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TEORIA DO PENSAMENTO DE BION

Em “Formulações sobre os dois princípios do funcionamento


mental” (1911) Freud afirma: “a decepção ante a ausência da
satisfação esperada motivou o abandono de sua tentativa de
satisfação por meio de alucinações e para substituí-lo, o aparelho
psíquico teve que se decidir a representar intrapsiquicamente as
circunstâncias reais do mundo exterior, e tender à sua modificação
real”.
 
O pensamento, as emoções e o conhecimento são indissociados
entre si, sendo que o pensamento precede o conhecimento,
porquanto o indivíduo necessita pensar e criar o que não existe, ou

o que ele não conhece.


Bion, nos trabalhos: “Uma Teoria do Pensamento” (1962) e
“Elementos em Psicanálise” (1963), introduziu as seguintes
concepções:
 
Da mesma forma como para Freud, também a teoria do pensamento
de Bion tem como ponto de partida a frustração das necessidades
básicas que são impostas ao lactante.
 
Para Bion o essencial é a maior ou menor capacidade do ego do
lactante poder tolerar o ódio resultante dessas frustrações. Ele
considera fundamental se vai haver uma fuga em relação à
frustração ou uma modificação desta.
 
Bion introduz a noção de que é necessária uma distinção entre
elementos do pensamento e os pensamentos propriamente ditos.
Para Bion, “o pensar é um desenvolvimento forçado sobre o
psiquismo, pela pressão dos elementos dos pensamentos, e não o
contrário”.
Na realização positiva há uma confirmação de que o objeto
necessitado está realmente presente e atende às suas
necessidades.
 
Na realização negativa, o lactante não encontra um seio disponível
para a satisfação e essa ausência é vivenciada como a presença de
um seio ausente e mau dentro dele.
 
Para Bion todo objeto necessitado, em princípio, é sentido como
sendo mau porque se ele o necessita é porque não tem posse dele;
logo, esses objetos são maus porque a sua privação provoca muito
sofrimento.
 
Se a capacidade inata do ego para tolerar as frustrações for
suficiente, a experiência do “não seio” torna-se um elemento do
pensamento (protopensamento) e se desenvolve um aparelho
psíquico para “pensá-lo”.
Se a capacidade inata para tolerar as frustrações for insuficiente, o
“não seio” – mau -, deve ser evadido e expulso pelo emprego de
maciças identificações projetivas.
 
As experiências de realização negativa são inerentes e
indispensáveis à vida humana, e elas podem seguir dois modelos de
desenvolvimento:
 
Se o ódio resultante da frustração não for excessivo à capacidade do
ego do lactante em suportá-lo, o resultado será uma sadia formação
do pensamento, através da “função α”, a qual integra as sensações e
as emoções.
 
A função α é a primeira que existe no aparelho psíquico e é ela quem
vai transformar as sensações e as primeiras experiências
emocionais em elementos α.
 
Os elementos α são processados pela função α, são utilizados pela
mente para a formação de sonhos, recordações e para as funções de
simbolizar.
Os elementos α formam um conjunto denominado de “barreira de
contato” que resulta do conjunto formado pelos elementos α,
demarca a fronteira de contato e de separação entre o consciente e
o inconsciente.
 
Se o ódio resultante da frustração for excessivo, os elementos do
pensamento que se formam, denominados “elementos β”, não se
prestam para a função de serem pensados e precisam ser
imediatamente aliviados, portanto, descarregados pela criança.
 
Os elementos β são protopensamentos, ou seja, experiências
emocionais e sensoriais primitivas e que, portanto, não puderam ser
pensadas até um nível de conceituação ou de abstração, elas devem
ser expulsas e evacuadas para fora.
 
Os elementos β formam um conjunto denominado de “pantalha ou
tela β” a qual não possibilita uma diferença entre o inconsciente e o
consciente, entre a fantasia e a realidade e nem a elaboração de
sonhos.
A essência da formação dos pensamentos úteis depende não só da
capacidade de tolerância às frustrações, como também da
capacidade em suportar as depressões, ou seja, vai depender
basicamente do modo da passagem da posição esquizo-paranóide
para a posição depressiva.
 
A relação entre o pensador e o pensamento, sob o modelo
continente-conteúdo, foi estudada por Bion e, segundo ele, adquire
três formas:
 
•A primeira é a forma parasitária, na qual o pensador e o pensamento
novo se desvitalizam, se destroem entre si e se nutrem de mentiras
que funcionam como uma barreira contra a verdade.

•A segunda é a forma comensal, em que o pensador convive com o


seu pensamento sem grandes atritos e, se não impede a evolução,
também não possibilita grandes mudanças.
 
•A terceira é a forma simbiótica, pela qual o pensador e o
pensamento se harmonizam e se beneficiam mutuamente entre si.
TEORIA DO CONHECIMENTO DE BION
O eixo central da formação do Conhecimento e do Pensamento é a
maior ou menor capacidade do ego da criança em tolerar as
frustrações decorrentes das privações. A criança tanto pode fugir
dessas frustrações, criando mecanismos que evitem conhecê-las (ela
evita o problema, mas não evita a angústia), como pode aprender a
modificar a realidade, através da atividade do pensar e do conhecer.
 
O desenvolvimento cognitivo da criança será mais ou menos exitoso
dependendo de três fatores:

 de como a mãe real utiliza o seu próprio pensar e conhecer e de


como contêm as angústias do seu filho;

 da capacidade da criança quanto à formação de símbolos;

 do desejo de conhecer a respeito dos conteúdos mentais como


estando intimamente relacionado com as emoções de amor e ódio.
VÍNCULOS L, H, K
O termo vínculo designa uma experiência emocional pela qual duas
ou mais pessoas, ou duas partes de uma mesma pessoa estão
relacionadas entre si.
 
VÍNCULO DO AMOR (L)
Até 1920 o trabalho psicanalítico estava praticamente reduzido a um
enfoque centralizado quase que exclusivamente nas pulsões
libidinais.
 
À medida que os conhecimentos da teoria e prática da psicanálise
foram evoluindo, tornou mais claro que:
 as demandas por amor não são unicamente de natureza libidinal e
sexual (conforme formulação original de Freud);
 as manifestações de amor provenientes do Instinto de Vida são
inseparáveis do Instinto de Morte;
 as demandas por amor procedem de uma fonte original muito
anterior: na relação diádica com a mãe, e elas estão representando
uma necessidade de preenchimento de vazios afetivos, para garantir
a sobrevivência psíquica.
VÍNCULO DO ÓDIO (H)
 
Principalmente a partir das concepções da escola kleiniana, os
psicanalistas passaram a valorizar o vínculo do ódio como sendo
um integrante fundamental de toda e qualquer relação objetal, intra
ou interpessoal.
 
VÍNCULO DO CONHECIMENTO (K)
 
O vínculo K foi conceituado por Bion como sendo aquele que
existe entre um sujeito que busca conhecer um objeto e um objeto
que se presta a ser conhecido. Representa também um indivíduo
que busca conhecer a verdade acerca de si mesmo.
Bion aprofundou-se nas particularidades do vínculo do
Conhecimento, correlacionando-o com:

 outras funções do ego, como a do pensamento, linguagem, juízo


crítico etc.;
 com os problemas relativos à Verdade, Falsidade e Mentira;
 com Ataque aos Vínculos, os quais permitiriam a percepção das
intoleráveis verdades, tanto as externas como as internas;
 a substituição do Conhecimento pela tríade: Arrogância,
Estupidificação e Curiosidade Maligna.
 
Em síntese, podemos afirmar que esses três tipos de vínculos são
indissociados entre si e dependem, diretamente, tanto da disposição
hereditária da criança como, e, principalmente, da capacidade de
reverie da mãe.
Se a capacidade de reverie da mãe for suficiente a criança terá
condições de fazer uma aprendizagem com as experiências das
realizações positivas e negativas impostas pelas privações e
frustrações e, neste caso, ela desenvolve uma função K.
 

Se a capacidade de reverie da mãe for insuficiente a criança


desenvolve um vínculo –K (a mãe é introjetada pela criança como
uma pessoa que a destitui de seus objetos bons e a obriga a ficar
com os objetos maus), ou pode resultar num vínculo “não K”.
PRINCIPAIS CONTRIBUIÇÕES DO TRABALHO DE BION
Os trabalhos que Bion desenvolveu com grupos contribuíram para o
desenvolvimento dos seguintes aspectos:
 
•Ele foi o criador pioneiro de uma série de concepções totalmente
originais acerca da dinâmica de grupo, através de experiências
realizadas com grupos, em distintos locais e com diferentes
objetivos. Da mesma forma, ele empregou uma terminologia inédita e
que ainda mantém sua vigência na atualidade.

•Bion propiciou um melhor entendimento da dinâmica inconsciente


profunda dos grupos – os Supostos Básicos – que estão sempre
subjacentes ao nível de qualquer “Grupo de Trabalho”, o qual opera
voltado para uma tarefa comum.

•Os seus estudos acerca da relação do “místico”, “gênio” ou


“messias” (o indivíduo contestador e inovador) com o establishment
alargaram o entendimento da psicologia dos grandes grupos, nos
planos social, político, religioso, psicanalítico etc.
Algumas estratégias que o establishment costuma utilizar para se
livrar do místico, segundo Bion, se referem a:

1. A sua expulsão pura e simplesmente.

2. A configuração do papel de bode expiatório.

3. Uma aparente aceitação formal de sua pessoa, acompanhada


por uma total indiferença às suas idéias.

4. Uma absorção e integração do místico ao establishment,


enaltecendo-o com tarefas administrativas e outras honrarias,
porém, esvaziando-o ideologicamente.

5. A aceitação lenta e surda das idéias novas, porém, quando


essas idéias se tornam reconhecidas, fecundadas e publicadas,
elas são tratadas como se fossem provenientes do próprio
establishment da instituição.
Criou um método original e duradouro de seleção de oficiais para as
Forças Armadas.
 
Propiciou o desenvolvimento de métodos de ensino em grupos.
 
Demonstrou um método de conduzir os debates com um público
grande, posto que freqüentemente ele provocava uma dinâmica de
grupo com o auditório.
 
Promoveu uma significativa mudança na prática da psicoterapia
analítica de grupo.
 
Todos os escritos de Bion sobre grupos foram reunidos em uma
única publicação, em 1961, sob o título: “Experiências em Grupos”.
ALGUMAS COMPARAÇÕES ENTRE FREUD (1856-1939), M. KLEIN
(1882-1960) e BION (1897-1979)
O mundo de Freud é um universo de seres humanos que buscam
alívio para os constantes estímulos internos e externos que estão
submetidos. O aparato psíquico deve tratar de resolver estas
pressões do melhor modo possível.
 
Para Freud, o crescimento da mente era a realização natural de
processos inatos e acidentais.
 
Freud colocava que o ser humano ao resolver seus conflitos podia
encontrar a satisfação de suas pulsões. Para Freud, o juízo de
realidade depende das experiências de satisfação.
 
Para Freud, o aparato psíquico é um modelo pulsional (polaridade
prazer/desprazer).
 
Freud conectou a função do conhecimento da criança com as suas
pulsões libidinais ligadas à relação entre os pais. Refere-se a estas
tendências como “Instinto do Saber ou de Pesquisa” e as liga tanto a
uma maneira sublimada de obter domínio como a uma forma de
utilizar a energia ligada à curiosidade em torno da sexualidade,
especialmente a que se refere ao enigma da origem dos bebês.
O mundo de M. Klein é um universo de bebês ameaçados pelo
instinto de morte e a inveja primária. O aparato psíquico é um
mediador cujas escalas de valores são éticas e morais.
 
Para M. Klein, um adequado desenvolvimento da mente depende do
alimento e da proteção adequada.
 
M. Klein vislumbrava o ser humano como podendo ser melhor.
 
Para M. Klein, o juízo de realidade depende das experiências de
segurança.
 
Para M. Klein, o aparato psíquico é um modelo quase teológico da
mente (polaridade bom/mau).
 
M. Klein relacionou a “Pulsão de Saber” com a pulsão sádica de
controlar e dominar, sendo que o conhecimento seria um meio de
controlar a ansiedade. Estudou a curiosidade inata da criança para
conhecer o mistério do interior do corpo da mãe e a relacionou com
as funções intelectuais.
O mundo de Bion é o de uma mente indagante que busca a verdade,
mas com um aparato psíquico inadequado.
 
Para Bion, o crescimento da mente se expressa pela aquisição da
capacidade de pensar acerca das experiências emocionais que
permitem ao ser humano aprender através da experiência.
 
Bion concebia o ser humano como mais capaz de tolerar a verdade
sem recorrer à mentira como escudo.
 
Para Bion, o juízo de realidade depende dos sentimentos de
confiança.
 
Para Bion, o aparato psíquico é um modelo epistemológico da mente
(polaridade verdade/mentira).
 
Bion concebeu a formação do Conhecimento de uma forma
indissociada da formação dos Pensamentos, sendo que ambas se
originam, inicialmente, como uma reação à experiência primitiva
decorrente da ausência do objeto.
 

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