No primeiro capítulo de seu livro As regras do método sociológico, no qual
apresenta sistematicamente a definição de fato social, a educação é discutida por Durkheim como um exemplo que ilustra a teoria sociológica proposta. O objetivo da educação, para ele, é o de criar o “ser social” com base em uma forma de “coação permanente exercida sobre a criança” pelo meio social para “moldá-la à sua imagem, e da qual os pais e professores não passam de representantes e intermediários” (Durkheim, 1978, p. 89). Segundo Durkheim, para entendermos como a educação é um fato social basta observarmos que o comportamento das crianças não é espontâneo, e sim ensinado pelo grupo à sua volta, que impõe valores, sentimentos e costumes, como os hábitos de higiene, alimentação, vestuário etc. Quando o processo educacional é bem-sucedido, a coerção que o grupo exerce sobre cada membro nem é sentida, parecendo a todos que são hábitos naturais e espontâneos de cada um. A consciência coletiva, por exemplo, é definida por Durkheim como um fato social primordial para a existência da sociedade, pois garante a ocorrência de uma solidariedade social entre os indivíduos, está presente objetivamente fora das consciências individuais e forma nessas mesmas consciências a identidade coletiva que propicia a vida social. A educação é um instrumento da consciência coletiva, por meio do qual a sociedade socializa as novas gerações de acordo com os seus pressupostos morais, religiosos etc. Durkheim (1955, p. 26) defende a ideia de que “[...] cada sociedade considerada em momento determinado de seu desenvolvimento possui um sistema de educação que se impõe aos indivíduos de modo geralmente irresistível”. Para conceituar precisamente o termo “educação”, como era o seu costume, o sociólogo francês formulou a seguinte definição: A educação é a ação exercida pelas gerações adultas sobre as gerações que não se encontram ainda preparadas para a vida social; tem por objeto suscitar e desenvolver na criança certo número de estados físicos, intelectuais e morais, reclamados pela sociedade política, no seu conjunto, e pelo meio especial a que a criança, particularmente, se destine. (Durkheim, 1955, p. 32) Com base nessa definição pode-se entender a educação como um processo de reprodução de uma certa sociedade, por meio da socialização das novas gerações. É por isso que Durkheim afirma que as novas gerações devem ser educadas levando-se em consideração que a sociedade se encontra diante de uma tabula rasa (Durkheim, ibidem). De acordo com a sua condição de fato social que atende a todas as características apontadas acima, a educação é um fenômeno da consciência coletiva que se impõe aos indivíduos, fazendo que o ser social seja acrescentado ao ser animal de cada membro da sociedade, ensinando-lhe certas maneiras de pensar, de sentir ou de agir que os indivíduos não teriam se houvessem vivido em outros grupos humanos. Nas sociedades modernas, a educação integra um conjunto de fatos sociais que promovem o processo de individuação dos seus membros, ou seja, o processo histórico que leva os seres humanos a se pensarem como indivíduos livres e iguais aos demais indivíduos. Esse processo de individuação faz parte de um amplo processo de transformação ocasionado pela evolução da consciência coletiva de uma solidariedade social de tipo mecânico para uma sociedade estruturada com base na existência de uma solidariedade orgânica. A solidariedade mecânica é um estado da consciência coletiva no qual os indivíduos são educados de modo a diferir pouco entre si e a compartilhar sentimentos e valores, reconhecendo os mesmos objetos como sagrados. Tais agrupamentos humanos, fundamentalmente comunidades tribais e clânicas, tornam-se coesos em razão da existência de um consenso que surge da igualdade social que leva os membros da coletividade a não se conceberem como seres singulares, independentes e com interesses próprios distintos dos do grupo. A solidariedade orgânica é o segundo e mais complexo estado da consciência coletiva no qual esta educa os indivíduos a se diferenciar dos demais, como os órgãos de um ser vivo, cada qual exercendo uma função própria na divisão do trabalho social, função esta que deverá beneficiar o todo orgânico. Nas coletividades em que impera a consciência coletiva de tipo mecânico, a consciência individual é quase inexistente e não ocorre o processo de individuação. Já nas sociedades de solidariedade orgânica, a consciência coletiva educa para certa autonomia dos indivíduos quanto às suas ações, crenças e preferências. Durkheim concebe, assim, o desenvolvimento da solidariedade orgânica como um processo social objetivo, por meio do qual o indivíduo nasce e é conformado pela sociedade.