violação

5.3.2 Desemprego

5.3.3 Acidentes

5.3A Relações intelpessoais

5 A Erros de atribuição

5 A.] Diferenças entre actor e observador

5 A.2 Erro fundamental

5A.3 Complacência na atribuição de causalidade

5AA Efeitos temporais na atribuição

5.5 Atribuição e relações intergrupais

5.6 Atribuições e diferenças culturais

6. Norma de Internalidade

6.1 Definição de norma de internalidade

6.2 A internalidade na sociedade portuguesa

7. Níveis de Análise Distintos, mas Relacionados?

Aplicações: Estilo atribucional

Sumário

Para ir mais longe

Actividades propostas

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I

übjectivos de aprendizagem

o estudo deste capítulo deve permitir ao aluno:


• Examinar o impacto de crenças no controlo pessoal sobre o

comportamento social;

• Examinar os factores situacionais que determinam a nossa reacção à

perda de controlo pessoal;

• Identificar diferentes tipos de atribuição;

• Compreender como é que fazemos julgamentos acerca das causas de

acontecimentos e das acções das pessoas;

• Examinar viés que afectam o modo como percebemos as pessoas e

como compreendemos o seu comportamento;

• Identificar factores intergrupais e culturais que desempenham um

papel nos processos de atribuição;

• Definir e ilustrar a norma de internalidade.

o homem é uma autonomia contingente. Sem ter a última palavra nos

acontecimentos, configura-os, contudo. Mas até esse privilégio perde quando

descrê de si. Então é que os deuses podem tudo.

Miguel Torga

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1. Introdução

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A vida é uma constante procura de controlo. Gastamos muito do nosso tempo
e esforço procurando concretizar um sentido de controlo. Desde tenra idade as
crianças procuram afirmar a sua própria vontade. Na adolescência, a procura
de autonomias é uma constante e muitas vezes surgem conflitos com os pais.
Na idade adulta, a batalha pelo controlo torna-se mais extensiva e complexa.
As pessoas lutam e competem para ganhar maior controlo numa variedade de
frentes, tais como saúde, prestígio, e poder; lutam sem cessar para melhorar as
suas posições. A procura de autonomia continua no último estádio da vida
humana. As pessoas idosas, ameaçadas pelo declínio físico e pela perda de
controlo sobre as suas vidas, devem utilizar todas as suas forças para se
manterem independentes tanto tempo quanto possível.

No âmago das relações humanas, quer sejam entre indivíduos quer entre
grupos, as relações com o controlo estão sempre presentes. Agressão e
conflito, dominação e submissão, negociação e cooperação são alguns dos
resultados a que chegam as pessoas para resolver problemas de controlo. Em
suma, o tema do controlo em todas as suas variações permeia todos os
aspectos da vida real. Não admira que a psicologia do controlo se tenha
tornado uma área de investigação dominante. Numerosas subdisciplinas na
psicologia, desde a educacional, social, industrial à clínica, têm fornecido uma
ampla evidência do impacto da psicologia do controlo.

Contudo, a grande popularidade da psicologia do controlo suscita um certo


número de problemas. Entre eles a proliferação dos conceitos relacionados
com o controlo. Estes incluem, entre outros, locus de controlo, locus de
causalidade, controlo desejado, controlo participado, controlo partilhado,
controlo percebido e real, julgamentos contingentes, auto-eficácia, mestria,
motivação para o poder, autonomia, liberdade, responsabilidade, reactância
psicológica, desânimo aprendido, optimismo aprendido, ilusão do controlo,
crença num mundo justo...

o conceito e o desejo de controlo não são novos. Já Adler, na sequência de


Nietzsche e de outros filósofos voluntaristas, falava de "vontade de poder" ou
de "procura de superioridade". Outros autores falam da vontade de se sentir
causa ou protagonista. Efectivamente, os teóricos da atribuição causal, como
Heider e Kelley explicam a busca de causalidade como necessidade de controlo
e de poder. Kelley (1971, p. 22) afirma que o objectivo da análise causal "é o
controlo efectivo".

235
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Ninguém nega a importância de que se revestem as expectativas (pessoais e
interpessoais) na psicologia da personalidade e na psicologia social, bem como
a importância do controlo ou das expectativas de controlo dos acontecimentos.
Os construtos que abordaremos referem-se especialmente às expectativas ou
crenças de controlo. O locus de controlo é definido precisamente como uma
crença, percepção ou expectativa de controlo do reforço. Por sua vez, as
atribuições causais surgem tomando por base crenças que permitem explicar e
controlar os acontecimentos da vida quotidiana.

Socialmente é mais valorizada a crença de controlo (internalidade) em termos


de sucesso, de saúde psicofísica ou de adaptação social. É a chamada norma de
internalidade que não provém apenas de um puro determinismo psicológico,
mas pode encontrar fundamento nas práticas educativas visando o controlo do
poder.

Assim sendo, é indiscutível a importância destes construtos, e não foi por


acaso que os psicólogos os têm estudado em profundidade. Estão em causa
conceitos de grande importância, como expectativas, controlo, reforço,
atribuições, e referem-se a fenómenos sociais importantes, além de tentarem
integrar, em grande parte, as correntes behaviouristas com as cognitivistas e da
aprendizagem social. Pode concordar-se, por isso, com Lefcourt (1984, pp.
385-387) que no Epílogo ao terceiro e último volume sobre o locus de
controlo diz tratar-se de um "construto provocador" de extremo valor
heurístico. O mesmo se diga para os outros construtos aqui estudados, em
particular as atribuições causais (cf. Barros, Barros, e Neto, 1993).

Neste capítulo abordaremos a questão do controlo, mais em particular o modo


como desenvolvemos ilusões de controlo, como uma crença no controlo afecta
o comportamento, como reagimos à perda de controlo nas nossas vidas.
Abordaremos seguidamente as atribuições e a norma de internalidade e, enfim,
levantaremos a questão se estamos perante níveis de análise distintos, se bem
que relacionados. Ao nível das aplicações abordaremos diferenças individuais
no estilo atribucional.

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2. A ilusão de controlo

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A crença de que podemos controlar o nosso destino é confortante. Talvez em
consequência disso as pessoas se enganem a si próprias muitas vezes pensando
que têm mais controlo do que efectivamente têm. Os antropólogos observaram
a função de um certo número de ritos enquanto controlo exercido sobre a
natureza. Assim em certas culturas as danças das chu vas são efectuadas com
tanta frequência que acabarão por ser seguidas do efeito desejado.

Henslin (1967) observou o comportamento dos jogadores de dados e ficou


surpreendido pelo facto de esses jogadores se comportarem como se
controlassem o resultado do lance: lançam o dado lentamente quando desejam
um número pequeno e lançam-no com energia quando querem obter um
número grande. Para além disso, crêem que a qualidade do seu jogo depende
do seu esforço de concentração e afirmam que a condição mais importante
para se jogar bem é estar seguro do lance. É por isso que o jogador anuncia
muitas vezes em voz alta os pontos que quer fazer. Os jogadores de dados
comportam-se pois como se pudessem condicionar o resultado.

Foi todavia Langer (1975) quem melhor ilustrou as manifestações desta ilusão
de controlo. Definiu-a como sendo a expectativa de uma possibilidade de
sucesso muito superior à probabilidade objectiva.

Langer (1977) pôde demonstrar a ilusão do controlo por meio de experiências


sobre o comportamento do jogador. Se as pessoas escolhiam elas próprias o
seu número da lotaria pediam quatro vezes mais caro pela venda do seu bilhete
do que se o número tinha sido determinado pelo experimentador. Se as
pessoas jogavam um jogo de sorte contra uma pessoa nervosa e desajeitada,
estavam muito mais dispostas a apostar que quando jogavam contra uma
pessoa segura. Comportamentos deste gênero levaram Langer a notar que as
pessoas se comportavam como se pudessem decidir do acaso.

A propensão em acreditar que os acontecimentos são controláveis é


aparentemente tão forte que bastarão alguns resultados positivos e rápidos
para provocar a ilusão de controlo. Num estudo, as pessoas deviam predizer
os resultados de 30 tiragens caras ou coroas (Langer e Roth, 1975). A
retroacção foi falseada de modo que certos participantes ganhassem quase
sempre nas 10 primeiras tiragens e os outros perdessem quase sempre ou
ganhassem e perdessem à sorte. Num conjunto de 30 lances, cada participante
obtinha sempre o mesmo resultado total, 15 vitórias e 15 derrotas. Os que
começaram com uma série bastante constante de vitórias efectuaram
avaliações exageradas do número de lances que tinham realmente previsto e do

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número de lances que poderiam prever se houvesse 100 tentativas. O sucesso
numa tarefa pode pois criar a ilusão de controlo. Isto mesmo foi confIrmado
por uma outra experiência (Zenker et al., 1982) que mostra que quando se
trata de predizer os resultados de lances de moedas, bem como
acontecimentos futuros, as pessoas que conhecem um sucesso inicial pensam
que têm jeito e esquecem, por conseguinte, os fracassos ulteriores que
poderão sofrer. Este processo revela a nossa tendência em pensar que os
acontecimentos são controláveis, de modo que quando encontramos sucesso
ou resultados positivos iniciais nalgum domínio, temos tendência a desenvolver
uma ilusão de controlo para avaliar os acontecimentos seguintes.

Resultados deste género não querem dizer que não temos nunca controlo das
situações e dos resultados. Todavia a nossa crença no controlo pode ser mais
ampla do que as fronteiras actuais do controlo.

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3. Locus de controlo

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111

i.

3.1. Popularidade e definição

Um dia, o próprio Jullian Rotter confidenciou ter ficado espantado com a


popularidade do seu construto, quase como quem atira ao chão um fósforo,
após ter acendido o cachimbo e, passado pouco, olha para trás e vê toda a
floresta a arder (in Weiner, 1980a, p. 237). Efectivamente a sua monografia,
publicada em 1966, é um dos textos mais importantes da psicologia moderna.
Esse texto foi o mais citado nas ciências sociais entre 1969 e 1977 (Strickland,
1989). E entre 1980 e 1990 o Psychological Abstracts refere mais de 4 000
artigos que tratam do locus de controlo.

Actualmente, contam-se aos milhares as publicações sobre esta dimensão


psicológica. Mesmo em Portugal, é bastante estudado este construto, nos
diversos domínios, particularmente a partir da segunda metade da década de
80 (Barros, 1986; Barros e Barros, 1990; Barros, Barros e Neto, 1989; Firmino
et aI., 1987; Lourenço, 1988; Neto, Barros e Barros, 1990; Relvas, 1983,
1985; Vaz Serra et al., 1987).

A grande atenção dos psicólogos (clínicos, educacionais e sociais) prestada a


este construto deve-se certamente, como reconhece o próprio Rotter (1975), à
importância das expectativas, do valor do reforço e da situação para a
interpretação do comportamento humano. Efectivamente, o locus de controlo
toca a complexidade da pessoa e do seu comportamento, dada a importância
das expectativas de controlo do reforço e do valor do mesmo reforço para o
comportamento, considerando sempre o contexto.

Rotter, considerado o pai deste construto, particularmente com a sua


monografia de 1966, onde teorizou sobre esta variável e apresentou a sua
escala, inicialmente não usava a expressão locus de controlo, mas controlo
interno-externo de reforço, considerando-o uma crença, uma percepção (usa
sobretudo o verbo 'perceber'), uma expectativa, ou ainda uma interpretação
(when the event is interpreted... Rotter, 1966, p. 1). Esporadicamente
denomina também esta variável de atitude (a generalized attitude, belief or
expectancy. .. (Rotter, 1966, p. 2).

Rotter (1966, p. 1), logo no início da sua monografia, descreve deste modo o
controlo interno e externo: "Quando o reforço é percebido pelo sujeito como
seguindo-se a alguma acção sua, mas não estando completamente dependente

© Universidade Aberta 243


dessa acção, então, na nossa cultura é tipicamente percebido como resultado
da sorte, do acaso, do destino ou sob o controlo de outros poderosos, ou
como imprevisível, dada a grande complexidade de forças que o rodeiam.
Quando o acontecimento é interpretado deste modo por um indivíduo,
designamos isto uma crença no controlo extemo. Se a pessoa percebe que o
acontecimento depende do seu próprio comportamento ou das suas
características relativamente permanentes, apelidamos isto de uma crença no
controlo intemo".

Rotter dá importância a esta definição, de tal modo que a cita literalmente no


artigo de 1975 (p. 57). O mesmo fizeram outros autores para tentar
compreender melhor o conceito de Rotter (cf. Palenzuela, 1988). Por
conseguinte, designa-se um indivíduo como "interno" quando ele tem a
percepção ou a crença de que controla a situação ou o reforço e por isso tende
a atribuir os resultados a si mesmo (o 'lugar' de controlo está dentro dele),
enquanto o "externo" sente que não controla os acontecimentos ou que os
resultados não são dependentes do seu comportamento, e por isso tende a
atribuí-los a causas alheias à sua própria vontade, como aos outros poderosos,
à sorte ou ao acaso (o "lugar" de controlo está fora dele).

Como diremos à frente, não se trata de tudo ou nada, mas simplesmente de


uma tendência maior ou menor para um dos pólos: Rotter (1982, p. 313)
afirma que "o controlo interno-externo se refere ao grau segundo o qual o
indivíduo crê que o que lhe acontece resulta do seu próprio comportamento ou
então é resultado da sorte, do acaso, do destiho ou de forças para além do seu
controlo".

Rotter (1966) compreendeu a importância de, juntamente com o construto


locus de controlo, ter um bom instrumento de avaliação. Por isso no mesmo
artigo monográfico onde teoriza sobre o novo conceito, apresenta também a
sua escala. Em artigos posteriores não deixou de se preocupar com esta
questão (Documento 3.1).

Rotter apresentou em 1966 a sua escala I-E com 29 itens (apenas 23 são contáveis,
sendo os outros 6 de despistamento). Para cada um dos itens o sujeito deve escolher
uma resposta entre duas alternativas que lhe são propostas (uma afirmação "interna"
e uma afirmação "externa") que mais cOlTesponde ao que pensa. Por exemplo.
escolher entre estas duas frases:

244 © Universidade Aberta


A. Quando um estudante está bem preparado, é raro haver um teste
i/!iusto.

B. Muitas ve;:es, as perguntas de um teste estilo tilo pouco relacionadas


com o conteúdo da disciplina que é inútil estudar.

o leitor terá visto na afirmação A. uma afirmação interna e na afirmação B. uma


afirmação externa.

A escala avalia a externalidade (score máximo: 23 pontos). Rotter encontrou nas


diversas amostras uma externalidade de 8 ou 9 pontos, manifestando-se nalgumas o
sexo feminino mais externo, mas noutras não. No seu artigo de 1975, Rotter já situa
a média de externalidade dos alunos dos cursos superiores entre 10 e 12, sinal de
uma subida da cxternalidade, que depois parece ter diminuído de novo.

A escala de Rotter inicialmente foi usada em quase todas as investigações sobre o


locus de controlo em adultos. Mas foi também criticada sob os mais diversos
aspectos, particularmente quanto à sua dimensionalidade e quanto à sua relação
com a desejabilidade social. Roller (1975) defende-se de algumas acusações e
procura esclarecer alguns problemas.

RotteI num arti\!o de 1990 volta a defender a sua escala de expectativas


generalizadas e o seu formato de escolha forçada com a intenção de evitar quanto
possível a desejabilidade social. Não foi levianamente que a escala apareceu, antes
se deve a "cinco anos de investigação e a cinco versões" antes de ser publicada (p.
492).

Existe uma adaptação portuguesa desta escala (Barros, Barros, e Neto, 1993).
Apesar de terem aparecido muitas outras escalas, após 1966, para avaliar o LOC,
para adultos, ou crianças, e ainda gerais (sobre numerosos aspectos da vida social)
ou específicas (medidas do LOC em relação com um só domínio, por exemplo,
professores) (cf. Barros, Barros, e Neto, 1993), a escala de Rotter ainda é o protótipo
das escalas de LOC.

Documento 3.1- A escala de Rotter

Os autores (v.g. Palenzuela, 1984, 1986) citam outros construtos mais ou


menos próximos do locus de controlo, procurando distingui-los, como
percepção de controlo, controlo pessoal, controlo real, necessidade ou desejo
de controlo, percepção de competência, poder/impotência, auto-estima, crença
num mundo justo, motivação intrínseca, crença meios-fins, resultados

245
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antecipados ou esperados, expectativa de reforço, automotivação, etc. Alguns
destes conceitos situam-se "para além do locus de controlo" (Palenzuela, 1986,
p. 12).

3.2 Diferenças comportamentais

Inúmeras investigações propuseram-se estabelecer as diferenças de


comportamento correspondendo a diferenças de crenças no controlo dos
reforços. Diferenças no locus de controlo estão relacionadas com o
comportamento em situações competitivas. Solicitações competitivas levam as
pessoas com uma orientação externa a desistir. Os internos excedem-se mais

que os externos quando está envolvida a competição, mas não diferem numa
situação de cooperação (Nowicki, 1982).

Dado que os internos se caracterizam por urna maior confiança neles próprios
que os externos, seria de esperar que fossem menos influenciados que os
externos. Urna das provas em apoio desta hipótese advém de se ter mostrado
que os internos se conformam menos facilmente que os externos com a opinião
de um grupo.

A primeira investigação que examinou a relação entre locus de controlo e


resistência à' influência foi efectuada por Odell (1959). Os externos mostraram
maiores tendências a conformarem-se.

Um segundo estudo que recorreu a urna técnica de conformidade tipo Asch


(1951 ) (cf. capítulo sobre influência social) foi conduzido por Crowne e
Liverant (1963). Os autores utilizaram duas tarefas de conformidade para
avaliar as capacidades dos sujeitos em se demarcarem da opinião maioritária de
um grupo. A tarefa comum a todos os sujeitos consistia em escolher, durante o
desenrolar de 20 ensaios sucessivos, qual era, entre dois conjuntos de pontos
apresentados muito rapidamente, o maior.

A situação era semelhante à de Asch, pois cada sujeito dava a sua resposta em
último lugar, após os "compadres" do experimentador terem respondido em
voz alta. Acontecia que a resposta destes "compadres" era unanimemente falsa,
o que colocava o sujeito perante um dilema: ou se conformava com as opiniões
expressas pelos outros membros do grupo, dando assim uma resposta que
sabia que era falsa, ou não tinha em conta a resposta dos parceiros e avançava

246
© Universidade Aberta
com uma resposta em consonância com o seu julgamento. Era pedido aos
sujeitos, após terem dado a sua resposta, para indicarem o que pensavam do
seu julgamento.

o segundo modo de apresentar esta tarefa consistia em pedir, sempre após


cada um dos julgamentos, para se efectuar apostas envolvendo somas de
dinheiro mais ou menos elevadas em função da confiança no seu julgamento.

Os resultados obtidos por meio do recurso a essas duas técnicas foram postos
em relação com o locus de controlo dos sujeitos avaliado pela escala de
Rotter. Com a primeira técnica não emergiu nenhuma diferença significativa.
Ao invés, com a segunda técnica, em que se introduziram somas de dinheiro,
verificou-se que os externos eram mais dependentes de julgamentos dos
parceiros do que os internos. Este estudo denota que, quando as paradas de
êxito se revestem de algum valor para o indivíduo, os internos acreditam mais
nos seus próprios julgamentos que os externos.

Se em geral se tem encontrado que os externos são mais conformistas, o


trabalho de Spector (1982) acrescenta uma precisão a esses resultados, tendo
em conta a distinção entre conformidade normativa, isto é, a que cOlTesponde
ao desejo de não cortar com os outros, estudada anteriormente, e
conformidade informativa, isto é, a que denota a necessidade de responder
com a maior cert.eza possível tendo em conta as respostas dos outros como
informações. Os resultados indicaram que os externos se diferenciavam dos
internos relativamente à conformidade normativa. Relativamente à
conformidade informativa os dois grupos não se diferenciavam.

Nas suas interacções sociais, os internos tomam medidas para controlar o


resultado. Por exemplo, alunas universitárias de tendência interna utilizavam
mais cosméticos que as externas (Cash, Rissi, e Chapman, 1985). Mesmo nas
relações sexuais, a internalidade está associada nos dois sexos com interacções
mais frequentes e satisfatórias com o sexo oposto (Catania, McDermott, e
Wood, 1984).

Ainda no domínio das relações interpessoais refiram-se as diferenças entre


internos e externos nos comportamentos de ajuda e nas condutas de liderança.
Os internos prestam mais ajuda às pessoas que delas precisam que os externos.
Por exemplo, num estudo de Midlarsky (1971) cada sujeito trabalhava numa
tarefa perante um "compadre". Era-lhe explicado que se alguém acabasse o seu
trabalho antes, poderia ajudar o seu parceiro. Cada sucesso tinha como sanção

247
© Universidade Aberta
uma descarga eléctrica. Assim, o sujeito tinha conhecimento que se expunha a
receber descargas quando ia a ajudar o parceiro. Apesar disso, verificou-se que
os internos ajudam mais frequentemente o seu parceiro que os externos.

As investigações relativamente à relação entre internalidade e liderança


apontam no sentido de os internos se sentirem mais à vontade no papel de
chefe que os externos. Por exemplo, Johnson et aI. (1984) analisaram os
comportamentos dos chefes e as percepções dos subordinados. Os resultados
puseram em evidência que os chefes internos evocavam recorrer mais à
persuasão que os externos. Por seu lado, os subordinados expressavam maior
satisfação em relação aos chefes internos que em relação aos chefes externos.

Em contexto laboral seria de esperar que o aumento de salário agisse como um


incentivo para se trabalhar mais e se estar mais satisfeito com o trabalho. Tal
não é totalmente verdade, e o locus de controlo é um dos factores que
complica essa relação. Earn (1982) colocou estudantes universitários perante
uma situação experimental em que se lhes pedia para resolverem uma série de
problemas simples. A alguns não se pagava nada pela tarefa, alguns recebiam
dois dólares e meio e os restantes recebiam cinco dólares. Quando depois se
lhes pediu para avaliarem até que ponto tinham gostado do trabalho, os
internos e os externos reponderam de modo muito diferente. Quanto maiores
os salários, melhor os estudantes orientados internamente avaliaram a tarefa,
mas o inverso aconteceu com os externos. Para além disso, o tempo gasto a
trabalhar quando o experimentador estava fora da sala aumentava para os
externos com o nível do salário. O autor sugere que os internos interpretam as
recompensas como denotando o seu grau de competência. Ao invés, os
externos vêem as recompensas como uma indicação de que a tarefa deve ser
desagradável. Em contextos laborais é avançada a hipótese de que os internos
trabalham mais e estão mais satisfeitos com o trabalho.

Um estudo de Dailey (1978) relaciona o locus de controlo com as


características da tarefa e as atitudes no trabalho. Em geral, os internos
envolvem-se mais no trabalho e sentem-se mais satisfeitos e motivados.
Q'Brien (1984) analisa a relação entre o locus de controlo, o trabalho e a
reforma. Embora muitos estudos não provem a relação entre o locus de
controlo e alguns aspectos relevantes no mundo do trabalho, esta variável dá o
seu contributo para prever o comportamento do sujeito no meio laboral.

Cummins (1989) analisa o papel do suporte social e do locus de controlo como


determinantes da satisfação ou da insatisfação (stress) no trabalho. Q tipo de

248
© Universidade Aberta
suporte ou desintegração social estava associado com a satisfação no trabalho,
dependendo também da percepção de controlo do reforço. As diferentes
dimensões de locus de controlo (internalidade, externalidade devido à sorte,
externalidade devido ao poder dos outros) produzem igualmente efeitos
diferentes na satisfação no trabalho, independentemente do nível de suporte
social.

Foi igualmente demonstrada a capacidade dos internos em prestarem atenção à


informação do meio em situações da vida -real. Estes são muito mais levados a
reagir a informações de índole médica para uma mudança dos seus hábitos de
vida que os externos. Os resultados de dois estudos indicam que há mais
internos nos não fumadores que nos fumadores (Straits e Sechrest, 1963;
Jones, Woodruff e Werner, 1965). Entre os sujeitos que tinham deixado de
fumar no seguimento de um relatório médico sobre os perigos do tabaco, havia
mais internos que externos. Além disso, os internos têm mais em conta os
avisos dados relativos à aproximação de uma catástrofe natural e iminente,
como um ciclone, e vão procurar abrigo (Sims e Baumrann, 1972). Tal parece
indicar que os internos levam uma vida mais sadia e mais segura que os
externos. Mesmo quando estão doentes ou feridos, parecem sair-se melhor. O
indivíduo que assume uma parte da responsabilidade de um acidente grave de
que foi vítima conhece uma cura mais rápida e completa. Houve até quem
emitisse a hipótese de que há uma relação entre uma orientação interna e a
capacidade de cura do cancro (Holden, 1978).

Escovar (1977, p. 374) caracteriza a psicologia comunitária como uma


psicologia para o desenvolvimento que, segundo esse autor, "é o processo pelo
qual o homem adquire mais controlo sobre o seu ambiente". Para ele, as
transformações comunitárias devem começar peja transformação das pessoas,
sentindo-se mais responsáveis pelo seu destino e mais confiantes na mudança.

Escovar (1980) avança um modelo psicossocial do desenvolvimento. Neste


modelo é salientada a necessidade de se romper o círculo vicioso em que as
atitudes das populações carecidas conduzem a atitudes e comportamentos que,
por sua vez, retro-alimentam essas mesmas características. Entre os factores
que contribuem para o status quo, o autor refere a característica da
externalidade. Assim, a sorte, o azar, a vontade divina, o destino, os outros
poderosos, etc. são considerados por estas pessoas como responsáveis pelos
seus destinos. Este tipo de pessoas encontra-se com frequência entre as
comunidades mais desfavorecidas.

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© Universidade Aberta
Ao invés, um dos factores que visa o desenvolvimento da comunidade é o
desenvolvimento da crença de que as pessoas podem interferir nos seus
destinos, o que caracteriza as pessoas consideradas internas. Ora, segundo
Escovar, uma das preocupações do agente comunitário é o de facilitar o
aumento da característica de internalidade nos membros das comunidades. A
sua consecução fará com que a comunidade se sinta mais confiante em
empreender tranformações que se tornem benéficas. Estarão menos
dependentes da ajuda dos outros e serão capazes de ter uma maior influência
no seu destino.

Este modelo de Escovar, segundo Rodrigues (1981), tem sido, na sua


integridade ou com variações, reconhecido como válido na descrição das
comunidades carecidas na América Latina.

Em suma, os resultados referidos são suficientes para ilustrar que os internos


usufruem de uma melhor representação que os externos. Quando se é interno
é-se mais bem sucedido e adaptado social e emocionalmente do que quando se
é externo. O estudo da distribuição social de crenças de controlo mostra que as
explicações internas são mais expressas nos grupos sociais favorecidos.

3.3 Investigação intercultural

O construto locus de controlo tem suscitado também um volumoso trabalho


no âmbito da investigação intercultural. Não se visa aqui apresentar uma
revisão exaustiva dessa literatura, mas somente delinear um breve apanhado
dos principais achados no domínio intercultural.

Agruparemos os estudos interculturais do locus de controlo em duas rubricas:


uma referente a estudos comparativos interculturais de grupos de
nacionalidades diferentes e outra referente a estudos de grupos étnicos
minoritários no seio da mesma nação. O estudo de diferenças em grupos
nacionais e étnicos são, segundo Phares (1976), particularmente importantes,
não só porque podem mediar diferenças grupais em certas espécies de
comportamento, mas também por causa das suas implicações em relação aos
antecedentes das crenças de internalidade.

250
© Universidade Aberta
3.3.1 Comparações nacionais

Tendo em conta as grandes semelhanças culturais entre países anglo-saxónicos


não seria de esperar encontrar grandes diferenças no locus de controlo entre
esses países. Por exemplo, McGinnies, Nordholm, Ward, e Bhanthumnavin
(1974) não encontraram diferenças de I-E em estudantes da Austrália, Estados
Unidos e Nova Zelândia. Também Cole et.a1. (1978) não encontraram
diferenças entre estudantes dos Estados Unidos e da Irlanda.

Também as diferenças entre países europeus e entre a Europa e os Estados


Unidos tendem a ser pequenas (Dyal, 1984). Pelo contrário, há diferenças
consistentes entre americanos e asiáticos, obtendo os japoneses, em particular,
um score alto em externaI idade. Segundo Bond e Tornatzky (1973) os
estudantes universitários japoneses eram mais externos que os dos Estados
Unidos, recorrendo à escala I-E de Rotter. Mahler (1974) pôde confirmar
esses resultados por meio do recurso à escala de Levenson, mostrando-se os
japoneses mais externos que os americanos nas três dimensões. McGinnies et
a1. (1974) encontraram que os estudantes japoneses eram mais externos que os
da Austrália. dos Estados Unidos e da Nova Zelândia. Do mesmo modo, num
estudo em oito países (Japão, Estados Unidos, Canada, Alemanha Ocidental,
Itália, França, Israel e Índia) de Parson e Schneider (1974) verificou-se que os
japoneses eram mais externos.

Uma ideia que também tem sido evidenciada é a de que as pessoas das nações
industrializadas são mais internas que as dos países em vias de
desenvolvimento. Reitz e Groff (1974) testaram hipóteses específicas relativas
à comparação de países industrialmente desenvolvidos e de países em
desenvolvimento no Oriente (Japão e Tailândia) e no Ocidente (Estados
Unidos e México). Foi emitida a hipótese de que os trabalhadores de
economias em desenvolvimento seriam mais externos do que os de economias
desenvolvidas na dimensão "Liderança-Sucesso". Esta hipótese pode ser
confirmada em países orientais e ocidentais. Os trabalhadores mexicanos
revelaram-se mais externos que os trabalhadores dos Estados Unidos e os
trabalhadores tailandeses eram mais externos que os japoneses. Foi também
emitida a hipótese de que na dimensão "Respeito" não haveria diferenças entre
os países orientais ou entre os países ocidentais, mas que os países orientais
seriam mais externos que os países ocidentais. Estas hipóteses foram
confirmadas. Na dimensão "Sorte", contrariamente ao que se esperava, os
trabalhadores dos países em desenvolvimento eram significativamente menos

251
© Universidade Aberta
externos que os dos países desenvolvidos. Os resultados contradizem, em
particular, o estereótipo de que os mexicanos seriam mais fatalistas do que os
estadudinenses.

3.3.2 Comparações com grupos étnicos e minoritários


São assaz numerosas as investigações em que se estudam grupos minoritários,
sobretudo nos Estados Unidos. Apesar da heterogeneidade destes estudos,
parece que a linha mestra nestas investigações aponta para uma maior
externalidade dos grupos minoritários.

A primeira investigação em que se comparam negros e brancos americanos é


a de Battle e Rotter (1963) que confror:J.taram as respostas de crianças negras e
brancas com 9 e 11 anos (controlando o sexo e a classe social) em duas provas
de locus de controlo. A primeira prova utilizada foi o questionário de Bialer
(1961) e a outra era uma prova projectiva. Resultados dos dois instrumentos
puseram em evidência uma interacção entre a raça e a classe social, sendo as
crianças negras da classe social mais baixa as mais externas. Lefcourt e Ladwig
(1966) efectuaram um estudo com prisioneiros adultos relativamente
homogéneos quanto à classe social; os negros eram mais externos que os
brancos.

A grande maioria dos estudos posteriores, quer com crianças quer com
adultos, tendem a apoiar a generalização de que os negros americanos são
mais externos que os brancos americanos. Por exemplo, Dyal (1984)
encontrou confirmação dessa hipótese em 13 dos 18 estudos revistos.

O quadro global que emerge a partir de estudos efectuados com americanos de


origem hispânica (espanhóis, porto-riquenhos, mexicanos) é mais confuso.
Entre os 14 estudos revistos por Dyal, só em 6 aparecem diferenças
significativas no sentido de uma maior externaI idade dos grupos minoritários.
Noutro estudo (Garza e Ames, 1974), os resultados são opostos, pois
estudantes mexicanos revelaram, na escala de Rotter, maior internaIidade que
os seus homólogos americanos; foi controlado o sexo e o nível sócio-
económico.

A inconsistência dos resultados não pode levar-nos a concluir que, ao invés


dos negros, os americanos de origem hispânica não se diferenciam dos
ameri,canos anglo-saxónicos. Entre as explicações alternativas para a falta de

252 © Universidade Aberta


consistência nos resultados é de referir o nível sócio-económico, a idade e o
nível de instrução.

As investigações com americanos de origem asiática (sobretudo chineses) são


menos abundantes que as efectuadas com populações negras e hispânicas. Os
resultados com pessoas de origem asiática confirmam geralmente o que se
encontrou com negros, isto é, são mais externos que os homólogos americanos
de origem anglo-saxónica. Por exemplo, Hsieh, Shybut e Lotsof (1969)
compararam adolescentes chineses de Hong Kong com americanos de origem
chinesa e anglo-saxónica, concluindo que os americanos de origem chinesa
eram significativamente mais externos que os americanos de origem anglo-
saxánica e menos externos que os chineses de Hong Kong. Coleman et al.
(1966) obtiveram resultados semelhantes, tendendo os americanos de origem
oriental a ser mais externos que os brancos americanos. Segundo Christy
(1977) as mulheres americanas de origem chinesa eram mais externas que as
chinesas de Hong Kong.

Foram também efectuadas investigações com autóctones americanos. Todavia


os estudos com tribos índias não se mostraram totalmente consistentes. Se em
alguns estudos as pessoas de ascendência índia são mais externas que as
americanas anglo-saxónicas (Tyler e Holsinger, 1975; Echohawk e Parsons,
1977), noutros não há diferenças (Jessor et aI., 1968).

São também de referir investigações em que se comparou o locus de controlo


de pessoas que emigraram recentemente ou de residentes temporários, com
pessoas da mesma cultura que ficaram no país de origem ou da sociedade
receptora. Wolgang (1973) comparou adolescentes que haviam chegado há
pouco ao Canadá com adolescentes residindo na Itália e com adolescentes
nascidos no Canadá de pais italianos. controlando a idade, o sexo e o nível
sócio-económico. Como seria de esperar, encontrou que os adolescentes que
tinham imigrado recentemente eram mais externos. Já Dyal (1978) comparou
crianças canadianas com filhos de imigrantes Portugueses e não encontrou
diferenças étnicas associadas com a responsabilidade pelo sucesso e pelo
fracasso.

Se passarmos a estudos com residentes temporários, Chan (1981), por


exemplo, verificou que estudantes universitários chineses a estudar no Canadá
eram mais externos que estudantes canadianos. Por seu lado, Mahler (1974)
não encontrou diferenças entre estudantes americanos no Japão e estudantes
americanos nos Estados Unidos.

© Universidade Aberta 253


Os estudos com imigrantes e minorias são típicos de muita da investigação
com o construto locus de controlo, isto é, os seus resultados nem sempre são
consistentes e por vezes são contraditórios. Apesar disso, os resultados
tendem geralmente a confirmar a hipótese de uma ligação entre expectativas
generalizadas de controlo de reforço e a existência de reforços sociais
valorizados no mundo real. Neste género de estudos, para se poderem fazer
inferências válidas sobre a influência de uma variável como a etnicidade, nem
sempre outras variáveis como idade, sexo, instrução e nível sócio-económico
foram controladas, o que poderá contribuir para uma certa incongruência dos
resultados. Sabe-se, por exemplo, que os grupos favorecidos do ponto de vista
sócio-económico são mais internos.

Os estudos referidos são suficientes para ilustrar que o locus de controlo é um


construto interessante e complexo em psicologia intercultural, dado que os
resultados obtidos com escalas que o avaliam dependem de condições
específicas do meio.

3.4 Desejo de controlo

Jerry Burger e seus colegas (l992a, 1992b) distinguem entre locus de controlo
e desejo de controlo. Enquanto que o locus de controlo se refere a quanto
controlo pessoal as pessoas percepcionam ter, o desejo de controlo refiecte
quanto controlo pessoal as pessoas preferem ter. Os dois não são a mesma
coisa e são possíveis diferentes combinações de cada um. Por exemplo, alguém
pode preferir ter um alto grau de controlo sobre os acontecimentos da sua
vida, mas acredita que actualmente tem muito pouco.

As pessoas que querem sentir-se com controlo são mais susceptíveis de


controlar uma conversa, de se envolverem em actividades da comunidade e
menos conformistas às pressões normativas. As pessoas com alto desejo de
controlo são também mais susceptíveis de sobressaírem na realização de
tarefas como, por exemplo, obter boas notas na Universidade. Burger (l992b)
sugere quatro razões para a tendência das pessoas altas no desejo de controlo,
sobressaírem. Em primeiro lugar, têm objectivos mais elevados para elas
próprias e ajustam os seus objectivos de modo apropriado após a comunicação
do seu resultado. Em segundo lugar, fazem um esforço extra em ocasiões
apropriadas. Em terceiro lugar, persistem mais tempo em tarefas difíceis. E em

254 © Universidade Aberta


quarto lugar, dado que os SUjeItos com alto desejo de controlo tendem a
assumir os seus sucessos e a atribuir os seus fracassos à sorte, são mais
susceptíveis de fazer mais esforço nas tarefas subsequentes.

Locus de controlo e desejo de controlo são diferenças individuais no modo


como vemos as nossas relações com as situações. Afectam o comportamento
em contextos diferentes (Rodin e Salovery, 1989).

iI

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4. Reacções à perda de controlo

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I I

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Muito embora possa ser gratificante acreditar que se tem controlo sobre os
acontecimentos, nem sempre se pode ter esse controlo. Por exemplo, os
portugueses que viveram a repressão do Estado Novo podiam sentir que
tinham pouco controlo das suas actividades quotidianas, das suas conversas
mesmo com amigos. A doença também pode suscitar sentimentos de ausência
de controlo. Como reagem as pessoas perante as percepções da falta de
controlo?

4.1 Teoria da reactância

A teoria da reactância psicológica explica algumas das nossas reacções à perca


de controlo ou de liberdade de escolha (Brehm, 1966; Brehm e Brehm, 198 I).
A reactância psicológica é uma motivação para restaurar liberdades
comportamentais ameaçadas. Segundo esta teoria, a reactância é activada
quando a liberdade de uma pessoa para se comprometer com algum
comportamento é ameaçada. Por exemplo, se um pai diz a uma criança que
não pode brincar com um(a) amigo(a), a criança pode valorizar jogar com
esse(a) amigo(a) mais do que antes do comportamento ter sido proibido.

Imagine que alguém oCa) interpela na rua pedindo-lhe para assinar uma petição
em favor de uma causa com que sintoniza. Enquanto está a ler a petição, é-lhe
dito que alguém pensa que não se devia permitir às pessoas assinar petições
deste género. A teoria da reactância prediz que tentativas do género para
limitar a liberdade das pessoas deveriam aumentar a probabilidade de
assinarem. Foi o que aconteceu nas ruas de Nova York (Heilman, 1976).

A censura constitui um exemplo de aplicação da reactância. Por exemplo,


encontrou-se que a censura de uma mensagem levou um público potencial a
mudar as suas atitudes no sentido da posição defendida pela comunicação e
desenvolveu um maior desejo de ouvir a comunicação (Worchel, Arnold, e
Baker, 1975).

4.2 Desânimo aprendido

Talvez o resultado mais negativo de experiências repetidas de falta de controlo


seja o desânimo aprendido, que foi definido por Seligman (1975) como sendo
uma crença que os resultados de uma pessoa são independentes das suas

259
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acções. A primeira investigação sobre esta problemática foi efectuada com
animais. Por exemplo, um estudo demonstrou que cães que recebiam uma
série de choques eléctricos sobre os quais não tinham controlo, mais tarde
fracassavam em escapar de outros choques atravessando um obstáculo para
um compartimento em que não eram administrados choques. Os cães que não
tinham recebido choques incontroláveis aprendiam rapidamente a evitar os
choques ulteriores (Seligman e Maier, 1967). Seligman sugeriu três espécies
de défices em resultado de experiências com resultados incontroláveis. Em
primeiro lugar há um défice motivacional, pelo que o animal não tenta
aprender novos comportamentos. Em segundo lugar, há um défice cognitivo,
pois a aprendizagem não se efectua. Há, enfim, um défice emocional,
tornando-se o animal deprimido porque os resultados são incontroláveis.

o desânimo aprendido pode ser uma resposta para as pessoas que sentem que não têm
controlo das situações

O desânimo aprendido observado nos animais é também. uma resposta


humana. Por exemplo, há investigações que mostram que o facto de se
percepcionar como tendo controlo no âmbito da escola está positivamente

260
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i'.

associado aos resultados escolares obtidos (Schultz e Hanusa, 1979), à eficácia


da aprendizagem (Savage, Perlmutter e Monty, 1979) e à rapidez na resolução
de problemas (Brown, 1979). A noção de desânimo aprendido tem também
sido evocada para explicar as reacções a uma ampla variedade de agentes de
stress, tais como ruído (Cohen, Evans, Stokols, e Krantz, 1986), desemprego
(Baum, Flemming. e Redley, 1986), sobrepovoamento (Rodin, 1976) e
desastres tecnológicos (Baum, Fleming, e Davidson, 1983).

Para Seligman (] 975), a depressão é uma forma de desânimo aprendido em


virtude de se experienciar resultados incontroláveis. Esta perspectiva da
depressão gerou muita investigação e também muita crítica (Wortman e
Brehm, 1975). Como resposta foi desenvolvido o modelo reformulado do
desânimo aprendido (Abramson, Seligman, e Teasdale, 1978; Peterson e
Seligman, 1984). O modelo reformulado postula que a percepção de falta de
controlo numa situação não é suficiente para produzir desânimo numa
situação diferente. O novo modelo está baseado em conceitos da teoria da
atribuição, pois o que importa são as atribuições da pessoa ao que causou a
falta inicial de controlo. Nos modelos contemporâneos da teoria da atribuição
são postuladas três dimensões ao longo das quais são feitas atribuições. A
primeira dimensão, interna versus extenza, refere-se a se as causas dos
acontecimentos são atribuídas a aspectos da pessoa em oposição aos da
situação. A segunda dimensão, estável versus instável, refere-se a se se espera
que as causas persistam ou fluctuem no tempo. Finalmente, a terceira
dimensão, global versus espec(fica, refere-se a se a atribuição tem implicações
difundidas ou circunscritas.

Segundo a formulação deste modelo, a gravidade dos défices de desânimo é


maior quando a falta de controlo é atribuída a factores internos, estáveis e
globais (Abramson et a!., 1978). Por exemplo, uma pessoa sentirá maior
desânimo quando atribuir o fracasso na realização a causas internas (por
exemplo. capacidade mais do que a dificuldade da tarefa), causas estáveis
(traço de personalidade mais que ao esforço), e causas globais (inteligência
geral mais do que a capacidades numa tarefa específica). Este padrão de
atribuições a acontecimentos negativos produz depressão. Segundo Metalsky
et a!. (1982), estudantes que estavam inicialmente enviesados fazendo essas
atribuições mostraram maiores saltos para o afecto depressivo após a obtenção
de notas mais baixas que os estudantes que normalmente fizeram atribuições
externas ou menos globais. Por isso, a experiência do desânimo aprendido nos
seres humanos parece depender de um padrão complicado de explicações.

261
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4.3 Dependência auto-induzida

Um sentimento de perda de controlo pode ser suscitado por outros factores,


para além de resultados incontroláveis que inicialmente engendram o desânimo
aprendido. Uma ilusão de incompetência pode ser criada por um certo número
de situações (Langer, 1978). Por exemplo, as outras pessoas podem sugerir
directamente que alguém é incompetente e essa crença pode ser interiorizada
pela pessoa. Assim, num estudo em que os alunos tinham oportunidade de
realizar um conjunto de problemas para encontrar palavras, experienciavam
sucesso na tarefa (Langer e Benevento, 1978). Numa segunda fase, cada aluno
trabalhava numa equipa com outro aluno (um compadre do experimentador)
de um modo pré-determinado. Ao aluno foi-lhe dado o papel de assistente e ao
compadre o papel de chefe; após haver trabalhado numa segunda tarefa neste
papel de assistente, os sujeitos participaram na terceira fase da experiência em
que lhes era de novo permitido trabalhar individualmente na tarefa de
encontrar palavras efectuada durante a primeira fase. A realização deste aluno
diminuiu cerca de 50%, após haver experienciado um papel dependente. Ao
invés, os alunos que não participaram no papel de assistente pouco alteraram o
seu nível de realização.

Se houve um efeito tão forte sobre a realização após haver passado por uma
breve experiência no papel de assistente, que dizer de grupos sociais que são
colocados com frequência no papel de dependentes? Pense-se no caso da
terceira idade. O facto de se ser rotulado de dependente, pode contribuir para
criar a dependência.

262
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5. Atribuições

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o tema da atribuição é um dos domínios mais importantes da investigação
na psicologia social nas duas últimas décadas.' Efectivamente, a partir dos
anos 70, os trabalhos suscitados pela atribuição vão ter uma expressão
notória. Segundo Ostrom (1981, p. 405) "do mesmo modo que a dinâmica
dos grupos foi a pre.ocupação dominante da Psicologia Social nos anos 50,
as atitudes nos anos 60, a investigação. sobre a teoria da atribuição foi a
preocupação empírica dominante dos anos 70". Numa recensão dos
trabalhos a propósito da atribuição nos anos 70, Kelley e Michela (1980),
sem a pretensão da exaustividade, contabilizaram 900 referências.
A sua importância transparece, não só pela quantidade de trabalhos
suscitados, como também pelas discussões proporcionadas. Tal
importância advém do facto de a atribuição nos ajudar a predizer e de certo
modo a controlar a nossa experiência social. Uma vez que acreditamos que
compreendemos as causas do comportamento, reagiremos com certos
pensamentos, sentimentos e respostas. Enfim, as atribuições acerca de
acontecimentos passados influenciam as nossas expectativas de futuro.

Têm emergido várias tendências na recente investigação sobre atribuição.


Em primeiro lugar, houve uma mudança de interesse na testagem dos
primeiros modelos para a resposta a questões básicas, tais como o que é
que motiva a procura de causas (Weiner, 1985b). Em segundo lugar, tem
aumentado o interesse pelo estudo das diferençás individuais na atribuição,
tendo-se desenvolvido escalas para medir construtos. Em terceiro lugar, a
teoria da atribuição tem-se aplicado a um vasto leque de áreas dentro da
psicologia, como por exemplo, educação, intervenções terapêuticas,
relações íntimas, questões sociais.

Nesta parte do capítulo examinaremos o que é a atribuição e as quatro


teorias principais da atribuição, com base na sua cronologia, apesar de ter
havido outros desenvolvimentos significativos neste domínio.
Efectivamente, a situação actual no domínio da atribuição é a diversidade e
multiplicidade de teorias de curto alcance. Apesar de tal dispersão, existem
quatro princípios gerais que são habitualmente aceites (Harvey e Weary
1984):
a) A atribuição de causalidade é uma actividade com ampla difusão

na vida quotidiana;

b) as atribuições podem não ser exactas, mas sujeitas a erros;

c) as pessoas comportam-se em função de como percepcionam e

interpretam os factos;

d) a actividade atribucional desempenha uma função adaptativa.

265
© Universidade Aberta
Em seguida, ilustraremos algumas das aplicações da teoria da atribuição,
abordaremos alguns erros de atribuição e faremos referência a trabalhos
que indicam a pertinência de uma análise das atribuições em termos de
relações entre grupos. Enfim, procurar-se-á saber se os modelos de
atribuição funcionam quando aplicados a outras culturas.

5.1 O que é uma atribuição?

5. 1. 1 Definiçlio

Uma atribuição é uma inferência que pretende explicar porque é que um


determinado acontecimento ocorreu ou que tenta determinar as disposições
de uma pessoa (Harvey e Weary, 1981). A questão do porquê que nos
colocamos tanto pode ser sobre os nossos próprios comportamentos como
sobre os dos outros. A explicação que se avança torna-se então a causa
percepcionada de um acontecimento ou de um comportamento
cOlTespondendo a uma atribuição. Convém realçar que uma atribuição
representa uma causa percepcionada que pode não estar certa.

Uma estudante pode interrogar-se porque é que reprovou no último exame


de Psicologia Social. As atribuições emitidas por esta estudante terão um
efeito decisivo sobre os seus comportamentos futuros. Se a estudante crê
que o seu fracasso se deve à falta de capacidade, pode abandonar a
matéria; se, pelo contrário, atribui o seu fracasso à pouca sorte, poderá
continuar as aulas esperando ter mais sorte da próxima vez. As atribuições
desempenham, pois, um papel importante no comportamento social.

5.1.2 Tipos de atribuições

Podem-se reagrupar as atribuições entitidas em três tipos principais:


atribuições causais, atribuições disposicionais e atribuições de
responsabilidade.

As atribuições causais são efectuadas a propósito de causas de um


acontecimento. Por exemplo, as causas utilizadas para explicar um sucesso

266
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ou um fracasso (Weiner, 1986) ou para explicar uma falta de controlo
sobre um acontecimento (Abramson, Seligman e Teasdale, 1978)
constituem atribuições causais.

Mediante as ati"ibuições disposicionais procura-se determinar em que


medida a acção que uma pessoa acaba de se realizar permite inferir
características sobre ela. Dado que as características da pessoa permitem
explicar o comportamento, possui-se então uma atribuição para a acção
bem como inferências sobre a personalidade efectiva da pessoa.

As atribuições de responsabilidade são mais difíceis de apreender pois


podem ter pelo menos três significações diferentes: a responsabilidade
relativa a um efeito produzido, a responsabilidade legal (pode-se cometer
um delito sem se ser responsável, como no caso de autodefesa ou de
loucura) e a responsabilidade moral (Shaver, 1975). As investigações sobre
auto-censura (Janoff-Bulman, 1979), isto é, quando a pessoa se julga
culpada do que acaba de acontecer, inscrevem-se nas atribuições de
responsabilidade moral.

5.1.3 Avaliação das atribuições

o método mais comum de medida das atribuições refere-se à avaliação das


atribuições causais específicas. Entre os processos mais frequentemente
utilizados para avaliar as atribuições causais relativas a acontecimentos
específicos, contam-se os seguintes: I) questionários de resposta aberta ou
não estruturada, onde os sujeitos referem porque é que obtiveram sucesso
ou insucesso numa dada tarefa; 2) medidas de percentagem das causas, em
que os indivíduos indicam a contribuição de cada causa para o resultado
obtido (o somatório das avaliações de percentagem deve ser igual a
100%); 3) escalas Likert para um conjunto de causas independentes, onde
os sujeitos indicam o grau de importância de cada uma delas como
determinantes de um dado acontecimento.

Duas outras técnicas têm sido também utilizadas. Numa delas, pede-se aos
sujeitos que indiquem a principal causa responsável pelo resultado; na
outra, os sujeitos avaliam um determinado número de pares de causas,
indicando em cada par, aquela que mais terá contribuído para o resultado.

Hoje em dia são sobretudo as dimensões causais subjacentes às atribuições


que se utilizam na investigação. Assim, os investigadores não medem
directamente as atribuições, mas antes as dimensões causais que descrevem

267
© Universidade Aberta
a atribuição em questão. Com este intuito, Russel (1982) desenvolveu a
Escala de Dimensões Causais (COS). A Escala de Dimensões Causais
compõe-se de oito situações hipotéticas de realização a que os sujeitos
respondem indicando as causas responsáveis pelo sucesso e insucesso,
avaliando, em seguida, cada uma dessas causas em 9 escalas semânticas
diferenciais (com formato Likert em 9 pontos). A Escala possui três itens
para cada dimensão causal (locus de causalidade, estabilidade e
controlabilidade).

As atribuições disposicionais e de responsabilidade são igualmente medidas


por meio de questionários e pela codificação dos conteúdos. Como já se
disse, as atribuições disposicionais procuram determinar se as
características da pessoa cOlTespondem à acção que acaba de se realizar.
Pedir-se-á, pois, ao sujeito para julgar a personalidade real do indivíduo
avaliando-o por meio de uma série de traços que o podem caracterizar.
Finalmente, as questões relativas às atribuições de responsabilidade são
mais directas (e.g., "Até que ponto pensa que o seu vizinho é responsável
pelos estragos havidos no seu apartamento 7") e implicam a noção de
censura (Shaver, 1975).

5.2 Teorias

Uma teoria da atribuição analisa o modo como nos julgamos a nós mesmos
e aos outros. Dada a complexidade do processo de atribuição, não é de
admirar que existam diversas teorias. Abordaremos as primeiras reflexões
de Heider sobre a atribuição e três modelos teóricos propostos a partir das
ideias desse autor: o modelo das "inferências correspondentes" de Jones e
Davis, o da covariação de Kelley e o da atribuição de sucesso e de fracasso
de Weiner. Não é desprovido de importância notar que cada uma das
teorias que apresentaremos não oferecem uma explicação diferente do
comportamento, mas oferecem uma explicação consoante a informação
disponível e o tipo de explicação em que se está interessado.

5.2.1 Causalidade e psicologia ingénua

A primeira formulação da teoria da atribuição foi efectuada por Heider


(1958), cuja monografia constitui a Bíblia dos investigadores neste campo.
Relembre-se que Heider é um psicólogo europeu, amplamente influenciado
pela psicologia da forma, e que se exilou nos Estados Unidos antes da

268
© Universidade Aberta
última guerra mundial. Heider sentiu que a maior parte dos indivíduos são
psicólogos "ingénuos" que tentam compreender os outros de forma a
tornarem o mundo mais previsível. Na sua famosa obra de 1958, Heider
lança os alicerces de uma nova problemática para a psicologia cognitiva,
fazendo uma descrição do processo pelo qual os indivíduos fazem
atribuições ao seu meio, atribuições de causas, de disposições, de
propriedades.

Para explicar um acontecimento, podem ser invocados dois conjuntos de


condições: causas internas e causas externas. As causas internas são
factores no interior da pessoa (por exemplo, o esforço, a capacidade e a
intenção), enquanto que os factores externos se situam no exterior da
pessoa (por exemplo, a dificuldade da tarefa e a sorte). Por exemplo, um
professor pode-se perguntar se a fraca realização de um aluno é devida a
uma falta de motivação e de capacidades (uma "atribuição disposicional")
ou a circunstâncias físicas e sociais, tais como uma alimentação deficiente e
dificuldades familiares (uma "atribuição à situação").

Quando alguém observa uma acção A de um sujeito, vai imputá-la a


factores internos a esse sujeito (FI) e/ou a factores do meio (FM), donde a
equação A=f(FI, FM). Tal faz-nos relembrar a equação estabelecida por
Lewin em que o comportamento (C) é função da personalidade do sujeito
(P) e do meio (M), isto é C=f(P,M). Estas duas equações apresentam
todavia uma diferença. Se Lewin procurava projectar luz sobre as causas
do comportamento, Heider tenta explicar a percepção das causas de uma
acção. É importante lembrar que a teoria da atribuição se refere não tanto
às causas reais do comportamento de uma pessoa como às inferências que
o observador faz acerca das causas.

Segundo Heider, os atributos pessoais são mais evidentes quando o meio


permite um leque de possíveis comportamentos. Uma vez inferida uma
característica acerca de um indivíduo, pode ser usada para predizer o
comportamento.

As ideias de Heider tiveram uma enorme influência nas investigações


ulteriores no domínio da atribuição.

5.2.2 Inferências correspondentes

A teoria das inferências correspondentes (Jones e Davis, 1965) aborda


como é que os indivíduos fazem um certo número de inferências sobre as

© Universidade Aberta 269


intenções de uma pessoa. O problema central é o de se saber como é que
um indivíduo atribui a outro disposições pessoais estáveis, a partir de
acções que terá observado. Procura-se assim saber como é que um
observador infere sobre as intenções subjacentes ao comportamento de um
actor, permitindo estas intenções atribuir ao actor uma disposição pessoal.
O objectivo da teoria da inferência correspondente é de "construir uma
teoria que explique de modo sistemático as inferências de um observador
sobre o que um actor tentava efectuar mediante uma acção particular"
(Jones e Davis, 1965, p. 222). A inferência correspondente refere-se ao
julgamento do observador que o comportamento do actor é causado por
um traço particular ou corresponde a um tal traço.

Os dois critérios fundamentais para que um observador possa aceder às


intenções subjacentes de um actor são o conhecimento e a capacidade.
Para poder inferir que alguns dos efeitos resultam de uma intenção, o
observador deve crer que o actor conhecia as consequências do seu acto.
Para além disso, esse actor deve ser visto como capaz de produzir os
efeitos observados. É só a partir destas duas condições que um acto e os
seus efeitos podem aparecer ao observador como sendo devidos ao actor e
não ao acaso ou às circunstâncias. Na ausência de qualquer destas
condições, os efeitos serão atribuídos a factores externos em vez de se
atribuírem à intenção pessoal do actor (figura 3.1).

INFERE Conhecimento OBSERVA

~
:feitol
Disposição -Intenção Acção Efeito 2

Efeito 3

Capacidade

Fonte: Jones e Davis, 1965.

Figura 3.1- O paradigma acção - atribuição

As inferências correspondentes são influenciadas por três factores. Em


primeiro lugar os comportamentos que resultam de livre escolha tendem a
produzir inferências correspondentes, não sendo o caso de
comportamentos que são resultado de escolha forçada. Isto foi

270 © Universidade Aberta


demonstrado num estudo de Jones e Harris (1967) em que se pedia às
pessoas para lerem discursos que eram quer pro-Fidel Castro quer contra.
Os sujeitos, numa condição de escolha, podiam escolher com qual dessas
posições concordariam falar. Aos sujeit~s na condição de não escolha era
atribuída uma posição a defender. Quando se pedia aos sujeitos para
determinarem as crenças actuais da pessoa que tinha escrito o discurso, os
que o liam numa condição de escolha livre eram mais susceptíveis de julgar
que o discurso reflectia a verdadeira atitude do escritor.

Em segundo lugar, prestamos atenção aos comportamentos que produzem


efeitos não comuns, isto é, elementos do padrão escolhido de acção que
não são partilhados com padrões alternativos dc acção. Esscs efcitos
servem para explicar a atribuição, eliminando-se os efeitos comuns, pois
não contribuem com informações susceptíveis de orientarem a escolha.
Imagine-se, por exemplo, que se uma aluna se levanta numa sala de aula,
fecha a janela e veste uma camisola, poderemos inferir que tem frio. Só o
facto de a aluna ir fechar a janela poderia também indicar que ela pretendia
não ser perturbada pelo barulho da rua. Todavia o efeito não comum de
vestir a camisola permite-nos inferir que as suas acções resultam de sentir
frio.

Em terceiro lugar, Jones e Davis sugerem que também prestamos mais


atenção nas nossas tentativas para compreendermos os outros, às acções
que realizam revestidas de baixa desejabilidade social, que às acções altas
nesta dimensão. Assim, Jones, Davis e Gergen (1961) mostraram que as
condutas que se afastavam das exigências de um determinado papel numa
situação, suscitavam mais informações ao observador do que as que
correspondiam a este papel. Neste estudo foi pedido a estudantes para
ouvirem uma entrevista gravada entre um examinador e uma pessoa à
procura de emprego, quer de tripulante de submarino quer de astronauta.

Um psicólogo encarregado das entrevistas descrevia a um compadre do


experimentador que as qualidades requeridas ao tripulante de submarino
eram a extroversão e uma propensão para a vida em grupo, enquanto que a
introversão e a independência deviam caracterizar os bons astronautas.
Depois o "compadre" respondia a uma série de questões e o seu
comportamento verbal era ou conforme às exigências do papel (condição
"segundo o papel", is!o é, a introversão para a candidato a astronauta, e a
extroversão para o candidato ao tripulante de submarino), ou contrário às
exigências do papel (condição "contra o papel", isto é, a introversão para o
candidato ao tripulante de submarino e a extroversão para o candidato a
astronauta).

271
© Universidade Aberta
Finalmente era pedido aos sUjeItos para avaliarem o "compadre" na
dimensão introversão/extroversão. Também se lhes pedia para dizerem se
estavam seguros das suas avaliações e se pensavam que o compadre tinha
revelado a sua verdadeira identidade. Verificou-se que a certeza quanto à
atribuição de características pessoais ao outro, no caso vertente ao
compadre, aumentava nas condições "contra o papel", o mesmo é dizer
quando as condutas do compadre não eram conformes às que se requeriam
para um certo papel. A experiência confirmou, portanto, a hipótese de que
o comportamento conforme a um papel, ou imbuído de desejabilidade
social, informa-nos relativamente pouco sobre os traços de personalidade
de um indivíduo.

Em suma, a teoria proposta por Jones e Davis sugere que concluímos mais
provavelmente que o comportamento dos outros reflecte os seus traços
estáveis, isto é, obtemos inferências correspondentes acerca deles, quando
as suas acções: 1) ocorrem por escolha; 2) produzem efeitos não comuns; e
3) são baixas em desejabilidade social (figura 3.2).

Comportamentos que produzem


efeitos não comuns (resultados que
não seriam produzidos por outras
acções)

INFERÊNCIAS

1----.....
CORRESPONDENTES
Os comportamentos foram
Alto grau de certeza de que o
escolhidos livremente
comportamento dos outros
resulta dos seus traços ou
disposições

Comportamentos com baixa


desejabilidade social

Fonte: Adaptação de Jones e Davis. 1965.

Figura 3.2 - Inferências correspondentes: atribuição ao comportamento dos


outros dos seus traços e disposições.

5.2.3 Covariação e esquema causal


Kelley (1967) propôs um modelo que assenta no princIpIo de analogia
entre as diligências feitas pelas pessoas na vida quotidiana e as efectuadas

272 © Universidade Aberta


pelo cientista, e isto a partir de uma análise de covariância. Segundo o
princípio de covariação, "um efeito é atribuído a uma das possíveis causas
com que, ao longo do tempo, varia" (Kelley, 1967, p. 108). Segundo
Kelley procuramos um padrão sistemático de relações e inferimos causa e
efeito a partir desse padrão. Este modelo postula que se tem mais de uma
oportunidade para se observar uma pessoa particular e que observamos
outras pessoas em situações semelhantes.

Kelley, apoiado na distinção feita por Heider entre causas de disposição e


de situação, apontou três tipos gerais de explicação que se podem utilizar
quando se tenta interpretar o comportamento de alguém:

-uma atribuição ao aetor, ou seja, à pessoa que está envolvida no


comportamento em questão;

-uma atribuição à entidade, ou seja, à pessoa alvo com quem o


actor está interagindo;

-e uma atribuição às circunstâncias, ou seja, ao contexto particular


em que o comportamento ocorre.

o modelo de covariação de Kelley afirma que a atribuição a um destes


componentes (actor, entidade, circunstâncias) depende de três aspectos do
comportamento. O valor de cada uma destas três variáveis
comportamentais pode ser alto ou baixo. As atribuições são feitas, quer a
factores internos (o actor), quer a factores externos (entidade,
circunstâncias), dependendo dos níveis relativos destas três variáveis. Estas
variáveis comportamentais são:

1. Distintividade. Um comportamento pode ser atribuído com


exactidão a alguma causa se só ocorre quando essa causa está
presente, e não ocorre quando essa causa está ausente.

2. Consistência. Sempre que a causa esteja presente, o


comportamento é o mesmo ou quase o mesmo.

3. Consenso. Os outros comportam-se do mesmo modo em relação ,

"

à mesma entidade.

Este modelo sugere que provavelmente atribuímos o comportamento dos


outros a causas internas em situações de baixa distintividade, alta
consistência e baixo consenso. Pelo contrário, atribuímos mais
provavelmente o comportamento dos outros a causas externas em
condições de alta distintividade, alta consistência e alto consenso. E

© Universidade Aberta 273


geralmente atribuimo-Io a uma combinação destes factores em condições
de alta distintividade, alta consistência e baixo consenso (figura 3.3).

Um exemplo talvez ajude a clarificar estas proposições. Suponhamos que


estamos interessados em saber porque é que uma colega, a Judite, se
comportou de modo simpático com outra pessoa, a Antónia. Segundo o
modelo de covariação, a atribuição interna ou externa depende do modo
como os três elementos de informação mencionados covariam para dar um
quadro geral. Suponhamos que dispomos da seguinte combinação de
informação: 1) a Judite é simpática com quase todas as pessoas (baixa
distintividade); 2) a Judite é quase sempre simpática com a Antónia (alta
consistência); e 3) não há muitas pessoas que sejam simpáticas com a
Antónia (baixo consenso). Neste caso, a teoria de Kelley indica que
provavelmente se atribui o comportamento a causas internas (a Judite é
uma pessoa simpática).

Pelo contrário, suponhamos que dispomos da seguinte combinação de


informação: 1) a Judite raramente é simpática com outras pessoas (alta
distintividade); 2) a Judite é quase sempre simpática com a Antónia (alta
consistência); e 3) a maior parte das pessoas são simpáticas com a Antónia
(alto consenso). A partir destas informações atribuímos o comportamento a
causas externas ou situacionais (a Antónia faz com que as outras pessoas
sejam simpáticas com ela).

Estas predições puderam ser confirmadas na investigação subsequente


(Major, 1980; McArthur, 1972). Explicamos o acontecimento atribuindo-o
ao actor, à entidade ou às circunstâncias consoante a combinação particular
de informação de que disponhamos acerca das pessoas envolvidas.

o modelo de covariação é útil quando se consideram padrões de acção


sobre os quais temos alguma informação. Todavia não nos ajuda no caso
de termos de fazer atribuições a acções isoladas. Como julgamos o
comportamento quando não se dispõe de informação acerca da
distintividade, da consistência e do consenso? Para preencher esta lacuna,
Kelley (1972) propôs um modelo de esquema causal que é "uma
concepção geral que a pessoa tem sobre o modo como certos tipos de
causas interagem para produzir um tipo de efeito particular"(p. 152).

Em certos casos, cada uma das diferentes causas possíveis é suficiente para
produzir um dado efeito (esquema das múltiplas causas suficientes).

274 © Universidade Aberta


Baixo consenso
As outras pessoas não
reagem a este estímulo do
mesmo modo

Alta consistência Atribuições a causas internas


Esta pessoa reage a este O comportamento desta pessoa
estímulo de modo semelhante - - - - - - - - - . 1 resulta de causas internas como
a outras ocasiões os seus traços ou motivações

Baixa distintividade
Esta pessoa reage do
mesmo modo a estímulos
diferentes

Baixo consenso
A, outras pessoas não reagem
a este estímulo do mesmo
modo

Alta consistência Atribuição a causas internas e


Esta pessoa reage a este externas
estímulo de modo semelhante O comportamento desta pessoa
a outras ocasiões resulta de causas intemas e extemas

Alta distintividade
Esta pessoa não reage do
mesmo modo a estímulos
diferentes

Alto consenso
Outras pessoas reagem a este
estúnulo do mesmo modo

Alta consistência Atribuição a causas ~xternas


Esta pessoa reage a este -----------i~.1 O comportamento desta pessoa
estímulo de modo semelhante resulta de causas externas
a outras ocasiões

Alta distintividade
Esta pessoa não reage do
mesmo modo a estímulos
diferentes

Figura 3.3 - Teoria da atribuição causal de Kelley: principais predições.

Noutros casos um efeito só pode manifestar-se se diferentes causas operam


ao mesmo tempo (esquema das múltiplas causas necessárias). Esquemas

275
© Universidade Aberta
ainda mais complexos podem ser elaborados. Pode ser verificada a hipótese
de que quanto mais um efeito tenha um carácter extremo, mais é
interpretado no esquema das múltiplas causas necessárias (Cunningham e
Kelley, 1975; Kun e Weiner, 1973). Por exemplo, um sucesso numa tarefa
fácil, e um fracasso numa tarefa difícil, podem ser interpretados quer em
termos de capacidade, quer de esforço, mas um sucesso numa tarefa difícil
e um fracasso numa tarefa fácil seriam interpretados em função das
capacidades e do esforço.

Kelley menciona certos princípios, em função dos quais um indivíduo


elaboraria uma opinião sobre a causalidade. Um destes princlplOs, o
princípio de desconto, diz respeito a situações em que um dado efeito tem
múltiplas causas possíveis. O papel de uma dada causa na produção de um
dado efeito é subtraído se outras causas plausíveis estão presentes. Por
exemplo, verificou-se que um indivíduo, a quem se tinha pedido para se
submeter a uma dada pessoa com estatuto elevado e a uma pessoa com
estatuto inferior forneceu explicações diferentes para o comportamento
idêntico das duas pessoas. Os factores internos foram subtraídos na
explicação da submissão da pessoa com estatuto inferior. porque factores
externos, como a força aplicada pelo indivíduo proporcionavam causas
externas plausíveis (Thibaut e Riecken, 1955).

Um outro princípio de aumento postula que quando há esforço, sacrifício,


embaraço, custos ou riscos associados à realização de um acto, a acção é
mais atribuída ao actor do que o seria de outro modo. Por exemplo, pode
acontecer que se um aluno oriundo de nível sócio-cultural baixo obtém
notas brilhantes, se atribua o seu sucesso mais a factores internos como o
esforço e a capacidade do que se faria para um aluno oriundo do nível
sócio-cultural elevado.

Em suma, os esquemas causaIs são uma espécie de estenografia. Se


dispomos de informação ilimitada, o modelo de covariação pode
representar os processos inferenciais de modo preciso. Todavia, em muitas
situações tenta-se a explicação dos acontecimentos sem se dispor de toda a
informação. Nestes casos contaremos com os esquemas causais para se dar
sentido ao comportamento observado.

Quer o modelo de covariação quer a teoria das inferências correspondentes


representam avanços de vulto para melhor se compreender como é que as
pessoas fazem inferências acerca das causas do comportamento. Na sua
forma original a teoria das inferências cOlTespondentes tratava sobretudo de
dar sentido a instâncias singulares do comportamento, ao passo que o
modelo de covariação foi avançado para explicar de modo explícito como é

276
© Universidade Aberta
que o sentido é dado a uma sequência de comportamento ao longo do
tempo. Ambas as teorias postulam que as pessoas são observadores
racionais e lógicos, actuando como cientistas ingénuos mediante o teste de
hipóteses acerca do lugar de causalidade de acontecimentos sociais. Até
que ponto somos lógicos nas nossas atribuições quotidianas? Mais adiante
voltaremos a este assunto.

5.2.4 Atribuições de sucesso e de}i-acasso

Wcincr avançou um modelo de atribuição que se refere a uma área muito


mais específica do comportamento que os modelos de Jones e Davis e de
Kelley. O modelo de Weiner diz respeito às explicações para o sucesso e o
fracasso de pessoas na realização de uma tarefa (Weiner, 1979; 1988;
Weiner et aI., 1972). Porque é que um estudante teve resultados medíocres
num exame? Porque é que um atleta venceu uma maratona? É a questões
deste género que o modelo de Weiner procura responder.

Tal como os modelos de Jones e de Kelley, o modelo básico de Weiner


alicerça-se no trabalho de Heider. Como Kelley, Weiner pressupõe que
uma das dimensões dos nossos julgamentos é uma comparação entre
causas de disposição e de situação, que refere como sendo a dimensão
interna/externa. Além disso, Weiner acrescenta uma segunda dimensão,
intitulada instável/estável. Para além de que o locus de causalidade se
localiza no interior ou no exterior do sujeito, a causa pode ser
percepcionada como perdurando no tempo (estável) ou não (instável).
Assim, atribuir um fracasso a uma falta de esforço próprio ou a uma
incapacidade para a tarefa, se ambas as atribuições são internas, podem
contudo ter implicações motivacionais e emocionais diferentes. Numa
outra versão da teoria, Weiner (l980b) acrescentou uma terceira dimensão
controlável-incontrolável que se refere à capacidade percepcionada pelo
sujeito para actuar sobre a causa de um sucesso modificando-a ou não.
Assim, podemos escolher entre oito tipos de explicações para o sucesso ou
o fracasso. A capacidade, por exemplo, é um factor interno, estável e
incontrolável, enquanto que a sorte é um factor externo, instável e
incontrolável (quadro 3.1).

Algumas dúvidas têm sido colocadas quanto à independência da dimensão


controlabilidade em relação ao locus de causalidade. A questão reside em
saber se as causas externas poderão ser controláveis. Na verdade, parece
que todas as causas externas são incontroláveis. Contudo, a decisão em

277
© Universidade Aberta
rotular todas as causas externas como incontroláveis poder-se-á considerar
incorrecta, se atendermos ao facto de as causas externas para o actor
poderem ser percebidas como controláveis pelos outros. Consideremos o
caso de um aluno que reprovou num exame e que pensa que o professor
não "vai com a sua cara". Esta é uma causa externa e incontrolável por
parte do aluno, mas é percebida por ele como sujeita à vontade do
professor e, portanto, controlável por este. O problema que permanece por
resolver é se a dimensão controlabilidade significa "controlável pelo
próprio" ou "controlável por qualquer outro".

INTERNAS EXTERNAS

ESTÁVEIS INSTÁVEIS ESTÁVEIS INSTÁVEIS

INCONTROLÁVEIS Capacidade Humor Dificuldade Sorte


da Tarefa

CONTROLÁVEIS Esforço Esforço do Viés do Ajuda habitual


imediato professor invulgar dos outros

Fonte: Weiner (I 98üb).

Quadro 3.1 - Classificação das causas do sucesso e do insucesso escolar de


acordo com as dimensões causais

Posteriormente, os teóricos do modelo reformulado do desânimo


aprendido (Abramson, Seligman e Teasdale, 1978) formularam uma outra
dimensão já referida: globalidade versus especificidade. Os elementos
causais específicos afectam as acções individuais específicas, enquanto que
os elementos causais globais afectam as acções do indivíduo numa ampla
variedade de situações. Alguns problemas se levantam relativamente a esta
nova dimensão causal. Weiner (1986), por exemplo, afirma que esta
distinção carece de um significado preciso e de uma fundamentação
empírica. Segundo Weiner, as causas poderiam ser categorizadas em
função da sua consistência no tempo (estabilidade ou generalização
temporal) e através das diferentes situações (globalidade ou generalização
dos estímulos). Tal facto, levantaria a possibilidade de incluir a estabilidade
e a globalidade dentro de uma única dimensão - a generalidade.

278 © Universidade Aberta


j,
l>--

Na vida devemos determinar muitas vezes as causas do nosso sucesso ou fracasso.


O resultado deve-se a uma causa interna ou do meio?

Frieze e Wcincr (1971) estudaram os modos como atribuímos sucesso ou


fracasso. Foi dada aos sujeitos informação sobre o sucesso (ou fracasso) de
um indivíduo numa determinada tarefa e em tarefas semelhantes. Foram-
lhes igualmente fornecidos dados sobre as taxas de sucesso (fracasso)
passado de outros indivíduos nessa tarefa. Os sujeitos respondiam então a
um questionário sobre os papéis dos factares internos, capacidade e
esforço, e dos factares externos, dificuldade da tareÚl e sorte, no sucesso
(fracasso) na história que tinham lido. Os autares encontraram que os
sujeitos atribuíam mais os sucessos a factores internos que os fracassos. A
tarefa fácil ou difícil era mais facilmente atribuída às tarefas dos indivíduos
que tinham tido um historiai consistente de sucesso ou fracasso prévio na
tarefa. Quando a realização de um indivíduo era consistente com a dos
outros, os resultados eram então atribuídos em grande parte à natureza da
própria tarefa, um factor estável, ao passo que um resultado que diferia
dos experienciados pelos outros era por vezes atribuído ao factor estável
de capacidade, e outras vezes aos factores instáveis de esforço e sorte. A
realização consistente da mesma tarefa e de outras semelhantes efectuadas

279
© Universidade Aberta
pela mesma pessoa era atribuída de modo maciço a ambos os factores
estáveis (capacidade e dificuldade da tarefa), enquanto que a realização
consistente era atribuída acentuadamente a ambos os factores instáveis
(esforço e sorte).

Por sua vez, Luginbuhl, Crowe e Kahan (1975) efectuaram duas


investigações sobre a auto-percepção do fracasso ou do sucesso, tendo em
conta quatro factores causais definidos por Weiner. Os resultados da
primeira investigação confirmam que sucesso é percebido sobretudo como
sendo determinado por causas internas. O sucesso é atribuído em cerca de
70% a factores internos e em cerca de 30% a factores externos. Todavia,
se o fracasso é atribuído a factores internos, é-o mais a factores internos e
instáveis (ao esforço em 45%) que a factores internos mas estáveis (à
competência em cerca de 25%). Se o sucesso é atribuído sobretudo a
factores de que o sujeito tem controlo (esforço), o fracasso é
percepcionado como sendo determinado por factores estáveis (em cerca de
80%), sejam eles internos (ausência de competência para determinada
tarefa) ou externos (dificuldade da tarefa).

A escolha entre estas possíveis causas pode ser afectada por diversos
factores. Por exemplo, as expectativas em relação a um grupo podem
afectar as atribuições. As pessoas atribuem mais o sucesso de uma mulher a
factores instáveis e o de um homem à capacidade (Deaux, 1976). Do
mesmo modo, os Brancos atribuem mais o sucesso devido à capacidade a
um Branco que a um Negro (Yarkin, Town, e Wallston, 1982). Quer os
Brancos quer os Negros atribuem mais o fracasso à falta de capacidade
noutro grupo que no seu próprio grupo (Whitehead, Snifer, e Eichhorn,
1982).

A categorização das causas em dimensões tem levantado alguns problemas


a nível empírico. Por um lado, pode-se interrogar se a atribuição causal é
igual para todas as pessoas. Tudo indica que o processo de busca causal
difere de pessoa para pessoa. Para um indivíduo a sorte pode ser percebida
como externa e instável, enquanto para outro pode ser concebida como
uma propriedade relativamente durável e pessoal.

Por outro lado, pode-se perguntar se uma mesma causa não poderá
exprimir diferentes significados em diversos contextos. Por exemplo, o
exercício do esforço pode ser percebido como temporário (instável) ou
como reflectindo um traço (estável). Esta hipótese é apoiada pelo facto de
que o esforço parece ser interpretado de modo diferente conforme se trate
de situações de sucesso ou de fracasso. O sucesso atribuído ao esforço
promove a crença de que o exercício do esforço é estável. Pelo contrário, o

280
© Universidade Aberta
fracasso atribuído à falta de esforço motiva, em geral, o indivíduo a
trabalhar mais. Assim, o exercício do esforço pode ser considerado instável
em situações de fracasso.

o modelo de Weiner é mais limitado do que os outros que vimos, pois


focaliza-se só nas explicações para o sucesso e insucesso em contextos de
realização. Além disso, investigação recente pôs em evidência que as
nossas reacções aos acontecimentos e as suas explicações podem ser mais
complicadas do que os três factores indicados (Smith, e KJuegeJ, 1982).
Apesar disso, mais do que os outros, este modelo aponta algumas das
consequências que as atribuições podem ter noutros comportamentos.

5.3 Aplicações da teoria da atribuição

Já referimos no primeiro capítulo que Kurt Lewin, um dos fundadores da


moderna Psicologia Social, chamou a nossa atenção para o facto de "nada
ser tão prático como uma boa teoria". O que o autor queria dizer através
deste comentário é que uma vez que tenhamos uma compreensão sólida e
científica de algum aspecto do comportamento social, podemos utilizar
este conhecimento de modo prático. No que diz respeito à atribuição, as
palavras de Lewin não caíram no vácuo. A teoria da atribuição tem sido
aplicada a uma variada gama de tópicos como, por exemplo, a realização
escolar, a realização no trabalho, satisfação no trabalho, realização
desportiva, desvio, crime, delinquência, alcoolismo e divórcio. Uma revisão
exaustiva sobre esta literatura ultrapassaria o objectivo deste capítulo (cf.
Kelley e Michela, 1980; Ross, e Fletcher, 1985). Diferentes exemplos dos
processo atributivos nos campos educativo e clínico podem ser vistos em
Barros, Barros e Neto (1993). Ilustraremos seguidamente quatro áreas de
aplicações da teoria da atribuição: violação, desemprego, acidentes e
relações interpessoais.

5.3.1 Violação

Nos últimos vinte anos os investigadores em ciências sociais têm estudado


extensivamente a atribuição de responsabilidade por incidentes em que
homens têm sido acusados de violar mulheres.

Ryan (1971) refere-se à tendência cultural em "censurar a vítima".


Efectivamente, as pessoas que sofrem crimes e acidentes tendem a ser

© Universidade Aberta 281


duplamente vitimadas: em primeiro lugar durante o próprio acontecimento
e depois pela tendência da sociedade em considerá-las responsáveis pelo
acontecido. Nesta via, Janoff-Bulman (1979) recolheu informação de
pessoas que trabalhavam em diversos centros de apoio a pessoas violadas.
Enviou pelo correio questionários a 120 desses centros, tendo obtido 53%
de respostas. As respostas dos conselheiros desses centros sobre a auto-
censura da vítima de violação permitiram distinguir duas espécies de auto-
censura: comportamental e caracteriológica.

Na auto-censura comportamental a vítima sabe que está fazendo algo de


néscio, tal como andar sozinha a uma hora tardia da noite, deixar entrar
uma pessoa estranha em casa, não fechar o carro, etc. Trata-se de
comportamentos voluntários e, por conseguinte, susceptíveis de se
evitarem no futuro. Na auto-censura caracteriológica a falta encontra-se no
próprio carácter da pessoa: "Sou uma pessoa fraca, não assertiva", etc. A
auto-censura caracterológica, é mais difícil de modificar que a
comportamental. Pediu-se aos conselheiros para indicarem a percentagem
de pessoas que se censuravam em cada uma das categorias referidas. Os
resultados mostraram em primeiro lugar que a auto-censura é uma resposta
frequente da vítima de violação: 74% das mulheres censuravam-se elas
próprias, pelo menos em parte, do que havia acontecido. Em segundo
lugar, a auto-censura comportamental (69%) ultrapassava a caracteriológica
(19%). Este trabalho chama-nos a atenção para a aceitação por parte das
vítimas da sua própria responsabilidade pelo que lhes aconteceu.

Howard (1984) fez a análise dos modos como as pessoas atribuem


responsabilidade a vítimas de vários tipos de crime, incluindo a violação.
Os resultados sugerem a tendência para considerar as vítimas femininas
mais responsáveis pelo que lhes aconteceu que as vítimas masculinas, e
também para se atribuir a auto-censura comportamental a vítimas
masculinas e a auto-censura caracteriólogica a vítimas femininas. Neste
estudo também se compararam pessoas que tinham estereótipos dos papéis
sexuais tradicionais acerca das mulheres e dos homens com aquelas que
não tinham tal tipo de estereótipos. As pessoas tradicionalistas eram mais
susceptíveis que as não tradicionalistas de colocar a culpa nas vítimas
femininas e no seu carácter. Efectivamente, as pessoas não tradicionalistas
tratavam as vítimas femininas e masculinas de modo semelhante.

Um estudo de Field (1978) sobre atitudes acerca da violação por parte de


violadores, conselheiros, polícia e população em geral, mostra algumas
semelhanças com os resultados referidos. Por exemplo, os homens tendem
mais que as mulheres a ver estes últimos como sendo geralmente
responsáveis pela violação. De modo semelhante aos dados de Howard,

282 © Universidade Aberta


Field verificou que as pessoas com perspectivas não tradicionais acerca dos
papéis das mulheres tendem a ver a violação mais como um crime de poder
do que de sexo.

Os resultados evocados ilustram o impacto de factores sociais e culturais


que vitimam certas vítimas. Parece, por conseguinte, ser ainda habitual,
sobretudo nas pessoas com atitudes tradicionais acerca dos papéis
masculinos e femininos, censurar a vítima de violação, especialmente se a
vítima é do sexó feminino. Para além disso, muitas mulheres aceitam a
perspectiva de censurar a vítima, por vezes de modo mais acentuado do
que os homens. Trata-se aparentemente de padrões atribucionais que estão
em consonância com estereótipos sexuais.

5.3.2 Desemprego

Uma outra questão social importante que tem sido examinada por meio da
teoria das atribuições é o modo como as pessoas encaram o desemprego.
Dado o lugar proeminente que o trabalho ocupa na maior parte da nossa
vida quotidiana, a perda de emprego representa não só um duro revés,
como também suscita a procura de alguma explicação.

Feather e Davenport (1981) referem que as pessoas que se sentiam mais


deprimidas acerca das circunstâncias, eram mais susceptíveis de censurar as
condições económicas da sociedade do que a elas próprias. Quando se
censuram as condições económicas, muitas pessoas têm dúvidas sobre o
controlo do seu próprio destino e assim sentem-se abandonadas e
deprimidas.

Num outro estudo, Feather (1985) examinou as atribuições feitas para


explicar o desemprego das outras pessoas. Pediu-se a estudantes
universitários para avaliarem um leque de causas possíveis para o
desemprego, incluindo factores que eram preponderantemente externos
(por exemplo, ineficácia governamental, condições económicas) e factores
preponderantemente internos (por exemplo, competências deficientes, falta
de capacidade). Se bem que os resultados sugiram globalmente uma
tendência para se favorecerem explicações externas sobre as internas, a
competência e a capacidade também eram vistas como sendo importantes.

Em ambos os estudos reflecte-se uma semelhança entre o modo como as


vítimas e os observadores do desemprego julgam as suas causas. Ambos
focalizaram-se mais em atribuições externas do que na censura da vítima.

283
© Universidade Aberta
Neste mesmo sentido, Schaufeli (1988) efectuou um estudo longitudinal.
Em primeiro lugar recolheu as atribuições de um grupo de sujeitos acerca
do desemprego. Em seguida comparou essas atribuições com as que foram
efectuadas seis meses mais tarde por essas mesmas pessoas, estando
algumas delas empregadas e outras desempregadas. Os resultados
mostraram não haver praticamente mudança nas primeiras atribuições,
apesar dos diferentes percursos quotidianos dos sujeitos, seis meses depois.
Quando consideraram o desemprego imaginado no primeiro momento,
ambos referiram que o sucesso no emprego seria principalmente função de
factores internos, enquanto que o fracasso em obter emprego dever-se-ia a
factores externos. Quando se procedeu a uma avaliação, seis meses mais
tarde, os que estavam empregados atribuíram o seu sucesso a factores
internos e os que estavam desempregados a factores externos. Em suma.
em ambos os casos de desemprego imaginado ou experienciado as pessoas
fazem o mesmo tipo de atribuições. O emprego é visto como sendo o
resultado de algo relacionado com as pessoas e o desemprego como sendo
o resultado de algo relacionado com a sociedade.

5.3.3 Acidentes

Se passarmos à explicação da responsabilidade de um acidente, se bem que


a investigação não seja sempre consistente, emerge novamente a tendência
geral para censurar a vítima. Berger (I 981), tendo efectuado uma revisão
da literatura, refere uma fraca tendência para atribuir mais responsabilidade
a uma vítima do acidente quando a severidade do acidente aumenta. Há
todavia uma tendência para baixar a responsabilidade da vítima do acidente
quando o sujeito e a vítima são ambos semelhantes.

5.3.4 Relações interpessoais

As atribuições revestem-se de grande importância nas relações


interpessoais, muito particularmente nas relações íntimas. Foi sugerido que
as relações interpessoais se desenvolvem através de três fases: formação,
manutenção e dissolução (Harvey, 1987). Fincham (1985) explica que
durante o estádio de formação, as atribuições reduzem a ambiguidade e
facilitam a comunicação e uma compreensão da relação. Na fase de
manutenção a necessidade de se fazerem atribuições diminui, porque
relações estáveis foram construídas. A fase de dissolução caracteriza-se por

284
© Universidade Aberta
um aumento nas atribuições com vista a obter-se de novo uma
compreensão da relação.

5.4 Erros de atribuição

Muito embora os modelos de atribuição pretendessem nas suas origens ver


as pessoas como fazendo atribuições de modo lógico e racional, depressa
se descobriu que a racionalidade nem sempre é a regra. Sabe-se hoje em dia
que há vários modos de as explicações poderem estar enviesadas. Por
exemplo, para explicar a realização de um endogrupo ou exogrupo
poderemos escolher diferentes razões para o sucesso e o fracasso. Os erros
podem ter um fundamento motivacional ou denotar os limites dos nossos
processos cognitivos. Ambas as razões são importantes, pois fornecem-nos
informação sobre o modo como vemos o mundo (Fiske e Taylor, 1984).

É importante compreender os viés atribucionais porque contribuem para o


conflito entre pessoas. Nesta secção abordaremos quatro erros da
atribuição: diferenças entre actor e observador, erro fundamental,
complacência na atribuição de causalidade e efeitos temporais na
atribuição.

5.4. I Diferenças entre aetor e observador

Antes de avançar mais na leitura, preencha o Documento 3.2. Em primeiro


lugar complete-o referente a si próprio indicando para cada um dos vinte
itens se tem um traço ou o seu oposto, ou se o seu comportamento
depende da situação. Em seguida pense num amigo e descreva-o com esses
mesmos itens. Quando acabar conte o número de vezes que se descreveu a
si mesmo e ao seu amigo escolhendo um traço em vez da opção
situacional. Há uma diferença? Com base na investigação pode-se prever
que escolheu a opção situacional mais para si próprio e a opção traço mais
para o seu amigo (Nisbett et al., 1973). Administraram-se 2800 adjectivos
a 14 grupos, cada um com 100 pessoas, e encontrou-se que 85% destes
sujeitos escolhiam mais traços para as outras pessoas do que para si
(Goldberg. 1978).

© Universidade Aberta 285


Complete este questionário para se descrever a si práprio(a), quer o primeiro traço, o
segundo traço, ou "depende da situação" para cada um dos vinte itens. Utilize então este
mesmo questionário para descrever um amigo. Finalmente conte o número total de traços
nas colunas A e B que escolheu para si práprio(a). Faça o mesmo para o amigo. Vê alguma
diferença? (Fonte: Nisbett et a!., 1973).

A B C

Eu Amigo Eu Amigo Eu Amigo

1. Sério Bonacheirão Depende da situação

2. Subjectivo Analítico Depende da situação

3. Orientado para Orientado para Depende da situação


o presente o futuro

4. Enérgico Descontraído Depende da situação

5. Simples Arrogante Depende da situação

6. Brando Firme Depende da situação

7. Reservado Emocionalmente Depende da situação


expressivo

8. Digno Descuidado Depende da situação

9. Realista Idealista Depende da situação

la. Vivo Calmo Depende da situação

11. Céptico Confiante Depende da situação

12. Silencioso Falador Depende da situação

13. Culto Simples Depende da situação

14. Sensível Duro Depende da situação

15. Autosuficiente Sociável Depende da situação

16. Seguro Flexível Depende da situação

286 © Universidade Aberta


17. Dominador Deferente Depende da situação

18. Cauteloso Arrojado Depende da situação

19. __ o

Desinibido Autocontrolado Depende da situação

20. __ o

Consciencioso Descuidado Depende da situação

Documento 3.2 - Atribuições a si próprio e aos outros

Existem diferenças nas atribuições que são feitas pelas pessoas implicadas no
comportamento (os actores) e as que só observam o comportamento. Os
actores têm tendência a fazerem atribuições para o seu próprio
comportamento a causas externas ou situacionais, enquanto que os
observadores são mais susceptíveis de fazerem atribuições internas ao
comportamento dos outros. Esta tendência é conhecida pejo nome de efeito
actor-ofJserl'ador. (Jones e Nisbett 1972). Esta diferença foi demonstrada,
por exemplo. num estudo (Nisbett Caputo, Legant, e Maracek, 1973) em que
se pedia a estudantes universitários para explicarem, quer para eles próprios
quer para um amigo, as causas da escolha de um curso numa universidade e da
escolha de uma namorada. Segundo os investigadores eram dadas respostas
diferentes para as escolhas deles próprios e para as escolhas feitas pelos seus
amigos. Para eles próprios descreviam a sua escolha em termos de
características inerentes às suas namoradas e universidades ("Ela é afectiva e
bonita", "ajudará a minha carreira"). Mas quando se respondia por um amigo,
os estudantes atribuíam o comportamento a qualidades dessa pessoa ("Ela
necessita de alguém com quem possa relaxar" ou "Ele quer ganhar muito
dinheiro").

Do mesmo modo quando se pediu a 60 prisioneiros para explicar porque é que


tinham cometido os seus crimes, e se perguntou o mesmo aos consultores,
estes referiam características pessoais, ao passo que os prisioneiros referiam
factores situacionais (Saulnier e Perlman, 1981).

A focalização da percepção é uma explicação para este efeito. Se somos o


actor, somos mais susceptíveis de nos focalizar nos acontecimentos
circundantes, ao passo que se observarmos outra pessoa geralmente essa
pessoa é o foco de atenção. Outra explicação para a diferença actor-

287
© Universidade Aberta
observador advém da diferença na informação disponível para actores e
observadores. Muitas vezes, o observador tem pouca informação sobre os
determinantes históricos e estará por conseguinte completamente focalizado
no aqui e agora. Enfim, os observadores estão mais interessados em obter
informação que permita efectuar predições sobre a conduta futura do actor.
Este objectivo motiva os observadores a olharem para as características
estáveis da pessoa. Esta hipótese pôde ser confirmada por Miller, Norman e
Wright (1978), concluindo que os observadores efectuam mais atribuições
internas acerca de um actor quando esperavam interagir com o actor do que
quando não o esperavam.

Há factores que podem alterar as diferenças actor-observador. Por exemplo,


se é pedida a uma pessoa para ter empatia com a pessoa que se está a
observar, ela será menos susceptível de utilizar explicações de disposição e
mais susceptível de encontrar explicações situacionais (Brehm e Aderman,
1977). Se se passar do papel de actor para o papel de observador também se
conseguem diminuir as atribuições situacionais (Storms, 1973). O modo de se
fazerem atribuições causais não é sempre o mesmo. Diferentes perspectivas e
diferentes tipos de informações podem contribuir para enviesar as nossas
explicações num sentido ou noutro.

5.4.2 Erro fundamenTal

A tendência relativa dos actores em prestarem atenção a factores situacionais


quando fazem atribuições é uma excepção a um viés muito espalhado. De um
modo geral, as pessoas subestimam a importância de factores situacionais
quando explicam o comportamento. Quer os actores quer os observadores dão
maior importância a disposições que a situações na explicação do
comportamento (Watson, 1982). A este exagero na importância de factores
pessoais tem-se chamado o erro fundamental da atribuição (Ross, 1977). As
atribuições das pessoas estão erradas porque os determinantes situacionais são
muitas vezes ignorados; o erro é fundamental porque a divisão de causas do
comportamento em internas/externas é fundamental para a abordagem da
atribuição.

Uma demonstração clássica deste erro foi fornecida por uma experiência em
que os sujeitos foram repartidos aleatoriamente em "interrogadores" e

288 © Universidade Aberta


"interrogados" no decurso de discussões intelectuais (Ross, Amabile, e
Steinmetz, 1977). Pedia-se aos interrogadores para colocarem questões
difíceis sobre qualquer assunto em que estivessem especializados. Quando
mais tarde se perguntava a todos os sujeitos para avaliarem o seu próprio
conhecimento geral, os interrogadores consideravam-se mais inteligentes do
que os interrogados que, aliás, partilhavam da mesma opinião. Por isso
cometeram o erro fundamental da atribuição sobreanalisando as vantagens
naturais dos interrogadores.

Uma explicação que tem sido avançada para o erro fundamental da atribuição
é que quando observamos o comportamento de outra pessoa, temos tendência
a focalizarmo-nos nas suas acções e ignoramos o contexto social em que estas
ocorrem. Donde resulta que a influência potencial das causas situacionais não
seja reconhecida. Uma segunda interpretação é que os indivíduos
efectivamente vêm os factores situacionais, mas não conseguem dar-lhes um
peso suficiente. Ou por outras palavras, não os percepcionam como sendo tão
importantes como são realmente (Johnson, Jemmott, e Pettigrew, 1984).

Se uma revisão do erro fundamental abonava em favor da hipótese de Ross


(Jones, 1979), um estudo de Harvey, Town e Yarkin (1981) levantava sérias
questões ao erro fundamental da atribuição. Estes autores sugerem que ele
pode nem ser "fundamental" desde que não ocorre sob todas as circunstâncias,
nem um "erro", desde que sob algumas circunstâncias as atribuições
disposicionais podem ser apropriadas. Daí que ainda reste estabelecer a
importância última do erro fundamental da atribuição.

5.4.3 Complacência na atribuição da causalidade

O erro de complacência na atribuição da causalidade refere-se à tendência da


pessoa a percepcionar-se como sendo a causa dos seus sucessos, mas a
atribuir a causa dos seus fracassos a causas externas (Bradley, 1978).

O suporte inicial para este erro da atribuição foi encontrado por Jonhson,
Feigenbaum e Weiby (1964) que utilizaram estudantes de psicologia da
educação como sujeitos, tendo-lhes pedido para ensinarem aritmética a dois
alunos. Comunicava-se aos estudantes que um aluno tinha tido bons resultados
e outro fracos resultados num teste. Pedia-se depois aos estudantes para
ensinarem mais aritmética aos mesmos dois alunos. Subsequentemente dizia-se

289
© Universidade Aberta
aos sujeitos que o aluno que tinha tido bons resultados no primeiro teste, tinha
continuado a ter esses mesmos resultados e o aluno que tinha tido fracos
resultados nesse teste ou a) continuava a ter fracos resultados ou b) tinha
melhorado. Pedia-se enfim aos sujeitos para avaliarem a realização dos dois
alunos. Encontrou-se que os estudantes-professores atribuíam o melhoramento
na realização dos alunos que inicialmente tinham tido fracos resultados a eles
próprios e os que continuavam a ter fracos resultados aos alunos. É necessário
todavia ser indulgente com estes estudantes-professores, pois os alunos
manifestam do mesmo modo a tendência a ver os seus sucessos como
resultado da sua própria responsabilidade e a considerar os seus fracassos
como sendo devidos às circunstâncias (Bernstein, Stephan, e Davis, 1979).

o erro de complacência pode ser demonstrado em várias experiências


(Bradley, 1978). Não ocorre só em relação ao próprio comportamento dos
observadores, mas também em relação a quem estão associados. Por exemplo,
adeptos de Pittsburg Steelers e do Dallas Cowboys foram entrevistados após
terem jogado as suas equipas em 1976, onde saíram vencedores os Steelers.
Enquanto que os adeptos do Steelers atribuú'am a vitória da sua equipa ao seu
bom jogo, os adeptos dos Cowboys atribuíram a derrota à má sorte (Winkler e
Taylor, 1979).

Este erro resulta de duas fontes diferentes se bem que estejam relacionadas.
Em primeiro lugar, permite-nos proteger a nossa auto-estima: se somos
responsáveis pelos resultados positivos, mas não nos censuramos pelos
negativos, os nossos sentimentos sobre nós próprios podem ser mantidos
(Greenberg, Pyszcynski, e Solomon, 1982). Em segundo lugar permite-nos
melhorar a nossa imagem pública. Mesmo que não nos preocupemos com as
suas origens precisas, este erro atribucional pode causar tensões interpessoais.
Imagine-se o que aéontece quando duas ou mais pessoas trabalham
conjuntamente numa tarefa. Por causa do erro de complacência cada pessoa
pode percepcionar o sucesso que resulte dos esforços conjuntos como sendo
sobretudo fruto da sua contribuição. Pelo contrário, cada pessoa pode
percepcionar os fracassos como sendo culpa dos outros. No caso de acontecer
este tipo de reacções, a cooperação futura está seriamente ameaçada.

290
© Universidade Aberta
5.4.4 Efeitos temporais da atribuição

Nem sempre são apresentadas explicações no momento em que um


acontecimento ocorre. Por vezes fazemos um regresso a um acontecimento
passado e inferimos as suas causas. Outras vezes nesta viagem pelo tempo,
podemos reinterpretar um acontecimento com a perspectiva do presente.
Miller e Porter (1980) procuraram saber se estas mudanças de perspectiva
afectavam o padrão das atribuições. Os autores sugerem que as atribuições
podem tornar-se mais situacionais com o passar do tempo. Uma explicação
possível é que figura (o actor) e fundo (a situação) se tornam mais
semelhantes quando olhamos para trás. Uma outra explicação pode ser que a
nossa necessidade de prever e de controlar não seja tão acentuada quando se
reflecte o passado como o é quando se interage no presente. Ambas as razões
podem contribuir para um aumento das atribuições situacionais e uma
diminuição das disposicionais.

Foram referidas algumas das interpretações teóricas de diversos viés ou erros


atributivos. Em particular evocaram-se interpretações motivacionais e
cognitivas. Mais adiante abordaremos uma interpretação normativa: a hipótese
da norma de internalidade. Esta norma permite compreender como é que os
sujeitos são levados a atribuir mais valor às explicações que privilegiam o
pape] causal do actor no que faz e no que lhe acontece, do que às explicações
redutoras deste papel.

5.5 Atribuições e relações intergrupais

A teoria da atribuição tem tentado compreender como é que uma pessoa


atribui causas a outra pessoa ou a ela própria. Passando por cima de muitos
aspectos sociais da vida quotidiana, muito particularmente psicólogos sociais
europeus têm lançado o desafio: "a teoria da atribuição deveria ser mais
social" (Hewstone, e Jaspars, ]984, p. 379). É efectivamente pertinente
colocar-se a questão de se saber se a pertença a determinados grupos ou
categorias sociais (v.g., classe social, raça, religião ... ) contribui para que as
atribuições feitas ao seu endogrupo ou a exogrupos sejam diferentes. Tendo
por base trabalhos sobre as relações intergrupais, é de esperar que as
atribuições ao endogrupo sejam realçadas.

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Certos estudos têm examinado essa predição. Uma experiência efectuada por
Taylor e Jaggi (1974) no sul da Índia, ilustra o efeito das pertenças categoriais
sobre a atribuição. Durante a fase inicial da investigação os autores mostram
que os sujeitos, todos eles hindus, avaliam o seu próprio grupo de modo mais
favorável que o grupo muçulmano. Numa segunda fase pedia-se aos hindus
para fazerem atribuições a uma pessoa da sua religião ou de religião diferente
(muçulmana). O comportamento da pessoa alvo da atribuição, era descrito
quer de modo socialmente desejável (um comerciante era generoso com a
clientela) quer de modo socialmente indesejável (um comerciante enganava o
seu cliente). Após o confronto dos sujeitos com uma história, apresentavam-se
as razões possíveis do comportamento do actor nesta situação. Uma destas
razões indicava uma atribuição de causalidade interna ao actor pelo seu
comportamento, e as outras alternativas reflectiam uma atribuição de
causalidade externa ao comportamento do actor. Pediu-se então aos sujeitos
para indicarem qual das alternativas propostas explicava o comportamento do
actor. No quadro 3.2 pode-se ver o tipo de atribuição feita. Os hindus tendiam
a fazer atribuições internas a outros hindus que eram tratados de modo
socialmente desejável, e atribuições externas para os hindus que eram
tratados de modo socialmente indesejável, enquanto as atribuições aos
Muçulmanos eram inversas, como por exemplo, o tratamento de modo
socialmente desejável dos muçulmanos era atribuído a factores externos. Em
suma, os resultados verificam a predição de que se fazem atribuições que
valorizam o grupo interno e que desvalorizam o grupo externo.

Religião do actor

Hindu Socialmente desejável Interno


Socialmente indesejável Externo

Muçulmano Socialmente desejável Externo


Socialmente indesejável Interno

Fonte: Taylor e Jaggi (1974).

Quadro 3.2 - Tipos de atribuições segundo a religião do actor e o modo como era
tratado

292 © Universidade Aberta


Hewstone e Ward (1985) efectuaram um estudo com sUjeItos malaios e
chineses na Malásia e em Singapura. Os sujeitos fizeram atribuições internas
ou externas para comportamentos desejáveis ou indesejáveis efectuados por
malaios ou por chineses. Na Malásia, os sujeitos malaios mostraram uma clara
atribuição etnocêntrica, atribuíram um comportamento efectuado por um
malaio mais a factores internos que um comportamento semelhante efectuado
por um chinês, e um comportamento negativo efectuado por um malaio menos
a factores internos que um comportamento semelhante efectuado por um
chinês. O efeito de engrandecimento do endogrupo foi muito mais forte que o
efeito depreciativo do exogrupo. Os sujeitos chineses não mostraram viés
etnocêntrico, manifestando uma tendência a fazer atribuições semelhantes às
efectuadas por malaios. Em Singapura o único efeito significativo foi o de que
os malaios fizeram atribuições internas para os comportamentos positivos
efectuados por malaios.

Os autores do estudo explicaram estes resultados tendo em conta a natureza


das relações intergrupais na Malásia e em Singapura. Na Malásia os malaios
constituem o grupo maioritário e os chineses são uma minoria étnica. Para
além disso, as relações entre os dois grupos eram tensas na altura, com os
malaios a enveredarem por uma política de assimilação. Quer os malaios quer
os chineses partilhavam em geral um estereótipo desfavorável dos chineses e
um estereótipo favorável dos malaios. Pelo contrário, Singapura apresenta-se
mais tolerante do ponto de vista étnico. Os chineses fazem parte da maioria e
os estereótipos étnicos são menos acentuados. A implicação importante desta
análise é que a atribuição etnocêntrica depende da dinâmica intergrupal
vigente no contexto sócio-histórico. As atribuições que os membros dos
grupos fazem sobre o comportamento do endogrupo e do exogrupo é
influenciada pela natureza das relações entre os grupos.

Este mesmo viés do efeito exogrupo pode ser demonstrado quanto à cor da
pele nos Estados Unidos. Duncan (1976) pediu a estudantes americanos
brancos para descreverem, após terem assistido a uma interacção entre um
negro e um branco em vídeo, o comportamento dos protagonistas. Quando os
sujeitos brancos viram o protagonista branco empurrar uma vítima negra, 17%
descreviam o acto como sendo "violento", enquanto que 42% pensavam que
era um mero "jogo". Quando os sujeitos brancos viam um protagonista negro
empurrar uma vítima branca, 75% descreviam-no como um acto "violento" e
somente 6% pensava que era um "jogo". Por outras palavras, o mesmo
comportamento é avaliado de modo mais positivo quando efectuado por um

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elemento do endogrupo. Para além disso, quando o agressor é negro, os
sujeitos percepcionam o seu comportamento como sendo devido a uma
disposição da pessoa (causalidade interna), enquanto que quando o agressor é
branco, a causalidade do seu comportamento é mais atribuída à situação.

Estas investigações mostram a influência da pertença a determinados grupos


sociais sobre a atribuição. Todavia, as investigações de Taylor e Jaggi, por um
lado, e de Duncan, por outro lado, se abordam as relações entre grupos,
focalizam-se nas atribuições ao próprio grupo e ao outro grupo feitas pelos
sujeitos de um só grupo. Mas também há investigações que abordam as
atribuições recíprocas entre grupos.

Numa investigação de Hastorf e Cantril (1954), estudantes de Dartmouth e


Princeton observaram um jogo de futebol entre as equipas destas duas
universidades e deviam assinalar o número de faltas cometidas por cada
equipa. Os sujeitos manifestam um enviesamento a favor do endogrupo, isto é,
pensam que a equipa adversária cometeu mais faltas que a sua própria equipa.

A existência de fenómenos etnocêntricos postos em evidência nas experiências


de Taylor e Jaggi, de Duncan e de Hastorf e Cantril não são contestáveis.
Todavia não se pode pensar que sistematicamente a causalidade interna do
efeito positivo seja atribuído ao grupo interno ou que a causalidade interna de
um efeito negativo seja atribuída ao grupo externo. Deschamps (1973-74, p.
718) chama-nos a atenção para este ponto: "não contestamos a existência
destes fenómenos de tipo etnocêntrico, ... tais resultados, escondendo uma
parte da realidade, correm o risco de só nos levarem a um modelo incompleto
que conduziria a uma teoria da auto-idealização dos grupos". Um tal modelo
não teria em conta que num dado momento há certos grupos que são
ideologicamante dominantes.

A influência do estatuto relativo dos grupos sobre a atribuição de uma


causalidade interna e externa pode ser examinada numa experiência de Mann e
Taylor (1974) que recorreram a uma amostra de canadianos franceses e
ingleses. ConfIrma-se que os factores que desempenham um papel na
atribuição de causalidade a membros de diferentes grupos culturais
(canadianos ingleses ou canadianos franceses) ou de classes sociais diferentes,
dependem das posições sócio-culturais relativas dos sujeitos.

Outras experi.ências também mostram que o lugar dos grupos ou categorias


sociais num contexto social pode desempenhar um papel na atribuição de

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causalidade interna e externa (Thibaut, e Riecken, 1955; Deaux, e Emswiller,
1974).

Em suma, se as pessoas tendem geralmente a fazer atribuições que aumentam


o valor do endogrupo, as atribuições também podem depender das posições
relativas que ocupam os grupos no relacionamento intergrupal.

5.6 Atribuições e diferenças culturais

Para além da problemática da atribuição aplicada às relações intergrupais,


pode-se levantar a questão se factores culturais mais gerais serão susceptíveis
de desempenhar um papel nos processos de atribuição. Diversos autores
chamaram a nossa atenção para o facto de os mecanismos inferenciais estarem
intimamente ligados à cultura. Gergen (1973) refere que o chamado erro
fundamental pode ser um fenómeno cultural. Nisbett e Ross (1980)
mencionam que a tendência dos indivíduos em explicar os comportamentos
mais em termos de disposições pessoais que em termos de factores
situacionais pode ser característico de se ter sido socializado na cultura
americana. Também Lalljee (1981) nos relembra que noções tão importantes
no âmbito dos processos atribucionais, como as de predição e controlo,
podem ser função de orientações sócio-culturais. As culturas particulares têm
não só diferentes tipos de explicação como também diferentes sistemas de
categorização.

Toda uma variedade de investigações confirmaram a existência do "erro


fundamental da atribuição" nas culturas ocidentais (Jones, 1979; Reeder,
1985). Foram contudo suscitadas dúvidas em que medida o "erro fundamental
da atribuição" é assim tão fundamental (Harvey, Town e Yarkin, 1981). Por
exemplo, Miller (1984) obteve explicações de comportamentos pró-sociais e
desviantes junto de sujeitos indianos hindus e norte-americanos. A maior
diferença encontrada entre culturas foi que os sujeitos indianos de todos os
níveis sócio-culturais faziam menos referência a disposições pessoais (indianos
M=20%, americanos M=40%) e mais referência a factores externos (indianos
M=40%, americanos M=18%), em particular a papéis sociais e relações
interpessoais. Esta aparente preferência por atribuições externas na sociedade
indiana foi também encontrada por Dalal, Sharma e Bisht (1983).

295
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A questão concreta que se pode levantar é a de se saber até que ponto os
mesmos modelos de atribuição funcionam se aplicados a outras culturas. O
modelo de Kelley foi testado numa perspectiva intercultural por Cha e Nam
(1985) que replicaram a metodologia de McArthur (1972) com sujeitos
coreanos. Foram fornecidas aos sujeitos curtas descrições de episódios
comportamentais e informação sobre consenso, distintividade e consistência.
Os resultados encontrados foram semelhantes aos encontrados por McArthur
nos Estados Unidos e apoiaram o modelo de Kelley. Todavia, à semelhança do
que acontece quando se efectuam comparações interculturais, também se
encontraram algumas diferenças. Por exemplo, os sujeitos da Coreia
utilizavam mais atribuições externas que os sujeitos dos Estados Unidos.

Em toda uma série de estudos em que se abordaram as atribuições do sucesso


e do fracasso com diversas técnicas (Betancourt e Weiner, 1982; Boski, 1983;
Gupta e Singh, 1981; lida, Reeder, McCabe, Miura e Goldstein, 1986; Singh e
Bhargava, 1985; Kashima e Triandis, 1986; Kuo, 1983; Watkins, 1982, Yang,
1982) emergem dois padrões que se aplicam a um vasto leque de culturas: a)
elevada capacidade e elevado esforço (em comparação com baixa capacidade
e baixo esforço) são recompensados e percepcionados como preditores de alta
realização; e b) o sucesso é explicado por causas internas (capacidade e
esforço), enquanto que o fracasso está mais fortemente associado a causas
externas (sorte e dificuldade da tarefa).

É óbvio que os estudos que se situam nesta linha também mostraram


diferenças entre culturas. Por exemplo, os estudantes japoneses, em
comparação com sujeitos dos Estados Unidos, dão mais valor ao esforço
dispendido e menos importância ao resultado actual, quer seja de sucesso quer
de fracasso (lida et aI., 1986). Para além disso, em oposição ao habitual viés
de complacência, os adultos japoneses parecem atribuir tanto os fracassos
como os sucessos às suas próprias capacidades (Kashima e Triandis, 1986).

Um outro exemplo de diferenças culturais provém de se ter mostrado que os


estudantes indianos combinam a informação de capacidade e esforço de modo
aditivo para a predição da realização (Gupta e Singh, 1981; Singh e Bhargava,
1985). Ao invés, estudantes americanos tratam essa informação de modo
multiplicativo. Por exemplo, um estudante com baixa capacidade é
percepcionado como estando confinado a um leque de realização
relativamente limitado, pouco interessando o esforço dispendido; ao contrário,
um estudante com alta capacidade é visto como sendo capaz de maior
melhoramento na realização se faz mais esforço (Surber, 1981). Singh e

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Barghava avançam como explicação para esta diferença o colectivismo da
cultura indiana em comparação com o individualismo da cultura norte-
amencana.

Verificou-se pois, num certo número de culturas, que se a investigação tem


posto em evidência uma semelhança nas atribuições à realização, é de notar
todavia que as amostras utilizadas são compostas de estudantes do ensino
secundário ou universitário. Ora, é sabido que em muitas. sociedades não-
ocidentais são relativamente poucas as pessoas que atingem tais níveis de
escolaridade. Tais amostras apresentam uma exposição selectiva a valores
ocidentais mediante a frequência do sistema educativo em que sobressaem
crenças individualistas e orientadas para a realização.

Em suma, a investigação intercultural tem evidenciado nesta área semelhanças


e diferenças entre as culturas. Se as semelhanças parecem deixar transparecer
que as características fundamentais dos esquemas causais são universais, tal
não significa que as diferenças encontradas sejam meras variações de somenos
importância. Assim, o viés sociocêntrico, mencionado na secção anterior, e o
erro fundamental da atribuição, dois fenômenos atribucionais amplamente
replicados nas culturas ocidentais, não parecem ser fenômenos universais.

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6. Normas de internalidade

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Talvez o leitor já se apercebesse que os processos da explicação quotidiana
deixam filtrar algo de inquietante. Por um lado, teóricos da atribuição notaram
uma espécie de erro (e não se trata de um qualquer erro: é fundamental) na
tendência em considerar a pessoa, o actor, o principal factor causal. Por outro
lado, já vimos que os internos em termos de locus de controlo são pessoas de
bem. Ou por outras palavras, o que muitas vezes é uma fonte de erro na óptica
de teóricos da atribuição, é o que há de melhor na perspectiva do locus de
controlo. Perante esta inquietação surgiu a "norma de internaiidade" (Jellison
e Green, 1981; Beauvois, 1984).

6.1 Definição de norma de internalidade

JeJlison e Green (1981) mostraram que as explicações internas no controlo dos


reforços são objecto de desejabilidade social. Foram esses os primeiros autores
a considerar que a ligação entre a internalidade e a tendência a exprimir
crenças socialmente desejáveis não é um artefacto, mas uma das componentes
da internalidade.

A originalidade do trabalho de JeJlison e Green não assenta unicamente em


provar que a internalidade é valorizada de modo positivo pelos indivíduos. Ela
advém igualmente da interpretação avançada para a desejabilidade social da
internalidade. Os autores, estabelecendo um paralelismo entre os numerosos
trabalhos que puseram em evidência o "erro fundamental da atribuição" (Ross,
1977), propuseram que a prevalência das explicações internas devia ser
considerada como a expressão de uma norma, "a norma de internalidade". Por
conseguinte, a norma de internalidade consiste na valorização social da
internai idade.

É de referir, todavia, uma certa ambiguidade de JeJlison e Green que perpassa


o corpo do artigo e é já evidente no título. Tem a ver com a assimilação que é
feita dos processos de atribuição que dizem respeito à explicação dos
comportamentos no âmbito dos quais emerge a noção de erro fundamental,
com os que se referem à explicação dos reforços. Seja como for, apesar da
evocação das teorias da atribuição, as experiências efectuadas por JelJison e
Green dizem respeito à desejabilidade social das explicações internas dos
reforços.

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Trabalhos posteriores suscitados pela noção de norma de internalidade,
mostraram que as explicações internas em matéria de locus de controlo, como
de atribuição, são socialmente desejáveis (Beauvois, 1984). Para este autor
intervém um mesmo viés no erro fundamental descrito pelos teóricos da
atribuição e na predominância das explicações internas na representação da
determinação dos reforços: a sobreavaliação do peso do actor. Este viés
reflecte-se, no caso do erro fundamental, por um exagero da causalidade
pessoal da conduta e, no outro caso, pelo exagero do sentimento de controlo
pessoal. Estamos aqui, por conseguinte, perante uma generalização das ideias
de Jellison e Green, em que se avança a hipótese de que a norma de
internalidade pode abarcar não só as explicações das causas dos reforços
como também a explicação de qualquer acontecimento psicológico, incluindo
a explicação das próprias condutas.

Beauvois (1993, p. 195) definiu a norma de internaI idade do seguinte modo:

A realização de utilidades sociais pela valorização adquirida socialmente nas


democracias liberais das explicações dos comportamentos e dos reforços que
acentuam o papel causal do actor que tem tal comportamento ou ao qual
acontece algo de positivo ou negativo.

Os trabalhos suscitados pela norma de internalidade têm sido orientados em


três direcções (Beauvois e Dubois, 1988). Numa primeira linha de
investigação tentou-se verificar que as explicações internas, quer em matéria
de atribuição quer de locus de controlo, são socialmente desejáveis. Verificou-
se também que as explicações internas das condutas e dos reforços são mais
escolhidas pelos indivíduos que pertencem a grupos favorecidos do que pelos
que pertencem a grupos sociais desfavorecidos. Verificou-se, enfim, que a
norma de internaI idade, quer na explicação das condutas quer dos reforços, é
objecto de uma aprendizagem social (Documento 3.3).

Le Poultier (1986) cfectuou experiências com o intuito de testar hipóteses relativas


ao funcionamento da norma de internai idade no serviço social. Numa dessas
experiências tentou verificar que o facto de se expor às práticas educativas dos
trabalhadores sociais leva os jovens a estabelecerem uma ligação mais sistemática
entre o que fazem e o que lhes acontece (controlo interno). Estes jovens
encontravam-se em lares de acção educativa ou de acolhimento por dificuldades de
adaptação social. Metade da amostra encontrava-se nos lares há menos de um ano e
a outra metade há um ano ou mais. Destes jovens, estando expostos há mais tempo

302 © Universidade Aberta


às práticas educativas dos trabalhadores sociais. esperava-se que dessem
expl icações mais internas que os outros. Le Poullier elaborou um questionário de
locus de controlo (ROtleL 1966) com 20 itens cada um, com duas proposições entre
as quais o sujeito devia escolher uma.

Os resultados mostraram a existência de uma diferença significativa das médias


entre os sujeitos que estavam nos lares há menos de um ano e há um ano ou mais.
Os sujeitos que estavam há mais tempo nos lares tendiam a explicar o que lhes
acontece de modo mais interno. Estes resultados vão no sentido da aquisição da
norma da internaI idade nos que estão há mais tempo expostos às práticas
educativas do serviço social.

Documento 3.3 - Norma de internai idade no serviço social

6.2 A norma de internaiidade na sociedade portuguesa

Entre nós foram efectuadas duas experiências (Neto, 1993) directamente


inspiradas no paradigma experimental utilizado por Jellison e Green (1981).
Por um lado, pretendeu-se verificar até que ponto na sociedade portuguesa se
encontra a norma de internaI idade. Relembre-se que a sociedade portuguesa
parece menos interna que a americana (Relvas, Vaz Serra, Saraiva e Coelho,
1984). Por outro lado, tentou-se saber se existiria um padrão atribucional
generalizado como parece ser postulado por Jellison e Green. Os próprios
indivíduos, comparando-se com outros, considerar-se-ão sempre como tendo
uma tendência a julgar-se mais internos?

A primeira experiência foi efectuada para verificar até que ponto as crenças
que os acontecimentos associados com o comportamento humano,
determinadas por causas internas, são mais valorizadas socialmente do que as
crenças externas.

Partiu-se das hipóteses de que o aumento da internalidade expressa estaria


relacionado com o aumento da aprovação social e da percepção do sucesso
académico. Puderam ser confirmadas as hipóteses de que quanto maior é o
nível de internalidade maior é a aprovação social e a percepção do sucesso
académico.

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Se o lugar das categorias sociais numa cultura pode influenciar a explicação
dos reforços, efectuou-se uma segunda experiência com o intuito de testar a
hipótese da ausência de um padrão atribucional generalizado.

Na primeira condição, os sujeitos consideravam-se eles próprios mais internos


que a aluna do ensino superior nascida no estrangeiro de pais portugueses e
que só veio viver para Portugal aquando do ingresso no ensino superior. Na
segunda condição, os próprios sujeitos consideravam-se mais externos que a
aluna estrangeira do ensino superior residente em Portugal. Entre os scores
médios próprios nas duas condições não apareceram diferenças
estatisticamente significativas.

As hipóteses de que se partira nas duas expenencias apresentadas parecem


confirmadas. Na primeira experiência constatou-se que, quanto maior é o nível
de internalidade maior é a aprovação social e a percepção do sucesso
académico. Confirmou-se a desejabilidade social das explicações internas em
termos de locus de controlo, pois os sujeitos que fornecem mais respostas
internas são mais bem julgados pelos outros. Esta experiência permite
comprovar a generalização intercultural da forte desejabilidade social das
explicações internas. Se estudantes americanos do ensino superior estão
impregnados pela norma de internalidade, bem como sujeitos franceses, o
mesmo sucede com portugueses.

Em Portugal essa norma pode ser suscitada pela referência a estudantes


portugueses da segunda geração, ou seja, sujeitos que viveram longos anos
numa outra cultura. Relembre-se que a emigração é um fenómeno de vastas
proporções em Portugal (Neto, 1986, 1993) e que existem no tecido escolar
português inúmeros jovens regressados a Portugal (Rocha Trindade, Baptista,
Mendes, e Teodoro, 1988). O recurso à pessoa-estímulo de uma aluna da
segunda geração vai para além de um mero artifício laboratorial e inscreve-se
numa realidade social omnipresente na sociedade pOltuguesa.

Na segunda experiência, as estudantes portuguesas atribuíram maior


externalidade à estudante portuguesa da segunda geração e maior
internaiidade à estudante estrangeira em Portugal do que a si próprias. Não
parece, por conseguinte, que nos encontremos perante um padrão atribucional
generalizado.

Perguntamo-nos se não terá sido esta hetero-idealização de grupos


estrangeiros por parte das gentes lusas uma das características da identidade

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nacional que asseguraria desde há séculos, na busca de novos mundos, "a
realização de um imaginário que se satisfazia em si mesmo, pois que se ficou
no fascínio desses novos mundos, sem que deles trouxesse a riqueza
fecundante da nossa Terra" (Mal pique, 1990, p. 23).

Em suma, as investigações que se inscrevem nesta linha chamam a nossa


atenção para o facto de que o psicólogo intuitivo é normativo quando efectua
explicações causais. Não procura a verdade científica, mas a aceitação social.
Será a norma de internalidade a única que intervém na explicação dos
acontecimentos psicológicos e que define o que é a aceitação de uma
explicação? Beauvois (1993) entrevê a possibilidade de um dia ser posta em
evidência um feixe de normas que permitirá apreender melhor a normatividade
do psicólogo intuitivo.

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7. Níveis de análise distintos
mas relacionados?

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Neste capítulo foram abordados alguns construtos que gravitam na órbita do
controlo percebido. A questão que se pode levantar é a de que espécie de
distinções se podem fazer no âmbito do controlo percebido. Exporemos as
três distinções avançadas por Ferguson, Dodds, Ng, e Flannigan (1994).

Há uma primeira perspectiva que sugere que o controlo percebido se


relaciona, de um modo ou de outro, com tantos construtos que pode ser
considerado como um único construto genérico. Há efectivamente autores
(e.g., Langer, 1983; Fisher, 1984) que se referem ao controlo percebido de
modo genérico abarcando uma vasta área de questões, tais como locus de
controlo, atribuições ao controlo, manipulações experimentais do controlo,
modelos cognitivos e comportamentais do controlo percebido. Nesta área
também tem havido um certo número de aplicações do controlo percebido
como, por exemplo, ao envelhecimento e ao sobrepovoamento.

Há uma segunda perspectiva que considera que o controlo percebido pode


dividir-se em construtos que se relacionam com crenças do controlo percebido
e atribuições de controlo (e.g., Gregory, 1981; Ryckman, 1979; Palenzuela,
1984). As atribuições são vistas como sendo específicas ao contexto e estão
relacionadas, por exemplo com tipos específicos de acontecimentos (Weiner,
1985a), problemas (Bandura, 1977) ou comportamentos (Seligman, 1975).
Pelo contrário as crenças do controlo reflectem avaliações contextuais
independentes do estado do mundo (e.g., Rotter, 1966). É de notar, no
entanto, que construtos relacionados com atribuições e crenças acerca do
controlo não são necessariamente independentes, podendo interagir entre eles
(Alloy e Tabachnick, 1984).

Há uma terceira perspectiva que se questiona se o controlo percebido forma a


base do construto, é um subcomponente do construto, ou é um correlato do
construto. Assim o locus de controlo (Rotter, 1966) e a auto-eficácia
(Bandura, 1977) são construtos que se alicerçam na noção de controlo
percebido. O construto de estilo atribucional (Abramson, Seligman e Teasdale,
1978) que reflecte o modo preferencial das pessoas efectuarem atribuições, é
um construto que poderia ser considerado um subcomponente. Por exemplo
as pessoas que atribuem acontecimentos negativos a factores internos,
estáveis, globais e incontroláveis poderiam ser consideradas como tendo um
estilo atribucional "depressivogénico". Enfim, construtos tais como atitudes,
aceitação da situação e auto-estima poder-se-iam considerar correlatos do
controlo percebido.

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Estas três perspectivas foram testadas empiricamente (Ferguson et aI., 1994).
O modelo que forneceu um melhor ajustamento dos dados assentava numa
distinção entre construtos que se relacionam com crenças de controlo
percebido e atribuições acerca do controlo percebido. As implicações práticas
deste estudo denotam a necessidade de se efectuarem distinções claras entre
crenças e atribuições. É todavia necessária ainda mais investigação para
aclarar estes aspectos.

310 © Universidade Aberta


APLICAÇÕES: ESTILO ATRIBUCIONAL

As pessoas apresentam diferenças no seu estilo atribucional e estas diferenças


podem afectar a maneira como respondem a acontecimentos incontroláveis da
vida (Abramson et aI., 1978). O que determina as reacções a acontecimentos
incontroláveis baseia-se em três tipos de atribuições: internas versus externas,
estáveis versus instáveis e globais versus específicas. As pessoas que fazem
atribuições internas para acontecimentos incontroláveis tendem a experienciar
uma auto-estima mais negativa. As pessoas que fazem atribuições estáveis e
globais para acontecimentos incontroláveis são mais susceptíveis de se
sentirem desamparadas em acontecimentos futuros. Quando todos os três
tipos de atribuições negativas são usadas habitualmente para explicar
acontecimentos da vida que suscitam stress, esta tendência atribucional é
denominada de estilo explicativo depressivo, na medida em que se encontrou
que as pessoas com este padrão têm um maior risco de depressão (Sweeney,
Anderson, e Bailey, 1986). Para essas pessoas um acontecimento infeliz tem
uma causa interna ("É por minha culpa"), uma causa estável ("Será sempre
deste modo"), e uma causa global ("É deste modo em muitas situações
diferentes"). Pelo contrário, quando acontece algo de positivo às pessoas com
um estilo explicativo depressivo tendem a fazer atribuições externas, instáveis
e específicas.

o estilo e:rplicativo optimista contrasta com o estilo depressivo.


Os optimistas
tendem a explicar os acontecimentos negativos em termos de uma causa
externa (É por causa de alguém"), uma causa instável ("Não me acontecerá de
novo"), e uma causa específica ("É somente nesta área"). Por outro lado,
quando encaram acontecimentos positivos, os optimistas explicam-nos
efectuando atribuições internas, estáveis e globais.

Foi efectuada uma série de estudos com o intuito de se compreender melhor a


relação entre estilo explicativo e doença (Peterson e Seligman, 1987). Num
estudo mediu-se o estilo atribucional de estudantes universitários e pediu-se-
lhes para indicarem todas as doenças que tinham tido no mês passado.
Completaram esta medida da doença um ano após o teste inicial. Os resultados
indicaram que mesmo depois de se controlar o número de doenças referidas na
primeira sessão, os estudantes com um estilo explicativo optimista referiram

© Universidade Aberta 311


menos doenças e menos visitas a um médico para diagnóstico ou tratamento
de uma doença do que os que tinham um estilo explicativo depressivo.

Numa outra investigação utilizaram-se as respostas que 99 estudantes deram


em 1946 a um questionário acerca das experiências em tempo de guerra para
os classificar em termos do seu grau de estilo depressivo explicativo
(Peterson, Seligman, e VaiJ1ant, 1988). Muito embora o estilo não predissesse
a saúde nos jovens adultos (quando quase todos os homens eram saudáveis)
havia uma ligação entre estilo explicativo e doença lá pelos 45 anos, quando a
saúde se tornou mais variável. Após esta idade os homens que tinham um
estilo explicativo depressivo na sua juventude tendiam a ter mais problemas de
saúde que os que eram mais optimistas.

Foi ainda efectuado um estudo de arquivo com os membros do "Baseball Hall


of Fame" que jogaram entre 1900 e 1950 e que faleceram (Peterson e
Seligman, 1987). Em primeiro lugar procuraram nas páginas de antigos jornais
desportivos explicações dadas por estes jogadores para as suas vitórias e as
suas derrotas. Em seguida, recorreram a juízes independentes para avaliar
estas citações em internaI idade, estabilidade e globalidade. Finalmente
obtiveram a idade em que cada jogador tinha falecido. Os resultados indicaram
que os jogadores que deram explicações internas, estáveis e globais para os
maus acontecimentos morreram mais jovens, e os que explicaram
acontecimentos positivos como sendo devidos a factores externos, instáveis e
específicos morreram numa idade mais jovem. De uma forma geral este estudo
sugere que as pessoas com um estilo explicativo depressivo vivem menos
tempo que as que têm um estilo optimista.

Apesar de estarmos perante estudos impressionantes ainda não se tem uma


resposta à questão de porque é que o estilo explicativo influencia a saúde. Há
várias possibilidades que são avançadas por Peterson e Seligman:

1) Um estilo depressivo explicativo pode afectar o sistema


imunológico, de modo semelhante ao de como opera o stress.

2) As pessoas com estilo explicativo depressivo podem não ser boas


em resolver problemas; adiam a solução de problemas que
eventualmente muitas vezes se transformam em crises.

3) As pessoas com estilo explicativo depressivo podem negligenciar a


sua saúde e não dormir, nem alimentar-se nem exercitar-se de modo
apropriado.

312 © Universidade Aberta


4) As pessoas com estilo explicativo depressivo podem tornar-se
passivas quando encaram com a doença. Na medida em que não
procuram cuidados médicos ou não seguem o tratamento médico
prescrito, a sua saúde deteriora-se.

Seja qual for a explicação para a relação entre estilo explicativo e saúde, estes
dados chamam a nossa atenção para o facto de a interpretação que fazemos
dos acontecimentos influenciar profundamente as nossas acções futuras.

SUMÁRIO

Mesmo em situações determinadas pela sorte as pessoas têm uma ilusão de


controlo. Segundo os teóricos da aprendizagem social, se tem um locus de
controlo interno acredita que as suas acções podem influenciar o resultado dos
acontecimentos. Se tem um locus de controlo externo acredita que os
resultados são controlados por forças ou acontecimentos exteriores a si, tais
como destino, sorte ou providência. Existem diferenças individuais nas
percepções de controlo. Se algumas pessoas acreditam no controlo externo,
outras acreditam no controlo interno. As crenças no locus de controlo podem
afectar a nossa saúde física e a nossa adaptação psicológica.

Muitas vezes as pessoas reagem à perda do controlo seja ele real ou


percepcionado. Segundo a teoria da reactância, as pessoas tentarão restaurar o
seu sentimento de liberdade quando essas ameaças são percepcionadas. O
desânimo aprendido pode ser induzido mediante a exposição de uma pessoa a
uma situação em que os resultados ocorrem de modo não contingente. A
dependência auto-induzida pode desenvolver-se mesmo na ausência desses
resultados. A rotulagem de pessoas como sendo dependentes pode suscitar
abaixamentos no comportamento ulterior.

A abordagem da atribuição procura compreender como é que as pessoas


atribuem causas ao seu próprio comportamento e ao comportamento das
outras pessoas.

Foram examinadas as quatro teorias principais da atribuição. Heider i"


estabeleceu os alicerces defendendo que as pessoas percepclOnavam o

313
© Universidade Aberta
comportamento como sendo causado, e que a causa era quer interna
(disposição subjectiva) quer externa (situacional ou ambiental). As inferências
correspondentes são observações acerca do comportamento que concordam
com outras acções observadas. As inferências correspondentes são
aumentadas pelos efeitos não comuns, quando não há desejabilidade social e
quando a pessoa que está a ser observada actua sob livre escolha. O modelo
de covariação requer conhecimento sobre como uma pessoa se tem
comportado no passado (consistência), em diferentes situações (distintividade)
e como se comportam as outras pessoas (consenso). O modelo do esquema
causal aplica-se quando temos informações acerca de como uma pessoa se
comporta numa só ocasião. O modelo de Weiner diz respeito às explicações
para o sucesso e o fracasso de pessoas na realização de uma tarefa.

Foram assinalados quatro erros de atribuição: a) diferenças entre actor e


observador, os actores fornecem mais atribuições externas e os observadores
mais internas; b) o erro fundamental da atribuição, isto é, a tendências das
pessoas a darem geralmente atribuições internas mesmo se as externas podiam
ser mais apropriadas; c) complacência na atribuição, em que, por exemplo, as
pessoas fornecem atribuições para o sucesso e o fracasso que servem para
aumentar ou manter a sua auto-estima; d) efeitos temporais na atribuição, as
atribuições podendo tornar-se mais situacionais com o passar do tempo.

O contexto social afecta o tipo de atribuições que são feitas. Se geralmente as


pessoas tendem a fazer atribuições que aumentam o valor do endogrupo, as
posições relativas que ocupam os grupos no relacionamento intergrupal
também podem determinar as atribuições. A investigação intercultural tem
evidenciado a propósito das atribuições semelhanças e diferenças entre
culturas.

A norma de internaI idade consiste na valorização social da internalidade. A


valorização social dos acontecimentos psicológicos (comportamento e
reforços) acentua o peso dos actores como factor causal.

A propósito dos construtos que gravitam na órbita do controlo percebido há


evidência empírica que apoia a distinção entre crenças e atribuições. Trata-se
no entanto de aspectos que a investigação futura deve aclarar melhor.

Ao nível das aplicações neste capítulo foram apresentadas diferenças


individuais no estilo atribucional. As pessoas que tendem a atribuir
acontecimentos negativos a causas internas, estáveis e globais, e

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acontecimentos POSItIvOS a causas externas, instáveis e específicas têm um
estilo explicativo depressivo. Ao invés, as pessoas com um estilo explicativo
optimista tendem a enveredar por atribuições exactamente opostas. Os
optimistas tendem também a ser m~is saudáveis.

PARA IR MAIS LONGE

BARROS, BARROS e NETO, F.

1993 Psicologia do controlo pessoal: Aplicações


educacionais, clínicas e sociais. Braga: Instituto de
Educação da Universidade do Minho.

Este trabalho consta de duas partes: a primeira sobre o locus de controlo, e a


segunda sobre a atribuição de causalidade. Em cada uma delas procura-se
clarificar os conceitos, confrontando-os com outros tópicos mais ou menos afins
(em particular com o desânimo aprendido e com a expectativa de eficácia
pessoal), e onde se trata dos instrumentos de avaliação e das aplicações ao campo
pedagógico, clínico e social. No final, em apêndice, apresentam-se algumas
escalas adaptadas para a população portuguesa.

DESCHAMPS, l.-C. e CLÉMENCE, A.

1987 L'explication quotidienne. Cousset: Delval.

Trata-se de uma obra que expõe pormenorizadamente as teorias clássicas da


atribuição. Na medida em que estas teorias se entrecruzam com outros conceitos
da Psicologia Social esta obra constitui de certo modo uma introdução à
Psicologia Social.

GRAHAM, S. e FOLKES, V. S. (Ed.)

1990 Attributiol1 theory: Aplications to achievement,


mental health, and interpersonal conflict. Hillsdale,
Nl: ErIbaum.

Esta obra oferece inúmeros exemplos de como a teoria da atribuição pode ser
aplicada em contextos educativos, empresariais e de saúde mental.

© Universidade Aberta 315


WEARY, G., STANLEY, M.A. e HARVEY, J. H.

1989 Attribution. New York: Springer-Verlag.

Este livro apresenta uma excelente síntese de diferentes linhas de investigação na


área da atribuição causal.

ACTIVIDADES PROPOSTAS

1) Pensa que alguém que dependa do seu horóscopo para se guiar é uma
pessoa interna ou externa?

2) Pensa que o locus de controlo se desenvolve de modo diferente em


resultado do género, da classe social e da cultura da pessoa?

3) O que é o processo de atribuição causal? Que tipos de erros são


susceptíveis de fazerem as pessoas ao usar o processo de atribuição?

4) Defina reactância e desânimo aprendido. Como se pode predizer quando


ocorrerão?

5) Quais são as características comuns das teorias de atribuição de Jones, de


Kelley e de Weiner? Quais são as principais diferenças?

6) Replique a experiência de Langer sobre o controlo. Langer deu a alguns


sujeitos bilhetes da lotaria e deixou que os outros escolhessem os seus
próprios bilhetes. Dê a metade dos sujeitos um número e deixe que os outros
escolham o seu próprio número. Pergunte-lhes até que ponto estão seguros
que o seu número será seleccionado. Pergunte-lhes se acreditam que tal é
devido à sorte ou ao controlo.

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I\: ATITUDES

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TÁBUA DE MATÉRIAS

1. Introdução

2. Sinopse Histórica

3. O que são as Atitudes'?

3.] Modelos de atitudes

3.2 Características

3.3 Funções psicológicas das atitudes

4. Atitudes e Noções Conexas

4.1 Crenças

4.2 Opiniões

4.3 Valores

4.4 Ideologia

5. Formação das Atitudes

5.1 Fontes de aprendizagem

5.2 Condicionamento clássico

5.3 Condicionamento operante

5.4 Aprendizagem social

5.5 Aprendizagem por experiência directa

5.6 Observação do próprio comportamento

6. Medida das Atitudes

6.] Análise de conteúdo de comunicações

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6.2 Escala de avaliação com um item

6.3 Escala de distância social

6.4 Escala de Thurstone

6.S Escala de Likert

6.6 Escala de Guttman

6.7 Diferenciador semântico

6.8 Medidas indirectas

7. Atitudes e Comportamento

7.1 O dilema da consistência atitude-comportamento

7.2 Condições metodológicas da predição atitude-comportamento

7.3 Modelos teóricos de predição do comportamento

7.3.1 A abordagem de variáveis moderadoras

7.3.2 As teorias da acção reflectida e do comportamento

planificado

Aplicações: Atitudes políticas e comportamento

Sumário

Para ir mais longe

Actividades propostas

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Objectivos de aprendizagem

o estudo deste capítulo deve permitir ao aluno:


• Considerar a natureza das atitudes;

• Estudar as funções das atitudes;

• Delinear como se formam as atitudes;

• Descrever como é que as atitudes podem ser medidas;

• Identificar os principais problemas na investigação sobre atitudes­


comportamento;

• Descrever como é que a investigação atitude-comportamento pode


ser melhorada;

• Descrever algumas áreas da investigação atitude-comportamento em


que os comportamentos são previstos com sucesso;

• Considerar a influência do contexto situacional, das normas sociais e


de factores de personalidade na correspondência entre atitude e
comportamento;

• Descrever os modelos da acção reflectida e do comportamento


planificado;

• Discutir a questão dos efeitos de grupos de referência nas atitudes


políticas das pessoas a longo termo.

Sans doute y-a-t-il merveilleuse harmonie quand la parole et le geste vont de


paIr.

Montaigne

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I'

1. Introdução

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Desde os alvores da década de 60 até 1974, Portugal esteve envolvido em
guerra contra os movimentos de libertação de ex-colónias portuguesas no
continente africano. Esta guerra colonial foi tremendamente custosa em vidas
humanas e em termos financeiros, para além de nefastas consequências
psicológicas para os combatentes e seus familiares. Salazar e posteriormente
Marcelo Caetano recusaram-se a alterar a sua política de envolvimento militar
apoiando-se nas atitudes da maior parte da população portuguesa que seria
supostamente a favor das políticas seguidas.

São poucas as questões que hoje em dia possam suscitar tanta paixão entre as
pessoas como a questão do aborto. Na discussão desta questão surgem muitas
vezes dois valores básicos: vida e liberdade. Activistas pró-vida defendem que
o aborto tira o direito a viver. Já activistas a favor do aborto defendem que a
verdadeira questão gira à volta do direito da mulher em escolher. Não conheço
onde oCa) leitor(a) se situa em relação à questão do aborto, mas estou quase
certo que tem uma atitude positiva ou negativa. Se fizer uma introspecção das
bases desta sua atitude, seja qual for a sua tonalidade, muito possivelmente há
um certo número de semelhanças que emergem. Em primeiro lugar, as suas
atitudes em relação ao aborto estão fortemente associadas a valores que
defende pessoalmente. Em segundo lugar, estas atitudes assentam num certo
número de crenças. Em terceiro lugar, estas atitudes aparecem associadas a
uma emoção forte ou afecto. A quarta semelhança susceptível de aparecer para
modelar a sua atitude poderá ser algum comportamento passado ou
experiência pessoal.

Estes exemplos chamam a nossa atenção para a importância das atitudes no


estudo do comportamento humano. O conceito de atitude tem ocupado um
lugar de destaque ao longo da história da psicologia social. Pelo menos
durante meio século foi o principal foco de atenção quer de sociólogos quer de
psicó logos. Thomas e Znaniecki (1918) definiram o campo da psicologia social
como sendo "o estudo de atitudes" e Gordon Allport (1935) referiu-se à
atitude como sendo "a pedra angular no edifício" do dOllÚnio em crescimento
da psicologia social.

Apesar dos desacordos existentes, a propósito de determinados aspectos das


atitudes, o seu estudo reveste-se ainda na actualidade de grande interesse para
os investigadores em ciências sociais e humanas. Todavia outros grupos sócio-
profissionais, para além dos cientistas sociais, também se interessam pelo
estudo das atitudes e da sua medida. Os políticos interessam-se por saber o seu
barómetro de popularidade. Os industriais querem conhecer as preferências

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As atitudes podem modelar profundamente as acções e os modos de vida das pessoas

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das populações em relação a detergentes, máquinas, perfumes, bebidas,
medicamentos. Institutos de sondagens têm. aparecido para fornecer as
informações pretendidas por esses grupos. Muito provavelmente o leitor já foi
contactado por algum entrevistador de um instituto de sondagens para
recolher a sua atitude em relação a determinada questão: droga, aborto,
inflação...

Se os psicólogos sociais têm dispendido muito do seu labor à volta da questão


das atitudes, isso explica-se em grande parte pela ubiquidade do conceito na
vida quotidiana. O outro, a sociedade ou até a própria pessoa são outros
tantos objectos em relação aos quais um indivíduo, um grupo restrito ou uma
colectividade podem exprimir atitudes com maior ou menor compromisso. É
pois facilmente compreensível a importância de que se pode revestir o
conhecimento objectivo das atitudes, a previsão da sua evolução e, se possível,
a sua mudança.

Após uma breve alusão à história da investigação no dOl1Únio das atitudes,


examinaremos neste capítulo o que são as atitudes, como se diferenciam de
noções conexas, como são formadas e medidas, e, finalmente, as relações entre
atitude e comportamento.

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2. Sinopse histórica

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o termo atitude, derivado da palavra latina "aptitudo" que significa a
disposição natural para realizar determinadas tarefas, designou a posição
corporal dos modelos dos pintores italianos do renascimento. Mediante
determinada posição corporal era expresso um sentimento, um desejo. Assim,
a atitude recebe uma significação que é susceptível de ser compreendida pelas
outras pessoas. Mais tarde, o termo entrou na linguagem corrente para se
referir já não tanto a uma postura corporal como a uma "postura da mente".
Hoje em dia, quer para o público em geral quer para os psicólogos sociais, as
atitudes referem-se a estados mentais.

Segundo Kahale (1984), a introdução da atitude na literatura científica dever-


se-ia a Charles Darwin no seu livro "ExpressiOll oi the emotions in man and
animais" publicado em 1872. Para Darwin este conceito implica respostas
motoras estereotipadas associadas com a expressão de uma emoção,
geralmente no sentido de postura de todo o corpo. As atitudes neste sentido
desenvolver-se-iam para instaurar uma função de restabelecimento do
equilíbrio.

o termo atitude vai aparecer relativamente cedo em psicologia experimental


em cientistas alemães e, em particular, em Oswald Külpe. No começo deste
século Külpe pôs em evidência o papel das instruções fornecidas aos sujeitos
para as respostas que davam em experiências. As suas respostas eram
melhores se elas diziam respeito ao aspecto a que se tinha chamado a atenção
antes da experiência. Ou seja, perante uma mesma estimulação o sujeito
respondia diferentemente consoante a orientação da sua percepção. A atitude
permitiria, pois, explicar a relação flutuante entre estímulo e resposta.

A introdução do conceito de atitude na literatura sociológica é geralmente


atribuída a Thomas e Znaniecki (1918) que estudaram os problemas com que
se confrontavam os emigrantes polacos nos Estados Unidos. Utilizaram o
conceito de atitude para se referirem ao sentimento que as pessoas dirigiam
para algum objecto, como dinheiro ou trabalho. Esta mudança de ênfase
fisiológico para psicológico teve profundo efeito nas ciências sociais. Allport
observara que antes da publicação desta obra o termo atitude só tinha
aparecido esporadicamente na literatura sociológica. Todavia, após a
publicação desta obra monumental, o conceito foi entusiasticamente adoptado
por um número crescente de autores. A maior parte dos psicólogos sociais
adoptaram o construto de atitude em referência a acontecimentos mentais.

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Subjacente à popularidade suscitada pela noção de atitude parece estar a
suposição que muitos psicólogos sociais fizeram que as atitudes eram muito
simplesmente "comportamentos em miniatura". Nesta ordem de ideias, para se
poder prever o comportamento, tudo o que se tinha a fazer era determinar a
atitude das pessoas em relação a um objecto do comportamento. O problema
tornara-se então metodológico, pois era necessário implementar utensílios
adequados para medir as atitudes. Essa suposição contribuiu para a eclosão de
uma literatura florescente sobre a medida das atitudes nos anos 30.

McGuire (1985) assinala três períodos principais no estudo das atitudes, tendo
em conta a sua focalização dominante. O primeiro período corresponde aos
anos 30, que como se disse, focaliza-se sobretudo na medida das atitudes. O
segundo período ocorreu nos anos 50 e 60 em que se desenvolveram a maior
parte das teorias sobre a mudança de atitudes. O terceiro período está em
curso e focaliza-se preponderantemente nos sistemas atitudinais.

Recentes revisões da literatura estão de acordo em considerar que o grande


interesse na investigação sobre atitudes continuará no futuro (Chaiken e
Stangor, 1987; Tesser e Shaffer, 1990; Olson e Zanna, 1993). Seja como for, o
conceito de atitude tem sido sempre nuclear em psicologia social. Embora a
focalização de determinados aspectos tenha mudado ao longo dos anos,
McGuire (1985) observou que cada ano cerca de 5% do total da literatura
publicada em psicologia - 5% perfaz cerca de 1 000 novos estudos anualmente
- versa algum aspecto das atitudes. Trata-se de um corpo impressionante de
material novo cuja acumulação ao longo do tempo representa um investimento
extraordinário em labor científico e em dinheiro.

Esta multiplicidade de investigações suscita uma grande diversidade de


definições, sobretudo porque as atitudes não podem ser directamente
observadas. Todos nós vimos na televisão manifestações contra o teste de
armas nucleares, mas ninguém pode ver ou tocar o que é uma atitude pro-teste
nuclear ou anti-teste nuclear. Por isso a atitude é um construto hipotético que
os investigadores tentam apreender por meio de definições conceptuais e de
elaboradas técnicas de medida.

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3. O que são as atitudes?

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o que é exactamente uma atitude? Dado tratar-se de um termo popular
utilizado na vida quotidiana, quase todas as pessoas têm uma ideia do seu
significado. Contudo os psicólogos sociais devem definir o termo de modo
preciso se pretendem utilizá-lo como um conceito científico.

As definições que são propostas na literatura são tão numerosas que quase
todos os autores que trataram deste tópico avançaram uma. Dawes e Smith
(1985), numa revisão sobre medida de atitude e opinião, confirmam que hoje
em dia ainda permanece tanta controvérsia na definição de atitude como
quando foi proposta pela primeira vez. Ainda é verdade, como já Gordon
Allpport argumentou há muitos anos, que se medem as atitudes com maior
sucesso do que são definidas.
Esta multiplicidade de definições deixa transparecer que este conceito é uma
realidade psico-social ambígua e difícil de apreender.

3.1. Modelos de atitudes

Os modelos são uma espécie de planos de arquitecto que tornam a sua


operacionalização mais fácil. Na figura 4.1 estão representados três dos
modelos que mais têm chamado a atenção dos investigadores.
Uma abordagem tradicional tem considerado as atitudes como sendo
multidimensionais com uma organização relativamente durado ira. Para o
modelo tripartido clássico a atitude é uma disposição que resulta da
organização de três componentes: afectivo, cognitivo e comportamental. Este
modelo foi proposto por Rosenberg e Hovland (1960) e tem a vantagem de
distinguir de modo suficiente as três dimensões para se poderem
operacionalizar. A divisão da experiência humana em pensamento, sentimento
e acção tem aliás uma longa história no pensamento Indo-europeu (McGuire,
1989). O componente afectivo de uma atitude refere-se aos sentimentos
subjectivos e às respostas fisiológicas que acompanham uma atitude. O
componente cognitivo diz respeito a crenças e opiniões através das quais a
atitude é expressa, muito embora nem sempre sejam conscientes. O
componente comportamental diz respeito ao processo mental e físico que
prepara o indivíduo a agir de determinada maneira. Por exemplo, uma pessoa
pode crer que os estudantes universitários são alTogantes (componente cognitivo),
pode sentir-se tensa em face a um estudante universitário (componente afectivo) e
pode recusar-se a dar boleia a um estudante para ir assistir às suas aulas
(componente comportamental). É necessário ter presente que nem sempre

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Estímulo Variáveis intermediárias Resposta

A. Modelo tripartido clássico de atitude

Cognição Medidas
• verbais
• fisiológicas
Objecto de atitude Afecto
ou
1 I....
--f

• comporta-
1 Comportamento I mentais

B. Modelo unidimensional clássico de atitude

Medidas
1 Objecto de atitude Atitude
• verbais
(afecto)
• fisiológicas
ou
• comporta-
mentais

C. Modelo tripartido revisto de atitude

I Cognição
Medidas
• verbais
• fisiológicas
IObjecto de atitude f-i Vi Afecto Atitude I 1---- ou
/ • comporta-
mentais

I Comportamento r

Figura 4.1- Estrutura das atitudes segundo três dos modelos mais utilizados

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as atitudes são expressas directamente em acções. Voltaremos a este assunto
mais tarde.

Não é claro o modo como se interrelacionam cada um destes componentes


(Bagozzi, 1978). Em muitas situações a presença de um componente implica a
presença dos outros. Suponha que a sua atitude em relação à caça à raposa é
extremamente negativa. Há uma festa e encontra lá uma pessoa que costuma ir
à caça da raposa começando a contar as suas aventuras a esse respeito. Pode
sentir repulsa por essa pessoa (componente afectivo), formar diversas opiniões
negativas acerca do caçador (componente cognitivo) e tentar ver o modo de se
desembaraçar da conversa com essa pessoa (componente comportamental).

Investigação mostrou também que cada componente pode contribuir com algo
de único para o que se chama atitude. Breckler (1984) efectuou um estudo
para testar as contribuições independentes dos componentes afectivo,
cognitivo e comportamental em relação às cobras. Breckler mediu o ritmo
cardíaco e os humores das pessoas na presença da cobra (componente
afectivo) e as suas crenças favoráveis ou desfavoráveis acerca das cobras
(componente cognitivo) e, por fim, perguntou às pessoas como reagiriam a
uma cobra e observou a que distância queriam aproximar-se de uma cobra
(componente comportamental). Encontrou que cada componente, se bem que
moderadamente relacionado com os outros, forneceu uma contribuição
importante e distinta para o construto que chamamos de atitude. As três
dimensões convergem, por conseguinte, para assegurar uma significação
comum, mas também existe urna validade dsicriminante entre cada uma delas.

Muito embora tenha havido um certo número de experiências semelhantes à de


Breckler que apoiaram o modelo, também um certo número de críticas têm
sido endereçadas. Por exemplo, numa perspectiva teórica, o modelo tem sido
criticado por ser pouco parcimonioso e apresentar deste modo obstáculos para
se verificar empiricamente (Greenwald, 1989). Já numa perspectiva
metodológica, Dawes e Smith (1985) consideram que as correlações não
podem ser suficientes para determinar a validade de construto do modelo.

Outros consideram a atitude como sendo unidimensional, isto é, uma atitude


representa a resposta avaliativa (afecto), favorável ou desfavorável, em relação
ao objecto de atitude. A atitude constitui, pois, a resposta que situa o objecto
numa posição do continuum de avaliação. Trata-se do modelo unidimensional
clássico. Por exemplo, em muitos estudos a dimensão avaliativa do
diferenciador semântico que abordaremos mais adiante (Osgood, Suci, e

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339
Tannenbaum, 1957) é utilizada sozinha, sem outras dimensões, como sendo a
única medida de atitudes. Neste âmbito Fishbein e Azjen (1975, p. 6) definem
a atitude como sendo "uma predisposição aprendida para responder de modo
consistentemente favorável ou desfavorável em relação a dado objecto". Uma
definição semelhante foi utilizada muitos anos antes por Thurstone (1928) que
definiu a atitude como a intensidade de afecto a favor ou contra um objecto
psicológico. Para esta abordagem a atitude em relação ao aborto, por exemplo,
seria definida pela resposta afectiva ao aborto.

Recentemente, Zanna e Rempel (1988) delinearam o modelo tripartido revisto


que integra todas estas concepções das atitudes (figura 4.1). Começam por
definir a atitude como uma categorização de um objecto-estímulo ao longo de
uma dimensão avaliativa (por exemplo: aborto - favorável... ... desfavorável -).
Neste modelo a atitude é, por conseguinte, um julgamento (isto é, uma
opinião) que exprime um grau de aversão ou de atracção num eixo bipolar.
Pressupõem então que esta avaliação pode basear-se em três espécies de
informação: informação cognitiva, informação afectiva ou informação baseada
no comportamento passado. Distingue-se pois atitude que consiste num
julgamento a "frio" de que se gosta ou se detesta; o afecto que se refere à
emoção sentida; as crenças que são as consequências negativas ou positivas
associadas ao objecto; e a estrutura cognitiva de antecipação da acção. A
avaliação pode basear-se em qualquer espécie de informação ou qualquer
combinação de espécies. Por outras palavras, uma atitude pode, por exemplo,
só derivar de cognições, ou de cognições e afecto, ou de cognições, afecto e
comportamento passado. Por exemplo, em relação ao preservativo, pode
exprimir-se uma atitude positiva ao considerar-se um meio de protecção contra
o SIDA (informação cognitiva); já numa perspectiva mais hedonista (por
exemplo a interrupção das brincadeiras sexuais para colocar o preservativo) a
atitude com base numa informação mais afectiva poderá ser negativa. Como
está indicado pelas flechas da figura 4.1 é recomendada a medida dos quatro
componentes do modelo. Trata-se pois de um modelo que apresenta uma
síntese de modelos precedentes abrindo avenidas estimulantes para a
investigação.

A definição de atitude como avaliação está-se a tornar cada vez mais usual em
psicologia social, se bem que ainda não seja universal. Está a substituir uma
definição "tripartida" da atitude previamente muito difundida: o chamado
"modelo ABC" de atitude. O grau de discrepância entre medidas empíricas dos
três presumidos componentes da mesma atitude tidos por uma pessoa em

340
© Universidade Aberta
relação a um só objecto é geralmente tão grande que o modelo tripartido tem
sido amplamente afastado (Eagly e Chaiken, 1993). E, para além disso, ao
definir-se o comportamento como um componente de atitude, o problema de
qualquer suposta relação entre atitude e comportamento é simplesmente
afastado. Tal não ajuda a resolver um dos problemas principais da psicologia
social, isto é, as atitudes predizem o comportamento?

3.2 Características

A atitude enquanto realidade psicológica possui determinadas características


oriundas das realidades físicas. Pode-se encarar como um continuum psíquico,
ou seja, uma entidade que tem um começo e um termo de modo que se possa
passar de um ao outro por variações de grau. Deste continuum ressaltam
quatro características: a direcção, a intensidade, a dimensão e a acessibilidade.

A direcção designa o nível positivo ou negativo do objecto de atitude. Em


relação a este objecto o sujeito pode sentir atracção ou repulsa. Somos a favor
ou contra a plantação de eucaliptos? A direcção exprimir-se-á pela
concordância ou discordância em relação à plantação de eucaliptos. O sujeito
também pode ser indiferente a essa questão. Considerar-se-á esta resposta
ainda uma atitude? O problema colocado por essa questão resolve-se caso se
considere uma outra característica das atitudes, a intensidade. Neste caso as
diferentes posições dos sujeitos são expressas num continuum que oscila entre
dois extremos (favorável e desfavorável) com um ponto intermédio.

A intensidade da atitude exprime-se pela força da atracção ou da repulsa em


relação ao objecto. Podemo-nos opor fortemente à plantação de eucaliptos ou
levemente. Na figura 4.2 a intensidade está representada pela escala
neutralmente, moderadamente, totalmente.

A intensidade foi e continua a ser a propriedade que mais tem atraído a


atenção dos investigadores. Foi objecto das teorias das escalas clássicas de
medida e recorre-se a ela para determinar o grau de mudança de atitude.

Uma subpropriedade associada à intensidade é a extremidade. Se indivíduos


sentem um sentimento positivo, podem exprimi-lo por meio de uma atitude
positiva desde "ligeiramente" a "totalmente positiva". Quanto mais a opinião
expressa se aproxima das categorias extremas do continuum "discordo

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totalmente" ou "concordo totalmente", mais se está perante uma atitude
polarizada. Já há muito tempo pode ser demonstrado que uma atitude bem
definida tende a ser extrema (Allport e Hartman, 1925).

DISCORDO DISCORDO INDIFERENTE CONCORDO CONCORDO

TOTALMENTE TOTALMENTE

DIRECÇÃO

INTENSIDADE

Figura 4.2 - Representação de um continuum de atitude

A dimensão da atitude permite-nos apreender se se trata de um objecto


complexo e que não está bem definido. Assim, uma atitude pode ser
unidimensional, se abarca um só domínio da actividade comportamental, e
multidimensional se abrange vários domínios. Pode acontecer que construtos
psicológicos sejam encarados como sendo quer unidimensionais quer
multidimensionais. É o caso, por exemplo, do construto locus de controlo
(Barros, Barros, e Neto, 1993) que vimos no capítulo anterior. Os autores que
elaboraram escalas unidimensionais consideraram à priori a variável
internalidade-externalidade como uma característica fundamental do
funcionamento psicológico dos sujeitos. Nestas escalas obtém-se um score
global de internalidade ou de externalidade mediante o carácter de aditividade
dos itens. Por exemplo, a escala I-E de Rotter (1966) tem subjacente esta
configuração. Os autores que elaboraram escalas multidimensionais rejeitam a
hipótese da existência de uma expectativa geral de controlo para todos os
domínios e espartilham o conceito em várias dimensões. São assim propostas

342 © Universidade Aberta


várias sub-escalas consoante as dimensões encaradas. Por exemplo, a escala de
Levenson (1974) é de concepção multidimensional.

A direcção da atitude, os seus graus e dimensão permitem caracterizar uma


atitude, não obrigando a defini-la no sentido que vimos anteriormente. Nesta
perspectiva, para Debaty (1967, p. 14) "a atitude será um síndrome originado
pela convergência de diferentes sintomas manifestos que serão as opiniões
verbais ou não verbais de um sujeito a propósito de um objecto definido".

Uma característica muito estudada na década de oitenta foi a acessibilidade da


atitude, ou seja, a solidez da associação entre o objecto de atitude e a sua
avaliação afectiva. Por exemplo, pode ser avançada uma definição mais prática
da noção de "não atitude". Foi demonstrada com muita frequência a notável
capacidade das pessoas em responder a itens das escalas de atitudes em
relação a determinado objecto. Um continuum "não atitude-atitude" foi
proposto por Fazio, Sanbonmatsu, Powell e Kardes (1986). Num dos
extremos do continuum encontra-se a "não atitude", isto é, não existe na
memória nenhuma avaliação à priori do objecto de atitude. Seguidamente, à
medida que nos deslocamos ao longo do continuum, a avaliação afectiva
aumenta e a sua acessibilidade torna-se mais provável. Finalmente, no outro
extremo do continuum aparece uma atitude bem definida, seja ela negativa ou
positiva, amplamente acessível a partir da memória de modo espontâneo e
automático. Quanto mais a resposta é automática, mais se pode concluir que a
atitude está cristalizada e, por conseguinte, é mais provável a predição do
comportamento.

Para além das características referidas, as atitudes têm outras características


básicas. Em primeiro lugar, as atitudes são inferidas do modo como os
indivíduos se comportam, podendo-se aqui incluir o comportamento de
preencher um questionário. Em segundo lugar, as atitudes são dirigidas em
relação a um objecto psicológico ou categoria. Os objectos de atitude podem
ser diversos. Podem ser objectos tangíveis (cadeiras, casas, automóveis),
pessoas (pais, presidente da república, professores), grupos (socialistas,
esquimós), ideias abstractas (democracia, justiça, tolerância) ou
comportamentos (beber, fumar, preferências sexuais). Em terceiro lugar, as
atitudes são aprendidas, isto é, provêm da experiência. Dado que as atitudes
são aprendidas, podem ser mudadas. Note-se, todavia, que recentemente
houve psicólogos sociais que propuseram que algumas das nossas atitudes
podem ser influenciadas por factores genéticos (Eaves, Eysenck, e Martin,
1989; Tesser, 1993). Por exemplo, as atitudes em relação à música podem

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desenvolver-se em parte por causa de factores temperamentais influenciados
geneticamente. Talvez as pessoas que tendem a gostar da paz e da
tranquilidade prefiram música clássica, ao passo que pessoas que gostam de
muita estimulação prefiram jazz e rock. Finalmente, as atitudes influenciam o
comportamento. A atitude que se tem em relação a um objecto pode fornecer-
nos uma razão para nos comportarmos em relação a esse objecto de
determinado modo.

3.3 Funções psicológicas das atitudes

Um outro modo de se obter uma compreensão mais aprofundada das atitudes


é perguntar porque é que as pessoas as têm. As atitudes são úteis para a
pessoa que tem uma atitude. É difícil imaginar porque é que uma pessoa teria
uma avaliação razoavelmente consistente de um referente, seja um Presidente
da República ou um automóvel, se tal atitude não servisse algum objectivo.
Quais são as funções das atitudes? Os psicólogos sociais forneceram respostas
a esta questão em duas épocas diferentes, uma nos anos 50 (Katz, 1960;
Smith, Bruner e White, 1956) e outra que começa nos anos 80. Smith et ai.
(1956) atribuem três funções às atitudes: adaptação social, exteriorização e
avaliação do objecto de atitude. Quanto a Katz (1960) menciona as quatro
funções seguintes: conhecimento, instrumentalidade (meios a atingir), defesa
do eu (protecção da nossa auto-estima) e expressão de valores (permitindo às
pessoas mostrar os valores com que se identificam e as definem). Estas
funções, indicadas no quadro 4.1, estão intimamente associadas a diferentes
perspectivas teóricas em psicologia.

As atitudes podem ter três funções: 1) ajudam a definir grupos SOCIaIS, 2)


ajudam a estabelecer as nossas identidades, e 3) ajudam o nosso pensamento e
comportamento (Schlenker, 1982; Pratkanis e Greenwald, 1989).

Tentemos ilustrar a primeira função. O que leva as claques de futebol a


agruparem-se e a expressarem do modo mais variado o apoio ao seu clube de
futebol é precisamente a atitude partilhada em relação ao seu clube e às suas
vitórias ou derrotas. Argumentarão certas pessoas que estes grupos dos
domingos à tarde num estádio podem não ser muito importantes, só existindo
enquanto dura o jogo. Todavia há atitudes mais importantes defendidas por
grupos, porventura considerados mais importantes. Por exemplo, a atitude

344 © Universidade Aberta


partilhada em relação ao racismo é o elo susceptível de levar as pessoas a criar
um associação anti-racista. Por isso as atitudes são elementos fulcrais para
manter os grupos.

Tipo de atitude Função suscitada pela atitude Perspectiva psicológica

Conhecimento Ajuda a pessoa a estruturar o Cognitiva


mundo em vista a dar-lhe
sentido

Instrumentalidade Ajuda a pessoa a obter Behaviorista


recompensas e a ganhar
aprovação dos outros

Defesa do eu Ajuda a pessoa a proteger-se de Psicanalítica


reconhecer as verdades básicas
sobre si

Expressão de valores Ajuda a pessoa a expressar Humanística


aspectos importantes do
autoconceito

Quadro 4.1 - Funções psicológicas das atitudes

Uma segunda função das atitudes é que elas contribuem para a auto-
representação. Se um conjunto de atitudes são um elemento fulcral de certos
grupos sociais, as atitudes também são elementos fulcrais nas representações
que as pessoas têm delas próprias. Quem foram os capitães de Abril sem as
suas atitudes em relação à guerra colonial e à liberdade? Quem é Nelson
Mandela sem as suas atitudes em relação ao apartheid?

As atitudes constituem também elementos importantes da vida cognitiva das


pessoas. Guiam o modo como se pensa, sente e age. É precisamente porque as
claques desportivas têm as atitudes que têm que estão tão atentas ao que se
passa no relvado, avaliam as boas ou más jogadas da sua equipa, cantam,
assobiam ou mergulham num silêncio sepulcral.

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4. Atitude e noções conexas

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Nem sempre se encontra uma ausência de confusão conceitual na literatura
sobre as atitudes o que é devido em grande parte ao facto de que os autores
não definem os termos utilizados do mesmo modo. Vimos precedentemente os
usos básicos que se têm feito da noção de atitude tendo-se em particular
assinalado a tendência que distingue os componentes afectivo, cognitivo e
comportamental, utilizando-se diferentes termos para cada uma dessas
realidades. Apesar disso, há noções conexas susceptíveis de produzirem uma
certa confusão no leitor menos precavido. Não tentaremos diferenciar a atitude
de todas essas noções conexas agora, mas tão somente de crenças, de opiniões
e de valores. Mais adiante abordaremos as suas relações com as
representações sociais (capítulo 5).

4.1 Crenças

o modo de relacionamento de crenças com atitudes tem muito a ver com a


conceptualização que é feita das atitudes previamente referida.

Para autores que se situam num modelo tripartido das atitudes, as crenças
podem ser consideradas como o componente cognitivo das atitudes (e.g.,
Krech, Crutchfield, e Ballachey, 1962). Esta perspectiva pode suscitar
problemas, pois implica uma consistência entre os três componentes das
atitudes. Já autores que consideram a atitude como sendo unitária, tais como
Fishbein e Ajzen (] 975) definem as crenças como julgamentos que indicam a
probabilidade subjectiva de uma pessoa ou um objecto tenha uma
característica particular. Nesta perspectiva, crenças e atitudes são claramente
distintas: as crenças são cognitivas (pensamentos e ideias) enquanto que as
atitudes são afectivas (sentimentos e emoções). Por exemplo, crer que um
gelado é saboroso não é a mesma coisa que sentir-se feliz por comer um
gelado quanto está calor.

4.2 Opiniões

Por vezes os termos opinião e atitude têm sido utilizados como sinánimos.
Efectivamente, McGuire (1969, p. 152) sugeriu tratar-se de "normas à procura
de uma distinção e não tanto de uma distinção à procura de uma

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terminologia". Assim, o termo opinião continua a ser amplamente utilizado, em
particular no âmbito da investigação de inquérito e de sondagens de opinião
pública que se focalizam em atitudes partilhadas e crenças de vastos grupos de
pessoas. Geralmente em sondagens de opinião, atitudes, crenças e intenções
comportamentais aparecem combinadas. Por exemplo, numa sondagem pode-
se perguntar aos sujeitos "Gosta do candidato X para Presidente da
República?", "Pensa que esse candidato a Presidente da República se interessa
pelos problemas das minorias étnicas?" e "Se a eleição fosse amanhã votaria no
candidato X para Presidente da República?" Quando contactar da próxima vez
com resultados de sondagens de opinião pública pode tentar analisar as
questões segundo este esquema tripartido.

Acontece todavia que muitas vezes são efectuadas distinções entre atitudes e
opiniões, havendo no entanto diferentes perspectivas sobre o tipo de distinção
a ser efectuada. Encontra-se frequentemente na literatura uma definição de
opinião como sendo mais específica que a atitude. ABport (1935) situa os
quatro conceitos - opinião, atitude, interesse e valor - ao longo de um mesmo
continuum indo do mais específico ao mais geral. Encontra-se uma concepção
semelhante em Hovland, Janis e Kelley (1953).

Por sua vez, Eysenck (1954) distingue quatro TIlVeIS: a opmIao acidental, a
opinião habitual, a atitude e a ideologia. A opinião acidental não é de nenhum
modo característica do indivíduo (a pessoa X diz hoje algo e no dia seguinte
diz o contrário). A opinião habitual, relativamente constante, é característica
do indivíduo (uma pessoa patrioteira reage em geral sempre do mesmo modo
quando se critica o seu país). A atitude, conjunto de opiniões estáveis
interligadas, corresponde a um componente importante da personalidade.
Enfim, o nível da ideologia traduz a interdependência das atitudes. De uma
pessoa que manifesta uma atitude etnocêntrica, um modo severo de educar as
crianças, atitudes pró-religiosas, patriotismo poder-se-á dizer que possui uma
personalidade de tipo conservador.

Há quem defenda a perspectiva de que as opiniões são equivalentes a crenças,


e não tanto a atitudes (Oskamp, 1991). Nesta via as opiniões são geralmente
mais restritas em conteúdo e objectivo que a orientação avaliativa geral,
considerada por certos autores, a atitude. Além disso as opiniões seriam
sobretudo cognitivas e não tanto imbuídas de emoção. Ou, por outras
palavras, as opiniões envolvem julgamentos de uma pessoa sobre a
probabilidade de acontecimentos ou relações, ao passo que as atitudes

350 © Universidade Aberta


envolvem sentimentos ou emoções de uma pessoa sobre objectos ou
acontecimentos.

4.3 Valores

Os valores constituem uma variável psicológica intimamente associada às


atitudes. Há maior concordância sobre as relações dos valores com as atitudes
do que sobre os termos precedentes (crenças e opiniões). Muito embora as
atitudes se refiram a avaliações de objectos específicos, os valores são crenças
durado iras acerca de objcctivos importantes da vida que transcendem situações
específicas (Rokeach, 1973; Schwartz e Bilsky, 1987). "Paz", "felicidade",
"igualdade" são alguns exemplos de valores. Os valores constituem um aspecto
importante do autoconceito e servem de princípios directores para uma pessoa
(Rokeach, 1972). Como tal, têm-se revelado como predizendo atitudes em
relação a armas nucleares (Kristiansen e Matheson, 1990), atitudes em relação
ao desemprego (Heaven, 1990) e crenças em relação a um mundo justo
(Feather, 1991).

Alguns psicólogos sociais tentaram catalogar um conjunto de valores básicos


em que as pessoas diferem. Por exemplo, Allport e Vernon (J 931), com base
nos escritos do filósofo alemão Spranger, desenvolveram uma medida para tais
valores: teórico, económico, social, estético, político e religioso. Morris
(1956) apresentou cinco dimensões gerais dos valores: constrangimento social
e autocontrolo; prazer e progresso na acção; retraimento e auto suficiência;
receptividade e simpatia; autocomplacência e prazer sensual. Sendo porventura
fútil tentar estabelecer o número exacto de valores, é claro que as pessoas têm
muitas atitudes e relativamente poucos valores.

Num trabalho mais recente (Rokeach, 1973) foi feita a distinção entre valores
finais, que dizem respeito aos objectivos últimos da vida, e valores
instrumentais, que dizem respeito a modos de conduta. Segundo Rokeach os
valores finais podem centrar-se na pessoa (dignidade, sabedoria, harmonia
interior, .. ) ou no grupo (igualdade, verdadeira amizade, segurança sociaL).
Trata-se pois no primeiro caso de valores pessoais e no segundo de valores
sociais. Por sua vez, os valores instrumentais podem estar mais orientados para
a auto-realização ou mais orientados para a moralidade.

351
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Rokeach elaborou duas escalas para se avaliarem os valores, cada uma
contendo dezoito valores finais e dezoito valores instrumentais. Aos sujeitos a
quem se administram essas escalas, é-lhes pedido para ordenar os valores finais
e os valores instrumentais tendo em conta a sua importância, os seus princípios
orientadores na sua vida. Se bem que este instrumento tenha sido alvo de
várias críticas (por exemplo, criticou-se a escala por se situar a um nível
ordinal de medida, Ng, 1982), possui no entanto propriedades psicométricas
interessantes o que permitiu a recolha de inúmeros dados de qualidade. Por
exemplo, Rokeach obteve dados a nível nacional nos Estados Unidos sobre um
número de valores terminais em quatro anos diferentes - 1968, 1971, 1974 e
1981, abrangendo um período de treze anos (Rokeach e Ball-Rokeach, 1989).
Os dados mostram que houve uma estabilidade considerável nos valores neste
período de tempo. Os seis valores com pontuações mais elevadas e mais baixas
mudaram muito pouco e os do meio permaneceram no meio. Contudo, apesar
desta estabilidade houve algumas mudanças interessantes. "Igualdade", um
valor considerado de importância na predição de uma pessoa ser liberal ou
conservadora, racista ou anti-racista passou da quarta posição em 1971 para a
duodécima em 1981. Ao mesmo tempo houve um aumento, por exemplo, na
importância da "vida confortável", e de "um sentido de realização". O que está
implicado por estas mudanças nos valores terminais nos Estados Unidos
durante essa década é um afastamento da preocupação com os outros e um
aumento da preocupação com o self.

Figueiredo (1988) utilizou de modo assaz original estas escalas para verificar
se existia consenso entre pais e jovens ao nível dos valores finais e
instrumentais. O autor encontrou um marcado consenso entre as duas gerações
na importância da "dignidade" e "felicidade" como valores finais e "honesto",
"afectuoso", "responsável", "capaz" como valores instrumentais. A propósito
dos valores finais os jovens dão uma maior importância aos valores íntimos
estritamente pessoais ("harmonia interior", "liberdade", "sentido de
realização", "vida apaixonante", em detrimento de valores mais sociais que são
privilegiados pelos progenitores ("segurança familiar", "mundo de paz" e
"igualdade"). Nos valores instrumentais, os jovens preferem sobretudo valores
de auto-afirmação, auto-realização, qualidades intrínsecas ao sujeito ("alegre",
"espírito aberto", "intelectual", "imaginativo", "ambicioso", "lógico"), em
detrimento de valores mais veiculados pelos pais com uma conotação de
subordinação ao outro e ao seu juízo ("educado", "prestável", "controlado",
"obediente", "limpo").

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Os valores têm as seguintes propriedades (Feather, 1994):

1. São crenças geraIs acerca de objectivos e comportamentos


desejáveis.

2. Envolvem bondade e maldade e têm urna qualidade de "dp.ver"


acerca deles.

3. Transcendem atitudes e influenciam a forma que as atitudes podem


assumIr.

4. Fornecem padrões para avaliar acções, justificar opmlOes e


comportamentos, planificar comportamentos, decidir entre diferentes
alternativas e apresentar-se aos outros.
5. Estão organizados em hierarquias para urna determinada pessoa e a
sua importância relativa pode variar ao longo da vida.
6. Os sistemas de valores variam segundo indivíduos, grupos e
culturas.

4.4 Ideologia

A ideologia representa um sistema integrado de crenças, em geral, com urna


referência social ou política. Para Rouquette (1996) a ideologia é o que torna
um conjunto de crenças, de atitudes e de representações simultaneamente
possíveis e compatíveis no seio de urna população. Por exemplo, as pessoas
hostis à pena de morte são geralmente favoráveis à liberdade de aborto.

Tetlock (l 989) propôs que os valores terminais, tais corno os descritos por
Rokeach, estão na base de toda a ideologia política. As ideologias podem
variar segundo duas características:

1. Podem atribuir diferentes prioridades a valores particulares. Numa


perspectiva tradicional é de esperar que pessoas da esquerda e da
direita ordenem "liberdade individual" e "segurança nacional" de modo
oposto.

2. Há ideologias que são pluralistas e há outras que são monistas. Se


urna ideologia pluralista pode tolerar um conflito de valores, urna
ideologia monista será bastante intolerante ao conflito, perspectivando
as questões em termos de tudo ou nada.

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5. Formação das atitudes

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As nossas atitudes resultam das diversas expenencias vItaIS. Como tal são
influenciadas pelas pessoas significativas nas nossas vidas e pelos modos como
processamos a informação acerca do mundo. Nesta secção examinaremos
brevemente fontes de aprendizagem das atitudes e, seguidamente,
abordaremos alguns dos modos como ocorre a formação das atitudes.

5.1 Fontes de aprendizagem

Muito embora gostássemos de acreditar que formamos as nossas atitudes de


modo independente, a investigação tem mostrado que as nossas atitudes são
influenciadas pelas pessoas que desempenham papéis significativos nas nossas
vidas. Os pais são os principais agentes de socialização na infância e as
atitudes que comunicam têm um efeito profundo e muitas vezes perene sobre
as pessoas. Um estudo de Jennings e Niemi (1968) mostrou que crianças
tendiam a ser simpatizantes dos mesmos candidatos políticos que os seus pais.
As crianças têm também tendência a formarem preconceitos contra negros,
judeus e outros grupos étnicos por influência de seus pais. Assim, Epstein e
Komorita (1966) encontraram que crianças da escola primária tanto brancas
quanto negras, tinham as mesmas atitudes preconceituosas para com minorias
ou grupos étnicos que os seus pais.
Por mais importância que tenham os pais na formação das atitudes dos seus
filhos, a sua influência não deve todavia ser sobreavaliada. Parece que à
medida que uma criança vai avançando na idade, o impacto das influências
parentais pode começar a diminuir. As atitudes em relação à música, aos
modos de vestir e de pentear, e muitos outros aspectos desenvolvem-se no
contexto da interacção com companheiros. Quando adolescentes e jovens
adultos deixam o meio familiar, por exemplo, a entrada para a universidade
que muitas vezes acarreta a mudança de residência, as suas atitudes mudam
muitas vezes de modo profundo como resultado da pertença a novos grupos
de companheiros e da pressão dos grupos de referência. O estudo clássico
sobre a influência dos companheiros foi efectuado de 1935 a 1939 por
Newcomb (1943) com estudantes da Universidade de Bennington. Nas
aplicações para este capítulo voltaremos a este assunto.
Pais, companheiros e grupos de referência não são os UnICOS modelos que
afectam a formação de atitudes. Os meios de comunicação de massa, muito
particularmente a televisão também influenciam a aprendizagem das atitudes.
Muito embora o impacto da televisão nos adultos não seja claro (Oskamp,

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As nossas atitudes são influenciadas pelas pessoas que desempenham papéis
significativos nas nossas vidas. As atitudes comunicadas pelos pais, por exemplo, têm
um profundo e muitas vezes duradoiro efeito.

358
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1984), já se questiona menos o seu papel na formação das atitudes das
crianças. Assim mostrou-se que crianças com menos des sete anos obtêm a
maior parte da informação política da televisão (Chaffee et aI., 1977) e esta
modela as suas atitudes políticas (Rubin, 1978). Atkin (1980) investigou o
impacto de anúncios nas atitudes das crianças. Todavia o seu impacto vai para
além dos anúncios. Num estudo, crianças esquimós foram expostas à televisão
pela primeira vez quando viram uma série sobre outras culturas e outros
valores. As crianças que viram esta série mostraram mudanças significativas
nas suas crenças acerca de grupos culturais (Caron, 1979).
Como são adquiridas as novas atitudes? Imagine que a Raquel é uma
candidata a presidente da associação de estudantes da sua Faculdade. Quais
serão os factores susceptíveis de determinar a sua atitude em relação a ela? Os
psicólogos sociais têm avançado diversas teorias da aprendizagem para
explicar a formação das atitudes. Essas teorias têm suscitado investigação
interessante sobre a formação das atitudes.

5.2 Condicionamento clássico

O princípio básico do condicionamento clássico é que quando um estímulo


neutro é emparelhado com um estímulo que naturalmente provoca uma
resposta particular (estímulo incondicional), o estímulo neutro provocará uma
resposta semelhante e então tornar-se-á um estímulo condicionado. Na famosa
experiência de PavIov, um cão foi condicionado a ensalivar ao ouvir uma
campainha, porque era sempre dada comida ao cão após o toque da
campainha. Então, a campainha, originalmente estímulo neutro, provocou a
mesma resposta, salivação, que o estímulo natural, a comida.

O trabalho de Staats ilustra o uso dos princípios básicos do condicionamento


desenvolvendo um modelo de formação da atitude (Staats e Staats, 1958).
Staats define uma atitude como uma resposta - uma resposta avaliativa
condicionada por algum objecto do meio. Esses autores pediram a um certo
número de sujeitos para se lembrarem de palavras emparelhadas com vários
nomes de nacionalidades, tais como francês-azul, holandês-presentes, alemão-
mesa, sueco-dor. Uma nacionalidade, a holandesa, foi sempre emparelhada
com problemas que tinham conotações emocionais agradáveis (tais como,
presentes, beleza, romance), ao passo que uma segunda nacionalidade, a
sueca, foi sempre emparelhada com palavras negativas (dor, feio, amargo).

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'.

EC "

(Campainha)
" ............................ :.:

"
.: -:
,

'" RC

/ / (salivação)

EI
RI
(Comida) /

EC

(nome do grupo

minoritário)

..
RC
(resposta
/ / :/ [/ de
avaliação
EI
RI negativa
(adjectivo
negativo) / V implícita)

Figura 4.3 - Modelo do Condicionamento Clássico, (EC = Estímulo condicionado;


EI = Estímulo incondicional; RI = Resposta incondicional; RC =
Resposta condicionada.)

Quando no final do estudo se pedia aos sujeitos para avaliarem o que sentiam
sobre vários grupos nacionais, as suas atitudes em relação aos holandeses
tinham-se tornado um pouco mais positivas e as suas atitudes em relação aos
suecos um pouco mais negativas. Num outro grupo de sujeitos o alvo das
nacionalidades foi invertido: os holandeses eram emparelhados com palavras

360 © Universidade Aberta


negativas e os suecos com palavras posItIvas. Estes SUjeItos referiram mais
tarde uma atitude mais negativa em relação aos holandeses e uma atitude mais
positiva em relação aos suecos (Figura 4.4)

5.0 5.0

4.0 4.0
SCORE
MÉDIO DE
ATITUDE 3.0 3.0
CONDICIO-
NADA
(Números mais
elevados = 2.0 2.0
atitudes mais
negativas)
1.0 1.0

Holandeses emparelhados com Holandeses emparelhados com


palavras negativas. Suecos palavras positivas. Suecos
emparelhados com palavras emparelhados com palavras
positivas. negativas .

Holandeses • Suecos

Figura 4.4 - Podem as atitudes ser condicionadas de modo clássico no laboratório?

Numa experiência mais recente, os sujeitos desenvolveram atitudes negativas


em relação a palavras (mão, advogado) e a não palavras (thomer) quando
estes estímulos eram emparelhados com choques eléctricos desconfortáveis
(Cacioppo, Marschall-GoodelI, Tassinary e Petty, 1992). - Um resultado
interessante deste estudo foi que as atitudes condicionadas eram mais fortes
para as não palavras que para as palavras. Tal sugere que o condicionamento
clássico pode ser particularmente potente na formação de atitudes em relação
a coisas quando não se tem muito conhecimento prévio acerca delas.

361
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Considerem-se as associações à palavra "preguiçoso". A maior parte das
pessoas reagirão sobretudo de modo negativo. Considere-se agora que uma
determinada minoria é sempre descrita do mesmo modo como sendo
constituída por pessoas preguiçosas. Certamente que aprenderá a avaliar essa
minoria de modo negativo. Se ouvir que as pessoas se referem continuamente
à Raquel em termos pouco lisonjeiros, o afecto negativo associado com esses
termos, tornar-se-á também associado com a Raquel.

É pois possível condicionar as atitudes. Aliás este processo está subjacente nas
mensagens publicitárias que recorrem a bonitas vedetas para realçar as
qualidades de produtos de consumo.

5.3 Condicionamento operante

Se os princípios do condicionamento clássico vêem a formação da atitude


como um processo automático de emparelhamento repetido, os princípios do
condicionamento operante (ou aprendizagem instrumental) enfatizam o papel
do reforço na formação da atitude. Quando os indivíduos recebem aprovação
social para as suas atitudes serão reforçados. Ao invés, se as atitudes são
desaprovadas, não serão reforçadas. Se os seus amigos se riem de si quando
diz coisas bonitas a propósito da Raquel, pode enveredar por desenvolver uma
atitude mais negativa para evitar a sua desaprovação. No documento 4.1 é
ilustrada a eficácia dos reforços verbais na formação das atitudes.

A eficácia dos reforços verbais para formar atitudes foi demonstrado num estudo
efectuado por telefone (Insko, 1965). Um entrevistador telefonava a estudantes da
Universidade de Hawai procurando saber as suas opiniões acerca da "Semana
Aloha" (festas que se realizam todos os anos em Honolulu). A metade dos
estudantes, o entrevistador respondia "Bom" quando o estudante indicava uma
opinião favorável acerca da Semana Aloha; à outra metade, a resposta "Bom" era
dada após opiniões negativas em relação à semana Aloha. Foi deste modo criado o
condicionamento verbal, pois para alguns dos estudantes as atitudes positivas eram
reforçadas e para outros eram-no as atitudes negativas.

Cerca de uma semana após as chamadas telefónicas os mesmos estudantes


preencheram um "Questionário sobre questões locais" aparentemente sem relação
com as opiniões antes expressas, mas num dos itens deste questionário eram

362
© Universidade Aberta
solicitadas as atitudes sobre a Semana Aloha. Os estudantes que tinham sido
verbalmente reforçados pelo entrevistador ao telefone nas suas atitudes positivas
expressaram pontos de vista mais favoráveis que os estudantes que tinham sido
verbalmente reforçados nas atitudes negativas. Se se generalizassem estes
resultados à questão de como as pessoas adquirem as atitudes, poderemos concluir
que quando as pessoas são elogiadas pela expressão de certas atitudes, continuarão
a expor essas atitudes no futuro.

Documento 4.1- A eficácia dos reforços verbais na formação das atitudes

Os reforços verbais têm sido. utilizados para modificar fenómenos tais como o
uso de vestuário de certas cores (Calvin, 1962), a expressão de atitudes
preconceituosas (Mitnick e McGinnies, 1958), a adesão a certas filosofias de
educação (Hildum e Brown, 1956).

Nesses casos o reforço de uma atitude aumenta a expressão futura dessa


atitude. Note-se, contudo, que isso depende muito da fonte de aprovação ou
desaprovação. Para os jovens que se revoltam contra as atitudes dos seus pais
pelo facto de fumarem marijuana, o reforço de companheiros pode ter maior
peso que a desaprovação dos pais.

5.4 Aprendizagem social

Bandura (1977) mostrou que muitas vezes aprendemos novas respostas - e


portanto novas atitudes - observando e tentando imitar o comportamento de
modelos. Através da modelagem, as crianças adquirem várias atitudes dos seus
pais. Por exemplo, foi demonstrado que as atitudes das crianças em relação a
comportamentos particulares tornaram-se mais positivas depois de terem
observado que os seus pais tinham recompensas realizando o comportamento
(Petty e Cacioppo, 1981). Por seu lado, Eiser, Morgan, Gammage e Gray
(1989) confirmaram que a probabilidade das crianças se tornarem fumadoras é
mais elevada nas famílias cujos pais fumam.

Evidentemente que os pais não são os únicos modelos que afectam a formação
das atitudes. Muita aprendizagem de atitudes continua na escola, na igreja e
noutras organizações. Os mass-media são também uma fonte poderosa para
formar as atitudes. O debate c'ontinua para se saber se os mass-media criam as

© Universidade Aberta 363


atitudes ou reforçam simplesmente as atitudes que Ja existem (Roberts e
Bachen, 1981). No entanto, a aprendizagem social não é só apanágio das
crianças. A sua atitude em relação à Raquel pode ser muito influenciada pelo
que os seus colegas de Faculdade admiram nela.

5.5 Aprendizagem por experiência directa

A experiência directa com o objecto de atitude contribui para a aprendizagem


de muitas das nossas atitudes. Foram examinadas, por exemplo, as mudanças
nas atitudes nacionais em resultado da exposição directa à estadia num país
estrangeiro (Stroebe et al., 1988). Se encontrar a Raquel, a sua atitude em
relação a ela será influenciada pela impressão formada a seu respeito.
Efectivamente nas interacções quotidianas com o objecto de atitude, bem
como com as recordações dessas interacções, podem ser enviesadas por
estereótipos. Se, por exemplo, tiver a expectativa, baseada nas atitudes
negativas dos seus amigos em relação à Raquel que será antipática, pode
parecer-lhe ser desse modo quando a encontrar. Mas a sua aparente antipatia
pode ser uma reacção à atitude negativa expressa, e não tanto uma
característica da Raquel.

5.6 Observação do próprio comportamento

Muito embora estejamos habituados a encarar as atitudes como causas do


comportamento, também acontece que os comportamentos podem levar a
mudanças de atitudes. A teoria da autopercepção propõe que as pessoas
podem "vir a conhecer as suas próprias atitudes, emoções e outros estados
internos, parcialmente através de inferências de observações do seu próprio
comportamento e/ou das circunstâncias em que este comportamento ocorre"
(Bem, 1972, p. 5). Por conseguinte, segundo esta teoria, inferimos muitas
vezes o que são as nossas atitudes observando o nosso próprio
comportamento. Imagine que enquanto está a falar com a Raquel se dá conta
de que se sente perturbado e que tem a língua presa, agindo como se a
quisesse impressionar. Imagine igualmente que tem uma conversa densa com
ela durante um certo tempo. Se se observar pode ser levado a pensar que
tendo em conta a maneira como se comportou, apesar de tudo deve gostar

364
© Universidade Aberta
dela. Ou, por outras palavras, mediante a observação do seu próprio
comportamento inferiu uma atitude positiva.

Em suma, as atitudes podem-se formar de diversos modos. Algumas atitudes


podem desenvolver-se através dos princípios básicos da aprendizagem e
reforço. Outras podem-se formar quando uma pessoa obtém informação sobre
novos assuntos.

Refira-se, enfim, que as atitudes também podem ser formadas para servir
necessidades da nossa personalidade. No capítulo 6 referiremos mais em
pormenor a investigação sobre a personalidade autoritária que mostra que as
atitudes se desenvolvem para defender as pessoas contra ansiedades ou
sentimentos de insegurança. Mencione-se ainda que Tesser (1993) defende
que os psicólogos não podem ignorar a influência genética sobre as atitudes.

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6. Medidas das atitudes

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1,11
"

Os psicólogos sociais não procuram somente saber o que são as atitudes e


como são formadas. Tentam também medi-Ias, avaliar a sua direcção e
intensidade, o que permite efectuar comparações entre os indivíduos e os
grupos. Em 1928 Louis Thurstone publicou um artigo intitulado "as
atitudes podem ser medidas", esquecendo-se todavia de antecipar que a
medida das atitudes é uma tarefa árdua. Uma revisão da literatura referiu
haver mais de 500 métodos para determinar a atitude de um indivíduo
(Fishbein e Ajzen, 1972). As atitudes podem ser medidas directa ou
indirectamente

6.1 Análise de conteúdo das comunicações

Uma das primeiras tentativas para avaliar as atitudes foi efectuada por
Thomas e Znaniecki (1918). O método que utilizaram consistiu
fundamentalmente em inferir as atitudes de diferentes tipos de documentos
escritos. Recorreram a uma vasta gama de fontes de que a mais importante
foi uma colecção de mais de 700 cartas recebidas sobretudo por imigrantes
polacos na América ou por estes enviadas a familiares que viviam na
Polónia. Recorreram também a cópias do jornal polaco Gazeta Zwiazkowy
que Thomas obtivera aquando de uma visita à Polónia. Outras fontes
incluíam histórias de paróquias polacas e de outras organizações
implantadas pelos imigrantes após a sua chegada à América, bem como
histórias de vida. Thomas e Znaniecki tinham assim à sua disposição uma
grande quantidade de material. Os autores esperavam a partir deste material
identificar atitudes ou temas comuns que permitissem compreender o
comportamento dos imigrantes polacos.

Mais recentemente, Eiser (1983) propôs que um exame cuidadoso das


palavras revestidas de emoções que as pessoas utilizam em entrevistas pode
fornecer uma indicação de valor sobre a atitudes subjacentes, mesmo que
não estejam a fazer afirmações atitudinais directas. E muitos investigadores
analisam entrevistas mediante gravações e transcrições para isolar as
afirmações-chave que condensam as atitudes subjacentes reveladas.

Na medida em que Thomas e Znaniecki não recorreram a instrumentos


específicos ou a escalas de medida punha-se a questão da precisão das
interpretações efectuadas. Por causa disso outros investigadores elaboraram
técnicas em que se podia avaliar mais facilmente a sua fidelidade e validade.

369
© Universidade Aberta
6.2 Escala de avaliação com um item

Recorre-se frequentemente a uma escala de avaliação com um item para


medir atitudes. Trata-se de um método económico de medir uma atitude em
muitos estudos com carácter representativo, como, por exemplo, em
sondagens de opinião. A questão formulada está ligada a uma escala de
avaliação com diversos graus. Por exemplo, "Até que ponto é a favor da
construção de uma nova ponte?"As respostas possíveis podem oscilar de
"totalmente em desacordo" (=1) a "totalmente em acordo" (=7). Este modo
de medir atitudes defronta-se no entanto com um problema de monta: a
potencial falta de fidelidade. As respostas aos itens podem ser
influenciadas, entre outros factores, pelo contexto, pela ordem dos itens,
pelo humor da pessoa que responde. Para ultrapassar uma possível baixa
fidelidade, foram construídas escalas de atitude mais complexas.

6.3 Escala de distância social

Esta escala foi proposta por Emory Bogardus em 1925 com o objectivo de
medir as atitudes étnicas. Esta técnica mede o grau de distância que uma
pessoa deseja manter nas relações com pessoas de outros grupos.

A escala apresenta-se sob a forma de um quadro de dupla entrada que tem


como abcissa o nome de diferentes grupos humanos: Americanos,
Canadianos, Espanhóis, etc. Aos grupos nacionais podem acrescentar-se
grupos raciais, grupos culturais, comunidades religiosas. Por vezes até se
incluem grupos imaginários (v.g. Brombinianos) para se estudarem as
relações entre ignorância e ansiedade. Como ordenada dispõem-se sete
proposições que caracterizam o tipo de relações que o sujeito gostaria de
ter com pessoas pertencendo a esses grupos (quadro 4.2).

Os números colocados à direita indicam o grau de distância social


representado por cada proposição. Quanto maior for o número, maior é a
distância social. Assim uma pessoa que aceitasse alguém de um
determinado grupo humano nas suas relações mais íntimas pelo casamento,
pressupõe-se que seria a pessoa menos preconceituada; ao passo que
alguém que fosse ao ponto de negar a admissão de um determinado grupo
no seu país é considerada a pessoa mais preconceituada.

370
© Universidade Aberta
Segundo as minhas primeiras reacções aceitaria pessoas de raça negra
(como uma categoria, não considerando nem os melhores membros que
conheci nem os piores) para uma ou mais de uma das seguintes
classificações:

parentesco próximo pelo casamento

membro do meu grupo de amigos pessoais 2

vizinhos na minha rua 3

emprego no meu local de trabalho 4

cidadão do meu país 5

somente como visitante do meu país 6

excluiria do meu país 7

Fonte: Adaptado de Bogardus, 1925.

Quadro 4.2 - Exemplo de itens da escala de distância social para medir as


atitudes

Diversos aspectos desta escala têm sido criticados, em particular a


questionável linearidade da escala e os seus intervalos desiguais. Para
alguns sujeitos, a admissão no local de trabalho significa uma maior
proximidade do que aceitar, por exemplo, alguém como vizinho na sua rua.
Tal exigiria uma ordenação dos graus, muito embora em vastas amostras
tal só se aplique a uma minoria. Relativamente à suposição de igualdade de
distância entre os pontos da escala, não é evidente, por exemplo, que a
distância entre 2 e 3 seja equivalente à distância entre 5 e 6. Relativamente
à fidelidade da escala tem-se obtido para cima de .90 o que é um valor
satisfatório. Há também, pelo menos alguma evidência positiva da validade
da escala (Alexandre, 1971).

6.4 Escala de Thurstone

Thurstone (1928) defendeu que há um continuum psicológico de afecto ao


longo do qual se podem situar os indivíduos. Este continuum tinha as

371
© Universidade Aberta
mesmas propriedades básicas de um continuum físico de pesos. Com base
nesta suposição, Thurstone procurou desenvolver uma técnica para
localizar os indivíduos ao longo deste continuum.

Ir

I.

Tal como este entrevistador, a maior parte dos psicólogos sociais medem atitudes
utilizando técnicas de autoavaliação por meio das quais as pessoas expressam a
direcção e a intensidade das suas opiniões.

Das diversas técnicas de escalas desenvolvidas por Thurstone a que foi


mais amplamente utilizada foi a escala de intervalos aparentemente iguais.
A elaboração desta escala pode ser sintetizada em oito passos:

1) Obtém-se um determinado número de itens em relação com o


objecto da atitude (cerca de 100). Uma boa fonte para estes itens
pode ser entrevistas com sujeitos apresentando características
semelhantes às da população com quem a escala vai ser utilizada.
Deve-se assegurar que as afirmações representem um vasto leque de
opiniões, incluindo as moderadas.

2) Os itens são avaliados por um conjunto de juízes com


características semelhantes às das pessoas que serviram de sujeitos.

372
© Universidade Aberta
,I,

Thurstone recomendou que "várias centenas" de juízes fossem


utilizados (Thurstone e Chave, 1929, p. 17); autores mais recentes
sugeriram o recurso de 50 a 300 juízes (Seltiz, Jahoda, Deutsch, e
Cook, 1963).

3) Pede-se aos juízes para ordenarem os itens em 11 categorias desde


a mais favorável (1) , passando pela neutra (6), à mais desfavorável
(11). Deve-se estar seguro que os juízes compreendem que vão
classificar as frases e não indicar o seu acordo ou desacordo com
elas.

4) Os itens que são ordenados pelos juízes nas mesmas categorias são
retidos, ao passo que os itens em que há um desacordo entre os juízes
são afastados.

5) A cada um dos itens atribui-se um valor da escala correspondendo


à mediana da distribuição das respostas dada pelos juízes.

6) Retém-se um certo número de proposições (é típico escolherem-se


cerca de 20) de modo que representem a extensão dos valores da
escala ao longo da dimensão favorável a desfavorável, tendo
aproximadamente intervalos iguais entre pares dos valores adjacentes
da escala.

7) Apresentam-se os itens seleccionados numa ordem aleatória a uma


população pedindo-se-lhes para escolherem aqueles com que
concordam.

8) A atitude do sujeito é então determinada pelo cálculo dos valores


médios ou medianos dos valores da escala dos itens escolhidos. Por
isso, na análise final, a atitude de um sujeito será representada por um
número entre 1 e 11.

No quadro 4.3 podem-se ver os itens de uma escala de atitude destinada a


avaliar a atitude em relação aos Negros. Cada item fornece ao sujeito a
alternativa de concordar ou discordar e cada ponto na escala representa um
score. Os scores dos itens seleccionados pelo sujeito fornecem uma medida
compósita da atitude de uma pessoa em relação aos Negros.

© Universidade Aberta 373


(1,7) 1. De nenhum modo se deveria autorizar aos negros associarem-se com os
brancos.

(4,3) 2. O negro deveria usufruir da sua liberdade, mas nunca deveria ser tratado
como igual ao branco.

(7,3) 3. Não se pode condenar a raça negra na sua totalidade por causa das acções
de alguns dos seus membros.

(10,3) 4. Creio que o negro merece os mesmos privilégios sociais que os brancos.

Nota: Os sujeitos assinalam os itens com que concordam. Os números entre parênteses
indicam os valores da escala atribuídos aos itens com base nas avaliações dos
juízes. Estes números não aparecem actualmente nos questionários dados aos
sujeitos.

Fonte: Thurstone, 1931.

Quadro 4.3 - Amostra de itens de uma escala de Thurstone para medir a atitude
em relação aos Negros

Este tipo de escala defronta-se com algumas dificuldades. Em primeiro


lugar, a preparação da escala é complicada e morosa, tendo-se encontrado
resultados muito semelhantes quando se utilizam técnicas menos
complicadas que a da escala de Thurstone. Em segundo lugar, pode haver
um fosso relativamente grande entre o júri e a população a quem se
administra a escala. Geralmente o júri é constituído por intelectuais e a sua
compreensão dos itens pode ser substancialmente diferente de uma outra
população. Em terceiro lugar, Thurstone partiu da ideia de que os juízes
ordenam as proposições independentemente das suas atitudes, mas o
contrário pode ser provado. Se investigação inicial (v.g., Hinckley, 1932;
Ferguson, 1935) indicava que a atitude dos juízes não influenciava a
ordenação das proposições, todavia outros estudos não vão nesse sentido.
Segundo Hovland e Sherif (1952) os juízes com atitudes pessoais extremas
ordenavam uma maior percentagem de proposições numa categoria e por
isso enviesavam a escala.

374 © Universidade Aberta


6.5 Escala de Likert

Rensis Likert (1932) concebeu um dos métodos que mais influência tem
tido na medida das atitudes. Likert examinou cinco grandes áreas das
atitudes: relações internacionais, relações raciais, conflitos económicos,
conflitos políticos e religião. Apesar de terem volvido mais de 50 anos
note-se a actualidade desses tópicos.

Pode-se sintetizar a construção das escalas de Likert em três etapas.

1) Um conjunto de itens relacionados com vários aspectos de uma


atitude são seleccionados pelos investigadores com base na
experiência, intuição ou pré-testes. Inclui-se um número
aproximadamente igual de proposições favoráveis e desfavoráveis.

2) Os itens são submetidos aos sujeitos a quem se lhes pede para


indicarem as suas opiniões fazendo um círculo à volta de um ponto de
uma escala de cinco graus cujos extremos são concordo fortemente
(5) e discordo fortemente (1). Os investigadores podem variar o
número de unidades utilizadas na escala, sendo 7, 9 e 11 pontos da
escala que são muito empregues. Por exemplo, numa medida das
atitudes em relação aos emigrantes, um item do questionário é
apresentado no quadro 4.4. Aí dá-se um score de 5 pontos a uma
resposta que exprima uma forte concordância, enquanto que a um
forte desacordo se atribui 1 ponto. Deste modo a cada proposição é
dado um valor da escala que oscila entre 1 e 5.

3) A atitude de uma pessoa em relação a um objecto é determinada


pela soma das respostas a todos os itens que têm uma correlação
satisfatória com toda a escala. Ou noutros termos, os itens que são
retidos para formar um score total são só aqueles que apresentam
uma correlação satisfatória com o score total. Procede-se assim a
uma análise do item.

Nunca casaria com um emigrante

concordo concordo neutro discordo discordo


totalmente totalmente

5 4 3 2

Quadro 4.4 - Um item de uma escala tipo Likert

© Universidade Aberta 375


A principal vantagem de uma escala de Likert é que ela constrói-se mais
depressa e com menos gastos que uma escala de Thurstone. Esses ganhos
não estão associados com uma perda de precisão e de informação como a
investigação tem confirmado. Atitudes obtidas mediante o recurso a escalas
de Likert estavam correlacionadas com as medidas por escalas de
Thurstone (Edwards e Kenney, 1946).

Todavia esta escala também não está isenta de críticas. Entre estas, a crítica
mais frequente à escala de Likert é de que se os scores de dois indivíduos
são iguais, estes devem ter a mesma atitude. Porém é frequente
observarem-se scores totais iguais engendrados por diferentes respostas às
questões, o que pressupõe atitudes também elas diferentes.

6.6 A escala de Guttman

A escala de Guttman baseia-se no pressuposto de que as opiniões podem


ser ordenadas segundo a sua "favoralidade" de modo que a concordância
com uma dada afirmação implica concordância com todos os itens que
exprimem opiniões mais favoráveis. Segundo Louis Guttman (1944),
qualquer escala que reproduzisse perfeitamente este modelo seria
perfeitamente unidimensional. De modo diferente da escala de Likert em
que o score total da atitude de uma pessoa podia reflectir um dentre os
vários padrões de resposta, um dado score de atitude numa escala de
Guttman só pode teoricamente ser obtido de uma maneira. Se se conhecer
o score de um indivíduo, então conhecer-se-á o modo como a pessoa
respondeu a cada item da escala.

A elaboração de uma escala deste tipo pode ser sintetizada em três etapas.

1) Reune-se um grande número de opiniões sobre a atitude que se


deseja medir. Estas opiniões deverão permitir a exploração dos
domínios que constituem o campo de expressão da atitude. Por
exemplo, se se considerar a atitude de um grupo social em relação a
um partido político, existe um conjunto de discursos proferidos pelos
membros do grupo sobre este partido, entre estes o discurso sobre a
política estrangeira deste partido, sobre a sua política cultural, a sua
política em relação à juventude, à educação, etc. As opiniões retidas
deverão igualmente permitir apreender todas as matizes da direcção
da atitude (da mais favorável à mais desfavorável). Enfim, as opiniões
serão formuladas de maneira dicotómica, isto é escolhas de tipo
acordo, desacordo.

376
© Universidade Aberta
111
,I,

2) Administra-se o, questionário de opiniões a uma população de


sujeitos.

3) Efectua-se uma análise das respostas para se determinar se


correspondem ao modelo ideal. Assim se houver três (N=3) itens de
que A é o mais favorável e C o menos, há quatro (N+l) padrões de
respostas aceitáveis em termos do modelo seguinte:

Concorda com o item Discorda com o item

Score A B C A B C

3 x x x

2 x x x

x x x

O x x x

Adaptado de Selltiz, Jahoda, Deutsch, e Cook, 1963, p. 374.

Qualquer outro padrão de respostas, por exemplo, concordar com A e C ,


mas discordar com B é considerado erróneo. Se efectivamente A é mais
favorável e C menos favorável, não teria sentido concordar com A e
discordar de B ou de C. Tal será assim quando se possam ordenar os itens.
A proporção dos scores do pré-teste que são agora conformes com o
padrão ideal é considerado um índice de adequação da escala, ou
reprodutibilidade.

A unidimensionalidade desta escala pode ser ilustrada por meio das atitudes
sexuais em relação ao comportamento sexual preconjugal. Reiss (1967)
elaborou um continuum unidimensional do comportamento preconjugal que
vai desde beijar até ter relações sexuais totais (quadro 4.5).

377
© Universidade Aberta
1. Acredito que beijar é aceitável para oCa) homem(mulher) antes do casamento se
estiver comprometido(a) para casar.

2. Acredito que beijar é aceitável para oCa) homem(mulher) antes do casamento se


este(a) estiver apaixonado(a).

3. Acredito que beijar é aceitável para oCa) homem(mulher) antes do casamento


quando este(a) sente uma grande afeição pela(o) sua(seu) companheira(o).

4. Acredito que beijar é aceitável para oCa) homem(mulher) antes do casamento


mesmo quando este(a) não sente uma afeição particular pela(o) sua(seu)
companheira(o).

5. Acredito que as carícias são aceitáveis para oCa) homem(mulher) antes do


casamento quando este(a) está comprometido(a) para casar.

6. Acredito que as carícias são aceitáveis para oCa) homem(mulher) antes do


casamento quando este(a) está apaixonado(a).

7. Acredito que as carícias são aceitáveis para oCa) homem(mulher) antes do


casamento quando este(a) sente uma grande afeição pela(o) sua(seu)
companheira(o).

8. Acredito que as carícias são aceitáveis para oCa) homem(mulher) antes do


casamento mesmo quando este(a) não sente uma afeição particular pela(o)
sua(seu) companheira(o).

9. Acredito que as relações sexuais são aceitáveis para oCa) homem(mulher) antes
do casamento quando este(a) está comprometido(a) para casar.

10. Acredito que as relações sexuais são aceitáveis para oCa) homem(mulher) antes
do casamento quando este(a) está apaixonado(a).

11. Acredito que as relações sexuais são aceitáveis para oCa) homem(mulher) quando
este(a) sente forte afeição pela(o) sua(seu) companheira(o).

12. Acredito que as relações sexuais são aceitáveis para oCa) homem(mulher) mesmo
quando este(a) não sente uma afeição particular pela(o) sua(seu) companheira(o).

Fonte: Reiss, 1967.

Quadro 4.5 - Escala para medir as atitudes em relação ao comportamento sexual


préconjugal

378
© Universidade Aberta
Esta escala baseia-se na ideia de que alguém que aprove acanCIar
fortemente também, aprova acariciar levemente e beijar ou alguém que
desaprove acariciar levemente também desaprovaria acariciar fortemente, o
contacto oral e relações sexuais totais. Ilustra-se na figura 4.5 a
unidimensionalidade da escala.

PERMISSIVIDADE ATITUDES EM RELAÇÃO

Carícias Relações Sexuais

Compro- Apaixo- Forte Compro- Apaixo- Forte Nenhuma


metido nado Afeição metido nado Afeição Afeição

Elevada + + + + + + +
Pcrmissi-
vidade

6 + + + + + +

5 + + + + +

4 + + + +

3 + + +

2 + +

Pouca
Permissi-
vidade

+ =Concordância com o item

Fonte: Reiss, 1967

Figura 4.5 - Representação esquemática de uma escala de permissividade pré-


matrimonial de Guttman

Neste exemplo verifica-se uma reprodutibilidade perfeita (ou


unidimensionalidade). O coeficiente de reprodutibilidade exprime a
separação entre o escalograma real e o modelo ideal, correspondendo à

379
© Universidade Aberta
proporção de respostas previsíveis em relação ao conjunto das respostas. A
reprodutibilidade é a base da escala de Guttman e é geralmente aceite que
um conjunto de itens deve ter um coeficiente de reprodutibilidade de cerca
de .90 (10% ou menos de erros). Um grande número de erros seria o
indicativo de que há mais de uma dimensão implicada. As escalas tipo
Guttman são úteis quando a unidimensionalidade é um problema crítico a
ser analisado.

A escala unidimensional de Guttman evita o problema de diferentes padrões


de atitude com o mesmo score, no entanto também não está isenta de
problemas. Entre eles refira-se que um conjunto de itens que produza
respostas escalonáveis (isto é, unidimensionais) para uma população pode
não funcionar noutra população. Os itens da escala podem ser ordenados
de modo diferente, ou podem não ter uma ordem consistente. Por isso, a
escala deve ser pre-testada junto de uma amostra de sujeitos semelhantes
àqueles com que se utilize a escala no estudo final.

6.7 Diferenciador semântico

O problema com escalas como as do tipo Thurstone, Likert ou Guttman é


de que para cada novo objecto de atitude tem de se construir uma nova
escala. O diferenciador semântico propicia a possibilidade de se medirem
diferentes atitudes com a mesma escala.

O diferenciador semântico desenvolvido por Osgood, Suei e Tannenbaum


(1957), é uma técnica de medida da significação psicológica que têm os
objectos ou os conceitos para o indivíduo. É a combinação de um método
de associações forçadas, mas controladas e de um procedimento de escalas
permitindo obter a direcção e intensidade do significado do conceito.
Concretamente, os sujeitos devem diferenciar num conjunto de escalas
bipolares de adjectivos antónimos com sete graus de intensidade, uma série
de conceitos saídos de um campo semântico. A direcção do julgamento
pode ser positiva ou negativa e ir de -3 a +3. Por exemplo, o árbitro de um
jogo de futebol pode ser julgado por um indivíduo bastante bom (+2),
muito simpático (+3) e muito agradável (+3) (Figura 4.6).

380
© Universidade Aberta
,1;-

Em cada uma das escalas abaixo indicadas, assinale a sua reacção em relação "ao árbitro
do Porto-Sporting"

bom /----I-- X--I----I----I----I----I----I mau

antipático /----/ ----I----I----I----/----/--X--I simpático

agradável /-- x--/----I----I----I----/----/----I desagradável

Figura 4.6 - Um exemplo de escalas do diferenciador semântico. Os SUjeItos


colocam uma cruz em cada escala para representar a sua atitude
em relação ao assunto em questão. Este sujeito manifesta
claramente uma atitude positiva em relação ao árbitro.

Por meio do recurso à análise factorial, Osgood e seus colegas


identificaram três dimensões básicas mediante as quais os conceitos podem
ser descritos. Estes factores foram interpretados como sendo a avaliação, a
potência e a actividade. Investigadores que se inscrevem numa abordagem
unidimensional da atitude defenderam que pares de adjectivos que
apresentam contribuições elevadas no factor de avaliação poderiam ser
apropriadas para se descrever a atitude de uma pessoa em relação ao
objecto em apreço.

o diferenciador semântico tem sido utilizado de diversos modos. Um dos


seus usos é para estudar as diferenças sócio-culturais nas atitudes. Um
segundo uso é para estudar as diferenças sexuais. Os sujeitos masculinos e
femininos podem apresentar diferentes respostas conotativas a conceitos e
objectos. Um terceiro uso é para avaliar o auto-conceito. Pode-se, por
exemplo, pedir a um sujeito para responder aos seguintes conceitos, com o
recurso às mesmas escalas bipolares: "eu", "a pessoa média", "como
gostaria de ser". Das comparações destes conceitos poder-se-ia ter uma
ideia do modo como o sujeito se autopercepciona quando comparado com
os outros e com o seu autoconceito ideal.

O diferenciador semântico tem a vantagem de ser fácil de construir. Quase


toda a escala previamente elaborada pode ser utilizada como modelo para
outra variável que vai ser estudada, na medida em que os adjectivos são
independentes de qualquer variável. Assim pode ser usada para medir
atitudes em relação a toda a espécie de fenómenos desde grupos étnicos a
partidos políticos, ou até ao controlo de nascimentos. As críticas ao
diferenciador semântico também não faltaram. Entre elas assinale-se a
existência por vezes de falsas bipolaridades, bem como o empobrecimento

381
© Universidade Aberta
das conotações suscitadas pela rigidez das escalas nas três dimensões. O
campo das conotações parece ser maior e mais aberto. Um outro problema
tem a ver com o facto de a estrutura factorial de uma escala de um
determinado diferenciador semântico variar com o tipo de conceito que se
avalia.

6.8 Medidas indirectas

Os questionários são de longe as técnicas de avaliação das atitudes mais


amplamente utilizadas. Todavia a facilidade em detectar-se a sua intenção é
susceptível de influenciar certas pessoas. As medidas de auto-avaliação são
particularmente susceptíveis de serem influenciadas pela desejabilidade
social. As pessoas, em vez de referirem os seus verdadeiros sentimentos ou
atitudes, respondem aos itens em termos de como sentem que a maior
parte das outras pessoas responderia, ou em termos do que pensam ser as
respostas sociais mais aceitáveis ou apropriadas. Tal tem suscitado nalguns
investigadores a utilização de métodos indirectos. As medidas indirectas
mais comuns, em que não se pergunta à pessoa a sua atitude directamente,
são: técnicas fisiológicas, comportamentais e projectivas.

As técnicas fisiológicas de medir as atitudes, tais como a resposta


galvânica da pele e a resposta pupilar, assentam no pressuposto de que o
comportamento afectivo das atitudes produz uma reacção fisiológica que
pode potencialmente ser medida. Encontrou-se numa experiência que
sujeitos brancos mostravam uma elevada resposta galvânica da pele perante
um experimentador negro, mas não na presença de um experimentador
branco (Rankin e Campbell, 1955). Este resultado podia interpretar-se
como sinal de preconceito dos sujeitos em relação ao experimentador
negro. Contudo mais recentemente chegou-se à conclusão de que a novidade
do estímulo causa uma elevada resposta galvânica da pele (Caccioppo e
Sandman, 1981). A surpresa no encontro de um experimentador negro
pode ter produzido a resposta galvânica de pele. O problema levantado
pela interpretação desta experiência mostra a dificuldade em se utilizar esta
medida fisiológica da atitude.

Uma outra medida que está associada com o sistema nervoso autónomo é a
mudança no tamanho da pupila. A sua dilatação tem sido interpretada
como indicativo de uma atitude positiva e a sua contracção como
indicativo de uma atitude negativa (Hess, 1965).

382
© Universidade Aberta
Cacioppo e Petty desenvolveram uma técnica de medida fisiológica que
permite obter medidas da intensidade e da direcção das atitudes (Cacioppo
et aI., 1986). A sua técnica assenta na actividade eléctrica de músculos.
Quando as pessoas experienciam felicidade ou tristeza contraem-se
diferentes tipos de músculos na face. Assim, os cantos da boca levantam-se
com um sorriso ou há franzimento da sobrancelha. Essa actividade
muscular ocorre mesmo quando há mudanças não se podem ver a olho nu.
É aqui que a técnica entra, a EMG pode medir actividade muscular como
se mostra na figura 4.7. Numa demonstração da técnica, Cacioppo e Petty
(1979) registaram a actividade muscular facial de homens quando ouviam
um discurso que apoiavam ou a que se opunham sobre a posse de álcool. A
EMG revelou um padrão da actividade muscular consistente com a
direcção e a intensidade das perspectivas dos sujeitos. Os estudantes que
concordavam com o discurso apresentavam um aumento de actividade nos
músculos associados ao sorriso, mesmo se observadores não podiam
apreender reflexos destas mudanças subtis nas faces dos estudantes.
Todavia os que se opunham ao discurso mostraram mais actividade nos
músculos da sobrancelha associados com o franzimento, novamente mesmo
se estas mudanças não eram visíveis a olho nu.

A utilização da EMG é obviamente impossível sem um equipamento


conveniente, um meio cuidadosamente controlado, um experimentador
perito e sujeitos que cooperem. Quando levada a cabo com cuidado, esta
técnica assegura a promessa de revelar a direcção e a intensidade de uma
atitude.

Refira-se ainda uma técnica de avaliação das atitudes que recorre a um


falso indicador psicofisiológico (bogus pipeline) (Jones e Sigall, 1971).
Esta técnica permite detectar atitudes que de outro modo não seriam
reveladas porque suscitam embaraço à pessoa. Por exemplo, os sujeitos são
levados a pensar que o investigador pode medir de modo certo as suas
atitudes fisiologicamente (por exemplo, gravações de eléctrodos ligados
aos braços). Num estudo foi demonstrado que sujeitos brancos exprimiam
atitudes mais negativas em relação aos negros quando estavam ligados à
"bogus pipeline" do que quando não o estavam (Sigall e Page, 1971).
Muito presumivelmente estes sujeitos responderam de modo mais honesto
- expressando um maior grau de intolerância nas respostas ao questionário -
quando pensavam que os investigadores já conheciam a verdade acerca dos
seus preconceitos através das suas respostas fisiológicas.

383
© Universidade Aberta
Quando as pessoas reagem de modo positivo a um objecto de atitude, a actividade nos
músculos zigomáticos aumenta, ao passo que respostas negativas acompanham-se de
aumento de actividade nos músculos co-rugadores. Muito embora esta actividade não se
possa observar a olho nu, pode medir-se por meio de eléctrodos colocados nas posições
indicadas. (adaptação de Petty e Cacioppo, 1986, p.429.

Co-rugador
----+

Zigornático

Figura 4.7 - Actividade electromiográfica facial (EMG): Uma medida indirecta


das atitudes

As medidas comportamentais assentam na suposição que o comportamento


é consistente com atitudes. Se um sujeito é afável com os imigrantes, por
exemplo, o investigador presume que o sujeito tem uma atitude favorável
em relação aos imigrantes. Mehrabian (1967) estudou o aspecto
comportamental das atitudes utilizando algumas das ideias da proxémica
que se refere ao grau de intimidade da interacção não-verbal entre duas
pessoas que comunicam. Segundo Mehrabian podem-se medir as atitudes
de um sujeito em relação a outro através da medição da distância, do
contacto ocular, da tensão corporal quando duas pessoas interagem. Por
exemplo, atitudes negativas podem estar associadas com maior distância,
menor contacto ocular de outro sujeito aquando da interacção. Um outro
exemplo de uma medida comportamental das atitudes é apresentada no
documento 4.2.

384
© Universidade Aberta
Foram mostrados aos participantes na investigação de DeFleur e Westie (1958)
diapositivos a cores com pares interraciais de homens e de mulheres. Alguns
dos diapositivos mostravam um jovem negro bem vestido e com boa aparência
junto de uma jovem negra igualmente bem apresentada e atraente. Os outros
diapositivos apresentavam um homem branco com uma mulher negra. As
pessoas estavam sentadas umas ao lado das outras, olhando-se com expressões
agradáveis. Mais tarde o experimentador informava os participantes que outro
conjunto de diapositivos era necessário para mais investigação e perguntava aos
sujeitos se quereriam ser fotografados com uma pessoa negra do sexo oposto
para esse objectivo. Pedia-se então a cada sujeito uma autorização que continha
uma série graduada de usos para que a fotografia poderia ser utilizada: 1)
experiências de laboratório em que seria visto somente por sociólogos, 2)
publicação numa revista técnica lida somente por sociólogos; 3) apresentação a
algumas dúzias de estudantes universitários numa situação laboratorial; 4)
apresentação a centenas de estudantes universitários como ajuda ao ensino em
aulas de sociologia; 5) publicação no jornal de estudantes como parte de um
relatório publicitário sobre a investigação; 6) publicação no jornal da cidade do
sujeito como parte de um relatório publicitário sobre a investigação; e 7)
utilização numa campanha publicitária a nível nacional defendendo a
integração racial. Pedia-se aos sujeitos para assinarem os seus nomes abaixo de
cada fotografia a que davam o consentimento. Quanto mais ampla era a
utilização autorizada, mais favorável era a atitude dos sujeitos. As pessoas
comprometiam-se à acção e às consequências da vida real em maior extensão
do que se preenchessem uma escala de auto-avaliação.

Documento 4.2 - Uma medida comportamentaI das atitudes

Outros estudos têm avaliado atitudes em relação a várias pessoas e


organizações mediante a medida comportamental da "técnica da carta
perdida". São "perdidas" cartas, sendo antes dirigidas a várias pessoas ou
organizações. A proporção de cada conjunto de cartas que é reenviada
serve de índice de como se gosta de cada organização. Mas, como veremos
mais adiante neste capítulo, o comportamento nem sempre é um bom guia
para as atitudes.

Mary Allen e Beth Rienzi (1992) utilizaram esta técnica para medir atitudes
em relação aos americanos em oito países europeus (Alemanha, Austria,
Checoslováquia, Dinamarca, França, Hungria, Itália, e Suiça). Os
experimentadores deixaram cair 200 cartas em lugares públicos (sobretudo
junto a cabines de telefone) nos países europeus e 70 cartas em lugares
semelhantes para comparação. As cartas tinham a direcção escrita à mão

385
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para a casa de um dos autores numa pequena cidade da Califórnia. Dado
que a direcção era claramente identificada como americana, os
experimentadores postularam que as taxas de regresso reflectiriam atitudes
em relação aos americanos. 145 cartas foram reenviadas, isto é, uma taxa
de reenvio de 55%. Não havia diferenças significativas nas taxas de
regresso de qualquer um dos lugares. Allen e Rienzi concluíram que
europeus e americanos têm atitudes semelhantes em relação aos
amencanos.

Fonte: Adaptado de Oppenheim, 1966.

Figura 4.8 e 4.9 - Exemplos de técnicas projectivas indirectas para medir a


atitude da pessoa. Na figura 4.8 é-lhe pedido para dar uma
explicação para o facto de chegar atrasado; na figura 4.9
tem que dar uma explicação para o facto de fumar.

As técnicas projectivas em que se pede aos sujeitos para descreverem uma


figura, contarem uma história, completarem uma frase, ou indicarem como
é que alguém reagiria a essa situação, têm a vantagem de que muitas vezes
as pessoas projectam as suas próprias atitudes nos outros. Daí que o facto
de se pedir a alguém para preencher, por exemplo, os balões nas figuras 4.8
e 4.9 pode propiciar o conhecimento da atitude da pessoa em relação à
autoridade. Tendo em conta o modo como o sujeito preenche esses balões
pode-se inferir que a pessoa tem uma atitude submissa ou irreverente
perante a autoridade.

386
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A utilização de técnicas indirectas para medir as atitudes reveste-se quer de
vantagens quer de desvantagens. Entre as vantagens assinale-se que essas
técnicas são menos susceptíveis de suscitarem respostas socialmente
aceites. A pessoa não conhece que atitude está a ser medida. Entre as
desvantagens refira-se a dificuldade em medir a intensidade da atitude e
sendo as atitudes inferidas, estas técnicas podem deixar a desejar quanto à
fidelidade. Também podem suscitar problemas éticos. Apesar disso as
medidas indirectas são a única avenida a seguir-se quando o investigador
trabalha sobre assuntos sociais muito sensíveis.

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7. Atitudes e comportamento

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Os psicólogos SOCIaIS estiveram tão interessados no estudo das atitudes
durante décadas, em grande parte porque acreditaram que a partir das
atitudes podiam prever o comportamento. A maioria das pesquisas sobre
atitudes raciais, por exemplo, tinham subjacente a suposição da existência
de uma relação coerente entre atitudes e comportamento. Além disso, os
psicólogos sociais também estavam interessados em mudar o
comportamento através da influência exercida sobre as atitudes das
pessoas. Efectivamente, muitas das definições tradicionais da atitude
consideravam-na como uma predisposição para agir de determinado modo.

7. I O dilema da consistência atitude-comportamento

Um dos primeiros estudos que sugeriram que as atitudes e os


comportamentos poderiam não estar tão estreitamente ligados como os
psicólogos sociais da época pareciam pensar, foi efectuado por LaPiere
(1934). Nessa altura havia fortes sentimentos de hostilidade em relação aos
Orientais nos Estados Unidos. Entre 1930 e 1932, LaPiere viajou por esse
país com um casal de chineses. Foram recebidos em 66 hotéis e servidos
em 184 restaurantes e cafés. Apenas uma vez foram claramente rejeitados
por pessoas a quem tinham solicitado serviço. Seis meses após as suas
visitas, LaPiere enviou um questionário onde pedia: "Aceitaria pessoas de
raça chinesa como hóspedes no seu estabelecimento?" Obteve respostas de
8 I restaurantes e 47 hotéis. A resposta foi extraordinariamente negativa -
92 disseram "NÃO", enquanto que os outros responderam "Não tenho a
certeza, depende das circunstâncias". Um grupo de controlo de
estabelecimentos que não foram visitados respondeu de forma idêntica.

Um estudo semelhante foi descrito por Kutner, Wilkins e Yarrow (1952)


nos Estados Unidos quando ainda existia a segregação em que se verificou
que, muito embora as pessoas negras fossem servidas de modo satisfatório
num certo número de restaurantes, os mesmos restaurantes recusariam
posteriormente efectuar reservas para um acontecimento social que incluía
pessoas negras.

Muito embora ambos os estudos sugiram a existência de uma certa


discrepância entre atitude e comportamento, suscitam alguns problemas.
Por exemplo, em nenhum caso foi avaliada a atitude. Em vez disso uma
intenção comportamental foi comparada com um comportamento. Não se
sabe tão pouco se as pessoas que recusaram a reserva por carta ou por
telefone eram as mesmas pessoas que tinham admitido as pessoas chinesas
e negras quando estiveram no estabelecimento (Dillehay, 1973).

391
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Se esses primeiros estudos suscitam uma sene de problemas, estudos
posteriores que eliminaram alguns dos problemas não foram muitas vezes
mais bem sucedidos no estabelecimento de uma relação entre atitudes e
comportamento. Wicker (1969) efectuou uma revisão de estudos empíricos
sobre as relações entre atitudes e comportamentos realizados desde o
estudo de LaPiere em 1934. Segundo Wicker estes estudos raramente
apresentam uma correlação superior a .30 e muitas vezes a correlação está
próxima de zero. Nessa mesma época, Mischel (1968) coligiu também
investigações sobre o valor do traço de personalidade enquanto factor
preditor do comportamento e concluíra pela famosa correlação de .30, ou
seja, a correlação média era aproximadamente de .30 entre o traço e o
comportamento.

A revisão de Wicker levou certos psicólogos sociais a concluírem que o


conceito de atitude não era útil e pouco servia para prever o
comportamento. Encontra-se, contudo, forte apoio empírico da validade
preditiva da atitude em relação ao comportamento. Por exemplo, Rajecki
(1990) refere um análise das sondagens de opinião efectuadas por Gallup
de 1936 a 1984 sobre eleições presidenciais americanas, nada menos que
25 eleições. A separação média em percentagem entre os resultados das
sondagens que precediam imediatamente a eleição e os resultados das
eleições é de 2,1. Para as cinco eleições mais recentes a margem é ainda
menor (1,2).

7.2 Condições metodológicas da predição atitude-comportamento

Uma primeira tentativa de reavaliação da consistência da atitude e do


comportamento debruçou-se sobre os aspectos metodológicos das
investigações. Referiremos, para além de possíveis problemas de medida, o
princípio de correspondência, o princípio de agregação dos
comportamentos e o princípio do comportamento prototípico.

Uma das possibilidades é que problemas de medida interfiram na nossa


possibilidade em prever de modo exacto o comportamento a partir das
atitudes. Pressões para se dizer e fazer coisas socialmente desejáveis pode
tornar as medidas das atitudes e dos comportamentos menos válidos do
que se pretenderia. Também pode acontecer que os instrumentos não sejam
suficientemente sensíveis e precisos para avaliarem as atitudes. A
discrepância também pode ocorrer devido ao prazo de tempo muito longo
entre a observação de uma variável e da outra. O investigador mede a
atitude do sujeito e, muito tempo depois, o seu comportamento. Entretanto,
a atitude pode ter mudado.

392
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,
"

Uma outra razão é que, como no estudo de LaPiere e em muitos outros, se


tentam relacionar atitudes gerais (atitudes em relação aos Chineses) com
comportamento específico (ser um casal chinês acompanhado por um
americano branco). Seria mais apropriado ter em conta o principio de
correspondência (Ajzen e Fishbein, 1977): as componentes preditivas do
comportamento (atitude ou crença, ou intenção ... ) e o comportamento
previsto deveriam medir-se a níveis correspondentes de especificidade.
Para se aplicar este princípio é necessário precisar os níveis de
correspondência atitude-comportamento por meio de quatro marcadores:
uma acção (fumar), um alvo (fumar cigarros), uma situação (em locais
públicos) e o tempo (nos próximos três meses). Para tal Ajzen e Fishbein
(1977) recensearam 109 trabalhos. Os resultados confirmaram as· vantagens
em aplicar-se o princípio de correspondência. As correlações notórias entre
atitude e comportamento apareciam nas investigações se seguiam o
princípio de correspondência. Em suma, quanto mais os quatro marcadores
da medida de atitude são parecidos com os marcadores do comportamento,
tanto mais a relação atitude-comportamento será importante.

Uma outra questão a considerar na relação atitude/comportamento é o


principio da agregação dos comportamentos. O estudo de LaPiere testou
um acto em relação com uma atitude. Manter-se-ia a discrepância caso se
considerem actos múltiplos? Para demonstrar que a construção de um
índice comportamental compósito pode aumentar a correlação atitude-
comportamento, Fishbein e Ajzen (1974) efectuaram um estudo
relacionando atitudes religiosas com os comportamentos. Em primeiro
lugar, pediram a 62 estudantes para preencherem um questionário de auto-
avaliação de comportamentos religiosos ("Reza antes das refeições", "Dá
dinheiro a instituições religiosas", etc). Seguidamente perguntava-se aos
sujeitos as suas intenções comportamentais ("Teriam um casamento
religioso", etc). Finalmente os estudantes preencheram cinco escalas de
atitudes diferentes: diferenciador semântico, Likert, Guttman, Thurstone e
Guilford. Os resultados mostraram que todas as escalas se correlacionavam
altamente tomando como critérios actos múltiplos, enquanto que a
predição tomando como critério um acto singular, tendia a ser baixa ou não
significativa. Estudos posteriores confirmaram a importância do princípio
de agregação dos comportamentos num índice compósito (Weigel e
Newman, 1976).

Uma das razões para a inclusão de um leque amplo de comportamentos é


que o comportamento é complexo e multideterminado. Os factores
situacionais também podem influenciar o comportamento. Carr e Roberts
(1965) encontraram que alguns estudantes negros não se juntaram a uma

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marcha dos negros pela igualdade racial porque foram pressionados pelos
seus pais contra tal acto. Já outros estudantes avançaram que a única razão
para a sua participação na marcha foi que os colegas os tinham pressionado
para tomarem parte. Muito presumivelmente, em ambos os casos, os
estudantes negros tinham atitudes favoráveis em relação à marcha. Mas por
diferentes razões situacionais, as suas atitudes e comportamentos não eram
consistentes.

As atitudes religiosas predizem comportamentos religiosos. Como se observa no


texto, as atitudes predizem melhor muitas vezes comportamentos agrupados do
que predizem comportamentos isolados.

Um outro princípio que ajudou a clarificar a relação atitude-


comportamento foi o do comportamento prototípico. Há objectos que
desencadeiam mais facilmente uma reacção atitudinal que outros. Isso
observa-se particularmente quando se está perante objectos representativos
de uma classe de objectos. Lord, Lepper e Mackie (1984) puseram em
evidência que as atitudes de estudantes em relação a pessoas descritas
como sendo homossexuais só prediziam o seu comportamento em relação
aos homossexuais se eles se enquadravam no protótipo que o sujeito tinha
do homossexual típico. Quando um homossexual era diferente do
protótipo, a relação atitude-comportamento já não era consistente.

394
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Podemos também ser levados a pensar que uma atitude em relação a uma
minoria étnica pode activar-se rápida e automaticamente aquando da
interacção com alguém que nos parece ser um representante típico desta
minoria. No caso do estudo de LaPiere (1934) é de admitir a existência de
uma grande diferença entre a representação do chinês tipo imaginado pelos
donos dos hotéis aquando da recepção da carta e a imagem do gentil casal
que se apresentou nos estabelecimentos. Em suma, quando estamos
perante a atitude a respeito de grupos pode revestir-se de interesse
examinar-se preliminarmente a representação que a amostra tem do alvo.

7.3 Modelos teóricos de predicção do comportamento

Para se resolver o dilema da consistência houve investigadores que se


voltaram para a "abordagem das outras variáveis" (Wicker, 1971). Apesar
de melhorias metodológicas é possível que haja factores que se possam
opor ao comportamento implicado por uma atitude. Por exemplo, uma
pessoa pode recusar-se a contribuir com dinheiro para uma organização
dos direitos humanos, muito embora tenha uma atitude favorável em
relação a essa organização (Insko e Schopler, 1967). Pode acontecer que
essa pessoa tenha obrigações mais prementes, tais como as necessidades da
sua família. A compreensão dos papéis concorrentes de diversas atitudes
pode contribuir para a previsão do comportamento futuro.

7.3.1 Abordagem das variáveis moderadoras

Uma variável moderadora representa uma variável que influencia a direcção


ou a intensidade da relação entre uma variável preditora ou independente e
uma variável critério ou dependente (Baron e Kenny, 1986). Trata-se pois
de uma terceira variável que age sobre a correlação simples entre outras
duas variáveis.

Ora tendo os psicólogos sociais recuperado a confiança de que as atitudes


prevêem o comportamento, investigadores têm-se debruçado sobre
condições em que atitude e comportamento serão mais ou menos
consistentes, como sejam, experiência directa, factores pessoais e
situacionais e diferenças individuais.

Um factor que contribui para aumentar a consistência atitude-


comportamento é a experiência directa da pessoa com o objecto da

395
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atitude. Por exemplo, quando um estudante partIcIpoU em várias
experiências em psicologia, a atitude desse estudante em relação às
experiências em psicologia é muito mais susceptível de predizer a sua
futura participação do que se o estudante só tivesse lido acerca de
experiências (Fazio e Zanna, 1978). Num estudo com jovens verificou-se
que a educação sexual nas turmas afectava o conhecimento acerca do sexo
e do controlo de nascimentos, mas tinha pouco efeito sobre o
comportamento. Contudo, tendo estes estudantes acesso a um centro de
saúde reduziu-se acentuadamente a gravidez indesejada num período de
dois anos (Findlay, 1981). Em consequência, a experiência directa com um
centro de saúde ou com as experiências aumentou a consistência entre
atitude e comportamento.
Tem sido sugerido que a ligação entre comportamentos e atitudes formada
mediante experiência directa é mais forte porque tais atitudes são mantidas
com mais clareza, confiança e certeza (Fazio e Zanna, 1978), porque tais
atitudes são mais acessíveis e mais fortes (Fazio, 1989) e porque são
automaticamente activadas com a apresentação do objecto de atitude
(Fazio, Sanbonmatsu, Powell e Kardec, 1986).
Um segundo factor que afecta a consistência atitude-comportamento é a
pertinência pessoal. Se uma pessoa tem um direito adquirido numa
questão aumenta a relação entre atitude e comportamento. Um direito
adquirido significa que os acontecimentos em questão terão um forte efeito
na própria vida da pessoa. Numa experiência, Sivacek e O-ano (1982)
tomaram contacto com estudantes e solicitaram a sua ajuda numa
campanha contra uma lei que aumentaria a idade de beber dos dezoito para
os vinte anos. Quase todos os estudantes se opunham à lei apesar da sua
idade. Se os estudantes mais novos tinham um direito adquirido e a
aprovação da lei interferia com as suas vidas sociais, os estudantes mais
velhos não tinham nenhum direito adquirido pois mesmo que a lei fosse
aprovada já teriam mais de vinte anos quando a lei se aplicasse. Não
admira, por conseguinte, que tenham sido os estudantes mais novos que
concordaram em fazer a campanha contra a lei. Muito embora os
estudantes mais velhos se opusessem em princípio de modo igual à lei,
faltava-lhes no entanto qualquer direito adquirido. As suas atitudes não
acarretavam o comportamento correspondente.
A relação entre atitudes e comportamento também depende do modo como
se espera que nos comportemos em determinadas situações. Por exemplo,
Kiesler (1971) assinala que se espera que uma pessoa não expresse
sentimentos negativos acerca das outras directamente, é difícil que os
sujeitos admitam que têm atitudes negativas em relação a outros sujeitos
nas experiências.

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Diferenças individuais também podem ser importantes. Algumas pessoas
estão naturalmente mais dispostas que outras a expressar consistência entre
as suas atitudes e comportamentos. Norman (1975) verificou que os
sujeitos com alta "consistência afectivo-cognitiva", isto é, o acordo entre
os seus sentimentos e as suas atitudes expressas, eram mais susceptíveis de
agir de acordo com as suas atitudes que os sujeitos cujos sentimentos e
crenças estavam em conflito.

Uma variável que tem sido muito estudada em psicologia é o locus de


controlo (Barros, Barros e Neto, 1993). No campo da relação atitude-
comportamento, Saltzer (1981) mostrou claramente a importância desta
variável para obter boas predições. Encontrou que os sujeitos com um
locus de controlo interno, a respeito da perda de peso, tinham correlações
significativas e importantes com essa conduta, o que não acontecia com os
sujeitos com um locus de controlo externo donde não apareceram
correlações significativas, o que impedia de obter correlações significativas
intenção comportamental-comportamento.

Outro factor de personalidade que pode afectar a consistência atitude-


comportamento é a auto vigilância que consiste numa capacidade de auto-
observação e de autocontrolo dos comportamentos verbais e não verbais
em função de índices situacionais (Snyder, 1979). Dado que os sujeitos
com auto-vigilância elevada são pragmáticos, indo de uma situação para
outra como um camaleão, e que os sujeitos com auto-vigilância baixa
guiam o seu comportamento a partir dos seus valores, atitudes e
convicções pessoais, resulta que a consistência atitude-comportamento é
maior nos sujeitos com autovigilância baixa.

Relembre-se que a autoconsciência é uma característica disposicional para


prestar atenção a si próprio em diversas situações (Buss, 1980; Neto,
1989), donde a existência de variações crónicas das pessoas nos seus
estilos de atenção em relação a si próprias. Contribui para o processo de
regulação do comportamento na medida em que a pessoa centra a sua
atenção em certos aspectos salientes de si própria. As dimensões privada e
pública da autoconsciência permitem efectuar predições diferentes da
consistência entre as atitudes e o comportamento. Por exemplo, Scheier
(1980) estudou a consistência atitude-comportamento para a auto-
consciência privada e pública, a partir das hipóteses seguintes. As pessoas
altas na autoconsciência pública deveriam ser inconsistentes nos contextos
públicos por serem tocados pela opinião dos outros. As pessoas altas na
autoconsciência privada deveriam ser consistentes porque elas conhecem
realmente bem as suas atitudes. As pessoas com elevada autoconsciência
pública e privada deveriam ser tão afectadas pela opinião dos outros que o

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efeito da autoconsciência privada deveria ser anulado, e seriam portanto
inconsistentes. As pessoas com baixa autoconsciência privada não se
conheciam suficientemente bem para serem consistentes quer com a
autoconsciência pública alta quer com a baixa. As únicas pessoas que se
espera sejam consistentes são as pessoas com alta autoconsciência privada
e com baixa autoconsciência pública.

Scheier entrevistou sujeitos para descobrir as suas atitudes em relação ao


uso do castigo físico como técnica de aprendizagem. Meses mais tarde
trouxe-os ao laboratório em grupos de 2 a 4 sujeitos. Pediu a cada um para
escrever uma redacção sobre o uso do castigo físico como uma técnica de
educação das crianças, depois do que discutiriam os pontos de vista com os
outros. As redacções foram avaliadas segundo a atitude em relação ao
castigo e estes scores foram correlacionados com as atitudes que os
sujeitos tinham manifestado na pré-testagem vários meses antes. Havia 4
grupos de sujeitos, divididos em altos ou baixos na autoconsciência
privada/pública: altos/altos, altoslbaixos, baixos/altos e baixoslbaixos. Só
os sujeitos com alta autoconsciência privada e com baixa autoconsciência
pública tinham uma correlação significativa .64. Somente os sujeitos com
elevada autoconsciência privada se conheciam suficientemente para serem
consistentes, e somente os sujeitos com baixa auto-consciência pública
expressavam as suas verdadeiras atitudes sem serem perturbados pelo
modo como os outros os viam.

Prever o comportamento a partir das atitudes não é assim tão simples como
poderia parecer à primeira vista. Os psicólogos sociais têm examinado o
problema da experiência directa, de factores pessoais, de normas sociais e
de diferenças de personalidade. Tomando em consideração tais factores
pode-se prever o comportamento de modo mais preciso, mas não tão
precisamente quanto seria desejável.

7.3.2 Teoria da acção reflectida e do comportamento planificado

Fishbein e Ajzen (1975) desenvolveram uma teoria da acção reflectida que


mais tarde foi denominada de teoria do comportamento planificado por
Ajzen (1985). A teoria da acção reflectida descreve as relações entre
crenças, atitudes e comportamento. As crenças influenciam: 1) atitudes em
relação a um comportamento particular e 2) normas subjectivas. Estes
componentes influenciam as intenções comportamentais que, por sua vez,
influenciam o comportamento. A atitude de uma pessoa em relação a um
comportamento (figura 4.8) é determinada pelas crenças de que realizando,

398 © Universidade Aberta


o comportamento, isso leva a resultados desejáveis ou indesejáveis. As
normas subjectivas envolvem: 1) crenças acerca de comportamentos
normativos (isto é, que são esperados pelos outros) e 2) motivação de uma
pessoa para condescender com expectativas normativas.

Só os componentes endógenos do modelo influenciam directamente a


intenção e, pelo mesmo facto, o comportamento (Ajzen e Fishbein, 1980).
Segundo a teoria, a intenção comportamental está sob a inlluência imediata
das componentes da atitude e da norma subjectiva, que ambas se
encontram sob a influência das componentes que as constituem, isto é as
crenças e as avaliações das consequências para a atitude, as crenças
normativas e a motivação em se submeter à norma subjectiva. Atitude tem,
pois, de se traduzir em intenção para exercer uma influência no
comportamen to.

De um modo geral, a intenção de efectuar um comportamento estará em


relação directa com a soma dos produtos das crenças, multiplicadas pela
sua avaliação, bem como com a soma dos produtos das crenças
normativas, multiplicadas pela motivação em condescender. Todavia, a
teoria postula que a importância relativa dos dois factores depende da
natureza do comportamento alvo. Por conseguinte, para certas intenções, a
componente atitude ou norma subjectiva será predominante; noutras
situações, as duas componentes podem contribuir para a intenção de igual
modo. O valor explicativo da teoria é aumentado pela possibilidade de
atribuir empiricamente ponderações (coeficientes de regressão) aos dois
determinantes da intenção.

Certas variáveis exteriores ao modelo podem também influenciar a intenção


comportamentaL mas de modo indirecto, por meio de outras componentes
do modelo. Esta aptidão dos factores preditores endógenos do modelo em
mediatizar os efeitos de ,.variáveis externas constitui o postulado de
suficiência. Entre estas variáveis externas encontram-se traços de
personalidade, dados sócio-demográficos, etc.

Diversos estudos têm vindo em apoio da teoria da acção reflectida em que


a intenção comportamental era determinada só pela atitude e pela norma
subjectiva. Num dos primeiros estudos, Fishbein (1966) tentou predizer se
estudantes teriam relações sexuais antes do casamento. No início do
semestre avaliou as suas crenças sobre o que os outros consideravam que
deveriam fazer e a sua motivação em conformar-se com as expectativas
dos outros. No fim do semestre perguntou aos estudantes se tinham tido
relações sexuais durante o semestre. Ora os resultados puseram em
evidência que as medidas iniciais prediziam muito bem as intenções dos

399
© Universidade Aberta
estudantes e que as intenções prediziam a actividade sexual. Davidson e
Jaccard (1979), por seu lado, mediram as atitudes de senhoras acerca de
terem um filho nos dois próximos anos. Foram igualmente medidas as
normas subjectivas. Tendo em conta estes dois factores, Davidson e
Jaccard efectuaram boas predições acerca de as senhoras terem um filho no
período de dois anos. Num outro estudo, atitudes e normas subjectivas de
senhoras casadas sobre o uso da pílula predisseram o seu uso dois anos
depois (Davidson e Morrison, 1983). De modo semelhante, medidas de
factores salientados pela teoria da acção reflectida predisseram a intenção
de ter um aborto entre senhoras que estavam à espera dos resultados de um
teste de gravidez (Smetana e Adler, 1980).

Crenças Atitude em
comportamen- --+
relação ao
tais e motivação
comportamento
do resultado

Crenças Norma Intenção ~comportamento I


normativas e
subjectiva comportamentaJ
motivação em
condescender A. Modelo de acção retlectida

Crenças acerca Controlo


da facilidade ou --+ comportamental
dificuldade do percepcionado B. Modelo do comportamento
planificado
comportamento

Fonte: A - Adaptado de Fishbein e Ajzen (1975).


B - Adaptado de Ajzen (1985).

Figura 4.10 - Componentes da teoria do comportamento planificado

Sínteses meta-analíticas da grandeza da associação entre atitudes e normas


subjectivas, por um lado, e intenções comportamentais, por outro lado,
mostram correlações médias oscilando de .53 a .68, e entre intenções

400
© Universidade Aberta
comportamentais e comportamento pouco mais de .50 (Sheppard,
Hartwick e Warshaw, 1988). Estas associações são consideravelmente
maiores que o máximo de .30 referido por Wicker (1969).

Apesar de certas dificuldades deste modelo, tem havido um consenso


quanto à robustez da teoria da acção reflectida para predizer o
comportamento voluntário. Mas o que é que acontec~ quando o
comportamento alvo só é parcialmente voluntário, como por exemplo, com
acções para perder peso? Para dar conta dos determinantes que escapam à
vontade, Ajzen (1985) propôs a teoria do comportamento planificado que
acrescenta uma variável preditora ao modelo da acção reflectida (Figura
4.8). Este factor denominado de controlo comportamental percepcionado é
determinado pelas experiências passadas de uma pessoa e pelas crenças
sobre como é susceptível de ser fácil ou difícil a realização do
comportamento. Por conseguinte, quanto mais a atitude e a norma
subjectiva sejam favoráveis a um comportamento e maior a impressão de
controlo quanto a este comportamento, mais a intenção comportamentaJ
será forte.

Suponha, por exemplo, que a Irene deseja deixar de fumar o que já faz há
vinte anos (atitude positiva em relação a deixar de fumar). Para além disso,
ela sabe que a sua família e o seu médico de família aprovam que deixasse
de fumar e ela gostaria de lhes ser agradável (norma subjectiva). Todavia
após se dar conta de como este hábito impregnava as suas actividades
quotidianas e quão difícil seria mudar estas actividades, a Irene pode perder
confiança na sua capacidade em tornar-se não fumadora (baixo controlo
comportamental percepcionado). Por isso, apesar da atitude e da norma
subjectiva, a Irene tem uma baixa probabilidade de mudar a sua intenção de
deixar de fumar.

No âmbito da teoria do comportamento planificado, Ajzen e Madden


(1986) encontraram que os três factores - atitude em relação ao
comportamento, normas subjectivas e controlo percepcionado - eram
predictores da intenção de assistir às aulas e de obter um boa nota. O
documento 4.3 apresenta um exemplo que apOla a teoria do
comportamento planificado.

o trabalho susceptível de ser desenvolvido com a teoria do comportamento


planificado pode ser muito complexo. Um estudo relativamente simples sobre a
dádiva de sangue foi efectuado por Giles e Cairns (1995). Administraram um
questionário a estudantes universitários uma semana antes da chegada do
serviço de dádiva de sangue. Neste questionário incluiram-se questões para

© Universidade Aberta 40\


avaliar as três variáveis da teoria: atitudes ("Ajudará as outras pessoas?"),
norma subjectiva ("Os membros da minha família pensam que eu deveria dar
sangue'?"), e o controlo comportamental percepcionado ("Posso facilmente dar
sangue se quiser"). Após a partida do serviço de dádiva de sangue, anotaram-se
os sujeitos que efectivamente tinham dado sangue e foi feita uma análise do
modo como as respostas ao questionário puderam predizer este comportamento.
Encontrou-se que as três variáveis juntas explicaram 619c. da variância na
dádiva de sangue. Ou se se quiser, por outras palavras, muito embora haja
outros aspectos que tenham afectado a dádiva, a teoria explicava quase dois
terços do que acontecera. Este exemplo denota um forte apoio da teoria de
Ajzen.

Documento 4.3 - Apoio da teoria do comportamento planificado

Embora alguns investigadores que compararam os poderes de predição das


teorias da acção retlectida e do comportamento planificado tenham
concluído que a teoria mais antiga funciona tão bem como a mais nova, a
maior parte das comparações dos dois modelos encontraram uma vantagem
de predição para a teoria do comportamento planificado (Olson e Zanna,
1993). Ajzen (1991) faz uma revisão de vários estudos em que mostra que
a teoria da acção planificada prevê intenções comportamentais melhor que
a teoria da acção retlectida, isto é, o controlo comportamental
percepcionado acrescenta à predição das intenções comportamentais além
dos efeitos de atitudes e das normas subjectivas.

Se estes modelos têm sido confirmados num número considerável de


estudos e mostram a utilidade em se ter uma perspectiva complexa sobre a
relação entre atitudes e comportamento, não estão todavia isentos de
críticas. Estes modelos não permitem prever com exactidão total, pois as
melhores intenções falham, em do comportamento. Outras coisas podem
interferir, como distracções, crise~, etc., impedindo que as intenções se
concretizem.

Mesmo se os dois modelos se revestem de simplicidade e de elegância e


têm suscitado muita investigação, não dão totalmente conta das
complexidades das relações entre atitude e comportamento. É óbvio que a
investigação continuará e emergirão novas abordagens que contribuirão
para uma melhor compreensão deste problema simultaneamente importante
e fascinante.

Através deste capítulo ficou patenteado que a psicologia social


contemporânea aborda o construto atitude como um fenómeno individual.
As atitudes têm sido sobretudo conceptualizadas como estados internos

402 © Universidade Aberta


cognitivos e afectivos, ou como intenções comportamentais e
predisposições. Tal perspectiva contrasta como as atitudes foram
construídas quando entraram nas ciências sociais. Todavia, em consonância
com as primeiras perspectivas de Thomas e Znaniecki e dos
interaccionistas simbólicos, há cada vez mais teóricos que de novo
sublinham que as atitudes se originam e emergem da vida social mediante
as interacções quotidianas e as comunicações com as outras pessoas. As
atitudes são amplamente partilhadas fornecendo significação cultural para a
vida quotidiana. Só recentemente ressurgiram análises que restabelecem a
natureza social das atitudes (Biser, 1994).

As teorias contemporâneas da atitude podem contrastar-se com o quadro


teórico das representações sociais que abordaremos no próximo capítulo.
As representações sociais tentam reinstalar a natureza social e colectiva de
construtos cognitivos, tais como atitudes, crenças e valores.

403
© Universidade Aberta
APLICAÇÕES: ATITUDES POLÍTICAS E COMPORTAMENTO

Com muita frequência os nossos valores e atitudes são determinados pelos


grupos a que procuramos pertencer ou com que nos identificamos. Um
grupo de referência é um grupo para onde as pessoas se orientam,
recorrendo aos seus padrões para efectuarem julgamentos sobre elas
próprias e sobre o mundo. Uma característica de um grupo de referência é
que as pessoas se sentem vinculadas afectivamente a ele, mesmo se no
presente não são membros desse grupo. Os grupos de referência podem ser
amplos como, por exemplo, uma determinada nação ou religião, ou muito
mais pequenos como, por exemplo, a própria família.
Um dos primeiros e melhores estudos sobre a inJ1uência de grupos de
referência foi a investigação efectuada por Theodore Newcomb nos anos
trinta que ilustra a mudança de atitudes políticas de estudantes
universitários de conservadorismo, aquando da entrada na faculdade, para
liberalismo quando concluíram a licenciatura.
As atitudes de caloiros em relação aos candidatos presidenciais eram
semelhantes às dos seus pais, mas as atitudes das estudantes mais velhas
divergiam acentuadamente das dos seus pais (quadro 4.6).

52 Caloiros 40 E~tudantes do 2°ano 52 Finalistas

Candidato Estudantes Pais Estudantes Pais Estudantes Pais

Alfred Landon

(Republicano) 62 66 43 69 15 60

Franklin Roosevelt

(Democrata) 29 26 43 22 54 35

Norman Thomas *
(Socialista)

Earl Browder

(Comunista) 9 7 15 8 30 4

* Os candidatos socialista e comunista foram agrupados porque a preferência era baixa


Fonte: Adaptado de Newcomb, 1943.

Quadro 4.6 - Percentagem de preferência de estudantes de Bennington e dos


seus pais pelos candidatos presidenciais em 1936

404
© Universidade Aberta
Theodore Newcomb

Newcomb avançou como explicação para estes resultados que se a


Universidade de Bennington era predominantemente liberal nas suas ideias
políticas tendendo portanto a apoiar o candidato do partido democrático, a
maioria das estudantes provinha de famílias com ideias conservadoras
apoiando o candidato do partido republicano. À medida que as estudantes
progrediam nos seus cursos adoptavam cada vez mais as ideias dos seus
professores. Assinale-se também que as estudantes que se tornaram mais
liberais eram mais activas na vida social da Faculdade. Por outro lado, as
que permaneciam conservadoras tendiam a estar isoladas. Para além disso,
estas últimas estudantes mantinham fortes laços com a família.

Para determinar até que ponto essas atitudes progressistas permaneciam,


Newcomb e seus colaboradores (1967) 25 anos depois retomaram contacto
com as estudantes. Nos anos sessenta, esses estudantes de Bennington
tinham 40, 50 anos e situavam-se também entre a população com nível
sócio-económico mais elevado. Comparando-as com estudantes que não
foram educadas em Bennington em riqueza, idade, religião e região
geográfica semelhantes, Newcomb encontrou que as atitudes políticas e o
comportamento das mulheres de Bennington eram muito mais liberais.
Newcomb notou que após o curso, as mulheres procuravam situações que
fossem consistentes com as atitudes que tinham desenvolvido na
universidade. Trabalhos, maridos e relações sociais eram escolhidos, pelo

405
© Universidade Aberta
menos em parte, de acordo com as atitudes formadas na Universidade.

Nos anos oitenta Newcomb e seus colegas contactaram novamente as


antigas estudantes de Bennington, agora com sessenta e setenta anos, para
medir novamente as suas atitudes políticas. Se bem que Newcomb tenha
falecido antes de o estudo estar completo, os dados ainda vêm em apoio
da sua hipótese inicial acerca da força dos grupos de referência (Alwin,
Cohen, e Newcomb, 1991). Os resultados indicaram que os grupos de
referência liberais destas mulheres, despontadas durante os tempos
passados na faculdade há meio século, ainda influenciavam
significativamente as suas, vidas. Como se pode ver no quadro 4.7, quando
comparadas com outras mulheres licenciadas do mesmo grupo etário, as
licenciadas em Bennington preferiam de modo consistente candidatos
liberais nas eleições presidenciais. Globalmente, a primeira e última
investigação de Newcomb ilustra a importância que os grupos de referência
desempenham para modelar e manter atitudes políticas e sociais, bem como
o papel que essas atitudes desempenham no desenrolar do ciclo vital para
as pessoas.

As estudantes de Bennington que desenvolveram atitudes políticas liberais nos anos 30


mantiveram-nas ao longo dos anos o que se reflecte na votação para as eleições
presidenciais. De modo consistente votaram no candidato mais liberal em todas as
eleições estudadas. Pelo contrário, mulheres com o mesmo nível de instrução e de idade
tendiam a preferir candidatos mais conservadores. Na sua faculdade predomina uma
orientação política de esquerda ou de direita? Mudaram as suas atitudes políticas na
direcção das perspectivas predominantes nesse contexto durante a estadia na faculdade?

Ano da eleição Candidato conservador Candidato liberal

1952 Eisenhower Stevenson

Mulheres de Bennington 43% 57%

Mulheres comparáveis 64 36

1960 Nixon Kennedy

Mulheres de Bennington 26 74

Mulheres comparáveis 75 25

406 © Universidade Aberta


1968 Nixon Humphrey

Mulheres de Bennington 33 67

Mulheres comparáveis 79 19

1976 Ford Carter

Mulheres de Bennington 31 69

Mulheres comparáveis 55 45

1984 Reagan Mondale

Mulheres de Bennington 27 72

Mulheres comparáveis 73 26

Fonte: Adaptado de Alwin, Cohen, e Newcomb, 1991.

Quadro 4.7 Voto de pessoas formadas por Bennington nas eleições


presidenciais americanas

Nem só o estudo de Bennington mostra a persistência de atitudes políticas


em gerações ulteriores (e. g., Marwell, Aiken, e Demerath, 1987;
McAdam, 1989). Tais estudos deixam transparecer que há mais
persistência que mudança nas atitudes políticas ao longo do tempo. De
certo modo quando se escolhe frequentar uma faculdade após o ensino
secundário, pode-se também estar a escolher, sem se dar conta, uma nova
perspectiva política.

SUMÁRIO

Poucos conceitos, senão mesmo nenhum, foram alvo de tanta atenção em


psicologia social como o de atitude. Apesar desta atenção, a compreensão
do conceito de atitude ainda é deficiente. Desde que começou o estudo
sistemático das atitudes, após a publicação do trabalho de Thomas e de
Znaniecki, foram feitas muitas tentativas para definir, medir e utilizar o
conceito com o intuito de melhorar a compreensão do comportamento
humano.

© Universidade Aberta 407


Tradicionalmente, as atitudes têm sido definidas como envolvendo crenças,
sentimentos e disposições a agir. Mais recentemente, os teóricos parecem
estar a mover-se para uma concepção das atitudes como avaliações,
avaliações estas que se relacionam de modo complexo com crenças,
sentimentos e acções.

Foram referidas quatro características da atitude: a atitude é pOSItiva ou


negativa (direcção); exprime um grau de atracção ou de repulsa em relação
ao objecto (intensidade); pode ser unidimensional ou multidimensional; a
acessibilidade está associada à força da atitude, quanto mais é acessível,
mais a latência da resposta é breve e mais esta atitude é preditora do
comportamento.

As atitudes ajudam-nos a definir grupos SOCIaIS, a estabelecer as nossas


identidades e a guiar o nosso pensamento e comportamento. Pode-se
distinguir as atitudes de crenças que são laços cognitivos entre um objecto
e algum atributo ou característica; e de valores que envolvem conceitos
mais abstractos, tais como liberdade e felicidade. A ideologia é uma outra
noção conexa.

As atitudes formam-se através da aprendizagem e são influenciadas pelas


pessoas (ou grupos) significativas da vida de uma pessoa. O grupo de
pertença é um grupo a que o indivíduo pertence; um grupo de referência é
um grupo a que o indivíduo aspira pertencer. Os meios de comunicação de
massa também podem contribuir para a formação das atitudes.

O condicionamento clássico é o processo que forma atitudes pelo


emparelhamento repetido de um conceito neutro com outro, com um
colorido social seja ele positivo ou negativo. O condicionamento operante
ocorre quando uma atitude é reforçada em virtude da aprovação social que
a pessoa recebe. As atitudes também são aprendidas através da modelagem
e da aprendizagem observacional. A teoria da autopercepção sugere que as
pessoas inferem muitas vezes as suas atitudes do comportamento.

Existem numerosas técnicas para medir as atitudes. Para além da análise de


conteúdo das comunicações, as técnicas mais comuns são de auto-
avaliação, tais como as escalas de distância social, de intervalos
aparentemente iguais, de classificações somadas, do escalograma e do
diferenciador semântico. Alguns procedimentos alternativos para medir as
atitudes foram também desenvolvidos, que não são técnicas de auto-
avaliação, tais como técnicas fisiológicas, comportamentais e projectivas.

Prever o comportamento a partir das atitudes não é tão simples como se


poderia pensar. Muito do trabalho inicial neste domínio partia da ideia de

408 © Universidade Aberta


que se se pudesse conceptualizar e medir as atitudes, poder-se-ia esperar
uma predição quase perfeita do comportamento. Contudo, várias décadas
de investigação empírica mostraram que a relação é contingente, isto é, a
utilidade das atitudes para prever os comportamentos é contingente de
vários factores pessoais e sociais.

As atitudes estão ligadas aos comportamentos, mas o estabelecimento desta


relação exige certas condições de foro metodológico. Segundo o princípio
de correspondência, uma atitude particular pode predizer um
comportamento particular se a atitude e o comportamento são
especificados por meio de quatro marcadores: acção, alvo, situação e
tempo. Uma atitude geral não assegura a predição de uma acção singular,
mas de uma categoria de comportamentos que formam o índice
comportamental compósito.
Para dar conta das numerosas variáveis, para além da atitude, que podem
influenciar, o comportamento foram propostos modelos teóricos. O
modelo mais influente da relação atitude-comportamento é o da teoria da
acção reflectida, posteriormente denominado de teoria do comportamento
planificado. Para o modelo da acção reflectida, o determinante mais
imediato do comportamento é a intenção ou o desejo de agir. Por seu lado,
a intenção é determinada pela atitude e pelas normas subjectivas. Para o
modelo do comportamento planificado o factor de controlo
comportamental percepcionado é acrescentado à atitude e à norma
subjectiva. Pressupõe-se que este modelo tem uma eficácia de predição
superior em situações em que o comportamento só esteja tenuemente sob
controlo voluntário.
Os grupos a que as pessoas procuram pertencer ou com que se identificam,
constituem um factor importante. para a formação e manutenção das
atitudes sociais e políticas. Tais grupos de referência fornecem às pessoas
padrões para se julgarem a elas próprias e ao mundo, e são susceptíveis de
influenciar decisões muitas vezes ao longo da vida.

PARA IR MAIS LONGE

AJZEN, L,

1988 Attitudes, personality and behavior. Chicago, Il:


Dorsey Press.

Esta obra apresenta uma discussão aprofundada da relação entre atitudes e

comportamentos, e em particular uma descrição pormenorizada da teoria da

acção reflectida.

© Universidade Aberta 409


JAHODA. M. e WARREN, N.

1973 Attitudes. Harmondsworth: Penguin.

Trata-se de uma colectânea de artigos de revistas abordando a teoria e a


investigação sobre atitudes. Inclui uma secção histórica com interesse.

MCGUIRE, W.1.

1985 Attitudes and attitudes change. In G. Lindzey e E.


Aronson (Eds.), Handbook of social psychology.
New York: Random House.

Neste capítulo descreve-se como é que atitudes e comportamentos são


influenciados pela comunicação e o que é que isso revela sobre a pessoa e a
sociedade.

OLSON,1. M. e ZANNA, M. P.

1993 Attitudes and attitude change. Annual Review of


Psychology,44,117-154.

É apresentada uma revisão da investigação e teoria sobre atitudes.

ACTIVIDADES PROPOSTAS

1- Passe alguns minutos a fazer uma lista de algumas situações em que o


termo atitude ou termos conexos, tais como opiniões, valores tenham sido
utilizados. Pense nas conversas da vida quotidiana que teve com outras
pessoas, nos programas de televisão, nas notícias dos jornais, em filmes ou
na literatura. Tente delinear uma lista de exemplos.
2- Qual a diferença entre uma crença, uma atitude e um valor?
3- Planeie uma escala de atitude, simples e administre-a a vários dos seus
amigos. Que problemas têm com as questões? Reflecte de modo acertado
as suas crenças? Até que ponto foi difícil construi-la?
4- Efectue um breve inquérito para determinar as fontes mais frequentes das
atitudes. Pergunte aos seus sujeitos o que é que influenciou mais as suas
atitudes mais importantes. Faça um mapa que mostre influências, tais como
influências dos pais, colegas, professores, meios de comunicação social, ou
da experiência pessoal.

410
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.,I .

5- O texto apresenta várias razões por que as atitudes ou os estereótipos


podem não predizer um comportamento específico. Há mais razões para
além das que foram apresentadas. Descreva várias razões e várias
circunstâncias em que pense que o seu comportamento teria estado de
acordo ou não com as suas atitudes.

6- Qual é a diferença entre medida directa e indirecta das atitudes?


Descreva três exemplos de cada uma.

7- Se fosse ligado(a) à "bogus pipeline" que género de questões mais


recearia que lhe fossem colocadas? Para quais das suas atitudes tem mais
dificuldade em ser honesto(a)?

8- Compare e contraste a teoria do comportamento planificado com a teoria


da acção reflectida.

9- No estudo de Bennington encontrou-se que muito embora a classe se


tivesse tornado muito mais liberal nos quatro anos que passou em
Bennington, as pessoas mais conservadoras, do centro ou de esquerda, ao
entrar na faculdade ainda eram susceptíveis de ter uma posição relativa no
fim do curso. Pode pensar em exemplos da sua própria experiência em que,
embora o grupo tivesse mudado, as posições relativas dos indivíduos
dentro do grupo permaneceram as mesmas?

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" '

\: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS

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TÁBUA DE MATÉRIAS

1. Introdução

2. Origens

3. Noção

4. Representações e Comunicação Social

5. Análise Psicossociológica da Representação Social

5.1 A representação-produto

5.1.1 Informação

5.1.2 Atitude

5.1.3 Campo de representação

5.2 A representação-processo

5.2.\ Objectivação

5.2.2 Ancoragem

6. Áreas de Investigação

7. Variações sobre Representações Sociais

7.1 Representações sociais e educação

7.1.1 Representações da escola através dos seus agentes

7.1.2 Representações recíprocas professor-aluno

7.2 Estudo experimental das representações sociais: Teoria do núcleo


central

7.3 Representações sociais da emigração

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Aplicações: representações e práticas sociais da sida

Sumário

Para ir mais longe

Actividades propostas

418
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Objectivos de aprendizagem

o estudo deste capítulo deve permitir ao aluno:


• Situar as origens do quadro teórico das representações sociais;

• Definir a natureza das representações sociais;

• Distinguir sistemas de comunicação;

• Examinar a incidência da comunicação ao nível da emergência das


representações sociais;

• Abordar os aspectos da representação-produto;

• Examinar a incidência da comunicação ao nível dos processos de


formação das representações, a objectivação e a ancoragem;

• Descrever diversas áreas de investigação sobre as representações


sociais;

• Indicar como o trabalho sobre as representações sociais pode ajudar


as pessoas a compreender questões sociais actuais, tais como
educação e emigração.

De même que dans un jeu, ou I'on essaie et éprouve les phénomenes matériels,
collectifs, avant de vérifier leur existence réelle et de les mettre en pratique
'pour de bon', on se risque à faire des ébauches et des brouillons, on se livre à
des manoeuvres intellectuelles et à des répétitions, que présentent le spectacle
du monde comme un monde du spectacle.

Serge Moscovici

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1. Introdução

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.,I .

Passamos uma parte importante das nossas vidas em conversações do mais


variado tipo. Conversas à volta de uma chávena de café com amigos,
entrevistas formais, conversas telefónicas são alguns exemplos que ilustram a
sua diversidade. Tarde, já em finais do século passado, apreendeu a importância
da comunicação para reproduzir e transformar as sociedades humanas, t.:ndo
então proposto que a Psicologia Social se ocupasse antes de mais do estudo
comparativo das conversações. Esta proposta "não caiu em saco roto", pois
nos anos sessenta em França vai despontar uma linha de investigação sobre as
representações sociais cujo material de base são precisamente as conversas
gravadas.

Após esta proposta de Tarde, as sociedades humanas evoluíram. Uma das


mudanças com maior impacto na vida quotidiana foi o papel cada vez mais
importante assumido pelos meios de comunicação de massa na criação e
difusão de informações e de modos de pensar, de sentir e de agir. Mais do que
nunca, as conversas particulares focalizaram-se em acontecimentos nacionais e
internacionais. Moscovici chegou ao ponto de caracterizar a nossa época como
sendo a era por excelência das representações sociais.

Serge Moscovici (1961, 1976) reagindo perante a progressiva psicologização


do conceito de atitude, inspira-se no conceito de Durkheim de representações
colectivas e faz a ligação com as origens mais sociais das atitudes, tal como
aparece, por exemplo, nos trabalhos de Thomas e Znaniecki (1918) no começo
deste século, para elaborar uma teoria que teve profundas repercussões na
psicologia social europeia. É amplamente reconhecido que os trabalhos que se
inscrevem nesta teoria constituem um traço diferenciado r na abordagem da
psicologia social europeia, constituindo uma das suas manifestações mais
importantes. As representações sociais são um exemplo muito claro da
prioridade da dimensão social na definição de sentido (Rijsman, 1990).

o quadro teórico das representações sociais construiu-se à volta de noções de


sistema e de meta-sistema antes de estar na moda o pensamento sistémico
(Doise, 1990). Por meio do estudo da representação social da psicanálise,
Moscovici (1961) mostrou várias semelhanças entre as características do
pensamento adulto e do pensamento infantil: utilização de informações
fragmentárias, recurso a conclusões demasiado gerais a partir de observações
particulares, a argumentos de causalidade com base em associações de natureza
avaliativa e a múltiplas redundâncias lexicais e sintáticas. Perante um quadro
tão denso de semelhanças, Moscovici (1976, p. 284) interroga-se sobre quais
os laços existentes entre pensamento infantil e características cognitivas das

423
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representações sociais: "o sistema cognitivo da representação social é do modo
como o vimos, porque a nossa razão contém organizações intelectuais próprias
de uma idade mais precoce? Ou é porque corresponde a uma situação e a uma
interacção colectivas a que se adaptou? Sobre o fundo, poder-se-ia mostrar não
haver contradição."

Efectivamente, quer no pensamento infantil quer no pensamento adulto, há


intervenção de dois sistemas cognitivos que originam as suas características
partilhadas: "... vemos em acção dois sistemas cognitivos, um que procede por
associações, inclusões, discriminações, deduções, isto é, o sistema operatório, e
o outro que controla, verifica, selecciona com ajuda de regras, sejam elas
lógicas ou não; trata-se de uma espécie de meta-sistema que trabalha de novo a
matéria produzida pelo primeiro" (Moscovici, 1976, p. 254). O estudo das
representações sociais vai precisamente ocupar-se das regulações efectuadas
pelo meta-sistema social no sistema cognitivo.

Considerado muitas vezes como "uma tradição francesa de investigação" (Farr,


1987), este domínio constitui hoje em dia um dos mais produtivos e inovadores
na psicologia europeia e já não se confina só à Europa, mas alastra-se cada vez
mais no mundo. Neste capítulo contextualizaremos as origens deste quadro
teórico e daremos alguns elementos para a sua definição. Referiremos também
o modo como habitualmente se estudam as representações sociais em
psicologia social, as suas áreas de investigação e a sua ilustração por meio de
estudos empíricos.

424 © Universidade Aberta


I
"

As conversas ajudam as pessoas a representar o que não é familiar como sendo


familiar, e o que é complexo como sendo fácil.

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2. Origens

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A noção de representação tem uma longa história e atravessa um certo
número de ciências sociais interrelacionadas. Moscovici apoia-se em diversas
fontes quando explica a teoria das representações sociais. Tal vai desde o
trabalho antropológico de Lévy-Bruhl que se preocupa com sistemas de
crenças de sociedades tradicionais, ao trabalho de Piaget sobre a psicologia da
criança que se focaliza na compreensão e representação que a criança tem do
mundo (Moscovici, 1989). Todavia, a influência mais importante exercida
sobre a noção deve-se a Durkheim.

A palavra representação social encontra-se, efectivamente, hoje em dia,


espalhada nas ciências sociais (lodelet, 1989a), desde que em 1961 Moscovici
desenterrou este "conceito esquecido" de Durkheim.

o conceito de representação social resulta do empréstimo pelo vocabulário


filosófico do termo representação. No seu "Vocabulário da Filosofia", Lalande
(1926) dá-lhe quatro acepções:

A - Facto de representar (nos sentidos B e C), uma pessoa ou uma


coisa (reenviando-nos para Leibniz e para o Código Civil).

B - No sentido concreto: conjunto de pessoas que representam outras.

C - Aquilo que está presente no espírito; o que em nós "se representa";


aquilo que forma o conteúdo de um acto do pensamento, em
particular, reprodução de uma percepção anterior (e reenvia-nos para
Taine).

D - Acto de representar em si algo; faculdade de pensar uma matéria


concreta, organizando-a em categorias; o conjunto do que em nós se
representa como tal.

E, num comentário crítico, continua: "... Pode-se supor que o sentido filosófico
actual da palavra venha, por uma lado, do uso do verbo 'representar-se', muito
clássico em Francês como sinónimo de 'imaginar' (cf. Bossuet); por outro lado,
o uso feito por Leibniz desta palavra que a toma, inicialmente, no sentido de
'correspondência' (ver A), mas que faz desta correspondência o género de que
a representação no sentido C é uma espécie... "

E acrescenta Lalande: "... Sobre representação, representar e outras palavras


desta família. - Na palavra representar, no sentido jurídico, o prefixo re parece
significar: tornar uma pessoa ou uma coisa presente no local onde a sua

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presença é devida e esperada. No sentido usual, ocupar o lugar de... , este
prefixo parece exprimir de preferência a ideia de uma segunda presença, de
uma repetição imperfeita da presença primitiva e real. Isto pode ser dito de
uma pessoa que age em nome de outra e de uma simples imagem que nos
torna presente, à sua maneira, uma pessoa ou uma coisa ausente. Donde o
sentido de representar-se interiormente uma pessoa ou uma coisa imaginando-
a, donde se passou enfim, ao sentido filosófico de representação. Mas a
passagem parece-me ter algo de violento e de ilegítimo. Teria sido necessário
renunciar a essa palavra. - Por isso parece-me provável que nós próprios não
tenhamos tirado representação de representar-se, mas decalcado simplesmente
Vorstellung para a traduzir. Somos hoje obrigados a tolerar este uso da
palavra; mas mal me parece Francês... "

Embora não agradando a Lalande, o termo foi precisamente pelo seu uso
"muito clássico" e muito antigo em Francês, próprio a ser retomado na língua
erudita da Filosofia e das Ciências do Homem.

o conceito de representação social inscreve-se numa tradição europeia e


sociológica, ao invés da grande maioria dos conceitos de psicologia social que
são de origem anglo-saxónica e procedem da psicologia geral.

Durkheim (1895) falara de "representações colectivas" e, em 1898, de


"representações sociais", esforçando-se por distingui-las das "representações
individuais" (que se devem classificar nas acepções C e D de Lalande): "... A
sociedade tem por substrato o conjunto dos indivíduos associados. O sistema
que formam ao unir-se e que varia segundo a sua disposição na superfície do
território, a natureza e o número das vias de comunicação, constitui a base
sobre a qual se ergue a vida social. As representações que são a sua teia
emanam das relações que se estabelecem entre os indivíduos assim
combinados ou entre os grupos secundários que se intercalam entre o
indivíduo e a sociedade total. Ora se não se vê nada de extraordinário em que
as representações individuais, produzidas pelas acções e pelas reacções
trocadas entre os elementos nervosos, não sejam inerentes a estes elementos,
que há de surpreendente em que as representações colectivas produzidas pelas
acções e as reacções trocadas entre as consciências elementares de que é feita
a sociedade não derivem directamente destas últimas e, por conseguinte, as
uI trapasse? .. ".

Se não se encontra na obra de Durkheim uma definição deste novo conceito,


existem numerosos pontos de ancoragem neste paralelo constante que opera o

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I
"

autor entre psiquismo individual e psiquismo colectivo para melhor os


distinguir: ", .. A vida colectiva, como a vida mental do indivíduo, é feita de
representações: é, por conseguinte, presumível que representações individuais
e representações sociais sejam de certo modo, comparáveis. Vamos
efectivamente tentar mostrar que umas e outras têm a mesma relação com o
seu respectivo substrato. Mas esta proximidade, longe de justificar a
concepção que reduz a sociologia a ser apenas um corolário da psicologia
individual, porá, ao contrário, em relevo a independência relativa destes dois
mundos e destas duas ciências... ".

Davy (1920) condensava bem a óptica durkheimiana quando escrevia: "... Não
nos podemos contentar de postular. .. uma natureza humana formada de um
certo número de sentimentos imutáveis e fundamentais, é necessário explicá-
la, ela própria, e explicá-la em função do meio social a que se adapta;
constituir, do ponto de vista sociológico, uma psicologia dos sentimentos e
uma psicologia do conhecimento... "

Esta psicologia dos sentimentos e esta psicologia do conhecimento


constituídas de um ponto de vista sociológico, é bem a psicologia social a que
Durkheim fazia apelo para estudar as leis da ideação colectiva e que ele
considerava ainda inteiramente por fazer.

Esta observação foi verdadeira durante muito tempo: foi necessário esperar os
anos sessenta para que um psicólogo social voltado para a sociologia do
conhecimento, Moscovici, consagrasse um estudo fecundíssimo às
representações sociais da psicanálise (1961), e se aplicasse em cemar o
conceito de representação social. Foi a partir desta investigação que se
afirmou em França uma corrente de estudo sobre as representações sociais.

Se é em Durkheim que encontramos a origem teórica do conceito, é, ao invés,


"no domínio antropológico que encontramos uma tradição de estudo de
fenómenos deste tipo, tais como os mitos, os reportórios linguísticos e os
diversos sistemas conceituais das sociedades ditas primitivas, quer se trate dos
estudos antigos do pensamento mágico-religioso quer dos mais recentes, das
taxonomias médicas ou botânicas da etno-ciência" (Herzlich, 1972, pp. 303-
304). Quais as razões de tão longa ausência da representação social das
preocupações dos psicólogos sociais?

o longo eclipse de um conceito cheio de promessas, esboçado em finais do


século passado, deve-se sobretudo, segundo Herzlich, ao desenvolvimento

431
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teórico da psicologia social. "A psicologia, sabe-se, foi durante muito tempo
dominada pela corrente behaviourista. Na tradição watsoniana da ligação
estímulo-resposta, só os comportamentos manifestos, directamente
observáveis, tais como as respostas motoras ou verbais, podiam ser objecto de
estudo. As respostas latentes ou implícitas, tais como as actividades
cognitivas, eram negligenciadas. Em psicologia social, a adjunção do termo
social, quer à classe dos estímulos, quer à classe das respostas, pouco
modificava a problemática" (Herzlich, 1972, p. 304).

o interaccionismo simbólico, tendo por origem os trabalhos de Mead -


corrente teórica que se desenvolveu em psicologia social em concorrência com
a tradição behaviourista - poderia ter constituído um terreno mais favorável
aos estudos da representação social. "O indivíduo tem menos a ver com
estímulos que com objectos e situações socialmente construídas na actividade
e na interacção. Contudo, além de que foram muitas vezes notadas as
ambiguidades e os defeitos de operacionalização, os estudos empíricos saídos
desta corrente trataram prioritariamente outros problemas: principalmente os
da identidade e do desempenho do papel no contexto geral do desvio social"
(Herzlich. 1972, p. 305).

Notemos igualmente o domínio de certas escolas de pensamento (de


inspiração marxista, em particular), que afastaram o estudo das representações
sociais do domínio da sociologia. Contudo, como nos relembra Moscovici, os
pensadores marxistas nem sempre manifestaram uma tal desconfiança ou um
tal desprezo perante a representação social e, mais geralmente, a psicologia
social. Assim Plekhanov pôde afirmar: "Não há nenhum facto histórico que
não tenha a sua origem na economia da sociedade; mas não é menos verdade
que não há nenhum facto histórico que não seja precedido, acompanhado e
seguido de um certo estado da consciência. Donde a importância enorme da
psicologia social" (1927, p. 211).

Não é inédito o facto de um conceito se estabelecer numa ciência e da teoria


ser elaborada noutra ciência. A noção de gene nasceu na genética e a sua
teoria na biologia molecular. O mesmo acontece para a representação social.
O seu conceito aparece em sociologia onde sofre um longo eclipse. Todavia, a
sua teoria vai esboçar-se em psicologia social, tendo efectuado uma incursão
pela psicologia da criança (Piaget, 1926) e na psicanálise. As metamorfoses do
conceito entre o seu nascimento e o seu ressurgimento foram recentemente
esboçadas (Moscovici, 1989) (documento 5. 1).

432
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As componentes principais de uma representação social relacionam-se com o facto que se
constroem conhecimentos partilhados sobre certos objectos dos grupos sociais. Eis como o
promotor deste quadro teórico (Moscovici, 1989, pp. 78-79) situa a sua origem:

"No que me diz respeito, posso testemunhar do facto que os estudos de Piaget e de
Freud de que acabo de falar tiveram esta consequência. Foram eles que me levaram
a perguntar-me porque é que o cuidado posto em estudar o universo da criança aqui
e o dos adultos algures não deveria voltar-se para o universo dos adultos aqui. Que
há de mais natural do que partir dos seus conceitos e das suas abordagens para
explorar as representações tornadas vivazes na imaginação dos contemporâneos
que as engendram e partilham? A partir daí e indo até Durkheim, foi-me possível
apreender melhor o alcance sociológico destes conceitos e destas abordagens. E de
ver que o que permanecia nele apesar, de toda uma noção abstracta, podia ser
abordado enquanto fenómeno concreto."

Moscovici (1989, pp. 78-79)

Documento 5.1- Das representações colectivas às representações sociais

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3. Noção

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.,,

Se a realidade das representações sociais é fácil de apreender, não acontece o


mesmo com o seu conceito. Para além de razões históricas de tal dificuldade,
as razões não-históricas reduzem-se a uma só: "a sua posição mista, na
encruzilhada de uma série de conceitos sociológicos e de uma série de
conceitos psicológicos" (Moscovici, 1976, p. 39).

A noção de representação social situa-se efectivamente numa encruzilhada


com múltiplos acessos. Desta situação específica resultam duas consequências
(Doise, 1986). Em primeiro lugar, pode acontecer que autores que se
inscrevem em campos disciplinares diferentes se encontrem na mesma
encruzilhada sem se aperceberem. Doise ilustra esta consequência citando
Bourdieu (1977) : "Não se compra um jornal, mas um princípio gerador de
tomadas de posição definido por uma certa posição distintiva num campo de
princípios geradores institucionalizados de tomadas de posição; e pode-se
afirmar que um leitor sentir-se-á tanto mais completo e adequadamente
exprimido quanto a homologia seja mais perfeita entre a posição do seu jornal
no campo dos órgãos de imprensa e a posição que ele próprio ocupa no
campo das classes (ou das fracções de classe), fundamento do princípio
gerador das suas opiniões."

Uma segunda consequência da situação da noção de representação social na


encruzilhada é a sua grande polissemia. Designa um vasto número de
fenómenos e de processos. Alguns deles serão referidos mais adiante.

Por agora apresentemos um exemplo que ilustra o tipo de fenómenos


estudados mediante esta noção. Tudo parece indicar que a relação que os
indivíduos têm com um objecto tão complexo como o SIDA não se reduz a
um conjunto de conhecimentos bem ou mal integrados, nem tão pouco se
condensa só num conjunto de opiniões com direcção e intensidade
diferenciadas em relação aos preservativos. O aparecimento no cenário social
deste fenómeno suscita medo, focalização sobre ele, um esforço de adaptação
e de construção sócio-cognitiva. Este esforço advém do que Moscovici
qualifica de "sociedade pensante" (Moscovici, 1981), isto é, do trabalho de
construção, mediante trocas e interacções, de pontos de vista e de saberes,
partilhados e distribuídos segundo as fronteiras incertas dos grupos sociais.
Este "pensamento" funciona como uma "teoria" frágil ou sólida que pode
servir quer para justificar, pela raLlonalização, o que já se faz quer para
permitir a adopção de uma nova conduta coerente com a "teoria". Nesta
perspectiva, 10delet (1989) indicou que para acolher este elemento novo
foram construídas duas representações: uma moral e outra biológica. Pode-se

437
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assim identificar uma diferenciação entre o recurso a uma concepção marcada
pela noção de "doença-punição" que toca o desregramento sexual e uma
concepção "biológica" que reactiva crenças antigas sobre líquidos corporais.

Como fenómenos, as representações sociais apresentam-se em formas


variadas, mais ou menos complexas: imagens, sistemas de referência,
categorias, teorias. "Imagens que condensam um conjunto de significações;
sistemas de referência que apenas nos permitem interpretar aquilo que nos
chega, isto é, dar um sentido ao inesperado; categorias que servem para
classificar as circunstâncias, os fenómenos, os indivíduos com que estamos
relacionados; teorias que permitem estatuir sobre eles muitas vezes quando
nos cingimos à realidade concreta da nossa vida social, tudo no seu conjunto"
(Jodelet, 1983a, p.6).

o conceito de representação social designa "uma forma de conhecimento


socialmente elaborado e partilhado, com uma orientação prática e
concorrendo para a construção de uma realidade comum a um conjunto
social" (Jodelet, 1989b, p. 36). Trata-se de uma definição capaz de concitar
um grau considerável de acordo entre os investigadores. Esta definição chama
a nossa atenção para a concepção dos modos de pensamento que nos
relacionam com o mundo e com os outros, para os processos susceptíveis de
interpretar e de reconstituir de modo significativo a realidade, para os
fenómenos cognitivos que suscitam a pertença social dos indivíduos com
implicações afectivas, normativas e práticas e configuram aos objectos uma
particularidade simbólica própria nos grupos sociais. Neste último sentido, as
representações são a expressão de identidades individuais e sociais.

Outras definições das representações sociais foram avançadas. Algumas delas


estão patenteadas no documento 5.2

o termo de representação designa, num sentido lato, uma actividade mental através
da qual se torna presente na mente, por meio de uma imagem, um objecto ou um
acontecimento ausente. A representação foi objecto de diversas definições de que
evocamos de seguida algumas das mais significativas.

Piaget (1926)

Trata-se "quer de uma evocação dos objectos na sua ausência, quer, quando ela
duplica a percepção na sua presença, completar os conhecimentos perceptivos

438
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I
,I

referindo-se a outros objectos que não são actualmente percepcionados. Se a


representação prolonga num sentido a percepção, introduz um elemento novo que
lhe é irredutível: um sistema de significações compreendendo uma diferenciação
entre o significante e o significado".

Moscovici (196 I)

A representação social é "um sistema de valores, de noções e de práticas relativas a


objectos, aspectos ou dimensões do meio social que permite não só a estabilização
do quadro de vida dos indivíduos e dos grupos, mas que constitui igualmente um
instrumento de orientação da percepção das situações e de elaboração de respostas".

Moscovici (1963)

Uma "representação social define-se como a elaboração de um objecto social por


uma comunidade".

Herzlich (1969)

Com base num trabalho sobre a representação social da saúde e da doença,


Herzlich define-a como um processo de construção do real. Para ela "o acento
colocado na noção de representação social visa reintroduzir o estudo dos modos de
conhecimentos e dos processos simbólicos na sua relação com as condutas".

Jodelet (1983a)

" O conceito de representação social designa uma forma de conhecimento


específica, o saber do senso comum, cujos conteúdos manifestam a operação de
processos generativos e funcionais socialmente marcados. Em sentido mais lato,
designa uma forma de pensamento social".

Doise (1990)

"As representações sociais são princípios geradores de tomadas de posição ligadas


a inserções específicas num conjunto de relações sociais e organizando os processos
simbólicos que intervêm nestas relações".

Documento 5.2 - Representações do conceito de representação

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Os principais aspectos a ter em conta na noção de representação social são os
seguintes:

- Na conceptualização das representações sociais há sempre referência


a um objecto. A representação, para ser social, é sempre uma
representação de algo.

- As representações sociais mantêm uma relação de simbolização e de


interpretação com os objectos. Resultam, por conseguinte, de uma
actividade construtora da realidade e de uma actividade expressiva.

- As representações sociais adquirem a forma de modelos que se


sobrepõem aos objectos, tornando-os visíveis, e implicam elementos
linguísticos, comportamentais ou materiais.

- As representações sociais são uma forma de conhecimento prático


que nos levam a interrogar-nos sobre os determinantes sociais da sua
génese e da sua função social na interacção social da vida quotidiana.

Esta forma de conhecimento permite a apreensão pelos sujeitos sociais dos


acontecimentos da vida corrente, das informações veiculadas, das pessoas do
nosso meio próximo ou longínquo. Trata-se do conhecimento do senso
comum em oposição ao conhecimento científico. Conceitos que tendem a
qualificar globalmente um conjunto de actividades intelectuais e práticas,
como a ciência, o mito, a religião, a ideologia, etc., distinguem-se das
representações sociais, pois "constituem uma organização psicológica, uma
forma de conhecimento particular à nossa sociedade e irredutível a nenhuma
outra" (Moscovici, 1976, p. 43). O parentesco não é muito maior com os
"objectos parciais" que utiliza a psicologia social: imagens, opiniões, atitudes,
estereótipos, preconceitos.

Como forma de conhecimento, a representação social implica a actividade de


reprodução das características de um objecto. Esta representação não é,
porém, o reflexo puro e fiel do objecto, mas uma verdadeira construção
mental. Assim, o conceito de imagem, que ocupou um lugar de destaque na
abordagem dos fenómenos psicológicos e psicossociológicos, não se pode
confundir com o de representação no sentido que hoje lhe é atribuído. Abric
(1976), referindo-se a Meyerson, relembra que durante muito tempo as
imagens foram consideradas como "conteúdos de consciência" em ligação
com o mundo exterior. As imagens, nesta concepção, são directamente
produzidas pelos objectos; são, diz Moscovici (1976, p. 45), "... sensações

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I
,l,;

mentais, impressões que os objectos, as pessoas, deixam no nosso cérebro". A


imagem é pois, neste ponto de vista, reprodução, reflexo. Além disso, é
selectiva, finalizada: trata-se de um fenómeno passivo, o que a distingue
definitivamente da representação.

Se bem que as noções de opinião e atitude tenham elos com a r~presentação,


são, contudo, noções diferentes. A opinião é uma resposta manifesta, tem a
particularidade de ser o único elemento observável do sistema que
descrevemos, a partir do qual os outros elementos só podem ser inferidos e é
susceptível de medida.

A atitude, mais complexa pelo seu carácter latente, foi sobretudo abordada
como resposta antecipada. Tanto a opinião como a atitude foram sobretudo
encaradas enquanto resposta e "preparação para a acção", respectivamente.
Pelo contrário, a representação social, na medida em que é um processo de
construção do real, age simultaneamente sobre o estímulo e a resposta.

Os preconceitos parecem constituir uma espécie de "genótipo" de que os


estereótipos seriam os "fenótipos" (CasteJlan, 1977). Sendo assim, o
preconceito está intimamente ligado à atitude tendendo mesmo a confundir-se
com ela. As noções de estereótipo e de preconceito, na medida em que se
aproximam das noções de opinião e de atitude, respectivamente, são, por
conseguinte, também diferentes da representação social.

Em suma, se todos estes "objectos parciais" estão integrados nas


representações sociais, estas não são consideradas "como opiniões sobre" ou
"imagens de", mas "teorias", "ciências colectivas" sui generis, destinadas à
interpretação e à leitura do real (Moscovici, 1976).

Na medida em que a representação social designa uma forma de


conhecimento, isso acarreta o risco de a reduzir a um acontecimento intra-
individual, o social intervindo só secundariamente. O facto de designar uma
forma de pensamento social, acarreta o risco de a diluir nos fenómenos
culturais e ideológicos.

Contudo, para o psicólogo social, a representação actualiza-se "numa


organização psicológica particular e preenche uma função específica"
(Herzlich, 1972, pp. 306-307). Não se pondo em dúvida a determinação de
uma representação por um feixe de condições objectivas, sociais e
económicas, entre um grupo e a sua representação há uma "reciprocidade de
relações". Também a representação social desempenha um papel na formação

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das condutas sociais e das comunicações, na medida em que é através dela
que o grupo apreende o seu meio. É este último aspecto que passaremos a
abordar de seguida.

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I. I

4. Representações e comunicação social

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I J

A comunicação social desempenha um papel fundamental nas trocas e


interacções quotidianas. Moscovici examinou a incidência da comunicação a
três níveis. Examinou-a, em primeiro lugar, ao. nível das dimensões das
representações que se referem à construção do comportamento: opinião,
atitude e estereótipo em que há intervenção dos sistemas de comunicação
social.

Segundo Moscovici (1961) podem-se distinguir três grandes sistemas de


comunicação cuja importância relativa varia segundo o momento histórico e
os grupos sociais: a difusão, a propagação e a propaganda.

A difusão é o sistema de comunicação de massas mais espalhado na nossa


sociedade. A fonte pretende transmitir e difundir o mais amplamente possível
um conteúdo de interesse geral, não tendo como finalidade deliberada reforçar
ou convencer. A indiferenciação também está patente na difusão ao nível dos
receptores. Não se dirige a um grupo definido, mas a membros de diversos
grupos sociais. A vulgarização histórica, científica e técnica entram neste
quadro.

A propagação, pelo contrário, recorre a mensagens que visam um grupo


particular, com objectivos e valores específicos, com uma visão do mundo
bem organizada. A sua finalidade é a integração de uma informação nova num
sistema de raciocínio e de julgamento já existente. Trata-se de um modo de
regular a ortodoxia (Deconchy, 1971).

Moscovici estudou como é que os suportes de comunicação da Igreja católica


adaptaram o saber psicanalítico às suas convicções religiosas. Por exemplo, no
começo dos anos 50, a Igreja católica não se pronunciava sobre a psicanálise,
limitando-se fundamentalmente a sublinhar a ausência de incompatibilidade
entre fé e recurso à psicanálise. Na medida em que a Igreja separava o plano
religioso do terapêutico, o que evitou qualquer encontro conflituoso, permitia
aos fiéis que o pretendessem passar pela cura analítica.

A propaganda, na sua forma sistemática e generalizada que hoje em dia se


conhece, é uma aquisição do século XX, uma manifestação da "idade das
multidões" (Moscovici, 1981). É óbvio que a vontade de convencer há muito
que existe e para tal foram mesmo criadas instituições. Por exemplo, o papa
Gregório XV fundou o colégio De propaganda fide. No entanto, os meios e
resultados de então não eram os mesmos da propaganda contemporânea.

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A propaganda desenvolve-se num clima social conflituoso, podendo oscilar
entre o simples proselitismo e a conquista violenta. A propaganda contribui
para a afirmação e reforço da identidade do grupo. É a sua função reguladora.
Tem também uma função organizadora: constrói, a propósito do adversário ou
da ideologia que combate, uma representação em conformidade com os
princípios inspiradores. A propaganda incita igualmente os seus receptores a
um determinado comportamento.

As representações sociais da psicanálise modificam-se. Assim pode ser


mostrado, por meio de uma análise da imprensa comunista do começo dos
anos setenta, que a representação da psicanálise tinha mais a ver então com a
propagação do que com a propaganda (Moscovici, 1976). Seja como for,
parece ser válida a hipótese principal de Moscovici, propondo uma integração
das investigações sobre opiniões, atitudes e estereótipos: "Considerados sob o
prisma da estrutura das mensagens, da elaboração dos modelos sociais, dos
laços entre emissor e receptor, do comportamento visado, os três sistemas de
comunicação conservam uma grande individualidade. Ora, é precisamente esta
particularidade que nos autoriza a aproximar termo a termo a difusão, a
propagação e a propaganda, da opinião, da atitude e do estereótipo"
(Moscovici, 1976, p. 497). Por conseguinte, a difusão produziria sobretudo
opiniões sobre a psicanálise, a propagação trabalharia ao nível das atitudes e a
propaganda ao nível dos estereótipos. A implicação desta conclusão é clara:
qualquer definição das representações sociais perspectivada sob o signo do
consenso não é suficientemente abrangente. Se os estereótipos são crenças
consensuais no seio de determinados grupos sociais, pode não acontecer o
mesmo com atitudes e opiniões.

Em segundo lugar, Moscovici examinou a incidência da comunicação ao nível


da emergência das representações cujas condições afectam os aspectos
cognitivos. Há três condições que afectam a formação das representações
sociais, as duas primeiras referindo-se à acessibilidade do objecto.

A primeira destas condições é a dispersão da informação sobre o objecto da


representação. Os sujeitos não podem ter acesso às informações úteis para o
conhecimento deste objecto por motivos inerentes à sua complexidade e
também por causa de barreiras sociais e culturais. Esta dificuldade de acesso à
informação vai favorecer a transmissão indirecta dos saberes e por conseguinte
numerosas distorções. A segunda condição relaciona-se com a posição
específica do grupo social em relação ao objecto de representação. Esta
posição vai determinar um interesse particular por certos aspectos do objecto e

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um desinteresse relativo por outros aspectos. Este fenómeno de focalização
vai impedir que os indivíduos tenham uma visão global do objecto. Finalmente,
a terceira condição refere-se à necessidade que sentem os indivíduos de
desenvolver comportamentos e discursos coerentes a propósito de um objecto
que conhecem mal. A comunicação e acção sobre este objecto que se domina
mal só é possível na medida em que, por diversos mecanismos de inferência, o
sujeito preenche zonas de incerteza do seu saber. No tempo da conversação e
da acção, por motivos de eficácia, o sujeito vai estabilizar o universo de
conhecimento relativo ao objecto. É o fenómeno da pressão à inferência que
favoreceria a adesão dos indivíduos às opiniões dominantes do grupo.

Estas três condições seriam, pois, necessárias para a emergência de uma


representação social. Trata-se de elementos que vão diferenciar o pensamento
natural nas operações, na lógica e no estilo. Serão essas três condições
suficientes? Para Moliner (1993) haverá elaboração representacional quando,
por razões estruturais ou conjunturais, um grupo de indivíduos se confronta
com um objecto polimorfo cujo domínio interessa em termos de identidade e
de coesão social. Quando, além disso, o domínio deste objecto constitui um
interesse para outros actores sociais que interagem com o grupo. Enfim,
quando o grupo não está submetido a uma insistência de regulação e de
controlo definindo um sistema ortodoxo.

Em terceiro lugar, essa incidência foi examinada ao nível dos processos de


formação das representações, a objectivação e a ancoragem. Estes processos
dão conta da interdependência entre actividade cognitiva e condições sociais.
Na secção seguinte examinaremos mais em pormenor estes dois processos.

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5. Análise psicossociológica
da representação social

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As proposlçoes teóricas de Moscovici integram numerosas aqUlslçoes da
psicologia social sobre as actividades cognitivas em situação de interacção
social estudadas por diversos autores (Zajonc, 1967; Bruner, 1957; Tajfel,
1972; Tajfel. Billig, Bundy e Flament, 1971). Mas estes dados inserem-se
numa construção de conjunto original em que o interesse já não está centrado
nos mecanismos de respostas sociais, como vimos, mas no "estudo dos modos
de conhecimento e dos processos simbólicos na sua relação com as condutas"
(Herzlich, 1972, p. 305).

Numerosas investigações, quer experimentais, quer ex post facto, inscrevem-


se neste quadro teórico. A investigação no âmbito deste quadro teórico difere
da investigação mais usual em Psicologia Social, como, por exemplo, a da
cognição social. A investigação clássica sobre a cognição social focaliza as
características gerais do processo de percepção, memória e julgamento, sendo
considerado uma característica psicológica universal do homem. Ao invés, a
investigação conduzida no quadro das representações sociais focaliza-se
frequentemente em conteúdos específicos de sistemas de conhecimento,
caracterizadores de grupos e de sociedades. A defesa desta orientação assenta
no facto de que são os conteúdos do conhecimento do senso comum que
orientam o comportamento e o pensamento das pessoas inseridas na
comunidade. Os processos de pensamento estão em grande parte dependentes
dos conteúdos de pensamento. Ou, por outras palavras, as condições sociais
em que nos locornovemos determinam não só o que pensamos, mas também,
como pensamos.

Há um acordo em abordar a representação social como o produto e o


processo de uma elaboração psicológica e social do real. Convém não perder
de vista que se nas investigações sobre as representações sociais se tornou
corrente distinguir dois objectos distintos - os produtos e os processos - esta
distinção, se se pode fazer, é artificial. Estamos de acordo com lodelet
(1983b, p.24): "processos e produtos são indissociáveis, só se pode descobrir
a obra nos seus efeitos, estudar os mecanismos na base da sua produção."

5. I A representação-produto

Com algumas variações nas formulações, todos os autores (Moscovici, 1961;


Kaes, 1968; Herzlich, 1972; Abric, 1976) concordam em dizer que a

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representação-produto aparece como um universo de opiniões ou de crenças,
organizadas à volta de uma significação central. Na passada de Moscovici,
todos propõem uma análise do produto sob vários aspectos e falam a este
propósito de "dimensões" (Moscovici, 1961), de "análise dimensional"
(Herzlich, 1972), ou de "elementos constitutivos" (Abric, 1976).

A título hipotético, Moscovici considera cada universo de representações sob


três aspectos: a informação, a atitude e o campo de representação.

5.1.1 Informação

A informação diz respeito à soma e organização dos conhecimentos sobre o


objecto de representação. A sua apreciação supõe que se relacione o discurso
do sujeito com os caracteres objectivos do objecto. Ê possível distinguir níveis
de conhecimento e de os definir, quer pela quantidade de informação relativa
ao objecto, quer pela qualidade desta informação, banal ou original, por
exemplo. Moscovici encontrou no estudo da representação social da
psicanálise, uma informação fraca nos operários interrogados. Esta é, pelo
contrário, maior nos estudantes, nos sujeitos das classes médias e das
profissões liberais.

5.1.2 Atitude

A atitude exprime a orientação global, pOSItIva ou negativa, em relação ao


objecto da representação. Ê "uma organização durado ira de processos
motivacionais, emocionais, perceptivos e cognitivos que se relacionam com um
aspecto do mundo do indivíduo" (Krech e Crutchfield, 1952, p. 199) e prepara
à acção. Moscovici exprime que o objecto da atitude é percepcionado como
exigência de acção para o indivíduo, ao defini-la como um "esquema dinâmico
da actividade psíquica" (1961, p. 269).

A atitude é muitas vezes o aspecto mais fundamental, enquanto elemento mais


arcaico, ou até mais resistente das representações. "Ê razoável concluir que
nos informamos e que nos representamos alguma coisa unicamente depois de
ter tomado posição." As investigações sobre a percepção e o julgamento
concordam plenamente com tal conclusão (Moscovici, 1976). Ela pode existir

452
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mesmo se a informação é reduzida e o campo de representação pouco
organizado. Por exemplo, Moscovici mostra que os operários têm uma atitude
estruturada em relação à psicanálise, enquanto que a informação possuída e o
campo de representação são mais difíceis de cemar.

Na atitude, a função reguladora é sem dúvida mais importante que a


energética. A atitude aparece como uma espécie de reacção secundária tendo
por função orientar (por antecipação ou comparação) o comportamento
através das estimulações do meio físico e social. Uma atitude transforma as
relações entre o estímulo e resposta de uma determinação mecânica numa
interdependência significante. Um exemplo pode facilitar a compreensão deste
ponto. Num questionário de atitude, o sujeito que responde a uma questão
responde efectivamente, a maior parte das vezes, a duas questões. Se lhe
perguntarmos, como faz Moscovici: "De qual das práticas seguintes vos
parece que a psicanálise se aproxima mais: sugestão, conversação, hipnotismo,
confissão ... ?, o sujeito responde de modo implícito à psicanálise, e depois à
própria questão. O que faz com que uma reacção favorável à psicanálise
influenciará a escolha da categoria "confissão", etc. Assim, a resposta a um
determinado estímulo engendrado pela atitude não é nunca uma resposta pura.
Ao mesmo tempo é uma acção, pois começa antes que o estímulo esteja
presente. Ou, por outras palavras, a teoria das representações sociais abandona
a distinção clássica (particularmente desenvolvida nas teorias behaviouristas)
entre o sujeito e o objecto. O quadro teórico das representações sociais
considera com efeito "que não há corte entre o universo exterior e o universo
interior do indivíduo (ou do grupo). O sujeito e o objecto não são radicalmente
distintos" (Moscovici, 1969, p. 9).

A atitude, não só orienta o comportamento, como regula as trocas com o


meio. Pode-se considerar o estímulo e a resposta de um sujeito como uma
troca, sendo a atitude o sistema que regula esta troca.

Tem também uma função energética, pois imprime à orientação e à troca com
o meio uma certa intensidade emocional e afectiva. Este componente afectivo-
emocional é constituído pela história individual e social do sujeito. A atitude é,
deste modo, o aspecto mais afectivo das representações sociais enquanto
reacção emocional para com o objecto.

Em suma, a atitude é reguladora e energética, supondo uma estruturação dos


estímulos e das respostas.

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5.1.3 Campo de representação
o campo de representação designa o "conteúdo concreto e limitado das
proposições sobre um aspecto preciso do objecto de representação"
(Moscovici, 1976, p. 107). Remete-nos para os aspectos imagéticos da
representação - isto é, para a construção significante que é feita do objecto
integrando e interpretando as informações de que o sujeito dispõe - com a
ideia de uma organização ou de uma hierarquia de elementos.

Moscovici mostra que os sujeitos de opinião política de esquerda dissociam a


psicanálise dos problemas sociais, considerando-os de uma outra ordem; para
os que têm opinião centrista, os problemas sociológicos, sociais e políticos
podem fazer parte de um mesmo universo, integram-se numa imagem
coerente. São pois os factores ideológicos que neste caso estruturam o campo
de representação.

A noção de campo de representação deve ser analisada sob diferentes


aspectos. "Poder-se-ia falar então de elementos constitutivos do campo, da sua
extensão, da sua estrutura, da sua estabilidade, do seu carácter mais ou menos
imaginado ou abstracto em relação ao objecto, etc. É igualmente a propósito
do campo que é necessário falar de elementos mais ou menos 'centrais' (o
núcleo) ou 'periféricos', elementos cuja distinção é importante tanto pelas suas
diferenças no seu respectivo peso da representação actual, como pelas suas
diferenças de resistência à mudança na perspectiva de uma evolução de certos
aspectos do campo" (Gilly, 1980, p. 32).

GiIly relembra que é a propósito do campo de representação que


operacionalmente se encontram maiores dificuldades. Se é relativamente fácil
apreciar a atitude e a informação "é, pelo contrário, sempre difícil chegar a um
bom conhecimento do campo. Este último só pode ser apreendido de modo
parcial através dos instrumentos propostos pelo psicólogo destinatário das
respostas construídas" (Gilly, 1980, p. 33).

Estes três elementos constitutivos da representação social denotam o seu


conteúdo e sentido. A sua análise permite estabelecer o grau de organização
da representação, delimitar a distinção entre os grupos em função de um
fenómeno estudado. Enfim, tornam possível um estudo comparativo dos
grupos segundo a homogeneidade ou heterogeneidade do conteúdo e da
estruturação da representação. O estudo dos elementos constitutivos
"distingue opiniões, atitudes, estereótipos como sendo modos de formação da
conduta para com um objecto socialmente significativo. A estmtura do universo de

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opiniões que tenta descobrir faz da atitude uma das dimensões, não estando as
duas outras acopladas sobre a conduta. Em conjunto, as três dimensões
permitem apreender a natureza e o grau de coerência de uma representação
sociaL estabelecer o seu papel na definição das fronteiras de um grupo, e enfim
tornar possível uma análise comparativa" (Moscovici, 196 L pp. 292-293).

5.2 A representação·processo

Moscovici põe em evidência dois processos fundamentais que deixam


transparecer o modo como o social transforma um conhecimento em
representação e como esta representação transforma o social, a propósito do
estudo de uma teoria científica, a Psicanálise. Estes dois processos, a
objectivação e a ancoragem, mostram a interdependência entre a actividade
psicológica e as condições SOCiais. Estes processos descrevem o
funcionamento e a emergência de representações sociais.

5.2.1 A objectivação

Muito daquilo que é importante na vida quotidiana e de que falamos a cada


passo não se reveste de uma realidade concreta. Pense-se no amor e na
amizade. Apesar disso falamos de amor e de amizade tão frequentemente na
vida quotidiana que podem parecer algo de concreto e de palpável. A
objectivação é o mecanismo que permite concretizar o abstracto.

Na objectivação, o social reflecte-se na "disposição e na forma dos


conhecimentos relativos ao objecto de uma representação. Articula-se com
uma característica do pensamento social, a propriedade de tornar concreto o
abstrato, de materializar a palavra. A objectivação pode assim definir-se como
uma operação imagética e estruturante" (Jodelet, 1983a, p. I 8).

Este processo pode subdividir-se em três fases no caso de um objecto


complexo como uma teoria.

a) A selecção e descontextualização dos elementos da teoria constItUI a


primeira fase que vai da "teoria à sua imagem". Procura-se dar um carácter
concreto, imagético, mais facilmente acessível, a noções mais abstractas. A

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selecção é necessária, pois para o produto da representação se tornar funcional
deve limitar-se a alguns elementos acessíveis. Será impossível objectivar toda a
informação existente sobre um objecto. O fenómeno de decontextualização
aparece sobretudo na transformação das ideias científicas em conhecimento
quotidiano. Há, deste modo, retenção selectiva de certos elementos e
respectiva deslocação, pois são extraídos do contexto inicial. As informações
sobre a psicanálise são seleccionadas em função de critérios culturais e
normativos e são desligadas do campo científico a que pertencem.

b) Obtem-se assim um "esquema figurativo" que é o núcleo organizador da


representação. O esquema figurativo forja uma imagem visual de uma
organização abstracta, captando a essência do conceito, da teoria, ou da ideia
que se trata de objectivar. No caso de um grupo social dispor de um esquema
figurativo é mais fácil falar da ideia ou do contexto representados. Uma tal
simplificação numa imagem tem o condão de permitir conversar e de
compreender de modo mais simples o mundo e nós próprios.

O esquema figurativo da psicanálise concentra nalgumas noções-chave uma


visão do psiquismo. O núcleo da representação pode ser visualizado pelo
posicionamento, em cima, do inconsciente, que evoca o involuntário, o
escondido, o possível, e abaixo, o consciente, que evoca a vontade, o aparente,
o realizável. Entre ambos, um mecanismo nocivo, o "recalcamento ", que
produz o "complexo" (Figura 5.1).

Inconsciente

1
Recalcamento > - - - -.... Complexo

1
Consciente

Fonte: Moscovici, 1961

Figura 5.1- Esquema figurativo da psicanálise

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Embora este esquema tenha relações com a teoria inicial, certos conceitos
teóricos são" apanhados", contribuindo para um conjunto imagético e coerente
que permite explicar a génese das neuroses, o desenvolvimento da
personalidade, a terapia analítica. Mas este esquema "esquece" o conceito
essencial na teoria, a libido, directamente associada à sexualidade. Sabe-se que
foi esta a noção que suscitou a controvérsia mais violenta. A eliminação da
libido na reconstrução esquemática permite ter uma visão do psiquismo
compatível com outras teorias e visões do homem.

Outros autores a propósito da coerência de uma representação autónoma


utilizaram termos diversos de "esque.ma figurativo": núcleo central (Abric,
1984), núcleo duro (Mugny e Carugati, 1985) e princípio organizador (Doise,
1990). A este propósito, Flament (1989) observa que os autores levam a
pensar que estas noções são fundamentalmente equivalentes, se bem que cada
escolha terminológica acentue um aspecto da noção de núcleo que ainda está
pouco elaborada. O núcleo é todavia uma estrutura que organiza os elementos
da representação.

Seja como for, não é de subestimar a importância dos efeitos da objectivação.


Roqueplo (1974) pensa que se trata de um processo que acompanha toda a
divulgação dos resultados científicos.

c) A naturalização é a operação pela qual os conceitos se movem "em


verdadeiras categorias de linguagem e entendimento - categorias sociais
certamente - próprias para ordenar os acontecimentos concretos e serem
abafados por eles" (Moscovici, 1961, p. 3 I5). O esquema figurativo
autónomo, separado do seu contexto inicial, torna-se uma expressão imediata
e directa do objecto de que é questão. A transformação de um conceito numa
imagem perde o seu carácter simbólico arbitrário e converte-se numa realidade
com existência autónoma. Cada um dos elementos do esquema figurativo
torna-se um ser natural: "o inconsciente está inquieto", "os complexos são
agressivos", "as partes conscientes e inconscientes do indivíduo estão em
conflito". A representação da realidade torna-se realidade da representação.

Esta tendência em dotar de realidade um esquema conceitual não é apanágio


do "sentido comum", como observa lodelet (1983a). Roqueplo (1974)
assinala a tentação que espreita os próprios cientistas de ontologizar os
modelos que familiarizam o aspecto teórico do seu saber. O modelo
"coisificante" do átomo induziu muitos físicos a considerar o electrão como
"qualquer coisa" que gira à volta de uma "outra coisa", o núcleo.

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A tendência à objectivação posta em evidência a propósito de uma teoria
científica, é caracterizada pela selecção, esquematização e naturalização, e é
susceptível de generalização a toda a representação.

Herzlich no seu estudo sobre a representação social da saúde e da doença


(1969), mostra que a representação organiza-se num esquema coerente, se
bem que o tema de que trate não seja uma teoria. No seu estudo conclui que a
génese da saúde e da doença é concebida como a luta entre "o
indivíduo/saúde" e o "modo de vida/doença". "Embora esquemática, uma tal
representação caracteriza-se mais pela coerência do seu conteúdo e da sua
função organizadora do real: a luta dos dois elementos opostos dá primeiro
conta dos diferentes estados (saúde e doença) e das diferentes etapas (no
desencadeamento de uma doença), mas em virtude disso, elabora-se uma visão
ou uma interpretação das relações entre o indivíduo e o seu meio. Saúde e
doença diferenciam-se pela oposição entre o indivíduo e o seu modo de vida"
(Herzlich, 1969, p. 43).

Igualmente, as representações da criança estudadas por Chombart de Lauwe


(1971), através da literatura e de filmes, põem em evidência que uma série de
oposições elaboram uma imagem coerente e mistificadora da criança, oposta à
do adulto, como: o autêntico ao inautêntico, a natureza à sociedade, a vida
espontânea ao condicionamento normativo.

As relações inter-étnicas nas suas sequelas de racismo são exemplos correntes


na elaboração de um estatuto de natureza. A história precave-nos contra a
"biologização do social" quando diferenças culturais e sociais são consideradas
como equivalentes de diferenças biológicas.

Note-se, no entanto, que o processo de objectivação, apreendido através


destas três fases, deve ser utilizado com precaução (Elejabarrieta, 1996). Se
esta apreensão permite descrever os efeitos do processo de objectivação,
pouco permite enunciar as características dos processos mediante os quais
funciona. Foram assim recentemente avançadas três propostas mais precisas e
menos descritivas para uma análise mais minuciosa do processo de
objectivação. A primeira sugere que o estudo das representações sociais se
interesse pela análise dos discursos em relação com atitudes socialmente
partilhadas. A segunda põe a ênfase na metaforização, dispositivo específico
de objectivação de objectos estranhos. Uma terceira proposta diz respeito à
possível generalidade de um efeito específico de objectivação, a
personificação.

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A estabilidade do esquema figurativo orientando os julgamentos fornece os
instrumentos à ancoragem, segundo processo da representação social.

5.2.2 A ancoragem

Se a objectivação reflecte a intervenção do social na representação, a


ancoragem traduz a intervenção da representação no social. Tal como a
objectivação, a ancoragem perrrúte transformar o que é estranho em algo de
familiar. Todavia, se a objectivação reduz a incerteza perante objectos por
meio do recurso a uma transformação simbólica e imagética, a ancoragem
incorpora o que é estranho mediante a inserção numa rede de categorias e de
redes pré-existentes. O processo de ancoragem não se limita ao conteúdo, mas
engloba as actividades cognitivas de reconstrução e de remodelação, em três
direcções. Se as duas primeiras, utilidade e significação, são tidas em conta
desde a introdução deste conceito em Psicologia Social, a terceira, a
integração cognitiva, só mais tarde foi posta em evidência em toda a sua
importância pela investigação no domínio das representações e dos processos
cognitivos (lodelet, 1983a).

a) A ancoragem equivale à atribuição de uma funcionalidade instrumental.


Assim, à Psicanálise atribuem-se domínios de intervenção, usos, uma eficácia.
As categorias ou objectos naturalizados, coisificados, vão constituir-se em
sistemas de interpretação e de classificação no conjunto da realidade social.
O sistema de interpretação tem uma função de mediação entre o indivíduo e o
meio e entre os membros de um mesmo grupo. "Enquanto sistema de
interpretação, a representação social revela-se como mediadora entre os
membros de um mesmo grupo humano, mediadora geral pela extensão do seu
horizonte, colectiva pelo seu poder e a sua origem" (Moscovici, 1961, p.328).
Permite ao indivíduo classificar e fabricar uma tipologia das pessoas e dos
acontecimentos. A propósito da ancoragem, citemos lodelet: "A ancoragem
aparece-nos como um prolongamento da objectivação: elaboração de um
quadro de instrumentos de conduta que prolonga a remodelagem cognitiva em
curso na objectivação" (lodelet, 1983a, p.25).

A ancoragem como instrumentalização permite pois compreender como os


elementos da representação não só exprimem relações sociais, como
contribuem para as constituir.

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b) Constitui-se assim uma "rede de sign(ficaçães" a partir dos valores salientes
na sociedade e nos seus diversos grupos. "Este enraizamento da representação
na vida dos grupos constitui para numerosos investigadores um traço essencial
do fenómeno representativo, já que dá conta da sua ligação com uma dada
cultura ou uma dada sociedade" (lodelet, 1983a, p.26). Assim, a psicanálise
não se limita a ser só um conteúdo, mas é também uma totalidade à volta da
qual se ordenaram uma rede e uma hierarquia de significações. Durante o seu
enraizamento encontrou diferentes correntes de pensamento (político,
filosófico, religioso ... ) mais ou menos hostis. Está desde então associada a
correntes de pensamento, a categorias sociais (os ricos, as mulheres, os
intelectuais... ), exprime uma relação entre grupos sociais (associa-se à luta de
classes, ao antagonismo franco-americano ... ), incarna um sistema de valores
morais (fonte de liberdade ou fracasso na vontade, chave para o desvio ou
ameaça para a autonomia... ). A representação social pode tornar-se um sinal,
um emblema de certos valores. A psicanálise pode tornar-se sinal,
representando a sexualidade ou uma vida sexual liberada. Uma representação
chama outras, opõe-se a outras, exclui outras.

c) A ancoragem refere-se também à integração cognItlva do objecto


representado no sistema de pensamento pré-existente e às transformações que
daí resultam. Se a objectivação traduz a constituição formal de um
conhecimento, a função cognitiva de integração denota a sua inserção orgânica
num pensamento constituído (lodelet, 1983a), já que a representação não se
inscreve numa tábua rasa.

Moscovici emite a hipótese de que modalidades distintas de conhecimento


coexistem num mesmo indivíduo ou num mesmo grupo, correspondendo a
relações definidas do homem ou do grupo com o seu meio. Esta coexistência
dinâmica determina um estado de "polifasia cognitiva". Este fenómeno
relaciona-se com o contacto entre o carácter criador, autónomo da
representação social e os quadros de pensamento antigos. "O contacto entre a
novidade e o sistema de representação pré-existente está na origem de duas
ordens de fenómenos, de certa maneira opostos, que dão às representações
uma dualidade, por vezes surpreendente. A de serem, ao mesmo tempo,
inovadoras e rígidas, móveis e remanescentes, e isto, por vezes, no interior de
um mesmo sistema" (lodelet, 1983a, p.31).

Resumindo, o processo de ancoragem aI1icula as três funções-base da


representação: função de orientação das condutas e das relações sociais, função de
interpretação da realidade, função cognitiva de integração da novidade.

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A ancoragem e a objectivação que são processos básicos no engendramento e
funcionamento das representações sociais têm uma relação "dialéctica"
(lodelet, 1983a). Combinam-se para tornar inteligível a realidade. Dessa
inteligibiJidade resulta um conhecimento social que nos permite evoluir na
complexidade de relações e de situações do quotidiano. É, no entanto, de
notar que esta relação "dialéctica" entre os processos de objectivação e de
ancoragem é um dos aspectos menos investigados no âmbito das
representações sociais.

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"
6. Areas de investigação

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.i"

Quando o investigador se debruça sobre o conjunto dos trabalhos efectuados


no campo da teoria das representações sociais, verifica uma grande diversidade
dos objectos estudados. Recorremos aqui à sistematização efectuada por
lodelet (1983b). Assim, esta autora distingue três áreas de investigação sobre
as representações sociais.

a) Uma área que se relaciona especificamente com a difusão dos


conhecimentos e com a vulgarização científica no campo social
(Ackerman e Zigouris, 1966; Barbichon, 1972; Roqueplo, 1974;
Vergés, 1987), ou no campo educativo (Gilly, 1980). Esta área tende
para a autonomia nos problemas e métodos.

b) Uma área que integra a noção de representação social como variável


intermediária ou independente no tratamento, a maior parte das vezes
experimental em laboratório, de questões clássicas de psicologia social:
cognição, conflito e negociação, relações interpessoais e inter-grupais,
etc. (Abric, 1987; Flament, 1984). Uma das contribuições essenciais
desta área é a de ter estabelecido a intervenção de processos de
interacção social e de modelos culturais na elaboração das
representações e o papel destas últimas na determinação dos
comportamentos. Como observou Farr (1984) esta é sem dúvida a
linha menos social dos estudos das representações sociais, sendo no
entanto a única que tentou o seu estudo experimental.

c) Uma área mais ampla, se bem que menos estruturada, em que as


representações sociais são apreendidas em contextos sociais reais ou
grupos circunscritos na estrutura social, mediante formações
discursivas diversas. Os estudos abordam objectos socialmente
valorizados, sempre situados no âmago de conflitos de ideias e de
valores, a propósito dos quais os diferentes grupos sociais definem os
seus contornos e as suas particularidades. Estão, neste caso, o estudo
de uma teoria científica como a psicanálise (Moscovici, 1961, 1976);
de papéis sociais como os da mulher (Chombart de Lauwe et aI.,
1963), da criança (M. 1. Chombart de Lauwe, 1971); de bens da
sociedade como a cultura (Kaes, 1968), a justiça (Robert e Faugeron,
1978); suportes de valores sociais como a saúde (Herzlich, 1969), a
doença mental (Jodelet, 1989c), ou o corpo (Jodelet, 1976, 1982).

Entre estas três áreas há pontos de convergência e de divergência.

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De entre os pontos de convergência sobre as abordagens das representações
sociais, 10delet menciona a pertinência, a estrutura, os processos de
constituição e as funções.

As diferentes abordagens convergem na pertinência social e cultural dos


fenómenos simbólicos que a noção permite assinalar e estudar; na sua
estrutura: conjunto complexo e ordenado compreendendo elementos
informativos, cognitivos, ideológicos, normativos, crenças, valores, opiniões,
imagens, atitudes, etc; nos processos da sua constituição: modalidades de
conhecimento implicando, por um lado, uma actividade individual e social de
elaboração, de aproximação, de interpretação de realidades exteriores ao
pensamento e, por outro lado, interiorizações de práticas, de experiências e de
modelos de conduta ou de pensamento socialmente inculcados ou transmitidos
pela comunicação social; nas suas funções: sistemas de interpretação das
relações dos homens entre si e com o seu meio, orientando e organizando as
condutas e as comunicações sociais, intervindo no desenvolvimento individual
e colectivo, na definição da identidade pessoal e social, na expressão dos
grupos, na difusão dos conhecimentos e nas transformações sociais.

A disparidade das abordagens é originada por duas ordens de razões. Umas


estão ligadas à complexidade dos fenómenos englobados na noção de
representação social que permite operar diferentes cortes da realidade
estudada e aplicar diferentes ópticas disciplinares, estudá-las em diferentes
escalas. Outras estão ligadas à conjuntura intelectual na comunidade científica.

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7. Variações sobre representações sociais

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Propomo-nos ilustrar nesta secção por meio de estudos empíricos, as três
áreas de investigação previamente referidas. Assim, abordaremos trabalhos
de investigação sobre as representações sociais da educação, a teoria do
núcleo central, e as representações sociais da emigração. De nenhum modo
se tem a veleidade de documentar aqui a investigação empírica efectuada
até à data, pois é extensa e abrange muitas áreas (Abric, 1994; Farr, 1987;
Jodelet, 1989a).

7. 1 Representações sociais e educação

Segundo Gilly (1989), dispomos ainda de poucas investigações em que as


representações sociais em si mesmas ocupem um lugar central. Para esse
autor ou só se abordam certos aspectos ou certas manifestações, ou então
só se evocam as representações sociais enquanto determinantes
subjacentes (variável intermediária) que explicam resultados sobre factos
que não têm em si mesmo o estatuto delas.

Seja como for não levanta dúvidas o interesse que a noção de


representação social tem para a compreensão das situações educativas. O
interesse fulcral desta noção no processo educativo é o de nos chamar a
atenção para o papel de "conjuntos organizados de significações sociais"
(Gilly, 1989). Mas para além do interesse da noção para a compreensão da
educação, a investigação nesta área contribui para o estudo da construção
e da função das representações sociais. "... 0 campo educativo aparece
como um campo privilegiado para ver como se constroem, evoluem e se
transformam representações sociais no seio dos grupos sociais e iluminar-
nos sobre o papel destas construções nas relações destes grupos com o
objecto da sua representação" (Gilly, 1989, p.363).

Procuraremos ilustrar dois tipos de trabalhos sobre representações sociais


e educação:

a) estudos focalizados em instituições, na escola, nos seus agentes;

b) estudos que abordam representações recíprocas professor-aluno.

Já dispomos de revisões pormenorizadas sobre esta temática (Gilly, 1980)


ou mais gerais (Gilly, ]984, ]989). Aqui não se procurará mais do que
ilustrar cada um dos dois tipos de trabalhos referidos.

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7.1.1 Representações da escola através dos seus agentes

o trabalho de Voluzan (1975), através da análise do inspector,


personagem charneira entre a administração escolar donde emanam as
normas e o funcionamento quotidiano das turmas que deve controlar, põe
em evidência não só a complexidade das representações como os seus
aspectos contraditórios. O sistema representacionaJ aparece complexo na
medida em que nos textos analisados aparecem várias imagens da infância,
do aluno, dos objectivos de mudança pela educação, das relações
professor-aluno e do professor tipo. Aparecem aspectos contraditórios na
confluência de dois modelos de que fala Voluzan. Por um lado, o autor fala
do modelo "tradicional" em que a estrutura hierárquica institucional e as
relações de dependência entre agentes do sistema é transposta para o
funcionamento da classe. Se esta constitui o modelo dominante, a
representação comporta, pelo contrário também elementos constitutivos
do "modelo adaptativo" que visa o desabrochamento, a colaboração, a
cooperação e a iniciativa.

Num estudo de Meyer (1978, 1981) reencontramos este mesmo dualismo a


propósito do discurso dos professores primários sobre as suas práticas. É
igualmente o modelo "tradicional" que estrutura fundamentalmente as suas
representações.

É sobejamente conhecido que as famílias têm comportamentos diferentes


perante a escola segundo a origem social. A propósito das representações
pode-se verificar (Zoberman, 1972; Paillard e Gilly, 1972) que as famílias
de meios desfavorecidos em comparação com as de meios socialmente
favorecidos davam maior importância às funções escolares tradicionais de
instrução - saberes de base - que às funções mais amplas de formação
cognitiva - abertura e cultura de espírito - e da formação sócio-relaciona!.
Ter acesso a esse tipo de saberes escolares representava para essas famílias
quer a possibilidade de reabilitação social quer a esperança que através da
escola, os seus filhos poderiam aceder a uma profissão melhor que a sua.

Siano (1985) num estudo efectuado com agricultores mostra, por seu lado,
que estes têm globalmente uma atitude pouco crítica em relação à escola e
esperam que esta assegure a sua função selectiva. Neste estudo transparece
um elemento central no sistema geral de representações dos agricultores:
representações sociais "auto-selectivas" e "alienantes" pois permitem a
aceitação do fracasso dos seus filhos e a função selectiva da escola.

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7.1.2 Representações recíprocas professor-aluno

Faremos seguidamente referência a alguns trabalhos que abordam os


sistemas de apreensão do aluno pelo professor e do professor pelo aluno.

o conjunto de trabalhos efectuados a propósito dos julgamentos dos


professores sobre os alunos põe em evidência o impacto de um sistema
dimensional cuja significação se encontra em ligação com o papel
profissional do professor (Gilly, 1980). Isto pode ser observado desde a
escola pré-primária à secundária. O sistema de apreensão comporta duas
dimensões principais que vão buscar a sua significação às normas que
definem o papel, isto é, objectivos e modalidades de funcionamento. A
primeira dimensão denota a existência de uma impressão geral que pode
ser interpretada em relação com a função de instrução. Surgem aqui antes
de mais valores de atitude face ao trabalho (mobilização, participação,
motivação) e seguidamente valores cognitivos em que os aspectos
convergentes do pensamento (qualidades de assimilação) são mais
importantes que os aspectos divergentes (qualidades criadoras). A
interpretação da dimensão está relacionada com a função de gestão do
grupo. Acentua-se aqui a conformidade com regras sociais e morais da
vida escolar de modo que o funcionamento do grupo seja favorável à
aquisição dos saberes.

Há evidentemente uma relação entre as dimensões do sistema de apreensão


do aluno pelo professor e a representação social da escola que se evocou
de modo sucinto mais acima. O professor representa cada aluno a partir
das duas dimensões principais porque a sua representação do sistema
escolar destaca o modelo do rendimento em relação à prossecução de
objectivos colectivos (Gilly, 1989).

Já numa perspectiva tipológica e não dimensional que acabamos de evocar,


Weiss (1986) pôs em evidência quatro "protótipos" a partir da análise das
respostas dos professores sobre os comportamentos dos alunos. Esses
protótipos são: dois para os bons alunos, julgados pelos professores aptos
a prosseguirem estudos (o aluno activo, sociável e inteligente; o aluno
aplicado e disciplinado); dois para os maus alunos, julgados inaptos para
prosseguirem estudos (o aluno passivo, voltado para si mesmo e pouco
dotado; o aluno pouco trabalhador, dissipado e indisciplinado).

Diferenças nas representações dos professores podem contribuir para


explicar diferenças no rendimento escolar. Por exemplo, Marc (1984) pôs
em evidência diferenças na atribuição das causas do insucesso escolar de
alunos da escola primária. As causas mencionadas pelos professores para os

471
© Universidade Aberta
filhos de operarIos migrantes evocavam a representação do aluno
"preguiçoso", responsável pelo seu insucesso. Para os filhos de pais do
terciário, as causas referidas pelos professores evocavam a representação
do aluno cuja lentidão se pode corrigir e as dificuldades perdoar. Para este
autor estas diferenças e representação do professor podem contribuir para
explicar diferenças no rendimento escolar. Assim uma representação
desfavorável de famílias de meios desfavorecidos, da sua relação à escola e
das atitudes em relação à escola dos seus filhos, poderia engendrar uma
constelação de atitudes e comportamentos relacionais por parte do
professor que em parte explicariam os maus resultados.

Se nos voltarmos agora para o modo como o professor vê o aluno, a


dimensão organizadora mais importante é a dimensão "empática" (Gilly,
1984). Esta dimensão associa calor, benevolência, disponibilidade para a
preocupação manifestada no desempenho do papel em relação a cada
indivíduo.

Nas idades da escola secundária os três factores mais frequentemente


citados para além da "empatia" nas relações com o aluno, são a
"organização" do ensino e a qualidade das "explicações".

Em suma, o contexto teórico da representação social aplicado à escola não


pode ser evocado de modo independente de outras constelações de
representações sociais, muito em particular as relativas ao mundo do
trabalho. Todavia, as representações sociais podem contribuir para a
compreensão dos fenómenos estudados num horizonte mais vasto de
significações sociais com que estão em interdependência.

7.2 Estudo experimental das representações sociais: A teoria do


núcleo central

A metodologia experimental em contexto laboratorial também tem, como


se disse, sido utilizada no estudo das representações sociais. Sobressaem
aqui experiências efectuadas em Aix-en-Provence por l-C. Abric, l-P.
Codol, C. Flament, entre outros.

o recurso à noção de representação social em Psicologia Soc'ial suscita um


novo olhar sobre a metodologia experimental na medida em que há uma
centração em factores cognitivos e simbólicos. Esses estudos têm
subjacente a hipótese geral de que os comportamentos dos sujeitos ou dos
grupos não são determinados pelas características objectivas da situação,

472
© Universidade Aberta
.,, .

mas pela representação desta situação. Assim puderam ser postas em


evidência diferenças importantes no comportamento quando o adversário
num jogo experimental era apresentado como "uma máquina" ou "um
estudante igual a si" (Abric, 1976) ou quando joga contra o "acaso" ou
contra "a natureza" (Faucheux e Moscovici, 1968); o mesmo se verifica
quando a tarefa experimental é descrita como sendo "criadora" ou
"pragmática" (Abric, 1971), ou ainda, numa situação de grupo que exige
uma abordagem competitiva ou cooperativa (Codol, 1974).

Se se dispõe, por conseguinte, de inúmeros estudos experimentais sobre as


representações sociais, vamos ilustrar esta abordagem, mais em particular
por meio da teoria do núcleo central (Abric, ]987). Esta teoria articula-se
à volta da hipótese geral de que toda a representação está organizada à
volta de um núcleo central. Este núcleo é o elemento que determina a
significação e a organização da representação. O núcleo central de uma
organização tem duas funções principais:

]. Função geradora que cria ou transforma a significação dos


outros elementos da representação.

2. Função organizadora na medida em que depende deste núcleo a


natureza dos laços que unem os elementos da representação.

O núcleo central é o elemento mais estável da representação, é o que


resiste mais à mudança. Uma representação transforma-se de modo radical
quando o núcleo central é posto em causa e de modo superficial quando há
uma mudança do sentido ou da natureza dos elementos periféricos.

Exemplificaremos esta teoria do núcleo central por meio de dois trabalhos


experimentais: um sobre a emergência de um núcleo central como um
elemento constitutivo de uma representação social; o outro sobre o papel
do núcleo central na transformação de uma representação social.

O objectivo do primeiro trabalho que passamos a referir foi o de verificar a


existência de um núcleo central da representação e o seu carácter estável e
organizador (Abric, 1985).

Numa primeira fase, o autor tentou estudar em pormenor a representação


de um ohjecto particular: o artesão. Foram utilizadas para tal três fontes de
informações: um estudo qualitativo, uma prova de associação de palavras e
uma prova de cruzamentos sucessivos hierarquizados. O conjunto destes
estudos permitiu definir o núcleo central da representação do artesão que
compreende cinco itens: trabalhador manual, gosto pela profissão, trabalho
personalizado, trabalho de qualidade e aprendiz.

473
© Universidade Aberta
Na segunda fase procedeu-se à investigação experimental propriamente
dita. A tarefa consistiu numa prova de memorização. Tratava-se de
restituir após audição (memória imediata) e uma hora depois (memória
diferida) uma lista de 30 palavras associadas ao artesão. Para metade dos
sujeitos, os cinco elementos do núcleo central figuram na lista (condição
núcleo central presente) e para a outra metade estas palavras então
ausentes e são substituídas por elementos periféricos (condição núcleo
central ausente).

Para além disso, em cada uma das condições anunciava-se aos sujeitos que
iam ouvir "uma lista de palavras" (representação social não evocada) ou
uma "lista de palavras referindo-se ao artesão" (representação social
evocada). O plano experimental comportava pois quatro situações.

As duas hipóteses principais puderam verificar-se. Assim, segundo a


primeira hipótese, verificou-se que os elementos centrais da representação
eram melhor memorizados sobretudo em memória diferida tendo em conta
o seu estatuto de organizador da representação. Na segunda hipótese,
verificou-se que quando os elementos centrais estavam ausentes da lista, os
sujeitos tinham tendência a reintroduzi-los na sua memória quando
restituíam uma lista associada à representação (condição representação
social evocada).

Estamos, pois, aqui perante uma verificação experimental da existência e


da importância do núcleo central.

Por seu lado, Moliner (1988) pôde estudar os processos que levam à
transformação de uma representação. O objecto de representação
escolhido foi o "grupo ideal", tendo os trabalhos de Flament (1984)
mostrado que se organiza em redor de dois elementos centrais: a
fraternidade e a igualdade.

A experiência compreendeu duas fases:

a) uma fase "antes", em que se apresentava aos sujeitos um curto


texto que descrevia um "bom grupo";

b) uma fase "depois", em que se dava aos sujeitos uma nova


informação sobre o grupo em questão.

No fim de cada uma das fases preenchiam um questionário com o intuito


de caracterizar o grupo apresentado.

A informação fornecida na fase "depois" constituía a variável experimental,


pondo em causa:

474
© Universidade Aberta
- quer um elemento do núcleo central: a igualdade (os sujeitos são

informados que no grupo descrito um dos seus membros dá ordens

aos outros);

- quer um elemento periférico da representação: a comunidade de

opiniões (informação nova: todos os membros do grupo não

partilham as mesmas opiniões).

Os resultados mostraram que, quando um elemento periférico da


representação era posto em causa, uma maioria de sujeitos (73%)
conservavam esta representação. Pelo contrário, quando se contestou um
elemento do núcleo central, 78% dos sujeitos pensavam que o grupo em
questão já não era um grupo ideal: havia mudança de representação. Esta
investigação de Moliner chama a nossa atenção que pôr em causa um
elemento do núcleo central é necessário para a transformação da
representação.

Recentemente têm surgido trabalhos sobre o funcionamento do núcleo


central. Estas investigações têm por objectivo validar uma nova hipótese
formulada por Abric: o núcleo central de uma representação social é ele
próprio um sistema organizado. Neste âmbito, os trabalhos experimentais
de Rateau (1995) sobre a representação social do grupo ideal e os de Abric
e Tafani (1995) sobre a representação social da empresa, verificaram as
hipóteses de que o núcleo central de uma representação social é
constituído por dois tipos de elementos, normativos e funcionais, e que os
elementos do núcleo central estão hierarquizados.

Muitas outras experiências poderiam ter sido escolhidas para ilustrar a


abordagem experimental das r~presentações sociais. Esta abordagem
experimental que tem em conta o modo como o sujeito representa a
situação experimental, constitui uma contribuição de vulto para evidenciar
processos de articulação entre o individual e o colectivo, as acções e as
representações.

7.3 Representações sociais da emigração

A realidade do fenómeno migratório assume por essência contornos muito


movediços. Uma análise deste real efectuada hoje pode já não ser
verdadeira no dia seguinte. Assim foi abordada a evolução das
representações da migração (Neto, 1986a, 1993b). Estas representações
serão estáveis ao longo do ter" ')

475
© Universidade Aberta
A amostra era constituída por 960 adolescentes, sendo metade
entrevistados em 1982 e a outra metade em 1987; comportava tantos
rapazes como raparigas; metade pertencia ao nível sócio-cultural baixo e a
outra metade ao nível sócio-cultural médio; metade residiam em zonas
urbanas e a outra metade em zonas rurais de Trás-os-Montes.

o instrumento utilizado compõe-se de 121 questões fechadas e de 11


questões abertas que as completam qualitativamente.

Qualquer que seja o elemento constitutivo da representação da emigração


que se considere, encontramos no seu seio dimensões em que se encontra
uma certa estabilidade temporal e outras que mudaram, embora em graus
diversos.

Seja como for, parece haver uma maior valorização do fenómeno


migratório nas representações sociais da migração em 1987 que em 1982.
Só evocaremos três aspectos que ilustram isto: a atitude, o processo
adaptativo e o projecto migratório.

Em 1987 encontra-se uma atitude mais positiva em relação à emigração


que em 1982, embora seja matizada. Em 1987 há mais jovens que
manifestam a intenção de partir, que aconselhariam aos seus amigos a fazê-
lo, que são favoráveis à partida de compatriotas e que julgam que os seus
pais têm uma opinião, menos negativa em relação à emigração dos filhos.

Para se ter uma visão global de evolução temporal recorremos à análise


factorial das correspondências (Benzécri, 1973) em que são utilizadas
como variáveis activas as treze questõe~ de atitude, e como variáveis
suplementares as variáveis que estiveram na base do plano amostragem. O
primeiro factor (28,6% da variância) está nitidamente separado do seguinte
(9,1% da variância) representando mais de um quarto da inércia total: é um
factor de nível geral. Podemos considerar este primeiro factor como uma
boa condensação do modo de sentir, pensar e agir em relação à emigração.
O segundo factor já é mais específico e opõe as modalidades de
desvinculação.

Encontra-se na figura 5.2 a localização das modalidades do aspecto atitude


no plano determinado pelos eixos I e 2. Pode-se aí observar que a
evolução temporal passa mais pela orientação global em relação à
emigração que pela desvinculação. Assim parece haver em 1987 uma
orientação global mais positiva em relação à emigração que em 1982.

Se passarmos aos processos de adaptação, as dificuldades mais impOltantes


são as ligadas à saudade (89%), à língua (75%) e à solidão (51%). São

476
© Universidade Aberta
igualmente, e nesta mesma ordem, estas três dificuldades que são mencionadas;
como sendo as mais importantes por um grupo de trabalhadores migrantes
portugueses instalados na região parisiense que foram interrogados sobre
este assunto (Neto e Mullet, 1987b). Seguem-se, para esses trabalhadores,
o alojamento, o racismo, o clima, a saúde, o trabalho, a alimentação. É
notável a grande semelhança na ordenação de classificação.

Entre as dificuldades do processo de adaptação, o efeito da evolução


temporal é significativo sobre o trabalho, o alojamento, a alimentação, a
saúde e a língua. Globalmente, ao nível destas cinco dificuldades, nota-se a
sua atenuação com o tempo.

o efeito de atenuação das dificuldades segundo a evolução temporal pode


ser observado igualmente por meio do recurso à análise factorial das
correspondências. A modalidade 1987 encontra-se associada a
modalidades que denotam um percurso migratório pouco difícil, enquanto
que a modalidade 1982 encontra-se mais associada a muitas dificuldades
no processo adaptativo.

A intenção de emigrar abrange uma parte importante da amostra (539'0),


sendo mais numerosos os jovens que a exprimem em 1987 (599'0) que em
]982 (489'0). O projecto migratório constitui, pois, um elemento
importante do projecto de vida. Aos conceitos de projecto escolar, de
projecto profissional, é necessário juntar o de projecto migratório, se se
pretender completar o campo do projecto de vida dos adolescentes (Neto e
MuJlet, 1987a).

Quais os países de destino perspectivados pelos que têm intenção de


emigrar? São mencionados 23 países espalhados pelos cinco continentes.
Pouco menos de dois terços dos sujeitos ancoram o seu olhar intencional
na Europa (64,69'0). Pouco menos de um terço estão voltados para a
América (29,29'0). As referências a países de África, Ásia ou Oceania são
episódicas. Em 1987 a Europa ainda atrai mais os jovens como virtual
continente de destino que em 1982 e, isto, em detrimento da América e da
África.

Em 1987, parece haver uma maior valorização nas representações sociais


do fenómeno migratório. Se pode haver várias explicações para tal,
referira-se tão somente uma de cariz psico-social. Uma alteração
significativa relevante, ocorrida entre as duas datas do inquérito, foi a
entrada de Portugal na Comunidade Económica Europeia em 1986. Já
sabemos que, segundo os jovens interrogados, são os países da União

477
© Universidade Aberta
:!:J
00

EIXO 2
* Desejo de ser muito menos * Nada difícil
informado sobre emigração deixar a família
* A emigração traz muitas
desvantagens para Portugal
* Nada difícil
deixar os amigos
* Desejo de ser menos
* A emigração traz informado sobre emigração
muitas desvantagens * Desfavorável a * A emigração traz * Nada difícil deixar

para o emigrante que os portugueses desvantagens para


o ambiente de Portugal

continuem a emigrar Portugal

* A emigração traz
desvantagens para * Desejo de ser igualmente
o emigrante informado sobre emigração
* A emigração não * Muito favorável a
* Os portugueses não * Não há identificação com que os emigrantes
traz vantagens nem continuem a emigrar
têm necessidade de desvantagens para o
os emigrantes regressados
continuar a emigrar emigrante

* No futuro Portugal * Desejo de ser muito * A. emigração traz


* Não aconselharia um * Os pais não deixará de ser mais informado sobre muitas vantagens
amigo a emigrar gostariam que
país de emigração emigração a Portugal
emigrasse

* Não tem intenção * Urbanos * A emigração traz muitas


de emigrar * Muito difícil * NSCrnédio vantagens para o emigrante
deixar o ambiente

© Universidade Aberta
de Portugal * 1982 * Rapazes
* Os portugueses tem necessidade EIXO I
* Muito difícil * Raparigas de continuarem a emigrar
* Indiferente que deixar os amigos * 1987 * Rurais
os portugueses * A emigração traz * Muito difícil * No futuro Portugal não deixará * Intenção de emigrar
continuem a deixar a família
vantagens para os de ser um país de emigração

emigrar emigrantes * A emigração não

traz vantagens
* NSCbaixo * Aconselharia um
nem desvantagens
* A emigração * Identificação com os amigo a emigrar
* Os pais gostariam
para Portugal emigrantes regressados que emigrasse
traz vantagens
para Portugal * Pouco difícil deixar o * Pouco difícil deixar
ambiente de Portugal os amigos * Pouco difícil
Fonte: Neto, 1993b. I * Favorável a que os portugueses continuem a emigrar deixar a família

Figura 5.2 - Localização das modalidades do aspecto atitude no plano detenninado pelos eixos 1 e 2.
Europeia que acolhem a maioria dos emigrantes portugueses e a grande
maioria dos que têm a emigração nas suas perspectivas de futuro ancoram
o seu olhar intencional também nos países da União Europeia. Sendo
assim, parece-nos que o processo psicológico da categorização social
possa ter contribuído, em parte, para a valorização do fenómeno
migratório segundo a evolução temporal.

As pertenças sociais de cada indivíduo são partilhadas com as pertenças de


muitos outros (como, por exemplo, a nacionalidade) e individualizadas por
categorias que lhes são próprias. Se antes da entrada de Portugal na C.E.E.
existia a categorização simples Nós (Portugal)/Eles (diferentes países
europeus receptores de emigração portuguesa), após a entrada de Portugal
na Comunidade Económica Europeia, já se está perante uma categorização
cruzada. Há uma intersecção do cruzamento de pertença do Nós e do Eles
no grande espaço comunitário. Ora já pôde ser mostrado
experimentalmente que se na condição de categorização simples há uma
diferença entre as atribuições feitas à sua própria categoria e as feitas à
outra categoria, na condição de categorização cruzada esta diferença
desaparece (Doise, 1984).
Num outro estudo seleccionou-se um subconjunto de preditores da
"intenção de emigrar" considerando as características sócio-demográficas
do jovem e os três elementos constitutivos de uma representação social
definidora acima (Silva e Neto, 1993). Estes subconjuntos formados por
preditores independentes deram origem a índices referentes aos vários
aspectos de uma representação e a sua análise indicou qual a importância
relativa desses aspectos na intenção de emigrar dos jovens. A partir dos
resultados expostos na figura 5.3 reconhece-se que a componente atitude é
a mais importante preditora da intenção de emigrar, seguida pelas
componentes de desvinculação e adaptação. As características sócio-
demográficas, bem como a componente "informação", podem ser
considerados factores "subjacentes" que estão correlacionados com
atitude. Aqui, como na teoria da acção raciocinada de Fishbein e Ajzen
(1980), a componente atitudinal tem um papel predominante em relação às
variáveis sócio-demográficas. Ainda segundo esta teoria, as intenções são
supostas cativar os factores de motivação que originam um
comportamento. Sendo assim, com a manipulação das variáveis preditoras
incluídas no modelo, será possível intervir e induzir um comportamento de
acordo com as políticas sociais a implementar quer no país de origem quer
no país de acolhimento. Particularmente no que diz respeito à emigração,
torna-se mais importante ter uma intervenção atempada ao nível da
intenção, tendo em vista incentivar ou desencorajar um determinado
comportamento.

479
© Universidade Aberta
Transparece desta revlsao sobre as representações SOCIaIS que a
investigação nesta área tem sido variada não só nos seus conteúdos, como
também nos seus métodos. As sendas trilhadas desde o projecto de
Durkheim até às recentes investigações sobre as representações sociais são
longas. A contribuição de Moscovici neste domínio é um marco
fundamental. A partir da verificação da existência de representações sociais
da psicanálise mostrou que o processo representacional possui uma dupla
função: fornece às colectividades um modo de interpretação das realidades
do meio e consequentemente modelos comportamentais.

Factores sócio-demográficos

0.19

.--­_ _....L._ _- . 0.16


Informação

0.17

Desvinculação

0.19

Adaptação

Intenção de emigrar

Fonte: Silva e Neto, 1993.

Figura 5.3 - Correlações entre as variáveis preditoras da intenção de emigrar.

Apesar disso este conceito tem sido alvo de várias críticas, incluindo se as
representações sociais constituem uma "teoria" (Potter e Litton, 1985;
Moscovici, 1985a). Jahoda (1988) manifesta reservas sobre o estatuto da
teoria das representações sociais a propósito da diferença de outros

480
© Universidade Aberta
conceitos conexos, como atitude, ideologia, cultura. Não restam dúvidas
da forte afinidade destes conceitos com o conceito de representações
sociais. No entanto, este quadro teórico reinjectou a negligenciada
natureza social e colectiva destes conceitos no domínio da psicologia
social.

481
© Universidade Aberta
APLICAÇÕES: REPRESENTAÇÕES E PRÁTICAS SOCIAIS DA

SIDA

A utilidade e a importância da noção de representação social para se


compreender e analisar práticas sociais não pode ser ignorada. Como seria
de esperar um problema social com a envergadura que tem nos nossos dias
- a sida - já tem sido abordado por meio do recurso ao quadro teórico da
representação social.

Recorremos ao trabalho da eqUlpa coordenada por Jean-Claude


Deschamps para mostrar como a noção de representação social permite
dar conta do modo como os indivíduos ou os grupos organizam os
conhecimentos, as percepções e as atitudes em relação a essa doença
(Comby, Devos e Deschamps, 1993; 1996). Este trabalho evidencia dois
aspectos: o primeiro é que as representações sociais constituem teorias do
senso comum que visam compreender a realidade; o segundo é que as
representações sociais estão ligadas às inserções dos indivíduos ou dos
grupos num conjunto de relações sociais.

Para esta análise os autores recorreram a um inquérito efectuado em 1990


junto de uma amostra representativa da população da ilha da Reunião,
departamento francês do ultramar, que se situa no oceano Índico. Devido à
sua insularidade esta população foi tocada mais tarde que a Europa
ocidental pela epidemia. O questionário utilizado abordava os temas sobre
a percepção do risco da infecção pelo HIV, os conhecimentos sobre a
doença, os modos de transmissão, as atitudes em relação às pessoas
seropositivas ou aos doentes da sida.

Os resultados mostram que o conjunto dos conhecimentos, percepções e


atitudes em relação à sida estão organizados em "teorias do senso
comum". Estas teorias destinam-se a apreender o real, sistemas investidos
com uma lógica própria e uma coerência interna. Emergiram duas
representações sociais da sida que são o resultado de processos de
selecção, de apropriação e de organização das informações disponíveis.
Há, por um lado, as pessoas que crêem na transmissão fácil do vírus pelos
contactos com as pessoas contaminadas, os seus objectos pessoais, os
lugares que frequentam, que julgam que as pessoas em contacto com
pessoas seropositivas ou doentes da sida estão mais expostas ao vírus que
as outras, e as suas atitudes manifestam rejeição em relação às pessoas
contaminadas. Há, por outro lado, as pessoas que sobre todos esses

482
© Universidade Aberta
aspectos têm uma opinião contrária: o vírus não se transmite facilmente,
ter contactos com pessoas seropositivas ou doentes da sida não é perigoso.
No dizer dos autores deste estudo estas "teorias" permitem dar sentido à
sida, explicá-la. O princípio explicativo parece girar à volta da noção de
contágio: uma crença na transmissão fácil do vírus pelos contactos
acompanham-se de uma recusa dos contactos sociais com as pessoas
contaminadas; pelo contrário, se a promiscuidade ou os contactos não
constituem uma explicação ou um risco não é necessário estabelecer uma
barreira entre si e uma pessoa seropositiva ou doente de sida.

Estes resultados aproximam-se de dois tipos de funcionamento


evidenciados por Paez Rovira e Paichler (1990) que distinguem o "modelo
corporativista" do "modelo liberal-individualista". As pessoas que
funcionam com o modelo "corporativista" privilegiam vias de contágio
como fluídos corporais, objectos de limpeza pessoal, contacto, picadas de
mosquitos. Essas pessoas têm tendência a sobrestimar a importância do
risco de contaminação entre quem contacta pessoas infectadas pelos vírus.
As pessoas que funcionam segundo o modelo "liberal-individualista"
sabem que certos grupos estão ameaçados, mas não os percepcionam
como uma causa da epidemia. Para elas, fluídos e promiscuidade não
constituem explicações: não crêem na transmissão do vírus pela saliva,
pelos mosquitos, pela troca de objectos de limpeza pessoal. É, por
conseguinte, inútil distanciar-se dessas pessoas infectadas com o vírus da
sida.

Estas duas representações evidenciadas sobre a sida têm características


semelhantes com as teses em confronto a propósito da cólera. Delaporte
(1990) num trabalho sobre a cólera de 1832 em Paris mostra que esta
doença foi definida quer como uma doença contagiosa quer como uma
doença infecciosa. Se os defensores da primeira tese queriam aplicar
medidas de segregação, os defensores da segunda tese viam na segregação
uma medida inútil. Reencontrou-se neste caso um antagonismo entre dois
sistemas de pensamento e uma coerência entre o sistema de pensamento e
as medidas preconizadas.

O segundo aspecto evidenciado pelo trabalho sobre as representações


sociais da sida que vimos analisando, refere-se à relação das
representações sociais com as inserções das pessoas nos grupos sociais.
Até que ponto as pessoas aprendem o fenómeno sida a partir do lugar
ocupado no sistema social? Nesta via os autores procuram evidenciar os
laços que podiam existir entre as inserções sociais das pessoas e as
representações "corporativista" ou "liberal-individualista". A oposição
entre estas duas representações diferencia os indivíduos segundo o nível de

© Universidade Aberta 483


formação e a idade. Quanto mais as pessoas têm uma formação escolar
elevada, tanto mais aderem a uma representação "liberal-individualista" da
sida; e, pelo contrário, quanto menos o nível de formação é elevado, tanto
mais se adopta uma representação "corporativista" da sida. O mesmo
acontece com a idade. As pessoas mais jovens têm uma representação
sobretudo "liberal-individualista" da sida, ao passo que as pessoas mais
velhas têm uma representação sobretudo "corporativista".

Estes resultados ilustram a necessidade de se tomar em consideração a


diversidade de situações em que as pessoas estão inseridas para a
compreensão das representações sociais da sida. Estas representações
ligam-se ao contexto em que as pessoas evoluem, aos modos de apreensão
de realidades que lhes são próprias e às comunicações estabelecidas.

Passamos agora a descrever uma investigação que se inscreve também na


teoria das representações sociais e que testemunha de modo mais geral
uma preocupação de operacionalização de algumas componentes
essenciais dos processos sócio-cognitivos susceptíveis de intervir na
regulação das práticas de tratar os pacientes pelos médicos (Morin,
Souville, Obadia, 1996).

o objectivo geral desta investigação consIstIU em avaliar as atitudes, as


motivações e as capacidades dos médicos generalistas para tratar pacientes
infectados com o HIV. Trata-se de um objectivo que está em consonância
com uma política de saúde pública que prevê que os médicos generalistas
serão levados cada vez mais a tornar-se actores de primeira fila na luta
contra a epidemia (Montagnier, 1993). Foi assim realizado um inquérito
junto de uma amostra representativa de médicos generalistas da cidade de
Marselha, França. O estudo põe em evidência orientações consensuais na
abordagem do tratamento da sida e dos pacientes infectados pelo HIV. A
relação das atitudes, das representações e das práticas permite caracterizar
vários tipos de implicação no tratamento. Podem-se assim distinguir quatro
grupos de médicos: I) os "comprometidos", 2) os "recusantes", 3) os
"tolerantes sem experiência" e 4) os "conservadores com experiência".

1) O grupo dos "comprometidos" apresenta duas características


importantes. Por um lado, revelam um nível de prática muito
superior aos outros médicos, profissional e pessoalmente. Estes
dois tipos de práticas estão intimamente associadas. Assim
declaram seguir regularmente pelo menos um paciente HIV ou ter
já realizado intervenções que os põem em contacto com tluídos ou
mucosas de pacientes contaminados. Declaram também ter seguido
pelo menos uma formação médica específica sobre o HIV. Ao nível

484 © Universidade Aberta


das práticas os médicos ressaltam como indicadores de
compromisso, por exemplo, ter utilizado pelo menos uma vez o
preservativo, conhecer pelo menos uma pessoa seropositiva no seu
meio próximo, não são fumadores ou ex-fumadores e declaram-se
ateus. Por outro lado, as suas posições ideológicas são bastante
marcadas. Por exemplo, rejeitam a ideia de que a sida possa ser a
consequência de um modo de vida sem moral ou que os
toxicómanos possam ser tratados como delinquentes. Para além
disso. sentem-se à vontade com os pacientes HIV e não pensam
que o facto de os tratar possa atingir a sua imagem de marca.

2) Os "reCUsClntes" são médicos que se comprometem nada ou


pouco com o tratamento do HIV. Por exemplo, declaram que
nunca seguiram regularmente pacientes HIV, que nunca realizaram
intervenções que os colocaram em contacto com fluídos ou
mucosas de pacientes contaminados. Para além disso, também não
seguiram uma formação médica específica sobre HIV. Em termos
de práticas pessoais declaram nunca ter utilizado preservativos, não
conhecer ninguém contaminado no seu meio próximo, serem
fumadores e crentes praticantes. Relativamente às dimensões mais
ideológicas estão de acordo com a frase" a sida é a consequência
de um modo de vida sem moral". Pensam que os homossexuais não
são pessoas como as outras e que os toxicómanos deveriam ser
tratados como delinquentes. Declaram também não se sentir à
vontade com o tratamento de pacientes infectados pelo HIV e que
o tratamento de um grande número destes pacientes pode atingir a
sua imagem de marca.

3) Os "tolerantes sem experzencia" constituem um grupo de


médicos cujo compromisso é sobretudo ideológico, mas que não se
comprometem com o tratamento da epidemia sobre o terreno.
Declaram-se abertos e tolerantes, mas colocam-se sobretudo à
distância do HIV e das pessoas infectadas.

4) Os "conservadores com experiência", tais como os do grupo 2,


são favoráveis a estratégias de controlo coercitivo. Distinguem-se,
no entanto, em dois aspectos: um compromisso ao nível das
práticas (podem ser actores comprometidos e participar
activamente sobre o terreno na luta contra a sida) e um
compromisso ideológico mais diferenciado (por exemplo, em
relação ao despiste obrigatório e ao segredo médico).

© Universidade Aberta 485


Os autores do estudo avançam como hipótese de que nestes médicos o
compromisso sobre o terreno está ligado a uma representação da saúde
pública que considera a necessidade de se tratar a epidemia ao nível
colectivo e não tanto um tratamento tradicional de casos individuais. Tal
poderia dar coerência à formação de novas condicionalidades na aplicação
das regras e das normas que enquadram a ética profissional.

As investigações referidas sobre a sida chamam a nossa atenção para o


facto de que as trocas e as articulações dos sistemas de representações e
das práticas não são fenómenos susceptíveis de ser abordados de modo
mecanicista. A abordagem delineada por Morin (1996) visa caracterizar as
diferentes lógicas de acção que podem encontrar-se ao nível de
confrontações interindividuais na situação de troca íntima ou na situação
de troca médico-doente.

SUMÁRIO

As representações sociais constituem um dos objectos de estudo


dominantes na psicologia social europeia no seguimento do trabalho
original de Moscovici. Efectivamente a palavra representação social
encontra-se amplamente difundida nas ciências sociais desde que em 1961
Moscovici desenterrou este "conceito esquecido" de Durkheim.

O conceito de representação social inscreve-se assim numa tradição


europeia e sociológica, ao invés da grande maioria dos conceitos de
psicologia social que são de origem americana e procedem da psicologia
geral.

A noção de representação social situa-se numa encruzilhada com múltiplos


acessos. As representações sociais apresentam-se sob formas variadas,
mais ou menos complexas: imagens, sistemas de referência, categorias,
teorias. O conceito de representação social designa uma forma de
conhecimento específica, o saber do senso comum. No seu sentido mais
lato designa uma forma de pensamento social. As representações sociais
são partilhadas pelos membros de uma sociedade ou colectividade. Estas
estruturas consensuais são vistas como sendo criadas socialmente através
da interacção e da comunicação social.

A incidência da comunicação pode ser analisada a três níveis: ao nível das


dimensões das representações que se referem à construção do

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comportamento, ao nível da emergência das representações e ao nível dos
processos de formação das representações.

Há um certo acordo em abordar a representação social como o produto e


o processo de uma elaboração psicológica e social do real. A título
hipotético Moscovici considera cada universo de representações sob três
aspectos: informação, atitude e campo de representação. Dois processos
deixam transparecer o modo como o social transforma um conhecimento
em representação e como esta representação transforma o social: a
objectivação e a ancoragem. A objectivação reflecte pois a intervenção do
social na representação e pode subdividir-se em três fases: selecção e
descontextualização, esquema figurativo c naturalização. A ancoragem
traduz a intervenção da representação no social. Este processo articula as
três funções-base da representação: função de orientação de condutas e
das relações sociais, função de interpretação da realidade e função
cognitiva de integração da novidade.

A investigação sobre as representações sociais pode ser agrupada em três


áreas: uma referente à difusão dos conhecimentos e à vulgarização
científica; outra manipula as representações sociais; e, enfim, a terceira
aborda objectos socialmente valorizados apreendidos em contextos sociais
reaIs.

Cada uma destas três áreas foram ilustradas de modo empírico por estudos
sobre as representações sociais da educação, da teoria do núcleo central e
da emigração, respectivamente.

Ao nível das aplicações mostra-se a utilidade e a importância da noção de


representação social para se compreender e analisar práticas sociais.

PARA IR MAIS LONGE

ABRIC, l-C. (Ed.)

1994 Pratiques sociales et représentations. Paris:


Presses Universitaires de France.

o objectivo desta obra é o de mostrar como as análises teóricas do núcleo


central podem contribuir para o conhecimento das representações sociais e
para compreender o modo como elas podem intervir nas práticas sociais.

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FARR, R. M. e MOSCOVICI, S. (Eds.)

1984 Social representations.. Cambridge: Cambridge


University Press.

o objectivo da publicação deste volume em inglês foi o de facilitar a difusão


do quadro teórico das representações sociais no mundo anglo-saxónico. As
pessoas que contribuíram para este volume apresentam uma vasta gama de
perspectivas a propósito das representações sociais.

JODELET, D. (Ed.)

1989 Les repreésentations sociales. Paris. Presses


Universitaires de France.

Esta obra escrita por 21 investigadores de diversos países delineia o estado da


investigação sobre as representações sociais. Faz ressaltar as articulações
teóricas e os principais eixos do desenvolvimento deste quadro teórico.

MOSCOVICI, S.

1961, 1976 La psychallalyse, son image et SOI1 publico Paris:


Presses Universitaires de France.

Este livro representa um marco de referência na psicologia social europeia. É


a partir desta obra que se vai iniciar o estudo das representações sociais. O
objectivo do livro é o estudo da transformação de uma teoria sábia em sentido
comum, ou por outras palavras, de um sistema conceptual num sistema de
representações.

ACTIVIDADES PROPOSTAS

1- Que comentários lhe são sugeridos peja definição de Moscovici da


representação social como "a elaboração de um objecto social por uma
comunidade"?

2- Como se pode distinguir difusão, propagação e propaganda?

3- Que tipo de relações estabeleceria entre atitudes e representações


sociais?

4- Tendo em conta a sua formação de base (por exemplo, economia,


ciências da educação, psicanálise, etc.) verifique se há investigações sobre

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as representações sociais nesse domínio. Procure fazer uma síntese dessas
investigações.

No caso de não encontrar investigações sobre o domínio da sua formação


de base, escolha uma investigação sobre as representações sociais já
publicada e faça a sua análise crítica.

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VI. PRECONCEITOS E DISCRIMINAÇÃO

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TÁBUA DE MATÉRIAS

1. Introdução

2. Definições: Preconceito, Discriminação e Grupos Minoritários

3. Algumas Categorias de Preconceito

3.1 Racismo

3.2 Sexismo

3.3 Heterossexismo

304 Idadismo

4. A face Mutante do Preconceito

5. Génese do Preconceito e da Discriminação

5.1 Abordagens históricas

5.2 Abordagens sócio-culturais

5.3 Abordagens situacionais

5A Abordagens psicodinâmicas

504.1 Frustração e agressão

504.2 Diferenças de personalidade

5.5 Abordagens cognitivas

5.5.1 Categorização social

5.5.2 O poder dos estereótipos

5.5.3 Atribuição

5.5 A Crenças sociais

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5.6 Alvo do preconceito

5.7 Quadro integrador de teorias

6. Consequências do Preconceito e da Discriminação

6.1 Reacções das vítimas de preconceito

6.2 Consequências do racismo sobre o racista

7. Redução do Preconceito e da Discriminação

7.1 Tomada de consciência

7.1.1 Tomada de consciência da pertença a um grupo

minoritário

7.1.2 Tomada de consciência das distinções

7.1.3 O assimilador cultural

7.2 A hipótese do contacto

7.3 Para além da hipótese do contacto

7.4 Contacto vicariante através dos meios de comunicação social

Aplicações: Estratégias para mudar atitudes negativas

Sumário

Para ir mais longe

Actividades propostas

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Objectivos de aprendizagem

o estudo deste capítulo deve permitir ao aluno:


• Ser capaz de distinguir entre preconceito e discriminação;

• Ser capaz de identificar formas de preconceito e de discriminação no


passado e no presente;

• Identificar causas do preconceito e da discriminação;

• Examinar os efeitos do preconceito e da discriminação;

• Identificar modos que permitam reduzir preconceito e discriminação.

Civilized men (women) have gained notable mastery over energy, matter, and
inanimate nature generally, and are rapidIy Iearning to contraI physical
suffering and premature death. But, by contrast, we appear to be Iiving in the
Stone Age so far as our handling of human reaItionships is concerned.

Gordon Allport

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1. Introdução

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As atitudes indicam-nos o modo como pensamos e sentimos em relação a
pessoas, objectos e questões do meio circundante. Para além disso, podem
permitir prever como agiremos em contacto com os alvos das nossas crenças.
A um nível mais geral, o conceito de atitude está relacionado com graves
questões sociais como são os problemas de preconceito e de discriminação.

A citação colocada no cabeçalho deste capítulo foi extraída do livro de


Gordon AUport (1954) sobre o preconceito. Desde a altura em que esse livro
apareceu, já lá vão mais de quarenta anos, centenas de artigos, de livros e de
filmes foram consagrados à questão do preconceito. Apesar da atenção que
este tópico tem suscitado, atitudes preconceituosas e comportamentos racistas
são tão usuais hoje como quando Allport publicou sobre esse aspecto.
Efectivamente muitos cientistas sociais defenderiam que preconceito e
discriminação estão a aumentar. Considerem-se os seguintes exemplos
ocorridos em países estrangeiros.

Em Abril de 1992, quatro polícias brancos foram absolvidos em Los Angeles


do assalto de um motorista negro, Rodney King, discretamente gravado em
video. A absolvição acendeu motins e violências em Los Angeles. Os
resultados aproximados dos motins foram 50 mortos, 1 600 comércios
completamente destruídos ou muito danificados e percas financeiras rondando
800 milhões de dólares (Mydans e Mariott, 1992).

Em Setembro e Outubro de 1992 houve uma vaga de ataques a residências de


refugiados em pelo menos dez cidades da ex-Alemanha de Leste (Kinzer,
1992).

Em Outubro de 1992 as Nações Unidas constituíram uma Comissão de Crimes


de Guerra para investigar reivindicações de "limpeza étnica" (genocídio étnico
e cultural) na guerra Bósnia-Herzegovina.

Estes acontecimentos recentes são suficientes para nos relembrar que


preconceito e racismo continuam a existir na sociedade actual. Se porventura a
violência nos Estados Unidos, na Alemanha e na Bósnia parecem distantes do
leitor português, contudo o colapso das fronteiras entre países juntamente com
os avanços ocorridos na comunicação global trazem estes acontecimentos
internacionais mais perto das nossas portas.

É tentador pensar-se que preconceito e discriminação no trabalho, no


alojamento e noutros contextos é um pecado não só passado, mas também
actuaJ, que em todo o caso, não existiria na sociedade portuguesa. Considere-

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se, por exemplo, o seguinte relato de uma estudante: "Os preconceitos que
compartilho, suponho com o resto da sociedade, e dos quais tenho
consciência, são dirigidos aos grupos étnicos: - os negros com os quais
pensaria duas vezes antes de decidir casar, sobretudo pelo seu aspecto físico; -
os ciganos que considero na generalidade muito agressivos. Quanto ao
preconceito universalmente, suponho, divulgado de que as mulheres são
menos competentes, em suma, as "segundas" relativamente aos homens,
embora o não compartilhe, sou por ele infelizmente condicionada". Esta
descrição refere duas manifestações diferentes de preconceito e de
discriminação - racial e sexual - e ilustra como todos esses problemas poderão
fazer parte do nosso quotidiano.

A imprensa entre nós também se tem feito eco do preconceito racial existente
em Portugal. Assim, por exemplo, o Público de 3111194 refere: "O grupo de 12
'skinheads' acusado de, em 18 de Novembro de ]989, ter agredido
barbaramente o cidadão angolano Francisco Faustino começa hoje a ser
julgado no Tribunal Correccional do Porto, sob acusação de ofensas corporais,
ameaças e uso de armas proibidas. É o mais importante caso relacionado com
actividades racistas depois do julgamento do homicídio do dirigente do PSR
José Carvalho." Nessa mesma página do Público são avançados dados sobre o
número de agressões de natureza racista: "Desde Janeiro de 1990, morreram
três pessoas em agressões associadas ao racismo e atribuídas a grupos
neonazis, de acordo com o inventário do SOS Racismo, elaborado a partir das
notícias divulgadas na imprensa. Há ainda a salientar, no mesmo período, três
feridos graves e um número não quantificado de feridos ligeiros, mas sempre
superior a três dezenas. A maioria das agressões verificou-se no Porto, embora
duas das mortes tenham ocorrido em Lisboa e a terceira em Carnaxide, no
concelho de Oeiras."

Certamente que já pensou em como o preconceito e a discriminação


constituem uma ameaça ao bem-estar humano em todo o mundo. É
praticamente impossível desfolhar um jornal ou ligar a televisão para ver um
telejornal sem que sejam referidas violências resultantes do seu impacto. Só
esta razão é suficiente para justificar como a Psicologia Social desde há muito
lhe tem consagrado um lugar de destaque. São diversas as facetas a que os
psicólogos sociais têm dedicado muito do seu labor para compreender os
processos subjacentes a esses problemas. Entre as mais importantes refiram-se:
]) a natureza do preconceito e da discriminação; 2) categorias de intolerância
grupal; 3) factores que contribuem para a sua emergência; (4) consequências

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do preconceito e da discriminação; 5) diferentes soluções que têm sido
propostas para reduzir o seu impacto. Neste capítulo abordaremos esses
diferentes aspectos.

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2. Definições: preconceito, discriminação
e grupos minoritários

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Muito embora se considere, por vezes, como sendo intermutáveis, os
conceitos de preconceito e de discriminação, parece-nos, no entanto, poderem
diferenciar-se. É possível distinguir um certo número de conceitos básicos com
interesse para o exame das interacções intergrupais: preconceito,
discriminação e grupos minoritários.

o preconceito pode ser definido como uma atitude favorável ou desfavorável


em relação a membros de algum grupo baseada sobretudo no facto da pertença
a esse grupo e não necessariamente em características particulares de membros
individuais. Por exemplo, o preconceito sexual surge se um sujeito é avaliado
tendo em conta a sua pertença a um grupo particular (masculino ou feminino)
e não tanto por traços individuais. Os mais variados grupos, para além dos
sexuais, podem ser alvos de preconceitos: raças, etnias, religiões, migrantes,
prisioneiros, homossexuais, deficientes, doentes mentais e os ditos
"intelectuais", para só nomear alguns. Note-se que muito embora o
preconceito possa ter uma tonalidade positiva ou negativa, no Ocidente tem
assumido sobretudo conotações negativas (Allport, 1954) (Documento 6.1).

Os termos endogrupo e exogrupo são úteis para se tratar do preconceito. O


endogrupo é composto pelos sujeitos que uma pessoa categorizou como
membros do seu próprio grupo de pertença e com quem tem tendência a
identificar-se. O exogrupo pode definir-se como sendo composto por todos os
sujeitos que uma pessoa categorizou como membros de um grupo de pertença
diferente do seu e com quem não tem tendência a identificar-se. Estes grupos
psicológicos definidos em função dos termos "nós" e "eles" são o produto de
um dos processos mais fundamentais do ser humano, a categorização (Fiske e
Neuberg, 1990). Este utensílio cognitivo permite-nos classificar e ordenar o
nosso meio físico e socia!. O corte da realidade em categorias distintas
permite-nos a repartição de modo mais eficaz do nosso tempo e dos nossos
esforços e a adaptação ao meio complexo em que se vive (Anderson, 1991).
Mas, como veremos, este processo não se reveste só de aspectos positivos.

Allport (1954):

"O preconceito étnico é uma antipatia baseada em generalização errada e inflexível.


Pode ser sentido ou pode exprimir-se. Pode dirigir-se a um grupo como um todo, ou
a um indivíduo por ser membro desse grupo."

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Ashmore (1970):

"Uma atitude negativa em relação a um grupo definido socialmente e em relação a


qualquer pessoa percepcionada como sendo membro desse grupo."

Jones (1986):

A psicologia, e em particular a psicologia social, focalizaram a sua atenção no


preconceito como sendo "uma generalização errada de uma categorização de um
grupo (estereótipo) para um membro individual do grupo, independentemente quer
I) da veracidade do estereótipo do grupo, quer 2) da aplicabilidade da
caracterização do estereótipo do grupo ao indivíduo em questão."

Documento 6.1- Definições de preconceito

Se bem que o preconceito seja uma atitude e sujeito a aspectos referidos no


capítulo 4, um certo número de razões levaram-nos a consagrar-lhe um
capítulo separado. Em primeiro lugar, o preconceito origina comportamentos e
acções que podem ter sérias implicações não só na vida quotidiana como no
bem-estar da sociedade. Para além disso, um corpo substancial de provas
baseadas em métodos experimentais e de observação têm advindo de
investigação em que se focaliza o preconceito.

o facto de se definir preconceito como um tipo especial de atitude tem pelo


menos duas implicações. A primeira é que muito embora o preconceito seja
usualmente utilizado como sendo uma avaliação negativa, também pode ser
positiva (por exemplo, todos os negros são atléticos). A segunda implicação é
que se o preconceito é uma atitude, podemos vê-lo como tendo três
componentes principais: afectivo, cognitivo e comportamental. A componente
afectiva diz respeito a sentimentos preconceituosos experienciados em face de
membros de grupos específicos, ou simplesmente pelo facto de se pensar
nesses grupos. A componente cognitiva refere-se não só a crenças e
expectativas acerca dos membros desses grupos, como também aos modos
como são processadas as informações acerca desses membros. Enfim, a
componente comportamental refere-se às tendências a agir em relação a esses
grupos. Caso essas intenções se concretizem em acções, estamos então perante
a discriminação.

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.,, .

A discriminação é, por consequência, a manifestação comportamental do


preconceito. Quando ocorre a discriminação, membros de grupos particulares
são tratados de modo positivo ou negativo por causa da sua pertença a
determinado grupo.

Tem a sua importância distinguir entre preconceito e discriminação, porque


muito embora as atitudes preconceituosas estejam muitas vezes associadas a
comportamentos discriminatórios, nem sempre é o caso. Por exemplo, o
director de uma empresa pode pensar que os transmontanos são "telhudos",
que as mulheres são "frívolas", podendo no entanto não assumir
comportamentos discriminatórios em relação a esses grupos quando procuram
emprego na sua empresa. Se o preconceito nem sempre leva à discriminação, a
discriminação nem sempre leva ao preconceito. Por vezes, as pessoas podem
discriminar membros de um grupo particular devido a pressões sociais. Por
exemplo, no romance de Kafka, Le Château, o personagem principal K. ..
chega a uma aldeia desconhecida, cujos habitantes desconfiados são
dominados pela autoridade do palácio. K. .. é um estrangeiro e tratado como
tal: "Não sois do palácio, não sois da aldeia, não sois nada", diz-lhe outro
personagem. Um hoteleiro recusa dar-lhe um quarto no seu albergue, mesmo
se nada tem contra K. .. "Gostaria muito de satisfazer o seu desejo" diz o
hoteleiro, que prossegue: "os donos do palácio são tão sensíveis que estou
convencido que não suportariam ver um estrangeiro". Nesta situação, se o
hoteleiro tem um comportamento discriminatório, não sente preconceitos em
relação ao estrangeiro.

o comportamento discriminatório pode assumir diferentes formas.A um nível


simplesmente moderado pode implicar evitamento. A um nível mais acentuado
pode levar a excluir de empregos, de escolas, de alojamentos. Em casos
extremos, a discriminação pode revestir-se de agressão contra os alvos do
preconceito (Documento 6.2).

Allport (1954) apresentou um modelo das expressões da passagem ao acto do preconceito


com cinco fases. O seu modelo apresenta expressões do preconceito num continuum do
menos ao mais enérgico que podem desenvolver-se dentro das sociedades que toleram ou
encorajam o racismo:

I. Antilacução - conversa hostil e difamação verbal, propaganda racista.

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2. Evitamento - manter o grupo étnico separado do grupo dominante na sociedade.
Por exemplo, tal pode transparecer de alguns agentes de compra e venda de
propriedades que afastem pessoas brancas de zonas onde residem minorias étnicas, e
deste modo desenvolve-se o gueto.

3. Discriminação - quando o grupo minoritário é excluído de direitos civis, do


emprego e do acesso a certas formas de alojamento. Tal era evidente na África do Sul
quando nesse país vigoravam as leis do apartheid.

4. Ataque físico - violência contra pessoas e propriedades que pode vir de


organizações racistas, de grupos não organizados de sujeitos. Há alguma evidência
que durante períodos económicos tensos (e. g., recessão económica do começo dos
anos 90 ou um rápido afluxo de refugiados à ex-Alemanha de Leste também no
começo desta década) os ataques físicos tornam-se uma forma mais frequente de
expressão do preconceito.

5. Extermínio - Violência indiscriminada contra todo um grupo de pessoas, tais como


as tentativas nazis de aniquilar todos os judeus e ciganos europeus na primeira
metade deste século.

Evidentemente os indivíduos que estão numa fase podem nunca progredir para a seguinte.
Contudo, o aumento de actividade a um nível aumenta a probabilidde de que um indivíduo
atravessará a fronteira para a seguinte. Allport (1954, p. 15) dá o seguinte exemplo
pungente: "Foi a anti locução de Hitler que levou os Alemães a evitar os seus vizinhos judeus
e amigos de outrora. Esta preparação tornou mais fácil decretar as leis de discriminação de
Nurnberg que, por sua vez, fizeram com que os subsequentes incêndios de sinagogas e
ataques a judeus nas ruas parecesse natural. O passo final nesta macabra progressão foram
os fornos de Auschwitz."

John Duckitt (1992-1993) apontou que se podia acrescentar um nível mais abaixo à
hierarquia de Allport. Denomina este nível de "expressões comportamentais subtis e
indirectas de antipatia antigrupal." Estas expressões subtis incluem o tom de voz, o não
respeito do espaço pessoal, menos contacto ocular, menos interacção verbal, menos amizade
e tendências para interpretar os motivos para o comportamento de modo enviesado. Atitudes
preconceituosas suscitam um leque de comportamentos discriminatórios.

Documento 6.2 - Expressões do preconceito étnico

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Se o preconceito e a discriminação são conceitos diferentes e podem não estar
associados, eles são também muito interdependentes. É evidente que
preconceito e estereótipos podem suscitar discriminação. Tal constitui só uma
parte dum círculo vicioso, pois a discriminação pode ter então consequências
sobre o alvo, produzindo padrões comportamentais que confirmam crenças
iniciais. Por exemplo, se os brancos recusam dar trabalho a um negro por
causa dos estereótipos de "preguiçoso", "imoral" e "sujo", não restam dúvidas
que a miséria e a marginalidade social do negro terão tendência a precipitá-lo
na passividade, na imoralidade, na sujidade de que é criticado.

A recusa de um proprietário em alugar um alojamento a uma família


simplesmente pelo facto dos seus membros serem de uma minoria visível
constitui um exemplo clássico de comportamento discriminatório. Por
exemplo, para se poder apreender as reacções das agências imobiliárias de
Paris perante fenótipos diferentes, utilizou-se o método "Situational Testing"
(Raveau et al., 1986). A situação ou cenário do estudo era do seguinte modo:
Uma agência imobiliária de Paris recebe, consecutivamente, as visitas de três
entrevistadores-actores: um Antilhano, um Português e um Francês. Os três
sujeitos tinham a mesma idade (cerca de 25 anos) e revelavam pertencer a uma
mesma categoria sócio-profissional. No contacto com as /agências, os três
indivíduos formulavam pedidos de aluguer de apartamento do mesmo tipo. Os
resultados revelaram que existe uma grande distinção entre o Francês e o
Português (apesar de estrangeiro), por um lado, e o Antilhano que é um
cidadão francês negro. Este é muito mais discriminado que os outros dois
actores.

Não lhe suscita certamente dúvidas que a discriminação não se manifesta


somente no domínio do alojamento. É muitas vezes no domínio do emprego e
no desenrolar da carreira no seio de organizações que a discriminação se
exprime de modo particularmente subtil e nefasto.

Refiram-se ainda as conclusões de um vasto estudo do Conselho Económico


do Canadá (CEC) sobre as diferenças de salário entre imigrantes provenientes
de uma "minoria visível" e os canadianos nascidos no Canadá (CEC, 1991). O
Conselho inquieta-se do facto que, esses imigrantes não obtêm um emprego e
um salário comparáveis aos dos canadianos nascidos no país que têm uma
competência semelhante. Pode-se supor que daí resultará ressentimento nos
primeiros e conflitos raciais. O estudo revela em primeiro lugar que segundo
o recenseamento de 1986, os imigrantes recentes têm, ao invés das crenças
populares, uma proporção de prestações de ajuda social mais fraca que os

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canadianos nascidos no país (12,5% contra 13,8%). Os mesmos dados
mostram também que em 1986 os imigrantes tinham uma taxa de desemprego
mais fraca que a da população nascida no Canadá: 8,2% contra 10,8%. Com
base no recenseamento de 1986 o estudo efectua uma comparação dos
ordenados dos imigrantes originários de uma "minoria visível" com os das
pessoas nascidas no Canadá. Estas comparações são feitas controlando do
ponto de vista estatístico todos os factores ligados ao sucesso social, tais como
o nível de escolaridade, o conhecimento das línguas oficiais e a experiência
profissional. Os resultados indicam. que a competência igual e com a
escolaridade e a experiência de trabalho adquirida no Canadá, os ordenados
dos imigrantes antilhanos e da Ásia do Leste (Chineses, Coreanos,
Vietnamitas) são estatisticamente inferiores (26% e 20% respectivamente) aos
dos canadianos nascidos no país. Estes últimos resultados ilustram que são
sobretudo os imigrantes antilhanos e asiáticos que sofrem de discriminação no
mundo do trabalho no Canadá. Para além disso, este estudo demonstrou que
as mulheres, quer imigrantes quer nascidas no país, são as maiores vítimas da
discriminação ao nível dos ordenados no Canadá.

Um dos termos que mais se ouvem hoje em dia na linguagem quotidiana é


minoria ou grupo minoritário. Poder-se-ia supor que o termo grupo
minoritário é mais claro do que os dois conceitos descritos previamente, caso
só tivéssemos em conta o tamanho dum grupo. Todavia os números não são
tudo na perspectiva sócio-psicológica (Simpson e Yinger, 1985). Por exemplo,
na África do Sul os brancos constituem apenas uma pequena percentagem da
população; há ligeiramente mais mulheres que homens no nosso planeta. Em
ambos os exemplos apontados a minoria dispõe de mais poder do que a
maioria. O que distingue um grupo minoritário de um maioritário é
precisamente o poder relativo exercido pelos dois grupos. Mais
especificamente para Wagley e Barris (1958) as minorias a) são sectores
subordinados de uma sociedade, b) possuem traços físicos e culturais que são
pouco apreciados pelos grupos dominantes, c) estão conscientes do seu
estatuto minoritário, d) tendem a transmitir normas que encorajam a afiliação
e) e o casamento com membros do mesmo grupo. Note-se que o número não
desempenha um papel muito importante nesta definição. A pertença a um
grupo minoritário envolve mais um estado de espírito do que características
numéricas.

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3. Algumas categorias de preconceito
e de discriminação

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Focalizaremos agora a nossa atenção em quatro formas de intolerância:
racismo, que é a intolerância com base na cor da pele ou na herança étnica;
sexismo, a intolerância com base no sexo; heterossexismo que é a intolerância
com base na orientação sexual, e idadisl1w , a intolerância com base na idade.

3.1 Racismo

o racismo é "qualquer atitude, acção, ou estrutura institucional que subordina


uma pessoa por causa da sua cor" (U.S. Comission on Civil Rights, 1969, p.
I). Por conseguinte, o racismo envolve preconceito e discriminação e pode ser
ou pessoal ou institucional (incluindo cultural). O quadro 6.1 apresenta alguns
exemplos destes diferentes tipos de racismo.

Racismo individual: características Racismo individual: expressão


gerais societal

crença na superioridade dos brancos violência contra não brancos; rir-se da


aparência ou dos costumes de grupos
não brancos, perseguição racial; rir
com anedotas racistas

recusa da existência de qualquer forma de não apoio de legislação sobre direitos


racismo civis

crença de que a falta de sucesso das utilizar termos raciais depreciativos;


pessoas não brancas se deve a falta de vontade em apoiar acção
inferioridade genética afirmativa; promulgação de
estereótipos raciais

Racismo cultural: características gerais Racismo cultural: expressão societal

superioridade na linguagem limitar o acesso ao trabalho e a


educação ao "padrão dos brancos"

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lei e política definidas de uma perspectiva candidatos políticos negros são
dos brancos designados para serem "líderes
negros". mas os candidatos brancos
não são "líderes brancos"

na educação, na ciência, na filosofia, etc., contribuições de outros grupos raciais


as contribuições das pessoas brancas são são invisíveis; produtos (e.g., música,
as melhores literatura) são "melhores" quando são
apresentados por uma pessoa branca

Racismo institucional: características Racismo institucional: expressão


gerais societal

a execução da lei é mais severa para brutalidade policial; mandar parar as


pessoas negras pessoas na "má" vizinhança; sentenças
mais severas para os mesmos crimes

desemprego e subemprego para pessoas taxa de desemprego de negros tem sido


negras pelo menos três vezes superior à dos
brancos; imigrantes muitas vezes não
têm empregos consentâneos com o seu
nível de instrução

alojamento inadequado discriminação no empréstimo sob


hipoteca; segregação racial no
alojamento

Fonte: Adaptado de Axelson, 1985.

Quadro 6.1 - Alguns exemplos de racismo com origem individual, cultural e


institucional

o racismo é a forma de preconceito mais estudada. É de observar que a noção


de raça tem a sua origem na biologia e designa uma espécie geneticamente
distinta de outras (Osborne, 1971). Relembre-se que no século passado os

516
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I
" .

etflólogos dividiam a espécie humana em três raças em função da cor da pele:


negra, amarela e branca. Desde então verificou-se em genética que as
diferenças que existem entre os indivíduos classificados na mesma raça são
mais importantes que as diferenças entre as raças (Stringer, 1991). Por isso os
cientistas de todas as disciplinas concordam no facto de que o termo raça não
se pode aplicar aos seres humanos (UNESCO, 1969). Ao invés, pessoas e
grupos racistas continuam a propalar este antigo sistema de classificação e a
ver nestas diferenças de pigmentação de pele o índice da pertença a diferentes
subgrupos humanos. Deste modo a ideologia racista torna-se um instrumento
político a que se recorre muitas vezes para legitimar o tratamento desigual
entre grupos sociais (Wierviorka, 1991). Se nesta obra utilizamos o termo raça
é para designar o problema social, pois não subscrevemos essa "noção".

A discriminação com base na cor da pele torna-se pois uma distinção arbitrária
e confusa. Negros mais claros, por exemplo, tendem a discriminar negros mais
escuros (HaIl, 1992), e brancos tendem a discriminar contra todos os negros,
incluindo contra alguns negros que são mais claros que alguns brancos.
Acontece que muitas vezes estas distinções têm mais a ver com distinções
étnicas que sociais. Um grupo étnico é um conjunto de pessoas que têm
antepassados comuns pertencentes a uma mesma cultura e sentimentos comuns
de identificação a um grupo distinto. À semelhança das diferenças raciais, as
diferenças étnicas também estão na base de muitos preconceitos. O
preconceito com base em distinções étnicas denomina-se etnocentrismo.
Quando as pessoas acreditam que o seu grupo étnico é superior aos outros
grupos estão imbuídas de etnocentrismo. Racismo e etnocentrismo são
extremamente comuns na nossa sociedade. O único tipo de preconceito que
rivaliza em frequência com o racismo é o sexismo.

3.2 Sexismo

A investigação sobre o sexismo é importante pelo menos por dois motivos: 1)


ensina-nos algo sobre os mecanismos psico-sociais associados ao preconceito
em geral, e 2) trata-se de uma forma de preconceito que pode afectar um em
cada dois seres humanos.

Poder-se-ia definir o sexismo como preconceito e discriminação com base no


género. Se, em teoria, o sexismo ocorre sempre que homens e mulheres são

© Universidade Aberta 517


colocados em desvantagem simplesmente por causa do seu género, na prática,
as mulheres têm sofrido mais os seus efeitos que os homens.

À semelhança do que acontece com outras formas de preconceito, o sexismo


provem muitas vezes de estereótipos. No capítulo 7 examinaremos mais em
pormenor a problemática dos estereótipos sexuais. Diga-se tão somente, por
ora, que estes rótulos têm as suas consequências. Suscitam diferentes
expectativas sobre os homens e as mulheres (Jackson, 1989), restringem a
realização mediante a diminuição da autoconfiança das mulheres (McCarty,
1986) e produzem atribuições diferentes sobre as realizações dos homens e das
mulheres (Nieva e Gutek, 1981). Em relação com tudo isto está o facto de que
cada cultura coloca mulheres e homens em diferentes papéis. Ora as diferenças
nos papéis com base no género são tão comuns que os investigadores
interculturais referem-se a uma vasta "assimetria género-papel"
(Mukhopadhyaye e Higgins, 1988).

Embora a discriminação sexual aberta seja ilegal em muitas circunstâncias em


Portugal e noutros países ocidentais, o certo é que formas subtis de sexismo
persistem em muitos contextos. Por exemplo, representações visuais de
homens e de mulheres nos jornais, nas revistas, na televisão e nos retratos
artísticos mostram um padrão de parcialidades subjacentes. Quando se retrata
um homem estes meios de comunicação focam de modo consistente a sua face.
Quando se retrata uma mulher, mostram muito mais do seu corpo. Dane
Archer e colegas (1983) sugerem que esta diferença ret1ecte o relativo ênfase
que a nossa cultura coloca na vida mental para os homens e na aparência física
para as mulheres. Este viés foi denominado de face-ismo. Archer e outros
investigadores relatam que quanto maior proeminênia é dada à face numa
representação visual, mais competente (inteligente, assertativa, ambiciosa, etc.)
é avaliada a pessoa (Archer et aI. 1983; Copeland, 1989).

Uma manifestação adicional de sexismo pode ocorrer ao nível de


oportunidades desiguais em educação. Segundo físicos do século dezanove,
cada ser humano estava impregnado com uma quantidade limitada de "força
vital" que consistia nalguma forma de energia eléctrica. Acreditava-se que a
quantidade total de energia no corpo permanecia constante porque a energia
não pode ser criada ou destruída. Devido a esta conservação da energia, os
físicos insistiam que as pessoas não deveriam exceder-se em qualquer
actividade com medo de que tal poderia deixar pouca energia para outros fins.
Armados com o princípio da conservação, muitos físicos, cientistas e
comentadores recomendavam que as mulheres não deveriam prosseguir uma

518 © Universidade Aberta


educação elevada. Porquê? Segundo a opinião dominante qualquer energia que
as mulheres gastassem no desenvolvimento da sua mente poderia reduzir a
quantidade de energia disponível para órgãos femininos mais importantes, tais
como os necessários para a reprodução. Esta ideia que a educação podia ser
perigosa para o sistema reprodutor da mulher foi defendida por personalidades
tão conhecidas como o psicólogo americano Stanley HaJl, o psiquiatra inglês
Henry Maudsley e o filósofo britânico Herbert Spencer (Bem, 1993). Em parte
devido a esta análise científica milhares de mulheres foram desencorajadas a
prosseguirem a sua educação para além do liceu.

Muito embora esta opinião científica do século dezanove pareça suscitar riso
hoje em dia, a morte da teoria da força vital não pôs fim ao sexismo na
educação. Durante as inúmeras horas que a criança passa na escola, a
aprendizagem do género é uma parte muito importante do curriculum oculto.
Rapazes e raparigas são muitas vezes segregados em diferentes actividades e
lugares de jogo (Thorne, 1992). Muitas vezes professores fazem competir
rapazes contra raparigas em competições académicas. Para além da tendência
de professores a dividir fisicamente as suas turmas com base no sexo, há
também investigação que denota que a atenção está da mesma maneira
dividida. Os rapazes recebem mais atenção do que as raparigas, incluindo
comentários positivos e negativos e maior instrução e escuta (Sadker e Sadker,
1994).

3.3 Heterossexismo

Na antiga Roma era-se relativamente tolerante com todas as formas de


preferência sexual e efectivamente ainda há uma grande variabilidade nas
atitudes em relação à preferência sexual (Gosslin e Wilson, 1980). Com o
advento do Cristianismo as normas sociais sobre o comportamento sexual
tornaram-se mais estrictas. A homossexualidade era vista como imoral e
desviante. O preconceito contra homossexuais ainda está muito espalhado.
Apesar de se ter assistido desde finais dos anos sessenta a uma progressiva
liberalização das atitudes em relação à homossexualidade, a actual epidemia do
srDA tem provocado desde meados dos anos oitenta uma vaga de histeria
contra homossexuais (Herek e Glunt, 1988).

519
© Universidade Aberta
Os cientistas SOCIaIS ao observarem que ainda persistem preconceitos e
discriminações contra lésbicas, homossexuais e até bissexuais têm recorrido a
explicações com base numa ideologia cultural particular. O heterossexismo é
um sistema de crenças culturais, de valores e de hábitos que exalta a
heterossexualidade e critica e estigmatiza qualquer forma não heterossexual de
comportamento ou de identidade (Bem, 1993; Herek et aI., 1991). O
heterossexismo é um conceito novo utilizado para explicar o preconceito
contra a homossexualidade. É preferível ao conceito mais espalhado de
homofobia, pelo menos por duas razões: 1) o termo fobia implica que o
preconceito contra a homossexualidade é um medo irracional e uma forma
psicopatológica, o que aliás, só explica uma reduzida percentagem de casos; e
2) focaliza-se mais na própria história pessoal do homofóbico que no contexto
cultural mais vasto em que se desenvolvem sentimentos contra
homossexualidade (Herek, 1994).

Apesar de na nossa cultura se incentivarem atitudes preconceituosas e


comportamentos discriminatórios contra as pessoas que não são
heterossexuais, verifica-se haver diferenças entre as pessoas heterossexuais
quanto ao seu nível de preconceito contra a homossexualidade. Tem-se
encontrado que as pessoas com atitudes extremamente negativas ,em relação a
lésbicas e homossexuais diferem em certos aspectos das que têm atitudes mais
positivas. Ao invés de pessoas com menos preconceitos, as pessoas
heterossexuais que exprimem atitudes contra a homossexualidade tendem a:

1) ser mais do sexo masculino que do feminino (Whitley e Kite, 1995);

2) ser muito religiosas e pertencer a organizações religiosas


conservadoras (Herek, 1984);

3) ter amigos que têm de modo semelhante atitudes negativas (Herek,


1988);

4) ter preconceitos raciais e ser autoritárias (Ficarroto, 1990);

5) ter tido menos contacto pessoal com homossexuais e lésbicas (Herek


e Glunt, 1993).

520
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3.4 Idadismo

Os psicólogos SOCIaIS só recentemente começaram a estudar de modo


sistemático o idadis1110 ( e. g. Fox e Giles, 1993). Nas últimas décadas deste
século tem-se assistido a uma profunda mudança na distribuição etária das
populações no sentido das pessoas idosas assumirem uma maior proporção,
quer nos países desenvolvidos quer nos países em desenvolvimento (United
Nations, 1980). Uma maior proporção de pessoas idosas numa sociedade pode
suscitar vários problemas relacionados com o apoio económico, com a saúde,
bem como com os papéis na família e na sociedade. Poderá acontecer que as
pessoas idosas constituam um peso desproporcionado em relação à força de
trabalho dos mais jovens o que poderá ter como consequência uma competição
pelos recursos entre as necessidades dos idosos e dos jovens.

o modo como os jovens percepcionam os idosos pode variar segundo as


sociedades em virtude de variáveis tais como tradições, estrutura familiar, grau
de contacto íntimo com os idosos e modernização. Estas percepções podem
ter consequências importantes. Antes de mais, na medida em que os jovens
terão de assumir eventualmente a responsabilidade de tratar dos problemas dos
idosos, as percepções que os jovens têm dos idosos desempenharão um papel
importante no modo da sociedade tratar os problemas. Para além disso, tendo
em conta que os jovens tornar-se-ão eles próprios idosos, as suas percepções
do envelhecimento podem influenciar dinamicamente o seu desenvolvimento
pessoal durante a idade adulta.

As percepções das pessoas idosas constituem uma rede de traços de


personalidade, de características físicas e de papéis. Ao nível dos papéis
encontrou-se em jovens portugueses uma atitude sobretudo positiva em
relação às pessoas idosas (Neto, Raveau, e Chiche, 1989). E ao nível das
características psicológicas? Um projecto intercultural englobando 19 países
centrou-se nos traços de personalidade ou características psicológicas que
estão diferencialmente associadas às pessoas jovens e idosas (Neto, 1992a). Os
resultados deste projecto intercultural mostram que nos diferentes países
surgem simultanemante semelhanças substanciais e diferenças interessantes nos
estereótipos das pessoas idosas. Os resultados sugerem todavia que em todos
os países há uma tendência para as pessoas idosas serem vistas de modo mais
favorável que as pessoas jovens; uma tendência para as pessoas jovens serem
vistas mais como fortes que as idosas; e uma clara tendência para os jovens
serem vistos como sendo mais activos que os idosos.

521
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Após estas considerações sobre algumas das formas de preconceito e de
discriminação talvez esteja a pensar se haverá alguém que possa não ser vítima
de preconceito. Efectivamente a evidência não é muito encorajadora. Para
além das categorias sociais evocadas, as vítimas de preconceito e
discriminação também podem ser as pessoas gordas (McEvoy, 1991), as
pessoas baixas (Jackson e Ervin, 1992) e as pessos deficientes (Anderson,
1988-1989). Na Irlanda do Norte, na antiga Jugoslávia e noutras paragens, os
preconceitos religiosos levam as pessoas a cometer assassínios. Vítimas de
preconceitos podem ser pessoas de várias raças, grupos étnicos, mulheres,
homossexuais e lésbicas, pessoas idosas, e virtualmente qualquer outra
categoria susceptível de ser identificada. Parece que utilizamos todos os
modos possíveis para dividir as pessoas em categorias sociais e usamos essas
categorias como uma base para preconceito e discriminação.

As pessoas idosas podem continuar a ser activas e a contribuir para a qualidade de


vida de si próprias e das outras pessoas.

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4. A face mutante do preconceito

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Muita coisa mudou desde os primeiros estudos sócio-psicológicos sobre o
preconceito nos anos trinta. Hitler subiu ao poder e perdeu-o, o anti-semitismo
foi desacreditado perante o holocausto nazi. Os movimentos das mulheres e o
activismo em prol de pessoas afectadas pelo SIDA, bem como de outros
grupos minoritários em situação desvantajosa têm-se feito ouvir de diversos
modos. Tem efectivamente havido mudanças na legislação e nos domínios
educativo e social. Tais mudanças na sociedade ocidental significam todavia
que ela é menos preconceituosa? Estarão racismo, sexismo e outras formas de
discriminação em declínio? Certos investigadores respondem "sim" (Fosu,
1992; Ransford e Palusi, 1992) e outros respondem "não" (Hurtado, 1992,
Lang, 1992). Se há, sem sombra de dúvida, sinais positivos, há também sinais
de que preconceito e discriminação podem ter mudado, tal corno um vú'us que
desenvolve urna estirpe mais resistente.

A face do racismo mudou. O racismo aberto está em declínio, mas novas


formas de racismo continuam a surgir e, porventura, a aumentar. Deve-se fazer
uma distinção entre formas de racismo mais antigas e mais novas. O racismo
mais usual e mais susceptível de ser apresentado nos meios de comunicação de
massa é a forma mais antiga conhecida como "racismo antiquado" (Greely e
Sheastley, 1971). Esta forma de racismo transparece nos indivíduos que
passam ao acto crenças intolerantes, os que representam a chama viva do ódio
racial (Gaertner e Dovidio, 1986).

A expressão aberta do racismo declinou, pelo menos nos Estados Unidos, nos
últimos anos (Katz e Taylor, 1988), devido em parte ao estigma social ligado
ao racismo e ao aumento de tomada de consciência em certos sectores da
população. No Documento 6.3 apontam-se diferentes perspectivas do racismo
moderno.

Encontram-se diferentes perspectivas sobre o racismo moderno, se bem que tenham


elementos comuns. Apontam que o racismo já não é aceite de modo aberto na sociedade e
que a maior parte das pessoas tentam combatê-lo. Para além disso, referem que os membros
do grupo maioritário experienciam apesar de tudo sentimentos negativos em relação a
grupos minoritários da sua sociedade.

Segundo o racismo simbólico, aplicado às relações interétnicas nos Estados Unidos, os


brancos dissimulariam muito simplesmente o seu racismo e manifestá-lo-iam de modo mais
subtil que outrora (McConahay, 1986). Pode-se evidenciar o racismo simbólico em

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diferentes formas de resistência perante as preocupações da minoria negra, como, por
exemplo, no voto sistemático contra os candidatos negros nas eleições. Este racismo
exprimir-se-ia em situações em que o comportamento não pudesse ser directamente rotulado
de racista.

Segundo a teoria da ambivalência-amplificação os brancos têm sentimentos efectivamente


positivos em relação aos negros, mas estes sentimentos estão também misturados com
sentimentos negativos (Katz, Wackenhut e Hass, 1986). Tendo em conta as circunstâncias,
os sentimentos positivos ou negativos vêm à tona e amplificam-se.

Segundo o racismo regressivo os brancos partilham hoje em dia uma norma mais
igualitária que está em contradição com os antigos modos de se comportar com os negros
(Rogers e Prentice-Dunn, 1981). Esta norma guia os comportamentos na maior parte das
situações. Todavia em situações de stress os membros da maioria têm tendência a regressar a
antigos modos de se comportar, ou seja, a voltar a comportamentos discriminatórios em
relação a grupos minoritários.

Segundo o racismo aversivo as pessoas brancas escondem o seu racismo a elas próprias, em
especial às pessoas liberais e com boas intenções (Gaertner e Dovidio, 1986). De um modo
geral o seu comportamento conforma-se com a norma que proíbe a discriminação. Contudo
os verdadeiros sentimentos só se exprimem quando o seu comportamento discriminatório
pode ser imputado a motivos que nada têm a ver com o racismo. Por exemplo, pode-se
justificar a recusa em dar emprego a negros invocando a sua falta de experiência, ao passo
que na realidade os negros nunea tiveram oportunidades de adquirir esta experiência pelo
facto de se terem sempre preferido candidatos brancos.

Estas diferentes perspectivas do racismo moderno levantam diversas questões sobre o modo
de lutar contra os preconceitos e a discriminação. Perante um desfilar de conflitos
interétnicos a que se vem assistindo ultimamente na América do Norte e na Europa, e em
virtude das manifestações abertas de discriminação estarem interditas pela lei, interrogamo-
nos se não se está perante o desenvolvimento de racismo latente.

Não é difícil imaginar como estas ideias do racismo moderno se podem também aplicar ao
sexismo. Homens "liberais" podem revelar a sua discriminação contra mulheres em situações
em que o seu sexismo podia ser atribuído a outras causas, como por exemplo, à biologia das
mulheres. Um homem "liberal" podia dizer: "Acredito que uma mulher podia fazer este
trabalho tão bem como um homem, mas que aconteceria se tivesse de parar para ter um
filho?" Homens "conservadores" podiam revelar o seu sexismo se pudessem atribui-lo à
defesa de valores conservadores, como por exemplo, à família. Um homem "conservador"

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podia dizer: "As mulheres são tão capazes como os homens, mas as famílias sofrem quando
as mulheres trabalham fora de casa."

Documento 6.3 - O racismo moderno

o racismo moderno enfatiza que os aspectos afectivos das atitudes raciais são
geralmente adquiridos na infância e são mais difíceis de mudar que os aspectos
cognitivos. Por isso muitas pessoas que abandonaram crenças e atitudes
racistas antiquadas, apesar disso mantêm sentimentos negativos em relação aos
negros (Gaertner e Dovidio, 1986). O resultado destas tendências
contraditórias é que em muitas pessoas os seus sentimentos raciais negativos
influenciam novas questões. Acontece que, geralmente, as pessoas brancas não
têm a percepção que as suas atitudes nestas novas questões são racistas e
tendem a justificar as suas posições de modo não racista. Exemplos de tais
questões novas incluem crenças sobre se ainda continua a haver discriminação
racial nos Estados Unidos, atitudes em relação ao transporte de crianças para a
escola e apoio a vários programas governamentais para ajudar os pobres.

A questão que se pode levantar é a seguinte: se as pessoas não admitem o


preconceito, como é que os investigadores o podem detectar? São várias as
metodologias que têm sido utilizadas para tal (Crosby et aI., 1980). Recorreu-
se, por exemplo, à bogus pipeline, uma máquina a que as pessoas são ligadas
por eléctrodos que supostamente regista os verdadeiros sentimentos. Dado
que as pessoas não querem ser apanhadas a mentir, este método suscitaria
respostas honestas a questões sensíveis. Assim, estudantes universitários
brancos avaliavam os negros de modo mais negativo, em termos
estereotipados, quando se recorria à bogus pipeline do que quando não se
recorria (Jones e Sigall, 1971).

O moderno racismo pode também ser detectado sem que se façam perguntas
directas. O tempo de reacção - a velocidade com que se responde a uma
questão - pode ser utilizado para evidenciar preconceitos escondidos. Por
exemplo, num estudo sujeitos brancos liam pares de palavras e carregavam
num botão sempre que pensavam que as palavras se ajustavam conjuntamente
(Dovidio, Evans, e Tyler, 1986). Em cada caso, as palavras negros ou brancos
eram emparelhadas quer com um traço positivo (limpo, ambicioso, etc) quer

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o racismo aberto parece estar em declínio, de modo que actos abertamente
racistas são relativamente raros. Todavia novas formas subtis de racismo
continuam a surgir e, proventura, a aumentar.

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grande parte a factores históricos, encontram-se hoje em dia poucas
mulheres camionistas.

Alvo

de

preconceito

~ Abordagens
cognitivas
~
.: Abordagens .
psico­
dinâmicas
. .
: Abordagens :
. sócio­ :
culturais
Abordagens:

históricas :

Figura 6.1- Níveis de análise no estudo do preconceito

Algumas teorias do preconceito têm salientado factores económicos. Por


exemplo, Karl Marx avançou uma teoria em que a classe dominante
propaga preconceitos para justificar a exploração da classe trabalhadora.
Lembre-se a opinião de Cox (1948), segundo a qual o preconceito de raça
é apenas uma atitude social perpetada para manter e justificar a posição
superior e vantajosa da classe alta em relação à classe inferior. Segundo
esta interpretação o preconceito de raça seria uma "máscara" para
intenções de exploração.

Se as abordagens históricas são utéis para se compreender o preconceito e


a discriminação, os psicólogos sociais, contudo, salientam mais explicações
que não são tão amplas.

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5. Génese do preconceito e da discriminação

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Os preconceitos encontram-se difundidos por todas as sociedades. Cada
um de nós certamente já teve um preconceito e foi igualmente sua vítima.
Dados os problemas sociais gerados por preconceitos, pode-se levantar a
questão de se saber as suas origens. De onde provêm os preconceitos
contra migrantes e outros grupos minoritários? Que é que desencadeia a
discriminação? Porque é que temos tendência a percepcionar mais
positivamente os membros do nosso próprio grupo que os dos outros
grupos? Quais os factores que determinam a evolução das relações
intergrupais para relações conflituosas? A compreensão da génese do
preconceito e da discriminação é necessária para se poderem utilizar
técnicas que permitam erradicá-los.

Estando-se perante um problema tão difundido e complexo como é o


preconceito e a discriminação, torna-se necessário tomar em conta
explicações que se situem a diferentes níveis de especificidade.
Efectivamente, o preconceito pode ser analisado a muitos níveis. Gordon
Allport (1954) formulou seis níveis de análise que começam com as causas
sociais amplas do preconceito e progridem para causas individuais mais
específicas. A Figura 6.1 ilustra estes níveis.

5. 1 Abordagens históricas

O historiador chama a nossa atenção para o facto de que a génese dos


preconceitos não pode ser plenamente compreendida senão se analisar o
contexto histórico dos conflitos. Allport chama a nossa atenção para o
facto de que o preconceito contra os negros nos Estados Unidos tem
raízes, por exemplo, na escravatura e no fracasso da reconstrução do sul
dos Estados Unidos depois da Guerra Civil. Do mesmo modo raízes
históricas importantes puderam levar ao apartheid na África do Sul, ao
sectarismo religioso na Irlanda do Norte, ao conflito da Bósnia na antiga
Jugoslávia, e a muitos outros casos em que recém-chegados suprimem
populações autóctones.

O preconceito contra as mulheres também pode ser compreendido pela


abordagem histórica. Determinadas profissões têm sido historicamente
encaradas como sendo mais apropriadas para os homens do que para as
mulheres. Por exemplo, camionista é uma profissão considerada
tipicamente masculina talvez como resultado de quando era necessário
muito esforço físico para conduzir. Determinadas inovações tecnológicas
que foram introduzidas podem já não justificar os princípios evocados
outrora para que as mulheres não sejam camionistas. Todavia, devido em

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grande parte a factores históricos, encontram-se hoje em dia poucas
mulheres camionistas.

Alvo

de

preconceito

~ Abordagens
cognitivas
~
.: Abordagens .
psico­
dinâmicas
. .
: Abordagens :
. sócio­ :
culturais
Abordagens:

históricas :

Figura 6.1- Níveis de análise no estudo do preconceito

Algumas teorias do preconceito têm salientado factores económicos. Por


exemplo, Karl Marx avançou uma teoria em que a classe dominante
propaga preconceitos para justificar a exploração da classe trabalhadora.
Lembre-se a opinião de Cox (1948), segundo a qual o preconceito de raça
é apenas uma atitude social perpetada para manter e justificar a posição
superior e vantajosa da classe alta em relação à classe inferior. Segundo
esta interpretação o preconceito de raça seria uma "máscara" para
intenções de exploração.

Se as abordagens históricas são utéis para se compreender o preconceito e


a discriminação, os psicólogos sociais, contudo, salientam mais explicações
que não são tão amplas.

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5.2 Abordagens sócio-culturais

Quer as abordagens históricas quer as sócio-culturais focalizam-se em


factores e forças sociais que levam ao preconceito. Sociólogos e
antropólogos têm posto em evidência o impacto de Jactores sóóo­
culturais no preconceito e na discriminação. Entre esses factores a
abordagem sócio-cultural tem examinado, por exemplo, o aumento da
urbanização, o aumento da densidade populacional, a mobilidade de certos
grupos, a competição para empregos entre membros de diversos grupos,
mudanças no papel e função da família.

Consideremos o caso específico do aumento da urbanização. As cidades


são meios que estão longe de constituir um local ideal para viver em
muitos aspectos. As relações impessoais das grandes cidades colocam os
seus habitantes em posições de incerteza e insegurança. O ruído, o
desemprego e a violência contribuem para essas tensões psicológicas. As
pessoas podem responsabilizar a presença de um determinado grupo
minoritário pelas dificuldades da vida urbana. Esse grupo é visto como
simbolizando os problemas da urbanização (Simpson e Yinger, 1985).
Watson (1947) verificou que muitas pessoas que estudara se tinham
tornado mais anti-semitas após se haverem deslocado para a cidade de
New York. Características supostamente urbanas como desonestidade,
fraude, vulgaridade eram há várias décadas projectadas no estereótipo do
judeu. O sociólogo Arnold Rose (1948) era de opinião que os judeus eram
odiados sobretudo porque eram o símbolo da vida citadina. Hoje em dia
em certas cidades europeias grupos de imigrantes são culpabilizados pela
propagação de doenças.

5.3 Abordagens situacionais

As abordagens da situação examinam os factores do meio imediato da


pessoa que causam o preconceito. Segundo· as teorias que põem em
evidência a situação, o facto de se conformar aos outros tem uma forte
influência no preconceito. Mediante o conformismo com as opiniões das
pessoas do nosso meio obtemos aprovação social.

Sabe-se que o preconceito nas crianças se forma através dos processos de


reforço directo e de modelagem em contacto com os pais, outros adultos e
colegas (veja-se o capítulo sobre atitudes). Tais atitudes preconceituosas
são aprendidas relativamente cedo. Por exemplo, Katz (1976) verificou
que pelos 3 ou 4 anos as crianças são capazes de fazer a distinção entre

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negros e brancos e manifestam sentimentos diferenciais sobre brancos e
negros.

Mudanças ao longo do tempo que ocorrem nos estereótipos são muitas


vezes o reflexo de factores situacionais. É ilustrativo deste aspecto um
estudo sobre os chineses na Califórnia no século passado efectuado a partir
da análise de documentos. As primeiras expressões encontradas nos jornais
eram de elogio: só se falava da seriedade dos chineses, da sua docilidade,
do gosto pelo trabalho e pela poupança, em suma, eram os melhores
imigrantes na Califórnia. Todavia desde 1867, por ocasião de uma
campanha eleitoral, só já se falava de barrar o caminho aos Mongois, sujos,
fechados, que vivem em condições inaceitáveis e desenvolvem actividades
misteriosas em sociedades secretas. Tinham-se entretanto tornado
indesejáveis quer como trabalhadores quer como residentes no país. Está-
se perante uma mudança total das características atribuídas a um grupo,
sem que a natureza da população tenha efectivamente mudado. KJineberg
(1963, p. 596) observa a este respeito: "Tinha-se produzido uma mudança
nas condições sócio-económicas na Califórnia, mudança que tornava
vantajosa para os brancos a eliminação dos Chineses enquanto factor
competitivo, e a atitude a seu respeito era o efeito desta situação."

Para se compreender o preconceito há autores que também se têm


debruçado sobre características demográficas, baseados na ideia de que há
normas específicas que se desenvolvem em certos grupos de pessoas. Por
exemplo, nos Estados Unidos há três características que têm aparecido
ligadas a atitudes preconceituosas contra negros: região geográfica, nível
de instrução e idade. Em geral as pessoas do sul são mais preconceituosas
contra os negros que as do norte; as pessoas com menos instrução
mostram mais preconceitos; as pessoas mais velhas têm mais preconceitos
que as mais novas (Maykovitch, 1975). Todavia quando estas três
variáveis se consideram simultaneamente as suas relações são complexas.

5.4 Abordagens psicodinâmicas

Contrariamente às abordagens situacionais, as abordagens psicodinâmicas


acentuam que o preconceito resulta dos próprios conflitos e desadaptações
da pessoa. Trata-se de teorias fundamentalmente psicológicas, que
contrastam com as abordagens históricas e sócio-culturais previamente
assinaladas. Segundo estas teorias, para se modificar o preconceito e a
discriminação devemos focalizar-nos na pessoa com preconceitos.

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solicitava-se novamente as suas atitudes em relação a grupos minoritários.
Em comparação com o grupo de controlo, os sujeitos frustrados revelaram
um aumento de preconceito.

Ao avaliarem as teorias de frustração, Feshbach e Singer (1957)


distinguem ameaças partilhadas de ameaças pessoais. Uma ameaça
partilhada, como a possibilidade de haver um ciclone tem como efeito
juntar as pessoas. Esse tipo de ameaça verificou-se que contribuía para
reduzir o preconceito contra negros. Já uma ameaça pessoal, como a perca
de um emprego, tem um efeito de escalada no preconceito, tal como a
teoria da frustração prediria.

5.4.2 Diferenças de personalidade

Uma segunda perspectiva de estudo das abordagens psicodinâmicas


acentuou diferenças básicas de personalidade entre pessoas
preconceituosas e com menos preconceitos. O mais conhecido desses
estudos foi o da Personalidade Autoritária (Adorno, Frenkel-Brunswick,
Levinson, e Sanford, 1950). O objectivo geral do estudo foi examinar
diferentes configurações de atitudes, para se ver, em particular, se as
pessoas com preconceitos contra grupos minoritários específicos tinham
igualmente outras espécies de ideias, e para além disso, tinham
determinados traços de personalidade.

Adorno e os seus colaboradores começaram por construir um questionário


para medir as atitudes em relação aos judeus: a Escala Anti-Semitismo. De
uma escala que avaliava um tipo particular de preconceito, os autores
passaram à construção de um questionário que media o preconceito em
geral, conhecido sob o nome de etnocentrismo. O anti-semitismo não é
então mais do que uma manifestação de etnocentrismo. Fez-se a suposição
de que a pessoa etnocêntrica tem preconceitos contra todos os que são
estrangeiros ou diferentes dele. A investigação com estes dois
questionários levou a que Adorno e os seus colaboradores pensassem que
havia uma ligação entre ideologia política e personalidade. Foi assim criado
o terceiro questionário, a Escala F ("F" como fascista), para medir as
tendências anti-democráticas dos sujeitos (autoritarismo). A teoria
freudiana forneceu um grande suporte teórico para a construção deste
questionário. A escala F comporta nove componentes: convencionalismo,
submissão autoritária, agressão autoritária, anti-intracepção, superstição e
estereotipia, poder e dureza, destrutividade e cinismo, projecção, atitudes
sexuais puritanas (quadro 6.2). A escala foi construída de modo a que

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© Universidade Aberta
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individuais; tende a projectar sobre os outros as tendências que não aceita
para ele; está muito preocupado pela pureza da sua consciência; mostra
uma intolerância rígida em relação aos outros; admira o poder e faz prova
de uma dominação excessiva sobre os fracos e de uma submissão
exagerada aos fortes.

A investigação de Adorno mostrou que os SUjeItos que têm fortes


preconceitos contra os judeus têm também fortes preconceitos contra os
negros e outros grupos minoritários, e ao mesmo tempo estão convencidos
da superioridade do seu grupo nacional, do seu sistema colectivo de
valores, dos seus costumes. São, enfim, sujeitos nitidamente conservadores
em matéria económica e política.

Subsequentemente aos trabalhos de Adorno et a!., a procura das


características que descrevem a personalidade autoritária constituíram uma
área de investigação muito fecunda. Centenas de estudos têm sido
efectuados e permitiram traçar um quadro da personalidade autoritária. Por
exemplo, em relação ao preconceito, pois é o tópico que agora nos
interessa, repetidamente se tem verificado que as pessoas com notas altas
de autoritarismo têm mais preconceitos para com os grupos minoritários:
preconceitos dos brancos contra os negros (Martin e Westie, 1959),
preconceitos dos árabes contra os judeus (Epstein, 1966), ou preconceitos
dos israelitas contra os árabes (Siegman, 1961).

Apesar disso, a Personalidade Autoritária tem sido alvo de vigorosas e


variadas críticas quer a nível metodológico quer teórico. Uma das críticas
metodológicas não só da escala F, mas também da escala de anti-semitismo
ou de etnocentrismo foi de que todas as questões estão formuladas na
mesma direcção. O acordo com um item nesses questionários é tomado
como indicativo de autoritarismo, de anti-semitismo ou de etnocentrismo.
Há assim o perigo de se encorajar um conjunto de respostas
"condescendentes", isto é, a tendência que muitas pessoas manifestem
concordância qualquer que seja a coisa que se diz. Daí que não se possa
estar seguro que as pessoas com uma nota mais elevada na escala F estejam
fortemente imbuídas de autoritarismo, pois pode-se estar perante uma
manifestação de condescendência. Se as pessoas exprimem o acordo só
pelo gosto de estar de acordo, as correlações entre as diferentes escalas são
artificialmente aumentadas. Uma outra crítica metodológica centrou-se
também na artificialidade das correlações elevadas encontradas entre as
escalas de anti-semitismo, de etnocentrismo e a escala F. As escalas de
atitudes estavam mal construídas uma vez que só se tinham utilizado na
escala fascismo e na de etnocentrismo questões que correlacionavam com a
escala de anti-semitismo. Tal implicaria a possibilidade teórica de construir

540
© Universidade Aberta
escalas de etnocentrismo e de fascismo com as questões que não foram
retidas, e encontrar-se-iam correlações diferentes das que foram
encontradas por Adorno e colaboradores com essas novas escalas.

Se a crítica metodológica acentuava sobrestimação da relação entre


autoritarismo e preconceitos, a crítica teórica efectuada por Rokeach
(1960) chamou a atenção para a subestimação do autoritarismo. Para esse
autor não se estudara mais do que uma das formas de autoritarismo, a que
se encontra nos partidários do conservadorismo político de extrema direita.
Rokeach defendeu que o autoritarismo pode estar associado não só à
extrema direita como à extrema esquerda. A característica importante das
pessoas autoritárias quer da direita quer da esquerda é que têm "mentes
fechadas", isto é, estilos rígidos de pensamento através de clichés. Rokeach
construiu uma escala de dogmatismo para medir não só o autoritarismo da
direita, como o da esquerda, em suma, o autoritarismo em si. Os seus
resultados confirmaram a hipótese de que o dogmatismo se encontra em
ambos os extremos políticos, pois encontrou que conservadores britânicos
e comunistas obtinham scores mais elevados que outros grupos políticos.
Contudo, esta investigação também não deixa de suscitar problemas, como,
por exemplo, todos os 40 itens da escala de dogmatismo estavam redigidos
na mesma direcção, o acordo sendo indicativo de dogmatismo. No
Documento 6.4 ilustra-se se o autoritarismo é o mesmo na Rússia e nos
Estados Unidos.

Como se observou, uma das críticas da investigação sobre a personalidade autoritária foi
de que se tinha focalizado demasiado no autoritarismo da extrema direita. Nas
democracias ocidentais, a investigação mostra uma tendência para o autoritarismo estar
mais associado com a política da extrema direita que da extrema esquerda (Altemeyer,
1988).

Se bem que o conceito de autoritarismo se tenha desenvolvido para dar conta das
tendências "fascistas" nas pessoas, as características fulcrais das pessoas autoritárias -
convencionalismo, submissão à autoridade, agressão em relação aos exogrupos - não são
directamente definidas por atitudes políticas. Por isso as atitudes políticas específicas que
têm as pessoas autoritárias podem variar de país para país. Houve um estudo que
demonstrou precisamente este assunto quando se compararam a atitudes autoritárias nos
russos e nos americanos (McFarland, Ageyev, e Abalakina, 1992). Os russos altamente
autoritários tendiam a opor-se ao individualismo "laissez faire" mas apoiavam a
igualdade, ao passo que os autoritários americanos apresentaram precisamente o padrão
oposto.

© Universidade Aberta 541


A explicação mais provável é que quer os autoritários russos quer os americanos
mostraram as suas características fulcrais de convencionalismo e de submissão à
autoridade. Na Rússia tal significa (pelo menos até recentemente) a adesão a doutrinas
do Partido Comunista (igualdade), ao passo que nos Estados Unidos significa a adesão
ao capitalismo com mercado livre. Apesar destas diferenças entre autoritários russos e
americanos, há um aspecto em que são muito semelhantes: ambos tendem a ser
nacionalistas e preconceituosos contra exogrupos e outras minorias nos respectivos
países.

Documento 6.4 - O autoritarismo é o mesmo na Rússia e nos Estados Unidos?

Outro problema teórico foi levantado por Hyman e Sheatsley (1954).


Segundo eles não é necessário recorrer a um tipo de personalidade para
explicar o etnocentrismo a partir do momento em que o nível de instrução e
o estatuto sócio-económico oferecem uma explicação mais plausível.
Hyman e Sheatsley verificaram que a personalidade autoritária é mais
susceptível de existir entre as pessoas com menor nível de instrução e com
estatuto sócio-económico mais baixo.

Uma outra crítica refere que não se podem sobrestimar os factores de


personalidade em detrimento de factores sociais. Pettigrew (1959) mostrou
que a noção de personalidade autoritária não era uma explicação suficiente
para o comportamento preconceituoso através de estudos efectuados em
três regiões: sul dos Estados Unidos, norte dos Estados Unidos e África do
Sul. Se no norte dos Estados Unidos se encontraram menos preconceitos
contra os negros que no sul, como se esperava, os resultados da escala F e
a medida do anti-semitismo eram quase os mesmos nas duas populações.
Por conseguinte, os preconceitos mais acentuados no sul não se explicavam
em função de uma maior proporção de personalidades autoritárias.
Resultados obtidos na África do Sul vão no mesmo sentido. A importância
do contexto cultural para que Pettigrew nos chama a atenção nos anos 50
pode ser confirmada mais recentemente no estudo do fenómeno migratório
(Bagley e Verma, 1979; Schonbach (1981).

Em suma, parece claro que podem existir pessoas com preconceitos a quem
não se lhes aplica a abordagem psicodinâmica. Esta não explica cabalmente
os casos em que preconceito e discriminação se imbricam na estrutura
social.

542 © Universidade Aberta


5.5 Abordagens cognitivas

Uma outra perspectiva sugere que os preconceitos resultam de processos


cognitivos. Segundo estas abordagens, aspectos de como processamos
informação podem estar na origem de preconceitos. As abordagens
cognitivas não se preocupam tanto com a realidade objectiva da situação
como com a compreensão subjectiva das pessoas com preconceitos. Quatro
espécies de informação podem ser utilizadas para desenvolver o
preconceito: categorização social, estereótipos, processos atribucionais e
crenças SOCIaIS

5.5.1 Categorização social

Uma perspectiva aborda as origens do preconceito e da discriminação


apoiando-se no facto básico de que muitas vezes os indivíduos dividem o
mundo em duas categorias distintas: "nós" e "eles". As outras pessoas são
vistas quer como pertencendo ao seu próprio grupo (endogrupo) ou a
alguma outra categoria (exogrupo). Os indivíduos são geralmente bastante
peritos em efectuarem esta distinção. Assim, na Irlanda do Norte que tem
uma população fisicamente homogénea, católicos e protestantes são
capazes de determinar com sucesso se uma pessoa estranha pertence ao seu
próprio grupo ou ao outro, com base em informações subtis como o nome,
lugar de residência, e escola (Stringer e Cook, 1985).

Caso o processo de categorização social ficasse por aí, não suscitaria o


preconceito. Mas infelizmente não é o caso. O mero facto de categorizar as
pessoas em dois grupos, um a que se pertence (endogrupo) e o outro a que
não se pertence (exogrupo) tem influência sobre o comportamento e a
percepção do indivíduo. Tajfel (1970) mostrou que só a pertença a um
grupo, na ausência de competição real, era uma condição suficiente para a
discriminação intergrupal, como se pode observar no Documento 6.5.

Henri Tajfel propôs que as pessoas mostram uma tendência a distinguir entre "nós" e
"eles" com base em distinções triviais. Para além disso, com base nestas diferenças
tendemos a tratar membros do endogrupo de modo favorável e membros do exogrupo de
modo desfavorável.

Tajfel (1970) recorreu a adolescentes que expressavam individualmente as suas


preferências acerca de pinturas efcctuadas pelos artistas modernos Paul Klee e Wassily

543
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Kandinsky. Era-lhes então dito que seriam colocados num grupo com outros rapazes que
partillhavam as suas preferências (o grupo Klee ou o grupo Kandinsky). Em seguida,
antes de encontrar os outros rapazes dava-se-Ihes a oportunidade de dividir algumas
recompensas monetárias entre o seu grupo e o outro grupo. Mesmo nesta situação, o dito
"paradigma do grupo mínimo" (dado que a preferência partilhada é ou seria sem
consequências e o grupo nunca foi encontrado), os sujeitos dividiam os recursos de modo
desigual: favoreciam o seu grupo à custa do outro.

Este resultado tem sido replicado ainda com categorizações grupais mais triviais (Brewer
e Silver, 1978). Por exemplo, o mesmo viés de favorecimento do endogrupo ocorreu se os
sujeitos eram divididos em grupos de "sobreavaliadores" do número de pontos num
diapositivo ou de "subavaliadores", ou até se os grupos eram formados arbitrariamente
com base no lançamento de uma moeda perante o sujeito.

Resultados do paradigma do grupo mínimo sugerem que nalguns contextos o preconceito


pode resultar da nossa tendência a percepcionar os outros como pertencendo ao nosso
próprio grupo ou a algum outro grupo.

Documento 6.5 - Tajfel e o paradigma do grupo minimo: Preconceito no


lançamento de uma moeda

A categorização social, para além de produzir o favoritismo do endogrupo,


afecta as nossas percepções e memória. Park e Rothbart (1982)
encontraram que os membros do endogrupo tendiam a ver os membros do
exogrupo como sendo mais homogéneos e menos diferenciados que os
membros do seu próprio grupo.

Mas quais serão as forças que levarão a categorização social a ter como
resultado o favoritismo do endogrupo e viés negativos do exogrupo?
Turner (1981) avançou duas explicações para isso: a categorização social
faz com que os indivíduos a) percepcionem maiores semelhanças dentro do
seu próprio grupo e maiores diferenças entre o endogrupo e o exogrupo do
que existem; b) e se avaliem e comparem em relação ao seu próprio grupo
para procurar uma identidade social positiva.

o poderoso efeito da categorização sobre as percepções da semelhança e


da diferença pode ser demonstrado por Tajfel e Wilkes (1963) solicitando
aos sujeitos para fazerem julgamentos acerca do comprimento de um
número de linhas. Foram apresentadas oito linhas de comprimento diferente
a três grupos de sujeitos. No grupo 1 deu-se a cada uma das quatro linhas

544
© Universidade Aberta
mais curtas a etiqueta (A) e a cada uma das quatro linhas mais longas a
etiqueta (B). No grupo 2 mostravam-se as oito linhas sem que elas fossem
categorizadas. No grupo 3 apresentavam-se as oito linhas com a etiqueta A
e B mas aleatoriamente, não estando associadas ao comprimento. Os
grupos 2 e 3 eram grupos de controlo para comparar os efeitos da
categorização (grupo 1). Encontrou-se que a linha mais longa na categoria
das linhas mais curtas (A) era percepcionada como sendo muito mais curta
do que era e muito mais curta que a avaliada pelos grupos de controlo. Ao
invés, a linha mais curta na categoria das linhas mais compridas (B) era
percepcionada como sendo mais comprida pelo grupo 1 do que era. A
existência de uma categorização (o facto de dividir as linhas em duas
categorias A e B) tinha influenciado a percepção das linhas pelos sujeitos.

Este resultado pode ser aplicado a estímulos sociais (Ross, Greene, e


House, 1977). Verificou-se que as pessoas percepcionam um maior grau de
semelhança entre eles e os outros que pensam acreditar em coisas
semelhantes ou agiriam de modo semelhante a eles. Do mesmo modo,
encontraram-se maiores diferenças do que as existentes quando as pessoas
acreditam em coisas diferentes ou agem de modo diferente deles. Numa
palavra, a categorizacão social acentua diferenças entre grupos e
semelhanças dentro de grupos.

Para certos autores, os viés do endogrupo estão ao serviço de uma função


hedónica, isto é, apoiam indirectamente a auto-estima do indivíduo criando
uma identidade social positiva. Tajfel e Tumer (1979) referem que as
pessoas retiram aspectos da sua auto-imagem de categorias sociais com que
se identificam. Então, para manterem uma auto-imagem positiva, as
pessoas avaliarão os seus próprios grupos de modo mais favorável que os
grupos dos outros. Este processo de competição social é distinto de
competição real que resulta de interesses objectivamente em conflito.

Esta teoria pode ser confirmada em várias experiências. Por exemplo,


Meindl e Lemer (1985) partiram da ideia de que uma experiência de
fracasso intensificaria a necessidade dos indivíduos para aumentar a sua
auto-estima e por isso levaria a uma categorização social mais forte. Foi
previsto em particular que as pessoas que tinham experienciado fracasso
avaliariam membros de um exogrupo de modo mais extremo. Esta hipótese
foi testada expondo ou não canadianos anglófonos a condições que
ameaçavam a sua auto-estima. Pediu-se-Ihes então para expressarem a sua
opinião em relação a canadianos francófonos. Os resultados confirmaram a
hipótese de que os sujeitos que tinham sofrido uma experiência de
diminuição da auto-estima avaliavam os membros do exogrupo de modo
mais extremo do que os que não tinham passado por esse acontecimento.

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Estes resultados confirmam que a categorização social desempenha um
papel na génese de preconceitos.

Em suma, o paradigma do "grupo mínimo" mostra que a categorização


social é só por si suficiente para suscitar discriminação social. Todavia há
casos em que não ocorre avaliação positiva do endogrupo. Tal é susceptível
de acontecer com grupos que têm um estatuto social muito baixo. Para
esses grupos é difícil avaliar de modo positivo o endogrupo. Por exemplo,
foi defendido que muitas mulheres aceitam estereótipos associados com o
seu baixo estatuto, tais como desprovidas de poder, de competência, serem
vistas como objectos sexuais (Schur, 1983).

5.5.2 O poder dos estereótipos

o termo foi pedido emprestado à indústria tipográfica, sendo geralmente


atribuído ao jornalista americano Walter Lippmann (1922) que descreve os
estereótipos como sendo "imagens na cabeça" que temos acerca de
membros de um grupo. Rudmin (1989) avança no entanto que foi James
Morier o primeiro a utilizar "estereótipo" para descrever o comportamento
humano no seu livro, The Adventures of Hajji Baba (1824).

o estudo dos estereótipos constitui um dos mais antigos interesses dos


psicólogos sociais e um dos que é investigado com maior avidez. O grande
interesse suscitado não tem nada de surpreendente se se tiver presente que
um dos objectivos fundamentais da Psicologia Social é a descoberta do
modo como as pessoas compreendem e reagem às outras no seu meio.
Assim oS estereótipos acerca de grupos sociais constituem um conjunto
importante e usual de expectativas acerca de outros.

Uma revisão recente do principal avanço na conceptualização dos


estereótipos nos últimos vinte anos, evidenciou que tal resultou do
reconhecimento explícito que os estereótipos, à semelhança de qualquer
outro tipo de expectativa, estão armazenados na memória a longo termo
(Stangor e Lange, 1994). A conceptualização dos estereótipos nesta via
como representações mentais constitui um avanço na Psicologia Social.

Os estereótipos são um conjunto de crenças que se associam a grupos


sociais. Estas crenças geralmente são simples, muitas vezes generalizadas
de modo excessivo e frequentemente erradas. Contudo, certos especialistas
do assunto (e. g., Brigham, 1973) sublinham que oS estereótipos não são
necessariamente incorrectos, ilógicos, ou rígidos e que não são de modo

546
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inerente diferentes de outras generalizações. Por outras palavras, trata-se
de generalizações acerca dos atributos de categorias de pessoas, como por
exemplo, grupos étnicos, sexuais e etários.

Nas primeiras investigações sobre os estereótipos demonstrou-se que


efectivamente os sujeitos possuiam-nos. O método clássico foi introduzido
por Katz e Braly (1933). Perguntaram a 100 estudantes da Universidade de
Princeton para indicarem os traços que descreveriam melhor nove grupos
étnicos. Os sujeitos concordaram, por exemplo, que os negros eram
supersticiosos e preguiçosos, os americanos (muito provavelmente os de
origem anglo-saxónica) eram diligentes e inteligentes, etc. Esta técnica
permite dar-nos uma imagem do conteúdo dos estereótipos e saber em que
medida são partilhados.

Três gerações subsequentes de estudantes de Princeton foram utilizadas


recorrendo à mesma técnica, em 1951, 1967 e ] 982 (Gilbert, 1951; Karlins,
Coffman, e Walters, 1969; Dovidio e Gaertner, 1986). Os resultados
apontam a tendência geral da diminuição do consenso e um aumento nos
estereótipos positivos dos negros. Se este tipo de investigação pode
informar-nos sobre o conteúdo e a popularidade de estereótipos,
investigação mais recente tem procurado saber porque é que os
estereótipos se desenvolvem e mantêm.

Grupo étnico Traço Percentagem

1933 1951 1967 1982

Americanos Deligentes 48 30 23 21

Inteligentes 47 32 20 lO

Materialistas 33 37 67 65

Negros Supersticiosos 84 41 13 6

Preguiçosos 75 31 26 13

Musicais 26 33 47 29

Fonte: Adaptado de Dovidio e Gaertner, 1985; Karlins et al., 1969.

Quadro 6.3 - Estereótipos de Americanos e Negros

547
© Universidade Aberta
Entre as explicações avançadas para o desenvolvimento dos estereótipos
refira-se a homogeneidade do exogrupo, isto é, a tendência para assumir
que há maior semelhança entre membros dentro de exogrupos que dentro
de endogrupos. Quantas vezes ouviu dizer a uma mulher: "Bem, conhece
os homens... São todos iguais e todos querem a mesma coisa!" Do mesmo
modo quantas vezes ouviu homens a descreverem mulheres em termos
semelhantes? Por outras palavras, as pessoas estão geralmente conscientes
de diferenças muitas vezes subtis entre pessoas dentro dos seus próprios
grupos, contudo os membros dos exogrupos, "eles" são todos iguais
(Linville, Salovery, e Fisher, 1986; Quatrone, 1986).

Se é verdade que percepcionamos os exogrupos como sendo mais


homogéneos que os endogrupos, é então fácil explicar porque é que somos
mais susceptíveis de formar estereótipos dos exogrupos. Num estudo do
efeito da homogeneidade do exogrupo, mostrava-se a estudantes da
Universidade de Princeton e de Rutgers um video de outro estudante a
tomar uma decisão. A alguns sujeitos dizia-se-lhes que a pessoa no video
era da sua própria instituição e a outra da instituição contrária. A pessoa no
video tomava uma decisão sobre algo de que os sujeitos não tinham uma
expectativa prévia: tinha de decidir esperar só ou com outros sujeitos
enquanto o experimentador fixava uma peça de um aparelho partido. Pedia-
se aos sujeitos para avaliarem a percentagem de outras pessoas (da mesma
instituição) que fariam a mesma escolha. Os resultados mostraram que os
sujeitos generalizavam mais do comportamento de um membro do
exogrupo para escolhas de outro exogrupo do que do comportamento de
um membro de um endogrupo para escolha de outro endogrupo. Por
exemplo, se os sujeitos de Rutgers 'viam o que eles pensavam ser outro
estudante de Rutgers, escolhiam esperar sozinhos, pensavam que cerca de
55% de outros estudantes de Rutgers fariam a mesma escolha; mas se viam
um estudante de Princeton esperar só, pensavam que cerca de 70% dos
estudantes de Princeton escolheriam esperar sós (Quattrone e Jones, 1980).

Este viés de homogeneidade do exogrupo parece caracterizar as percepções


mútuas de jovens e de idosos (Linville, 1982), de conservadores e de
liberais (Quatrone e Jones, 1980), de negros e de brancos (Linville e Jones,
1980), de homens e de mulheres (Park e Rothbart, 1982).

Tem sido sugerido que em muitos casos os estereótipos surgem e mantêm-


se mediante a operação de correlação ilusória que consiste em
percepcionar uma relação que não existe realmente entre pertença a um
grupo e o facto de possuir certos traços inusitados (Crocker, 1981;
Hamilton e Gifford, 1976; Hamilton, 1981 a; Hamilton e Sherman, 1989).
Uma correlação ilusória é um viés no processamento de informação pelo

548 © Universidade Aberta


que a associação entre características ou acontecimentos é sobreavaliada.
Por exemplo, num estudo de Hamilton e Gifford (1976), os sujeitos liam
breves frases acerca do comportamento de dois grupos, A e B. Havia duas
vezes mais enunciados que descreveriam membros do grupo A que do
grupo B, mas os dois grupos foram associados a nove comportamentos
desejáveis para cada conjunto de quatro comportamentos indesejáveis.
Dado que o grupo B e os actos indesejáveis eram duas vezes menos
frequentes, o facto de aparecerem simultaneamente constituía uma
combinação rara que chamava a atenção. Os sujeitos sobreavaliam pois a
frequência com que o grupo B "minoritário" se comportava de modo
indesejável e julgaram mais severamente o grupo B. Por outras palavras, os
sujeitos neste estudo sobreavaliaram o número de co-ocorrências do
comportamento negativo no grupo B, minoritário. Uma vez que uma
associação foi efectuada, informação subsequente será enviesada na mesma
direcção.

Estes dados são bastante perturbantes. Na vida real, traços muito negativos
(por exemplo, ser desonesto) e actos igualmente muito negativos (tais
como assassinato) tendem a ser raros, e quase por definição, observações
de membros minoritários são mais raras que observações de membros
maioritários. Por isso os mecanismos cognitivos que levam a correlações
ilusórias podem colocar inevitavelmente minorias em desvantagem em
termos de como são retratadas nos nossos estereótipos.

Os meios de comunicação social podem retlectir e alimentar este fenómeno.


Por exemplo, no caso de um imigrante caboverdiano matar alguém, muito
provavelmente menciona-se muitas vezes a sua nacionalidade. No caso de
ser um português que mate alguém, é um acontecimento menos particular,
de modo que muito provavelmente raramente se evocará a sua
nacionalidade. O assassinato é relativamente raro podendo ocupar as
primeiras páginas dos jornais. O recurso ao que é sensacional pode
alimentar a ilusão de uma forte correlação entre a nacionalidade
caboverdiana e as tendências à violência. Ora se se adquirir a crença de que
os caboverdianos são mais agressivos que os portugueses, mesmo não
havendo diferenças entre as duas nacionalidades, esta expectativa
intluenciará os julgamentos subsequentes sobre a agressividade de cada
grupo. Foi sugerido que isto se deve ao facto das desconfrrmações do
estereótipo serem aprendidas mais devagar e/ou esquecidas mais depressa
que informação neutra ou confirmatória (Hamilton e Rose, 1980).

As pessoas investidas de estereótipos podem ser levadas a encontrar


pessoas que não lhe correspondem. Por exemplo, poder-se-ão encontrar
com homossexuais que não são efeminados. Levanta-se então a questão de

549
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se saber como se conservam os estereótipos em relação a estes membros de
exogrupos. Há várias noções provenientes dos trabalhos sobre cognição
social que nos podem ajudar a este propósito (Mackie e Hamilton, 1992).
Os estereótipos são fundamentalmente esquemas e interpretamos e
relembramos a informação que confirma os nossos esquemas (Hamilton e
Trolier, 1986). Da mesma maneira alguém pode lembrar-se de uma
negociação muito dura com um comerciante judeu e esquecer-se da sua
generosa contribuição para uma fundação que se ocupa de doentes de
SIDA. Deste modo é mantida a imagem irracional de que os judeus são
avarentos. Além disso, as investigações sobre o efeito do caso excepcional
demonstram que a informação individual que contradiz um estereótipo nos
leva muito raramente a modificar o estereótipo em questão (Krueger e
Rothbart, 1988). Efectivamente, o estereótipo continua a aplicar-se ao
conjunto do grupo, excepto ao caso particular; este torna-se a excepção
que confirma a regra (Rothbart e Lewis, 1988).

Há investigação que evidencia que as profecias de auto-realização funcionam na


sala de aula. Quando os (as) professores (as) têm altas expectativas pelo (a) aluno
(a), os (as) alunos (as) são susceptíveis de ter melhores resultados, mesmo se as
expectativas não têm fundamento.

Um outro fenómeno que favorece a estabilidade cognitiva dos estereótipos


consiste na profecia de auto-realização. Dado que os comportamentos em

550
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relação a um membro de um exogrupo se alicerçam nos nossos
estereótipos, podem levar esta pessoa a reagir conforme às nossas
expectativas. Por exemplo, numa conversa telefónica caso um homem
acredite que uma mulher é muito atraente, terá tendência a comportar-se
em relação a ela de modo afável. Este comportamento levará a mulher a
sentir-se calma e segura, o que confirma o estereótipo de que as mulheres
atraentes são socialmente competentes (Snyder, Tanke e Berscheid, 1977).

Em suma, segundo esta abordagem cognitiva, uma vez que um estereótipo


se estabelece, muitas vezes com base na avaliação errada da covariação de
características, permanecerá, devido ao processamento enviesado da
informação subsequente. Crer é ver.

5.5.3 Atribuição

Como se viu no capítulo 3, a atribuição é o processo de explicar o


comportamento. Tentativas de explicação de acontecimentos
surpreendentes ou negativos podem ser distorcidos pelo pensamento
estereotipado. Duas consequências importantes são a rotulagem enviesada
e o erro irrevogável da atribuição.

Mesmo no caso do comportamento de membros do exogrupo parecer


semelhante ao do endogrupo, é possível descrever as duas acções de modo
diferente. Por exemplo, se se orgulha de ser muito trabalhador pode
ressentir-se ao pensar que um membro de um grupo antipático também
trabalha muito. Em vez disso, pensa o seu comportamento como sendo
"diligente", ao passo que o da outra pessoa como sendo descuidada. A tal
chama-se rotulagem enviesada. Na sua forma mais usual, o rótulo
enviesado descreve o mesmo comportamento de modo favorável para o
endogrupo, e desfavorável para o exogrupo.

As pessoas com preconceitos têm tendência a manifestarem o erro


irrevogável da atribuição (Pettigrew, 1979) que é uma extensão do erro
fundamental da atribuição. Já se viu no capítulo sobre a atribuição que o
erro fundamental da atribuição salienta as tendências dos observadores em
atribuírem o comportamento das outras pessoas a disposições. Ora o erro
irrevogável da atribuição sugere que quando as pessoas com preconceitos
vêem o alvo de preconceito a executar uma acção negativa, tendem a
atribuí-la a traços estáveis dos membros dos grupos minoritários: "Já
nasceram assim". Todavia quando um membro de um grupo minoritário é
visto a executar uma acção positiva, ela não é atribuída a disposições

55l
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internas. Pettigrew sugere quatro modos para explicar como as pessoas
com preconceitos tratam com o problema de acções positivas de membros
do exogrupo: o caso excepcional, diferenciando-se o actor dos outros
membros dos grupos minoritários; a vantagem especial ou sorte; os factares
situacionais que estão fora do seu controlo; alta motivação para o sucesso e
esforço extraordinário.

As quatro atribuições possíveis que se fazem ao comportamento de um


membro de um grupo minoritário deixam filtrar uma situação não vitoriosa.
Caso a pessoa execute uma acção positiva recorrer-se-á a uma das quatro
causas que são pouco lisonjeiras. O erro irrevogável de atribuição coloca,
pois, a pessoa alvo de preconceito numa situação que não é vitoriosa, não
podendo fazer nada para alterar a percepção do observador.

5.5.4 Crenças sociais

As crenças são uma fonte importante de atitudes preconceituosas. Alguns


preconceitos estão baseados em ideologias religiosas ou políticas. O
preconceito pode também apoiar-se em crenças de que o mundo é um lugar
justo.

A investigação tem posto em evidência uma ligação entre ideologias


políticas conservadoras e algumas formas de preconceito. Também tem
sido evidenciada uma correlação entre certas medidas de religiosidade e
preconceito que pode ser explicado tendo em conta o papel da religião
como regulador social. A ligação religião-preconceito desaparece todavia
quando a religião é encarada em termos de compromisso ético e não tanto
de membro da igreja ou de ortodoxia. É importante insistir-se que
correlação não significa causa, pois pode acontecer que os preconceitos
suscitem determinadas afiliações políticas e religiosas e não tanto que
ideologias levem ao preconceito.

Acredita que as pessoas obtêm na vida o que merecem e merecem o que


obtêm? Lerner (1980) notou que muitas pessoas acreditam nesse mundo
justo e denominou este fenómeno de crença nU/n mundo justo. As pessoas
imbuídas desta crença podem pensar que quem sofre merece o seu
sofrimento. Ver alguém que sofre pode fazer pensar às pessoas que alguém
fez algo para merecer esta desgraça. A ilustração clássica deste pensamento
encontramo-lo no Antigo Testamento na história de Job. Os amigos de Job
supõem que, estando-se num mundo justo, Job deve ter feito algo mal para
atrair esse sofrimento terrível.

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© Universidade Aberta
Imagine que participava com alguns colegas num estudo sobre a percepção
de pistas emocionais (Lerner e Simmons, 1966). Um dos participantes, um
compadre, foi seleccionado à sorte para realizar uma tarefa de memória.
Esta pessoa recebe choques dolorosos sempre que dá uma resposta errada.
Você e os colegas notam as suas respostas emocionais. Depois de haver
observado que a vítima recebe um certo número destes choques
aparentemente dolorosos, é-lhes pedido para avaliar a vítima. Como
responderia? Com compaixão? Bem pelo contrário, os resultados
mostraram que observadores desprovidos de poder para alterar a sorte da
vítima, rejeitavam e desvalorizavam a vítima.

Nas pessoas com scores elevados neste viés do mundo justo tem-se
encontrado que acreditam que vítimas, por exemplo de violação, de
violência familiar, de pobreza, devem ter sido a causa do seu próprio
sofrimento. São pois mais susceptíveis de censurar a vítima, viés que apoia
muitas formas de preconceito. Um estudo intercultural evidenciou que as
crenças num mundo justo e as crenças num mundo injusto eram mais
elevadas na Índia, seguida da África do Sul, países do Terceiro Mundo em
que há extremos de riqueza e de pobreza (Furnham, 1993). Os dados
sugerem que as pessoas nos países mais pobres tendem a acreditar que o
mundo não é um lugar justo.

5.6 Alvo do preconceito

As abordagens prévias focalizaram a fonte do preconceito no observador.


As características do alvo suscitarão preconceito e discriminação? Para se
poder responder a esta questão tem de se analisar as relações entre crenças
acerca do alvo e as suas características. Preconceito e hostilidades
intergrupais podem por vezes basear-se em características reais de grupos;
esta ideia tem por vezes sido denominada da reputação ganha.

Já sabemos que os estereótipos são crenças sobre as características


psicológicas de grupos humanos em que há um elevado grau de
concordância. Uma questão, todavia, que se pode levantar é se os
estereótipos são descrições certas dos alvos de preconceito. Trata-se de
uma tarefa que está muito longe de se revestir de facilidade. Conhece-se
relativamente pouco acerca da veracidade do conteúdo de vários
estereótipos sociais (Judd e Park, 1993). Estes autores avançam a este
propósito duas conclusões, após uma revisão sobre o assunto. A primeira é
que parece haver evidência de ( 'le os estereótipos do endogrupo são mais
certos que os estereótiDos exogrupos. Em comparação com os

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estereótipos dos endogrupos, os estereótipos dos exogrupos parecem
reflectir exagero, preconceito. Uma segunda conclusão é de que a força da
identificação com o endogrupo exacerba as diferenças endogrupo/exogrupo
na verdade do estereótipo.

Em função de múltiplas observações e experimentações, os psicólogos


sociais são obrigados a dar uma resposta matizada à hipótese do "fundo de
verdade" dos estereótipos. Certos autores sugerem que há um fundo de
verdade nos estereótipos, pelo menos nos casos em que as pessoas estão
em contacto íntimo com o objecto do esteréotipo. Por exemplo, Triandis e
Vassilliou (1967) que estudaram os estereótipos acerca dos Gregos
sugerem que há um fundo de verdade em muitos dos estereótipos quando
são extraídos de pessoas que têm um conhecimento em primeira mão do
grupo alvo de estereótipos. Uma revisão efectuada por Brigham (1971)
conclui que os estereótipos étnicos podem ter um fundo de verdade no
sentido de que diferentes grupos de pessoas que respondem concordam
com que traços identificar um determinado grupo. Por seu lado Levine e
Campbell (1972) sugerem que os estereótipos não são totalmente inválidos,
mas os processos cognitivos implicados no desenvolvimento dos
estereótipos tendem a exagerar as diferenças que realmente existem.

Por conseguinte, pelo menos em certos casos, as crenças sobre as


características dos membros de outro grupo, podem ser relativamente
certas (McCauley e Sitt, 1978). Mas dado que os estereótipos são
simplificações do mundo social, não permitem efectuar previsões certas
acerca do comportamento de membros de outros grupos.

Existe toda uma gama de explicações para o preconceito e a discriminação.


Como o leitor se deu conta, cada explicação que foi exposta tem os seus
méritos. Todavia, nenhuma teoria explica suficientemente todos os casos, o
que não admira, pois um fenómeno tão complexo como o preconceito pode
ter múltiplas origens.

5.7 Quadro integrador de teorias

Por conseguinte, ao longo dos anos têm sido propostas muitas teorias para
explicar o preconceito. Estas diferentes abordagens têm sido dominantes
em diferentes períodos históricos (Duckitt, 1992). Assim, a teoria da
personalidade autoritária e outros construtos da personalidade que se
situam ao nível individual dominaram a investigação nos anos 50. Nos anos
60 e 70 a ênfase foi colocada nos processos sócio-culturais.· Mais

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recentemente a abordagem cogmtIva tem sido predominante na
compreensão e explicação do preconceito e das relações intergrupais
(Messick e Mackie, 1989). Apesar deste domínio, a perspectiva cognitiva
defronta-se com vários limites. Entre eles refIra-se, por exemplo, a
negligência de factores afectivos. "Se há algum domínio da interacção
humana que a história nos diga estar cheia de fortes, e até apaixonantes,
sentimentos, é na área das relações intergrupais. E este ponto torna claro o
facto de que a abordagem cognitiva, apesar de ricos e variados avanços
efectuados nos anos recentes, só ela é incompleta "(Hamilton, 1981 b, p.
347).

Sendo a abordagem cogmtIva, à semelhança das abordagens que a


precederam, parcial, seria necessário tentar integrar esta abordagem com
outras perspectivas. Foi o que Duckitt (1992) tentou efectuar
recentemente. O quadro integrador para a conceptualização dos processos
causais do preconceito evidenciados pelo autor são quatro. Em primeiro
lugar, são referidos processos psicológicos universais assentes na
propensão inerentemente humana para o preconceito. Em segundo lugar,
dinâmicas sociais e intergrupais descrevem as condições de contacto
intergrupal que elaboram esta propensão para padrões normativos de
preconceito. Em terceiro lugar, os mecanismos de transmissão explicam
como estas dinâmicas intergrupais e padrões partilhados de preconceito são
transmitidos socialmente a membros individuais destes grupos. E
fInalmente, dimensões de diferenças individuais determinam a
susceptibilidade dos indivíduos ao preconceito e por isso modulam o
impacto dos mecanismos de transmissão social sobre os indivíduos. Cada
um destes processos causais fornece uma contribuição parcial e
fundamental para a explicação do preconceito. Trata-se de um quadro
integrador que envolve quatro processos complementares que segundo
Duckitt (1992) fornece uma explicação global razoavelmente completa do
preconceito enquanto fenómeno grupal e individual.

Seja como for, há muitas fontes que contribuem para o preconceito e a


discriminação; como para todos as respostas humanas, preconceito e
discriminação são multideterminados. Contudo a complexidade do
problema não deixou de levar os psicólogos sociais a tentar atenuá-lo
(Lambert, 1992). Como defendeu o pioneiro da Psicologia Social, Kurt
Lewin, os psicólogos sociais devem ser agentes de mudança, bem como
teóricos e investigadores. Tendo isto presente, voltemo-nos para as
consequências do preconceito e da discriminação e depois para os modos
da sua redução.

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6. Consequências do preconceito
e da discriminação

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Os efeitos evidentes do racismo sobre o grupo alvo são fáceis de identificar.
Oito milhões de Judeus foram mortos em resultado do anti-semitismo dos
Nazis. Cerca de oito milhões de africanos morreram ou ficaram de modo
permanente incapacitados durante a viagem forçada para a América (Skillings
e Dobbins, 1991). Centenas de pessoas perderam as suas vidas este século
devido a linchagens, motins, atentados e outros actos suscitados por ódios
raciais. Existem também formas mais subtis, se bem que igualmente insidiosas,
de discriminação com base na raça, no alojamento, na educação e no emprego.
Perante a opressão do grupo dominante, como reagem as vítimas do
preconceito? Será este aspecto que passaremos a abordar, e depois,
examinaremos as consequências do racismo sobre o racista.

6.1 Reacções das vítimas de preconceito

Se tem sido efectuada muita investigação a propósito da génese do


preconceito e da discriminação, bem menor atenção tem sido prestada às
reacções das vítimas de preconceito e de discriminação. Quais são as respostas
dos grupos minoritários? Já nos anos 50 Allport (1954) identificou mais de
quinze consequências possíveis do facto de ser vítima de preconceito. Dentre
elas refira-se afastamento e passividade, militância, agressão contra o
exogrupo e auto-aversão. Allport sugeriu também que estas reacções podiam
ser circunscritas em duas categorias gerais: intrapunitivas e extrapunitivas. As
defesas intrapunitivas são as que implicam auto-culpabilidade e as defesas
extrapunitivas colocam a culpa nos outros. Allport defende que os membros de
grupos minoritários que são intrapunitivos serão hostis ao seu próprio grupo,
ao passo que os que são extrapunitivos manifestarão lealdade em relação ao
seu próprio grupo e agressividade em relação a outros grupos.

Tajfel e Turner (1979), ampliando a abordagem de Allport avançam três tipos


de respostas. As pessoas vitimadas podem simplesmente aceitar a sua situação
com passividade e resignação, muito embora com ressentimento; podem tentar
libertar-se e fazê-lo em sociedade; ou podem tentar a acção colectiva e
melhorar o estatuto do próprio grupo. Com base nestas alternativas foi traçado
um modelo com cinco estádios que mostra como grupos tratam com o
preconceito e uma posição desvantajosa na sociedade (Taylor e McKirnon,
1984): relações grupais claramente estratificadas, emergência de uma ideologia
individualista, mobilidade social individual, tomada de consciência e relações

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intergrupais competitivas. Trata-se de um modelo atribucional e dá conta do
modo como as vítimas podem interpretar e responder a essa situação.

Segundo este modelo passam sequencialmente através destes estádios,


chegando finalmente ao ponto em que a autocensura é fácil, sendo no entanto
necessária a acção colectiva. Em termos atribucionais as implicações de
preconceito são particularmente relevantes. Relembre-se do viés de
autocomplacência em que os indivíduos atribuem o seu sucesso a eles próprios
e os seus fracassos a factores externos. Dado que a nossa identidade como
pessoas é fortemente influenciada pela nossa identidade como membros de
grupos (religiosos, étnicos, nacionais, sexuais) pode-se também conceber um
viés ao serviço do grupo em que atribuímos sucessos a características positivas
do grupo e fracassos a factores externos, tais como a discriminação. Neste
caso, as pessoas podiam censurar-se a elas próprias pelo fracasso para evitar
censurar outros membros do grupo.

Já foi demonstrado experimentalmente o que pode acontecer quando membros


de um grupo minoritário percepcionam que foram alvo de preconceito (Dion,
1975; Dion, Earn, e Yee, 1986). Criou-se uma situação em que se pediu a
membros de um exogrupo (e. g., judeus, chineses e mulheres) para
completarem uma tarefa em que os seus sucessos ou fracassos dependiam da
acção dos membros do endogrupo (e.g., cristãos e homens). Encontrou-se que
o preconceito percepcionado levou a que quer os judeus quer as mulheres
fortalecessem os seus estereótipos positivos. Já no caso dos chineses, o
preconceito percepcionado levou a uma negação dos estereótipos negativos
associados a esse grupo. Dion et aI. (1986) sugerem que a "visibilidade" de um
grupo minoritário pode dar conta destas diferentes reacções. Os membros de
grupos que não são facilmente identificados acentuam os estereótipos
positivos, ao passo que os membros de minorias visíveis focalizam-se em
estereótipos negativos. Outros factores observados dizem respeito à auto-
estima e à quantidade de stress. Ao invés do que se esperava, a experiência de
preconceito teve como resultado um aumento de auto-estima para os membros
de três grupos: judeus, mulheres e chineses. A razão de tal não é clara, mas
pode dever-se a que a discriminação aumenta a consciência de pertença ao
grupo, e para se ser escolhido deste modo se sublinhe a superioridade da
minoria. Sem surpresas são os resultados relativos à quantidade de stress. Por
exemplo, perante o anti-semitismo, os judeus referiram sentir-se agressivos,
tristes e ansiosos.

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A discriminação é pois percepcionada como ameaçadora e em certas
circunstâncias as pessoas discriminadas podem agir contra o grupo dominante.
Caplan e Paige (1968) referiram que os negros que participavam em motins
raciais nos Estados Unidos nos anos 60 eram mais sensíveis à discriminação
percepcionada, referiam que experienciaram mais frequentemente a
discriminação e aceitavam menos os estereótipos da inferioridade negra que os
negros que permaneceram inactivos.

Note-se que os membros de diferentes grupos étnicos dizem experienciar


diferencialmente preconceito e discriminação (Neto, 1987).

6.2 Consequências do racismo sobre o racista

As consequências do racismo não têm unicamente efeitos traumáticos sobre as


vítimas do preconceito e do comportamento racista. O racismo tem efeitos
sobre todas as pessoas, sejam elas as vítimas, as perpetradoras ou muito
simplesmente os seus observadores.

Dennis (1981) demonstra que a imersão de pessoas numa rede social racista
torna difícil para qualquer pessoa branca evitar a sua influência. Dennis (1981)
evidencia um certo número de efeitos da socialização racial sobre crianças
brancas: a) ignorância das outras pessoas, b) desenvolvimento de uma
consciência psicológica dupla e confusi'í.o moral, e c) conformidade ao grupo.

Por seu lado, Terry (1981) defende que o racismo mina e distorce a
autenticidade das pessoas brancas. Tal leva os brancos a centralizarem os
valores postulados nos seus comportamentos quotidianos, a distorcer o poder
nas relações, a construir organizações que nem compreendem nem gerem de
modo eficaz. A explicação psicológica do racismo branco dada por Karp
(1981) apoia-se numa perspectiva psicodinâmica, vendo o racismo como um
mecanismo de defesa para lidar com feridas do passado. A sua posição, tal
como a de Dennis e de Terry, é a de que os brancos estão profundamente
feridos pelo seu racismo. Isola brancos das pessoas de cor e cria um
isolamento geral entre os brancos. Falsas barreiras raciais são erigidas que
negam as amizades de brancos com não brancos. O racismo restringe aspectos
quotidianos das suas vidas, tais como onde viver, trabalhar e divertir-se.
Segundo Karp (1981), as consequências emocionais do racismo são pesadas:
culpa, vergonha, bem como o sentir-se mal em ser branco.

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7. Redução do preconceito e da discriminação

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Poderia ser-se levado a pensar que os psicólogos sociais só têm estado
obssecados com teorias que explicam a génese do preconceito e da
discriminação e teriam prestado pouca atenção à maneira de os reduzir. A
redução do preconceito e o combate aos seus efeitos negativos sendo um
objectivo de suma importância para a sociedade, levou efectivamente os
psicólogos sociais a conceberem e porem em acção estratégias para atingir
esse objectivo. Se bem que reconheçamos a possibilidade de que o
contexto histórico, político e econó mico mais amplo desempenha um papel
importante no relacionamento intergrupal, abordaremos alguns dos
métodos que os psicólogos sociais têm utilizado para tratar com o
problema do preconceito e da discriminação: a tomada de consciência, a
hipótese do contacto e, para além da hipótese do contacto, o contacto
vicariante através dos meios de comunicação social.

7.1 Tomada de consciência

Referiremos seguidamente três tipos de técnicas de tomada de consciência


susceptíveis de reduzirem o preconceito e a discriminação: técnicas de
consciencialização de ser oprimido, de aprender a fazer distinções, do
assimilador cultural.

7.1.1 Tomada de consciência da pertença a um grupo minoritário

Diversos grupos minoritários como mulheres, negros, idosos, migrantes


implementaram os seus próprios modos de vencer o preconceito. Técnicas
de tomada de consciência são cada vez mais utilizadas por esses grupos.
Pretende-se mediante este processo tornar os membros desses grupos
sensíveis às influências opressivas que pesam sobre a sua vida,
assegurando-lhes um meio de defesa colectiva.

Mednick (1975) começou por descrever o processo de tomada de


consciência pela insatisfação que os indivíduos sentem da sua condição.
Por exemplo, as mulheres podem achar que as tarefas domésticas
tradicionais são alienantes e sentir-se infelizes e abatidas. Podem censurar-
se pela sua sorte e sentir que não têm nenhum controlo sobre a sua vida.

Quando os indivíduos começam a aperceber-se que pertencem a um grupo


oprimido, na ocorrência as mulheres, é então uma boa ocasião para se
recorrer a técnicas directas de tomada de consciência. As mulheres

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reconhecem que o problema é partilhado por elas enquanto grupo e não
causado pela sua própria família ou pelo seu estado mental. O agente de
tomada de consciência tenta então propor uma ideologia que permita
congregar as mulheres. Mostra-se que o sistema social controla o
indivíduo sendo responsável pela sua situação insatisfatória. A mulher
apercebe-se que pode exercer mais controlo como membro de um grupo e
este pode então dirigir uma acção contra o sistema (Figura 6. 2).

Insatisfação Sentimento
Auto­ Limites quanto
com a sua 1----+1 limitado de 1-----.1
censura à acção
condição controlo pessoal

Fonnação
do grupo

Tomada de

consciência do

controlo pelo
Aumento do
sistema social
L-t .Censura d~ r------­ sentimento de -----t Acção dirigida
sistema social con tro Io pessoaI para o sistema

Desenvolvimento
da ideologia

Reacção do
sistema

Fonte: Adaptado de Mednick, 1975.

Figura 6. 2 - Um esboço do processo de tomada de consciência

Estas técnicas de tomada de consciência podem ter um impacto importante


nas pessoas participantes nos grupos. Há investigação que tem mostrado
que os participantes valorizam o seu autoconceito, adquirem um
sentimento de competência e de igualdade (Eastman, 1973).

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7.1.2 Tomada de consciência de distinções

A maior parte das vezes processamos informação de modo automático e


passivo. Por exemplo, se encontramos alguém pela primeira vez fiamo-nos
nas distinções ou categorias que temos à nossa disposição em vez de
fazermos novas formulações. Langer e os seus colaboradores (1983) falam
a este propósito de falta de atenção. Esta tendência tem reflexos no
preconceito, pois desde que encontremos alguma pessoa pertencente a um
grupo minoritário, as nossas reacções podem ser polarizadas por essa
característica importante desse sujeito.

Langer, Bashner, e Chanowitz (1985) efectuaram uma expenencia que


mostra a possibilidade de contrariar essa tendência através da indução nas
pessoas para estarem mais atentas aos outros. Pôs-se a hipótese de que as
pessoas que fossem treinadas a adoptar um estado atento demonstrariam
menos preconceito em relação aos deficientes. Os resultados confirmam
essa hipótese mostrando que os sujeitos que tinham sido expostos a um
treino de atenção estavam mais dispostos a ir a um piquenique com uma
pessoa deficiente que os sujeitos que não tinham passado esse treino.
Revelaram também uma maior tendência em escolher pessoas deficientes
como colegas em tarefas em que a deficiência podia ser uma vantagem. O
mesmo é dizer, essas pessoas estavam já a pensar nas outras não
meramente como membros de uma categoria social, mas tendo em conta as
suas capacidades e as suas falhas.

É possível que as pessoas tomem activamente consciência dos outros, em


vez de se contentarem com as distinções previamente estabelecidas. Um
tanto paradoxalmente, quanto mais discriminamos os outros no nosso
pensamento, menos os consideramos como membros de uma categoria
abstracta. Tal estratégia pode reduzir o preconceito.

7.].3 O assimilador cultural

O assimilador cultural é uma técnica de sensibilização aos julgamentos


correctos a respeito das expectativas de um grupo ou cultura. Permite
considerar o mundo social em consonância com o ponto de vista de uma
outra pessoa. Mais especificamente são ensinadas as normas e os modos de
vida de outro grupo com o intuito de permitir efectuar atribuições certas a
propósito do comportamento dos membros do outro grupo.

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o assimilador cultural recorre a "incidentes críticos" que são episódios
com importância para a interacção intergrupal e que são susceptíveis de ser
mal interpretados pelas pessoas que não estão habituadas a lidar com a
população alvo, sendo todavia claros para os que conhecem a cultura
(Triandis, 1972; Landis, Day, McGrew, Thomas e Miller, 1976).

A pessoa que está a ser treinada lê o episódio que descreve uma interacção
intercultural e faz uma interpretação dessa interacção. É então explicado à
pessoa se a sua resposta está certa ou errada. Se a resposta está errada, a
pessoa deve voltar ao episódio e escolher outra resposta. Apresenta-se no
Documento 6.6 um exemplo de um episódio utilizado para diminuir o
preconceito racial no exército. Neste episódio um oficial tenta
compreender porque é que se lhe pede para rever decisões negativas de
promoção muito mais frequentes em relação aos negros que aos brancos.
Às pessoas em treino são-lhes dadas quatro escolhas e, após a resposta,
explica-se porque é que a resposta está certa ou errada. Trata-se neste
exemplo de um item entre 100 sobre interacções entre brancos e negros.

o branco C. de uma unidade integrada racialmente tentou recomendar promoções na


base do trabalho dos seus homens e nos resultados de competências. Depois da lista das
promoções ser afixada, um negro Spec 4 entrou no seu escritório e perguntou-lhe porque
é que não tinha sido promovido. Spec 4 alegou que teve bastante bons resultados e pediu
a C. para rever a sua decisão. C. ficou surpreendido com este comportamento, mas
prometeu prestar alguma atenção à sua queixa. Depois de reflectir, C. notou que as
revisões de promoção foram pedidas muito mais frequentemente pelos negros que pelos
brancos na sua unidade. C. estava intrigado e surpreendido por tal.

Porque é que houve mais negros que brancos que pediram revisões da decisão de
promoção?

Opção I. Os negros sentem que não lhes seria dada uma promoção a não ser que
a pedissem. (Sim)

Explicação: Muitos negros sentem que uma boa nota não é suficiente para ser
promovido. Sentem que a não ser que eles chamem a atenção para o seu caso,
não se agirá. Esta acção não é para ser considerada como desprovida de respeito,
mas antes como uma acção que é assumida como sendo necessária para a
promoção.

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Opção 2. O C. prejudicou e promoveu mais brancos que negros. (Não)

Explicação: Não há evidência em apoio de tal. Leia novamente o incidente e


escolha outra resposta.

Opção 3. Os negros causam perturbações mais frequentemente que os brancos.


(Não)

Explicação: Não há nada no incidente que sugira que os negros foram


perturbadores. Tente de novo.

Opção 4. Muitos negros esperam obter promoções que não merecem,


intimidando os seus chefes a conceder-lhas para evitar de serem chamados de
"preconceituosos". (Não)

Explicação: O comportamento dos negros não era para intimidar. Não havia
ameaças ou insinuações. Está a ler demasiado neste incidente. Releia o incidente
e tente novamente.

Fonte: Landis, Day, McGrew, Thomas, e Miller (J 976).

Documento 6.6 - Um exemplo de um assimilador cultural

Este tipo de treino cogmtIvo pode contribuir para a redução do


preconceito e do pensamento estereotipado. As pessoas que passam por
esse treino tendem a ter atitudes mais positivas em relação a membros de
outros grupos em relação às que tinham antes do treino.

7.2 A hipótese do contacto

Poderá o preconceito ser reduzido se se aumentar o grau de contacto entre


diferentes grupos? A ideia de que pode, é conhecida como a hipótese do
contacto. Esta hipótese baseia-se não tanto na personalidade do indivíduo
ou nas atitudes dos indivíduos que sofrem modificação como no
desenvolvimento de uma nova identidade grupal.

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No caso dos grupos estarem de costas voltadas pode-se desenvolver a
hostilidade autista. Ora se membros de grupos diferentes desenvolvem a
hostilidade autista pode surgir o fenómeno de reflexo nos preconceitos
intergrupais (Bronfenbrenner, 1960). Cada um dos grupos considera-se
com boas intenções e com razão e vê o inimigo como estando errado e
sendo ameaçador.

Com o aumento do contacto, o exogrupo deixa de ser estranho e parece


mais diferenciado. Ora quando o exogrupo é percepcionado de modo mais
diferenciado, a discriminação pode ser reduzida (Wilder, 1978).

O balanço da investigação sobre a hipótese de contacto não é claro


(Brewer e Kramer, 1985). Por um lado, notou-se que atitudes tolerantes
estavam ligadas a níveis mais elevados de contacto entre estudantes. Por
outro lado, encontrou-se pouco suporte para esta hipótese (Amir, Bizman,
Ben-ari, e Rivmar, 1980).

Em suma, se a investigação demonstrou que o contacto inter-racial pode


levar a uma redução do preconceito, tal nem sempre se verifica. Na
Alemanha, sob o comando de Hitler, os judeus tinham vivido em contacto
com os alemães durante várias décadas. Trezentos anos de contacto entre
negros e brancos nos Estados Unidos não acabaram com o preconceito
racial.

Há razões para se pensar que o tipo de contacto intergrupal desempenha


um papel importante para que se efectue com sucesso. Vários factores
devem ser tomados em consideração (Quadro 6.4).

Segundo a hipótese do contacto, o preconceito intergrupal pode ser reduzido se as


quatro condições referidas mais abaixo forem encontradas. Pense nas hostilidades
intergrupais no seu local de estudo ou na sua comunidade. Talvez esse cont1ito envolva
homens e mulheres, homossexuais e lésbicas, ou pessoas de diferentes grupos étnicos.
Como podemos desenvolver uma "campanha de tolerância" utilizando estas quatro
condições principais?

Condições necessárias

1. Igualdade de estatuto social: Membros de grupos em conflito deveriam


interagir em contextos em que cada pessoa tem aproximadamente estatuto igual.

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2. COllfacto íntimo: A interacção entre membros de diferentes grupos deveria ser
face-a-face e deveria manter-se durante um longo período de tempo.

3. Cooperação intergrupa/: Os membros de diferentes grupos deveriam


comprometer-se em actividades conjuntas para realizar objectivos
sobreordenados.

4. Normas sociais que favoreçam a igualdade: Deve haver uma clara percepção
social, amplamente apoiada pelas figuras investidas de autoridade nos grupos
onde preconceito e discriminação não são perdoados.

Quadro 6.4 - Redução do preconceito mediante contacto social

Um dos factores chave para o sucesso dos contactos intergrupais é a


igualdade de estatuto (Norvell e Worchell, 1981). A desigualdade nos
papéis atribuídos aos homens e às mulheres explica em parte porque é que
o contacto entre os sexos não reduziu os preconceitos. Se um patrão com
preconceitos sexuais emprega uma mulher de limpeza no seu escritório não
será de esperar que se torne menos preconceituoso só pelo facto do
contacto. Todavia se trabalhasse com uma mulher num contexto com
estatuto igual, aumentariam enormemente as possibilidades de redução do
preconceito. Depois da Segunda Guerra Mundial, por exemplo, vários
estudos avaliaram as atitudes dos soldados brancos em relação a soldados
negros (Amir, 1969). Verificou-se que os soldados brancos que tinham
combatido ao lado dos soldados negros tinham menos atitudes
preconceituosas em relação aos negros que soldados brancos que não
tinham tido essa experiência de combate.

Um segundo factor a considerar é a intimidade de contacto entre membros


de dois grupos. Quanto maior seja a intimidade, maior é a redução do
preconceito. O contacto íntimo ajuda a individualizar o membro do grupo
de que se não gostava. Será visto mais em termos individuais e não tanto
em termos de um estereótipo. Por exemplo, pode-se esperar que um
autóctone com atitudes preconceituosas em relação a um imigrante deixe
de as ter se trabalhar intimamente associado a ele num projecto em que
pode evidenciar as suas próprias características e capacidades.

Um terceiro factor para que o contacto tenha efeitos benéficos é que os


indivíduos podem ter necessidade de partilhar objectivos comuns que
requerem acção interdependente e cooperativa. O estudo clássico que
demonstra os efeitos destl JS da competição sobre as relações

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intergrupais foi efectuado por Sherif et aI. (1961) que se apresentou no
primeiro capítulo. Inicialmente foi encorajada a competição entre dois
grupos de rapazes num campo de férias. Mas isso criou tanta raiva e
hostilidade entre grupos que emergiu até aquando de acontecimentos
desprovidos de competição como ao ver um filme. Os investigadores mais
tarde reduziram com sucesso esta hostilidade levando os rapazes a
trabalhar de modo cooperativo para resolver um problema comum.
Resultados semelhantes foram obtidos na sala de aula utilizando o que
Elliot Aronson e os seus colegas (1978) chamaram de técnica do "quebra-
cabeças" (jigsaw technique) que envolve a aprendizagem cooperativa em
pequenos grupos (ver as aplicações para uma discussão mais
pormenorizada desta técnica). Uma razão possível da cooperação reduzir
viés intergrupais e hostilidade é que ao cooperarem os membros de
diferentes grupos sociais aparece cognitivamente a recategorização de uns
e outros num novo grupo (Bettencourt et aI., 1992).

Uma última condição para reduzir com sucesso conflitos é que deve haver
normas sociais que favoreçam a igualdade (Blanchard, Lilly e Vaughn,
1991). Como se demonstrou no capítulo 4, as normas sociais têm um
efeito significativo na determinação das intenções comportamentais das
pessoas. Eis onde as figuras investidas de autoridade e os líderes de grupos
podem desempenhar um papel fulcraI. Se afirmam publicamente apoio para
a igualdade, outras pessoas são susceptíveis de seguir líderes. Se se opõem
ao contacto intergrupal, a redução do preconceito é improvável (Cook,
1984). Por exemplo, tensões ligadas à raça, ao sexo e mesmo à orientação
sexual têm sido atenuadas com sucesso em muitos locais de trabalho
quando os supervisores tornam claro que afirmações preconceituosas e
acções discriminatórias não serão toleradas.

Raramente se encontram todas estas condições nas actuais situações


interétnicas. Por exemplo, tem-se invocado que o turismo pode ser um
meio para melhorar a compreensão dentro das nações e, entre as nações
(Neto e Freire, 1990), mas vivenciado à janela de um autocarro, não
permitirá reunir qualquer desses factores.

Todavia a eficácia dos critérios do contacto pode ser demonstrada em


experiências laboratoriais e de campo. Por exemplo, organizou-se uma
situação de trabalho em que negros e brancos tinham estatutos iguais e
partilhavam objectivos comuns. Mulheres brancas (do sul dos Estados
Unidos) com atitudes racistas foram seleccionadas para trabalhar com
mulheres negras num jogo de gestão de empresas. As equipas interraciais
deviam fazer um caminho de ferro simulado. Os membros das equipas
trabalhavam em conjunto mais de uma hora por dia e isto durante cerca de

572
© Universidade Aberta
três semanas. As mulheres racistas desenvolveram quase sempre estreitas
relações com as suas colegas de equipa negras. Verificou-se também nos
sujeitos uma diminuição do preconceito com medidas gerais efectuadas
fora do contexto de trabalho. Ao contrário, não se encontrou redução de
preconceito num grupo de controlo de mulheres racistas que não
participaram no jogo.

Se geralmente os resultados de laboratório que testam a hipótese de


contacto para diminuir o preconceito têm sido positivos, nem todos os
esforços para introduzir o contacto têm sido plenamente conseguidos.
Durante os anos 60 e 70 os Estados Unidos embarcaram no que pode ser
encarado nalguns dos seus aspectos como uma das maIores
experimentações SOCIaIS. Com esta "experimentação" pretendeu-se
desagregar as escolas. Estudos efectuados com o intuito de avaliar os
resultados da não segregação têm traçado todavia um quadro confuso.

Stephan (1978) avaliou as consequências a curto prazo da desagregação da


escola e notou que não havia evidência de uma redução efectiva do
preconceito. Mais especificamente concluiu que as atitudes dos brancos em
relação aos negros mostram pouca redução, enquanto que os preconceitos
dos negros em relação aos brancos são tão susceptíveis de aumentar como
de diminuir. Uma consequência positiva encontrada por Stephan foi que os
negros tendiam a ter melhores resultados académicos. A razão destes
resultados parece residir no facto de que o governo e as autoridades
escolares descuidaram muitas vezes várias das condições que são
essenciais para que o contacto intergrupal directo pudesse ter efeitos
benéficos (Cook, 1985). Por exemplo, foi prestada pouca atenção a que os
alunos em contacto fossem de estatuto igual. A integração também
ocorreu frequentemente num contexto de violência e de protestos. Pode-se
por isso esperar que se se tomarem em conta os critérios chave que
determinam o impacto do contacto intergrupal, os efeitos desta grande
"experimentação" social possam ainda ser positivos.

Em suma, juntar simplesmente os grupos não eliminará o preconceito, mas


então conservá-los separados também não ajudará. Contacto intergrupal
judicioso pode desempenhar um papel importante no esforço para
combater preconceito e discriminação.

7.3 Para além da hipótese do contacto

Uma das críticas da hipótese do contacto é o ênfase colocado na mudança


de atitudes preconceituosas do grupo dominante, e a ignorância das

© Universidade Aberta 573


atitudes dos membros de grupos minoritários (e.g., Devine, Evett, e
Vasquez-Suson, 1995). Os autores que levantam esta crítica sugerem que
para uma promoção mais eficaz da harmonia intergrupal, os cientistas
sociais devem considerar também 1) as atitudes e as crenças dos membros
dos grupos minoritários, e 2) as crenças e ansiedades de todas as pessoas
envolvidas no contacto intergrupal. Por exemplo, durante o contacto
intergrupal os membros dos grupos minoritários podem sentir-se ansiosos
porque receiam ser vitimados e avaliados de modo negativo, ao passo que
os membros do grupo dominante podem estar ansiosos com medo de dizer
ou fazer algo que possa ser interpretado como um sinal de preconceito. É
o efeito combinado desta ansiedade intergrupal que muitas vezes cria
dificuldades para esses encontros sociais, mesmo na ausência de qualquer
atitude preconceituosa (Stephan e Stephan, 1985). Ainda é necessária mais
investigação para se compreender os meandros dos processos desta
interacção.

7.4 Contacto vicariante através dos meios de comunicação social

Muitas vezes não temos de encontrar fisicamente membros de outro grupo


para estarmos em "contacto" com esse grupo. Ao longo dos anos, os
meios de comunicação de massa têm, por um lado, intencionalmente,
outras vezes de modo inadvertido, mantido estereótipos e preconceitos.
Por exemplo, um estudo efectuado durante a Segunda Guerra Mundial
analisou o modo como eram retratadas as características de grupos
minoritários nos meios de comunicação (Writers' War Board, 1945). De
um modo geral os heróis e as características boas eram representadas por
anglo-saxónicos, ao passo que criados e criminosos eram mais susceptíveis
de serem pessoas pertencentes a grupos minoritários. Segundo este estudo,
os retratos fornecidos pela ficção popular podiam facilmente ser usados
para "provar" que os negros são preguiçosos, os judeus avarentos, os
irlandeses supersticiosos e os italianos criminosos.

Hoje em dia os estereótipos veiculados pelos meios de comunicação de


massa são menos extremistas. Apesar disso a investigação ainda evidencia
retratos negativos de várias minorias e das mulheres. E até muito
recentemente, algumas minorias, por exemplo, homossexuais e lésbicas,
muito raramente apareciam nos meios de comunicação de massa. E quando
apareciam eram retratados de modo extremamente negativo.

Não parece haver dúvidas de que os meios de comunicação de massa têm


contribuído para que haja preconceitos na nossa sociedade. A questão que

574 © Universidade Aberta


se pode levantar é a de se saber se também podem contribuir para a sua
redução. A resposta parece ser positiva. Por exemplo, crianças que viram
interacções sociais no programa Sesame Street desenvolveram atitudes
mais positivas em relação a negros e hispânicos (Bogatz e Ball, 1971).
Uma réplica canadiana deste estudo que introduziu conteúdos pertinentes
para minorias no Canadá, evidenciou uma redução no preconceito (Gom,
Goldberg, e Kanungo, 1976). As crianças canadianas dos jardins de
infância que viram Sesame Street eram mais susceptíveis de escolher
crianças não brancas como potenciais colegas de brincadeira do que
crianças do grupo de controlo. Diga-se para concluir que uma revisão da
investigação sobre os efeitos da televisão nas atitudes sociais e étnicas
concluiu que a mudança para uma atitude positiva é possível,
particularmente quando há uma exposição prolongada (Graves, 1980).

É óbvio que a mudança do preconceito não é uma tarefa fácil. Se algumas


das condições conducentes a um melhoramento das relações intergrupais
existem ou podem ser introduzidas em contextos laborais, recreativos,
políticos, religiosos, há todavia ainda muito trabalho a ser efectuado na
elaboração de técnicas para melhorar as relações nestes contextos. Trata-
se de um desafio para o futuro.

575
© Universidade Aberta
APLICAÇÕES: ESTRATÉGIAS PARA MUDAR ATITUDES
NEGATIVAS

Como é que se podem mudar atitudes negativas em relação a minorias que


são alvo de estereótipos? Em 1954, Gordon Allport respondeu que o
"preconceito pode ser reduzido pelo contacto com estatuto igual entre
grupos da maioria e da minoria na prossecução de objectivos comuns" (p.
281). Infelizmente as pessoas com responsabilidades na planificação social
muitas vezes não prestaram atenção à üItima parte da recomendação de
Allport, "... na prossecução de objectivos comuns". Só o contacto não é
suficiente.

Em 1971 foi pedido a Elliot Aronson para traçar um plano que permitisse
reduzir a tensão interracial n~s escolas recentemente de-segregadas nos
Estados Unidos. Após haver observado a interacção dos estudantes em
várias salas de aula, Aronson pensou que a dinâmica psico-social era
notavelmente semelhante à descrita por Sherif na experiência de campo da
Caverna dos Ladrões. Recorrendo a este estudo corno guia, Aronson e a
sua equipa desenvolveram uma técnica de aprendizagem que foi
denominada de "técnica do quebra-cabeças" (jigsaw technique) (Aronson,
1990; Aronson, Bridgeman, e Geffner, 1978). A técnica foi assim chamada
porque os estudantes tinham de cooperar para "juntar" as suas lições
diárias, do modo semelhante como se reúne um "quebra-cabeças". Foram
submetidas a esta técnica dez turmas do quinto ano, e três turmas
adicionais serviram como grupos de controlo.

Na sala de aula "quebra-cabeças" os estudantes eram colocados em grupos


de aprendizagem de seis pessoas, misturados do ponto de vista racial e
académico. A lição do dia era dividida em seis subtópicos, e cada
estudante era responsável por aprender uma parte desta lição e de a ensinar
aos outros membros do grupo. Com a lição dividida desta maneira a
cooperação era essencial para o sucesso. Ao invés da tradicional
aprendizagem na sala de aula em que os estudantes competem uns com os
outros, a aula "quebra-cabeças" promovia objectivos sobreordenados.
Promovia também a harmonia racial. Em comparação com os alunos nas
salas de aula de controlo em que se recorreu a técnicas de aprendizagem
tradicionais, os grupos "quebra-cabeças" mostraram uma diminuição no
preconceito e um aumento em gostar uns dos outros. O gosto pela escola
também melhorou, bem como o seu nível de auto-estima. A aprendizagem
cooperativa também melhorou os resultados académicos dos estudantes

576
© Universidade Aberta
11

minoritários, enquanto que os dos alunos brancos permaneceram os


mesmos.

Grupos multiraciais de aprendizagem cooperativa na sala de aula podem reduzir o


preconceito racial das crianças e aumentar os seus níveis de realização.

Desde que estes estudos foram efectuados e publicados, técnicas


cooperativas semelhantes também se têm desenvolvido em centenas de
escolas nos Estados Unidos e noutros países.

o trabalho de Aronson e de seus colegas ilustra as potencialidades do


contacto cooperativo interdependente. Todavia esse trabalho levanta várias
questões: I) Os estudantes nas aulas "quebra-cabeças" generalizam a sua
aceitação a grupos raciais mais amplos ou veriam os indivíduos
minoritários nessas aulas como sendo excepções? 2) Outras formas de
contacto interdependente também reduziriam o preconceito? 3) Qual é o
processo pelo qual o contacto muda com sucesso estereótipos e atitudes?

Uma tentativa de resposta a algumas destas questões foram fornecidas pela


investigação de Donna DesForges e sua equipa (199 I). Num estudo, esses
autores examinaram as atitudes dos estudantes em relação a antigos
doentes mentais, grupo frequentemente estigmatizado na nossa sociedade.
A experiência compreendeu três partes principais: medida das atitudes dos

© Universidade Aberta 577


estudantes em relação aos doentes mentais, uma oportunidade para
interagir com um doente mental, e uma segunda medida de atitudes para
ver se tinham mudado.

Na primeira parte da experiência, os estudantes responderam a uma série


de questões sobre as suas atitudes em relação a antigos doentes mentais,
bem como em relação a outros grupos minoritários. Responderam a
questões do género: "Qual é a sua atitude em relação a antigos doentes
mentais?", escolhendo uma entre sete respostas numa escala de avaliação
que ia de 7 (extremamente positiva) a 1 (extremamente negativa).
Indicaram também as suas atitudes para agir de vários modos em relação a
antigos doentes mentais em domínios tais como trabalhar com eles, viver
perto deles, socializar-se com eles, etc. Para além disso, os estudantes
indicavam numa lista de adjectivos os que eram mais característicos e os
que eram menos característicos de um"doente mental típico".

Na segunda parte da experiência, efectuada um mês mais tarde, os


estudantes participaram individualmente num estudo supostamente não
relacionado com estratégias de aprendizagem. Os investigadores queriam
que os sujeitos pensassem que era um estudo completamente separado das
prévias medidas de atitude porque queriam evitar revelar uma óbvia
tentativa de mudar atitudes. Os experimentadores pediram aos estudantes
para estudar seis páginas sobre terapia intravenosa como preparação para
um exame sobre o assunto. Cada estudante foi estudar durante 50 minutos
com outro estudante que era um compadre dos experimentadores. Os
investigadores disseram aos estudantes que o seu parceiro tinha estado
numa instituição de doença mental no ano anterior, desde então tinha
recuperado e regressado à faculdade e não gostava de falar sobre ter sido
doente mental.

Os investigadores designaram os sujeitos para uma das três condições de


contacto: numa condição de controlo, o sujeito e o compadre sentavam-se
nos lados opostos de uma mesa e estudavam a passagem sem falar um com
o outro. Na condição "quebra-cabeças" o sujeito e o compadre recebiam
cada um diferentes fragmentos de material para o sintetizar um ao outro.
Dado que nenhum deles recebia a passagem toda, tinham de depender um
do outro para obter todo o conteúdo. Na terceira condição o sujeito e o
compadre liam fragmentos idênticos de material e então cada um fazia um
resumo para o outro enquanto que o outro ouvia e dava uma retroacção.
Então mudavam de papéis e passavam ao fragmento seguinte, lendo,
resumindo e dando a retroacção. Este procedimento melhora a
aprendizagem dos participantes, mas os seus efeitos sobre as avaliações
dos participantes não havia sido previamente testada. Depois de um

578
© Universidade Aberta
período de 50 minutos de contacto, todos os SUjeItos descreveram o
"doente mental" utilizando a mesma lista de adjectivos que tinham utilizado
um mês antes para descrever um doente mental antigo típico.

Na terceira parte da experiência, um experimentador diferente entrou e


levou os sujeitos a acreditar que estavam de novo a participar num "estudo
totalmente separado", supostamente do que tinham participado um mês
antes. Os sujeitos responderam de novo a questões sobre as suas atitudes
em relação a antigos doentes mentais em geral, bem como em relação a
membros de outros grupos minoritários. Os experimentadores esconderam
a ligação entre estas medidas de atitudes e o estudo de "aprendizagem"
anterior para ver se alguma mudança de atitude em relação ao doente
mental antigo após o estudo de "aprendizagem" se generalizaria a antigos
doentes mentais num contexto diferente.

Os experimentadores explicaram então totalmente o objectivo de cada


parte do estudo. Os sujeitos exprimiram surpresa pelo facto do "antigo
doente mental" ser um compadre dos experimentadores; nenhum sujeito
desconfiou que o segundo estudo de "aprendizagem" não fosse um
projecto separado das medidas de atitude.

DesForges e a sua equipa encontraram que as atitudes em relação aos


antigos doentes mentais mudaram devido a contacto com um membro
deste grupo. Em primeiro lugar, os sujeitos deram ao "antigo doente
mental" uma avaliação mais positiva depois do contacto com ele que
tinham dado previamente ao "antigo doente mental típico". Este efeito foi
mais forte nos sujeitos que começaram com uma atitude negativa e depois
experienciaram uma das condições de "contacto cooperativo". Este
resultado sugere que outras formas de contacto cooperativo para além da
técnica "quebra-cabeças" podem ser eficazes na redução do preconceito.
Em segundo lugar, os sujeitos deram aos antigos doentes mentais como
grupo uma avaliação mais positiva na terceira parte do estudo que na
primeira. Todos os grupos mostraram algum melhoramento nas suas
atitudes em relação aos antigos doentes mentais. Todavia ambos os tipos
de contacto estruturado, diminuíram mais o preconceito que o contacto
sem interacção (condição de controlo). Este resultado sugere que o
contacto cooperativo estruturado com um membro de um grupo
minoritário pode produzir uma redução no preconceito que se generaliza
ao grupo minoritário como um todo.

Os investigadores referem que estes resultados são consistentes com um


modelo de mudança de atitude em três estádios com base no contacto

579
© Universidade Aberta
cooperativo estruturado com um membro do grupo. A Figura 6.3 ilustra
este modelo.

DesForges e a sua equipa sugerem que fornecer uma estrutura na situação


de contacto ajuda a reduzir o efeito de expectativas cognitivas e de
esquemas cognitivos pré-existentes. Isto por sua vez aumenta a
probabilidade de se formarem impressões não enviesadas e que se
generalizam ao grupo mais amplo. Os investigadores sugerem que uma
estrutura é uma parte necessária para reduzir o preconceito com sucesso
mediante o contacto com grupos opostos.

Estádio 1: Expectativa

As pessoas que sabem que estão para interagir com um membro de um


grupo estereotipado esperam interagir com alguém semelhante ao membro
típico

Estádio 2: Adaptação

Contacto cooperativo com estatuto igual com um membro de um grupo


estereotipado negativamente, suscita uma impressão mais positiva dessa
pessoa que a esperada

Estádio 3: Generalização

A impressão positiva de modo inesperado desse membro do grupo


específico generaliza-se a um retrato mais positivo do membro típico e a
uma atitude mais positiva

Adaptado de DesForges et aI.. 1991.

Figura 6.3 - Contacto cooperativo estruturado e mudança de atitude em relação


ao grupo

580 © Universidade Aberta


I
, !

SUMÁRIO

o preconceito é uma atitude favorável ou desfavorável em relação a


membros de um grupo particular baseado na pertença a esse grupo, ao
passo que a discriminação é a manifestação comportamentaJ do
preconceito. Os grupos minoritários são definidos não tanto pelas suas
características numéricas, como pelas relações psicológicas estabelecidas
com os grupos maioritários.

O racismo consta de atitudes e acções negativas injustificadas em relação a


um grupo ou membros individuais de um grupo com base na raça. O
racismo inclui práticas institucionais que subordinam certas pessoas por
causa da sua raça. O sexismo é o preconceito e a discriminação com base
no género. Tal qual o racismo, o sexismo pode ser o resultado de práticas
institucionais, bem como de atitudes e comportamentos individuais. Em
contraste com as normas sociais existentes contra a expressão aberta de
sentimentos racistas e sexistas, o heterossexismo permeia a nossa cultura
de tal modo que a maior parte das pessoas ainda se sentem relativamente
livres de exprimir desdém em relação a homossexuais, lésbicas e
bissexuais.

Muito embora algumas formas de preconceito racial tenham diminuído nas


últimas décadas, outras emergiram para tomar o seu lugar. Há alguma
evidência que os enviesamentos antigos podem reaparecer de um modo
novo, com formas mais subtis de racismo moderno.

Diversas teorias têm sido avançadas para explicar a génese do preconceito


e da discriminação. Essas teorias acentuam o contexto social em que o
preconceito se desenvolve e o grau de preconceito existente em diferentes
indivíduos.

As abordagens históricas colocam a hipótese de que o preconceito é


muitas vezes o resultado de tradições e das relações que existiram durante
gerações. As abordagens sócio-culturais analisam o impacto da sociedade
no preconceito do indivíduo. As abordagens situacionais estudam os
modos como o meio circundante da pessoa se relaciona com as atitudes
preconceituosas. As abordagens psicodinâmicas examinam o preconceito
como sendo o resultado de conflitos pessoais e de desadaptações no
interior da pessoa com preconceitos.

As abordagens cognitivas olham para os modos como as pessoas com


preconceitos percepcionam e processam informação sobre o alvo do
preconceito. As fontes cognitivas do preconceito incluem categorização,

581
© Universidade Aberta
estereótipos, atribuição e crenças sociais. A categorização social envolve a
distinção entre endogrupo e exogrupo e o exagero de diferenças nas
crenças. Os estereótipos podem ser suscitados pela percepção exagerada
de heterogeneidade do exogrupo e da homogeneidade do endogrupo, pelas
correlações ilusórias e pelas profecias de auto-realização. A atribuição
inclui rotulagem enviesada e o erro irrevogável da atribuição, ambas
interpretações distorcidas do comportamento dos membros do exogrupo.
Crenças sociais que apoiam o preconceito podem provir de ideologias
políticas e religiosas. As pessoas que acreditam num mundo justo podem
ser mais susceptíveis de censurar as vítimas do preconceito.

Pode-se também discutir se as características do alvo contribuem para


suscitar preconceito e discriminação. Muitos autores sugerem que se pode
haver um "fundo de verdade" nos estereótipos, há exagero nas diferenças
intergrupais. As consequências do preconceito fazem-se sentir não só nas
suas vítimas, como também no próprio racista.

Várias tácticas podem ser eficazes para reduzir o preconceito. As técnicas


de tomada de consciência podem ser utilizadas pelas vítimas de
discriminação para reduzir os efeitos sobre elas e com o intuito de mudar a
sociedade. O assimilador cultural permite sensibilizar as pessoas para o
significado das diferenças comportamentais que ocorrem durante a
interacção social entre membros de grupos diferentes.

É possível reduzir os preconceitos na sociedade pelo aumento do contacto


entre os grupos que se opõem. Todavia, para que o contacto possa reduzir
o preconceito deve haver igualdade de estatuto, intimidade, cooperação
intergrupal e normas sociais que favoreçam a igualdade. Mais
recentemente os investigadores têm também examinado o modo como as
percepções dos membros de grupos minoritários e a ansiedade intergrupal
em geral podem dificultar o desenvolvimento de uma maior compreensão
entre vários grupos.

Muito embora os meios de comunicação de massa tenham muitas vezes


perpetuado estereótipos e preconceito, podem também reduzir o
preconceito mediante retratos favoráveis dos grupos minoritários e de
interacções entre os diferentes grupos.

Reconhecendo o papel das profecias de auto-realização, os psicólogos


sociais desenvolveram técnicas de aprendizagem estruturada para reduzir o
preconceito.

582
© Universidade Aberta
PARA IR MAIS LONGE

ALLPORT, G. W.

1954 The nature ofprejudice. Reading: Addison-Wesley

Trata-se de uma obra clássica sobre o desenvolvimento e a manutenção do


preconceito. Se bem que muitas das aplicações e exemplos se inspirem num
certo contexto histórico, as principais abordagens teóricas ainda são
pertinentes

DUCKITT, J.

1992 The social psychology of prejudice. New York:


Praeger.

Esta obra fornece urna revisão das causas do racismo, com um particular
ênfase na análise do racismo na África do Sul.

KATZ, P. A. e TAYLOR, D. A. (Eds.)

1988 Eliminating racism: Profiles in controvers:\,. New


York: Plenum.

Revisão da investigação sociológica e psicológica sobre a aquisição e a


eliminação do preconceito.

SIMPSON, G. E. e YINGER, 1. M.

1985 Racial and cultural minorities: An analysis of


prejudice and discrimination (Y ed.). New York:
Plenum.

Trata-se igualmente de uma contribuição clássica para o estudo dos grupos


minoritários e da discriminação. O livro inclui dezoito capítulos divididos em
três partes: causas e consequências do preconceito e da discriminação;
minorias na estrutura social: padrões institucionais de relações intergrupais;
preconceito, discriminação e valores democráticos.

583
© Universidade Aberta
TAJFEL, H.

1982/83 Grupos humanos e categorias sociais: Estudos em


psicologia social (2 volumes). Lisboa: Livros
Horizonte.

Inclui os principais escritos teóricos e empllxos de Tajfel, desde a sua


investigação inicial sobre a categorização de estímulos físicos até ao mais
recente trabalho sobre identidade social.

TAYLOR, D. M. e MOGHADDAM, F. M.

1987 Theories of intergroup relatiolls: International


social ps)'chological perspectives. New York:
Praeger.

São apresentadas contribuições de psicólogos sociais para a compreensão de


fenómenos. tais como motins sociais, intolerância religiosa e preconceito
social.

WORCHEL, S. e AUSTIN W. G. (Eds.).

1986 Psycholog)' of intergroup relatiol1s. Monterey,


CA: Brooks/Cole.

Este volume fornece um balanço das relações intergrupais. com especial


ênfase para a investigação experimental.

ACTIVIDADES PROPOSTAS

1) Apesar de uma legislação em prol da igualdade, os grupos minoritários


em Portugal têm um tratamento igual e as mesmas oportunidades que a
maioria?

2) O que é que entende por racismo? Esboce algumas notas sobre as suas
experiências pessoais neste domínio e sobre as da sua comunidade.

3) Planeie um "poster" para promover a igualdade racial.

4) Pode ver alguma semelhança entre sexismo e racismo que possa dar
conta de alguma das dificuldades em eliminar o sexismo?

584
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I
"il
I
I

5) Identifique exemplos de sexismo em anúncios e sugira como é que se


podem mudar para reduzir tal impressão.

6) Como é que o erro fundamental da atribuição contribui para o


preconceito tornando-se o "último erro da atribuição"?

7) Como é que as notícias dos meios de comunicação podem aumentar


estereótipos negativos mediante correlações ilusórias?

8) Pode referir contextos não académicos que pudessem funcionar como a


sala de aula "quebra-cabeças"?

9) A maior parte das sociedades consideram que preconceito e


discriminação são inaceitáveis, todavia o preconceito ainda perdura.
Porquê?

585
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Página intencionalmente em branco

© Universidade Aberta
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

© Universidade Aberta
Página intencionalmente em branco

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Composto e maquetizado
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1.a edição

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136 ISBN: 978-972-674-613-3

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