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Prólogo

O taberneiro tomou um tempo para observar os estranhos integrantes daquele


grupo, todos viajantes, que partiriam ao amanhecer. Ou, pelo menos, fora isso que
eles disseram. Chegaram durante os últimos raios de sol, todos a pé, a não ser uma
figura encapuzada, que montava em um cavalo cansado, tão esfarrapado quanto
todos os membros do grupo. O cavalo era grande, e apesar do barro encrustado em
seu pelo, seu cavalariço afirmara que era de um negro estonteante. A sela e os
arreios eram usados, e o couro fora remendado em vários lugares, às vezes com
fios, as vezes com metal, as vezes com panos. A sela surrada e a barrigueira tinham
que ser amarradas, pois suas fivelas haviam estragado a muito tempo, e apenas
restos de algo enferrujado estava costurada às tiras de couro.
Tão intrigante quanto o cavalo, o primeiro integrante que entrou na taberna
era, no mínimo, curioso. Ele chegara quando havia somente três homens na
taberna. Tavon Hardy era um mercador que passava pela pequena vila todo último
dia de semana, quando os homens de paz saiam da capela à Pelor, e se dirigiam
para a rua, onde crianças corriam e brincavam, enquanto adultos conversavam,
reclamando sobre as mesmas coisas que seus pais, e os pais antes deles
conversavam: o tempo, perigo na estrada, os impostos, e fofocas locais. Esse
momento era perfeito para Tavon Hardy vender suas bugigangas, e trocar moedas
de cobre por panos limpos, pedaços de estopa e aniagem. Ele sempre passava na
taberna à noite, para vender ingredientes, e beber uma ou duas canecas de
hidromel, dormir em uma dura cama de palha, para que estivesse pronto para a
viagem do dia seguinte.
Os dois últimos eram pai e filhos, famosos na taberna local. Adler Tully, e seu
filho Marc Tully, tinham o melhor café da região, e a fama dos maiores beberrões da
vila. Chegavam cedo para que pudessem pegar a mesa mais perto do fogo, já que
estavam correndo os primeiros ventos do inverno. Quando estava quente,
chegavam cedo para pegar os bancos do bar mais perto da janela, aonde a brisa
fresca do verão refrescava os clientes da taberna. Nenhum deles estavam
preparados para o grupo estranho que ocuparia uma mesa de cinco lugares.
O primeiro a passar pela porta foi um homem branco e sem cabelo ou
sobrancelhas. Suas pupilas eram alvas, e por um momento, Adler achou que era um
cego. Usava uma surrada túnica branca por baixo de uma capa esfarrapada de
viajante. Seus movimentos eram incomuns, estranhamente límpidos e fluentes,
como se homem estivesse em uma dança. Sem falar nada, e olhar para alguém,
sentou-se na primeira mesa que encontrou, sem dar nenhuma palavra.
Atrás dele, um anão gorducho com enormes cabelos ruivos e uma barba que
chegava aos seus calcanhares adentrou bamboleante. Tinha nas costas um enorme
martelo, quase do seu tamanho, cheio de escritas rúnicas. Usava uma armadura
improvisada, obviamente com partas de uma roupa, partes de outra, alguns lugares
eram couro, enquanto outros eram ferro ou prata. O capacete parecia
extremamente decorado e feito com ouro e prata, apesar de estar riscado e
desgastado. Na hora que entrou, bateu com sua enorme mão na maior das dobras
de sua barriga e abriu um enorme sorriso de dentes tortos e amarelos antes de
falar, com uma voz de trovão, que preencheu toda a sala:
- Avandra, como senti falta de um hidromel!
Depois do anão, seguiu-se um homem de cabelos castanhos extremamente
curto: as mais longas mexas terminavam em suas bochechas. Usava uma armadura
com o símbolo de um lobo, o símbolo do norte, apesar do taberneiro saber que
dificilmente aquela armadura realmente lhe pertencia. Foi naquele momento que
percebeu que aqueles viajantes eram perigosos. Apesar dos dentes brancos do
homem se abrirem em um sorriso, seus olhos cinzentos vasculhavam a sala em
torno de qualquer ameaça. Sua espada estava somente presa ao cinto, sem uma
bainha apropriada, continha manchas de ferro e algumas manchas mais escuras
que pareciam sangue.
De mãos dadas ao homem, uma mulher encapuzada com um enorme arco
revertido em seu ombro entrou, sorria de algo que o homem lhe dissera fora da
taberna, mas ninguém conseguiu ver mais nada nela, nem ao menos uma aljava.
Usava um capuz levantado e sua roupa parecia ser feita sob medida, com um lindo
couro negro. Mas era só.
O último era um jovem de no máximo uns dezesseis anos, que continha duas
facas em sua bainha. Usava uma túnica verde com alguns frascos em seu cinto,
olhava para os lados com frequência, não demonstrando nenhuma reação. Era mais
como se estivesse intimidado do que outra coisa. Usava uma capa em farrapos
vermelha. Tinha um cabelo no comprimento do pescoço negro como a noite, e seus
olhos eram de um verde estonteante. Este fechava o grupo.
Eles estavam ali a algum tempo, deixando todos extremamente sem graça e
nervosos. Estavam enlameados, cheios de poeira, ferrugem e sangue seco. Fediam
a estrada, chuva, e cavalo. Todas as roupas pareciam roubadas e quando Ratley, o
dono taberna, pediu para que retirassem as armas, todos negaram
veementemente, alegando que precisavam delas perto de si. Falavam alto demais e
riam de tudo, antes mesmo que ficassem bêbados. O primeiro, que usava uma
túnica, pediu água e um pouco de pão. Tostado, disse. Preto por fora e crocante por
dentro. Não, não queria manteiga. Não, não queira doce de abóbora. Queria o pão
“imaculado”, seja lá que diabos significava aquilo.
O anão pediu um pequeno barril de hidromel. Pediu que misturasse junto dele, o
vinho de Ingram, um dos mais fortes conhecidos. Pediu frango amanteigado,
recheado com o doce de abóbora. Um inteiro. Para acompanhar, pediu frutas
silvestres e também, falou que para a sobremesa, queria uma quente torta de
morango ou banana, o que estivesse por trás do bar. O anão também perguntou
descaradamente por um bordel nas redondezas, sendo acotovelado por seus
comparsas logo em seguida. O homem pediu um prato com arroz, carne de coelho
e ervilhas, e para acompanhar, uma caneca de hidromel. A misteriosa moça
encapuzada, pediu suco de pêssego e requeriu que Ratley cortasse pedaços de
frutas como mangas e maçãs para ela.
Por fim, o jovem pediu alguma salada. Salada verde. Pediu que o homem
esmagasse rosa-salva, ervas daninhas e flores de campo com farinha e água e lhe
desse para beber.

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