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Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande
Mestrado em Letras • UEMS / Campo Grande
ISSN: 2178-1486 • Volume 4 • Número 11 • Novembro 2013
RESUMO: O objetivo deste artigo é mostrar um ponto de vista pluricultural em que os conceitos em
torno da diglossia (sob o enfoque do bidialetalismo) e do bilinguismo (sob a abordagem plurilíngue)
sejam tomados como complexos fenômenos linguísticos que abrangem relações sociais e culturais mais
amplas. A referida temática poucas vezes é abordada em sala de aula, mesmo em nível superior. Por isso,
defende-se a necessidade de rever e refletir sobre ambos os conceitos e com eles trabalhar para que possa
haver uma linguística educativa plurilíngue no contexto escolar. Até porque, um dos problemas
observados é em torno das línguas de imigrantes que ainda são ensinadas nas comunidades, tanto
ideológica como metodologicamente, como línguas estrangeiras, sem respeitar e tratar os dados sócio-
históricos referentes à origem étnica e à hibridização interna dos dialetos com a língua institucionalizada.
Situação devida, em grande parte, às políticas linguísticas repressivas e homogeneizadoras ao longo da
história linguística do Brasil. A fim de refletir sobre esse cenário, primeiramente, neste estudo, será feito
um levantamento bibliográfico acerca dos conceitos de bilinguismo e diglossia, para após, mencionar os
contextos linguísticos e sociocultuais de regiões de imigração, propondo, na sequência, dentro da
sociolinguística, uma linguística educativa bilíngue que possa contribuir para que, realmente, os direitos
linguísticos destes grupos minoritários sejam respeitados.
ABSTRACT: The purpose of this paper is to show a pluricultural point of view in what the concepts
around diglossie (on the focus of bidialetalism) and bilingualism (on a plurilingual approach) are seen as
complex linguistic phenomenons that engage wider social and cultural relationships. The referred
thematic is broached few times in the classroom, even in graduation level. Because of it, it is defended the
necessity of reviewing and reflecting about both concepts and work with them to make an educative
plurilingual linguistic in the school context. Even why, one of the problems observed is about the
immigrants languages that are still taught on the communities, as ideologically as methodologically, like
foreign languages, without respecting and treating sociohistorial data witch refer to the ethnic origin and
the inner hybridization of the dialects with the institutionalized language. Situation under, in great part,
the reprehensive and homogenizer linguistic politics through the Brazilian linguistic history. To reflect
about this scenery, first, in this research, it is going to be made a bibliographic survey about the concepts
of bilingualism and diglossie to, after that, mention the linguistic and sociocultural contexts from
immigration regions, proposing, on the sequence, inside the sociolinguistic, a bilingual educative
linguistic which can contribute to, actually, the linguistic rights of these minority groups be respected.
1
Aluna do Doutorado do Curso de Pós-Graduação Stricto Sensu em Letras – nível de Mestrado e
Doutorado, da Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste), bolsista da CAPES. Orientada pela
Profa. Dra. Clarice Nadir von Borstel.
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Aluna do Mestrado do Curso de Pós-Graduação Stricto Sensu em Letras – nível de Mestrado e
Doutorado, da Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste). Orientada pela Profa. Dra. Clarice
Nadir von Borstel.
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INTRODUÇÃO
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a) a Constuição atual em seus artigos 215 e 216 admite que o Brasil é um país
pluricultural e multilíngüe; b) no Brasil coexiste um grande número de
línguas de imigrantes; c) para integração cultural e lingüística das
comunidades de imigrantes no território nacional pouco foi feito e ainda
persiste o desprezo por minorias lingüísticas, revelando a discriminação legal
para as comunidades de língua materna não portuguesa; d) a pluralidade
lingüística no Brasil delineia situações diversas de bilingüismo e
multilingüismo e somente a educação indígena está contemplada com
propostas curriculares de educação bilíngüe na Lei de Diretrizes e Bases
(LDB) de 1996 (SAVEDRA, 2003, p. 40).
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Dessa forma, ao longo do tempo e da história das línguas, pode-se notar que os
falantes tiveram contatos com as mais diversificadas realidades linguísticas.
Porém, foi apenas a partir do século XX que o conceito de bilinguismo se tornou
cada vez mais amplo e complexo, não havendo até a atualidade uma concordância entre
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os pesquisadores sobre o que é ser um sujeito bilíngue, pois há várias acepções em torno
dessa conceituação, em diferentes campos investigatórios do saber, como, por exemplo,
na área da psicolinguística, da sociologia, da sociolinguística e da própria linguística.
De maneira geral, por muito tempo perdurou a ideia de que ser bilíngue era a
pessoa capaz de falar duas línguas simultaneamente, ou seja, alguém que dominasse
totalmente dois sistemas linguísticos diferentes.
Bloomfield (1933 apud HEYE, 2006) foi um dos pioneiros ao conceituar o
bilinguismo, afirmando que para ser bilíngue é preciso falar “perfeitamente” duas
línguas, como um nativo em ambos os códigos linguísticos. Porém, conforme essa
concepção, grande parte dos bilíngues seria excluída devido à necessidade do falante de
ter que dominar todos os aspectos das línguas faladas, o que geralmente não acontece.
Sob semelhante viés, Halliday (apud MAHER, 2007) considera que o sujeito
bilíngue é aquele que sabe utilizar todos os domínios nas duas línguas e, acrescenta,
ainda, que não pode haver a interferência de uma língua na outra. Também uma visão
restrita do conceito de bilinguismo que percebe o falante como idealizado, como se
fosse possível exibir comportamentos idênticos em duas línguas e sem nenhuma
interferência.
Outra visão pouco abrangente do conceito se tem em Malmberg (1977 apud
VON BORSTEL, 2001). Para o referido autor, é preciso haver uma completa habilidade
funcional do bilíngue que seria
[...] um indivíduo que, além de sua língua materna adquiriu desde a infância,
ou desde muito cedo, uma segunda língua por meios naturais (em princípio
não através de instrução formal), de modo que se tornou um membro
totalmente competente da outra comunidade lingüística dentro da esfera do
grupo ocupacional ou social ao qual ele pertence (MALMBERG, 1977, apud
VON BORSTEL, 2001, p. 12).
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Por essa visão, é possível perceber que o bilinguismo vem sendo visto, cada vez
de uma maneira próxima das situações reais de fala, da competência linguística
comunicativa e da interação entre os falantes em um dado contexto sociocultural.
Levando em consideração o contexto brasileiro, essas novas reflexões acerca
dessa discussão auxiliam nos estudos em torno do bilinguismo de descendentes de
imigrantes; de falantes das línguas indígenas, de fronteiras que foram sendo oprimidas
ao longo dos anos; de surdos, entre outros.
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determinado grupo social que muito provavelmente irá utilizar-se da língua para efetivar
essa afirmação.
Heye (2006) também menciona o conceito de diglossia, proposto,
primeiramente, por Ferguson (1974) que se referia ao uso de duas variedades
linguísticas distantes de uma mesma língua. Foi ele quem introduziu esse vocábulo
(com base no termo francês diglossie) para designar certa situação linguística, em que
“duas variantes de uma língua coexistem numa mesma comunidade, cada uma
desempenhando um papel definido” (FERGUSON, 1974, p. 99).
A partir da análise da situação linguística de quatro comunidades (Suíça, Haiti,
Grécia e países árabes) e suas respectivas línguas, Ferguson (1959) distinguiu duas
variantes da mesma língua: «high variety» = variante alta e «low variety» = variante
baixa, sendo que as duas variedades fariam parte do mesmo diassistema.
Define o autor que,
Por essa definição, poderia ser citado o alemão padrão, o Hochdeutsch, como a
variedade “alta” e o alemão suíço, Schwyzerdütsch, como a variedade de uso, pois as
duas variedades fazem parte do mesmo diassistema: a língua alemã, na Suíça. Dessa
forma, “A variedade ‘baixa’ é caracterizada pela aquisição natural do ambiente familiar,
seu uso é informal e, predominantemente, oral. A variedade ‘alta’ se caracteriza pela
aprendizagem formal, seu uso formal e literário” (HEYE, 2006, p. 395).
Embora Ferguson tenha sido fundamental para as bases teóricas dos estudos da
diglossia, há demasiada abstração nessa teoria, além disso, a análise de uma LE não
pode ser tão exata como a de um nativo.
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“Vemos que o discurso sobre a diglossia depende e se desenvolve em sua própria dinâmica, segundo o interdiscurso
acadêmico e político em que se encontra” (HAMEL; SIERRA, 1983, p. 100, tradução nossa).
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Também esses contextos podem ser considerados bidialetais, uma vez que
coocorrem variedades consideradas, em certos lugares, como de menor prestígio social
do português, ou de alguma outra língua, com a variedade padrão da língua.
Situação que acontece no município de Marechal Cândido Rondon, localizado
no Oeste do Paraná, onde a maior parte da população é descendente de imigrantes
alemães e, portanto, bilíngue em vários contextos, principalmente as pessoas da faixa
etária de 45 a 85 anos na interação comunicativa em contexto familiar, vizinhos ou em
grupos mais próximos de suas relações sociais.
Cabe ressaltar que o crescimento do fluxo imigratório ocorreu na segunda
metade do século XIX com a participação de várias etnias/nacionalidades, destacando-
se portugueses, italianos, espanhóis e alemães.
No caso dos alemães vários se tornaram proprietários de terras, com a tendência
para a formação de colônias (pequenas áreas de terras) mais ou menos homogêneas.
Tais deslocamentos ganharam mais intensidade e abrangência a partir da segunda
década do século XX, chegando ao Oeste catarinense e ao Sudoeste e Oeste
parananense.
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Essa situação dos “deslocados” se torna ainda mais grave e complexa quando
constatamos que os grupos descendentes de imigrantes sofrem duplo
preconceito. Quando falam alemão, falam um alemão corrompido, que “não é
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Desta forma, a língua de herança está se perdendo no município, sendo cada vez
menos falada e ouvida. Muitos descendentes consideram este cenário uma perda
linguística e cultural imensurável, no entanto, quase nada tem sido feito pela
comunidade ou pelo poder público municipal para que a língua seja valorizada e/ou
revitalizada.
De semelhante maneira, o município de Medianeira, Paraná, foi povoado, em
sua grande maioria, por migrantes vindos do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina,
descendentes de imigrantes alemães e italianos. A colonização do núcleo que fundou o
atual município foi feita pela empresa Industrial Agrícola Bento Gonçalves. O incentivo
para a migração gaúcha e catarinense foi feita por intermédio da propaganda paulista
"Marcha para o Oeste", que se propagou.
Em um primeiro momento, Medianeira foi distrito do território municipal de Foz
de Iguaçu e, na sequência, pela Lei Estadual nº 4245, de 1960, foi transformado em
município.
Colognese (2004) menciona que 54,5% dos imigrantes que se estabeleceram na
região Oeste do Paraná eram italianos, os quais contribuíram para a formação de
comunidades italianas nas cidades de Matelândia, São Miguel, Céu Azul, Medianeira,
Palotina, Cascavel, entre outros. Os mesmos, a exemplo do que aconteceu com os
alemães, tiveram que se adaptar à nova realidade, mas tentaram perpetuar sua religião,
cultura e língua.
Contudo, Colognese (2004) atenta para o fato de que a saída das terras de origem
não foi, geralmente, um ato espontâneo, mas o resultado das condições de miséria, que
parte da população italiana passava naquele período, principalmente os camponeses do
norte do país.
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social. Assim, “para a sociedade majoritária, quem, pois, fala alemão é visto como
colono, ou seja, tem pouca instrução e fala um dialeto, isto é, uma língua considerada
inferior” (FRITZEN, 2008, p. 144, grifos da autora). Também a língua italiana é
considerada de minorias e muitos estudos mostram a falta de perpetuação da mesma, em
comunidades de imigrantes, o que pode denotar o preconceito linguístico e uma visão
distorcida sobre os falantes bilíngues.
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Considerações finais
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REFERÊNCIAS
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