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Andressa Vendrame

CORRELAÇÃO ENTRE ACUSAÇÃO E SENTENÇA

Centro Universitário Toledo


Araçatuba
2016
Andressa Vendrame

CORRELAÇÃO ENTRE ACUSAÇÃO E SENTENÇA

Monografia Jurídica apresentada, como requisito parcial


para obtenção do grau de Bacharel em Direito, à Banca
Examinadora do Centro Universitário Toledo, sob a
orientação do Professor Ms.Carlos Paschoalik Antunes.

Centro Universitário Toledo


Araçatuba
2016
BANCA EXAMINADORA

Prof.

Prof.

Prof.

Araçatuba, ____ de ___________ de 2016.


AGRADECIMENTOS

Agradeço inicialmente a Deus, que me deu saúde, força e sabedoria para enfrentar essa
jornada acadêmica.
A minha família, em especial ao meu pai, que me oportunizou estar aqui hoje, me
apoiou de forma incondicional e me incentivou nos momentos difíceis.
Agradeço aos meus amigos de faculdade, companheiros dessa jornada, que a fizeram
mais alegre e com certeza, inesquecível.
Ao meu querido orientador, Professor Carlos Paschoalik Antunes, por todo auxílio e
dicas imprescindíveis para a conclusão deste trabalho.
A todos que direta ou indiretamente fizeram parte de minha formação, o meu muito
obrigada.
RESUMO

O presente trabalho tem como sua principal finalidade explicar o princípio da correlação entre
acusação e sentença. Apresenta-se os sistemas inquisitório e acusatório, este último adotado
no Brasil e que ensejou a criação do referido princípio, que existe justamente para assegurar o
processo acusatório, com sua consequente separação de funções. Também apresenta-se o
princípio da ampla defesa e do contraditório, de essencial observância, pois são a base do
sistema acusatório. Informa-se o conceito de fato para o direito penal e para o processo penal,
além do conceito de identidade e seus desdobramentos. Por fim, apresenta-se a aplicação do
princípio da correlação no ordenamento jurídico brasileiro através dos institutos da emendatio
libelli e da mutatio libelli.

Palavras-chave: Sistema acusatório; Contraditório; Ampla defesa; Fato; Emendatio libelli;


Mutatio libelli.
ABSTRACT

This work has as its main purpose to explain the principle of correlation between accusation
and sentence. It presents the inquisitorial and accusatorial systems, the latter adopted in
Brazil, which led to the creation of that principle, which exists precisely to ensure the
adversarial process, with its consequent separation of functions. It also presents the principle
of legal defense and contradictory, essential compliance, since they are the basis of the
adversarial system. Informs the concept of fact to criminal law and criminal proceedings,
beyond the concept of identity and its consequences. Finally, the application of the principle
of correlation is presented in Brazilian legal system through the institutes of libelli emendatio
and libelli mutatio.

Keywords: Adversarial system; Contradictory; Full defense; Indeed; Emendatio libelli;


Mutatio libelli.
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO.................................................................................................................... 08
I - SISTEMA E PRINCÍPIOS INFORMADORES DA CORRELAÇÃO..................... 09
1.1- Sistema Acusatório e Sistema Inquisitório..................................................................... 09
1.2- Princípio do Contraditório.............................................................................................. 11
1.3- Princípio da Defesa......................................................................................................... 14
II - CORRELAÇÃO ENTRE ACUSAÇÃO E SENTENÇA........................................... 16
2.1- Identidade entre o fato imputado e o fato constante na sentença................................... 17
2.1.1- Conceito de fato para o processo penal e para o direito penal.....................................19
2.1.2- O conceito de identidade............................................................................................. 20
2.1.3- Regra geral de identidade ou solução no caso concreto.............................................. 21
2.1.3.1- Identidade e o critério teleológico da garantia do direito de defesa......................... 22
2.1.3.2- Regra de identidade: conteúdo da representação do fato imputado e do fato
considerado na sentença......................................................................................................... 23
2.2- A identidade do objeto do processo e o julgamento de toda a imputação...................... 29
2.3- Violação da regra da correlação entre acusação e sentença........................................... 31
2.4- Correlação entre acusação e sentença e ne bis in idem.................................................. 33
III - APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA CORRELAÇÃO NO ORDENAMENTO
JURÍDICO BRASILEIRO.................................................................................................. 36
3.1- Emendatio libelli.............................................................................................................36
3.1.1- Momento adequado..................................................................................................... 37
3.1.2- Transação penal e suspensão condicional do processo................................................39
3.1.3- Emendatio libelli em segunda instância...................................................................... 41
3.2- Mutatio libelli................................................................................................................. 42
3.2.1- Momento adequado..................................................................................................... 44
3.2.2- Procedimento............................................................................................................... 44
3.2.3- Fato diverso e fato novo.............................................................................................. 46
3.2.4- Mutatio libelli em ação privada................................................................................... 47
3.2.5- Mutatio libelli em segunda instância........................................................................... 48
CONCLUSÃO...................................................................................................................... 50
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS............................................................................... 51
8

INTRODUÇÃO

A presente monografia tem como tema o princípio da correlação entre acusação e


sentença e sua utilização no processo penal brasileiro.
No Brasil, a opção política do legislador foi adotar o sistema do processo acusatório,
onde as funções de acusar, julgar e defender são realizadas por pessoas distintas, e para
embasar esse sistema há vários direitos e garantias, como o direito ao contraditório, à ampla
defesa e a garantia do devido processo legal.
O princípio da correlação entre acusação e sentença existe justamente para assegurar o
processo acusatório, com sua consequente separação de funções e preservar os direitos e
garantias ligados ao processo penal, como os acima expostos.
A correlação entre acusação e sentença assegura o sistema acusatório ao passo que não
permite que o juiz aja de ofício, usurpando a função do órgão acusador e imputando fatos ao
réu não contidos na peça acusatória. Da mesma forma, preserva os direitos e garantias
processuais ao passo que assegura ao réu o contraditório e a ampla defesa, ao impossibilitar
que ele seja surpreendido na sentença por uma condenação que contém fatos dos quais ele não
se defendeu, tendo assim, o devido processo legal assegurado.
Faz parte desse tema dois institutos importantes, que são a emendatio libelli e a
mutatio libelli. Na emendatio libelli o juiz apenas corrige a tipificação dada aos fatos pelo
Ministério Público na peça acusatória, de modo que não infringe nenhum direito do acusado,
nem o devido processo legal. Já a mutatio libelli, ocorre durante a instrução processual
quando surge prova de circunstância ou elementar que não estava na peça acusatória. Assim,
como o réu não pode ser condenado por fatos dos quais não se defendeu, o juiz deve remeter
os autos ao Ministério Público para que ele realize o aditamento, de modo a preservar o
princípio da ampla defesa, do contraditório e consequentemente o sistema acusatório.
Como se nota, o princípio da correlação e seus institutos garantem o processo
acusatório com seus direitos e garantias.
9

I - SISTEMA E PRINCÍPIOS INFORMADORES DA CORRELAÇÃO

São vários os princípios informadores da correlação entre acusação e sentença, entre


eles se destacam o sistema acusatório e o sistema inquisitório.

1.1. Sistema Acusatório e Sistema Inquisitório

Os princípios da regra da correlação entre acusação e sentença encontram-se na


diferença entre sistema acusatório e sistema inquisitório.
O processo acusatório é caracterizado por ter acusação e defesa se enfrentando no
mesmo patamar, as quais se confrontam sob o crivo do contraditório e diante de um juiz.
Relata Guilherme de Souza Nucci:

Possui nítida separação entre o órgão acusador e o julgador; há a liberdade de


acusação, reconhecido o direito ao ofendido e a qualquer cidadão; predomina a
liberdade de defesa e a isonomia entre as partes no processo; vigora a publicidade do
procedimento; o contraditório está presente; existe a possibilidade de recusa do
julgador; há livre sistema de produção de provas; predomina maior participação
popular na justiça penal e a liberdade do réu é a regra (2015, p. 70).

Historicamente, o sistema acusatório é composto por um juiz que não tem iniciativa
probatória, ficando à cargo das partes fornecer qualquer tipo de prova, tendo mais valor a
prova testemunhal e a confissão do acusado, prevalecendo no entanto o princípio da
presunção de inocência e permanecendo o réu solto até que fosse definitivamente considerado
culpado.
No mais, nesse sistema há a publicidade dos atos processuais e a oralidade como
características fundamentais.
Ainda sobre as características do sistema acusatório, relata Fábio Capela:

Resumidamente, então, as características do sistema acusatório são:


a) Há separação entre as funções de acusar, julgar e defender, com três personagens
distintos: autor, juiz e réu (ne procedat iudex ex officio);
b) O processo é regido pelo princípio da publicidade dos atos processuais,
admitindo-se, como exceção, o sigilo na prática de determinados atos (no direito
brasileiro, art. 93, IX, da CRFB c/c art. 792, § 1º c/c art. 481, ambos do CPP);
c) Os princípios do contraditório e da ampla defesa informam todo o processo. O
réu é sujeito de direitos, gozando de todas as garantias constitucionais que lhe são
outorgadas;
10

d) O sistema de provas adotado é o do livre convencimento, ou seja, a sentença


deve ser motivada com base nas provas carreadas para os autos. O juiz está livre na
sua apreciação, porém não pode se afastar do que consta no processo (cf. art. 157 do
CPP c/ art. 93, IX, da CRFB);
e) Imparcialidade do órgão julgador, pois o juiz está distante do conflito de
interesses instaurado entre as partes, mantendo seu equilíbrio, porém dirigindo o
processo adotando as diligências necessárias à instrução do feito, indeferindo inúteis
ou meramente protelatórias (cf. art. 130 do CPC).
f) A oralidade, onde se tem como corolários: a predominância da palavra falada; a
imediatidade da relação do juiz com as partes e com os meios de prova; a identidade
física do julgador em todo decorrer do processo; e a concentração da causa no
tempo;
g) A regra é a liberdade do réu no decorrer da instrução processual, salvo os casos
de prisão cautelar.
(2008, p. 47-48)

Sobre o sistema acusatório e suas características, aduz Gustavo Henrique Badaró:

O sistema acusatório, com essas características históricas, vigorou durante quase


toda a Antiguidade grega e romana, bem como na Idade Média, nos domínios do
direito germano. Somente no século XIII entrou em declínio, passando a vigorar o
processo inquisitivo. Nos dias atuais, o processo penal inglês é o que mais se
aproxima do sistema acusatório puro (2013, p. 27).

Já no sistema inquisitório, existe a presença do juiz inquisidor, o qual acumula as


funções de acusar, defender e julgar, não existindo contraditório.
Relata Guilherme de Souza Nucci:

É caracterizado pela concentração de poder nas mãos do julgador, que exerce,


também, a função de acusador; a confissão do réu é considerada a rainha das provas;
não há debates orais, predominando procedimentos exclusivamente escritos; os
julgadores não estão sujeitos à recusa; o procedimento é sigiloso; há ausência de
contraditório e a defesa é meramente decorativa (2015, p. 69).

O juiz inquisidor tinha a liberdade de colher provas ex officio, não importando se a


prova seria benéfica ou se traria consequências negativas para o réu, o qual como regra
permanecia preso e incomunicável durante o processo.
Devido as características expostas, nota-se que o sistema inquisitorial é totalmente
incompatível com os princípios norteadores do atual sistema jurídico, o qual, dentre outras
coisas, preza pela imparcialidade do juiz, que não deve ligar-se psicologicamente à causa sob
pena de incorrer em julgamento injusto.
Sobre o sistema inquisitório, aduz Fernando Capez:

É sigiloso, sempre escrito, não é contraditório e reúne na mesma pessoa as funções


de acusar, defender e julgar. O réu é visto nesse sistema como mero objeto da
persecução, motivo pelo qual práticas como a tortura eram frequentemente admitidas
como meio para se obter a prova-mãe: a confissão (2014, p. 81).
11

Não obstante à existência desses dois modelos, surgiu com o Code d’Instruction
Criminalle francês, de 1808 o sistema misto, o qual se configura como a fusão dos dois
sistemas anteriores.
No sistema misto, há duas fases, a primeira inquisitória, na qual acontece o
recolhimento de provas, sem acusação, o que explica ser fora do crivo do contraditório. Se
apura o fato e a autoria, documentando as provas colhidas de forma escrita e secreta. E a
segunda fase, acusatória, a qual é pública e oral, além de existir a figura do acusado, do
acusador e do julgador.

Classicamente, define-se sistema processual misto como um modelo processual


intermediário entre o sistema acusatório e o sistema inquisitivo. Isso porque, ao
mesmo tempo em que há a observância de garantias constitucionais, como a
presunção de inocência, a ampla defesa e o contraditório, mantém ele alguns
resquícios do sistema inquisitivo, a exemplo da faculdade que assiste ao juiz quanto
à produção probatória ex officio e das restrições à publicidade do processo que
podem ser impostas em determinados casos (AVENA, 2012, p. 10).

Prevalecia a compreensão de que o atual código de processo penal era embasado no


sistema misto, sendo que o inquérito policial representava a fase inquisitorial e o processo
representava a fase acusatória.
Porém, devido a nova sistemática constitucional, o atual código de processo penal é
norteado pelo sistema acusatório, que apesar de haver um inquérito, há a presunção de
inocência e a separação entre acusação, defesa e órgão julgador.
Com relação ao que já foi exposto, vale ressaltar as palavras de Gustavo Henrique
Badaró:
Tudo isso vem destacar a direta vinculação das regras da correlação entre acusação e
sentença com o sistema acusatório. Não poderia ser diferente. Se as funções de
acusar e julgar se encontrassem concentradas nas mãos de uma só pessoa ou órgão,
pouca ou nenhuma relevância teria o tema. Separando-se as funções, como ocorre no
sistema acusatório, o papel de acusar caberá exclusivamente ao Ministério Público,
ou ao querelante nas ações penais de iniciativa privada, enquanto o juiz é quem
julgará a imputação formulada. Não poderá haver decisão judicial por parte do
acusador, bem como não será admissível falar-se em acusação ex officio. O juiz
somente julgará, jamais podendo acusar (2013, p. 31).

1.2. Princípio do Contraditório

O princípio do contraditório está na CF, em seu art. 5º, inciso LV, ou seja, é uma
garantia constitucional, a qual deve ser respeitada por todas as legislações vigentes.
12

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade
do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos
seguintes:
LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral
são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela
inerentes;

Com base no princípio do contraditório, o juiz tem que julgar o acusado com base nos
fatos que foram a ele imputados, sendo que é imprescindível que tenha sido concedida
oportunidade de o acusado se defender, apresentar a sua versão.
Em relação a esse princípio, relata Fábio Capela:

A vinculação que o pedido da parte acusadora tem sobre a matéria a ser decidida
pelo magistrado é uma decorrência do princípio do contraditório, pois se trata de
uma garantia dada às partes, principalmente ao réu, a regra de que o juiz não pode
julgar o acusado por fato diverso do apresentado na imputação penal (2008, p. 53).

Aduz Guilherme de Souza Nucci que o princípio do contraditório:

Quer dizer que a toda alegação fática ou apresentação de prova, feita no processo
por uma das partes, tem o adversário o direito de se manifestar, havendo um perfeito
equilíbrio na relação estabelecida entre a pretensão punitiva do Estado e o direito à
liberdade e à manutenção do estado de inocência do acusado (2015, p.37-38).

Relata Fernando Capez:

A importância do contraditório foi realçada com a recente reforma do Código de


Processo Penal, a qual trouxe limitação ao livre convencimento do juiz na
apreciação das provas, ao vedar a fundamentação da decisão com base exclusiva nos
elementos informativos colhidos na investigação, exigindo-se prova produzida em
contraditório judicial, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas
(cf. art. 155). O legislador manteve, dessa forma, a interpretação jurisprudencial já
outrora sedimentada, no sentido de que a prova do inquérito não bastaria
exclusivamente para condenação, devendo ser confirmada por outras provas
produzidas em contraditório judicial. Ressalva a lei as provas cautelares, não
repetíveis e antecipadas (2014, p.61-62).

Vale ressaltar o conceito clássico do contraditório, o qual foi criado por Joaquim
Canuto Mendes de Almeida, conforme esse conceito, o contraditório tem seus alicerces no
binômio informação – reação.
De acordo com esse conceito, é necessário que seja dada às partes informação, e
possibilitada a reação, ou seja, a informação necessariamente tem que ser concedida, tendo a
informação em mãos, a parte vai reagir se for de seu interesse.
Nesse sentido aduz Fábio Capela:
13

Este binômio de informação e reação, onde a primeira é imprescindível, já a segunda


é necessária apenas ser possibilitada, pode ter validade no processo civil, ou mesmo
no penal de outros tempos, pois hodiernamente se tem propugnado, no processo
penal, por um contraditório efetivo, real, substancial. Tanto que se exige defesa
técnica substancial do réu, ainda que revel (CPP art. 261), para que se tenha por
obedecido o mandamento constitucional. Para isso a norma é completada por aquela
outra do CPP, art. 497, V, que manda seja dado defensor ao réu, quando o juiz o
considerar indefeso (2008, p. 54).

Outro ponto importante diz respeito ao contraditório sobre questões de direito,


recentemente o entendimento é que o contraditório não deve incidir apenas sobre as questões
de fato, devendo incidir também sobre as de direito.
Deve ser concedida às partes a oportunidade de se manifestar sobre a lei a ser usada no
caso concreto.
Relata Gustavo Henrique Badaró:

Pode se falar, então, em um verdadeiro dever do juiz de provocar o prévio


contraditório entre as partes, sobre qualquer questão que apresente relevância
decisória, seja ela processual ou de mérito, de fato ou de direito, prejudicial ou
preliminar. O desrespeito ao contraditório sobre as questões de direito expõe as
partes ao perigo de uma sentença de surpresa (2013, p. 37).
Em face da previsão constitucional do princípio do contraditório, em termos amplos
e abertos, sua interpretação deve ser no sentido de um contraditório pleno e efetivo,
com ampla participação do juiz, que deve respeitar e, se necessário, implementar o
contraditório em relação às partes, mas também observando ele mesmo o
contraditório, que deverá instaurar-se previamente, tanto em relação à matéria fática
quanto às questões de direito, que não poderão ser objeto de decisão que cause
surpresa às partes ( 2013, p. 39).

Decidiu o STJ em HC:

HABEAS CORPUS. APELAÇÃO. DEFESA CONSTITUÍDA.


DETERMINAÇÃO DO JUÍZO DE PRIMEIRO GRAU FOSSEM TODAS AS
PUBLICAÇÕES FEITAS EM NOME DA ADVOGADA CONSTITUÍDA
PELO PACIENTE. INTIMAÇÃO REALIZADA EM NOME DA
DEFENSORIA PÚBLICA. VIOLAÇÃO À AMPLA DEFESA E AO
CONTRADITÓRIO. NULIDADE ABSOLUTA.
1. A alegada ausência de defesa, na espécie, restou comprovada nos autos,
porquanto a Corte de origem intimou, para o julgamento do apelo, a Defensoria
Pública e não a Advogada constituída nos autos. 2. Sendo assim, resta configurada a
nulidade absoluta, devendo o julgamento da apelação ser anulado e renovado o ato,
agora com a intimação da advogada constituída. 3. Habeas corpus concedido para
anular o julgamento da apelação. Ratificada a liminar outrora concedida.
(STJ - HC: 316363 SP 2015/0031735-9, Relator: Ministra MARIA THEREZA DE
ASSIS MOURA, Data de Julgamento: 28/04/2015, T6 - SEXTA TURMA, Data de
Publicação: DJe 06/05/2015)
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1.3. Princípio da Defesa

O princípio da defesa também está garantido na CF em seu art. 5º, LV:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade
do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos
seguintes:
LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral
são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela
inerentes;

Aduz Fernando Capez:

Implica o dever de o Estado proporcionar a todo acusado a mais completa defesa,


seja pessoal (autodefesa), seja técnica (efetuada por defensor) (CF, art. 5º, LV), e o
de prestar assistência jurídica integral e gratuita aos necessitados (CF, art. 5º,
LXXIV). Desse princípio também decorre a obrigatoriedade de se observar a ordem
natural do processo, de modo que a defesa se manifeste sempre em último lugar.
Assim, qualquer que seja a situação que de ensejo a que, no processo penal, o
Ministério Público se manifeste depois da defesa (salvo, é óbvio, nas hipóteses de
contrarrazões de recurso, de sustentação oral ou de manifestação dos procuradores
de justiça, em segunda instância), obriga, sempre, seja aberta vista dos autos à
defensoria do acusado, para que possa exercer seu direito de defesa na amplitude
que a lei consagra. O Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, em seu art.
14, 3, d, assegura a toda pessoa acusada de infração penal o direito de se defender
pessoalmente e por meio de um defensor constituído ou nomeado pela Justiça,
quando lhe faltarem recursos suficientes para contratar algum (2014, p. 62).

Ao acusado deve ser assegurado o direito de se defender, utilizando todos os meios em


direito admitidos e para que esse direito seja efetivo também é necessário que seja concedido
tempo hábil para tanto.

Outro aspecto relevante a destacar com relação ao direito de defesa é a necessidade


de um tempo hábil para sua preparação e exercício. Conferir ao réu o direito de
defesa, sem oferecer-lhe tempo suficiente para sua preparação é esvaziar tal direito.
Deve haver um tempo razoável entre a comunicação do ato em relação ao qual
deverá ser exercida a defesa e o prazo final para tal exercício. Defesa sem tempo
suficiente é ausência de defesa, ou no mínimo, defesa ineficiente (BADARÓ, 2013,
p. 42).

O princípio da defesa, ou ampla defesa, é profundamente relacionado com o princípio


do contraditório, pois a defesa é desdobramento do contraditório, por meio dela o acusado
apresenta sua versão dos fatos, contradiz a parte contrária. É um dos princípios mais
importantes do processo penal, tem que haver a oportunidade de defesa para que haja a
justiça.
15

Alguns doutrinadores o desdobram em três garantias: direito à informação,


bilateralidade da audiência e direito a prova legalmente obtida ou produzida.
Nesta linha ensina Norberto Avena:

a) Direito à informação (Nemo inauditus damnari potest): a garantia constitucional


da ampla defesa envolve a necessidade de conhecimento, pelo réu, dos atos do
processo, a fim de que possa exercer sua defesa. Conhecendo a realidade
materializada nesses atos, em especial aqueles relacionados à produção de prova
(atos instrutórios), poderá o réu, ao ser ouvido em juízo, pessoalmente ou por
intermédio de seu defensor (nemo inauditus damnari potest = ninguém pode ser
julgado sem antes ser ouvido), prestar, com maior efetividade, sua versão quanto aos
fatos.
b) Bilateralidade da audiência (contraditoriedade): também conhecido como
princípio da audiência bilateral, significa que as partes devem ser ouvidas pelo juiz,
no sentido de participar da formulação de seu convencimento, fornecendo-lhe suas
razões, por meio da defesa de seus interesses.
c) Direito à prova legalmente obtida ou produzida (comprovação da
inculpabilidade): trata-se da faculdade conferida às partes no sentido de produzir e
trazer ao processo as provas que reputem necessárias à demonstração da verdade dos
fatos que alegam, condicionando-se, contudo, a que sejam pertinentes e relevantes
no tocante ao fim a que se destinam, bem como a que tenham sido obtidas por meios
lícitos.
(2012, p. 38)

Decidiu o STJ em HC:

PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. SONEGAÇÃO FISCAL.


DENÚNCIA. INÉPCIAFORMAL. NARRATIVA DOS FATOS. CARÁTER
LACÔNICO. AMPLA DEFESA.VIOLAÇÃO. RECONHECIMENTO.
1. A perfeita descrição do comportamento irrogado na denúncia é pressuposto para
o exercício da ampla defesa. Do contrário, a peça lacônica causa perplexidade,
prejudicando tanto o posicionamento pessoal do réu em juízo como a atuação do
defensor técnico. In casu, a inserção do paciente no universo acusatório sem se lhe
atribuir, de modo claro, qual teria sido sua contribuição efetiva para a prática do
crime de sonegação fiscal, conduz ao reconhecimento de prejuízo para a defesa,
dada a ausência de individualização de sua contribuição causal. Ademais, causa
perplexidade o fato de o Parquet, no amplo universo da administração societária, ter
pinçado, sem mais, exclusivamente o paciente. 2. Ordem concedida para anular as
Ações Penais n.º 86.01. e n.º 486.01., da Vara Única da Comarca de Quatá -SP , a
partir da denúncia, inclusive, reconhecendo sua inépcia formal, sem prejuízo de que
outra seja oferecida com a obediência aos parâmetros legais.
(STJ - HC: 100128 SP 2008/0030092-2, Relator: Ministra MARIA THEREZA DE
ASSIS MOURA, Data de Julgamento: 01/09/2011, T6 - SEXTA TURMA, Data de
Publicação: DJe 19/09/2011)
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II - CORRELAÇÃO ENTRE ACUSAÇÃO E SENTENÇA

Tem que haver a correlação entre a acusação e a sentença para que haja respeito as
garantias fundamentais da ampla defesa e do contraditório. O acusado não pode ser pego de
surpresa com uma sentença baseada em fatos dos quais ele não teve a oportunidade de se
defender.
Relata Fernando Capez:

É princípio garantidor do direito de defesa do acusado, cuja inobservância acarreta a


nulidade da decisão. Por princípio da correlação entende-se que deve haver uma
correlação entre o fato descrito na denúncia ou queixa e o fato pelo qual o réu é
condenado. O juiz não pode julgar o acusado extra petita, ultra petita ou citra petita;
vale dizer, não pode desvincular-se o magistrado da inicial acusatória julgando o réu
por fato do qual ele não foi acusado (2014, p. 538).

Aduz Guilherme de Souza Nucci:

É a regra segundo a qual o fato imputado ao réu, na peça inicial acusatória, deve
guardar perfeita correspondência com o fato reconhecido pelo juiz, na sentença, sob
pena de grave violação aos princípios do contraditório e da ampla defesa,
consequentemente, ao devido processo legal (2015, p. 608).

As jurisprudências abaixo expõe a importância da correlação nos casos concretos:

REVISÃO CRIMINAL - DOSIMETRIA - APLICAÇÃO DA CAUSA DE


AUMENTO DO ART. 71 DO CPB NA SENTENÇA - NÃO DESCRIÇÃO DA
CONTINUIDADE DELITIVA NA DENÚNCIA - VIOLAÇÃO DO
PRINCÍPIO DA CORRELAÇÃO - OCORRÊNCIA - DECOTE DA
MAJORANTE QUE SE IMPÕE - INDENIZAÇÃO - NÃO CABIMENTO -
RESSARCIMENTO DA MULTA PAGA A MAIOR - POSSIBILIDADE.
- Incabível é a condenação do acusado por crime ou elementar não descrita na
denúncia, sem oferecer-lhe oportunidade para manifestar-se, na forma do art. 384 do
Código de Processo Penal. - A sentença que reconhece circunstância não prevista
em lei incorre em evidente erro, sendo, portanto, passível de correção pela via da
Revisão Criminal. - Se não há prova do efetivo prejuízo suportado pelo condenado
proveniente de erro do Estado, incabível se falar em indenização. - Reduzido o
"quantum" dos dias-multa da condenação, cabível é o ressarcimento do valor pago a
maior pelo agente.(TJ-MG - RVCR: 10000150421972000 MG, Relator: Catta Preta,
Data de Julgamento: 14/09/2015, Grupo de Câmaras Criminais / 1º GRUPO DE
CÂMARAS CRIMINAIS, Data de Publicação: 18/09/2015). Disponível em:
<www.jusbrasil.com.br/jurisprudencias> Acesso em: 16-07-2016.
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APELAÇÃO CRIMINAL - DISPARO DE ARMA DE FOGO - OFENSA AO


PRINCÍPIO DA CORRELAÇÃO - OCORRÊNCIA - ABSOLVIÇÃO QUE SE
IMPÕE - POSSE ILEGAL DE MUNIÇÃO - REGISTRO DE ARMA DE
FOGO COMPATÍVEL - EXISTÊNCIA - ATIPICIDADE DA CONDUTA -
ABSOLVIÇÃO QUE SE IMPÕE.
01. Em obediência ao princípio da correlação - corolário do postulado constitucional
da ampla defesa e do contraditório - vedado está o magistrado de julgar o réu por
fato não descrito na exordial acusatória, eis porque inadmissível a condenação do
apelante pelo crime de disparo de arma de fogo. 02. A posse de munição, quando
associada a arma de fogo devidamente registrada, ainda que de calibre diverso,
contanto que compatível, não ofende o bem jurídico tutelado pela norma
incriminadora. (TJ-MG - APR: 10105100321873001 MG, Relator: Fortuna Grion,
Data de Julgamento: 25/03/2014, Câmaras Criminais / 3ª CÂMARA CRIMINAL,
Data de Publicação: 04/04/2014)
Disponível em: <www.jusbrasil.com.br/jurisprudencias> Acesso em: 16-07-2016.

E por fim:
RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. PRONÚNCIA. PRELIMINAR.
SUBMISSÃO DA RÉ A JULGAMENTO PELO TRIBUNAL DO JÚRI COM
FUNDAMENTO EM CIRCUNSTÂNCIA NÃO NARRADA NA DENÚNCIA.
OFENSA AO PRINCÍPIO DA CORRELAÇÃO. OCORRÊNCIA. SENTENÇA
ANULADA. PRELIMINAR ACOLHIDA.
- No processo penal, a mínima alteração da narrativa contida na denúncia, com a
inclusão de elementos ou circunstâncias não descritos na peça originalmente
ofertada, deve se submeter às regras do art. 384 do CPP. - Se a denúncia narra que a
acusada agiu sob a influência do estado puerperal e não menciona ter procedido com
animus necandi, é defeso ao juiz na sentença de pronúncia reconhecer esta
circunstância não descrita, sob pena de violação ao princípio da correlação. -
Preliminar acolhida. (TJ-MG - Rec em Sentido Estrito: 10625100046220001 MG,
Relator: Nelson Missias de Morais, Data de Julgamento: 29/08/2013, Câmaras
Criminais / 2ª CÂMARA CRIMINAL, Data de Publicação: 09/09/2013) Disponível
em: <www.jusbrasil.com.br/jurisprudencias> Acesso em: 16-07-2016.

2.1. Identidade entre o fato imputado e o fato constante na sentença

No processo penal o acusado defende-se dos fatos que foram a ele imputados pela
acusação, e não da classificação formulada pela acusação. Por essa razão a sentença tem que
estar de acordo com os fatos descritos na peça acusatória, sob pena de violar os princípios do
contraditório e da ampla defesa.
Sendo assim, o objeto do processo, que são os fatos nele descrito, em regra devem
permanecer inalterados, desde a peça acusatória até a sentença, e caso venham a mudar, deve
ser respeitado o princípio do contraditório.

A regra da correlação entre o fato imputado e o fato constante na sentença implica


que o objeto do processo permaneça inalterado, durante todo o desenvolver do iter
procedimental. Não pode haver alteração do objeto do processo, considerado em
seus momentos extremos. Desde o momento inicial, com a acusação, até o seu
término, com a sentença, o objeto do processo não pode, em regra, sofrer alterações
(BADARÓ, 2013, p. 99)
18

A classificação formulada pela acusação é importante, mas não há problemas se ela


estiver errada, a peça acusatória será recebida da mesma forma. O acusado não se defende da
classificação formulada, mas sim dos fatos. Os fatos que são importantes, pois à partir deles
que o advogado vai formular a defesa do acusado, e em regra eles devem permanecer
inalterados desde a peça acusatória até a sentença.
Sobre a regra de o objeto do processo permanecer inalterado, ressalta Gustavo
Henrique Badaró:
Isso não quer dizer que todo objeto do processo deve permanecer imutável.
Identificado o objeto do processo como o objeto da imputação, não significa que
todo o fato imputado deva permanecer inalterado, ou que o juiz não possa
sentenciar, ainda que considerando algo diverso do que foi imputado. A questão é
saber em que medida é possível alterar o objeto do processo, sem que tal mudança
viole o contraditório. É possível admitir mudanças no objeto do processo, sem que
isso represente uma quebra da regra da correlação entre acusação e sentença, desde
que a variação se verifique em um aspecto não relevante do fato imputado. E é o
perímetro dentro do qual se desenvolveu o contraditório que determinará a
relevância ou irrelevância de tal alteração (2013, p. 100).

O objeto do processo penal possui caráter dinâmico, isso acontece devido à


importância que a verdade real tem no processo penal. O juiz penal deve buscar a verdade
real, por isso, se surgirem fatos diversos durante o processo, ele deve conhecê-los e
oportunizar às partes o contraditório. O HC 170093 do STJ, expõe a busca da verdade real:

HABEAS CORPUS. IMPETRAÇÃO SUBSTITUTIVA DE RECURSO


ESPECIAL. IMPROPRIEDADE DA VIA ELEITA. ROUBO DUPLAMENTE
CIRCUNSTANCIADO. REJEIÇÃO DA DENÚNCIA. RECEBIMENTO
PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. RECONHECIMENTO FOTOGRÁFICO
NA FASE POLICIAL. POSSIBILIDADE. EXAME APROFUNDADO DAS
PROVAS. VEDAÇÃO. PRISÃO CAUTELAR. CONCRETA MOTIVAÇÃO.
AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE PATENTE. NÃO CONHECIMENTO.
1. É imperiosa a necessidade de racionalização do emprego do habeas corpus, em
prestígio ao âmbito de cognição da garantia constitucional, e, em louvor à lógica do
sistema recursal. In casu, foi impetrada indevidamente a ordem como substitutiva de
recurso especial. 2. O trancamento da ação penal em sede de habeas corpus é medida
excepcional, somente se justificando se demonstrada, inequivocamente, a absoluta
falta de provas, a atipicidade da conduta ou a existência de causa extintiva da
punibilidade, inocorrentes da espécie. 3. Hipótese em que a Corte estadual bem
analisou as provas produzidas no curso do inquérito policial e concluiu serem
suficientes para a persecução penal e para a decretação da custódia cautelar. Não há
como inverter o decidido nesta via estreita, em que vedado o exame aprofundado das
provas. 4. O Superior Tribunal de Justiça já assentou a possibilidade de ser realizado
reconhecimento fotográfico na fase policial, com posterior ratificação em juízo de
forma pessoal, o que ainda ocorrerá após a prisão do paciente e o prosseguimento da
ação penal. 5. Inexiste ilegalidade se a Corte estadual apresentou concreta
fundamentação para justificar a prisão cautelar do paciente para a garantia da ordem
pública, destacando sua real periculosidade, evidenciada pelo modus operandi do
delito, bem como a existência de condenações anteriores. 6. Writ não conhecido.
(STJ - HC: 170093 SP 2010/0073326-9, Relator: Ministra MARIA THEREZA DE
ASSIS MOURA, Data de Julgamento: 15/08/2013, T6 - SEXTA TURMA, Data de
Publicação: DJe 26/08/2013)
Disponível em: <www.jusbrasil.com.br/jurisprudencias> Acesso em: 16-07-2016.
19

2.1.1. O conceito de fato para o processo penal e para o direito penal

O conceito de fato no processo penal e no direito penal são distintos, e para o estudo
do tema da correlação entre acusação e sentença é importante saber o conceito em cada um
deles.
O conceito de fato vai além do que a ciência do direito pode apresentar. Mesmo no
campo jurídico, o seu conceito varia muito de acordo com a área do direito a qual apresenta
sua definição.
No direito penal e no processo penal o fato apresenta diferentes conceitos. No direito
penal fato é algo abstrato, conduta que pode ser praticada ou não por alguém, algo que pode
acontecer, no processo penal fato é algo concreto, que realmente possa ter acontecido,
condutas que em tese foram praticadas pelo sujeito.

O fato processual penal é um acontecimento histórico concreto, um fato


naturalístico. Diversamente, o fato na concepção do direito penal é uma entidade
extraída de uma situação hipotética, de um tipo penal, e não um fato concreto que
foi realizado pelo autor e que foi introduzido no processo através de imputação
(BADARÓ, 2013, p. 101).

É necessário frisar que o fato no processo penal pode não ter acontecido, pois o fato
imputado que está sendo imputado a alguém configura-se como uma hipótese, o qual poderá
deixar de ser uma hipótese apenas na sentença. Só na sentença é que poderá se afirmar se o
fato realmente ocorreu ou não.

Com isso não se quer dizer, contudo, que o fato imputado, necessariamente, existiu
ou ocorreu. O fato está sendo imputado, atribuído a alguém, mas não se sabe ainda
se ele existiu ou não. Tal certeza somente será alcançada no momento da sentença.
Assim, embora possa parecer contraditório, o fato processual, isto é, o fato
imputado, que constitui o objeto do processo, não deixa de ser algo hipotético, no
sentido de que não se tem certeza, ou melhor, tem-se, apenas, uma suspeita de que
aquele acontecimento concreto, aquele suceder histórico, efetivamente ocorreu. O
fato processual é um concreto acontecimento histórico tido por existente, mas que
pode não ter efetivamente existido (BADARÓ, 2013, p. 101-102).

O processo gira em torno do objeto, que são os fatos imputados, não gira em torno do
tipo penal, sendo assim o acusado se defende dos fatos, a defesa trabalha de modo com que os
fatos ao final do processo sejam considerados inexistentes ou se existentes, que tenham
ocorrido de forma diferente. Todo processo tem objeto, mesmo no que ao final tem como
resultado uma sentença penal absolutória, nesses casos o objeto é o fato que hipoteticamente
ocorreu.
20

Em relação ao tema relata Gustavo Henrique Badaró:

A relevância da distinção avulta quando se busca estabelecer em que medida é


possível a alteração do fato, sem que isso represente uma mutação do objeto do
processo. Assim, afirmações no sentido de que é possível mudar os fatos acidentais
permanecendo imutável o fato essencial, ou que devem permanecer imutáveis os
fatos que digam respeito aos elementos do delito, podendo variar suas
circunstâncias, mostram-se totalmente equivocadas, por partirem de uma falsa
premissa. Se o objeto do processo é o fato imputado, isto é, o fato processual, trata-
se de um fato concreto, um acontecimento real e indivisível. O fato imputado deixa
de ser aquele fato se ocorrer uma mudança em qualquer de seus aspectos, sendo
indiferente que esses, à luz do fato penal, sejam elementos ou circunstâncias do
delito (2013, p. 102).

2.1.2. O conceito de identidade

Para se falar em identidade, é necessário que exista duas coisas distintas para fazer
uma comparação.
No caso do tema em estudo, a identidade se relaciona com a ideia da comparação entre
as representações que são feitas no momento da imputação dos fatos e no momento da
sentença.
Porém, ao comparar as representações feitas no momento da imputação dos fatos e no
momento da sentença, pode ser que se chegue à conclusão de que elas não são idênticas.

A relação de identidade entre as duas representações não se estabelece em termos


absolutamente lógicos, exigindo uma identidade total e absoluta. Trata-se de um
conceito de identidade jurídico e não lógico. A representação do fato contido na
imputação não precisa ser absolutamente idêntica à representação do mesmo fato
contida na sentença. Não é necessário que haja uma adequação perfeita em toda sua
extensão. Pode haver variação de alguns elementos de ambas as representações dos
fatos, sem que isso represente variação do objeto do processo (BADARÓ, 2013, p.
103-104).

Além das considerações sobre o fato feitas por Badaró, vale fazer algumas
considerações sobre a imputação, que são de muita importância no processo penal.
A imputação é a atribuição de um fato considerado pelo direito penal fato típico, é a
atribuição de um fato considerado um ilícito penal, tipificado em algum dos artigos do código
penal. Ou seja, é a atribuição de um fato que realmente aconteceu, um fato concreto, que por
suas características se enquadrou em algum dos artigos do código penal.
21

Sobre a imputação aduz Gustavo Henrique Badaró:

A qualificação jurídica do fato também integra a imputação. Porém, permanecendo


inalterado o substrato fático da imputação, eventual mudança da qualificação
jurídica de tal fato não representa, para fins de correlação entre acusação e sentença,
quebra da identidade do objeto do processo. A relação de correlatividade, portanto,
diz respeito, unicamente, ao fato e não ao direito. Contudo, embora possa o juiz
alterar a qualificação jurídica dos fatos, sem que se altere o objeto do processo, isso
não significa que não deva ele próprio respeitar e fazer observar o contraditório,
determinando que as partes se manifestem, previamente, sobre a nova definição
jurídica que poderá ser dada ao fato imputado (2013, p. 104-105).

Sobre a identidade do objeto do processo também é importante ressaltar que o juiz


deve julgar toda a imputação. Não pode haver sentença citra petita. O juiz é obrigado a julgar
toda a imputação e além disso, deve motivar sua decisão. Também não pode o juiz proferir
sentença ultra petita ou extra petita, ele tem que se ater ao processo, aos fatos que ele tem
acesso à partir dos autos.
Pode acontecer também de o juiz não se convencer de toda a imputação, e condenar o
acusado com base no que, levando-se em consideração as provas dos autos, se convenceu,
com base em parte da imputação.
Por exemplo, a imputação pode ter sido de roubo, em que a acusação narra que
mediante violência ou grave ameaça um indivíduo subtraiu coisa alheia móvel de outro, e
tendo em vista as provas dos autos, o juiz pode se convencer que houve furto, devido à
ausência de violência ou grave ameaça, e condenar o acusado por furto. Nesse caso o juiz
julgou toda a imputação.

2.1.3. Regra geral de identidade ou solução no caso concreto

É possível arquitetar uma regra geral de identidade ou solução no caso concreto, mas
nem sempre o problema da correlação entre acusação e sentença pode ser resolvido através de
uma regra geral.
Porém, sendo a imputação a atribuição de um fato concreto, e portanto específico e
único, a busca de uma regra geral é, na verdade, a procura de um parâmetro
uniforme que possa ser utilizado na generalidade dos casos, permitindo estabelecer
quando é possível ou em que hipótese é vedado considerar determinada alteração do
fato imputado na sentença (BADARÓ, 2013, p. 106).
22

2.1.3.1. Identidade e o critério teleológico da garantia do direito de defesa

A regra da correlação entre acusação e sentença tem o objetivo de concretizar o direito


de defesa do réu, pois por meio dessa regra o réu fica garantido que a sentença vai estar de
acordo com os fatos imputados na acusação, não existindo o risco de o réu se surpreender com
uma sentença injusta, a qual apresenta fatos os quais não foram objeto do contraditório e da
ampla defesa.
O direito de defesa é empregado para verificar se houve alteração nos fatos imputados
ao réu, no objeto do processo. Pois se durante a instrução ou no momento da sentença os fatos
forem modificados, mas isso não tiver gerado prejuízo para a defesa, considera-se que os fatos
não foram alterados, porém, se os fatos tiverem sido modificados e, devido a essa modificação
a defesa teve prejuízos, considera-se que os fatos foram alterados.
Em relação a condenação por fato diverso, há doutrinadores que admitem, quando
representar benefício ao réu, ou seja, quando gerar uma pena mais branda. Por exemplo,
quando na imputação a acusação tiver narrado os fatos de forma a enquadrá-los no crime de
homicídio, e na sentença o juiz, com base nas provas do processo, condenar o acusado por
lesão corporal seguida de morte.

A regra da correlação entre acusação e sentença tem conteúdo mais amplo, visando a
preservar a garantia do contraditório, que, sem dúvida, encontra-se intimamente
ligado ao direito de defesa. Porém, conforme já acreditamos ter demonstrado, o
contraditório não visa a assegurar apenas o direito de defesa, ou assegurar a posição
do réu no processo. O contraditório, ao possibilitar a participação dos interessados, é
elemento de legitimidade da própria função jurisdicional, interessando também ao
Estado e não apenas ás partes. Por outro lado, no que diz respeito às partes, é certo
que o contraditório deve ser assegurado e preservado em relação a ambas, autor e
réu (BADARÓ, 2013, p. 112).

No mais, haverá a violação ao princípio da correlação entre acusação e sentença e ao


princípio do contraditório se na sentença tiverem fatos que não foram imputados ao réu na
peça acusatória, sendo que, não importa se esses fatos beneficiam ou não o réu, e não haverá a
violação ao princípio da defesa, se esses fatos novos apresentados na sentença não
significarem prejuízo ao réu.
23

2.1.3.2. Regra de identidade: conteúdo da representação do fato imputado e do fato


considerado na sentença

O entendimento doutrinário é que qualquer modificação nos elementos do delito


fazem com que os fatos mudem, com que o objeto processual mude.
Aduz Gustavo Henrique Badaró:

Assim, haveria mutação do objeto do processo, violando-se a regra da correlação


entre acusação e sentença, quando variassem os elementos materiais (ação ou
omissão, o evento e a relação de causalidade) ou o elemento subjetivo (dolo, culpa
ou preterdolo), ou ainda as circunstâncias agravantes do delito.
Tal concepção, mais uma vez, toma por base o fato penal. Porém, o fato processual
não se confunde com o fato penal: o primeiro é um concreto acontecimento
histórico, enquanto o segundo é um modelo abstrato. Tal distinção é relevante para a
solução do problema, e afasta velhas fórmulas que recorrem à distinção entre
elementos essenciais, que não poderiam ser modificados, e elementos acidentais,
que, livremente, podem ser alterados. Também impede que se considere no fato
processual o elemento subjetivo do delito (2013, p. 113).

Qualquer mudança, seja nos elementos acidentais ou essenciais, implicam em


mudança no fato. No processo penal o fato é um acontecimento histórico, são ações que
ocorreram em um determinado tempo e lugar, sendo que o elemento ser acidental ou essencial
não interfere no seu grau de importância, os dois são igualmente importantes e qualquer
mudança neles implica em mudança no objeto do processo.
Há muita discussão sobre quais tipos penais podem ser alterados para configurar
outros sem que isso implique alteração nos fatos. Por exemplo, quando se pode mudar a
tipificação de homicídio para lesão corporal seguida de morte ou de roubo para furto.
Porém, o caso concreto é que deve ser analisado. Deve se observar se os fatos que
foram tipificados erroneamente como sendo um crime têm todos os elementos necessários
para que se configure outro crime.
Se não fosse assim, através de casos concretos, e considerando que a primeira
tipificação foi feita de forma errada, estaria se admitindo que os mesmos fatos poderiam
configurar mais de um tipo penal, o que seria inaceitável.
Relata Badaró:

O tema da correlação entre acusação e sentença é pertinente ao fato processual, isto


é, ao concreto acontecimento histórico imputado ao réu. A importância está na
relevância processual do fato. Por isso, concretamente, o que pode ser indiferente em
relação a uma imputação pode ser relevante em relação à outra, ainda que se trate do
mesmo tipo penal. Assim, o que é acidental em relação ao tipo penal- por exemplo,
uma agravante- pode modificar o fato processual, isto é, o objeto do processo (2013,
p. 115).
24

A mudança do fato que tem relevância para o direito penal, também terá relevância
para o processo penal, isso porque para se adequar uma conduta num tipo penal é necessário
que a pessoa tenha agido de forma a enquadrar sua ação nesse tipo penal.
Para o processo penal, não importa se os elementos são acidentais ou essenciais, a
alteração de qualquer deles representa alteração do objeto do processo. Um fato que é
circunstancial ou acidental no âmbito do direito penal, no âmbito do processo penal pode se
apresentar como tendo relevância. Aduz Gustavo Henrique Badaró:

Por outro lado, pode ocorrer uma alteração que seja processualmente relevante, sem
que signifique modificação do fato penal. As alterações relevantes do fato
processual podem incidir, sob a ótica do fato penal, nas circunstâncias do delito, mas
o que é circunstancial para o direito penal pode ser relevante para o processo penal,
a acidentalia delicti pode ser um aspecto relevante do fato processual,
principalmente em face da defesa apresentada pelo réu (2013, p. 115).

Exemplificando a diferença de relevância entre o fato no direito penal e no processo


penal, suponha-se que a um indivíduo tenha sido imputado ter roubado outro, utilizando para
tanto um revólver, e que esse roubo tenha ocorrido no dia 5 de janeiro, o juiz pode
tranquilamente, com base nas provas dos autos condenar o indivíduo por ter praticado o
referido roubo utilizando uma garrucha e considerar, também com base na prova dos autos,
que esse roubo aconteceu no dia 6 de janeiro e não no dia 5. Essa mudança dos fatos tem
relevância para processo penal, mas não tem para o direito penal.
As regras da correlação entre acusação e sentença têm o intuito de preservar o
princípio do contraditório, pois a partir da regra só os fatos imputados ao réu na peça
acusatória poderão ser tomados como base no momento da sentença.
Na mesma linha de raciocínio, também pode se afirmar que a relevância de uma
eventual mudança nos fatos é dada pelo que a defesa vai afirmar acerca desses fatos que
foram alterados. Os fatos podem ser alterados e a defesa concordar com a mudança, devido
não ter tido prejuízo, de outro lado, a defesa vai se manifestar em sentido contrário, se com a
alteração dos fatos, ela tiver algum prejuízo.
No primeiro caso a alteração dos fatos não foi relevante, no segundo caso a alteração
dos fatos foi relevante. Nesse sentido, dispõe:

Sempre que a mudança do fato processual resultar em alteração de um elemento do


delito, ao se ter em vista o fato penal, haverá relevância processual e o prejuízo
causado à defesa é evidente. Porém, quando a mudança do fato processual atingir
um dado fático que, do ponto de vista do fato penal, seja considerado uma
circunstância do crime, para se verificar a relevância ou não de tal alteração, o
prejuízo deverá ser aferido em face da defesa efetivamente apresentada no caso
concreto (BADARÓ, 2013, p. 116).
25

A defesa não pode mudar o objeto do processo, ela não pode ampliá-lo ou alterá-lo. É
a peça de acusação que vai delimitar o objeto do processo, o que cabe à defesa é apenas expor
suas alegações com o objetivo de convencer o juiz que sua tese é a correta, com o objetivo de
ampliar o objeto de análise do juiz. Essas alegações feitas pela defesa sobre o fato imputado
que vão dar relevância ou não aos fatos imputados pela acusação. Em regra, todos os fatos
imputados pela acusação têm relevância penal, porém só os contestados pela defesa que tem
relevância processual.
Antes do juiz condenar o acusado pela prática de tipo penal diverso ao que foi
imputado a ele na acusação, deverá ser concedida a oportunidade de o acusado se defender, se
essa condenação for causar surpresa ao acusado.
Relata Gustavo Henrique Badaró:

Pode acontecer, ainda, que a alteração de um fato, relevante do ponto de vista do


direito penal, também seja processualmente relevante. Em tal hipótese, temos uma
alteração relevante tanto penal quanto processualmente. Mais uma vez, mostra-se o
desacerto das teorias que procuram estabelecer, abstratamente, quais as
possibilidades de alteração de um tipo penal para outro (2013, p.118).

Um exemplo do relatado acima, é um caso em que inicialmente foi imputado ao


acusado a prática de lesão corporal seguida de morte, porém, com base na prova dos autos
descobre-se que na verdade os fatos caracterizam homicídio. Nesse caso há alteração do tipo
penal e dos fatos processuais.

A questão pode se mostrar ainda mais sutil. Há situações em que a alteração pode
ser processual e penalmente relevante, mesmo que, em relação a esse último, não se
altere o tipo penal invocado. A identidade do título do delito, contido na acusação e
na sentença, não é suficiente para excluir a modificação do fato, visto que pode
haver identidade de tipo penal e diversidade de fato, como, por exemplo, nos tipos
culposos, nos crimes de forma vinculada, ou nos tipos penais múltiplos (BADARÓ,
2013, p. 118).

Iniciando a explicação dos crimes considerados culposos, esses têm que ser
caracterizados na peça acusatória como negligentes (desprezar, desatender, não cuidar),
imprudentes (falta de atenção, descuido) ou imperitos (ignorância, inexperiência). Dessa
forma não pode se admitir que um indivíduo ao qual tenha sido imputado na peça acusatória a
prática de homicídio culposo por imprudência, devido a trafegar em velocidade alta, seja
condenado pela prática de homicídio culposo por imperícia, por não ter a experiência
necessária para condução de veículos.
A jurisprudência abaixo elucida a impossibilidade de serem considerados na sentença
fatos que não foram imputados na peça acusatória.
26

CRIME DE TRÂNSITO HOMICÍDIO CULPOSO AUSÊNCIA DE


CORRELAÇÃO ENTRE DENÚNCIA E A SENTENÇA
RECONHECIMENTO ABSOLVIÇÃO QUE SE IMPÕE.
Tendo em vista que o acusado se defende dos fatos descritos na denúncia, a sentença
não pode inovar e condená-lo por outros diversos dos ali descritos, já que isso fere,
diretamente, os princípios do contraditório, da ampla defesa e da correlação ou
congruência. RECURSO PROVIDO.
(TJ-SP - APL: 00058481520078260101 SP 0005848-15.2007.8.26.0101, Relator:
Willian Campos, Data de Julgamento: 09/04/2013, 4ª Câmara de Direito Criminal,
Data de Publicação: 09/04/2013)
Disponível em: <www.jusbrasil.com.br/jurisprudencias> Acesso em: 16-07-2016.

Também deve se salientar que, na modalidade culpa, quando os fatos imputados na


peça acusatória caracterizem uma forma de imprudência, não pode o juiz proferir sentença
condenatória com base em outra forma de imprudência.
Explica Badaró sobre os crimes de forma vinculada e os tipos penais múltiplos:

Passando aos crimes de forma vinculada, e tomando por exemplo o crime de maus
tratos, não se pode admitir, ainda que dentro do mesmo tipo penal, que uma
imputação por maus tratos consistentes em sujeitar uma criança a 14 horas diárias de
trabalho numa carvoaria, o que é excessivo e inadequado, redunde em uma
condenação pelo abuso nos meios de correção e disciplina, porque a criança ficava
acorrentada e presa dentro de casa.
E quanto aos tipos penais múltiplos, como no crime de participação em suicídio,
quem foi acusado de ter auxiliado alguém a suicidar-se, por lhe fornecer a arama
utilizada em tal atividade, não pode ser surpreendido por uma condenação pelo
mesmo delito, mas porque instigou, reforçando o propósito suicida de quem já
pretendia pôr cabo em sua vida (2013, p. 119).

Como visto, somente o caso concreto poderá mostrar se foi respeitado o princípio da
correlação entre a acusação e a sentença e o princípio do contraditório. E somente o caso
concreto poderá mostrar se a modificação do fato imputado poderá ocorrer ou não na
sentença.
Sendo assim, é necessário observar quando o fato modificado tem relevância para o
direito processual. O fato modificado pode ter relevância tanto para o direito processual
quanto para o direito penal. Por ser o fato processual diferente do fato penal, é possível que a
alteração no objeto do processo tenha relevância para o direito processual e não tenha para o
direito penal.
De qualquer forma, não é aceitável a modificação dos fatos no momento da sentença,
sem que se utilize as regras da mutatio libelli.

Sendo o fato processual diverso do fato-tipo, não tem sentido determinar quais os
tipos de crime que podem ser indiferentemente mudados para outros. Conforme já
demonstrado, o fato pode mudar, mas permanecer idêntico o tipo penal, ou, por
outro lado, o fato pode permanecer idêntico, mas variar a fattispecie legal
(BADARÓ, 2013, p. 120).
27

A última situação exposta acima por Badaró (2013, p.119) pode ser exemplificada
com o caso de “uma peça acusatória que impute ao acusado o fato de induzir alguém ao
suicídio, mas que conceitue tal fato, erroneamente como homicídio e não como o fato
tipificado no art. 122 do CP (Induzimento, instigação ou auxílio a suicídio)”.
Pode ocorrer também de as modificações nos fatos não serem processualmente
relevantes, não tendo necessidade de emendatio libelli, mas serem relevantes no âmbito penal.
Conclui-se, portanto, que pode ocorrer três situações. Pode acontecer de a modificação
no objeto do processo ter relevância no âmbito do direito penal e no âmbito do direito
processual. Pode acontecer de a modificação no objeto do processo só ter relevância no
âmbito do direito processual. E, no último caso, pode acontecer de a alteração no objeto do
processo só ter relevância no âmbito do direito penal.
Nos dois primeiros casos, para que o juiz, no momento da sentença, possa considerar
fato diferente do imputado na peça acusatória, é fundamental o órgão julgador faça o
aditamento da denúncia, sendo fundamental a mutatio libelli. No último caso, seria necessário
a emendatio libelli.
No tema de correlação entre acusação e sentença, também deve se considerar um outro
aspecto para determinar a relevância da modificação dos fatos imputados na peça acusatória,
esse aspecto diz respeito à acusação, se ela também não foi prejudicada, se a ela foi
assegurado o contraditório.

A alteração fática pode não afrontar o direito de defesa, mas pode prejudicar a
acusação. O direito de defesa não pode ser o critério exclusivo na determinação da
relevância da alteração do fato imputado. É necessário pensar na acusação, o outro
polo da relação processual que irá integrar o contraditório. Se a regra da correlação
entre acusação e sentença tem por objetivo preservar o princípio do contraditório, e
se diz respeito não só à defesa, mas a possibilidade de ambas as partes estarem em
condição de se contradizer, violação do exercício da acusação é também violação ao
princípio do contraditório (BADARÓ, 2013, p. 121).

Se a modificação dos fatos imputados na peça acusatória ao réu não prejudicarem a


defesa, mas prejudicarem a acusação, essa modificação terá relevância processual, pois a
regra da correlação entre acusação e sentença visa garantir o contraditório, e o contraditório
tem que ser garantido para ambas às partes, para que se dê o devido processo legal.
Com relação à acusação, assim como ocorre com a defesa, é possível que a alteração
dos fatos imputados seja processual e penalmente relevante, que seja só processualmente
relevante ou que seja só penalmente relevante.
Um exemplo de alteração processual e penalmente relevante é o caso de uma
imputação classificada como homicídio e que foi alterada para lesão corporal seguida de
28

morte no momento da sentença, devido ao surgimento de novos fatos. Nesse caso não houve
violação ao direito de defesa, pois a defesa teve benefícios, porém houve violação ao
princípio do contraditório, pois o juiz no momento da sentença levou em consideração fatos
que não foram imputados pela acusação.
Em situações como essa, é necessário o aditamento da denúncia, é necessário a
mutatio libelli, para que possa ser exercido o contraditório e para que o órgão acusador exerça
corretamente sua função. Se o juiz pudesse julgar com base em fatos não imputados na peça
acusatória, ele estaria agindo de ofício e usurpando a função do Ministério Público.
A mutatio libelli se faz necessária nos casos em que surgem fatos não imputados ao
réu na peça acusatória, mesmo que dessa situação resulte uma tipificação que tenha pena mais
branda, isso porque deve se preservar o papel do ministério público, é o órgão acusador que
tem o poder da imputação.

Considerando a correlação entre acusação e sentença pela ótica do fato processual,


percebe-se que é possível haver mudança do fato, mas restar idêntico o tipo penal,
ou pode permanecer idêntico o fato processual, mas variar o tipo penal. Portanto, a
circunstância de o título do delito permanecer idêntico, por si só, não autoriza a
condenação, se o fato for diverso (BADARÓ, 2013, p. 122-123).

Na hipótese de classificação errônea dos fatos, é possível mudar o tipo penal, seja para
mais grave ou menos grave, pois não há mudança dos fatos, há somente uma classificação
errada, por exemplo, se os fatos foram classificados como furto, mas na verdade seria um
roubo, pois há violência ou grave ameaça, nesse caso há a emendatio libelli. De outro lado, se
há mudança dos fatos, não pode haver nova tipificação, sem que ocorra a mutatio libelli.
As jurisprudências abaixo ilustram o acima exposto:

HABEAS CORPUS. PENAL E PROCESSO PENAL. DENÚNCIA PELA


PRÁTICA DO CRIME DE QUADRILHA. CONDENAÇÃO, EM
APELAÇÃO, PELO CRIME DE QUADRILHA E ROUBO. VIOLAÇÃO AO
PRINCÍPIO DA CORRELAÇÃO. MUTATIO LIBELLI. INOBSERVÂNCIA
AO ART. 384 DO CPP. SÚMULA N. 453 DO STF. CONSTRANGIMENTO
ILEGAL EVIDENCIADO. ORDEM CONCEDIDA.
- É certo que o acusado se defende dos fatos narrados na denúncia e não da sua
capitulação legal. Todavia, é necessário o aditamento desta peça processual, nos
termos do art. 384 do CPP, quando surgir, no curso da instrução, um novo
delineamento fático não contido na inicial acusatória. - No caso dos autos, verifica-
se que a conduta do crime de roubo não estava contida na denúncia, que se limitou a
descrever o paciente como integrante da quadrilha, denunciando-o como incurso no
tipo legal do art. 288 do CP, não lhe atribuindo qualquer conduta relativa ao delito
contra o patrimônio. Assim, verifica-se configurada a mutatio libelli, a exigir
observância ao art. 384 do Código de Processo Penal. - Nos termos da Súmula n.
453 do STF, não se admite, em segunda instância, a aplicação do disposto no art.
384 do Código de Processo Penal, razão pela qual é inadmissível ao Tribunal, no
julgamento da apelação, dar nova definição jurídica à conduta criminosa, em razão
de fatos não contidos na denúncia.
29

Ordem de habeas corpus concedida para cassar em parte o acórdão recorrido apenas
afastando a condenação do paciente quanto ao delito previsto no art. 157, § 2º, I e II,
do Código Penal.
(STJ - HC: 172790 ES 2010/0088363-0, Relator: Ministra MARILZA MAYNARD
(DESEMBARGADORA CONVOCADA DO TJ/SE), Data de Julgamento:
08/04/2014, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 28/04/2014)
Disponível em: <www.jusbrasil.com.br/jurisprudencias> Acesso em: 16-07-2016.

Nesse sentido:

AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. ALTERAÇÃO DA


CLASSIFICAÇÃO DO DELITO. RÉU DENUNCIADO POR EXTORSÃO E
CONDENADO POR CONCUSSÃO PELO TRIBUNAL DE ORIGEM.
HIPÓTESE DE EMENDATIO LIBELLI. 1.
O agravante não apresentou argumentos novos capazes de infirmar os fundamentos
que alicerçaram a decisão agravada, razão que enseja a negativa de provimento ao
agravo regimental. 2. O réu se defende dos fatos que são descritos na peça
acusatória, e não da capitulação jurídica dada na denúncia. Assim sendo, a
adequação típica pode ser alterada tanto em primeira instância quanto em segundo
grau, via emendatio libelli. 3. Na espécie, embora o Ministério Público tenha
capitulado os fatos narrados na denúncia como o delito previsto no art. 158, caput,
do Código Penal (extorsão), a descrição contida na exordial acusatória permite a
imputação do fato previsto no tipo legal do art. 316, caput, do Código Penal
(concussão), razão pela qual a decisão objurgada se enquadra na hipótese do art. 383
do Código de Processo Penal (emendatio libelli), não estando eivada de nenhuma
nulidade. 4. Agravo regimental improvido. (STJ - AgRg no HC: 201343 RS
2011/0063819-1, Relator: Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, Data de
Julgamento: 23/09/2014, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe
10/10/2014). Disponível em: <www.jusbrasil.com.br/jurisprudencias> Acesso em:
16-07-2016.

2.2. A identidade do objeto do processo e o julgamento de toda a imputação

A sentença deve julgar todos os fatos imputados ao acusado. O juiz não pode
sentenciar com base em fatos novos, que não foram imputados ao réu na peça acusatória, mas
também não pode deixar de julgar algum fato que foi imputado ao réu, tem que haver
identidade da representação do objeto do processo.
Para que haja respeito à regra da correlação entre acusação e sentença, é necessário
que todo o objeto da imputação seja analisado na sentença, de modo a evitar a violação do
princípio do contraditório e a ofensa à função do órgão de acusação.
Haverá a violação da regra da correlação quando ao réu for imputado a prática de dois
ou mais crimes e o juiz proferir sentença de modo a julgar somente um dos crimes, ignorando
o outro, da mesma forma, também haverá violação da regra se ao acusado for imputado a
prática de apenas um crime e o juiz, no momento da sentença, deixar de considerar algum
aspecto desse crime. Nos dois casos há o julgamento citra petita.
30

O fato de o juiz ser obrigado a julgar todo o objeto da imputação, não significa que ele
tem o dever de condenar ou absolver o réu por todo o objeto processual. Pode por exemplo,
no caso de uma imputação pelo art. 138 (calúnia) com a causa de aumento de pena do artigo
141, inciso IV (quando a pessoa for maior de 60 anos), em que o juiz condenar o réu somente
pelo artigo 138, por concluir que na época dos fatos a pessoa não era maior de 60 anos. Nesse
caso a sentença não é citra petita, porque o juiz analisou todo o objeto processual.
As imputações que tiverem mais de um crime, farão com que as sentenças tenham
mais de um capítulo, ela terá o tanto de capítulos que tiver de imputações e deverá julgar todo
o objeto processual.
Nesse sentido, expõe Badaró:

Nos casos de duas imputações em uma mesma denúncia, a questão pode ser
facilmente solucionada atentando-se para o reflexo que o cúmulo de pretensões
produz na sentença. Cada decisão sobre uma das pretensões será um capítulo da
sentença, no caso de cumulação de pretensões. Segundo Chiovenda, haverá tantos
capítulos de sentença quantos forem os capítulos da demanda. Com isso, cada vez
que se imputa mais de um delito ao acusado, na verdade, estamos diante de várias
imputações, ou melhor, de tantas imputações quantos são os delitos atribuídos.
Por outro lado, há posições que reduzem os capítulos da sentença à solução de
questões de fato e de direito. Tal posição, contudo, não parece a mais correta, tendo
em vista que a solução das questões de mérito influenciam na formação lógica da
sentença e concorrem para determinar seu conteúdo, mas, consideradas
isoladamente, não possuem relevo autônomo; pelo contrário, visam à preparação de
um ato final sobre o objeto do processo (2013, p. 124-125).

No caso de imputação de apenas um crime, da mesma maneira, o juiz de julgar todo o


objeto processual, não deixando de se manifestar sobre nenhum aspecto relevante.
O fato de haver violação da regra da correlação entre acusação e sentença quando o
juiz não julgar todo o objeto processual, ou seja, quando a sentença for citra petita, mostra que
a regra da correlação entre acusação e sentença não tem como único objetivo a proteção do
direito de defesa, pois no caso de sentença citra petita o réu será beneficiado, pois ao deixar de
julgar parte da imputação, ao réu pode ser cominada pena menor do que a que realmente
caberia no caso concreto.
No caso de sentença citra petita quem será prejudicado é a acusação, o órgão
acusatório, pois o direito dele ao contraditório foi cerceado e não houve o respeito à sua
função. Decidiu o STJ:

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL


SENTENÇA CITRA PETITA. JULGADO QUE REFLETE O
ENTENDIMENTO DESTA CORTE SUPERIOR DE JUSTIÇA.
1. A jurisprudência desta Corte admite a nulidade de toda a sentença em caso do
reconhecimento de decisão citra petita, o que pode ser feito de ofício, além de
31

reconhecer esse defeito processual quando o provimento jurisdicional não se


manifesta acerca da compensação 2. Agravo regimental não provido.
(STJ - AgRg no REsp: 1395999 SP 2013/0249395-0, Relator: Ministro MAURO
CAMPBELL MARQUES, Data de Julgamento: 20/05/2014, T2 - SEGUNDA
TURMA, Data de Publicação: DJe 26/05/2014)
Disponível em: <www.jusbrasil.com.br/jurisprudencias> Acesso em: 16-07-2016.

2.3. Violação da regra da correlação entre acusação e sentença

A violação da regra da correlação entre acusação e sentença fere o contraditório,


podendo violar o direito de defesa e resulta em usurpação da função do órgão acusador. Isso
porque ao proferir sentença em desacordo com a imputação feita pela acusação, o juiz fere o
direito de defesa se o réu for prejudicado com tal situação, de outro lado, o juiz usurpa a
função do órgão acusador, ao agir de ofício.
A classificação da sentença decorrente da violação apresenta divergências
doutrinárias, alguns a caracterizam como nula, outros como inexistente.
Ada Pellegrini Grinover, Antônio Magalhães Gomes Filho e Antônio Scarance
Fernandes, consideram nula a sentença que viola o princípio da correlação (2011, p. 213). Já
Luigi Sansò, a classifica como inexistente (1950, p. 244).
A classificação utilizada possui relevância prática, pois, os atos processuais nulos
produzem efeitos no processo, até que sejam considerados nulos por sentença judicial. Já os
atos considerados inexistentes não têm eficácia jurídica, sendo desnecessário sentença que
reconheça sua condição. Na concepção de Badaró:

A situação parece que melhor poderá ser enquadrada na nulidade absoluta da


sentença, visto que violadora do princípio constitucional do contraditório. A
sentença irregular, por violar a regra da correlação entre acusação e sentença, não se
caracteriza como uma das hipóteses em que o julgador não está investido da função
jurisdicional ou em que ocorra qualquer outro vício que torne a relação jurídica
processual inexistente (2013, p. 127).

Em sentido oposto se coloca Arturo Santoro ao afirmar:

Se il giudice statuisce sopra un fatto non contestato, essendo mancata,


relavativamente ad esso, la possibilità del contradittorio, deve ritenersi, per questa
parte, non istituito il rapporto processuale, per difetto della qualità d’imputato, e la
sentenza dovrebbe considerarsi inexistente (1954, p. 574-575).

Destarte, há vários posicionamentos doutrinários, porém, o mais adequado é


considerar a sentença absolutamente nula, pois se ela fosse considerada inexistente, estaria se
32

afirmando que toda a relação processual inexiste, sendo que o vício surgiu apenas no
momento da sentença.
Relata Badaró sobre o julgamento extra petita:

O fato de o julgamento extra petita significar uma modalidade de ação penal ex


officio não quer dizer que isso leve à inexistência do processo ou da sentença.
Independentemente da teoria adotada sobre o direito de ação, o certo é que,
atualmente, propugna-se, cada vez mais, pela ampliação do acesso ao judiciário.
Assim, ainda que se entenda que em tal caso teríamos uma verdadeira ação penal
exercida por órgão diverso do Ministério Público e, mais precisamente, pelo próprio
juiz, não se pode falar que o juiz “não tem ação”, ou que, sendo a ação proposta por
órgão diverso do Ministério Público, o processo seja inexistente (2013, p. 128).

Quando o juiz violando a regra da correlação entre acusação e sentença, ao jugar com
base em fatos que não foram imputados ao réu na peça acusatória, ele está criando um
problema de ilegitimidade, pois não é ele que tem a legitimidade para imputar fatos ao réu,
sendo assim, o processo deve ser declarado absolutamente nulo.
Conforme o art. 564, II, do Código de Processo Penal, Art. 564. A nulidade ocorrerá
nos seguintes casos: I - Por incompetência, suspeição ou suborno do juiz; II - Por
ilegitimidade de parte. Assim dispõe Aduz Badaró:

O problema é de ilegitimidade e, por conseguinte, de falta de condição da ação, visto


que o juiz não pode figurar como legitimado ativo na relação processual penal.
Porém, ver em tal caso inexistência do processo ou da sentença é confundir
pressuposto processual, como requisito de existência da relação jurídica processual,
com condições da ação, como requisito do direito de ação (2013, p. 129).

Também não deve se considerar a inexistência apenas da sentença e não de todo o


processo.
Relata Badaró:

Por fim, ainda que se queira pensar em inexistência apenas da sentença, e não de
toda a relação jurídica processual, tal posição não parece correta. Houve sentença, e
os requisitos mínimos para que tal ato ingresse no mundo jurídico estão presentes.
Apenas tal sentença não terá validade. Essa decisão, como ato processual, existe e
produz seus efeitos jurídicos até que outra decisão venha lhe retirar a eficácia, em
razão do vício que caracteriza a nulidade (2013, p. 129).

Em relação ao julgamento citra petita ou infra petita, o juiz não usurpa a função do
Ministério Público, pois não age de ofício. Nesses casos, o juiz não profere sentença com base
em fatos não imputados ao réu pela acusação, mas sim, profere sentença com base nos fatos
imputados, mas deixando de analisar alguns. Nesses casos a sentença, em relação ao que
julgou, é válida.
33

O fato de a sentença não respeitar a regra da correlação não significa que ela deverá
ser considerada totalmente nula. Deve-se analisar os capítulos da sentença, e só considerar
nulos os que realmente são. A sentença pode ser parcialmente nula.
Quando houver mais de um crime imputado ao réu, a sentença deve ter mais de um
capítulo. E cada capítulo deve ser analisado isoladamente em relação a existência de vícios,
sendo que somente o capítulo que for eivado de vícios deverá ser invalidado, atendendo-se
assim o princípio da economia processual e atendendo um critério de razoabilidade.

2.4. Correlação entre acusação e sentença e ne bis in idem

O tema da correlação entre acusação e sentença também tem relação com a coisa
julgada.
Quando a sentença transita em julgado, forma-se a coisa julgada material, ou seja, a
sentença torna-se imutável. Essa coisa julgada material possui uma função negativa,
denominada de ne bis in idem, essa denominação quer dizer que nenhum juiz pode julgar
novamente a mesma pessoa pelo mesmo fato, o qual já foi objeto de uma relação processual
que teve sentença que transitou em julgado.
Após o oferecimento da peça acusatória, em regra os fatos imputados nela devem
permanecer inalterados durante toda a relação processual, no entanto, pode haver a emendatio
libelli quando aos fatos foi dada definição jurídica errônea ou a mutatio libelli quando surgir
prova de circunstância ou elementar não contida na acusação. Em relação ao julgamento de
recursos, também deve haver a obediência à regra da correlação, deve o juiz de segundo grau
se ater aos fatos imputados ao réu na peça acusatória.
Como pode ser analisado, a regra da correlação entre acusação e sentença assegura que
o objeto processual permaneça o mesmo durante todo o trâmite do processo, ou seja, que o
objeto processual permaneça inalterado. Essa inalterabilidade continua sendo assegurada após
o término do processo, com o trânsito em julgado, pois, conforme já exposto, este faz coisa
julgada material, a qual tem como consequência o ne bis in idem, que impede que qualquer
juiz julgue a mesma pessoa pelos mesmos fatos que foram objeto da sentença transitada em
julgado.
Deve-se também fazer algumas considerações sobre o conceito de objeto do processo
para efeito de correlação entre acusação e sentença e para efeito de coisa julgada, esse
conceito é bem mais restrito quando se pensa em correlação do que quando se analisa coisa
34

julgada. No processo penal, apesar de o objeto do processo ter que permanecer o mesmo
desde a imputação pela acusação até a sentença, por meio da emendatio libelli é possível que
o Ministério Público faça o aditamento da peça acusatória, desde que antes da sentença de
primeiro grau, incluindo assim novos fatos, e em relação a ação penal privada, também é
possível a modificação dos fatos, quando o querelante, antes de transcorrido o lapso
decadencial, modifique a queixa.
Já no processo civil, não é possível a modificação dos fatos a qualquer tempo antes da
sentença de primeiro grau, só é possível a modificação até o momento final da fase
postulatória.
Em relação ao processo civil, relata Badaró:

A razão disso é simples: no processo civil, um dado fático que não tenha sido
incluído na causa de pedir remota não pode ser acrescido ao processo após o
despacho saneador, porque o autor poderá, formulando nova demanda, trazê-lo à
apreciação do Poder Judiciário. Por outro lado, em face do princípio dispositivo,
poderá também deixar de incluir tal aspecto fático na sua pretensão, o que é
perfeitamente possível, ante a disponibilidade da situação material debatida. O autor,
ao formular o seu pedido e expor a causa de pedir, é que irá determinar em que
medida a situação da vida será trazida ao processo (2013, p. 135).

Já em relação ao processo penal, Badaró relata:

No processo penal, porém, o fato naturalístico deve ser imputado como um todo, não
se permitindo ao acusado trazer apenas porção da conduta delitiva ou,
posteriormente, formular demanda autônoma sobre parte do fato que não tenha sido
trazida ao processo. Um fato da natureza que se afigure crime deve ser trazido por
inteiro ao processo, dele se extraindo todas as consequências penais. Daí por que, se
no curso do processo é descoberto um novo aspecto daquele fato já imputado ao
acusado, o mesmo deverá ser trazido ao processo, o que será feito através da mutatio
libelli, que poderá ocorrer até o momento da sentença. Já no processo civil, tal regra
não existe, tendo em vista que o autor poderá levar tal aspecto fático ao Judiciário,
por meio de demanda autônoma (2013, p. 135-136).

No processo penal, há a necessidade de todos os fatos serem levados ao processo por


razão do princípio do ne bis in idem, ou seja, porque depois de transita em julgado a sentença,
o objeto do processo não poderá mais ser discutido, toda a situação será julgada. Já no
processo civil, o autor pode levar ao processo só parte dos fatos, deixando para discutir outra
parte eventualmente em outra demanda, se lhe interessar. Decidiu o STJ:

PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS E


RESPECTIVA ASSOCIAÇÃO. (1) IMPETRAÇÃO SUBSTITUTIVA DE
RECURSO ORDINÁRIO. IMPROPRIEDADE DA VIA ELEITA. (2)
PRIMEIRA DENÚNCIA, IMPUTAÇÕES: TRÁFICO E RESPECTIVA
ASSOCIAÇÃO MAIS RESISTÊNCIA. SEGUNDA DENÚNCIA,
IMPUTAÇÕES: TRÁFICO E RESPECTIVA ASSOCIAÇÃO. MESMOS
FATOS NATURALÍSTICOS. PRINCÍPIO DO NE BIS IN IDEM.
35

VIOLAÇÃO. ILEGALIDADE FLAGRANTE. CONCESSÃO DE OFÍCIO DA


ORDEM.
1. É imperiosa a necessidade de racionalização do emprego do habeas corpus, em
prestígio ao âmbito de cognição da garantia constitucional, e, em louvor à lógica do
sistema recursal. In casu, foi impetrada indevidamente a ordem como substitutiva de
recurso ordinário. 2. O objeto do processo penal é a proposta de responsabilização
criminal em razão de certo fato naturalístico. Sob pena de se violar o princípio do ne
bis in idem, não é possível a formulação de duas denúncias pelos mesmos fatos,
concretamente considerados. Na espécie, o paciente foi denunciado duas vezes pelo
tráfico, na mesma data e local (21 de julho de 2010, no interior da Unidade de
Recuperação Social Doutor Francisco de Oliveira Conde, Rio Branco/AC), da
mesma quantidade e espécie de droga [01 (uma) "barra" de maconha, pesando
242,35g (duzentos e quarenta e dois gramas e trinta e cinco centigramas)]. Ademais,
na primeira exordial acusatória, ao paciente foi imputada inserção em quadrilha com
traficantes de dentro e de fora daquela penitenciária, funcionando como
intermediário entre eles, prevalecendo-se, lado outro, de sua condição de agente
penitenciário, para distribuir entorpecente dentro da unidade prisional.
Posteriormente, veio a ser denunciado pelos mesmíssimos fatos, só que na
companhia de mais vinte e três pessoas. Especificamente em relação a ele, tem-se
como manifestamente ilegal o oferecimento da segunda peça vestibular. A nulidade
ganha foros dramáticos, pois, no primeiro processo, o paciente foi absolvido pelo
crime de associação para o tráfico, vindo a ser condenado no segundo por tal
imputação. 3. Habeas corpus não conhecido, ordem expedida de ofício para,
somente em relação ao paciente, trancar a ação penal n.º 0022200-
48.2010.8.01.0001, da Vara de Delitos de Tóxicos e Acidentes de Trânsito da
Comarca de Rio Branco/AC.
(STJ - HC: 260038 AC 2012/0248112-0, Relator: Ministra MARIA THEREZA DE
ASSIS MOURA, Data de Julgamento: 17/12/2013, T6 - SEXTA TURMA, Data de
Publicação: DJe 03/02/2014)
Disponível em: <www.jusbrasil.com.br/jurisprudencias> Acesso em: 16-07-2016.
36

III - APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA CORRELAÇÃO NO


ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

3.1. Emendatio Libelli

A emendatio libelli é uma correção feita pelo juiz da tipificação dada pelo Ministério
Público de forma errônea aos fatos imputados ao réu. O juiz corrige a tipificação sem alterar
os fatos, mesmo que dessa correção resulte crime que tenha pena mais grave.
O acusado defende-se dos fatos imputados, não da tipificação legal dada a eles na peça
acusatória, sendo assim, a defesa não poderá alegar surpresa ao ocorrer a emendatio libelli.
A emendatio libelli pode ocorrer tanto na ação penal pública como na ação penal
privada, o que fica evidente ao ler o artigo 383 do Código de Processo Penal.
Dispõe o CPP Art. 383. “O juiz, sem modificar a descrição do fato contida na
denúncia ou queixa, poderá atribuir-lhe definição jurídica diversa, ainda que, em
consequência, tenha de aplicar pena mais grave”. Relata Fernando Capez:

No processo penal, o réu se defende dos fatos, sendo irrelevante a classificação


jurídica constante na denúncia ou queixa. Segundo o princípio da correlação, a
sentença está limitada apenas à narrativa feita na peça inaugural, pouco importando
a tipificação legal dada pelo acusador. Desse modo, o juiz poderá dar aos eventos
delituosos descritos explicita ou implicitamente na denúncia ou queixa a
classificação jurídica que bem entender, ainda que, em consequência, venha a
aplicar pena mais grave, sem necessidade de prévia vista à defesa, a qual não poderá
alegar surpresa, uma vez que não se defendia da classificação legal, mas da
descrição fática da infração penal (...) (2014, p. 538-539).

Aduz Norberto Avena:

Na emendatio libelli, em verdade, inexistem acréscimos na sentença quanto ao fato


inicialmente atribuído e que consta na denúncia ou na queixa. Por isso mesmo é que
facultam os arts. 383 e 418 do CPP o reconhecimento pelo juiz, na sentença, de
crime cuja capitulação importe em aplicação de pena mais grave independente de
qualquer providência prévia relacionada à concessão de novas oportunidades de
defesa ao réu (2012, p. 1089).

Aduz Gustavo Henrique Badaró:

A emendatio libelli, por sua vez, é uma correção, uma emenda ao libelo, sem que se
altere a essência da acusação. São correções ou alterações em aspectos acidentais ou
secundários da acusação que serão mudados, permanecendo ela substancialmente
idêntica (2013, p. 147).
37

Nesse sentido julgou o STJ:

PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO


ESPECIAL. CRIME CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL.
EMENDATIO LIBELLI. CARACTERIZADA. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO
AO ART. 564, INCISO II, ALÍNEA B, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL.
I. O réu se defende dos fatos narrados na denúncia e não da sua capitulação legal,
que é sempre provisória, podendo o juiz, no momento da sentença, atribuir definição
jurídica diversa, nos termos do artigo 383, do Código de Processo Penal, ainda, que
consequência, tenha de aplicar pena mais grave. II. Não se exige a prova pericial
para comprovação da materialidade do delito nos crimes que não deixam vestígios.
Agravo regimental desprovido.
(STJ - AgRg no AREsp: 193387 SP 2012/0127121-3, Relator: Ministro FELIX
FISCHER, Data de Julgamento: 03/03/2015, T5 - QUINTA TURMA, Data de
Publicação: DJe 12/03/2015)
(Disponível em: <www.jusbrasil.com.br/jurisprudencias> Acesso em: 16-07-2016).

3.1.1. Momento adequado

De acordo com o STF, o STJ e a doutrina majoritária, é no momento da sentença que


deve ocorrer a emendatio libelli.
Decidiu o STF:

EMENTA HABEAS CORPUS. PROCESSO PENAL. EMENDATIO


LIBELLI. LAVAGEM DE ATIVOS. DESCLASSIFICAÇÃO NO
RECEBIMENTO DA DENÚNCIA, PARA ESTELIONATO. ART. 383 DO
CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. MOMENTO PROCESSUAL
ADEQUADO. RELATIVIZAÇÃO. ESPECIALIZAÇÃO DO JUÍZO.
1. Segundo a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é a sentença o momento
processual oportuno para a emendatio libelli, a teor do art. 383 do Código de
Processo Penal. 2. Tal posicionamento comporta relativização – hipótese em que
admissível juízo desclassificatório prévio –, em caso de erro de direito, quando a
qualificação jurídica do crime imputado repercute na definição da competência.
Precedente. 3. Na espécie, a existência de peculiaridade – ação penal relacionada a
suposto esquema criminoso objeto da ação em trâmite na vara especializada em
lavagem de ativos –, recomenda a manutenção do acórdão recorrido que chancelou a
remessa do feito, comandada pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região para a 1ª
Vara Federal da Seção Judiciária do Maranhão, que detém tal especialização. 4.
Ordem denegada. (STF - HC: 115831 MA, Relator: Min. ROSA WEBER, Data de
Julgamento: 22/10/2013, Primeira Turma, Data de Publicação: DJe-227 DIVULG
18-11-2013 PUBLIC 19-11-2013).
(Disponível em: <www.jusbrasil.com.br/jurisprudencias> Acesso em: 16-07-2016).

Porém, existe uma importante corrente doutrinária e jurisprudencial defendida por


exemplo por Fernando da Costa Tourinho Filho (2012, p. 1046) que alega ser possível “a
emendatio libelli no momento do recebimento da denúncia ou queixa em dois casos, se a
correção da tipificação for beneficiar o réu ou se for permitir a correta fixação da competência
ou procedimento a ser adotado”.
38

Nesse sentido julgou o STF:

I. Habeas corpus: descabimento. A análise da suficiência dos indícios de autoria e da


prova da materialidade não dispensa, no caso, o revolvimento de fatos e provas que
lastrearam a denúncia, ao que não se presta o procedimento sumário e documental
do habeas corpus. II. Denúncia: errônea capitulação jurídica dos fatos narrados: erro
de direito: possibibilidade do juiz, verificado o equívoco, alterar o procedimento a
seguir (cf. HC 84.653, 1ª T., 14.07.05, Pertence, DJ 14.10.05). 1. Se se tem, na
denúncia, simples erro de direito na tipificação da imputação de fato idoneamente
formulada é possível ao juiz, sem antecipar formalmente a desclassificação, afastar
de logo as conseqüências processuais ou procedimentais decorrentes do equívoco e
prejudiciais ao acusado. 2. Na mesma hipótese de erro de direito na classificação do
fato descrito na denúncia, é possível, de logo, proceder-se a desclassificação e
receber a denúncia com a tipificação adequada à imputação de fato veiculada, se, por
exemplo, da sua qualificação depender a fixação da competência ou a eleição do
procedimento a seguir. III. Concussão e corrupção passiva. Caracteriza-se a
concussão - e não a corrupção passiva - se a oferta da vantagem indevida
corresponde a uma exigência implícita na conduta do funcionário público, que, nas
circunstâncias do fato, se concretizou na ameaça. IV. Nulidade processual:
inobservância do rito processual específico no caso de crimes inafiançáveis
imputados a funcionários públicos. Necessidade de notificação prévia (CPrPenal,
art. 514). 1. É da jurisprudência do Supremo Tribunal (v.g. HC 73.099, 1ª T.,
3.10.95, Moreira, DJ 17.5.96) que o procedimento previsto nos arts. 513 e seguintes
do C.Pr.Penal se reserva aos casos em que a denúncia veicula tão-somente crimes
funcionais típicos (C.Penal, arts. 312 a 326). 2. No caso, à luz dos fatos descritos na
denúncia, o paciente responde pelo delito de concussão, que configura delito
funcional típico e o co-réu, pelo de favorecimento real (C. Penal, art. 349). 3. Ao
julgar o HC 85.779, Gilmar, Inf.STF 457, o plenário do Supremo Tribunal,
abandonando entendimento anterior da jurisprudência, assentou, como obter dictum,
que o fato de a denúncia se ter respaldado em elementos de informação colhidos no
inquérito policial, não dispensa a obrigatoriedade da notificação prévia do acusado.
4. Habeas corpus deferido, em parte, para, tão-somente quanto ao paciente , anular o
proceo a partir da decisão que recebeu a denúncia, inclusive, a fim de que se
obedeça ao procedimento previsto nos arts. 514 e ssss. Do C.Pr.Penal e, em caso de
novo recebimento da denúncia, que o seja apenas pelo delito de concussão.
(STF - HC: 89686 SP, Relator: Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Data de
Julgamento: 12/06/2007, Primeira Turma, Data de Publicação: DJe-082 DIVULG
16-08-2007 PUBLIC 17-08-2007 DJ 17-08-2007<span id="jusCitacao"> PP-00058
</span>EMENT VOL-02285-04<span id="jusCitacao"> PP-00638</span>)
(Disponível em: <www.jusbrasil.com.br/jurisprudencias> Acesso em: 16-07-2016).

No mesmo sentido, julgou o STJ:

PENAL E PROCESSUAL PENAL MILITAR. HABEAS CORPUS.


TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. DENÚNCIA. VIOLÊNCIA
ARBITRÁRIA. EXCESSO DE ACUSAÇÃO. FLAGRANTE ILEGALIDADE.
REFLEXOS JURÍDICOS IMEDIATOS. DESCLASSIFICAÇÃO. LESÕES
CORPORAIS. NULIDADE. AUSÊNCIA DE EXAME DE CORPO DE
DELITO.
I - Não há vedação a que se altere a capitulação logo no recebimento da exordial,
nos casos em que é flagrante que a conduta descrita não se amolda ao tipo penal
indicado na denúncia. Tal possibilidade, acentua-se ainda mais quando o tipo
indicado e aquele aparentemente cometido possuem consequências jurídicas
diversas, com reflexos imediatos na defesa no acusado. Nessas hipóteses, é patente o
excesso de acusação (Precedentes do STJ e do STF). II - Na espécie, o
enquadramento da conduta descrita na denúncia como delito de violência arbitrária
(art. 333 do CPM)é manifestamente inadequada, já que descreve, de fato, as
elementares do delito de lesões corporais, previsto no art. 209 do CPM. III - O
39

equívoco na capitulação jurídica, na espécie, acarreta reflexos jurídicos imediatos na


defesa no paciente, já que a correta classificação jurídica do fato, no caso, implicaria
nulidade da ação penal, por ausência do exame de corpo de delito, imprescindível,
na hipótese, por se tratar de crime que deixa vestígio (art. 328, caput, do CPPM).
Ordem concedida. (STJ - HC: 103763 MG 2008/0074267-0, Relator: Ministro
FELIX FISCHER, Data de Julgamento: 17/02/2009, T5 - QUINTA TURMA, Data
de Publicação: <!-- DTPB: <span class=highlightBrs>20090316</span><br> -->
DJe <span class=highlightBrs>16/03/2009</span>)
(Disponível em: <www.jusbrasil.com.br/jurisprudencias> Acesso em: 16-07-2016).

3.1.2. Transação penal e suspensão condicional do processo

Com a correção da tipificação dos fatos, o crime pode passar a ser de menor potencial
ofensivo, admitindo-se a transação penal ou a ter pena mínima igual ou inferior a um ano,
admitindo-se a suspensão condicional do processo.
Está expresso no CPP:

Art. 383. O juiz, sem modificar a descrição do fato contida na denúncia ou queixa,
poderá atribuir-lhe definição jurídica diversa, ainda que, em consequência, tenha de
aplicar pena mais grave.
§ 1.º Se, em consequência de definição jurídica diversa, houver possibilidade de
proposta de suspensão condicional do processo, o juiz procederá de acordo com o
disposto na lei.
§ 2.º Tratando-se de infração de competência de outro juízo, a este serão
encaminhados os autos.

Se o juiz, ao realizar a emendatio libelli, perceber que o crime tem pena mínima igual
ou inferior a um ano, ele não pode sentenciar o processo, de acordo com o disposto no art. 89
da lei dos Juizados, ele deve remeter os autos ao Ministério Público para que este possa fazer
a proposta da suspensão condicional do processo.
O art. 89 da lei 9099/95 dispõe:

Art. 89. Nos crimes em que a pena mínima cominada for igual ou inferior a um ano,
abrangidas ou não por esta Lei, o Ministério Público, ao oferecer a denúncia, poderá
propor a suspensão do processo, por dois a quatro anos, desde que o acusado não
esteja sendo processado ou não tenha sido condenado por outro crime, presentes os
demais requisitos que autorizariam a suspensão condicional da pena.

A súmula 337 do STJ dispõe “É cabível a suspensão condicional do processo na


desclassificação do crime e na procedência parcial da pretensão punitiva”. Relata Gustavo
Henrique Badaró:
Nada impede que tudo isso se dê oralmente, na própria audiência, na hipótese em
que o procedimento esteja sendo realizado efetivamente em audiência una, de
instrução, debates e julgamento. Nesse caso, se, após os debates, o juiz for proferir a
sentença e constatar que os fatos merecem uma definição jurídica diversa, deverá
40

possibilitar às partes que se manifestem, oralmente, sob a eventualidade de uma


nova definição jurídica dos fatos. Após isso, o juiz retoma o feito para sentenciar e
opera a emendatio libelli, sem pronunciar-se pela condenação ou absolvição. O
Ministério Público poderá, oralmente, na sequência, formular proposta de suspensão
condicional do processo, já se colhendo a manifestação do acusado e de seu defensor
na própria audiência. Se aceita a proposta, o juiz homologa o acordo, se recusada, o
juiz retoma o feito para sentencia-lo, absolvendo ou condenando o acusado (2013, p.
150).

Prevalece o posicionamento de que a suspensão condicional do processo não pode ser


concedida de ofício pelo juiz, embora tenha alguns doutrinadores que entendam que ela é um
direito subjetivo do acusado.
Para sustentar o posicionamento majoritário, existe a Súmula 696 do STF que dispõe:
“reunidos os pressupostos legais permissivos da suspensão condicional do processo, mas se
recusando o Promotor de Justiça a propô-la, o juiz, dissentindo, remeterá a questão ao
Procurador-Geral, aplicando-se por analogia o art. 28 do Código de Processo Penal.”
Conclui-se, portanto, que a suspensão condicional do processo não é direito subjetivo
do acusado, pois se assim fosse, não existiria essa remessa ao Procurador de Justiça, o juiz
poderia decidir sem a intervenção do Ministério Público.
Já no caso de a emendatio libelli fazer um crime ser desclassificado para crime de
menos potencial ofensivo, o juiz deverá remeter os autos ao juízo competente, que é o Juizado
Especial Criminal, onde será designada audiência para que o Ministério Público faça a
proposta de transação penal. A transação penal pode ser proposta a qualquer momento,
mesmo após o oferecimento da denúncia. Aduz Gustavo Henrique Badaró:

Nos casos em que um determinado fato, subsumido a um tipo penal com pena
máxima superior a 2 anos, venha a receber outra classificação jurídica, passando a
ser subsumido a outro tipo penal, com pena máxima igual ou inferior a 2 anos, o juiz
comum se tornará incompetente para o julgamento, devendo remeter o feito para o
Juizado Especial Criminal. Assim, em verdade, embora os autos tenha sido
conclusos para a sentença, o juiz não deverá condenar o acusado, mas se limitar a,
diante de nova definição jurídica do fato, proferir uma decisão interlocutória, na qual
se declara incompetente, remetendo o feito ao Juizado Especial Criminal. No
juizado, deverá ser designada audiência para que o Ministério Público formule
proposta de transação penal e o réu tenha oportunidade de celebrar a transação
penal, ou para que o Ministério Público apresente proposta de suspensão condicional
do processo. Se não for aceita a proposta de transação penal, o feito prosseguirá no
Juizado, devendo o juiz proferir sentença (2013, p. 150-151).

Decidiu o STJ:

RECURSO ESPECIAL. PENAL. VIOLAÇÃO AO ART. 384 DO CPP NÃO


RECONHECIDA. HIPÓTESE DE APLICAÇÃO DA EMENDATIO LIBELLI.
SENTENÇA. NOVA DEFINIÇÃO JURÍDICA DO FATO NARRADO NA
DENÚNCIA. PENA IN ABSTRATO QUE AUTORIZA A APLICAÇÃO DOS
INSTITUTOS PREVISTOS NA LEI N.º 9.099/95. NECESSIDADE DE
41

OPORTUNIZAR AO MINISTÉRIO PÚBLICO A MANIFESTAÇÃO A


RESPEITO DA EVENTUAL PROPOSTA DE TRANSAÇÃO OU
SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO. PRECEDENTES DO STF E
DO STJ. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
1. Escorreita a sentença monocrática que aplicou ao caso o art. 383 do Código de
Processo Penal, uma vez que o julgador, fazendo uma análise da sucessão de leis
que tratam do tema, apenas deu nova definição jurídica ao fato narrado na peça
acusatória, sem alterar os seus contornos. 2. Caberia ao Juízo processante, ao
classificar a conduta do réu no art. 70 da Lei n.º 4.117/62, cuja pena é de detenção
de 1 (um) a 2 (dois) anos, determinar que o Ministério Público se manifestasse a
respeito da possibilidade de concessão da transação penal ou da suspensão
condicional do processo. 3. Recurso parcialmente provido para declarar a
insubsistência da condenação imposta pela sentença – mantida pelo acórdão ora
impugnado – e determinar, com base na nova classificação jurídica dada ao fato, seja
aberta vista ao Ministério Público para que possa se manifestar a respeito da
eventual oferta de transação ou de suspensão condicional do processo.
(STJ - REsp: 762842 MG 2005/0101373-0, Relator: Ministro ARNALDO
ESTEVES LIMA, Data de Julgamento: 15/12/2005, T5 - QUINTA TURMA, Data
de Publicação: DJ 05/06/2006 p. 312)
(Disponível em: <www.jusbrasil.com.br/jurisprudencias> Acesso em: 16-07-2016).

3.1.3. Emendatio libelli em segunda instância

O tribunal pode fazer a emendatio libelli, porém, em recurso exclusivo da defesa, deve
ser atendido o princípio da non reformatio in pejus, ou seja, o réu não poderá ser prejudicado
com a correção da tipificação.
Dispõe o CPP o Art. 617. “O tribunal, câmara ou turma atenderá nas suas decisões ao
disposto nos arts. 383, 386 e 387, no que for aplicável, não podendo, porém, ser agravada a
pena, quando somente o réu houver apelado da sentença”. Relata Fernando Capez:

Não existe qualquer limitação para a aplicação dessa regra em segunda instância,
pois não há que se falar em surpresa para as partes; entretanto, se a emendatio libelli
importar em aplicação de pena mais grave, o tribunal não poderá dar a nova
definição jurídica que implique prejuízo do réu, no caso de recurso exclusivo da
defesa, sob pena de afronta ao princípio que veda a reformatio in pejus (2014, p.
539).

Decidiu o TJ:

PENAL E PROCESSO PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. ROUBO


MAJORADO. EMENDATIO LIBELLI. LATROCÍNIO TENTADO.
POSSIBILIDADE EM SEGUNDA INSTÂNCIA. DOSIMETRIA DA PENA.
MANUTENÇÃO DA PENA ESTIPULADA PELO JUÍZO A QUO. RECURSO
EXCLUSIVO DA DEFESA. INOCORRÊNCIA DE REFORMATIO IN PEJUS
INDIRETA.
1. É possível se proceder a emendatio libelli em segundo grau, mudando-se a
capitulação penal sem a modificação da descrição do fato contido na denúncia (art.
383, caput, CPP). Precedentes do STJ. 2. Sendo o conjunto probatório apto à
comprovação da materialidade e autoria delitivas do crime de latrocínio tentado,
expresso no art. 157, § 3º, c/c 14, II, do CP, não deve ser acolhido o requerimento de
42

absolvição por insuficiência de lastro probatório. 3. Em se tratando de recurso


exclusivo da defesa, não se permite que a nova capitulação, decorrente de emendatio
libelli, importe em agravação da pena, sob pena de violação do princípio da non
reformatio in pejus indireta. Dessa forma, revela-se adequada a manutenção da
reprimenda fixada pelo Juízo a quo. 4. Apelação criminal conhecida e desprovida.
(TJ-AM - APL: 00025055420158040000 AM 0002505-54.2015.8.04.0000, Relator:
Carla Maria Santos dos Reis, Data de Julgamento: 06/07/2015, Primeira Câmara
Criminal, Data de Publicação: 07/07/2015).
(Disponível em: <www.jusbrasil.com.br/jurisprudencias> Acesso em: 16-07-2016).

Se na segunda instância, após a realização da emendatio libelli, o colegiado perceber


que o crime foi desclassificado para infração de menor potencial ofensivo, ou se com a nova
classificação passou a ser admitida a suspensão condicional do processo, ele deve remeter os
autos ao juízo competente para que o juiz faça a proposta cabível, sendo que se a proposta não
for aceita, os autos voltarão ao Tribunal para que ele prossiga o julgamento.
Aduz Gustavo Henrique Badaró:

Assim, se alterada a classificação legal, o crime passar a ser definido como infração
de menor potencial ofensivo ou como delito que admite a suspensão condicional do
processo, deve-se converter o julgamento em diligência. No caso de infração de
menor potencial ofensivo, o tribunal remeterá o feito ao Juizado Especial Criminal,
em que será realizada a audiência na qual será feita a proposta de transação. Por
outro lado, no caso de cabimento da suspensão condicional do processo, o feito
deverá ser remetido ao juiz de primeiro grau, para que seja formulada a proposta e
realizada a audiência para a aceitação ou não. Não aceita a proposta de transação
penal ou de suspensão condicional do processo, conforme o caso, os autos
retornarão ao Tribunal, que deverá retomar o julgamento do recurso (2013, p. 152-
153).

3.2. Mutatio libelli

Ocorre a mutatio libelli quando durante a instrução processual, surge circunstância ou


elementar que não faziam parte da denúncia. Nesse caso o juiz não pode condenar o réu com
base nos novos fatos, pois estaria ferindo o princípio da ampla defesa e do contraditório, da
correlação entre acusação e sentença e consequentemente o sistema acusatório, sendo assim,
os autos devem retornar ao Ministério Público, para que ele realize o aditamento da denúncia.
Dispõe o CPP:
Art. 384. Encerrada a instrução probatória, se entender cabível nova definição
jurídica do fato, em conseqüência de prova existente nos autos de elemento ou
circunstância da infração penal não contida na acusação, o Ministério Público deverá
aditar a denúncia ou queixa, no prazo de 5 (cinco) dias, se em virtude desta houver
sido instaurado o processo em crime de ação pública, reduzindo-se a termo o
aditamento, quando feito oralmente.
43

Relata Fábio Capela “o Código de Processo Penal traz a alteração no “elemento ou


circunstância da infração penal” como critério da mutatio libelli para se aferir a relevância das
provas descobertas durante a instrução” (2008, p. 107).
Relata Guilherme de Souza Nucci:

O art. 384 do Código de Processo Penal acolhe a possibilidade de o juiz reconhecer


nova definição jurídica ao fato, em consequente de prova existente nos autos de
elemento ou circunstância da infração penal, não contida expressa ou implicitamente
na denúncia ou queixa. Para tanto, deve abrir vista ao Ministério Público para que
promova o aditamento da peça acusatória, no prazo de cinco dias, nos casos de ação
pública. Outra alternativa, quando o aditamento for realizado oralmente, é a redução
a termo. É a hipótese denominada de mutatio libelli (2015, p. 611).

Decidiu o TJ:

APELAÇÃO CRIMINAL - ROUBO MAJORADO - MAJORANTE DE


EMPREGO DE ARMA E CRIME DE CORRUPÇÃO DE MENOR NÃO
CAPITULADOS NA DENÚNCIA - MUTATIO LIBELLI NÃO OPERADA -
CONDENAÇÃO - IMPOSSIBILIDADE.
Impossível o reconhecimento da majorante de emprego de arma ou a condenação do
acusado por crime diverso do capitulado na denúncia sem que se tenha operado a
mutatio libelli, em respeito ao princípio da correlação. Desprovimento ao recurso
ministerial é medida que se impõe.
(TJ-MG - APR: 10317130072901001 MG, Relator: Antônio Carlos Cruvinel, Data
de Julgamento: 14/07/2015, Câmaras Criminais / 3ª CÂMARA CRIMINAL, Data
de Publicação: 22/07/2015)
(Disponível em: <www.jusbrasil.com.br/jurisprudencias> Acesso em: 16-07-2016).

Decidiu o STJ:

PENAL. RECURSO ESPECIAL. DENÚNCIA. DESCRIÇÃO DA CONDUTA


DE ATENTADOVIOLENTO AO PUDOR. SENTENÇA QUE CONDENA O
RÉU PELA PRÁTICA DEESTUPRO. CIRCUNSTÂNCIAS NÃO
NARRADAS NA INICIAL. MUTATIO LIBELLI.NULIDADE ABSOLUTA.
RECURSO DESPROVIDO.
I. O fato imputado ao réu, na peça inicial acusatória, deve guardar perfeita
correspondência com o fato reconhecido pelo Juiz, na sentença, sob pena de
violação aos princípios da ampla defesa e do contraditório. II. Impossibilidade do
magistrado, ao promover a emendatio libelli, de modificar qualquer fato descrito na
inicial acusatória. III. Hipótese em que a denúncia foi direcionada no sentido da
ocorrência de atentado violento ao pudor, tendo sido incluída, na sentença
condenatória, conduta não descrita na inicial acusatória, com a condenação do réu
por tentativa de estupro. IV. A situação que representa hipótese típica de mutatio
libelli, diante da nova definição jurídica dada ao fato, em consequência de
circunstância da infração penal não contida na acusação, razão pela qual dependia da
participação ativa do Ministério Público, com estrita observância às formalidades
descritas no art. 384 do Código de Processo Penal, sob pena de nulidade absoluta. V.
Acórdão recorrido que merece ser mantido por seus próprios fundamentos. VI.
Recurso desprovido.
(STJ - REsp: 1195254 MT 2010/0093898-2, Relator: Ministro GILSON DIPP, Data
de Julgamento: 02/08/2011, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe
17/08/2011). (Disponível em: <www.jusbrasil.com.br/jurisprudencias> Acesso em:
16-07-2016).
44

3.2.1. Momento adequado

Em regra, o momento adequado para fazer o aditamento é na audiência, de maneira


oral, sendo posteriormente reduzido a termo, porém, na prática o Ministério Público faz o
aditamento no prazo de 5 dias, de forma escrita, como prevê o art. 384 do Código de Processo
Penal. Nos dois casos o aditamento é realizado durante a instrução processual.
Se o juiz rejeitar o aditamento, o recurso cabível é o RESE, porém se o aditamento for
feito durante a audiência, na qual o juiz proferir sentença, o recurso cabível será a apelação,
pois pelo princípio da consunção ela absorve o RESE, nesse caso, o apelante deverá abordar
como preliminar da apelação a rejeição do aditamento.
Dispõe o art. 593 do CPP § 4º “Quando cabível a apelação, não poderá ser usado o
recurso em sentido estrito, ainda que somente de parte da decisão se recorra”.

3.2.2. Procedimento

Se o Ministério Público fizer o aditamento, ocorrerá uma nova instrução processual


para o acusado ser ouvido em relação a nova imputação. Essa nova instrução não é obrigatória
se o juiz tiver conduzido a primeira instrução de forma a esclarecer os novos aspectos do
crime, com a oitiva do acusado em relação a esses aspectos.
Após recebido o aditamento, o juiz estará adstrito aos seus termos, não podendo
condenar o réu pelo fato anteriormente imputado, como esclarece o §4º do artigo 384 do CPP
ao expor: “ Havendo aditamento, cada parte poderá arrolar até 3 (três) testemunhas, no prazo
de 5 (cinco) dias, ficando o juiz, na sentença, adstrito aos termos do aditamento”.
Renato Brasileiro (2016, p. 1026) defende que “no caso de inclusão de elemento
especializante e no caso de crime complexo o juiz poderá condenar o réu tanto pelo fato
originário como pelo superveniente”. Já Guilherme de Souza Nucci relata:

Após, oferecido o aditamento, ouve-se a defesa, no prazo de cinco dias. Admitindo-


se o aditamento, o juiz, a requerimento de qualquer das partes, designará dia e hora
para continuar a audiência, inquirindo-se testemunhas e promovendo-se novo
interrogatório do acusado. Após, realizam-se os debates e julgamento (art. 384, §
2.º). Lembremos que, em face do aditamento proposto, as partes podem arrolar até
três testemunhas, no prazo de cinco dias, para serem ouvidas (art. 384, § 4.º).
Espera-se, por óbvio, que sejam testemunhas inéditas, pois ouvir exatamente o que
já foi narrado por pessoas ouvidas não tem sentido. Excepcionalmente, pode-se
arrolar quem já foi inquirido, para que forneça nova versão diante do aditamento da
acusação (2015, p. 611).
45

Aduz Gustavo Henrique Badaró:

Ambas as partes, acusador e acusado, deverão ter oportunidade de trazer suas


alegações e produzir provas para poder influir sobre o convencimento judicial.
Enfim, ter conhecimento, poder ser manifestar e produzir provas sobre a ocorrência
ou não do “elemento ou circunstância” objeto do aditamento. Não só à defesa, mas
também ao Ministério Público ou ao querelante deve ser dada oportunidade de
produzir provas e trazer suas alegações para os autos. O fato diverso pode ser
interesse primordial da acusação, embora não cause qualquer prejuízo à defesa. É
necessário que haja pleno exercício do contraditório, para a acusação e a defesa,
sempre que surgir qualquer material fático relevante no curso a instrução (2013, p.
170-171).

Já no caso de o Ministério Público não fazer o aditamento, aplica-se por analogia o


artigo 28 do CPP, ou seja, haverá a remessa do inquérito ao Procurador-Geral, o qual irá fazer
o aditamento, designará outro órgão do Ministério Público para fazê-lo, ou insistirá em não
fazer o aditamento, ao qual só então estará o juiz obrigado a atender. Se o Procurador-Geral
não fizer o aditamento nem designar outro órgão seu para fazer e o juiz entender que a
imputação originária não foi provada, ele irá absolver o acusado, o que não impede que
futuramente o Ministério Público ofereça denúncia pela imputação superveniente, pois está
não estará protegida pela coisa julgada, já que não foi objeto processual.
Relata Guilherme de Souza Nucci:

Recusando-se o órgão do Ministério Público a fazer o aditamento, o juiz aplica o


disposto no art. 28 do CPP, isto é, remete os autos ao Procurador-Geral de Justiça
(no âmbito estadual), ou à Câmara Criminal (no âmbito federal), para que se delibere
a respeito. O 2.º grau da Instituição pode insistir na mantença da peça acusatória, tal
como se encontra, sem o aditamento, o que obriga o magistrado a acatar, julgando
como bem lhe aprouver a causa. Pode, ainda, indicar outro membro do Ministério
Público para promover o aditamento, agindo em nome da Chefia da Instituição.
Por outro lado, se houver a inércia do Ministério Público para promover o
aditamento, nada impediria que, valendo-se do disposto no art. 29, pudesse o
ofendido fazê-lo (2015, p. 611).

Dispõe o CPP:

Art. 384. Encerrada a instrução probatória, se entender cabível nova definição


jurídica do fato, em consequência de prova existente nos autos de elemento ou
circunstância da infração penal não contida na acusação, o Ministério Público deverá
aditar a denúncia ou queixa, no prazo de 5 (cinco) dias, se em virtude desta houver
sido instaurado o processo em crime de ação pública, reduzindo-se a termo o
aditamento, quando feito oralmente.
§1.º Não procedendo o órgão do Ministério Público ao aditamento, aplica-se o art.
28 deste Código.
§2.º Ouvido o defensor do acusado no prazo de 5 (cinco) dias e admitido o
aditamento, o juiz, a requerimento de qualquer das partes, designará dia e hora para
continuação da audiência, com inquirição de testemunhas, novo interrogatório do
acusado, realização de debates e julgamento.
46

Aduz, Guilherme de Souza Nucci sobre a possibilidade da suspensão condicional do


processo e alteração de competência na mutatio libelli:

No caso de mutatio libelli (art. 384), também é possível aplicar os benefícios da


suspensão condicional do processo, nos termos do art. 383, § 1.º do CPP. E se
houver alteração de competência, os autos seguem ao juízo natural da causa (art.
383, § 2.º, CPP) (2015, p. 612).

3.2.3. Fato diverso e fato novo

A mutatio libelli só é cabível no caso de fato diverso, pois ele tem relação com a
imputação originária, sendo que no caso de fato novo, devido ele não ter relação com a
imputação originária, será necessário nova peça acusatória.
Aduz Gustavo Henrique Badaró:

O fato novo não se agrega àquele originalmente imputado, mas o substitui


integralmente. Assim, se o novo fato não guardar qualquer relação com o fato
inicialmente imputado, possibilitando uma nova imputação autônoma, não haverá
porque se aplicar a regra do art. 384. Os aspectos fáticos que surjam no curso da
instrução e que indiquem alteração do fato originalmente imputado devem ser
incluídos na imputação, aditando-se a denúncia ou queixa. Mas o fato novo,
dissociado do fato imputado e que dê origem a delito diverso, deverá ser objeto de
novo processo, formulando-se uma pretensão autônoma (2013, p. 181-182).

Aduz Fábio Capela:

Seguindo, então, a conclusão de que somente a descoberta de elementos ou


circunstâncias novas do fato processual originário é que terá como consequência as
providências da mutatio libelli, infere-se que, por sua vez, a descoberta de fatos
novos que não guardem qualquer associação com o fato já imputado e que dêem
origem a delito diverso, deverão ser objetos de nova imputação, formando outro
processo.
Se os fatos que caracterizem uma nova infração não guardarem uma relação de
conexão (CPP, art. 76) ou continência (CPP, art. 77) com o fato que foi objeto da
imputação originária a solução será a aplicação do CPP, art. 40 (2008, p. 110).

Nesse sentido decidiu o STF:

PENAL E PROCESSUAL PENAL - CRIME CONTRA A ORDEM


TRIBUTÁRIA - LEI 8.137/90 - CONDENAÇÃO POR FATO DIVERSO DO
CONTIDO NA DENÚNCIA - IMPOSSIBILIDADE - INAPLICABILIDADE
DO DISPOSTO NOS ARTIGOS 383 E 384 DO CÓDIGO DE PROCESSO
PENAL - MANUTENÇÃO DA IMPUTAÇÃO CONTIDA NA DENÚNCIA -
IMPROCEDÊNCIA DA ACUSAÇÃO POR FALTA DE PROVA.
1. Denunciado por crime contra a ordem tributária, que teria sido praticado mediante
falsificação de nota fiscal, não pode o Réu ser condenado pela não emissão daquele
documento, fato diverso do contido na peça acusatória, circunstância que não
encontra amparo no art. 383 do Código de Processo Penal. 2. De outro lado,
47

incabível na hipótese a aplicação do art. 384 do CPC, ainda que com o aditamento
da denúncia, a que se refere o parágrafo único do mesmo dispositivo, eis que
inexistente qualquer circunstância elementar que tenha sido omitida na denúncia e
que, provada durante a instrução criminal, imponha nova definição jurídica ao fato.
3. Além do mais, falsificação de nota fiscal e sua não emissão, referidas nos incisos
III e V do art. 1º da Lei 8.137/90 não constituem, por si sós, crime contra a ordem
tributária, mas apenas condutas que podem levar à supressão ou redução de tributo,
núcleo do tipo descrito no caput do mesmo dispositivo legal. 4. Apelação provida
para, mantida a imputação feita na denúncia, julgá-la improcedente, eis que não
provadas a materialidade e a autoria da falsificação ou a ocorrência da sonegação
fiscal. (TRF-1 - ACR: 90916 AP 1998.01.00.090916-0, Relator: JUIZ OSMAR
TOGNOLO, Data de Julgamento: 29/03/2000, TERCEIRA TURMA, Data de
Publicação: 26/06/2000 DJ p.52)
(Disponível em: <www.jusbrasil.com.br/jurisprudencias> Acesso em: 16-07-2016).

3.2.4. Mutatio libelli em ação privada

Na ação penal privada subsidiária da pública, caberá o aditamento pelo órgão do


Ministério Público. Na ação penal exclusivamente privada, somente o querelante poderá fazer
o aditamento da queixa crime, devido ao princípio da oportunidade e disponibilidade, desde
que não transcorrido o prazo decadencial de seis meses contado do momento em que o
querelante toma conhecimento do fato ou de quem foi seu autor.
Nesse sentido, expõe Fábio Capela:

Com relação à hipótese de ação penal de iniciativa privada, deve-se fazer a distinção
entre ação penal de iniciativa exclusivamente privada e ação penal subsidiária da
pública. Na primeira o legitimado ativo é somente o ofendido ou uma das pessoas
enumeradas no CPP, art. 31, já, na última, em virtude da inércia do Ministério
Público que é o legitimado ordinário, qualquer daquelas pessoas ou o ofendido
poderá apresentar queixa (CR, art. 5º, LIX; CPP, art. 29) como substituto processual
(2008, p. 125-126).

Em relação à ação privada subsidiária da pública, há um consenso na doutrina no


sentido de que cabe o aditamento pelo órgão do Ministério Público, já em relação à ação
exclusivamente privada, há dissenso doutrinário com relação à possibilidade do querelante
aditar a queixa.
Parte da doutrina entende que o querelante não pode fazer o aditamento da queixa,
sem exceções. Nesse sentido por exemplo, Fernando de Almeida Pedroso (1986, p. 263) e
Julio Fabbrini Mirabete (2001, p. 993).
De acordo com Gustavo Badaró (2000, p. 175-177) e Weber Martins Batista (1996, p.
170), que adotam o segundo posicionamento, defendem que “na ação exclusivamente privada,
pode haver o aditamento, mas ele não pode ser provocado como nas ações de iniciativa
48

pública ou nas ações privadas subsidiárias, o juiz não pode avisar o querelante que surgiu
novas circunstâncias fáticas”.
Já o terceiro posicionamento, adotado por Benedito Garcia Pozzer (2001, p. 162-163)
e Tourinho Filho (2002, p. 257), defendem que “o juiz pode com base na analogia (CPP, art.
3º), provocar o aditamento”.
Sobre essas três correntes, aduz Fábio Capela:

Das três correntes apresentadas parece que a razão está com a segunda, uma vez que
na primeira há demasiado apego aos princípios da oportunidade e da
disponibilidade, no sentido de não admitir aditamento pelo querelante nas ações de
iniciativa exclusivamente privada. Acreditar que o elemento fático a ser
possivelmente aditado à queixa já teria sido objeto de ação penal é um erro, pois não
é possível renunciar a algo que nem mesmo se sabe de sua existência. Não se deve
presumir tanto o conhecimento do novo aspecto fático por parte do querelante como
a não ciência deste mesmo elemento, como faz, neste último caso, a terceira
corrente, porque há a possibilidade de o autor da ação de iniciativa privada já, em
razão do conhecimento deste, ter se posicionado pela sua não submissão ao
Judiciário. Contrariamente, o segundo posicionamento, não fazendo nenhuma
presunção, reconhece e garante tanto os princípios da oportunidade e disponibilidade
quanto o direito ao aditamento, ou seja, o querelante pode aditar a queixa acerca do
elemento fático descoberto, todavia do juiz não poderá ser cobrado o dever de
cientificá-lo. Outro condicionante é a decadência, pois para poder haver o
aditamento mister observar se esta já ocorreu, para isso imprescindível constatar
quando o querelante teve ciência deste novo aspecto fático, se há seis meses ou mais
a decadência torna-se de imperioso reconhecimento (CP, art. 130) (2008, p. 128).

3.2.5. Mutatio libelli em segunda instância

Não se aplica a mutatio libelli em segunda instância, pois o réu tem que ter direito ao
duplo grau de jurisdição. Se houvesse o aditamento na segunda instância, o réu seria
condenado pelo tribunal, suprimindo seu direito ao duplo grau de jurisdição.

STF Súmula nº 453 DJ de 12/10/1964- Não se aplicam à segunda instância o Art.


384 e parágrafo único do Código de Processo Penal, que possibilitam dar nova
definição jurídica ao fato delituoso, em virtude de circunstância elementar não
contida, explícita ou implicitamente, na denúncia ou queixa. (Disponível em:
<www.jusbrasil.com.br/sumulas> Acesso em: 16-07-2016).

Apesar de não ser possível a mutatio libelli em segunda instância, se em primeira


instância o juiz não tiver observado o procedimento da mutatio libelli, a acusação pode apelar,
suscitando como preliminar uma nulidade, que se configura pela violação do art. 384 do CPP,
então o processo será anulado e devolvido à primeira instância, para que lá seja aplicado o que
dispõe o artigo 384 do CPP.
49

Em recurso exclusivo da defesa essa devolução para a aplicação da mutatio libelli não
pode ocorrer, pois prejudicaria o réu e infringiria o princípio da non reformatio in pejus.

Porém, se a acusação não alegou a nulidade, e a defesa também não, entendem


doutrina e jurisprudência que o tribunal não poderá declarar nulidade não arguida
em prejuízo da defesa, ante a vedação da Súmula 160 do STF. Referida súmula,
contudo, parece ter sido distorcida em tal interpretação. A vedação do
reconhecimento da nulidade não arguida pela defesa baseia-se no prejuízo que o réu
sofreria com a anulação da sentença. Daí a expressão “acolhe, contra o réu, nulidade
não arguida”. Porém, pode se indagar que espécie de prejuízo decorreria para o réu
se a sentença, no caso condenatória, fosse anulada? Antes havia contra o réu uma
condenação que foi cassada com o julgamento do recurso. O prejuízo, na verdade, é
um prejuízo indireto: o tribunal não pode aplicar o art. 384; se a sentença não for
anulada, como o tribunal não poderá condenar o acusado pelo fato originariamente
imputado, nem pelo fato diverso que restou provado na instrução, apenas poderá
absolve-lo. Com tal raciocínio, o prejuízo, que é pressuposto para a aplicação da
súmula, somente advirá caso a própria súmula seja aplicada. Transforma-se em
pressuposto o que é consequência. Além disso, é possível que, aplicando-se o art.
384, o acusado venha a ser absolvido. Nesse caso, onde estará o prejuízo? No
entanto, a aceitar-se a Súmula 160 do STF, e sendo vedada a utilização do art. 384
em segundo grau, outro caminho não restará ao tribunal senão absolver o acusado. A
sentença não poderia ser anulada pelos motivos invocados, e a condenação pelo fato
inicialmente imputado é impossível, por ter demonstrado a instrução que os fatos se
passaram de forma diversa do narrado na denúncia ou queixa (BADARÓ, 2013, p.
185-186).

O art. 384 do CPP dispõe:

Encerrada a instrução probatória, se entender cabível nova definição jurídica do fato,


em consequência de prova existente nos autos de elemento ou circunstância da
infração penal não contida na acusação, o Ministério Público deverá aditar a
denúncia ou queixa, no prazo de 5 (cinco) dias, se em virtude desta houver sido
instaurado o processo em crime de ação pública, reduzindo-se a termo o aditamento,
quando feito oralmente.

Decidiu o TJ:
APELAÇÕES CRIMINAIS - FURTO QUALIFICADO - AUTORIA E
MATERIALIDADE DEMONSTRADAS RELATIVAMENTE A DELITO
DIVERSO - RECEPTAÇÃO - MUTATIO LIBELLI - ART. 384 DO CPP -
IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO EM SEGUNDA INSTÂNCIA -
SÚMULA N.º 453 DO STF - ABSOLVIÇÃO IMPOSTA - RECURSOS
PROVIDOS. 1. Entendendo o Tribunal que a definição jurídica correta para o fato
criminoso é diversa daquela constante explícita ou implicitamente da denúncia, não
tendo havido aditamento ou inconformismo da acusação, impõe-se a absolvição dos
acusados, nos termos da Súmula n.º 453 do STF, porque inaplicável, em segunda
instância, o art. 384 do CPP. 2. Recursos providos. (TJ-MG - APR:
10145140024087001 MG, Relator: Eduardo Brum, Data de Julgamento:
09/03/2016, Câmaras Criminais / 4ª CÂMARA CRIMINAL, Data de Publicação:
16/03/2016) Disponível em: <www.jusbrasil.com.br/jurisprudencias> Acesso em:
16-07-2016.

E por fim, temos a súmula do Supremo Tribunal Federal nº 160 “É nula a decisão do
Tribunal que acolhe, contra o réu, nulidade não argüida no recurso da acusação, ressalvados
os casos de recurso de ofício”.
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CONCLUSÃO

A regra da correlação entre acusação e sentença está profundamente relacionada com o


processo acusatório, o qual tem as funções de julgar, acusar e defender, sendo que tais
funções são realizadas por pessoas distintas. Caso não existisse essa separação de funções, a
regra não teria sentido, isso porque, o referido princípio garante a separação de funções e ao
mesmo tempo impede que o juiz aja de ofício imputando fatos ao réu que não fazem parte da
peça acusatória, impedindo assim que o juiz usurpe a função da acusação.
Além de representar a garantia de defesa, a correlação entre acusação e sentença
também representa a garantia do contraditório, pois confere ao acusado o direito de debater os
fatos expostos pela acusação.
O fato imputado ao réu na peça acusatória, em regra, deve permanecer inalterado
durante todo o processo, exceto quando for caso de mutatio libelli, que ocorre quando surge
prova de circunstância ou elementar relacionada aos fatos, ocasião em que o juiz remeterá os
autos ao Ministério Público para que este realize o aditamento da denúncia. Por outro lado, na
emendatio libelli não há surgimento de fatos novos, apenas uma nova classificação dada aos
fatos já imputados.
Enfim, o juiz não pode sentenciar o processo considerando fatos que não integram a
peça acusatória, pois se assim fizesse, estaria contrariando a estrutura do processo penal
brasileiro, que adota o sistema acusatório, e este exige a separação das funções de julgar,
acusar e defender, bem como a observância de vários princípios, como o do contraditório e da
ampla defesa.
51

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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BADARÓ, Gustavo Henrique. Correlação entre Acusação e Sentença. São Paulo: Revista
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