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Introdução

Émile Durkheim e a educação

Émile Durkheim (1858-1917) inicia sua obra intitulada Educação e sociologia


promovendo uma discussão a respeito da pergunta “o que é educação?”. Logo de início,
o autor faz uma delimitação. Explicita que a concepção de educação que ele toma como
referência diz respeito à ação que os homens imprimem sobre os próprios homens.
Dentro desta lógica ainda ressalta que “a ação entre homens pertencentes à mesma faixa
etária diferem da que os adultos exercem sobre os mais jovens” (DURKHEIM, p. 43,
2013). Ou seja, a concepção de educação está atrelada à preparação das gerações atuais
para a vida social realizada pelas gerações anteriores.
“ [...] na verdade, cada sociedade, considerada em determinado momento de
seu desenvolvimento, tem um sistema de educação que se impõe aos indivíduos
como uma força geralmente irresistível” (DURKHEIM, p. 47-48, 2013).
Durkheim coloca que os sistemas educativos ao se desenvolverem sempre dependeram
seja da religião, da organização política, do desenvolvimento das ciências, do estado da
indústria. A educação para uma vida de costumes acaba por ser uma construção social.
Após esta colocação, Durkheim observa:
“[...] cada sociedade elabora um ideal de homem, ou seja daquilo que ele deve
ser tanto do ponto de vista intelectual quanto físico e moral; que este ideal é, em
certa medida, o mesmo para todos os cidadãos; que a partir de certo ponto ele
se diferencia de acordo com os meios singulares que toda a sociedade
compreende em seu seio. A educação é a ação exercida pelas gerações adultas
sobre aquelas que ainda não estão maturas para a vida social. Ela tem como
objetivo suscitar e desenvolver na criança um certo número de estados físicos,
intelectuais e morais exigidos tanto pelo conjunto da sociedade política quanto
pelo meio específico ao qual ela está destinada em particular” (DURKHEIM, p.
52-54, 2013).
Com isto percebe-se uma consequência social à definição, pois neste sentido empregado
por Durkheim, daquilo que se entende por educação, há uma “socialização metódica das
novas gerações” (DURKHEIM, p. 54, 2013). É muito simples de se observar isto,
segundo o próprio autor, quando afirma que na natureza congênita do ser humano não
estão inscritas leis que o fazem obedecer. Isto é um efeito das forças morais que pautam
a regulação da sociedade, as quais seus sistemas educativos corroboram perpetrando-as.
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E são estas forças morais que fizeram o homem sentir sua inferioridade e a necessidade
de submeter-se (DURKHEIM, p. 55, 2013).
Pelo fato de que a criança quando nasce traz consigo apenas as marcas da
hereditariedade, sua natureza pessoal, se tipificando ainda como um “ser egoísta e
associal”, cabe a educação revelar-lhe as potencialidades. Descortiná-las, para uma vida
regulada em sociedade, indo além, pois este movimento é capaz de criar novos homens:
a virtude criadora da educação humana. A educação é um instrumento de transmissão de
aptidões necessárias à vida social (DURKHEIM, p. 56, 2013).
Em assim sendo, pode-se discutir o papel do Estado no processo educativo. Ao mesmo
tempo em que a educação é de interesse da sociedade, a sociedade é de interesse da
educação em uma via de mão dupla. Durkheim aponta a necessidade da sociedade
“lembrar ao professor ideias e sentimentos” que devem ser arraigados durante a
formação das crianças (DURKHEIM, p. 62, 2013).
Assim surge a tarefa educativa: promover uma “comunhão de ideias e sentimentos
entre cidadãos”. Isto além de ser o que torna uma sociedade possível, evita que a
educação fique a mercê de arbitrariedades ou “vontades individuais”. O Estado, então,
aparece como o verificador de princípios essenciais e garantidor de seu ensino nas
escolas (DURKHEIM, p. 64, 2013).
Ainda, é preciso perceber a educação como questão de autoridade. Ao conduzir-nos ao
abandono de nossa condição de natureza inicial, é preciso que exerçamos uma forte
repressão contra nós mesmos com o intuito de nos “subordinarmos a fins mais
elevados” (DURKHEIM, p. 70-71, 2013).
O autor ressalta que a educação em sua conotação de autoridade não diz respeito à
“violência ou repressão”, mas a uma primazia moral. Esta autoridade, segundo
Durkheim, deve ser sentida pelo professor para que ele consiga, exatamente, transmitir
este sentimento acreditando não em si, mas na grandeza de sua tarefa como educador. É
essencial a percepção de que a liberdade deriva da “autoridade bem aplicada”, pois
segundo Durkheim, ser livre “significa ter autocontrolo e agir guiado pela razão e
cumprir o seu dever” (DURKHEIM, p. 73, 2013).
“A criança deve, portanto, estar acostumada a reconhecer a autoridade na
palavra do educador e a respeitara sua superioridade. Esta é a condição para que
mais tarde ela a reencontre sem sua consciência e acate o que ela prescrever”
(DURKHEIM, p. 73, 2013).
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O autor justifica a cientificidade por três motivos: o primeiro diz respeito a


possibilidade de observar fatos já concluídos, ou seja, tem um objeto bem delimitado; o
segundo diz respeito a homogeneidade dos fatos que faz com que se possam estabelecer
categorias para enquadrá-los, classificá-los; e o terceiro é condizente ao interesse em
conhecer fatos, os quais tais objetos de interesse estão implicados.
“De fato, a educação vigente em determinada sociedade e considerada em
determinado momento de sua evolução é um conjunto de práticas, maneiras de
agir e costumes que constituem fatos perfeitamente definidos e tão reais quanto
os outros fatos sociais” (DURKHEIM, p. 78, 2013).
O autor reforça a relação educação/sociedade ao afirmar a impossibilidade de alguém
tentar imprimir determinada educação a um filho que não obedeça ao jogo de regras
vigentes na sociedade.
“Não adianta acreditar que podemos educar nossos filhos como quisermos.
Somos obrigados a seguir as regras reinantes no meio social em que vivemos. A
opinião nos impõe este comportamento, e a opinião é uma força moral cujo
poder opressivo não é menor do que o da força física” (DURKHEIM, p. 78,
2013).

Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948: Direito à Educação (art. 26)

Sabe-se que a educação é algo imprescindível a formação do indivíduo, pois ela é a


ferramenta para o alcance de uma vida melhor, com mais dignidade, além de promover
o acesso a cidadania e ao cumprimento de direitos e deveres.

Trata-se de uma forma de buscar justiça social, haja vista que todos merecem um lugar
de respeito na sociedade e a educação é o mecanismo capaz de transformar a sociedade,
de proporcionar a todos mais igualdade de oportunidades além do desenvolvimento
pessoal e profissional.

A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e


incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da
pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.

Nessa esteira entende-se que, a educação como direito assegurado na Lei Maior deve ser
considerada essencial ao desenvolvimento do indivíduo, logo para que se possa ter
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acesso à cidadania, bem como seus direitos e deveres é necessário o seu pleno acesso
pleno e constante acesso a todos níveis de educação.

Segundo os ensinamentos de Pompeu “de um lado, se encontra a pessoa portadora do


direito à educação e, do outro, a obrigação estatal de prestá-la”. Dessa forma, a
educação é algo que o indivíduo pode cobrar do Estado, pois este tem o dever legal de
promovê-la não importando a condição social de cada um, sendo que cada indivíduo na
realidade é o titular de tal direito enquanto o Estado é o organismo que deve viabilizar o
seu cumprimento sem a distinção por respeito à dignidade da pessoa humana e na busca
pela igualdade e desenvolvimento social.

Aí se afirma que a educação é direito de todos, com o que esse direito é informado pelo
Princípio da Universalidade.

Nessa toada, subtende-se que o Direito a Educação pode ser considerado como parte dos
Direitos Fundamentais, já que se trata de algo indispensável ao alcance da Dignidade
Humana, tendo como base o Princípio da Universalidade sendo, portanto, um direito
universal que o Estado não pode tolher do indivíduo e este por sua vez não pode dispor,
tratando ser este um direito indisponível.

Para que o Direito a Educação atinja a sua real finalidade é preciso que a sua aplicação
seja eficaz, no sentido de oferecer eficiência para que o mesmo seja realizado através de
total e livre acesso.

Assim, o Estado como titular dessa obrigatoriedade deve oferecer mecanismos para que
o acesso à educação seja eficaz de forma que todos possam usufruir de tal direito, pois
não se pode apenas viabilizar a educação a alguns em detrimento de outros.

Portanto, o Estado deve criar ferramentas que viabilizem o acesso à educação a todos os
indivíduos, sem distinção, de forma a possibilitar a inclusão social, o desenvolvimento e
o alcance da justiça social.

A educação é um dos Direitos Humanos, pois está reconhecida teor do artigo 26 da


Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948:

1. Toda pessoa tem direito à instrução. A instrução será gratuita, pelo menos nos
graus elementares e fundamentais. A instrução elementar será obrigatória. A
instrução técnico-profissional será acessível a todos, bem como a instrução
superior, esta baseada no mérito.
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2. A instrução será orientada no sentido do pleno desenvolvimento da


personalidade humana e do fortalecimento do respeito pelos direitos humanos e
pelas liberdades fundamentais. A instrução promoverá a compreensão, a
tolerância e a amizade entre todas as nações e grupos raciais ou religiosos, e
coadjuvará as atividades das Nações Unidas em prol da manutenção da paz.

3. Os pais têm prioridade de direito na escolha do gênero de instrução que será


ministrada aos seus filhos.

O Direito Humano à educação reconhecido na Declaração foi fortalecido como norma


jurídica internacional, principalmente, pelo Pacto Internacional dos Direitos
Econômicos, Sociais e Culturais (arts. 13 e 14), da Convenção Relativa à Luta contra a
Discriminação no Campo do Ensino, da Convenção sobre os Direitos da Criança (arts.
28 e 29) e do Protocolo Adicional à Convenção Americana sobre Direitos Humanos em
Matéria de Direitos Humanos Econômicos, Sociais e Culturais (art. 13).

Tratar a educação como um Direito Humano significa que não deve depender das
condições econômicas dos estudantes ou estar sujeita unicamente às regras de mercado.
Também não pode estar limitada à condição social, nacional, cultural, de gênero ou
étnico-racial da pessoa. O mais importante é conseguir que todas as pessoas possam
exercer e estar conscientes de seus direitos. Nesse sentido, o tópico 2 do artigo 26 da
Declaração é fundamental na definição dos propósitos universais da educação.

O direito à educação tem um sentido amplo, não se refere somente à educação escolar.
O processo educativo começa com o nascimento e termina apenas no momento da
morte. A aprendizagem acontece em diversos âmbitos, na família, na comunidade, no
trabalho, no grupo de amigos, na associação e também na escola.

Por outro lado, nas sociedades modernas, o conhecimento escolar é quase uma condição
para a sobrevivência e o bem-estar social. Sem ele, não se pode ter acesso ao
conhecimento acumulado pela humanidade.

Além de sua importância como Direito Humano que possibilita à pessoa desenvolver-se
plenamente e continuar aprendendo ao longo da vida, a educação é um bem público da
sociedade, na medida em que possibilita o acesso aos demais direitos. Portanto, a
educação é um direito muito especial.
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A educação contribui para que crianças, adolescentes, jovens, homens e mulheres saiam
da pobreza, seja pela sua inserção no mundo do trabalho, seja por possibilitar a
participação política em prol da melhoria das condições de vida de todos. Também
contribui para evitar a marginalização das mulheres, a exploração sexual e o trabalho
infantil, possibilita o enfrentamento de discriminações e preconceitos, entre muitos
outros exemplos.

Direito a educação em Moçambique

Em Moçambique a questão da educação está patente na Lei nº 6/92 de 6 de Maio:


Sistema Nacional da Educação. Esta lei discute sobre a educação contando com sete (7)
capítulos nomeadamente:

Capítulo I: Princípios e objectivos gerais.

Capitulo II: Estrutura do SNE;

Capítulo III: Ensino pré-escolar;

Capítulo IV: Ensino escolar;

Capítulo V: Ensino extra-escolar;

Capítulo VI: Responsabilidade e administração;

Capítulo VII: Implementação do SNE.

Apenas iremos comentar sobre o capítulo I e dois pois os demais capítulos


complementam os dois.

Sobre o capítulo I inerente a princípios e objectivos gerais do SNE sob o artigo 1, a


educação é direito e dever de todo o cidadão e o Estado organiza e promove o ensino,
como parte integrante da acção educativa nos termos definidos na constituição da
Republica.

O que se deve ter em conta nesse artigo supracitado é que o individuo ao se constituir na
sociedade moçambicana de acordo com a lei, o mesmo passa a usufruir do direito como
algo que adquire em primeira instancia na família e ou nas creches por meio da
Socialização Primária e passa para a socialização secundária adquirida no meio escolar
tornando dever na medida em que se torna membro integrante da sociedade
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moçambicana a desenvolver para regular o bem-estar da sociedade moçambicana que


aposta no capital humano.

O Estado com o poder atribuído pelo povo ele promove e organiza o ensino (art. 1,
ponto C) o ensino público é laico. Pela laicidade do ensino implica que todos somos
capazes de ensinar basta que seja para o bem-estar do individuo na integração da vida
social na sociedade dai que o art. 2 dá os princípios pedagógicos:

a) Desenvolvimento das capacidades e da personalidade de uma harmoniosa,


equilibrada e constante, que confira uma formação integral:
b) Desenvolvimento da iniciativa criadora da capacidade de estudo individual e de
assimilação crítica dos conhecimentos:
c) Ligação entre a teoria e a prática que se traduz no conteúdo e método de ensino
das várias disciplinas no caracter politécnico do ensino conferido e na ligação
entre escola e comunidade.

São várias alíneas que elucidam sobre a educação em que os princípios pedagógicos são
meio orientadores que visam disciplinar o que ensina de quem é ensinado em que a
harmonia e o equilíbrio são factores primordiais na formação integrada do educando.

O capítulo 2 fala sobre a estrutura do SNE dizer que apresenta a seguinte estrutura:
ensino pré-escolar – aquele que se realiza em creches e jardins-de-infância para crianças
com idade inferior a 6 anos como acção educativa da família, com a qual coopera
estreitamente (explicito no art. 6), o ensino escolar aquele que compreende o ensino
geral, técnico-profissional e o ensino superior (art. 8) e o ensino extra-escolar este que
engloba as actividades de alfabetização e de aperfeiçoamento e atualização cultural e
cientifica, realiza-se fora do sistema regular do ensino (art. 35).
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Conclusão

Bibliografia

Constituição da República de Moçambique, 2004

DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS DE 1948

DURKHEIM, Émile. Educação e sociologia. Rio de Janeiro: Editora Vozes, 2013.

Lei nº 6/92 de 6 de Maio sobre Sistema Nacional de Educação.

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