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Tenho um desejo intenso de que as pessoas vejam e

provem o Deus da Bíblia, e uma frustração semelhante


quando vejo a desilusão, a perda e a insegurança que
acompanham a falta de conhecimento bíblico. É por isso
que fico feliz por você estar segurando este livro. Jen
Wilkin leva a sério a necessidade de conhecermos o Deus
da Bíblia. Ela é uma das melhores professoras da Bíblia
que já tive a oportunidade de ouvir. Sua abordagem para
ensinar as pessoas a crescerem no conhecimento das
Escrituras é acessível e útil, independentemente de serem
crentes há décadas e sentirem que é muito tarde para
aprender ou de serem novos crentes que têm fome de
conhecer e compreender o Deus da Bíblia.
Matt Chandler, Pastor Principal da Village Church, Dallas,
Texas; Presidente da Rede de Implantação de Igrejas Atos
29.

Tenho visto olhos cheios de lágrimas à medida que as


mulheres compreendem pela primeira vez que a Bíblia é,
de fato, literalmente a Palavra de Deus. Que grandiosa
misericórdia nos foi revelada — que o criador, que apenas
falou para trazer à existência todas as coisas, deu-nos a
sua Palavra.
Jen Wilkin conhece essa misericórdia no íntimo do seu
ser. Ela tem provado e visto a bondade de Deus em sua
Palavra, e deseja que toda mulher compreenda isso. Leia
Mulheres da Palavra com sua Bíblia aberta e na companhia
de suas amigas. Pense nesse livro como um maître de um
banquete de estudo bíblico — sente-se, aqui estão os seus
talheres, prove e aprecie-o.
Gloria Furman, esposa do pastor da Redeemer Church of
Dubai; mãe, autora de Glimpses of Grace [Vislumbres da
Graça] e Treasuring Christ When Your Hands Are Full
[Valorizando Cristo Quando Suas Mãos Estão Cheias].

Jen vive aquilo que ensina. Seu humilde coração, ao


esclarecer as Escrituras, bem como sua afeição pelas
mulheres a quem ensina, torna-se evidente desde o
momento em que a conhecemos. Estou tão feliz por ela ter
sido obediente ao chamado do Senhor para escrever este
livro! Ele tem servido para limpar a névoa de meu coração
e mente no que se refere a estudar a Palavra de Deus, e,
absolutamente, não posso esperar para adquirir muitas
outras cópias dele para as mulheres em minha vida, as
quais eu sei que também o amarão!
Bethany Dillon, cantora e compositora norte-americana.

Ler a Bíblia pode parecer desencorajador às vezes. Há


passagens difíceis, muitas interpretações e, geralmente,
pouco tempo para lê-la mais detalhadamente. Jen Wilkin
reconhece essas dificuldades e oferece ferramentas para
nos ajudar a navegar pela Bíblia. Mulheres da Palavra nos
fornece um guia para o conhecimento bíblico. Se
quisermos conhecer o Deus que amamos, devemos engajar
nossas mentes em conhecer a sua Palavra, onde ele se
revela. As ferramentas de Wilkin talvez possam ser novas
para alguns, mas esse esforço valerá a pena pela
recompensa. Finalmente, o propósito é ver e contemplar o
nosso Salvador.
Trillia Newbell, autora do livro United: Captured by God’s
Vision of Diversity [Unidos: Encantados Pela Visão de Deus
sobre a Diversidade].

Este livro confronta a abordagem baseada em


sentimentos, egoísta e que tem frequentemente
dominado o nosso estudo das Escrituras. Jen encoraja as
mulheres a crescerem no conhecimento da Palavra, a fim
de conhecerem o Senhor. Ela revela a sua própria
experiência alegre e crescente de aprender a cavar mais
fundo. Quem sabe sua voz se junte a de muitas outras!
Kathleen Nielson, diretora do Women’s Initiatives
[Iniciativas Femininas], do Ministério Gospel Coalition
[Coalisão Evangélica].

O livro de Jen Wilkin é escrito com carisma e ternura, o


que o torna fácil de ler. Mas ela também escreve com uma
clareza de propósito que instiga, da forma correta, o leitor
a desejar ler bem a Palavra de Deus. Conclusão: este livro
encoraja as mulheres a conhecerem melhor a Deus através
do desenvolvimento de bons hábitos de leitura da Palavra.
Amém, irmã!
Jenny Salt, deã de estudantes na Sidney Missionary and Bible
College.

Como podemos nos aprofundar no conhecimento da


Palavra ao invés de apenas provarmos umas amostras da
Bíblia para ter inspiração? Jen Wilkin nos mostra como
fazer isso nessa leitura obrigatória para toda mulher
interessada em ensinar e liderar grupos de discussão
bíblica em sua igreja.
Nancy Guthrie, professora da Bíblia, autora do livro
Antes de Partir, Editora Fiel.
Mulheres da Palavra
Como Estudar a Bíblia com nossa Mente e Coração
Traduzido do original em inglês Women of The Word: How to Study the Bible
with both our Hearts and Our Minds Copyright ©2014 por Jennifer Wilkin
Publicado por Crossway Books, Um ministério de publicações de Good News
Publishers

1300 Crescent Street


W heaton, Illinois 60187, USA.

Todos os direitos em língua portuguesa reservados por Editora Fiel da Missão


Evangélica Literária P ROIBIDA A REPRODUÇÃO DESTE LIVRO POR QUAISQUER
MEIOS , SEM A PERMISSÃO ESCRITA DOS EDITORES , SALVO EM BREVES CITAÇÕES , COM
INDICAÇÃO DA FONTE .

Copyright © 2014 Editora Fiel Primeira Edição em Português: 2015

Diretor: James Richard Denham III Editor: Tiago J. Santos Filho


Coordenação Editorial: Renata do Espírito Santo Tradução: Waléria Coicev
Revisões: Zípora Vieira, Anna Maria de Azevêdo e Renata do Espírito Santo
Diagramação: Wirley Corrêa
Capa: Lucas Gonçalves
Ebook: Yuri Freire

ISBN: 978-85-8132-279-7
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

W683m Wilkin, Jen, 1969-

Mulheres da palavra : como estudar a Bíblia com nossa


mente e coração / Jen Wilkin. – São José dos Campos,
SP : Fiel, 2015.
2Mb ; ePUB
Título original: Women of the word.
Inclui referências bibliográficas.
ISBN 978-85-8132-279-7

1. Bíblia – Estudo e ensino. 2. Mulheres cristãs – Vida


religiosa. I. Título.

CDD: 220.071

Caixa Postal, 1601


CEP 12230-971
São José dos Campos-SP
PABX.: (12) 3919-9999
www.editorafiel.com.br
Sumário

Prefácio de Matt Chandler


Introdução
Capítulo 1 — Revirando as Coisas
Capítulo 2 — Uma Questão para o Conhecimento Bíblico
Capítulo 3 — Estude com Propósito
Capítulo 4 — Estude com Perspectiva
Capítulo 5 — Estude com Paciência
Capítulo 6 — Estude com Processo
Capítulo 7 — Estude com Preces
Capítulo 8 — Juntando Tudo
Capítulo 9 — Auxílio para Professoras
Conclusão — Busque a Face de Deus
Recursos Recomendados
Para Jeff, aquele que me conhece melhor.
Você me dá coragem. Salmo 34.3
Agradecimentos

Sou grata a Collin Hansen e Dave DeWit por


acreditarem que eu teria algo a dizer e por me darem um
meio para dizê-lo. Vocês dois sabiam que eu era uma
escritora antes mesmo que eu soubesse.
Aos meus amigos editores — Lindsey Brittain, Kindra
Grider, Lori Kuykendall e Kristen Rabalais — obrigada
por lerem todas as versões desajeitadas dos meus
pensamentos e por me ajudarem gentilmente a ser uma
melhor comunicadora. Eu valorizo o trabalho de vocês e,
ainda mais, sua amizade.
Emily Spalding e Sally Sturm, chamá-las de “terapia
gratuita” seria um eufemismo. Amo vocês duas.
Tara Davis, obrigada por me dar a regra sobre vírgulas
de Oxford e por desemaranhar minhas frases com
paciência e graça. Gloria Furman, você leu meus
manuscritos com generosidade nas semanas posteriores à
chegada de seu quarto filho. Eu sabia que você tinha
outras coisas para fazer, e seu encorajamento foi um
presente de valor inestimável.
Matt Chandler, você concedeu sua amizade e apoio
irrestrito ao meu ministério e mensagem. Obrigada por
ser o meu pastor. Kent Rabalais e Sara Lamb, a disposição
de vocês em me ajudar a equilibrar minhas
responsabilidades na Village Church e meus compromissos
de escritora me mantiveram sã.
Matt, Mary Kate, Claire e Calvin, vocês são meus filhos
favoritos no mundo. Ao me darem espaço para escrever e
me ajudarem a manter a nossa casa de pé, vocês se
tornaram parceiros em meu ministério. Não vamos comer
lasanha congelada por algum tempo.
E às mulheres do grupo de estudo bíblico do Flower
Mound [Monte das Flores], cujas fome e sede de justiça
têm sido uma contínua inspiração para manter minhas
mãos no arado, obrigada por se juntarem a mim e por
amarem a Deus com sua mente. Vocês são preciosos
lembretes semanais de que esse trabalho é importante.
Prefácio

Quando o Espírito Santo abriu os meus olhos para crer,


foi como se eu tivesse sido atropelado por um trem. Eu me
apaixonei por Jesus naquela noite e ainda tive que me
recuperar disso. Mas, embora o meu coração estivesse em
chamas, minha mente estava vazia. Fiz centenas de
perguntas naquela noite e nos dias seguintes.
Pela providência graciosa de Deus, ele colocou um
homem em minha vida que estava disposto a me ensinar
desde o início o que era a Bíblia. Essa citação de Ed
Clowney resume o que aprendi naqueles primeiros dias:

Há histórias maravilhosas na Bíblia..., mas é possível conhecer as


histórias da Bíblia e ainda assim não compreender a história da Bíblia...
A Bíblia tem um enredo. Ela traça o desenrolar de um drama. A história
segue a trajetória de Israel, mas não começa aí, nem contém o que
esperaríamos da história de uma nação... Se nos esquecermos do
enredo, arrancaremos a essência da Bíblia. As histórias da escola bíblica
dominical são então contadas como histórias enfadonhas de um gibi de
domingo, nas quais Sansão é um substituto para o Super-Homem e
Davi se torna uma versão hebraica do filme Jack the Giant Killer [O
Matador de Gigantes]. Não, Davi não é um menino valente que não tem
medo do enorme gigante mau. Ele é o ungido do Senhor... Deus
escolheu Davi como um rei segundo o seu coração, a fim de preparar o
caminho para o grandioso Filho de Davi, o nosso Libertador e
Campeão.1

Ao longo dos últimos vinte anos, o Espírito Santo tem


usado as Escrituras para me encorajar, repreender, moldar
meu casamento, minha paternidade, minha relação com o
dinheiro, minha perspectiva em meio a tragédias e para
atrair o meu olhar repetidamente para Aquele que é o
centro da Bíblia. Encontro em meu coração um desejo
intenso de que as pessoas vejam e provem o Deus da
Bíblia, e uma frustração semelhante quando vejo a
desilusão, a perda e a insegurança que acompanham a
falta de conhecimento bíblico.
É por isso que fico feliz por você estar segurando este
livro. Jen Wilkin leva a sério a necessidade de
conhecermos o Deus da Bíblia. Ela é uma das melhores
professoras da Bíblia que já tive a oportunidade de ouvir.
Sua abordagem para ensinar as pessoas a crescerem no
conhecimento das Escrituras é acessível e útil,
independentemente de serem crentes há décadas e
sentirem que é muito tarde para aprender ou de serem
novos crentes que têm fome de conhecer e compreender o
Deus da Bíblia. Os seus 5 P’s de propósito, perspectiva,
paciência, processo e preces lhe servirão muito bem durante
as semanas e meses que estão por vir.
Estou confiante de que aprendendo e praticando o
método de estudo bíblico da Jen, você ficará fascinada
tanto com as histórias bíblicas como com a História da
Bíblia, e será transformada para sempre à medida que for
conhecendo o Herói dessa história.
Cristo é tudo,

Matt Chandler
Pastor Principal da Village Church
Presidente da Rede de Implantação de Igrejas Atos 29.

1. Edmund P. Clowney. “The Unfolding Mystery: Discovering Christ in the Old


Testament” [O Mistério Revelado: Descobrindo Cristo no Antigo Testamento]
(Phillipsburg, NJ: P&R, 1988), p. 11.
Introdução

Como mover uma montanha?


Com uma colherada de terra por vez.
Provérbio chinês

Este é um livro sobre como mover uma montanha. A


montanha é minha própria falta de conhecimento bíblico,
embora eu admita ter ignorado a existência dela até meus
vinte e poucos anos. Desconfio que ela possa ser a sua
montanha também, mas você terá que decidir isso por si
mesma. Ao contrário do Pico Pikes ou do monte
Kilimanjaro, essa montanha não se apresenta de imediato
à nossa vista — ela leva tempo para ser percebida.
Felizmente, ao contrário de uma montanha real, essa
pode ser movida. Isso é uma coisa boa, porque há algo
indescritivelmente belo a ser contemplado do outro lado.
Se houvesse uma coisa chamada pedigree de igreja, o meu
seria “vira-lata”. Passei minha infância buscando uma
igreja para chamar de lar, seguindo uma ou outra igreja
dos meus pais (que se divorciaram quando eu tinha nove
anos) e visitando algumas onde iam sem compromisso.
Gastei um tempo considerável em sete denominações
diferentes, durante o qual eu ia para a escola dominical,
escola bíblica de férias, grupos de jovens e retiros. Fui
batizada por aspersão quando criança e por imersão na
adolescência. Eu cantava hinos antigos de hinários ao som
de órgãos, e entoava canções de louvor projetadas na
parede ao som de violões. Aprendi a levantar minhas
mãos em adoração e também a deixá-las ao lado do corpo.
Ouvi sermões lidos em tom monótono e escutei pregações
feitas aos berros. Aprendi o ritmo dos credos e liturgias,
bem como o dos tamborins e das danças. Aprendi a ter a
“hora silenciosa” e memorizei inúmeros versículos da
Bíblia para ganhar uma estadia gratuita no acampamento
de verão. Aprendi como compartilhar o evangelho com
meus amigos perdidos. Eu era uma criança da igreja —
apesar de ser uma criança de muitas igrejas — e podia dar
respostas às perguntas da escola dominical que deixavam
minhas professoras radiantes de orgulho.
Na faculdade, continuei minhas viagens
denominacionais, lendo livros devocionais e frequentando
estudos bíblicos para abanar as chamas da minha fé. No
meu último ano, pediram-me para liderar um estudo. Mas
eu carregava um segredo que não era incomum às pessoas
com os meus antecedentes: eu não conhecia a minha
Bíblia. É claro, eu conhecia partes dela — lembrava-me
das histórias da escola bíblica de férias e podia citar
versículos de todo o Novo Testamento e dos Salmos —
mas eu não sabia como as partes que eu conhecia se
encaixavam com as outras, muito menos como elas se
encaixavam com as partes que eu ainda não conhecia.
Ofuscando minha visão periférica, havia uma montanha
de ignorância bíblica que estava só começando a me
preocupar. Embora eu tenha guardado o que sabia, estava
crescendo perturbada por aquilo que não sabia.
Gastar tempo em todas aquelas igrejas diferentes me
ensinou a verdade preocupante de que todos os pastores
tinham muito a dizer, mas que nem todos os pastores
estavam dizendo as mesmas coisas. Quem estava certo? O
arrebatamento existia ou não? Deus teria que responder
às nossas orações se orássemos de determinada maneira?
Eu precisaria me batizar de novo? Qual é a idade da Terra?
Os crentes do Antigo Testamento foram salvos de modo
diferente dos crentes do Novo Testamento? Em sua
maioria, meus professores pareciam igualmente
convincentes. Como eu poderia saber quem estava
interpretando adequadamente a Bíblia e quem estava
ensinando algo errado? Experimentar o doloroso
resultado do ensino errado despertou em mim o desejo de
conhecer, por mim mesma, o que a Bíblia ensinava.
O casamento e a maternidade aumentaram meu senso
de urgência para aprender, revelando o quão mal
equipada eu estava para cumprir esses papéis de maneira
que honrasse a Deus. Mas eu não sabia por onde começar
para solucionar o problema. Parecia mais do que óbvio
que, se Deus havia nos dado sua vontade revelada na
Bíblia, eu deveria gastar mais tempo tentando conhecê-la
e entendê-la. Mas essa tarefa parecia assustadora. Por
onde eu deveria começar? E por que as coisas que eu já
estava fazendo não estavam tornando o problema
visivelmente melhor? Como eu deveria mover a montanha
da minha ignorância bíblica?
A resposta, é lógico, era gloriosamente simples. A
resposta era: “uma colherada por vez”. Felizmente, alguém
me deu uma colher.
Confesso que fui ao meu primeiro estudo bíblico para
mulheres esperando encontrar conversas de adultos e
bolo de café, não necessariamente nessa ordem. A
tentação de poder ter babá gratuita era mais do que
aquela jovem mãe de um bebê de três meses poderia
resistir, então saí de casa e voltei para a terra dos viventes.
O que encontrei foi algo muito doce: um grupo com a
mesma disposição para interagir em comunhão, oração e
estudo. O que encontrei, embora eu não soubesse disso
naquela época, foi o início de um processo que me
transformaria de aluna a professora, levando-me a ficar
acordada na cama à noite, planejando uma forma de
colocar mais colheres nas mãos de mais mulheres, orando
para que muitas montanhas pudessem ser lançadas no
mar.
Este livro tem a intenção de equipá-la com a melhor
colher que eu puder lhe oferecer. Ele pretende ensinar-lhe
não apenas uma doutrina, um conceito, ou uma narrativa,
mas um método de estudo que lhe permitirá desvendar a
Bíblia por si mesma. Ele pretende desafiá-la a pensar e a
crescer, usando ferramentas acessíveis a todos, quer
tenhamos um diploma de ensino médio ou uma
graduação em um seminário; tendo apenas alguns
minutos ou horas diárias para se dedicar. Este livro tem a
intenção de mudar a sua forma de pensar sobre o estudo
bíblico.
Talvez a sua história não se pareça em nada com a
minha — talvez você tenha passado toda a sua vida em
uma mesma igreja ou em nenhuma igreja. Minha
suposição é que você deva conhecer o desconforto obscuro
de viver à sombra de uma montanha.
Dizem que nos tornamos aquilo que contemplamos.
Creio que não exista nada mais transformador para a
nossa vida do que contemplar Deus em sua Palavra. Afinal
de contas, como podemos nos conformar à imagem de um
Deus que não temos contemplado? Do outro lado da
montanha da minha ignorância bíblica estava a visão de
um Deus elevado e exaltado, uma visão que se estendia
desde Gênesis até Apocalipse, a qual eu precisava ver
desesperadamente. De modo nenhum posso dizer que já
removi toda aquela montanha do meu campo de visão,
mas pretendo ir para o túmulo com terra debaixo das
unhas de tanto cavar e segurando bem firme uma colher.
Estou determinada a não deixar que nenhuma montanha
de ignorância bíblica me impeça de ver Deus da forma
mais clara que os meus setenta ou oitenta anos nesta terra
me permitirem.
Portanto, este é um livro para aquelas que estão prontas
para começar a cavar. É um livro para aquelas que estão
prontas para enfrentar definitivamente a montanha de
sua compreensão fragmentada das Escrituras, erguendo
uma colher, e ordenando que ela se mova.
1
Revirando as Coisas

Toda a Escritura é inspirada por Deus e útil para o ensino, para a repreensão,
para a correção, para a educação na justiça, a fim de que o homem de Deus seja
perfeito e perfeitamente habilitado para toda boa obra.
2 Tm 3.16-17

Este é um livro sobre equipar mulheres por meio do


estudo da Bíblia. Com exceção da minha família, esse é o
assunto com que mais me preocupo. Mas nem sempre foi
assim. Muito tempo antes de eu ter uma paixão por
ensinar a Bíblia, eu tinha um amor profundo e contínuo
por outra coisa. Aos quatro anos de idade, eu era
apaixonada por meias-calças de babado.
Você se lembra das meias-calças de babado — aquelas
meias para menininhas, superenfeitadas com quatro
fileiras de babado de renda costuradas na parte de trás?
Eu definitivamente amava aquilo. Todos os dias eu ia para
a escola de vestido, de forma que eu pudesse usar minhas
meias-calças especiais. Quando me cansava dos vestidos,
corajosamente, eu apertava a meia-calça por debaixo da
calça jeans. Volumoso? Sim. Desconfortável? Totalmente.
Bonito? Você sabe.
Eu apreciava tudo nelas, exceto uma coisa — os babados
ficavam na parte de trás, onde a pessoa que usava a meia-
calça não podia ter a alegria de vê-los. Toda aquela renda
linda fora do alcance da vista? Inaceitável. Mas uma
solução simples apareceu: comecei a usá-las de trás para
frente.
Problema resolvido. Até minha mãe descobrir.
Não sei se foi a parte onde deveria ficar o calcanhar que
ficava para o lado de fora dos meus sapatos tipo boneca ou
se foi a forma suspeita como o meu estômago estufou
debaixo da minha saia. Talvez tenha sido a minha maneira
engraçada de andar para impedi-los de cair ou o meu
hábito de rodopiar em frente ao espelho. Digamos apenas
que o fato de vestir minhas meias-calças de babados de
trás para frente revelou alguns problemas que eu não
teria se as usasse corretamente. Minha mãe me disse que
usá-la de maneira incorreta não era uma opção. As meias-
calças de babados foram feitas para serem usadas de uma
maneira específica, com um propósito específico, e eu
deveria virá-las do lado certo ou abandonar o privilégio de
usar aquelas quatro gloriosas fileiras de babado de renda.
Gostaria de dizer que essa foi a única vez na vida que
deixei algo de trás para frente. Mas não foi. Na verdade,
minha paixão por ensinar a Bíblia para mulheres é, de
fato, o resultado de deixar outras coisas também de trás
para frente. Gostaria de falar sobre duas abordagens que
usei para ser equipada pelas Escrituras, que me pareciam
corretas a princípio, mas que estavam completamente de
trás para frente.
Pode parecer que estudar a Bíblia fosse algo que
deveríamos saber fazer intuitivamente. Afinal, se Deus
revelou sua vontade e caráter nela, o Espírito Santo
simplesmente não desvendaria a mensagem bíblica ao
nosso coração? Mas não é assim que funciona. Sim, o
Espírito Santo nos revela a Palavra, mas não sem algum
esforço da nossa parte.
Você sabia que a palavra discípulo significa “aprendiz”?
Como discípulos de Cristo, você e eu somos chamados a
aprender, e aprender exige esforço. E também exige bons
métodos de estudo. Sabemos que isso é verdade para a
nossa formação acadêmica, mas será que sabemos que isso
também é verdade em relação a seguir Cristo? Embora eu
fosse uma boa aluna na escola, eu nem sempre era boa
aluna da Palavra, e se fosse por mim, provavelmente não
teria me tornado uma boa aluna. Mas, por meio do ensino
fiel de outros, minha tendência de usar uma coisa boa de
trás para frente veio à tona. Desvirar as duas abordagens
do estudo bíblico que estavam de trás para frente
direcionou-me para um amor pelo aprendizado, aplicação
e ensino para a vida toda.

REVIRAVOLTA 1:
DEIXE QUE A BÍBLIA FALE DE DEUS
A primeira coisa que estava de trás para frente parecia
tão óbvio de percebermos que é até embaraçoso admitir:
falhei em compreender que a Bíblia é um livro sobre Deus.
A Bíblia é um livro que revela em cada página, de forma
audaciosa e clara, quem é Deus. Em Gênesis, ela faz isso
colocando Deus como o sujeito da narrativa da criação. Em
Êxodo, ela revela a autoridade de Deus sobre faraó e os
deuses do Egito. Nos Salmos, Davi exalta o poder e a
majestade do Senhor. Os Profetas proclamam sua ira e
justiça. Os Evangelhos e as Epístolas revelam seu caráter
na pessoa e obra de Cristo. O livro de Apocalipse exibe seu
domínio sobre todas as coisas. Do início ao fim, a Bíblia é
um livro sobre Deus.
Talvez eu soubesse de fato que a Bíblia era um livro
sobre Deus, mas não percebia que não a estava lendo
como se fosse.
Foi aqui que coloquei as coisas de trás para frente: eu
iniciava meu devocional fazendo as perguntas erradas. Eu
lia a Bíblia, perguntando: “Quem eu sou?” e “O que devo
fazer?” E a Bíblia realmente respondeu a essas perguntas
em alguns lugares. Efésios 2.10 me disse que eu era
feitura de Deus. O Sermão do Monte me disse para pedir
pelo pão de cada dia e para acumular tesouros no céu. A
história do rei Davi me disse para buscar um coração
segundo o coração de Deus. Mas as perguntas que eu
estava fazendo revelaram que eu tinha uma sutil má
interpretação em relação à própria natureza da Bíblia: eu
acreditava que a Bíblia era um livro sobre mim.
Eu cria que deveria ler a Bíblia para ensinar a mim
mesma sobre como viver e para ter a garantia de que eu
era amada e perdoada. Eu acreditava que ela era um guia
para a vida e que, em qualquer circunstância, alguém que
realmente soubesse como ler e interpretá-la poderia
encontrar uma passagem que oferecesse conforto ou
orientação. Eu acreditava que o propósito da Bíblia era me
ajudar.
Com esse pensamento, eu não era muito diferente de
Moisés, em pé diante da sarça ardente no Monte Sinai.
Imediatamente em sua visão estava a revelação do caráter
de Deus: uma sarça em chamas, conversando com ele de
forma audível, a qual não era consumida
miraculosamente. Quando foi encarregado por essa visão
de Deus para ir até faraó e exigir a libertação dos cativos,
Moisés, autoconsciente, responde: “Quem sou eu para ir a
Faraó e tirar do Egito os filhos de Israel?” (Êx 3.11)
Deus responde com paciência, fazendo de si mesmo o
sujeito da narrativa: “Eu serei contigo” (Êx 3.12). Em vez
de se tranquilizar com essa resposta, Moisés pergunta em
seguida: “Disse Moisés a Deus: Eis que, quando eu vier aos
filhos de Israel e lhes disser: O Deus de vossos pais me
enviou a vós outros; e eles me perguntarem: Qual é o seu
nome? Que lhes direi?” (v. 13)
Observe que em vez de dizer a Moisés o que ele deveria
fazer, Deus, ao contrário, diz o que ele mesmo tem feito,
está fazendo e fará:

Disse Deus a Moisés: EU SOU O QUE SOU. Disse mais: Assim dirás
aos filhos de Israel: EU SOU me enviou a vós outros. Disse Deus ainda
mais a Moisés: Assim dirás aos filhos de Israel: O SENHOR, o Deus de
vossos pais, o Deus de Abraão, o Deus de Isaque e o Deus de Jacó, me enviou a
vós outros; este é o meu nome eternamente, e assim serei lembrado de
geração em geração. Vai, ajunta os anciãos de Israel e dize-lhes: O
SENHOR, o Deus de vossos pais, o Deus de Abraão, o Deus de Isaque e o Deus de
Jacó, me apareceu, dizendo: Em verdade vos tenho visitado e visto o que
vos tem sido feito no Egito. Portanto, disse eu: Far-vos-ei subir da aflição
do Egito [...]. E ouvirão a tua voz; e irás, com os anciãos de Israel, ao rei
do Egito e lhe dirás: O SENHOR, o Deus dos hebreus, nos encontrou. Agora,
pois, deixa-nos ir caminho de três dias para o deserto, a fim de que
sacrifiquemos ao SENHOR, nosso Deus. Eu sei, porém, que o rei do
Egito não vos deixará ir se não for obrigado por mão forte. Portanto,
estenderei a mão e ferirei o Egito com todos os meus prodígios que farei
no meio dele; depois, vos deixará ir. Eu darei mercê a este povo aos
olhos dos egípcios; e, quando sairdes, não será de mãos vazias. (Êx 3.14-
22)

O diálogo continua dessa maneira. Por todo esse


capítulo e metade do livro de Êxodo, Moisés faz as
perguntas erradas: Quem sou eu? O que eu devo fazer?
Em vez de lhe dizer: “Moisés, você é meu servo escolhido.
Você é minha criação preciosa, um líder sábio e talentoso”,
Deus responde removendo completamente Moisés da
posição de sujeito da discussão e inserindo a si mesmo. Ele
responde à pergunta autocentrada de Moisés “Que sou
eu?” com a única resposta que importa: “Eu sou”.
Somos como Moisés. A Bíblia é a nossa sarça ardente —
uma declaração fiel da presença e da santidade de Deus.
Nós pedimos que ela fale acerca de nós mesmos, mas em
todo o tempo ela nos fala a respeito do “Eu sou”. Nós
pensamos que se ela ao menos nos dissesse quem somos e
o que devemos fazer, então nossas inseguranças, temores
e dúvidas desapareceriam. Mas as nossas inseguranças,
temores e dúvidas jamais podem ser banidos pelo
conhecimento de quem nós somos. Eles só podem ser
banidos pelo conhecimento do “Eu sou”. Devemos ler e
estudar a Bíblia com nossos ouvidos treinados para ouvir a
declaração que Deus faz de si mesmo.
Isso significa que a Bíblia não tem nada a dizer sobre
quem nós somos? De modo nenhum. Nós apenas
tentamos responder àquela pergunta de trás para frente.
A Bíblia realmente nos fala sobre quem somos e sobre o
que devemos fazer, mas o faz através das lentes de quem é
Deus. O conhecimento de Deus e o conhecimento do eu
sempre andam de mãos dadas. De fato, não pode haver
um conhecimento verdadeiro do eu desvinculado do
conhecimento de Deus. Ele é o único ponto de referência
que é confiável. Portanto, quando leio que Deus é
longânimo, percebo que não sou longânima. Quando leio
que Deus é tardio em se irar, percebo que sou rápida em
me irar. Quando leio que Deus é justo, percebo que sou
injusta. Perceber quem ele é me revela quem eu sou diante
da verdadeira luz. Uma visão de um Deus elevado e
exaltado revela o meu pecado e aumenta o meu amor por
ele. Tristeza e amor levam ao arrependimento genuíno, e
eu começo a me conformar à imagem daquele que
contemplo.
Se eu ler a Bíblia procurando a mim mesma no texto
antes de procurar por Deus, eu posso de fato aprender
que não devo ser egoísta. Posso até tentar mais
arduamente não ser egoísta. Entretanto, até que eu
enxergue o meu egoísmo através das lentes do absoluto
altruísmo de Deus, não compreenderei adequadamente a
pecaminosidade disso. A Bíblia é um livro a respeito de
Deus. Assim como Moisés aprenderia durante o Êxodo,
quem ele era não exerceu qualquer impacto no desfecho de
sua situação. Quem Deus era fez toda a diferença.
No Novo Testamento, encontramos Jesus tratando do
mesmo problema com os líderes judeus. “Examinais as
Escrituras, porque julgais ter nelas a vida eterna, e são
elas mesmas que testificam de mim. Contudo, não quereis
vir a mim para terdes vida.” (Jo 5.39-40) Os líderes judeus
investigavam as Escrituras fazendo a pergunta errada,
procurando pela imagem errada a ser revelada.
Se a vida eterna se encontra nas Escrituras, ela só é
descoberta por meio das lentes de quem Deus é. Se a
nossa leitura da Bíblia concentrar os nossos olhos em
qualquer outra pessoa que não seja Deus, temos virado o
processo de transformação de trás para frente. Todo
estudo da Bíblia que busca estabelecer a nossa identidade
sem antes proclamar a identidade de Deus nos prestará
uma ajuda parcial e limitada. Devemos desvirar o nosso
hábito de perguntar “Quem eu sou?” Devemos perguntar
primeiro: “O que esta passagem me ensina a respeito de
Deus?”, antes de pedirmos para que ela nos ensine
qualquer coisa acerca de nós mesmos. Devemos
reconhecer que a Bíblia é um livro a respeito de Deus.

REVIRAVOLTA 2:
DEIXE QUE A MENTE TRANSFORME O CORAÇÃO
A segunda coisa que deixei de trás para frente em
minha abordagem bíblica foi a crença de que meu coração
deveria guiar meu estudo. O coração, conforme é dito nas
Escrituras, é a sede da vontade e das emoções. Ele é a
nossa “antena” e o nosso “tomador de decisões”. Deixar
meu coração guiar o meu estudo significava buscar a Bíblia
para me fazer sentir de determinada maneira quando eu a
lesse. Eu queria que ela me desse paz, conforto ou
esperança. Queria que ela fizesse com que eu me sentisse
mais perto de Deus. Queria que ela me desse garantias em
relação a escolhas difíceis. Devido ao fato de eu querer que
a Bíblia se comprometesse com as minhas emoções,
gastava pouco tempo em livros como Levítico ou Números
e muito tempo em livros como os Salmos e os Evangelhos.
A Bíblia nos ordena a amar a Deus com todo o nosso
coração (Marcos 12.30). Quando dizemos que amamos a
Deus com todo o nosso coração, queremos dizer que o
amamos totalmente, com nossas emoções e com a nossa
vontade. Ligar as nossas emoções à nossa fé é algo que
acontece, até certo ponto, de modo natural para nós
mulheres — falando de forma geral, sabemos como ser
emotivas sem muita orientação. Se pensarmos no coração
como a sede de nossas emoções e de nossa vontade, faz
sentido nos aproximarmos com tanta frequência da
Palavra de Deus perguntando: “Quem eu sou?” e “O que
devo fazer?” Essas duas perguntas tratam exclusivamente
do coração. E falamos com frequência na igreja sobre como
o cristianismo é uma religião do coração — de como Cristo
entrou em nosso coração, de como precisamos de uma
mudança de coração. É correto falar do cristianismo dessa
maneira, mas não exclusivamente dessa maneira.
Curiosamente, o mesmo versículo que nos ordena amar
a Deus com todo o nosso coração também nos ordena a
amá-lo com toda a nossa mente. A nossa mente é a sede
do nosso intelecto. Ligar o nosso intelecto à nossa fé não
acontece naturalmente para a maioria de nós. Vivemos
num tempo em que a fé e a razão são tidas como pólos
opostos. Por vezes, até a igreja adota esse tipo de
linguagem. Para algumas de nós, a intensidade da nossa fé
é medida através do quão perto nos sentimos de Deus em
determinado momento — de como o sermão nos fez
sentir, de como o coral de adoração nos fez sentir, de
como a nossa hora silenciosa nos fez sentir. Escondido
nesse pensamento, está um desejo sincero de
compartilhar um profundo relacionamento com um Deus
pessoal, mas sustentarmos nossas emoções pode ser
exaustivo e frustrante. A mudança de circunstâncias pode
derrubar nossa estabilidade emocional em um instante. A
nossa “caminhada com o Senhor” pode se parecer mais
com uma volta de montanha-russa, com picos e vales, do
que com um caminho reto onde vales e montanhas foram
nivelados.
Seria isso a consequência de termos deixado as coisas de
trás para frente? Ao pedirmos para que o nosso coração
dirigisse a nossa mente, será que adquirimos
voluntariamente um ingresso para uma volta de
montanha-russa? A menos que viremos as coisas para o
lado certo, deixando a mente encarregada do coração,
podemos estar numa longa e desenfreada volta.
Pedir para que a nossa mente venha antes do coração
soa quase como não espiritual, não é mesmo? Mas observe
a maneira como as Escrituras falam sobre o papel da
mente:

Em relação ao arrependimento: “[Se eles] se converterem a ti de todo o seu


coração e de toda a sua alma, na terra de seus inimigos [...] ouve tu nos
céus, lugar da tua habitação, a sua prece e a sua súplica...” (1 Reis 8.48-
49).
Em relação a buscar a Deus: “Disponde, pois, agora o coração e a alma para
buscardes ao SENHOR, vosso Deus” (1 Cr 22.19).
Em relação a buscar a paz: “Tu conservarás em paz aquele cuja mente está
firme em ti; porque ele confia em ti” (Is 26.3 – ARC).
Em relação à adoração correta: “Porque, se eu orar em outra língua, o
meu espírito ora de fato, mas a minha mente fica infrutífera. Que farei,
pois? Orarei com o espírito, mas também orarei com a mente; cantarei com o
espírito, mas também cantarei com a mente” (1 Co 14.14-15).
Em relação à compreensão das Escrituras: “A seguir, Jesus lhes disse: São
estas as palavras que eu vos falei, estando ainda convosco: importava se
cumprisse tudo o que de mim está escrito na Lei de Moisés, nos
Profetas e nos Salmos. Então [ele] lhes abriu o entendimento para
compreenderem as Escrituras” (Lucas 24.44-45).
Em relação à transformação: “E não vos conformeis com este século, mas
transformai-vos pela renovação da vossa mente, para que experimenteis qual
seja a boa, agradável e perfeita vontade de Deus” (Rm 12.2).

Não passe correndo por cima da verdade fundamental


que você acabou de ler em Romanos 12.2-3. O que o
cristão quer desesperadamente não é transformação de
vida e o conhecimento da vontade de Deus? Nesses
versículos, Paulo afirma inequivocamente como nós
podemos obtê-los: pela renovação da nossa mente — não do
nosso coração.
Durante anos, tentei amar a Deus com o meu coração
em detrimento da minha mente, sem reconhecer minha
necessidade de crescer no conhecimento do “Eu sou”.
Qualquer estudo sistemático da Bíblia parecia mecânico,
até mesmo um pouco como um ato de falta de fé ou um
reconhecimento de que a percepção que o Espírito Santo
me dava durante a hora silenciosa não era suficiente para
mim. Mas eu estava deixando escapar uma verdade
importante: que o coração não pode amar aquilo que a mente não
conhece. Essa é a mensagem de Romanos 12.2-3 — não
que a mente sozinha atinja a transformação, mas o
caminho para a transformação passa da mente para o
coração, e não o contrário.
A comunidade científica tem observado essa conexão da
mente vindo antes do coração. Paul Bloom, um professor
de Yale, com PhD em psicologia cognitiva, é especializado
na pesquisa sobre o prazer — o estudo de como nós, seres
humanos, desenvolvemos a capacidade de obter prazer
por meio das pessoas, experiências e coisas. Ele descobriu,
trabalhando em sua pesquisa, que o prazer não acontece
simplesmente, ele se desenvolve. E a forma como ele se
desenvolve é uma questão digna de nota: “As pessoas me
perguntam: ‘Como conseguir mais prazer na vida?’ E
minha resposta é extremamente pedante: Estude mais... A
chave para apreciar um vinho não é apenas beber
avidamente uma grande quantidade de vinhos caros, mas
é aprender a respeito dos vinhos”.2
Bloom descobriu que o prazer resulta do fato de
obtermos conhecimento a respeito do objeto de nosso
prazer, e não, conforme poderíamos supor, de
simplesmente experimentarmos esse objeto vez após vez.
De maneira específica, nosso prazer em alguma coisa
aumenta quando aprendemos sua história, sua origem e
sua natureza mais profunda.3 Isso é relevante
principalmente para os cristãos. Somos chamados para
sermos um povo que se deleita no Senhor, que pode dizer
com convicção: “na tua destra [há] delícias
perpetuamente” (Sl 16.11). Muitas entre nós se
identificam prontamente com o chamado para o
hedonismo cristão. No entanto, lutamos diariamente para
viver como pessoas cujo maior prazer está em Deus. Se
Bloom estiver certo, encontrar maior prazer em Deus não
será consequência do fato de buscarmos mais experiências
com ele, mas de o conhecermos melhor. Será consequência
de estudarmos a divindade.
Pense sobre um relacionamento, um bem ou algo que
lhe interesse que lhe dê muito prazer. Como você
desenvolveu esse prazer? Quer você seja apaixonado por
arte moderna, pela conservação do seu carro, por seu
cônjuge, por nutrição, educação ou futebol, meu palpite é
que você tenha ficado assim por aprender acerca do objeto
da sua paixão — e que seu prazer cresceu à medida que o
seu conhecimento também cresceu.
O casamento talvez seja o exemplo mais óbvio desse
processo. A maioria das pessoas se casa com base em
pouquíssima informação. Você já observou isso?
Arriscamos o nosso futuro com base num conhecimento
relativamente pequeno, em grande parte devido ao
ímpeto das emoções que nos atingem durante a fase de
namoro. Nós nos casamos, inundados de sentimentos de
amor por nosso cônjuge, mas sabendo bem pouco sobre
ele no âmbito mais abrangente. Esses sentimentos iniciais
de amor também definham ou se aprofundam,
dependendo de como os nutrimos. Olhando para trás,
após vinte anos de casamento, posso dizer com
honestidade que amo meu marido exponencialmente
mais do que o amava no dia de nosso casamento. Por quê?
Porque tenho feito um estudo sobre ele, e ele, sobre mim.
O fato de conhecê-lo fez com que meu amor por ele
aumentasse. No dia do nosso casamento, eu desconfiava
que ele seria um bom pai, um trabalhador dedicado e um
ouvinte fiel, mas, vinte anos mais tarde, eu soube que ele
é isso tudo. Meu amor por ele cresceu à medida que o meu
conhecimento sobre ele também cresceu.
Agora, pense em seu relacionamento com Deus à luz
desse exemplo. A maioria das pessoas chegam à fé com
base em pouca informação. Compreendemos que
precisamos de perdão e graça, e somos conduzidos ao
reino em uma onda de emoções profundas. Mas
possuímos apenas um pequeno senso sobre aquele que
nos trouxe para si mesmo. Desconfiamos que ele seja
todas as coisas boas, mas ainda não fizemos um estudo
sobre ele. Como uma esposa recém-casada, chegamos ao
fim da fase de lua-de-mel e começamos a questionar como
iremos sustentar e nutrir esse relacionamento.
A resposta está em conhecermos Deus, em amá-lo com a
nossa mente. Jamais a expressão “conhecê-lo é amá-lo” foi
tão verdadeira. À medida que crescemos no conhecimento
do caráter de Deus por meio do estudo de sua Palavra, não
podemos fazer outra coisa senão crescer em um amor
exponencialmente mais profundo por ele. Isso explica por
que Romanos 12.2 diz que somos transformados pela
renovação da nossa mente. Passamos a compreender
quem é Deus e somos transformados — nossas afeições se
desapegam das coisas inferiores e se apegam a ele. Se
quisermos sentir um amor mais profundo por Deus,
temos que aprender a vê-lo mais claramente pelo que ele
é. Se quisermos ter um relacionamento mais profundo
com Deus, temos que aprender a pensar mais
profundamente sobre Deus.
Considere outra ilustração: se eu dissesse que amo
piano e que tenho um grande contentamento em tocá-lo,
como você poderia descobrir se meus sentimentos a
respeito do piano são verdadeiros ou não? É simples.
Apenas me peça para tocar para você. Uma pessoa que
ama de verdade tocar piano se disciplina para estudar
piano. Por meio da aplicação de muita disciplina mental,
sua proficiência em tocar — e, consequentemente, seu
amor por tocar — crescerão e serão aprimorados.
O coração não ama aquilo que a mente não conhece.
Sim, é pecado adquirir conhecimento pelo simples
conhecimento, mas adquirir conhecimento acerca daquele
a quem amamos, com o propósito de amá-lo com mais
profundidade, sempre será bom para a nossa
transformação. Devemos amar a Deus com a nossa mente,
permitindo que o nosso intelecto instrua as nossas
emoções, em vez do contrário.

DEUS ANTES DE MIM, A MENTE ANTES DO CORAÇÃO


Perceber a nós mesmas na Bíblia e empenhar nossas
emoções para amar a Deus são coisas belas. Elas são,
metaforicamente, os babados das meias-calças do estudo
bíblico. Mas elas pertencem à parte de trás, uma
recompensa secundária de obedientemente buscar o que é
primordial. O estudo bíblico que equipa não negligencia o
autoconhecimento, mas o coloca no lugar certo: instruído
pelo conhecimento de Deus. O estudo bíblico que equipa
não separa o coração do estudo, mas coloca o coração no
lugar certo: instruído pela mente.
Talvez você tenha deixado as coisas de trás para frente
como eu. Talvez você tenha percebido o enorme
desconforto de um estudo bíblico que se concentra mais
em você e no que você deve fazer do que em quem Deus é,
ou o desconforto do estudo bíblico que tem por alvo suas
emoções em detrimento do seu intelecto. Não é tão tarde
para revirar as coisas. Prossigamos, pedindo ao Senhor
que nos mostre a abordagem “babados na parte de trás”
do estudo bíblico.
2. “What Do We Value Most?” [O que valorizamos mais?] NPR Radio TED Radio
Hour, 25 de maio de 2012, 14:00, disponível em
<http://www.npr.org/player/v2/mediaPlayer.html?
action=1&t=3&islist=true&id=57&d=04-27-2012>.
3. Paul Bloom: “The Origins of Pleasure” [As Origens do Prazer], TED Talks,
julho de 2011, disponível em
<http://www.ted.com/talks/paul_bloom_the_origins_of_pleasure.html>.
2
Uma Questão para o
Conhecimento Bíblico

Pois tudo quanto, outrora, foi escrito para o nosso ensino foi escrito, a fim de
que, pela paciência e pela consolação das Escrituras, tenhamos esperança.
Rm. 15.4

Um pequeno aviso: este é o capítulo que você não quer


ler. Este é o capítulo com o qual você ficará desconfortável
e desejará me dizer para cuidar da minha própria vida.
Este é o capítulo no qual falaremos sobre conhecimento
bíblico: o que é isso, se o estamos adquirindo e por que é
importante que o tenhamos.
Permita-me deixá-la à vontade: a maioria de nós não o
possui, e eu me incluo nisso. O conhecimento bíblico é
algo que a maioria de nós jamais se sentirá confortável
para alegar tê-lo alcançado durante a vida. Portanto, este
é um capítulo que também me deixa desconfortável.
Todas nós carregamos o vago desconforto da nossa falta
de conhecimento, e a sentimos vir à tona quando
conversamos com o descrente, o amigo do nosso pequeno
grupo, a mulher mais velha e sábia. Às vezes, quando a
categoria de um jogo de TV como o americano Jeopardy
abrange um tema bíblico, experimentamos um momento
de pânico absoluto em torno do texto sagrado, sobre o
qual o apresentador Alex Trebek4 mostra mais
conhecimento do que nós. Seria difícil dizer sob pressão o
nome dos doze apóstolos ou dizer a ordem da história da
criação. Já ouvimos falar de Tamar, mas ela foi um
exemplo positivo ou negativo? Quando dois pregadores
que amamos tomam posições diferentes sobre uma
mesma passagem, somos lançadas na confusão.
Nós guardamos aquilo que sabemos, mas ficamos
perturbadas por aquilo que não sabemos. Fazemos o nosso
melhor para costurar juntos os retalhos do conhecimento
das Escrituras, pedaços de sermões, de estudos e da hora
silenciosa; mas, muitas vezes, somos confrontadas com os
buracos e costuras soltas na roupa de nosso
entendimento, principalmente quando a vida fica difícil.
Não conhecemos nossa Bíblia como precisamos —
algumas de nós que são novas na fé realmente não a
conhecem, e muitas que estão na igreja há décadas
raramente estão em uma situação melhor.
Mas o que podemos fazer para conhecer a Bíblia
melhor? Já começamos a responder à pergunta sobre o
que fazer para ter um estudo bíblico saudável: um bom
estudo bíblico transforma o coração por meio do
treinamento da mente e coloca Deus no centro da
história. Entretanto, o estudo bíblico saudável faz mais do
que isso — ele leva o estudante a uma compreensão
melhor da Bíblia, superior a que ele tinha anteriormente.
Falando em outras palavras, o estudo bíblico saudável
aumenta o conhecimento bíblico.

O QUE É CONHECIMENTO BÍBLICO?


O conhecimento bíblico acontece quando uma pessoa
tem acesso à Bíblia em uma linguagem que ela entende e
quando está constantemente indo na direção do
conhecimento e da compreensão do texto.
Se for verdade que o caráter e a vontade de Deus estão
proclamados nas Escrituras, então toda tentativa séria de
se tornar equipada para a obra do discipulado deve incluir
um desejo de desenvolver o conhecimento bíblico,
costurando seus retalhos e transformando-os em uma
veste de entendimento sem emendas.
Se você estiver lendo este livro, então você
provavelmente teve acesso à Bíblia em uma linguagem
que você entende. Isso não é pouco. O que você precisa é
de um movimento contínuo na direção do conhecimento e
do entendimento. Esse movimento contínuo não acontece
por acaso, nem acontece sempre de forma intuitiva.
Talvez tenhamos um desejo sincero de desenvolver o
conhecimento bíblico, mas se formos deixadas sem
treinamento, talvez desenvolvamos o hábito de nos
ocuparmos com um texto que, na melhor das hipóteses,
não fará coisa alguma para aumentar o nosso
conhecimento e, na pior delas, agirá contra ele de fato.
Antes de podermos desenvolver bons hábitos, devemos
fazer um inventário sincero dos hábitos ruins que talvez já
estejamos praticando.
Você já teve um hábito ruim que desejou interromper?
No início dos meus vinte e poucos anos, percebi que tinha
o hábito de completar as frases das pessoas. Lembro-me
de como fiquei surpresa quando alguém destacou
amorosamente que eu não deveria fazer isso. Não que eu
não soubesse que completava as frases das outras pessoas
— mas eu não via nada de errado nisso. Na verdade, eu
acreditava que estava ajudando a conversa ao me
intrometer. Mas quando me tornei ciente de que estava
fazendo isso, percebi a frequência com que isso acontecia
e o quão desrespeitoso era para com os outros. Estava
constrangida e envergonhada, e fui tomada por um desejo
imediato de parar. Mas na época em que percebi o
problema, eu havia formado um padrão bem estabelecido
de comunicação que era difícil de romper. Aprender a
parar com esse hábito ruim exigia que eu reconhecesse a
extensão do meu problema e, depois, trabalhasse duro
para mudar esse comportamento.
Isso acontece com qualquer hábito ruim que possamos
desenvolver, principalmente se esse hábito foi cultivado
no decorrer de anos. A fim de rompê-lo, devemos
primeiro reconhecer a extensão de sua influência e,
depois, dar alguns passos para mudar.
Quando se trata de estudar a Bíblia, os hábitos ruins são
abundantes. Dentro da nossa cultura cristã, temos
adotado uma frase coringa para o nosso hábito de
interagir com as Escrituras: “gastar tempo na Palavra”. Os
líderes da igreja nos estimulam a fazer isso. Os escritores e
blogueiros nos exortam a valorizar isso. Mas o que deve
acontecer durante o nosso “tempo na Palavra” pode
continuar sendo uma informação vaga; os hábitos
específicos que isso representa variam amplamente de
pessoa para pessoa.
O perigo potencial dessa imprecisão é que podemos
assumir que a nossa versão de “gastar tempo na Palavra”
esteja nos levando na direção do conhecimento bíblico
simplesmente porque temos sido obedientes nessa
prática. Nem todo contato com as Escrituras desenvolve o
conhecimento bíblico. Aprender o que a Bíblia diz e,
posteriormente, trabalhar para interpretá-la e aplicá-la
requer práticas bem diferentes de muitas daquelas que
geralmente associamos com o “gastar tempo na Palavra”.
Não podemos nos dar ao luxo de supor que nossas boas
intenções sejam suficientes.

ESTAMOS CRESCENDO NO CONHECIMENTO BÍBLICO?


Se o conhecimento bíblico deve ser o nosso alvo,
precisamos de uma avaliação sincera daquilo que estamos
fazendo no momento para alcançá-la. Alguns dos nossos
hábitos atuais talvez não sejam “ruins” no sentido de não
realizarem nada para nos ajudarem a aprender a Palavra
de Deus — mas eles podem ser simplesmente limitadores,
ou seja, só podem nos levar até determinado ponto em
nosso entendimento. Outros hábitos talvez precisem ser
completamente abandonados. A princípio, podemos não
ser capazes de perceber que a nossa abordagem atual seja
limitadora ou inútil, mas com um exame mais minucioso,
começaremos a observar as lacunas que ela pode deixar no
entendimento.
Em meus anos de ensino bíblico com mulheres, tenho
descoberto vários hábitos comuns e inúteis de “gastar
tempo na Palavra”. Eu me pergunto se algum deles parece
familiar a você.

A ABORDAGEM DO ALPRAZOLAM
Você se sente ansiosa? Filipenses 4.6 diz que não
devemos andar ansiosos por coisa alguma. Você se sente
feia? O Salmo 139 diz que você foi feita de modo
assombrosamente maravilhoso. Você se sente cansada?
Mateus 11.28 diz que Jesus dará descanso ao que está
sobrecarregado. A abordagem do Alprazolam trata a Bíblia
como se ela existisse para nos fazer sentir melhor. Quer
eu seja auxiliada por um livro devocional ou apenas pelo
índice de tópicos da minha Bíblia, declaro que meu tempo
na Palavra foi bem-sucedido se eu puder dizer: “Nossa,
isso foi realmente confortador”.
O problema: a abordagem do Alprazolam faz da Bíblia um
livro a meu respeito. Pergunto como a Bíblia pode me
servir em vez de como eu posso servir ao Deus que ela
proclama. Na verdade, a Bíblia nem sempre faz com que
nos sintamos melhor. De fato, com bastante frequência
ela faz exatamente o contrário (você está se sentindo
incrível? Jeremias 17.9 diz que somos corruptos e
perversos). Sim, existe conforto em sermos achados nas
páginas das Escrituras, mas o contexto é o que torna esse
conforto duradouro e real. Observe também que a
abordagem do Alprazolam garante que partes enormes de
nossa Bíblia permaneçam sem serem lidas porque elas
falham em nos oferecer uma dose imediata de satisfação
emocional. Não estaremos muito propensos a ler Levítico
ou Lamentações se concordarmos com essa abordagem.
Uma abordagem bem fundamentada do estudo bíblico nos
desafia a navegar em todas as áreas da Bíblia, até mesmo
naquelas que nos fazem sentir desconfortáveis ou que são
de difícil compreensão.

A ABORDAGEM DA BOLINHA DE FLIPERAMA


Na falta de uma preferência ou qualquer orientação a
respeito do que ler, eu leio algum trecho das Escrituras em
qualquer página que eu abrir. Ei, isso é bom, não é?
Pedirei ao Espírito Santo para falar comigo por meio de
qualquer versículo que eu sortear. Soltando a alavanca de
minhas boas intenções, mando a bolinha do fliperama de
minha ignorância se mover rapidamente para qualquer
passagem na qual ela possa bater, passando por várias
passagens, “conforme o Espírito conduzir”.
O problema: a Bíblia não foi escrita para ser lida dessa
maneira. A abordagem da bolinha de fliperama não
considera o contexto textual, histórico ou cultural, a
autoria ou a intenção original da passagem em questão.
Ela não faz coisa alguma para nos ajudar a ter uma
compreensão do texto que vá além do nosso contexto
imediato. Quando lemos dessa maneira, tratamos a Bíblia
com menos respeito do que daríamos a um simples livro
escolar. Imagine tentar dominar álgebra lendo ao acaso,
durante dez minutos por dia, a partir de um parágrafo
qualquer do livro, onde acontecer de seus olhos caírem.
Assim como aquela bolinha de metal do fliperama, você
perderia a propulsão muito rapidamente (e iria muito mal
em álgebra). Uma abordagem bem fundamentada para
estudar a Bíblia leva em consideração o modo como cada
passagem se enquadra na perspectiva integral daquilo que
a Bíblia tem a dizer, honrando o contexto, a autoria, o
estilo e outros fatores.

A ABORDAGEM DA BOLA MÁGICA


Você já ouviu falar no brinquedo Bola 8 Mágica? Esse
brinquedo podia responder até mesmo às nossas
perguntas mais difíceis quando éramos crianças. Mas sou
adulta agora, e estou questionando se devo me casar com
Bob, arrumar um emprego novo ou mudar minha cor de
cabelo. Dou uma chacoalhada bem forte na Bíblia e a abro.
Colocando o dedo cegamente sobre um versículo, eu o leio
para ver se ele “sinaliza a resposta sim.”
O problema: a Bíblia não é mágica e não serve aos nossos
caprichos, nem tampouco sua função principal é
responder às nossas perguntas. A abordagem da Bola
Mágica interpreta erroneamente o ministério do Espírito
Santo através da Palavra, exigindo que a Bíblia nos diga o
que fazer, em vez de quem devemos ser. E isso chega
perigosamente perto da adivinhação que as pessoas
costumavam fazer usando pedras. Então, por favor, sem
essa de Bola 8 Mágica. Uma abordagem de estudo bíblico
bem fundamentada reconhece que a Bíblia está sempre
mais preocupada com quem toma a decisão do que com a
decisão em si. Seu alvo é transformar o nosso coração, de
modo que desejemos aquilo que Deus deseja, em vez de
nos dar respostas prontas para cada decisão na vida.

A ABORDAGEM DO “PERSONAL SHOPPER” OU


COMPRADOR PESSOAL (também conhecida como estudo
bíblico por tópicos)
Quero saber sobre como ser uma mulher piedosa ou
como lidar com as questões de autoestima, mas não sei
onde encontrar versículos sobre esses assuntos, então
deixo que ela [insira aqui o nome de uma professora da
Bíblia conhecida] faça o trabalho mais difícil por mim. Ela
seleciona, a dedo e de modo atraente, versículos
relevantes de toda a Bíblia e os entrega a mim para que eu
os experimente e veja se me servem.
O problema: a abordagem do Comprador Pessoal não nos
ajuda a obter “propriedade” das Escrituras. Muito
semelhante à abordagem da bola de fliperama, nós
pulamos de passagem em passagem, obtendo um
conhecimento fragmentado de muitos livros da Bíblia,
mas sem o domínio de nenhum deles. Os estudos por
tópicos têm, de fato, potencial para nos ajudar a crescer,
mas corremos risco ao chamá-los de “estudos bíblicos”.
Chamar um livro sobre autoestima de estudo bíblico
implica dizer que ele está nos ensinando um
conhecimento prático das Escrituras. Muitos estudos por
tópicos, embora bons, não podem, de forma justa, fazer
essa afirmação. Eles têm valor como uma suplementação
— mas não como um substituto — para estudar a Bíblia
em seu sentido mais básico. Os estudos por tópicos
servem para um objetivo: eles nos ajudam a integrar
conceitos abrangentes em nossa compreensão das
Escrituras. Mas eles não são fundamentais. Se eles
representam todo o nosso estudo, perderemos a riqueza
de aprender todos os livros da Bíblia do início ao fim. Uma
abordagem bem fundamentada do estudo bíblico trata de
um tópico à medida que ele vai aparecendo nas Escrituras,
em vez de ligar as Escrituras a um tópico. Isso exige que o
estudante trabalhe no processo de descoberta.

A ABORDAGEM DO JOGO DE TELEFONE SEM FIO


Você se lembra de brincar de telefone sem fio? Quando
você se sentava em uma fileira e sussurrava uma frase no
ouvido da pessoa que estava ao seu lado? A diversão
estava em ver o quão deturpada a mensagem ficava à
medida que percorria a fileira. Um processo semelhante
pode acontecer quando lemos a respeito da Bíblia, em vez
de ler a própria Bíblia. Por quê? Porque os autores
edificam sobre os escritos de outros. Isso não é errado —
na verdade, é algo lógico. Mas esse é um fato sobre o qual
o estudante deve estar ciente. Se eu preferir ler o que os
outros escreveram acerca da Bíblia em vez de ler a própria
Bíblia, estarei provavelmente lendo aquilo que alguém diz
a respeito do que alguém disse sobre o que a Bíblia diz.
Assim como o estudo por tópicos, os livros que falam da
Bíblia podem ser úteis, mas não são fundamentais. Se eu
puder citar John Piper mais do que consigo citar o
apóstolo Paulo, provavelmente eu esteja praticando a
Abordagem do Jogo Telefone Sem Fio. Às vezes, mesmo
sem perceber, posso escorregar para esse padrão. Isso
acontece porque os livros a respeito da Bíblia não exigem
muito trabalho para serem compreendidos se comparados
com a própria Bíblia, e eles geralmente são escritos por
pessoas que parecem conhecer muito mais a Bíblia do que
eu jamais conhecerei.
O problema: somos chamadas para amar ao Senhor nosso
Deus com toda a nossa mente, não com a mente de John
Piper. Embora aquilo que ele e outros tenham a dizer a
respeito da Bíblia possa ser extremamente útil, isso não
substitui o estudo bíblico feito por nós mesmas. Por que
eu gastaria mais tempo lendo diversas vezes um texto
extraído das Escrituras em vez de gastar tempo lendo as
próprias Escrituras? Teremos mais de Piper se investirmos
o nosso tempo no livro que ele ama acima de todos os
outros. Uma abordagem bem fundamentada do estudo
bíblico reconhece que os livros acerca da Bíblia, assim
como o estudo por tópicos, são uma suplementação ao
estudo pessoal, não um substituto para ele. A menos que
estejamos crescendo em conhecimento bíblico, a
capacidade que eles têm de nos ajudar será limitada.
Quanto mais crescermos em conhecimento bíblico, mais
proveitosos os comentários e as suplementações se
tornarão.

A ABORDAGEM DA ESCOLHA DO CARDÁPIO


Adoto essa abordagem quando me empenho em “ficar
escolhendo o que comer” na Palavra de Deus. Leio o Novo
Testamento; e, com exceção de Salmos e Provérbios, evito
ler o Antigo Testamento, ou leio livros com personagens,
tramas ou temas com os quais eu consiga me identificar
com facilidade. As mulheres, particularmente, parecem
ser atraídas para esse tipo de abordagem (você também
está um pouco cansada de só ler Ester, Rute e Provérbios
31?), mas todo mundo luta com essa tentação em algum
momento.
O problema: Toda a Escritura é inspirada por Deus e útil.
Toda ela. Precisamos de uma dieta equilibrada para
crescer em maturidade — é hora de ir para o resto da
refeição. Nós, mulheres, precisamos tanto dos exemplos
masculinos quanto dos femininos para nos dirigir à
piedade. Não podemos apreciar plenamente a doçura do
Novo Testamento sem o aroma do Antigo Testamento.
Precisamos da narrativa histórica, da poesia, dos livros de
sabedoria, da lei, das profecias e das parábolas, de tudo
isso nos revelando o caráter de Deus em diferentes
ângulos. E precisamos ver a história do evangelho de
Gênesis a Apocalipse. Uma abordagem bem
fundamentada do estudo bíblico nos desafia a aprender
todo o conselho da Palavra de Deus. Ela nos ajuda a
edificar uma compreensão integrada a respeito de como a
Bíblia, como um todo, fala de Deus.
Você percebeu algo familiar nessas sete abordagens?
Reconhecer um hábito ruim nunca é divertido, mas isso
marca o início de uma mudança para melhor. Posso
garantir ter praticado todas essas abordagens, uma vez ou
outra, na estrada da descoberta de uma abordagem
melhor. Admito que ter ouvido tantas outras mulheres
relatarem que já usaram as mesmas abordagens foi um
alívio, mas também foi frustrante aprender que muitas de
nós parecem estar no mesmo barco. Se nunca fomos
treinadas para sermos boas estudantes da Bíblia, não é de
se surpreender que tenhamos buscado maneiras de
improvisar. De qualquer forma, o predomínio dessas
práticas provavelmente revela um ponto cego na visão que
a igreja tem de discipulado em vez de uma falta de
disposição para aprender por parte do discípulo.
Romper com hábitos existentes é trabalho duro, e
somente aqueles que acreditam que o resultado final
valerá o esforço se aplicarão no trabalho de abandoná-los.
Devemos reconhecer que um caminho melhor exige mais
de nós. Devemos combinar a nossa disposição de aprender
com uma abordagem que desenvolva o conhecimento
bíblico. Devemos aprender a estudar de tal maneira que
não estejamos apenas absorvendo as percepções de outra
pessoa, mas, de fato, estejamos sendo equipadas para
interpretarmos e aplicarmos as Escrituras por nós
mesmas. Todo estudo do qual nos encarregarmos deve
fazer mais do que apenas nos ensinar sobre um livro da
Bíblia; ele deve nos ensinar como estudar qualquer livro
da Bíblia com uma eficácia maior.

POR QUE O CONHECIMENTO BÍBLICO É IMPORTANTE?


Você acredita na importância de recuperar o
conhecimento bíblico? Deixe-me sugerir uma razão por
que você deve acreditar: o conhecimento bíblico é
importante porque nos protege de cairmos no erro. Tanto
o falso mestre quanto o humanista secular confiam na
ignorância bíblica para que suas mensagens criem raízes, e
a igreja moderna tem se mostrado um terreno fértil para
essas mensagens. E, por não conhecermos a nossa Bíblia,
nos desfalecemos diante dos desafios mais básicos a nossa
visão de mundo. Desilusão e apatia corroem a nossa
convicção. As mulheres, em particular, estão deixando a
igreja em números sem precedentes.5
Quando as mulheres crescem cada vez mais negligentes
em sua busca pelo conhecimento bíblico, todos em seu
círculo de influência são afetados. Em vez de agirem como
sal e luz, nós nos tornamos uma contribuição insípida
para o ambiente em que vivemos e moldamos, sem
distinção daqueles que nunca foram transformados pelo
evangelho. O lar, a igreja, a comunidade e o país precisam
desesperadamente da influência de mulheres que saibam
por que acreditam naquilo que acreditam, fundamentadas
na Palavra de Deus. Eles precisam desesperadamente da
influência de mulheres que amam o Deus proclamado na
Bíblia de modo profundo e ativo.
Talvez você tenha sentido que seu próprio interesse
pela Bíblia está minguando e tenha se perguntado o
porquê disso. Talvez você tenha até mesmo questionado o
seu amor por Deus à luz de sua falta de desejo de
conhecer a Palavra. Eu creio que uma mulher que perde o
seu interesse pela Bíblia não está equipada para amar da
maneira como deveria. O Deus da Bíblia é tão encantador
que ofusca buscas menores. Eu desejo que as mulheres, em
todo lugar, desenvolvam um amor profundo e
permanente por ele, por meio do estudo do texto que o
faz conhecido.
Nos capítulos seguintes, quero demonstrar como fazer
isso. Assim como muitas professoras, eu tenho uma leve
fraqueza por aliteração, portanto, dê-me sua tolerância à
medida que explorarmos como valorizar aquilo que chamo
de os Cinco P´s do Estudo Saudável.
Estude com Propósito
Estude com Perspectiva
Estude com Paciência
Estude com Processo
Estude com Preces
Conforme avançarmos ao longo dos nossos Cinco P´s do
estudo saudável, você sem dúvidas começará a perceber
que o relacionamento entre eles não é estritamente
linear. Edificaremos sobre cada ideia à medida que
tratarmos delas, mas a ordem na qual elas serão discutidas
não indica que uma é mais importante do que a outra.
Consideraremos a importância das preces por último,
embora isso certamente não seja de última importância
em nossa abordagem das Escrituras, nem seja o último
princípio que devamos praticar. Cada um dos P´s dá
suporte aos outros: nós fazemos preces para alcançarmos
paciência a fim de estudarmos bem. A perspectiva e o processo
estão entrelaçados e dependem de mantermos o propósito
em vista. Tendo em mente que todos os cinco P´s são
igualmente necessários e inter-relacionados,
organizaremos nossa discussão sobre eles avançando em
uma ordem que parte do geral para o específico.
Cada uma dessas visões estratégicas nos ajudará a
começarmos a crescer no conhecimento bíblico, treinando-
nos no exercício: “mente antes do coração” e “Deus antes
do eu”. Então, mãos à obra.

4. Alex Trebek é apresentador de Jeopardy, um programa de perguntas


semelhante ao Show do Milhão, apresentado por Silvio Santos entre 1999 e
2003.
5. Vorjack, “Women Leaving the Church” [Mulheres Deixando a Igreja], Patheos,
5 de agosto de 2011, disponível em
<http://www.patheos.com/blogs/unreasonablefaith/2011/08/women-
leaving-the-church/>.
3
Estude com Propósito

Acaso, não sabeis? Porventura, não ouvis? Não vos tem sido anunciado desde o
princípio? Ou não atentastes para os fundamentos da terra? Ele é o que está
assentado sobre a redondeza da terra.
Is. 40.21-22a

Quando eu era pequena, meu pai costumava levar a


mim e meus irmãos para acamparmos. No início, eu
acreditava que fazíamos esses passeios porque meu pai
amava estar ao ar livre. À medida que cresci, comecei a
perceber que o que meu pai amava mais do que qualquer
outra coisa era uma cama confortável, um telhado sólido
sobre sua cabeça e um acesso previsível às notícias da
noite em uma TV. Eu me esforçava para tentar entender
como esses fatos se relacionavam com o acampamento.
Por que, afinal, gastávamos fins de semana fora de casa,
na natureza, comendo comida enlatada, quando estava
bem claro que meu pai não era um amante de aventuras
ao ar livre? Quando eu mesma me tornei mãe, a razão se
tornou clara: ele não nos levava para acampar porque ele
amava acampar; ele nos levava para acampar porque ele
nos amava. Conforme a intenção dele tornava-se clara
para mim, sua disposição para renunciar aos confortos em
troca de repelente de mosquitos e estacas de tendas
também começava a fazer perfeito sentido.
Todo bom esforço deve ser feito com um propósito. Sem
um senso claro de propósito, os nossos esforços para fazer
algo bom podem fracassar. Mas com um propósito claro,
somos muito mais propensos a perseverar. Isso com
certeza é verdade em relação a desenvolver um
conhecimento bíblico — ele exige esforço para ser
desenvolvido, mas manter uma clara nocão de propósito
nos sustenta em nosso trabalho. Como podemos começar
a ter mais propósito na maneira como abordamos o
estudo bíblico?
Poderia parecer muito óbvio dizer que devemos estudar
a Bíblia com propósito. Com certeza, todos nós temos
algum propósito em mente quando começamos a estudar
— observamos alguns deles no capítulo anterior: fazer
com que nos sintamos bem, ter ajuda para tomarmos
decisões, ter ajuda para a nossa autodescoberta. Mas
queremos ter em mente o propósito que a própria Bíblia
espera que tenhamos quando abrimos a sua capa.
Nenhum outro propósito é tão importante.
Já temos considerado que a Bíblia é um livro a respeito
de Deus, consideremos agora essa verdade em termos
mais específicos. Desde Gênesis até Apocalipse, a Bíblia
nos fala acerca do reino e do governo de Deus. Essa é a
História Principal da Bíblia, o propósito pelo qual ela foi
escrita. Cada um dos sessenta e seis livros contribui para
contar a História Principal — uma história de criação,
queda, redenção e consumação. A Bíblia tem o propósito
de nos contar essa História Principal por meio de milhares
de histórias menores, desde sua primeira página até a
última.
Portanto, o nosso propósito em estudar deve ser buscar
essa História Principal cada vez que vamos para as
Escrituras. Devemos estudar perguntando não apenas o
que uma porção específica das Escrituras quer nos dizer,
mas de que forma essa porção está nos contando a
respeito da História Principal da Bíblia como um todo.
Estudar a Bíblia com propósito significa manter sua
mensagem fundamental à vista em todo o tempo, quer
estejamos no Antigo Testamento ou no Novo, quer
estejamos nos Profetas Menores ou nos Evangelhos. A fim
de fazermos isso, devemos diminuir o “zoom” ao lermos
cada passagem ou livro em particular, de forma a
enxergarmos como ele desempenha o seu papel na
revelação da História Principal.

O QUE UMA PASSAGEM DE AVIÃO ME ENSINOU?


Obtive uma compreensão mais clara dessa grandiosa
História Principal durante umas férias. Geralmente em
nossas férias dirigimos por dez horas de Dallas, no Texas,
até Santa Fé, no Novo México, para passarmos um tempo
com os avós. Minha família se acostumou com a viagem —
pausa para o café nas Cachoeiras Wichita, almoço em
Amarillo, um lanche em Tucumcari. O cenário na estrada
é espetacular, e as crianças sabem exatamente em que
ponto direi para pararem tudo o que estiverem fazendo
para apreciarmos um obrigatório “momento da natureza”.
Meu marido ama mapas, e sua “declamação” fiel das
mudanças topográficas da paisagem é sempre um sucesso:
“Estamos nas planícies do Sul, agora...”
“Acabamos de entrar no Vale do Rio Vermelho...”
“Aqui estamos, subindo na direção de Llano Estacado...”
“Estamos passando por Mesalands...”
O fato de ele conhecer exatamente esses detalhes
sempre me deixa maravilhada. A sua professora de
geografia do ensino médio se deleitaria ao vislumbrar um
trabalho tão bem feito. E a minha deveria ficar deprimida
na obscuridade: nunca conheci topografia porque nunca
me ensinaram topografia.
E foi assim até que eu tive um motivo para voar a Santa
Fé e então comecei a apreciar plenamente aquilo que o
meu marido sabia. Assim que decolamos e viramos para o
oeste, de repente percebi que estava observando as
planícies do Sul, as quais estendiam-se abaixo de mim,
cortadas pelo Vale do Rio Vermelho, pontuadas pelas
elevações de Llano Estacado. Vi os planaltos de Mesalands
se estendendo até as montanhas ao norte. Vi, do ponto de
vista dos pássaros, a história que eu só havia apreciado em
partes, e, de repente, todos os momentos espetaculares
durante a viagem se encaixaram em uma paisagem
contínua e deslumbrante. A perspectiva que obtive com
aquele voo mudou para sempre a minha forma de
perceber a viagem de carro. Pelo preço de uma passagem
de avião, meus filhos ganharam não um, mas os dois pais
tagarelando sobre topografia durante dez horas todos os
feriados.

A HISTÓRIA PRINCIPAL DA BÍBLIA


A Bíblia tem sua própria topografia, seu próprio
conjunto de “características geográficas”, que se encaixam
para formar uma paisagem contínua e deslumbrante. Mas
muitas de nós nunca compramos uma passagem de avião
para entender seus contornos. Muitas de nós, depois de
anos na igreja, não conhecemos a topografia bíblica
porque nunca nos ensinaram topografia. Sabemos quando
estamos vendo algo lindo nas páginas das Escrituras, mas
nem sempre sabemos como aquilo que estamos vendo se
encaixa ao restante da história. A nossa compreensão das
Escrituras é uma série fragmentada de “momentos da
natureza” que talvez nos toquem profundamente, mas
que não se interligam necessariamente para nos revelar
uma visão panorâmica.
Entretanto, sem a visão panorâmica, podemos ter
apenas uma apreciação parcial daquilo que uma única
imagem estiver tentando nos dizer. Desde Gênesis até
Apocalipse, a Bíblia nos fala acerca do reino e do governo
de Deus. Sua topografia fala da criação, queda, redenção e
consumação em cada paisagem. A topografia da história
principal é repleta de estilos diferentes de escrita —
narrativa histórica, poesia, livros de sabedoria, leis,
profecias, parábolas, epístolas — tudo cooperando para
expandir a nossa compreensão do reino e do governo de
Deus de maneiras diferentes.
A ideia de uma história maior explicando as histórias
menores não é exclusiva da Bíblia. Os estudiosos chamam
isso de metanarrativa — uma explicação abrangente ou um
tema norteador que ilumina todos os outros temas de um
texto. A metanarrativa é essencialmente uma história a
respeito de histórias, englobando e explicando as
“pequenas histórias” que ela abrange. A metanarrativa E o
Vento Levou, de Margaret Mitchell, poderia ser descrita
como uma história de opressão, transformação e
autoconfiança. A história principal do romance é contada
de ângulos diferentes, por meio das histórias individuais
dos personagens do livro.
Como jardineira, não posso fazer outra coisa senão
pensar na metanarrativa em termos de jardinagem. Assim
como a metanarrativa bíblica é uma metanarrativa da
criação, queda, redenção e consumação, a metanarrativa
da jardinagem é a história do inverno, primavera, verão e
outono. Cada planta e árvore do meu jardim contam a sua
própria história exclusiva nas flores, nos frutos e nas
folhas; mas cada uma dessas histórias aponta para uma
história principal: a da mudança das estações. Se eu não
tivesse compreensão alguma acerca das estações, poderia
não entender por que minha árvore ficou amarela de
repente, em vez de verde. Eu poderia interpretar mal essa
mudança, como um sinal de doença, e não como um
indicador do outono. Mas porque compreendo a
metanarrativa da jardinagem, não procuro tomates em
meu tomateiro no inverno. Nem posso pedir ao meu pé de
jasmim para florescer no outono. Posso interpretar os
comportamentos das minhas plantas à luz da estação em
que estivermos, e posso perceber qual será a próxima fase
da metanarrativa da jardinagem através dos seus sinais.
A nossa falta de conexão com a metanarrativa da Bíblia
pode nos tornar muito semelhantes a um jardineiro que
falha em reconhecer as folhas coloridas como um sinal do
outono, e não como um sinal de doença. Quando não
temos clareza a respeito da história principal, talvez
tenhamos dificuldade em encontrar uma continuidade
entre o Deus do Antigo Testamento e o Deus do Novo
Testamento. Teremos dificuldades para fazermos
associações com o Antigo Testamento. Interpretaremos
erroneamente o propósito ou a ênfase de uma história
menor se a considerarmos de forma desvinculada da
história principal.
Então, considere a forma como a metanarrativa da
criação, queda, redenção e consumação age conforme a
história principal orienta e aborda todas as histórias
menores. Da janela de um avião, podemos olhar para
baixo na paisagem bíblica e observar que a história da
criação é apresentada em Gênesis 1-2: Deus cria todas as
coisas para a sua glória de uma maneira organizada. Ele
cria o homem à sua imagem. A queda é apresentada em
Gênesis 3: o homem tenta usurpar a autoridade de Deus,
o seu relacionamento com Deus é arruinado, o cosmos
sofre dano. O tema da redenção é apresentado
imediatamente em Gênesis 3.15, com a promessa de
salvação através da descendência de Eva. Ao final de
Gênesis e Êxodo, o plano da redenção toma a forma de um
povo escolhido por Deus — os descendentes de Abraão, a
nação de Israel. O tema da redenção é explorado ao longo
do restante do Antigo Testamento de vários ângulos,
apontando, enfim, na direção da obra redentora perfeita
de Cristo na cruz, que nos é recontada nos Evangelhos e
explorada nas epístolas. O Novo Testamento reforça e
expande a nossa compreensão da redenção, garantindo-
nos que essa salvação já foi realizada, exortando-nos a
buscar santificação e encorajando-nos a ter esperança em
uma glorificação futura. Em Apocalipse, vemos a
consumação e a restauração da ordem do cosmos: Deus
restabelece a perfeita ordem com a criação de novos céus e
nova terra.
Saber como um livro da Bíblia em particular se relaciona
com a história principal é importante, mas os elementos
individuais dos temas da criação, queda, redenção e
consumação também podem ocorrer nas histórias menores
da Bíblia de diversas formas. A nossa tarefa é buscar por
esses temas à medida que estudamos.

COMO A METANARRATIVA MOLDA O NOSSO


ENTENDIMENTO?
Considere a história de Noé em Gênesis. Muitas de nós
temos aprendido a história de Noé e da arca como um
conto heroico de um homem justo que construiu um barco
conforme Deus ordenara, preservando a humanidade por
meio de sua obediência. Mas observe como a
metanarrativa nos pede para lermos a história em um
nível mais profundo. À luz da história principal, a história
de Noé é uma história de recriação, na qual Deus faz com
que a terra volte ao seu estado original de desordem e
depois o reorganiza exatamente como ele fez em Gênesis
1. Ele separa as águas da terra seca, restaura a vegetação e
repovoa sua nova criação, ordenando mais uma vez que
ela seja frutífera e se multiplique. A história de Noé
também é uma história de redenção, na qual Noé prefigura
Cristo. O fiel servo de Deus é voluntariamente colocado
em uma arca (também traduzido por encaixotado) por
Deus, passa pelas águas da destruição e é despertado para
uma nova vida. A história de Noé também é uma história
de queda. Exatamente no momento em que estamos
prontos para proclamar Noé como perfeito em retidão, ele
fica bêbado e é encontrado vergonhosamente nu em sua
tenda, recordando-nos que somente um homem é
perfeito em retidão e capaz de nos salvar. A história de
Noé talvez tenha para nós um significado desconectado
do ponto de referência da história principal, mas quando
a vinculamos à história principal, ela adquire a
profundidade e a riqueza que se pretende ter. Em relação
à metanarrativa, a história de Noé recebe o foco de uma
história sobre Deus: Deus cria, Deus organiza, Deus
preserva a vida, Deus provê um libertador e somente
Deus pode salvar.
Ou considere a parábola do bom samaritano à luz da
metanarrativa. De modo geral, aprendemos essa história
como um conto de fundo moral que nos desafia a sermos
bondosos para com os outros, mesmo que isso seja
inconveniente. Mas de que forma Jesus fez referência à
metanarrativa quando ele idealizou essa história? A
parábola do bom samaritano é uma parábola que ecoa os
temas da queda, redenção e consumação. Ela é a história de
um homem rejeitado pelos judeus (o samaritano), que
preserva a vida de um homem que certamente morreria
sem sua intervenção (o homem à beira do caminho). Esse
samaritano não tem obrigação alguma de intervir, mas ele
o faz ao grande custo de sua própria vida, providenciando
um cuidado contínuo para o homem desamparado e
prometendo voltar para acertar as contas. Vista à luz da
metanarrativa, a parábola do bom samaritano é uma
história a respeito de Deus: Deus envia seu Filho para ser
rejeitado pelos seus, para nos salvar da morte certa, para
restaurar todas as coisas.
Somos chamadas para sermos como Noé? Sim. Somos
chamadas para sermos como o bom samaritano? Sim. Mas
não apenas porque eles são exemplos positivos para nos
inspirar em retidão. Essas histórias apontam para Cristo.
Elas nos apontam para a história principal do reino e do
governo de Deus, convidando-nos para percebermos a nós
mesmas em relação a ele. O conhecimento de Deus e o
conhecimento do eu sempre andam de mãos dadas: vemos
a retidão de Cristo ilustrada nessas duas histórias e
reagimos clamando por graça, a fim de agirmos da mesma
forma que Deus agiu conosco em Cristo: libertando-nos da
inundação de sua ira; resgatando-nos da morte certa.
Mas o que dizer daqueles livros ou partes da Bíblia que
não são narrativas ou histórias? Os livros da Lei, os
poéticos, de sabedoria e os proféticos também dizem
respeito à metanarrativa. Examinaremos como abordar
cada um desses gêneros com mais detalhes no capítulo 4,
mas por enquanto, vamos considerá-los brevemente (e de
forma bem geral) à luz da metanarrativa da criação, queda,
redenção e consumação.

Livros da Lei: a Bíblia registra a lei de Deus para nós, de modo que
entendamos a nossa necessidade de redenção por meio de Cristo. Ela
também mostra ao crente como obedecer a Deus ao ilustrar o caráter
dele e nos chamar para nos conformarmos à sua imagem, começando
assim o processo de restauração à imagem de Deus (consumação), a qual
foi perdida na queda.
Livros Poéticos: a poesia na Bíblia varia de lamentações a bênçãos,
hinos de louvor e profecias. A linguagem poética e representações
podem ser usadas pelos autores das Escrituras para enfatizar ou
reforçar qualquer parte da metanarrativa. O conhecido Salmo 23
aponta para a redenção e consumação. A resposta bem conhecida de Deus
ao questionamento de Jó (30-40) aponta para a criação e queda.
Livros de Sabedoria: assim como acontece com a Lei, os livros de
sabedoria nos mostram as lacunas em nossa santificação e nos motivam
a responder em obediência. Eles também apontam para a nossa
necessidade de redenção e para a obra contínua de restauração na vida do
crente (consumação).
Livros Proféticos: Quando estudamos os profetas, aprendemos
que Deus faz exatamente aquilo que ele diz que fará. Perceber o
cumprimento meticuloso da profecia no livro de Daniel ou de Isaías nos
aponta para a certeza de que todas as profecias ainda não cumpridas
serão também cumpridas meticulosamente. As profecias apontam para
a metanarrativa, dizendo “a redenção foi cumprida e a consumação é algo
certo”.
Aprender a interligar uma passagem das Escrituras à
ampla visão da metanarrativa poderia ser tão simples
quanto comprar uma passagem de avião para Santa Fé.
Identificar a metanarrativa à medida que estudamos é
algo que não acontece sem esforço — essa é uma
habilidade de estudo que exige tempo e prática para ser
adquirida. Todas as novas habilidades requerem uma
curva de aprendizagem. À medida que você começar a
estudar com propósito — com a história principal em
vista — permita-se ter uma curva de aprendizagem
conforme seus olhos se ajustam a esse novo ponto de
vista. Com o tempo, você se tornará melhor em conectar
as áreas individuais do estudo a uma compreensão
integral do propósito de Deus desde Gênesis até
Apocalipse.
4
Estude com Perspectiva

Por isso, todo escriba versado no reino dos céus é semelhante a um pai de família
que tira do seu depósito coisas novas e coisas velhas.
Mt. 13.52

Aprender a nos orientar para a metanarrativa das


Escrituras dará um propósito claro ao nosso estudo:
contemplar o reino e o governo de Deus conforme
revelado em sua Palavra e, assim, compreender melhor o
nosso próprio lugar na história principal. Uma vez que
tenhamos determinado o nosso propósito nesses termos
amplos, estaremos preparadas para considerar o segundo
P de nosso estudo saudável: perspectiva. Nós paramos de
perguntar, “Qual é a estrutura geral da Bíblia?” e
passamos a perguntar: “Qual é a estrutura específica para
esta porção que estou estudando das Escrituras?”
Pense mais uma vez em minha viagem para Santa Fé.
Amarillo, no Texas, é o ponto que está na metade do
caminho, por essa razão, geralmente paramos lá para um
almoço rápido. Se você nunca esteve naquela região do
Texas, deixe-me dizer que ela não é exatamente um lugar
agradável. Amarillo, em particular, emite um cheiro de gás
metano ao longo de oito quilômetros de estrada, devido a
um curral mal localizado. A topografia é árida e plana. Se
Amarillo fosse um livro da Bíblia, ele provavelmente
corresponderia a Levítico: para aqueles que só estão de
passagem, é difícil imaginar por que alguém desejaria
passar mais tempo ali. Mas se eu tivesse que ficar um
tempo em Amarillo, descobriria que lá é um lugar com
uma cultura e história únicas, um lugar de fazendas de
gado, fazendas eólicas gigantes, do Canyon de Palo Duro e
da fazenda do famoso bife texano de dois quilos. Quanto
mais tempo eu passasse em Amarillo, mais poderia
apreciar esses tesouros locais. Eu poderia nunca desejar ir
embora.
Com a Bíblia acontece da mesma maneira. Não só todos
os sessenta e seis livros da Bíblia dizem uma única história
extensa, mas cada um desses sessenta e seis livros conta a
sua própria história, refletindo o caráter de Deus por
meio de uma lente histórica e cultural específica. Essa
lente nos dá a perspectiva necessária que precisamos para
compreender um texto corretamente. Se tirarmos tempo
para aprendermos a perspectiva histórica e cultural de um
livro da Bíblia, entenderemos como interpretá-lo e
valorizá-lo melhor. Mas como podemos aprender a
estudar com a perspectiva correta? Para fazê-lo, devemos
nos tornar arqueólogas.

DESENTERRANDO A HISTÓRIA
A cidade de Roma existe desde o século VIII A.C., um
fato do qual seus cidadãos hoje estão bem cientes. Se você
possui uma casa em Roma atualmente, a história se revela
em qualquer projeto de melhoria de casas que requeira
escavação. Isso porque a Roma dos dias de hoje foi
construída em cima da Roma antiga. Bem abaixo da
superfície dessa cidade agitada, repousam literalmente
quilômetros de templos antigos, casas de banho, prédios
públicos e palácios que desapareceram de vista; muitos
deles ainda estão intactos.6 Por séculos, os romanos
construíram em cima de estruturas já existentes, às vezes
eles as preenchiam com terra para torná-las um alicerce
mais adequado para a nova construção. O resultado é uma
cidade em cima de outra cidade, com uma coluna antiga
ocasionalmente se projetando de um alicerce moderno,
dando a sugerir o que se encontra em baixo. Os
arqueólogos têm mapeado meticulosamente essa Roma
subterrânea em um esforço para preservar seu registro da
antiguidade que está desparecendo; reconhecendo, com
razão, o seu valor para o mundo moderno.
Assim, quando o proprietário de uma casa na Roma
atual quer fazer qualquer reforma que exija escavação,
quase sem exceção, os arqueólogos devem ser
consultados.7 Roma não permite que seus residentes
escavem sem levar em consideração sua rica e relevante
história. Todo tipo de construção atual deve ser feita com
cuidado, reconhecendo que seus habitantes
contemporâneos vivem em um contexto que é bem maior
do que o curto período de tempo em que habitarão ali.
Viver em Roma significa respeitar seus primeiros
habitantes, ocupando um lugar atual e ao mesmo tempo
mantendo uma perspectiva antiga. A tentação de
reformar uma residência particular para torná-la mais
agradável sem notificar as devidas autoridades pode ser
forte. O desejo de dizer: “Não posso simplesmente
construir de acordo com meu próprio gosto?” pode ser
grande. O passado está lá para ser escavado, mas somente
aqueles cidadãos com um senso de seu pequeno espaço na
história de Roma estão dispostos a habitar a cidade de
acordo com suas rigorosas leis de construção.
Assim como os residentes atuais de Roma, nós cristãos
hoje devemos lidar com as nossas Bíblias com o mesmo
entendimento. Os cristãos atuais herdaram uma fé que
está construída sobre os fundamentos daquilo que veio
antes. Nós também devemos ocupar um lugar atual ao
mesmo tempo em que mantemos uma perspectiva antiga.
As porções mais antigas de nosso texto sagrado foram
escritas há aproximadamente 1500 anos A.C., em uma
língua que não falamos, para pessoas cujas vidas pareciam
ser bem diferentes das nossas. Mas muitas de nós
escolhemos edificar o nosso entendimento das Escrituras
hoje sem qualquer consideração pelo contexto histórico e
cultural que repousa debaixo de sua superfície; um
contexto que é essencial para a compreensão e aplicação
corretas de qualquer texto. A tentação para tornarmos a
Bíblia aplicável à nossa experiência atual sem
preservarmos seus laços com os ouvintes originais é forte.
O desejo de dizer: “Não posso ler o texto como se ele
tivesse sido escrito para mim?” é grande. Os contextos
históricos e culturais da Bíblia estão lá para serem
escavados, mas somente aqueles crentes com um senso de
seu pequeno lugar na história da redenção estão dispostos
a cavar com diligência.

ESCAVANDO PARA TER PERSPECTIVA


Não é de se admirar que a Bíblia compare a aquisição da
sabedoria ao fato de encontrarmos ouro, prata e um
tesouro escondido; todas essas coisas exigem escavação
para serem obtidas. E escavar é um trabalho difícil,
principalmente quando deve ser feito respeitando-se o
contexto histórico e cultural. Vivemos numa época em que
a Bíblia é geralmente considerada um livro para a nossa
própria edificação, por meio do qual o Espírito Santo
simplesmente revelará a verdade àqueles que estiverem
dispostos a lhe dar alguns minutos de sua atenção por dia.
Os músculos intelectuais que os nossos antepassados na fé
uma vez usaram para escavar têm crescido atrofiados na
mente moderna. Poucas de nós estamos dispostas a fazer
o trabalho duro de escavar, preferindo viver na
compreensão moderna da Bíblia, sem nenhuma
consideração pelo seu público ou propósitos originais;
costurando a nossa leitura moderna para se adaptar aos
nossos próprios objetivos. E porque perdemos o senso do
quanto somos pequenos no grandioso esquema da
história, nós rapidamente evitamos a prática saudável de
“consultar os arqueólogos” para nos ajudarem a cavar de
modo responsável quando lemos e estudamos. Precisamos
da perspectiva dos povos da antiguidade, e essa
perspectiva deve ser escavada.
Os estudiosos chamam esse processo de escavação do
sentido original de uma passagem de exegese. Cada uma de
nós é um produto da época e da cultura em que vivemos e,
sendo assim, trazemos algumas ideias preconcebidas para
a nossa leitura das Escrituras. É por isso que determinadas
passagens podem nos causar grande dificuldade quando
as encontramos pela primeira vez — passagens como,
bem, basicamente todo o livro de Levítico. A exegese nos
impele para além dos limites da nossa compreensão
pessoal de cultura e história, pedindo-nos para voltarmos
ao período em que o texto foi escrito e ouvi-lo com os
ouvidos dos ouvintes originais. A exegese diz: “Antes que
você possa ouvir isso com o seus ouvidos, ouça-o com os
deles. Antes que você possa compreender isso nos dias de
hoje, compreenda-o nos dias deles”. Ela nos pede para
assumirmos a perspectiva do autor e de seu público em
seu cenário original. A exegese nos pede para sermos
arqueólogas na medida da nossa capacidade e para
consultarmos a ajuda de arqueólogos mais capazes naquilo
que precisarmos. Ela nos dá a perspectiva necessária para
interpretarmos adequadamente as Escrituras. Ela faz isso
por meio de cinco perguntas arqueológicas básicas para
qualquer texto em questão.
1 - Quem escreveu o texto?
2 - Quando ele foi escrito?
3 - Para quem ele foi escrito?
4 - Em qual estilo ele foi escrito?
5 - Por que ele foi escrito?

Se neste momento você se sente como se estivesse de


volta a uma sala de aula do ensino médio, é exatamente
assim que eu quero que você se sinta. Acredite ou não, não
temos que frequentar um seminário para aprendermos
como conduzir a exegese de um texto. Essas habilidades
nos foram provavelmente ensinadas no ensino médio.
Uma parte da desmistificação do estudo bíblico é
reconhecer que os princípios básicos de interpretação
literária são aplicáveis a todos os livros, inclusive à Bíblia.
Grande parte da nossa dificuldade com o estudo bíblico
apropriado pode ser atribuída à nossa dificuldade com o
português do ensino médio e com a nossa hesitação em
considerarmos a Bíblia como literatura. Deixe-me garantir
duas coisas a você:
1 - A Bíblia não é de modo algum depreciada por ser
designada como literatura.
2 - Sua habilidade para compreender a Bíblia
aumentará grandemente se você tratá-la como tal.
Chamar a Bíblia de literatura é um simples
reconhecimento de que ela transmite uma mensagem por
meio de um autor humano, para um público humano, na
forma de palavras. De acordo com o dicionário, literatura
é qualquer obra escrita “que possui excelência na forma ou
expressão, e expressa ideias de interesse universal ou
permanente”.8 A Bíblia é, pelo menos, isso e muito mais.
Mas entender a Bíblia como literatura nos permite
empregar ferramentas básicas de escavação que
aprendemos a usar na escola (ou deveríamos ter
aprendido). Talvez os anos tenham ofuscado suas
lembranças das aulas de português do ensino médio ou
talvez suas aulas tenham sido dadas por um treinador de
futebol. Não é tão tarde para rever esses princípios básicos
de interpretação a fim de obter ajuda para estudar a peça
literária mais importante que já foi redigida. Ao fazer
cinco perguntas arqueológicas simples a respeito do texto
antes de começar a ler, você pode ao mesmo tempo
satisfazer as mais preciosas esperanças de sua professora
de português e se tornar uma melhor estudante da Bíblia.
Abordaremos rapidamente cada uma dessas cinco
perguntas para entendermos como o fato de respondê-las
causará impacto em nosso estudo.

1. QUEM ESCREVEU O TEXTO?


A maioria de nós não lemos um livro ou um artigo sem
considerarmos sua fonte. Saber quem escreveu algo nos
ajuda a compreender por que um texto é escrito de uma
maneira e não de outra, e nos ajuda a julgar a
credibilidade daquilo que foi escrito. Em relação aos
autores bíblicos, a credibilidade não está em jogo —
vamos para o texto com o pressuposto de que Deus
inspirou um determinado autor a escrever com
autoridade plena. Mas por nos aproximarmos do texto
com esse pressuposto, às vezes nos esquecemos de dar a
devida consideração ao elemento humano da autoria
bíblica: Deus escolheu uma pessoa específica para escrever
um livro específico. Como essa escolha influencia a
maneira como interpretamos determinado livro? Nem
sempre sabemos quem escreveu um livro específico da
Bíblia, mas até mesmo a ambiguidade autoral moldará a
forma como lemos o texto.
Assim como saber que Thomas Jefferson e Benjamin
Franklin escreveram a Declaração de Independência
norte-americana molda a forma como lemos esse
documento, saber que o meio-irmão de Jesus escreveu o
livro de Tiago também molda a forma como lemos a
epístola. Reconhecemos que Tiago escreveu como alguém
que recebeu o conhecimento diretamente de Jesus, de um
modo que outros não receberam e com uma perspectiva
que nenhum outro poderia alegar ter. Não é de se
surpreender o fato de seus escritos ecoarem as palavras
do Sermão do Monte de modo tão exato, e saber que ele
teve uma morte de mártir nos faz levar a sério suas
palavras acerca de vivermos a nossa fé.

2. QUANDO ELE FOI ESCRITO?


Usamos a datação de um livro para nos ajudar a
entender como o livro teria sido lido por seu público
original, de que maneira ele fala especificamente sobre
aquele momento da história, quais outros livros da Bíblia
são seus contemporâneos e onde ele se encaixa na história
principal. Nem todos os livros são capazes de ser datados
com precisão, mas muitos o são. Em alguns casos, talvez
mais notadamente no livro de Apocalipse, a data que um
comentarista escolher como sendo a mais precisa poderá
influenciar fortemente sua interpretação do texto.
Conhecer a data aproximada em que um livro foi escrito
nos ajuda a considerarmos os fatores culturais que
influenciaram sua escrita. Associada à nossa próxima
pergunta arqueológica (“Para quem ele foi escrito?”), a
data de um livro nos permite examinar as estruturas
sociais, os papéis dos gêneros, as leis, a geografia e as
forças políticas que cercavam o público para o qual o livro
fora escrito originalmente. Isso nos ajuda a começarmos a
fazer as perguntas certas sobre os pressupostos implícitos
de um autor acerca da adoração, casamento, família,
idolatria, escravidão, posse de propriedades, deveres
cívicos e assim por diante.

3. PARA QUEM ELE FOI ESCRITO?


Cada livro da Bíblia foi escrito para um público
específico que viveu no passado. Esses ouvintes originais
viveram em épocas e culturas muito diferentes das nossas.
A mensagem da Bíblia transcende seu público original,
mas ela não pode ser separada de seu público original.
Conforme Gordon Fee e Douglas Stewart observam: “Um
texto não pode significar aquilo que ele nunca poderia ter
significado para o seu autor ou seus leitores”.9
Muitas de nós já ouvimos que “a Bíblia é uma carta de
amor de Deus para nós”. Em certo sentido, ela o é, mas
conforme já consideramos, a Bíblia é, primeiramente e
acima de tudo, um livro a respeito de Deus. Quando
perguntamos: “Para quem um determinado livro foi
escrito?”, estamos expandindo essa primeira ideia para
dizer: “A Bíblia é um livro a respeito de Deus, escrito para
pessoas que viveram no passado e também escrito para
nós”. Da mesma forma como não estudaríamos Platão ou
Sócrates sem considerarmos o público da época, não
podemos estudar o texto bíblico sem fazermos o mesmo.
Ocorrem muitas aplicações incorretas das Escrituras
porque os crentes hoje ignoram o público para o qual foi
escrito um texto. Nem todas as promessas feitas ao Israel
étnico se aplicam ao Israel espiritual (a Igreja). Nem todas
as instruções relativas a pessoas e bens se aplicam à
cultura moderna. Devemos considerar as necessidades,
estruturas sociais, crenças e desafios específicos daqueles
para quem o autor escreveu originalmente se quisermos
interpretar e aplicar uma passagem de forma apropriada.
Antes de perguntar: “O que este texto tem a me dizer?”,
devemos perguntar: “O que este texto tinha a dizer ao seu
público original? ”
4. EM QUAL ESTILO ELE FOI ESCRITO?
No capítulo 3, consideramos alguns dos diferentes
estilos literários encontrados nas Escrituras à luz da
metanarrativa. Cada livro da Bíblia utiliza um ou mais
desses gêneros para comunicar sua mensagem. A nossa
capacidade de interpretar e aplicar um texto com precisão
depende do quão bem compreendemos as nuances de
cada um desses gêneros. Cada gênero utiliza a linguagem
de maneira diferente.
A narrativa histórica utiliza a linguagem para fornecer
uma releitura real dos acontecimentos. Ela tem a intenção
de ser interpretada pelo que ela de fato parece dizer.
Saber disso nos previne de ler livros desse gênero como
sendo um simples mito ou alegoria. Nós compreendemos
isso; o relato do dilúvio, primeiramente e acima de tudo,
deve ser lido como uma história. Isso não significa que ele
não contenha quaisquer elementos alegóricos, mas que
qualquer objetivo alegórico é secundário em relação ao
propósito de recontar um acontecimento real.
As parábolas/histórias contadas utilizam personagens e
cenários cuidadosamente formulados para ensinar uma
lição ou ilustrar um ponto. Talvez nem todo detalhe de
uma parábola acrescente algo importante ao sentido
geral, e nem todo personagem represente alguém ou algo.
Os personagens e os cenários que podem parecer
estranhos para nós seriam facilmente reconhecidos por
seu público original. Aprender a ouvir essas histórias
culturalmente ricas da mesma forma como seus ouvintes
originais a ouviram nos permite interpretá-las
adequadamente.
As Leis na Bíblia geralmente utilizam uma linguagem
referente a situações ou relacionamentos tão distantes da
nossa compreensão cultural hoje que podemos ficar
totalmente perdidas a respeito de como compreendê-las.
Às vezes, as leis registradas são uma lista parcial ou
representativa de um conjunto completo de leis que
existiam em outro lugar na forma escrita, levando o leitor
dos dias de hoje a questionar por que apenas
determinados assuntos são tratados, enquanto outros são
aparentemente desconsiderados. É importante lembrar
que as leis foram registradas como diretrizes para as
autoridades governamentais, e não para que os indivíduos
administrassem a justiça por si próprios. A famosa lei do
“olho por olho, dente por dente” não concede permissão
para que um homem exija retaliação contra o seu vizinho.
Ela provê uma orientação para um juiz proferir a sentença
de um caso, servindo para impedir que a parte lesada se
vingue (punição exagerada) ao invés de receber o que é
justo (justiça).
A Poesia na Bíblia, assim como em qualquer outro lugar,
utiliza a linguagem de forma simbólica e metafórica para
descrever imagens com palavras. Quando o salmista pede
para Deus destruir totalmente seus inimigos, podemos ler
isso como uma expressão poética de profunda dor e raiva,
em vez de um pedido de oração real e assustador. Quando
um autor fala, cheio de entusiasmo, que os dentes de sua
amada são como o rebanho das ovelhas recém-tosquiadas,
que sobem do lavadouro, entendemos que ele tem a
intenção de elogiá-la por seu sorriso encantador.
Os Livros de Sabedoria utilizam a linguagem para
transmitir princípios que, de forma geral, são verdadeiros,
embora não universalmente verdadeiros. Ler um
provérbio como se fosse uma promessa pode levar à
angústia e dúvida. Entendê-lo como uma regra geral para
a vida pode nos direcionam para uma tomada de decisão
sábia. O famoso provérbio “Ensina a criança no caminho
em que deve andar, e, ainda quando for velha, não se
desviará dele” não promete que pais crentes terão filhos
crentes. Em vez disso, ele afirma um princípio sábio e
geral de que um pai piedoso deve ensinar seus filhos no
caminho da piedade.
As Profecias, assim como a poesia, utilizam a linguagem
de maneira simbólica. Colocar a profecia dentro de seu
contexto histórico e cultural esclarece ainda mais esse seu
uso de linguagem. Quando uma profecia diz que o sol, a
lua e as estrelas cairão do céu, podemos examinar essa
linguagem de acordo com as regras do gênero em vez de
supor que um acontecimento cósmico está sendo
profetizado de modo específico (embora isso seja
possível). Saber que os pagãos das culturas antigas
adoravam o sol, a lua e as estrelas nos ajuda a
compreender melhor a profecia acerca da extinção dos
corpos celestiais: a adoração a outras divindades cessará
quando a profecia for cumprida.

5. POR QUE ELE FOI ESCRITO?


Cada autor escreve com um propósito específico em
mente. Os autores da Bíblia não são uma exceção à regra;
eles escrevem para registrar a história, para instruir, para
admoestar, para inspirar, para repreender, para advertir e
para encorajar. Eles escrevem para tratar das
necessidades, esperanças ou temores de seu público à luz
do caráter de Deus. Podemos identificar por que um livro
foi escrito ao considerarmos seus temas principais e as
ideias repetidas à luz do seu público original, e de seu
contexto histórico e cultural. Conhecer o propósito para o
qual um texto foi escrito nos guarda de lê-lo unicamente
para os nossos próprios objetivos.

NÃO ENTRE EM PÂNICO


Eis uma boa notícia: ninguém espera que você saiba as
respostas das cinco perguntas de cor, nem tampouco você
deve esperar que o Espírito Santo simplesmente revele as
respostas a você. Ele as tem revelado, mas ele tem feito
isso ao dotar algumas pessoas no corpo de crentes com o
desejo e a capacidade de descobrir essas respostas por
meio do estudo diligente. Você tem permissão para obter
ajuda da arqueologia.
Mas onde você deve ir para buscar ajuda? Uma Bíblia de
estudo confiável, como a Bíblia de Estudo de Genebra, é um
ponto de partida indispensável. Uma Bíblia de estudo
fidedigna é uma ferramenta essencial para alguém que
deseja começar a desenvolver o conhecimento bíblico. No
início de cada livro, você encontrará uma discussão sobre
as questões arqueológicas. Antes de começar a ler um livro
específico, leia o material introdutório que se encontra ali.
Mas não leia simplesmente — escreva as cinco perguntas
que propusemos e anote as respostas que você encontrar
para cada uma delas. Para o livro de Gênesis, suas
anotações poderiam ser mais ou menos assim:

A autoria é atribuída a Moisés, o libertador de


Israel, aquele que trouxe a lei, juiz.
Quem escreveu o texto?
Provavelmente usou os recursos orais e escritos
existentes para escrevê-lo.
Por volta de 1400 A.C., durante o período de
Quando ele foi escrito?
quarenta anos de peregrinação no deserto.
Para quem ele foi Aos israelitas que foram tirados do Egito,
escrito? durante o período que passaram no deserto.
Em qual estilo ele foi De forma geral, narrativa histórica. Algumas
escrito? poesias e profecias.
Para dar à nação de Israel uma história e uma
regra de vida quando entrassem em Canaã. Para
Por que ele foi escrito?
recordá-los de seu passado e prepará-los para o
futuro.

Ao escrever as perguntas e respostas você será capaz de


se lembrar daquilo que aprendeu com o material
introdutório. Esse é um passo a mais, mas o esforço valerá
a pena. Uma Bíblia de estudo não é o único lugar onde
você poderá encontrar um material introdutório — um
comentário ou um manual bíblico também poderão ajudá-
la. Discutiremos sobre como escolher e utilizar
ferramentas de estudo, como Bíblias e comentários, no
próximo capítulo. Por ora, tenha em mente que é bom
consultar mais de uma fonte para responder às cinco
perguntas. Estudiosos diferentes as responderão de
formas diferentes, e nem todos os estudiosos têm o
mesmo ponto de vista teológico. Consultar mais de uma
fonte irá ajudá-la a perceber se está respondendo às cinco
perguntas da forma como a maioria dos estudiosos, cada
um com o seu ponto de vista teológico, as responderiam.

O ANTIGO E O MODERNO
Exatamente como a cidade de Roma, sua Bíblia é uma
maravilha moderna inseparavelmente ligada a um
contexto antigo. Estudar com perspectiva, fazer o trabalho
duro de cavar até as estruturas culturais e históricas
originais de um texto, irá capacitá-la a ler a Bíblia da
forma como o seu autor humano pretendia que ela fosse
lida. Levar em conta o propósito original de um livro e
conhecer os gêneros literários que ele utiliza a capacitará a
começar o processo de desenvolvimento do conhecimento
bíblico com zelo. Uma vez que você tenha escavado as
respostas das cinco perguntas arqueológicas, você estará
preparada para começar o processo de aprendizagem do
texto, trabalhando metodicamente para trazer tesouros
antigos aos contextos modernos.
6. Tom Mueller, “Underground Rome”, The Atlantic Monthly [“Roma
Subterrânea” em
O Mensário Atlântico], abril de 1997, disponível em
<http://www.theatlantic.com/past/docs/issues/97apr/rome.htm>.
7. Stephan Faris, “Rome’s Developing Subway”, Travel and Leisure [“A Passagem
Subterrânea de Roma” em Viagens e Lazer], abril de 2008, disponível em
<http://www.travelandleisure.com/articles/romes-developing–subway>.
8. Merriam-Webster OnLine, sob a palavra “literature” [literatura], disponível
em <http://www.merriam-webster.com/dictionary/literature?
show=0&t=1385582790>.
9. Gordon Fee and Douglas Stuart, “How to Read the Bible for All Its Worth”
(Grand Rapids, MI: Zondervan, 1993), p. 74, traduzido para o português
como Como Ler a Bíblia Livro por Livro: Um guia de estudo panorâmico da
Bíblia, Vida Nova: São Paulo, 2013.
5
Estude com Paciência

A [semente] que caiu na boa terra são os que, tendo ouvido de bom e reto
coração, retêm a palavra; estes frutificam com perseverança.
Lc. 8.15

Até aqui, observamos a importância de estudarmos com


propósito — trabalhando para inserir qualquer texto em
questão dentro da história principal da Bíblia, e temos
considerado a importância de estudarmos com perspectiva
— trabalhando para inserir cada texto analisado em seus
contextos histórico e cultural originais. Esses dois
primeiros P´s, dos cinco P´s do estudo saudável, podem
exigir mais tempo e esforço para serem colocados em
prática do que os nossos estudos no passado exigiam, mas
eles impactarão grandemente nossa compreensão a
respeito do que lemos. Eles exigem mais de nós como
estudantes do que planejávamos nos esforçar caso
fôssemos deixadas aos nossos próprios padrões. O estudo
bíblico, assim como a maioria das habilidades, exige
disciplina. Se você já teve que aprender alguma
habilidade, você provavelmente se recordará da frustração
que o acompanhou — os sentimentos de inadequação, a
monotonia de repetir um processo até que você o tenha
aprendido, o desejo intenso de abandoná-la ou de
encontrar uma maneira mais fácil de realizá-la. Aprender
a estudar a Bíblia traz todos esses mesmos sentimentos,
razão pela qual o nosso terceiro P do estudo saudável é um
lembrete para deixarmos que o processo de aprendizagem
tome o seu curso. Além de estudar com propósito e
perspectiva, devemos estudar com paciência.
Aprendemos muito cedo, com nossos pais e professores,
que a paciência é uma virtude. Podemos perceber o seu
valor ao lidarmos com pessoas ou dificuldades. Estamos
cientes de que ela aparece como o quarto fruto do Espírito
(Gl 5.22-23), mas nem sempre somos rápidas para colocá-
la em prática. A nossa cultura acredita que a paciência é
uma chatice e procura maneiras de evitar exercê-la
constantemente. Os shows de televisão resolvem conflitos
em trinta minutos ou menos. Os restaurantes nos servem
comida quase tão rapidamente quanto conseguimos fazer
o pedido. A internet entrega toda e qualquer compra que
poderíamos conceber em menos de quarenta e oito horas.
Músicas, e-books e filmes estão disponíveis
instantaneamente. Programas de perda de peso oferecem
resultados imediatos. A noção de gratificação tardia pode
ser difícil de ser aprendida e praticada em uma cultura de
paciência opcional, que celebra a satisfação imediata de
cada desejo.
Assim, não é de se surpreender que o desejo por
gratificação instantânea possa ainda penetrar
furtivamente em nosso estudo bíblico. A predominância
de material devocional disponível traz evidências de nosso
amor pelo “pacote” pronto: uma intuição espiritual
combinada com alguns versos e uma aplicação ou duas.
Abordamos o nosso “tempo na Palavra” como o drive-thru
do McDonald’s: “Tenho só alguns minutos, dê-me algo
rápido e fácil para eu me alimentar”.
Mas o estudo bíblico saudável está arraigado na
celebração da gratificação tardia. Ganhar conhecimento
bíblico exige permitir que nosso estudo tenha um efeito
cumulativo — ao longo de semanas, meses e anos — de
modo que a inter-relação de uma parte das Escrituras com
outra se revele de forma vagarosa e graciosa, como um
pano que, ao ser retirado, vai deslizando centímetro por
centímetro até revelar a obra de arte que está por baixo. A
Bíblia não deve ser um pacote pronto de suplementos
para trezentos e sessenta e cinco dias do ano. Ela não deve
ser reduzida a clichês e planos de ação. Ela quer fazer você
pensar, a fim de estender o seu entendimento. Ela revela
um mosaico da majestade de Deus, texto por texto, um dia
por vez, ao longo de toda vida. É claro que você deve
trazer entusiasmo para o seu tempo de estudo. Sim,
também traga fome. Mas, com certeza, traga paciência —
venha preparada para estudar por toda vida.

PACIÊNCIA COM VOCÊ MESMA


O oitavo ano do ensino fundamental é o ano da
choradeira começar. Com os nossos filhos mais velhos,
fomos pegos de surpresa — a escola jamais havia causado
neles aquele nível de angústia antes. Mas com a
introdução da álgebra, todos os nossos quatro filhos
adotaram um ritual noturno de frustração e lágrimas. Jeff
e eu desenvolvemos um mantra que pegamos emprestado
de um de nossos filmes favoritos de beisebol: There is no
crying in math [Não há choro em matemática].10 A
inauguração aconteceu em uma noite, quando tentávamos
desfazer a confusão que havia sido criada em torno da
lição de casa, tranquilizando as crianças com a ideia de
que elas tinham aquilo que era necessário para
completarem o trabalho, e guiando-as gentilmente para
avançarem com paciência.
A primeira vez que usamos o “Não há choro em
matemática”, falado em um tom de completa calma a
alguém que não estava mais conseguindo pensar, esse
alguém gritou ainda mais inflexível: Você não entende! Estou
completamente perdido. Meu professor fez um péssimo trabalho
explicando esse conceito. A aula é muito difícil. Por que, em vez
disso, você não deixa eu me inscrever para fazer uma aula de
educação física ao ar livre?
Na época em que o nosso filho mais novo passou para o
oitavo ano, essa cena se desenrolou de forma diferente.
Conforme o caçula da família sentou-se à mesa,
enxugando as primeiras lágrimas de frustração induzidas
pela matemática, eu apelei para o respeitado mantra:
“Calvin, não há choro em matemática”. E, antes que ele
pudesse escondê-lo, um sorriso começou a aparecer nos
cantos de sua boca. Calvin tinha a vantagem de saber
como o oitavo ano terminava. Após ter observado seus
irmãos irem das lágrimas para os sorrisos durante o oitavo
ano de aventura na matemática, ele sabia que a frustração
era parte natural do processo de aprendizagem. Havia
choro na matemática? Para dizer a verdade, havia muito
choro. Mas, no final, Calvin havia testemunhado a
diligência e a paciência deles para realizarem o trabalho à
medida que cada um de seus irmãos adquiria as
habilidades necessárias para conquistar a matemática —
no oitavo ano e nos demais. Calvin poderia se sentir
perdido agora, mas esse sentimento não duraria. Sentir a
frustração do processo de aprendizagem era como se ele
estivesse se colocando no lugar dos seus irmãos mais
velhos. Sim, o choro poderia durar uma noite, mas a
alegria de entender viria, sem dúvida, com o tempo e o
esforço.
Eu gostaria que mais mulheres compreendessem essa
perspectiva quando se trata de aprender a Bíblia. Ser uma
estudante de qualquer matéria exige esforço — o processo
de obtenção de entendimento não é fácil e geralmente
pode ser frustrante. Dependendo do assunto, aprender
pode ser agradável, mas isso não acontecerá sem esforço.
Aprender exige trabalho. Isso é tão verdadeiro em relação
a aprender a Bíblia quanto a aprender álgebra. Pensamos
que aprender a Bíblia deveria ser tão natural quanto
inspirar e expirar. Se conhecer a Palavra de Deus é algo
tão bom para nós, com certeza Deus não tornaria isso
difícil de fazer. Mas o aprendizado da Bíblia exige
disciplina, e a disciplina é algo que não aceitamos
naturalmente. E porque aprender a Bíblia exige disciplina,
a paciência desempenha um papel muito necessário em
nosso progresso.
Muitas aulas dos meus filhos jamais os levaram a chorar
de frustração. Aulas como trilhas ao ar livre são
divertidas; elas oferecem um conhecimento novo ao
estudante, mas não conseguem expandir seu
entendimento. Chegar ao entendimento é bem mais
difícil do que apenas assimilar novos fatos. Quando lemos
um jornal, não nos sentimos frustrados em nossa
capacidade de entendê-lo. Isso porque o jornal não tem a
intenção de expandir o nosso entendimento — ele é um
sistema de entrega de informação. Aprender a Bíblia é
buscar o conhecimento, mas essa busca é, em última
análise, uma busca por entendimento. Ao contrário de um
jornal, a Bíblia é muito mais do que um sistema de entrega
de informação — ela almeja moldar a forma como
pensamos. Isso significa que devemos esperar ter, com
frequência, experiências de frustração quando sentamos
para lê-la.
Você espera enfrentar frustração quando estuda a
Bíblia? Como você reage quando não consegue entender
uma passagem? Como adultos, nós não temos mais a
obrigação de estudar porque nossos pais ou professores
estão nos cobrando. Se cedermos à impaciência no
processo de aprendizagem, teremos a tendência de reagir
de apenas duas maneiras.
Nós desistiremos. Ao descobrirmos que estudar a Bíblia é
muito confuso, muitas de nós pensamos: “Isso não deve
ser o meu dom”, e seguimos adiante na direção dos
aspectos da nossa fé que surgem com mais naturalidade.
Nós permitimos que os sermões, áudios, livros ou blogs
sejam a nossa única fonte de absorção da Bíblia. Talvez
leiamos a Bíblia de forma devocional, mas assumimos que
simplesmente não estamos conectadas para aprendermos
sobre a Bíblia de nenhuma forma estruturada.
Nós buscaremos um atalho. A fim de acabarmos o mais
rápido possível com a sensação de estarmos perdidas,
corremos para as anotações de nossa Bíblia de estudo
imediatamente após a leitura. Ou mantemos um
comentário à mão, de modo que possamos consultá-lo ao
primeiro sinal de confusão. Se lermos alguma coisa
confusa, não há necessidade de lágrimas de frustração —
podemos simplesmente ler aquilo que as anotações de
nossa Bíblia de estudo dizem ou procurar uma resposta na
internet para a nossa pergunta. Mas ter uma ajuda
prontamente disponível para interpretação é tão útil
quanto parece? Ou acabamos como aquelas crianças da
aula de português do ensino médio que nunca liam um
livro porque a sua resenha ou o filme estavam facilmente
disponíveis? Na verdade, usar um atalho, é, de certa
maneira, ligeiramente melhor do que desistir, porque
desistir não honra o processo de aprendizagem. A pressa
para eliminar o conflito do momento “eu não sei”, na
verdade diminui o êxito do momento “eureca” da
descoberta.

COMO A PACIÊNCIA PROMOVE A APRENDIZAGEM


Nós amamos os “momentos eureca” — aqueles
momentos quando algo que nos confundia de repente faz
sentido. O que, às vezes, ignoramos acerca dos “momentos
eureca” é que eles acontecem depois de um considerável
período nos sentindo perdidas. Será que esses períodos
quando nos sentíamos perdidas na verdade nos
prepararam para compreendermos o que viria no final?
Será que essa sensação de estar perdida não é uma
maneira de Deus nos humilhar quando vamos para sua
Palavra, sabendo que no tempo oportuno ele exaltará o
nosso entendimento?
Contrariamente ao nosso instinto de reação, sentir-se
perdida ou confusa não é uma coisa ruim para uma
estudante. De fato, isso é um sinal de que o nosso
entendimento está sendo desafiado, e que o aprendizado
está para acontecer. Adotar o conflito de se sentir
perdida, em vez de evitá-lo (desistir) ou menosprezá-lo
(procurando um atalho) nos colocará, de fato, na melhor
posição possível para aprender. Precisamos nos dar a
permissão para ficarmos perdidas e paciência para
encontrarmos o nosso caminho para o entendimento.
Há muitos anos atrás, eu me mudei de Houston para
Dallas. Após viver treze anos em Houston, eu conseguia
dirigir em suas ruas com facilidade. Eu não fazia ideia de
como andar em Dallas, então usava um GPS para chegar a
qualquer lugar que eu precisasse ir. Aquele era um
sentimento maravilhoso — sem conhecer quase nada da
cidade, eu podia mapear a rota para o meu destino
instantaneamente. Nunca tive que me sentir perdida ou
perder tempo vagueando em torno de caminhos errados.
Mas, após três anos, eu ainda não conhecia os caminhos
de Dallas sem aquele GPS. Se a bateria acabasse ou se eu
saísse de casa sem ele, estaria em uma grande enrascada.
Depois disso, uma coisa estranha aconteceu: fiz uma
viagem de volta à Houston. Em uma cidade que eu
conhecia bem, descobri que meu GPS nem sempre pegava
a rota que fazia mais sentido. Ele ainda falava com o
mesmo tom de autoridade que usava em Dallas, mas eu
poderia afirmar que ele estava escolhendo um caminho
que não era o mais rápido.
Quando voltei para Dallas, sabia o que tinha que fazer:
tinha que me permitir ficar perdida. Tive que perambular
um pouco, planejar um tempo extra de passeio, perder
algumas saídas e fazer retornos errados, a fim de
aprender, por mim mesma, as rotas que meu GPS tinha
me dado de bandeja. Adivinhe? Aprendi caminhos
melhores.
Essa é a mesma lição que aprendi sobre a ajuda
prontamente disponível dos comentários e Bíblias de
estudo. Se eu não for cuidadosa, eles podem mascarar
minha ignorância das Escrituras e me dar um falso senso
de que conheço os caminhos em torno de suas páginas. Eu
não preciso trabalhar duro para ter entendimento, porque
quando encontrar uma passagem difícil, resolverei
imediatamente o desconforto de me sentir perdida dando
uma olhada nas anotações ou buscando um comentário
para obter uma resposta. E ao dar ouvidos ao seu tom
autoritário, posso me esquecer de quem eles realmente
são: apenas palavras de homem — uma opinião instruída,
proveitosa, mas não infalível.
Em resumo, se eu nunca me permitir ficar perdida,
nunca permitirei que o processo de aprendizagem tome
seu curso apropriado. Se eu nunca lutar para interpretar
por mim mesma, poderei aceitar qualquer interpretação
que me derem. E esse é um caminho perigoso para dirigir.
Minha intenção não é questionar o valor de um
comentário. Um comentário saudável é de valor
inestimável para um estudante da Bíblia. Minha intenção
é questionar o seu lugar no processo de aprendizagem. A
menos que o consultemos depois de tentarmos
compreender e interpretar por nós mesmas, teremos a
tendência de ser totalmente condescendentes com seus
raciocínios. O problema não está nas nossas Bíblias de
estudo ou nos comentários; o problema está na nossa
necessidade de gratificação instantânea e em nossa
aversão a nos sentirmos perdidas. Os comentários
possuem um lugar válido no processo de aprendizagem,
conforme veremos no próximo capítulo. Mas esse lugar
não é no início do processo, quando eles podem diminuir
a nossa sensação de estar perdidas — uma sensação que,
na verdade, é nossa amiga.

O EFEITO CUMULATIVO DO ESTUDO PACIENTE


Estudar com paciência exige de nós uma visão a longo
prazo. Permitir-se ficar perdida em um texto significa que
haverá dias em que o seu tempo de estudo talvez lhe deixe
mais confusa do que você estava ao começar. Para aquelas
que estão acostumadas a ter uma hora diária silenciosa
que as inspire a começar o dia, permitir que a dúvida se
prolongue e as force a um estudo mais profundo será
difícil. Talvez não encontremos uma aplicação pronta ao
final de cada estudo, e poderíamos ser tentadas a pensar
que o nosso tempo não foi proveitoso sem obtermos essa
aplicação. Mas não poderíamos estar mais enganadas.
Durante anos, vi minha interação com a Bíblia como
uma conta negativa: eu tinha uma necessidade, então ia
para a Bíblia extrair uma resposta. Mas fazemos muito
melhor se enxergarmos a nossa interação com a Bíblia
como uma conta-poupança: eu aumento minha
compreensão diariamente, deposito o que conseguir
juntar e pacientemente espero para acumular, sabendo
que um dia eu precisarei recorrer a ela. O estudo bíblico é
um investimento com retorno a longo prazo. Em vez de
ler um texto específico para tentar satisfazer uma
necessidade imediata, se dê a permissão de guardar os
benefícios do seu estudo para um uso futuro. E se uma
passagem que você estiver lutando para entender hoje, de
repente, fizer sentido quando você mais precisar, daqui a
dez anos? Dizem que nós supervalorizamos aquilo que
podemos realizar em um ano e menosprezamos aquilo
que podemos realizar em dez. Você está disposta a investir
dez anos esperando para ter entendimento? Você está
disposta a esperar uma década para a aplicação de um
estudo surgir? Sinta-se encorajada, porque você estará
acumulando um tesouro, mesmo que você não perceba ou
sinta isso a curto prazo.
Isso não significa dizer que não haverá benefícios para o
seu estudo a curto prazo. Haverá. Meu filho não tem que
colar grau em matemática avançada para começar a
desfrutar os benefícios de ter dominado a matemática do
oitavo ano. Mas a matemática do oitavo ano é um
investimento a longo prazo em sua habilidade para
alcançar níveis mais elevados de entendimento. Estudar o
livro de Tiago talvez me mostre imediatamente os
benefícios de estar pronta para ouvir, tardia para falar e
tardia para me irar. Mas os anos seguintes, sem dúvida,
escreverão essas lições de forma cada vez mais profunda
em meu coração.

PACIÊNCIA COM AS CIRCUNSTÂNCIAS


Se eu fosse você, poderia começar a ficar um pouco
irritada comigo agora. Talvez você possa estar pensando:
“Eu adoraria ter paciência com o processo de
aprendizagem, mas se não encontro tempo nem para
começar um processo, como buscarei isso com paciência?”
As mulheres não podem sempre confiar que a vida lhes
dará oportunidades abundantes de estudar a Bíblia. Um
trabalho novo, uma família nova, pais idosos que precisam
de cuidado — uma grande quantidade de circunstâncias
podem nos conduzir a um período no qual o tempo com
nossa Bíblia acontece em momentos roubados, em
intervalos irregulares.
Para mim, esses períodos às vezes duravam anos —
sermões e áudios eram o meu salva-vidas. Participar de
um grupo de estudo me ajudou a me manter em contato
com a Bíblia, mas, em determinados meses, até mesmo
isso era demais para assumir. Em alguns meses, o cuidado
com a minha família parecia ocupar quase todo o tempo
em que eu estava acordada. Não considero que esses
meses tenham sido uma perda de tempo ou um retrocesso
em meu crescimento. Eles foram períodos para exercitar a
paciência, não com uma aprendizagem ativa das
Escrituras, mas esperando no Senhor. Eles aprofundaram
meu desejo de estudar. Alguns dos meus momentos mais
frutíferos de ensinar e escrever livros aconteceram
imediatamente após um período de espera como esses.
Se essa etapa da vida está dificultando que você separe
um tempo regular para o estudo — mesmo com um grupo
ou pelos seus esforços pessoais, por favor, ouça-me: está
tudo bem. Dê ao Senhor aquilo que você pode dar e confie
que ele honrará sua fidelidade nas pequenas coisas.
Confie que o Senhor conhece suas circunstâncias melhor
do que você, e que ele vê o seu desejo de aprender e
crescer. E confie que esses momentos serão utilizados para
o seu amadurecimento — para ensiná-la que é um
privilégio ser capaz de se dedicar ao aprendizado e ao
estudo, e para escrever de forma mais profunda em seu
coração as verdades que você já aprendeu.

PACIÊNCIA E FRUTIFICAÇÃO
A primeira parábola que Jesus contou aos seus
discípulos fala a respeito de paciência e de dar frutos. Se
você tem frequentado a igreja, você provavelmente está
mais familiarizada com isso. Jesus descreve um lavrador
que sai para semear. A semente cai em vários lugares onde
não pode crescer bem, mas, no final, algumas caem em
solo fértil, onde produzem uma colheita miraculosa.
Observe a interpretação que Jesus dá para esse momento
de clímax da parábola: “A [semente] que caiu na boa terra
são os que, tendo ouvido de bom e reto coração, retêm a
palavra; estes frutificam com perseverança” (Lucas 8.15).
Quando meus filhos eram pequenos, eles amavam as
histórias de The Frog and Toad [O Sapo e a Rã], de Arnold
Lobel. Em uma delas, a rã planta sementes para crescer
em um jardim. E porque ela nunca havia feito jardinagem
antes, observa com obsessão suas sementes brotarem
assim que acaba de plantá-las, esperando que um jardim
apareça instantaneamente. Ela toca violino para elas.
Canta para elas. Lê histórias e poemas para elas. Após
cada tentativa de ajudar no processo, ela grita: “Agora,
sementes, comecem a crescer!” No devido tempo, de
acordo com o seu próprio planejamento, elas
simplesmente fazem isso.
Ao contrário da rã no conto de Lobel, o lavrador da
parábola de Jesus não demonstra qualquer ansiedade em
relação às suas sementes. Os filhos de Deus têm corações
com solo fértil. Somos capazes de ouvir e receber a
Palavra, e quando a paciência tiver feito o seu trabalho,
seremos capazes de dar muito fruto. Seja paciente à
medida que você praticar o estudo saudável. Permita que a
semente da Palavra germine e cresça de acordo com o bom
tempo de Deus, confiando que uma colheita miraculosa
será produzida no devido tempo.

10. A League of Their Own, 1992. “There’s no crying in baseball!” [Não há choro no
beisebol!].
6
Estude com Processo

Cuida dos teus negócios lá fora, apronta a lavoura no campo e, depois, edifica a
tua casa.
Pv. 24.27

Temos aprendido a desenvolver o conhecimento bíblico,


estudando com propósito, perspectiva e paciência. Mas como
em qualquer projeto, um bom processo também é
necessário.
O processo que esboçarei aqui é diferente daquele que
você poderia encontrar em um “pacote” normal de estudo.
Muitos estudos pedem para que você leia uma porção das
Escrituras e reflita, depois disso, eles oferecem
pensamentos sobre a interpretação e a aplicação
adequadas. O processo que desejo apresentar pede a você,
estudante, que carregue o fardo não só de ler, mas de se
apropriar do texto, e depois faça uma tentativa de
interpretação e de aplicação por você mesma. Somente
após ter feito isso é que esse processo a direcionará para
olhar as opiniões e formação acadêmica dos outros para
ajudá-la.
Sou uma pessoa, até certo ponto, criativa. Eu preferiria
fazer um esboço à mão em vez de traçar um desenho
metodicamente; gosto de tocar piano de ouvido mais do
que ler música; gosto de costurar sem seguir um molde;
gosto de plantar minhas flores aleatoriamente em vez de
precisamente espaçadas e gosto de cozinhar sem medir
nada. Então, você não ficará surpresa ao ver que os meus
resultados nem sempre dão certo.
Meu marido, Jeff, por outro lado, é um mestre do
processo. Ele vem de uma família de pessoas movidas por
processos, que fazem as coisas da forma certa pela
absoluta satisfação de fazê-las assim. Há uma maneira
certa de fazer qualquer coisa que precise ser feita, a
família Wilkin conhece essa maneira, e eles farão as coisas
exatamente assim, não importa o quão difícil seja ou
quanto tempo leve para fazer. Existe uma maneira
adequada de dobrar as toalhas, de organizar a despensa,
de podar os arbustos, de limpar um pincel. Apelidei
carinhosamente isso de Maneira Wilkin. Eu venho de uma
família inteira de pessoas que dobram as toalhas tortas e
que prefeririam comprar outro pincel a ter que limpar
um; descobrir a maneira Wilkin de fazer as coisas é algo ao
mesmo tempo magnífico e incompreensível.
Vamos apenas dizer que os primeiros anos do meu
casamento me ofereceram uma oportunidade para
aprender e crescer.
Gosto de pensar que Jeff tem crescido em sua
apreciação pelos acasos felizes e talentos inesperados com
os quais tenho contribuído para as refeições, fantasias de
Halloween e para o triunfo ocasional na jardinagem. Eu,
com certeza, cresci em minha apreciação por honrar
processos. Tenho observado que a maneira Wilkin resulta
em móveis lindamente redecorados, cômodos
meticulosamente pintados, deques perfeitamente
trabalhados, gramados impecavelmente bem cuidados e
churrascos que farão você salivar só de prová-los.
O mundo precisa tanto dos construtores que criam ao
acaso quanto daqueles que são movidos por processos.
Ambos contribuem com seus pontos fortes para o corpo
de crentes. Mas a aquisição do conhecimento bíblico se
aproxima mais de um projeto de construção do que de um
projeto de arte. Se você estivesse construindo uma casa,
você contrataria um construtor que observa os processos,
não um que pense que as regras de construção são apenas
“ótimas sugestões”. Você desejaria um construtor que
concordasse com a maneira Wilkin de pensar. E esse é o
tipo de construtora que você e eu devemos nos tornar
para desenvolvermos o conhecimento bíblico. Devemos
ser aquelas que constroem sobre o fundamento da rocha
sólida do processo de empenho mental, em vez de
construirem sobre as areias da subjetividade da pergunta
“O que este versículo significa para mim?”
Como devemos construir o nosso entendimento das
Escrituras? Por meio de qual processo organizado? Uma
boa construtora de conhecimento honra o processo de
aprendizagem, passando por três etapas diferentes do
entendimento: compreensão, interpretação e aplicação. Cada
uma dessas três etapas busca responder uma pergunta
específica a respeito do texto.

1 - A compreensão pergunta: “O que o texto diz?”


2 - A interpretação pergunta: “O que o texto significa? ”
3 - A aplicação pergunta: “Como o texto pode me
transformar?”

Nós, de fato, passamos por essas etapas intuitivamente


em nossa vida cotidiana. Qualquer pessoa que acorda com
um despertador de manhã passa da compreensão para a
interpretação e, depois, para a aplicação:

No sono profundo, nós nos tornamos cientes de um


som. A princípio, o nosso cérebro pode ignorar esse
som ou incorporá-lo a qualquer sonho que estejamos
tendo. À medida que o som se repete, o nosso cérebro
reconhece: “Meu despertador está tocando”.
Compreendemos o som. Não é o detector de fumaça, não
é parte do sonho — é o nosso despertador.
Uma vez que percebemos que estamos ouvindo o
nosso despertador, nosso cérebro interpreta isso como:
“São sete horas”.
Então, nós aplicamos aquilo que o nosso cérebro
sonolento compreendeu e interpretou: “É hora de
levantar e começar o meu dia”.

Nesse simples exemplo do dia a dia, nós passamos da


compreensão para a interpretação e da interpretação para
a aplicação de forma tão rápida que provavelmente nem
nos demos conta de que as duas primeiras etapas
aconteceram. Com o estudo bíblico, cada etapa exige mais
esforço deliberado e consideravelmente mais tempo.
Observe também que cada etapa entrará em ação dentro
da estrutura do propósito, da perspectiva e da paciência
que já definimos.

Precisaremos refletir sobre o propósito de nosso estudo,


permitindo que as três etapas nos ajudem a colocar o
nosso texto dentro da história principal.
Precisaremos empregar a perspectiva de nossas cinco
perguntas arqueológicas para nos ajudar na
compreensão e interpretação.
Precisaremos estimular a paciência sobre a qual
discutimos nos capítulos anteriores, a fim de termos
ajuda para resistir ao estímulo de correr direto para a
aplicação.

Agora, consideremos como cada uma dessas três etapas


funciona dentro do contexto do estudo da Bíblia como um
processo organizado para desenvolver o conhecimento.

ETAPA 1:
COMPREENSÃO – “O QUE O TEXTO DIZ?”
A etapa da compreensão é provavelmente a mais
negligenciada e mal compreendida pelas estudantes da
Bíblia, principalmente porque assumimos que ler um
texto e absorver o sentido de sua mensagem equivale a
compreendê-lo. Por causa dessa concepção errônea,
gastaremos o nosso tempo discutindo o que é
compreensão e como ela é obtida. Se você tiver lido outros
livros acerca do estudo bíblico, talvez você tenha ouvido
que o primeiro passo no processo de aprendizagem é
denominado de “observação”, em vez de “compreensão”.
Eu acredito que compreensão assimila melhor aquilo que
queremos concluir. A observação pode ser subjetiva — ela
pode conotar uma leitura casual, da qual extraio detalhes
ou pensamentos que pareçam importantes para mim à
medida que leio. A compreensão, por outro lado, é mais
objetiva. Ela busca intencionalmente descobrir o que o
autor original pretendia me fazer observar ou perguntar.
Você se lembra da parte de compreensão de texto do
vestibular? Lembra-se daqueles longos textos seguidos de
perguntas para testar o seu conhecimento sobre aquilo
que você havia acabado de ler? O objetivo daquelas
perguntas era forçá-la a ler nas entrelinhas. É exatamente
assim que devemos começar a estudar um texto.
Perguntar a nós mesmas “o que o texto diz?” é um
trabalho difícil e requer que nos alonguemos em nossa
leitura. Uma pessoa que compreende a conta dos seis dias
da criação, em Gênesis 1, pode lhe dizer especificamente o
que aconteceu em cada dia. Esse primeiro passo de
compreender o que o texto diz leva-nos a sermos capazes
de interpretar e aplicar a história da criação em nossas
vidas.
Um bom construtor utiliza boas ferramentas. Quais são
as ferramentas que podemos usar para começarmos a
desenvolver a compreensão de uma passagem? Gostaria
de sugerir seis:

1. UMA CÓPIA IMPRESSA DO TEXTO


Se você olhasse todos os livros das minhas prateleiras,
você não levaria muito tempo para descobrir quais deles
são os mais amados. A lombada desgastada talvez fosse a
sua primeira dica, mas uma folheada nas páginas logo
revelaria meus favoritos: as margens estão cobertas de
anotações à mão, os parágrafos favoritos estão destacados,
as frases bonitas estão sublinhadas, as ideias das quais eu
discordo são marcadas com um enorme ‘x’ e uma
observação minha. Mas se você abrisse a minha Bíblia,
veria as páginas branquinhas — sem qualquer anotação à
mão. Por que eu não faço anotações no livro mais
importante que possuo? Porque não há espaço suficiente
para isso.
Você nunca marcará aquelas páginas de papel bem fino,
com laterais douradas e letras pequenas de sua Bíblia da
maneira que elas merecem ser marcadas. Quando você
começar a estudar um texto, imprima uma cópia com
espaço duplo e fonte tamanho 12. Imprima uma cópia que
lhe dê espaço e liberdade para marcar palavras repetidas,
frases ou ideias, e até para escrever “o que isto
SIGNIFICA?????” com letras vermelhas gigantes na
margem. Imprima uma cópia que lhe permita anotar o
texto como um verdadeiro estudante faria. Vá em frente e
se divirta com um ótimo conjunto de canetas coloridas e
um novo marca-texto quando estiver fazendo isso.
Falaremos mais sobre isso daqui a pouco.
Usar uma cópia impressa do texto para a etapa da
compreensão também irá ajudá-la a resistir ao impulso de
olhar as anotações de sua Bíblia de estudo. Fique à
vontade para imprimir sua cópia com as referências
cruzadas. Nós as usaremos.

2. LEITURA REPETIDA
Agora que você tem uma cópia que pode ser totalmente
marcada, você está pronta para começar a ler o texto
repetidas vezes. A lacuna histórica, cultural e linguística
que existe entre a Bíblia e suas leitoras dos dias de hoje
faz da leitura repetida uma ferramenta crucial em nossas
tentativas de desenvolver a compreensão. Simplificando,
nós provavelmente não entenderemos o que o autor tinha
a intenção de transmitir fazendo uma única leitura. O
primeiro passo na compreensão de um texto é lê-lo várias
vezes do começo ao fim. Não esperaríamos ler uma única
vez uma cena da peça de Shakespeare, O Rei Lear, e chegar
a um entendimento claro sobre o que ela diz. Nem
devemos esperar ser capazes de fazer isso com a Bíblia.
Após termos nos munido com o contexto histórico e
cultural (ao lermos o material introdutório em uma Bíblia
de estudo e respondermos às cinco perguntas
arqueológicas), começamos a leitura, tentando ouvir o
texto com os ouvidos de seus ouvintes originais.
Quantas vezes devemos ler um texto? Tantas quantas
forem necessárias. Para um livro menor da Bíblia, eu peço
às mulheres do meu grupo de estudo para lerem o livro
todo a cada semana antes de começarem a olhar para a
passagem específica da qual estivermos tratando. Isso
significa que elas podem ter lido o livro de Tiago, pelo
menos, onze vezes até o final do estudo. Para livros
maiores, ler o livro todo duas ou três vezes antes de
incorporar as outras ferramentas de compreensão
geralmente é suficiente. Seja sincera sobre o seu próprio
nível de habilidade. Se você for novata na leitura de
compreensão da Bíblia, talvez você precise fazer mais
leituras iniciais do que alguém que já usa essa ferramenta
há mais tempo.
A leitura repetida oferece dois principais benefícios à
estudante: memorização das Escrituras e, além de tudo,
uma familiaridade com o texto. Para aquelas de nós que
não amam memorizar as Escrituras, a leitura repetida é
uma excelente maneira de assimilar as palavras. Eu
denomino isso de “método preguiçoso” de memorização
das Escrituras. Mas é claro, ele não é nem um pouco
preguiçoso — ele é intuitivo. A repetição é exatamente a
primeira estratégia de aprendizagem que empregamos
quando somos crianças; é assim que aprendemos a falar, a
recitar o voto de lealdade à pátria e a citar as séries de
nossos filmes favoritos. A leitura repetida nos ajuda a
memorizar as Escrituras da melhor maneira possível —
dentro de seu contexto original. Talvez não memorizemos
uma passagem inteira, mas os versículos que começarem a
ser fixados em nossa memória serão fixados como parte
da compreensão mais abrangente que teremos do livro.
Sempre que memorizamos um versículo sem saber o que
vem antes ou depois dele, corremos um perigo muito real
de aplicá-lo de forma errada.
Enfim, através da leitura repetida, ganhamos uma
familiaridade geral com o texto. Quanto mais lermos um
livro todo ou um texto extenso, mais ele nos revelará sua
estrutura e temas gerais, capacitando-nos a empregar a
próxima ferramenta de compreensão em nossa caixa de
ferramentas: o esboço. Tenha em mente que lemos
repetidas vezes no início de um estudo para obtermos
uma percepção geral do texto — esse é o ponto de partida
para a compreensão. A leitura repetida não exige que
agonizemos acerca do significado do texto ou busquemos
maneiras de aplicar a verdade. Ela simplesmente serve
como uma introdução, assim como as primeiras três ou
quatro conversas que temos com alguém que conhecemos
há pouco tempo.

3. ANOTAÇÃO
Após sua primeira leitura geral, comece a marcar sua
cópia do texto nas leituras seguintes, para ter uma ideia
melhor do que ele diz.

Existem determinadas palavras, expressões ou ideias


repetidas? Use suas canetas coloridas para marcá-las
de forma distinta em sua cópia impressa. Você pode
desenvolver qualquer sistema de anotação que gostar
— fazer círculos, retângulos, usar diferentes tipos de
sublinhado ou ícones. Apenas seja consistente e faça
aquilo que funcione de modo intuitivo para você.
Existe um atributo específico de Deus sendo ilustrado?
Escreva nas margens.
O texto mostra vários argumentos em série? Enumere
cada argumento conforme ele for introduzido no
texto.
Existem palavras que você não entende? Marque-as
com um ponto de interrogação, para que você possa
procurar uma definição para elas.
Existem palavras-chave de conexão, tais como se/então,
portanto, semelhantemente, mas, porque ou da mesma forma?
Faça uma flecha para ligar uma conclusão ao seu
argumento inicial.
Há alguma ideia confusa? Escreva sua pergunta na
margem para tratar dela mais tarde.

4. UM DICIONÁRIO DE PORTUGUÊS
Use um dicionário de português para procurar palavras
desconhecidas ou mesmo palavras conhecidas que
requeiram uma análise mais detalhada. Sim, isso mesmo
— um simples e velho dicionário de português. Você
conseguiria usar um léxico hebraico-grego? Você pode usá-
lo se souber o que está fazendo. Muitas de nós não sabem,
mas o dicionário de português pode ser de grande ajuda.
Os tradutores da Bíblia escolhem as palavras com enorme
cuidado. A nossa compreensão acerca daquilo que o texto
está dizendo pode ser aumentada simplesmente pelo fato
de buscarmos uma palavra difícil no dicionário. Uma das
formas mais comuns de tentarmos correr com a etapa da
compreensão é supor que entendemos as definições das
palavras que estamos lendo. Poderíamos tirar um tempo
para buscar a palavra propiciação, mas será que devemos
também tirar tempo para buscar palavras mais familiares
como santo, santificar, honrar ou perseverança? Ao nos
alongarmos e considerarmos os significados das palavras-
chave ou das palavras desconhecidas, caminhamos na
direção da compreensão. Busque a palavra em questão e
depois, com base no contexto, apresente uma definição
que melhor se enquadre na forma que ela é usada no
texto. Depois, anote essa definição na margem de sua
cópia impressa.

5. OUTRAS TRADUÇÕES DA BÍBLIA


Ler uma passagem em mais de uma tradução pode
aumentar a compreensão de seu significado. Se você
costuma usar a versão da Bíblia Almeida Revista e
Atualizada, comparar um versículo difícil com outra
tradução tal como a NVI, a NTLH ou a Revista e Corrigida
pode, às vezes, ajudar a esclarecer a confusão. É
importante observar que há uma diferença entre tradução
e paráfrase. As traduções são bem próximas da língua
original. Elas preservam a pergunta “o que o texto diz?” do
hebraico e do grego, à medida que essas línguas são
traduzidas palavra por palavra ou pensamento por
pensamento para o português. As paráfrases, como a Nova
Bíblia Viva ou A Mensagem, tentam pegar a língua original e
perguntar: “O que isto significa”? Elas interpretam. As
paráfrases podem ser úteis, mas devem ser consideradas
como comentários (a interpretação do homem para as
palavras de Deus). É melhor consultar as paráfrases após o
estudo cuidadoso de uma tradução real. Em virtude disso,
nós as guardaremos para o nosso próximo passo do
processo.

6. O ESBOÇO
Uma vez que você tenha lido todo o texto algumas
vezes, feito anotações, buscado definições de palavras e
comparado as traduções, você poderá começar a organizar
aquilo que está lendo em um esboço. Quando tentamos
fazer um esboço, reconhecemos que o autor original
escreveu com um propósito em mente e tentamos
identificar esse propósito.
Você não tem que ser uma estudiosa da Bíblia para
escrever um esboço. Faça o seu melhor e depois compare
as suas conclusões com aquilo que os estudiosos têm a
dizer. Procure os pontos principais e os pontos
secundários que os apoiam. Nem todos os livros da Bíblia
podem ser cuidadosamente esboçados — às vezes, a
cronologia de uma história é confusa ou um autor trata de
um mesmo tópico em mais de uma passagem. O seu
esboço não precisa ser exaustivo. O objetivo dele é ajudá-
la a reconhecer a estrutura geral e o propósito do texto, e
não de assimilar cada uma das ideias. Você também
poderá revisar o seu esboço conforme progredir no
estudo, e sua familiaridade com o texto aumentar. No
final do meu estudo, eu geralmente olho para trás, para o
meu resumo inicial, e vejo melhores maneiras de
organizar o texto.
A leitura repetida, as anotações em uma cópia impressa
do texto, a definição das palavras-chave, a comparação de
traduções e o esboço podem nos ajudar com o primeiro
passo crucial de compreender “o que o texto diz”. O
simples fato de compreender o que o texto diz é um alvo
digno do tempo que você gasta em estudo. A compreensão
adequada é o que possibilita uma interpretação adequada,
levando a uma aplicação.
ETAPA 2:
INTERPRETAÇÃO — “O QUE O TEXTO SIGNIFICA?”
Enquanto a compreensão pergunta: “O que o texto
diz?”, a interpretação pergunta: “O que o texto significa”?
Agora que fizemos o esforço de entender a estrutura, a
linguagem e os detalhes do texto, estamos prontas para
checar o seu significado. Uma pessoa que compreende a
conta dos seis dias da criação, em Gênesis 1, pode lhe
dizer especificamente o que aconteceu em cada dia. Uma
pessoa que interpreta a história da criação pode lhe dizer
por que Deus criou as coisas em uma determinada ordem
ou de certa maneira. Ela está apta a deduzir coisas além
do que o texto diz.
A maioria de nós confiamos nos sermões, nas anotações
da Bíblia de estudo e nos comentários para nos ajudar
com a interpretação. Isso é apropriado. Já discutimos a
necessidade dessas coisas para nos ajudarem a responder
às cinco perguntas arqueológicas. Deus dotou alguns de
nós com conhecimento e discernimento únicos, e seríamos
tolas se ignorássemos suas contribuições para o nosso
estudo. Eles oferecem um serviço indispensável ao corpo
de crentes. Mas devemos sempre lembrar que cada uma
de nós, individualmente, é chamada para amar a Deus
com a sua mente. Isso significa que é bom tentarmos
arduamente fazer a interpretação por nós mesmas antes
de lermos as interpretações de outros. E isso significa que
devemos esperar para consultarmos comentários, Bíblias
de estudo, áudios, blogs e paráfrases até que tenhamos
nos esforçado ao máximo no trabalho de interpretação.
Portanto, antes de sermos ajudadas por esses suportes
de estudo, duas ferramentas em particular nos ajudarão a
formular a nossa própria interpretação.

1. REFERÊNCIAS CRUZADAS
As referências cruzadas são os versículos que aparecem
em uma lista nas margens ou na parte inferior da página
de sua Bíblia. Elas identificam ideias em comum entre as
diferentes partes da Bíblia — temas semelhantes,
palavras, acontecimentos ou pessoas. Talvez você já tenha
ouvido a expressão: “Deixe que as Escrituras interpretem
as Escrituras”. Esse é o princípio mais básico de
interpretação; a ideia de que a melhor forma de entender
o que o texto bíblico está dizendo é olhar outras passagens
da Bíblia que dizem as mesmas coisas ou coisas
semelhantes. As referências cruzadas nos ajudam a
honrar esse princípio básico e devem servir como ponto
de partida para respondermos: “O que o texto significa?”.
Quando você encontrar uma passagem difícil de entender,
busque primeiro as referências cruzadas para ver o que
elas podem acrescentar à sua compreensão.

2. PARAFRASEAR
Parafrasear é a habilidade de escrever os pensamentos
de outra pessoa com suas próprias palavras. De todas as
ferramentas mencionadas até aqui, creio que parafrasear
seja a mais difícil. Ela exige que andemos mais devagar e
que usemos a paciência. Se acharmos que é fácil
parafrasear, é porque provavelmente não estamos dando
a essa habilidade a concentração que ela merece. Se
investirmos nisso, cresceremos em nossa maturidade
como estudantes.
Quando você se deparar com um versículo ou passagem
difícil de entender, verifique o contexto, cheque quaisquer
palavras complicadas no dicionário, veja as referências
cruzadas e depois escreva a passagem com suas próprias
palavras. Parafrasear o texto irá ajudá-la a se concentrar
naquilo que está sendo dito. Mesmo que sua paráfrase
não seja ótima, ela irá forçá-la a ler em busca de detalhes e
sentido. Você não tem que compartilhar isso com
ninguém — essa é uma ferramenta para o seu próprio
uso. Uma vez que você consultar um comentário, poderá
avaliar se sua paráfrase é terrível. Mas tudo bem. Ao
forçá-la a lutar ao longo do texto, o exercício terá
cumprido a sua função.
Após termos sinceramente tentado compreender e
interpretar o texto por nós mesmas, estaremos
preparadas para considerarmos as interpretações dos
outros. Tentar interpretar o texto antes de consultar um
comentário é vital, porque nem sempre dois comentários
dizem a mesma coisa. Fazer o trabalho pessoal de
compreender e interpretar nos ajuda a discernir quais
comentários são confiáveis e qual interpretação se encaixa
melhor no que o texto diz. Levará tempo para você ser
capaz de reconhecer em quais autores e teólogos você
pode confiar para ter uma interpretação atenta e
confiável. Peça recomendações a um professor experiente
ou ao seu pastor para começar a desenvolver uma
biblioteca pessoal de comentários confiáveis. Quando você
encontrar um comentário que você ama, pesquise as notas
de rodapé dele para obter mais recursos que podem ser
bons.

ETAPA 3:
APLICAÇÃO — “COMO O TEXTO DEVE ME
TRANSFORMAR?”
Finalmente, chegamos à etapa do processo de
aprendizagem no qual o nosso trabalho duro se traduz em
ação. Depois de estabelecer o que o texto diz e o que ele
significa, finalmente estamos na posição de perguntar
como ele deve nos impactar. A aplicação pergunta: “Como
esse texto deve me transformar?”
No capítulo 1, reconhecemos que a Bíblia é um livro a
respeito de Deus. Quando aplicamos um texto, devemos
nos lembrar, mais uma vez, que o conhecimento de Deus e
o conhecimento do eu sempre andam de mãos dadas, que
não há qualquer conhecimento verdadeiro do eu à parte
do conhecimento de Deus. Compreendida a partir de uma
perspectiva centrada em Deus, a pergunta “como esse
texto deve me transformar?” é respondida por três
subperguntas:

O que essa passagem me ensina sobre Deus?


Como esse aspecto do caráter de Deus transforma
minha visão do eu?
Como eu devo responder a isso?

Uma pessoa que compreende a conta dos seis dias da


criação, em Gênesis 1, pode lhe dizer especificamente o
que aconteceu em cada dia. Uma pessoa que interpreta a
história da criação pode lhe dizer por que Deus criou as
coisas em uma determinada ordem ou de certa maneira.
Uma pessoa que aplica a história da criação pode lhe dizer
que, porque Deus cria de maneira organizada, nós
também devemos viver vidas bem organizadas (falaremos
sobre isso mais tarde). O conhecimento de Deus, deduzido
da compreensão do texto e da interpretação do seu
significado, pode ser agora aplicado à vida de uma forma
que desafie a estudante a ser diferente.

POR QUE O ESFORÇO DE ESTUDAR COM PROCESSO VALE A


PENA?
Estudar com processo nos permite descobrir o caráter
de Deus nas Escrituras, por meio de uma compreensão e
interpretação cuidadosas. Isso, então, nos permite aplicar
adequadamente as Escrituras à luz de quem Deus tem se
revelado ser. O processo de compreensão, interpretação e
aplicação parece difícil? No início pode ser, mas quanto
mais você utilizá-lo, mais ele se tornará intuitivo. Esse é o
processo para um projeto de construção organizado e de
longo prazo, com benefícios cumulativos. Mesmo que você
esteja passando por uma fase da vida que não lhe
permitirá utilizar todas as ferramentas do processo de
forma exaustiva, você poderá utilizá-las conforme o seu
tempo permitir. Desenvolva-o devagar se precisar, mas
desenvolva-o! Ao buscar um processo organizado, você
estará seguindo um padrão estabelecido pelo próprio
Deus.
O Deus da Bíblia é um Deus de ordem. Na verdade, as
primeiras e as últimas cenas registradas nas Escrituras nos
mostram Deus organizando o cosmos. Gênesis, capítulos 1
a 3, nos mostra Deus organizando um jardim, pegando
aquilo que era sem forma e vazio e dando-lhe forma e
função em passos organizados, tornando-o uma habitação
perfeitamente organizada para a sua presença. Apocalipse
21 mostra Deus reorganizando a desordem de um mundo
caído, na forma de novos céus e nova terra, culminando
na inauguração da Nova Jerusalém, uma morada
perfeitamente organizada para a sua presença.
Se você estiver familiarizada com o livro de Êxodo, você
saberá que ele também contém uma história de criação
organizada. Deus ordena que Israel crie um tabernáculo
perfeitamente organizado, por meio de um processo
ordenado, para que ele pudesse fixar residência dentro de
suas paredes de cortinas. Página após página é dedicada a
detalhar o processo de desenvolvimento dessa estrutura,
e o resultado final é um lindo lugar no qual Deus e o
homem podem ter comunhão. Ao contrário das histórias
da criação e da Nova Jerusalém, nas quais Deus cria
sozinho, Deus envolve os seres humanos na obra
organizada de criar o tabernáculo. Ele os convida para
entrar no processo. As histórias da construção do templo
de Salomão, em 1 Reis, e da reconstrução de Jerusalém,
com Esdras e Neemias, falam de outros momentos em que
os humanos se tornam participantes no processo
organizado e criativo de estabelecer ou restabelecer um
lugar de comunhão com Deus. E sendo templos do
Espírito Santo (1 Co 6.19–20), você e eu somos chamadas para
nos tornarmos participantes do processo de criação e
manutenção de um lugar lindo e organizado, dentro do
nosso coração, onde o Senhor possa habitar. Uma das
formas mais importantes de fazer isso é por meio do
estudo bíblico.
O soberano Deus do universo, um dia, habitou conosco
em um jardim perfeitamente organizado de sua própria
criação. E um dia ele habitará conosco de novo em uma
cidade perfeitamente organizada de sua criação. Mas
nesse meio tempo, Deus nos concede oportunidades
únicas de estarmos envolvidas em uma obra organizada
de criar espaços onde o divino e o humano possam viver
em comunhão. Estudar a Bíblia com um processo é um
meio de fazer exatamente isso.
Podemos começar o trabalho de construção como
construtoras bem desajeitadas, mas temos um Deus fiel,
que é paciente com os seus trabalhadores e os equipa com
tudo o que precisam para fazerem o trabalho que está à
mão. Nós apenas temos que pedir por aquilo que
precisamos. Com isso em mente, estamos prontas para
considerar o último P do estudo bíblico saudável: estude
com preces.
7
Estude com Preces

Se, porém, algum de vós necessita de sabedoria, peça-a a Deus, que a todos dá
liberalmente e nada lhes impropera; e ser-lhe-á concedida.
Tg. 1.5

Frequentemente ouvimos que os melhores perfumes


vêm nos menores frascos. Oro para que isso seja verdade
em relação a este pequeno capítulo que você está para ler.
Não deixe que a contagem das palavras a engane: embora
mais espaço tenha sido dedicado aos quatro P´s que
vieram antes, este quinto e último P do estudo saudável
não é menos importante. Na verdade, poderíamos
argumentar que as preces são mais importantes que todos
os outros. As preces são o meio pelo qual imploramos ao
Espírito Santo para nos iluminar durante o nosso tempo
de estudo. Sem orações, o nosso estudo não será nada
além de uma atividade intelectual. Orar é um meio de
termos comunhão com o Senhor. A oração é o que
transforma o nosso estudo de uma busca por
conhecimento para uma busca pelo próprio Deus.
Talvez você se familiarize com o acróstico CAPA como
um lembrete dos elementos-chave da oração.

Confessar: confesse a Deus as suas falhas.


Adorar: glorifique a Deus por quem ele é e pelo o que
ele tem feito.
Pedir: peça a Deus para perdoar os seus pecados e
suprir as suas necessidades.
Agradecer: dê graças a Deus por quem ele é e pelo o que
ele tem feito.

Consideremos como incorporar as preces em nossos


esforços de estudo — antes, durante e depois de
estudarmos — usando a palavra CAPA como nosso guia. É
provável que você já tenha praticado uma oração cotidiana
que envolva os elementos de CAPA. Seu tempo de estudo
oferece uma oportunidade extra e única de adaptar suas
orações especificamente ao ministério da Palavra.
Seu tempo de oração pode ser longo ou curto. Ele pode
acontecer de forma alternada enquanto você estuda.
Reconheça os benefícios de orar em todas as etapas do seu
estudo, mas permita-se incorporar-lhe as preces com o
tempo. Ore com um desejo sincero, não pelo sentimento
de obrigação de “fazer as coisas da maneira certa”. Se você
não tem o desejo de orar, confesse isso ao Senhor e peça-
lhe que aumente esse desejo em você à medida que
estudar.

ORE ANTES DE ESTUDAR


Confessar: Reconheça as suas próprias inseguranças e
fraquezas enquanto você estuda e exponha-as diante do
Senhor. Confesse que você não consegue fazer isso e que
isso parece muito difícil. Confesse qualquer pecado que
possa impedir seu estudo (Orgulho? Impaciência?
Distração?). Confesse sua falta de vontade de estudar.
Adorar: Comece adorando a Deus por nos dar a revelação
de sua vontade e de seu caráter em sua Palavra. Se você
estiver no meio da leitura de um livro, adore-o pelos
atributos específicos que o seu estudo já lhe revelou. Se
estiver no começo, adore-o por ser misericordioso e
gracioso ao lhe garantir esse presente que é a Bíblia.
Pedir: Peça ao Senhor ouvidos para ouvir e olhos para ver
à medida que você estudar. Peça-lhe que a ajude a guardar
das distrações o tempo que você separou; peça-lhe que
limpe sua mente de outras preocupações. Peça a Deus que
lhe revele o caráter dele e o seu pecado. Peça-lhe que faça
com que sua Palavra seja viva em você, a fim de que o
conheça melhor e veja a sua própria necessidade de Deus
mais claramente.
Agradecer: Agradeça por ele ter se revelado na Bíblia e
por ter lhe dado a capacidade de conhecê-lo. Agradeça-lhe
o tempo que você tem para estudar. Agradeça-lhe por
Jesus Cristo.

ORE DURANTE O SEU ESTUDO


Confessar: Confesse quando você ficar frustrada com seu
estudo. Confesse se o achar chato. Diga-lhe o que você
preferiria estar fazendo ou o que considera mais
importante. Confesse se ficar irritada com aquilo que a
passagem estiver pedindo de você ou lhe revelando.
Adorar: Ao longo do estudo, adore a Deus quando você
fizer alguma associação sobre o caráter dele que você não
havia entendido antes. Adore-o quando você observar que
está começando a fazer as perguntas certas acerca do
texto, por você mesma. Louve-o quando você perceber que
está apreciando o seu estudo, sabendo que ele é a origem
dessa alegria.
Pedir: Quando você se deparar com uma passagem
difícil, peça ao Senhor que lhe conceda entendimento. Se
sua mente estiver vagueando, peça ajuda para se manter
concentrada. Se você ficar frustrada, peça-lhe que a
ensine a ter paciência e humildade. Se você estiver com
pressa, peça-lhe que a ajude a ir devagar. Se estiver
cercada de interrupções, peça-lhe para lhe conceder algum
período tranquilo ou para ajudá-la a entender que é hora
de parar por aquele dia.
Agradecer: Agradeça ao Senhor quando ele trouxer à sua
mente outras passagens das Escrituras que confirmem ou
reforcem aquilo que você estiver aprendendo em seu
estudo. Agradeça quando você receber uma correção do
texto ou quando receber um exemplo para seguir.
Agradeça pelos momentos em que o evangelho se revelar
a você por meio do seu estudo.

ORE DEPOIS DO SEU ESTUDO


Confessar: Confesse qualquer pecado pessoal que tiver
sido trazido à luz durante o seu tempo de estudo.
Confesse sua tentação para aplicar a passagem ao pecado
de outra pessoa em vez aplicá-lo ao seu. Confesse se você
se permitiu ficar distraída enquanto estudava. Seu tempo
de estudo aumentou sua percepção de que lhe falta
entendimento? Você se apressou para terminar? Confesse
isso também.
Adorar: Medite no aspecto do caráter de Deus que seu
estudo estiver lhe revelando. A passagem mostrou que
Deus é misericordioso? Paciente? Generoso? Irado?
Santo? Adore a Deus por esse aspecto de quem ele é. Se
for apropriado, recite em voz alta a passagem das
Escrituras que exalta esse aspecto do caráter de Deus.
Pedir: Peça ao Senhor para ajudá-la a aplicar aquilo que
você aprendeu. O fato de aprender que Deus é gracioso
revelou sua própria falta de graça em relação a alguém?
Peça ao Senhor para ajudá-la a viver aquilo que você
aprendeu. Peça-lhe para trazer à sua mente aquilo que
você estudou ao longo do dia e da semana. Se o seu tempo
de estudo parece infrutífero, peça-lhe para ajudá-la a
confiar que existe um fruto que você ainda não consegue
ver. Peça-lhe para lhe dar o desejo de perseverar no
processo de aprendizagem.
Agradecer: Agradeça ao Senhor por aquilo que ele está
lhe ensinando. Agradeça-lhe pelo dom pessoal da
percepção e pelos homens e mulheres que escreveram os
comentários que você usa. Agradeça especificamente por
uma verdade que ele lhe mostrou durante o seu estudo.

ISSO PARECE MUITA ORAÇÃO?


As sugestões de oração que lhe dei são exatamente isto:
sugestões. Elas não representam nenhuma fórmula
mágica, nem são uma lista completa, nem devem
acontecer em um tempo específico. Meu alvo é desafiá-la a
permanecer em espírito de oração do começo ao fim do
seu estudo. Aprender a Bíblia não é algo que acontece
como resultado do esforço humano somente. Assim como
todos os outros aspectos da nossa santificação, isso é
resultado da obra do Espírito Santo em nossos esforços e
através deles.
A quantidade de tempo que você gasta e a profundidade
que alcança na oração dependerão, em certa medida, do
seu planejamento. Certamente haverá dias em que você
sussurrará: “Ajude-me Senhor!”, e seguirá em frente. Mas
também haverá dias em que você provará plenamente dos
resultados da oração ao longo do seu estudo. O Espírito
Santo tem sua maneira de falar por meio das Escrituras,
quer peçamos para ele fazer isso ou não. Quão melhor
será se o convidarmos? Se o recebermos? Se celebrarmos a
sua presença em nosso estudo diário? Se a Palavra de
Deus é verdadeiramente viva e ativa, ela o é por causa das
ministrações do Espírito Santo, por meio da obra
consumada de Cristo, através do decreto amoroso do Pai.
As preces suplicam a comunhão da trindade em seu
tempo de estudo, uma comunhão doce e necessária para
qualquer estudante da Palavra.
E ao contrário do tamanho deste capítulo, isso não é
pouca coisa.
8
Juntando Tudo

De todo o coração te busquei; não me deixes fugir aos teus mandamentos.


Guardo no coração as tuas palavras, para não pecar contra ti.
Sl. 119.10-11

Então, eis o que você tem: Cinco P´s do estudo saudável,


cinco ferramentas para ajudá-la a desenvolver o
conhecimento bíblico e, por meio delas, crescer em seu
amor pelo Deus que a Bíblia proclama. Eis uma breve
revisão de cada P que resume aquilo que temos aprendido.

Compreenda onde o seu texto se encaixa na


Estude com Propósito história principal da criação, queda, redenção e
consumação.
Compreenda a “arqueologia” do seu texto (seu
Estude com Perspectiva
contexto histórico e cultural).
Decida não se apressar; estabeleça uma
Estude com Paciência expectativa realista para o seu ritmo de estudo,
concentrando-se na questão a longo prazo.
Comece a ler metodicamente para fazer a
Estude com Processo
compreensão, a interpretação e a aplicação.
Estude com Preces Peça ao Pai para ajudá-la antes, durante e depois
do seu tempo de estudo.

Agora que temos todo o método de estudo em vista,


veremos através de um exemplo como você pode de fato
utilizá-lo. Conforme mencionei quando os apresentei, a
relação entre os cinco P´s não é estritamente linear. Eles
não são uma lista a ser verificada, mas um conjunto de
práticas que se inter-relacionam e se sobrepõem. Nenhum
exemplo sozinho apreenderá exatamente como o seu
estudo pode progredir, mas este capítulo deve fazê-la
começar na direção certa. Para efeito de nosso exemplo,
assumiremos que a paciência e as preces serão necessárias ao
longo de todo o nosso estudo. Concentraremos a nossa
atenção em como estudar com propósito, perspectiva e
processo usando o livro de Tiago.
Você observará, à medida que prosseguir neste exemplo,
que cada passo não será dividido em tempos pré-
determinados. Se você está acostumada com um guia de
estudo ou um professor dividindo o processo de estudo
em porções diárias ou semanais por você, poderá levar
algum tempo para se acostumar com o fato de não ter
uma estrutura como essa. Isso lhe dará liberdade para
trabalhar em seu próprio ritmo. Você poderá avançar mais
ou menos, conforme o seu tempo permitir. Você poderá
levar três dias ou três semanas para ler o texto todo várias
vezes, dependendo de quanto tempo tiver. Mais
importante do que cumprir uma quantidade estabelecida
de estudo é fazer um progresso constante na direção
certa, usando uma abordagem que desenvolva o
conhecimento.
Com isso em mente, passemos para como o seu estudo
poderá progredir se você decidir aprender o livro de Tiago
de acordo com o nosso método de estudo. Antes de
começar, junte os seguintes itens:

Uma cópia impressa do texto com espaço duplo e


margens largas. Incluindo as nota de rodapé e as
referências cruzadas.
Uma caneta e um marca-texto.
Um conjunto de canetas ou lápis coloridos para
anotação.
Um diário ou um fichário para manter todas as suas
anotações em um mesmo lugar.

PASSO 1:
COMECE COM PROPÓSITO
Comece seu estudo considerando onde o livro de Tiago
se encaixa na história principal da Bíblia. Que papel ele
desempenha em contar a história da criação, queda,
redenção e consumação? Como ele aponta para o reino e
governo de Deus? A menos que você esteja estudando
Gênesis ou Apocalipse, a princípio pode ser difícil saber
exatamente onde o livro que você escolheu se encaixa na
história principal. Mas tudo bem. Adquira uma ideia geral
ao começar (consulte o material introdutório de sua Bíblia
de estudo ou um comentário) e comprometa-se a manter
essa pergunta em mente enquanto você continua o seu
estudo.
Conforme você gastar tempo no texto, suas
contribuições específicas para a história principal
começarão a surgir com mais clareza. Ao final do estudo,
você deverá ser capaz de destacar os temas da
metanarrativa conforme eles aparecerem no texto. Tendo
em vista o fato de o livro de Tiago ser um livro de
sabedoria (como descobriremos abaixo), ele claramente
lida com o tema da redenção, principalmente a
santificação progressiva, embora outros elementos da
metanarrativa também estejam presentes.
PASSO 2:
GANHE PERSPECTIVA SOBRE O LIVRO QUE VOCÊ ESTIVER
ESTUDANDO
Usando uma Bíblia de estudo, um comentário ou ambos,
responda às perguntas arqueológicas relativas ao livro de
Tiago. Gaste tempo com isso para que quando começar a
ler, você seja capaz de ouvir como a carta teria sido ouvida
por seu público original. Em seu diário, escreva cada uma
das perguntas arqueológicas e anote uma resposta curta
para cada uma. Você poderá usar suas respostas como um
ponto de referência quando estiver no passo 3. Suas
respostas para as perguntas arqueológicas do livro de
Tiago poderiam ser mais ou menos assim:
Tiago, o irmão de Jesus.
Elevado a uma posição de proeminência na igreja
de Jerusalém (Atos 15).
1. Quem escreveu este Conhecido como “Tiago, o justo”; conhecido pela
texto? quantidade de tempo que gastava em oração.
Morto em 62 DC — martirizado. Atirado do
muro do templo, apedrejado e espancado até a
morte.
Por volta de 49 DC, tornando-se o escrito mais
2. Quando ele foi escrito?
antigo do Novo Testamento.
Para os judeus cristãos que enfrentavam
3. Para quem ele foi perseguição nos primórdios da igreja, por
escrito? alguém familiarizado com os escritos e
representações do Antigo Testamento.
Foi escrito como os Livros de Sabedoria do A.T.
— Provérbios, Jó, Cantares de Salomão.
4. Em qual estilo ele foi Muitas exortações — 54 apelos diretos para a
escrito? obediência.
Seu tom é de autoridade, ordenando respeito.

Para mostrar como viver uma vida de piedade


5. Por que ele foi escrito? prática no cotidiano. Responde à pergunta: “O
que é a fé genuína?”

Se você não estiver familiarizado com o gênero Livros


de Sabedoria, você poderá fazer alguma leitura adicional
para descobrir mais sobre isso. Se algum aspecto do
cenário histórico lhe interessar, você poderá explorá-lo um
pouco mais também. Quanto mais tempo você gastar
“entrando na pele” dos ouvintes originais, mais facilidade
você terá na compreensão, interpretação e aplicação do
texto.

PASSO 3:
COMECE O PROCESSO DE COMPREENSÃO, INTERPRETAÇÃO
E APLICAÇÃO

COMPREENSÃO: O QUE O TEXTO DIZ?


Usando sua cópia do texto com espaço duplo, leia Tiago
do início ao fim, prestando atenção às notas de rodapé e
fazendo anotações nas margens, resumindo as ideias
principais. Lembre-se de manter em mente os ouvintes
originais de Tiago enquanto você as resume. Quais os
principais pensamentos que eles teriam da carta, com
base no fato de estarem sendo perseguidos por sua fé?
Leia toda a carta mais algumas vezes, anotando as
palavras, expressões ou ideias repetidas, conforme elas
surgirem em sua compreensão. Leia a carta em outras
duas traduções como parte de sua leitura repetida. À
medida que você ficar mais familiarizada com o que o
texto diz, comece a transferir suas afirmações resumidas
para o seu diário, a fim de formar um esboço da carta. O
esboço geral do livro de Tiago pode ficar mais ou menos
assim:
Saudações (1.1).
Provações e tentações (1.2–18).
É bom para a nossa fé ser testada (1.2–12).
Não somos tentados por Deus, mas pelos nossos desejos
(1.13–18).
Não apenas ouça a Palavra, pratique o que você ouve
(1.19–27).
Não manifeste favoritismos (2.1–13).
A verdadeira fé sempre resulta em obras (2.14–26).
Vigie suas palavras (3.1–12).
Dois tipos de sabedoria (3.13–18).
Não ceda ao mundanismo (capítulo 4).
Não seja briguento (4.1–3).
Não tenha amizade com o mundo (4.4).
Não seja orgulhoso (4.5–10).
Não julguem uns aos outros (4.11–12).
Não se vanglorie (4.13–17).
Advertência contra a riqueza injusta (5.1–6).
Exortações finais (5.7–20).
Seja paciente no sofrimento (5.7–11).
Diga exatamente aquilo que quer dizer (5.12).
Ore com fé (5.13–18).
Restaure aqueles que se desviam da verdade (5.19–20).

Não fique angustiada ao fazer o esboço. Você sempre


poderá voltar atrás e revisá-lo conforme seu estudo
progredir. Uma vez que você tenha uma percepção daquilo
que Tiago está dizendo de forma geral, comece a olhar
para o que ele está dizendo de forma específica. Comece
trabalhando ao longo das partes lógicas da carta, pedaço
por pedaço.
Seu esboço identificou Tiago 1.1–18 como tendo as
primeiras duas partes lógicas do livro: a saudação e a
discussão sobre as provações e tentações. Olhe para essa
parte do texto e marque os seguintes itens:

O texto contém palavras, frases ou ideias repetidas?


Ele menciona atributos de Deus (coisas que sejam
verdade a respeito dele)?
O texto faz vários argumentos em série? Enumere
cada argumento conforme ele for introduzido no
texto.
Você se deparou com palavras que não compreende?
Marque-as com um ponto de interrogação. Procure-as
no dicionário e escreva uma definição ou um sinônimo
para elas em sua cópia.
A passagem inclui palavras-chave de transição, tais
como se/então, portanto, semelhantemente, mas, porque ou
da mesma forma? Faça uma flecha para ligar uma
conclusão ao seu argumento inicial.
Há alguma ideia confusa? Escreva sua pergunta na
margem para tratar dela mais tarde.

Tenha em mente que as anotações de cada estudante


parecerão diferentes, eis como sua cópia de Tiago 1.1–18
poderia ficar após você tê-la marcado:
INTERPRETAÇÃO: O QUE O TEXTO SIGNIFICA?
Agora que você já leu o texto atentamente para obter
compreensão, utilize as referências cruzadas, parafraseie e
use comentários (nessa ordem) para ajudá-la a chegar a
uma interpretação.

REFERÊNCIAS CRUZADAS
Procure as referências cruzadas listadas em sua Bíblia
de cada versículo da parte que você estiver estudando
(elas estão localizadas nas margens ou na parte inferior
da página de sua Bíblia). Depois, observe como a
referência cruzada dessa passagem enriquece sua
compreensão acerca do texto que você está estudando. Por
exemplo, algumas das referências cruzadas citadas para
Tiago 1.2-3 na Bíblia Almeida Revista e Atualizada são
Mateus 5.12 e 1 Pedro 1.6. Verifique cada referência
cruzada e leia os versículos que as cercam, assim você
poderá inseri-las em seu contexto. Observe quem está
falando e para quem está se falando. Nesse caso,
precisamos ler Mateus 5.11–12 (Jesus, o irmão de Tiago,
dirigindo-se aos discípulos) e 1 Pedro 1.6–7 (Pedro se
dirigindo aos crentes perseguidos) para entendermos
plenamente a ligação de cada referência cruzada.

Tiago 1.2–3: Meus irmãos, tende por motivo de toda alegria o


passardes por várias provações, sabendo que a provação da vossa fé,
uma vez confirmada, produz perseverança.

Mateus 5.11–12: Bem-aventurados sois quando, por minha causa, vos


injuriarem, e vos perseguirem, e, mentindo, disserem todo mal contra
vós. Regozijai-vos e exultai, porque é grande o vosso galardão nos céus;
pois assim perseguiram aos profetas que viveram antes de vós.
1 Pedro 1.6–7: Nisso exultais, embora, no presente, por breve tempo,
se necessário, sejais contristados por várias provações, para que, uma
vez confirmado o valor da vossa fé, muito mais preciosa do que o ouro
perecível, mesmo apurado por fogo, redunde em louvor, glória e honra
na revelação de Jesus Cristo.

Observe como as palavras de Jesus e de Pedro


aumentam o nosso entendimento em relação às palavras
de Tiago. As provações são, em última análise, uma
bênção: elas nos concedem uma recompensa celestial, são
relativamente breves, provam que a nossa fé é genuína e
trazem glórias a Deus.

PARAFRASEAR
Lembre-se que parafrasear é apenas escrever um
versículo ou uma passagem com as nossas próprias
palavras para nos ajudar a raciocinar, a fim de
entendermos o seu sentido. Parafrasear é útil
principalmente quando um versículo parece obscuro ou
confuso.
A exortação de Tiago em 1.2–3 “tende por motivo de
toda alegria”, à primeira vista, parece estar nos dizendo
que as provações devem ser uma fonte de alegria para nós
enquanto perseveramos nelas. Será que Tiago está
dizendo àqueles que enfrentam uma dura perseguição que
eles devem sorrir e se emocionar com isso? Quando
consultamos outras traduções, descobrimos que a NVI diz:
“Considerem motivo de grande alegria” e a Revista e
Atualizada diz: “Tende por motivo de toda alegria”. Um
dicionário de sinônimos nos ajudará ainda mais,
mostrando que considerar e ter por podem ser sinônimos de
julgar e contar como. As nossas referências cruzadas falam
da ideia de perseguição como algo que resulta em uma
recompensa futura. Combinando esses pontos de
referência, você poderia parafrasear Tiago 1.2–3 assim:
Meus irmãos, quando vocês forem perseguidos, considerem isso
como uma fonte de futura alegria, sabendo que quando sua fé é
testada, vocês crescem em sua capacidade de perseverar.

Sua paráfrase está precisa? Você saberá isso melhor


quando começar a ler um comentário para ver se os
estudiosos chegaram a uma conclusão parecida com a sua.
De qualquer forma, você fez a sua parte, tentando
interpretar por si mesma. Se você descobrir que sua
paráfrase não está precisa, apenas volte atrás e anote
“melhorar na compreensão” em seu diário ou em sua cópia
do texto, como um pensamento a ser desenvolvido.
CONSULTANDO UM COMENTÁRIO
Tendo investido esforços para compreender por si
mesma o que o texto diz e o que ele significa, agora você
está pronta para considerar o que os outros têm a dizer.
Você poderia achar útil passar do geral para o específico
com os comentários. Comece com as anotações de sua
Bíblia de estudo, depois leia comentários ou ensinos mais
profundos para refinar o seu pensamento. Lembre-se de
usar comentários de fontes confiáveis. Procure por
concordâncias e discordâncias entre os comentários.
Quando eles discordarem entre si, pergunte-se qual
interpretação se enquadra melhor com aquilo que você
mesma deduziu dos seus esforços de estudo.

APLICAÇÃO: “COMO ESTE TEXTO DEVE ME


TRANSFORMAR”?
Uma vez que você tenha feito o trabalho da
compreensão e da interpretação, você estará pronta para
considerar como aplicar aquilo que você tem aprendido.
Relembre que a pergunta: “Como este texto deve me
transformar?” é respondida por três subperguntas:

O que esta passagem me ensina sobre Deus?


Como este aspecto do caráter de Deus transforma
minha visão do eu?
O que devo fazer em resposta a isso?

Voltando atrás em suas anotações de Tiago 1.1–18,


agora você está pronta para tomar aquilo que você
observou a respeito do caráter de Deus e extrair uma
aplicação. O nosso exemplo mostra diversas verdades
acerca de Deus que foram anotadas na margem. Transfira
essas anotações para o seu diário, escrevendo para cada
uma das anotações, uma visão correspondente do eu e
uma reação.

1. Visão de Deus: Deus (Jesus) tem autoridade (1.1).


Visão do Eu: eu não tenho autoridade sobre a minha vida
ou circunstâncias.
Reação: Como posso me submeter melhor a Jesus como
Senhor? Em que área da minha vida estou tentando ter o
controle?
2. Visão de Deus: Deus tem sabedoria.
Ele a dá generosamente quando pedimos (1.5).
Visão do Eu: eu tenho falta de sabedoria. Eu ajo com base
em minha própria sabedoria, em vez de pedir uma
sabedoria piedosa a ele.
Reação: Em que áreas da minha vida eu mais preciso da
sabedoria piedosa neste momento? Eu tenho pedido por
isso?

Nós podemos e devemos extrair outros pontos de


aplicação do texto, mas devemos nos lembrar de que as
perguntas centradas em Deus devem sempre ser o nosso
ponto de partida. Elas nunca devem ser uma consideração
posterior. Os exemplos de outros pontos de aplicação que
podem surgir de sua consideração inicial acerca do caráter
de Deus em Tiago 1.1–18 incluem:

Tiago, que chamava Jesus de “irmão” durante sua vida,


inicia sua carta chamando Jesus de “Senhor” e
“Cristo”. Eu demonstro respeito a Jesus como Senhor e
Cristo ou penso nele de forma muito informal?
Deus dá sabedoria (1.5) e todo dom perfeito (1.16).
Tenho pedido por sabedoria? Tenho agradecido a Deus
pelos bons dons que ele tem me dado?

Suas perguntas de aplicação podem servir de base para


uma oração de encerramento. Ou, se você estiver se
reunindo com outras mulheres, essas perguntas podem
servir de base para o seu período de discussão.
TODO EXEMPLO TEM SEUS LIMITES
Confissão: eu escolhi o livro de Tiago como exemplo
porque ele pode facilmente demonstrar como o método
de estudo funciona. Tiago está completamente cheio de
todos os tipos de coisas que você pode anotar, é
razoavelmente simples de interpretar e fácil de aplicar. E
não é muito extenso. Nem todos os livros são tão
acessíveis assim.
Tenha em mente que se você estiver estudando um livro
extenso, suas anotações sobre o texto podem ser menos
frequentes do que aquelas em nosso exemplo de Tiago. As
palavras ou ideias repetidas podem levar mais tempo para
serem localizadas. A compreensão talvez consista em dizer
novamente os pontos principais de uma ampla narrativa
histórica. A interpretação pode consistir de algumas
tentativas destemidas, que acabam errando o alvo devido
à falta de informações anteriores. Os personagens podem
se comportar de formas inexplicáveis; os autores podem
abranger temas confusos ou aparentemente tolos; a
linguagem e as representações podem ser confusas. E
esqueça a tentativa de pronunciar os nomes das pessoas.
Se você se frustrar ou sentir-se empacada, lembre-se de
que seu trabalho como estudante é continuar avançando
com as ferramentas disponíveis. Em momentos
diferentes, em livros diferentes, você utilizará cada uma
das diferentes habilidades de estudo, com vários graus de
eficácia. Mas use-as continuamente. Lute continuamente
para ter o seu próprio contato pessoal com o texto antes
de olhar outros recursos em busca de ajuda. Tiago a
exortaria a continuar pedindo por sabedoria, confiando
que a receberá do Senhor, lembrando que seus esforços
são a longo prazo. Perseverança é algo verdadeiramente
maravilhoso no estudante.

ALGUNS PENSAMENTOS FINAIS SOBRE O ESTUDO PESSOAL


COM OS CINCO P's Então você terminou. Você caminhou
pelo texto como uma estudante metódica. Talvez a sua
agenda não lhe tenha permitido ter um contato diário com
o seu estudo ou, talvez, em alguns dias você tenha tido
menos tempo do que em outros, mas você usou o seu
tempo disponível para honrar os Cinco P´s. Você me
permite lançar um P extra para sua consideração? Se,
enfim, isso for possível, compartilhe seus esforços de
estudo com outras pessoas.
Conforme sugeri anteriormente, reunir-se com outros
para discutir suas descobertas no estudo pessoal
aumentará grandemente os benefícios do trabalho que
você realizou. O estudo bíblico com certeza acontece em
um nível pessoal, mas dentro de uma comunidade, ele
toma uma dimensão e uma responsabilidade que de outra
forma não aconteceria. Estudar com uma colega ou um
grupo a ajudará a continuar avançando, e irá guardá-la de
mover-se na direção de interpretações e aplicações que
possam desonrar o texto. Se você estiver em um lugar ou
em uma fase da vida que torne difícil reunir-se em grupo,
o estudo pessoal definitivamente a levará na direção do
conhecimento bíblico. Mas se tudo isso for possível, reúna
outras pessoas para estudar com você. Seu grupo se
tornará um instrumento para discussão, confissão,
arrependimento, encorajamento e edificação mútua. Você
terá a garantia de que não é a única a achar que estudar é
desafiador, e irá compartilhar a alegria da descoberta e da
compreensão.
Assim como um grupo pode servir como um ponto de
referência para mantê-la no caminho certo com o seu
estudo, a pregação e o ensino também podem. Esses dons
do corpo de crentes estão mais acessíveis hoje do que
jamais estiveram. Quer o fato de se reunir com um grupo
seja possível para você ou não, tire vantagem da riqueza
do ensino saudável disponível a você por meio dos
recursos online. Se você não sabe a quem ouvir, pergunte
ao seu pastor por alguém cujo ensino tem sido uma ajuda
pessoal para ele. Compare aquilo que você está
aprendendo por si mesma com o ensino de professores
confiáveis. Apenas se lembre de usar esses recursos depois
de haver empregado os Cinco P´s em seu estudo pessoal. A
pregação e o ensino adquirem uma dimensão bem maior e
realizam muito mais quando vamos a eles já impregnadas
com o texto que eles expõem.
É verdade que estudantes ávidas geralmente se tornam
professoras ávidas. Foi isso o que aconteceu comigo. Eu
estava tão empolgada por compartilhar a riqueza da
compreensão que estava desvendando, que passei
rapidamente de estudante a professora. Obviamente, não
deixei de ser uma estudante — de muitas maneiras, o fato
de começar a ensinar foi um instrumento para me manter
responsável por estudar. O fato de saber que outras
pessoas dependiam de eu estar preparada e de saber que o
Senhor leva a sério o papel do professor (Tiago 3.1)
pressionou-me a ser uma estudante bem melhor do que
eu jamais poderia ter sido por mim mesma.
Uma coisa é ser uma estudante cuidadosa, usando os
Cinco P´s para nortear o seu estudo, outra coisa é ser uma
professora cuidadosa, guiando as suas alunas para
aprenderem e implementarem os Cinco P´s. Se você é
professora, eu lhe oferecerei alguma ajuda no próximo
capítulo.
9
Auxílio para Professoras

Procura apresentar-te a Deus aprovado, como obreiro que não tem de que se
envergonhar, que maneja bem a palavra da verdade.
2 Tm. 2.15

Sou horrível como membro de pequenos grupos. Se você


já foi treinada para liderar um pequeno grupo, espero que
tenham lhe oferecido este inestimável conselho: nunca
faça contato visual com o membro do grupo que quer
sequestrar a discussão. Seu grupo está contando com você.
Se você olhar para ela enquanto faz a pergunta seguinte
da discussão, será o fim do jogo.
Eu sou aquela para quem você nunca olha. Ou, pelo
menos, eu costumava ser. O momento do pequeno grupo
era um pesadelo para mim e para todas em meu grupo. Eu
aparecia a cada semana com meu caderno de tarefas
marcado com perguntas adicionais e observações que eu
havia descoberto durante o meu estudo pessoal. O
período de discussão nunca era longo o suficiente para
mim. Eu não via a hora de acabar o momento “Alegrias e
Preocupações”, para que pudéssemos nos aprofundar na
lição. (Eu não conheço o seu primo de segundo grau que é carteiro.
Já podemos falar sobre Romanos?). Eu estava constantemente
pensando em como eu faria a pergunta de forma
diferente; que referência cruzada eu destacaria; como eu
ensinaria uma determinada ideia. Eu sentava na beira da
cadeira, inclinada, esperando pelo momento em que
pudesse inserir minha observação ou descoberta na
conversa.
Lembro-me de um dia em que ofereci uma
interpretação diferente para a passagem que o autor de
nosso estudo havia abrangido. Eu não fazia ideia de que o
silêncio poderia ser tão sonoro. Ou tão longo. De forma
geral, os pequenos grupos de mulheres são lugares onde o
consenso é valorizado. Isso é estabelecido no jardim da
infância. O que, afinal, havia de errado comigo?
Peço desculpas a todas as minhas líderes de pequenos
grupos. Se eu fosse vocês, teria desejado me bater na
testa. E, à líder que me chamou ao lado e disse: “Sabe,
acho que você pode ter o dom do ensino”, eu agradeço do
fundo de meu coração. Obrigada por reconhecer algo que
eu não conseguia ver em mim mesma.
Talvez você se identifique com minha experiência.
Talvez a sua líder de pequeno grupo evite o contato visual.
Talvez você conheça aquela sensação de estar prestes a
explodir com todos em seu pequeno grupo e já se
perguntou se é apenas uma mascote sabichona da
professora, com um grave problema de orgulho. Ou talvez
você tenha um cônjuge ou alguém que está aguentando
pacientemente a sua descarga semanal (diária?) de cada
coisinha que você aprende durante o seu tempo de estudo
pessoal. É importante você se fazer a pergunta sobre o
orgulho, mas também é importante considerar a questão
do ensino — principalmente se os outros têm observado
evidências do dom de ensino em você.
Talvez a razão de você ser um péssimo membro de
grupo seja porque você está equipada para ensinar.
Espero que você esteja. Creio que a igreja precisa
desesperadamente de professoras bem equipadas;
mulheres que lidarão com as Escrituras com cuidado e
diligência, e que têm um coração para o conhecimento
bíblico. É importante que mulheres ensinem mulheres, e
que elas o façam com excelência. Creio que isso seja
importante por três razões.

POR QUE AS MULHERES PRECISAM DE PROFESSORAS


MULHERES?
Em primeiro lugar, precisamos do exemplo de
professoras mulheres. Quando uma mulher vê alguém que
se parece com ela e que dá a impressão de ensinar a Bíblia
com paixão e inteligência, ela começa a reconhecer que
também pode amar a Deus com sua mente — quem sabe,
além daquilo que ela pensa ser necessário ou possível. Se
eu tivesse ouvido somente homens ensinando bem a
Bíblia, não sei se teria me considerado capaz de fazer o
mesmo. Felizmente, Deus me deu mulheres diligentes e
inteligentes para servirem de exemplo do que significa
abrir a Palavra com reverência e habilidade.
Em segundo lugar, precisamos da perspectiva das
professoras mulheres. Uma professora mulher será
naturalmente propensa a fazer aplicações e a dar
exemplos que sejam reconhecidos por outras mulheres e
que sejam acessíveis a elas. Pense: poucas analogias com
futebol e filmes de ação, e mais analogias com programas
sobre decoração e comédias românticas; menos coisas
sobre o vício da pornografia ou abdicação das
responsabilidades, e mais coisas sobre questões de
autoimagem ou pecados da língua. Uma professora
mulher também extrairá verdades diferentes das que um
homem poderia extrair de um texto. Isso não quer dizer
que ela feminizará um texto (uma armadilha sobre a qual
discutiremos mais tarde), mas que ela enfatizará aqueles
elementos do texto que destacam o papel das mulheres na
história da redenção ou que falará de questões
relacionadas aos pecados que as mulheres geralmente
enfrentam.
Em terceiro, precisamos da autoridade das professoras
mulheres. Uma mulher pode dizer a outras mulheres para
parar de idolatrar seu cônjuge e filhos, de uma maneira
que um homem não consegue fazer. Uma mulher pode se
dirigir a outras mulheres nas questões de vaidade,
orgulho, submissão e contentamento de um jeito que um
homem não pode. As professoras mulheres possuem uma
autoridade empática sobre suas estudantes femininas; nós
temos a habilidade de dizer: “Eu entendo os pecados e
temores que afligem o sexo feminino, e lhe recomendo o
conselho suficiente das Escrituras”.
Então, por todos os meios, pergunte a si mesma se o
Senhor a está chamando para ensinar. A igreja precisa de
mulheres ensinando mulheres. E se a resposta for “sim”,
reúna um grupo e comece a ensinar. Mas faça isso com
cuidado. O livro de Tiago nos adverte a não entrarmos na
área de ensino de forma leviana, mas a considerarmos o
fato de que aqueles que ensinam serão julgados com
maior rigor (Tiago 3.1).
O que seria assumir o papel do ensino de forma
leviana? Creio que isso acontece quando confundimos
ensinar com falar em público. Mas essas coisas não são a
mesma coisa. Às vezes, a igreja é lenta para discernir a
diferença entre uma oradora talentosa e uma professora
talentosa. A oradora e a professora dependem de
conjuntos de ferramentas diferentes e têm objetivos
diferentes em vista. A oradora depende da retórica, de
narrativas e de humor para inspirar e exortar. A
professora depende do conhecimento, da percepção e da
capacidade de condensar aquilo que é complexo em algo
simples, a fim de treinar e instruir. A oradora faz fãs, a
professora faz discípulos.
Desempenhamos o papel de professora de forma
leviana quando elevamos as ferramentas de uma oradora
acima das de uma professora. Amo humor e contar
histórias mais do que qualquer pessoa. Eu tenho usado
isso neste livro. Mas a professora deve se perguntar
constantemente se ela está confiando nas ferramentas da
oradora ao ponto de o conteúdo desaparecer, ficando em
segundo plano. Se as pessoas se lembrarem de minhas
histórias e piadas, mas não se lembrarem da minha lição,
eu errei o alvo. O ideal é que uma professora talentosa
também seja uma oradora talentosa. Mas se eu tiver que
escolher entre uma das duas coisas, escolho a professora.
A professora lutará pelo conhecimento bíblico.
Então, como nós, sendo professoras cuidadosas,
podemos pegar os Cinco P´s e treinar outras para amá-los
e usá-los em seu estudo? Como podemos elaborar lições
que honrem a abordagem que temos esboçado? Fazer isso
exigirá que nos preparemos com diligência, estruturemos
com sabedoria e ensinemos com responsabilidade.

PREPARE COM DILIGÊNCIA


É evidente que para ensinar os Cinco P´s você deve
primeiro utilizá-los por si mesma. Acredite ou não, a
professora é mais fiel às suas alunas quando ela as ensina
de acordo com sua própria falta de compreensão. Sempre
acreditei que as professoras ensinavam porque sabiam
mais que os seus alunos. Não acredito mais que esse seja o
caso. Eu ensino por causa daquilo que não sei. Percebo que
as perguntas que me ocorrem à medida que leio uma
passagem são provavelmente as mesmas que outras
pessoas também estão fazendo. A diferença entre mim e
as outras, entre a professora e a aluna, é que eu não
consigo deixar essas perguntas sem respostas nas
margens. Quando muito, a professora não é aquela com
mais conhecimento, mas sim com uma maior curiosidade
natural para persistir nas perguntas com as quais todas
nos deparamos. Devido ao fato de estar conectada, ela é a
pessoa mais preparada para cavar por entendimento se
comparada a suas colegas. Seu entusiasmo pela descoberta
se torna contagioso no meio de suas alunas.
Então, eu ensino a aprender. O fato de saber que
minhas alunas precisam que eu aprenda bem me ajuda a
me preparar cuidadosamente. O preparo cuidadoso
começa quando ponho os Cinco P´s em prática e, na hora
certa, destilo as partes mais importantes do meu próprio
tempo de estudo para as minhas alunas. A fim de fazer
isso, uma professora deve se entregar à prática de
consultar comentários somente depois de tentar fazer a
compreensão, a interpretação e a aplicação por si mesma.
Então, ela deve escolher bem seus comentários. Leva
tempo para saber quais autores são mais confiáveis. Uma
vez que você os encontrar, eles terão a tendência de se
tornar suas estrelas-guia. Sou conhecida por escolher um
livro da Bíblia para estudar baseada no fato de meu autor
preferido ter escrito um comentário sobre ele.
Quando você começar a desenvolver uma lista de
comentários ou autores de confiança, peça ajuda a outros:
seu pastor, outra professora que pense de forma
semelhante, um professor de seminário. Uma vez que
encontrar um autor excelente, leia as suas fontes. Siga as
notas de rodapé para ver quem moldou o pensamento de
seu autor. Depois, leia também aquilo que essas pessoas
escreveram. As notas de rodapé são uma mina de ouro
para encontrar recursos adicionais para consulta.
Conforme temos observado, nem todos os comentários
dirão a mesma coisa. Quando você perceber conflito entre
as suas fontes confiáveis, procure onde estão os pontos de
maior consenso e pese essa interpretação em contraste
com a sua própria compreensão do texto. Você terá que
decidir se ensinará a interpretação mais comum ou aquela
com a qual você mais se alinha. Se não for causar
confusão, considere ambas. Admita a sua posição para as
suas alunas. Depois, diga-lhes que você está com a minoria
e apresente fielmente a visão que prevalece. Mas esteja
certa de tratar disso com o rigor e a imparcialidade que
isso merece.
À medida que se preparar, lembre-se de documentar
suas fontes em suas anotações. Isso a ajudará a localizar
de onde veio uma ideia, caso alguém lhe faça uma
pergunta sobre essa ideia ou você mesma precise revê-la.
Eu apenas escrevo o sobrenome do autor e o número da
página, entre parênteses, ao lado do pensamento que
desejo ser capaz de localizar novamente.
Preparação cuidadosa exige um compromisso de muitas
horas. A quantidade de tempo que você gasta ensinando,
na verdade, é uma fração do tempo que você gasta
preparando o estudo. O seu trabalho é absorver uma
grande quantidade de informação e depois destilar os
seus elementos mais importantes para as suas alunas.
Imagine-se como uma organizadora profissional
colocando em ordem um armário superlotado. Você
organizará pilhas de informações, decidindo o que precisa
ser mantido e onde deve ser mantido, arranjando e
etiquetando-as de forma que uma estudante consiga
encontrá-las e utilizá-las facilmente.

ESTRUTURE COM SABEDORIA


A professora não só organiza a informação de modo que
esteja acessível, mas também organiza a forma como ela
será entregue. A forma como você escolhe estruturar o seu
estudo influenciará na quantidade de material que você
conseguirá cobrir e no quanto conseguirá se aprofundar
no texto. Haverá tarefa para casa? Você usará o tempo da
reunião para oração ou discussão, ou apenas para o
ensino? A estrutura do seu estudo determinará o seu foco.
O estudo que eu lidero envolve ao todo duas horas de
discussão em grupos menores, adoração e ensino. Nosso
grupo é grande, por essa razão, ele exige mais estrutura
do que um grupo que se reúne em casa. Em um ambiente
familiar, o ensino poderia ser misturado com discussões, e
a necessidade de um planejamento poderia ser mais
flexível.
Muitos estudos para mulheres dedicam uma porção
considerável do tempo juntas aos elementos que
contribuem para o desenvolvimento de relacionamentos,
como compartilhar pedidos de oração e perguntas de
quebra-gelo. Esses são elementos necessários, mas
também são aqueles que têm maior probabilidade de
devorar o tempo de discussão e ensino. Se as mulheres do
seu grupo tiverem outras oportunidades para se
relacionarem (como um grupo de comunhão ou escola
dominical), considere a possibilidade de limitar esses
elementos durante o período da reunião. Falo com
franqueza às alunas participantes do meu estudo que
queremos muito que elas se relacionem, mas que o nosso
alvo principal é que elas cresçam em seu conhecimento de
Deus e em seu amor por ele. Separamos um tempo para
discussão das tarefas de casa em grupos menores. Não
somos muito rígidas com isso — apenas mantemos o
nosso foco principal nisso. Os pedidos de oração são
escritos em notinhas e enviados por e-mail para o grupo.
Se houver uma necessidade específica, oramos juntas por
isso durante esse período. Para desenvolver os
relacionamentos, as líderes geralmente reúnem seus
grupos para uma refeição em outro momento que não seja
a reunião de estudo. E encorajamos as mulheres a ficarem
um pouco mais de tempo após o ensino para baterem
papo.

PENSAMENTOS SOBRE A TAREFA DE CASA


Se você for nova na área do ensino, talvez você deseje
fazer um programa de estudo escrito. Você pode começar
simplesmente pedindo às mulheres de seu grupo que
leiam o texto várias vezes e façam anotações. Você poderia
enviar por e-mail uma lista de três ou quatro perguntas de
interpretação e aplicação para que elas considerem antes
da reunião. Eu descobri que, pelo menos, alguma tarefa
semanal é necessária para que aproveitem ao máximo o
tempo que vocês gastarão juntas. Quer você apenas peça
que as mulheres leiam o texto repetidamente ou designe
perguntas a elas, faça o seu melhor para que elas
retenham os comentários até o período de discussão e
ensino. Estruture sua tarefa e seu ensino de tal maneira
que honrem o processo de aprendizagem.
Eu escrevo um programa para cada estudo que dou. A
cada semana, as mulheres leem uma parte do texto e
respondem às perguntas sobre ele. As perguntas baseiam-
se, em sua maioria, na compreensão, com algumas
perguntas de interpretação e aplicação em intervalos
regulares. A tarefa pede que elas parafraseiem o texto,
procurem palavras no dicionário, chequem as referências
cruzadas e leiam o texto em traduções alternadas. Meu
objetivo com a tarefa é que minhas alunas venham para o
estudo bíblico após ter gastado tempo absorvendo
cuidadosamente o que o texto diz (compreensão).
Durante o estudo, usamos o período de ensino e discussão
para explorarmos juntas aquilo que o texto significa
(interpretação) e como ele deve nos desafiar a sermos
diferentes (aplicação). Na verdade, minha intenção é que
a tarefa levante tantas perguntas quanto for possível
respondê-las através do texto, a fim de levar as mulheres
ao reconhecimento daquilo que elas não sabem. Depois,
eu permito que haja um tempo de discussão e ensino para
resolver os conflitos que a tarefa tiver criado.
As perguntas da tarefa contêm pouquíssimos
comentários da minha parte; não forneço muitas
explicações ou significados de palavras, a menos que seja
absolutamente necessário. Isso ajuda as alunas a
desenvolverem a habilidade de questionar por elas
mesmas e de aprender a não temerem a parte do “não sei”
do processo de aprendizagem. Discutimos as perguntas de
interpretação e aplicação da tarefa durante o período de
reunião em grupos menores e/ou durante o ensino. Cada
tarefa semanal é concluída com uma reflexão sobre qual
aspecto do caráter de Deus tem sido revelado no texto, e
como a compreensão desse aspecto de seu caráter
transforma a nossa forma de pensar e agir.
Fazer tarefas eficazes exige que a professora pense
como aluna. Quando você começar a prepará-lo, leia todo
o texto e anote nas margens as perguntas que você
naturalmente teria depois de lê-lo. Suas alunas
provavelmente terão as mesmas perguntas. Lembre-se
que as perguntas que parecem óbvias para você talvez
sejam realmente necessárias para as suas alunas. Pedir a
elas para definir palavras, contar palavras ou expressões
repetidas ou reiterar conceitos básicos ajudará a treiná-las
para começar a adotar essas práticas sem a ajuda de um
programa. Isso as ajuda a aprender a estudar melhor por
si mesmas.
Tenha também em mente a importância de fazer
perguntas difíceis, aquelas que você talvez tenha medo de
fazer até a si mesma. Essas são as perguntas que tentam
você a dizer: “Eu vou apenas confiar isso ao Senhor e
seguirei em frente.” Se o texto abordar um pai vendendo
sua filha como escrava, pergunte na tarefa de suas alunas
como um mandamento desse poderia vir de um Deus bom
e amoroso. Se o texto descrever Jesus aconselhando você a
cortar sua mão para evitar o pecado, pergunte às alunas se
Jesus está ordenando a automutilação. Se você sabe que
uma passagem é geralmente usada fora do contexto,
desafie o seu mau uso: “Será que Filipenses 4.13 está
querendo dizer que podemos fazer qualquer coisa que
tivermos em mente? Por que sim ou por que não? Você
consegue pensar em outra passagem que apoie a sua
resposta?”.
Garanta às suas alunas que, mesmo que elas não
consigam chegar a uma resposta adequada, reconhecer
uma pergunta difícil e tentar respondê-la faz parte do
processo de alcançar compreensão. Evitar as perguntas
difíceis só alimenta a dúvida e o temor a longo prazo. Suas
alunas ficarão tranquilas ao saber que é seguro fazer
perguntas difíceis, e que pessoas inteligentes têm pensado
arduamente sobre elas por mais de dois milênios.
Escrever um programa de estudo é um trabalho difícil.
Se possível, peça ajuda a uma amiga para receber
sugestões e críticas. Peça-lhe para trabalhar na tarefa e
fornecer a você um retorno sobre quais perguntas
ajudaram e quais foram confusas ou inúteis. Uma
pergunta que faça perfeito sentido para você talvez
precise ser reformulada para fazer sentido para outros.
Esboçar bem um estudo requer que a professora passe
pelo método de estudo dos Cinco P´s perguntando quais
partes seriam difíceis para alguém que está só
aprendendo a utilizá-lo. As minhas alunas irão prestar
atenção para esta palavra-chave? Elas perceberão uma
ideia repetida? Será que elas tomarão uma afirmação que
exige uma observação mais detalhada pelo que ela
aparenta significar? Será que elas serão tentadas a correr
com o estudo? Onde elas estarão propensas a empacar?
Ser capaz de localizar as respostas dessas e de outras
perguntas semelhantes requer que nos lembremos
continuamente como o texto nos parecia ser à primeira
vez que o encontramos. Uma vez que nos tornamos
familiarizadas com um texto, podemos esquecer as
perguntas e dificuldades que ele nos apresentou
anteriormente. As boas professoras são capazes de
perceber o texto com os olhos de suas alunas. Por essa
razão, eu começo fazendo um programa de estudo antes
de explorar exaustivamente uma passagem. Isso me
permite fazer as perguntas que ocorrem com mais
naturalidade, extrair as observações mais básicas antes
que elas se tornem potencialmente obscurecidas por um
coro de comentaristas. Depois de ter estudado um pouco,
eu refino e desenvolvo melhor as perguntas que escrevi.
É aqui que minha abordagem difere das outras. Eu não
tenho a intenção de que a tarefa ensine por si só. Minha
intenção é que a tarefa ajude principalmente na
compreensão e no início do processo de interpretação e
aplicação pessoal. Estritamente falando, ensinar é
comentar. Meu objetivo com a tarefa é que ela prepare os
corações e as mentes das minhas alunas para o período de
ensino. Se elas tiverem feito o trabalho da tentativa
pessoal de compreender, interpretar e aplicar
anteriormente, elas ouvirão o meu ensino com um ouvido
muito mais perceptivo — tanto em relação aos pontos
fortes como em relação às falhas. Elas saberão quando eu
lidei com um texto de forma responsável, porque terão
investido tempo lutando com ele antes de chegarem ao
grupo de estudo. Existe um alto nível de responsabilidade
nisso, mas eu aceito o desafio.
Lembre-se, você não tem que criar o seu próprio
programa de estudo. Você pode utilizar um programa
existente que honre o processo de aprendizagem, ao
oferecer o mínimo de comentários possível e enfatizar a
compreensão, ou você pode pedir às suas alunas para
simplesmente lerem o texto várias vezes como preparação.
Não deixe que a intimidação para desenvolver seu próprio
material a impeça de ensinar. Nem toda professora
escreve seu próprio programa, mas toda professora pode
levar suas alunas a um aprofundamento maior na Palavra,
utilizando algum tipo de tarefa para dar início ao processo
de aprendizagem.

ENSINE COM RESPONSABILIDADE


Ensinar uma passagem para quem já a estudou exige
muito mais do que ensiná-la àquelas que não a estudaram.
Minha esperança é que a tarefa desafie o pensamento
delas o suficiente para que, no momento em que me
ouvirem ensinar, elas não tomem apenas a minha palavra.
Saber que elas pensarão de modo crítico em relação ao
meu ensino me faz ter a responsabilidade de evitar sete
armadilhas comuns do ensino.

1. PULAR PARA LÁ E PARA CÁ


Alguma vez você já se sentou para ouvir um ensino
sobre um texto-chave, só para ouvir a professora ler a
passagem rapidamente antes de gastar quarenta minutos
pulando de passagem em passagem por toda a Bíblia?
Uma aluna que tiver gastado a semana analisando um
capítulo de Efésios não ficará satisfeita se a professora
usar o texto-chave simplesmente como um pontapé
inicial. Ela desejará se alongar mais nele, como deveria.
Ela terá descoberto que o texto em questão é digno de
quarenta minutos do tempo do grupo, sem distrações, e
que esses quarenta minutos talvez não sejam suficientes
para resolver as questões acerca daquele único texto.
Um bom ensino envolverá necessariamente o uso das
referências cruzadas, mas não em detrimento do texto
principal. Nós, professoras, somos propensas a divagar,
particularmente quando o nosso texto principal é um
texto difícil. A professora que se esforça para desenvolver
o conhecimento bíblico precisa saber parar naquele texto.
Seu objetivo primordial não é mostrar como o texto-chave
se relaciona com milhares de outras passagens, mas
ensinar o texto-chave de modo tão detalhado que ele
venha automaticamente à mente de suas alunas quando
elas encontrarem temas semelhantes em outras passagens
em seus estudos.

2. FEMINIZAR O TEXTO
As mulheres que ensinam a Bíblia para mulheres
enfrentam constantemente a tentação de tomar um texto
e revesti-lo com um significado exclusivo para o sexo
feminino. Toda vez que tomamos uma passagem que tem
como objetivo ensinar pessoas e a ensinamos como se ela
fosse voltada especificamente para mulheres, corremos o
risco de feminizar o texto.
Isso não significa que não podemos extrair aplicações
específicas para um gênero de um texto que fala a ambos
os gêneros. Mas sim que temos que nos guardar de dar
interpretações e aplicações que roubem do texto sua
intenção original, ao concentrar-nos exclusivamente no
enquadramento de um gênero específico. O livro de Rute
não é um livro sobre mulheres, para mulheres; do mesmo
modo que o livro de Judas não é um livro sobre homens,
para homens. A Bíblia é um livro sobre Deus, escrito para
pessoas. É claro que você ensinará o Salmo 139 no que diz
respeito às mulheres e à imagem corporal, mas resista ao
impulso de ensinar exclusivamente isso. Não é trabalho da
professora tornar a Bíblia relevante ou palatável para as
mulheres. Seu trabalho é ensinar o texto de modo
responsável. Em virtude de seu gênero, uma professora
mulher traz, às vezes, uma perspectiva do texto diferente
da de um professor homem, mas nem sempre é assim.
Uma estudante que gastou tempo no texto antes de ouvir
o ensino sobre ele saberá quando o texto estiver sendo
feminizado.

3. EXTRAPOLAÇÃO EXAGERADA
No intuito de “trazer o texto à vida”, as professoras às
vezes sucumbem à tentação de acrescentar um pouco de
cor ao redor das bordas da tela das Escrituras. Admito que
é interessante especular a respeito dos pensamentos e
motivações não registrados de Maria, a mãe de Jesus. Isso
talvez seja benéfico até certo ponto. Mas em algum
momento, isso deixará de ser útil e passará a ser distração,
e potencialmente extrabíblico.
Se você já assistiu uma adaptação cinematográfica de
uma história bíblica conhecida, você entenderá essa
questão — quanto mais instruída acerca do que a Bíblia
realmente diz sobre o Êxodo, por exemplo, menos você
será capaz de apreciar a extrapolação do texto feita por
Cecil B. DeMille, um produtor de cinema norte-
americano. Imaginar além do que o texto diz traz um
grande apelo ao público, mas um apelo limitado para um
estudante. A familiaridade com um texto antes de ouvi-lo
ser ensinado torna o participante de uma plateia em um
estudante. Uma estudante que passou a semana imersa no
texto que você está ensinando perceberá quando você
“sair do roteiro”.

4. EXCESSIVA DEPENDÊNCIA DE NARRAÇÃO DE


HISTÓRIAS OU HUMOR
A fim de serem acessíveis e carismáticas, as professoras
empregam a narração de histórias e o humor como
artifícios de retórica. Isso não é errado. O humor e a
narração de histórias humanizam a professora, ajudam as
ouvintes a se manterem engajadas e tornam os pontos do
ensino memorizáveis. Não é bom que a professora seja
inacessível, chata ou fácil de ser esquecida. Mas também
não é bom que a professora se torne superdependente do
humor e das narrações, ou as utilize de forma a manipular
a lição ou a causar distrações. Se essas coisas não
reforçarem o ensino, elas acabarão comprometendo-o.
Se alguém dividisse o seu ensino em um gráfico com o
formato de pizza, quantos pedaços dessa pizza seriam
tomados por esses dois elementos? Se você pedisse às suas
alunas para dizerem algo que elas se lembram de sua lição,
será que elas se lembrariam de um ponto-chave ou de uma
história engraçada? Plateias amam humor e histórias, quer
essas coisas apoiem a mensagem ou não. As estudantes
amam quando um conteúdo saudável se torna mais fácil
de ser memorizado por meio de uma ilustração ou de uma
história bem colocada. Uma estudante bem preparada
saberá se sua professora está usando esses artifícios de
retórica para tapar buracos ou para reforçar o ensino.

5. CEDER ÀS EMOÇÕES
Quando leio as Escrituras em voz alta para o público,
geralmente choro. Não sei bem por que, com exceção de
quando acho as verdades do texto profundamente
comoventes. Isso costumava me deixar frustrada, mas o
Senhor está me mostrando que ensinar a Bíblia deve
envolver as emoções. Ou seja, ensinar a Bíblia deve
despertar tanto na professora quanto na aluna um amor
mais profundo por Deus, um amor que afete
profundamente nossas emoções. Amar a Deus com a
nossa mente deve resultar em amar a Deus com o nosso
coração de forma profunda e pura.
Nós entramos em apuros quando alvejamos
intencionalmente as emoções das pessoas com o propósito
de criar uma experiência compartilhada. É tentador
elaborar uma lição que comece com uma piada e termine
com uma história que arranque lágrimas. Por quê? Porque
essa é uma fórmula retórica que funciona. Às vezes, as
ouvintes confundem o fato de serem tocadas pelo Espírito
Santo com o fato de serem manipuladas por uma
mensagem humana bem elaborada.
Como podemos saber qual é a diferença? Isso nem
sempre é fácil, mas eis uma reflexão: a manipuladora
emocional aumentará o amor que você sente por ela tanto
quanto ou mais do que o amor que você sente por Deus. O
trabalho da professora é chamar a atenção para a beleza
do texto, e não criar uma experiência comovente. Seu
trabalho é exaltar o Deus da Bíblia, e não desenvolver um
culto à personalidade. Uma estudante bem preparada será
menos suscetível à manipulação emocional.

6. SOBRECARGA DE ENSINO
Um dos maiores desafios na elaboração de uma lição é
saber qual conteúdo incluir nela e qual deixar de fora.
Leva tempo para desenvolver uma percepção de quanto
conteúdo você conseguirá tratar de forma razoável
durante o seu período de ensino. No início, a maioria das
professoras comete o erro de exagerar no conteúdo. Isso
pode levá-la a ficar atolada em um mar de anotações ou a
segurar suas alunas por mais tempo do que pretendia. A
maioria das pessoas não gosta de beber de uma mangueira
de incêndio, então, embora não haja problemas em ter
mais anotações do que você conseguiria ensinar, é
importante que você tenha um plano de contingência
sobre o que poderá cortar, caso o tempo seja curto.
Mais uma vez, a professora cujas alunas já gastaram
tempo no texto-chave possui uma vantagem. O trabalho
que elas já investiram na compreensão deixará você livre
para explorar a interpretação e a aplicação sem que seja
necessário lançar uma base extensa. Você estará
ampliando e reforçando a compreensão delas, em vez de
começar do zero. Uma estudante bem preparada não
precisará de um tempo de ensino exagerado.

7. BANCAR A ESPECIALISTA
Ninguém gosta de se sentir inapto, muito menos uma
professora. E por causa disso, as professoras às vezes são
relutantes para admitir os limites de seu conhecimento.
Seja honesta em relação às suas limitações; não há nada de
errado com o fato de uma professora dizer: “Eu não sei”.
Na verdade, isso pode ser tranquilizador para as suas
alunas. Haja com transparência total quando mais de uma
interpretação for amplamente aceita para uma passagem.
Dê uma resposta sincera, que reconheça os diferentes
pontos de vista. Isso dará às suas alunas uma
oportunidade de examinar qual ponto de vista se encaixa
melhor com a leitura que elas mesmas fizeram do texto.
Uma estudante bem preparada saberá que uma passagem
difícil exige cuidado. Ela saberá quando você estiver dando
uma resposta simplista para um assunto complexo. É bem
melhor ser honesta sobre a sua confiança (ou falta dela)
em uma interpretação específica.
O melhor de ensinar às mulheres um texto que elas já
estudaram anteriormente é que isso torna a professora
responsável em não “fugir dele”. A estudante equipada
poderá reconhecer uma preparação superficial por parte
da professora. Exigir mais das minhas alunas antes do
ensino significa que elas podem e devem exigir mais de
mim durante o ensino.

POR QUE ENSINAR COM OS CINCO P´s É LIBERTADOR?


Embora ensinar seja um trabalho difícil, usar um
método como os Cinco P´s torna essa carga
consideravelmente mais leve. A beleza de usar os Cinco P
´s está no fato de que isso livra a professora de ter que
decidir sobre quais temas tratar. Sua lição será
determinada pelo conteúdo da passagem em questão.
Tenho um grande conforto em saber que o texto
introduzirá aquilo que for necessário, quando for
necessário, em um contexto que exibirá isso da melhor
forma. Tudo o que tenho a fazer é ensinar o próximo
versículo. Ensinar um tópico exige que eu desenvolva
esboços elaborados, ligando os pontos entre muitas
passagens. Ensinar com os Cinco P´s permite que o texto
seja o meu esboço.
Concordo com Tiago: poucos devem assumir o ensino.
Moldar o entendimento de alguém em relação às coisas de
Deus é uma responsabilidade enorme, e isso não deve ser
feito de forma leviana. Não há lugar para a mentalidade
“finja ser isso até conseguir ser isso” entre aquelas que
gostariam de ensinar. Aquelas que levam o seu papel a
sério gastarão horas se preparando para ensinar por
quarenta minutos; e passarão horas meditando sobre o
que mais poderiam ter dito; o que mais poderiam ter
explicado e qual ilustração deveriam ter usado. Quando
uma mulher jovem me diz: “Eu quero ensinar como você”,
sempre penso: “Eu devo ter feito isso parecer muito fácil”.
O ensino, assim como outros chamados, com certeza não é
fácil, mas se o Senhor a equipou para fazer isso, você pode
confiar que ele a suprirá com os recursos necessários.
Conclusão
Busque a Face de Deus

Ao meu coração me ocorre: Buscai a minha presença; buscarei, pois, SENHOR, a


tua presença.
Sl. 27.8

Alguém me perguntou recentemente, após saber que eu


era uma professora da Bíblia, se eu era uma adoradora de
Deus ou uma adoradora da Bíblia. A pergunta não veio
como uma completa surpresa. Quando você gasta tanto
tempo como eu, pedindo às pessoas para valorizarem suas
Bíblias, alguém será compelido a perguntar se você perdeu
de vista o que é importante em prol do que é secundário.
Minha resposta foi simples: quero ser conformada à
imagem de Deus. Como posso me conformar à imagem de
alguém a quem nunca contemplo? Não sou uma
adoradora da Bíblia, mas não posso ser uma verdadeira
adoradora de Deus sem amar a Bíblia de forma profunda
e reverente. Caso contrário, estarei adorando a um deus
desconhecido.
Um adorador da Bíblia ama um objeto. Um adorador de
Deus ama uma pessoa. Podemos amar a Bíblia com a nossa
mente, mas não podemos amá-la com o nosso coração
mais do que amamos um carro ou um cappuccino. Um
objeto não pode receber ou retribuir amor. Só uma pessoa
pode fazer isso. Portanto, se você leu este livro em um
esforço para amar mais a Bíblia, quero parabenizá-la e
adverti-la ao mesmo tempo. Por favor, ame realmente a
Deus com a sua mente por meio do estudo fiel da sua
Palavra, mas, por favor, não atribua suas afeições a
qualquer outra coisa que seja inferior à pessoa do próprio
Deus. O nosso estudo da Bíblia só será benéfico à medida
que ele aumentar o nosso amor pelo Deus que ela
proclama. O estudo bíblico é um meio para um fim, não
um fim em si mesmo e por causa de si mesmo. Ele é um
meio de amarmos mais a Deus e de vivermos de modo
diferente, por termos aprendido a contemplá-lo melhor. E
ele é um meio de nos tornarmos aquilo que
contemplamos. O amor recíproco de Deus é um amor que
transforma.
Em João 13, Jesus diz aos seus discípulos que a
influência deles será reconhecida. Ele diz que o mundo os
conhecerá por uma razão distinta: se eles tiverem amor
uns pelos outros. O seu amor pelos outros é o transbordar
do seu amor por Deus. O seu amor por Deus aumentará à
medida que você aprender a conhecê-lo melhor. Mas
nunca perca de vista que sua influência será notada pela
forma como você usa o seu coração, não a sua cabeça.
Conhecimento bíblico que não transforma é como correr
atrás do vento. Os cristãos serão conhecidos pelo seu
amor, não pelo conhecimento.
Nós não seremos conhecidas por qualquer tipo de amor
— seremos conhecidas pelo tipo de amor que o Pai nos
mostrou, e que, por sua vez, nós mostramos aos outros.

NÓS NOS TORNAMOS AQUILO QUE CONTEMPLAMOS


Quando eu estava no oitavo ano, queria ser exatamente
como minha amiga Meg. Meg tinha um cabelo loiro
brilhante em um corte chanel perfeito. Ela tinha roupas
invejáveis. Era engraçada, inteligente e popular. Ela ouvia
músicas legais e carregava a bolsa certa. Tinha boa
aparência e um bronzeado cor de mel. Ela sabia coisas
sobre maquiagem. Era quase a perfeição em pessoa.
Então eu fiz o que muitas meninas do ensino
fundamental faziam: fiz um corte de cabelo chanel. Eu
percorria os cabides de liquidação, à procura de roupas
iguais as da Meg pelas quais eu pudesse pagar com o meu
salário de babá. Eu mudei minha maneira de falar e o meu
gosto musical para ficarem iguais aos dela. Tentei até
mesmo aprender a caminhar com os mesmos passos largos
que ela andava. Estudei tudo o que tornava Meg
maravilhosa e então tentei imitá-la nos mínimos detalhes.
Não importava o fato de eu ser quinze centímetros mais
alta do que ela, ter a pele pálida e sardenta e ser tão cheia
de curvas quanto um menino de dez anos. Eu fiz um
estudo profundo sobre ela e tudo o que estava ao meu
alcance para me conformar à imagem dela.
Eu sempre penso sobre esse período da minha vida,
tanto pelo que fiz de errado, como pelo que fiz de certo.
Na verdade, eu era muito boa em reconhecer o que nos
fazia imitar alguém bem— prestar atenção
cuidadosamente aos seus atributos. Eu até estava certa em
querer imitar a perfeição. Mas estava errada em pensar
que poderia encontrá-la em outro ser humano.
Nós humanos somos imitadores. Desde o tempo em que
somos bebês, temos imitado os outros ao nosso redor. Às
vezes, imitamos ativamente, assim como quando eu
tentava ser a Meg. Outras vezes, imitamos de forma
passiva, como quando percebemos tardiamente que
estamos nos transformando em nossa mãe. Será que
fomos projetadas dessa maneira por alguma razão? Será
que essa propensão para imitar é, na verdade,
intencionada para o nosso bem?
Efésios 5.1 nos diz para sermos “imitadores de Deus,
como filhos amados”. Filhos que sabem que são
afetuosamente amados imitam seus pais com jubilosa
adoração. Eles querem ser como eles. E é dessa maneira que
somos chamadas para imitarmos o nosso Deus perfeito:
não com um desejo escravizador do ensino fundamental,
de nos tornarmos melhores ou diferentes do que somos,
mas com um reconhecimento jubiloso de que ele é amável
e completamente digno de ser imitado.
Mas saiba disto: nós não o imitaremos por acaso. Nós
certamente nos tornaremos como nossas mães sem sequer
tentarmos fazer isso, mas não acordaremos daqui a dez
anos e descobriremos que adquirimos passivamente o
caráter de Deus.

IMITAÇÃO ATIVA
A imitação de Deus acontece da mesma forma que
acontecia no ensino fundamental, só que desta vez nós
temos um objeto muito mais digno. Assim como eu fiz um
estudo da minha amiga, devemos fazer um estudo do
nosso Deus: o que ele ama, o que ele odeia, como ele fala e
age. Não podemos imitar um Deus cujos hábitos e
características jamais aprendemos. Devemos fazer um
estudo sobre ele se quisermos nos tornar como ele.
Devemos buscar a sua face.
Existem muitas razões boas para investirmos na
aprendizagem da Palavra de Deus, mas nenhuma melhor
do que esta: que com todo esforço com propósito, com cada
leitura ligada à perspectiva, cada passo paciente que damos à
frente, cada tentativa organizada pelo processo, cada prece
feita nos intervalos das páginas das Escrituras, nós nos
aproximamos do semblante de Deus e nos alinhamos mais
diretamente com o resplendor da sua face. Nós o vemos
da forma como ele é, o que com certeza é uma recompensa
por si só, mas é também uma recompensa com o benefício
secundário de sermos eternamente transformadas por
essa visão.
Nós nos tornamos aquilo que contemplamos. Você crê
nisso? Quer seja de forma passiva ou ativa, somos
conformadas ao modelo que gastarmos mais tempo
estudando.
Sobre o que você fixa o seu olhar? Sobre a sua conta
bancária? Sobre a balança que está no seu banheiro? Sobre
o próximo elogio que o seu filho irá receber? Sobre a
cozinha dos seus sonhos? Sobre a última série de TV?
Sobre o seu telefone? Essa é a natureza desta vida, contra
a qual devemos lutar diariamente para criarmos espaço
em nosso campo de visão para aquilo que transcende.
Muitas coisas reivindicam a nossa atenção de forma
legítima, mas quando os nossos olhos estão livres do filho
de dois anos, ou da planilha, ou do livro escolar, ou da
louça do jantar, para onde nós os voltamos? Se gastarmos
o nosso tempo contemplando apenas as coisas inferiores,
nós nos tornaremos como elas, medindo os nossos anos
nos termos da glória humana.
Mas eis a boa notícia: aquele a quem mais precisamos
contemplar se fez conhecido. Ele traçou com mão precisa
as linhas e os contornos do seu rosto. Ele fez isso em sua
Palavra. Devemos buscar esse rosto, embora os bebês
continuem chorando; as contas continuem aumentando;
as más notícias continuem chegando sem avisar; embora
as amizades aumentem ou diminuam; embora a facilidade
e a dificuldade enfraqueçam o nosso controle sobre a
piedade; embora milhares de outros rostos se amontoem
perto de nós querendo o nosso afeto, e milhares de outras
vozes clamem por nossa atenção. Ao fixarmos o nosso
olhar nesse rosto, trocamos a mera glória humana pela
santidade: “Contemplando a glória do Senhor, somos
transformados, de glória em glória, na sua própria
imagem” (2 Co 3.18).
Há, de fato, somente duas possibilidades nesta vida:
sermos conformadas à imagem de Deus ou conformadas
ao padrão deste mundo. Sem dúvidas, você desejará o
primeiro. Mas esteja ciente: a Palavra é viva e ativa. Ela a
conformará dividindo-a. E por meio dessa divisão, que é o
milagre dos milagres, ela a tornará completa. Nós nos
tornamos aquilo que contemplamos. Não sei quanto a
você, eu tenho muito “tornar-se” para fazer. Existe uma
vastidão entre aquilo que sou e aquilo que devo ser, mas
essa é uma vastidão capaz de ser transposta pela
misericórdia e graça daquele cuja face é a que eu mais
necessito contemplar. Ao contemplarmos a Deus,
tornamo-nos como ele.
Por essa razão, faça um estudo fiel daquele a quem você
deseja imitar, como filha amada. Estude tudo o que torna
Deus maravilhoso e imite essas coisas para o deleite do
seu coração, como uma expressão jubilosa do seu amor
recíproco por ele. Responda como Davi: “Buscarei, pois,
SENHOR, a tua presença’” (Sl 27.8). O Senhor se agrada
em levantar o seu rosto sobre aquele que o busca, agora e
para sempre. Estude bem os contornos do rosto de Deus.
Deixe que a contemplação de sua beleza toque sua mente
e coração. E seja transformada.
Recursos Recomendados

• Ajuda para Desenvolver um Método de Estudo


Confiável
Robert H. Stein. A Basic Guide to Interpreting the Bible:
Playing by the Rules, traduzido para o português como
Guia Básico para Interpretação da Bíblia. CPAD: Rio de
Janeiro, 2008.

• Sobre os Atributos de Deus


A. W. Pink. The Attributes of God. Available at
http://www.pbministries.org/books/pink/Attributes/,
traduzido para o português como Os Atributos de Deus,
Tradução de Odayr Olivetti. S.Paulo: PES, 1990.
A Editora Fiel tem como propósito servir a Deus através
do serviço ao povo de Deus, a Igreja.
Em nosso site, na internet, disponibilizamos centenas
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