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SRILA
BHAKTI
PRAMODE
PURI GOSWAMI
MAHARAJ
SRILA BHAKTI PRAMODE
PURI GOSWAMI
MAHARAJ
Fundador Acharya da Sri Gopinath
Gaudiya Math

BIOGRAFIA

Compilado por seu discípulo:


SRIPAD BHAKTIVEDANTA PURI MAHARAJ
a pedido de Srila Bhakti Aloka Paramadveiti
------------------------------------------------------------------------------------------
---------

SEVA
JULHO 2016
Copyright 2017 by
Produção editorial:
Revisão:
Impressão:
Capa:
Projeto gráfico e
diagramação:

Editado e Impresso no Brasil


Rua....

*****DEDICATORIA

autor
yasya prasādād bhagavat-
prasādo yasyāprasādān na gatiḥ
kuto ’pi:
“Pela misericórdia do Mestre Espiritual somos abençoados com a
misericórdia de Krishna. Sem a misericórdia do Mestre Espiritual não
podemos fazer nenhum avanço.”
Śrīla Viśvanātha Cakravartī Ṭhākura

PREFACIO
Bhaktivedanta Puri Maharaj, um dos últimos discípulos de Srila Bhakti Pramode
Puri Goswami Maharaj, serve a Krishna há muitos anos no Brasil. Ele, ao escutar
sobre este devoto puro, aventurou-se em uma grande viagem que teve como
destino Jagannath Puri (Orissa-Índia), onde esse grande devoto puro, sua divina
graça Srila Bhakti Pramode Puri Goswami Maharaj, estava celebrando seu último
Vyasapuja (celebração em comemoração ao dia de seu aparecimento) na terra.
Jagannath Puri é o lugar em que vive o Senhor Jagannatha e no qual o Senhor
Caytania passou os últimos anos de sua vida. Srila Bhakti Pramode Puri Goswami
Maharaj havia escolhido esse sagrado lugar para construir o templo de Sri Sri
Madana Mohan, e o fez frente à praia onde o Senhor Caytania exibiu muitos de
seus passatempos, em Cakra Tirtha (lugar sagrado). Srila Bhakti Pramode Puri
Goswami Maharaj inspirava às pessoas de todas as missões a tomar instruções com
ele. Dessa forma, seu último Vyasapuja foi uma reunião muito surpreendente em
que participaram todos seus irmãos espirituais que ainda viviam, tais como Srila
Bhakti Vaibhava Puri Goswami Maharaj, Bhakti Kusum Santa Maharaj,
Nayanananda Das Babaji e muitos outros acaryas. Profundamente tocado por seu
Gurudev, que o aceitou como seu discípulo nesse encontro, Bhaktivedanta Puri
Maharaj voltou ao Brasil e começou sua missão na fazenda de Vrinda Bhumi, na
região de Minas Gerais. Suas praticas profundas atraíram a muitas almas que se
refugiaram em seu asrama (refúgio espiritual) com o propósito de ganhar força e
preparar-se para a grande luta contra Maya (ilusão) como servidoras do Senhor
Supremo. Eu pedi a Bhaktivedanta Puri Maharaj para que, por favor, coletasse toda
a informação importante acessível sobre a vida de seu Gurudev, para que possamos
publicar em português. Esta obra que está agora em suas mãos é o resultado de
muitos caminhos e de muitas lágrimas que a alma espiritual passa até que tenha a
oportunidade de juntar-se com os devotos puros de Krishna, os quais nos guiam no
bhajana, nas praticas de sadhana etc. Os livros de Srila Bhakti Pramode Puri
Goswami Maharaj, como O Coração de Krishna, A Arte do Sadhana e tantos
outros, assim também como inumeráveis artigos que ele mesmo editou, já que era
ele o editor principal da Gaudiya Math, são todos aptos para transformar nosso
coração. Eu felicito a Bhaktivedanta Puri Maharaj por este trabalho em
homenagem ao seu Gurudev Srila Bhakti Pramode Puri Goswami Maharaj, quem
também há sido meu siksa guru (guru instrutor) por muitos anos, e aos leitores, que
através de estas linhas poderão conhecer a um devoto puro do Senhor, que logrou
agradar a seu maestro espiritual, Srila Prabhupada Bhaktisidhanta Sarasvati
Thakur, extraordinariamente, o qual também atuou como presidente da Associação
Mundial Vaisnava (WVA) e iluminou toda sampradaya ao trabalhar unidamente
pela causa com todos os diferentes seguidores dos ideais que o Senhor Caytania
Mahaprabhu propagou.
Um aspirante a servidor, Srila Bhakti Aloka Paramadveiti Swami.

ÍNDICE

Capítulo 1 – O Aparecimento Divino – 1


Capítulo 2 – Infância Divina – 5
Capítulo 3 – Hari-katha - 10
Capítulo 4 – Uma certa proposta - 15
Capítulo 5 – A iniciação - 18
Capítulo 6 – Serviço – 25
Capítulo 7 – A Entrega - 32
Capítulo 8 – O Trabalho - 35
Capítulo 9 – A Família – 38
Capítulo 10 – Sastra– 43
Capítulo 11 – A vida na Gaudiya Math – 51
Capítulo 12 – Kirtana– 56
Capítulo 13 – Um ataque Sanguinário – 58
Capítulo 14 – Uma associação muito íntima - 61
Capítulo 15 – Uma nova vida - 66
Capítulo 16 – Um Darshan muito especial – 70
Capítulo 17 - Uma linda associação – 75
Capítulo 18 – O trabalho de pregação – 78
Capítulo 19 – Aceitando Sannyasa – 81
Capítulo 20 – Outros acontecimentos – 86
Capítulo 21 – Intercâmbios Amorosos - 96
Capítulo 22 – Uma nova Missão – 110
Capítulo 23 – Livros – 118
Capítulp 24 – Um comportamento impecável – 121
Capítulo 25 – Associação Mundial Vaisnava – 130
Capítulo 26 - Conselho aos devotos casados - 134
Capítulo 27 – Seguindo a Etiqueta – 142
Capítulo 28 – Aconselhando seus discípulos – 145
Capítulo 29 – Extrema Humildade - 152
Capítulo 30 - Uma visão transcendental - 160
Capítulo 31 – Passatempos finais - 170
PROLOGO- INTRODUÇÃO
AUTOR

Capítulo 1
APARECIMENTO DIVINO

O aparecimento de nosso adorável guru não é algo comum, não

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poderíamos dizer que se encontra sob a jurisdição das leis materiais. Por
isso, dizemos 'aparecimento' e não 'nascimento'. Ele aparece para realizar
os seus passatempos (prakrta lila) ou seja, os passatempos que são
manifestos neste plano material.
Sua divina graça nitya-lila-pravista om visnupada paramahamsa
Srila Bhakti Promode Puri Goswami Maharaj apareceu exatamente em
uma quarta-feira, dia 18 de Outubro de 1898, no horário supremamente
auspicioso conhecido como Brahma muhurta (antes do nascer do sol).
No Caitanya Bhagavata, um livro escrito por Srila Vrindavana das
Thakur, encontramos um verso que expressa de forma muita clara a
importância do aparecimento do Acarya: “Assim como o dia de
aparecimento do Senhor é considerado santo, é sagrado também o dia em
que um Vaisnava aparece nesse mundo.” Em certo sentido, poderíamos
afirmar que para a vida do discípulo, o dia do aparecimento do Guru é
mais significativo que o próprio dia de aparecimento do Senhor Supremo.
O discípulo se beneficia muito mais servindo ao guru do que a
Krishna mesmo, o guru é a manifestação direta de Deus ( prakāśa
vigraha) e é com ele que devemos buscar estabelecer nossa conexão, é
através dele que poderemos ter um contato com a Divindade. Sri Caitanya
Mahaprabhu citou um verso do Adi Purana:
ye me bhakta-janāḥ pārtha
na me bhaktāś ca te janāḥ
mad-bhaktānāṁ ca ye
bhaktās te me bhakta-tamā
matāḥ

“O Senhor Krishna disse a Arjuna: 'aqueles que são Meus


devotos diretos na realidade não são Meus devotos, mas aqueles que
são devotos de Meu servo são de fato Meus devotos.”
Sendo assim, se queremos nos aproximar de Deus, temos que
primeiramente nos aproximarmos do seu devoto, se queremos satisfazer à
Krishna, temos que primeiro satisfazer ao seu representante. E nada mais
apropriado do que dar grande importância ao dia do aparecimento do
Acarya, celebrando essa data com muito sentimento, meditando que o
guru veio nos resgatar, que ele é o único amigo nesse mundo e a única
pessoa em podemos confiar.
No plano traiçoeiro do mundo fenomênico, em que, todos os
esforços culminam em nada, nossa existência vaga em busca do
transitório, entretanto, o guru nos puxa com toda a sua força, nos tirando
das garras de maya (ilusão) e nos impulsionando rumo ao mundo da
imortalidade.
Guru significa aquele que nos salva da morte, que nos mostra a luz,
o caminho a seguir. Estávamos sem caminho, sem direção, cegos de nossa
própria existência, não conseguíamos distinguir o que era mais benéfico
para nós. Colocando toda nossa energia agora em algo que se acabaria no
futuro. Poderíamos ser comparados a péssimos investidores, que não
sabem investir de maneira apropriada o seu capital.
Mas Krishna, misericordiosamente, nos enviou um especialista em
investimento, uma pessoa que não pode ser corrompida por nada desse
mundo, que não vai abandonar o seu ideal por nenhuma proposta
indecente que venham-lhe oferecer. A palavra Guru também significa
pesado, ou seja, que não pode ser movido de sua posição. Nós não
possuímos uma consciência firme, estamos cedendo aos encantos da
ilusão. Nossa opinião não tem muito peso.
Por isso somos considerados tatastha-sakti, ou seja, que podemos
ter tanta atração por Krishna, como por maya (ilusão). Tatastha significa
literalmente, à margem, em um posição marginal – ou seja, nos desviamos
do nosso verdadeiro propósito que é amar e sentir bem-aventurança.
Então, Krishna é o nosso bem-querente e nos envia o seu mais íntimo
associado para nos mostrar o caminho que temos que trilhar, nesse
contexto, estaremos eternamente endividados com nosso Gurudeva.
Sabemos que é impossível quitar essa dívida, entretanto, temos que
cultivar uma consciência de agradecimento, e considerar o dia do
avirbhava (aparecimento) de nosso amado guru, como o mais significativo
e adorável para nós.
*Nota editor: as palavras Srila Guru Maharaj, Srila Gurudeva
ou Gurudeva sempre se referem a Srila Bhakti Pramode Puri Maharaj
neste escrito.
Srila Guru Maharaj apareceu em Ganganandapur, um grande
vilarejo, no distrito de Jessore, atualmente nos limites de Bangladesh (país
vizinho da Índia). Os seus pais, Sri Tarinicharan Chakravati e Srimati
Ramrangini deram-lhe o nome de Promode Bhusan. Ele nasceu em uma
alta casta de uma família brahmanas (sacerdotes, a alta superior indiana).
Sri Radhika-ranjan Goswami, um erudito em sânscrito e astrologia fez a
carta astrológica da criança. De acordo com esse calculo astrológico, ele
estaria no modo da bondade, teria grande senso prático e boas maneiras,
trataria a todos os tipos as pessoas de maneira equânime. Percebia-se uma
forte inclinação à devoção. Outras qualidades descritas eram amabilidade,
sensitivo, inteligente e honesto. Iria possuir um grande conhecimento das
escrituras e residiria em diferentes locais.
Os pais de Gurudeva tiveram dois filhos antes dele, os quais
haviam morridos na infância. Depois disso, sua mãe, Ramrangini Devi
começou a orar para o Senhor Shiva para que o seu próximo filho não
morresse prematuramente - ela tinha o costume de adorar a Deidade do
Senhor Shiva regularmente. Um dia, ela teve um sonho que teria um filho
que seria abençoado pelo Senhor Mahadev (Shiva). Logo após, ela deu a
luz ao seu filho, que seria nomeado como Promode Bhusan. Ela se referia
a ele como “Siver var-putra” (o filho que recebeu a benção do Senhor
Shiva) De acordo com a tradição local, uma mulher que tivesse um filho
com uma parteira, teria que comprá-lo por uma pequena doação para
garantir uma vida longa. Então ele foi “comprado” da parteira por um tin
kari (três conchinhas). Por isso seu apelido era Tinu.
O distrito de Jessore também foi o local de nascimento de Srila
Lokanath Goswami, que foi o mestre espiritual de Narottam Das Thakur e
um dos mais queridos discípulos de Prabhupada Bhaktisiddhanta Sarasvati
Thakur, como por exemplo Srila Bhakti Vilas Tirtha Maharaj, Bhakti
Vivek Bharati Maharaj e Bhakti Prapanna Damodara Maharaj. O local de
nascimento de grandes vaisnavas, também se torna automaticamente um
tirtha (local) de peregrinação. O verdadeiro motivo de uma pessoa se
dirigir a um local sagrado é buscar a associação de devotos imaculados do
Senhor, os quais podem iluminar com o verdadeiro conhecimento. O
Srimad Bhagavatam (10.84.13) nos diz:

yasyātma-buddhiḥ kuṇāpe tri-dhātuke


sva-dhīḥ kalatrādiṣu bhauma
idyadhīḥ yat-tīrtha-buddhiḥ salite
na karhicij janeṣv abhijñeṣu sa eva
gokharaḥ.

“Aquele que acredita que seu corpo, o qual é constituído de


muco, bílis e ar, é o seu próprio ser, aquele que pensa que sua esposa e
filhos são expansões do seu corpo, e aquele que considera a terra de
seu nascimento como sendo adorável, o qual visita os locais santos,
simplesmente para nadar aí, sem procurar o refúgio das pessoas
santas, as quais vivem ali, não é melhor do que uma vaca ou um
asno.”
O verso supracitado pode parecer um pouco difícil de ser digerido,
mas se analisamos de forma sincera o seu conteúdo, perceberemos nele,
nitidamente a intenção de expandir nossa consciência. Temos que
abandonar os conceitos objetivos de nossa percepção e mergulhar
profundamente em um campo de consciência totalmente diferente do que
temos experimentado até agora. Somos forçados a acreditar que o local de
nosso nascimento é algo muito adorável, por isso se diz que o apego a terra
natal é, em certo sentido, o apego mais forte que a jiva (alma) possui.
Esta falsa identificação é a fonte de muitos problemas, dela
derivam concepções completamente equivocadas. Mas se pensamos,
inspirados nas palavras de Srila Sridhara Maharaj: “Eu não sou nada e o
vaisnava é tudo. Não tenho posição tangível no âmbito da Realidade
Absoluta”. Então, iniciaremos o processo de transformação necessário de
nossa consciência, para poder perceber a real posição em que nos
encontramos. Isso se chama sambandha jnana, o conhecimento preliminar
que o sadhaka (praticante) deverá possuir para se guiar em sua jornada
espiritual.
Perceberemos que os locais de peregrinação são extremamente
importantes, principalmente porque os sadhus (santos) deixaram suas
impressões marcadas na terra em que caminharam, que suas palavras
permanecem vivas no plano etéreo, que seu comportamento foi
estabelecido para sempre, servindo como exemplo para as demais gerações
vindouras. Sendo assim, imbuídos com esta mentalidade, alçaremos vôo a
um plano superior de consciência, em que perceberemos que o marco
inicial da vida de um grande vaisnava é sempre marcante na história da
humanidade.
Talvez agora as pessoas não possam dar a verdadeira importância a
esse fato devido a suas concepções estarem equivocadas e sua consciência
não possa perceber o valor inestimável que representa o local
transcendental de aparecimento de um devoto puro do Senhor. Em outro
verso do Srimad Bhagavatam ( 10.84.11) encontramos:
na hy am-mayāni
tīrthāni na devā mṛc-chilā-
mayāḥ te punanty uru-
kālena darśanād eva
sādhavaḥ
“Não é por possuir somente água, que um local se torna sagrado.
Nem é a terra, nem argila que compõe a forma da Deidade. As águas do
Ganges, visitar locais sagrados, e adorar a Salagrama-sila purificam uma
pessoa apenas depois de um longo tempo, mas santos como você
purificam instantaneamente por um simples olhar.”

O grande poder do sadhu é ressaltado nesse verso também, muitas


pessoas estão ávidas para se banharem no Ganges, por saberem do grande
poder purificatório do mesmo, inclusive ali se aglomeram. Entretanto, para
se beneficiarem, terão que se banhar muitas vezes nos locais sagrados.
Mas, somente por receber um breve olhar misericordioso de um sadhu,
nossa existência se purifica imediatamente.
Desta forma, necessitamos somente de alguns instantes para tornar
nossa existência perfeita. Mas, é necessário frisar, que esse contato inicial
é simplesmente um despertar de uma futura consciência que pouco a
pouco se incrementará em nosso ser. Dependerá muito do nosso esforço
para que a perfeição possa tomar conta de nossa existência. Mas o grau de
excelência já foi alcançado em certo sentido, simplesmente pela influência
da presença da pessoa santa em nossas vidas.
Tivemos a oportunidade de nos aproximarmos de alguém que
possui um ideal muito elevado, que somente tem olhos para a
transcendência e o resultado disso foi estimular nossa vida espiritual de
maneira extraordinária, este salto quântico somente foi capaz por sua
influência e nossa dormência pode ser rompida.
Nosso coração que estava congelado por uma influência demente,
agora, começa a fluir de maneira natural, assumindo um fluxo que sempre
foi natural, assim como é natural para água fluir em uma cachoeira e isso
cria alegria e satisfação. Simplesmente por participar dessa cena, o nosso
coração foi ativado com a corrente do bhakti (devoção) pelo olhar
misericordioso do devoto puro sobre nós.
Seremos capazes de perceber que tudo relacionado ao devoto puro
é capaz também de nos impulsionar para seguir adiante, essa parafernália é
supremamente sagrada, porque de certa forma teve contato com essa alma
pura e para nós se torna digno de adoração tudo que nos leva a meditar
nesse contexto. Sendo assim, Ganganandapur, o local onde começou os
passatempos divinos de nosso Gurumaharaj, deve ser digno de adoração
por todas as pessoas que buscam se adentrar nos mais profundos
sentimentos de amor por Deus.
Capítulo 2
UMA INFÂNCIA DIVINA

A infância constitui a fase mais importante do ser humano, é nela


que adquirimos todas nossas características que irão influenciar a vida. Por
isso a sociedade de uma maneira geral dá muita importância a essa etapa
da vida. O futuro dependerá completamente do que cultivamos nessa fase
de nossas vidas. Em realidade “o homem é o arquiteto do seu destino”, ele
molda sua consciência de acordo com o que está recebendo do meio
ambiente e isso refletirá por toda sua existência.
Por isso, é de suma importância fundamentar a vida espiritual com
bases sólidas desde os primórdios da juventude. Quanto mais cedo
começarmos a praticar a vida espiritual, mais facilidades teremos para
prosseguir no caminho da transcendência. Muito afortunados são as
pessoas que tiveram a oportunidade de experimentar vivências espirituais
sólidas em suas vidas no início de sua existência. Decerto ficaram
completamente marcados com o selo da devoção, nunca puderam apagar
da memória as reminiscências de um passado tão auspicioso.
E assim foi o que aconteceu com nitya-lila-pravista om visnupada
paramahamsa Srila Bhakti Pramode Puri Goswami Maharaj, sua infância
foi envolvida por uma série de acontecimentos implicados com
espiritualidade. Sua atração para o vaisnavismo foi despertada muito
precocemente, era algo que já estava com ele, que fazia parte de sua
natureza. Sua atração ao canto de canções devocionais foi notória e sua
voz celestial combinava perfeitamente com todo o enredo que se
apresentava diante dele. Ao escutar a leitura do Caitanya Caritamrita,
Srimad Bhagavatam e outros escritos de Srila Bhaktivinoda Thakur e
praticar bhajanas, seu entusiasmo crescia dia a dia na associação de Srila
Bhaktiratna Thakur, seu Vartma Pradaksa Guru (a pessoa que pela
primeira vez nos impulsiona para a consciência de Krishna). Como Guru
Maharaj morava próximo a sua casa (de Bhaktiratna Thakur) e com o
consentimento e estímulo de sua mãe, todos os dias costumava visitá-lo a
fim de incrementar suas práticas na bhakti-yoga (yoga da devoção).
Srila Bhaktiratna Thakur convidou a Gurudeva para participar da
adoração à Deidade de Sri Madan-mohan. Esse serviço deu a Gurudeva
grande satisfação e ele o realizou com grande entusiasmo, dedicação e de
forma muito meticulosa. Em uma noite de inverno, entretanto, Srila
Gurudeva esqueceu de colocar o cobertor em Madan-mohan quando deitou
a Deidade. No momento em que foi caminhando de volta, ele começou a
tremer de forma incontrolável. Depois, quando ele chegou em casa,
continuou tremendo a noite toda, ele pensava que havia contraído malária,
mas o mais interessante é que não estava com febre e apesar de usar bons
cobertores, seu tremor não diminuía. No dia seguinte, pela manhã, ele
caminhou em direção a casa de Bhaktiratna Thakur para despertar a
Deidade. Tão logo Gurudeva apareceu em sua porta, foi castigado
severamente por não ter colocado o cobertor na Deidade na noite anterior.
Entendendo o que tinha feito, Guru maharaj começou a chorar e disse a
Srila Mahasaya: “Foi por isso que eu não parava de tremer a noite inteira.”
Uma noite, quando voltava da casa de Srila Bhaktiratna, Gurudeva
estava passando perto de uma árvore de Kul, quando uma serpente
venenosa enrolou em sua perna e o picou. Ele retornou para sua casa em
grande sofrimento, então pediu a seu irmão Nani uma folha de Tulasi
(planta sagrada para os devotos de Krishna, da família do manjericão) dos
pés da deidade. Sua mãe e seus irmãos estavam muito ansiosos pelo que
havia acontecido, mas ele solicitou a todos que mantivessem calma e
fossem descansar. Então, ele começou a ler o passatempo de Kaliya-
daman do décimo canto do Srimad Bhagavatam e ao amanhecer, já estava
se sentido melhor.
Desses acontecimentos, podemos perceber muitos aspectos que nos
levam a refletir sobre diversas nuances da transcendência. O primeiro, que
é notório e brilhante como o sol, é que devemos começar nossa vida
espiritual o quanto antes. Podemos ver isso na história de Prahlada
Maharaj, narrada no canto sétimo do Srimad Bhagavatam. Ele era um
devoto imaculado do Senhor e seu pai era completamente adverso a sua
devoção. Em um momento, quando Prahlada foi estudar em uma escola
materialista, queriam lhe incutir ensinamentos completamente opostos a
prática da vida espiritual pura e Prahlada não se interessava nada por esses
tópicos, não conseguia digeri-los de maneira alguma, ele somente estava
absorto em pensar em Deus o tempo todo. E mesmo nos momentos de
recreação, quando os seus colegas de classe se divertiam com muitas
brincadeiras e jogos, Prahlada não se interessava o mínimo por essas
diversões e não queria perder o seu valiosíssimo tempo com futilidades.
Nesse contexto, ele disse no Srimad Bhagavatam (7.6.1):
śrī-prahlāda uvāca kaumāra
ācaret prājño dharmān
bhāgavatān iha durlabhaṁ
mānuṣaṁ janma tad apy
adhruvam arthadam

“ Aquele que é bastante inteligente deve, desde o começo da vida,


saber usar o corpo humano e então, desde a tenra idade da infância,
praticar as atividades do serviço devocional, abandonando todas as
outras ocupações. O corpo humano é muito raro de ser obtido, e,
embora temporário como os outros corpos, é valioso porque, na vida
humana, pode-se executar serviço devocional. Mesmo com um pouco
de serviço sincero a pessoa pode alcançar a perfeição completa”

O primeiro sintoma de uma boa inteligência, é que a pessoa logo se


atrai por escutar Hari-katha, ou seja, tópicos relacionados com o Senhor
Supremo. Nesse mundo fenomênico, os assuntos mundanos e conversas
triviais tomam conta do cenário de forma evidente. O impulso da fala é
muito forte e difícil de ser controlado, por isso, vemos que a maioria das
pessoas sempre estão colocando atenção em aspectos temporários da
existência. Se falamos que esse mundo material é fenomênico, é porque
um fenômeno tem uma curta duração em sua existência,não vai perdurar
para sempre e todos os assuntos relacionados a ele, possuem uma utilidade
muito relativa.
Somente os tópicos que tratam da imortalidade poderão preencher
a lacuna que existe dentro da entidade viva. Ela tem a necessidade de ser
feliz, na verdade, podemos dizer que é um direito de cada alma
experimentar bem-aventurança. Onde quer que ela esteja, sempre vai estar
pendente essa busca, por mais que tentemos fugir disso, não
conseguiremos deixar de indagar e procurar pela felicidade inata de nosso
ser interno. E é por essa razão que não ficaremos contentes e satisfeitos
plenamente por ouvir e saborear tópicos mundanos. Sendo assim, se temos
a oportunidade de praticar o serviço devocional, começando por escutar,
estaremos fazendo jus a grande fortuna de ter recebido o corpo humano,
que é tão raro e valioso. Porque ele é o veículo da alma, o templo onde
nosso ser interno repousa, junto com a forma expandida da suprema
Personalidade de Deus, conhecida como Paramatma. Esse aspecto que é a
testemunha, que espera o momento oportuno, no qual a entidade viva
preste atenção em seu chamado, está ali, querendo mostrar o caminho,
ansioso por dar a guia interna para que possa despertar na entidade viva o
desejo de praticar o serviço devocional. No Bhagavad-gita (18.61)
encontramos:
īśvaraḥ sarva-
bhūtānāṁ hṛd-deśe
'rjuna tiṣṭhati bhrāmayan
sarva-bhūtāni
yantrārūḍhāni māyayā

“O Senhor Supremo está situado no corações de todos, ó


Arjuna, e está dirigindo as andanças de todas as entidades vivas , as
quais estão sentadas como em uma máquina, feita de energia
material.”

Nesse sentido, Srila Gurudeva segue sendo uma fonte de inspiração


para todos os sadhakas que tentam se engajar nas práticas espirituais sérias
e que desejam aprofundar seus sentimentos mais internos direcionados aos
extratos mais profundos da rendição. Foi isso que Guru Maharaj
demonstrou quando em uma idade tão precoce, se colocou completamente
a disposição para escutar com muito entusiasmo a literatura vaisnava e ao
mesmo tempo ocupando-se em bhajana (canto introspectivo) e arcana
(adoração) à Deidade. Em relação ao ultimo, é extremamente
impressionante que ele tenha estabelecido uma relação tão profunda e
íntima com a Deidade a ponto que a mesma tenha se manifestado perante
uma situação relacionada ao serviço de puja (outra expressão para
adoração a Deidade).
Existem muitas formas de se executar serviço devocional, Srila
Rupa Goswami Pada nomeou sessenta e quatro como principais, e no
Caytania-caritamrta (2.22.214), encontramos que dentro elas, existem
cinco como as mais proeminentes:
sādhu-saṅga, nāma-kīrtana, bhāgavata-śravaṇa
Mathurā-vāsa, śrī-mūrtira śraddhāya sevana

“A pessoa deve associar-se com devotos, cantar o Santo Nome do


Senhor, escutar o Srimad Bhagavatam, residir em Mathura e adorar a
Deidade com fé e veneração.”
Estes cinco membros do serviço devocional são considerados os
melhores de todos, porque apenas uma leve execução dos mesmos
desperta o amor por Krishna. O caminho do arcana nos leva a
possibilidade de servir ao Supremo em tempo integral e acomodar nossas
atividades de maneira tal, que nossa mente fique meditando no Senhor
todo o dia. Nosso trato com a Deidade deve elevar a nossa consciência a
um nível que possamos perceber que a Deidade está viva. Por isso se diz
que é necessário a cerimônia de prana-pratistha para que a Deidade possa
ser preparada para ser adorada. Nessa cerimônia, o Guru ou um devoto
qualificado invoca a Deidade para que desça e entre na murti (imagem).
Prana quer dizer vida e pratistha significa que assume uma posição, ou
seja, nesse momento se pratica alguns rituais que dão a murti vida própria.
Importante frisar, que esse procedimento possibilita uma adoração
responsável e ao mesmo tempo, de acordo com o nível do adorador, vai
mudando a concepção da Deidade, até que possa chegar ao ponto de ter
um relacionamento tão intenso com a Deidade, que ela mesma se
manifesta perante alguma situação específica, como foi no caso de Guru
Maharaj, em que a própria Deidade o fez tremer e sentir frio para que ele
pudesse perceber que havia esquecido de cobri-la com um cobertor.
Mesmo que para nós seja impossível experimentar um nível tão
amplo de realização, devemos entender que existe vida na Deidade, que
ela não é feita de metal, na realidade seu corpo é transcendental. O Padma
Purana nos ensina:
“Aquele que considere que a Deidade do templo está feita de
madeira ou pedra; que considera ao mestre espiritual na sucessão
discipular como um homem ordinário; que considere que um vaisnava do
próprio clã infalível do Senhor, pertença a uma determinada casta ou
credo; quem pensa que a caranamrita(agua sagrada) ou a água do Ganges
como sendo água comum; quem considera ao mantra composto de nomes
do Senhor, que destrói todos os pecados, como um conjunto de palavras
ordinárias ou que considera ao Senhor Supremo de todos os senhores ,
Visnu, sendo igual a um ser humano ordinário, pode ser considerado um
residente do inferno.”
O sentimento apropriado deveria ser: não podemos ver a Deidade
com os olhos materiais e quando vamos ao templo, é para que a própria
Deidade nos veja, para que Ela coloque sua visão sobre nós, nos
abençoando e permitindo que nossa existência seja purificada. Nosso Guru

20
Maharaj adorou a Deidade até os noventa e seis anos de idade, mostrando
a determinação de seguir esse processo tão poderoso.
Somente a fé pode nos levar a uma constância em nossas práticas,
ela é como o combustível que faz mover o carro da devoção. Podemos ter
um carro que seja muito potente, que esteja em excelente condição de uso,
o último modelo no mercado, entretanto, se ele não tiver gasolina, não vai
funcionar. Da mesma maneira, temos o corpo humano, que é muito valioso
para as práticas espirituais, temos o Guru que nos deu a iniciação espiritual
através do Harinama (nome, mantra) e de diksa (iniciação no mantra),
possuímos a oportunidade de adorar a Deidade. Mas se não tivermos fé,
seremos com um bom carro, que apesar de estar em ótimas condições de
uso, não se move porque falta combustível.
Srila Krishnadasa Kaviraja Gosvami tem definido a fé (sraddha)
da seguinte maneira no Caytania-caritamrta (2.22.62):
'śraddhā'-śabde—viśvāsa kahe sudṛḍha niścaya kṛṣṇe
bhakti kaile sarva-karma kṛta haya

“A palavra fé se refere a um crença firme e confiante de que


por somente se ocupar na devoção à Krishna, todos os nossos deveres
restantes serão cumpridos.”

Poderíamos imaginar se em uma noite escura, fossemos picado por


uma cobra venenosa e ali não houvesse a possibilidade de ajuda médica?
Qual seria a nossa reação? Como nossa mente estaria? Será que
conseguiríamos manter a paz de espírito e se entregar em oração? Mas
justamente essa foi a atitude de om visnupada Srila Bhakti Pramod Puri
Gosvami Maharaj, que diante desse acontecimento, começou a ler o
passatempo de Kaliya-daman, do décimo canto do Srimad Bhagavatam,
em que uma enorme serpente, depois de envenenar as águas do rio
Yamuna, foi pisoteada e subjugada pela Suprema Personalidade de Deus,
em um dos mais belos passatempos da Divindade.
Nesse momento, Gurudeva mostrou que a fé pode ser infinitamente
superior a qualquer outra perspectiva que possamos conceber. Acreditar
que dentro de nós existe um elemento totalmente aparte de toda a
existência que possamos conceber. Por acreditar tudo se torna possível.
Como disse Santo Agostinho: “Acredito, porque é impossível.” Esse
mecanismo, que nos leva a um salto rumo a eternidade, está latente dentro
nós, esperando o momento de abraçar algo muito além de nossa
capacidade, entendendo que somos insignificantes perante tanta grandeza
infinita. Se em algum dia formos beneficiados pela graça de Deus, então,
nossa consciência estará tão conectada a transcendência, que qualquer
obstáculo ou acontecimento adverso nos fará observar que Krishna está
por trás de todas as coisas, que qualquer acontecimento que venha tomar
parte em nossa vida é controlado e supervisionado por este poder superior.

Capítulo 3
HARI-KATHA

No mundo material as conversações mundanas pululam em todas


as direções, as pessoas estão muito preocupadas em colocar toda a sua
energia em tópicos que não nutrem suas consciências. Assuntos
superficiais e sem nenhuma consistência tomam conta de um cenário
surreal, invertendo todos os valores da nossa sociedade. O que tem
verdadeiro valor e que deveria ser prioridade na vida das pessoas, passa a
ser negligenciado de tal maneira, que a futilidade se tornou um ornamento
necessário na vida dos seres humanos.
Todos querem falar muito e se esforçam para expor ideias sem
nenhuma conexão com a verdadeira identidade do ser. São grandes
generais para pequenos problemas e meros soldados rasos para os
verdadeiros problemas, colocando a sua energia em algo totalmente
efêmero e superficial. Por isso, podemos dizer que Hari-katha, ou seja,
tópicos relacionados a Divindade, são muito raros e quando temos a
oportunidade de escutar sobre os passatempos da Suprema Personalidade
de Deus e assuntos que nutrem nossa consciência de um sadhu(santo)
genuíno, se diz que somos muito afortunados.
Esse momento deve ser considerado como sendo muito especial em
nossa existência, devemos aproveitar essa oportunidade com se fosse
única, deixando de lado a preguiça e letargia - com uma atenção indivisa,
devemos escutar Hari-katha de maneira bem introspectiva, entendendo
que esse fluir de néctar vai penetrar em nossos corações e será capaz de
promover uma profunda mudança em nosso comportamento. O Hari-
katha não está simplesmente destinado para os nossos ouvidos, ele
ultrapassa os limites da superficialidade e consegue adentrar nos lugares
mais recônditos de nossa consciência.
Os transcendentalistas nutrem sua espiritualidade mutuamente e se
iluminam uns aos outros com Hari-katha, no próprio Bhagavad-gita (10.9)
Krishna nos ensinou:
mac-cittā mad-gata-prāṇā
bodhayantaḥ parasparam
kathayantaś ca māṁ
nityaṁ tuṣyanti ca
ramanti ca

“Os pensamentos dos meus devotos puros residem em Mim,


suas vidas são plenamente devotados a Meu serviço, e eles obtêm
grande satisfação e bem-aventurança sempre se iluminando uns aos
outros e conversando sobre Mim”.

Situar nossos pensamentos em Krishna, aí está a perfeição da


existência. Onde estiver nossa mente, estará nosso coração. O
mandamento da Bíblia diz que devemos amar a Deus acima de tudo,
porém, quem é Deus, quais são suas atividades e passatempos? Como
poderemos pensar no objeto de nosso amor? Essas são perguntas
essenciais que deverão ser respondidas se quisermos estabelecer uma
relação com o Supremo. Amor significa sacrifício, dedicação completa e
abnegação de nossa própria vontade, para satisfazer os desejos do Centro
absoluto, isso significa estar com a vida completamente devotada em todos
os sentidos.
A iluminação somente virá se obtivermos uma ajuda do agente
superior, daquela pessoa que conhece a verdade e pode nos dá a verdade.
Onde obtivermos essa ajuda, temos que nos agarrar com toda a força e não
soltar jamais essa conexão. Se diz que na cultura japonesa, o Deus da
oportunidade é representado por um ser completamente careca, que possui
apenas um tufo de cabelo na cabeça. Então, quando se consegue essa
oportunidade deve-se agarrar firmemente esse tufo com as duas mãos e
não soltar de maneira nenhuma. O mesmo pode ser dito em relação a uma
oportunidade de escutar tópicos transcendentais de um devoto puro.
E nesse contexto, podemos observar que Srila Guru Maharaj nos
deu um exemplo magistral em uma vez quando ainda jovem e visitava a
Gaudiya Matha (local de reunião dos devotos de Mahaprabhu, Deus) todos
os dias para escutar Hari-katha de Srila Prabhupada Bhaktisiddhanta.
Como ele trabalhava em uma comissária, todas as tardes depois de voltar
do trabalho, se dirigia ao templo.
Um dia, quando ele voltava do trabalho, e se preparava para ir a
Gaudiya Matha , foi picado por um escorpião ao colocar os sapatos.
Imediatamente, ele começou a sangrar e o sangue ficou negro. Sua mãe
começou a chorar despertadamente, porque na mesma semana duas
pessoas haviam sido picadas e haviam morrido, vitimadas pelos
escorpiões. Para acalmar sua mãe, Srila Gurudeva disse que não estava
doendo muito e o fez com uma serenidade impressionante, apesar da dor
ser quase insuportável. Assim que escutou os cavalos que puxavam a
carruagem que o levaria para a Gaudiya Math, ele subiu imediatamente
nela e partiu para o seu destino. Em sua mente pensava: “Se eu tenho que
morrer pela picada, eu espero morrer na Gaudiya Math, enquanto escuto a
Srila Prabhupada.” Muitos anos depois, referindo-se a esse incidente, ele
disse que somente foi possível ir ao Hari-katha, apesar de tanto sofrimento
pela picada de escorpião, por causa de sua absorção em navanurag (o
primeiro estágio do amor puro : nava significa novo e e anurag significa
amor).
Somente a manifestação do amor pode dar forças para uma pessoa
superar uma dor provocada pela picada de um animal peçonhento e fazer
com que brotasse forças para subir em uma carroça com o intuito de ir
escutar tópicos transcendentais e ao mesmo tempo transcender aos
cuidados com o corpo que normalmente seriam exigidos para esse
momento. Sua cobiça por escutar era tão poderosa que ultrapassou os
limites físicos e mentais que são impostos pela energia material.
Esse fato também nos faz lembrar o episódio narrado no Srimad
Bhagavatam, em que o rei Pariksit Maharaj, depois de ter sido
amaldiçoado por um jovem brahmana a perder a sua vida em sete dias, o
rei decidiu escutar Hari-katha da boca de Srila Sukadeva Gosvami por
uma semana, sem comer e beber nada e sem dormir também. Apesar de ter
recebido a notícia de sua morte iminente , ele não se desesperou ou tentou
combater a maldição, não, somente quis se absorver em escutar. Se
tivéssemos um pouco mais de sinceridade em nossa vida espiritual,
teríamos que nos inspirar muito com os exemplos supracitados.
Entendendo que ao escutar os tópicos transcendentais da boca de uma
alma auto realizada nossa existência pode se tornar perfeita, não
precisamos nem sequer realizar muitas práticas ou demandar de muito
tempo nas mesmas.
Mas se estivermos engajados de forma sincera e com o objetivo de
“fazer ou morrer”, nossa vida espiritual será um êxito. Srila Prahlada
Maharaj disse : “sravanam kirtanam visnoh smaranam pada-sevanam... ”
existem nove principais tipos de serviço devocionais e escutar é primeira
delas. Existem muitos versos no Srimad Bhagavatam 1.12.14 testemunham
a proeminência das três atividades principais de ouvir, cantar e recordar.
tasmād ekena manasā
bhagavān sātvatāṁ patiḥ
śrotavyaḥ kīrtitavyaś ca
dhyeyaḥ pūjyaś ca
nityadā

“Sendo assim, uma pessoa deve constantemente escutar sobre,


glorificar, meditar em e adorar ao Senhor Supremo, o protetor dos
devotos, com concentração única”. (Srimad Bhagavatam 1.12.14 )

tasmāt sarvātmanā rājan


hariḥ sarvatra sarvadā
śrotavyaḥ kīrtitavyaś ca
smartavyo bhagavān
nṛṇām

“Sendo assim, Ó Rei , onde quer que alguém se encontre, sempre deve
se falar do Senhor Supremo Hari, glorificá-lo e recordá-lo com toda
concentração.” (Srimad Bhagavatam 2.2.36)
tasmād bhārata sarvātmā
bhagavān īśvaro hariḥ
śrotavyaḥ kīrtitavyaś ca
smartavyaś
cecchatābhayam

“Ó filho da dinastia Bharata! Quem deseje falta de temor, deve


escutar sobre, glorificar e também recordar ao Senhor Supremo Hari,
a alma de todos os seres vivos e o controlador supremo, pois somente
Ele pode colocar um fim em todas as nossas misérias”. (Srimad
Bhagavatam 2.1.5)

Todos os versos supracitados indicam a importância de se escutar e


meditar nos nomes de Deus e seus passatempos transcendentais, se
quisermos alcançar a perfeição de nossas vidas. Somos bombardeados por
pensamentos e imagens que ficam impregnadas em nossa mente. Podemos
dizer que somos um seres pensantes e deliberantes baseado na associação
que obtemos do meio ambiente. “Digas com quem andas que eu te direi
quem és”. Atrás deste ditado tão famoso se esconde uma verdade
ontológica - somos produtos de nossa associação. Através dela moldamos
todo nosso ser. Nosso esquema mental será influenciado pela associação
que obtivemos durante toda nossa vida. A mente absorve do meio
ambiente, assim como um papel absorve a gordura de uma fritura.
No Srimad Bhagavatam, Krishna diz a seu querido amigo e devoto
Uddhava que a mente que medita nos objetos dos sentidos, se apega a eles
e se degrada pouco a pouco. Enquanto que a mente que medita na
Suprema Personalidade de Deus, se apega a Ele e alcança a perfeição.
Nossa vida é como uma escola, na qual temos que sempre se submeter as
provas para avaliar nosso rendimento. Cada vez mais os exames vão se
tornando mais difíceis. No Ensino Médio temos um grau de avaliação bem
diferente ao da Universidade.
O homem que deseja a elevação espiritual e sublimar os desejos,
terá a cada dia que lutar com seus inimigos internos e externos. Em
nenhum momento poderá descuidar a relação com o meio ambiente, ficará
alerta com seus pensamentos e se policiará em todos sentidos para buscar
uma posição favorável para o seu aprimoramento interno. Estará disposto a
mudar conceitos e aceitar novos prismas de pensamentos que o levarão a
estágios mais sublimes da consciência. Ao final de sua existência nesse
plano fenomênico, será como a uma prova final para todo mundo, ninguém
poderá escapar do teste de consciência. Em que estaremos pensando?
Onde estiver a nossa mente, ali estará o nosso coração. No próprio
Bhagavad-gita 8.6 Sri Krishna diz:
yaṁ yaṁ vāpi smaran
bhāvaṁ tyajaty ante
kalevaram
taṁ tam evaiti kaunteya
sadā tad-bhāva-bhāvitaḥ

“Qualquer que seja o estado de consciência de alguém ao deixar o


corpo, ó filho de Kunti, esse mesmo estado ele alcançará
impreterivelmente.”

Temos que estar cientes de que nossas ações e pensamentos


formarão o molde de nosso destino final. Cada momento vivido sem uma
consciência superior, será uma derrota antecipada. E tudo começa com o
que escutamos, o que está entrando dentro de nós e transformando nossa
consciência. Porque somos seres dotados de consciência e temos que nos
elevar e não se degradar.
Se nos aproximamos do plano subjetivo da realidade e buscamos
aprimorar a nossa vida através do som divino que emana da boca dos
devotos imaculados do Senhor, nosso mundo interno será fortalecido e aos
poucos sairemos da caverna do egoísmo para entrar em um mundo em que
a dedicação é o ponto mais importante, procuraremos dar ao invés de
receber. Este é o plano da dedicação, em que o amor será o ponto central
em nossas vidas. E Hari-katha será o alimento que irá nutrir nossa
necessidade básica de existência.

Capítulo 4
UMA CERTA PROPOSTA

O pai de Srila Guru Maharaj, Tarini Charan Chakravarti Mahasai,


pensou em arrumar um casamento para Gurudeva, ele havia conhecido
uma moça que ele pensava ser adequada para seu filho, e quando lhe
revelou a ideia, Gurudeva refutou-a veementemente. Então, o seu pai lhe
disse: “Você é o meu filho mais velho, e eu já perdi um outro filho, como
você pode dizer que não irá se casar?” Gurudeva respondeu: “Pai, você se
esqueceu que eu há muito tempo atrás prometi para mim mesmo que
nunca iria me casar?”. Então, seu pai foi pedir para a sua esposa que
intercedesse a favor de sua causa perante ao seu filho. Gurudeva disse a
sua mãe: “Mãe, porque você deseja que eu me case e tenha família? Você
se casou e tem família e tenho visto durante toda minha vida como você
tem chorado. Você perdeu seu filho e seu neto e tem passado por tanto
sofrimento. Eu tenho visto você derramar muitas lágrimas. E ainda assim,
você deseja que eu passe pelas mesmas situações?”. Sua mãe era muito
inteligente, ela imediatamente realizou que Gurudeva estava firmemente
decidido em seu ponto de vista.
A vida material significa que teremos que aceitar sofrimentos.
Ainda que façamos muitos esforços para escapar do sofrimento, ele vem
naturalmente como uma consequência espontânea desse mundo material.
Quer dizer que tem sua manifestação limitada, vai ser bom por algum
tempo, mas depois muitos problemas irão surgir. Entender que a existência
material possui um aspecto temporário e miserável faz parte de um
compreensão superior. O próprio Gita (7.3) nos adverte:
mām upetya punar janma
duḥkhālayam aśāśvatam
nāpnuvanti mahātmānaḥ
saṁsiddhiṁ paramāṁ
gatāḥ

“Após Me alcançarem, as grandes almas, que são yoguis em devoção,


jamais retornam a este mundo temporário, que é cheio de misérias,
porque obtiveram a perfeição máxima”

Swami Maharaj Prabhupada costumava dizer que somente por


existir mosquitos neste mundo, isto já era um bom motivo para querer sair
daqui. Um exemplo bem simples, mas que ilustra muito bem onde estamos
situados.
Agora, se levamos em conta a vida familiar, chegaremos a
conclusão que por mais arranjos que possam ser feitos para estabelecer a
felicidade familiar, veremos que isso é impossível em um plano absoluto.
Como disse Srila Prabhupada Bhaktsiddhanta Sarasvati Thakur: “Família é
somente uma lista de nomes.” E se formos analisar de forma consistente
essa frase, encontraremos muita sabedoria, uma vez que olhamos para a
nossa mesma família e vemos os nossos parentes que já partiram para
outro plano de existência e isso se torna somente uma lembrança de
nomes, como se fosse uma lista mesmo. Qual é a nossa verdadeira família?
Quem são nossos verdadeiros bem-querentes? Mesmo na Bíblia, em uma
passagem onde Jesus Cristo estava reunido com seus discípulos, sua mãe e
seus irmãos procurando falar com ele. Ao ser informado disso, Jesus
respondeu: “ Quem é minha mãe, e quem são meus irmãos?; em seguida
apontou para todos que estavam ali e disse: “ Eis minha mãe e meus
irmãos. Pois todo aquele que faz a vontade do meu Pai, que está nos céus,
esse é meu irmão, minha irmã e minha mãe.” Não deveríamos pensar que
Jesus estaria rejeitando a sua família, não, muito pelo contrário, ele estava
escolhendo sua verdadeira família. Aquela que se nutre por um ideal
superior, que não é movida por interesses egoístas e provincianos.O
Srimad Bhagavatam (11.17.53) diz:
Putra-darapta-bandhunam
sangamah pantha-
sangamah anu-deham
viyanty ete svapno
nidranugo yatha
“A associação com filhos, esposa, parentes e amigos é tal o encontro
breve de viajantes. A cada troca de corpo a pessoa se separa de todos
esses companheiros, assim como alguém perde os objetos que possui
em um sonho tão logo este termina.”
Entender e aceitar esse aspecto transitório, nos dará muita
tranquilidade em nossos relacionamentos. Será um alívio pensar que todas
as pessoas com as quais temos um relacionamento mais íntimo, seguirão
adiante em sua longa jornada, sem olhar para trás e sem se lamentar por
todos os maus entendidos ocorridos no passado. Tudo que aconteceu já
não tem muita importância, porque esse breve encontro foi somente uma
experiência que tivemos que viver devido ao nosso karma prévio, não
importando o quanto tivemos que padecer pelas supostas divergências, ou
pelo sofrimento causado por um apego excessivo que tínhamos por um
ente querido que nos deixou.
Compreendemos também que a vida familiar pode ser um oceano
de bem-aventurança se as membros da mesma colocarem Krishna no
centro de suas relações. Em um incidente, quando Sri Caitanya
Mahaprabhu visitava um lugarejo chamado Kurma, no sul da Índia, a
morada de uma Deidade da encarnação de tartaruga do Senhor - Nessa
cidade viva um brahmana védico chamado Kurma Vipra, que se encantou
com a refulgência de Mahaprabhu. Convidou-O para a sua casa, onde o
Senhor foi servido com grande devoção. Kurma se encantou tanto com
Ele, que quando chegou o momento de Sua partida, não aguentou suportar
a separação e caiu aos pés do Senhor, suplicando que o mesmo o
permitisse acompanhá-lO onde quer que Ele fosse. Mahaprabhu, ficou
muito feliz com a atitude de Kurma Vipra, porém respondeu-lhe o
seguinte:
“Nunca mais voltes a sugerir isso. Ao contrário, deves permanecer
em sua casa e cantar constantemente o Santo Nome de Krishna. Instrua a
todos que você encontrar na religião de Krishna. Seja um mestre espiritual
e por Minha ordem libera a todos nesta terra. Faça isso e nunca mais volte
a se enredar nas ondas da vida materialista. Certamente, um dia terás a
Minha companhia novamente, aqui, nesse mesmo lugar.”(Caytania-
caritamrta 2.7.127-9)
Em outro incidente do Caitanya Caritambrta, quando uma vez
Pradyumna Misra foi se encontrar com Sri Mahaprabhu, pediu-lhe para ser
instruído. Sri Mahaprabhu disse que seria melhor que fosse procurar a
Ramananda Ray e aprendesse com ele. Quando chegou lá, ele viu que
Ramanada Ray estava treinando as dançarinas do Senhor Jaganntha (uma
forma de Krishna), e que para isso, ele tinha que massagear os seus corpos.
Então Pradyumna Misra retornou a Gourasundara (Sri Caitanya
Mahaprabhu, o avatar dourado de Krishna) e explicou-lhe que não havia
conseguido tomar instruções de Ramananda Ray, uma vez que este estava
tendo um contato não usual com mulheres. Sri Mahaprabhu ao escutar isso
disse, “Apesar de ser um sannyasi (renunciante), a minha mente vacila ao
ver uma mulher, porém Ramanada Ray é superior a mim, porque ele pode
tocar em uma mulher sem se perturbar”. Embora Ramananda Ray fosse
um um chefe de família ocupado no serviço governamental, seu nível de
renúncia era extraordinariamente elevado. Dependendo da natureza do
praticante de bhakti yoga ele pode optar pela vida renunciada ou seguir a
vida regulada de um chefe de família, entretanto, o mais importante é
coloque Krishna no centro de suas vida e desenvolva um profundo apego
ao santo nome.
Srila Guru Maharaj não tinha desejo de aceitar a vida familiar
devido a sua forte propensão a renúncia. Ele fez referência aos incidentes
aflitivos que sua mãe havia sofrido e aliado a um desejo de estar sempre
engajado no serviço ao mestre espiritual de forma plena, para evadir a
ideia da possibilidade de entrar na vida familiar. Entretanto, Sri Caitanya
Mahaprabhu mesmo encorajou a permanência na vida familiar aliada a
prática e a pregação como uma maneira de se alcançar a perfeição
também. O mais importante é a sinceridade do praticante, que o leva a uma
conexão real com o plano transcendental. Uma vez estabelecida esse elo, o
sadhaka vai galgando patamares mais elevados de consciência até chegar a
um ponto de estabilidade que o leva a se atrair muito pela plano da
Realidade Absoluta.
Ainda que possa haver uma atração por maya (ilusao), ele rejeita
isso e somente se absorve em seu sadhana para logo alcançar um gosto
permanente na vida espiritual, que não pára de crescer e nutrir sua
existência a cada momento. Alcançada essa etapa, o sadhaka não se
desviará um centímetro sequer da sua ocupação constitucional como um
servo eterno em busca do seu objetivo supremo.
Não importando com o aspecto objetivo da realidade, ele somente
terá olhos para vislumbrar sua ascensão espiritual. Neste contexto,
qualquer situação que possa de alguma maneira desviar seu foco em seguir
seu caminho, será visto como uma ameaça ao a seu aperfeiçoamento.
Talvez tenha sido isso que tenha levado a Guru Maharaj a ter rejeitado de
forma tão incisiva a proposta de casamento feita por seus pais.

30
Capítulo 5
A INICIAÇÃO

Em uma ocasião,seu pai, Chakravarti Mahasai encontrou um


astrólogo muito famoso que era capaz de prever o dia exato da morte de
uma pessoa. Então, ele consultou a carta astrológica de seu filho e pôde
ver teria uma morte prematura. Este fato o deixou muito preocupado, para
confirmar o que havia visto no horóscopo de seu filho, também decidiu
procurar outra opinião com um astrólogo de confiança da família. Mas o
prognóstico foi o mesmo, uma morte prematura se anunciava na vida do
seu filho.
Na Índia, a astrologia tem uma grande importância na vida das
pessoas, e em todas as famílias existe o costume de consultar a um
astrólogo para verificar a tendência dos filhos tanto no âmbito material
como no espiritual. Por exemplo, quando Swami Maharaj Prabhupada
nasceu, seus pais fizeram sua carta astrológica, que predizia que Srila
Prabhupada seria o homem mais rico da Índia e que também abriria mais
de cem templos. Em um momento de sua vida, Srila Prabhupada pensou,
baseado nessa previsão, que primeiro teria que ganhar muito dinheiro com
seus negócios para somente depois pregar e satisfazer o desejo do seu
mestre espiritual de levar os Santos Nomes de Deus aos países de língua
inglesa.
Inclusive hoje, muitos casamentos são arranjados pela análise da
carta astral dos noivos, em que se analisa a natureza dos pretendentes para
ver se existe alguma compatibilidade entre os dois. Estudando o caráter
psíquico e tendências, um astrólogo experiente poderá auxiliar muito a
futura vida familiar dos namorados ou noivos.
Inclusive Srila Bhaktisiddhanta Sarasvati Thakur Prabhupada foi
um astrólogo muito famoso e erudito em sua época. Ele mesmo fundou um
grêmio astrológico, que foi intitulado de Assembleia Augusta, em que os
integrantes que quisessem fazer parte desse grupo de estudo, deveriam
fazer um voto vitalício de celibato para o resto da vida. Sendo assim, se na
Índia, um astrólogo famoso disser que alguém terá pouco tempo de vida,
isso é algo bastante assustador. Então não é de se estranhar que o pai de
Guru Maharaj entrasse em desespero. Mas é interessante notar que
Gurudeva viveu até os 102 anos aqui nesse plano material, sem muitos
problemas de saúde.
O ponto é que um devoto puro, exclusivamente dedicado ao
serviço devocional não tem a sua vida regida por ditames astrológicos ou
leis materiais. Krishna cuida pessoalmente da vida do seu devoto ekantika
bhakta (devoto exclusivo) de tal maneira que se torna muito parcial com o
mesmo, velando por ele em todos os momentos. Apesar que as escrituras
revelarem que Krishna é imparcial com todos, Ele pode ser parcial com
seus devotos rendidos e mostrar alguma preferência ou mesmo e mudar o
próprio karma deles. No Gita, (9.29), encontramos:
samo 'haṁ sarva-bhūteṣu
na me dveṣyo 'sti na
priyaḥ ye bhajanti tu māṁ
bhaktyā mayi te teṣu cāpy
aham

“Não invejo ninguém, tampouco sou parcial com alguém. Sou igual
para com todos. Porém, todo aquele que Me presta serviço com
devoção é um amigo, e está em Mim, e eu também sou seu amigo.”
Então poderíamos pensar que Krishna recompensa a todos de
forma equânime, mas isso nem sempre é assim, às vezes um devoto puro
agrada Krishna de maneira tão especial que dificilmente o próprio Krishna
não pode recompensá-lo ou em alguns casos Krishna pode mostrar
misericórdia para os mais desqualificados. Se diz que Krishna, em Seu
aspecto Paramatma (dentro do coração da entidade viva) é imparcial com
todos, e que em Seu aspecto pessoal, como Bhagavan, se torna parcial.
Como Paramatma, Ele somente observa a jiva (entidade viva) em todas as
suas ações, atuando somente como uma testemunha, enquanto que o
aspecto Bhagavan mostra sua parcialidade com seus devotos imaculados,
devido ao relacionamento amoroso que o devoto estabelece com Ele. Na
realidade, Krishna é completamente independente e por isso pode fazer o
que Ele quiser. Entretanto, Krishna diz no Bhagavad-gita (4.11)
ye yathā māṁ prapadyante
tāṁs tathaiva bhajāmy
aham mama
vartmānuvartante
manuṣyāḥ pārtha sarvaśaḥ

“A todos que se rendem a Mim, Eu recompenso proporcionalmente .


Todos seguem o meu caminho sob todos os aspectos, ó filho de Prtha.”
Sendo assim, no caminho constitucional, Krishna mostrará a sua
misericórdia para aqueles que se esforçaram para se render à Ele. Srila
Guru Maharaj costumava dizer: “ Primeiro mereça, depois deseje.” O
sadhaka tem que se esforçar no caminho da devoção ao ponto que possa
chamar a atenção do Senhor. Então, nesse momento Sri Bhagavan,
Krishna poderá recompensá-lo proporcionalmente ao seu esforço.
Também no Gita (9.22) encontramos:
ananyāś cintayanto
māṁ ye janāḥ
paryupāsate teṣāṁ
nityābhiyuktānāṁ
yoga-kṣemaṁ vahāmy aham

“Mas aqueles que sempre Me adoram com devoção exclusiva,


meditando em minha forma transcendental – para eles Eu trago o que
lhes falta e preservo o que eles tem.”
Então, o devoto exclusivo estará sempre protegido por Sri Krishna,
que cuidará inclusive das suas necessidades pessoais. Esta preocupação
por parte do Supremo é devido a que o devoto que é incompatível com
outro assunto que não seja a satisfação de Sri Krishna está cem por cento
ocupado ao serviço do Senhor.
Como foi dito anteriormente, Guru Maharaj havia escutado pela primeira
vez a respeito de Srila Prabhupada Bhaktisiddhanta de seu siksa guru
(Mestre instrutor, no caso Bhaktiratna Thakura). E em meados de 1915,
escutou do mesmo, que Srila Goura Kisora Das Babaji Maharaj estava
manifestando seu passatempo de desaparecimento em Navadwip Dham.
Então Gurudeva foi até lá tentar receber o darshan (visão) de Babaji
Maharaj, mas desafortunadamente, quando chegou ali, Babaji Maharaj
havia desaparecido um dia antes. No dia seguinte Gurudeva foi a Mayapur,
onde teve seu primeiro darshan de Srila Bhaktisiddhanta Sarasvati Thakur
Prabhupada.
Quando Guru Maharaj havia escutado a respeito de Srila
Prabhupada Bhaktisiddhanta de Srila Bhaktiratna Thakura, sentiu grande
atração por ele, e sentiu que seria seu futuro Gurudeva. Nesses dias,
Prabhupada Bhaktisiddhanta estava vestindo roupas de brahmacari
(monge estudante, no primeiro estágio da estrutura espiritual indiana), e
Gurudeva quando o encontrou, ofereceu reverências e recebeu um pouco
de mahaprasada (alimento santificado) das mãos da mãe de Srila
Prabhupada. Nesse ocasião, Prabhupada estava praticando muitas
austeridades, com a intenção de poder pregar a missão de Sri Mahaprabhu
por todo o mundo. Ele cantava todos os dias 192 voltas de japa, voto que
observou por três anos consecutivos, comendo apenas um pouco de
haviysanna* (uma preparação feita de arroz com vegetais, sem sal e
temperos). Gurudeva nessa ocasião pode ter o darshan de Prabhupada
umas três vezes mais e ficou muito impressionado com suas austeridades e
seu apego ao canto do santo nome.
Srila Krsna Dasa Kaviraj Gosvami instrui em seu Caytania-
caritamrta (Adi 9.5) a respeito do comportamento de Sri Caitanya
Mahaprabhu sobre a pregação aliada a prática:
ei-mata bhakta-bhava kari
angikara āpani ācari' bhakti
karila pracāra
“Dessa forma, assumindo o sentimento de um devoto, O Senhor
Caitanya pregou o serviço devocional enquanto praticava Ele
mesmo.”
Guru Maharaj nos brinda uma aclaração sobre esse tópico também:
“Nosso adorável Srila Prabhupada Bhaktisiddhanta deu o exemplo do
serviço devocional concentrado, da mesma maneira que fez Sri
Mahaprabhu, sabendo que sem ensinar pelo próprio exemplo, difundir
estas doutrinas é impossível.” (A Arte do Sadhana, capítulo 10, pág. 113)

Quando Gurudeva estabilizou a situação financeira que preocupava


sua mãe, ele a enviou de volta para a casa, e nesse momento, surgiu o
desejo de pedir iniciação espiritual para Srila Prabhupada Bhaktisiddhanta.
Prabhupada imediatamente disse: “Qual o dia que você gostaria de se
iniciar?” Srila Guru Maharaj respondeu: “O próximo dia auspicioso é
Janmastami (aniversário de Krishna, por volta de agosto).” Srila
Prabhupada sorrindo, disse: “Então, com a cabeça raspada nesse dia, venha
ver-me.” Sendo assim, no dia de Janmastami do ano de 1923, Srila
Prabhupada, em seu próprio quarto, o iniciou.
Seu nome era Sri Promod Bhusan, o que significa: “ Aquele que se
alegra com o entretenimento (como música).” Seus pais pensavam que
esse nome tinha sido apropriado para ele, uma vez que ele amava a música
desde criança. Srila Prabhupada disse: “Entretenimento musical não pode
dar felicidade à você. À partir de hoje, seu nome será Pranavananda
Brahmacari (aquele que se alegra com o som sagrado). Desde esse dia
começou a viver na Gaudiya Math.
Poderíamos dizer que esses incidentes acima mencionados,
marcam profundamente os corações do sadhaka (praticante) para o resto
de suas existência com o emblema da devoção estampada dentro do ser. O
momento em que uma alma afortunada decide buscar refúgio em um Guru
genuíno e seguir o caminho da bhakti yoga, subtende-se que deve-se
realizar uma mudança completamente radical em todos os conceitos
internos.
Tornar-se discípulo significa ser um revolucionário, antes de tudo,
um discípulo é aquele que diz não aos conceitos externos, querendo
sempre controlar os sentidos e a mente, ele luta contra seus inimigos
internos e não tenta mudar o meio ambiente. Poderíamos dizer que ele é
um idealista, e como tal será capaz de se sacrificar pelo seu ideal, não
deixando pedra sobre pedra. Ele terá que destruir seus velhos conceitos e
renovar a sua consciência.
Uma nova vida deve ser construída, esquecer o passado e não
pensar muito no futuro, que afinal de contas, será sempre incerto.
Mergulhar no presente e acreditar que através da sua sinceridade será
levado aos poucos à outra direção, completamente oposta a que vinha
trilhando e tomar a decisão de querer queimar a ponte que acabou de
atravessar. Como dizia Srila Sridhara Maharaj: “ Para essa viagem, deve-
se comprar uma passagem somente de ida.” Entender que este momento
que agora se manifesta é uma somatória de uma longa viagem que agora
está chegando ao final. Foram muitas jornadas, ora em planetas celestiais,
ora em planetas infernais, diversas classes de corpos... Mas agora está
chegando ao fim. Isso é confirmado no Caitanya-caritamrta, na instrução
dada por Śrī Caitanya Mahaprabhu para Śrila Rupa Goswami no
Dasasvamedha-ghaṭa (na Índia).O Caytania-caritamrta (Madhya 19.151) diz:
brahmāṇḍa bhramite kona bhāgyavān
jīva guru-kṛṣṇa-prasāde pāya bhakti-
latā-bīja

“De acordo com seu karma, todas as entidades vivas vagueiam pelo
universo inteiro. Algumas delas elevam-se aos sistemas planetários
superiores, e outras mergulham em direção aos sistemas planetários
inferiores. Entre milhões e milhões de entidades vivas errantes, aquela
que é afortunada recebe a oportunidade de, pela graça de Krishna,
associar-se com um mestre espiritual fidedigno, tal pessoa consegue a
semente da trepadeira da devoção do serviço devocional.”

Receber a oportunidade de poder encontrar um Sat-Guru (mestre


genuíno) é algo extremamente raro, não podemos imaginar o quão
afortunados somos se temos a oportunidade conseguir esse tipo de
conexão. Deveríamos aproveitar ao máximo a chance que Krishna está nos
dando, seríamos ingratos se desperdiçássemos este momento. Um tesouro
tão valioso nos foi dado e se não cuidamos muito bem dele seremos
negligentes ao ponto de dilapidar esse capital que nos foi dado. Imagine
que alguém nos dá um diamante de presente - ficamos muito felizes de
receber esta preciosidade. O que faremos com o diamante então?
Deixaremos jogado em qualquer canto, sem nenhum cuidado? Ou
guardaríamos em local que protegido e bem cuidado? Se somos sérios em
nosso processo de vida espiritual, vamos receber a iniciação como algo
que terá que ser velado com todo cuidado e aos poucos vamos
incrementando nossa devoção por polir este tesouro que agora possuímos.
É necessário cuidar muito bem daquilo que recebemos através da
misericórdia de Krishna. Entender que isso foi difícil de se conseguir, se
perdemos esta oportunidade que agora recebemos, estaremos jogando fora,
de forma muito caprichosa, algo que poucas pessoas podem receber.
Deveríamos entender a grande possibilidade que temos em nossas mãos
para mudar todo o curso de nossas vidas, começar uma viva nova e sempre
estar sob a guia do guardião. É algo que não podemos menosprezar e nem
deixar de refletir sobre isso. O Caytania-caritamrta (Madhya 22.47) nos
ensina que:
Krsna yadi kripa kare kona
bhagyavane guru-antaryami-rupe
sikhaya apane

“Krishna encontra-Se no coração de todos como Caitya-guru, o mestre


espiritual interno. Ao mostrar-Se favoravelmente inclinado a alguma
afortunada alma condicionada, Ele pessoalmente lhe dá lições de como
progredir no serviço com devoção, instruindo-a como a Alma
Suprema, internamente, e como o mestre espiritual, externamente.”

Diante do verso supra citado, podemos confirmar tudo aquilo que


estava sendo explanado anteriormente. Krishna pessoalmente está
favorecendo a jivatma (ser interno). Com Seu olhar misericordioso,
observou o sofrimento da mesma desde tempos imemoriais e agora por
Sua misericórdia, a alma poderá ser resgatada do atoleiro desse maya-
samsara (nascimento e morte regido pela ilusão material).
Momentos iniciais tão essenciais, em que Krishna mesmo, na
forma de caitya-guru (guru interno) começa a dar instruções para a
entidade viva que está enredada nesse mundo material. De certa maneira, o
ser interno poderá se beneficiar muito com estas instruções, é através delas
que alma poderá se direcionar no caminho correto em busca da sua boa
fortuna, mas em dado momento ela precisará de instruções mais
específicas para que possa ser colocada na busca de sua posição original.
Então, Krishna mesmo se manifesta como o Guru externo que vai
de encontro a entidade viva para socorrê-la da situação aflitiva em que se
encontra. O Guru funciona como um facilitador que está limpando o
terreno para que a alma possa caminhar. Poderíamos dar o exemplo de
uma pessoa que tem uma deficiência física e que necessita de certo auxílio
para seu deslocamento, para sua segurança, ali estará um facilitador, que
auxiliará retirando os obstáculos que porventura possam atrapalhar o seu
caminho. Sendo assim, o papel do Guru é fazer muitos ajustes para que os
principiantes possam entender a posição em que se encontram, a isso
damos o nome de sambandha-jnana, ou seja, um conhecimento preliminar
que vai mostrar a verdadeira posição da jiva (alma).
A vida espiritual começa com perguntas inteligentes, por exemplo,
“quem eu sou?”. O mestre espiritual terá que explicar para o estudante que
ele é uma alma, um ser espiritual e que já não deveria se identificar tanto
assim com o corpo material. Foi o que Krishna fez no Bhagavad-gita logo
no início, quando explicava a natureza da alma, dizendo para Seu discípulo
Arjuna, que estava um pouco confuso em relação ao seu dever.
E Krishna lhe disse logo de entrada, que ele não deveria se
lamentar pelo que poderia acontecer no campo de batalha, não deveria se
lamentar nem pelos vivos, nem pelos mortos e que nunca houve um tempo
que ele não existisse e que nunca deixaria de existir e que todos os
combatentes também não deixariam de existir. Depois disso Krishna
passou a explicar a natureza da alma - como eterna, que nunca pode ser
destruída, que é não nascida e imutável. Isso é um tipo de instrução
essencial para o começo da vida espiritual. O discípulo deverá ser
orientado sobre onde está situado no momento, ou seja, no devi-dham
(mundo material, onde tudo morre) e também terá que entender as
características de maya. Maya significa aquilo que não é, ou seja, um
mundo de conceitos equivocados, que nos distanciam da Verdade
Absoluta. Mas temos também que entender que maya é uma energia que
trabalha para Krishna. No próprio Gita (7.14) aprendemos:
daivī hy eṣā guṇamayī
mama māyā duratyayā
mām eva ye
prapadyante māyām
etāṁ taranti te

“Essa minha energia divina (maya) é muito difícil de ser superada, mas se
você se rende a Mim, poderá facilmente superá-la.”

A respeito disso, o Guru também deverá tratar de forma minuciosa


com o discípulo, porque o mesmo deverá saber onde está situado e
entender o tamanho da enrascada que ele está metido, que o mundo de
maya sempre o leva para longe da bem-aventurança que está corporificada
em Krishna. Na mesma proporção que sentimos atração por Krishna,
sentimos atração por maya, e quando tentamos nos aproximar de Krishna,
maya se coloca diante de nós como um obstáculo para impedir nossa
aproximação, este é o seu papel. Maya muitas vezes pode se apresentar de
uma forma que nos engana facilmente, pois essa energia de Krishna é
suprema, ou seja, possui uma inteligência sobre-humana, nós não podemos
competir com ela, seremos facilmente enganados.
Algo que pode parecer muito bom e atraente e que se mostra
muitas possibilidades de nos trazer felicidade, será um grande engano de
maya. Se pegarmos um copo de água misturada com cal e colocarmos ao
lado de um copo de leite. Aparentemente não vai haver diferença, mas
quando tomamos os dois sentiremos grande diferença. O leite irá nutrir o
nosso corpo e será saboroso desde o início ao final, enquanto o copo com
água e cal será amargo e causará um grave dano no nosso organismo.
Assim atua maya, nos enganando, fazendo-nos beber veneno enquanto
pensamos que é néctar. O preceptor védico terá que ser muito perito para
nos mostrar como podemos escapar de maya e se refugiar em Krishna.
Nesse contexto, quando nos aproximamos do Guru munidos de muita
sinceridade no coração e dispostos a mudar completamente nossos
conceitos equivocados, nossa existência será coroada com toda a
auspiciosidade derramada por Krishna através do seu devoto puro.
Capítulo 6
O SERVIÇO

Quando Srila Guru Maharaj foi viver na Gaudiya Matha, ele se


ocupava dia e noite em serviço responsável a seu Gurudeva. Nesse
momento, a Gaudya Matha vivia um momento de efervescência espiritual,
em que todos os residentes do templo se dedicavam a algum serviço
relacionado com a pregação. Srila Prabhupada Bhaktisiddhanta estava
muito entusiasmado em difundir a mensagem transcendental de Srimad
Mahaprabhu para todo o mundo. E uma das principais táticas de pregação
foi a impressão e distribuição da literatura transcendental. Srila
Prabhupada (em toda essa obra, Srila Prabhupada se refere a Srila
Bhaktisiddhanta Sarasvati Thakur, o Guru de Srila Bhakti Pramode Puri
Goswami – não deve ser confundido com Srila Swami Bhaktivedanta que
expandiu a Consciência de Krishna para o Ocidente nos anos 1960-1970,
que posteriormente também foi chamado de Srila Prabhupad) considerava
a pregação através dos livros e revistas como sendo uma grande
ferramenta para o assunto da pregação.
Ele chamou a impressão de livros de brhad-mrdanga (o grande
tambor), porque a mrdanga que é usada no sankirtana (quando os devotos
saem para cantar nas ruas) pode ser escutada apenas em uma curta
distância, enquanto a pregação através de publicações de revistas e livros
pode propagar a mensagem de Sri Caitanya Mahaprabhu por todo o
mundo. Na realidade, um dos primeiros passos na estratégia de pregação
de Srila Prabhupada foi abrir uma imprensa em Calcutá (na Índia)
chamada Bhagavata Press onde imprima os livros. Então, o primeiro
manifesto foi publicado e intitulado de Nadiya Prakas, logo um jornal
diário, Dainik Nadiya Prakas e a famosa revista Gaudiya Magazine
também foi uma das principais publicações da missão de Srila Prabhupada.
Srila Guru Maharaj esteve sempre muito envolvido nessas três publicações
como editor ao mesmo tempo, estava ocupando-se intensamente nesse
serviço. Ele teve a boa fortuna de se associar intimamente com Srila
Prabhupada por trinta anos. Durante esses tempo, ele o serviu
pessoalmente, sempre estava recordando e anotando suas leituras e
conversas, as quais foram mais tarde publicadas. Em grande parte, as
palavras faladas por Srila Prabhupada que nós temos hoje em dia foram
transcrições dessas notas.
Ao mesmo tempo, Srila Guru Maharaj (refere-se a Srila Bhakti
Pramode Puri Goswami Maharaj) cultivou um conhecimento profundo das
escrituras Vaisnavas, tornando-se um verdadeiro celeiro da fortuna
transcendental dos ensinamentos de Sri Caitanya Deva. Srila Gurudeva foi
braço direito no bater da mrdanga , ou em outras palavras, o tambor, na
publicação de livros da Gaudiya Math. A ele lhe foi dada a posição de
editor porque possuía muitas qualificações. Tinha nascido em uma família
de brahmanas elevados, e possuía uma escolaridade sem paralelos e ainda
assim, ele sempre foi humilde e sem orgulho. Expressava sua humildade à
todos os vaisnavas, sendo avançados ou neófitos.
Seguindo as diretrizes de Srila Prabhupada, nosso Gurudeva
editou, escreveu, publicou e ajudou a distribuir incontáveis publicações
espirituais. Ele foi inicialmente inspirado diretamente por Srila
Prabhupada a começar escrever e contribuir com artigos da Gaudiya
Magazine que era considerada a espinha dorsal do trabalho missionário da
Gaudiya Math. Por sete anos serviu como revisor e como um dos editores
principais. Também esteve encarregado de publicar o único jornal diário
mundial Vaisnava, o Dainik Nadiya Prakasa. Ele manteve esse serviço por
dois anos, publicando todos os discursos diários de Srila Prabhupada e de
outros contemporâneos. Seu serviço e aprendizagem não passou
despercebido por Srila Prabhupada, o qual o nomeou com os títulos de
mahapadesaka (o grande instrutor) e pratna-vidyalankara (aquele que
mantém a sabedoria da antiga erudição escritural)
Depois do desaparecimento de Srila Prabhupada Bhaktisiddhanta
Sarasvati Thakur, Srila Gurudeva continuou com sua vocação de espalhar
os conhecimentos de Sri Mahaprabhu através da revista Gaudiya
Magazine. Depois, seu irmão espiritual, Srila Bhakti Dayita Madhava
Maharaj, o convidou para encabeçar o corpo editorial da revista Caitanya
Vani, serviço que manteve por trinta e dois anos. O nosso venerável Guru
Maharaj esteve ao total consubstanciado em mais de sessenta anos de
escritos da filosofia e teologia Vaisnava.
Diariamente Srila Prabhupada Bhaktisiddhanta costumava sair para
fazer uma caminhada matinal e nesse momento ele ditava algum artigo
para ser publicado na revista semanal que imprimiam e ao mesmo tempo,
também ditava outro artigo para ser publicado no jornal e algum texto para

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algum livro que estava escrevendo. Alguns devotos que acompanhavam-
no nessa empreitada ficavam atentos para reter todas essas instruções.
Guru Maharaj que sempre estava presente nessas jornadas, escutava
atentamente e depois mais tarde transcrevia o que tinha escutado para as
publicações que ele era responsável. Como naquela época não havia
nenhum aparato eletrônico que fosse capaz de gravar as interlocuções
respectivas, ele tinha que somente usar sua memória para semelhante
tarefa. Depois à noite, ele redigia os artigos que seriam impressos logo em
seguida.
Em muitas ocasiões, Gurudeva também tinha que ministrar
palestras para os convidados que chegavam ao templo, quando Srila
Prabhupada estava ocupado em outros afazeres. Além disso, cumpria o
voto de cantar diariamente 64 voltas de japas (terço usado na meditação
vaisnava)e em muitas ocasiões seu tempo era muito reduzido para a
realização de todas estas tarefas. E ele relatou: “Toda vez que eu propunha
a Srila Prabhupada a possibilidade de reduzir meu canto de alguma
maneira, atento ao meu esquema diário de atividades, Prabhupada
replicava, insistindo que todos deveriam tentar cantar um lakh de nomes
diários (64 voltas de japa). Em tal sentido, seu conselho era firme, de que
todos deveriam encontrar tempo para completar esse canto de um lakh de
santos nomes diários como uma prática rotineira. E acrescentava que
cantar esse lakh de nomes não era o fator principal, senão que o devoto
deveria se esforçar para permanecer atento durante dito canto e deveria
também evitar as ofensas contra o Santo Nome. E continuava agregando
que aqueles que tivessem o mais leve respeito por Sri Mahaprabhu, não
deveriam desconsiderar suas palavras em nenhum sentido.”
O serviço é a vida de um devoto, ele se sacrificará ao máximo para
executar as tarefas que lhe corresponde, entretanto nunca negligenciará o
seu sadhana (praticas espirituais) em prol do serviço. Sempre tentará
harmonizar o serviço com o sadhana, para poder continuar praticando
serviço. O canto do Santo Nome também deve ser considerado como um
serviço, não somente um serviço, mas o serviço mais importante de todos
os tipos de serviços que podem ser executados para Krishna. Sri Rupa
Gosvamipada, um dos principais seguidores de Sri Caitanya Mahaprabhu,
elaborou em seus escritos, que existem mais de mil serviços que poderiam
ser praticados ao Senhor Krishna e que dentre eles, sessenta e quatro são
os mais importantes. Dos quais, nove foram considerados como principais.
Aceitando a instrução dada por Sri Prahlada Maharaj, citado no Srimad
Bhagavatam (7.5.23-24) :
Sri Prahlada Maharaj uvaca
śravaṇaṁ kīrtanaṁ
viṣṇoḥ smaraṇaṁ pāda-
sevanam arcanaṁ
vandanaṁ dāsyaṁ
sakhyam ātma-nivedana m

iti puṁsārpitā viṣṇau


bhaktiś cen nava-lakṣaṇā
kriyeta bhagavaty addhā
tan manye ’dhītam
uttamam

“Prahlada Maharaja disse: Ouvir e cantar a respeito do Santo Nome,


da forma, das qualidades, da parafernália e dos passatempos do
Senhor Visnu, que são todos transcendentais, lembrar-se deles, servir
aos pés de lótus do Senhor, oferecer ao Senhor respeitosa adoração
com dezesseis classes de artigos, oferecer orações ao Senhor, tornar-se
Seu servo, considerar o Senhor o melhor amigo de todos e entregar-
Lhe tudo (em outras palavras, servi-lO com corpo, mente, palavras) -
estes nove processos são aceitos como serviço em devoção. Alguém que
dedicou sua vida a servir a Krishna através desses nove métodos deve
ser considerado a pessoa mais erudita, pois adquiriu conhecimento
completo.”
Sri Caitanya Mahaprabhu também aceitou esses nove processos de
serviço como os melhores para se alcançar a perfeição, no Caytania-
caritamrta (Antya 4.70-71) encontramos:

bhajanera madhye śrestha nava-vidha


bhakti krsna-prema krsna dite dhare maha-
śakti tara madhye sarva-śrestha nama-
sankirtana niraparadhe nama laile paya
prema-dhana
“Dentre as maneiras de se executar serviço com devoção, os nove
métodos prescritos são os melhores, pois esses processos têm grande
potência de outorgar Krishna e o amor extático por Ele. Dos nove
processos de serviço com devoção, o mais importante é sempre cantar
o Santo Nome do Senhor. Quem faz isso e evita as dez espécies de
ofensas - obtém mui facilmente o valiosíssimo amor por Deus”.
O canto do Santo Nome se estabelece por cima de todos os demais
processos do serviço com devoção, por isso nossos Acharyas (mestres que
ensinam pelo exemplo) predecessores deram tanta importância a sua
prática. Todo o esforço feito com o objetivo de se estabelecer centros de
pregação em todo mundo e tantos livros escritos, publicados e distribuídos
tem como meta fundamental levar as pessoas a terem um contato com o
Santo Nome. Sendo assim, podemos ver a importância de estabelecer o
canto como a prática mais importante em nosso esquema de atividades
diárias. Não podemos desconsiderar tantas citações das escrituras e
exemplos práticos de nossos mestres predecessores; que com seu exemplo
pessoal deixaram instituídos os ditames a serem seguidos por nossa
sampradaya (linhagem filosófica).
Reservar algumas horas de nosso precioso dia para tentar cantar o
Santo Nome de forma concentrada é a maneira mais plausível de
avançarmos na vida espiritual. Entretanto, devemos salientar que o canto
sempre deve ser acompanhado de uma atitude de serviço, sem isso, nosso
canto não terá a mínima possibilidade de atrair a atenção de Sri Krishna. O
serviço, sob a guia de um sad-guru (guru genuíno) é essencial para que
possamos nos ocupar de forma ativa em nossa vida espiritual.
Se preenchemos nosso tempo com um serviço responsável,
veremos que é uma maneira muito eficaz de se proteger de maya e seguir
adiante com nossa prática do canto. Na realidade quando cantamos
estamos pedindo serviço, pedimos para ser atraídos ao serviço de Radha-
Krishna e sermos afastados do serviço a maya (ilusão).
Por isso se cantamos é para cada vez mais nos ocupar em serviço a
Divindade e se estamos servindo, temos que cantar também para que nossa
consciência se eleve ao nível transcendental e deixe de buscar os aspectos
temporários deste plano fenomênico. Diz-se que estamos onde nossa
mente está situada. Então, por exemplo, se estamos varrendo a sala do
templo, mas nossa mente está pensando em algo mundano, isso não pode
ser caracterizado como um serviço de primeira classe. Podemos alcançar
alguma purificação com esse serviço, mas na realidade não alcançaremos o
objetivo desejado, que é se conectar completamente com a Verdade
Absoluta.
Krishna fala no Gita: Man-mana bhava mad- bhakto, “Pensa
sempre em Mim e torne-se Meu devoto...”. Essa instrução Ele dá como
conclusão do capítulo nove, denominado: “o conhecimento mais
confidencial” e novamente repete este verso no final do Gita (18.65),
chegando a conclusão da obra, no capítulo dezoito , designado como, “a
perfeição da renúncia.”
Verdadeiro serviço significa pensando sempre em Krishna, e isto
seria muito fácil se nós não estivéssemos contaminados pelos modos da
energia material e se não nos encontrássemos com mente perturbada e
sentidos completamente descontrolados. Por isso, é muito importante usar
os sentidos externos para praticar a meditação, quando cantamos e
escutamos o que estamos pronunciando, estamos realizando a meditação
mais eficiente nesta era de ferro chamada Kali-yuga.
O serviço executado por Guru Maharaj ao seu amado Gurudeva,
foi de importância crucial para missão da Gaudiya Math. Além disso,
entendemos que escrever também é uma forma de cantar (kirtana), na
realidade, é considerado como o tipo de kirtana mais elevado de todos.
Quando cantamos em nossas japas, muitas vezes podemos estar distraídos
e isso é bem normal nos estágios preliminares do canto, diversas vezes o
praticante se vê dormindo no canto da japa e raramente consegue uma
concentração sem nenhum desvio.
Quando cantamos em congregação, estamos mais despertos e
inclusive podemos também dar pulos de euforia. Mas do mesmo modo na
maioria das vezes nossa mente não está no objeto da meditação, que
deveria ser Radha-Krishna. Em muitos bhajanas coletivos, os praticantes
estão sendo mais atraídos pela melodia do que pela própria essência do
canto, sendo assim, o aspecto aparente da meditação coletiva muitas vezes
sobressai ao aspecto real e os praticantes não conseguem se absorver
internamente.
Pregar também é uma forma de kirtana e de uma maneira geral é
considerada como sendo superior ao canto da japas e bhajanas, uma vez
que quem está pregando deve ter uma concentração muito forte para poder
transmitir a sua mensagem ao público ao mesmo tempo que tenta entregar
um pouco de bhakti (devoção) de acordo com sua realização. Muitas vezes
pudemos ver o comportamento de alguns pregadores que antes de suas
preleções estavam cantando em suas japas e de certa maneira sentiam um
pouco de frio e sonolência e quando começaram a falar de Krishna,
imediatamente começavam a se livrar de seus casacos e de maneira muito
desperta, seguiam dando discursos entusiasmados para os seus ouvintes.
Para escrever a respeito de Krishna e de tópicos transcendentais se
requer mais concentração e absorção ainda maiores do que são necessários
para pregação. Sendo a forma mais elevada de kirtana, os devotos que se
dedicam a esse serviço estão completamente extasiados e alheios aos
acontecimentos que os rodeiam. Sendo assim, é curioso notar o
comportamento de Srila Prabhupada Bhaktisiddhanta que, mesmo sabendo
da importância do serviço realizado por seu discípulo querido, não o
permitiu diminuir o número de voltas de japas que vinha praticando desde
o momento da sua iniciação.
Na realidade, Srila Prabhupada foi que estabeleceu o Gaudiya
Vaisnavismo como conhecemos hoje em dia. Ele idealizou uma maneira
que fosse mais plausível para que as pessoas pudessem praticarem bhakti-
yoga. Naquela época, muitos devotos tentavam se isolar na selva e cantar o
Santo Nome o dia inteiro, mas logo muitos problemas surgiam dessa
tentativa e eles, na maioria das vezes caiam vítimas da mente e acabavam
tendo um desvio de comportamento, se envolvendo ilicitamente com
mulheres e outros desvios. Por isso, Srila Prabhupada teve o cuidado de
estabelecer muitas atividades em que os praticantes pudessem ser
ocupados de diversas maneiras e não somente cantar o Santo Nome na
japa o dia todo já que isso se tornava algo inviável para quase todos os
aspirantes à devoção, apesar de que muitas escrituras enfatizam o canto
massivo do Santo Nome como o processo principal para se obter a
perfeição.
Somente a título de esclarecimento, no Hari-bhakti-vilas, Sri
Sanatan Gosvami, cita alguns versos informando que apesar do processo
para se alcançar a realização em satya-yuga (primeira era, a de ouro) fosse
a meditação e em treta-yuga (segunda era, de prata) a prática de
sacrifícios, e para dvapara-yuga (terceira era, de bronze) fosse a prática da
adoração à Deidade - ainda assim, era recomendado o canto do santo nome
na japa para se obter a realização. Sanatan Gosvami, citando os sastras
(escrituras), diz que em satya-yuga o sadhaka deveria cantar um lakh de
santos nomes diariamente, ou seja, sessenta e quatro voltas. E que em
treta-yuga se deveria cantar dois lakhs (cento e vite oito) por dia e que em
dvapara-yuga deveriam ser cantados três lakhs diariamente (cento e
noventa e duas voltas) e para Kali-yuga, como o processo para alcançar a
realização é obtido somente através do canto, o praticante era aconselhado
a cantar quatro lakhs diariamente (duzentos e cinquenta e seis voltas).
Apesar dessas informações, vemos que Srila Haridas Thakur, o
Acarya do santo nome para Kali-yuga cantava três lakhs diariamente e
ainda pregava. Por isso foi muito glorificado por Sanatan Goswami, que
lhe disse que era a perfeita encarnação da devoção. Sanatan continuou
comentando que algumas pessoas gostavam muito de pregar, mas não
gostavam de praticar, enquanto outros gostavam muito de praticar e não
gostavam de praticar, mas Haridas Thakur era perfeito, porque todos os
dias cantava cento e noventa e duas voltas de japa e ao mesmo tempo
estava pregando.
Sri Caitanya Mahaprabhu estabeleceu como norma que se cantasse
um lakh de nomes diariamente (sessenta e quatro) para que as pessoas
deixassem de ser caídas. Em uma ocasião, alguns brahmanas se
aproximaram do Senhor e o convidaram para comer em suas casas e Ele
costumava sorrir e responder dessa maneira a esses convites frequentes:
“antes de tudo, converta-se em um milionário (lakhsa-pati). Eu somente
como nas casas dos milionários.” Ao escutar isso, os brahmanas que
haviam feito o convite se desconcertavam e ficavam preocupados. Eles
faziam alguns comentários de forma abnegadas e então um deles disse ao
Senhor: “ Senhor, nenhum de nós tem sequer mil rúpias (dinheiro indiano),
que dizer um lakh (cem mil) rúpias. Porém se Você não aceitar o meu
convite, então minha vida como chefe de família estará arruinada e seria
melhor lançar-me ao fogo.”
O Senhor respondeu: “Sabe o que eu quero dizer com lakhsa-pati?
Me refiro a alguém que canta cem mil nomes do Senhor todos os dias.
Para Mim, essa pessoa é um verdadeiro milionário. Eu somente aceito os
alimentos na casa de alguém assim e nunca como em nenhuma outra
parte.”
Quando os brahmanas escutaram a declaração do Senhor, ficaram
contentes e já não se preocuparam mais. Disseram: “Muito obrigado
Senhor. Nós vamos cantar cem mil nomes cada dia. Por favor, venha a
nossa casa. Somos muito afortunados por sermos ensinados desse
modo.”(Caitanya Bhagavata 3.9.128)
Também é muito importante notar, que sempre vamos nos deparar
com diferentes pontos de vista em relação ao canto da japa e o serviço. Em
algum momento e em diversas a circunstâncias aleatórias, um Acarya
poderá optar dar mais ênfase a um em detrimento de outro. Por exemplo,
Srila Bhaktivedanta Swami Maharaj Prabhupada estabeleceu que seus
discípulos deveriam cantar dezesseis voltas de japa todos os dias e o
restante do tempo se ocupar em serviço relacionado a pregação. Essa foi
sua ênfase e entendemos que os discípulos que seguiram sinceramente a
sua instrução puderam alcançar altos estágios de devoção e
consequentemente a perfeição.
O mais importante neste contexto, é seguir as diretrizes do
preceptor védico e agradá-lo, seguindo suas instruções relativas a
quantidade que se deve cantar e ao mesmo tempo estar pendente do
serviço que tem ser realizado.
Um dos principais slogans de Srila Prabhupada Bhaktisiddhanta
Sarasvati Thakura relacionados ao santo nome era que: “Uma pessoa
deveria equilibrar o seu tempo com lakh de nomes que deveriam ser
cantados em equilíbrio com todos os outros serviços no templo.” Então,
talvez essa seja a explicação do motivo pelo qual Srila Prabhupada
Bhaktisiddhanta exigiu que Guru Maharaj (Srila Bhakti Pramode Puri
Goswami Maharaj) mantivesse seu voto de cantar sessenta e quatro japas
diariamente a despeito de tanto serviço que realizava.

Capítulo 7
A ENTREGA

Uma vez, Sri Nandasunu Brahmacari (depois conhecido como Srila


Bon Maharaj) e Srila Guru Maharaja foram visitar um chefe de família,
discípulo de Srila Prabhupada Bhaktisiddhanta, que se chamava Vaikuntha
Babu. Ele tinha um filho de onze anos. O menino estava muito atraído pela
associação dos brahmacarys (monges celibatários). Então, Srila Guru
Maharaja disse a seu irmão espiritual: “o pai do menino esperava que seu
filho fosse um rico fazendeiro, ou um doutor, ou mesmo um bom
cantante” E dirigindo a palavra a Vaikuntha Babu, Gurudeva disse: “Seu
filho é muito extraordinário. Ele está todo o tempo conosco. Não sai para
brincar com os outros meninos da sua idade?” O pai disse: “ Não. Desde
criança ele é sido assim. Ele está profundamente atraído ao Hari-katha
(conversas sobre Krishna)”. Enquanto falava assim de seu filho, ficou
emocionado e começou a chorar. Então o pai perguntou: “Porquê você está
perguntando a respeito do meu filho? Você gostaria de levá-lo para a sua
missão?” Srila Gurudeva respondeu: “Nós gostaríamos muito de ter um
menino como ele em nossa missão.” O Pai disse: “Então, que assim seja!
Leve-o com vocês.” O pai, não quebrou a sua palavra quando chegou o
momento dos brahmacarys partirem e entregou seu filho como havia
prometido.
Srila Gurudeva disse depois: “foi muito surpreendente ver a
felicidade com que os pais enviaram seu filho de onze anos de idade para
viver no Math (templo). Esse incidente me faz recordar a mãe de Dhruva
Maharaj, a qual vestiu a Dhruva com suas próprias mãos e o enviou para
floresta para meditar em Krishna.” Srila Prabhupada Bhaktisiddhanta
desenvolveu um afeto muito especial pelo novo residente do Math, e esse
garoto de apenas onze anos de idade, mais tarde recebeu o nome de Sri
Radharaman Brahmacari, tornando-se posteriormente Srila Bhakti Kumud
Santa Maharaj, um grande pregador da consciência de Krishna.
O conhecimento espiritual nos leva a entender o verdadeiro
propósito da vida, não viemos a este mundo material somente para
executar atividades laborais ou então qualificar-nos em algo específico e
com isso nos tornarmos especialistas em algum tópico. Porque hoje em
dia, vemos que as pessoas são estimulas a se aprofundarem em somente
um assunto, abandonando o entendimento mais generalizado de aspectos
que fogem ao seu domínio. Quando por exemplo, uma pessoa vai a um
médico procurando algum tratamento, o doutor é incapaz de analisar seu
paciente de uma maneira mais ampla. Será incapaz de examinar o seu
aspecto psicológico e emocional por exemplo.
A sociedade busca padronizar tudo sobre o pretexto de “facilitar”,
mas na realidade o que vemos é uma banalização do ser humano como um
todo. Em um mundo onde os valores estão baseados no quanto você tem,
sem se importar com a essência do ser, transforma-se a convivência entre
as pessoas algo completamente artificial. A situação se agrava ao extremo
quando levamos em consideração a espiritualidade das pessoas, nesse
aspecto sentimos uma profunda tristeza ao ver o ser humano se
distanciando cada vez mais da sua essência. Quase ninguém se
preocupando com o plano da alma, com a consciência que mantém tudo
vivo, que anima e ilumina o ser. Sem essa substância dentro de nós, não
podemos viver, nossas funções fisiológicas dependem em última análise
da alma e é incrível que as pessoas não se preocupem em absoluto com
algo tão essencial.
No incidente acima, os pais de uma criança de apenas onze anos de
idade entregam seu filho para espiritualistas com muita felicidade em seus
corações, sem nenhum remorso, o enviaram para viver no templo, sendo
privados de sua companhia por tempo indefinido. Que tipo de pais
poderiam ser tão corajosos para realizar tamanho sacrifício? Somente
aqueles que estão imbuídos com muita sabedoria transcendental. Entender
que quanto mais cedo começamos a praticar vida espiritual, maior será a
possibilidade de alcançarmos a perfeição nesta mesma vida. No Srimad
Bhagavatam (7.6.1) Srila Prahlada Maharaj disse:
kaumāra ācaret prājño
dharmān bhāgavatān iha
durlabhaṁ mānuṣaṁ
janma tad apy adhruvam
arthadam

“Aquele que é bastante inteligente deve, desde o começo de sua vida,


saber usar o corpo humano e então, desde tenra idade da infância,
praticar as atividades do Serviço com devoção, abandonado todas as
outras ocupações. O corpo humano é muito raro de ser obtido, e,
embora temporário como os outros corpos, é valioso porque, nessa
vida humana, pode-se executar serviço com devoção. Mesmo com
pouco de serviço com devoção de forma sincera, pessoa pode alcançar
a perfeição completa.”
Também encontramos no Srimad Bhagavatam (2.2.23) :
na hy ato 'nyaḥ śivaḥ panthā
viśataḥ saṁsṛtāv iha
vāsudeve bhagavati
bhakti-yogo yato bhavet

“Para aqueles estão vagando no universo material, o processo de


liberação mais auspicioso é aquele que leva ao serviço devocional
direto ao Senhor Supremo.”
Quais são as verdadeiras necessidades da vida? Devemos inquirir
sobre aquilo que é essencial, eliminando tudo que é supérfluo em nossa
jornada, não podemos levar um peso extra nesta caminhada, qualquer
coisa que cause alguma dificuldade, deverá ser eliminado sem hesitação.
Nossa vida deve ser direcionada desde a infância rumo a espiritualidade,
sem perda de tempo e tentando evitar o desperdício de energia.
Vamos imaginar que esta vida é como uma caminhada, em que
temos um destino final, começamos a caminhar desde quando nascemos e
sempre temos que caminhar, porque a ação do tempo sobre nós não para
nem sequer um instante. Por isso temos que ser bem vigilantes para
aproveitar cada momento de nossa existência neste plano. Mas, vamos
imaginar que alguém o chamasse para fazer uma caminhada no parque e
então nesse momento, você decidisse amarrar um saco cheio de areia no pé
e fosse caminhar dessa maneira... Seria algo muito insólito, para não dizer
ridículo. Da mesma forma, as pessoas estão tentando cruzar a existência
material com muitas âncoras alçadas em sua existência. São muitas as
futilidades que carregamos em nossa vida que deveriam ser deixadas para
trás. Levamos conosco uma falsa identificação que foi criada através de
uma invenção mental e está sendo alimentada dia a dia e não para de
crescer a isso damos o nome de falso ego - a alma está sendo esquecida
nesse contexto.
No Gita 3.27 encontramos: ahankara-vimudhatma... “a alma que
está sendo encoberta pelo ego...”. Sufocada por conceitos equivocados, a
alma vaga neste mundo, sem destino certo, errante e não podendo
encontrar a sua morada, vive no meio de uma selva de confusões, não
podendo valorizar esta grande oportunidade que está sendo dada para o
aperfeiçoamento da existência, permanece estancada e incapaz de buscar a
sua boa fortuna e não sabemos quando vamos ter a chance de novamente
obter um corpo humano para podermos nos dedicar a transcendência. No
Visnu Purana encontramos:
jalajā nava-lakṣāṇi
sthāvarā lakṣa-viṁśati
kṛmayo rudra-saṅkhyakāḥ
pakṣiṇāṁ daśa-laka ṣ ṇam
triṁśal-lakṣāṇi
paśavaḥ catur-lakṣāṇi
mānuṣāḥ

“Existem 900.000 espécies aquáticas, 2'000.000 de vegetais, 1'100.000


de insetos e répteis, 1'000.000 de aves, 3'000.000 de animais de quatro
patas e 400.000 espécies humanas.”
Essa família que entregou o seu filho com toda felicidade e
desprendimento, para que ele fosse treinado em vida espiritual, estavam
acreditando que através de Krishna tudo é possível. Aparentemente
poderia se pensar que era uma loucura permitir que uma criança abandone
seus pais e queria somente se dedicar a vida espiritual, deixando para trás
todas as possibilidades de atuar na vida material, mas também estava claro
que seu filho buscaria satisfazer o conceito central da Realidade Absoluta.
Outro verso do Srimad Bhagavatam (4.31.14) também é bem esclarecedor
a esse respeito:
yathā taror mūla-niṣecanena
tṛpyanti tat-skandha-bhujopaśākhāḥ
prāṇopahārāc ca yathendriyāṇāṁ
tathaiva sarvārhaṇam acyutejyā

50
“Ao regar a raiz de uma árvore, automaticamente todas as folhas são
nutridas e os galhos também. Da mesma forma, ao proporcionar
alimentos ao estômago, todos os membros do corpo são nutridos. Da
mesma maneira, quando satisfazemos a concepção central do
Supremo Absoluto, automaticamente serão cumpridas todas as nossas
obrigações.”
Entender que Krishna controla tudo, que essa é a posição peculiar
do Absoluto, não vamos perder o nosso tempo examinando nem sequer a
menor partícula da criação material, no mesmo Srimad Bhagavatam
(5.5.5) também podemos ver que: Parabhavas tavad abodha-jato yavan
na jijnasata atma-tattvam “a menos que alguém indague acerca da vida
espiritual, tudo lhe é inútil. Sem a busca espiritual, nosso trabalho ou o
objetivo de nosso trabalho não passam de mera perda de tempo”.
Ao encontrar algo tão grandioso, que está por cima de todos os
demais conceitos que até agora vinhamos cultivando e que de certa
maneira nos afastava muito da realidade deste plano, deveríamos tentar
apreciar a magnanimidade da Suprema Personalidade de Deus e quanto
mais baixarmos a cabeça, mais fácil poderemos conquistá-Lo. E ao obter
essa Realidade, poderemos obter tudo. Disto se trata viver no mundo da fé,
acreditar que tudo é possível devido a misericórdia de Krishna, que todos
as possibilidades descansam no Absoluto, porque Ele será capaz de
harmonizar tudo por Sua doce vontade.

Capítulo 8
O TRABALHO

Em 1925, Srila Prabhupada Bhaktisiddhanta organizou seu


primeiro Goura-mandala-parikrama (peregrinação pelos lugares sagrados
de Sri Caitanya Mahaprabhu na Bengala, Índia) com seus discípulos.
Centenas de devotos esperavam encontrar com ele e juntos sair em
peregrinação. Guru Maharaj também estava ali e quando os peregrinos
foram a Kethuri, o local de nascimento de Srila Narottam Das Thakur, eles
pararam em um local denominado Godagari-Ghat. Justamente no ponto de
encontro onde os devotos viriam de Calcutá para encontrar o grupo de
parikrama (grupo de devotos peregrinos).
Dentre esse grupo, um devoto trazia um telegrama endereçado a
Srila Gurudeva oriundo de seus chefes dizendo assim: “Seu serviço não é
mais necessário em nossa empresa.” Esta notícia não causou nenhuma
surpresa, muito tempo antes, Srila Gurudeva queria abandonar o seu
emprego. Mas a comissária portuária tinha recusado o seu pedido e
sugeria, ao invés disso, que ele aceitasse uma licença. Nessa momento,
tinham lhe garantido uma licença caso ele pedisse, então, Srila Prabhupada
Bhaktisiddhanta sugeriu a Gurudeva: “Você deveria voltar a Calcutá e
pedir pela licença.” Então, Gurudeva se jogou aos pés de Srila
Prabhupada, dizendo, “por favor, Srila Prabhupada, não me peça para
voltar para o meu trabalho outra vez. Eu não posso me dedicar
completamente a minha vida devocional se tenho trabalho fora do templo.
Por favor, permita-me servi- lo sem nenhuma distração.” Srila Prabhupada
sorriu.
Serviço devocional é o trabalho mais elevado que uma pessoa pode
executar em sua existência e é o único capaz dar dignidade ao ser humano.
Sempre existirá a necessidade de se executar algum serviço como
obrigação imprescindível para a manutenção da vida. Mas na realidade,
ninguém gosta de trabalhar, todos gostariam de viver sem trabalhar, mas
isso é impossível. Podemos ver a ansiedade das pessoas que estão
trabalhando, pois sempre necessitam trabalhar, mas ao mesmo tempo,
anseiam pelo tão sonhado descanso. Com o árduo labor de segunda à
sexta, no momento em que chega o fim de semana, é o instante de
extravasar e esquecer completamente dos compromissos. Entretanto, esse
lapso de tempo dura muito pouco, e logo a rotina deve ser re-estabelecida
novamente.
Há um tempo atrás, uma pesquisa cientifica demonstrou que existia
mais probabilidade de acontecer um ataque cardíaco e derrame cerebral
nas segundas-feiras do que em qualquer outro dia da semana. O estudo
apontava a influência do stress e angústia de retornar ao trabalho como
causas para estes acidentes neuro vasculares. Os próprios sankirtaneiros,
que são os distribuidores da literatura transcendental nas ruas, também
percebem a diferença de humor nas pessoas, que estão muito mais
dispostas e favoráveis na sexta-feira e final de semana em relação a
segunda-feira. Voltar a rotina sempre é difícil e doloroso, parece que a
ilusão que foi criada na mente coletiva das pessoas está se desfazendo,
assim como uma nuvem se dissipa com a presença do vento.
Mesmo o tão sonhado descanso anual, muitas vezes se torna um
desastre quando algo inusitado acontece, devido a tanta expectativa que se
cria em torno daquilo que vinha sendo almejado por tanto tempo e agora
devido a alguma ardilosa armadilha do destino, não consegue satisfazer os
desejos extremamente organizados que os trabalhadores criaram em suas
mentes para desfrutarem de um período de férias que pode durar, na
melhor das hipóteses um mês sem trabalhar, depois de um ano todo de
diligências extenuantes.
De uma maneira geral, sentimos que as pessoas estão infelizes e
frustradas com suas atividades, elas não conseguem se adaptar ao meio
ambiente, sofrem por não conseguirem sua emancipação. Hrdaye navhya
nujnato “a garantia final é a aprovação do seu próprio coração.”
“Será que realmente é isto o que quero? Desde o recôndito mais
profundo de meu coração, sinto que desejo algo diferente para minha vida
e já não posso mais me calar diante de tanta injustiça, não nasci para
trabalhar a vida toda sem alcançar a verdadeira felicidade, sinto o desejo
de libertar-me de toda a agonia que me consome e quero aprender a amar”.
Somente quando surgir dentro de nós um desejo ardente por servir
um ideal superior, a mais querida das aspirações brotará dentro do coração
que aspira dedicar-se completamente a uma causa superior. No Bhagavad-
gita (3.9) está dito que:
yajñārthāt karmaṇo ’nyatra loko ’yaṁ karma-
bandhanaḥ tad-arthaṁ karma kaunteya mukta-
saṅgaḥ samāchara

“Deve-se realizar o trabalho como um sacrifício a Visnu; caso


contrário, o trabalho produz cativeiro neste mundo material.
Portanto, ó filho de Kunti, execute seus deveres prescritos para a
satisfação dEle, e desta forma você sempre permanecerá livre do
cativeiro.”
Devemos deixar todos os interesses pessoais e trabalhar se
sacrificando para satisfazer a Verdade Absoluta, se liberando da
contaminação material que nos impulsiona em direção completamente
oposta a que deveríamos seguir. Se pudermos entender o valor da verdade
espiritual, veremos que todo o esforço a ser feito, deveria ser direcionado a
satisfazer o interesse do Centro e não a conveniência de nosso próprio
egoísmo. No Gita (9.27) encontramos:
yat karoṣi yad aśnāsi
yaj juhoṣi dadāsi yat
yat tapasyasi
kaunteya
tat kuruṣva mad-arpaṇam

“Tudo o que você fizer, tudo o que comer, tudo o que oferecer ou der
para os outros, e quaisquer austeridades que você executar, faça isto
como uma oferenda a Mim.”
Se podemos trabalhar para o Supremo, dedicar todas nossas
atividades para Sua satisfação, não haverá nem um pouco de hesitação em
se dedicar exclusivamente ao serviço devocional, talvez seja por isso que
Srila Prabhupada Bhaktisiddhanta tenha aprovado com um sorriso a
decisão de Srila Guru Maharaj de abandonar o seu emprego para se
dedicar exclusivamente em servir ao Senhor Supremo.

Capítulo 9
FAMÍLIA

Em 1928, enquanto viva no templo, o pai de Srila Guru Maharaj


veio visitá-lo. Estando muito ocupado com seus serviços, ele não teve
muito tempo para estar com seu pai. Srila Prabhupada era muito atencioso
e afetuoso com os membros familiares dos devotos que viviam no Math.
Quando soube que Gurudeva estava muito ocupado com os serviços, ele se
dedicou de maneira muito afável, a atender ao pai de seu querido
discípulo. Quando Chakravarti Mahasai, o pai de Gurudeva, estava indo
embora, disse a seu filho: “seu mestre cuidou muito bem de mim. Não
existe nenhuma dúvida a respeito disso. Mas você é meu filho mais velho,
não passou tempo suficiente comigo. Eu não espero nada de você. Mas
você deveria vir e ver a sua mãe em algum momento. Se não fizer isso, ela
se atirará dentro do rio”.
Meses depois, Gurudeva recebeu uma carta informando que seu pai
havia morrido. Ele chorou muito, mas continuou com seu serviço. Logo
em seguida, sua mãe, Ramrangini Devi, foi visitá-lo no templo, junto com
sua prima, chamada Bardi. Bardi entrou primeiro, e quando viu que ele
dormia em uma cama com mosquiteiro (indicador de bom nível social
naquele momento), começou a castigá-lo: “ que tipo de sadhu (pessoa
santa) você é? Até tem uma cama com mosquiteiro para protegê-lo. Seu
pai morreu pensando em você e aqui está você tentando ser um santo,
enquanto dorme na cama com mosquiteiro.”
Gurudeva permaneceu quieto e não respondeu a essa crítica.
Pensou consigo “Bardi costumava cuidar de mim quando eu era uma
criança, ela pode dizer o que quiser.” Então Ramarangini chegou, e
quando viu a Gurudeva, não disse nada e começou a chorar. Vendo isso,
ele ficou extremamente emocionado. Antes de sair sua mãe disse-lhe: “Eu
não espero nada de você, mas por favor, venha me ver antes que eu
morra”. Além disso, Bardi lhe disse a respeito do estado de pobreza de sua
família. Nesse momento, seu jovem irmão, Nani Gopal, não tinha trabalho
e sua família passava por uma difícil crise financeira.
Quando Srila Prabhupada Bhaktisiddhanta escutou do apuro que
passava a família de Gurudeva, chamou-o e disse-lhe: “por favor, aceite
um pouco de dinheiro da gráfica e envie para a sua família”. Escutando
isso, Gurudeva ficou sobrecarregado com sentimentos de emoção. E
respondeu: “Prabhupada, sua afeição para mim é ilimitada, mas por favor,
não me peça para aceitar dinheiro do templo para enviar a minha família.
Por favor, permita-me ter um trabalho de meio período fora do templo e aí
então eu poderei enviar dinheiro para eles. Eu não permitirei que meu
serviço seja interrompido de maneira nenhuma. Mas por favor, eu imploro,
não me peça que aceite algum dinheiro do templo.” Srila Prabhupada disse
afetivamente, mas muito relutante: “Então faça o que você quiser”. Estava
claro pelo tom de sua voz que aquilo não era seu desejo. Nesse momento,
Srila Gurudeva teria que trabalhar mais duro. Mas mesmo assim, ele
aceitou um trabalho como professor.
Ser devoto interno em um templo e ao mesmo tempo manter um
bom relacionamento com a família é algo muito difícil de se conseguir.
Geralmente a família não compreende muito bem a decisão de seus filhos
de irem viver em um templo e se dedicarem exclusivamente ao serviço
devocional. Pensam que é um exagero que seus descendentes abandonem
tudo para viver uma nova vida. Mas a prática de bhakti (devoção) requer
algumas atitudes bem drásticas se o praticante deseja avançar em sua vida
espiritual. Devoção deve ter um caráter exclusivo, não pode haver
nenhuma mescla de sentimentos que possam atrapalhar seu
aprimoramento. Obviamente nem todos devotos podem morar no templo,
muitas vezes sua própria natureza não lhes permite ou mesmo muitos
afazeres profissionais são um empecilho grande nesse sentido. Na
realidade o processo da bhaki yoga é tão poderoso, que uma pessoa não
necessita morar em um templo para alcançar a perfeição. Mesmo em casa,
uma pessoa poderia se dedicar de forma sincera as suas práticas e obter
bons resultados. No Srimad Bhagavatam (5.5.2) aparece:
ye vā mayīśe kṛta-sauhṛdārthā
janeṣu dehambhara-vārtikeṣu
gṛheṣu jāyātmaja-rātimatsu
na prīti-yuktā yāvad-arthāś ca loke

“Aqueles que estão interessados em reviver a sua consciência de


Krishna e incrementar o seu amor por Deus, não deveriam gostar de
nada que não esteja relacionada com Krishna. Eles não estão
interessados em se misturar com aqueles que estão ocupados em
manter seus corpos comendo, dormindo, em procriar e se defender.
Eles não são apegados a seus lares, apesar que eles possam ser chefes
de família. Não são apegados a suas esposas , filhos, amigos e fortuna.
Ao mesmo tempo, eles não são indiferentes em executar seus deveres.
Semelhantes pessoas estão interessadas em coletar apenas o dinheiro
suficiente para manter o seu corpo e alma juntas. Essas são as
características do devoto.”

No Caytania-caritamrta (Adi 17.22) também encontramos :


nāma vinu kali-kāle nāhi āra dharma
sarva-mantra-sāra nāma, ei śāstra-
marma

“Não existe outro dharma (dever) na era de kali. O Santo Nome é a


essência de todos os mantras e propósito de todas as escrituras
reveladas.”

Uma vez que o único dever em Kali-yuga (era atual) é o cantar do


Santo Nome e para cantá-lo não existe restrições quanto ao tempo e local,
poderíamos tranquilamente praticar o canto em nossa casa e alcançar a
perfeição, desde que exista um ambiente favorável para isso.
Infelizmente, muitas vezes, os próprios templos não se tornam um
recinto adequado para as práticas da bhakti yoga. Em algumas
circunstâncias, este lugar venerável, torna-se um local de disputas
pessoais, em que intrigas políticas sobressaem-se de tal maneira, que
perde-se o foco da prática e o sadhaka se vê em um meio completamente
desfavorável. Geralmente isto acontece, quando os líderes correm atrás de
uma posição prestigiosa e buscam favorecer alguém em detrimento de
outros, esquecendo que o serviço devocional é para ser executado por
todos, sem preconceitos e favorecimentos de qualquer espécie.
Mas quando o praticante tem a oportunidade de estar em um
templo, com boa associação, ao lado das pessoas que estão praticando
seriamente e dispostos a se sacrificar por um ideal supremo, viver em um
templo é uma oportunidade única que não deveria ser desperdiçada em
hipótese alguma, uma vez que este ambiente favorável irá estimular de
forma gradativa a busca pela dedicação exclusiva da devoção. O Bhakti-
rasamrita-sindhu, (Purva-vibhaga 1.12):
anyābhilāṣitā-śūnyaṁ
jñāna-karmādy-
anāvṛtam ānukūlyena
kṛṣṇānu- śīlanaṁ
bhaktir uttamā

“Serviço devocional puro está livre de todas as impurezas, começando


com karma e jnana. Em outras palavras, está desprovido de todas
tentativas de alcançar satisfação através do poder e conhecimento.
Śuddha-bhakti é o cultivo favorável ao serviço a Krishna. Em śuddha-
bhakti o devoto constantemente serve os desejos de Krisnha.”
O śudha bhakti (ou devoção pura) deve ser a meta de todo devoto
que leva o processo de forma séria, ele não quer simplesmente conviver
com os devotos, mas sim se absorver em verdadeira sadhu-sanga
(companhia dos santos). A associação real eleva a nossa consciência, nos
estimula aspirar por algo superior, a lutar por nos estabelecermos em boa
companhia ou seja, pessoas que estejam praticando e se sacrificando para
servir melhor.
Na vida espiritual sempre teremos que fazer escolhas, aceitando
algo favorável que nos estimule praticar e rejeitando algo desfavorável que
nos confunda, afastando assim nossa consciência do foco a ser atingido.
Anukul significa algo favorável, ou seja, tudo que ajude na pratica do
serviço devocional. No Caitanya-caritamrita encontramos: Anukulyasa
sankalpah, “aceitar as coisas que são favoráveis ao serviço devocional” e
também está dito: Pratikulysya varjanam, “rejeitar as coisas desfavoráveis
ao serviço devocional”. Nesta mesma escritura Sri Mahaprabhu instrui a
Sanatana Goswami: Krsna-pritye bhoga-tyaga (“deveríamos estar
preparados para abandonar todas as coisas para a satisfação de Krsna e
aceitar todas as coisas para a satisfação de Krishna”).
Estes são princípios básicos da rendição e quando uma pessoa
decide abandonar seus compromissos laborais e laços familiares para ir
morar em um templo, deve ser digno de adoração por todos, uma vez que
ele está realizando uma escolha que o vai capacitar a servir de forma
integral a causa suprema, ocupando seu tempo em um serviço responsável
que o absorva de tal maneira, que muitas vezes ficará sem tempo para os
demais afazeres, tendo que sacrificar as relações familiares para poder se
engajar diligentemente em satisfazer ao Senhor Supremo.
Quando Guru Maharaj não conseguiu dar atenção ao seu pai, que
fazia-lhe uma visita, não podemos mal interpretar esse episódio, pensando
que cometeu-se negligência em relação ao seu pai. Não, na verdade como
Gurudeva estava tão absorto em cumprir com o serviço devocional não
conseguiu parar para atender seu pai. Na realidade o serviço que Gurudeva
estava realizando era algo muito essencial, porque estava absorto na
redação e publicação da literatura transcendental que chegaria ao coração
das pessoas, muito delas teriam contato com esta mensagem e poderiam
modificar suas vidas ao extremo. Esta é uma necessidade urgente e não se
pode parar com uma atividade que vai beneficiar de forma tão magnânima
a todos.
Neste mesmo incidente vimos que um arranjo de Krishna foi feito
para que o pai de Gurudeva fosse beneficiado, uma vez que Gurudeva não
pode dar atenção a ele devido aos seus serviços , assim o próprio
Prabhupada Bhaktisiddhanta cuidou dele, tanto que quando ele se foi
estava muito satisfeito com Prabhupada. Uma misericórdia imensa que um
devoto do quilate de Srila Prabhupada tenha se preocupado de forma tão
afetuosa velando pelo bem estar de seu discípulo e familiares. O fato é que
quando de uma maneira ou outra abandonamos nossas obrigações para
tentar satisfazer a Krishna, Ele mesmo se encarrega de compensar da
melhor forma ao seu devoto ou as pessoas que foram prejudicadas por
algum descuido ou negligência que o praticante tenha cometido para que o
serviço devocional pudesse ser realizado. Krishna mesmo no Gita (18.66)
esclarece:
sarva-dharmān parityajya
mām ekaṁ śaraṇaṁ
vraja ahaṁ tvāṁ
sarva-pāpebhyo
mokṣayiṣyāmi mā śucaḥ

“Abandone todas as formas de religião e renda-se somente a Mim, Eu


te liberarei de todas as reações pecaminosas. Não temas.”
No Srimad Bhagavatam (4.31.14) também é confirmado:
yathā taror mūla-niṣecanena
tṛpyanti tat-skandha-bhujopaśākhāḥ
prāṇopahārāc ca yathendriyāṇāṁ
tathaiva sarvārhaṇam acyutejyā

“Ao colocar água na raiz de uma árvore se consegue nutrir o tronco,


ramos, galhos e o restante da árvore, e por alimentar o estômago,
todos os sentidos e membros do corpo ganham força, simplesmente
adorando a Suprema Divindade através do serviço devocional
automaticamente todos os semideus ficam satisfeitos, porque são
partes da Suprema Personalidade de Deus.”

Krishna sempre vai proteger seus devotos que se dedicam


exclusivamente ao Seu serviço de forma rendida. Ma sucah significa “não
temas”! Temos que acreditar no poder harmonizador do Absoluto em
nossas vidas. Em nenhum momento Krishna deixará de cuidar do seu
devoto rendido que está se sacrificando para satisfazê-Lo. Se buscamos
satisfazer o centro, podemos satisfazer todo restante. Srila Sridhara
Maharaj diz que para quem alcançá-Lo, não resta mais nada para alcançar,
por entendê-Lo não precisamos entender nada mais.
Outro ponto importante a ser salientado na narração dos fatos
relacionados com a família de Srila Guru Maharaja, foi quando Bardi, a
prima de sua mãe, que também estava acompanhando na visita ao templo,
viu onde Gurudeva dormia, comentou de forma irônica e de certa maneira
criticando-o por dormir em uma cama com mosquiteiro. De uma maneira
geral, os sadhus dormem no chão, não usam nada para se cobrir e isto é
um tipo de renúncia diferente a que os Vaisnavas aceitam. Os Gaudiya
Vaisnavas aceitam a yukta-vairagya, o que significa não rejeitar, antes de
perceber a possibilidade de utilizar ao serviço à Krishna.
Nesse caso, usar uma cama para dormir, não significava
simplesmente um conforto a mais, e sim, um meio preventivo para se
evitar uma pneumonia por exemplo. E auferir vantagem de um
mosquiteiro, era uma forma de prevenir doenças como febre amarela,
malária, etc., que são transmitidas por mosquitos. Sendo assim, é bem
inteligente usar estas ferramentas para proteger o corpo, afim de que este
possa ser bem utilizado ao serviço devocional. O mesmo Prabhupada
Bhaktsiddhanta Sarasvati Thakur utilizou um carro de passeio para poder
pregar a consciência de Krishna e naquela época, no início do século XX,
era algo bem incomum, um sadhu sannyasi (santo que renunciou a tudo)
andar de carro com um motorista, mas Prabhupada se locomovia em um
automóvel para distribuir a mensagem de Sri Mahaprabhu em toda a Índia.
Apesar de tantas críticas, Srila Prabhupada Bhaktisiddhanta não
abandonou o ímpeto em querer levar adiante sua missão de pregação.
Quando Gurudeva foi criticado por Bardi, a prima de sua mãe, ele
ficou calado, pensando que pelo fato dela ter cuidado dele, ela poderia
falar o que bem quisesse. Esta atitude também demonstra que os devotos
sempre deveriam ter uma postura compassiva com a família, que tanto
sofre com a posição que tomaram seus filhos de abandonar o lar e se
dedicar exclusivamente ao serviço devocional em um templo.
Compreender sua dor e nunca castigá-los por não entenderem as
complexidades de uma ação tão radical aos olhos dos outros, serve para
amenizar muito a dor da separação que o pais sentem ao perder seu filho
para a vida monástica.
Os devotos são sempre muito compassivos com todas as entidades
vivas, o que dizer então com as pessoas que estão intimamente
relacionadas com eles através de laços familiares. Foi devido a essa
compaixão que Prabhupada Bhaktisiddhanta queria que Srila Guru
Maharaj aceitasse um pouco dos recursos da gráfica que publicava os
livros devocionais , para manter a sua família que nesse momento passava
por grandes dificuldades. E a reação de Gurudeva, apesar da urgência da
situação, não querendo sacrificar nenhum recurso do templo para uma
questão de assunto familiar marcou sua pureza. Esse episódio causa uma
grande comoção, ao perceber o sentimento benévolo que essas grandes
personalidades inspiram diante da infelicidade ou o mal alheio.

Capítulo 10
SASTRA
Srila Guru Maharaj foi sempre aficionado por ler e escrever. Srila
Prabhupada Bhaktisiddhanta difundiu muito que Gurudeva tinha um apego
profundo pelas escrituras. Essa foi uma das razões pela qual o manteve no
departamento editorial. A oura razão era seu domínio em Bengali e
Sânscrito. Srila Prabhupada o encorajou a ter uma excelente compreensão
da escritura vaisnava. Reconhecendo seu talento literário e seu
conhecimento das escrituras, Srila Prabhupada deu-lhe o título de “pratna
vidyalankar” (aquele que é adornado pelo conhecimento das escrituras

60
ancestrais).
No dia 26 de Março de 1929, o 35º encontro de Sri Navadwip
Dham Pracharini Sabha (Associação para transmitir as Glórias de Sri-Sri
Navadwip dham) que acontecia em Sri Yogapith, Sridham Mayapur. O
seguinte extrato da fala dada no encontro foi publicado no sétimo volume
( 1929) da Gaudiya Magazine:
“Eu quero dizer a audiência a respeito de uma jóia. Essa joia é chamada
Pratna Vidyalankar Pandit Sripad Pramod Bhusan Chakravarti ( mais tarde
conhecido como Srila Bhakti Promode Puri Gosvami Maharaj): Ele é um
editor altamente qualificado da única revista representativa de Sridham
Navadwip, a mensagem transportada de Vaikuntha, Dainik Nadiya Prakaś
(um jornal local). Aqueles que são experientes nessa matéria, conhecem a
responsabilidade que essa posição demanda, em editar um jornal
diariamente. Mas Pratna Vidyalankar Prabhu tem tomado toda essa
responsabilidade em sua própria cabeça e está demonstrando um exemplo
extraordinário de serviço incansável. Ele não é um editor assalariado. Ele
não é uma pessoa sem sinceridade e inescrupulosa que escreve uma coisa
no papel e faz outra. Sua sabedoria não é aplicada apenas para aconselhar
aos demais. Ele é um sábio, sua consciência é iluminada pelas escrituras,
que pratica o que prega, tendo abandonado o desfrute dos sentidos para
servir a Krishna e sendo assim é um mahapurusa bhagavat (um vaisnava
da mais elevada classe) cuja renúncia é exemplar. O que ele escuta de seu
Gurudeva, transcreve em seus escritos e segue isso em sua vida pessoal em
todos os sentidos.O Caitanya-Caritamrta (Madhya-lila 22.35) diz:
Kama tyaji Krisnha bhaje śastra-ajna
mani deva-rsi-pitradiker kabhu nahe
rni

“Aquele que, abandona os desejos dos sentidos, adorando a Krishna


de acordo com as injunções das escrituras, nunca está endividado com
os semideuses, sábios, ou antepassados.”
Pratna Vidyalankar Prabhu tem demostrado o ideal destas injunções. Na
minha vida pessoal, eu estou endividado com ele de diversas formas. Eu
estou sempre encantado pelo seu exemplo de sacrifício, renúncia e serviço
a Gurudeva”.
Os sastras (escrituras) são os códigos pelos quais devemos nos
guiar, servem como uma ajuda valiosa, que incrementará nossa fé para
continuar seguindo a longa jornada da vida espiritual. Sem sua ajuda,
temos a tendência a querer atuar de forma independente e terminamos nos
desviando do nosso real propósito. Entretanto, hoje em dia é comum entre
os devotos negligenciar o estudo das escrituras devido a preguiça que está
profundamente enraizada em nossa cultura de uma maneira geral. Cada
vez mais os livros são artigos de relíquia em uma casa convencional. Já
não fazem parte mais do cotidiano das pessoas, porque outros meios mais
passivos de transmissão de conhecimento assumiram um papel
predominante no comportamento da sociedade.
Ao analisarmos de forma bem detalhada, podemos verificar que
pouquíssimos devotos tem lido o Srimad Bhagavatam por inteiro, sendo
que estamos falando da literatura principal dos Gaudiyas Vaisnavas. É
lamentável que esteja acontecendo tamanha indiferença por parte daqueles
que mais se beneficiariam por valorizar este aspecto tão valioso na vida de
um devoto. Aqueles que sempre estão se absorvendo em obter
conhecimento da literatura védica, nunca serão defraudados em sua busca
pela verdade.
Podemos obter uma diretriz bem clara e ampla que vai guiar nossa
vida rumo ao Infinito, se nos apoiamos nos ditames dos sastras. Quando o
aspirante a discípulo tentar encontrar seu mestre espiritual, as escrituras
lhe mostrarão os sintomas de um guru genuíno e como é a maneira de se
aproximar de tal representante da verdade. Antes que o novato se
confunda, o shastra está ali para guiá-lo de forma adequada a como se
aproximar do preceptor védico. O Bhagavad-gita (4.34) aconselha:
tad viddhi praṇipātena
paripraśnena sevayā
upadekṣyanti te
jñānaṁ jñāninas
tattva-darśinaḥ

“Tente aprender a verdade aproximando-se de um mestre espiritual.


Fazendo-lhe perguntas com submissão e prestando-lhe serviço. As
almas auto realizadas podem transmitir conhecimento porque viram a
verdade.”

A palavra tat neste verso é significava, porque quer dizer diferentes


tipos de sacrifícios. Vidhi quer dizer tenta compreender. Um conhecimento
que leva uma pessoa a perceber que a iniciação espiritual requer aceitar
muitos sacrifícios, tanto externos como internos. A atitude de aceitar um
mestre espiritual e fazer parte de uma escola iniciática, envolve muito mais
que um formalismo usual, requer que o discípulo se torne um verdadeiro
revolucionário do amor. Ele deve estar disposto a mudar completamente
seu ponto de vista, abandoando os conceitos mundanos, e se entregando de
corpo e alma a uma nova vida, que será marcada com sacrifícios.
Pariprasena significa que deve-se indagar de forma submissa. Não
devemos aceitar algo sem antes perguntar a respeito do assunto que
estamos envolvidos. Se queremos aceitar a guia espiritual, temos que fazer
perguntas que poderão nos conduzir ao esclarecimento de todas nossas
dúvidas. Ao Guru devemos perguntar a respeito de sambandha
(relacionamentos), abhideya (procedimentos) e prayojana (meta). No
início o mestre espiritual vai esclarecer ao discípulo os aspectos
concernentes a sambandha tattva, explicará quais são as características da
jiva (alma) , fará uma aclaração de Krishna, quem é maya, quais são suas
interações. Este conhecimento é algo preliminar, que ajudará ao sadhaka
(praticante) a começar e progredir em sua vida espiritual.
Depois disso, é necessário obter conhecimento relativo a abhideya,
que fará com que o praticante proceda em consonância com as regras e
regulações dos sastras (escrituras). E por fim, será orientado em relação a
meta a ser obtida e isso se chama prayojana, ou como despertar o amor
puro por Deus. No Caitanya Caritamrta (Madhya-lila, 20.124) deparamos
com a seguinte afirmação:
Veda-saśtra-kahe- sambandha abhideya prayojana
Krsna prapya sambandha , bhakti prapyera
sadhana

“A literatura védica informa a relação eterna das entidades vivas com


o Senhor, o qual é chamada sambandha. O entendimento da entidade
viva de sua relação e atuar de acordo a isto se chama abhideya.
Retornar a casa, voltar a Deus, esse é o objetivo da vida e é chamado
de prayojana.”

Quando o divya-jnana (conhecimento divino) chega ao coração do


discípulo, no momento de diksa (iniciação), esta informação começa a
capturar posições provoca uma mudança radical em sua vida. Tanto o
Guru quanto o discípulo devem estar qualificados para que o sacramento
da iniciação frutifique. O Srimad Bhagavatam(11.3.21) expressa:
tasmād guruṁ prapadyeta
jijñāsuḥ śreya uttamam
śābde pare ca niṣṇātaṁ
brahmaṇy upaśamāśrayam

“As pessoas que seriamente desejam a felicidade real, devem buscar


um mestre espiritual fidedigno e tomar refúgio aceitando a iniciação.
A qualificação do Guru é são suas realizações das conclusões das
escrituras. Estas grandes personalidades, as quais se refugiaram no
Senhor Supremo, deixam de lado todos as considerações materiais.”

O Guru deve ter um amplo domínio das escrituras para poder


esclarecer os discípulos em suas dúvidas e além de não sentir atração por
esse mundo material. Mas os discípulos devem estar dispostos a travar
uma árdua luta contra as fortes tendências que os arrastam em direção
contrária.
Os inimigos internos da alma estão dentro de nós, enraizados de uma
tal maneira, que não se inclinam a ceder nem um só espaço a novas
concepções que poderão abalar suas posições preestabelecidas. O ser
interno sofre com esses inimigos e de certa forma já se acostumou com
eles, parece que é algo que já existe desde tempos imemoriais. No Gita
(15.7) encontramos:
mamaivāṁśo jīva-loke
jīva-bhūtaḥ sanātanaḥ
manaḥ
ṣaṣṭhānīndriyāṇi
prakṛti-sthāni karṣati

“As entidades vivas que estão no mundo condicionado são Minhas


partes fragmentárias eternas. Devido a vida condicionada, elas estão
lutando muito arduamente com os seus seis sentidos, o qual inclui a
mente.”
A mente faz parte do linga-sarira (corpo sutil), mas também é
considerada um dos sentidos, na realidade diz-se que é a rainha dos
sentidos. Sendo a líder dos sentidos, é a principal causa do sofrimento das
entidades vivas aprisionadas no corpo material. Quando o sadhaka recebe
instruções relativas a sambandha, é para que possa entender a sua
verdadeira posição, onde está situado agora e tentar escapar desse
enredamento no qual se envolveu. Obviamente que a alma não pode
descobrir isso por conta própria, seria impossível. Ela precisará muita
ajuda, e o preceptor védico se torna o seu melhor amigo, porque
primeiramente lhe informa a sua posição e depois lhe dá meios para
escapar da ilusão e ao final conseguir atingir a meta última da vida, que é o
amor puro pelo Absoluto.
Quando Krishna diz no Gita: dadami buddhi -yogan tam, yena
mam yupayantite.. ( te darei a verdadeira inteligência para que possas Me
alcançar..). Krishna não confia em nossa inteligência contaminada pela
energia ilusória, Ele está dando um conhecimento superior que chega a nós
através do mestre espiritual. Se dependêssemos de nossa inteligência
nunca poderíamos nos aproximar de algo tão sublime, porque somos muito
limitados ao plano sensorial, que sempre nos engana e nos mostra algo
completamente diferente da verdadeira realidade.
Agora estamos caminhando em um plano completamente
encoberto pela ilusão, pensamos que somos os autores das atividades, mas
na realidade, essas são realizadas por uma energia divina (maya) e nós
somente atuamos passivamente. No Gita (3.27) está explicado prakrteh
kriyamanani gunaih karmani sarvasah.. (a alma iludida, sob a influência
das três modalidades da natureza material, pensa que ela mesma é quem
realiza as atividades..).
O conhecimento divino que obtemos das escrituras, vai aos poucos,
acabando com todas as cortinas que cobrem nossa existência, para que
possamos enxergar nossa verdadeira identidade que foi coberta com a
escuridão da ignorância. Mas não somos capazes de escapar dessa ilusão
simplesmente com nossos esforços individualistas, ao contrário, teremos
que depender da misericórdia divina. No Gita (10.11) aparece Tesam
evanukampartam... (para mostrar-lhes uma misericórdia especial..).
Por muita compaixão pelas entidades vivas, Krishna vem nos tirar
dessa situação completamente absurda que agora estamos vivendo. Cada
nascimento que experimentamos nesse maya samsara (ciclo de
nascimentos e mortes envoltos em ilusão) é uma oportunidade a mais no
intento de liberar-nos da ilusão que nos agarra, que não permite nos
aproximarmos do Bem Supremo. Mas Krishna diz no mesmo verso que
com a luz do conhecimento dissipará a escuridão nascida da ignorância.
Mesmo sabendo que dentro de cada alma condicionada existem
inumeráveis inimigos imbatíveis como a luxúria, a ira, a inveja, etc.,
também dentro se encontra dentro de cada um o Ser Supremo na forma de
Paramatma, a testemunha de nossas atividades, que está pronta a nos
ajudar, esperando o momento oportuno, em que não mais sentiremos tanta
atração por essa energia ilusória e procuraremos um novo horizonte para
onde olhar. Uma nova perspectiva surgida dentro de nós que procura algo
diferente, alguma coisa que nos dê um outro plano para sonhar de forma
diferente do que agora estávamos acostumados a sonhar, porque queremos
beber de um conhecimento que nutre a nossa alma e não o nosso corpo e
mente. Nossa alma quer a experiência que está vindo do alto, estamos
fartos de tanta mesmice, de tanto conhecimento inútil que não mostra a
verdadeira essência a ser conhecida, que afasta mundo real, para lançar-
nos em mundo de fantasias, que jamais vão preencher nossas
necessidades, que nunca nos darão a possibilidade de enxergar as coisas de
um outro prisma. No Katha Upanisad (1.2.2) encontramos:
śreyaś ca preyaś ca manusyam etah
tau samparitya vivinakti dhirah
śreyo hi dhiro’bhipreyaso vrnite
preyo mando yoga-ksemâd vŗnite

“Cada alma tem a opção de aceitar ou o caminho dos sentidos (preyaś)


ou o caminho espiritual, conhecido como (śreyaś). O sábio depois de
cuidadosa consideração, aceita o caminho espiritual da felicidade,
enquanto as almas iludidas preferem o caminho do desfrute sensual.”

Nossa ignorância não é acidental, ela foi obtida por nossa própria
ação prévia, como diz Srila Siddhara Maharaj: “o homem é o arquiteto de
sua própria fortuna”. Se agora somos atraídos pela ignorância, isso deve-se
a nossa própria culpa, estamos bem longe de sermos inocentes nessa
história, chamada vida. Onde tudo que é escuro nos atrai, tudo que é
efêmero chama nossa atenção,desviando nossa concentração do ponto
essencial, nos atraímos pelo transitório que nunca nos dará a felicidade
eterna, e nem mitigará a sede do conhecimento que possuímos dentro de
nós.
Se quisermos somente satisfazer os sentidos, nunca estaremos
saciados e sempre buscaremos algo a mais que não podemos encontrar
aqui nesse mundo sensual. Enquanto estivermos aprisionados as correntes
de uma felicidade momentânea, nossa busca por bem-aventurança será
defraudada uma e outra vez, repetidamente nos encontraremos com o
fracasso, por não conhecer o nosso verdadeiro propósito da existência.
Lutando contra inimigos invencíveis, a existência sensualista vaga de um
lado para outro sem conseguir alguma satisfação que possa dar uma paz de
espírito. Somente o caminho da espiritualidade poderá nos colocar no
trilho da devoção onde o conhecimento será utilizado para alcançar a
iluminação e profunda absorção nos assuntos transcendentais.
Srila Guru Maharaj viveu uma vida de completa absorção nos
tópicos relacionados a devoção, se aprofundando cada dia nos segredos
mais confidenciais das escrituras e com muita devoção, soube utilizar toda
essa informação adquirida para realizar serviço a Srila Bhaktisiddhanta
Prabhupada Sarasvati Thakur através da edição e publicação diária de um
jornal que tratava de assuntos transcendentais, além de ser um exemplo
perfeito de como colocar em prática tudo o que escrevia, por isso foi
imensamente glorificado por seu Gurudeva que lhe outorgou o título de
“pratna vidyalankar” ou seja, aquele que é adornado pelas escrituras
ancestrais.
Aparte de escrever seus próprios artigos, Gurudeva costumava
também revisar e editar todos os artigos da Gaudiya Magazine (revista
semanal). Srila Prabhupada Bhaktisiddhanta foi bastante exigente em
relação ao estilo de apresentação e correção dos textos, então Gurudeva
tinha que ser extremamente cuidadoso a retificação de possíveis erros e
frenquentemente ficava acordado por toda a noite. Srila Prabhupada sabia
disso e sentia grande confiança em seu discípulo.
Srila Gurudeva durante toda a sua vida tinha o costume de dormir
muito pouco. Ainda quando era criança em Ganganandapur, toda tarde
costumava ir para Thakur-bari (casa de Srila Bhatiratna Thakur) para
participar do kirtana (canto el glorificação a Krishna), Hari-Katha
(conversas sobre Krishna) e Arcana (cerimônias de adoração a Krishna) e
somente ao final do programa retornava para sua casa. No dia seguinte,
voltava no Thakur-bai para despertar as Deidades (Srila Gurudeva era o
pujari, o sacerdote, a convite de Srila Bhaktiratna Thakur, que lhe tinha
bastante afeição devido a seu caráter devocional que exibia desde criança).
Quando foi estudar no colégio, gastava muito tempo na viagem de
trem de Calcutá para Jessore, depois caminhava até a casa – por conta
disso ficava acordado à noite para estudar. No momento em que começou
a viver no Math (templo) e estava trabalhando na Comissaria Portuária,
escolheu trabalhar à noite e realizar seu trabalho de serviço editorial de
dia.
Suas ocupações diárias eram Hari-katha (conferenciar sobre
Krishna), também dedicava certo tempo para supervisionar a impressão do
material que era impresso na gráfica da Gaudiya Math (a missão fundada
por Srila Bhaktisiddhanta Sarasvati Thakur), pela noite, buscava um tempo
para se concentrar nos seus escritos e edição do material que seriam
impressos no dia çseguinte (quando deixou de trabalhar na Comissária
Portuária). Usava grande parte da noite para ler, escrever e cantar. Sempre
seguiu a rotina de levantar bem cedo, cantar, realizar puja (adoração) e ler,
durante toda a sua vida.
Em algumas ocasiões, Sundarananda Prabhu expressou-se de
maneira muito franca e disse que as atividades de Gurudeva poderiam
enfurecer ou desencorajar o público em geral a praticar bhakti yoga. Srila
Gurudeva considerou esses pontos e levou-os para a examinação de Srila
Prabhupada Bhaktisiddhanta que apreciou e respondeu: “Sim, esses
comportamentos não são apropriados para o público em geral.”
A gráfica da Gaudiya Math estava em atividade dia e noite. Então,
Gurudeva permanecia constantemente próximo no quarto de Srila
Prabhupada Bhaktisiddhanta em todos os momentos do dia por muitos
anos. Ele vivia em um quarto no andar de baixo perto da gráfica, enquanto
Srila Prabhupada vivia no andar de cima.
Enquanto Srila Prabhupada fazia leituras e comentava, Gurudeva
tomava notas extensivamente as quais depois seriam escritas e publicadas.
Srila Prabhupada nem sempre estava disponível para ditar. Um dia, no seu
quarto da Gaudiya Math, Srila Prabhupada Bhaktisiddhanta estava
expulsando uns pombos para fora do quarto. Gurudeva apareceu ali para
poder utilizar o tempo disponível de seu Gurudeva para os artigos. Srila
Prabhupada Bhaktisiddhanta entendeu isso e disse-lhe: “eu sei que você
está trabalhando muito duro e aceitando uma grande atribulação para você.
Mas o que eu posso fazer? Você não pode dispor de mim quando quiser.
Você tem que escrever enquanto eu puder ditar”. Então, Srila Prabhupada
caminhou de um lugar para outro para espantar os pombos, enquanto
ditava e Srila Gurudeva fazia anotações.
O grande filósofo hindu, Canakya Pandita dizia que um momento
perdido já não podemos recuperar mais, ainda que possamos dispor de
muito ouro. E Srila Visvanatha Cakravarti Thakur dizia que um dos
sintomas do vaisnava é que ele não gosta de perder tempo. Cada instante
na vida de um devoto é muito valioso, ele se preocupa em se ocupar o dia
todo em alguma atividade do serviço devocional, sem desperdiçar tempo.
No Gita (9.14) Krishna disse
satataṁ kīrtayanto māṁ
yatantaś ca dṛḍha-vratāḥ
namasyantaś ca māṁ
bhaktyā nitya-yuktā upāsate
“Sempre cantando Minhas glórias, se esforçando com grande
determinação, Me oferecendo reverências, estas grandes almas
perpetuamente Me adoram com devoção.”

Estando absorto em servir a Krsna, Guru e vaisnavas, o sadhaka se


concentra de maneira indivisa, sua inteligência está focada em um só
objetivo, ele é incapaz de se desviar, enquanto a inteligência das demais
pessoas possui muitos desvios. No Gita (2.41) aparece:
vyavasāyātmikā buddhir
ekeha kuru-nandana
bahu-śākhā hy anantāś
ca buddhayo
'vyavasāyinām

“Aqueles que estão nesse caminho são resolutos em seu propósito, e


seu objetivo é um só, Ó amado filho dos Kurus (Arjuna), a inteligência
daqueles que são irresolutos possui muitas ramificações.”
Nesse sentido qualquer instante de sua existência será
extremamente louvada como um momento mágico, capaz de conectá-lo de
maneira muita intensa com a divindade. Por isso Guru Maharaj estava
ansioso para ter algum tempo livre com Srila Prabhupada Bhaktisiddhanta,
para tomar notas que depois se tornariam artigos. Quando viu Prabhupada
tentando mandar os pombos embora do seu quarto, em um momento
aparentemente ocioso, bastou observar isso, que Gurudeva ansiosamente
ficou a espera do instante que pudesse realizar algum serviço. Srila
Prabhupada, percebendo a atitude de seu discípulo, satisfez o seu desejo
em servir. Gurudeva muitas vezes não conseguia nem dormir por causa da
sua absorção em editar e publicar a revista semanal e o jornal diário que
eram divulgados com muito afinco. No Gita, Arjuna foi nomeado como
gudakesa, aquele que pode controlar o sono, o sono constitui um dos
maiores apegos da entidade viva. Uma pessoa, em sua tentativa de
controlar os sentidos, pode inclusive tentar controlá-los e isso já a qualifica
para ser um ponto de referência para todos. No seu Upadesamrita (verso
1) Srila Rupa Gosvami diz:
vāco vegaṁ manasaḥ krodha-
vegaṁ jihvā-vegam udaropastha-
vegam etān vegān yo viṣaheta
dhīraḥ sarvām apīmāṁ
pṛthivīṁ sa śiṣyāt
“A pessoa sóbria, a qual é capaz de tolerar as demandas da fala, as
exigências da mente, as ações da ira e as exigências da língua,
estômago e genitais, é qualificada para fazer discípulos no mundo
todo”
Entretanto o sono é extremamente difícil de ser controlado.
Poderíamos tomar o exemplo dos Gosvamis de Vrindavana que
praticamente não dormiam. Mesmo assim, temos que considerar que esses
devotos não eram pessoas ordinárias. Srila Bhakti Bibudha Bodhayan
Maharaja que conviveu intimamente com Srila Guru Maharaj, conta que
quando estava servindo a seu Guru, ia dormir e Gurudeva estava
escrevendo ou lendo, depois quando ele (Bodhayan Maharaj) acordava, ali
encontrava a Gurudeva ainda desperto e dizia: “Gurudeva já está na hora
do mangal arati (a primeira cerimônia do dia, as 5h) e o Senhor ainda não
foi dormir”. E muitas vezes ele pôde testemunhar esses acontecimentos
que provam o engajamento quase sobrenatural de Gurudeva ao serviço
devocional.

Capítulo 11
A VIDA NA GAUDIYA Math
Qualquer serviço realizado na Gaudiya Math, por mais duro que
fosse, se tornava suave pela presença de Srila Bhaktisiddhanta
Prabhupada. Ali, sempre havia uma atmosfera de muita alegria. Apesar de
existir um clima de muita austeridade, seriedade e estrita disciplina, Srila
Prabhupada era muito afetuoso com todos os seus discípulos e a afeição
que tinham um pelo outro, fazia a vida no templo um local bastante alegre
e inspirador.
Srila Prabhupada conhecia o talento especial de cada um de seus
discípulos. Sannyasis (renunciantes) como Srila Sridhara Maharaj, Srila
Bhakti Pradip Maharaj, Srila Goswami Maharaj, Srila Bon Maharaj
estavam sempre viajando e pregando. Muitos brahmacarys tinham
residência fixa no templo. Por ordem de Srila Prabhupada, Srila Guru
Maharaj dava Hari-katha (aulas sobre Krishna) regularmente. Muitos
visitantes frequentemente visitavam ao templo e como muitas vezes Srila
Prabhupada estava ocupado em outros afazeres, nessas ocasiões, Gurudeva
se ocupava em falar Hari-katha. E muitas pessoas se tornaram devotas

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depois de escutá-lo. Mesmo quando não estava dando a aula, estava
atendendo muitos visitantes, os quais tinham diversas questões. Esse foi
outro motivo pelo qual tinha que trabalhar em seu serviço de edição até
tarde da noite todos os dias.
Srila Prabhupada estava muito consciente das circunstâncias
pessoais de cada um dos seus discípulos. Se alguém possuía algum tipo de
sofrimento, ele aceitava pessoalmente a responsabilidade de ajudá-lo.
Guru Maharaj sentia que a afeição de Srila Prabhupada era mais profunda
e compassiva do que milhões de mães e pais juntos. Srila Prabhupada
costumava pessoalmente supervisionar a distribuição de prasadam
(alimento espiritual). Srila Gurudeva era um apreciador de doces. Srila
Prabhupada sorrindo, chamava a quem quer estivesse distribuindo
prasadam e dizia em tom de brincadeira "ali está Pranavananda. Ele é de
Jessore, você deve dar a ele um bom pedaço de rapadura!” (Jessore é
famosa por produzir rapadura).
O momento de tomar prasadam sempre era uma ocasião muito
feliz. Os irmãos espirituais costumavam brincar entre si. Em algumas
ocasiões, os devotos arrancavam alguma prasadam do prato de outro, ou
dava alguma prasadam a outro por saber que era sua favorita. Tudo isso
acontecia na frente de Srila Prabhupada, o qual parecia muito satisfeito ao
ver seus discípulos tomando prasadam de forma tão feliz.
A vida em um templo deve estar envolvida por um ambiente de
muita harmonia e felicidade. O processo na consciência de Krishna é para
transformar as pessoas que estão dispostas a vivenciar uma experiência
completamente diferente do vivenciado no mundo comum e corrente.
Todos que vivem dentro do Math são pessoas muito especiais, por que de
uma maneira ou outra, tem se sacrificado muito para entregar tudo para o
Supremo. Essa segurança propicia uma felicidade substanciada em um
ideal elevado.
Ninguém gostaria de viver em um templo, onde não existisse um
clima propício para as suas práticas pessoais e executar um serviço sob a
guia dos vaisnavas. Afinal de contas, em um dado momento, os devotos
internos abandonaram suas atividades, seus familiares e decidiram
completamente seu ponto de vista em relação ao mundo que acabaram de
abandonar. Eles precisam verificar por meio de sua própria experiência
que a vida em comunidade é possível e mais do que isso, ela deve ser
prazerosa e agradável.
Esse ambiente deve proporcionar todos os meios para que a
satisfação seja parte da vida de todos. Claro, é bem-sabido que uma vida
em comunidade requer muita tolerância e perseverança da parte dos
integrantes do Math. Que tudo não será um mar de rosas, e os obstáculos
surgiram de forma natural para testar a sinceridade dos mesmos. Tudo isso
faz parte do processo purificatório de todos que aspiram uma elevação
espiritual em suas vidas. Mas mesmo assim a felicidade e satisfação
devem estar presentes no convívio mútuo de todos os integrantes residem
em um templo. Krishna diz no Bhagavat Gita (2.9):
rāja-vidyā rāja-guhyaṁ
pavitram idam uttamam
pratyakṣāvagamaṁ
dharmyaṁ susukhaṁ
kartum avyayam

"Esse conhecimento é o rei da educação, o mais secreto de todos os


segredos. É o conhecimento mais puro e por dar a percepção do ser
pela realização, ele é a perfeição da religião. Ele é eterno e deve ser
praticado com felicidade."

No verso, a palavra su-sukam significa “com muita felicidade” e a


palavra kartum significa “que deve ser praticado”. Então podemos concluir
que o processo deve ser praticado com muita felicidade As pessoas que
vem morar no templo, necessitam de um amparo afetuoso e apesar de toda
a seriedade na prática do processo e austeridade que é necessária para se
alcançar o aperfeiçoamento do praticante, o ambiente necessita estar
impregnado com certa tranquilidade e felicidade para que seja possível
uma convivência saudável dentro da comunidade.
Ao abandonar algo inferior devemos aceitar algo superior, essa
aceitação implica crescer em conceitos totalmente diferentes do plano
mundano. Ao aceitar o caminho da devoção, inicia-se uma transformação
completa no nosso sistema interno e desvanece paulatinamente nosso
encanto pelo mundo exterior. O sadhaka vive em uma eterna guerra contra
seus desejos e sentimentos egoístas. Abandonar os conceitos inferiores
necessita-se de muito sofrimento interno - e essa luta gera ansiedades e
dúvidas. Por isso é muito importante que o meio ambiente seja favorável
no início das práticas espirituais bem como no seu desenvolvimento e
aperfeiçoamento. No Caytania-caritamrta (Madhya-lila, 17.22)
encontramos:
kṛṣṇa-bhakti-janma-mūla haya 'sādhu-saṅga'
kṛṣṇa-prema janme, teṅho punaḥ mukhya aṅga

"A causa raiz do serviço devocional ao Senhor é a associação com


devotos avançados. Mesmo quando nosso amor adormecido por
Krsna desperta, associação com devotos é ainda muito essencial."

Dependemos da associação em todos os momentos, como no verso


é descrito, ela é essencial, não podemos prescindir dela em momento
algum. Os devotos sempre estão nos animando a seguir adiante, seu
entusiasmo é que nos impulsiona a seguir na batalha contra a ilusão.
Sadhu sanga significa alcançar entusiasmo para seguir praticando
vida espiritual, quando encontramos ajuda do plano superior que se
manifesta na associação dos devotos, devemos aceitá-la, entendendo que
essa oportunidade é muito rara de se obter. Segundo Srila Bhaktivinoda
Thakura, é hipocrisia do sadhaka não mudar seu comportamento, depois
de tanta oportunidade de estar associado com o sadhu. Estar bem
associado não quer dizer simplesmente uma conexão física e sim uma
proximidade que conseguimos através da atitude de serviço. No Srimad
Bhagavatam (5.12.12) é declarado:
rahūgaṇaitat tapasā na yāti
na cejyayā nirvapaṇād gṛhād

na cchandasā naiva jalāgni-sūryair
vinā mahat-pāda-rajo-'bhiṣekam

"Meu querido Rei Rahugana, a menos que uma pessoa tenha a


oportunidade de untar seu corpo com a poeira dos pés de lótus dos
grandes devotos, uma pessoa não pode realizar a Verdade Absoluta.
Não se pode realizar a Verdade Absoluta simplesmente por observar
celibato, por adorar a Deidade, por aceitar sannyasa, por seguir
perfeitamente as regras do grihastha asrama (vida familiar), nem se
pode alcançar a verdade por aceitar severas penitências e
austeridades, por estudar os Vedas, nem por adorar os deuses da água
e do sol. Apenas por banhar na poeira dos pés de lótus do devoto puro
é que a Verdade Absoluta será revelada."

Para obtermos a meta última da vida, necessitamos alcançar a


poeira dos pés de lótus dos devotos puros e isso não é algo físico, não é
simplesmente se atirando aos pés de um vaisnava que obteremos esta
substância tão elevada. Não é tão simples assim, para mergulhar
profundamente na poeira dos pés de lótus de um vaisnava, temos que
desenvolver completa rendição de maneira incondicional, somente assim
poderemos obter o benefício de estar verdadeiramente associado com o
sadhu (devoto avançado).
O verso está citando diversas atividades supremamente elevadas
que são extremamente difíceis de se executar, como, por exemplo, praticar
celibato e aceitar sannyasa, mas até isso é inútil se não aceitamos o refúgio
de um sadhu genuíno. Inclusive a prática de austeridades e sacrifícios ou
mesmo adorar a Deidade que são tidas como atividades poderosas para se
conseguir a perfeição, são também consideradas inúteis se comparamos ao
ato de se refugiar nos pés de lótus de um Vaisnava.
Entende-se que tudo repousa no Vaisnava, ele deverá ser o centro
de todas as atividades, porque a faculdade de exercer a ação está sendo
impulsionada para satisfazer ao vaisnava. Se queremos satisfazer ao
Supremo, teremos que primeiramente satisfazer ao seu devoto, ele é o
canal pelo qual a misericórdia está descendo. Krishna não vai aceitar nada
sem que antes possa ser aceito pelo seu devoto. Para se aproximar da
Verdade Absoluta, temos que primeiramente nos aproximar-mos dos
devotos do Senhor. No Caytania-caritamrta (Madhya-lila 11.28) aparece:
ye me bhakta-janāḥ pārtha
na me bhaktāś ca te janāḥ
mad-bhaktānāṁ ca ye
bhaktās te me bhakta-tamā
matāḥ

“O Senhor Krishna disse a Arjuna: ‘aqueles que são meus devotos


diretos, na verdade não são meus devotos, mas aqueles que são
devotos de Meus devotos são verdadeiramente Meus devotos”.

Estar conectado com um devoto puro é algo tão sublime, que


simplesmente a sua presença faz que todos em seu entorno se contaminem
com sua energia e comecem a se engajar no serviço devocional de tal
maneira, que naturalmente o sacrifício será estimulado em suas vidas.
Na Gaudiya Math, a vida era naturalmente austera naquela época, os
devotos estavam ocupados em serviço devocional de forma integral e nem
por isso se perdia o clima afetivo entre eles. Principalmente Srila
Prabhupada Bhaktisiddhanta Sarasvati Thakur que era a figura central
naquele momento, não perdia a oportunidade de demonstrar o seu carinho
através da preocupação com o bem-estar de todos os devotos, ninguém
escapava de sua visão amorosa e ele podia também brincar com algum
devoto, como foi no caso de Srila Guru Maharaj, pedindo para que lhe
oferecesse um pedaço de rapadura a mais.
Em outra ocasião, Srila Prabhupada percebeu que a despensa de
alimentos do templo estava vazia por falta de recursos para comprem, sem
quase nenhuma provisão de alimentos. Então foi verificar o que os devotos
estavam comendo e pode ver que somente comiam um pouco de vegetais
sem arroz e nada mais para acompanhar a sua refeição. E então Srila
Prabhupada perguntou o porquê e os devotos dissimularam respondendo
que era o desejo de incrementar as austeridades e por isso somente
comiam vegetais.
Nesse momento, na face de Srila Prabhupada começou a escorrer
algumas lágrimas ao ver o sacrifício que os devotos estavam fazendo para
manter o templo e suas atividades. Srila Prabhupada sempre estava muito
preocupado com a alimentação dos residentes do templo, ele dizia que
deveriam sempre comer refeições que fossem saborosas e nutritivas e que
de nenhuma forma tivessem alguma ansiedade em relação a comida.
Analisando todos esses incidentes minuciosamente, vemos que o
afeto entre os praticantes da bhakti yoga sempre será um fator
predominante entre as relações que devem ser cultivadas. Não importando
o quanto um devoto seja elevado e a diferença existente entre ele e um
praticante neófito, não importando se inclusive se encontra na posição de
um Guru. Em nenhuma circunstância, a posição social ou status espiritual
poderia criar uma diferença de tal magnitude que colocasse em segundo
plano as relações pessoais, estabelecendo uma certa frieza de
comportamento que coloca a perder tudo o que o Vaisnavismo propõe em
sua essência.

Capítulo 12
Kirtana
Srila Prabhupada Bhaktisidhanta Sarasvati Thakur apreciava
basteante um kirtana (musica, canto) devocional. Ele pedia a Guru
Maharaj que cantasse com freqüência. Na realidade, pedia para Gurudeva
cantar kirtan em todos os festivais vaisnavas, grandes encontros e em
ocasiões especiais, por exemplo no festival de Ratha-yatra em Jagannatha
Puri, ou durante o Vraja-mandal-parikrama (peregrinação por Vrindavan,
a cidade de Krishna). Entre outros cantores de kirtana que agradavam a
Srila Prabhupada, estavam Srila Vivek Bharati Maharaj, Sri Svadhikara-
nanda das Brahmacary (Krisnadas Babaji Maharaj) e Sri Radharaman
Brahmacary ( Srila Bhakti Kumud Santa Maharaj).
Por volta de 1930, Srila Prabhupada instruiu aos seus discípulos
para pregarem a mensagem de Mahaprabhu na rádio. Então, todo domingo
Hari-katha e kirtana eram transmitidos pela Indian Broadcasting Service
de Calcutá. Entre aqueles que foram pioneiros em dar Hari-katha na rádio,
estavam Srila Bhakti Hrday Bon Maharaj e Srila Sundarananda
Vidyavinodi Prabhu. Om Visnu pada Srila Bhakti Promode Puri Gosvami
Maharaj cantava a coleção de versos intitulada “Gopinatha-Vijnapati” de
Srila Bhaktivinoda Thakur.
O kirtana é um processo para a emancipação da alma. Deve ser
executado para alcançar o coração, nunca deve ser superficial. Não
podemos aceitar um canto que seja para os nossos ouvidos e sentidos. Não
podemos conceber que ele esteja somente imbuído com uma melodia e que
não passe de um som físico. Isso não seria o verdadeiro kirtana, seria
apenas um kirtana aparente, sem substância, longe de ser algo que vai
mudar nossa concepção mundana e nos lançar nas ondas do sabda
brahman (som espiritual). Srila Guru Maharaj era um cantor de voz
celestial, e além disso, praticava regularmente o canto do Santo Nome e
estava absorto no verdadeiro bhajana (canto introspectivo) interno, que é a
fonte capaz de nutrir espiritualmente nosso ser. O kirtana deve ser
exclusivo, sem nenhum outro desejo de satisfazer nenhum outro objetivo,
a não ser o desejo de agradar a fonte de toda a bem-aventurança, que é Sri
Krishna. Realizar kirtana, entendendo que nossa única esperança repousa
em uma prática sincera. No Brihad Naradiya Purana encontramos:
Harer nama harer nama
harer namaiva kevalam
kalau nasty eva nasty
eva nasty eva gatir
anyatha
“Para o progresso espiritual nessa era de kali, não existe alternativa,
não existe alternativa, não existe alternativa, a não ser o canto do
Santo Nome, o canto do Santo Nome e canto do Santo Nome”.
E mais adiante no Caitanya-caritamrta (Antya 15.24) aparece:
Harse prabhu karena- suna svarupa-rama-
raya nama-sankirtana -kalau parama upaya

“Com muito júbilo, Sri Caitanya Mahaprabhu dizia 'Meus queridos


Svarupa Damodara e Ramananda Raya, confesso-vos que cantar o
Santo Nome é o meio mais plausível para alcançar a salvação nesta
era de Kali’”.

Estes dois versos aludem ao poder exclusivo do canto para resolver


todos os problemas e conseguir alcançar a perfeição. Não existe nada mais
auspicioso do que a prática constante e dedicada ao canto e quando ele é
vibrado em voz alta, pode beneficiar todos os seres, entretanto, para que o
benefício possa ser amplo e estendido a todos, o cantor deve ter uma
prática real, sem nenhum sentimento de duplicidade e hipocrisia, ele tem
que alcançar a perfeição através do seu bhajana para poder beneficiar de
forma fidedigna a todos que escutem e participem do Harinama-
sankirtana (movimento de pregação do Santo Nome). Caso contrário o
benefício será apenas aparente e nunca poderá alcançar aos cantos mais
profundos da consciência.
O Caytania-caritamrta (Antya 20.11) também nos adverte:
nāma-saṅkīrtana haite sarvānartha-nāśa
sarva-śubhodaya, kṛṣṇa-premera ullāsa

“Basta cantarmos o santo nome do Senhor Krishna para que nos


livremos de todos os hábitos indesejáveis. É este o meio de
despertarmos toda a boa fortuna e iniciarmos o fluir das ondas do
amor a Krishna”.

Estamos agora condicionados pela energia ilusória e não


conseguiremos abandonar nossos maus hábitos se não tivermos ajuda do
plano superior. O santo nome vem do plano transcendental e por isso
poderá auxiliar-nos muito nessa luta para escapar dos maus costumes que
adquirimos devido a nossa associação indevida com o meio ambiente.
Golokera Prema dham harinama sankirtana (o Santo Nome está descendo
do plano superior Goloka), para dar a sua misericórdia. As pessoas que
escutam o sankirtana não necessitam possuir muitas qualificações, porque
serão beneficiadas independentemente de suas qualificações. E se
conseguirem pronunciar o Santo Nome, sem importar o grau de pureza que
possuam, conseguirão uma purificação correspondente. O Srimad
Bhagavatam (6.2.14) afirma:
sāṅketyaṁ pārihāsyaṁ
vā stobhaṁ helanam eva
vā vaikuṇṭha-nāma-
grahaṇam aśeṣāgha-
haraṁ viduḥ

“Uma pessoa que canta o santo nome do Senhor se livra das de


ilimitados pecados, mesmo se ele canta indiretamente, querendo
indicar alguma coisa, de brincadeira, por entretenimento musical ou
de forma negligente. Isso é aceito por todos os eruditos das
escrituras.”

Tão poderoso é o Santo Nome que mesmo não sendo praticado de


forma pura, possui a capacidade para purificar a pessoa de um número
ilimitado de pecados. Isto é aceito por aqueles que conhecem
profundamente os tópicos sobre a verdade esotérica.O dever do sadhaka
é praticar o nama bhajana de forma autêntica, tentando ser sincero em
todos os aspectos de suas práticas, com isso adquirindo a pureza necessária
para praticar o kirtan que será um bálsamo para todos os participantes.
Srila Bhaktivinoda Thakura explica que para alguém ser
beneficiado pelo kirtana, deve ser liderado por um devoto puro.
Entretanto, Srila Bhaktivinoda declara que se um nama-aparadhi (ofensor
ao Santo Nome) lidera o kirtana, os participantes serão prejudicados, ainda
que externamente o cantor possa fazer um show musical e uma exibição de
suas qualidades externas - todos que participam desse kirtan estarão se
prejudicando em vez de se beneficiar. Todavia, o canto de um namabhasi
(cantor que ainda não canta de forma pura, mas não é ofensivo) terá um
efeito benéfico no processo espiritual dos participantes.
Nesse sentido, Srila Prabhupada Bhaktisiddhanta sempre escolhia
para liderar o kirtan, somente os devotos que estavam estritamente
praticando seu bhajana sem duplicidade e que estavam também engajados
no serviço devocional de forma responsável. Isso garantia a pureza do
kirtana e um benefício espiritual automático a todos.

Capítulo 13
UM ATAQUE SANGUINÁRIO
A pregação de Prabhupada Bhaktisiddhanta desde sempre estava
incomodando muito os Goswamis (uma classe de sacerdotes) de casta (que
defendiam a manutenção de privilégios baseado no nascimento e não no
mérito com é a tradição Vaisnava), que muito antes mesmo de um conflito
iminente, já haviam demonstrado insatisfação com os conceitos que Srila
Bhaktivinoda Thakura vinha propondo, e que agora Prabhupada já estava
estabelecendo. Mesmo quando vivia em Mayapur e praticava seu bhajana
quase solitário, muito antes de iniciar seu movimento de pregação, Srila
Prabhupada pregava atacando as apa-sampradaya (falsa sucessão
discipular) por enganar as pessoas com Gurus falsos, suas interpretações
erradas das escrituras, práticas desviadas e mal encaminhamento das
pessoas de uma maneira em geral. Ele praticamente tinha agitado os
smarta-brahmanas (classe de sacerdotes mais ortodoxos) e Goswamis de
casta (outra classe de sacerdotes), por insistir que a posição de um
brahmana (sacerdote que está no primeiro plano dentro da sociedade
védica, indiana) e o posto de um Guru não eram profissões hereditárias
(como defendiam os opositores buscando manter prestígio e garantir
conforto).
Semelhantes afirmações se tornavam intoleráveis para os smarta-
brahmanas e os Goswamis de casta, mantendo estrangulado o Hinduísmo
na Bengala (estado da Índia tradicional para os Gaudiya Vaisnavas) por
manter o conceito de que apenas as pessoas nascidas em família de
linhagem brahminica poderiam ser considerados Gurus ou brahmanas
genuínos. Obviamente não estavam muito satisfeitos com essas novas
ideias que iam contra os interesses fortemente instituídos por uma tradição
baseada no engano. Eles sentiam uma ameaça iminente contra seus
próprios interesses e em um manifesto, argumentavam de maneira nada
devocional, tentando refutar a verdade.
Entre os pontos defendidos pelos opositores de Bhaktisiddhanta
podemos citar:
- A menos que alguém nasça em uma família brahminica, os vaisnavas são
incapacitados para adorar Salagrama-sila (Deidade automanifesta de
Krishna na forma de pedras) e conferir iniciação (e se tornar um Guru).
- Por aceitar discípulos, Narottama dasa Thakura e Syamananda Prabhu
(dois grandes e maravilhosos devotos da época posterior a Mahaprabhu)
tinham então contrariado o sastra (escritura);
- Caitanya Mahaprabhu deu de presente uma Govardhana-sila a
Raghunatha Dasa Goswami porque ele de família sudra (da classe mais
baixa da sociedade, inferior aos brahmanas, os sacerdotes) e assim sendo,
incapaz de adorar Salagrama-sila;
- Adorar a Govardhana-sila é apenas sentimentalismo e não é baseado em
argumentos das escrituras;
- Somente as injunções do Hari-bhakti-vilasa que não contradizem aos
smrtis deveriam ser seguidas.

Todos esses argumentos causaram perturbação e dúvidas nos


vaisnavas , e assim logo surgiu o desejo de derrotar essas mentiras em uma
assembléia. Como Srila Bhaktivinoda Thakur estava muito doente, foi
enviado Srila Prabhupada Bhaktisiddhanta para massacrar todos os
argumentos inapropriados com uma dissertação comparando os
brahmanas com os vaisnavas num primeiro momento, seguido da
exposição da supremacia dos vaisnava sobre os brahmanas.
Quando o Goura-mandala Parikrama (peregrinação pelos locais
sagrados de Mahaprabhu) completava o quinto ano, um forte movimento
de oposição gerado pelos Goswamis de casta aconteceu. Srila Sarasvati
Prabhupada era um intrépido pregador e constantemente condenava as
práticas dos falsos devotos, por exemplo cobrar a entrada nos templos,
praticar kirtana e dar leitura do Srimad Bhagavatam para ganho monetário,
assumir o cargo de Guru como uma profissão.
Além do mais, Srila Prabhupada estava propagando que Mayapur
era o verdadeiro local de nascimento de Srimad Mahaprabhu o que
acarretava um sério prejuízo econômico para os proprietários de templos
de Navadvipa. Nos anos anteriores, os descontentes organizaram encontros
de pseudo religiosos adjacentes ao parikrama durante a parada em Kuliya,
no local onde os Goswamis tinham tentado de forma desastrosa desviar a
atenção do Parikrama. Sendo assim, a tensão entre as duas partes
permanecia alta e o conflito parecia inevitável.

80
Desafiando a hegemonia professada pelos Gosvamis, Srila
Prabhupada Bhaktisiddanta novamente marchou com força para Kuliya
com mais ou menos setecentos seguidores, incluindo muitas mulheres,
acompanhado das pequenas Deidades de Sri Radha-Govinda, que eram
transportadas em cima de um elefante. Num determinado momento Srila
Prabhupada daria uma palestra. E logo depois que os peregrinos chegaram,
uma gangue de malfeitores começaram a ameaçar os peregrinos com
pedras, cascalhos e paus tentando parar o kirtana. Os Goswamis de casta
estavam tentando incentivar a briga entre os grupos, mas os peregrinos
mantiveram a calma e evitaram o conflito.
Considerando que o parikrama (peregrinação) não estava completo
porque não havia tido a oportunidade de escutar os passatempos de
Mahaprabhu conectados com o local, no dia seguinte, mais ou menos
duzentos peregrinos, na maioria homens retornaram ao local onde tinham
sido ameaçado anteriormente. Enquanto Srila Tirtha Maharaj tinha
começado uma aula, uma gangue de malfeitores apareceu inesperadamente
e começou a lançar tijolos nos peregrinos e na tromba do elefante que
carregava a Deidade.
Os peregrinos tentaram convencer os agressores que desistissem
dessa atrocidade e para surpresa de todos, os criminosos foram embora.
Mas minutos depois, eles retornaram armados com longos pedaços de pau,
os quais eles já tinham deixado preparados perto das lojas. Os peregrinos
indefesos desceram rapidamente as Deidades para junto de si, pensando
que com isso pudessem sensibilizar os ânimos dos agressores, devido à
presença de suas senhorias. Então, um homem muito rico de Navadwip,
desceu do carro com seus guarda-costas e gritando ordenou que se
atirassem tijolos de cima do telhado nos devotos que estavam cercados. Os
peregrinos tentavam fugir e se esconder na casa dos grhasthas (chefes de
família), mas estes mantinham as portas de suas casas fechadas.
Alguns poucos valentes chefes de família deram refúgio aos
devotos, e suas portas foram golpeadas e chutadas. Alguns devotos
conseguiram escapar por algumas vielas e becos da cidade. Aqueles que
suplicavam para os cocheiros que os levassem embora do ataque, eram
desprezados e se tornavam mais assustados observando as carroças
puxadas pelos cavalos carregadas com pedras que serviam como munição
para o massacre que parecia iminente.
Os poucos devotos que tentavam lutar, estavam cercados e eram
em minoria. Bhakti Saranga Prabhu foi capturado e permaneceu sem medo
algum - depois ele declarou, que até pensou que poderia ser oferecido em
um sacrifício humano em algum local. Poucos devotos sofreram
ferimentos e fraturas , um devoto ficou caído inconsciente, mrdangas
(tambores) foram quebradas e banners destruídos. Srila Guru Maharaj foi
ferido na cabeça e sangrou profusamente. Apesar das ruas de Navadvipa
terem ficado manchadas com o sangue dos vaisnavas, pela misericórdia do
Senhor Nrsimhadeva ninguém saiu mortalmente ferido.
Srila Prabhupada Bhaktisiddhanta Sarasvati conseguiu escapar
devido a astúcia de Vinoda Bihari Brahmacary, o qual implorou para um
chefe de família para que pudesse dar abrigo a Srila Prabhupada. Vinoda
Bihari, tendo uma aparência similar e também possuindo quase o mesmo
porte de Srila Prabhupada, trocou de roupas com seu gurudeva, vestindo as
suas roupas vermelhas e correndo um grande risco por escoltar a Srila
Prabhupada de volta a Mayapur.
Depois desse episódio, alguns moradores do local, o qual eram
simpatizantes da causa, revelaram que o ataque foi previamente
arquitetado pelos Goswamis de casta que haviam preparado previamente
todos esses atos de terror contra os pacíficos peregrinos que estavam
ocupados em cantar harinama na terra sagrada. O público ficou chocado
com todos esses acontecimentos e todos se tornaram muito favoráveis a
Gaudiya Math e a peregrinação continuou sobre forte proteção policial.
As notícias do ataque se espalharam através da Bengala, e os
círculos acadêmicos protestaram em revistas e jornais e demais meios de
comunicação. Quando sugeriram a Srila Prabhupada que tomasse as
providências legais contra os agressores, o mesmo declinou a esse pedido,
opinando que os malfeitores tinham feito um grande serviço. Porque, de
uma ou outra forma, como poderia a Gaudiya Math ter tirado tanto
proveito desse acontecimento sendo notícia na primeira página de todos os
jornais.

Capítulo 14
UMA ASSOCIAÇÃO MUITO ÍNTIMA
Por muito tempo, Srila Guru Maharaj esteve no Templo Bagbazar
Gaudiya Math, em Calcutá, dando Hari-katha, editando e escrevendo para
a Gaudiya e para vários livros além de supervisionar a impressão do
material para pregação. Mas, sempre que Srila Prabhupada Bhatisiddhanta
Sarasvati Thakur pedia, Srila Gurudeva o acompanhava em suas viagens.
Nesses momentos, Srila Prabhupada expressava seus sentimentos a
respeito de como estava se desenvolvendo a missão em diferentes locais e
também os seus desejos para o futuro. Muitos aspectos dos seus conceitos
internos, eram revelados a cada momento.
Como de costume, Srila Gurudeva tomava notas dessas palavras e
escrevia a respeito delas. Na Gaudiya Math, em um dado momento, Srila
Prabhupada começou a manifestar seus passatempos de doença. Muitos
doutores vieram cuidar dele e instruíam que deveria falar o menos
possível. Quando perguntavam como estava, Srila Prabhupada costumava
dizer que seu único problema era que não estavam permitindo a ele
realizar Hari kirtan.
Srila Prabhupada disse aos devotos que estavam ali reunidos “que
uma pessoa não deveria fazer muitos discípulos. Eu não tenho feito
nenhum discípulo. Ele são todos meus gurus. Eu tenho aprendido muita
coisa de todos eles. Que eu possa ter a oportunidade de seguir o exemplo
de sua devoção pura. Essa é minha oração.” Logo depois disso, Srila
Prabhupada deu sua instrução final a todos os devotos ali reunidos.
Novamente Srila Guru Maharaj tomava notas de tudo o que Prabhupada
dizia. Dias depois, Srila Prabhupada continuava mostrando seus
passatempos de enfermidade. Nesse momento, ele estava continuamente
cantando e meditando.
Um dia ele estava sentado sozinho em seu quarto, quando
Gurudeva entrou ali. Ele ofereceu suas reverências a Srila Prabhupada.
Então ele abraçou os pés de lótus de Srila Prabhupada contra o seu peito.
Com lágrimas em seus olhos, ele implorou a Srila Prabhupda, “
Prabhupada, eu não tenho boas qualidades. Eu tenho cometido muitas
ofensas a seus pés de lótus. Por favor, perdoa-me, e derrama sobre mim
sua misericórdia. Por favor, dê-me o refúgio de seus pés de lótus. Sem sua
misericórdia, eu não tenho esperança. Então, sua voz estava sufocada com
emoção”.
Escutando isso, Srila Prabhupada também começou a chorar.Sri
Kunjavihari Prabhu fez uma lista de devotos que poderiam estar ali
presentes estar com Srila Prabhupada a cada hora do dia e noite. Entre
aqueles que estavam incumbidos de realizar esse serviço, estavam Srila
Bhakti Raksak Srila Sridhara Maharaj, Guru Maharaj (na época
Pranavananda Brahmacary), Sri Krisnananda Brahmacary e Sri Teoyari
Mohan Brahmacary. Srila Gurudeva depois escreveu em seu diário: “Eu
estarei eternamente endividado com Sripad Kunjavihari Prabhu por dar-me
a oportunidade de servir a Srila Prabhupada quando ele estava
manifestando seus passatempos de enfermidade.”
Na manhã do dia 31 de Dezembro, de 1936, Srila Prabhupada
pediu a Srila Sridhara Maharaj que cantasse a canção sri rupa-manjari-
pada sei mora sampada de Srila Narottama Das Thakura. Srila Gurudeva
sempre relembrava esse incidente, “Srila Sridhara Maharaj hesitou, então
Kunjavihari Prabhu pediu-me para cantar essa canção, mas Srila
Prabhupada não desejava que eu cantasse a canção. Ele desejava que Srila
Sridhara Maharaj cantasse. Por pedir a Srila Sridhara Maharaj para cantar
sri-rupa-manjari-pada, ele nos deu a clara indicação da alta posição de
Srila Sridhara Maharaj”. Ele repetiu essa história muitas vezes. Então
Srila Prabhupada expressou sua apreciação para alguns discípulos pelos
seus serviços e deu algumas instruções para o futuro.
Logo depois ele disse a todos que estavam reunidos: “todos aqui
presentes, e bem como todos os ausentes, por favor aceitem minhas
bênçãos. Por favor relembrem que nosso único dever e religião é propagar
o serviço do Senhor e Seus devotos.” Por volta das 5:20am, Srila Guru
Maharaj estava ao lado da cama de Srila Prabhupada. Repentinamente
Srila Prabhupada entrou em profunda meditação e disse, “quem está
aqui?” Srila Gurudeva disse: “sou eu, Pranavananda, Prabhupada.” Srila
Prabhpada disse, “ Ó Pranavananda Prabhu?” Srila Gurudeva perguntou a
ele, “como o senhor está se sentindo, Prabhupada?” Prabhupada disse, “o
que eu posso dizer? Hare Krishna, Hare Krishna!” Essas foram suas
últimas palavras. O próximo devoto que estava com a responsabilidade de
cuidar de Srila Prabhupada, era Krsnananda Prabhu. Srila Gurudeva foi de
volta para o seu quarto. Ele sentou ali pensativo, “Será que Srila
Prabhupada estará nos deixando agora?
O que podemos esperar se ele nos deixar agora? O que eu vou
fazer?” Seus pensamentos foram interrompidos pelo som de passos de
Sripad Krsnananda Prabhu. Ele disse, “venha rapidamente, eu penso que o
grande desastre já aconteceu”. Então, se escutava um som de choro e
lamentação por toda a Gaudiya Matha, e espantosamente todos os relógios
da Matha pararam imediatamente. Às 5:30am em uma quinta-feira,
primeiro de Janeiro, de 1937, Srila Prabhupada deixou este mundo
material para entrar nos seus passatempos eternos de Sri Sri Radha-
Govinda nisanta-lila. Todos os devotos estavam se lamentando muito,
caindo no solo e gritando “Jay Prabhupada”.
Os devotos começaram a praticar os ritos védicos com muito
cuidado e o levaram para a estação de trem no meio de um sankirtan com
milhares de pessoas. Um trem especial foi arranjado para que Srila
Prabhupada fosse levado a Mayapur. Eles decidiram fazer o samadhi de
Srila Prabhupada entre a Sri Caitanya Matha e Sri Bhakti Vijay Bhavan.
Srila Prabhupada foi banhado com água do Ganges, vestido com roupas
novas e decorado com pasta de sândalo. Srila Bhakti Pradipa Tirtha
Maharaj escreveu o samadhi com polpa de sândalo.
Os devotos estavam cantando sua canções favoritas, Sri Rupa
Manjari Pada, Svananda-sukhada-kunja manohara, e Yasomati
Nandana. Srila Sridhara Maharaj e Srila Guru Maharaj fizeram o
sacrifício de fogo. Srila Bharati Maharaj leu o desaparecimento de Srila
Haridasa Thakur do Sri Caitanya Caritamrta e os devotos circumbalaram o
samadhi cantando Je Anilo Prema Dhana.. e Gurudev, krpa bindu diya...
Então eles cantaram o pranama mantra de Srila Prabhupada.
Seria impossível pensar em Srila Puri Maharaj sem pensar em Srila
Bhaktisiddhanta Sarasvati Thakur. Os dois estão tão intimamente
conectados que pensar em um, significa automaticamente se conectar com
o outro. Por isso em muitas ocasiões Srila Gurudeva quando queria se
referir a Srila Prabhupada, o fazia em tom muito confidencial, ele dizia:
“Vocês não conhecem meu Srila Prabhupada”. E essa expressão indica que
temos muito a conhecer sobre essa grande personalidade do vaisnavismo.
Porque tudo o que temos hoje no vaisnavismo foi projetado por Srila
Bhaktivinoda Thakur e aplicado por Srila Prabhupada Bhaktisiddhanta.
Srila Bhaktivinoda Thakura orou muito para que o Senhor Krsna lhe
enviasse um filho que fosse capaz de ajudá-lo a difundir os preceitos do
vaisnavismo de forma pura.
Depois de alguns anos do desaparecimento de Sri Caitanya
Mahaprabhu, o vaisnavismo caiu em um ostracismo e poucas pessoas
tinham acesso aos preceitos Gaudiya Vaisnavas amplamente. Em um
sonho, o Senhor Jagannatha revelou a Srila Bhaktivinoda Thakura que lhe
enviaria ajuda para que pudesse colocar em prática todos os seus planos de
difundir o vaisnavismo, como ele havia arquitetado.
Srila Prabhupada teve um nascimento muito auspicioso, tanto foi
assim, que o cordão umbilical ficou enredado em seu pescoço, assim como
o cordão brahminico está colocado em um sacerdote védico. Sua carta
astrológica mostrava todos os sintomas de uma grande personalidade que
se tornaria famoso no mundo todo como um grande professor do objetivo
último da vida.
Quando ele tinha apenas cinco anos de idade, durante o festival
anual do Senhor Jagannatha, que é levado em procissão por um percurso
de mais ou menos cinco horas, deteve-se por três dias em frente a casa de
Srila Bhaktivinoda Thakur , que aproveitando o ensejo, pediu a sua esposa
pra levar o seu filho para frente do carro e o colocou aos pés do Senhor
Jagannatha, imediatamente, o Senhor reciprocou, deixando cair uma
guirlanda de flores de seu pescoço e somente depois disso o carro pode
finalmente seguir o seu trajeto.

Desde a infância, Srila Prabhupada foi treinado nas práticas puras


do vaisnavismo e sua educação foi cuidadosamente dirigida para que ele
pudesse adquirir uma ampla erudição tanto nos sastras vaisnavas quanto
no âmbito da cultura ocidental. Desde cedo, Srila Prabhupada evidenciava
que não era uma criança comum - com apenas sete anos de idade já sabia
todos os 700 versos do Bhagavad-gita de cor e nunca perdia o seu tempo
com brincadeiras frívolas como os meninos de sua idade.
Ele fundou uma academia de estudos astrológicos, na qual para
fazer parte, cada integrante teria que fazer um voto de celibato pelo resto
da sua vida. Ele alcançou uma extrema erudição em jyotisa (astrologia
védica) e sânscrito, mas abandonou para se dedicar a devoção e a
propagação da pregação.
Primeiramente, ele fez um voto de cantar um bilhão de santos
nomes, o que equivale cantar 192 voltas de japa todos os dias. Comendo
muito frugalmente, esse voto se estendeu por 9 anos e 4 meses. E mesmo
durante essa austeridade, Srila Prabhupada arrumava tempo para pregar e
escrever. Logo após, começou a pregar massivamente e viajar por toda a
Índia, estabelecendo muitos templos. Realizando Harinama sankirtana
(incentivando as pessoas a cantarem o Santo Nome) imprimindo livros,
revista semanal e mensal, e além disso, um jornal diário com vários
tópicos transcendentais.
Era incrível notar que quando Srila Prabhupada saia para sua
caminhada diária em Mayapur, muitos devotos o acompanhavam com o
seu caderno de anotações, porque a qualquer momento, Srila Prabhupada
poderia começar a falar e seus discípulos estavam alertas para tomar notas.
Ele podia começar a ditar um artigo para uma revista e ao mesmo tampo,
outro artigo para o jornal diário e algum trecho de um livro. Também
nesse momento, alguns peregrinos podiam vir e prestar reverências a ele, o
qual correspondia de acordo com o nível da pessoa. Ele pregou a
mensagem de
sudha bhakti (devoção pura) por toda a Índia e enviou discípulos que
foram pregar pelo mundo, confirmando a previsão de Sri Mahaprabhu:
prtivite ache yata nagari grama sarvatra pracara haibe mora nama (Em
muitas cidades e vilarejos, e em toda a superfície da terra , Meu Santo
Nome será pregado).
Srila Prabhupada Bhaktisiddhanta Sarasvati Thakur tinha o desejo
de pregar por 12 anos no ocidente, entretanto, não foi possível para realizar
isso (de certo modo), mas seu querido discípulo Srila Bhaktivedanta
Swami Prabhupada foi o executor dessa tarefa que pode beneficiar o
mundo todo (como uma extensão de seu próprio Gurudeva). É devido a
sua misericórdia, que muitas pessoas até hoje podem coletar o fruto de um
trabalho bastante árduo que Srila Bhaktivedanta Svami Maharaj realizou
para cumprir o desejo de seu Gurudeva (Srila Prabhupada
Bhaktisiddhanta). O Seu sucesso na pregação foi tão grande que muitas
pessoas consideram um milagre tudo que conseguiu alcançar com sua
missão.
Nos momentos finais neste planeta, quando Srila Bhaktisiddhanta
manifestava seus passatempos de enfermidade, os principais discípulos
estavam reunidos ao redor de seu leito e todos escutaram quando pediu a
Srila Sridhara Maharaj que cantasse Sri Rupa Manjari Pada. Como
titubeou para cantar, uma vez que não tinha uma voz muito boa - dizem
que sua era um pouco rouca e desafinada - logo Kunja Bihari Prabhu
(administrador da Gaudiya Math e secretário pessoal de Prabhupada
Bhaktisiddhanta) pediu para Guru Maharaj (Srila Bhakti Pramode Puri
Goswami) cantar, uma com sua voz muito bela, sempre fora um dos
cantores preferidos de Srila Prabhupada - e era algo natural que ele
cantasse, tanto pela sua voz, como por sua realização.
Mas como Srila Prabhupada disse que não queria ouvir a uma voz
melodiosa e sim queria escutar a Srila Sridhara Maharaj. Isso foi uma
forma de estabelecê-lo em uma posição muito especial no grupo de Srila
Rupa Manjari (as eternas companheiras de Sri Radhe, a mais excelsa
personalidade no Vaisnavismo, a consorte de Krishna) e isso foi algo que
ficou claro para todos os principais devotos da Gaudiya Math.
Mas um ponto muito importante a ser frisado nessa história, é que
Srila Gurudeva aceitou a Srila Sridhara Maharaj como seu siksa guru
(mestre instrutor que nos aconselha diariamente na prática do serviço
devocional) à partir desse dia e sempre contava esse episódio. Podemos
ver toda a grandeza de Srila Guru Maharaj nesse contexto. Lembrando que
ele era o devoto que começou a cantar para seu Guru e foi de certa
maneira rejeitado, no entanto jamais deixou crescer algum sentimento que
estimulasse a inveja, ao contrário, estava sempre relembrando o incidente
e não deixava de glorificar e reverenciar a Srila Sridhara Maharaj.
Gurudeva sempre deu a instrução que os devotos deveriam ler os
livros de Srila Sriadhara Maharaj. Conta-se que uma vez, quando
Gurudeva foi levado ao templo Vrinda Kunja, em Vrindavana na Índia, no
momento em que viu sua foto na mesma altura da foto de Srila Sridhara
Maharaj, Gurudeva disse que era errado estar na mesma posição de Srila
Sridhara Maharaj, porque ele se considerava como sendo inferior a esse
vaisnava.
Podemos ver que a ausência de inveja é uma das principais
características de um vaisnava e isso coloca o nosso amado Srila Guru
Maharaj em uma posição extremamente elevada, ele não tinha nada de
inveja, em nenhum momento passou por sua cabeça que tinha sido
desprezado por seu Guru para beneficiar a outro discípulo em detrimento a
sua pessoa.
Srila Guru Maharaj teve um contato muito profundo com seu
Gurudeva Srila Prabhupada Bhaktisiddhanta Sarasvati Thakura, não
somente pelo serviço de edição, publicação e revisão dos artigos da
Gaudiya Math, mas também pelo contato pessoal com Srila Prabhupada
Bhaktisiddhanta, o qual pode compartilhar muitas realizações e
sentimentos confidenciais.
Se formos analisar o privilégio que foi participar de viagens com
Srila Prabhupada, dormir ao seu lado por vários anos e ter a boa fortuna de
colocar os pés de lótus de Srila Prabhupada Bhaktisiddhanta em seu peito
nos momentos finais da estadia de Srila Prabhupada nesse plano
fenomênico... Talvez tenha sido esse momento tão íntimo entre duas
personalidades tão magnânimas um marco que selou o desfecho de uma
relação eternamente abençoada por Sri Krishna.
Capítulo 15
UMA NOVA VIDA

Por treze anos consecutivos, Srila Guru Maharaj tinha se dedicado


exclusivamente a servir a Srila Prabhupada Sarasvati Thakur na Gaudiya
Math, e isso tinha sido sua vida e alma. Foi a morada de Gurudeva, onde
encontrava felicidade e esperança, um verdadeiro refúgio. Agora esse
mesmo local tornou-se de muito sofrimento, porque tudo o que ele olhava
lhe traria na memória a presença de Srila Prabhupada. Gurudeva depois
escreveu “após o desaparecimento de Srila Rupa Gosvami, Srila Ragunath
Das Gosvami chorou tão desesperadamente, que poderia inclusive derreter
as pedras com seu choro. Em seu sofrimento se tornou consciente que o
vasto campo de pastagem onde Krishna levava as vacas para pastar se
tornara vazio, a colina de Govardhana como uma jibóia, Radha-kunda
como a boca de um tigre, e seu próprio ser como um corpo morto. Como
pode a alma condicionada como eu imitar semelhantes sentimentos de
separação experimentados por um associado eternamente liberado do
Senhor?”
Entretanto, em seu coração, ele tentou aceitar a vontade divina.
Arcou com suas responsabilidades como tinha feito antes na missão de
Srila Prabhupada. Ele continuou seu serviço de escreve e editar, também
de dar Hari-katha e dessa forma o tempo foi passando. Entretanto, podia
perceber algumas discrepâncias na conduta de alguns líderes do templo e
Srila Guru Maharaj começou a sentir grande desconforto. Ele não podia
ser conveniente com semelhantes desvios, porque em sua memória vinham
os ideais de pureza de seu Guru.
Sendo assim, depois de dois anos, ele decidiu viver fora do templo
e pregar de forma independente. No mesmo momento, Srila Bhakti
Hrday Bon Maharaj tomou a mesma decisão. Então, ele alugou um
pequeno apartamento em Calcutá e pediu que Gurudeva fosse morar com
ele ali. Juntos, começaram a entregar Hari-katha em diferentes lugares.
Se diz que quando um Acarya (preceptor védico) cai de sua
posição isso se torna um choque para o mundo, mas quando o Acarya vai
embora desse plano, o mundo se torna devastado. Nesse momento os
discípulos deveriam tomar refúgio em outros Acaryas e nos irmãos
espirituais que estão em condições de auxiliar como siksa guru (mestre
instrutor) consistente.
Esse momento é muito crucial para o discípulo, porque a sua fé
será testada ao máximo, ele terá que assumir novas responsabilidades, terá
que harmonizar com seus irmãos espirituais e nesse contexto, sempre a
essência das instruções do Acarya deve ser seguida e preservada a todo
custo. Devemos nos sacrificar para estabelecer o ideal deixado pelo
Acarya, porque sua importância se iguala a da própria divindade. No
Srimad Bhagavatam (11.17.27), Krishna diz:
ācāryaṁ māṁ
vijānīyān
nāvamanyeta
karhicin
na martya-buddhyāsūyeta
sarva-deva-mayo guruḥ
“Deve-se saber que o acarya sou Eu mesmo e jamais deve ser
desrespeitado. Ninguém deveria invejá-lo, pensando nele como um
homem ordinário. Porque ele é a soma de todos os semideuses”.
O Guru é a representação e manifestação da Suprema
Personalidade de Deus, em nenhum momento deve ser desrespeitado,
entendendo que não há diferença entre Krishna e o Guru. São iguais e ao
mesmo tempo diferentes. Mas sua posição divina sempre deverá ser
ressaltada, como sendo um papel fundamental para vida do praticante. Sua
presença será como uma bússola, que guia o discípulo para o norte dos pés
de lótus de Krishna. Então, é um tanto natural, entender que depois de sua
partida as coisas não funcionem muito bem e em muitas ocasiões o caos se
estabeleça, os discípulos se dividem e não conseguem trabalhar em união.
E foi o que aconteceu depois da partida de Srila Prabhupada
Bhaktisiddhanta.
Quando perceberam que o ideal de seu Gurudeva já não podia ser
mais sustentado, muitos discípulos trilharam caminhos diferentes, não
existindo mais uma conformidade de esforços que fosse capaz de seguir as
diretrizes da missão do Acarya. É um instante de suma importância, no
qual o discípulo deve ser capaz de seguir a doutrina estabelecida pelo seu
Guru e não se desviar em momento algum. Agora chegou o momento dele
mostrar que é um verdadeiro discípulo, porque o seu Guru não está mais
presente fisicamente para instruí-lo, e ainda assim, deve seguir adiante
com tudo o que recebeu de seu Gurudeva. O verdadeiro discípulo um dia
90
terá que se tornar Guru e ajudar as pessoas também. No Caytania-
caritamrta (Madhya 8.128) está escrito:

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kibā vipra, kibā nyāsī, śūdra kene naya
yei kṛṣṇa-tattva-vettā, sei 'guru' haya

“Quer seja um brahmana (sacerdote), um sannyasi (renunciante) ou


um sudra (um trabalhador, da classe mais baixa) aquele que conhece a
ciência de Krishna deve ser aceito como Guru.”
O discípulo qualificado se prepara para aceitar a responsabilidade
de guiar outras pessoas no caminho da devoção. Não importando a posição
que ele se encontre, se é capaz de entender a consciência de Krishna,
estará apto para oferecer ajuda e assim atuar como Guru.O
conhecimento transcendental vem até nós através de uma sucessão
discipular e o discípulo tem a obrigação de representar nosso parivar
(família, descendência) com muita dignidade.
No momento em que o Guru não estiver mais presente fisicamente,
o discípulo através das instruções do Guru levará adiante a essência de
todo esse conhecimento que será capaz semear dentro dos corações a
semente da devoção. Ela crescerá e se nutrirá com as práticas de bhakti e
aos poucos, as pessoas que se conectaram com essa corrente do amor,
serão beneficiadas amplamente.
Sendo assim, a responsabilidade que carrega o discípulo,
aumentará na medida que ele incremente o círculo de pessoas que
dependem de sua instrução.Infelizmente quando os grandes Acaryas
deixam o planeta, o caos se instala de imediato, e em muitas vezes, mesmo
antes que parta, já podemos sentir sintomas de distúrbios provocados pelos
interesses pessoais e desejo de obter fama e posição.
O discípulo sincero, permanecerá longe de qualquer pessoas que
demostrar sintomas antes mencionados. Mas sempre terá que lidar com
muitas situações desconfortáveis que o pressionarão a decidir qual lado
escolher. Se ele for sincero, optará pela essência e nunca pelo formalismo.
Nunca se deixará sucumbir pela ambição de estar ao lado da maioria,
somente por uma posição mais cômoda. Não se preocupará com a posição
formal para si, porque isso, afinal de contas é bem secundário. O próprio
Caytania-caritamrta (Madhya-lila, 13.80) adverte:
nāhaṁ vipro na ca nara-patir nāpi vaiśyo na śūdro
nāhaṁ varṇī na ca gṛha-patir no vanastho yatir vā
kintu prodyan-nikhila-paramānanda-
pūrnāmṛtābdher gopī-bhartuḥ pada-kamalayor dāsa-
dāsānudāsaḥ
“Eu não sou um brahmana (sacerdote), eu não sou um vaisya
(comerciante ou proprietário de terras) ou sudra (trabalhador). Nem
sou um brahmacary (monge estudante), ou chefe de família, um
vanaprastha (aposentado) ou sannyasi (renunciante). Eu me identifico
apenas como um servo do servo, do servo dos pés de lótus do Senhor
Krishna, o mantenedor das gopis (companheiras de Radharani, a
querida de Krishna). Ele é como um oceano de néctar, e Ele é a causa
universal de bem-aventurança transcendental - O qual está sempre
existindo com Seu brilho.”
Realmente não importa nossa posição formal dentro do sistema
sócio- religioso-védico, se uma pessoa é um brahmana ou um sannyasi ou
mesmo um sudra, isso não tem muita importância, uma vez que Sri
Caitanya Mahaprabhu veio de certa forma pulverizar o sistema de castas
hindu, trazendo o Sanatana-dharma (dever eterno da alma) como a única
saída para todos que buscam a emancipação.
Concluindo esse ponto, a nossa posição formal dentro de uma
instituição deveria ser deixada a um segundo plano, quando consideramos
os aspectos mais elevados e profundos de nossa consciência. No mesmo
Caytania-caritamrta (Adi-lila,7.74) encontramos:
nāma vinu kali-kāle nāhi āra dharma
sarva-mantra-sāra nāma, ei śāstra-
marma

“Nessa era de kali não existe outro princípio religioso do que o canto
do Santo Nome, o qual é a essência de todos os mantras védicos, esse é
o objetivo de todas as escrituras.”

Em uma sociedade que fomente os princípios religiosos, o mais


importante é que o canto do Santo Nome possa ser estabelecido como o
preceito fundamental. Se existe tanto esforço coletivo para arrecadar
fundos para manter templos e construir edificações ou mesmo adquirir
propriedades rurais, se tantos livros foram distribuídos e tantas almas
recrutadas para o serviço, isso deve-se unicamente ao propósito de
estabelecer o canto do Santo Nome como algo essencial na vida dos
devotos.
Não existe outro princípio religioso para essa era de Kali. Cantar o
Santo Nome é natural e constitucional para toda a entidade viva, é através
dessa prática que poderemos relembrar nossa verdadeira identidade. Por
isso devemos ser muito fiéis aos princípios estabelecidos pelo nosso Guru-
varga (sucessão de Gurus, nossos preceptores) e quando vemos que a
sociedade que pertencemos está se desviando da essência trazida e
estabelecida por Sri Caitanya Mahaprabhu, deveríamos analisar nossa
posição relativa na sociedade em que estamos inseridos e romper as
fronteiras que momentaneamente nos prendem somente aos laços
institucionais.
Foi assim que Om Visnupada Bhakti Promode Puri Gosvami
Maharaj deixou a instituição que Srila Prabhupada Bhaktisiddantha
Sarasvati Thakur havia fundado e pela qual tinha se dedicado tanto - mas
que naquele momento se desviava dos preceitos básicos deixados pelo seu
mestre espiritual.

Capítulo 16
UM DARSAN MUITO ESPECIAL

Quando Srila Guru Maharaj estava pregando junto com seu irmão
espiritual Srila Bhakti Hrday Bon Maharaj em Calcutá, uma senhora idosa,
que frequentemente assistia as suas aulas, o convidou para ir a visitar a sua
casa. Srila Gurudeva disse a ela de forma muito humilde: “Mãe, nós somos
sannyasis e brahmacarys, não podemos ir a sua casa, a menos que seja
para dar Hari-katha”. A senhora replicou: “Eu tenho minha Deidade de
Krishna e necessito que vocês venham a minha casa para adorar a Deidade
e dar Hari-katha.”
Sendo assim, com satisfação aceitaram o convite. Quando
chegaram a sua casa, a senhora pediu que Gurudeva adorasse a Deidade.
Guru Maharaj ficou emocionado com a beleza da Deidade. Esta Deidade
não tinha nome então ele a chamou de “Sri Gopinath”. Gurudeva ofereceu
folhas de Tulasi (uma planta sagrada para os Vaisnavas) para a Deidade e
posteriormente a adoração, Gurudeva cantou belamente um kirtana para o
prazer de Sri Gopinath.
Um dia Srila Guru Maharaj estava escrevendo um artigo em seu
quarto, quando a mesma senhora idosa veio vê-lo. Ela disse que um sonho
a sua Deidade (Sri Gopinath) havia lhe dito que gostaria de ser adorada por
ele. Gurudeva ficou muito surpreso ao escutar aquilo. Ele perguntou a
senhora se era verdade o que ela estava dizendo. Ela respondeu que sim,
que era verdade, que jurava por sua própria vida que tudo era verdade.
Gurudeva ficou muito ansioso para adorar a Deidade, mas a senhora disse
que a Deidade deveria ser adorada em uma casa de família.
No entanto por um arranjo, a mãe de Gurudeva, Srimati
Ramrangini Devi, era muito devocional e apegada a adoração à Deidade.
Ela e seu irmão Nani Gopal estavam muito felizes em receber a Deidade
de Gopinath. Depois de adorar a Sri Gopinath com todo o seu coração por
poucos dias, Srila Gurudeva decidiu voltar para o Bagbazar da Gaudiya
Math (o principal templo de Bhaktisiddhanta, localizado em Calcutá). Sua
piedosa família, com muita devoção mantinha a adoração a Sri Gopinath
todos os dias. Todos do vilarejo eram convidados para a adoração e
sentiam-se muito atraídos pela Deidade de Gopinath.
A casa passou a ficar famosa pelo nome de “a casa de Gopinath.”
Nesse momento, Srila Guru Maharaj continuou a fazer o seu serviço no
Bagbazar Gaudiya Math novamente. Mas por causa de alguma umas
situações que eles via como corretas e que demonstravam a pureza de seu
Gurudeva, ele decidiu sair do templo outra vez.
A adoração à Deidade sempre esteve presente em sua vida, desde
sua infância, realizou passatempos maravilhosos relacionado a Deidades e
por toda sua existência o gosto por arcana (adoração) o seguia a cada
instante. Como nesse incidente supracitado, em que a Deidade através de
um sonho quis ser adorada por Gururdeva e acabou se instalando na casa
de sua piedosa família. No Srimad Bhagavatam (12.3.52) :
kṛte yad dhyāyato
viṣṇuṁ tretāyāṁ
yajato makhaiḥ dvāpare
paricaryāyāṁ kalau
tad dhari-kīrtanāt
“O método de adorar a Deus em Satya-yuga (primeira era) era através
da meditação, em Treta-yuga (segunda era) através de sacrifícios, em
Dvapara-yuga (terceira era) pela adoração à Deidade e em Kali-yuga
(quarta era, a atual) pelo canto do Santo Nome”.
Levando-se em conta que as escrituras nos recomendam em Kali-
yuga o processo para alcançar a perfeição como sendo o canto do Santo
Nome e que a adoração a Deidade seja um processo praticado em outra
era, sabe-se que a adoração á Deidade é de suma importância para o
sadhaka (praticante). Uma vez que em Kali-yuga, todos os habitantes da
era possuem mente perturbada e sentidos descontrolados, a adoração da
murti (Deidade) torna-se uma prática poderosa para os adeptos da bhakti
yoga, principalmente nos estágios preliminares da devoção. Sabemos que
o canto é tudo em Kali-yuga: Nama vinu kali kale nahi ara dharma (Não
existe outro dever em Kali-yuga a não ser cantar o Santo Nome).
E também está dito que nava vidha bhakti purna nama haite haya
(Por praticar o canto do Santo Nome, todos os nove processos principais
da pratica do bhakti são automaticamente satisfeitos). Ou seja, por cantar o
Santo Nome é como se já estivéssemos adorando a Deidade. E também no
famoso verso do Caytania-caritamrta (Adi-lila,7.76):
harer nāma eva kevalam
kalau nāsty eva nāsty
eva nāsty eva gatir
anyathā

“Para o progresso espiritual em Kali-yuga, não existe outra


alternativa, não existe outra alternativa, não existe outra alternativa, a
não ser o canto do Santo Nome, o canto do santo nome e o canto do
Santo Nome”

Apesar de todas as afirmações acima enfatizarem fortemente o


canto do Santo Nome como o processo mais elevado a ser praticado na era
atual, nunca deveríamos prescindir da adoração da Deidade como um dos
meios mais poderosos para estabelecer a devoção dentro de nós. Se somos
tão afortunados de possuir algum serviço relacionado a Deidade,
deveríamos aceitá-lo com muito entusiasmo.
Em outro incidente, contado por Srila Bhakti Bibudha Bodhayan
Maharaj, mostra a sobrenatural relação que Srila Guru Maharaj tinha com
a Deidade. Um dia, em Sridham Mayapur (no estado da Bengala na Índia),
Srila Gurudeva estava falando para Sripad Syaamal Krsna Prabhu e Sripad
Dinabandhu Prabhu. De Repente Srila Guru Maharaj disse: “Eu sinto
como se meu corpo estivesse queimando, porque está acontecendo isso?”
Eles pensaram que não estivesse se sentindo bem, mas não puderam
encontrar nenhuma razão para essa sensação de “estar queimando.” Depois
de algum tempo, alguém ligou do templo de Calcutá (que esta 4 horas do
local onde se encontrava Gurudeva) e comentou que durante o arati, a
asana (o assento)de Giridhari (Deidade de Krishna) tinha pegado fogo
mas, que já tinha sido apagado.
Escutando isso, Srila Guru Maharaj ficou extremamente aflito e se
recusou a tomar prasadam (alimento sagrado) por dois dias. E depois disse
uma e outra vez “Mãe Yasoda cuidava muito bem de seu Gopal (Krishna).
Com grande afeição e cuidado ela o alimentava. Hoje seu mesmo Gopal
foi queimado. Eu sou um filho de um pobre brahmana; eu não não
provarei dessa opulenta prasadam que você me deu”. Ele manteve essa
lamentação por alguns dias.
Outro assunto relevante nesse contexto, é o fato de que Guru
Maharaj ter de forma muito cuidadosa evitado o convite de ir à casa de
uma mulher, ainda que ela fosse uma senhora de idade avançada. Naquele
momento de sua vida, Gurudeva, era um brahmacary (monge estudante) e
como era muito estrito em relação as recomendações do vaisnavismo,
sentia-se muito constrangido de receber um convite para um simples visita,
mas se estivesse relacionado a pregação, seria um caso completamente
diferente.
Brahamacarys e sannyasis (renunciantes) devem seguir um
comportamento muito rígido, no que tange o trato com as mulheres.
Seguindo o exemplo dado por Sri Mahaprabhu, que havia rejeitado a um
de seus associados, por que estava na vida de renúncia e ao mesmo tempo
havia se comportado de maneira inadequada aos olhos do Senhor. Uma
vez, Chota Haridas, que estava na vida renunciada, foi buscar um certo
tipo de arroz para ser cozinhado para Sri Mahaprabhu, ele teve que ir a
casa de uma devota, que já era idosa e somente recebeu o arroz e partiu.
Mas quando o Senhor ficou sabendo desse encontro, Ele o rejeitou e não
quis mais vê-lo em sua frente.
Chota Haridas ficou muito melancólico, e apesar de muitos
associados de Mahaprabhu terem intercedido a seu favor, O Senhor não
voltou atrás de sua decisão de rejeitar a Chota Haridas. E logo depois que
soube que Chota Haridas havia cometido suicídio por causa desse fato, Sri
Caitannya Mahaprabhu ficou satisfeito, dizendo que essa tinha sido a única
maneira de expiar a atividade pecaminosa de um sannyasi ao se associar
ilicitamente com uma mulher. Inclusive, as escrituras denominam um
sannyasi que volta ter relacionamentos com uma mulher como vantasi, ou
seja, aquele que come o próprio vômito.
Mas analisando profundamente esse acontecimento, vemos que
Chota Haridas não havia cometido uma falta muito grave e que a punição
que recebeu de Mahaprabhu havia sido um pouco exagerada, mas
entendemos que Senhor queria estabelecer um exemplo de como deveria
ser cuidadosa uma pessoa que está na ordem de vida de renuncia. Também
vemos que Sri Mahaprabhu não quis se associar com o Rei Prataparuda
Maharaj, apesar deste ser um devoto puro de Krishna mesmo depois que
os seus principais associados pedissem a favor do rei, insistindo que ele
havia favorecido muito a Ramananda Ray, que era um dos associados mais
queridos de Mahaprabhu. Ainda assim, O senhor disse que se O quisessem
entre com eles, que nunca mais tocassem nesse assunto, porque senão, Ele
iria embora no mesmo instante. No Srimad Bhagavatam ( 7.15.36)
encontramos:
yaḥ pravrajya gṛhāt
pūrvaṁ tri-
vargāvapanāt punaḥ
yadi seveta tān bhikṣuḥ
sa vai vāntāśy apatrapaḥ

“ Aquele que renuncia ao material, abandonando a vida de grhasta, e


deixa sua casa para ser um mendicante, um sannyasi, e aquele que
deixa o sannyasi asrama para novamente procurar sexo e dinheiro, é
como alguém que vomita uma comida que lhe fez mal e a come
novamente, porque ele está cobiçoso de experimentar aquilo que ele já
tinha rejeitado. Semelhante pecador descarado, é um homem
condenado.”

Brahmacarys e sannyasis seguem o caminho da renúncia, estão


lado a lado, tentando se libertar do desfrute sensual e ao mesmo tempo
servindo de maneira intensa e tomando todo o cuidado para não macular a
imagem de pureza que a ordem traz consigo desde tempos remotos.
Entende-se que o objetivo não é ser brahmacary ou sannyasi, e sim ser um
devoto puro, o que significa ter um forte apego pelo canto do Santo Nome.
Mas uma vez que alguém assume o papel de ser um brahmacary
ou sannyasi, deve ser muito meticuloso e cuidadoso com seus movimentos
e companhias. As pessoas de uma maneira geral, são peritas em encontrar
defeitos nos demais e se um monge que está no caminho da renúncia
comete um erro, será imediatamente notado, assim como um ponto negro
em um lenço branco.
Em Kali-yuga a karma sannyasa (tomar renúncia) é proibida,
porque as pessoas nesta era não possuem os requisitos psicológicos e
físicos adequados para a ordem da renúncia, a qual requer muitas regras
que seriam quase impossíveis de serem seguidas em nessa era. Entretanto
como Sri Caitanya Mahaprabhu aceitou a ordem de sannyasa com o
intuito de fomentar a pregação, os Gaudiyas Vaisnavas também são
encorajados a entrar na ordem de renúncia.
Foi Srila Prabhupada Bhaktisiddhanta Sarasvati Thakur que
primeiramente formulou os procedimentos que hoje conhecemos para um
renunciante se adequar aos requisitos básicos que o mesmo necessita. Srila
Prabhupada, anteriormente havia pesquisado intensamente na Ramanuja
sampradaya (uma linha paralela a Gaudiya Vaisnava, também adoram a
Krishna) a respeito de toda simbologia necessária para estabelecer os
parâmetros formais da sannyasa. Entretanto, o próprio Srila Prabhupada
frisava que o mais importante era a atitude de serviço que o tyagi
(renunciante) deveria desenvolver em relação a todos os aspectos e
situações de sua vida. O Manu Samhita ( 12.10) traz o significado da
palavra tridandi (renunciante):
“ Vagdado tha mano-dandah kaya-danda-stathaiva
ca yasyaite nihita-buddhau tridanditi as ucyate

“Aquele que aceita em sua mente a vara do castigo para sua fala, é
conhecido como tridandi; aquele que aceitou os três tipos de vara do
castigo.”

Damanam dandam yasya van-manah-kayanam dandah


nisiddhabhidhanah
sat-sankalpa-pratisiddha -vyapara-vyapara-tyagena buddava-vasthitah
as
tridandity-ucyate na tu danda-traya-dharana-matrena

“A palavra danda significa punição. Aquele que pune a fala, a mente e


as ações significa aquele que abandona o apego pelo desfrute sensorial
material e o qual aceita o que é favorável para a verdade e rejeita o
que é desfavorável para a perfeição. Semelhante pessoa é chamada
tridandi. E nem todo aquele que carrega as três varas pode ser
chamado de tridandi.”
Tendo se estabelecido de forma integral no serviço a Sri Hari, o
renunciante somente pensa em sacrificar-se para a satisfação da
Divindade, o que significa cem por cento ocupado em serviço, sem
nenhuma distração sem nenhum objetivo subjacente. Tomando cuidado
especial com seu comportamento na sociedade, o renunciante ficará
cauteloso em suas palavras e comportamento, uma vez que servir
exclusivamente a causa suprema é sua meta.
Capítulo 17
UMA LINDA ASSOCIAÇÃO

Depois de viver por mais um tempo na Gaudiya Math, Srila Guru


Maharaj morou aproximadamente um ano em Navadwip, com o seu
amado irmão espiritual, Srila Bhakti Raksaka Sridhara Deva Gosvami
Maharaj, fundador Acarya da Sri Caitanya Sarasvati Math. Alguns poucos
irmãos espirituais de Srila Gurudeva também viviam ali nesse momento, e
logo depois saíram para abrir programas na Bengala e em outras diferentes
partes da Índia. Srila Gururdeva sempre se sentia muito confortável e feliz
na companhia de Srila Sridhara Maharaj. Por ele, Gurudeva nutria uma
grande confiança em sua sabedoria, erudição e discernimento em relação
aos tópicos transcendentais.Quando Srila Guru Maharaja vivia na
Gaudiya Math, um educado cavalheiro chamado Sri Ramendra Chandra
Bhattacarya, estava vindo todos os dias escutar Hari-katha, e ouvia de
forma muito atenta. E nesse momento a palestra era dada por Srila
Prabhupada Bhaktisiddhanta ou por Gurudeva. Alguns dos seus irmãos
espirituais, principalmente Kirtanananda Prabhu, estavam muito
desconfiados.
O movimento para a independência da Índia crescia muito nesse
momento, e o governo britânico suspeitava que todos os encontros
poderiam estar fomentando alguma suposta rebelião. Eles frequentemente
enviavam agentes secretos da central de inteligência para investigar
alguma possível conspiração contra o governo britânico. Então, Sri
Kirtananandana Prabhu disse para Gurudeva “eu nunca vi alguém escutar
a cada palavra com atenção indivisa, dia após dia, você deveria ser muito
cuidadoso com ele, eu penso que ele é um agente secreto infiltrado”.
Quando Srila Sridhara Maharaj viu pela primeira vez a Srila
Prabhupada Bhaktisiddhanta Sarasvati Thakur, pode perceber sua
completa indiferença para o mundo material, não se preocupava por
alguém em especial, era auto-suficiente. Então Srila Sridhara Maharaj
começou a visitar a Math e desejava viver em semelhante companhia.
Entretanto muitos empecilhos ainda impediam que seu desejo fosse
satisfeito. O maior obstáculo era o seu casamento. Em algum momento,
desejou que sua esposa morresse, assim ele poderia viver com Srila
Prabhupada Bhaktisiddhanta. Quando chegou em casa, a sua esposa se
encontrava muito doente e três dias depois ela havia deixado este mundo.
Sua mãe quis que se cassasse de novo, mas ele não queria, então seis
meses depois em peregrinação no Kumbha Mela (o maior festival religioso
do mundo que acontece na Índia), ela também abandonou o corpo.
Desta maneira, sentido-se livre para morar no templo, Srila
Sridhara Maharaj quis conhecer a Srila Prabhupada em seu quarto, mas foi
barrado por Kirtanananda Prabhu que não o deixou subir, dizendo que
deveria esperar para ser chamado, que não poderia querer falar com o
sadhu, sem que esse o chamasse. Isso o desanimou um pouco e pensou em
ir embora. Mas logo se lembrou do passatempo com Sukadeva Gosvami,
quando foi se encontrar com Janaka para finalizar os seus estudos e
sadhana, ele foi detido por sete dias em sete portões consecutivos.
Refletindo sobre esse incidente, Srila Sridhara Maharaj pensou:
“Se existe algo ruim aqui, e se eles me colocam em um trono para adorar-
me, eu deveria ir embora imediatamente. Mas se existe algo de bom
verdadeiro aqui, e eles me batem com um cabo de vassoura, eu não deveria
ir embora”. Todos estes pensamentos suavizaram sua mente e continuou a
visitar a Gaudiya Math.
Um dia, Srila Prabhupada estava fora de seu quarto, comendo um
pouco de Prasadam , e isso era algo incomum, porque Srila
Bhaktisiddhanta raramente comia de noite. Quando viu a Srila Sridhara
Maharaj parado em um canto, perguntou a seu servo se ele (Srila Sridhara
Maharaj) tinha alguma coisa a dizer. E quando o servo veio a indagar, o
mesmo disse que não tinha nada a dizer. Nesse momento, Srila
Prabhupada perguntou a seu servo se tinha algo a perguntar, mas Srila
Sridhara Maharaj disse que não tinha nada a perguntar também. O servo
retornou e Srila Prabhupada perguntou se ele (Srila Sridhara Maharaj)
tinha algum propósito em sua mente quando vinha ao templo. E ele
respondeu que seu único propósito para vir ao templo era obter a graça de
Srila Prabhupada. Esta resposta parece ter sensibilizado a Prabhupada,
porque começaram a conversar (Srila Prabhupada e Srila Sridhara
Maharaj) perguntando a ele quem era, de onde vinha e muito mais.
Pela ocasião da comemoração do aparecimento de Sri Mahaprabhu,
Srila Srila Sridhara Maharaj foi ao templo escutar Hari-katha de Srila
Prabhupada. Muitas pessoas importantes da sociedade estavam ali
presentes. Em um momento Srila Prabhupada falou: “Vocês estão me
enganando, por favor, não me enganem”. Srila Sridhara Maharaj que
estava muito ansioso por ouvir as palavras de Srila Prabhupada, pensou:

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“porque ele está falando em engano? Onde está o engano aí? Todos foram
convidados, todos vieram ao templo e agora estavam indo embora, sendo
assim, porque haveriam de enganá-lo?”
Nesse momento, Srila Prabhupada disse: “todos vocês vem ao
templo com o entendimento de que iam se ocupar no serviço ao Supremo e
então eu me dediquei a criar uma relação com vocês. E agora apenas como
uma moda vocês assistiram a cerimônia e estão indo para suas casas se
ocuparem em afazeres mundanos. Vocês poderiam dizer que
primeiramente tem que terminar seus próprios afazeres, e depois poderiam
vir ao templo para se ocuparem nas práticas devocionais. Mas não! Não
deve ser assim. Se vocês me dizem que é necessário apagar um pequeno
incêndio primeiramente e depois virão aqui para se ocupar, eu digo que
isso não é necessário. Eu afirmo que se fogo queimar o mundo todo, você
não perderá nada. Mas ao contrário, vocês estariam salvos se puderem se
desconectar de tudo isso que estão queimando. Todos os engajamentos
positivos, suas buscas e desejos serão correspondidos na busca de Sri
Krsna. Todas as suas buscas e necessidades serão satisfeitas no serviço aos
pés de lótus de Sri Krsna e nada mais.”
Srila Sridhara Maharaj estava completamente atônito com tudo o
que havia escutado, ele conta que nunca havia visto ninguém nesse mundo
que fosse tão apegado a Hari bhajana, e assim, decidiu que seria seu
discípulo.Tão logo Srila Sridhara Maharaj foi viver na Matha, se
envolveu com os programas de pregação e depois de três anos foi indicado
para tomar sannyasa. Foi um experto pregador e considerado logo depois
como o general dos sannyasis. De uma forma ou outra todos viam tomar
seu refúgio, devido a seu amplo conhecimento das escrituras e suas
profundas realizações espirituais.
Já mencionamos o passatempo em que Srila Prabhupada
Bhaktisiddhanta Sarasvati Thakur estava manifestando os seus
passatempos de enfermidade, mandou Srila Sridhara Maharaj cantar Sri
Rupa Manjari Pada de Srila Rupa Gosvami, mas como ele não estava
acostumado a liderar os kirtanas, ficou um pouco ansioso e então outro
devoto pediu a um brahmacary que cantasse, mas logo Srila Prabhupada
protestou dizendo que não queria escutar a melodia - isso pode ser
entendido que ele estava dando ingresso a sessão Radha Seva (o mais
elevado dentro do Vaisnavismo, o serviço a Sri Radharani, a querida de
Krishna).
Um ano antes, ele havia composto um poema em sânscrito que
glorificava a Srila Bhaktivinoda Thakura e Srila Prabhupada ficou muito
feliz com isso. E disse que o poema era de um estilo muito fino, e
acrescentou a dizendo a Sripad Srauti Maharaj que “esse poema é tão
apurado que eu não acredito que tenha sido escrito por ele, e sim pelo
próprio Bhaktivinoda Thakur”. E também disse a Sriyukta Aprakrta
Prabhu que “estou tão satisfeito com esse poema, que posso dizer que
permanecerei presente através do siddhanta (conclusão filosófica)
apresentado nele.” (indicando que seu discípulo manteria a chama de seu
Guru acesa mesmo após sua partida).
Srila Sridhara Maharaj foi nomeado por Srila Bhaktisiddhanta
como shastra nipuna, ou seja, aquele que é perito em entender os
significados profundos das escrituras.Desafortunadamente, depois da
partida de Srila Prabhupada Bhaktisiddhanta, muitos conflitos surgiram e
Srila Sridhara Maharaj resolveu deixar a missão e tentou se esconder em
um bhajana kutir (cabana simples) e viver anonimamente. Isso não foi tão
fácil, porque muitos dos seus irmãos espirituais o buscavam para tomar
refúgio. Dessa maneira, muitas pessoas foram chegando e naturalmente
sua influência foi naturalmente estabelecida entre os Gaudiya Vaisnavas.
Sua própria missão foi estabelecida sem que ele precisasse se
mover. As pessoas foram chegando de todos os lados e Srila Sridhara
Maharaj se tornou um dos mais famosos expoentes do Gaudiya
vaisnavismo. A relação entre Srila Sridhara Maharaj e Srila Guru
Maharaja, foi sempre marcada por uma profunda comunhão e intercâmbio
de experiências devocionais. Sempre que se celebrava o Vyasapuja
(aniversário do Guru) de Srila Sridhara Maharaj, Srila Gurudeva se
deslocava para o templo de Srila Sridhara Maharaj para prestar seus
respeitos a essa grande personalidade.
E foi assim também que Gurudeva foi aos poucos se tornando
conhecido por alguns discípulos de Swami Bhaktivedanta Maharaj
Prabhupada, os quais seguindo suas instruções, haviam tomado refúgio em
Srila Sridhara Maharaj, porque uma vez Srila A.C. Bhaktivedanta Swami
Maharaj Prabhupada havia dito que para assuntos filosóficos, os seus
discípulos deveriam buscar refúgio em Srila Sridhara Maharaj, o qual ele
mesmo considerava como seu siksa guru ( guru instrutor). Alguns dias
antes da partida de Srila Sridhara Maharaj do planeta, Srila Guru Maharaj
chegou ao seu ashram e depois realizou os ritos funerários que eram
apropriados a semelhante personalidade de tamanha amplitude espiritual.
A relação existente entre esses dois Acaryas emanava entre eles um
profundo respeito e admiração mútua. Quando os dois se encontravam,
compartilhavam experiências transcendentais de um plano completamente
diferente ao nosso. A viagem interna que guiava as suas consciências o
levavam sempre a interiorizar todos os assuntos que lhe chegavam
automaticamente. Profundamente inspirados no ideal do amor divino, estas
duas grandes personalidades foram grandes baluartes da devoção que
inspiraram a todos aqueles que se aproximaram com o intuito de receber
instrução espiritual. A inveja nunca pode se aproximar dessa linda relação,
que sempre foi estabelecida de coração para coração, sem nenhuma
duplicidade ou hipocrisia. Essa grande manifestação de amizade entre
esses dois grandes Acaryas consolidou para sempre em nossas
consciências o ideal de vaisnavismo puro.

Capítulo 18
O TRABALHO DE PREGAÇÃO
Entre o período de 1941 a 1947, Om Visnupada Srila Bhakti
Promode Puri Gosvami Maharaj viajou pela Bengala e por muitos outros
locais em toda a Índia. Isso pode ser confirmado pelas memórias escritas
por seus irmãos espirituais, seus discípulos e também em seu próprio
diário. Sem nenhum pensamento de formar discípulos ou de estabelecer a
sua própria missão, ou mesmo obter algo de nome, fama ou
reconhecimento, ele e seus muitos irmãos espirituais pregaram a
mensagem de Srila Prabhupada Bhaktisiddhanta incessantemente e de
forma muito intensa.
Srila Guru Maharaj foi a muitos locais com seus irmãos espirituais,
sem ficarem em um local específico por muito tempo. Estava sempre
viajando por várias Gaudiya Mathas por toda a Bengala, continuando com
suas leituras, escritos e pregações onde quer que fosse. Esteve no Triveni
(a confluência do Ganges, Yamuna e Sarasvati, que são rios muito
sagrados), por um ano. Também visitou em Uddharan Gaudiya Matha em
Chuchura.
Dali novamente saiu para pregar extensivamente para a rica
comunidade local que era conhecida como os ourives de Chuchura.
Impressionados pelo seu Hari-katha, muitos deles vieram a abraçar o
vaisnavismo. O resultado dessa constante peregrinação e absorção na
pregação rendeu muitos frutos que podem ser sentidos inclusive nos dias
atuais pelo engajamento de gerações que se conectaram com o serviço
devocional de uma forma ou outra.
A missão de Sri Caitanya Mahaprabhu, representada por Srila
Bhaktivinoda Thakura e Srila Prabhupada Sarasvati Thakura estava sendo
reformulada e uma aplicação prática era estabelecida - com isso vários
campos de oposição também surgiam como uma resposta natural a forte
onda que a Gaudiya Matha vinha propondo.
Srila Prabhupada havia declarado formalmente uma guerra contra
maya e automaticamente isso incluía a adesão voluntária dos seus
discípulos mais íntimos. Depois de sua partida, os mesmos estavam
assumido a responsabilidade de levar a cabo as instruções do seu divino
mestre. Esse apego ao aspecto vani (instruções) do guru sempre demonstra
um grau elevado de maturidade espiritual do discípulo.
Apesar do aspecto vapu (forma pessoal) do guru não ser predominante no
vaisnavismo, os discípulos sempre sentirão o apoio na presença física do
guru que remarca com muito vigor a aplicação prática das suas instruções.
Nesse contexto, Srila Guru Maharaj junto com seus irmãos espirituais
estavam demonstrando na prática, sendo fiéis seguidores na missão de
propagação da consciência de Krishna. No verso supremamente famoso
do Caitanya-Bhagavata (Antya-khanda 4.126) encontramos:

pṛthivīte āche yata nagarādi-grāma


sarvatra pracāra haibe mora nāma

“Em todas as cidades e vilarejos por toda a superfície da terra, Meus


nomes serão pregados.”

No Caytania-caritamrta (Adi 9.41) se diz:


bhārata-bhūmite haila manuṣya janma yāra
janma sārthaka kari' kara para-upakāra

“Aquele que nasce como um ser humano na terra da Índia, deveria


tornar a sua vida um sucesso e trabalhar para o benefício de todas as
pessoas por pregar o nama-sankirtana, o canto do santo nome do
Senhor.”
A previsão era de que o santo nome iria se espalhar por todas as
partes, naquele momento histórico os discípulos de Srila Bhaktisiddhanta
estavam mergulhados nessa tarefa de difundir a consciência de Krishna.
Srila Gurudeva não ficava muito tempo em um local, a ideia era abarcar o
máximo possível as pessoas. Eles tinham um nascimento muito
privilegiado em Bharata varsa (Índia) e além da boa fortuna de ter
conhecido a Srila Prabhupada Sarasvati Thakur e como se não bastasse,
foram iniciados pelo mesmo em Harinama (canto do Santo Nome), diksa
(iniciação espiritual) e sannyasa (ordem de renúncia) em alguns casos.
Sendo assim, o compromisso que recaia em seus ombros era
imenso, e mesmo assim não estavam escapando de suas responsabilidades,
pelo contrario era um bálsamo refrescante que tinha como o objetivo
aliviar um pouco a influência negativa de kali sobre as pessoas
desorientadas desta era.
No Caytania-caritamrta (Madhya 8.39) está dito:
mahānta-svabhāva ei tārite pāmara
nija kārya nāhi tabu yāna tāra
ghara

“A prática geral de todas as pessoas santas é liberar as almas caídas.


Sendo assim elas vão a casa das pessoas, apesar de não terem nenhum
negócio a fazer nesse mundo material.”
Também Maharaj Yudhisthir diz no Srimad-Bhagavatam(1.13.10 )
bhavad-vidhā bhāgavatās
tīrtha-bhūtāḥ svayaṁ
vibho tīrthī-kurvanti
tīrthāni svāntaḥ-sthena
gadābhṛtā

“As pessoas santas de seu calibre são elas mesmas locais de


peregrinação. Por causa de sua pureza, eles são constantes
companhias do Senhor, e podem purificar os locais de peregrinação.”

Esses grandes devotos eram muito compassivos com todas as


entidades vivas, por isso fizeram um grande sacrifício de viajar e pregar de
forma muito expansiva. Para-dukha-duki, significa que eles sofrem com o
sofrimento dos demais. Não podiam estar tranquilos vendo todas as
pessoas desperdiçando suas vidas. O sadhu é mais elevado que os locais de
peregrinação. Os devotos puros se banham nos lugares sagrados para
purificarem os mesmos, uma vez que tantas pessoas se banhando ali,
deixam parte de seus pecados nos lagos e rios sagrados, os devotos puros
podem purificar esses locais.
Conta-se que Srila Prabhupada Bhaktisiddhanta Sarasvati Thakur
não gostava de se banhar nos locais sagrados porque preferia praticar
bhajana, escrever e pregar a consciência de Krishna. Desse
comportamento podemos deduzir como são poderosos os devotos do
Senhor, Krishna mesmo diz que não está em Vaikuntha, não está no
coração do yogui, mas está onde os devotos estão presentes.

Capítulo 19
ACEITANDO SANNYASA

No ano de 1946 a mãe de Om Visnupada Bhakti Pramode Puri


Gosvami Maharaj, Srimati Ramarnangi Devi, partiu deste mundo. Ele
sempre teve uma relação muito íntima e doce com sua mãe. Falava dela
com muita reverência e dizia que era muito amorosa, piedosa, inteligente e
devotada ao Senhor Supremo. Ela nem mesmo bebia água se não fosse
oferecida a Sri Gopinath. Desde criança ela o encorajou a seguir vida
espiritual. Ele sentiu grande sofrimento com sua partida. Um ano depois
que ela abandonou o corpo, ele decidiu aceitar a ordem de renúncia. De
uma carta a seu irmão Sri Nani Gopala, extraímos algumas partes:
“Meu querido Nani,
Eu não tenho recebido notícias suas faz muito tempo. Agora estou
indo de ônibus para Eta. Nós estamos escrevendo, dando conferencias e
cantando kirtan. Eu estou incapacitado de enviar dinheiro para o festival
anual de Sri Gopinath. Eu espero que ele aceite minhas lágrimas como
oferenda. Eu sou uma alma desafortunada. Atualmente nossa mãe não está
mais conosco. Quando estava presente neste mundo, eu não tive
oportunidade de lhe falar sobre minha vontade de aceitar sannyasa. Por
toda a sua vida, ela sofreu muito. Eu lhe causei grande sofrimento. Sempre
fui uma fonte de muita ansiedade para os meus pais. Eu tenho feito vocês
chorarem muito.
Hoje, Sri Gopinatha, sendo misericordioso comigo, inspirou-me a
aceitar sannyasa, então eu poderei adorar a Krishna sem nenhuma
ansiedade em Vrindavana. Seguindo o ditado tasmim tuste jagat-tustam
(“se o Senhor Supremo está satisfeito, todas as entidades vivas estão
satisfeitas”), esperando que por satisfazer a Krishna, eu irei satisfazer a
todo o mundo, eu estou determinado a aceitar a vestimenta de sannyasa.
Nenhum de vocês deveria se sentir tristes.
Supostamente, eu deveria pedir permissão para nossa mãe para
tomar sannyasa, mas ela não está aqui. Em seu lugar, está nossa tia. Eu
espero que ela perdoe minhas ofensas e me dê a sua permissão. O nosso
pai não está conosco também. Por favor, ofereça meus pranams (respeitos)
e peça a sua permissão para o meu benefício. A casa de meus tios são a
casa de meus primos, os quais são mais velhos do que eu. Eu estou
oferecendo minhas reverências a eles. Jethina (outra tia) me vê como seu
filho, e eu a considero como minha mãe. Eu espero que ela me dê suas
bênçãos. Estou mendigando pela aprovação de todos, quer eles sejam mais
velhos ou mais novos do que eu”.
Pouco tempo antes de Srila Prabhupada Bhaktisiddhanta Sarasvati
ter partido deste mundo, ele foi a Gaya para estabelecer um templo ali.
Nessa ocasião, Guru Maharaja foi com Srila Prabhupada, o qual
mencionou o seu desejo de dar sannyasa para ele. Mas por algum motivo,
não houve tempo suficiente e logo depois, Srila Prabhupada partiu deste
mundo. Srila Gurudeva relembrou isso e se lamentou pelo fato de não ter
tido a oportunidade de receber sannyasa de Prabhupada. Então, um dia,
Srila Prabhupada apareceu em seu sonho e deu-lhe o sannyasi-mantra, o
qual ele escreveu em seu diário. Em Agosto de 1947, Srila Guru Maharaja
aceitou a ordem de renúncia de seu irmão espiritual, Srila Bhakti Gourava
Vaikhanas Maharaj no templo de Sri Sri Goura-Gadadhara em Champahati
(Índia).
Srila Bhakti Gourava Vaikhanas Maharaj era um discípulo muito
querido de Srila Prabhupada Bhaktisiddhanta. Era conhecido por sua
erudição em sânscrito e por ser perito em adorar a Deidade e realizar
rituais védicos. Antes de unir a missão de Srila Prabhupada, ele foi o
sacerdote real e pandita (sábio) da corte de alguns reis na Índia. Srila
Bhakti Gourava Vaikhanas Maharaj gostava muito de Srila Pranavananda
Prabhu, que agora havia recebido o nome de “Srila Bhakti Pramode Puri
Gosvami”. Nesse caso Bhakti Promod significa “aquele que é alegre em
devoção”. Dois irmãos espirituais, Sri Ananda-lilamay-vigraha Prabhu e
Sri Sat-Prasagananda Prabhu (o qual depois recebeu sannyasa de Srila
Guru Maharaj e ficou conhecido mais tarde como Srila Nayanananda
Babaji) presenciaram a cerimônia de sannyas.
Aceitar a ordem de renúncia muitas vezes pode se tornar um
dilema que muitos sadhakas podem encontrar no transcurso da vida
espiritual. Uma decisão que pode deixar sequelas irreparáveis na vida do
praticante, caso ele não tenha maturidade suficiente para discernir a
diferença entre um mero formalismo e uma atitude sincera de querer
descobrir a sua verdadeira vocação de acordo com a sua natureza.
Independentemente da decisão que venha a tomar, o mais importante é
adesão a prática ao Santo Nome com muita fé e isto significa que a
posição formal não tem tanta importância assim para o estabelecimento de
uma conexão profunda com Krishna. No Caytania-caritamrta (Madhya-lila
8.128)encontramos:
kibā vipra, kibā nyāsī, śūdra kene naya
yei kṛṣṇa-tattva-vettā, sei 'guru' haya

“Quer uma pessoa seja um brahmana, um sannyasi ou um sudra,


independentemente do que ele seja, ele pode se tornar um mestre
espiritual, se ele conhece a ciência de Krishna.”

No mesmo Caytania-caritamrta (Madhya-lila,13.80) encontramos:


nāhaṁ vipro na ca nara-patir nāpi vaiśyo na śūdro
nāhaṁ varṇī na ca gṛha-patir no vanastho yatir vā
kintu prodyan-nikhila-paramānanda-
pūrnāmṛtābdher gopī-bhartuḥ pada-kamalayor dāsa-
dāsānudāsaḥ

“Eu não sou um brahmana, eu não sou um ksatriya, eu não sou um


vaisya ou um sudra. Não sou um brahmacari, um chefe de família, um
vanaprastha ou um sannyasi. Eu me identifico apenas como o servo do
servo do servo dos pés de lótus do Senhor Krsna, o mantenedor das
gopis. Ele é como um oceano de néctar, e ele é causa da bem-
aventurança transcendental. Ele é sempre auto refulgente.”
Ainda que as evidências das escrituras nos mostrem que a
perfeição última da vida não é encontrada em uma posição formal dentro
do sistema sócio religioso védico, aceitar a posição mais elevada facilita
muito o trabalho de pregação. Um sannyasi é considerado o cabeça do
Varnasrama (organização da sociedade considerando os planos materiais e
espirituais) e sua posição é altamente respeitável. Então, para estabelecer a
pregação, muitas vezes alguns devotos usaram da estratégia de aceitar a
ordem de renúncia.
O próprio Sri Caitanya Mahaprabhu teve que aceitar sannyasa para
poder cumprir seu propósito de espalhar o Harinama Sankirtana por toda
Índia. Sri Mahaprabhu sofreu muita oposição em um certo momento,
quando alguns brahmanas ortodoxos queriam retaliar de forma muito
agressiva o comportamento de Srimad Caitanya Mahaprabhu, que estava
absorto em seu bhava (emoção) cantando os nomes das gopis.
Os brahmanas diziam que cantar os nomes das gopis não estava
amparado pelas escrituras, e que não traziam nenhum benefício. Encontra-
se que cantar os nomes de Krishna ou Narayana beneficia as pessoas, mas
cantar os nomes das gopis seria uma perda de tempo. Nesse instante,
sobrelevado pela emoção, Sri Caitanya Mahaprabhu começou a correr
atrás deles com um pedaço de pau em sua mão, querendo golpeá-los. Logo
depois desse incidente, os brahmanas se reuniram e resolveram dar uma
surra em Mahaprabhu. o Senhor, sendo muito compassivo, pensou “eu sou
como um médico que tem o desejo de curar os pacientes, mas agora os
pacientes se voltaram contra o doutor, qual será o destino deles? Preciso
aceitar sannyasa para que eles possam me respeitar e aceitem o tratamento
que necessitam”.
Sri Caitanya Mahaprabhu aceitou sannyasi de um guru
impersonalista, porque naquele contexto, os sannyasis mayavadis
(impersonalistas) eram muito respeitados pela sociedade. E com o objetivo
de espalhar o Santo Nome, Sri Mahaprabhu aceitou sannyasa, apesar que
na linha de bhakti yoga, a sannyasa não seja algo muito proeminente - Ele
o fez mais por um motivo externo. Geralmente o caminho do jnana yoga
(do conhecimento) dava muita atenção a aceitação formal de sannyasa
Um sannyasi levava uma vida muito ascética, se dedicando muito
aos estudos das escrituras. No Caitanya Caritamrta, Srila Krsnadas Kaviraj
Gosvami conta como Sri Mahaprabhu depois que aceitou a ordem de
renúncia foi convidado para um encontro com sannyasis impersonalistas
que era liderado por um guru sannyasi mayavadi (impersonalista) muito
proeminente, chamado Prakasananda Sarasvati Ele repreendeu a Sri
Caitanya dizendo que era muito sentimentalista para ser um sannyasi,
porque ficava cantando o tempo todo e o dever de um sannyasi é estudar
os Vedas. Então nesse momento, Sri Mahaprabhu replicou: mūrkha tumi,
tomāra nāhika vedāntādhikāra‘kṛṣṇa-mantra’ japa sadā, — ei mantra-
sāra “Meu mestre espiritual me disse, 'você é um tolo. Não tem
qualificação para estudar a filosofia Vedanta, e sendo assim, você
sempre deve cantar o santo de Krishna. Isso é a essência de todos os
mantras ou hinos védicos”.
O Caytania-caritamrta (Madhya 22.106) diz:
śravaṇādi-kriyā--tāra 'svarūpa'-laka
ṣ ṇa
'taṭastha'-lakṣaṇe upajāya prema-dhana

“As atividades espirituais de ouvir, cantar, lembrar-se e assim por


diante são as características naturais do serviço devocional. A
característica marginal é despertar amor por Krishna”.

Logo em seguida, Sri Caitanya Mahaprabhu converteu o líder dos


sannyasis e todos seus discípulos também a culto do vaisnavismo,
demonstrando a superioridade do bhakti sobre o jnana. Todos os
participantes se renderam ao poder sobrenatural de Sri Caitanya
Mahaprabhu. Também podemos ver no caso de Srila Prabhupada Sarasvati
Thakur, que quando chegou o momento em que pensou que seria
adequado tomar sannyasi, o fez com uma foto do seu guru, porque não
havia um sannyasi guru que fosse capacitado para lhe dar a ordem de
renúncia.
Apesar de ser muito criticado por esse ato, ele havia se respaldado
nas escrituras e também no fato de que Ramanuja Acarya também havia
tomado sannyasi por intermédio de um retrato de seu mestre. Outro fato
que gerou muita controvérsia, foi que Prabhupada Bhaktisiddhanta
começou a utilizar roupas muito avermelhadas para os seus sannyasis, o
que se assemelhava muito com a vestimenta dos impersonalistas. Eles
eram muito respeitados, desde tempos remotos, como monges e
verdadeiros representantes do ascetismo mais tradicional.
Mesmo no que tange a parte administrativa existem encontros
interessantes entre o mayadismo e vaisnavismo, encabeçada por um
querido discípulo de Srila Prabhupada, Kunja Bihari Prabhu, que
anteriormente havia participado de um de um grupo impersonalista e pôde
aprender a respeito de organização e estratégias de pregação, que foram
110
utilizadas de certa maneira pela Gaudiya Math. A utilização da ordem de
renúncia como um aspecto mais direcionado a uma apresentação formal do
vaisnavismo para pregação, por exemplo.
Outra abordagem, está situada mais no âmbito de que a sannyasa é
um processo reformatório e todos necessitam passar por um processo que
seja capaz de promover uma certa purificação em nossa existência. A
palavra sannyasa quer dizer literalmente “um chute no mundo”, ou seja, o
aspirante a devoção decide de forma definitiva aceitar uma posição formal
que poderá lhe ajudar muito na determinação de servir a Krishna.
Um tridandi sannyasi é aquele que utiliza as palavras, o corpo e a
mente para o serviço a Krishna. Por isso o renunciante carrega consigo
uma danda de três varas de bambu. Prabhupada Bhaktisiddhanta Sarasvati
Thakur acrescentou uma peça a mais em cima das três varas da danda que
um sannyasi deve carregar representando a alma - Simbolizando que um
sannyasi também está dedicando a sua alma a causa suprema.
Uma pessoa que entra na vida de renúncia é denominado “maharaj” que
significa o rei dos sentidos ou “svami”, que indica aquele que é o senhor
dos sentidos, por isso ele deve ser muito estrito em seus hábitos,
entendendo que sempre estará em uma posição visada pelas pessoas, que
estarão muito ávidas para encontrar o menor defeito em seu
comportamento e desfazer tudo de bom que ele vem realizando.
Gostamos de dar exemplo de uma partida de futebol, em que o
goleiro realiza uma brilhante partida e “ fecha o gol” ou seja, não deixando
que o adversário faça gol, inclusive ele pode defender um penalte e chutes
“cara a cara”. Mas se ao final da parida, tomar um “frango”, ou seja, um
chute que seria muito fácil defender, ou mesmo se imaginamos que ele fez
um gol contra ao final da partida, todos irão crucificá-lo e esquecerão toda
a sua boa atuação na partida.
Da mesma forma, um sannyasi , ainda que execute muito serviço
ou mesmo que pratique por muito tempo, será lançado ao inferno, se as
pessoas encontrarem nele um desvio em sua conduta. Ele é como o “ boi
marcado”. Está em evidência o tempo todo. Todos estarão observando
suas ações, seus gestos, qualquer coisa que diga será levado em conta e
analisado profundamente. Por isso deve ser extremamente cuidadoso e
criterioso com suas palavras, com seu corpo e com sua mente. Srila Rupa
Gosvami dá a definição do que é um sannyasi em seu Upadesamrta (verso
1):
vāco vegaṁ manasaḥ krodha-vegaṁ
jihvā-vegam udaropastha-vegam
etān vegān yo viṣaheta dhīraḥ
sarvām apīmāṁ pṛthivīṁ sa
śiṣyāt

“Aquele que é capaz de tolerar as urgências da fala, mente, ira, língua,


estômago e genitais é conhecido como goswami e é qualificado para
aceitar discípulos por todo mundo”.
Afortunados são os sadhakas que conseguem aceitar a sannyasa
vaisnava e mantê-la de maneira impecável por toda a sua vida. Rejeitar
todos os compromissos com a sociedade e alcançar a plataforma em que a
vida é uma completa entrega para Krishna, sem nenhuma outra
preocupação, a não ser a de satisfazer ao Supremo.
Ser um sannyasi é ter serviço garantido pelo resto da existência,
sempre existirá um público ávido para escutar e aprender com o sannyasi.
Seu compromisso com a verdade é o seu emblema estampado em sua
existência e por nada neste mundo deixará para trás o seu ideal da
verdadeira renúncia. Ele não está disposto somente a renunciar ao mundo e
deixar todas as classes de prazeres para trás simplesmente por um
capricho. A sua visão é muito mais ampla do que possamos imaginar.
Antes de mais nada, o seu desejo de se sacrificar para Krishna, através de
uma prática sincera e exemplar deve estar por cima de qualquer proposta
indecente que maya venha lhe apresentar. A bandeira tridandi deve
tremular sempre erguida, mostrando para todos que o seu voto é para
eternidade e principalmente para o benefício de toda a humanidade.

Capítulo 20
OUTROS ACONTECIMENTOS

Logo depois que Srila Guru Maharaja aceitou sannyasi, seu irmão
espiritual Srila Bhakti Vilas Tirtha Maharaj convidou-o a se unir ao Math
do Yogapith (Sri Caitanya Math, onde nasceu Sriman Mahaprabhu,
Bengala/Índia) para que se encarregasse da adoração ali. Regularmente
também dava aulas. Nesse momento, Srila Tirtha Maharaj estava
publicando uma revista mensal e fez de Gurudeva o editor.
Srila Gurudeva tinha o costume de ir a Ganganandapur visitar as
Deidades de Sri Gopinatha e Sri Radha Vallabh, que estavam sendo
adoradas por sua família. E frenquentemente tinha costume de adorar as
Deidades pessoalmente. Podemos ver a extrema devoção que Srila
Gurudeva tinha pela adoração à Deidade, por estar sempre engajado em
escrever tópicos relacionados com Krishna e por dar Hari-katha. Estas
atividades foram por ele mantidas até o final de sua vida.
Mesmo quando tinha por volta dos cem anos, foi cogitado por ele
realizar uma cirurgia para tratar uma catarata que possuía, porque era seu
desejo veemente continuar escrevendo. Alguns devotos relatam que
quando Srila Gurudeva estava enfermo e com idade bastante avançada,
muitos vaisnavas se aproximaram de para tomar refúgio nele. Podia
acontecer que, em algum momento, quando algum devoto fazia uma
pergunta, ele começava a falar Hari-katha e não conseguia mais parar.
Essa era a sua disposição, se exaltava e não conseguia mais parar
de falar sobre Krishna. Sendo assim, os seus servos pessoais pediam para
os devotos saírem do quarto para que Gurudeva pudesse descansar. Sua
vida inteira foi uma profunda absorção em adorar e cantar, servir a causa
suprema com toda a sua energia e disponibilizando sua vida para esse
único propósito.
Sua incomparável humildade sempre o levou a colaborar com seus
irmãos espirituais em seus projetos de pregação. Ele estava expressando
em seu comportamento as principais atividades do serviço em devoção.
Inteiramente comprometido com um alto nível de prática, Gurudeva foi a
expressão viva do sadhana (disciplina pessoal) aliado a pregação. O
Caitanya Caritamrta ( Madhya-lila,22.128 ) nos ensina sobre as atividades
essenciais e o humor da pregação ( Adi-Lila,4.41) respectivamente :
sādhu-saṅga, nāma-kīrtana, bhāgavata-śravaṇa
Mathurā-vāsa, śrī-mūrtira śraddhāya sevana

“Uma pessoa deveria se associar com devotos, cantar os Santos Nomes


do Senhor, escutar Srimad-Bhagavatam, residir em Mathura (local
sagrado) e adorar a Deidade com fé e veneração.”

ei-mata bhakta-bhāva kari' aṅgīkāra


āpani ācari' bhakti karila pracāra

“Dessa forma, assumindo o sentimento de um devoto, Ele pregou o


serviço devocional enquanto praticava Ele mesmo.”

Uma vez, Srila Guru Maharaj teve que se submeter a uma


operação de hérnia em um hospital em Calcutá. Ele conta: “durante esse
tempo, Sri Krishna Sharanam prabhu cuidou muito bem de mim e meu
irmão espiritual Sripad Bhavat Maharaj também costumava me trazer
prasadam, eu nunca tive que comer nada do hospital.” Depois de sua
recuperação, ele novamente intensificou seus programas de pregação.
Através desse simples incidente, podemos perceber a conduta pessoal de
Srila Guru Maharaj como uma marca registrada que sempre o seguiu por
toda a sua vida, ou seja, ser estrito consigo mesmo. Este foi seu emblema
pessoal. Seguindo o exemplo de Sri Caitanya Mahaprabhu, Gurudeva
sabia que era impossível pregar o culto de bhakti yoga sem ter uma prática
exemplar.
Guru Maharaj decidiu que moraria em um local que estava
relacionado com os passatempos de Sriman Mahaprabhu dentro de Goura-
mandala (Bengala, estado da Índia). Com isso em mente, decidiu residir
em Ambika-kalna, no distrito de Burdwan. Sri Gouridas Pandit, associado
de Sri Mahaprabhu, viveu sempre em Kalna. Ele também foi um querido
associado de Sri Nityananda. Perto da entrada de sua residência, existe
uma bela árvore de tamarindo. Está dito no Bhakti-ratnakar que foi sob ela
que Sri Caitanya Mahaprabhu encontrou-se com Sri Gouridas Pandit.
Agora, dentro do templo está o remo usado pelo próprio Caitanya
Mahaprabu, e o Bhagavat Gita, o qual foi dado para Sri Gauridas Pandit
por Srimam Mahaprabhu.
Sri Caitanya e Nityananda Prabhu foram remando eles mesmos em
bote para o vilarejo de Harinadi para ver a Sri Gauridas Pandit. E quando
Sri Mahaprabhu entrou na casa de Sri Gauridas, com remo em sua mão,
disse a ele: “com isto você poderá cruzar o oceano da existência material.”
Pouco antes de tomar sannyasa, Sri Caitannya Mahaprabhu foi visitar a
Gouridas. Sri Mahaprabhu estava dançando em êxtase, enquanto Sri
Nityananda cantava “Hari Hari”. Enquanto Gouridas estava chorando
incessante e lastimosamente. Ele caiu aos pés do Senhor e disse: “Por
favor, não vá embora daqui. Se Você for embora, eu prometo que vou
morrer de sofrimento”.
Sri Caitanya Mahaprabhu replicou: “Não faça isso, você pode me
servir na forma da Deidade. Eu estarei presente nela também”. Mas
Gauridas continuava inconsolável. Novamente os dois irmãos tentaram
apaziguá-lo, mas parecia que seu coração ia romper em pedaços. Então Sri
Mahaprabhu disse: “tudo bem. Não se preocupe, nós estaremos sempre
com você em sua casa”. Assim, Sri Caitanya Mahaprabhu e Sri
Nityananda Prabhu se transformaram em Deidades e foram caminhando
em direção à Gauridas Pandit.
No próprio caderno de notas pessoais de Guru Maharaj continha
muitas anotações com referências purânicas relacionadas a Ambika-Kalna.
Existe um templo ali, onde uma Deidade de Ambika Devi havia sido
instalada por Maharaj Ambarish Maharaj (um sábio rei védico e grande
adorador), ela é chamada de Ambika, e por causa seus grandes siddhis
(poderes) ela é chamada Siddheswari. Esta Siddheswari é Yogamaya (A
energia interna do Senhor Sri Krishna) mesma.
Srila Guru Maharaj era muito apegado ao Goura Lila (passatempos
de Mahaprabhu), sempre procurava uma oportunidade para conectar seus
sentimentos transcendentais com os locais sagrados que estavam
relacionados com Caitannya Mahaprabhu. Quando Gurudeva tinha mais de
cem anos e estava vivendo em Vridavana dham (onde Krishna brincava),
desejou residir em Jagannatha Puri (cidade do Jagannath, o Senhor do
universo).
Um dos discípulos comentou que era uma ótima ideia, uma vez que
o clima de Jagannatha Puri era muito mais propício para a saúde de
Gurudeva, comparado com o de Vrindavana. Então Gurudeva respondeu
que gostaria de mudar para Jagannatha Puri não pela sua saúde e sim
porque poderia meditar melhor nos passatempos finais de Sri Mahaprabhu,
que justamente ocorreram em Jagannatha Puri, e que não estava muito
preocupado com a sua saúde em si, mas uma motivação interna que o
impulsionava para buscar o refúgio naquele local sagrado, onde tudo
estava relacionado com o Goura-lila.
O que também motivou a Srila Gurudeva a viver em Ambika
Kalna, além do fato de que ali era o local onde morava um eterno
associado de Sri Mahaprabhu, Sri Gauridas, o qual havia obrigado a Sri
Mahaprabhu a se manifestar na forma de Deidade, devido ao seu
sofrimento extremo por uma separação futura.
Outro passatempo bonito aconteceu durante a sagrada ocasião do
Festival de Jhulan-yatra (quando Radha e Krishna se balançam, iniciando
a primavera). Srila Gurudeva foi pregar em um programa fora do templo
de Yogapith. Enquanto isso, uma inexperiente pujari (quem adora as
Deidades) estava realizando o ritual de Jhulan-yatra com a Deidade de
Radha Vallabha, que pertencia a Srila Gurudeva e a havia trazido desde
Ganganapur (sua cidade natal) para o Yogapith já que seu local de
nascimento havia se tornado parte do estado do Paquistão depois da
independência da Índia. Em um dado momento, esta pujari deixou a
Deidade cair do balanço e o corpo da deidade foi danificado.Mas, nesse
ínterim, uma devota anciã foi residir no Yoga Pith. Ela era de uma família
aristocrática e muito experta no que se refere a parte ritualística da
adoração à Deidade. Quando Srila Guru Maharaj voltou do programa de
pregação e se inteirou do que havia acontecido com a Deidade por causa
da pujari inexperiente ele sentiu um grande sofrimento. No entanto, com
sua visão divina, aceitou como indicação que suas Deidades podiam ficar
sob os cuidados da senhora mais experiente recém chegada ao templo.
Nessa época, a partida de alguns dos seus irmãos da Sri Caitanya
Math, especialmente de Sri Madhava Maharaj, o fez sofrer bastante e seu
coração tornou-se inquieto e desejou partir para outro lugar. Podemos
notar os profundos sentimentos de rendição incondicional de Guru
Maharaj, que podia relacionar qualquer incidente de sua vida com a
Divindade. No Caytania-caritamrta (Madhya. 22.102) está escrito:
śaraṇa lañā kare kṛṣṇe ātma-samarpaṇa
kṛṣṇa tāre kare tat-kāle ātma-sama

“Quando um devoto completamente rendido à Krsna, oferece seu


próprio ser, nesse momento, Krishna aceita o devoto como sendo tão
bom quanto o Seu próprio ser.”
O devoto de Krishna e o próprio Krishna se tornam uma só
existência e não existe nada mais que possa ser percebido sem que haja um
profundo conhecimento dessa troca amorosa. O devoto puro está o tempo
todo absorto em sentir qualquer manifestação do Infinito e essa intuição o
guiará em todas as suas atividades e decisões na vida. Sendo assim, Srila
Gurudeva se guiava pelas indicações espirituais que podiam ser recebidas
através de sua íntima conexão com Deus.
Srila Guru Maharaj tinha muitos livros espirituais em sua coleção.
Ele os usava como recursos para seus artigos. Era muito cuidadoso com os
livros e os guardava como se fosse sua própria vida. Sendo assim, decidiu
enviar seus livros antes que saísse do templo de Yogapith, empacotou seus
livros em caixas e os mandou de barco para Kalna (sua futura nova
residência) com seu irmão espiritual, Srila Satyagovinda Prabhu. Os
residentes da Math estavam muito tristes ao vê-lo partir, mas entenderam a
necessidade de seu coração e não tentaram impor resistência.
Srila Gurudeva conseguiu um local na beira do Rio Ganges,
chamado Sadhunivas, tinha três quartos com um jardim cercado. Um dos
quartos foi convertido em cozinha, o maior se tornou o templo e o menor
foi seu quarto de dormir. Ele adorava a Deidade com grande entusiasmo e
continuava escrevendo artigos e os enviando para as revistas vaisnavas.
Gurudeva dava aulas para as pessoas locais e muitos vaisnavas chegavam
de longe para escutá-lo.
Uma vez, alguns meninos do Paquistão estavam vadiando perto da
sala do templo que dava para o quintal e cantavam canções de filmes
mundanos em um tom muito alto e isso era um distúrbio para o humor
introspectivo de Srila Gurudeva. Ele se aproximou e de forma muito
polida pediu: “se vocês quiserem se sentar e descansar, são bem-vindos,
mas por favor, não cantem esses sons do lado de fora do quarto da minha
Deidade, assim eu não posso cantar os mantras apropriadamente, enquanto
estou adorando minha Deidade.” Mas essas crianças eram arrogantes e não
respeitavam os sentimentos de Gurudeva. Então ele pediu ajuda para seu
irmão espiritual Sri Atul Sarkar, que ficou de ajudá-lo a conseguir um
local mais apropriado para a sua adoração.
Um dia, quando Srila Gurumaharaj estava sentado na sala do seu
templo, adorando suas Deidades, uma inundação chegou diretamente do
rio Ganges e à água subiu até o nível da porta do templo. Mas Srila
Gurudeva não comentou nada. O sacerdote local, chamado Arun Ray
entrou na sala do templo de Srila Gurudeva e disse “Maharaj você está
quase se afogando com essa enchente”. com grande cuidado, ele tentou
levar Gurudeva para um local seguro e seco. Mas Gurudeva ficou muito
ansioso para proteger as suas Deidades e seus livros. Referindo-se a esse
incidente, depois ele escreveu “eu precisei fazer muita força para mover
todas aquelas caixas de livros.”
As dificuldades aumentavam a cada dia, mas Srila Gurudeva podia
tolerar tudo. E de forma alguma desviava sua atenção da adoração à
Deidade. Não importando o que acontecesse, ele não se desviava nem um
milímetro da sua meta, que era a satisfação do Senhor Supremo. O Gita
(2.41)diz:
vyavasāyātmikā buddhir
ekeha kuru-nandana
bahu-śākhā hy anantāś
ca buddhayo
'vyavasāyinām
“Aqueles que estão no caminho são resolutos em seu propósito, e seu
objetivo é um só. Ó amado filho dos Kurus, a inteligência daqueles
que são irresolutos têm muitas ramificações”.

Podemos também notar a extrema tolerância que Srila Gurudeva


possuía, nada era capaz de perturbá-lo. O rio Ganges subiu muito de nível
e começou a invadir a sala to templo, e Srila Gurudeva permanecia sereno.
Parecia que ficaria submerso na enchente, mas não se moveria dali, não
deixaria de adorar a Deidade por nada nesse mundo, qualquer coisa
poderia acontecer, mas ele seguia firmemente estabelecido na adoração da
Deidade e também cuidando seus livros, que para ele representava seu
grande tesouro. O Srimad Bhagavatam (3.25.21) nos fala:
titikṣavaḥ kāruṇikāḥ
suhṛdaḥ sarva-dehinām
ajāta-śatravaḥ śāntāḥ
sādhavaḥ sādhu-bhūa ṣ ṇāḥ

“Os sintomas de um sadhu são que ele é tolerante, misericordioso e


amigo de todas as entidades vivas. Ele não possui inimigos, ele é
pacifico, se guia pelas escrituras e todas as suas características são
sublimes.”
Entretanto, devido a compaixão uma vez, Srila Guru Maharaj abriu
uma exceção. Quando estava adorando a Deidade, não gostava de ser
interrompido de forma nenhuma, mas essa vez ele escutou um bezerro
berrar. Como todas as pessoas estavam ocupadas em outros serviços,
ninguém se incomodou com o caso. Mas Gurudeva interrompeu a
cerimonia e foi ele mesmo desamarrar uma corda que estava incomodando
o bezerro.
Tolerância ao extremo, esse é o termômetro que mede o avanço
espiritual do devoto , se ele consegue desenvolver tolerância, isso é sinal
que sua prática está no caminho certo. Srila Prabhupada Bhaktisiddhanta
dizia que tínhamos que tolerar o intolerável, somente assim poderemos
estabelecer nossa prática de forma constante, por isso Sri Catainnya
Mahaprabhu diz em seu Sri Siksastaka (verso 3):
tṛṇād api sunīcena
taror api sahiṣṇunā
amāninā mānadena
kīrtanīyaḥ sadā
hariḥ

“Uma pessoa deveria cantar o santo nome do Senhor em um estado


humilde, se sentindo mais baixa que a palha da rua; ser mais tolerante
que uma árvore desprovida de todo o sentido de falso prestígio, estar
preparado para oferecer todos os respeitos aos demais. Em
semelhante estado mental, uma pessoa deveria cantar o Santo Nome
do Senhor constantemente.”

Poderíamos dizer que esse verso é a essência de nossa filosofia:


sem conseguir estabelecer esses princípios de forma bem sólida em nossas
vidas, nosso canto de japa, mantras, trabalho de pregação, etc., não
surtirão muito efeito. Esse verso deveria ser colocado em nosso pescoço e
deveríamos usá-lo como uma guirlanda, para que possa ornamentar nossa
vida devocional.
Humildade, tolerância, oferecer respeitos aos outros e não esperar
respeitos de alguém são as características marginais que um devoto
desenvolve devido as suas práticas sinceras. Srila Guru Maharaj tinha
todas essas características bem sobressalentes em sua pessoa e seus únicos
apegos eram o canto dos Santos Nomes, a adoração à Deidade, seus livros,
os quais eram uma ferramenta valiosa para escrever seus artigos
transcendentais e constante Hari-katha que fluía dos seus lábios de lótus.
A impressão que temos é que o mundo poderia se acabar, mas Srila
Gurudeva não se importava muito com isso, se pudesse ficar absorto em
Nama Bhajana (canto introspectivo do Santo Nome) e sankirtana yajna
(sacrifício de cantar o Santo Nome e pregá-lo). Se alguém o trancasse em
um quarto com seus livros e sua japa, isso era suficiente para lhe propiciar
satisfação dentro do seu ser.
Com a ajuda de pessoas locais, Srila Gurudeva mudou-se para uma
casa, em um patio abandoando perto ao templo de Sri Gouridas Pandita, o
qual foi chamado “Mahaprabhu bari” (a casa de Mahaprabhu). Srila
Gurudeva esteve ali por poucos anos.
Ele viveu ali bem feliz por algum tempo, na realidade ele chamou
esse local de “Sri Gopinath Gaudiya Math” (futuramente sua missão
receberia esse nome). Ele escreveu depois “no mesmo dia em que eu
recebi a Deidade de Sri Gopinath, meu coração tornou-se ansioso por um
local que poderia ser nomeado com o nome de meu Senhor Gopinath.” Ele
continuou sua adoração à Deidade, pregando e escrevendo. Nos dias de
festivais, Srila Guru Maharaj imprimia convites para diferentes Gaudiya
Maths e para outros lugares e muitas pessoas viam de longe e de perto para
participarem desses festivais.
Um dia, o irmão espiritual de Gurudeva, Srila Atul Sankar veio
visitá-lo e disse-lhe: “o famoso templo de Ananta-Vasudeva de Kalna,
pertencente a família real de Burdwan, o qual é muito antigo, mas a
adoração à Deidade não está sendo praticada de forma apropriada e os
membros da família real gostariam de colocar um santo vaisnava a cargo
da adoração à Deidade, vamos visitar o templo”.
Quando os dois chegaram ali e viram o estado deplorável que
estava o templo ficaram muito chocados, então, Srila Gurudeva disse:
“Com muita dificuldade, eu consigo algum dinheiro para minha
manutenção pessoal, sendo assim, como eu poderia cuidar desse templo?”
Poucos dias depois, Srila Atul Sankar veio ver a Srila Gurudeva
novamente. Nesse momento, ele disse que havia sonhado com Srila
Prabhupada Bhaktisiddhanta, o qual lhe havia dito que o templo de
Ananta-Vasudeva deveria ser dado a ele. Srila Atul Sankar escreveu uma
carta a Srila Bon Maharaj para que se comunicasse com a família real de
Burdwan, recomendando que Srila Gurudeva fosse o sacerdote
encarregado do templo de Ananta-Vasudeva. Previamente quando Srila
Bon Maharaj foi pregar na Inglaterra, ele desenvolveu uma grande
amizade com o rei de Burdwan, Maharaj Vijaychad, o qual foi apresentado
para Srila Prabhupada Bhaktisiddhanta.
A família real ficou muito contente de receber a carta de Srila Bon
Maharaj. Eles alegremente concordaram em dar o templo a Srila Guru
Maharaj , o qual ficou conhecido por todos como um grande santo
vaisnava.
No dia auspicioso de Radhastami (o aniversário de Sri Radharani, a
mais querida de Krishna), as Deidades foram transladadas em um
procissão, na qual Srila Gurudeva ia liderando junto com suas Deidades e
muitas pessoas que se dirigiam para o templo de Srila Ananta-Vasudeva.
Ele instalou as Deidades ali com grande felicidade e começou a adorá-las
com muito cuidado e devoção.
Um dia Srila Guru Maharaj acidentalmente encontrou uma
tapeçaria descrevendo a Deidade de Sri Ananta-Vasudeva. Acima, o nome
da Deidade estava escrito como Sri-Sri Goloknath. Vendo isso, Srila
Gurudeva ficou muito surpreso. No documento legal que ele tinha visto, a

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Deidade chamava-se “Sri-Sri Ananta-Vasudeva, também conhecida como
Vaikunthanath.” Não havia menção de Goloknath ali. E Srila Gurudeva
alegrou-se muito com esse nome pois lhe recordava o famoso verso do Sri
Brahma-samhita (5.37):
ānanda-cinmaya-rasa-pratibhāvitābhis
tābhir ya eva nija-rūpatayā kalābhiḥ
goloka eva nivasaty akhilātma-bhūto
govindam ādi-puruṣaṁ tam ahaṁ
bhajāmi

“Eu adoro a Govinda, o Senhor Primordial, o qual é Syamasundra,


Krishna mesmo com atributos inumeráveis e inconcebíveis, o devoto
puro O vê em seu coração com o olho da devoção untado com o
unguento do amor”.

Então, Srila Guru Maharaj perguntou para a Deidade: “Meu


querido Senhor, seu nome é Goloknath?” Depois, quando ele estava
manuseando a tapeçaria para guardá-la, repentinamente, uma senhora
muito idosa, que tinha o cabelo completamente branco, apareceu ali e
começou a oferecer reverências para a Deidade repetidamente dizendo
“Jay Baba Goloknath!”
Srila Guru Maharaj estava maravilhado ao escutar isso. Ele nunca
tinha visto esta senhora antes e nem veria ela novamente. Srila Gurudeva
começou a investigar esse assunto, mas jamais tinha escutado de nenhum
templo de Goloknath, nem em Kalna ou em qualquer outro local em
Burdwan. Srila Guru Maharaj teve a realização que Yoga Maya, a energia
ilusória do Senhor, a qual Ele usava para incrementar Seus passatempos,
tendo vindo ela mesmo (Yoga Maya) na forma de uma velha senhora
revelando a verdadeira identidade do Senhor. Quando Srila Gurudeva
contou para os seus irmãos espirituais, todos eles foram da mesma opinião.
A conexão com a Deidade foi sempre uma marca registrada na vida
de Srila Guru Maharaj e mais uma vez vemos que através de sua devoção
imaculada, o próprio Senhor vinha se manifestar na forma de sua energia
Yoga Maya, que assumiu o aspecto de uma senhora para revelar uma
dúvida em relação ao nome específico da Deidade. Sua rendição era tão
intensa que podia atrair a atenção do Senhor Supremo para si sem que ele
mesmo percebesse o fato. Não podia explicar o que estava acontecendo,
mas ao mesmo tempo sentia que uma onda da transcendência havia
capturado toda sua existência. Não podia agir de forma separada e
independente do Centro Absoluto. Sua adesão ao serviço à Deidade era tão
intensa que em nenhum momento podia deixar de meditar nela, de como
satisfazê-la em todos sentidos.
Entregar tudo para satisfação do Supremo constitui o nosso
purusartha (meta ultima), não devemos nos contentar com nada menos do
que isso. E a rendição é a estrada que temos que seguir se queremos
estabelecer o serviço à Krishna de forma definitiva em nossas vidas. No
Gita encontramos sarva dharma parityajya mam ekam saranam vraja
(“abandona todas as variedades de religião e simlesmente se renda à
Mim”). Nesse momento Krishna está chegando a conclusão da conversa
com Arjuna, e encontramos a essência de todas as demais instruções. Todo
nosso conhecimento e toda nossa prática nos leva para este zênite. Por isso
Guru Maharaj podia ter um relacionamento tão íntimo com suas Deidades,
ele condensava muita devoção aliada a prática, impregnado com o
conhecimento, que o levava a se absorver completamente em um
sentimento de unidade com a Deidade, podendo sentir e perceber todas a
nuances que envolviam o serviço à Deidade. O Padma Purana (3.5) nos
ensina:
Tadadi-panca-samskari navejakarma
karakahartha-Panchakavid vipro mahabhagavath
smrtah

“A pessoa na qual a espiritualidade se desenvolveu através da


maestria nos cinco processos purificatórios (panca-samskaras), que se
absorveu nas nove atividades devocionais (adoração da Deidade,
mantra, yoga, yajna, orações, nama-sankirtana, serviço, e adoração
tanto aos vaisnavas quanto ao Senhor) e os que entendem o significado
esotérico destas diferentes atividades, são conhecidos como maha-
bhagavata, os grandes devotos de Visnu e os mais elevados vaisnavas”.

Somente um devoto desse calibre pode ter uma relação tão íntima
com a Deidade, ao ponto da mesma se manifestar em sua vida, trocando
sentimentos internos relacionados com a devoção. Sentindo a presença
divina em todas as partes e percebendo que a vida deve ser uma completa
entrega à vontade do Supremo, Gurudeva podia sentir nos mínimos
detalhes a transcendência tomando conta de sua relação com a Sri Murti
(Deidade), sabendo que cada ação envolve uma troca profunda de
sentimentos sobrecarregados de muita emoção.
Aos olhos das pessoas comuns, a Deidade é estática, não pode
realizar nenhum movimento, mas para as grandes almas, que não
conseguem deixar de sentir a presença do Infinito em todas as partes, o
que dirá na própria Murti - para eles as Deidades estão comendo mesmo,
Ela tem que ir dormir , ou seja, a Deidade está viva, não conseguem
perceber nada diferente disso.
Podemos ver vários exemplos disso em diversas escrituras. Como
foi o caso de Raghunandana Thakura. Ele nasceu em uma família kaviraja,
uma linhagem de doutores ayurvédicos, e foi tio de Mukunda, aquele que
até os reis o chamavam para se tratarem com ele. Raghunandana
permaneceu solteiro por toda a sua vida. Sua figura era
extraordinariamente bela e era muito aficionado à dança. A família de
Mukunda Thakura adorava uma Deidade ancestral em sua casa. Uma vez,
quando Raghunandana era jovem, recentemente tinha recebido o cordão
sagrado e havia ganhado permissão para adorar a Deidade, seu pai lhe
pediu: “Tenho que sair e não regressarei a tempo da cerimonia. Por favor
adora a Deidade e lhe dê algo de comer”. Sua expressão foi: “por favor,
trate de alimentar a Deidade”.
Quando o pai se foi, a mãe de Raghunandana cozinhou muitas
preparações, as levou ao templo e pediu que Raghunandana oferecesse
para a Deidade. Geralmente as portas se mantém fechadas durante a
adoração, e assim Raghunandana ofereceu o alimento e orou ao Senhor:
“por favor, coma estas preparações que eu estou Lhe oferecendo”. Porém a
Sri Murti não respondeu nada e nem veio comer. Raghunandana começou
a chorar: “meu pai vai me repreender! Ele me pediu que a alimentasse e
Você não está comendo. Serei castigado. Você tem que comer esta
comida!”
O rapaz sincero começou a gritar de tal maneira que Krishna teve
que comer. Raghunandana ficou muito satisfeito e saiu do quarto da
Deidade. Sua mãe veio buscar a bandeja e exclamou: “o que aconteceu?
Todos os pratos estão vazios!” Você me pediu que alimentasse a Deidade
e ela comeu” respondeu Raghunandana. “Olha aqui rapaz! Foi você que
comeu. A Deidade não come. Nós oferecemos, tudo permanece e depois
nós tomamos prasadam (alimento espiritualizado). Seu menino travesso,
você se tornou um ladrão, você comeu tudo!” disse sua mãe brava.
- Não, não, eu não comi nada, a Deidade comeu tudo – Disse o filho.
-Isto é impossível! Não seja tolo! – Retrucou a mãe.
- Não, estou dizendo a verdade - E começou a chorar Raghunandana.
- Está bem, deixe que se pai venha e eu lhe contarei tudo.

Mukunda voltou para a casa e a mãe de Raghunandana se queixou:


Seu filho já está crescido, mas se tornou um ladrão. Ele disse que a
Deidade que comeu a oferenda. Raghunandana também suplicou a seu pai
: “é verdade, a Deidade comeu a oferenda. Ela não queria comer no início,
porém comecei a chorar e logo depois ela começou a comer”.
- Isso é verdade? Perguntou o pai
- Sim, é verdade! Não estou mentindo – afirmou a criança.
- Você poderia me mostrar? Comentou Mukunda.
- Vou tentar – Afirmou Raghunandana.
Desta maneira, foi lhe dada uma nova oportunidade de realizar a
adoração e desde um local escondido, seu pai pode ver que a Deidade
realmente havia comido a oferenda.
Passatempos como esse mostram a pureza e fé do adorador em
relação ao seu objeto de adoração e somente a esses kevala bhaktas
(devotos exclusivos) a Deidade pode se relacionar de forma tão íntima, ao
ponto de literalmente vir e comer as oferendas dos seus adoradores. De
forma similar, no caso de Om Visnupada Bhakti Promode Puri Maharaj, a
Deidade se manifestou na forma de Yoga Maya para responder a uma
dúvida do seu adorador exclusivo.

Capítulo 18
INTERCÂMBIOS AMOROSOS
Srila Guru Maharaj continuou o seu excelente serviço de adorar a
Deidade, dando aulas e pregando, realizando vaisnava-seva, escrevendo
artigos e vivendo de acordo com as suas possibilidades, que eram um
pouco escassas. Muitas pessoas vinham de Kalna e de outras localidades
mais distantes para escutar suas leituras. De acordo com seus meios,
costumava celebrar todos os festivais vaisnavas de forma meticulosa.
Apesar da falta de espaço e dinheiro, pela vontade do Supremo, muitas
pessoas que o amavam, e tinham grande reverência por ele, de forma
espontânea traziam todos os tipos de provisões para ajudar a celebrar esses
festivais.
Em outras ocasiões, seus irmãos espirituais e muitos outros
vaisnavas costumavam visitá-lo. E todos ficavam muito satisfeitos com
seu Hari-katha, Kirtan, e distribuição de prasadam. Também costumavam
visitá-lo quando residia em Kalna: Srila Bhakti Raksak Sridhara Dev
Gosvami Maharaj, Srila Bhakti Dayita Madhava Maharaj, Srila Yayavar
Maharaj, Srila Kesava Maharaj, Srila Krsnadas Babaji Maharaj, Srila Bon
Maharaj, Srila Bhakti Vijnan Bharati Maharaj e Srila Bhakti Ballabh
Tirtha Maharaj.
Enquanto residia em Kalna, Srila Guru Maharaj tinha o costume
de visitar outras Gaudiya Mathas. Ele também pregava em outros lugares
da Índia, como Madras. Entre todos os seus irmãos espirituais, Gurudeva
especificamente mencionava a relação que tinha com Srila Bhakti Raksak
Sridhara Dev Gosvami Maharaj, Srila Bhakti Dayita Madhava Maharaj e
Srila Krsnadas Babaji Maharaj. Em relação a sua afeição por Gurudeva,
Srila Sridhara Maharaj costumava a dizer: “Maharaj, espero que você
nunca saia de Kalna (já que o templo de Srila B. R. Sridhar Maharaj fica
em Nabadwip, não muito distante de Kalna, isso significava que poderiam
se ver com freqüência)”.
Guru Maharaj também visitava a Srila Sridhara Maharaj
frenquentemente em sua Matha em Navadwip. Srila Sridhara Maharaj
ficava muito feliz de ver a Srila Gurudeva em seu Math. Eles podiam levar
muitas horas discutindo Hari-katha. Srila Sridhara Maharaj costumava
dizer em relação a Gurudeva: “eu era júnior na Gaudiya Math porque eu
me uni muito depois.”
Mas Gurudeva sempre dizia: “mas Maharaj, você era sênior para
mim em todos os outros aspectos.” Todos os discípulos de Srila Sridhara
Maharaj eram também muito respeitosos com Srila Gurudeva. E
frequentemente dizia a eles: “Baba (uma forma carinhosa e respeitosa de
se dirigir aos demais na Índia), o que eu posso dizer? Vocês possuem um
grande Guru, eu não consigo imaginar sua boa fortuna!”
Relembrando a respeito de sua associação com Srila Sridhara
Maharaj, ele disse muitas vezes: “Eu sinto grande felicidade e conforto
estando na companhia de Srila Sridhara Maharaj. Quando eu escutei suas
conclusões e realizações a respeito das escrituras, sentia como se estivesse
com Srila Prabhupada Bhaktisiddhanta.”
Seu Guru glorificou seu conhecimento e realização das escrituras, e
Srila Bhaktisiddhanta sempre se sentiu inspirado na companhia de Srila
Sridhara Maharaj. Depois de sua partida (de Srila Sridhar Maharaj, em
1988), nunca passou nenhum dia em que Srila Gurudeva não deixasse de
glorificá-lo e lamentar a sua ausência desse planeta. Ele falava: “Eu sinto
sua ausência em todos os momentos e nunca vai existir alguém como Srila
Sridhara Maharaj.”
Às vezes Gurudeva falava para alguns discípulos de Srila Sridhara
Maharaj “Eu tenho essa pergunta na mente, mas agora não posso mais
perguntar para Srila Sridhara Maharaj, se ele aparecer para você em um
sonho, por favor faça-lhe a pergunta e pode ser que ele a responda”. E
acrescentava: “Eu não tenho devoção e boas qualidades. Mas Srila
Prabhupada Bhaktisiddhanta me deu sua misericórdia. E aqueles que estão
perto dele, como Srila Sridhara Maharaj, Srila Madhava Maharaj, e outros
tem muita afeição por mim, eles conhecem tudo”.
Srila Krsnadas Babaji Maharaj sempre se associava intimamente
com Srila Guru Maharaj. Quando não estavam juntos, frequentemente
trocavam correspondência. Algumas vezes Gurudeva enviava alguma
quantia de dinheiro pelo correio para Srila Krsnadas Babaji Maharaj junto
com as cartas. Srila Krisnadas Babaji Maharaj vivia como um mendicante
geralmente em Vrindavana. Era conhecido por sua simplicidade e o canto
incessante do Santo Nome.
Uma vez quando foi visitar a Gurudeva em Kalna, havia apenas um
mosquiteiro e os dois tiveram que dormir sob a mesma tela. Guru Maharaj
se recorda que Srila Krsnadas Babaji Maharaj cantava o Harinama a noite
inteira. E acrescentou que tinha um apego muito profundo por Nama-
bhajana e uma incrível memória. Podia recitar de memória muitos versos
e canções também. Ele apreciava muito todos os versos escritos por Srila
Sridhara Maharaj, especialmente muitos versos do Sri-Sri Premadhama
Deva Stotram que glorifica a Sri Caitanya.
Babaji Maharaj tinha uma bela e excelente pronúncia do sânscrito,
tinha também uma voz muito melodiosa e também era um experto tocador
de mrdanga (tambor vaisnava). Sua conduta foi de um devoto puro e seu
caráter sem nenhuma mácula. Não se encontra nenhum traço de ira. Se
alguém, por algum motivo, ficava zangado com ele, então, apenas sorria e
dizia “Hare Krsna”! e não tentava argumentar. Quando alguém se
aproximava dele para pedir iniciação, ele somente sorria e dizia: “Hare
Krishna”. Babaji Maharaj nunca quis ter um templo próprio, preferia
visitar as Mathas de seus irmãos espirituais, participando dos festivais,
cantando e pregando as glórias do Santo Nome através da distribuição de
pequenos livros e quando alguns cavalheiros lhe davam alguma doação
por isso, ele não mantinha nada para si mesmo, mas empregava os
fundos
arrecadados para o serviço à Krishna e Seus devotos.
Costumava vestir-se com um pequeno pano que ficava um pouco
abaixo dos seus joelhos. Quase não tinha qualquer posse, cama ou roupas e
no meio do inverno, não buscava meios de se abrigar, e mesmo assim,
permanecia sempre feliz e satisfeito. Ele foi a corporificação do verso três
do Siksastakam escrito por Mahaprabhu:
tṛṇād api sunīcena
taror api sahiṣṇunā
amāninā mānadena
kīrtanīyaḥ sadā
hariḥ

"Aquele que é mais humilde do que uma folha de grama, mais


paciente do que uma árvore, que honra devidamente os outros sem
desejar tal honra para si, é qualificado para cantar sempre o santo
nome de Krishna”

Uma vez, quando Babaji Maharaj ficou muito doente, um doutor


foi chamado para atendê-lo. E ao examiná-lo com o estetoscópio no
coração, o doutor começou a escutar “Hare Krsna Hare Krsna, Krsna
Krsna, Hare Hare, Hare Rama Hare Rama, Rama Rama, Hare Hare.” Ele
ficou muito surpreso com tudo isso, porque Babaji Maharaj estava com os
lábios fechados e ninguém perto estava cantando o mantra, mas o doutor
ouviu o mantra do coração de Babaji Maharaj! Uma vez, contou-nos Srila
Bhakti Bibudha Bodhaya Maharaj, viram a Srila Krishnadasa Babaji
Maharaj dormindo, e seus lábios estavam se movendo e cantando o Santo
Nome durante seu sono profundo.
Outro associado muito próximo a Srila Guru Maharaj foi Srila
Bhakti Dayita Madhava Maharaj. Quando Gurudeva foi viver no Yogapith,
Srila Bhakti Dayita Madhav Maharaj também estava por ali havia um
tempo e conseguia atrair muitas pessoas para o templo através de sua
extraordinária habilidade na pregação. Ele tinha recebido muitas
solicitações para abrir um novo templo em Calcutá. Com isso, deixou o
Yogapith antes de Srila Gurudeva para ir a Calcutá e abrir um Math ali.
Antes, Srila Madhava Maharaja tinha ido ao Nepal pregar e quando
se estabeleceu em Calcutá, foi ali que conheceu seu amado discípulo, Sri
Krsnavallabha Brahmacary que depois se tornaria mais conhecido como
Srila Bhakti Ballabh Tirtha Maharaj, o qual seria o seu sucessor Acarya da
missão criada por ele, chama Sri Caitanya Gaudiya Math.
Em Calcutá a pregação de Srila Madhava Maharaj se tornou muito
poderosa. Srila Gurudeva mencionou várias vezes que “Srila Madhava
Maharaj era um poderoso orador. Muitas pessoas educadas eram atraídas
por suas palestras. Possuía inumeráveis qualidades transcendentais como a
tolerância e paciência. Ele podia derrotar qualquer um em argumentação
com sua afiada lógica e apresentação do conceito vaisnava. Sua natureza
era muito doce, afetiva e indulgente, conquistava o coração de todos que
entravam em contato com ele”.
Guru Maharaj muitas vezes era convidado por Srila Madhva
Maharaj para dar palestras em seu Math. Como esse templo estava
florescendo de forma exponencial, ele resolveu fundar Maths em Mayapur,
Vrindavana e Puri (locais sagrados dos passatempos de Mahaprabhu,
Krishna e Jagannath respectivamente). Srila Madhva Maharaj começou a
pregar em diferentes partes da Índia e estabelecer templos em diferentes
lugares. Quando tinha que viajar, convidava a Srila Gurudeva para dar
palestras no Math, então, Srila Gurudeva saia de Kalna e ia a Calcutá para
Sree Caitanya Gaudiya Math.
Quando Srila Madhava Maharaja fundou uma revista chamada Sri
Caitanya vani, Srila Guru Maharaj sempre era convidado a enviar artigos
sobre diferentes tópicos. Seus belos e eruditos escritos foram uma grande
atração para a revista. Vários Gaudiya-vaisnavas sentiam grande
satisfação por ler semelhantes artigos e muitas cartas de congratulações
foram enviadas para o autor.
Muitas vezes Guru Maharaj acompanhou a Srila Madhava Maharaj
em suas viagens de pregação por toda a Índia. Em 1961, um grupo de 90
devotos se reuniu sob a liderança de Srila Madhava Maharaj para
peregrinar pelos locais sagrados do norte e sul da Índia. Viajaram de trens,
ônibus , carros, charretes, etc., ao estrondoso som de kirtana e Hari-katha.
Guru Maharaj sempre carregava consigo suas Deidades, e mesmo nos
trens e ônibus, ele as adorava com cuidado, como se estivem no Math. Isso
inspirava grande admiração e reverência nos espectadores. Em qualquer
lugar que fosse, Srila Gurudeva tomava notas a respeito da biografia e
história dos locais de peregrinação e dos detalhes da adoração da Deidade.
Depois de retornar, Srila Gurudeva escreveu vários artigos dando
entusiasmadas e detalhadas descrições dessas viagens. Todos os outros
vaisnavas que não tiveram a oportunidade de viajar, tinham grande prazer
em ler aqueles artigos. Eles se tronaram famosos como “Aryarvata-
parikrama” e “Daksinatya-parikrama” (descrevendo as peregrinações ao
Norte e Sul da Índia respectivamente). Foi a primeira vez que artigos tão
bem elaborados, tratando de forma tão detalhada e erudita eram escritos a
respeito dos locais de peregrinação na Índia em uma revista Gaudiya-
Vaisnava.
Podemos notar a intensidade que Srila Gurudeva colocava em sua
vida espiritual, quando peregrinava pelo dham (local) sagrado não estava
ali para fazer turismo, ao contrário estava muito concentrado em se
absorver por completo no serviço. Anotava todas as informações dos
locais sagrados para depois realizar o serviço de escrever artigos bem
interessantes e eruditos que tinham o objetivo de informar todos os
aspectos mais essenciais a respeito daquelas peregrinações.
Estar no dham sagrado é algo que deve estar conectado ao serviço,
senão perde-se a essência da peregrinação. Com nossa consciência
deveríamos nos absorver no espírito de serviço. Uma pessoa poderia estar
ali e somente realizar um exercício com olhos, poderia observar tudo
somente com os olhos materiais, mas isso não seria algo tão proveitoso
para seu avanço espiritual. Mas como Srila Gurudeva estava absorto em
cumprir o desejo de Srila Prabhupada Sarasvati Thakur que lhe foi dado
em forma de serviço para nunca parar de escrever, era bem apropriado
notar a sua absorção em tomar notas dos detalhes mais importantes para
depois escrever. A respeito dessa consagração que Srila Gurudeva mostrou
a seu Gurudeva, Srila Bhaktisiddhanta Sarasvati Goswami Thakur, pode
ser expressada pelo Srimad Bhagavatam ( 10.80.74) :
Naham ijya-
prajatibhyam
tapasopasamena va
tusyeyam sarva-
bhutatma guru-
susrusaya yatha

“Eu, a alma de todos os seres, não fico tão satisfeito pela execução dos
deveres prescritos dos quatro asramas (ou seja, sacrifícios, serviço à
família, austeridades e renúncia), como fico com o serviço ao Guru”.

Não somos capazes de entender a potência que existe na conexão


existente entre Guru e discípulo, essa ligação tem um poder milagroso de
transformar nossas vidas, de nos dar uma nova visão, que está nos
impulsionando rumo a nova consciência.
Quando Srila Guru Maharaj ia instalar alguma Deidade durante
essa viagem de peregrinação, muitos artigos auspiciosos eram trazidos de
vários locais de peregrinação, como diferentes tipos de argilas e frutas. Ele
sempre tinha suas próprias anotações a mão acerca de todos os rituais da
adoração e mantras citados das diferentes escrituras.
Outro aspecto muito marcante nessa viagem aos locais sagrados,
foi o fato de que Gurudeva sempre estava cuidando das suas Deidades,
mesmo nos percursos de trem ou ônibus. Sua dedicação era a mesma que
dispensava no Math. O conceito de que a Deidade é como se fosse uma
pessoa, ou seja, deve comer, dormir, receber seus cuidados necessários
sem nenhuma discriminação a respeito do local em que a mesma se
encontra era vivo dentro do coração de Gurudeva e em seu agir. O fato é
que o serviço a Deidade não pode ser detido, sempre temos que nos
organizar para que a atenção à Deidade seja contínua e com esmero.
Assim, Gurudeva causou muita admiração em todos que estavam ali vendo
sua dedicação, fé e devoção no serviço à Deidade.
Uma vez, Srila Guru Maharaj fez uma longa viagem de ônibus,
quis se sentar no fundo, e quando o ônibus saiu, pegou as Deidades e
começou a adorá-las como se estivesse em seu próprio quarto. Cantou
todos os mantras completamente absorto em sua puja (adoração)
esquecendo-se completamente de seu meio ambiente. Algumas senhoras,
que estavam sentadas perto, observavam tudo com grande reverência, mas
ele nem percebeu a presença delas. Quando o ônibus chegou ao seu
destino, Guru Maharaj percebeu a presença dessas senhoras e perguntou a
seu acompanhante “Elas estavam sentadas perto de nós?”

As escrituras nos aconselham a sempre lembrar de Krishna e


nunca esquecê-Lo, poderíamos dizer que a essência de todas as escrituras
repousam nesses dois preceitos. O Caytania-caritamrta (Madhya-lila,
22.113) ressalta:
smartavyaḥ satataṁ
viṣṇur vismartavyo na
jātucit sarve vidhi-
niṣedhāḥ syur etayor eva
kiṅkarāḥ

“Krishna é a origem do Senhor Visnu. Ele deveria sempre ser


relembrado e nunca esquecido em momento algum. Todas as regras e
proibições mencionados nos sastras deveriam ser servas desses dois
princípios.”
130
Através de arcana (adoração a Deidade), o Senhor Supremo se
manifesta neste mundo material para nos ajudar a mantermos uma conexão
com Ele. Adorando à Deidade criamos uma possibilidade de meditar
sempre em Krishna. O Srimad Bhagavatam (11.14.27) também estabelece:
viṣayān dhyāyataś
cittaṁ viṣayeṣu
viṣajjate
mām anusmarataś cittaṁ
mayy eva pravilīyate

“Aquele que medita nos objetos dos sentidos torna-se isso. Aquele que
lembra-se de Mim, entretanto, torna-se absorto em Mim”.

Se de certa maneira somos levados a contemplar os objetos dos


sentidos e partir daí geramos um apego à ele da mesma forma somos
impulsionados a se engajar no serviço à Deidade e pensar sempre em
como servi-la através da adoração.
Sripad Hrsikes Maharaj da Sri Chaitanya Gaudiya Math relembra a
Guru Maharaj sentando em um piso muito limpo do seu quarto e adorando
suas pequenas Deidades, durante um tempo prolongado cada manhã, com
grande concentração e todo tipo de parafernália. Seu humor na devoção era
tão atrativo que muitos devotos vendo isso, não podiam deixar de olhar sua
absorção completa na adoração à Deidade. Srila Gurudeva fazia esse tipo
puja inclusive aos noventa e seis anos.
Ensinou um padrão muito alto aos seus discípulos em relação à
adoração da Deidade. No que diz respeito a isso, está dito que de acordo as
escrituras, se existir alguma negligência em relação à Deidade, as
consequências de grandes ofensas se tornarão inevitáveis. Aqueles que
instalaram as Deidades, aqueles responsáveis da adoração da Deidade e
inclusive aqueles que moram no mesmo bairro ou cidade, ou aqueles que
governam o local se tornam implicados na mesma ofensa. Então ele
explicava que somente um devoto rendido e sem egoísmo é elegível para
praticar adoração.
Por exemplo, no templo de Dauji Mandir (Templo de Srila Bhakti
Pramode Puri Goswami Maharaj em Vrindavan-Índia), algumas vezes
acontecia de algumas cobras aparecerem e desaparecerem
misteriosamente. Os devotos encarregados imaginavam se estas serpentes
estavam surgindo devido a alguma imperfeição à atenção a Deidade. Srila
Gurudeva sempre pedia a seus discípulos que estivessem muito vigilantes
em relação à Deidade.
Em 1964, Srila Guru Maharaj se tronou o editor chefe da revista
Sri Caitanya- Gaudiya- Vani. Ele aceitou essa responsabilidade com
extrema seriedade, nunca havia esquecido a instrução de seu Guru: “Não
abandone o seu serviço de escrever”. Srila Bhaki Bhakti Bibudha
Bodhayan Maharaj (seu discípulo e secretário pessoal) contou dois
incidentes que se encaixam perfeitamente com o contexto: “Meu mestre
espiritual, nos mostrou muitos exemplos de como servir o Guru, até
mesmo quando estava fisicamente incapaz de prestar serviços ao seu
Gurudeva.
Uma vez, quando as mãos de Gurudeva estavam tremendo devido a
sua idade avançada (96 anos de idade) e procurava manter seus serviços,
editando publicações a Gaudiya e adorando as Deidades, mas era incapaz
de entender a sua própria letra, eu lhe pedi que ditasse, e eu poderia
escrever para ele. Nesse momento ele disse: “Esse serviço de escrever para
publicação da Gaudiya foi dado por meu Gurudeva. Ele não me deu o
serviço de ditar e sim escrever, então, como eu poderia incumbir a você
esse serviço? Se eu sou incapaz de entender a minha própria letra, então é
melhor para de escrever.”
Depois de expressar semelhante frase, seus olhos estavam cheios
de água devido aos sentimentos de separação. E novamente ele expressou
com uma voz suave: “Ó Gurudeva, agora sou incapaz de realizar algum
serviço para a missão; qual a utilidade desse corpo inútil? Por favor,
permita-me partir daqui”.
O outro incidente maravilhoso que nos contou Srila B. B.
Bodhayan Maharaj aconteceu em 1983. Estavam hospedados na Sri
Chaitanya Gaudiya Math (a missão de Srila Madhav Maharaj) em Calcutá.
Srila Gurudeva estava com 95 anos de idade; e ele era seu servo pessoal.
“Nesse momento, Gurudeva era o editor da revista mensal Sri
Caitanya Vani. E era o momento de publicar a revista. Nesse intuito, ele
se manteve a noite toda ocupado em editar os conteúdos da revista. Para
preparar a sua cama, eu esperava por ele; mas devido a minha preguiça,
acabei dormindo no piso do quarto.
Então, o som do sino para o Mangal-arati (a primeira cerimônia do
dia, as 5h da manhã) despertou-me, e vi que ainda estava ocupado
escrevendo para a revista. Eu perguntei ‘Srila Gurudeva, quando é que o
senhor vai dormir?’ Nesse momento, ele replicou ‘Deixe-me finalizar essa
pequena parte, isso vai levar poucos minutos’. Então, eu disse que já era a
hora do Mangala-arati. Imediatamente Srila Gurudeva respondeu ‘Ó,
agora eu tenho que cantar minha japa; agora já não é hora de dormir’.
Depois dessa conversa, ele começou a cantar suas voltas de japa
normalmente.”
Srila Madhava Maharaj também ajudou financeiramente a Guru
Maharaj. Quando qualquer ritual vaisnava era praticado em seu Math,
dava essa função para Srila Gurudeva e lhe passava o dinheiro da doação
correspondente. Às vezes enviava dinheiro para Kalna para ser usado no
serviço à Deidade. Como Srila Gurudeva era um experto na realização de
rituais védicos e como vinha de uma família de brâmanes muito
respeitada, era muito qualificado para realizar as cerimônias védicas.
Outro fator, foi o fato dele ser um devoto puro de Krishna. Quando
existe a necessidade de fazer cerimônia de sradha (ritual funerario que os
descendentes realizam em benefício dos antepassados), então, quem não
gostaria de realizar uma cerimônia destas com um devoto puro? Isso já
seria uma garantia do êxito da cerimônia.
Além de realizar o serviço de ser o editor chefe da revista Sri
Caitanya-vani, Guru Maharaj, continuava a dar palestras sobre Srimad-
Bhagavatam. Seu irmão espiritual Krsna-Kesava Prabhu relembra que
Gurudeva tinha o costume de dar aulas com seus olhos fechados. Quando
alguém perguntava a razão disso, dizia que alguma pessoa na audiência
poderia falar fortemente e ele poderia perder o seu ensejo. Então, para ler
sem interrupção, ele pregava com os olhos fechados.
Srila Guru Maharaj também se tornou muito famoso por sua
dedicação, conhecimento e habilidade na adoração da Deidade e em todos
os rituais vaisnavas. Por toda a Índia era convidado para realizar
cerimonias e instalar Deidades, na realidade, ele instalou a maioria das
Deidades da Gaudiya Math.
Em 1978, Srila Madhava Maharaj começou a manifestar seus
passatempos de doença pela idade avançada. Entretanto, continuava
trabalhando muito duro na pregação. Algumas vezes sentia-se melhor de
saúde, e necessitava de ajuda para continuar com os esforços de
recuperação. Sua saúde ora piorava, ora melhorava e assim esteve por
vários meses. No começo de 1979 o seu estado de saúde piorou muito e no
dia 27 de Fevereiro de 1979, as nove horas da manhã, Srila Bhakti Dayita
Madhava Maharaj, desapareceu desse mundo para entrar em seus
passatempos eternos.
Srila Prabhupada Bhaktisiddhanta Sarasvati Thakur tinha o
costume de denominar a energia no serviço devocional de Srila Bhaki
Dayita Maharaj de “energia vulcânica.” Quando começou a estabelecer
seus próprios Maths, tornaram-se um local de encontro onde seus irmãos
espirituais podiam pregar e se associar uns com os outros. Sua
generosidade, amabilidade, tolerância e entusiasmo em pregar foi
legendária. Sua divina graça Srila Guru Maharaj disse “Eu estou
endividado com Srila Madhava Maharaj”.

Outro associado bem íntimo de Srila Guru Maharaj foi Srila Bon
Maharaj. Depois do desaparecimento de Srila Prabhupada
Bhaktisiddhanta, os dois viajaram juntos muitas vezes para pregar por
diferentes locais. Eles se correspondiam frenquentemente. Gurudeva disse
a respeito de Bon Maharaj: “Ele sempre foi conhecido por suas aulas
eloquentes . Foi muito proficiente em Inglês e escreveu alguns livros. Em
diferentes locais, pessoas educadas viam escutar as suas palestras, porque
tinham ouvido falar sobre ele. Esteve ajudando-me de muitas maneiras.
Ele tinha o costume de ir ao Math de Srila Madhava Maharaj e dar
palestras ali também”.
Srila Bhakti Kumud Santa Maharaj sempre manteve uma conexão
muito próxima e franca com Om Visnupada Srila Bhakti Pramode Puri
Govami Maharaj. Em relação a ele, Gurudeva disse: “Foi muito querido
para Srila Prabhupada Bhaktisiddhanta, tinha apenas onze anos de idade
quando veio morar no Math, depois se tornou um famoso pregador. Srila
Prabhupada e todos os demais se deleitavam muito ao escutar os seus
kirtanas. Ele tinha muita afeição por mim”.
Srila Guru Maharaj muitas vezes era convidado por Srila Madhva
Maharaj para dar palestras em seus templos. Começou a pregar em
diferentes partes da Índia e quando Srila Bhaktivedanta Swami Maharaj
Prabhupada estava vivendo no Radha Damodara em Vrindavana, muitas
vezes se correspondia com Guru Maharaj. Quando ia à Vrindavana,
costumava visitá-lo ali. Muitos anos antes, Quando Swami Maharaj
Prabhupada foi chefe de família em Calcutá, Srila Sridhara Maharaj , por
algum tempo vivia no piso inferior de sua casa. Durante esse período, Srila
Gurudeva foi ali muitas vezes para estar com eles. Conta-se que quando
haviam programas de pregação ali, Srila Bhaktivedanta Maharaj
Prabhupada tocava a mrdanga, Gurudeva cantava e Srila Sridhara Maharaj
pregava.
Em Novembro do ano 1977, Srila Swami Maharaj Prabhupada
manifestou seus passatempos de desaparecimento deste mundo. Pouco
antes, quando Srila Guru Maharaj foi à Vrindavana, ele escutou que
Swami Maharaj Prabhupada estava gravemente doente. Sendo assim, ele
foi para o templo da ISKCON (Sociedade Internacioal para a Consciência
de Krishna) de Krsna-Balarama para vê-lo. Srila Swami Maharaj
perguntou onde Gurudeva estava se hospedando e ele respondeu que no
Math de Madhava Maharaja. Gurudeva perguntou como a Swami Maharaj
como se sentia. E Srila Swami Maharaj Prabhupada respondeu que estava
muito doente. Ele respondeu à Gurudeva “eu tenho corrido atrás de
dinheiro e fama e é por isso que estou experimento muito sofrimento
agora”. Srila Gurudeva respondeu “Maharaj, você não tem corrido atrás de
fama e dinheiro – o dinheiro e fama é que correm atrás de você”. Swami
Maharaj Prabhupada disse que tinha ofendido muitos dos seus irmãos
espirituais enquanto se esforçava por pregar no Ocidente. Ele estava
pedindo perdão para todos. Mas Gurudeva disse “você não ofendeu
ninguém, nós que não soubemos compreendê-lo bem.”
Então Swami Maharaj disse: “Maharaj, você tinha o costume de
cantar para Srila Bhaktisiddhanta. Você poderia cantar para mim? Nesse
momento, Srila Gurudeva cantou “Jay Radhe, jay Krsna, Jay Vrindavan”.
Swami Maharaj Prabhupada disse: “poderia cantar ‘Sri Rupa Manjari
Pada’ para mim? Era uma canção que nosso Gurudeva gostava tanto,
pediu no momento em que estava para abandonar o corpo”. Então,
Gurudeva começou a cantar e quando terminou, Swami Maharaj disse:
“Maharaj, eu sei que você é um devoto puro e viveu uma vida pura dentro
do vaisnavismo. Será que posso lhe dar um presente?” E logo depois,
Swami Maharaj pediu para seus discípulos trazerem prasadam (alimento
espiritual) para Gurudeva.
Os anos se passaram, e Guru Maharaj lembrava-se sempre desse
acontecimento com uma certa curiosidade. Ele queria saber qual era o
presente que Srila Swami Maharaj queria lhe dar. Porque depois ele
mandou servir prasadam e não havia dado nenhum presente. Uma vez que
prasadam, sempre é oferecido, não significaria dar um presente mesmo.
Gurudeva esperava algo que Swami Maharaj quisesse dar-lhe.
Então, um dia Gurudeva teve uma revelação, refletiu que o
presente que Swami Maharaj tinha para lhe entregar eram seus discípulos
ocidentais, esse era o presente! Uma vez que tinham sido os discípulos
ocidentais de Swami Maharaj que haviam cozinhado naquele dia quando
lhe pediu para aceitar um presente dele.
Mas para que possamos entender esse fato, é necessário voltar a
um tempo remoto, quando Srila Swami Maharaj Prabhupada foi ao
ocidente pregar aos ocidentais e havia aceitado muitos discípulos. Quando
eles foram para à Índia pela primeira vez com Swami Maharaj, em algum
momento, seus irmãos espirituais foram visitá-los. E nesse dia, os
discípulos ocidentais cozinharam prasadam e Srila Swami Maharaj
Prabhupada pediu que eles aceitassem prasadam, mas eles se recusaram a
aceitar prasadam. E entre eles, estava Srila Guru Maharaj, que também
recusou aceitar o alimento cozinhado pelos discípulos ocidentais.
Isso deixou muito triste a Swami Maharaj Prabhupada. Ele havia
feito muito esforço para começar a pregação no ocidente, querendo
cumprir a instrução de Prabhupada Bhaktisiddhanta Sarasvati Thakur. Mas
por outro lado, estavam os seus irmãos espirituais que eram bem ortodoxos
em suas práticas e de certa forma ficaram receosos de aceitar prasadam
que não havia sido elaborada dentro dos parâmetros mais estritos
referentes à etiqueta vaisnava.
Om Visnupada Srila Bhakti Aloka Paramadvaiti Maharaj
(discípulo e sannyasi de Srila Bhaktivedanta Swami) conta que algumas
vezes, Om Visnupada Srila Bhakti Pramode Puri Goswami Maharaj o
segurava forte pelo uttaria (o top que usam os sannyasis, ou seja, um
tecido que colocam na frente do corpo), o sacudia e dizia: “Babu (forma
carinhosa de se direcionar a outro), somos todos iguais.” Om Visnupada
Bhakialoka Paramadvait Maharaj pensava consigo: “como eu posso ser
igual a ele?”
E Srila Guru Maharaj disse várias vezes a ele. Até que um dia lhe
contou toda essa história que havia acontecido com Srila Swami Maharaj
Prabhupada e de como ele havia resolvido aceitar discípulos ocidentais
depois de ter entendido qual era o verdadeiro presente que o mesmo queria
dar-lhe.
Srila Rupa Goswami escreve no seu Upadesamrta (versos 4 e 5)
sobre os intercâmbios e relacionamentos entre devotos:
dadāti pratigṛhṇāti
guhyam ākhyāti pṛcchati
bhuṅkte bhojayate caiva
ṣaḍ-vidhaṁ prīti-laka
ṣ ṇam
“Oferecer aos devotos puros os objetos que estão de acordo com suas
necessidades, aceitar a prasadam, ou sobras dadas pelos devotos
puros, revelar aos devotos sua própria realização no bhajana, indagar
dos devotos sobre suas realizações confidenciais, comer com grande
amor as sobras da prasadam dada pelos devotos e servir prasadam
aos devotos com amor. Esses são os seis sintomas da associação
amorosa com os devotos.”
kṛṣṇeti yasya giri taṁ manasādriyeta
dīkṣāsti cet praṇatibhiś ca bhajantam
īśam śuśrūṣayā bhajana-vijñam ananyam
anya- nindādi-śūnya-hṛdam īpsita-
saṅga-labdhyā

“Quem canta o nome de Krishna apenas uma única vez exclamando:


‘Ó, Krishna!’ é um devoto neófito (kanistha-adhikari). Devemos
considerá-lo como um membro da família e respeitá-lo
silenciosamente.
Aquele que compreende completamente o significado de diksa, aceitou
iniciação de um guru qualificado e que realiza bhajana (meditação
instrospectiva) para Bhagavan de acordo com as convenções vaisnavas, é
um devoto intermediário (madhyama- adhikari). Devemos respeitar um
devoto que está dotado de compreensão na ciência do bhajana, deve ser
considerado um devoto maha-bhagavata(um grande devoto). Devido a
absorção indesviável em Krishna, o coração puro de um devoto assim está
livre de defeitos tais como a tendência em criticar aos outros. Devemos
oferecer-lhe dandavat-pranams (pranipata), fazendo perguntas relevantes
(pariprasana) e prestando serviço (seva) com grande amor”.

Nesses versos do Upadesamrta, Sri Rupa Gosvami ensina como


devemos nos relacionar com os devotos e como reconhecê-los também,
para poder tratá-los de maneira apropriada. Durante toda a sua vida, Guru
Maharaj deu o exemplo de como se relacionar com todas as classes de
devotos e como intercambiar sentimentos. Srila Gurudeva não tinha
nenhuma espécie de animosidade contra ninguém, sua vida foi um livro
aberto, sem nenhum tipo de duplicidade, dotado com um imenso amor
para todos os devotos e principalmente para os seus irmãos espirituais, por
isso, sempre esteve empenhado em se relacionar com eles, aproveitando
todas as oportunidades para estreitar os laços afetivos entre os mesmos.
Mas não era apenas com seus irmãos espirituais e outros vaisnavas
que Srila Gurudeva mantinha contato. Por suas correspondências é
possível obter uma pequena ideia de como as pessoas de muitas diferentes
classes e sessões da sociedade tinham amor e confiança nele. Ele dedicou
muito tempo da sua vida em responder cartas com suas próprias mãos.
Todas as cartas que ele respondia eram dotadas de muitos sentimentos
devocionais capazes de instruir a todos desta forma.
Além de adorar sua Deidade com todo esmero e dedicação, e
pregar em vários programas de maneira extensiva, ele escolheu uma
terrível vida de pobreza, podendo dormir na varanda e comendo muito
pouco. Todo o dinheiro que ganhava, ele gastava no serviço devocional.
Durante toda a sua vida manteve o hábito de ficar até altas horas da noite
escrevendo e lendo artigos. Assim foi a sua vida, inteira dedicação, sem ter
tempo para si e sempre pensando no bem estar dos demais. Essa é a
mentalidade do sadhu, ele não pensa em seu conforto pessoal, em suas
necessidades básicas não pensa em incrementar seus caprichos e somente
no bem estar de todas as entidades vivas.
Como se descreve no shastra, ele teve todos os sinais auspiciosos
de um nascimento piedoso, de boa família, prosperidade, educação e
beleza. Nascido em uma família de brahmanas, sua escolaridade foi
inquestionável e sua beleza era notável. Seu conhecimento do siddhanta
ou das doutrinas vaisnavas eram ilimitadas, não existia nada que não
soubesse em relação à filosofia. Suas qualidades transcendentais eram sem
fim. Nunca escutou-se de um incidente em que tivesse usado uma palavra
áspera à alguém. Sua conduta era sempre de muita calma e sobriedade.
No Srimad Bhagavatam (3.25.21) encontramos:
titikṣavaḥ kāruṇikāḥ
suhṛdaḥ sarva-dehinām
ajāta-śatravaḥ śāntāḥ
sādhavaḥ sādhu-bhūa ṣ ṇāḥ

“Os sintomas de um sadhu são que ele é tolerante, misericordioso e


amigo de todas as entidades vivas, é pacífico, obedece as escrituras e
todas as suas características são sublimes.”

Encontrar semelhante alma é muito raro no mundo material e


quando conseguimos obter o seu refúgio, podemos nos considerar muito
afortunados. Possuidores de uma grande fortuna, temos que nos agarrar a
essa oportunidade como se fosse a última, imbuídos desses sentimentos
faremos jus a boa fortuna que agora somos depositários. Podemos
imaginar, se de alguma forma ganhamos um diamante, por estar de posse
de tamanha jóia, teríamos um cuidado imenso em guardá-la conosco - em
hipótese alguma deixaríamos jogada em qualquer canto da casa. Não, de
maneira alguma faríamos isso, ao contrário, a guardaríamos em um local
bem seguro, longe do olhar das demais pessoas, da mesma forma, o fato de
recebermos do Guru, tanto o Harinama e o mantra, temos que entender a
importância dessa grande misericórdia que possibilitou a conexão com
nossos guardiães da devoção.
Srila Bhakti Bibudha Bodhayan Maharaj, o sucessor de Guru
Maharaj, que esteve servindo-o pessoalmente por mais de 13 anos,
dormindo ao seu lado, compartilhando em todos os momentos, viajando
com Srila Gurudeva para todas as partes. Sendo assim, contou que quando
Guru Maharaj morava em Nilachala, no Math, todos os dias vinha um
cavalheiro que se encontrava com Gurudeva e pedia para ouvir Hari-katha
dos lábios de Srila Gurudeva, então, Srila Bhakti Bibudha Bodhayan
Maharaj percebeu que logo que ele saia do Math, ia direto ao um mercado
que vendia peixes e com a mesma bolsa que estava carregando quando
ouvia Hari-katha, ali colocava os peixes e partia rumo à sua casa. Quase
todos os dias a história se repetia.
Então Srila Bhakti Bibudha Bodhayan Maharaj dirigiu-se a
Gurudeva e indagou: “todos os dias, aquele cavalheiro vem aqui e pede
para escutar Hari-katha e logo depois de sair, se dirige a um mercado para
comprar peixes e os leva em sua bolsa. Acho que Gurudeva não deveria
perder seu tempo falando com semelhante indivíduo”. Srila Bodhayan
Maharaj sabia que seu Guru não tinha muito tempo disponível para si,
presenciava que muitas vezes foi dormir antes de seu Guru, que
continuava a escrever por altas horas da noite e quando Srila Bodhayan
Maharaj acordava, Gurudeva ainda estava escrevendo ou cantando japa.
Então, imbuído de um sentimento de proteção, tentava resguardar a
integridade física do seu Guru. Mas a resposta de Gurudeva foi: “Eu não
estou perdendo tempo em falar Hari-katha, você não conhece o verdadeiro
valor do Srimad Bhagavatam? Qualquer pessoa que estiver interessada em
escutar o Bhagavatam deve ser objeto de nossa misericórdia, porque se
uma pessoa está interessada em ouvir sobre Krishna, é o meu dever falar a
respeito de Krishna pra ele, sem importar se vai a comprar peixe depois”.
E também conta-se que quando Gurudeva depois de tomar a sua
refeição do meio-dia, tirava uma soneca logo depois, era a hora de dar
Hari-katha, sem importar se tinha uma pessoa para escutar ou se haviam
dez pessoas, ele fechava os olhos e começava a falar, o Hari-katha fluía de
sua boca sem levar em conta o tamanho da audiência.
Srila Guru Maharaj, sempre que viaja de trem ia no vagão da
terceira classe. Quem já viajou na Índia em semelhante compartimento,
pode testemunhar sobre o fato e descrever o semelhante desconforto que é
uma viagem desse tipo, ainda mais para uma pessoa de uma idade tão
avançada, como era a Gurudeva nesse momento. Mas como Gurudeva
tinha muito respeito pelo laksmi (refere-se a dinheiro nesse contexto) que
conseguia para servir à Krishna, ele o economizava para utilizar no serviço
devocional.
Então, Srila Bhakti Bibudha Bodhayan Maharaj contou que quando
ia viajar à Calcutá, uma vez chegaram na estação ferroviária e quando
desembarcaram, Srila Bodhayan Mahraj sugeriu que deveriam tomar um
táxi, porque tinham muita bagagem. Srila Guru Maharaj ficou descontente
com esta sugestão e disse-lhe que sempre deveríamos ter muito cuidado
com o laksmi que colectamos para o serviço à Krishna e jamais
deveríamos gastá-lo de forma desnecessária. Então, ele sugeriu que
poderiam pegar um caminhão para o transporte. Este é um transporte bem
rudimentar, em que todas as pessoas sobem na carroceria do caminhão e
são transportadas junto com suas bagagens.
Srila Bodhayan rejeitou essa alternativa, porque Srila Guru
Maharaj tinha uma idade já avançada e subir em sua carroceria seria muito
perigoso para ele. Então Srila Bodhayan Maharaj sugeriu que tomassem
uma riksa (uma espécie de bicicleta que é capaz de transportar
passageiros). Srila Gurudeva também rejeitou semelhante proposta e
decidiu que deveriam ir caminhando até o templo onde se hospedariam.
Srila Bodhayan Maharaj disse que nas outras vezes que tinham que ir à
Calcutá, antes combinava com alguém para que pudesse buscá-los na
estação e evitasse todos esses transtornos que eram surgiam com o
objetivo de Srila Gurudeva de economizar os recursos adquiridos para
servir à Krishna.
Srila Guru Maharaj costumava escrever do lado contrário dos
convites que recebia para economizar o laksmi de Krsna. Ele pensava
“Apenas um lado do papel foi usado, porquê deveríamos desperdiçar o
papel?” Uma vez recebeu uma mensagem em um cartão e então ele
respondeu a mesma do outro lado no mesmo cartão. Srila Sridhara
Maharaja também era assim. Muitas vezes seus discípulos tinham que

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ajudar a Srila Guru Maharaja a subir no trem com muitas malas, porque
não queria gastar de forma desnecessária o laksmi de Krsna. Conta-se que
Srila Sridhara Maharaj também era assim.
Srila Guru Maharaj era um mahatma (grande alma), e isso é algum
muito difícil de se encontrar nesse mundo material. Ele estava ensinando a
todos pelo seu comportamento impecável, não podemos vê-lo através do
prisma mundano, somente conseguiremos apreciar seus atos quando
formos capazes de ungir nossos olhos com o conhecimento divino, não de
outra forma. Srila Gurudeva estava preocupado com todos os detalhes,
nada podia escapar a sua visão, por isso, todos aqueles que tiveram a boa
fortuna de conseguir a sua santa associação, puderam aprender muito em
todos os sentidos.
No Srimad Bhagavatam (5.5.2) está escrito:
mahat-sevāṁ dvāram āhur
vimuktes tamo-dvāraṁ yoṣitāṁ
saṅgi-saṅgam mahāntas te sama-
cittāḥ praśāntā vimanyavaḥ
suhṛdaḥ sādhavo ye

“O serviço aos mahatmas abre as portas para a liberação. O caminho


para o inferno está amplamente aberto para aqueles que se associam
com pessoas que afeiçoadas a mulheres e ao sexo. Os grandes devotos
são equilibrados. Eles não vêm diferença entre uma entidade viva ou
outra. Eles são pacíficos, e estão completamente ocupados em serviço
devocional. Eles são desprovidos de ira e trabalham para o benefício
de todos. Eles não se comportam de forma abominável. Semelhantes
pessoas são conhecidas como mahatmas.”

No Bhagavad-gita (7.19) encontramos:


bahūnāṁ janmanām
ante jñānavān māṁ
prapadyate vāsudevaḥ
sarvam iti
sa mahātmā sudurlabhaḥ

“Depois de muitos e muitos nascimentos e mortes, aquele que possui


conhecimento se rende a Mim, conhecendo-Me como a causa de como
a causa de tudo que existe. Semelhante grande alma é muito rara”.
O grande santo está completamente ocupado em serviço
devocional, e ao mesmo tempo não se ocupa em nenhuma atividade de
gozo pessoal dos sentidos, trabalhando exaustivamente para o benefício
dos demais, nunca fazem nada que incremente o seu egoísmo, devido ao
seu profundo conhecimento, rendem-se completamente ao Supremo e
tornam perfeita a vida daqueles que o servem com devoção.

Capítulo 22
UMA NOVA MISSAO

Depois do desaparecimento de Srila Bhakti Dayita Madhav


Maharaj, Srila Guru Maharaj experimentou grande sofrimento devido a
separação de seu adorável irmão espiritual. E naturalmente os discípulos
de Srila Madhava Maharaj buscaram refúgio em Gurudeva, o qual era
aceito como siksa guru (instrutor) de todos.
Srila Bhakti Ballabh Tirtha Maharaj, o sucessor de Srila Madhva
Maharaj, depois da partida de seu Gurudeva, caiu em profundo sentimento
de separação (vipralambha). Com o coração partido, foi para Vrindavana.
Depois de alguns dias, Srila Gurudeva chamou-o de volta para assumir a
responsabilidade total da missão, como era o desejo de seu Gurudeva.
Srila Maharaj continuou escrevendo para a revista Sri Caitaya
Vani, dando palestras e era tratado com muito amor e reverência por Srila
Tirtha Maharaj e seus irmãos espirituais. Gurudeva viveu dias felizes ali e
seus discípulos sempre vinham para estar com ele e em todos os festivais
estavam presentes para também compartilhar com os discípulos de Srila
Madhva Maharaj.
Mas em 1982, alguns discípulos de Srila Guru Maharaj se
aproximaram dele com uma petição: “Srila Guru Maharaj, nós estamos
muito felizes na Sri Caitanya Gaudiya Math. Nós sempre viemos para
buscar a sua associação e também temos participado de todos os festivais
aqui. O mais importante é que percebemos que o senhor está muito feliz
aqui. Você tem todas tudo que necessita aqui para se absorver em seu
bhajana, Hari-katha e escrever também. Mas, nós muitas vezes sentimos
que necessitamos de ter um local onde nós possamos cuidar da nossa
missão e ter onde ir depois que o senhor partir.” Srila Gurudeva pode
entender e apreciar esse desejo dos seus discípulos. Então, pediu para
começar a procurar uma terra para construir um Math.
Uma vez que Srila Guru Maharaj nunca procurou ter muitos
discípulos, na realidade, por muito tempo, não quis aceitar nenhum
discípulo. Ele estava muito feliz de ver como as missões de seus irmãos
espirituais cresciam e prosperavam. Ele enviou muitas pessoas que
queriam se iniciar com ele para seus irmãos espirituais.
Quando alguns Gurus da ISKCON caíram de seu status de Guru,
discípulos deles foram à Srila Gurudeva para pedir iniciação. Srila
Gurudeva disse: “Vocês estão na missão de Swami Maharaj, vocês
deveriam permanecer nesta missão. Eu sugiro que procurem a Srila Bhakti
Charu Swami, ele é qualificado, tem as bênçãos de seu Gurudeva e o meu
suporte também. Desta forma, Srila Gurudeva, sempre demonstrou o
desejo de ter poucos discípulos. Como tinha pouco dinheiro, ele estava
satisfeito em ter seu Math em uma pequena construção.
Um verdadeiro Guru nunca quer ser Guru, somente a ideia de
assumir a posição de Guru, causa-lhe um desgosto profundo. Em muitas
passagens da vida dos grandes vaisnavas, encontramos exemplos dessa
mesma mentalidade. Por exemplo, Srila Prabhupada Bhaktisiddhanta
Sarasvati Thakur já havia recebido Harinama e mantras para adorar a Sri
Nrsimha-deva e Sri Kurmadeva de Srila Bhaktivinoda Thakur (atribuições
de Guru). No entanto seu pai biológico (Bhaktivinod) enviou seu filho
para aceitar a iniciação diksa de Srila Gaura Kisora Das Babaji Maharaj.
Foi bastante difícil para convencê-lo a se tornar Guru. Por
exemplo, muitas pessoas se aproximavam dele para pedir iniciação e eram
golpeadas com um guarda-chuvas. Mas quando Srila Prabhupada
Bhaktisiddhanta Sarasvati Thakur pediu iniciação para ele, Babaji Maharaj
respondeu “Eu uma vez aceitei um discípulo, mas ele me enganou e foi
embora. Eu não quero mais ter discípulos”. Mas Srila Bhaktisiddhanta não
perdeu o ânimo e novamente pediu sua misericórdia.
Babaji Maharaj disse: “Eu vou perguntar para Mahaprabhu, se Ele
der permissão, eu posso aceitá-lo como discípulo.” Quando, depois de
cinco dias Srila Prabhupada retornou e inquiriu: “Qual foi a decisão de
Mahaprabhu?” Babaji Maharaj disse: “esqueci de perguntar. “ E no
momento em que Srila Prabhupada voltou para a terceira tentativa, Babaji
Maharaj disse que não tinha recebido o aval de Sri Mahaprabhu. Srila
Prabhupada disse então: “Sem sua misericórdia, não poderei sustentar a
minha vida.” Em prantos e lamentando, Srila Prabhupada começou a vagar
desesperadamente por não ter obtido a graça de Babaji Maharaj. Mas
vendo o desejo sincero desse jovem aspirante, Babaji Maharaj cedeu e
disse para Srila Prabhupada tomar banho no Ganges e no outro dia bem
cedinho o iniciou. Isso foi em Janeiro de 1900.
De forma similar, Srila Guru Maharaj era muito averso a iniciar
discípulos, sempre pensando que a melhor solução para aqueles que
desejassem se iniciar, era recorrer aos seus irmãos espirituais. Isso ele fez
por algum tempo, mas chegou um momento, que já não era possível
recusar por mais tempo a insistência de seus seguidores em tê-lo como
guia espiritual.
Todos os aspirantes à devoção estão lutando para encontrar um
Guru genuíno e quando isso acontece, a felicidade brota em seus corações.
No Caytania-caritamrta (Adi 1.45) está dito:
guru kṛṣṇa-rūpa hana śāstrera pramāṇe
guru-rūpe kṛṣṇa kṛpā karena bhakta-gaṇe

“De acordo como o shastra, o guru não é diferente de Krishna mesmo.


Como guru, Krishna tem duas formas, como a Superalma e como o
melhor dos devotos.”

E também encontramos no Caitanya Cairitamrta (Madhya lila 22-


47):
kṛṣṇa yadi kṛpā kare kona bhāgyavāne
guru-antaryāmi-rūpe śikhāya āpane

“Pela misericórdia de Krishna, a afortunada alma é guiada pela


Superalma desde dentro e pelo guru por fora”.

Começando a atender ao chamado interno, o indagador sincero


estará sincronizado com a ajuda interna e por isso logo será levado a se
aproximar da ajuda externa, na forma do preceptor védico. Este forte
sentimento vai em direção ao caminho que o próprio Guru também está
trilhando. Nesse momento, na mesma proporção em que o discípulo
necessita do Guru, o mesmo tem a necessidade do discípulo. O Guru não
pode viver sem o discípulo, está atrelado a ele para atuar como professor.
Se não houver discípulo, o Guru não pode existir. Subentende-se que
desde o ponto de vista absoluto, o Guru está servindo ao discípulo, ele
nunca se intitula na posição de Guru, senão que assume esse rol mais por
uma questão de necessidade.
A princípio, os discípulos de Guru Maharaj queriam comprar uma
terra em Kalna, uma vez que ali era o bhajana kutir de Srila Gurudeva,
mas ele rejeitou a ideia, preferindo que se conseguisse um local em
Sridham Mayapur. Então, em Dezembro de 1987, em Sri Mayapur, a
fundação da Sri Gopinatah Gaudiya Math foi estabelecida. Em março de
1987 dois quartos e um banheiro foram construídos no térreo da Math e
uma cozinha foi construída ao lado de fora. O piso eram muito úmido,
quando Srila Gurudeva foi instalar-se ali seus discípulos colocaram um
pouco de feno para aliviar o efeito da umidade. Srila Gurudeva ocupou um
dos quartos, o outro recebeu as Deidades e logo depois, outras terras foram
adquiridas e novos Maths instalados em Calcutá, Medinipur e Jagannatha
Puri.
Quando Srila Guru Maharaj queria ficar em Vrindavana, muitas
vezes se hospedava na Sree Caitannya Gaudiya Math de Madhava
Maharaj. Srila Gurudeva sempre estava meditando nas glórias de Sri
Vrindavana Dham e expressava o desejo de ter um templo em Vrindavana
Dham. Em relação a esse episódio, primeiramente vamos retroceder um
pouco no tempo.
Om Visnupada Srila Bhakti Aloka Paramadvaiti Maharaj conheceu
a Guru Maharaj no Math de Srila Sridhara Maharaj. Sempre que era a
Vyasapuja (aniversário de devotos puros) de Srila Sridhara Maharaj, Srila
Gurudeva tinha o costume de ir e participar das festividades. como Om
Visnupada Srila Bhakti Aloka Maharaj havia tomado refúgio em Srila
Sridhara Maharaj, foi algo bem natural que acabassem se conhecendo e
uma estreita amizade foi estabelecida entre os dois.
Quando Srila Paramadvaiti Maharaj visitava Sri Vrindavana Dham,
realizava o Vraja Parikrama (peregrinação por Vrindavan), estava há
muitos anos procurando um lugar em Vrindavana para estabelecer seu
templo e poder trazer seus discípulos para peregrinar no dham sagrado.
Sendo assim, um dia alguém perguntou-se se ele já havia orado para Sri
Gopesvara Mahadeva pedindo permissão para poder se estabelecer em
Vrindavana. Ele disse que ainda não havia orado, então o interlocutor disse
“como você espera comprar um templo em Vrindavana, sem a pedir
permissão a Sri Gopesvara Mahadeva?”
Então, imediatamente, Srila Paramadvaiti Maharaj foi correndo ao
templo de Sri Gopesvara Mahadeva e orou com muito fervor para
conseguir um templo em Vrindavana. No dia seguinte, quando estava
passando perto de uma loja em Vrindavana, um comerciante chamou-se e
disse que havia um templo ao lado de Sri Gopesvara Mahadeva que estava
a venda e Srila Paramadvait Maharaj conseguiu comprá-lo e estabelecer a
sua missão (chamada Vrinda) em Vrindavana, que foi conhecido
posteriormente como o Vrinda Kunja, um local paradisíaco dentro do
Dham sagrado.
Uma vez, Srila Guru Maharaj foi convidado para ir em Vrindavana
no templo de Vrinda Kunja, passou alguns dias ali e se encantou com o
lugar. Posteriormente toda vez que estava em Vrindavana se hospedava
ali, então, um dia Srila Gurudeva falou para Om Visnupada Srila
Paramadvaiti Maharaj “Você foi abençoado diretamente por Srimati
Radharani por conseguir um local como o Vrinda Kunja. Eu fiquei
sabendo que você orou para Sri Gopesvara Mahadeva para que ele
conseguisse um templo para você em Vrindavana. Será que você poderia
orar para mim, para que eu possa também conseguir um templo em
Vrindavana?”
Ele ficou surpreso com o pedido e pensou “um devoto puro está me
pedindo para orar por ele, isso me parece absurdo. Eu não sou nada no
plano da devoção, se me comparo com ele. Mas ao mesmo tempo, como
poderia desobedecer ao pedido de um devoto puro?” Pensando dessa
forma Srila Paramadvaiti Maharaj foi ao templo de Sri Gopesvara
Mahadeva para orar e pedir que Guru Maharaj conseguisse um templo em
Vrindadvana. Algum tempo depois, recebeu a notícia que Srila Gurudeva
tinha conseguido comprar um templo em Vrindavana, perto do templo de
Sri Gopesvara Mahadeva e perto também do Vrinda Kunja, o templo de
Srila Bhakti Aloka Paramadveiti Maharaj. Srila Guru Maharaj conseguiu
adquirir o antigo templo de Dauji (o irmão maior de Krishna, Balarama)
em Vrindavana, logo depois construiu seu bhajana kutir (local para o
canto introspectivo do mantra) ali mesmo.
O vaisnavas são capazes de satisfazer todos os desejos de todas as
entidades vivas. Mesmo um devoto puro, que tem sua vida totalmente
controlada por Krishna, sente o desejo de estar com os vaisnavas e é
dependente da misericórdia deles. Os vaisnavas estão se relacionando em
uma plataforma completamente diferente da percebida pelas pessoas
comuns, a visão deles está untada com o bálsamo da devoção, por isso são
capazes de enxergar o que não podemos.
Seu alcance é bem diferente do nosso, podem enxergar além,
podem perceber certas nuances que nos escapam completamente. Não
podemos prescindir de sua misericórdia, sempre estaremos ávidos para
obter o auxílio dos vaisnavas, não importando o nível da devoção em que
nos encontramos. No Caitanya Caritamrta ( Madhya-lila,17.22) está
escrito:
kṛṣṇa-bhakti-janma-mūla haya 'sādhu-saṅga'
kṛṣṇa-prema janme, teṅho punaḥ mukhya
aṅga

“A causa raiz do serviço devocional é a associação com os devotos


avançados. Mesmo quando nosso amor adormecido por Krishna
desperta, a associação com os devotos é ainda mais essencial”.
Srila Narottama Dasa Thakura canta em Prarthana:
ṭhākura vaiṣṇava pada, avanīra sampada,
śuno bhāi hoiyā eka mana
āśraya loiyā bhaje, tāre kṛṣṇa nāhi
tyaje, āra saba more akāraṇa

vaiṣṇava caraṇa jala, prema bhakti


dite bol, āra keho nahe balavanta
vaiṣṇava caraṇa reṇu, mastake bhūa ṣ ṇa vinu,
āra nāhi bhūṣaṇera anta

tīrtha jala pavitra guṇe, likhiyāche purāṇe,


se saba bhaktira pravañcana
vaiṣṇavera pādodaka, sama nahe ei saba,
yāte hoy vāñchita pūraṇa
vaiṣṇava sańgete mana, ānandita
anuka
ṣ ṇa, sadā hoy kṛṣṇa parasańga
dīna narottama kānde, hiyā dhairya nāhi bāndhe
mora daśā keno hoilo bhańga

“Ó meu querido irmão, escute minhas palavras com profunda


atenção: Os pés de lótus dos vaisnavas são o tesouro mais valioso no
mundo. Esses vaisnavas continuamente tomam refúgio em Krishna e
adoram-No. Eles nunca abandonam o Senhor, são liberados do ciclo
de repetidos nascimentos e mortes.
A água que lavou os pés de lótus dos vaisnavas derramam serviço em
amor puro à Suprema Personalidade de Deus. Não existe nada tão
efetivo como alcançar esse divino amor. Eu coloco a poeira dos pés de
lótus dos vaisnavas sobre a minha cabeça. Eu não uso outro
ornamento.
O poder purificatório das águas de todos os locais de purificação está
descrito nos Puranas, apesar de que isso seja um pouco enganoso. Na
realidade, não existe nada que seja tão purificante quanto a água que
lavou os pés de lótus dos vaisnavas. Essa água satisfaz todos os desejos.
Depois que a minha mente encontrou prazer na associação com os
vaisnavas, eu sempre busco a companhia daqueles devotos do Senhor
Krishna. O pobre Narottama Das Thakura chora: ‘Eu não posso
manter minha compostura por mais tempo. Porque eu caí em tão
baixa condição de vida, eu não posso obter a associação dos
vaisnavas”.

Uma vez, um devoto que buscava associação de Srila Guru


Maharaj, e o convidou para visitar Vrindavana. Nesse momento Srila Guru
Maharaj estava na cidade de Jagannath Puri, na região de Orissa. Ele disse:
“Guru maharaj, vamos visitar Vrindavana, eu gostaria muito de levá- lo
ali, faz tempo que o senhor não visita Vrindavana dham.” Srila Gurudeva
respondeu: “Eu já estou muito velho, e uma viagem tão longa de trem
(quase três dias) seria muito desgastante”. Então o devoto falou: “Não,
Guru Maharaj, eu não vou levá-lo de trem, eu o levaria de avião”. De uma
maneira ou outra, ele conseguiu convencer a Guru Maharaj a viajar.
Quando chegaram em Vrindavana, se hospedaram no Vrinda Kunja, a
convite de Srila Bhakti Aloka Paramadveiti Maharaj, que o considerava
como seu siksa guru (instrutor) e mantinham contato muito íntimo.
ESTRATO DO AUDIO DE SRILA BHAKTI ALOKA
PARAMADVEITI AO RESPEITO Srila Bhakti Pramode Puri Maharaj
quando foi a primeira vez a Vrinda Kunja
Srila Bhakti Aloka Paramadvaiti diz:
“Ram das chegou a Vrinda Kunja indagando sobre os devotos puros de
Krishna que ainda estavam no planeta, neste dia, Paramadveiti Maharaj o
convidou para visitar a Srila Bhakti Pramode Puri Maharaj, que estava no
Caytania Gaudiya Math; dois dias depois recebeu a iniciação.
Devido à grande contaminação da rua em Mathura, Srila Bhakti Pramode
Puri ficou muito mal de saúde e eu o convidei a Vrinda Kunja, para que se
recuperasse na boa atmosfera de lá. Srila Bhakti Pramode Puri Maharj,
junto a Nayanananda das Babaji, foram a Vrinda Kunja e ali ele se
recuperou rapidamente. outras
Todos os dias dava aulas, nas quais mais e mais devotos, especialmente de
missões, chegavam a escutar. Sarva Pavana era o tradutor e um dia
Srila Bhakti Pramode Puri me perguntou como eu tinha conseguido um
templo tão bonito como Vrinda Kunja, eu respondi que fiz uma oração a
Gopesvara Mahadeva e que um dia depois este templo chegou para a
missão Vrinda. Srila Bhakti Pramode Puri me diz: “Paramaveiti Maharaj,
vá a Gopesvara Mahadeva e peça outro templo para minha missão
também”, obediente, eu fui a Gopesvara Mahadeva(deidade do senhor
Shiva considerado o guardião do dham sagrado) para que Srila Bhakti
Pramode Puri também pudesse obter um templo especial em Vrindavan. O
resultado foi surpreendente, não apenas um templo chegou a Srila Bhakti
Pramode Puri, mas dois. Primeiro, o antigo Dauji Mandir, que tinha muitos
donos em todos os lados da Índia e era quase impossível conseguir os
papéis, mas com muita determinação e doações de diferentes devoto, se
conseguiu, finalmente, obter o Dauji Mandir – um templo de nove pátios
internos, uma das belezas arquitetônicas mais grandes de Vrindavan. E
justamente uns dias depois Ram das chegou, tendo negociado com
Padmanaba Goswami o templo de Pandava Nikunja, que é perto do

Kesighat, um dos lugares mais importantes de Vrindavan. históricas


Fomos todos lá, com Srila Bhakti Pramode Puri, e ele disse palavras
como “quando criança, sonhei com o Kesighat, como jovem,
meu mestre espiritual me trouxe aqui em parikrama e agora, na minha
velhice, vocês me entregam o Kesighat para que eu faça serviço aqui”. Ele
estava em alegria máxima e como Pandava Nikunja é na volta do Dauji
Mandira, onde já tinha um apartamento muito bonito, então ele ficou ali
perto. voltou
Tristemente, a saúde de Srila Bhakti Pramode Puri piorou, por isso, ele
a Mayapur, em busca de um clima melhor, mas, antes disso, muitas
festas foram celebradas no Dauji Mandir, incluindo a sua Vyasapuja, em
companhia de milhares de devotos e uma festa gigante. Srila Bhakti
Pramode Puri foi definitivamente aceito como a máxima autoridade
vaisnava de seus tempos e, assim, foi um instrumento para que a
associação mundial vaisnava realmente pudesse ser formada como nos

tempos de seu mestre espiritual. crescendo


Dessa forma, voltando a Mayapur, onde seu templo também estava
de uma forma surpreendente e as formosas Deidades foram
instaladas, também celebraram a associação mundial vaisnava, celebrada
duas vezes por ano, em Mayapur, na presença de Srila Bhakti Pramode
Puri, no seu aniversário de 99 anos. Srila Bhakti Pramode Puri dava
instruções, recebia devotos de todas as partes do mundo e sempre
assessorava aos acaryas e devotos de igual forma, com seu profundo
carinho.
Ao mesmo tempo, seu templo em Jagannath Puri estava em marcha; como
sua saúde não estava bem em Mayapur, decidiram ver se em Jaganatha
Puri poderia recuperar sua saúde. Ele foi a Jaganatha Puri e lá os devotos
discípulos começaram a fazer muitas arrumações de construções.
Especialmente Gopinath foi um grande apoio. Então, Srila Bhakti Pramode
Puri Maharaj passou seu último Vyasapuja, de 101, anos celebrando na
presença de praticamente todos os Gaudiya Vaisnavas, foi uma festa
inesquecível, celebrada num salão especial. Srila Bhakti Pramode Puri,
dava a misericórdia. Srila Bhakti Vaibhav Puri também estava presente,
assim como Srila Santa Maharaj e muitos outros acaryas. Era umas das
festas mais importantes do Gaudiya Vaisnavismo nos últimos anos. Em
seguida, Srila Bhakti Pramode Puri Maharaj apoiou a Mula Prakriti a
publicar um livro histórico muito importante sobre Srila Prabhupad,
porque ela queria escutar das pessoas, seus contemporâneos, o que
aconteceu com Srila Bhaktivedanta Swami Maharaj Prabhupad. E seus
contemporâneos e Srila Bhakti Pramode Puri insistiam que queriam lhe
dar isso.”

Logo que chegou ao ashram do Vrinda Kunja, Srila Gurudeva


começou a sentir-se mal, teve que ficar deitado e não conseguia respirar
direito. Os devotos foram atrás de um balão de oxigênio, mas não
encontraram em Vrindavana, então tiveram que ir para a cidade de Nova
Delhi que fica mais ou menos três horas distante. Quando conseguiram o
balão de oxigênio e remediaram o seu estado de saúde, Srila Gurudeva
segurou no devoto que o havia convidado a vir à Vrindavana e lhe disse:
“Babu, me desculpe, você me trouxe aqui, me pagou as passagens para que
eu pudesse vir e agora eu não posso fazer nenhum serviço, não consigo
falar de Krishna.” O devoto teve vontade de se jogar no rio ao ouvir essa
afirmação tão humilde, que lhe cortava o coração.

Um devoto puro naquela idade, mais de 80 anos, com toda uma


bagagem devocional respaldando suas ações, em um estado de saúde um
tanto crítico, que por alguns dias estava agonizando com falta de ar, sem

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conseguir respirar direito. Todos devotos desesperados por sua saúde,
correndo de um lado para o outro para tentar solucionar aquela situação. E
quando melhorou, e conseguiu falar algumas poucas palavras com certa
dificuldade, não ficou lamentando pelo seu estado de saúde, não reclamou,
porque o trouxeram de um lugar distante e talvez esse fosse o motivo de
seu sofrimento. Não, nada disso, ele se desculpou porque não foi capaz de
realizar nenhum serviço, porque não havia conseguido dar Hari-katha,
porque se sentia inútil, pensando que não conseguia corresponder as
expectativas. Isso era algo incrível de se ver. Todos estavam assombrados.
Na realidade essa era a verdadeira aula de Srimad Bhagavatam que Srila
Guru Maharaj deu para todos. Com seu próprio comportamento, sem
nenhuma lamentação em relação ao corpo, sem alguma exigência ou
reclamação, estava dando um exemplo para todos de extrema humildade e
tolerância.
Logo depois que Srila Guru Maharaj melhorou um pouco o seu
estado de saúde, os devotos queriam que Gurudeva descanasse, mas na
primeira oportunidade que tinha, começava a falar de Krishna. E mesmo
hospitalizado devido a uma severa congestão pulmonar e extrema
dificuldade em respirar, passava o tempo cantando o Hare Krishna Maha
Mantra e às vezes pronunciava bem alto “Jay Prabhupada! Jay
Nrisimhadeva! Jay Jagannatha!” E Qualquer momento podia começar a
falar Hari-katha, e era difícil pará-lo. Sempre pedia-se, para lhe cuidar a
saúde, que não falasse muito. Então ele respondia: “eu tenho que ficar
aqui, sentado o dia todo... Como posso não falar Hari-katha?”
Uma vez, Srila Bhakti Aloka Paramadvaiti Maharaj estava com seu
irmão espiritual Srila Bhaktivedanta Tripurari Maharaj no templo, quando
chegou Srila Guru Maharaj que nesse momento deveria ter quase cem anos
de idade acompanhado de seu servo. Então, Srila Gurudeva (Srila Bhakti
Pramode Puri Goswami) começou a circum-ambular envolta do templo
prestando dandavats (cair prostrado no chão com o corpo completamente
estirado como uma vara). Ele fez isto, dando reverências em cada esquina
do templo, completando quatro voltas ao redor do templo. Para uma
pessoa nesta idade fazer isso, deve-se entender que é uma proeza
indescritível. Quando Srila Guru Maharaj terminou de realizar seu
parikrama, Srila Tripurari Maharaj disse: “agora acabamos de presenciar
uma genuína aula do Srimad Bhagavatam”.
Srila Gurudeva estava sempre ensinando com seu comportamento,
inspirando a todos a se renderem cada vez mais, a se entregarem
completamente na trilha da devoção. Bastava contemplá-lo para obter a
inspiração no serviço devocional. Esse é o verdadeiro valor de sadhu-
sanga, um breve momento se torna suficiente para adquirir muito
entusiasmo para continuar praticando e buscando a perfeição da vida. No
Caytania-caritamrta (Madhya-lila, 22.54) podemos encontrar:
'sādhu-saṅga', 'sādhu-saṅga'- sarva-śāstre kaya
lava-mātra sādhu-saṅge sarva-siddhi haya

“O veredicto de todas as escrituras reveladas é que com apenas um


momento de associação com um devoto puro pode-se alcançar todas as
perfeições”.

Estar verdadeiramente associado com um santo, presume-se


também uma mudança de comportamento, buscar a pureza, deixando de
lado tudo aquilo que nos afasta de nosso ideal supremo. O sadhu não
precisa falar muito, não necessita dar grandes discursos para mudar nossas
vidas. Simplesmente por observá-lo nosso coração se enche com um
desejo forte de ser diferente daquilo que somos agora, daquilo que
queremos ser no futuro. Vida espiritual, completa rendição e absorver-se
integralmente em uma atmosfera devocional serão consequência de uma
inspiração provocada pelo sadhu. No Caytania-caritamrta (Madhya-lila,
24.97) encontramos:
sādhu-saṅga-kṛpā kimvā kṛṣṇera kpāya

kāmādi 'duḥsaṅga' chāḍi' śuddha-bhakti pāy

“Uma pessoa é elevada a plataforma da vida devocional pela


misericórdia do vaisnava, do mestre espiritual genuíno e pela especial
misericórdia de Krishna. Nessa plataforma, abandona-se todos os
desejos materiais e a associação indesejada. Então, a pessoa é elevada
a plataforma pura do serviço devocional.”
Em 1990, um neto de Sri Madan-Mohan Prabhu, o qual era um
amado e ilustre discípulo de Srila Sarasvati Thakur,tomou refúgio nos pés
de lótus de Srila Guru Maharaj, depois de ter esperado nove anos pela
iniciação. Recebeu o nome de Srila Achyutananda Prabhu. Ele havia
nascido em uma família de devotos vaisnavas, e sob a guia de seu avô se
tornou experto nas práticas devocionais.
Durante a adolescência, o desejo para renunciar surgiu de forma
natural e se aproximou de Srila Guru Maharaj, revelando o desejo de
receber iniciação formal. Gurudeva disse: "Aceito você como meu
discípulo, porém primeiramente peço que termines os estudos. É
importante para todas as pessoas inteligentes que recebam uma boa
educação".
Sendo assim, aceitou as instruções de seu futuro guru e no dia
seguinte da graduação em licenciatura em comércio se aproximou de
Gurudeva novamente para reiterar o seu pedido de iniciação. Gurudeva
chamou o pai do jovem e disse-lhe: "O senhor tem muitos filhos, agora um
deles se aproxima a mim com o desejo de dedicar sua vida a
espiritualidade, eu vejo nele boas qualidades e muita determinação.
Gostaria de aceitá-lo como me servo pessoal. O senhor me daria o seu
filho?"
O pai respondeu: "consideraria o êxito na vida de grihastha (de
família) se um dos meus filhos se dedica de forma exclusiva a vida
espiritual". Então, Srila Guru Maharaj disse a seu jovem discípulo que
seria mais benéfico se viesse morar no templo. Gurudeva lhe falou que um
devoto é um servidor sincero, e que de outra forma seu serviço não dará
fruto. Ele disse: “um servo que não mergulha profundamente no serviço,
só será um hipócrita”. Então, esse brahmacary (monge) decidiu morar no
Math para servir seu Guru com mais dedicação.
No dia 28 de maio de 1990, ele chegou a Mayapur (Índia). Srila
Gurudeva chamou a todos e disse: “De agora em diante, ele estará sempre
comigo”. No Goura Purnima (celebração do nascimento de Sri Caitanya
Mahaprabhu) do ano de 1993, Srila Guru Maharaj deu a ordem de
sannyasa (renúncia) a seu amado discípulo Sri Achyutananda Prabhu e
deu-lhe o nome de Bhakti Bibudha Bodhayam Maharaj.
Ele tornou-se um instrumento do crescimento e desenvolvimento
para missão de Srila Gurudeva e muitos devotos foram testemunha de sua
completa e constante dedicação no serviço à Sri Guru, dia e noite o estava
servindo. Srila Gurudeva disse uma vez: “Na realidade, é Bodhayan
Maharaj que está construindo e tocando todas as propriedades da Missão
(referindo-se a Gopinath Gaudiya Math). Eu não entendo de finanças”. No
Goura Purnima do ano de 1997, Srila Guru Maharaj escolheu como seu
sucessor a Srila Bhakti Bibudha Bodhayan Maharaj.

Capítulo 23
LIVROS
É impossível para os discípulos de Srila Guru Maharaj pensar em
Gurudeva sem seus livros. Mesmo quando não estava escrevendo ou lendo
um livro, estava acompanhado de uma montanha de livros em sua cama,
esse volume chegava a ocupar um terço do espaço de todo o quarto. Srila
Guru Maharaj estava completamente envolvido com a publicação de
livros, isso foi sua vida, seja escrevendo, editando ou publicando. Ele
sempre encorajou todos seus discípulos a ler e discutir as escrituras
básicas. Dizia: “quando vocês tiverem algum tempo livre, leiam as
escrituras. Se vocês pelo menos lerem os livros básicos, poderão obter um
conceito geral. Vocês sempre sentirão entusiasmo e inspiração por ler
esses livros, eles darão força e esperança”.
Por muitos anos seguidos, Srila Guru Maharaj foi a mão direita de
Srila Prabhupada Bhaktisiddhanta Sarasvati Thakura para edição e
publicação da literatura vaisnava. Por isso, ele estava sempre encorajando
seus discípulos a publicar e imprimirem livros. Mesmo em uma idade
avançada,Gurudeva estava pensando em editar e publicar novos livros. Sua
face se tornava radiante, seu humor estático e sua voz ficava potente e
poderosa quando falava a respeito da publicação de livros.
Por sua instrução, Bhaktisiddhanta Vani Trust foi fundada com o
propósito de publicar livros. Apesar de seus discípulos sugerirem o nome
de Bhakti Promode Vani Trust, ele preferiu colocar o nome de Srila
Prabhupada Vani. À partir de 1992 alguns livros clássicos foram
publicados pela Gopinatha Gaudiya Math e amplamente distribuídos.
Entre eles estão: Sadhu-sanga, Vaisnava-aparadha, Sachichidananda-
vigraha, Sri-Nama-Ganga-Tulasi-Mahatmya, Sri Mathura-Mahatmya,
Mantrarta-chayam-dipika, Srimad-Bhagavad-gita-Upanisad, Prabhupada
Sri-Srila Saraswati Thakur, Sri Sanatana-siksa, Sri Kirtatananjali, Sri
Amiya-ratnavali, Sri Sat-sandharbha, Sri Tattva-sandarbha, Sri Bhagavat-
sandarba, etc.
Alguns dos seus escritos em Bengali (que somam mais de 20
livros) foram traduzidos para o Inglês e outros idiomas: O coração de
Krishna ; Arte do Sadhana; Essência da Devoção Pura; Princípio do Guru
e método de Bhajan; Sobre amor e Separação, Meditações de meu Divino
Mestre; Bhakti Sara; A arte da Adoração; Sri Krishna Bhajanamrtam
(baseado no original de Sri Narahari Sarkar).

Quando o livro Vaisnava-aparadha foi traduzido para o Inglês,


muitos devotos ocidentais apreciaram e ficaram impressionados com as
instruções concernentes a gravidade da Vaisnava-aparadha (ofensa a um
devoto). Logo depois, o Coração de Krishna e a Arte do Sadhana foram
traduzidos para o espanhol pela iniciativa de Srila Bhakti Aloka
Paramadvaiti Maharaj. Foram amplamente distribuídos e muito apreciados
pelos devotos de língua hispânica. Na realidade, os devotos se inspiraram
bastante com a leitura desses dois livros, sendo usados amplamente por
alguns como uma guia de devoção diária.
O estudo dos sastras é uma das principais fontes de inspirações
para o sadhaka sincero. Através da leitura diária das escrituras, o
praticante tem a possibilidade de desenvolver muito a sua fé no processo
da bhakti yoga. Ainda que não possamos obter a associação dos devotos
por algum motivo, a leitura dos sastras é uma poderosa associação.
Mergulhar profundamente na leitura dos livros sagrados, com um espírito
submisso, constitui uma forte ferramenta para incrementar nossa fé no
serviço devocional. Podemos encontrar a definição da palavra sastra no
Madhva-Bhasyadhrta, Skanda-vacana (2.43):
rg-yajuh-saMatharvanca bharatam
pancaratrakam mula-ramayanancaiva
sastramityabhidhiyate yacchanukulametasya tacca
sastram prakirtitam ato'nya granthavistaro naiva
sastram kurvatma tat

“O Rg, Yajur, Sama e Atharva Vedas, assim como o Mahabharata, o


Narada-Pancaratra, e Ramayana, são certamente conhecidos como
escrituras. Aqueles livros que favoravelmente seguem as pegadas das
escrituras autorizadas, são também designadas como sastra. Todas as
demais literaturas simplesmente levam as pessoas a cair no caminho
errado, e nunca podem ser consideradas como sendo uma escritura.”

Em uma carta, Srila Guru Maharaj escreveu:


“Eu estou viajando para muito longe de Vrindavana. Se pela vontade do
Senhor, algum acidente acontece, espero que você saiba que na casa de
Radhavallabh Das em Jessore, eu tenho uma caixa de livros e outra caixa
no templo Sri Sri Radha-Gopinatha . Por favor, coloque-os todos juntos e
faça uma catalogação. A Deidade do Senhor Supremo e os livros sagrados
são sabda-brahma (O Senhor Supremo na forma de som). Temos que
servir essas duas formas do Senhor. Nem as Deidades, nem os livros são
propriedade particular”.
Em certo sentido, o estudo do sastra não pode ser algo somente
intelectual, deve envolver um forte sentimento de entrega ao sadhu, sem
isso, nosso estudo não produzirá frutos tangíveis. Poderíamos ler muito,
aprender de memória muitos versos, mas sem um adequada ocupação no
serviço ao vaisnava, tudo se tornará infrutífero. Srila Prabhupada
Bhaktisiddantha Sarsavti Thakur não permitia que seus seguidores lessem
de forma independente, ele dizia que sempre deveriam ler sob a guia de
um vaisnava e imbuídos de uma atitude de serviço, do contrario não
passaria de um exercício intelectual. Ele foi bem enfático nesse assunto.
Srila Bhakti Sundar Sripada Bhagavata Maharaj, na sua vida de
casado, tinha sido um médico e também um erudito em conhecimento
secular. No entanto, como não tinha uma base sólida em sastra jnana
(conhecimento da escritura), impressionou-se pela erudição nos sastras
por Srimad Bon Maharaj e Srimad Bharati Maharaj, desejou aprender com
eles. Humildemente pediu a Srila Prabhupada Bhaktisiddhanta que
gostaria de aprender as escrituras da parte deles. Srila Prabhupada o
enviou a Ramadasa Prabhu.
Nesse momento, Sripada Bhagavata Maharaj não conhecia seu
anfitrião. Depois de ter perguntado a outros devotos sobre o seu paradeiro,
ele foi enviado ao uma plantação de folhas que seriam trabalhadas a mão
para virarem pratos ecológicos (e ancestrais). Ramadas não se assemelhava
a um pandita (sábio), e o sannyasi fico um pouco confuso. O próprio
Ramadasa disse que era um iletrado, ignorante e que talvez pudesse ter
acontecido algum engano.
Então, o monge renunciante foi de novo onde Prabhupada
Bhaktisiddhanta, que o mandou de forma humilde a se aproximar de
Ramadasa e pedir-lhe instruções. Ramadasa, finalmente revelou em uma
simples mas penetrante instrução sua realização prática do princípio de
sevonmukhe hi jivadau: “Eu simplesmente tento produzir flores e frutos
para oferecer ao Senhor, por fazer isso, eu sinto que estou sempre
cantando o Santo Nome. Eu considero isso o sucesso de minha vida.”
Nesse momento, o Maharaja retornou a seu Gurudeva, o qual comentou
que a realização de Ramadasa Prabhu era a essência da filosofia Bhagavata
e citou o Srimad Bhagavatam (4.24.30):
etāvaj janma-sāphalyaṁ
dehinām iha dehiṣu
prāṇair arthair dhiyā
vācā śreya-ācaraṇaṁ
sadā
“Sacrificar a própria vida, riqueza, intelecto e falas para o
benefício dos outros é o modo mais elevado de conduta dos seres
condicionados. A pessoa deve sempre atuar de tal maneira que faça
um sucesso o seu nascimento humano”.

Na carta acima citada, podemos ver a preocupação de Srila Guru


Maharaj com os dois aspectos que tinham grande importância em sua
existência. Tanto a Deidade quanto os livros foram sua vida e alma,
estiveram muito conectados com ele, como se fossem parte de seu próprio
ser. Em um momento em que foi viajar para um local distante, pensou que
a morte poderia chegar e logo veio em mente os livros que havia
guardados

Capítulo 24
UM COMPORTAMETO IMPECÁVEL
Srila Guru Maharaj jamais ansiou ter muitos discípulos, sempre
desejou ter uma Math (nesse caso missão) pequena. Mas devido a sua
fama como param bhagavat (devoto excelso) muitas pessoas viam vê-lo
de todos os lados da Índia e do mundo. Srila Gurudeva era sempre
afetuoso, respeitoso e hospitaleiro, percebia-se que estava muito feliz em
poder recebê-los.
Em alguns momentos, sentiu que não possuia nada a oferecer.
Sempre dizia: “Todas essas pessoas estão atraídas por Srimam
Mahaprabhu e Gurudeva. Mas o que eu posso dar à elas? Eu não consigo
falar um bom Inglês. Se algum dos residentes da Math sabe um pouco de
Inglês, então eu posso falar para os visitantes que podem escutar a
tradução – ficarão felizes com isso.”
Sua humildade era espontânea, não necessitava fazer nenhum
esforço. Como pode alguém estar orgulhoso, se ele vê os outros como seus
superiores? Em sua visão, ele via a todos como seus superiores. O fato é
que ele tinha um bom Inglês, mas devido a sua humildade, pensava que
seu conhecimento não era suficiente. Muitas vezes falava em Inglês e as
pessoas ficavam surpreendidas.
Mas muitos que viam visitá-lo, estavam felizes simplesmente por
vê-lo, não precisavam escutar nada. Eram felizes de prestar suas
dandavats (reverências) e receber sua misericórdia e bençãos. Apenas por
ter obtido seu darsana (visão, por ver a Srila Bhakti Pramode Puri
Maharaj), eram imediatamente atraídos por sua humildade, sua
simplicidade e natureza afetuosa. Muitos dos discípulos de seus irmãos
espirituais viam à ele para oferecer seus dandavats e escutar dele sua
pregação. Outros viam a ele para inquirir a respeito de tópicos espirituais.
Srila Bhakti Aloka Paramadvaiti Maharaj, que muitas vezes esteve
com Srila Gurudeva em seu quarto no tempo que residiu na Índia, comenta
a respeito da humildade de Srila Guru Maharaj: “Srila Sridhara Maharaj
dizia que gostava de sempre permanecer no fundo, sempre atrás. Mas Srila
Puri Maharaj não falava nada e já ficava atrás”. Outro fato que ilustra essa
situação, era quando por algum motivo iam tirar fotos na Gaudiya Math,
dizem que Gurudeva sempre gostava de ficar no fundo das fotos, onde não
aparecesse.
Durante toda a sua vida, Srila Guru Maharaj escreveu muitos
artigos para a Gaudiya (Revista) sem colocar seu nome neles. Muitos
artigos escritos por outros estavam também baseados nas notas que fazia
quando Srila Prabhupada Bhaktisiddhanta dava suas leituras.
O Caytania-caritamrta (Madhya 4.146-147) nos diz:
pratiṣṭhāra svabhāva ei jagate vidita ye
nā vāñche, tāra haya vidhātā-nirmita
pratiṣṭhāra bhaye purī gelā palāñā
kṛṣṇa-preme pratiṣṭhā cale saṅge
gaḍāñā

“Apesar de uma pessoa não gostar disso, reputação, como ordenada


pela providência, vem para ele. De fato, sua reputação transcendental
é conhecida através do mundo inteiro. Estando com medo da
reputação (pratistha) Madhavendra Puri fugiu de Remuna. Mas a
reputação pelo amor de Deus é tão sublime que vai junto com o
devoto, como se estivesse seguindo ele.”

Madhavendra Puri Pada chegou a um templo e viu o pujari


(sacerdote que serve as Deidades no altar do templo) oferecendo uma
preparação de arroz doce para a Deidade. Quando viu que a preparação
parecia saborosa, pensou que se pudesse aprender como cozinhar, talvez
pudesse oferecer para sua Deidade. Então, nesse momento, sentiu que
poderia ter desejado a oferenda da Deidade (desfrutar do que deve ser
desfrutado pelo Senhor é egoísmo e prejudicial). Nesse momento, ele saiu
do templo sentido-se muito mal.
Quando o pujari foi dormir, a Deidade apareceu no sonho disse-lhe
que havia separado um pouco da oferenda de arroz doce que estava
escondido embaixo do altar e que era para levar a preparação para
Madhavendra Puri. Quando o pujari acordou e foi procurar pela
preparação – realmente estava lá! Ficou atônito e saiu gritando bem alto:
“Quem é Madhavendra Puri? A Deidade roubou o arroz doce para você.”
Quando Madhavendra Puri soube disso e pegou a prasadam que a Deidade
havia roubado para ele. O primeiro que pensou foi fugir daquele lugar para
que ninguém se aproximasse dele e o glorificasse, tinha medo da fama.
Srila Bhaktisiddhanta Sarasvati Thakur Prabhupada dizia a verdadeira
humildade é estar livre do desejo de desfrute. Se usamos os objetos que
são destinados para servir Krishna para nosso propósito, apesar de
estarmos aparentemente ocupados ao serviço do Supremo, não estaremos
realmente sendo humildes, não conseguiremos ser mais baixos que a palha
na rua, não teremos posição tangível dentro do mundo da devoção.
Se eu não consigo cantar minhas voltas de japa todos os dias, se
não consigo me ocupar em Hari-bhajana (canto instrospectivo do mantra),
em Hari-katha (conversas sobre Krishna) e Hari-seva (serviço a Krishna)
não conseguirei ser humilde. A humildade genuína me leva a entender que
não consigo me aproximar da Verdade Absoluta por meios materiais, que
devo que deixar de lado a preguiça e a avareza. Se queremos nos
aproximar desse aspecto transcendental devemos deixar de lado toda nossa
propensão sensorial e simplesmente render serviço com os sentidos
purificados.
No Bhakti-rasamrta-sindhu (1.2.234) descreve-se como
poderíamos vislumbrar esses tópicos:
ataḥ śrī-kṛṣṇa-nāmādi
na bhaved grāhyam indriyaiḥ
sevonmukhe hi jihvādau
svayam eva sphuraty adaḥ

“Os sentidos materiais não podem apreciar o Santo Nome,


forma, qualidades, e passatempos de Krishna. Quando a alma
condicionada é desperta pela consciência de Krishna e rende serviço
para usar a língua para cantar o Santo Nome e provar os remanentes
do Senhor a língua é purificada e a pessoa gradualmente começa a
entender quem é Krishna realmente.”
Em outras palavras, o Santo Nome nunca pode ser agarrado pelos
sentidos materiais. Apenas por render serviço devocional, começando com
a vibração das glórias do Senhor - Ele mesmo poderá se revelar para a
alma sincera.
Vários grupos de devotos de outros Maths viam até Srila Guru
Maharaj para esclarecer algum argumento ou conseguir suporte a favor de
seu próprio argumento, porque eles sabiam que a instrução dada por ele
seria respeitada por todos. Em semelhante situação, ele falava
cuidadosamente, meditando em cada palavra. Era impossível não notar a
firmeza que a respeito do que conhecia como sendo a verdade, e qual
reservado era em relação aquilo que ele não.
Quaisquer devotos que vinham à ele, independente da missão a que
pertennciam, não questionavam sua honestidade, objetividade e justiça.
Qualquer um que perguntasse a ele direta e sinceramente, receberia uma
resposta direta e sincera. Todos sabiam que não era possível receber um
julgamento preconceituoso ou emotivo dele, tampouco era evasivo a
respeito do que entendia como sendo a verdade. Não tinha favoritos nem
inimigos. Falava a verdade como conhecia, baseada na evidência e
injunções escriturais.
Uma vez um grupo de devotos ocidentais veio visitar a Srila Guru
Maharaj. Começaram a fazer diversas perguntas a Gurudeva e de certa
maneira acabaram pressionando-o muito. Quando já estavam de saída,
Srila Gurudeva disse, “Eles são muito bons para formular perguntas, mas
não são muito bons para obter as respostas.” Nas entrelinhas, esse
comentário levava um questionamento interno, os interlocutores estavam
ávidos por obter muitas respostas, mas não queriam aceitar as respostas, ou
seja, não estavam muito interessados em colocar em prática tudo aquilo
que estavam aprendendo. Na realidade o fator mais importante da vida
devocional, está em aplicar aquilo que estamos aprendendo, do jnana
(conhecimento) para o vijnana (conhecimento sublime, realização). Esse é
o aprendizado que o discípulo honesto deve estar aceitar se deseja avançar
em Hari-bhajana.
O Srimad Bhagavatam (7.5.23) fala a respeito dos melhores ramos
de Bhakti:
śravaṇaṁ kīrtanaṁ
viṣṇoḥ smaraṇaṁ
pāda-sevanam
160
arcanaṁ vandanaṁ
dāsyaṁ sakhyam ātma-
nivedanam

“Escutando e cantando a respeito do transcendental Santo Nome,


forma, qualidades, parafernália e passatempos do Senhor Visnu,
relembrando, servindo os pés de lótus do Senhor, oferecendo ao
Senhor respeitosa adoração com dezesseis tipos de parafernália,
oferecer orações ao Senhor, se tornando Seu servo, considerando-O
como o melhor amigo e rendendo tudo `a Ele (em outras palavras
servindo-O com corpo, mente e palavras) esses nove processos são
aceitos como o serviço devocional puro.”

Escutar com grande atenção, isso é a primeira qualificação que se


espera de um inquiridor honesto que tem interesse em aplicar todas os
meios disponíveis para mudar o seu ângulo de visão na vida espiritual.
Não basta escutar, temos que começar a cantar, a adorar, sempre se
lembrar do Senhor, essa é a perfeição da vida, começando com as funções
fundamentais da devoção até chegar a entrega total.
No Srimad Bhagavatam (11.20.29) encontramos:
proktena bhakti-yogena
bhajato māsakṛn muneḥ
kāmā hṛdayyā naśyanti
sarve mayi hṛdi sthite

“Dessa forma, uma pessoa inteligente irá Me adorar com bhakti yoga e
entendendo que gradualmente todos os desejos materiais em seu
coração irão desaparecer, na medida em que Me situo em seu
coração”.

A prática do serviço devocional vai levar o sadhaka a


gradualmente a limpar o coração. Essa limpeza somente poderá acontecer
pelo canto dos Santos Nomes. Se queremos perguntar a respeito do serviço
devocional, temos que nos preparar para colocar em prática as instruções
que o sadhu está nos dando e começar a cantar.
Srila Guru Maharaj disse que o Santo Nome possui todas as
potências para satisfazer os desejos, e pode fazer o impossível acontecer.
Se alguém toma refúgio no Santo Nome com fé, o Senhor Supremo na
forma do Seu Nome salvará esta pessoa.
Sempre que Srila Guru Maharaj não estava escrevendo, lendo ou
dando Hari-katha, estava cantando. Mesmo quando mostrou seu
passatempo de estar gravemente doente e teve que ser hospitalizado, nunca
parou de cantar o Santo Nome. Seus doutores e enfermeiras ficaram
maravilhados. Se sentiram muito afortunados por atenderem semelhante
santo. Nunca o trataram como um paciente comum, mas com o mesmo
tipo de amor e reverência que dariam para seu guru. Alguns desejaram
tomar iniciação dele, mas como de costume, era relutante em aceitar
discípulos. Estava sempre instruindo aos seus discípulos para cultivar um
apego pelo Santo Nome, para cantar o máximo possível e regularmente
aumentar o número de voltas.
Ele disse: “Você deveria cantar Hari Nama o tanto quanto possa.
Seja apegado ao Hari Nama. Em quanto canta o Nome de Hari, não pense
em nada mais além de Hari. O apego pelo Santo Nome resultará num
apego por Krishna. Porque o Santo Nome e Krishna não são diferentes. O
sintoma de suddha-nam (nome puro) é que a língua não deseja abandonar
o Nome. Noite e dia o sadhaka não pode pensar em nada além de Krishna.
Será que estamos aceitando o Santo Nome desta maneira?”
Então ele continuava “Algumas vezes, quando cantamos o Santo
Nome ou escutamos Hari-katha, alguma emoção pode vir; algumas
lágrimas podem aparecer. Em nenhum momento podemos pensar 'ó me
tornei um grande devoto.' Tão logo pensamos assim, isso será a causa da
nossa queda.”
Uma vez, um jovem sannyasi (renunciante) da ISKCON (a família
espiritual fundada por Srila A. C. Bhaktivedanta Swami) veio para ver a
Srila Guru Maharaj e disse-lhe: “Você sabe, Maharaj, muitos gurus da
ISKCON tem caído, e seus discípulos vem para tomar refúgio em mim”.
Srila Gurudeva o olhou seriamente e comentou: “Se você pensa que é um
guru, então não é um guru”.
Srila Gurudeva estava sempre advertindo a seus discípulos que se
na busca do serviço devocional, alcançam o sucesso, o orgulho não deveria
nascer em seus corações. O orgulho sempre vem antes da queda. O
sucesso deveria ser conseguido com humildade e gratidão. Qualquer
sucesso na vida pessoal ou sucesso da missão, não existe necessidade de
espalhar ou exagerar essas performances. O Senhor Supremo conhece
todas as coisas.
O orgulho mata a trepadeira da devoção (bhakti-lata). Os vaisnavas
não se desviam do seu caminho para para falar a respeito do seu serviço ou
de sua prática diária. Na medida do possível, mantém seus serviços em um
humor interno de devoção. Eles revelam seus corações apenas na
associação privada com uma intimidade fraternal. A vida devocional não é
um campo de negócios e prática devocional não é algo que deve ser
revelado sem critério.
Uma das características do vaisnava é a simplicidade. A prática da
bhakti yoga leva ao amolecimento do coração e sendo assim, o orgulho
não tem mais espaço nesse âmbito. Quanto maior for o avanço do
sadhaka, maior será sua simplicidade. Entendendo que tudo o que é obtido
na consciência de Krishna não nos pertence, porque não possuímos
independência. Se formos analisar, tudo o que realizamos nessa esfera é
dada pelo plano superior, somos nutridos por esta força e completamente
dependentes da sua misericórdia.
Entendemos que não possuímos nada em uma conta separada, tudo
que realizamos no serviço à Krishna, não é um monopólio nosso e sim
uma concessão que chegou para nós através do plano superior, nesse
sentido, não podemos pensar em termos de “meu serviço” e sim de um
privilégio que foi concedido para nós em forma do serviço.
Srila Sridhar Maharaj diz que primeiramente devemos orar pelo
serviço antes de executá-lo. Contudo, geralmente fazemos o contrário, ou
seja, primeiro fazemos o serviço e nesse momento oramos pela ajuda. Mas
o que deveríamos fazer é orar para que o serviço venha para nós e para que
possamos ser somente o instrumento.
O Narotama das Thakur aconselha em sua canção Prarthana:
golokera prema-dhana, hari-nāma-saṅkīrtana,
rati nā janmila kene tāya
saṁsāra-viṣānale, divā-niśi hiyā
jvale, juḍāite nā kainu upāya

“O tesouro do amor divino em Goloka Vrindavana desce na forma


congregacional do canto do Santo Nome do Senhor Hari. Porquê
minha atração por esse canto nunca apareceu? Dia e noite meu
coração queima no fogo venenoso da existência mundana. E eu não
tenho meios de me aliviar disso.”

Uma vez, em Sri Mayapur, Srila Guru Maharaj sentiu um grande


desconforto, pensando que um dos seus discípulos estava guardando
pensamentos inapropriados em seu coração. Então, Srila Gurudeva
chamou-o à parte para indagar sobre os seus sentimentos, ele admitiu que
estava tendo pensamentos inapropriados e mendigou o perdão de Sri Guru.
Ele ficou surpreso e emocionado que Srila Gurudeva pudesse ter lido a sua
mente, uma vez que não havia revelado seus pensamentos a ninguém.
Temos que evitar a todo custo a duplicidade na vida devocional. Nossa
vida tem que ser um livro aberto, sem esconder nada a ninguém, querendo
sempre limpar o coração, o vaisnava busca a pureza de caráter acima de
qualquer coisa. Sendo assim, tudo começa pela mente, na medida em que a
mente se torna limpa, o coração vai se purificando cada vez mais. A
natureza do vaisnava é a simplicidade. No Caitanya-caritamrita, (Madhya-
lila 15.274) encontramos:
sahaje nirmala ei 'brāhmaṇa'-hṛdaya
kṛṣṇera vasite ei yogya-sthāna haya

“O coração do brahmana é por natureza muito limpo; sendo assim, é


um local apropriado para Krishna estar situado.”
A honestidade é um dos pilares da devoção, é um fator de proteção
para que o sadhaka possa progredir na sua escalada espiritual. Entre os
devotos sempre deve haver transparência nas relações, isso é o mais
importante. No Upadesamrta (verso 4) está descrito :
dadāti pratigṛhṇāti guhyam ākhyāti pṛcchati
bhuṅkte bhojayate caiva ṣaḍ-vidhaṁ prīti-laka
ṣ ṇam

“Oferecendo presentes em caridade, aceitando presentes como


caridade, inquirindo em confidência, aceitando prasadam (alimento
espiritual) e oferecendo prasadam - são seis sintomas de amor que são
compartilhados entre os devotos. “

Srila Gurudeva dizia que um devoto não poderia ter algo dentro do
seu coração e dizer algo diferente. Ele não deve usar de malícia,
deturpando suas palavras com diplomacia e falando diferentes em distintos
lugares somente por diplomacia. Ele sempre falou contra kuti-nati
(comportamento enganoso, diplomacia e duplicidade), isso destrói a
trepadeira da devoção. Srila Jagadananda Pandit, em seu Prema-Vivarta
diz:
“Se quer adorar ao Senhor Gauranga, torne seu coração simples e franco.
Adore aos pés de lótus do Senhor Gauranga, abandone o engano e a
duplicidade. Simplesmente dizer, ‘Eu pertenço a Gauranga, eu pertenço a
Gauranga’ - somente pronunciar isso com os lábios, não é suficiente. Os
frutos virão seguindo o exemplo de suas ações e sentimentos apropriados.”

Quando alguma doação chegava às mãos de Guru Maharaj ,


colocava em sua cabeça e dava de volta a seus discípulos. Nem procurava
saber quanto havia ganhado, nem se preocupava como seria gasto a doação
(pela confiança que sentia em Krishna e em seus discípulos). Por sua
conduta e pregação, sempre procurava que as coisas ficassem muito claras
para preservar a pureza do comportamento vaisnava dentro do Math e
dizia: “Na maior parte da minha vida eu fui muito pobre, mas digo a vocês
que a pobreza foi favorável para a minha vida espiritual.”
Uma vez quando Srila Guru Maharaj estava sentado em seu quarto
em Mayapur, um dos seus discípulos perguntou-lhe como o Math seria
mantida no futuro. Srila Gurudeva respondeu “Nós devemos
primeiramente manter nosso bhajana e pregar; então, o Senor Gopinath irá
manter o Math”. E olhando pela janela, continuou: “Esta manhã um
pássaro estava sentado do lado de fora da minha janela. Eu tinha muito
desejo de alimentá-lo com um pouco de prasadam. Mas o pássaro estava
fora do meu alcance. O que eu poderia fazer? Em poucos momentos eu vi
o pássaro dentro do meu quarto, no meu piso, dei-he um pouco de
prasadam e ele comeu ali. Na verdade ele foi alimentado pelo Senhor
Gopinath, ele é o Senhor do universo. Ele alimenta até os pássaros.
Porque nós deveríamos nos preocupar com isso? Sri Gopinath irá cuidar de
nós.”
A única necessidade que temos está em conseguir alcançar uma
consciência altamente elevada, somente ali poderemos encontrar nossa
verdadeira necessidade da existência: felicidade, êxtase e amor divino.
Toda nossa busca deveria ser baseada nesses prospectos, não podemos
prescindir destes fatores, são essenciais para promover a verdadeira
nutrição que ansiamos.
Na realidade, não queremos nada deste plano viciado da existência,
somente desejamos aquilo que é real para o plano da alma. Quando nos
empaturramos com coisas do mundo material, ficamos intoxicados com as
distrações que nos são apresentadas através da energia ilusória, então com
muita propriedade, Srila Gurudeva nos diz que é preferível a pobreza ao
esbanjamento desenfreado dos objetos dos sentidos.
Inclusive, ele mesmo escreveu em seu diário, relatando sua
ansiedade de que quando tinha que receber um determinado convidado e
não havia quase nada para servir aos demais, Srila Gurudeva jejuava e
esperava que as provisões chegassem para que fosse feito os arranjos para
servir ao convidado. De uma maneira muito singela, ele explica como
ficou satisfeito, depois que seu convidado foi-se feliz.
Sua compaixão não tinha limites, podia se sacrificar pelos demais o
quanto fosse necessário. Sacrificava seu tempo, seu sono, sua liberdade,
simplesmente para que os demais ficassem satisfeitos. Até mesmo os
animais eram alvo de sua compaixão.
Certa vez, quando Guru Maharaj foi a sua casa natal em
Ganganandapur, a sua família tinha duas vacas. Uma era mais velha e
outra bem mais nova e dava muito leite. Srila Gurudeva tinha o costume
de ficar na varanda do templo da casa. Então ele escutou sua mãe dizer
para a sua filha adotiva “Bouma, certifique-se de cuidar da vaca que dá
leite. Se você não cuidar da que não dá leite, tudo bem, isso é
comprensível.” Então Srila Gurudeva disse a sua irmã adotiva “Sim,
Bouma, em sua casa também existe uma mulher velha que não necessita
de muitos cuidados, não é necessário cuidar bem dela”. Escutando isso,
sua mãe pensou e ficou envergonhada pelo que havia dito.
Uma vez, nasceu um bezerro no gosala (local especial destinado as
vacas, comum na Índia) do Math. Quando Gurudeva ficou sabendo do
fato, disse, “Traga o bezerro para mim; eu vou dar para o Harinama
mantra para ele”. Os devotos trouxeram-no, Srila Gurudeva cantou-lhe
Harinama mantra e deu-lhe um pouco de prasadam (alimento espiritual).
Uma vez um suposto devoto que estava algum tempo morando no
Math e que tinha o serviço de administrar o laksmi (nesse caso, dinheiro)
do templo, acabou roubando todos os fundos do templo e fugindo com
tudo que havia roubado. Quando Srila Gurudeva foi informado a respeito
do acontecido, ele disse, sem se perturbar de nenhuma maneira, “Um
ladrão (Krishna) me deu e outro ladrão ( Krishna) me roubou.” Essa era
sua consciência, ver a Krishna em tudo.
Em uma ocasião, Srila Guru Maharaj estava dançando em frente a
carruagem do Senhor Jagannatha, e um batedor de carteiras veio e tirou
um pouco de dinheiro de seu bolso. Um brahmacary (monge) vendo o
incidente, agarrou o ladrão pelo braço e gritou: “Eu consegui agarrá-lo!”
Srila Gurudeva ao invés de estar satisfeito, o repreendeu: “Se ele deseja
pegar o dinheiro, não tem problema, entregue para ele.” A razão disso, é
que Srila Gurudeva não queria que ninguém atrapalhasse o seu humor
devocional. O brahmacary por seu lado, pensava “Primeiro de tudo, Guru
Maharaj é um sadhu e depois ele não é rico, sendo assim, é meu dever
proteger seu dinheiro.” Srila Guru Maharaj pedia que o ladrão fosse
libertado e ficou feliz isso aconteceu.
O Srimad-Bhagavatam (1.8.26) aconselha:
janmaiśvarya-śruta-śrībhir
edhamāna-madaḥ pumān
naivārhaty abhidhātuṁ
vai tvām akiñcana-
gocaram

“Aqueles que estão intoxicados pelo falso ego, devido a seu bom
nascimento, fortuna, erudição, conhecimento e beleza não podem
chorar e gritar Seu nome com um sentimento sincero. Apenas aqueles
que são materialmente desprovidos podem cantar os Seus nomes com
pureza.”

Em seu Math não fazia distinção entre pessoas ricas e pessoas


pobres, nem quem dava muitas doações ou quem dava pouca doação. Ele
não se preocupava com isso, ele via a sinceridade em cada pessoa, seu
nível de devoção. Em uma carta, Srila Gurudeva escreveu “Eu não quero
nenhum dinheiro ou presente daqueles que são contra minhas decisões e
princípios“. Ele também dizia que se a artha (riqueza) não for usado para
o serviço a Hari, Guru e vaisnavas, então, se torna causa de anartha (maus
hábitos, impedimentos e infortúnios).
Uma vez, um rico comerciante que frequentemente dava boas
doações para o Math, de certa maneira começou a ofender a Srila Bhakti
Ballabh Tirtha Goswami Maharaj (discípulo sucessor de seu querido irmão
espiritual Srila Madhava Maharaj), e quando Srila Gurudeva ficou sabendo
desse fato, deixou de aceitar as doações. O senhor ficou surpreendido e
implorou para que Gurudeva aceitasse a novamente suas doações. Mas
Srila Gurudeva foi relutante e respondeu, que não aceitaria nem mais um
centavo dele e não queria olhar em seu rosto por causa da ofensa que
havia cometido ao vaisnava. Então o senhor começou a chorar implorando
perdão. E Gurudeva continuou explicando que a menos que fosse pedir
desculpas ao vaisnava que havia ofendido e que fosse perdoado, ele não
poderia aceitar nada que vinha da sua parte.
O Caitanya Bhagavata (Madhya-kanda 4.375-377) nos explica a respeito
do destino dos ofensores:

prabhu bale, vaiṣṇava nindaye yei jana


kuṣṭharoga kon tāra śātiye likhana
āpātataḥ śāstri kichu haiyāche mātra
āra kata āche yama-yātanāra pātra
caurāśī sahasra yama-yātanā
pratyekse
punaḥ punaḥ kari" būñje vaiṣṇava-nindake

“Mahaprabhu disse: ‘está escrito que todo aquele que blasfema os


vaisnavas sofrerão de lepra, depois seráo punidos pelos agentes de
Yamaraja (senhor da morte), uma e outra vez, em milhares de
nascimentos.”

O Skanda Purana também ilumina sobre esse ponto:


nindāṁ kurvanti ye
mūḍhā vaiṣṇavānāṁ
mahātmanām patanti
pitṛbhiḥ sārdhaṁ
mahā-raurava-saṁjñite

hanti nindati vai dveṣṭi


vaiṣṇavān nābhinandati
krudhyate yāti no harṣaṁ
darśane patanāni ṣaṭ

“Os tolos que blasfemam os vaisnavas irão para o pior tipo de inferno
junto com suas gerações de ancestrais. Aquele que mata um devoto,
assim como aquele que blasfema aos devotos ou aquele que é invejoso
dos devotos, ou aquele que deixa de oferecer reverências aos vaisnavas
depois de vê-los, ou aquele que se torna irado com os vaisnavas, ou
aquele que não se torna feliz ao ver um vaisnava - essas seis classes de
homens são todos candidatos a caírem no inferno”.

Capítulo 25
ASSOCIAÇÃO MUNDIAL VAISNAVA

Onze anos depois do desaparecimento de Mahaprabhu, seis estrelas


apareceram em Sri-Vraja-mandala (Vrindavan) e se ocuparam em
estabelecer o serviço de criar uma associação vaisnava para representar os
ensinamentos de Sri Mahaprabhu. Eles foram conhecidos como os
Goswamis de Vrindavana. Além deles, muitos outros mahatmas (grandes
almas) encabeçados por Bhugarba Gosvami, Srila Lokanatha Gosvami e
Srila Kasisvara Gosvami contribuíram. Sessenta e quatro associados de
Gourasundara e doze associados de Sri Nityananda Prabhu incrementarem
a beleza dessa associação.
A palavra Goswami nos remota a uma pessoa que tem domínio
completo dos seus sentidos, ou literalmente, aquele que é “senhor dos
sentidos.” Eles foram sadhakas (praticantes) perfeitos e podemos dizer
que são os arquitetos de nossa sampradaya (família, ramo espiritual)
porque: estabeleceram através de seus livros, das descobertas dos locais
sagrados dos passatempos de Radha Krishna e da construção de templos e
instalação das principais Deidades de nossa linhagem. Os escritos serviram
de referência para os Acaryas vaisnavas que vieram depois deles assim
como seus ensinamentos sobre os conceitos de sambandha (relações),
abhideya (procedimento) e prayojana (objetivo). Todo conhecimento
védico está contido nesses três seguimentos:
veda-śāstre kahe sambandha, abhidheya, prayojana
kṛṣṇa, kṛṣṇa-bhakti, prema,--tina mahā-dhana

“O conhecimento védico está subdividido em três partes conhecidas


como sambandha, abhideya e prayojana, esses três grandes tesouros
são Krishna, devoção por Krishna e amor por Krishna”.

Nesse contexto, o conhecimento estabele-se de forma consistente e


tendo em vista que muitas missões vaisnavas apareceriam, Srila Rupa
Goswami Pada pediu a Srila Jiva Goswami Pada que fundasse a Visva-
vaisnava Raj-sabha (Assembléia real da comunidade vaisnava unida de
todas as Sampradayas) para que todos os vaisnavas pudessem compartilhar
os seus conhecimentos e estabelecer relações amistosas entre si. Uma vez
que o vaisnava, independente de qual missão pertença, banha-se nas águas
sagradas do mesmo rio Yamuna e do Ganges, leem as mesmas escrituras,
cantam o Santo Nome em seus rosários de Tulasi, têm fé e honram
mahaprasadam.
Sendo assim, eles têm muito em comum e podem se beneficiar
enormemente quando se encontram em uma assembléia com o espírito
imbuído de união na diversidade. Srila Jiva Goswami Prabhu é
considerado o diretor primordial da sabha (assembléia) promovendo os
ensinamentos de Sri Rupa-Sanatana como Bhagavat-sandarbha, ou Sat-
sandarbha (dois livros de sua autoria).
Por tomar refúgio em Srila Raghunatha (um dos Goswamis de
Vrindavan mencionados anteriormente), Sripada Krsnadasa Kaviraja
Goswami Prabhu se tornou um dos diretores da Visva-vaisnava Raja-
sabha. E logo depois, Sri Narottama Thakur decorou a coroa da Visva-
vaisnava Raja-sabha.
Seguido dele, Srila Visvanatha Cakravarti Thakur espalhou sua
refulgência sobre. Depois que essas grandes almas partiram, e quanto mais
o tempo passava, mais o vaisnavismo foi envolvido por uma densa neblina
e os vaisnavas caíram no descrédito de todos, sem nenhuma possibilidade
de serem estabelecidos em sua posição sublime.
Em 1855, uma brilhante estrela do firmamento vaisnava surgiu
para restabelecer a Visva-vaisnava Raja-sabha. A partir desse ponto, a
corrente do vaisnavismo começou a jorrar novamente com toda força.
No dia 5 de Fevereiro do ano de 1919, no avirbhava-tithi (dia de
aparecimento) de Sri Visnupriya devi, no centro de Ultadingi Road, Srila
Sarasvati Thakur Prabhupada reestabeleceu a Visva-vaisnava Raja-sabha
(Associação Mundial Vaisnava).
Convenções da assembléia vaisnava eram feitas a cada ano em
Mayapur-dham depois do Navadvipa-dhama Parikrama tendo como
convidados de honra o rei de Tripura. Mas a principal iluminação desses
encontros foram as palavras de Srila Sarasvati Thakura Prabhupada, outros
sannyasis e líderes dos devotos. Outra característica desses encontros foi a
distribuição de títulos para os devotos que os mereciam, junto com
glorificações poéticas escritas em sânscrito por Srila Sarasvati Thakura e
outros. Esses louvores eram apresentadas aos devotos de maneira
individualizada na forma de asirvada-patras (elogios em sânscrito).
Depois do aparecimento da Gaudiya Math (missão fundada por
Prabhupada Bhaktisiddhanta), Associação Mundial Vaisnava continuou
como uma organização colateral, consistindo principalmente de membros

170
da Gaudiya Matha, mas também com devotos simpatizantes e tendo como
presidente a Srila Sarasvati Thakura Prabhupada.
O nome “Sri Gaudiya Math”, dado em 1920 por Srila
Bhaktisiddhanta Sarasvati Thakura Prabhupada para o centro de Ultadingi
Road, foi mantido quando houve a mudança para o Bag-Bazar em Calcutá.
Aproximadamente em 1922 com a expansão do movimento tornou-se mais
conhecido como Gaudiya Math, com cada nova assembleia também sendo
denominada como Gaudiya Math, ainda que para os assuntos legais
oficialmente o nome fosse Visva-vaisnava Raj-sabha (Associação Mundial
Vaisnava). Papéis formais e legais, boletins, endereços por exemplo eram
emitidos pela Associação Mundial Vaisnavas. Mas em publicações e
encontros públicos foi denominado como Gaudiya Math, um nome
consideravelmente mais fácil e curto para ser relembrado e pronunciado do
que Visva-vaisnava Raja-sabha.
Depois da partida de Srila Bhaktisidhanta Sarsvati Thakura
Prabhupada, muitos dos seus discípulos estabeleceram novas missões e
proeminentes Acaryas surgiram para derramar o prema dharma (dever do
amor divino) às almas condicionadas.
Mas foi através de Srila A.C. Bhaktivedanta Swami Maharaj
Prabhupada que o vaisnavismo ganhou proporções gigantescas em todo
mundo. Depois que ele fundou a ISKCON, muitas outras missões surgiram
dentro dessa missão. O propósito de unir os vaisnavas pairava no ar, então,
alguns vaisnavas se encontram em Vrindavana (Índia) com Srila Bhakti
Aloka Paramadvaiti Maharaj, Srila BV. Tripurari Maharaj e Srila Bhakti
Gourava Narasimha Maharaj para discutir a ideia de formar uma
associação mundial vaisnava. A ideia foi aceita com muito entusiasmo por
todos, mas devido a falta de tempo e clareza de propósitos, essa tentativa
de reviver a assembléia dos vaisnavas foi postergada.
Em 1993, Srila Bhakti Aloka Paramadvaiti Maharaj se aproximou
do vaisnava sênior mais exaltado do momento, Sua Divina Graça Srila
Bhakti Pramode Puri Goswami Maharaj pedindo que aceitasse ser
presidente da Visva-vaisnava Raja-sabha (Associação Mundial Vaisnava).
Guru Maharaja respondeu que era muito idoso para assumir um cargo de
tanta responsabilidade, e que com 97 anos de idade seria incapaz de
conciliar o seu serviço de Acarya da Gopinatha Gaudiya Math, sendo
assim, ele declinou o convite.
Mas Srila Bhakti Aloka Paramadveiti insistiu e dizendo-lhe que ele
não teria que fazer absolutamente nada, somente tinha que aceitar o cargo
(já que por sua santidade tudo se resolveria facilmente). E passou-lhe
todos os regulamentos previamente elaborados por ele ( Srila Bhakti Aloka
Paramadveiti ).
O mesmo relembra: “Pensei que Srila Puri Maharaj somente daria
uma olhada de forma superficial e depois me entregaria o documento, mas
não foi isso o que aconteceu. Ele examinou detalhadamente página por
página e depois de muito tempo, disse que iria pensar no assunto. Então,
depois de alguns dias eu voltei a sua Math e perguntei-lhe o que havia
decidido. Ele respondeu: 'Swami Maharaj (refereindo-se a Srila A. C.
Bhaktivedanta Swami Prabhupad) construiu uma ponte entre a Índia e
Ocidente, levando a consciência de Krsna para lá, Sridhara Maharaj
pregou para os mundos sutis e eu ainda não fiz nada. Por isso vou aceitar o
que você me propõe.”
Foi através dessa conexão que Srila Bhakti Aloka Paramadveiti
Maharaj conseguiu estabelecer uma ligação íntima com Guru Maharaj. Ele
mesmo conta que através desse serviço que tinha como secretário da
Associação Mundial Vaisnava podia entrar a qualquer momento no quarto
de Srila Guru Maharaj, podia conversar sem nenhum impedimento,
conseguindo oportunidades para estreitar os vínculos que os uniram pela
eternidade, o considerando como seu siksa-guru(guru instrutor) - estando
intimamente ligado com ele até o final dos seus passatempos aqui neste
mundo fenomênico.
Nos momentos finais dos passatempos manifestos de Srila Guru
Maharaj, Srila Bhakti Aloka Paramadveiti Maharaj estava visitando a Srila
Guru Maharaj com alguns dos de seus discípulos da missão Vrinda. Em
um momento, um devoto perguntou-lhe “Quando seu Guru partiu, você se
refugiou em Srila Sridhara Maharaj. Quando Srila Sridhara Maharaj foi
embora, você se refugiou em Srila Puri Maharaj. E agora quando Puri
Maharaj partir, em quem você irá se refugiar?” A resposta foi curta e
categórica: “Irei me refugiar em Sri Caitanya Mahaprabhu”.
No dia 14 de Novembro de I994 foi celebrado um encontro em
Vrindavana no Modi Bhavan - compareceram 120 pessoas e 28 Acaryas e
muitos sannyasis qualificados como membros fundadores da Associação
Mundial Vaisnava.
Nos três dias seguintes, um comitê de voluntários analisou todas as
propostas, as quais foram apresentadas pelo secretário (Srila Bhakti Aloka
Paramadveiti Maharaj) e aceitas com unanimidade.
No dia 18 de Novembro de 1994 o resultado foi apresentado em
uma assembléia geral junto com os estatutos da Associação Mundial
Vaisnava. O comitê assinou a respectiva autorização legal e o registro em
Agra foi consumado.

Capítulo 26
CONSELHOS AOS DEVOTOS CASADOS

Uma vez, uma família de discípulos americanos estava visitando a


Srila Guru Maharaj. Cada dia, Srila Gurudeva perguntava a respeito da
rotina de suas práticas, especialmente inquiria a respeito do cuidado que
tinha em relação à Deidade. No dia em que iam partir, Srila Gurudeva deu-
lhes uma carta indicando que procurassem determinado vaisnava, que lhes
conseguiria uma Govardhana-sila (Deidade automanifesta de Krishna)
para que pudessem adorar em sua casa.
Então, Srila Gurudeva deu muitas instruções sobre como poderiam
adorar a Govardhana-sila. Em Vrindavana, quando o casal de devotos
encontrou o vrajabhasi (habitante de Vrindavana), disse que não daria a
Govardhana sila a menos que visse a carta endereçada por Srila Gurudeva.
Quando a viu, colocou-a na cabeça com muito respeito e entregou a
Govardhana-sila imediatamente.
No Caytania-caritamrta, encontramos uma passagem em que Sri
Caitanya Mahaprabhu recebe uma Govardhana-sila trazida por um devoto
que vinha de Vrindavana. Sri Mahaprabhu começou a adoração a sua
Govardhana-sila com muito cuidado durante três anos consecutivos.
Depois o Senhor passou essa mesma Govardhana-sila junto com a gunja-
mala (colar que acompanha a Deidade), para que Srila Raghunnatha Das
Goswami pudesse se absorver na adoração, oferecendo todo o seu
alimento a Govardhana-sila.
Na realidade, os vaisnavas tradicionalmente adoravam-na de uma
maneira muito simples, apenas oferecendo um banho diário com oito
manjares de Tulasi devi em cada lado da Govardhana-sila, realizando os
respectivos aratis (adorações) e viajando com ela para aonde fossem.
Srila Guru Maharaj sempre encorajava seus discípulos casados a
adorar as Deidades, a se ocuparem em nama-sankirtana e servir aos
vaisnavas. Se os devotos chefes de família tinham Deidades em suas casas,
deveriam adorá-las com o mesmo amor e reverência que tinham pelas
Deidades no templo. Srila Gurudeva sempre dizia que as Deidades não
deviam ser tratadas como se fossem bonecos. O chefe de família deveria
ter uma responsabilidade adicional com a a adoração à Deidade, porque
representa que Krishna está no centro do lar e que tudo que será feito, visa
a satisfação do Senhor Supremo na forma de sat-cit-ananda-vigraha
(deidade).
No Caitanya Bhagavata encontramos (Madhya-khanda. 27.47):
Ara dui janma ei sankirtanarambhe
haiba tomara putra ami avilambe
mora arca-murti mata tumi se
dharani jihvarupa tumi se dharani
ei dui janma mora sankirtanarambhe
dui thani putra rahu avilambe

“O Senhor Caitanya disse a Saci: nascimento após nascimento você é


Minha mãe. Novamente neste nascimento, Eu vim a trazer o
movimento de sankirtana (inundação de amor divino em todo o
planeta) e sendo assim, tenho Me tornado seu filho. O Meu nascimento
neste mundo é de dois tipos: apareço como arcana-murti (deidade) e
como o Santo Nome. Desta forma, Eu apareço embaixo da língua na
forma do som e como a Deidade feito dos elementos desenhados da
terra. Em ambas as formas, Eu sou adorado, e nessas duas
características Eu tenho aparecido para espalhar o movimento de
sankirtana.”

Estar na vida familiar não constitui um empecilho para a prática


séria na adoração da Deidade e ao Santo Nome. Estar ocupado nessas duas
atividades é uma garantia que o chefe de família possui para obter o
sucesso desejado na vida espiritual. Não basta o cantar contínuo do Santo
Nome, ele deve tentar de todas as maneiras cantar concentradamente os
Nomes para que sua vida seja marcada com a auspiciosidade necessária
para se chegar a meta última da vida.
Srila Gurudeva deixava muito claro que não é suficiente para os
chefes de família enviar um pouco de dinheiro para o templo de tempo em
tempo. Se eles são iniciados por um Guru vaisnava, eles deveriam seguir o
comportamento em suas vidas diárias, que inclui o canto do Santo Nome,
ler as escrituras sagradas, cantar kirtanas, oferecer bhoga (alimentos que
ainda não são prasadam, espiritualizados) e aceitar prasadam (alimentos
que já foram oferecidos no altar), adorar as Deidades (se for o caso ),
observar Ekadasi, caturmasya e outros festivais vaisnavas.
O casamento não significa o fim da vida espiritual como pensam
determinadas pessoas. Apesar de algumas passagens as escrituras
glorificarem muito a vida renunciada, estimulando de forma muito intensa
a prática ascética. Em outras partes das escrituras vemos um estímulo
similar para que as pessoas permaneçam casadas e continuem adorando ao
Senhor Supremo de maneira contínua. Muitas vezes, escutamos
comentários nada apropriados em relação ao casamento, que de certa
maneira têm um sentimento de cunho negativo desestimulando a vida
marital. Entretanto, se os grhastras (casados) estão conscientes de sua
responsabilidade com as práticas espirituais apropriadas para o seu
desenvolvimento no plano da consciência, não terão que temer a vida de
casado, ao contrário, deveriam estar confiantes e animados com a
possibilidade de uma certa estabilidade para poderem seguir avançando
cada vez mais na Consciência de Krishna.
Quando Mahaprabhu foi pregar no sul da Índia, Ele visitou um
local sagrado, chamado de Kurma. Nessa cidade, vivia um brahmana
védico chamado Kurma Vipra. Ele levou a Mahaprabhu para comer em
sua casa. Junto com toda a sua família, ele serviu à Mahaprabhu com
muita devoção. Quando chegou o momento da despedida, não foi capaz de
suportar tamanho sofrimento. Ele caiu aos pés do Senhor e pediu para que
pudesse acompanhá-lo por todos os lugares. Sri Mahaprabhu respondeu da
seguinte maneira Caytania-caritamrta Madhya (7.127-129):

prabhu kahe,--"aiche bāt kabhu nā


kahibā gṛhe rahi' kṛṣṇa-nāma nirantara
laibā

yāre dekha, tāre kaha 'kṛṣṇa'-upadeśa āmāra


ājñāya guru hañā tāra' ei deśa

kabhu nā bādhibe tomāra viṣaya-taraṅga


punarapi ei ṭhāñi pābe mora saṅga"
“Nunca voltes a sugerir isso. Ao contrário, você deve ficar no lar e
cantar o Santo Nome de Krishna constantemente. Instrua a todos na
religião de Krishna. Por Minha ordem seja um mestre espiritual e
libere a todos nessa terra. Faça isso e nunca mais você será enredado
nas ondas da vida materialista. Certamente um dia terá minha
companhia novamente neste mesmo lugar.”

Os grihasthas (casados) jamais poderiam esquecer a devoção ao


Senhor Supremo, ao contrário, deveriam estar sempre pendentes de como
incrementar as suas práticas espirituais. O foco central deveria satisfazer à
Krishna através da consagração ao matrimônio em consciência de Krishna.
O Srimad Bhagavatam(11.19.18 ) nos aconselha:
karmaṇāṁ pariṇāmitvād
ā-viriñcyād
amaṅgalam vipaścin
naśvaraṁ paśyed
adṛṣṭam api dṛṣṭa-vat

“Uma pessoa não deveria se tronar apegada aos membros familiares,


não deveria se tronar iludido tentando mantê-los. Apesar de ser um
chefe de família, ele não poderia ser negligente em sua devoção ao
Senhor. Um chefe de família inteligente, deveria realizar que até a
esperança dos desfrutes não experimentados no futuro, bem como
aqueles que ele já experimentou, são todos temporários.”
putra-dārāpta-
bandhūnāṁ saṅgamaḥ
pāntha-saṅgamaḥ
anu-dehaṁ viyanty
ete svapno nidrānugo
yathā

“As relações com esposa, filhos, parentes e amigos são como as relações
entre peregrinos - os quais se encontram por acaso, descansando em um
local por algumas horas antes de irem embora. Quando alguém deixa o
corpo, para aceitar outro corpo, os amigos e parentes são esquecidos,
assim como se esquece tudo o que passou em sonho quando se desperta.”
O Srimad Bhagavatam (11.17.53) tambem diz
itthaṁ parimṛśan mukto
gṛheṣv atithi-vad vasan
na gṛhair
anubadhyeta
nirmamo
nirahaṅkṛtaḥ
“Tendo realizado a verdade de semelhantes relações transitórias, o
grhastha vive em sua casa assim como um peregrino, visitante, ou um
estrangeiro em terra estrangeira. Dedicando-se inteiramente para
Krishna e abandonando o apego ao seu corpo, parentes, casa, ele está
liberado ainda nessa vida.”

Srila Guru Maharaj sempre observava os Ekadasis (décimo


primeiro dia da lua nova e cheia) praticando nirjala upavasa (jejum
completo, sem tomar água ou ingerir alimentos), com constante canto e
Hari-katha por longo tempo. Ele não esperava que todos seguissem os
Ekadasis da maneira mas pelo menos que jejuassem de grãos e feijões
neste dia.
Esperava que seus discípulos observassem Ekadasi em completo
humor devocional. Nesses dias, o sadhaka deveria dedicar mais tempo em
cantar o Santo Nome e ler as escrituras sagradas. É um dia para evitar
tratar de assuntos mundanos, e passar o dia discutindo Hari-katha na
associação dos devotos. Nesse dia o Senhor deveria ser relembrado.
Diz-se que Ekadasi é o dia do Senhor, nesse sagrado dia, devemos
nos absorver ao máximo em tópicos transcendentais, esquecendo dos
demais afazeres. Ekadasi também é considerado como a mãe da devoção e
constitui uma das angas (partes) principais da devoção.
No Caytania-caritamrta (Madhya-lila 22.116 ), Sri Caitanya
Mahaprabhu instrui a Sanatana Goswami sobre a importância de se
observar Ekadasi :
kṛṣṇa-prītye bhoga-tyāga, kṛṣṇa-tīrthe vāsa
yāvan-nirvāha-pratigraha, ekādaśy-
upavāsa

“Uma pessoa deveria estar preparada para abandonar tudo para a


satisfação de Krsna, e deveria aceitar tudo para a satisfação de
Krishna; deveria viver em um local onde Krishna está presente, assim
como Mathura ou Vrndavana ou no templo de Krishna; deveria
adquirir meios de sobrevivência suficientes para manter o corpo e
alma juntos; deveria jejuar nos dias de Ekadasis.”
Srila Guru Maharaj frisava que seus discípulos grihasthas
deveriam seguir todos os principais festivais do calendário vaisnava:
Janmastami; Gaura-Purnima; Nityananda-trayodasi; Radhastami;
Balarama Purnima; aparecimento e desaparecimento de Srila Prabhupada
Saraswati Thakur, etc.
Nesses dias, os chefes de família deveriam estar completamente
engajados nos serviços necessários para a realização dos festivais. Os
grhastras viam ao templo não somente com o intuito de honrar a
prasadam, mas também de realizar algum serviço nesses dias tão especiais
para incrementar a devoção. Srila Gurudeva queria que seus discípulos
chefes de família abandonassem os hábitos que são desfavoráveis para a
devoção e cultivassem aqueles que são favorávei.
A canção de Srila Bhaktivinda Thakura, Saranagati (1.3-5) ensina:
dainya, ātma-nivedana, goptṛtve
varaṇa ‘avaśya rakṣībe kṛṣṇa’—viśvāsa,
pālana

bhaki-anukūla-mātra kāryera svīkara


bhakti-pratikūla-bhāva
varjanāńgikāra

ṣaḍ-ańga śaraṇāgati hoibe jāhāra


tāhāra prārthanā śune śrī-nanda-
kumāra

“Humildade, oferecendo a si mesmo ao Senhor, buscando Sua proteção,


tendo firme fé na proteção de Krishna, aceitando o que é favorável para o
serviço devocional, rejeitar o que é desfavorável para o serviço devocional
com grande determinação. Estes constituem o caminho sêxtuplo da
rendição exclusiva.”

Srila Gurudeva dizia que bhajan-jivan (vida devocional) ou bhakti-


lata (trepadeira da devoção) é a nossa posse mais preciosa. Sendo assim,
os devotos deveriam se proteger contra as ervas daninhas como a preguiça,
maus hábitos, vícios, distrações e vaisnava-aparadha (ofensa contra os
vaisnavas).
Primeiramente nós devemos eliminar esta existência mortal. Então
deveríamos satisfazer nossa razão, nossa consciência. E finalmente
satisfazer nossos corações. Dessa maneira poderemos progredir no
caminho da devoção. Queremos abandonar o fator morte de nossas vidas,
porque somos eternos, não podemos aceitar a ditadura da consciência
animal, que nos faz sempre morrer, queremos viver e não somente isso, ir
além, buscar alimentar nossa razão para que a verdadeira consciência
possa fluir dentro de nós. Até agora estamos sofrendo devido a nossa
doença material, mas se somos auxiliados em nossa caminhada,
poderemos iluminar nosso ser interno.
No Caytania-caritamrta (Madhya-lila, 22.14-15 ) :
kāma-krodhera dāsa hañā tāra lāthi khāya
bhramite bhramite yadi sādhu-vaidya pāya
tāṅra upadeśa-mantre piśācī palāya
kṛṣṇa-bhakti pāya, tabe kṛṣṇa-nikaṭa yāya

“E desta forma, a alma condicionada se torna a serva dos desejos


luxuriosos, e quando esses não são completamente satisfeitos, se torna
serva da ira e continua sendo chutada pela energia externa, maya.
Vagando e vagando através do universo, ele pode ter a chance de
obter a boa associação de um devoto médico, o qual o instrui nos
mantras, podendo assim escapar da energia externa. A alma
condicionada entra em contato com o serviço devocional ao Senhor
Krishna, e desta forma, pode se aproximar cada vez mais do Senhor”.

Srila Guru Maharaj dizia que os chefes de família necessitam


regularmente se associar para discutir Hari-katha. Os devotos deveriam
respeitar todos os devotos, servir a Gurudeva e aqueles que são mais
elevados, e especialmente os que são mais queridos para Gurudeva.
Em relação a isso, Srila Guru Maharaj citava o verso: chhariya
vaisnava-seva nistar peyechhe keva (“quem pode ser resgatado sem servir
aos vaisnavas”)? E acrescentava, quando tiverem a oportunidade para
pregar o bhagavat dharma (a consciência de Krishna) para outros,
deveriam fazer isso. Da melhor forma possível, aconselhava a terem um
contato com o Math e buscar servir a missão de Gurudeva. Eles deveriam
conduzir suas vidas baseando-se nas instruções de Gurudeva e não se
deixar levar por ideias baseadas na mentalidade mundana.
Srila Guru Maharaj também repetidamente enfatizava a
importância de comer somente prasadam. Os devotos chefes de família
iniciados deveriam tentar evitar comer comida preparada por não devotos
o tanto quanto possível. O ideal seria que cozinhassem todos os dias e
oferecessem o alimento às Deidades, ou na ausência de Deidades, para Sri
Guru.
Srila Gurudeva não comia nada que não fosse prasadam preparada
no templo. Quando estava pregando, cozinhava para si. Sripad Sundar
Gopal Prabbhu conta que quando Srila Guru Maharaj estava em sua casa
pregando, ele cozinhou para si. Nesse momento, ele tinha 76 anos de
idade.
Em certa ocasião, lhe serviram um pouco mais de prasadam em seu
prato. Então, Gurudeva castigou falando ao devoto que jamais fizesse isso
novamente. À noite, o devoto foi chamado e Gurudeva disse “Você com
certeza foi castigado por seus pais quando era pequeno. Eu também sou
seu pai, e você é minha criança, é por isso que eu castigo você”. Ele estava
chorando quando disse estas palavras!
Srila Gurudeva sempre enfatizava a importância da amabilidade.
Ele dizia: “os vaisnavas não são apenas vegetarianos, eles são amáveis
com todas as entidades vivas, incluindo animais e árvores, na realidade,
eles são amáveis com todo o meio ambiente. Quando uma pessoa ama a
Krishna, ele sente afeição com todo mundo, não apenas pelos seus amigos
e parentes”.
Afirmava “vasudhaiva kutumbakam” (o mundo todo é minha
família). Para viver neste mundo, os devotos fazem muitas tarefas. Mas
podem colocar Krishna no centro de suas vidas. Todo o dia, de manhã até
a noite, a vida da pessoa e pensamentos devem estar imersos em
consciência de Krishna. Se puder cultivar amor por Krishna e
sinceramente servi-Lo, sua vida sofrerá uma profunda modificação.
No Bhagavad-gita(9.27) encontramos:
yat karoṣi yad aśnāsi
yaj juhoṣi dadāsi yat
yat tapasyasi
kaunteya
tat kuruṣva mad-arpaṇam

“Ó filho de Kunti, todo o que você fizer, todo o que você comer, todo
que você der, assim como todas as austeridades que você praticar,
faça como uma oferenda à Mim.”

Srila Guru Maharaj observava que em algumas vezes os devotos

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experimentam extrema frustração, desamparo e desânimo em suas vidas.
Nesse momento é que eles deveriam orar sinceramente diante de Krishna.
E Srila Gurudeva finalizava: “cada momento em que eu chorei na frente
de Krishna, o Senhor sempre me respondeu.”
Ele esperava que seus discípulos tivessem filhos em consciência de
Krsna para aumentar o número de devotos em todo o mundo. O Srimad
Bhagavatam (5.5.18) indica:
gurur na sa syāt sva-jano na sa syāt
pitā na sa syāj jananī na sā syāt
daivaṁ na tat syān na patiś ca sa
syānna mocayed yaḥ samupeta-
mṛtyum

“Aquele que não pode liberar seus dependentes do caminho de


repetidos nascimentos e mortes nunca deveria se tornar mestre
espiritual, pai, esposo, mãe ou um semideus adorável”.
Srila Gurudeva queria que os pais educassem seus filhos. Ele não
era contra a educação material , ao contrário, ele sempre lamentava o fato
que não havia pessoas suficientemente educadas para se juntar na missão
de Sri Mahaprabhu. Ele queria que os pais dessem boa educação para as
crianças para encorajá-las em sua proficiência acadêmica e humor
filosófico. Se o conhecimento material pode ser alcançado enquanto se
mantém o foco na consciência de Krishna, então, qualquer conhecimento
material pode ser usado para servir Krishna.
O Bhagavad-gita(3.21) diz:
yadyadācarati śreṣṭhas
tattadevetaro janaḥ
sa yatpramāṇaṃ
kurute
lokastadanuvartate

“Qualquer ação que é praticada por um grande homem, homens


comuns seguem suas pegadas. E qualquer norma que se defina pelos
seus atos exemplares todo mundo também o segue.”

O Caitanya Bhagavata (Adi-khanda 12.49) indica:


pare kene lok Krsna-bhakti
janibare se yadi nahila tabe vidyay
ki kare
“Porquê as pessoas estudam? Para conhecer a respeito do caminho da
devoção à Krishna. Caso semelhante conhecimento não incremente
isso, então o que a boa educação pode trazer?”
E tambem Caitanya Bhagavata (Adi-khanda 13.178)
Sei se vidyar phal janiha niscahay
Krsna pada-padme yadi chitt-vitta
Ray

“Você deveria saber que a educação produz frutos se uma pessoa pode
oferecer seu coração e propriedade aos pés de lótus de Krishna”.

Srila Gurudeva também encorajou os pais a criarem uma atmosfera


de consciência de Krishna para seus filhos desde o começo. Os pais
deveriam encorajar os jovens a participarem da oração diária e festivais
vaisnavas. Seria muito bom se as crianças ouvissem histórias do Srimad
Bhagavatam(7.6.1), especialmente os passatempos de Prahlad Maharaj e
Sri Dhruva Maharaj. O próprio Prahlad Maharaj disse:
kaumāra ācaret prājño
dharmān bhāgavatān iha
durlabhaṁ mānuṣaṁ
janma tad apy adhruvam
arthadam

“Uma pessoa que é suficientemente inteligente deveria fazer um bom


uso da sua forma humana de vida desde o início. Em outras palavras,
na infância, desde a mais tenra idade, deveria praticar atividades do
serviço devocional, abandonando as outras ocupações. O corpo
humano é muito raro de ser alcançado, e apesar de temporário como
os outros corpos é significante por que na vida humana uma pessoa
pode alcançar o serviço devocional. Até mesmo uma pequena
quantidade de serviço devocional sincero pode dar a completa
perfeição”.

Capítulo 27
SEGUINDO A ETIQUETA
Srila Guru Maharaj estava sempre pendente das necessidades de
seus discípulos e ciente do bem-estar espiritual, emocional e físico deles.
Ele dizia: “todos os dias pela manhã, tão logo me levanto, oro para o bem-
estar de todos, independente de onde estejam”.
Quando algum devoto ficava doente, Srila Gurudeva orava para ele
e sempre perguntava a respeito de sua recuperação. Quando seus
discípulos ou discípulos dos seus irmãos espirituais vinham até ele para
oferecer dandavats pranams, no final da visita, ele cantava todo Nrsimha-
kavacha mantra para protegê-los.
Pessoalmente, lia todas as cartas que eram escritas para ele, e
pessoalmente respondia a cada uma delas. Jamais esquecia o nome de
alguém ou de algum fato, mesmo que o visse por uma única vez ou que
tivesse acontecido a dois ou três anos antes.
Quando por algum motivo Srila Guru Maharaj tinha que corregir
algum discípulo, logo depois, em outra oportunidade, ele o tratava de
maneira tão doce e suave que ao ouvir isso, o discípulo sentia que suas
palavras poderiam derreter pedras. Ele se dirigia aos seus discípulos de
forma muita carinhosa, aos homens lhe chamava de “baba” (senhor) e as
mulheres chamava de “ma” (mãe). Toda vez que lhe ofereciam alguma
prasada, falava alguma coisa que fazia os devotos sorrirem.
Um dos sintomas da prática do bhakti (devoção) é que o coração se
torna cada vez mais macio e naturalmente sentimentos de afeição
transbordam dentro do sadhaka para com todas as entidades vivas. Srila
Guru Maharaj personificava esses sentimentos e todos que chegaram a
conviver com ele puderam perceber sua doçura e amabilidade. O seu olhar
era tão tenro que era capaz de derreter até mesmo os corações mais
endurecidos.
Srila Guru Maharaj vivia completamente absorto no plano do
êxtase e aprofundando no plano da realidade divina. Ele não se satisfazia
com o aspecto formal, com a superficialidade, ao contrário, buscava a
essência em todas as coisas e somente conseguia ver o aspecto espiritual
da existência. Sua visão era equânime para com todos e transmitia o amor
à todos desde o fundo do seu coração. O Bhagavad-gita (5.18) expressa
essa visão equânime:
vidyā-vinaya-sampanne
brāhmaṇe gavi hastini
śuni caiva śva-pāke ca
paṇḍitāḥ sama-darśinaḥ

“O sábio humilde, em virtude de seu conhecimento, vê com visão


equânime um sábio e gentil brahmana, a vaca, o elefante, o cachorro e
comedor de cachorro”.

Também encontramos no Srimad Bhagavatam (3.25.21) referências


do caráter do devoto puro:
titikṣavaḥ kāruṇikāḥ
suhṛdaḥ sarva-dehinām
ajāta-śatravaḥ śāntāḥ
sādhavaḥ sādhu-bhūaṣ ṇāḥ

“Os sintomas de um sadhu são que ele é tolerante, misericordioso e


amigo de todas as entidades vivas. Ele não possui inimigos, ele é
pacifico, se guia pelas escrituras e todas as suas características são
sublimes.”
Mesmo quando possuía uma idade avançada, Srila Guru Maharaj
não deixava que uma mulher viesse ao seu quarto por conta própria. A
respeito disso, ele dizia “nós temos que obedecer as instruções de Sriman
Mahaprabhu.” Nesse mesmo momento ele tratava as mulheres como se
fossem sua própria mãe. Uma vez, uma discípula se aproximou muito de
Srila Gurudeva para oferecer-lhe reverências. Ele a parou no meio do
caminho e disse: “ Eu sou um sannyasi, sendo assim, eu não quero que
uma discípula chegue muito perto de mim ou venha para o meu quarto
enquanto eu estiver sozinho. Isso não é um sinal de desrespeito em relação
as mulheres. Ao contrário, todos deveriam respeitar as mulheres, porque
viemos delas, ainda mais se elas são devotas. Mesmo assim, eu como um
sannyasi tenho que seguir muitas regras. Eu não estou introduzindo estas
regras, apenas estou seguindo as instruções de meu Gurudeva”.
Srila Guru Maharaj tinha o hábito de ler o Srimad Bhagavatam sem
camisa e vestindo dhoti (roupa tradicional hindu). Se algum discípulo o
advertia em relação ao perigo de contrair uma doença devido por causa do
frio por exemplo, então, ele respondia: “Eu não tenho o hábito de ler o
Srimad Bhagavatam vestindo uma Kurta (camisa tradicional hindu)”.
Sendo o Srimad Bhagavatam não diferente de Sri Krishna mesmo, é uma
Deidade também e por isso Srila Gurudeva lia-o sem vestir roupa
costurada.
* Nota do editor: O pujari (adorador) atende as Deidades vestindo roupas
limpas e sem costura para garantir que nenhuma sujeira se esconda nas
costuras. Arcana (serviço as Deidades) requer o máximo de cuidado já
que “limpeza é o mais próximo que se pode chegar de Deus”. Por conta
desse costume, Srila B. P. Puri Maharaj vestia apenas dhoti para ler o
Srimad Bhagavatam.

Nos parikramas (peregrinações), costumava jejuar e percorrê-lo a


pé, por que se é um tipo de adoração, como se estivesse atendendo a
Deidade no altar (que é feito descalso).
Quando algum discípulo dos irmãos espirituais de Srila Gurudeva
vinham a tomar o seu darsana (vinham vê-lo), perguntava aos seus
discípulos se já haviam servido prasadam para os visitantes. E quando
respondiam que não estava pronta. Ele comentava: “Esses são queridos
discípulos de meu irmão espiritual e vocês estão fazendo eles esperar por
prasadam!”
Através de sua própria conduta,Gurudeva estava demonstrando o
padrão mais elevado de vaisnava-seva à seus discípulos. Preocupava-se
com os visitantes do Math, ensinava como tratá-los apropriadamente.
Sempre remarcava que os convidados deveriam ser bem recepcionados
quando chegassem; tratados com muito respeito, cuidado, afeição e
consideração durante sua estadia.
Uma vez um convidado veio visitar o templo e Gurudeva pediu que
servisse um pouco de prasadam e disse a um devoto que fosse comprar
iogurte doce e quando o convidado foi tirar o dinheiro para dar ao devoto,
nesse momento Gurudeva disse: “O vaisnava está vindo ao templo de
Gopinath; é meu dever servir a você”.
No templo de Srila Guru Maharaj (da Gopinatha Gaudiya Math)
em Mayapur dham na Índia, pela tradição todo o ano era servida
prasadam para os devotos em Mayapur-dham-parikrama (peregrinação
pelos locais sagrados de Sri Caitanya Mahaprabhu) organizado pela Sri
Caitanya Gaudiya Math (missão de seu irmão espiritual Srila Madhava
Maharaj), no dia de Dvadasi (décimo dia do mês, depois do jejum de
ekadasi).
Srila Guru Maharaj perguntou: “que prasadam vão servir no dia de
Dvadasi?” Então, alguns discípulos foram perguntar para Srila Bhakti
Ballabha Tirtha Maharaj (naquele momento o responsável pela missão).
Sua resposta foi: “Porquê a todos? Podemos servir apenas os residentes do
Math que estarão ali. Cerca de setecentos chefes de família estão reunidos
aqui. Seria muito complicado para vocês servirem a todos eles.”
Os devotos retornaram e relataram o que haviam escutado para
Srila Gurudeva que disse: “Ha-iyachhen ha-iben prabhur yata das, ta
sabar charam vandi dante kari ghas (‘Para os pés daqueles que se
tornaram e daqueles que vão se tornar os servos do meu Senhor, eu
ofereço minhas reverências mantendo uma palha entre meus dentes’ –
Trecho da canção 'Sri Vaisnava Vandana' escrita por Sri Devakinandana
Dasa Thakur.) Aqueles que participam no parikrama também se tornarão
vaisnavas algum dia. Eu estou no fim de minha vida e quero oferecer
prasadam para todo mundo! Sendo assim, voltem a Tirtha Maharaj e
peçam para trazerem todos para aceitarem prasada em nosso templo”.
Quando convidados vaisnavas chegavam na Matha, Srila Gurudeva os
estava alegremente esperando e só aceitou prasadam depois que todos
haviam comido.

Capítulo 28
ACONSELHANDO SEUS DISCÍPULOS

Srila Guru Maharaj teve muitos discípulos, ainda que não quisesse,
isso acabou escapando do seu controle e de todas as partes foram chegando
muitas pessoas que queriam se refugiar nele. Contudo, ainda que tenha
iniciado muitos discípulos, ele não perdia os aspectos mais relevantes na
conexão entre Guru e discípulo. Tanto um quanto outro necessitam estar
qualificados para que seja sacramentado a união divina entre eles. O
discípulo precisa seriamente desejar buscar uma solução verdadeira para
os seus problemas - e enquanto o Guru necessita ter um amplo domínio
sobre as escrituras e ao mesmo tempo realizar tudo aquilo que aprendeu
das mesmas e de seu próprio Mestre. O Srimad Bhagavatam(11.3.21)
apresenta de forma extensa esse tema em diversos versos, entretanto,
especialmente neste:
tasmād guruṁ prapadyeta
jijñāsuḥ śreya uttamam
śābde pare ca niṣṇātaṁ
brahmaṇy
upaśamāśrayam

“Portanto, qualquer um que deseje seriamente felicidade verdadeira


deve buscar um mestre espiritual genuíno e refugiar-se nele mediante
a iniciação. A qualificação do guru autêntico é que ele compreendeu as
conclusões das escrituras mediante deliberação e é capaz de convencer
os outros acerca dessas conclusões. Semelhantes grandes
personalidades, que se refugiam no Deus Supremo, abandonando
todas as considerações materiais, devem ser aceitas como mestres
espirituais genuínos.”
Muitas pessoas podem se aproximar da consciência de Krishna e
inclusive podem receber um nome no momento da iniciação, porém,
poucos poderão ser chamados de discípulos. A respeito disso Srila Guru
Maharaj disse: “Qual é o verdadeiro significado da palavra sisya
(discípulo)? Significa aquele que deveria ser instruído, controlado e
disciplinado pelo Guru. Você pode procurar o significado no dicionário.
Mas aqui eu vejo que o Guru está em algum lugar e o discípulo está em
outro lugar diferente, não apenas no aspecto físico, mas em um sentido
mais amplo. Eu tenho alguns discípulos que são desta forma. E quando se
necessita de algo, nenhum deles pode ser encontrado. Eles virão para
oferecer dandavats com grande show. E isso é tudo. Alguns vem aqui para
ver-me, como se fosse alguns dias de férias nas suas vidas.”
No Srimad Bhagavatam (11.20.17) podemos encontrar a
importância de se tornar discípulo:
nṛ-deham ādyaṁ sulabhaṁ
sudurlabhaṁ plavaṁ sukalpaṁ
guru-karṇadhāram mayānukūlena
nabhasvateritaṁ
pumān bhavābdhiṁ na taret sa ātma-hā

“Essa forma humana de vida é rara e pode conceder todo benefício da


vida. É superior a todas as formas de vida. Por obtê-la, pode-se
facilmente cruzar sobre o oceano da existência material. A forma
humana de vida é como um barco que pode cruzar o oceano material.
O Guru é o capitão e a misericórdia de Krishna são os ventos
favoráveis que carregam o barco com segurança. Aquele que falha em
usar a forma humana de vida para cruzar o oceano de de nascimentos
e mortes é considerado como o assassino de si.”

Srila Gurudeva possuia muito afeto por seus discípulos e movido


por tal afeição gostaria que se dedicassem à adquirir qualidades vaisnavas,
e desejassem servir, cantar e discutir Hari-katha. Quando Srila Gurudeva
pensava alguma coisa que poderia ser corrigida em seus discípulos, fazia
em privado e discretamente. Era incapaz de corrigir alguém na frente de
outros. Mas ele podia louvar uma pessoa na frente de todos, quando essa
pessoa não estava presente.
Srila Gurudeva dizia a seus discípulos que ele não era o Guru real,
uma vez que havia oferecido todos aos pés de lótus de Srila Prabhupada.
Ao mesmo tempo que mantinha a responsabilidade pessoal caso um dos
discípulos se desviavasse do caminho das práticas vaisnavas. Quando ia
dar iniciação, antes de cantar na japa que seria dada ao discípulo, ele
oferecia o terço de oração para um quadro de Srila Prabhupada
Bhaktisiddhanta Sarasvati Goswami Thakur, em acordo com seu
sentimento de ser um servo de seu Guru.
Vendo as transgressões ou a ausência do humor vaisnava em seus
discípulos, se lamentava com grande humildade. Algumas vezes
lastimava-se por ter dado Harinama para algumas pessoas que não
estavam capacitadas, e esse era o motivo pelo qual estava sofrendo.
Uma vez um discípulo que ele não via a uns cinco anos, voltou
com dois filhos para que Srila Guru Maharaj os visse e abençoasse. Nesse
momento, Srila Gurudeva percebeu que o discípulo estava desfrutando de
forma inapropriada com a esposa. Depois que ele saiu, Srila Gurudeva
disse: “Maha maya (a energia ilusória de Krishna) arruinou
completamente sua vida espiritual”. No entanto, Gurudeva expressou que
ele (Gurudeva) era o verdadeiro responsável, uma vez que era o Guru.
Então citou o verso do Srimad Bhagavatam(5.5.18) que ilustra bem o
sentimento de imensa humildade de Srila Gurudeva:
gurur na sa syāt sva-jano na sa syāt
pitā na sa syāj jananī na sā syāt
daivaṁ na tat syān na patiś ca sa
syānna mocayed yaḥ samupeta-
mṛtyum

“Aquele que não pode liberar seus dependentes dos repetidos


nascimentos e mortes não deveria se tronar guru, pai, mãe, semideus
ou marido”.

Então, Srila Gurudeva pediu que chamassem o devoto novamente


em sua presença, por que necessitava falar algo mais. Quando o discípulo
voltou, Srila Gurudeva falou-lhe por longo tempo a respeito da prática
espiritual do vaisnavismo. Nesse momento, ele implorou com grande
humildade e sinceridade: “Baba, por favor, não me abandone novamente”.
Nós abandonamos nosso caminho espiritual pelo apego que
criamos pelos objetos dos sentidos, se atraindo pelos conceitos
equivocados e mundanos, pensando que a felicidad encontra-se ali. Mas
isso é uma grande equívoco. Na realidade, estes objetos de nossa afeição e
atenção são unicamente a causa de nosso sofrimento. Se queremos
alcançar a felicidade suprema, temos que constantemente absorver-nos nas
práticas espirituais que nos levarão aos poucos a graus mais elevados de
consciência. Deixando de lado nossos hábitos indesejáveis para jamais
abandonar o caminho da devoção, segurando nos pés de lótus de nosso
amado Gurudeva e não olhando para nada que possa distrair nossa
atenção. O Bhagavad-gita(5.22) nos instrui a respeito da inteligência
superior que nos leva a não nos envolvermos com o desfrute material:
ye hi saḿsparśa-jā
bhogā duḥkha-yonaya
eva te ādy-antavantaḥ
kaunteya na teṣu
ramate budhaḥ

“A pessoa inteligente não participa das fontes de miséria, as quais


surgem devido ao contato com os sentidos materiais. Ó filho de Kunti,
semelhantes prazeres tem um início e um fim, sendo assim, o sábio não
se deleita com eles”.

O presente está em nossas mãos. Não podemos saber nada a


respeito do futuro e passado - não tem a menor importância, por isso
devemos usar o tempo que possuímos agora da melhor forma possível, não
podemos desperdiçar nem um momento sequer. Tudo que é favorável
poderá nos ajudar nessa caminhada, não devemos parar no meio do
caminho, não podemos olhar para trás e nem nos perder em planos que são
difusos e incertos - nossa única esperança está na associação dos santos e
das escrituras.
Srila Gurudeva sempre dizia: nisvase visvas nei (“não podemos
cofiar nem em nossa própria respiração”). Nesse mundo somente podemos
confiar em Guru sadhu sastra (mestre espiritual, os sábios rendidos e
escritura sagrada). São nossos amigos e nunca nos abandonarão. Se
tomamos refúgio neles, por mais que possamos encontrar obstáculos em
nossa vida, com as bençãos dos nossos guardiões, poderemos alcançar
nossos objetivos. Srila Gurudeva também dizia: sreyamsi bahuvighnami
(“muitos obstáculos chegarão quando uma pessoa tenta fazer algo bom”).
Srila Krsnadas Kaviraj Goswami em seu mangalacarana (invocação
auspiciosa) do seu livro Caitanya-caritamrta (Adi-lila 1.20-21) expressou:
granthera ārambhe kari 'maṅgalācaraṇa'
guru, vaiṣṇava, bhagavān,--tinera
smaraṇa tinera smaraṇe haya vighna-
vināśana anāyāse haya nija vāñchita-
pūraṇa

“No começo dessa narração, simplesmente por relembrar meu mestre


espiritual, o devoto do Senhor, e a Suprema Personalidade de Deus,
tenho invocado suas bençãos. Semelhante lembrança destrói todas as
dificuldades e facilmente nos possibilita satisfazer todos os desejos”.
Quando alguns discípulos vinham perguntar a respeito de assuntos
muito confidenciais, como por exemplo, siddha-pranali (corpo espiritual,
serviço as Gopis, queridas de Krishna), Srila Guru Maharaj se sentia
bastante desconfortável. Respondia que Srila Prabhupada Sarasvati Thakur
jamais tolerava anadhikar charcha (ocupar-se em algo além do nosso
entendimento e qualificação espiritual).
Em algumas ocasiões em que ocorriam essas perguntas
inapropriadas, Srila Gurudeva tinha algumas respostas pouco usuais. Uma
vez, um devoto veio indagar sobre siddha pranali e Srila Gurudeva
respondeu: “Você quer saber de batata cozida? (já que siddha também
significa vegetais cozidos)?” E o devoto ficava sem saber o que Srila
Gurudeva queria dizer com isso.
Outro vez lhe perguntaram sobre o mesmo tema, ele respondeu ao
devoto: “Babu, quando você está cantando japa, chora de sentimentos de
separação por Srimati Radharani?”. O devoto obviamente dizia que não,
então Srila Gurudeva continuava: “sendo assim, não desperdice o meu
tempo e o seu também.” Às vezes Gurudeva respondia dessa maneira “por
que você não me pergunta a respeito de como melhorar a japa e sadhana
190
(disciplina), eu gosto deste tipo de perguntas”.
Um dia um jovem arrogante devoto que havia deixado a ISKCON
e se unido ao um grupo sahajiya (imitacionistas dos vaisnavas, desviados)
em Navadwip se aproximou de Srila Guru Maraja e perguntou-lhe de
forma desafiadora se já havia despertado seu siddha svarupa (forma
espiritual como serva eterna de Krishna, na companhia das donzelas de
Vrindavana). Srila Gurudeva ficou silencioso por algum tempo e então
respondeu de uma maneira muito suave: “Não, eu estou apenas praticando.
Talvez algum, dia serei capaz de receber a misericórdia de meu Guru
Maharaj e isso será revelado para mim”.
O tolo arrogante, totalmente ignorante da humildade vaisnava
comentou “Se depois de tantos anos de prática, você não obteve isso,
então como uma pessoa pode esperar que o processo que você está
seguindo possa funcionar?” Gurudeva respondeu: “Você entenderá isso
em seu coração. Uma satisfação interna inundará o seu coração quando
você apropriadamente seguir - essa será a indicação de que o esforço está
funcionando.”
Aquela alma desafortunada não entendeu o profundo significado
daquelas sábias palavras e continuou em tom desafiador: “Até mesmo a
gratificação sensorial pode dar a uma pessoa a satisfação interna.” Então
Srila Gurudeva ficou silencioso e não gastou mais seu precioso tempo
para tentar convencer semelhante desafortunada alma.
Ele queria que seus discípulos pudessem sempre relembrar que a
devoção se desenvolve através de estágios. A respeito disso ele gostava de
citar alguns versos do Caytania-caritamrta, em que Sri Caitanya
Mahaprabhu responde a várias perguntas de Srila Sanatana Goswami sobre
o processo do serviço devocional:
kona bhagye kona jiver sraddha yadi hay
tabe sei jiva sadhu-sanga karay
sadhu-sanga haite hay sravan-kirtana
sadhana-bhaktye hay sravana-
nirvatanan anartha- nivritti haile
bhaktye nistha hay nistha haite
sravanadye ruchi upajay ruchi haite
bhaktye hay asakti prachur
asakti haite chitte janme Krsna prity-ankur
sei rati garha haile dhare prem nam
sei prema-prayojan sarvananda-dham
“Se, por boa fortuna, a entidade viva começa se associar com devotos,
quando é encorajada em serviço devocional pela associação dos
mesmos, ela se torna livre de toda a contaminação indesejada por
seguir os princípios regulativos, cantar e escutar. Quando a pessoa se
torna livre de toda a associação indesejada, avança com firme fé.
Quando a fé firme no serviço devocional desperta, o gosto pelo escutar
e cantar também desperta. Depois que o gosto é despertado, o
profundo apego aparece, e desse apego a semente do amor por
Krishna cresce dentro do coração. Quando o estágio emocionmal se
intensifica isso é chamado de amor por Deus. Semelhante amor é o
objetivo último da vida e reservatório de todo prazer".

Em conexão a isso, citava o Sri Bhakti-rasamrta-sindhu (1.4.15-


16):

ādau śraddhā tataḥ sādhu-


saṅgo 'tha bhajana-kriyā
tato 'nartha-nivṛttiḥ syāt
tato niṣṭhā rucis tataḥ
athāsaktis tato bhāvas
tataḥ premābhyudañcati
sādhakānām ayaṁ premṇaḥ
prādurbhāve bhavet
kramaḥ

"No começo deve haver fé. Então a pessoa se interessa em se associar


com os devotos puros. Sendo assim, ele é iniciado pelo mestre
espiritual e executa os princípios regulativos sob suas ordens. Então,
fica livre de todos os hábitos indesejados e se torna firmemente
estabelecido em serviço devocional. Logo depois desenvolve gosto e
apego. Este é o caminho do sadhana-bhakti, a execução do serviço
devocional de acordo com os princípios do regulativos. Gradualmente
as emoções se intensificam, e finalmente desperta o amor. Este é o
desenvolvimento gradual do amor por Deus para o devoto que está
interessado em consciência de Krishna."

Srila Guru Maharaj tinha muito cuidado para que seus discípulos
não lessem qualquer tipos de livros. Dizia que Srila Prabhupada
Bhaktisddhanta Sarasvati Thakur não permitia aos devotos neófitos lerem
nem sequer o décimo canto do Srimad Bhagavatam e outros livros que
narrassem os passatempos conjugais de Sri Radha Krishna.
Os livros que eram recomendados por Srila Gurudeva eram:
- Srimad Bhagavad-gita
- Srimad Bhagavatam (especialmente os passatempos
Maharaj Bharati, Maharaj Ambarisa, Dhruva Maharaj e
Prahlad Maharaj - também o décimo primeiro e décimo
segundo canto)
- Sri Caytania-caritamrta de Srila Krishna das Kaviraj
Goswami
- Sri Caitanya Bhagavata de Srila Vrindavan das Thakur
- Bhakti-rasambrta-sindhu, Upadesamrta e outros livros de
Srila Rupa Goswami
- Canções de Srila Narottama Das Thakura (especialmente
Prarthana e Prema-bhakti-candrika)
- Todos os livros de Srila Bhaktivinoda Thakura
(especialmente Saranagati e Jaiva Dharma)
- Livros de Srila Bhakti Raksak Srila Sridhar Maharaj
- Livros de Srila A. C. Bhaktivedanta Swami Maharaj
- Livros de Srila Bhakti Bhallabh Tirtha Goswami Maharaj
(especialmente Goura-parsad-charitavali sobre os associados
de Mahaprabhu);

Srila Guru Maharaj queria que dentro do templo houvesse um


ambiente de respeito mútuo e que seus menbros pudessem respeitar uns
aos outros de acordo com a etiqueta. Os brahmacarys (monges estudantes)
deveriam respeitar aos sannyasis (renunciantes), e eles por sua vez
deveriam respeitar aos devotos maiores. Quanto a esse tema: "Quando não
se presta o devido respeito, Sri Caitanya Mahaprabhu não tolera isso". No
Caitanya-caritamrita (Antya 4.132) existe uma passagem em que Sri
Mahaprabhu torna-se intransigente quando a conduta da etiqueta vaisnava
não é seguida:
maryādā rākhile, tuṣṭa kaile mora mana
tumi aiche nā karile kare kon jana?"

"Por observar a etiqueta, você satisfez minha mente. Quem mais além
de você mostraria esse exemplo?”

Srila Guru Maharaj era muito estrito em seguir a etiqueta vaisnava,


seu comportamento sempre era de submeter-se a sastra sadhu guru
(escritura, sábio e mestre). Ainda que estivesse por cima das regras e
regulações, ele fazia questão de seguir a risca todos os mandamentos que
regem a conduta vaisnava, o fazia com grande minúcia e satisfaçao. Nada
podia escapar a sua acurada visão quando se tratava de seguir as injunções
das escrituras e estabelecer relacionamentos com outros vaisnavas.
Mesmo quando já havia estabelecido seus templos, não fazia
simplesmente para colecionar vários edifícios e muitos seguidores. Na
realidade seu desejo era que os Maths estivessem equipados com o espírito
de pureza nas práticas devocionais, que houvesse espírito de pregação,
simplicidade e amor entre os devotos que ali residiam. Sobretudo, ele
esperava que seus seguidores pudessem pregar com seu próprio
comportamento pessoal. Que fossem consistentes em suas ações, sabendo
que seria a melhor forma de divulgar os ensinamentos de Sri Mahaprabhu.
O comportamento do vaisnava deve ser impecável, deve ser como
um lenço branco, sem nenhuma mancha. No Caytania-caritamrta (Adi-lila,
4.41) podemos encontrar:
ei-mata bhakta-bhāva kari' aṅgīkāra
āpani ācari' bhakti karila pracāra

“Dessa maneira, assumindo o sentimento de um devoto, Ele


(Mahaprabhu, o vaisnava ideal) pregou o serviço devocional enquanto
praticava Ele mesmo.”

Capítulo 29
EXTREMA HUMILDADE

Pode parecer um pouco redundante comentar sobre a humildade de


Srila Guru Maharaj, devido aos vários episódios já citados. Mas como
sabemos que essa é a qualidade que ornamenta o comportamento vaisnava,
não hesitamos em novamente abordar esse tópico para glorificar o devoto
do Senhor Krishna.
Nossa atitude deveria ser de humildade, em nenhum momento
buscar algum reconhecimento, não deveríamos trabalhar para estabelecer
nossa própria posição. Queremos nos sentir vazios e sem nenhuma posição
perante o Infinito. Ao estabelecer a humildade em nossos corações,
formamos uma barreira que impede que a inveja possa ganhar posições
dentro de nós e se estabelecer ocupando posições estratégicas no nosso ser.
E se sentimos insatisfação com a felicidade dos demais ou se
sentimos alegria ou euforia quando algo de ruim acontece aos outros -
provavelmente sofremos desse grande mal chamado inveja. Temos uma
grande luta a ser travada contra este inimigo (inveja). A luta será longa,
não poderá ser finalizada em poucas horas, ou em poucos dias nem mesmo
anos. Entendemos que se o nosso objetivo é conquista de nós, se
conseguimos olhar para dentro e compreender que somos nossos maiores
inimigos quando deixamos de apreciar os esforços dos demais ou se
pensamos que existe uma necessidade de derrotar aos outros para
estabelecer uma supremacia que surgida pelos falsos conceitos do ego,
então estamos em uma posição perigosa. Em um situação em que a inveja
está sendo incrementada a despeito de qualquer esforço que façamos em
nossas vidas espirituais.
Por isso Srila Guru Maharaj era amado e querido por todos.
Quando estava cantando para Srila Prabhupada Bhaktisiddhanta Sarasvati
Thakur e foi interrompido para que Srila Sridhara Maharaj pudesse cantar,
não sentiu nem um pouco de inveja de seu irmão espiritual, ao contrário,
ele o aceitou como seu siksa-guru (instrutor) para o resto da vida - porque
sabia que Srila Prabhupada tinha dado uma posição especial para Srila
Sridhara Maharaj naquele momento.
Quando foi a Vrinda Kunja (templo de Srila Bhakti Aloka
Paramadveiti em Vrindavan) e viu sua foto no mesmo nível da de Srila
Sridhara Maharaj, protestou dizendo “por que minha foto está ao lado da
de Srila Sridhara Maharaj? Eu não devo estar nos mesmo nível que ele
pois sou inferior.” Quando alguém falava o nome de Srila Sridhara
Maharaj, Srila Gurudeva fazia um sinal de reverência para mostrar sua
consideração ao seu irmão espiritual. Em seu coração não podia se
encontrado nem um pingo de inveja, seu coração era puro e limpo dessa
mácula.
Uma vez um discípulo escutou um comentário infeliz de um
acarya (mestre destacado) sobre Gurudeva, dizendo que era um devoto
kanistha adhikari (nível de devoto mais baixo, um novato) porque era
muito apegado a adoração à Deidade. O discípulo gravou essa conversa e
mostrou para outros irmãos espirituais, que ficaram simplesmente
indignados com o comentário e agitados foram conversar com Srila
Gurudeva para mostrar a gravação que havia sido feita.
Naquele momento ele olhou para os seus discípulos enfurecidos e
mostrou um grande sorriso, uma verdadeira alegria, levantando os braços e
dizendo, “Finalmente fui estabelecido na posição de um devoto,
finalmente consegui uma posição! Antes eu pensava que não tinha
nenhuma posição, mas agora um Acarya me reconheceu e me estabeleceu
em uma posição no âmbito devocional. Isso é muito bom!”
Seus discípulos ficaram surpresos com essa demonstração de
humildade. E disse para não criassem nenhuma confusão e nem discutir
sobre o caso, o melhor a fazer era manterem-se ocupados em serviço. Srila
Gurudeva também disse: “Não se deve culpar aos outros, somente a nós
mesmos. Aqueles que são devotos não perturbam aos demais. Aqueles que
querem adorar ao Senhor Hari têm que colocar grande atenção em seu
próprio comportamento. O Senhor mesmo diz que a luxúria e a ira são os
dois inimigos mais vorazes.”
Podemos dizer que Srila Guru Maharaj possuia todas as qualidades
de um vaisnava puro, suas qualidades eram transcendentais e não podem
ser completamente explicadas. O Caitanya Caritamrta (Madhya 22.77-80)
trata disso, quando cita as vinte e seis qualidades de um vaisnava:
sei saba guṇa haya vaiṣṇava-laka
ṣ ṇa saba
kahā nā yāya, kari dig-daraśana

kṛpālu, akṛta-droha, satya-sāra sama


nidoṣa, vadānya, mṛdu, śuci, akiñcana
sarvopakāraka, śānta, kṛṣṇaika-
śaraṇa akāma, anīha, sthira, vijita-ṣaḍ-guṇa
mita-bhuk, apramatta, mānada, amānī
gambhīra, karuṇa, maitra, kavi, dakṣa, maunī

“Os devotos são sempre misericordiosos, humildes, verazes,


equânimes com todos, impecáveis, magnânimos, suaves e limpos. Eles
não têm nenhuma posse material e praticam o trabalho mais
beneficioso para todo o universo. Eles são pacíficos, se renderam à
Krsna e não tem desejos. Eles são indiferentes as aquisições materiais
e estão fixos no serviço devocional. Ele controlam completamente as
seis más qualidades: luxúria, ira, cobiça orgulho, ilusão e inveja.
Comem apenas o que necessitam e são sóbrios. Eles são respeitosos,
graves, compassivos, e sem falso prestígio. São amigáveis, poéticos,
espertos e silenciosos - ou seja, jamais falam caprichosamente”.

Muitas vezes Gurudeva instruiu aos seus discípulos como deveriam


se comportar diante de situações conflitivas. Como escritor que era, dava
esse exemplo: “Eu tenho uma caneta de ouro que uso para fazer minhas
anotações quando tenho alguma inspiração. Se vejo que uma pessoa pegou
a minha caneta e a guardou em sua bolsa... Então, o que eu deveria fazer?
Como eu falaria com essa pessoa? De uma maneira muito amável, eu
perguntaria assim: ‘será que você por algum engano você não pegou a
caneta que estava em cima da mesa? Será que por algum descuido você
não está guardando a caneta que estava em cima da mesa? Mas eu vi ele
pegar minha caneta e guardar na sua bolsa, não há nenhuma dúvida a
respeito disso. Ainda assim, eu não deveria tratar de maneira ríspida
àquele que roubou minha caneta de ouro. Eu não grito com ele e nem o
ataco.”
Srila Gurudeva sempre instruiu aos seus discípulos a atuarem
dessa maneira, se estabelecendo completamente de acordo com as
qualidades vaisnavas. A simplicidade é a ante sala da humildade. Caso
queiramos seguir os preceitos de Sri Caitanya Mahaprabhu, o nosso
coração deve se tornar simples. Por isso se diz que vaisnavismo é
sinônimo de simplicidade.
Na medida que avançamos à níveis mais elevados de consciência,
sentimos sinceramente que não somos nada, não temos nada e nenhuma
posição tangível dentro do plano do Absoluto. Mantendo uma alta
apreciação para o transcendente, e procurando ver a graça de Krishna em
tudo, o aspirante à devoção deve vencer seus obstáculos sempre amparado
nos preceitos da simplicidade e humildade.
Srila Guru Maharaj costumava dizer sobre a importância de ser
tolerante e indulgente (perdoar os outros), ele dizia que o devoto deveria
pensar: “Eu estou sendo protegido por Krishna. Se alguma onda negativa
vem em minha direção, isso é para minha boa fortuna. Se alguém tenta me
desmerecer, ferir-me de alguma maneira, então essa pessoa deveria ser
perdoada tanto por mim como pela Suprema Personalidade de Deus.
Existe sempre muito sofrimento neste mundo. Nenhuma gota de
sofrimento deveria ser incrementada por minha causa”.
Quando estava em seu quarto, Gurudeva não queria que ninguém sentisse
alguma inconveniência,por exemplo, antes de ir ao banheiro, ele
perguntava a todo mundo que estava no quarto se necessitavam ir ao
banheiro.
Se alguém lhe fazia algo de bom, ficava agradecido com essa
pessoa para o resto da vida. Algumas vezes, a mesma pessoa podia fazer
algo equivocado depois, mas Srila Gurudeva não ficava irado ou chateado.
Ele costumava dizer: “Se alguém nos ajuda, não podemos esquecer isso”.
Ele nos dizia que deveríamos manter sempre o sentimento de gratidão. Ele
podia se lembrar de todas as coisas que havia recebido como doação. Ele
pensava: “Se alguém me dá algo, está sendo enviado pelo Meu Senhor
(Krishna) através de outra pessoa”.

Srila Gurudeva não aprovava que seus discípulos excessivamente


julgassem os outros. Ele queria que pudéssemos tratar aos demais com
simpatia e respeito. Sobre isso ele dizia: “Tão logo vemos que uma pessoa
caiu, não deveríamos julgá-la, porque nós não sabemos o quanto ele chora
em frente da Krishna e o tanto que ela pede para ser perdoada. Sem
considerar isso, nós não podemos dizer algo coisa áspero ou cruel”.
Quando uma vez fizeram reformas estruturais no templo de Kalna
(Índia), um engenheiro foi contratado para realizar o serviço. Quando o
profissional chegou ao templo, Srila Guru Maharaja lhe ofereceu
dandavats (reverências prostradas no chão, indicando muito respeito).
Mesmo que nesse momento já era um sannyasi muito respeitado, se
extendeu no chão para aquele que Seu Senhor havia enviado mandado para
reformar Seu templo. Essa era sua consciência. Sempre foi agradecidos
com todos, todos era importante em sua visao, tudo tinha o seu valor,
nenhum detalhe podia passar em branco diante de seus olhos - relacionava
tudo com Krishna.
Enquanto vivia em Kalna, frequentemente viajava para Calcutá, e
nessas ocasiões, trazia alguns doces de boa qualidade e os distribuía para
as crianças. Ele nunca era tomado pela raiva. Exceto uma vez, quando
absorto em adorar a Deidade, sua sobrinha que era uma menina pequena
nessa época, o distraiu muitas vezes da adoração. Então Srila Gurudeva
deu uns apertões delicados em sua bochecha. Depois ele a tratou de forma
muito afetuosa para compensar o “castigo”. Mas depois Srila Guru
Maharaja escreveu em seu diário: “Porquê eu fiquei dominado pela ira?
Aconteceu por eu jamais ter feito Hari-bhajana (cantado o Santo Nome
com pureza, nesse contexto) em minha vida”.
Quando estavam construindo em Sridham Mayapur, os devotos
que auxiliavam na construção quiseram cortar um coqueiro. Quando Srila
Gurudeva viu, falou: “O que vocês estão fazendo? O coqueiro é tão bom
quanto um brahmana (sacerdote). Matar essa árvore de coco é como
assassinar um brahmana. Pare com isso imediatamente.” Depois desse
incidente, Srila Gurudeva jejuou até mesmo de água, por um dia e uma
noite e cantou o Maha Mantra incessantemente.
Outro passatempo muito peculiar que remarca a extrema humildade
de Srila Guru Maharaj, ocorreu na celebração do seu centenário
aniversário. Nessa ocasião, muitos vaisnavas de todos as partes do mundo
vieram para a comemoração, então Srila Gurudeva deu um discurso que
depois foi publicado em várias revistas por conta da clareza de seu
siddhanta (conclusão filosófica). Mas o que mais impressionou a todos foi
a maneira com que ele se referia a si mesmo - uma tremenda comoção
tomou conta de muitos vaisnavas que estavam presentes naquele
momento. Era um instante muito especial, em que o vaisnava sênior iria
discursar, todos ficaram perplexos com suas palavras de tremenda
humildade.
Tentamos selecionar alguns trechos do discurso em questão: “Hoje,
os devotos da Gopinatha Gaudiya Math fizeram um esforço especial para
celebrar meu aniversário com grande pompa. Eu sou verdadeiramente
indigno de semelhante atenção. Mas meu mestre espiritual está sentado ali
noaltar, e ao lado dele, todas as minhas Deidades adoráveis e também os
Acaryas predecessores estão presentes. Eu sou apenas um dos seus
insignificantes servos” Depois dessas breves palavras de introdução, Srila
Gurudeva continuou, citando a Srila Bhaktivinoda Thakura:
“Eu tenho rendido tudo aos Seus pés de lótus (de Krishna). E tenho
caído a Sua porta. Eu peço que Você reconheça que eu sou Seu cachorro e
que você é Meu mestre. Você me amarrá perto de Você e cuidará de mim.
Eu permanecerei perto de Sua porta e eu espantarei os ladrões e outras
perigosas pessoas, mantendo-os do outro lado.
Cada dia, com alegria eu comerei os remanentes dos devotos que
comeram sua prasadam. Quer eu esteja sentado ou deitado, apenas
pensarei em Seus pés de lótus. Qualquer hora que Você chamar, eu irei
dançar em Sua direção.
Eu nunca pensarei em minha própria manutenção ou em minhas
necessidades. Mas ficarei feliz com meus sentimentos para Você.
Bhaktivinoda oficialmente aceita Você como meu protetor”.
(Saranagati,19 )

Então, Srila Gurudeva continuou na mesma linha de raciocínio:


“Eu sou o cachorro do cachorro do meu mestre espiritual. Todos vocês
oferecem adoração a meu mestre espiritual Srila Prabhupada
Bhaktisiddhanta. E seu cachorro de estimação está sentado a seus pés.
Como vocês adoraram meu Gurudeva, uma ou duas flores caíram sobre o
corpo do seu cachorro. Isso não é adorar o cachorro, isso é adorar minha
Deidade adorável (Sri Guru). Muitos devotos vieram de terras distantes
para se ocupar nesta adoração hoje, e isso me dá um grande prazer. Se eles
entenderem o verdadeiro significado desse puja (adoração), eles me farão
mais feliz ainda.
O Senhor Supremo falou a mensagem dos Vedas para Brahma,
porque a mesma havia se perdido. Por este motivo, ele é considerado o
mestre espiritual do universo. Então os vaisnavas pertencem a Brahma-
sampradaya. Narada tomou instrução de Brahma e Narada instruiu a
Vyasa”.
Depois disso, Srila Gurudeva contou o passatempo de Ajamila e
frisou no ponto em que os yamadutas (servos de Yamaraj, Senhor da
Morte), atônitos porque foram impedidos de levar o pecador Ajamila que
havia morrido e que foi resgatado pelos Visnudutas, são instruídos por
Yamaraja, o qual acaba discorrendo sobre o caminho da religião e
mostrando que a verdadeira função para todas as entidades vivas é cantar
Santo Nome do Senhor. A continuação Srila Guru Maharaj cita uma parte
de um verso invocatório do Srimad Bhagavatam que diz: dhramah
projjhita-kataivo tra paramo nirmatsaranam satam (“Esse Bhagavata
Puruna rejeita completamente todas as atividades religiosas as quais são
materialmente motivadas. E então, ele é apenas compreensível para
aquelas pessoas santas que estão livre da inveja”).
Inveja é terrível. Inveja significa para-sri-katarata ou a
incapacidade de tolerar o sucesso de outra pessoa, em termos de riqueza,
beleza ou outra qualificação. Aquele que é incapaz de tolerar a felicidade
dos outros e que encontra felicidade em ver o sofrimento dos demais não

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pode ser considerado um sadhu.”
Logo em seguida Srila Gurudeva citou muitos versos das escrituras
que glorificam o cantar do Santo Nome como única maneira de salvação
para esta era de Kali-yuga: “Não importa se no Ocidente ou no Oriente, a
alma não é diferente. Todas as almas são iguais. Seu supremo mestre é
Krishna – Aham sarvasya prabhavah, todas as criaturas têm a origem em
Krishna. Então se praticamos o sacrifício de cantar o Santo Nome todos
serão beneficiados.
Não estamos tentando nos tornar uma espécie de grandes mestres.
Meu Srila Prabhupada é o mestre espiritual de todo o universo. Srila
Bhaktivinoda Thakur é meu Guru. Por isso é que digo que eu não sou mais
do que um cachorro. Por favor, lembrem-se disso. Eu não sou nada mais
do que um cachorro do cachorro. Srila Prabhupada, Srila Bhaktivinoda
Thakura, a sucessão discipular inteira são meus mestres. Eu sou
simplesmente seu cachorro, nada mais. Eu apenas oro para todos vocês,
para que eu possa me tornar um cachorro e latir repetidamente: ‘cantem os
Santos Nomes, apenas cantem os Santos Nomes’.
Mahaprabhu nos disse para fazermos uma oblação do nosso
próprio ser no fogo do sacrifício dos Santos Nomes. E nós devemos pregar
enquanto praticamos esse princípio religioso. Sanatana Goswami disse a
Haridas Thakura: ‘Você está fazendo ambas as atividades, praticando e
pregando’. Acara pracara name kara dui karya. Srila Haridasa Thakura
costumava cantar três lakhs (192 voltas da japa) de Nomes todos os dias.
Isso não é possível para nós. Srila Prabhupada aceitou esse voto de cantar
100 bilhões de Nomes ou três lakhs por dia por um período de
aproximadamente dez anos. Nós podemos começar cantando apenas um
granthi,ou seja, quatro voltas por dia, mas gradualmente nós deveríamos
subir para um lakh por dia (64 voltas).
Tanto os homens quanto as mulheres deveriam cantar os Santos
Nomes. Essa é a religião genuína da espécie humana, serviço devocional
com o canto do Santo Nome, como seu principal aspecto. Nós não estamos
dizendo que essa é uma ideia sectária. Vyasadeva foi quem escreveu toda a
literatura védica e ele mesmo deu essas instruções. Devem ser seguidas
por todos, sem exceção. Essa é a instrução essencial de todas as escrituras,
sendo assim, todos deveriam segui-la.
Então, eu tenho falado, latido como um cachorro aqui por alguns
poucos minutos, dizendo qualquer o que veio em minha mente. Não
apenas devemos cantar os Santos Nomes, mas devemos pensar em dar
satisfação para Krishna. Eu sou um homem velho e minha memória está
falhando, então por favor, me perdoem. Tudo o que eu quero salientar é
que deveríamos cantar constantemente e não somente isso, temos que
cantar com muita atenção”.

Depois desse discurso, em que Srila Guru Maharaj por diversas


vezes se auto intitulou como sendo “o cachorro dos vaisnavas” e como não
tendo qualificações para ser Guru, impressionou a muitos devotos que ali
estavam presentes. A humildade de Srila Gurudeva era algo surpreendente,
não tinha limites. Muitos diziam que nunca haviam visto algo semelhante.
Jamais poderiam imaginar um Acarya sênior entre os vaisnavas
presentes no planeta, que havia praticado o caminho da devoção por quase
noventa anos, uma vida inteira dedicada ao serviço desinteressado à
Krishna, pelo menos sessenta anos escrevendo artigos, livros e anotações
que serviriam para a elaboração de outros livros...
Nesse momento todos estavam esperando por suas palavras, mas
ninguém poderia imaginar que seria tão humilde a ponto de pedir
desculpas por sua idade, falta de memória, apesar de todos ali
presenciarem como pôde citar muitos versos e trechos das escrituras com
precisão. Muitos dos seus discípulos ficaram um pouco constrangidos
quando Srila Gurudeva começou a intitular-se como um cachorro do
cachorro do seu Guru. E comentava que se algo era oferecido a ele, isso
não passava de um remanente que acabava de cair da mesa que estava
diante de seu Guru.
Essas palavras foram muito duras para alguns dos seus discípulos,
que se sentiram incomodados com tamanha expressão sincera de
humildade. Naquele momento, eles estavam ali para glorificar ao seu Guru
da melhor forma possível, o Vyasapuja (aniversário do Guru) estava
comemorando cem anos de vida de um devoto puro do Senhor Supremo.
Todos os esforços estavam sendo canalizados com o intuito de glorificar o
vaisnava mais elevado do momento. Mas Srila Guru Maharaj estava se
colocando em uma posição completamente inferior, “o cachorro do
cachorro”, assim ele se chamava - chocando a todos que escutavam o
discurso.

Capítulo 30
UMA VISÃO TRANSCENDENTAL
No final do Vyasapuja, Srila Guru Maharaj anunciou que iria
aceitar ksetra-sannyasa (renunciante que faz o voto de não sair de um
determinado lugar) em Jagannatha Puri, da mesma forma que Sri
Gadadhara Pandita havia feito para estar junto o tempo todo com Sri
Caitanya Mahaprabhu.
A pessoa que aceita semelhante voto, está disposta a não deixar
mais o dham sagrado por toda a sua vida. Alguns devotos estavam muito
felizes que Srila Gurdeva iria residir em Puri, uma vez que isso seria
muito benéfico para a sua saúde. Mas Srila Gurudeva estava querendo
viver em Puri por causa de sua conexão com o Senhor Jagannath.
Previamente, quando ainda podia dançar e cantar em frente ao carro do
Senhor Jagannath com amor e devoção os sacerdotes da Deidade se
encantavam por seu kirtan (canto), muitas vezes o colocavam em cima da
carruagem.
Srila Gurudeva afirmou que não estava indo para Jagannath Puri
para recuperar sua saúde, e sim por que ali era o local onde ocorreram os
passatempos muito íntimos de Srimad Mahaprabhu nos últimos doze anos
de sua vida. Ele estava em no Gambhira, absorto no humor de Srimati
Radharani, Caytania-caritamrta, (Madhya-lila 2.15-16):
kāhāṅ mora prāṇa-nātha muralī-vadana
kāhāṅ karoṅ kāhāṅ pāṅ vrajendra-
nandana kāhāre kahiba, kebā jāne mora
duḥkha vrajendra-nandana vinu phāṭe
mora buka

"Onde está o Senhor da minha vida, aquEle que toca a flauta?


Quando eu poderei ir encontrar com o filho de Maharaj Nanda? A
quem eu deveria falar? Quem poderia entender o meu sofrimento?
Sem o filho de Nanda Maharaja, Meu coração está destruído".

Srila Gurudeva afirmava que nós poderíamos dizer muitos


verbalmente, mas Sri Mahaprabhu estava chorando com o Seu coração
destruído. E chorava tão profusamente que a areia da praia era lavada com
as suas lágrimas. Isso não era algo imaginário.
O que Srila Krsnadasa Kaviraja Goswami escreveu foi
testemunhado por outros. Ele escutou isso de Srila Raghunath Das
Goswami, o qual foi testemunha de tudo o que havia acontecido. Murari
Gupta também escreveu a respeito disso em seu diário. Srila Gurudeva
também dizia que os três lugares sagrados (Vraja-mandal, Goura-
Mandala e Jagannath Puri) existem dentro de Jagannath Puri, uma cidade
no estado de Orissa (Índia). Srila Gurudeva explicava que não poderia
viver em Vraja-mandal, porque pensava que Vraja-mandal estava em
Ksetra- Mandal. Sri Mahaprabhu também exibiu os seus passatempos de
Vrindavana ali.
Srila Narottama Das Thakur canta: (Prarthana, Savaran-Goura-
Mahima, 3)
sri goura-mandala-bhumi yeva jane
cintamani tara hay vraja-bhumi vas

"Aquele que sabe que Gaura-mandala-bhumi não é diferente de


cintamani ( Goloka, planeta de Krishna) pode viver em Vraja-bhumi
(Vridavana)."

E Srila Gurudeva enquando citava este verso, concluiu: "Eu não sei
quando irá acontecer comigo, mas Mahaprabhu sabe". Srila Guru Maharaj
estava sempre absorto nos passatempos de Sriman Mahaprabhu e do
Senhor Jagannath. Quando os devotos o viam, ele perguntava-lhes se
tinham ido ao tempo de Jagannath. Então falava a respeito, como se ele
mesmo estivesse no templo. Ele instruiu a todos que pudessem se ocupar a
serviço do Senhor Jagannh no templo. Se algum discípulo trazia-lhe
Jagannath Prasadam (alimento oferecido a Deidade) ele começava a falar
a respeito do Senhor Jagannath por longo tempo.
Um certo dia, um discípulo estava passando a noite no quarto de
Srila Gurudeva. No meio da noite, Srila Gurudeva falou alguma coisa, e
quando o discípulo indagou a respeito do que ele havia falado, Srila
Gurudeva respondeu "eu não disse nada para você, eu estou falando com o
Senhor Jagannath".
Srila Guru Maharaj viva absorto em bhajana (meditação) interno
vinte quatro horas por dia, não havia um momento em que não estivesse
ocupado em serviço de forma responsável ao Senhor Supremo.
Quando Srila Gurudeva estava em Kalna, tinha uma rotina bem
pesada de serviços. Ele se banhava no Ganges e limpava o templo com
suas próprias mãos. Ele cozinhava para as Deidades e as adorava também.
Dava aulas duas vezes ao dia e escrevia cartas e artigos. Obviamente
cantava um lakh (64 voltas) de japa. Como é possível conceber que uma
pessoa pudesse ter tanta energia e tempo para tudo isso?
Podemos dizer ele era a personificação do oitavo verso do
Upadesamrita (8) de Srila Rupa Goswami:
tan-nāma-rūpa-caritādi-sukīrtanānu-
smṛtyoḥ krameṇa rasanā-manasī
niyojya tiṣṭhan vraje tad-anurāgi
janānugāmī kālaṁ nayed akhilam ity
upadeśa-sāram

"A essência de todos os conselhos é que uma pessoa deveria utilizar


todo tempo, vinte quatro horas por dia, em cantar e relembrar bem o
divino nome, forma transcendental, qualidades e passatempos eternos
do Senhor, sendo assim, gradualmente ocupando a língua e a mente.
Dessa forma, ele deveria residir em Vraja e servir a Krishna sob a guia
dos devotos. Ele deveria seguir os passos dos amados devotos do
Senhor, os quais estão profundamente apegados ao serviço do
Senhor."

Dessa forma, Srila Gurudeva via o mundo transcendental diante


dos seus próprios olhos, não precisava fisicamente ir ao templo para ver o
Senhor Jagannath, simplesmente conversava com ele em seu transe
meditativo. Geralmente queremos ver a Deidade com nossos olhos
materiais, mas o que se espera realmente é que a Deidade nos veja. Isso
não depende de nenhum impedimento físico, nenhuma distância pode
separar o devoto puro do seu objeto de adoração, não existe barreiras nem
limites para devoção. Ela cresce dentro de nós de forma invisível, em um
plano completamente desconhecido para nós, vai conquistado posições e
mudando completamente nosso prisma para enxergar o mundo e os objetos
que os rodeiam.
Em algumas ocasiões já escutamos pessoas dizerem que estão
vivendo em Vrindavan por alguns anos, e falam isso com forte convicção.
Em nenhum instante duvidam ao afirmar que já são moradores do dham
sagrado por um tempo determinado. Entretanto, se vamos analisar
profundamente a questão, chegaremos a conclusão que esse tipo de
informação é um tanto quanto precipitada.
Observando um pouco a história de Srila Narattoma Das Thakur,
que havia nascido em uma família aristocrática, um príncipe, uma pessoa
de uma estrato elevado. Um dia sonhou com Sri Caitanya Mahaprabhu,
que dizia-lhe para ir a Vrindavana encontrar-se com seu futuro Guru, um
vaisnava muito elevado de nome Lokanatha Goswami.
Narottama vivia em Kheturi, um vilarejo que fica mais ou menos
mil e quinhentos quilômetros de Vrindavana, onde estava Lokanatha
Goswami. Narottama Das Thakur partiu, e como naquela época não havia
trem, nem automóveis, que dizer então de algum avião que pudesse levá-lo
comodamente para o seu destino final - Ele caminhou para Vrindavana,
enfrentando todas as classes de perigos que podiam ser encontradas na
selva. E depois de muitos dias conseguiu chegar.
Quando conheceu a Lokanatha Goswami, pediu-lhe iniciação a
Lokanath que respondeu-lhe: "Fiz um voto de não aceitar discípulos, e vai
ser mais fácil que o sol deixe de nascer no horizonte todos os dias do que
eu aceitá-lo como discípulo". O jovem Narottama ficou desconsolado, mas
não desistiu tão facilmente. Ele começou a limpar o local que Lokanatha
usava como banheiro. Todos os dias, de forma secreta, Narottama limpava
as necessidades de Lokanatha, sem que ele percebesse. Depois de quase
um ano, Lokanatha desconfiou que alguém estava limpando o seu banheiro
todos os dias e quis descobrir quem estava fazendo isso. Então ele se
escondeu e ficou esperando e foi aí que ele descobriu que Narottama
estava fazendo isso para obter o seu favor de qualquer maneira. Então, não
restou mais nenhuma outra alternativa para Lokanatha Goswami, a não ser
de aceitar a Narottama das Thakura como discípulo.
Narottama Das Thakura depois de viver por mais de vinte anos em
Vrindavana, cantou da seguinte maneira, (Lalasmayi Prarthana, 1):
saḿsāra-bāsanā mora kabe tuccha
ha'be viṣaya chāriyā kabe śuddha ha 'be
mana kabe hāma herabo śrī-bṛndābana

"Quando meu desejo por desfrute material será insignificante?


Quando eu estarei livre de todos os desejos de desfrute material, e
então eu serei capaz de ver a verdadeira naureza de Vrindavana?"

Mesmo vivendo em Vrindavana por mais de vinte anos, Narottama


Das Thakur não achava que estava em Vrindavana, ele sentia que estava
muito distante e implorava para um dia poder morar em Vrindavana.
Um dia, uma discípula de Srila Guru Maharaj veio visitá-lo. Ela era
tia de Srila Bhakti Bibuddha Bodhayan Maharaj (seu secretário pessoal e
atual acharya-sucessor da Sri Gopinath Gaudiya Math), o qual foi
testemunha e muitas vezes contou essa historia comovedora. Ela havia
acabado de se casar, vivia uma vida cheia de felicidade, até que um dia,
depois de uma bateria de exames, descobriu que estava com câncer
linfático. O médico aconselhava-a não fazer mais nada, porque o estado
que se encontrava a doença era tal que não adiantaria algum tratamento-
restava-lhe seis meses de vida apenas.
Ela se sentiu desamparada e pensou em procurar a Srila Guru
Maharaj para conseguir beber a água que lavou seus pés e depois disso
esperar a morte iminente. Quando chegou no templo em Calcutá onde
estava Srila Gurudeva, ela estava decidida a obter esta água. No momento
em que se encontrou com Srila Bhakti Bibuddha Bodhayam Maharaj, que
estava servindo a Srila Gurudeva e quando ela lhe explicou toda a
situação, ele disse que achava difícil que Srila Gurudeva lhe desse a água
que havia lavado os seus pés. Mas advertiu que esperasse para obter um
encontro com ele.
Esse dia era uma manhã bem cedinho e quando Srila Gurudeva
escutou dela toda a situação, disse-lhe que a água usada para lavar os seus
pés não poderia beneficiá-la, mas que primeiro ele iria cantar o seu
Gayatri Mantra e quando terminasse, lhe daria uma instrução. Srila
Gurudeva demorou mais ou menos três horas para cantar o seu Gayatri e
depois disso se aproximou de sua discípula dizendo "daqui uma semana,
quando for as quatro horas da manhã, Krishna estará no Keshi Ghat (local
em Vridavana), você deve ir lá pegar um pouco de água e beber. No dia
seguinte, quando for cinco horas da manhã, você deve ir à porta do
Nidhuvan (outro local em Vrindavana) e pegar um pouco de terra dali e
colocar sob sua cabeça - esse vai ser o momento em que Srimati Radharani
passará por ali. Faça isso e espere pela misericórdia do Senhor Supremo. E
sobre tudo, sempre lembre-se que quando Krishna quer proteger alguém,
ninguém poderá matá-lo e se Krishna quiser matar alguém, ninguém
poderá protegê-lo".
Dizendo estas palavas, Srila Gurudeva deixou sua discípula a
mercê de seu próprio entendimento. A senhora depois de escutar tudo isso,
deliberou um pouco e partiu rumo à Vrindavana para cumprir as instruções
de seu Gurudeva. Ela seguiu as diretrizes do seu mestre, foi curada de sua
doença, e vive até hoje, teve filhos, eles cresceram saudáveis, se formaram
e ocupam uma boa posição formal dentro da sociedade.
Apesar de fisicamente Srila Gurudeva estar a uma distância
considerável de Vrindavana (mais de 50 horas viajando de trem expresso)
com seu sadhaka-deha (corpo de praticante do caminho da devoção
através da disciplina), o seu siddha-deha (corpo espiritual) estava em
Vrindavana. E Srila Gurudeva, enquanto cantava o Gayatri pode ver o que
Sri Krishna e Srimati Radharani estariam fazendo em um determinado
momento, possibilitando que sua discípula pudesse se beneficiar com os
elementos por Eles tocados e se curar de forma milagrosa de uma doença
que para os conceitos da medicina a condenava a uma morte iminente.
Srila Guru Maharaj tinha como hábito participar no Vraja-mandal-
parikrama (peregrinação por Vrindavana) e Navadvip-mandal-parikrama
(peregrinação pela Bengala) seguidamente até o ano de 1987. Ele
costumava caminhar com os pés descalços e jejuar até o fim do dia. Depois
do ano de 1987, quando tinha oitenta e nove anos, seus discípulos pediram
que não fazesse tanto esforço físico devido a sua avançada idade.
Uma vez quando Srila Puri Goswami Maharaj foi a um festival do
Ratha-yatra, Srila Bhakti Ballabh Tirtha Goswami Maharaj ficou atônito
ao vê-lo cantar o capítulo do Ratha-yatra do Caitanya-caritamrta
continuamente.
Sua prática do Vraja-mandala-parikrama à pé até os oitenta e nove
anos foi sem paralelo. Srila Gurudeva mesmo com idade avançada, seguia
realizando austeridades e não gostava de obter privilégios apesar de sua
posição. Ele seguia o padrão de renúncia estabelecido pelos Goswamis de
Vrindavana e sempre estava disposto a se sacrificar para estabelecer suas
práticas de sadhana-bhakti (disciplina espiritual).
Sriman Mahaprabhu instruiu a Srila Raghunatha Das Goswami,
(Caytania-caritamrta Antya 6.236-237):
grāmya-kathā nā śunibe, grāmya-vārtā nā kahibe
bhāla nā khāibe āra bhāla nā paribe
amānī mānada hañā kṛṣṇa-nāma sadā
la'be vraje rādhā-kṛṣṇa-sevā mānase
karibe

"Não fale desnecessariamente a respeito de coisas triviais, não escute


semelhantes tópicos. Você não deveria comer alimentados saborosos,
nem deveria se vestir belamente. Não espere honra, mas ofereça
respeito aos outros. Sempre cante o Santo Nome do Senhor Krsna e
dentro da sua mente renda serviço para Radha e Krishna em
Vrindavana".
Srila Gurudeva ensinava essa instrução de Sriman Mahaprabhu
através de sua própria conduta, esta é a forma mais potente para deixar
marcas profundas na consciência daqueles que desejam trilhar o caminho
da devoção. Se desejamos nos relacionar com o Infinito, devemos
incrementar nossa reverência e devoção e diminuir a a exploração e o
desfrute. Na medida que possamos nos adequar a essa equação, poderemos
avançar rumo a rendição. Seguir o caminho da austeridade será a garantia
do praticante que deseja triunfar na árdua luta contra a a ilusão.
No Srimad Bhagavatam (6.1.13) encontramos:
tapasā brahmacaryeṇa
śamena ca damena ca
tyāgena satya-
śaucābhyāṁ yamena
niyamena vā

"Para concentrar a mente, uma pessoa deve observar a vida de


celibato e não cair. Ele deve submeter-se a austeridade voluntária
abandoando o desfrute sensorial. Então, ela deve controlar a mente e
sentidos, dar caridade, ser veraz, limpa e não violenta, seguir os
princípios e regularmente cantar os nomes do Senhor".

E no Bhagavad-gita (6.17), em dois versos vemos a importância do


comportamento regulado aliado a tolerância:
yuktāhāra-vihārasya
yukta-ceṣṭasya karmasu
yukta-
svapnāvabodhasya yogo
bhavati duḥkha-hā

"Aquele que é equilibrado nos hábitos de comer, dormir, trabalhar e


recrear-se, pode mitigar todos os sofrimentos pela prática do sistema
de yoga."
E também no Bhagavad-gita 2.14:
mātrā-sparśās tu kaunteya
śītoṣṇa-sukha-duḥkha-
dāḥ āgamāpāyino 'nityās
tāṁs titikṣasva bhārata
"Ó filho de Kunti, o aparecimento de felicidade e tristeza, e seu
desaparecimento no devido tempo, são como o aparecimento e
desaparecimento das estações de inverno e verão. Elas nascem da
percepção sensorial, ó descendente de Bharata, e uma pessoa deve
aprender a tolerar sem se perturbar."

Outro aspecto que digno de ser destacado, foi a capacidade de Srila


Guru Maharaj praticar o serviço com devoção com a mente (manasa-seva)
. Quando estava manifestando seus passatempos de velhice e enfermidade,
ficava imobilizado na cama, no entanto às vezes comentava discretamente:
"hoje eu fui ao garbha-mandir (quarto interno do templo) e dei uma
olhada em tudo ali; por favor, peça ao pujari (sacerdote) para deixar tudo
limpo".
Os discípulos que estavam acompanhado-o ficaram surpresos com
aquela afirmação, e foram dar uma olhada no quarto interno do templo e
perceberam que muitas coisas ali estavam realmente sujas e transmitiram o
recado ao pujari para que tomasse os procedimentos necessários para a
limpeza do local.
Sripad Gopinath Prabhu, um íntimo discípulo de Guru Maharaj
conta que uma vez em Sridham Mayapur, Srila Guru Maharaj o chamou
em uma manhã e disse-lhe: “Eu fiquei surpreso porque na última noite
tive um pesadelo. Quero que você vá ao templo e pergunte ao pujari se
aconteceu algo com as Deidades na última noite - e você deve me dizer a
verdade”. Então o pujari revelou: “Na última noite, quando fui trocar a
Deidade, dei uma cotovelada em Gadadhara que se inclinou em direção a
Krishna”. Quando contaram para Srila Guru Maharaj, ele disse: “Vá ao
templo e de forma humilde peça perdão (pelo incômodo causado a
Deidade)”
Ao mesmo tempo que Srila Gurudeva estava absorto em seu humor
interno de devoção, ele podia em outros momentos, estar muito pendente
de vários detalhes de organização de festivais ou tópicos referentes a
assuntos administrativos da missão.
Sendo o epítome da humildade, Gurudeva estava disposto a
mostrar respeito à todos e nunca esperava ser respeitado em nenhum
momento. Por vê-lo, alguém poderia entender rapidamente o significado
da humildade. Ele frequentemente referia-se a si mesmo com expressões
como "estúpido, cachorro, tolo, alma condicionada, cavalo".

210
Quando seus discípulos lhe davam alguma roupa, ele a
inspecionava e se percebia que eram roupas de boa qualidade, então
perguntava: "porque vocês estão gastando com semelhantes roupas para
mim?" E mesmo que seus discípulos pudessem responder que haviam
ganhado as roupas, ainda assim, ele retrucava: "mas ainda assim, estas
roupas são muito finas para mim".
Quando alguém lhe oferecia uma coalhada, ele perguntava: "quanto
de leite se necessita para fazer essa coalhada? Quanto custa o leite? Porque
vocês estão gastando tanto dinheiro comigo?" Se algum visitante
perguntasse: "como o senhor está, Maharaj?" Gurudeva responderia: "nem
sequer pergunte sobre mim. Eu tenho me tornado completamente inútil, eu
estou apenas consumindo esses alimentos." Quando os discípulos traziam-
lhe arroz frito, ele se lembrava de como seu Guru gostava dessa
preparação e começava a falar de Srila Prabhupada. Um dia lhe trouxeram
um pouco de postobara (bolas fritas de semente de papoula), então ele
disse: "se você me dá semelhante prasadam opulenta, eu irei parar de
comer".

Srila Gurudeva com a suas práticas ascéticas mostrava que


primeiramente deveríamos eliminar nossa existência mortal, e isso
significa controlar as demandas do corpo. Não podemos pensar na
transcendência, se estivermos muito apegados a satisfazer nossos sentidos.
Viver no mundo sem tocar no mundo, essa deveria ser a atitude daqueles
que desejam transcender a este mundo material. Quando deixamos de
pensar em termos de nossa existência corporal, então nós poderemos
satisfazer nossa razão, ou nossa consciência, e finalmente satisfazer nossos
corações. A demanda do coração é bem mais importante para nós do que
qualquer outra desejo que possamos perceber.
Srila Guru Maharaj nunca teve algum interesse contemporâneo
com os eventos sociais, econômicos ou políticos. Ele foi sempre
profundamente compassivo com as entidades vivas, porque era muito
consciente do destino espiritual último de todos. Algumas pessoas
achavam impressionante que Srila Gurudeva, apesar de estar vivendo no
século vinte, nunca houvesse visto um filme ou assistido televisão.
Mesmo quando ele já estava beirando os noventa anos, e sendo um
Acarya mundialmente renomado, ele não queria subir em um avião, se
podia viajar de carro ou trem. Ele disse aos seus discípulos: "Pessoas estão
doando dinheiro para mim, então eu não posso gastar isso de maneira
luxuriosa, então, eu somente posso gastar isso com minhas Deidades e
com o templo".
Devotos ocidentais que iam à Índia para conhecer `a Srila
Gurudeva, estavam assombrados de ver de como ele era facilmente
acessível e de como era pequeno e simples o seu quarto, somente
possuindo uma cama, ao lado uma mesa, uma estante de livros e uma
cadeira. Somente havia um discípulo que ficava perto dele, porque
Gurudeva não permitia que muitos discípulos estivessem perto dele, não
queria que “atrapalhar” a dedicação deles no serviço (na visão de
Gurudeva), disponibilizando de muitos secretários.
A simplicidade e humildade são dois pilares de extrema
importância para um vaisnava. Se não estamos fundamentados com estas
duas características, estaremos longes do verdadeiro grau de pureza que
nos mostram os grandes santos. Não querer nenhum reconhecimento para
si e jamais buscar alguma posição dentro da sociedade são imprescindíveis
para se alcançar os extratos mais elevados da devoção. Não estamos
interessados aspectos externos do Infinito, não queremos nada com seu
poder ou com todo espaço que ele possa abarcar. Mesmo o tempo eterno,
que tudo abarca, que exerce sua influência sobre todos, não terá a mera
importância para nós. Somente poderemos ser atraídos pela infinita
rendição, a qual nos dará a capacidade de conexão com o Infinito. Através
da humildade e instalando a simplicidade dentro do coração poderemos
atrair a atenção do Supremo.
Srila Guru Maharaj podia perceber todas as coisas que estavam
acontecendo com seus discípulos, podia prever o futuro e saber do passado
também, simplesmente por olhar para alguém, era capaz de saber tudo da
vida dessa pessoa. Srila Bhakti Bibhuda Bodhayan Maharaj (seu
secretário pessoal e sucessor) contou alguns episódios a respeito desses
poderes místicos.
Uma vez, eu vinha de Mayapur para Calcutá de ônibus. A certa
altura do caminho, o ônibus chocou-se com um caminhão. Muitos
passageiros ficaram gravemente feridos. Eu estava cantando no ônibus e
nada aconteceu comigo. Desci e tomei outro. Quando cheguei no templo,
Syamal Prabhu e Madhumangala Prabhu vieram me perguntar se alguma
coisa tinha me acontecido. Eles disseram que Guru Maharaj estava muito
ansioso por mim. Ele tinha dito: “Eu espero que Bodhayan Maharaj não
tenha passado nenhum tipo de problema. Por favor, vá e veja se ele está
bem?”
Em uma outra ocasião, na cidade de Mayapur, nossa irmã
espiritual, Vandanadi devi dasi, veio com outras irmãs espirituais para
oferecer reverências para Srila Guru Maharaja. Ele disse-me que estava
sentindo alguma infelicidade em seu coração porque algo ruim havia
acontecido. Exatamente duas horas depois, chegou a notícia de que Sripad
Ramdas tinha se envolvido em acidente de carro.
Um devoto estava trabalhando no gosala (cuidando das vacas),
quando Srila Guru Maharaja chegou ali e perguntou: “Você não trabalhava
em Gunin (um vilarejo onde as pessoas tinham o costume de realizar
magia negra)?” O devoto ficou surpreso que Guruveda adivinhasse isso,
simplesmente por olhar para ele. Depois Gurudeva o iniciou.
Srila Guru Maharaj se tornou Guru de Gurus não somente devido a
seu amplo conhecimento das escrituras, mas principalmente devido a sua
conduta impecável, extrema humildade e simplicidade, que serviram de
inspiração para muitos devotos. Foram momentos muito intensos, em que
todos aqueles que tiveram a oportunidade de observar seu caráter santo,
como era auto satisfeito, equânime com todas as entidades vivas, sempre
procurando o bem estar de todos...
Sempre que surgia no cenário da devoção tudo ganhava outra
amplitude, era diferente, os sadhakas, sannyasis e gurus já não eram os
mesmos, porque a influência do devoto puro já estava instalada em seus
corações.
O (Hari-Bhakti-Vilasa 1.45,46 citando o Visnu-smrti Vacana)
revela:
krpa-sindhuh su-sampurnah, sarva-
sattvopakarakah nisprhah sarvatah siddhah, sarva-
vidya-visaradah sarva-samsaya-samchetta, 'nalaso
gurur ahrtah

“Aquele que é um oceano de misericórdia, o qual é realizado em todos


os aspectos, o qual tem todas as boas qualidades, o qual trabalha para
benefício de todas as almas, o qual está livre da luxúria, o qual é
perfeito em todos aspectos, aquele que é versado em todas as
escrituras, que conhece a ciência de Krishna, aquele que pode
remover todas as dúvidas dos seus discípulos, e que está sempre alerta
no serviço à Krishna é conhecido como um guru genuíno.”

Quando os discípulos de Guru Maharaj disseram-lhe que tinham o


desejo de escrever sua biografia, ele pensou que era uma ideia ridícula.
Sorriu e brincou em relação ao tema. Ele disse alegremente: “Você lembra
qual era meu apelido de infância? Eu era chamado de ‘Tinu’porque minha
mãe me comprou da parteira por três conchas, então esse era o meu valor,
três conchas”.
Mas seus discípulos eram insistentes, apesar dos comentários
jocosos de Srila Gurudeva. Ao final, ele acabou contando algumas
histórias de sua vida. Seus discípulos começaram a fazer algumas
entrevistas com ele, no intuito de escutá-lo e gravar estas conversas. Em
um dado momento, num dos intervalos das gravações, Srila Gurudeva
disse: “Eu não entendo porque deveria haver uma biografia a meu respeito.
Que boas qualidades eu possuo? Isto é ridículo, isto me faz rir. Porquê
alguém desejaria ler a biografia de uma pessoa tão insignificante como
eu?” As últimas palavras que ele havia dito, estavam carregadas com tanta
sinceridade e sua voz tinha um tom tão forte de humildade que todos que
escutaram isso ficaram aturdidos. Lágrimas vieram dos seus olhos e ele
não conseguia falar mais.
Mais tarde, Srila Gurudeva escreveu em uma carta: “Eu tenho um
pedido, por favor, assegurem-se de que esta biografia não se torne uma
chacota, porque acho que vocês vão me glorificar demasiadamente.
Considero-me muito insignificante em conhecimento e inteligência - ainda
que eu esteja forçado a honra de todos vocês, uma vez que eu sou o
presidente (da Gopinath Gaudiya Math). Entretanto, eu não me considero
um Guru. Sempre falei que ofereci vocês aos pés de lótus de Srila
Prabhupada Bhaktisiddhanta”.

Capítulo 31
PASSATEMPOS FINAIS

No dia 28 de Abril de 1999, em Sri Jagannatha Puri, por volta das


três horas da manhã, Srila Guru Maharaj disse que não estava se sentindo
bem. O auxílio médico foi chamado e Srila Gurudeva dizia que sentia
muita dificuldade para respirar. Decidiram que seria melhor internar Srila
Gurudeva em Calcutá (no estado vizinho). No aeroporto, as autoridades
permitiram que ele fosse diretamente para o hospital sem nenhuma
burocracia.
Srila Gurudeva permaneceu por um mês no hospital. Durante todo
esse tempo, estava cantando fortemente o quanto podia. Na maioria do
tempo cantava o Mahamantra Hare Krishna, em outros momentos ele
recitava alguns versos. Os doutores e enfermeiras estavam admirados por
causa do seu constante canto. Eles sentiam muita reverência e o tratavam
como se fosse seu guru.
No hospital, somente alguns devotos liderados por Sripad Gopinath
Prabhu estavam se revezando para cuidar de Srila Gurudeva. Telefonemas
chegavam de todas as partes do mundo e a direção do hospital estava
ajudando bastante para atender todas estas chamadas. Muitos vaisnavas
vieram de outras templos e missões, incluindo seu amado irmão espiritual,
Srila Bhakti Kumud Santa Maharaj. Ainda que Gurudeva não estivesse
falando por muito tempo, vendo a Srila Santa Maharaj, pediu que lhe
dessem prasadam.
Não somente aos devotos, mas para quaisquer pessoa que chegasse, ele
inquiria a respeito com atenção. Srila Bhakti Bibudha Bodhayan Maharaj
estava pregando no Sul da Índia quando Srila Gurudeva foi internado e
imediatamente retornou para Calcutá, preocupando-se em responder as
mensagens que chegavam de toda a Índia e ocidente querendo saber do
estado de saúde de Srila Guru Maharaj.
Srila Bhakti Ballabh Thirta Maharaj, o Acarya da Sri Caitanya Gaudiya
Math estava muito preocupado com o estado de saúde de Srila Gurudeva e
ofereceu todo apoio e meios para que seus discípulos se hospedassem em
seus templos e pudessem se comunicar com o resto do mundo.
Em maio, Srila Gurudeva recebeu alta e deixou o hospital, mas
ainda estava muito debilitado para voltar para Jagannatha Puri, então
Sripad Govinda Prabhu conseguiu um apartamento em Calcutá para
acomodar a Srila Gurudeva e os devotos mais próximos. Ali, Srila
Gurudeva permaneceu cantando e seus discípulos cantavam kirtana
durante as horas que ele estava descansando.
Mas Srila Gurudeva continuava indisposto e doente, em um
momento ele começou a olhar atentamente para o teto. Quando,
perguntaram: “Guru Maharaj, o senhor está vendo alguém ali?”
Gurudeva disse: “Sim”.
- “O senhor está vendo Krishna?”
- “Não”.
- “O senhor está vendo Mahaprabhu?”
- “Não”.
- “O senhor está vendo Radharani?”
Nesse momento, Srila Gurudeva respondeu fortemente: “Sim!”

Em Julho de 1999, Srila Guru Maharaj voltou para Jagannath Puri


acompanhado por Srila Bahkti Bibudha Bodhayan Maharaj e mais alguns
devotos. Sua saúde melhorou um pouco e tomar um pouco de prasadam.
Depois ficou cantando e perguntando sobre diversos assuntos relativos a
missão e templos. Como era de se esperar, vários devotos vieram de toda
Índia e inclusive de todas as partes do mundo.
Em Outubro foi celebrado o seu aniversário com grande festividade
e participação de muitos Vaisnavas acaryas. Entre eles estavam Srila
Bhakti Kumud Santa Maharaj e Srila Bhakti Vijnan Bharati Maharaj.
Poucos dias antes do dia da celebração, Srila Bhakti Bibudha Bodhayan
Maharaj se aproximou de Srila Gurudeva e perguntou: “Muitos vaisnavas
estão vindo para participar do seu aniversário. Nós sabemos que o senhor
está muito fraco para ir, mas eles gostariam que o senhor falasse algumas
palavras para eles”. Mas Srila Gurudeva respondendo com extrema
humildade disse: “Minha voz agora ficou parecida com a de um pato”.
Então alguns discípulos leram e cantaram alto em seu quarto.
Srila Guru Maharaj ficou gravemente enfermo novamente e seus
discípulos pesarosamente pensavam na sua iminente partida para o mundo
espiritual. No fim de Outubro, na costa da Orissa passou um terrível
ciclone, considerado como um dos piores de todos os tempos. Apesar de
tantos sinais não auspiciosos, aqueles que amavam a Srila Gurudeva,
tinham a esperança de que ele se recuperasse. Muitos buscadores
espirituais de todo mundo estavam vindo para a Índia, com a esperança de
tomar iniciação de Srila Gurudeva, enquanto ele permanecesse no planeta.
Muitos desejavam aceitar a Srila Guru Maharaj, mas não conseguiam
viajar para Índia, então Srila Bhakti Bibudha Bodhayan Maharaj decidiu
viajar para Flórida e Bolívia. Devotos de diferentes partes dos Estados
Unidos foram a Flórida para tomar iniciação ritvik em nome de Srila
Gurudeva através de Srila Bodhayan Maharaj.
Exames de raio-X e de sangue foram realizados e nem sinal de
enfermidade foi encontrado. Toda manhã Srila Gurudeva era banhado e
pela tarde tinha o costume de sentar-se na cadeira. Três ou quatro dias
antes que Srila Gurudeva partisse desse mundo, apesar de já não estava
falar mais, repentinamente e bem alto repetiu esse verso Bhagavad-gita
(10.8)
ahaṁ sarvasya
prabhavo mattaḥ
sarvaṁ pravartate iti
matvā bhajante māṁ
budhā bhāva-samanvitāḥ

“Eu sou a fonte de todos os mundos materiais e espirituais. Tudo


emana de Mim. O sábio que conhece perfeitamente isso, se ocupa em
Meu serviço devocional e Me adora com todo o seu coração”.

No dia do desaparecimento de Srila Gurudeva deste planeta, ele


estava ouvindo kirtana e olhava fixamente fotos de Srila Bhaktisiddhanta,
Sri Nrsinhadeva e Sri Jagannatha. No domingo, 21 de Novembro foi um
dia normal em todos os aspectos. Nessa noite, Sripad Bhakaprasad Prabhu
e Srimati Haripriya Didi estavam servindo a Srila Gurudeva entre as dez
da noite e duas da manhã.
Em dado momento, todos se surpreenderam ao toque do sino e
então, Dinabandhu Prabhu, Madhava Priya Prabhu, Rasesvar Prabhu e
Radhe Syam Prabhu imediatamente foram ao quarto de Srila Gurudeva,
Sripad Gopinath Prabhu foi em seguida. Gurudeva estava deitado,
cantando suavemente. Às duas e dez da manhã Gurudeva parou de
respirar. Sripad Dinabandhu Prabhu disse para Gopinath Prabhu, “ Srila
Gurumaharaj partiu”. Dr. Mahapatra foi chamado, mas disse que mais
nada poderia ser feito.
No dia 22 de Novembro de 1999, às 2h10 AM em Sri Jagannath
Puri, no dia de Rasa Purnima, Nitya Lila Pavista Om Visnupada
Astottarasata Jagatguru Srila Bhakti Promode Puri Goswami Maharaj
desapareceu deste mundo para entrar nos passatempos de Sri Radha e
Krishna.
Logo depois, Gopinath Prabhu ligou para os Estados Unidos, onde
estava Srila Bhakti Bibudha Bodhayan Maharaj e deu-lhe a notícia. Ele
descreve: “Eu já estava me sentindo um pouco indiposto, mesmo antes de
receber a triste notícia da partida de Srila Guru Maharaj, mas mesmo
assim, isso provocou um tremendo efeito em mim. Eu senti como se
tivesse caído inconsciente. Ainda assim, eu imediatamente relembrei as
palavras que Guru Maharaj tinha me falado quando ele ainda estava bem:
'Baba, quando eu partir, eu quero que você leve os meus remanentes para
Mayapur. Meu mestre espiritual, meu parama-gurudeva (guru do guru), e
a maioria dos meus irmãos espirituais foram todos colocados em samadhi
em Mayapur, eu também quero ser enterrado ali’”.
Muitos devotos foram tomar o último darsana de Srila Gurudeva
(vê-lo). A bandeira do templo do Senhor Jagannatha foi trazida junto com
sua guirlanda e foram colocadas em seu pescoço. Muitos servidores do
Senhor Jaganntha estavam chorando por ter a última visão de tal santo. No
meio de um tumultuoso som de lamentação e choro, Srila Gurudeva partiu
de carro para Sridham Mayapur. Ali estavam Sripad Gopinatha Prabhu,
Sripad Dinabandhu Prabhu, Sripad Visnudas Babaji Maharaj, Sripad
Bhakti Saran Damodar Maharaj, Sripad Madhava Priya Prabhu, Sripad
Radhe Syam Prabhu, Sripad Bhaktaprasad Prabhu e Sripad Vidyapati
Prabhu da Sri Caitanya Gaudiya Math.
Primeiramente eles pegaram um pouco de água e areia da praia de
Jaganntha Puri, depois ele circumbularam o samadhi mandir (túmulo) do
Namacharya Srila Haridasa Thakur e foram ao templo do Senhor
Jagannatha. Então, foram a Sri Caitanya Gaudiya Math de Puri, o qual era
o local de aparecimento de Srila Prabhupada Bhaktisiddhanta Sarasvati
Thakur.
Ali, o irmão espiritual de Gurudeva, Pujyapada Krsnakesava
Prabhu veio oferecer reverencias e guirlanda, apesar de seu precário estado
de saúde (por ser também idoso). Todos os devotos do templo vieram
oferecer seus respeitos com lágrimas nos olhos.
Enquanto estavam na Gaudiya Math, Gopinatha Prabhu lembrou-se
que tinha o costume de todos os dia ler o Caitanya Caritamrita no quarto
de Srila Gurudeva e um dia quando estava lendo o passatempo do
desaparecimento de Srila Haridas Thakura, Srila Gurudeva disse-lhe:
“Preste atenção nesse texto! No dia que você fizer o meu samadhi
(túmulo), você vai me trazer essas coisas”.
Os artigos eram: dor (corda de seda usada na adoração do Senhor
Jagannatha); karar (pasta de sândalo oferecida para o Senhor Jagannatha);
prasadam (alimento cozinhado e oferecido para a Deidade.); e vastra
(roupa que oferecida para a Deidade).
Quando chegaram a Bubhanesvara (capital do estado de Orissa,
onde está localizado Jagannath Puri) viram alguns devotos em pé, ao lado
da rua, esperando para ter o último darsana de Srila Guru Maharaj. Os
devotos ofereceram seus dandavats na rua e depois vieram oferecer
guirlandas e doações.
Chegando em Mayapur, o primeiro que fizeram foi ir à Sri
Caitanya Math onde todos os devotos vieram prestar seus respeitos,
soluçando e chorando - trouxeram maha prasada e guirlandas. Quando
foram ao Yogapith, estava extremamente lotado. E novamente, todos
vieram oferecer reverências, guirlandas e prasadam oferecida a Srimam
Mahaprabhu.
Por volta do meio dia, foi feito o samadhi (túmulo) de nitya-lila
pravista om visnupada paramahamsa astotara-sata Srila Bhakti Promode
Puri Goswami Maharaj.
Sripad Bhakti Sarvasva Govinda Prabhu escreveu o samadhi
mantra no peito de Srila Guru Maharaj e Sri Dinadandu Prabhu fez o arati
(adoração). A areia que trazida da praia e toda a parafernália do templo de
Jagannatha Puri foram colocados no samadhi.

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