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2.3 Peculiaridade das Ciências Sociais: Unidade do Social e Pluralidade das


Ciências Sociais

O que caracteriza as diversas Ciências Sociais é que a realidade por elas


estudadas é uma só: a condição humana, vista numa perspectiva específica com
o objecto de estudo, isto é, as Ciências Sociais sendo um campo vasto de estudo
apresentam uma unicidade do objecto, contudo, mantem a sua diversidade e
pluralidade que se expressa na forma de encarar, abordar aquela mesma
realidade. Por outras palavras, cada uma das Ciências Sociais adopta, em
relação a realidade social, uma óptica de análise diferente.

Segundo Nunes (1994), as diferentes Ciências Sociais distinguem-se uma das


outras em função de 4 níveis que ele considerou de princípios lógicos de
diferenciação empírica das Ciências Sociais, que são:

1o - quanto aos fins ou objectivos que orientam a investigação, ou seja, o que


interessa ao investigador analisar, explicar e compreender;
2o - quanto a natureza do problema de investigação que os investigadores
definem como sendo aqueles sobre os quais a sua pesquisa vai incidir;
3o - quanto aos critérios utilizados pelos investigadores para o estudo desses
problemas;
4o - quanto aos métodos e técnicas de pesquisa.

Portanto, as Ciências Sociais diferem uma das outras devido ao centro de


interesse de investigação que é preparado umas diferentes das outras

2.3.1 Unidade do Social e Pluralidade das Ciências Sociais


Sabe-se a partida que as Ciências Sociais procuram conhecer o Homem e a
realidade que o cerca com as diferentes facetas em que se apresentam. Os
diferentes acontecimentos que na realidade social se produzem, contém
inúmeras informações que não podiam ser entendidas de uma mesma forma.
Daí que a realidades social possa, por si só, representar um vasto campo de
análise onde se constituem objectos diversos de conhecimento científico, o que

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implica o aparecimento de diferentes e diversas Ciências Sociais. Através delas


e do contributo de cada uma, podemos atingir uma explicação mais completa
sobre a realidade social.

Há pois, uma pluralidade das Ciências Sociais que incidem sobre o mesmo
campo de análise – a realidade social - buscando, aí, e de acordo com a
perspectiva de cada uma, informações que se complementam.

As Ciências Sociais invadem a realidade social sem, contudo, a repartirem ou


compartimentarem, porque afinal, possuem o mesmo campo de análise, o que
implica afirmar que a realidade social é uma e única, não se dividindo. Pode,
então, falar-se de uma unidade (a realidade social) analisável por diversas
Ciências (Sociais): a unidade sob a diversidade.

Como afirma o filósofo francês George Gurvitch, ".... o que caracteriza as


Ciências do Homem é que a realidade por elas estudadas é uma só: é a condição
humana considerada sob uma certa luz e tomada objecto de um método
específico (...)"

Teoricamente pode compartimentar-se a realidade social para melhor


comodidade de análise por parte de cada uma das Ciências Sociais, mas ela
continua a ser apenas uma e a mesma realidade, com um grau de complexidade
que apela para uma cada vez mais participação de todas as Ciências Sociais,
no sentido de poder conhecer melhor.

Na verdade, se a realidade social estudada pelas Ciências Sociais é uma só (o


comportamento social do Homem), diferentes fenómenos Sociais (económicos,
sociológicos, políticos, etc.) não pode desligar-se uns dos outros como se fossem
compartimentos estanques.

Nota-se que existe uma unidade sobre as diversidades das disciplinas onde uma
unidade exprime uma realidade que é uma só - a condição humana. Esta
unidade do objecto das Ciências Sociais começou a ser conhecida com base na
noção de fenómeno social total.

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A condição humana contrariava a opinião de Augusto Comte visto que ele


defendia que cada uma das ciências cabia investigar um distinto campo do real,
isto é, um conjunto de fenómenos reais separados uns dos outros. Para Comte,
a Economia ocupar-se-ia da realidade económica (ou das realidades
económicas), a Ciência Política da realidade política ou dos fenómenos
políticos), e assim em diante. Este posicionamento é contrariado pela concepção
que defende que no domínio do humano e do social não se distinguem uns dos
outros como se fossem campos estanques. O campo da realidade sobre a qual
as Ciências Sociais se debruçam é, de facto, um só - o da realidade humana e
social, e todos os fenómenos desse campo são fenómenos sociais totais, quer
dizer, fenómenos que, seja na sua estrutura própria, seja nas suas relações e
determinações, têm implicações simultaneamente em vários níveis e em
diferentes dimensões do real social, podendo interessar a várias ciências, senão
a todas.

Texto Complementar
Os Fenómenos Sociais Totais

Em função do que foi dito, ficamos com a ideia de que as Ciências Sociais não
investigam distintos campos do social, nem distintos fenómenos. Pelo
contrário, todas elas analisam o social, aplicando instrumentos e mecanismos,
esse sim, diferentes, que permitem atingir os objectivos e finalidades de cada
uma delas. Daí, dizer-se que um mesmo fenómeno social pode ser analisado
por diversas Ciências Sociais, criando-se, deste modo, o conceito de
"fenómeno social total", de características unidimensionais e
pluridimensionais.

Para melhor se perceber a ideia de fenómeno social total, tem-se o seguinte


exemplo sobre Emigração:

- A saída da população activa implica, sem dúvida, um desfalque na produção


nacional, nomeadamente no empobrecimento da mão-de-obra,
enfraquecimento da estrutura económica ao nível de um ou mais sectores. Por

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outro lado, poderia contribuir para o aumento do consumo graças à acção de


remessas de emigrantes, criando a ilusão que isso aumentaria a produção.

- A saída para o estrangeiro conduz, simultaneamente, a um crescimento da


população e baixa de outras taxas como a fecundidade e a de natalidade, ou
o incremento da taxa de mortalidade geral devido ao aumento relativo da
população idosa, compreensivelmente não vocacionada para emigrar.

- Numa determinada estrutura social pode denotar-se as implicações


socioculturais que provoca o fenómeno de imigração, nomeadamente ao nível
das manifestações culturais importantes, o desenraizamento face aos
fenómenos de aculturação no exterior e até ao aparecimento de situações de
novo-riquismo, devido ao aumento substancial de riqueza obtida no exterior.

- A emigração determina, no tempo, ciclos mais ou menos intensos cujas


causas facilmente encontramos nas situações políticas e económicas de uma
formação social. É durante um período de crise interna que este fenómeno
aumenta.

Do exemplo apresentado constata-se o seguinte:

No primeiro caso, define-se algumas das preocupações da Economia. No


segundo, o texto induz-nos a encontrar respostas através da Demografia. No
terceiro, coloca-se problemas no âmbito da sociologia. No último, a História se
encarrega de estudar os ciclos das emigrações.

Como se pode constatar, a partir de um fenómeno (a Emigração) definiram-se


diversas abordagens científicas e outras mais poderiam realizar-se, tantas
quantas as Ciências Sociais. Quer isso dizer que o fenómeno em causa pode
ser investigado de acordo com as suas múltiplas facetas - Pluralidade das
Ciências Sociais e Unidade ou Unicidade do Fenómeno Social. Ao mesmo
tempo, o fenómeno em si, reflecte-se não só no segmento ou dimensão onde
se produz (unidimensional), como em todos os outros segmentos ou dimensão

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do social (pluridimensional), afectando, portanto, toda a estrutura social


implicada, definindo-se, deste modo, como fenómeno social total.

Exercício.
Explica como é que "as classes sociais" como fenómeno social total pode ser
objecto de estudo ou interessar à Economia, à Psicologia Social, à Linguística e
à Demografia.

2.3.2 Complementaridade e interdependência das Ciências Sociais


Se pretendemos analisar correcta e completamente um determinado fenómeno
social, devemos partir do princípio de que poderá ser feita essa análise por todas
as Ciências Sociais.
Os fenómenos são plurifacetados o que impende que uma só ciência social
tenha a possibilidade de os conhecer na sua totalidade. Cada ciência estudará
uma das facetas do problema e, para chegar a compreensão da totalidade do
fenómeno tem de fazer recurso das outras ciências sociais. Quer isso significar
a necessidade que o cientista tem de complementar o conhecimento conseguido
por uma ciência, com o contributo doutras que ajudam a conhecer melhor o
fenómeno, através dos seus diferentes aspectos que o compõem.

Portanto, está posta de lado a ideia de que cada ciência social actuava nos seus
domínios próprios e isolada de todas as outras: a Economia estudava os
fenómenos económicos, a História estudava os fenómenos históricos, a
Psicologia o comportamento individual, etc. Qualquer estudo social implica, hoje
em dia, um conhecimento mais vasto sobre o objecto a analisar pelo que o
recurso às outras ciências e respectivas perspectivas é uma necessidade não
só para complementar conhecimentos conseguidos por cada uma das ciências
em causa, como também para justificar, a sua interdependência através da
articulação dos saberes que cada uma apresenta.
Deste modo, nenhum historiador poderá escamotear os conhecimentos que a
Demografia, que a Antropologia, que a Sociologia, e que todas outras ciências
possuem para perceber melhor um fenómeno social em análise.

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As Ciências Sociais são, pois, complementares entre si porque são


interdependentes na procura de respostas às questões, cada vez mais
pertinentes que elas próprias colocam.

2.3.3 A Interdisciplinaridade e Multidisciplinaridade como atitude metodológica


Se a abordagem pluridisciplinar, sobre o mesmo fenómeno social é deveras
importante, não é suficiente para ter um conhecimento mais científico.
Para ultrapassar os problemas criados pela compreensão sobre o nosso objecto
de análise - o fenómeno social -, torna-se importante criar uma rede de inter-
relações disciplinares que pesquisem no sentido de definição do objecto a
analisar, elaboração de hipóteses de trabalho para, ainda em conjunto atingirem
as conclusões finais. Este modo de análise a (interdisciplinaridade) não se
opõem à multidisciplinaridade, apesar de diferentes significados que têm. A
multidisciplinaridade pressupõe a conjugação de esforços de várias ciências
para atingir determinados objectivos, estes mesmos elaborados à partida pelas
ciências intervenientes no estudo do fenómeno. A construção dos conceitos e
elaboração das técnicas fazem parte da interdisciplinaridade, "quebrando" os
obstáculos da autonomia de cada ciência.
A multidisciplinaridade apresenta-se como um conjunto de ciências/disciplinas
que analisam o mesmo fenómeno cada qual com os seus instrumentos e
chegando, todas elas, a resultados diferentes, mas não antagónicos, que apenas
se complementam entre si, contrariamente à interdisciplinaridade que apenas
admite um único resultado.

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