Você está na página 1de 6

Anais do XIX Encontro de Iniciação Científica – ISSN 1982-0178

Anais do IV Encontro de Iniciação em Desenvolvimento Tecnológico e Inovação – ISSN 2237-0420


23 e 24 de setembro de 2014

A FORMAÇÃO DO PSICÓLOGO NO BRASIL: COMPROMISSOS


COM A REALIDADE?
Priscila de Sales Oliveira Raquel Souza Lobo Guzzo
Faculdade de Psicologia Avaliação e Intervenção Psicossocial: Prevenção,
Centro de Ciência da Vida Comunidade e Libertação
priscila.so@puccampinas.edu.br Centro de Ciências da Vida
rguzzo@puc-campinas.edu.br

RESUMO apresentando como a solução para os problemas da


Este trabalho teve por objetivo realizar um humanidade em escala mundial [2]. Também, o Ban-
levantamento sobre as políticas de formação do psi- co Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento
cólogo brasileiro a partir dos documentos oficiais – BIRD, e o Fundo Monetário Internacional – FMI,
produzidos para o ensino superior no Brasil, mais ambos criados em 1944, atuaram diretamente, ao
especificamente, as Diretrizes Curriculares Nacionais longo da segunda metade do século XX, em países
para os cursos de Psicologia, instituídas em 2004. de terceiro mundo, articulando as relações econômi-
Realizou-se um levantamento bibliográfico em bases cas entre as nações com os ajustes estruturais ne-
de dados online, selecionando os artigos publicados cessários à condução ao globalismo econômico,
a partir de 2004 que tiveram como tema de discus- dentre eles: busca de equilíbrio orçamentário, abertu-
são a formação em Psicologia. A análise crítica so- ra comercial, liberalização financeira, desregulamen-
bre princípios que regem a formação do psicólogo, tação do mercado interno e das relações de trabalho,
baseando-se numa perspectiva marxista de análise redução dos gastos públicos e, aquele que leva aqui
de seu contexto, tornou possível identificar as con- um maior destaque no que atinge a Educação, a
tradições presentes no documento e em sua aplica- privatização de empresas e serviços estatais ou pú-
ção nos cursos. Também se observou que há pou- blicos [3]. Para o Ensino Superior, especificamente,
cas discussões sobre a formação, se comparado à significou flexibilidade e diferenciação entre as insti-
discussão sobre áreas mais específicas e tradicio- tuições, com incentivo ao progresso das instituições
nais da atuação do psicólogo. privadas de ensino [5].
Como resultado deste movimento, no ano de
2012, o país já contava com 2.112 IES privadas, e
Palavras-chave: Formação em Psicologia, políticas com apenas 304 públicas [4]. Para Calderón e Fran-
de formação, Diretrizes Curriculares Nacionais. ça [5], a privatização do Ensino Superior significava
abandonar uma política nacional de valorização da
educação como um bem público para submeter-se
Área do Conhecimento: Ciências Humanas, Psico-
logia. às imposições do neoliberalismo.

1.2. O capitalismo e a formação em Psicologia no


1. INTRODUÇÃO
Brasil

1.1 O Impacto das políticas econômicas na Educa- Os cursos de Psicologia no Brasil não estiveram
ção alheios a tal movimento. Segundo o INEP [6], desde
Tendo em vista o capitalismo como elemento 1997, o número de estudantes de Psicologia nas IES
fundamental na construção de uma sociedade-arena, privadas aumentou de tal forma que, em 2012, 82%
na qual a luta pela riqueza se desenvolve [1], tal dos formandos provinham de instituições particulares
parâmetro carrega uma condição de relações de [4]. Esse crescimento foi visto com preocupação por
exploração que, para Marx, precisaria ser superada. profissionais da área, uma vez que tal alastramento,
Em nossos dias, no entanto, o neoliberalismo eco- ocorrendo sem o acompanhamento de qualidade,
nômico tem sido o mecanismo que qualifica o mer- traria um descompasso entre o profissional que esta-
cado como a única instituição capaz de coordenar va sendo formado e o que se desejaria formar [7].
racionalmente os problemas econômicos e políticos Ainda na década de 90 algumas oposições da
[2]. Em expansão, como sistema econômico, desde a formação começaram a ser discutidas, como os di-
pós segunda grande guerra, de forma ampla se lemas entre formar psicólogos generalistas ou espe-
Anais do XIX Encontro de Iniciação Científica – ISSN 1982-0178
Anais do IV Encontro de Iniciação em Desenvolvimento Tecnológico e Inovação – ISSN 2237-0420
23 e 24 de setembro de 2014

cialistas; entre um currículo rígido ou flexível; entre ção e instituição das Diretrizes, em 2004. Faz-se
cursos teóricos ou essencialmente práticos; além dos então a seguinte questão: e no período que se se-
dilemas éticos referentes à formação. Para solução guiu a estes fatos? Discute-se a formação depois da
de tais questões, mudanças curriculares começaram instituição das DCN?
a ser consideradas [8].
Duran [8], trabalhando em parceria com o OBJETIVOS
CFP, realizou um levantamento de posicionamentos Objetivo Geral
de vários profissionais da área de ensino da Psicolo-
gia, buscando reunir posicionamentos diversos sobre Evidenciar discussões posteriores à instituição das
questões relevantes da formação, que permaneces- DCN´s quanto à formação do psicólogo e em que
sem como entraves nos processos de revisão curri- direção esta formação se situa.
cular. Em seus resultados, as necessidades que
mais se destacaram foram: o direcionamento de uma
Objetivos Específicos
formação para a realidade de nosso país, a união de
uma formação teórica com a prática e a multidiscipli- (a) Discutir a construção histórica do conhecimento
naridade. psicológico para o atendimento das necessidades e
Semelhantemente, Guzzo [9] afirma que o demandas da classe dominante.
comprometimento com a realidade brasileira deveria (b) Marcar aspectos positivos e negativos da forma-
se estabelecer por meio de uma formação politizada ção profissional provocados pelas Diretrizes Curricu-
e crítica, para a libertação da formação hegemônica lares Nacionais em Psicologia.
que se faz presente na grande maioria das universi- (c) Contextualizar a produção científica sobre a for-
dades do país. mação de Psicologia a partir da aprovação das Dire-
trizes Curriculares Nacionais.

1.3. As Diretrizes Curriculares Nacionais para os MÉTODO


cursos de Psicologia no Brasil Metodologia

A partir de 1995, o MEC nomeou comissões de Este estudo se propôs a discutir e confrontar
as políticas de formação no Ensino Superior, especi-
especialistas para tratar da elaboração das Diretrizes
almente as políticas que envolvem a formação em
Curriculares Nacionais para os cursos de Psicologia
Psicologia, as DCN`s, com a ideologia de construção
– DCN e, até a instituição da versão final do docu-
do conhecimento, sustentadas para a alienação e
mento, em 2004 [10], travaram-se diversas discus- manutenção de uma ordem social. Para tanto, reali-
sões entre grupos de opiniões opostas, a favor de zou-se um levantamento bibliográfico de artigos
interesses distintos, basicamente entre dois grupos: acerca da formação em Psicologia.
aqueles que defendiam uma formação em três dife- Através das lentes do método materialista
rentes perfis: bacharelado, licenciatura e formação histórico-dialético, este trabalho busca compreender
do psicólogo; e o grupo que desejava um perfil único, as origens historicamente construídas dos fenôme-
abrangente e pluralista. Diante de tais divergências, nos sociais, investigando-as nas formações socioe-
a comissão sugeriu aos grupos que elaborassem um conômicas e nas relações de produção. Sustenta-se
documento comum, que superasse os desacordos, em uma interpretação dialética do mundo, por meio
tendo então como resultado o documento citado da qual é possível admitir as transformações da ma-
anteriormente, em 2004, que define os eixos estrutu- téria e aceitar que estes fenômenos estão em movi-
rantes aos quais os cursos devem compor sua for- mento [13].
mação, com base em um núcleo comum, constituído O levantamento bibliográfico, tal como foi re-
de competências básicas, que garantem a identidade alizado, é um recurso que, de acordo com Antunes
dos cursos de Psicologia no país [11]. Em 2011, foi [14], possibilita recuperar o passado, a partir de um
atualizado com o estabelecimento de normas para o olhar do presente, considerando as limitações deste
projeto pedagógico complementar para a Formação processo. Entende-se que não se pode reaver o
de Professores de Psicologia [12]. passado em sua totalidade mas, reconhecendo que
A história aqui contada sobre a formação em seus elementos disponíveis podem elucidar suas
Psicologia no Brasil expõe momentos nos quais a contradições e a dinâmica de seus movimentos,
discussão sobre a formação no país se mostrou de- permite-se então admiti-lo como uma base de sus-
terminante na busca de soluções para os impasses tentação para a compreensão do presente.
vigentes, como aconteceu às vésperas da elabora-
Anais do XIX Encontro de Iniciação Científica – ISSN 1982-0178
Anais do IV Encontro de Iniciação em Desenvolvimento Tecnológico e Inovação – ISSN 2237-0420
23 e 24 de setembro de 2014

O gráfico abaixo apresenta a frequência de


Desenvolvimento Metodológico publicações em cada ano, considerando os 235 arti-
gos publicados no período de 2004 a 2014.
Em primeiro lugar, estabeleceram-se como
fonte dos dados as bases online: Periódicos Eletrôni- Gráfico 1: Frequência de publicações por ano, de 2004
cos em Psicologia (PePSIC) e Scientific Eletronic a 2014.
Library Online (SciELO), ambas anexadas à Bibliote-
ca Virtual em Saúde Psicologia (BVS-Psi), em razão
da abrangência e amplitude possibilitada de artigos Ano  de  Publicação  
publicados. Em seguida, foram atribuídas, para a
delimitação dos resultados, as palavras-chave: Dire- 42  
trizes Curriculares de Psicologia, Diretrizes Curricula- 35  
30   26  
res da Psicologia, formação do psicólogo e formação 24   22   21  
em Psicologia. Como um primeiro critério para a 12   8   14  
seleção dos artigos, determinou-se o período poste- 1  
rior a 2004, ano de estabelecimento das Diretrizes
Curriculares Nacionais da Psicologia [DCN]. Deste
modo, os resultados foram ordenados em uma lista
da seguinte forma: palavra-chave, base de dados,
ano de publicação e título do artigo. Observou-se
Observa-se que os anos de 2014 e 2005
que grande quantidade dos títulos encontrados não
concentraram a menor quantidade de artigos, res-
correspondeu ao tema apresentado pelas palavras-
pectivamente 1 e 8, enquanto que o ano de 2010
chave propostas. Portanto, iniciou-se um afunilamen-
concentrou o maior número de publicações - 18% de
to dos resultados pela leitura dos títulos e, na ocor-
todo o período estudado. Seria possível supor a ra-
rência de dúvidas sobre a pertinência, seus resumos
zão do grande número de publicações se concentrar
também foram lidos, sendo avaliados pelo segundo
em 2010 por ser o ano anterior à alteração nas DCN,
critério: a paridade de assunto.
em seu artigo 13, referente ao estabelecimento de
Em decorrência da etapa anterior, três cate-
normas para o projeto pedagógico complementar
gorias foram criadas para analisar os artigos selecio-
para a Formação de Professores de Psicologia. En-
nados: a) formação; b) formação específica e c) ou-
tretanto, apenas dois artigos mencionaram a Licenci-
tros. Em formação foram incluídos todos os artigos
atura como tema central da discussão e nenhum
que diretamente abordaram o tema da formação em
deles foi escrito em 2010, mas ambos em 2007, co-
Psicologia no Brasil. Intitularam-se formação especí-
mo serão apresentados a seguir.
fica todos os artigos que trataram de uma área parti-
A partir da análise dos 235 artigos, eviden-
cular da Psicologia. A terceira categoria – outros – foi
cia-se que a grande maioria deles refere-se à dis-
gerada identificando publicações que discutiram
cussão de uma área específica da formação, tal co-
temas alheios à formação, sem paridade significativa
mo a formação em psicologia clínica (44) em suas
com assunto em pesquisa.
diferentes abordagens teóricas; a formação em psi-
cologia e saúde (31) e a psicologia esco-
RESULTADOS E DISCUSSÃO lar/educacional (17). Categorizamos esses artigos
sob o título de formação específica, uma vez que o
Em razão do vasto número de resultados debate sobre o currículo, permeando os conteúdos e
encontrados, foram estabelecidos critérios de afuni- disciplinas, ou sobre as DCN, não estava em pauta.
lamento das publicações, a fim de se obter uma se- Também foi possível elaborar a categoria outros,
leção coerente com a proposta. Desta forma, na para denominar aqueles temas que abordam a ques-
primeira seleção, contando apenas com a delimita- tão da formação, mas em direções diferenciadas de
ção do banco de dados, período e palavras-chave, atuação, como pesquisas com estudantes e recursos
foram encontrados 680 artigos. Destes, em uma didáticos. Por fim, a terceira categoria de maior valor
segunda seleção, extraíram-se apenas 235 que ti- para nossa investigação foi denominada formação,
nham de fato paridade com o tema da formação em para a qual foram identificados os artigos que discu-
Psicologia, pela leitura dos títulos e resumos. Em um tem desde os currículos dos cursos e as DCN até
terceiro momento, reuniram-se em três categorias os questões históricas sobre a formação no país. Esta
235 artigos selecionados, de acordo com seus temas categoria será mais detalhada nesta discussão.
de discussão.
Anais do XIX Encontro de Iniciação Científica – ISSN 1982-0178
Anais do IV Encontro de Iniciação em Desenvolvimento Tecnológico e Inovação – ISSN 2237-0420
23 e 24 de setembro de 2014

Gráfico 2: proporção dos artigos encontrados, de 2010, vol.14, no.1, p.105-120. ISSN 1413-
acordo com a categoria. 8557
Câmara de Educação Superior. Notícia: Dire-
trizes curriculares nacionais para os cur- forma-

Categorias  
sos de graduação em psicologia. Psic.: ção:
Teor. e Pesq., Ago 2004, vol.20, no.2, p.205- DCN
Outros   208. ISSN 0102-3772
20%   Feitosa, Maria Ângela Guimarães. Implica-
ções da internacionalização da educação forma-
para a formulação de currículos em Psico- ção:
logia. Temas psicol., Jun 2007, vol.15, no.1, DCN
Formação   p.91-103. ISSN 1413-389X
16%   Formação   Poppe, Andrea Regina Soares e Batista, Syl-
específica   via Helena Souza da Silva. Formação em
64%   Psicologia no contexto das diretrizes curri- forma-
culares nacionais: uma discussão sobre os ção:
cenários da prática em saúde. Psicol. cienc. DCN
prof., 2012, vol.32, no.4, p.986-999. ISSN
1414-9893
Os artigos reunidos na categoria formação forma-
Ferreira Neto, João Leite e Penna, Lícia Mara
(16%) montam 37 publicações do período de 2004 a ção:
Dias. Ética, clínica e diretrizes: a formação
2011 dos quais, a) oito centraram-se em discussões do psicólogo em tempos de avaliação de
DCN
sobre as reformas de currículo e suas implicações; (ética
cursos. Psicol. estud., Ago 2006, vol.11, no.2, na
além de análises de Projetos Pedagógicos de Cursos p.381-390. ISSN 1413-7372 clínica)
no Brasil e em currículo voltado para atuação com forma-
Cirino, Sérgio Dias et al. As novas diretrizes
pessoas com deficiência; b) dez discutiram as DCN e curriculares: uma reflexão sobre a licencia- ção:
seus desdobramentos; e c) dezenove artigos apre- DCN
tura em Psicologia. Temas psicol., Jun 2007, (licen-
sentaram temas variados, mas com menção à for- vol.15, no.1, p.23-32. ISSN 1413-389X ciatura)
mação, tais como: história nacional e internacional
da formação em Psicologia, pesquisas com egressos Valle Cruces, Alacir Villa. A pesquisa na forma-
formação de psicólogos brasileiros e suas ção:
dos cursos de Psicologia, estágio curricular obrigató-
políticas públicas. Bol. - Acad. Paul. Psicol., DCN
rio, especialidades em Psicologia, desempenho no Dez 2008, vol.28, no.2, p.240- 255. ISSN (pes-
ENADE, a ética na relação professor-aluno, o perfil 1415-711X quisa)
dos cursos de Psicologia e a teoria versus prática na
supervisão. Luiz RibeiroI, Sérgio e Amélia Luzio, Cristina. forma-
Considerando o objetivo geral da pesquisa As diretrizes curriculares e a formação do ção:
de levantar uma discussão sobre as políticas de psicólogo para a saúde mental. Psicol. rev. DCN
(Belo Horizonte), Dez 2008, vol.14, no.2, (saúde
formação do psicólogo brasileiro, partindo especifi-
p.203-220. ISSN 1677-1168 mental)
camente das Diretrizes Curriculares da Psicologia,
elegemos os dez artigos com temas relacionados às
Portes, João Rodrigo Maciel e Máximo, Carlos
DCN como fundamentais para a compreensão da Eduardo. Formação do psicólogo para atuar
dinâmica das políticas de formação. De fato, o centro no SUS: possíveis encontros e desencon- forma-
de nossa pesquisa está nestes resultados que serão ção:
tros entre as diretrizes curriculares nacio- DCN
apresentados a seguir: nais e as matrizes curriculares de um curso (SUS)
de psicologia. Barbaroi, Dez 2010, no.33,
Tabela 1: Artigos encontrados sobre o tema das DCNs. p.153-177. ISSN 0104-6578
Artigo tema
Bernardes, Jefferson de Souza. A formação Dentre tais artigos, foram predominantes as
em Psicologia após 50 anos do Primeiro forma- críticas a respeito da aplicação e elaboração das
Currículo Nacional da Psicologia: alguns ção: Diretrizes Curriculares. O tema das contradições
desafios atuais. Psicol. cienc. prof., 2012, DCN
entre uma formação generalista versus especialista
vol.32, no.spe, p.216-231. ISSN 1414-9893
ainda apareceram, mesmo depois da institucionali-
Brasileiro, Tânia Suely Azevedo e Souza, zação do documento. Este fato confirmou o descon-
Marilene Proença Rebello de. Psicologia, forma- tentamento por parte dos profissionais com relação à
diretrizes curriculares e processos educa- ção:
DCN formação, ainda sem consenso. Semelhante a esta
tivos na Amazônia: um estudo da formação
de psicólogos. Psicol. Esc. Educ. (Impr.), Jun pesquisa, Costa et al. [15] realizaram uma coleta de
Anais do XIX Encontro de Iniciação Científica – ISSN 1982-0178
Anais do IV Encontro de Iniciação em Desenvolvimento Tecnológico e Inovação – ISSN 2237-0420
23 e 24 de setembro de 2014

artigos, livros, capítulos de livros, dissertações e ecoando: como se espera mudanças na formação
teses, publicados até 2011, em bases de dados on- em Psicologia, se há tão pouca discussão sobre ela?
line. A análise de seus resultados permitiu a obser- Os resultados desta pesquisa, de uma forma geral,
vação de que “a produção sobre a temática encon- ilustraram como está comprometida a psicologia de
tra-se dispersa e possui caráter opinativo; grande nossas IES com as especialidades tradicionais, prin-
parcela das publicações focaliza áreas tradicionais cipalmente com a atuação clínica, e que, quando há
da Psicologia e aborda o tema por uma ótica interna- discussão sobre a formação, em sua maioria ocorre
lista.” (p.135). Da mesma forma, neste trabalho ob- a defesa de uma área específica.
servamos que, dos dez artigos apresentados, a mai- É claro que os resultados desta pesquisa li-
oria provém de áreas específicas da psicologia, pre- mitam-se a um período exclusivo, a década de 2004-
ocupadas com seu espaço nas DCNs, como apare- 2014, e que temos em mãos apenas parte da produ-
ceram nos temas do preparo para a atuação em ção científica nacional – as publicações em duas
saúde mental, licenciatura, saúde, pesquisa e clínica. bases de dados online. Logo, sabe-se que não te-
Ademais, dos 235 artigos por nós analisa- mos um panorama completo das discussões atuais
dos, 64% centraram-se nas áreas tradicionais da sobre a formação no país. No entanto, acreditamos
Psicologia, em sua maioria Psicologia clínica, Psico- que esta parcela por nós observada, dentro de suas
logia e saúde e Psicologia escolar/educacional. limitações, é capaz chamar a atenção para a discus-
são sobre a formação em Psicologia em nosso país,
Sendo assim, percebe-se o quadro da dis- ou para a falta dela.
cussão sobre a formação em Psicologia no Brasil, Esperamos contribuir para a comunidade ci-
tendo como parâmetro e marco de partida a institui- entífica, no sentido de incentivar a discussão sobre
ção das Diretrizes Curriculares Nacionais para os nossos currículos e sobre o impacto das Diretrizes
cursos de Psicologia, no ano de 2004. Além de, pos- Curriculares em nossa formação. É necessário discu-
teriormente a esta data, a discussão sobre a temáti- tirmos, nos movimentarmos, nos comprometermos
ca estar significativamente menor do que estava na com a transformação e nos despojar da formação de
década anterior, que foi marcada pela farta discus- uma psicologia, usando as palavras de Moura [17],
são sobre o assunto [15], está agora majoritariamen- que não mais queremos (p.19).
te comprometida com as áreas específicas da forma-
ção, ao invés de promover uma discussão transfor- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
madora e transversal para a Psicologia.
A pequena parcela identificada nesta pesqui- [1] Lessa, S., & Tonet, I. (2011). Introdução à Filoso-
sa de artigos que tratam centralmente sobre o tema fia de Marx. São Paulo: Expressão Popular.
da formação, frente à representativa maioria das [2] Teixeira, F. J. (1996). O neoliberalismo em deba-
publicações em áreas específicas, representa a rea- te. In: F. J. Teixeira, & M. Oliveira, Neoliberalismo e
lidade na qual se encontram as IES formadoras de reestruturação produtiva – as novas determinações
psicólogos em nosso país. do mundo do trabalho (pp. 195-252). São Paulo:
Cortez.
[3] Sguissardi, V. (2000). O Banco Mundial e a edu-
CONSIDERAÇÕES FINAIS cação superior: revisando teses e posições? Univer-
Em uma observação panorâmica do trabalho sidade e Sociedade , 66-77.
realizado, podemos identificar como está entrelaçada [4] INEP. (2012). Sinopse da Educação Superior.
a formação em Psicologia no Brasil aos padrões Brasília: Ministério da da Educação e da Cultura.
neoliberais estabelecidos nas políticas educacionais [5] Calderón, A., & França, C. (2013). O Banco Mun-
para o ensino superior. Esta é uma trama composta dial na educação superior brasileira: de ilustre des-
de acordos políticos, motivações econômicas e inte- conhecido nos anos 1980 a protagonista nos anos
resses de grupos dominantes. A instituição das Dire- 1990. Andes-SN , 102-115.
trizes Curriculares para os cursos de Psicologia no [6] INEP. (s.d.). Evolução 1980-1998. Brasília: Minis-
ano de 2004 parece ter dividido em dois períodos a tério da Educação e Cultura.
movimentação dos profissionais na discussão sobre [7] Calais, S., & Pacheco, E. (2001). Formação de
a formação. Na década que o antecedeu, muito se psicólogos: análise curricular. Psicologia
debateu para que as DCN cumprissem a promessa Escolar e Educacional , 5 (1), 11-18.
de transformar a formação no país. Na década que [8] Duran, A. (1994). Alguns dilemas na formação do
se seguiu à instituição do documento, período por psicólogo: buscando sugestões para superá-los. In:
nós estudado, pouco se falou sobre. A questão que C. F. PSICOLOGIA, Práticas emergentes e desafios
levantamos no início deste trabalho parece continuar para a formação (pp. 273-308). Casa do Psicólogo.
Anais do XIX Encontro de Iniciação Científica – ISSN 1982-0178
Anais do IV Encontro de Iniciação em Desenvolvimento Tecnológico e Inovação – ISSN 2237-0420
23 e 24 de setembro de 2014

[9] Guzzo, R. (2011). Desafios cotidianos em contex-


tos educativos: a difícil formação de psicólogos para
a realidade brasileira. In: R. Azzi, & M. (Gianfaldoni,
Psicologia e Educação (pp. 253-270). São Paulo:
Casa do Psicólogo.
[10] CNE/CNS Resolução n.8 de 7 de Maio de 2004.
Institui as Diretrizes Curriculares para os cursos de
graduação em Psicologia.
[11] CNE/CNS 0062 de 19 de fevereiro de 2004.
Parecer que aprova as Diretrizes Curriculares de
Psicologia.
[12] CNE/CES Resolução n.5 de 15 de Março de
2011. Institui as Diretrizes Curriculares Nacionais
para os cursos de graduação em Psicologia, estabe-
lecendo normas para o projeto pedagógico comple-
mentar para a Formação de Professores de Psicolo-
gia.
[13] Triviños, A. (2008). Introdução à pesquisa em
ciências sociais: a pesquisa qualitativa em educação.
São Paulo: Atlas S.A..
[14] Antunes, M. (1996). Algumas Reflexões Acerca
de Minha Formação. In: C. R, História da Psicologia:
pesquisa, formação, ensino (pp. 95-104). São Paulo:
EDUC/ANPEPP.
[15] Costa, J. P., Costa, A. L., Lima, F. C., Seixas, P.
d., Pessanha, V. C., & Yamamoto, O. H. (Dez de
2012). A Produção Científica sobre a formação de
Psicólogos no Brasil. Psicologia em Pesquisa , pp.
130-138.
[16]Palma, N. S., & Moraes, M. (2012). Psicólogos
em forma[ta]ção: Cartografias de um esboço de au-
toanálise. Estudos e pesquisas em Psicologia , 623-
647.
[17] Moura, E. P. (1999). A Psicologia (e os psicólo-
gos) que temos e a Psicologia que queremos. Psico-
logia: ciência e profissão, 10-19.

Você também pode gostar