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Centro de Estudos Jurídicos, Econômicos e

Sociais – UCPel
VI Jornadas Interuniversitarias de Derecho Constitucional y Derechos Humanos

Setembro / 2008 – Montevidéu / Uruguai

* **
“O Judiciário na contra Marcha da Liberdade”

“Nas grandes cidades, no pequeno dia-a-dia


O medo nos leva tudo, sobretudo a fantasia
Então erguemos muros que nos dão a garantia
De que morreremos cheios de uma vida tão vazia

Nas grandes cidades de um país tão violento


Os muros e as grades nos protegem de quase tudo
Mas o quase tudo quase sempre é quase nada
E nada nos protege de uma vida sem sentido

Trabalho publicado pela editora EDUCAT, da Universidade Católica de Pelotas (UCPel) em 2009.
*
Trabalho elaborado por: Frank Sebastiani Moraes; Jackson da Silva Leal; Letícia Barbosa
Hernandorena; Lucas Fagundes Machado; Wagner Barbosa Pedrotti.
**
Sob orientação de: prof. Ms. Marcelo Oliveira de Moura; prof. Samuel Chapper.
Universidade Católica de Pelotas
Centro de Estudos Jurídicos, Econômicos e Sociais
VI Jornadas Interuniversitarias de Derecho Constitucional y Derechos Humanos

Um dia super, uma noite super, uma vida superficial


Entre as sombras, entre as sobras da nossa escassez
Um dia super, uma noite super, uma vida superficial
Entre cobras, entre escombros da nossa solidez

Nas grandes cidades de um país tão irreal


Os muros e as grades nos protegem de nosso próprio mal
Levamos uma vida que não nos leva a nada
Levamos muito tempo pra descobrir
Que não é por aí... não é por nada não
Não, não pode ser... é claro que não é, será?

Meninos de rua, delírios de ruínas


Violência nua e crua, verdade clandestina
Delírios de ruína, delitos e delícias
A violência travestida faz seu trottoir
Em armas de brinquedo, medo de brincar

Em anúncios luminosos, lâminas de barbear


Viver assim é um absurdo como outro qualquer
Como tentar o suicídio ou amar uma mulher
Viver assim é um absurdo como outro qualquer
Como lutar pelo poder
Lutar como puder”

Muros e Grades

Engenheiros do Hawaii – composição: Humberto Gessinger

Resumo

O presente trabalho procura discutir de forma não legalista e acrítica três temas, que
primeiramente parecem distantes, no entanto, estão totalmente entrelaçados. De forma
radical, ou seja, atingindo a raiz da questão, primeiramente, se aborda a modernidade,
como norteador de toda nossa cultura ocidental, sendo gênese de todas as discussões e
problemas vivenciados pela atual sociedade. Conceitos criados a partir do
individualismo influenciaram toda sociedade mundial, inclusive o Judiciário, que será
objeto da segunda análise. O Direito como parte da sociedade não poderia ser diferente,
pois influenciado pelo senso comum teórico dos juristas, torna seu discurso desprovido
de crítica e complexidade, chegando às piores decisões possíveis. Dessa maneira,
procurou-se fazer um estudo de caso, abordando o Judiciário frente à prática da
liberdade de expressão. Esta, que foi impedida em várias manifestações a favor da
descriminalização da maconha em todo Brasil, desrespeitando o direito fundamental
adquirido.

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Introdução

O presente trabalho objetiva abordar a questão da liberdade de expressão, mais


especificamente a criminalização da liberdade de manifestação dos movimentos sociais.
Abordaremos três questões que poderiam parecer desconectadas, não fosse a trans
disciplinaridade que veicula a discussão deste trabalho. Estas aparentes desconexões
residem na modernidade e a sua forma de estruturação desigual e de reprodução, as
influências desse fenômeno no Estado e por via de conseqüência lógica, os
determinismos preponderantes no saber político-jurídico do Poder Judiciário e por sua
vez desembocam na discussão final que pretende analisar o caso do enfrentamento do
Judiciário e do aparato repressivo frente ao Movimento Social da Marcha Global da
Maconha.

Desta forma, sem a pretensão de esgotar a temática, pretende-se a análise de três


situações de dominação/exclusão que se interligam e produzem a manutenção da ordem
burguesa/capitalista/individualista. O que se pretende, após uma análise crítica, é avaliar
este processo de super estruturação do sistema burguês individualista e propor
alternativas, uma forma de romper com esse elo e conseqüentemente as diversas formas
de dominação/exclusão a ele inerentes, ou ainda chegar a mais questionamentos
reflexivos, o que já terá sido frutífero, ante uma pseudo-normalidade inquestionada
atualmente vigente, o modelo de sociabilidade indolente.

A modernidade complexa e a juridicidade simplificada

O primeiro capítulo apresentará breve e sucintamente a modernidade com as


suas promessas de liberdade e igualdade, repletas de desenvolvimento econômico e
progresso tecnológico. O que aqui chamaremos de modernidade, para muitos autores é
abordado como sendo a pós-modernidade ou segunda modernidade. Para Zygmunt
Bauman seria a modernidade em uma nova fase que em parte consegue cumprir com
suas promessas, mas a que custo; de quem; e até quando?

Tratar-se-á também, de questões relacionadas ao Direito Moderno, um dos fortes


pilares mantenedores da “ordem” burguesa, sua dinâmica e pressupostos legitimadores.

A modernidade que queremos trabalhar é a modernidade produtora da ordem


atual, da ordem vigente. É uma ordem que vai bem para além dos códigos normativos
que poderíamos pensar, trata-se de uma identidade ou da mais variada gama de
identidades a disposição de cada indivíduo, é claro, cada uma a seu preço. Esta
modernidade, que tem sua gênese na ampla e profunda interiorização dos ideais
individualistas, burgueses, transformando cada indivíduo encarregado por sua sorte e
responsável por seu azar. Diferentemente da etapa moderna anterior, onde o Estado
regulamentava as relações humanas e se responsabilizava por uma fatia social,
procurando minorar os efeitos da “evolução” e visando prosseguimento do crescimento
e super estruturação deste sistema.

A modernidade está ligada ao surgimento do capitalismo, ao modo de vida, de


produção, que se deu após as transformações que puseram fim a Idade Média. Essa nova
cultura teve seu ápice com a Revolução Industrial, impondo um novo estilo de vida, de
visão de mundo, rompendo com a aristocracia decadente. Esse período pode ser

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dividido em três partes: a Modernidade Liberal, a Modernidade Social e a Modernidade


Neoliberal.

A primeira se dá em função das primeiras revoluções burguesas. Aparece um


novo tipo de Estado, o Estado Liberal, que limitava o poder do soberano em relação ao
cidadão, ou seja, o Estado se minimiza, se preocupando apenas com as questões
fundamentais, tais como justiça, segurança, e o resto ficava a cargo do mercado. Devido
aos grandes problemas gerados pelo modo de produção, explícitos pela Revolução
Industrial, como a exploração exacerbada da mão-de-obra, a desigualdade social, a
fome, enfim, a miséria, leva os países a disputarem mercados, ocasionando a Primeira
Guerra Mundial. Problemas esses que criaram a necessidade de um novo modelo de
Estado, capaz de solucionar as imperfeições causadas pelo mercado.

Esse novo modelo convencionamos denominar de Modernidade Social, onde o


Estado passou a intervir mais nas questões sociais, esse “é o Estado que garante tipos
mínimos de renda, alimentação, saúde, habitação, educação, assegurados a todo
cidadão, não como caridade, mas como direito polìtico” (BOBBIO, 1991, P. 416), ou
ainda, como sugere Giddens, é o Estado em que há “trabalho para aqueles que irão
labutar, castigo para aqueles que não irão fazê-lo, e pão para aqueles que não podem
fazê-lo” (GIDDENS, 1996, p. 154). No mundo jurídico, este, se materializou através da
Constituição Mexicana de 1917, assim como a Constituição Alemã de 1919, notando
uma maior abrangência na defesa dos direitos fundamentais. No começo da década de
1970 a economia começa a demonstrar problemas de déficit público, como diria
Bauman, “Estado de Bem-Estar? Já não podemos custeá-lo” (BAUMAN, 1997. p. 51).
Sobrando como solução a minimização do Estado, passando para a terceira fase, a
Modernidade Neoliberal.

Pois bem, essa responsabilização por parte do Estado não mais se faz necessária,
não por terem se desvanecido as necessidades em decorrência do “desenvolvimento”
tecno-produtivo – o modelo burguês individualista – mas porque não mais se tem à
iminência de uma revolução social, os inimigos se dissiparam, separaram-se, não mais
oferecendo uma ameaça real de subversão ao modelo político ideológico que foi se
modificando e concedendo, para se manter da mesma forma e mais bem estruturado,
perverso e estável\inseguro.

No atual estágio as desigualdades sociais atingem todo o mundo, e o Estado se


torna ineficaz, devido seu baixo poder, insuficiente para com os problemas, e ausente
das questões fundamentais. O modelo neoliberal foi desde o início orientado pelo
consenso de Washington, que é um conjunto de princípios que vão desde a liberalização
do mercado e do sistema financeiro, fixação dos preços pelo mercado, fim da inflação
até a privatização. Os governos devem ficar fora do caminho, pois “a economia é
progressivamente isentada do controle político; com efeito, o significado primordial do
termo economia é o de área não polìtica” (BAUMAN, 1999, p. 74). O individualismo é
o principal princípio, e sabemos que ninguém se salva sozinho, todos se salvam juntos,
pois não há benevolência na era global, não há ajuda gratuita, pois a moral, assim como
o Estado provedor, já não existe. O Estado neoliberal se torna uma instituição de cunho
global, e imposto pelos países desenvolvidos como Estado democrático, como sendo o
melhor meio de desenvolvimento.

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A perversidade moderna, ademais todas as desigualdades sociais e de poder que


comporta, reside justamente na questão da insegurança, do medo, a situação de pavor
constante e sem momento e objeto determinados ou mesmo, sem inimigo definido.
Situação esta manipulada político-ideologicamente para produzir os corpos obedientes
auto-regulados dos quais se sustenta a sociedade moderna, a dinâmica capitalista e
produtiva, que planta a insegurança e incerteza, ao mesmo tempo que colhe a
manutenção ordeira e dentro de alguns limites estável. Como diria Anthony Giddens
“nossa incerteza é fabricada. A incerteza não é algo que reparamos, mas algo que
criamos e criamos sempre de modo novo e em maior quantidade, e criamos através dos
esforços para repará-la” (BAUMAN, 2000, 149). A modernidade transformou a todos
em inimigos potenciais, ao passo que a todos em vítimas potenciais; e aí reside a
perversidade e astúcia da insegurança. Norbert Elias substitui o “versus” pelo “de” na
relação entre a liberdade e a dominação, não mais havendo uma ambivalência, senão
uma complementaridade mantenedora desta lógica do consumo.

A modernidade a qual estamos falando, é a mesma que está assentada nos


postulados ideológicos e político-jurídicos de igualdade e liberdade.

No que tange à igualdade os países capitalistas avançados com 21% da


população mundial controlam 78% da produção mundial de bens e serviços e
consomem 75% de toda a energia produzida. Os trabalhadores do Terceiro Mundo no
sector têxtil ou eletrônica ganham 20 vezes menos que os trabalhadores da Europa e da
América do Norte para levar a cabo as mesmas atividades e com o mesmo resultado
produtivo. Desde a crise da dívida externa na década de 80 os países sub-desenvolvidos
tem contribuído com mais de 30 bilhões de dólares ao ano, a mais do que receberam em
novos empréstimos.
Quanto à questão da liberdade, Zygmunt Bauman, diferentemente de muitos
outros autores propõe que vivemos hoje uma liberdade sem precedentes, ao mesmo
tempo em que nos encontramos com uma impotência sem igual. A democracia liberal-
burguesa e individualista é composta, inerentemente de liberdade, que por sua vez
necessidade de autonomia para seu pleno exercício. Se não há autonomia, não há
liberdade, dado que a autonomia social é composta pela autonomia dos indivíduos que
compõem o corpo da sociedade. Só se é livre e autônomo, isto é, livre para optar e se
governar, se seus membros têm o direito e os meios de escolher e jamais renunciam a
esse direito nem o entregam a outro ou a alguma coisa.
Se a liberdade foi conquistada, como explicar que entre os
louros da vitória não esteja a capacidade humana de imaginar
um mundo melhor e de fazer algo para concretizá-lo? E que
liberdade é essa que desestimula a imaginação e tolera a
impotência das pessoas livres em questões que dizem respeito a
todos? (BAUMAN,2000, p. 9)

Boaventura de Sousa Santos nos traz ainda, que a promessa de igualdade, um


dos principais postulados burgueses na modernidade não só tolera como produz,
reproduz e intensifica, as violações dos direitos humanos em países vivendo
formalmente em paz e democracia. Quinze milhões de crianças trabalham em regime de
cativeiro na Índia; a violência policial e prisional atinge o absurdo no Brasil, enquanto
os incidentes raciais na Inglaterra aumentaram 276% entre 1989 e 1996, a violência

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sexual contra as mulheres, a prostituição infantil, os meninos de rua, os milhões de


vítimas de minas anti-pessoais, a discriminação contra os tóxico-dependentes, os
portadores de HIV ou os homossexuais, o julgamento de cidadãos por juízes sem rosto
na Colômbia e no Peru, as limpezas étnicas e o fundamentalismo religioso são algumas
das manifestações da liberdade e seus efeitos na modernidade – os efeitos da liberdade
de concorrência, de consumo, de compra de personalidades e desperdício de vidas.
O consumo é a única certeza e a principal arma vendida nos dias atuais, contra
doenças, contra a solidão, contra a fé ou falta dela, há uma infinidade de produtos cujas
necessidades se ampliam cada vez mais e cada vez mais insaciáveis. Esse consumismo
permitiu que se processasse o que Bauman chama de transformação do cidadão em
indivíduo, com seu individualismo a flor da pele, auto-suficiente e independente, de
sociedades – uma era – de dependência cada vez maior, hiposuficiência, como proposto
por Joël Roman “a vigilância é guarda dos bens, enquanto o interesse geral não é mais
que um sindicato de egoìsmos, que envolve emoções coletivas e o medo do vizinho”
(BAUMAN, 2001, p. 46).
A partir da transformação do cidadão em indivíduo e do esvaziamento de
política na vida privada, da diluição das questões públicas e da desintegração da
cidadania – após isso se tem um elemento diferenciador, a identidade ou as identidades
– todas elas compradas ou vendidas – mas o elemento diferenciador está em quem pode
ou não vesti-las, em suma, quem tem a possibilidade de comprá-las, de consumir.
Existindo, portanto, dois pólos, a dos indivíduos consumidores de identidade,
desprovidos de sua cidadania e o lixo humano, pessoas as quais não é atribuída uma
identidade, ou porque as suas identidades não são aceitas como tais, e tendo em vista a
impossibilidade de adentrarem nesta dinâmica movida pelo econômico, os extra-
hiposuficientes não são bem vindos, são a sujeira da pureza pós-moderna uma sub-
classe que não pode sequer abandonar a identidade que outros lhes impõem quiçá
escolher e manifestar preferências identitárias – pois não podem pagá-las.

De acordo com Bauman:


se os estranhos são as pessoas que não se encaixam no mapa
cognitivo, moral ou estético do mundo (...) se eles, portanto, por
sua simples presença, deixam turvo o que deve parecer
transparente, confuso o que deve ser uma coerente receita para a
ação, e impedem a satisfação de ser totalmente satisfatória; se
eles poluem a alegria com angústia, ao mesmo tempo que fazem
atraente o fruto proibido; se, em outras palavras, eles
obscurecem e tornam tênues as linhas de fronteira que devem
ser claramente vistas; se, tendo feito tudo isso, geram a
incerteza, que por sua vez dá origem ao mal-estar de se sentir
perdido – então cada sociedade produz esses estranhos
(BAUMAN. 1997, p. 27)
Este sujeito - não se utilizando o termo indivíduo, pois segundo o autor nem
disto se pode nomear este ser humano, dada a sua falibilidade como ser social
consumidor – criado pela, ou melhor, o refugo da modernidade transforma-se em um
mutante monstruoso personificando a possibilidade de todos os medos e pavores

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humanos, determinando um inimigo que era indeterminado e despersonificado. Como


demonstra Leslie Sklair, citado por Boaventura:

a cultura-ideologia do consumismo está hoje profundamente


enraizada em grupos sociais e em sociedades que carece de
capacidade econômica para se envolverem na prática do
consumo. [...] no fundo, trata-se da ideologia do consumismo
sem a prática do consumismo [...] um consumo de que se
consome activamente a sua ausência. (SANTOS, 2000, p. 270-
71)

O neoliberalismo torna-se contraditório, pois depende da tradição para sua


legitimidade, mas ao mesmo tempo necessita terminar com velhas práticas. A
modernidade, como um todo, nasceu revolucionária, contra a tirania dos monarcas,
sempre lutando por melhores condições de vida. Tanto é verdade que a burguesia
somente chegou ao poder pela derrubada de reis absolutistas, através da luta, do
derramamento de sangue. Porém, essa mesma burguesia revolucionária que até hoje se
encontra no poder, tornou-se conservadora, oprimindo todos aqueles que não estão de
acordo com seus ideais, se é que há ideais. Até mesmo aqueles que concordam podem
vir a ser vìtimas da “mão invisìvel” do Estado, que somente é invisìvel para o mercado,
pois para a repressão ela é bem visível.

Aqui (EUA), o método favorito tem sido o de confinar as


„pessoas supérfluas‟ em guetos urbanos que cada vez mais
parecem campos de concentração. Se isso não dá certo, apela-se
para as cadeias, que são a contrapartida, numa sociedade mais
rica, dos esquadrões da morte que nós treinamos e apoiamos em
nossos domínios (CHOMSKY, 2001, p. 38)

O medo nos leva a tudo, a fantasia, ao risco, e por sermos iguais, “da igualdade
deriva a desconfiança, e da desconfiança, a guerra” (HOBBES, 2004. p. 95). O risco que
o outro nos trás nos leva a agir sem pensar, ao inconsciente coletivo. A pureza é a visão
das coisas colocadas em seus lugares, é uma visão de ordem, ou seja, com a finalidade
de eliminar os excluídos, aqueles que estão fora do lugar, que estragam o quadro. Não
ligamos para as razões do outro, desde que ninguém ao nosso redor nos coloque em
dúvida, então, é por isso que a chegada do outro nos coloca em insegurança, como diria
Sartre, “o inferno são os outros”.

Vizinhos do lado inteiramente familiares e sem nenhum


problema podem da noite para o dia converter-se em estranhos
aterrorizantes, desde que uma nova ordem se idealiza; inventa-se
um novo jogo no qual é improvável os vizinhos de ontem
competirem placidamente, pela simples razão de que a nova
ordem está prestes a transformá-los em estranhos e o novo jogo
está prestes a eliminá- los. (BAUMAN, 1997. p. 20-21)

Dessa forma os estranhos se vão agrupando em pequenos grupos, sexuais,


étnicos, desempregados, sem terra...e entoando o coro por liberdade, por oportunidade,
por igualdade e por aceitação da diferença, esta situação que se acirra e se tem

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transformado e como diz o autor “a luta pela igualdade se torna uma luta pelo poder –
mas o poder, por conta própria, não reconhece a igualdade” (BAUMAN, 1997, p. 46).

Aqueles que contestam verdades pré-estabelecidas nunca foram vistos com bons
olhos, porém, sem eles a sociedade permaneceria estática até os dias atuais. É notório
que em toda história da humanidade o modelo de sociedade só mudou através da
tomada do poder, da revolução, e posteriormente tornando-se conservador, ou seja, o
revolucionário de hoje será o conservador de amanhã, nem que isso tenha que passar
por cima de seus próprios princípios. Esse conservadorismo quando não assume um
fundamento lógico, toma forma de fundamentalismo, o certo é a alienação, é aceitar o
status quo, e todo aquele que estiver insatisfeito é visto como anti-social.

En la sociedad del riesgo lo imposible y los efectos derivados de


esta demanda de control conducen, a su vez, a lo que se había
considerado superado: al ámbito de la incertidumbre, de la
ambivalencia, en una palabra, de la alienación (BECK, 1994, p.
24)
Esta modernidade “ordeira” tem como pilar mantenedor o Estado que quanto aos
direitos econômicos e políticos regula desregulando o mercado neoliberal, que está na
gênese deste sistema, quanto aos direitos sociais regula através de ordenamentos
genéricos ineficazes de apelo individual do cuidado consigo mesmo sem se
responsabilizar pelos efeitos desse afastamento social.

Diante das promessas e das realizações do modelo de sociabilidade moderna em


fins do século XX e início do XXI propicia o que coloca Boaventura “Há um
desassossego no ar. Temos a sensação de estar na orla do tempo entre um presente
quase a terminar e um futuro que ainda não nasceu” (SANTOS, 2000, p. 41) visto que
as probabilidades de catástrofe individual e coletiva se elevam quase à certeza.
O Estado Constitucional e de Direito Moderno foi concebido como uma
máquina perfeita de engenharia social. A sua constituição formal, mecânica e artificial,
conferia-lhe uma força e uma deformação nunca antes conseguidas por qualquer outra
entidade política. A força era simultaneamente externa e interna; externamente através
do poder militar e desenvolvimento econômico, contra os Estados estrangeiros e
concorrentes na acumulação de capital; e internamente, sobremaneira por meio do
Direito, contra inimigos potenciais de uma transformação social normal e ordeira – ou
contra a transformação social que extrapole os moldes pré-determinados. A deformação,
resultante de uma utilização institucional e jurídica sistêmicas, reside na capacidade do
Estado de decidir quais os meios normais e anormais e quais os fins normais e anormais
da transformação social. Estas características transformam o Direito em um ente de
controle/dominação naturalizada – como proposto por Boaventura “esta naturalização
do Estado exigia a naturalização do Direito Moderno como direito estatal” (SANTOS,
2000, p. 170).
Este, um pilar importante nessa estrutura. O Direito Moderno que, juntamente
com o modelo societário vigente sofreu uma grande influência da ciência moderna
tradicional – as ciências naturais – primando pelo resultado quantificado. O que não
fosse quantificável seria cientificamente irrelevante, de preferência que fosse
quantificável em cifras. Através de um determinismo mecanicista e funcional

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newtoniano, reconhecido menos pela capacidade de compreender profundamente a


realidade e mais pela possibilidade de dominá-la e transformá-la.

A hipercientifização como propõe Boaventura do pilar da emancipação permitiu


promessas brilhantes e ambiciosas. Mas, à medida que foi passando o tempo, foi
ficando visível e patente que a ciência não só não deu conta de todas as promessas que
fez, mas também ampliou os déficits, aumentando e potencializando os efeitos destes
déficits, da exclusão, da exploração e da criatividade de dominação.

Para entender desenvolvimento desequilibrado e hipercientificizado da dinâmica


do Estado moderno é necessário não esquecer o desenvolvimento concomitante, e
igualmente desequilibrado, talvez gritante seja a ostensividade da regulação. Como
propõe Boaventura “enquanto a regulação se torna impossìvel, a emancipação torna-se
impensável” (SANTOS, 2000, p. 57).

Ao Direito Moderno foi atribuída a tarefa de assegurar a ordem burguesa


individualista, cujo desenvolvimento criava e se desenvolvia em meio ao clima de caos
social. O Direito Moderno passou, assim, à estatização, já que a prevalência política da
ordem sobre o caos foi atribuída ao Estado moderno, pelo menos transitoriamente,
enquanto a ciência e a tecnologia não pudessem a assegurar por si mesmas. Nos países
desenvolvidos o Estado apresentava-se forte – internamente flexível e externamente
rígido; enquanto os países subdesenvolvidos, centrifugados por este sistema e
enxugados no ceio deste, apresentam-se como externamente flexíveis, maleáveis e
internamente rígidos, punitivos. Criando assim, no mínimo três esferas jurídicas, a
estatal oficial, a supra-estatal do mercado internacional; e, a infra-estatal, sistemas
político-jurídicos no interior do mesmo Estado à recusa flagrante deste que
ostensivamente deslegitima e combate por não reconhecer estas ordens. Como proposto
por Boaventura Santos:

Os problemas e dilemas da racionalidade moderna ocidental


decorrem do facto de ela ter confiado a gestão das suas
potencialidades a uma forma de conhecimento, a ciência, que
progressivamente se transformou na força produtiva, por
excelência do capitalismo, e uma forma de normatividade, o
direito moderno, que, de um golpe revolucionário foi
transformado em propriedade do Estado e, portanto, dos grupos
sociais que controlam o Estado e que, por essa via, tem o
privilegio de transformar os seus interesses em interesses
nacionais (SANTOS, 2000, p. 191)

Neste sentido, a noção de comunidade forjada significa a ausência do Outro, do


diferente especialmente um outro que teima em assim ser, e precisamente por isso capaz
de causar surpresas desagradáveis e prejuízos. O medo da incerteza, que é cada vez mais
certa, fundado na experiência da vida, encontra a largamente procurada, e bem-vinda,
corporificação. Esta postura social e até político-jurídica não mais será afastada, mas
sim até mesmo desejada dada a criação da insegurança e do medo. O combate
defensivo/agressivo que produz seu próprio alvo, sua legitimação e razão de existir.
Graças a ela, o estranho é metamorfoseado em alienígena, e o alienígena, numa ameaça.
Como propõe Bauman “O antigo sonho da pureza, que há não tanto tempo embalou a
visão da sociedade „perfeita‟ (transparente, previsìvel, livre da contingência), tem agora

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como objeto principal a “comunidade do bairro seguro” (BAUMAN, 2003, p. 105). No


pólo adverso desta comunidade “normal” e ordeira preconizada pelo modelo societário
vigente e pelos viventes que hoje clamam por segurança total é o gueto artificial e
humano, onde se amontoam os descartáveis e para os quais se voltam os olhos do
Estado Sistêmico, não para realocá-los, para coibi-los.

A guetificação, como propõe Bauman, é o lugar urbano onde se deposita o lixo


humano, quando não mais necessários à mão-de-obra reserva e transmutam-se em
consumidores falhos e com isso a sua perigosidade, ou como resume Wacquant em sua
abordagem “não serve como reservatório de trabalho industrial disponìvel, mas como
mero depósito [daqueles para os quais] a sociedade circundante não faz uso econômico
ou polìtico” (BAUMAN, 2003, p. 105). Este é o processo social quase que automático,
onde se afastam indivíduos diferentes; mas não é o único, acompanha o processo
complementar político-jurídico de criminalização do diferente, do estranho, do perigoso,
da pobreza, fazendo com que haja uma constante troca, migração de indivíduos dos
guetos para as penitenciárias (o confinamento absoluto), e vice-versa retornando cada
vez com menos expectativas e menos desejável.

Este processo – a criação dos guetos - é paralelo e complementar à


criminalizaçao da pobreza. Há uma troca constante de população entre os guetos e as
penitenciárias, um servindo como grande e crescente fonte para a outra. O Estado, mais
especificamente através do Judiciário como guardião ou produtor da ordem recorre à
produção de dor como meio de reconciliar os pobres com sua nova condição – um
processo de domesticação de pobres modernos incertos em um mercado de trabalho –
na melhor das hipóteses como mão-de-obra barata e sem qualquer garantia e que a única
regra é produzir/consumir, ao passo que a única contrapartida é a liberdade de escolha.

A fim de garantir um ambiente seguro, muitos políticos são eleitos para


combater os desordeiros, que reagem aos valores morais, a tradição. O que os governos
são eleitos para combater são quaisquer tipos de manifestantes, mendigos, perturbadores
e ladrões. “A polìtica agora é feita no mercado” (SANTOS, 2005, p. 67) e para o
mercado, com o intuito de aparentar maior confiança aos investidores, pois se assim não
for o investimento será retirado, tornando a política dependente da economia. A atual
fase da modernidade nos causa um mal-estar, segundo Bauman, o mal-estar da pós-
modernidade nasce da liberdade, quanto mais liberdade individual menos segurança, por
isso então cada vez mais a liberdade é perseguida. O Judiciário nada faz sobre isso, pois
também está contaminado por essa cultura decadente, usando os velhos métodos
ineficazes de soluções para os conflitos, ficando claro que a alienação chega a todos os
níveis do poder.

Ao mesmo, tempo que é transformado em filial político-jurídica da lógica global


internacional e subalterna economicamente, repudia e combate as dinâmicas internas e
desatende aos seus interesses sociais, culturais, identitários.

A simplicidade das leis constitui uma simplificação arbitrária da realidade que


nos confina a um horizonte mínimo para além do qual outros conhecimentos da
natureza, provavelmente igualmente ricos deixam de ser conhecidos ou caem no
esquecimento, legitimando uma repressão estatal-oficial aos diferentes, pessoas que não
se enquadram nos padrões societários individualistas-burgueses-consumistas ou porque
não querem ou porque não podem ser ali admitidos, tampouco são reconhecidos na

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condição em que se encontram de desnecessários e descartáveis-descartados, e quiçá


manifestar-se por esse reconhecimento, seria uma atitude contrária à ordem subversiva e
combatida.

Esta dinâmica sistêmica do Direito moderno legitimador e reprodutor da ordem


globalizada, da economia de cassino e do oficializado estranhamento com os seres
despossuídos do poder de consumo, será abordada adiante. O reflexo desta lógica no
Judiciário com suas profissões e instituições inerentes.

O Judiciário Moderno e o Velho Modelo de Controle

O liberalismo ou liberalismos, formas de ser estar e pensar, apesar de algumas


críticas atuais, é um termo e uma ideologia em alta, predominante, hegemônica. Que
tem por seus dogmas os ideais de liberdade e igualdade – formais – submissão diante do
império da lei. Estes conceitos, forjados e manipulados politicamente, de acordo com a
época e contexto, permitem o controle através da retórica, regula-se e manipula o corpo
social.
A democracia, da mesma maneira, se utiliza e é formada por estes ditos
mistérios (pois ninguém conhece) de liberdade e igualdade formal; ao mesmo tempo,
que também é manipulada pelo modelo liberal de acordo com as necessidades de
manutenção do sistema, Jose Eduardo Faria diz que a democracia é uma fórmula aberta
e indeterminada, não só um importante ponto de apoio para o discurso político, como
também uma significativa orientação para a criação de estratégias com sentidos também
cambiantes de acordo com as necessidades contextuais.

Faz-se muito pertinente também a retomada da clássica atribuição de cegueira à


Justiça, como sendo um indicativo de imparcialidade, e servindo de instigante reflexão,
que guiará este ponto do presente trabalho. Como propõe Luiz Antonio Bogo Chies e
Marcelo Oliveira de Moura – se a Justiça é cega, lê em Braille, melhor seria se fosse
daltônica1 . Prosseguem ainda, os autores, que a Justiça está calcada precipuamente em
dogmas, símbolos com definição inquestionada. Propõem, todavia, que esta seja
conduzida por enigmas, pois, como propõe Luiz Alberto Warat o dogma é crença
advinda de um mistério, enquanto que o enigma é algo que deverá ser constantemente
enfrentado e problematizado. Em suma, deve ser cultivado uma cultura
permanentemente crítica de combate ao senso comum teórico dos juristas 2 .

1 Nesta obra os autores trabalham o mito da justiça, sendo cega, necessitaria ler em Braille a fim de ter
contato com os signos e símbolos que operacionalizam a pretensa resolução de conflitos. Permitindo com
que sejam negligenciados as particularidades de cada caso conflituoso que amplia as insuficiências do
fenômeno jurídico em sua tarefa apaziguadora diante da complexidade e multiplicidade das relações
sociais e a conflitualidade potencial que encerra. Por sua vez, o daltonismo jurídico, pelo fato de
enxergar, no entanto não poder confiar no seu sentido e com isso nos símbolos que ele traduz, procederia
com maior cautela e analisando as especificidades e contexto de cada caso.
2
“se encontram condicionados, em suas práticas cotidianas, por conjunto de representações, imagens,
noções baseadas em costumes, metáforas e preconceitos valorativos e teóricos, que governam seus atos,
suas decisões e suas atividades.” (WARAT, Luís. (...) In: FARIA, José Eduardo. A Crise do Direito
Numa Sociedade em Mudança. P. 31.

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O modelo político jurídico liberal está estruturado a partir de uma liberdade


controlada pela lei, genérica e abstrata, onde tudo que não está proibido está permitido,
possibilitando a retórica intencionalidade libertadora:
[ao passo que] na dinâmica da ordem jurídica oriunda do
modelo liberal de organização do Estado e do Direito, suas leis
não se limitam a informar, ou seja, a proibir ou autorizar
condutas, a estimular ou desencorajar novos comportamentos.
Elas também sutilmente procuram formar a opinião dos
indivíduos, ou seja, calibrar suas expectativas, forjar seus
desejos e padronizar suas reações, motivo pelo qual, investidas
de autoridades e estruturadas de modo diretivo, apelam tanto
para os símbolos quanto para os ideais presentes no imaginário
social com a finalidade de moldar os indivìduos, segundo „o
espìrito da legalidade‟ burguesa. (FARIA, 1997 p. 27).

No mesmo sentido, depreende-se que a eficácia do Direito depende menos da


sua coerência lógico-formal do que de um complexo e intrincado código de signos e
símbolos, dogmas culturalmente difundidos, relegando a um segundo plano a
aplicabilidade efetiva e particularizada do Direito; ou a voz da consciência, preconizada
pela moral burguesa liberal e individualista – como propunha F. Nietzsche “o estudo de
uma pedagogia da crueldade com fins éticos e polìticos” (CARVALHO, 2008, P. 172);
continuando com F. Nietzsche “[a] finalidade no Direito é a última coisa a se empregar
na história da gênese do Direito [...] todos os fins, todas as utilidades são apenas
indícios de que uma vontade de poder se assenhorou de algo menos poderoso e lhe
imprimiu o sentido de uma função” (CHIES; MOURA, 2005, p. 30).
José Eduardo Faria começa a abordagem de ”A crise do Direito numa sociedade
em mudança” com uma pertinente indagação - Que tipo de Direito se afigura entre nós
no futuro próximo: uma ordem legal fundada apenas e tão-somente no primado da
racionalidade formal, garantindo as regras do jogo político e econômico, para que um
pouco integrada e discriminativa possa jogá-lo livremente ao sabor de suas
contradições, reproduzindo assim uma desigualdade real, ou, uma ordem normativa
mais flexível, capaz de conciliar certos procedimentos formais com as exigências de
racionalidade material, em termos de justiça substantiva, a partir de uma ampla reforma
de nossas estruturas socioeconômicas? (FARIA, 88, P. 7) Ou ainda, como questiona
Boaventura, poderá ser o Direito emancipatório? (SANTOS, 2003, p. 4) Nos moldes
como está erigido?

Pode-se começar tentando fazer uma abordagem a partir do tempo-espaço


presente, de como se apresenta ou é apresentado o Judiciário moderno. O saber jurídico-
normativo moderno não tem conseguido ou mesmo pretendido dar conta das
complexidades e multiplicidades da vida moderna. A causa disto muito está em ser um
ente formalista e isolado das relações sociais. Não sendo um ente autônomo e auto-
suficiente, forma-se a partir de um embate classista que procura a defesa dos próprios
interesses, ou seja, regulação/organização a fim de manter e definir um padrão de
relações sociais. Estas, que são definidas e reguladas a partir de sua individualidade, ou
seja, a partir de uma estratégia de dispersão, de isolamento dos fatos e seus
desdobramentos como sendo situações únicas e sem relação com seu entorno, retirando

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as possibilidades de discussão e problematização político-jurídica destes


acontecimentos. Uma contextualização muito eloqüente é a que expõe Wolkmer:

há que se relembrar a trajetória nacional do centralismo legal e


sua natural convivência não só com o autoritarismo estatal
intervencionista, como basicamente, com uma sociedade
marcada por instituições frágeis e submissas, uma cultura de
importação e reprodução, uma ideologia de liberalismo
conservador, uma democracia formal e elitista, uma economia
historicamente dependente etc. (WOLKMER,1994, p. 74)

Ao mesmo tempo que este modelo de Estado e de Direito permitiram e


impulsionaram o desenvolvimento econômico (de alguns), ampliaram as possibilidades
produtivas – modelo liberatório das relações privadas de consumo e produção. Sendo
assim, também produziram e permitiram a potencialização das desigualdades inerentes
quando se trata de repartição de benefícios materiais finitos.
Retomando a questão da disparidade abismal imperante e produzida pelo modelo
capitalista de sociabilidade e controle social onde a população 20% mais pobre tem 2%
da riqueza produzida no país, já os 20% mais ricos, detém 66% da riqueza nacional. É
nesta mesma estrutura societária que se projetam discursos e procedimentos político-
jurídicos embasados em postulados gerais ou princípios gerais do Direito como „boa fé’,
„função social‟, „bem comum‟ e „fins sociais ’(...). No entanto, não de acordo com a
pseudo-intencionalidade, mas de acordo com a realidade fática da situação social e
aferível das práticas político-jurídicas modernas no Brasil é visível a partir da
perspectiva de que classe ou grupos partem desses conceitos e seus objetivos. Dessa
forma, o aparato jurídico-estatal permanece com a ritualística tradicional e seus prazos e
procedimentos kafkianos, sem qualquer objetivação e sentido, absolutamente alienígena
para os profanos3 .
Desigualdades econômicas que se transmutam em sofrimentos e necessidades de
ação por parte dos desiguais; o que não é tolerado e não cabe neste modelo, que propõe
e remonta o „ideal‟ de justiça e „justo‟ para que seja aceito um modelo paralelo de
Estado, regulador da convivência social e dos espaços públicos e suas relações, que é
antagônico com os postulados anteriormente referidos, trazendo não a liberdade, mas o
controle, um sistema regulatório que pretensamente propõe a diminuição das
discrepâncias sociais, enquanto apenas mantém – como coloca Boaventura – em um
nível tolerável de desigualdade, permitindo a manutenção do sistema.

Através de um corpo técnico, que, diferentemente do que romanticamente se


poderia pensar, fazem parte desta mesma sociedade classista, ou pior, fazem parte da
classe dominante, permeados de pré-conceitos, valores éticos e identidade burguesa,
ampliados pelo dogmatismo que permeia, ao mesmo tempo que estrutura o Direito
Moderno, o deforma, pela dinâmica legalista-mecanicista. Esta formação elitista é bem
visível inclusive na forma como se compõe os Tribunais no Brasil, a partir da própria
legislação nacional que estabelece o concurso público para escolha de um servidor que
irá trabalhar com os interesses sociais, aprovado nos testes um manual de condutas do

3
Termo utilizado remeter às pessoas absolutamente estranhas ao universo jurídico e seus
desdobramentos.

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“profissional da área”, tais como freqüência de lugares e convìvio social entre outras
questões pertinentes a um juiz, afinal na cultura local, este é tido como um quase Deus,
pois traduz para a sociedade a “vontade legislativa de fazer justiça” – sem nunca ter tido
contato com esta Justiça efetivamente. Como propõe Wolkmer:

trata-se de um órgão elitista, quase sempre ocultado pelo


pseudo-neutralismo e pelo formalismo pomposo, age com
demasiada submissão aos ditames da ordem dominante e move-
se através de mecanismos burocrático-procedimentais onerosos,
inviabilizando, pelos seus custos, o acesso da imensa maioria da
população de baixa renda. (WOLKMER,1994, p. 89-90)
Com o isolamento dos fenômenos sociais, e à mercê de um juiz que por sua vez
é reflexo dos interesses da classe que pertence, como propôs Karl Marx, não é a
consciência que determina seu ser social, mas sim seu ser social que determina sua
consciência. Lédio Rosa Andrade coloca que “os conflitos jurídicos não possuem
relação com os conflitos sociais. Cria-se uma falsa realidade, e, desse mundo de
fantasias, onde os fatos são trocados por conceitos, nascem as decisões judiciais”
(ROSA, 1996, p. 94 ); nas palavras de José Eduardo Faria “à medida que as concepções
de mundo são o inevitável ponto de partida de toda reflexão sobre o próprio mundo
sobre a vida humana e sobre a sociedade” (FARIA, 1988, p. 20). Assim, o Direito
retoma uma característica clássica, ser sinônimo de „dever ser‟ – no entanto, o dever ser
de que se trata atualmente é diferente daquele tradicional, sendo o atual o dever ser da
normatividade social burguesa ordeira, o que já se verifica e apenas se constata a
repressão legal por vezes; o que não é verificável com tanta facilidade é o dever ser da
legalidade positivada e conquistada pelas classes populares ao longo de décadas de luta
por garantias, que continuam apenas no plano teórico e positivo, longe da efetividade
dos direitos fundamentais como liberdade de expressão e igualdade real perante a lei. O
Direito é um espaço em disputa, onde a função do jurista crítico é de reconhecer esse
antagonismo de idéias. “Por isso, tudo o que os juristas digam para fazer acreditar que o
Estado protege aos mais fracos constitui uma ideologia mentirosa, apologética, digna do
maior desprezo, e que deve ser combatida em todos os terrenos” (CORREAS, 1995, p.
260). Todo aquele que não crê na disputa ideológica que se trava, está servindo ao
discurso dominante, e se esconde por detrás de discursos fáceis e vazios, que é
declarado falso empiricamente, bastando observar a realidade desigual e injusta que nos
rodeia.
José Reinaldo de Lima Lopes nos propõe que o Direito positivado e suas
instituições e organizações não foram criados para dar conta mesmo dos interesses de
todos quando mais das classes desfavorecidas, relegando a esses contingentes de
pessoas a posição de mera assistência da ineficácia quase que total dos fundamentos da
Constituição, diminuição de seus efeitos, emperrados na burocracia dos tribunais
caracterizada por uma prática forense retrógrada ou então na burocracia processual que
arrasta no tempo os anseios sociais. Estas pessoas estão excluídas porque não
contribuem para o estado democrático de consumo, e assim, apenas tem contato com a
justiça, ou melhor, com o Judiciário, quando em posição passiva do julgamento, pois
apenas tem contato com a intencionalidade repressiva desse sistema judicial; pior ainda,
que esta situação não é ocasional, nem acidental, quiçá transitória, mas sim o fruto bem
calculado e planejado de um modelo político-jurídico-econômico burguês-individualista
moderno que é construído para funcionar a partir do viés apenas de uma parcela da

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sociedade, o que nos permitiria denominar de Estado de anti-Direito ou na denominação


de Celso Fernandes Campilongo para esse modelo de Estado classista excludente e de
Direito formalista e normativista repressor “comitê polìtico da burguesia” (FARIA,
1988, p. 97) no mesmo sentido, Wolkmer denuncia:

[que] trata-se de uma instância de decisão não só submissa e


dependente da estrutura de poder dominante, como, sobretudo,
de um órgão burocrático do Estado, desatualizado e inerte, de
perfil fortemente conservador e de pouca eficácia na solução
rápida e global de questões emergenciais vinculadas, quer às
reivindicações dos múltiplos movimentos sociais, quer aos
interesses das maiorias carentes de justiça e da população
privada de seus direitos. (WOLKMER, 1994, p. 89)

Ademais, que se transforma em uma situação preocupante é que, essa estrutura


vai se naturalizando e sendo interiorizada pelas classes populares, não por eles criada,
mas por eles aceita e reproduzida, é um modelo burguês que persuade a toda sociedade,
não apenas a parcela da burguesia, o que seria fadado ao fracasso sob uma ótica
capitalista neo-repressora de insustentabilidade. Nas palavras de José Reinaldo Lima
Lopes - a classe desfavorecida “aceita o discurso da dominação e aceita, entre outras
coisas, porque sua forma de sobreviver é sujeitar-se. Curioso paradoxo: resistir é
sobreviver e para sobreviver e preciso sujeição à lógica do sistema social se que impõe”
(FARIA, 1988, p. 77). Boaventura coloca que “a esmagadora maioria da população que
sofre as conseqüências da intensa destruição e da intensa criação social está demasiado
ocupada ou atarefada com adaptar-se, resistir ou simplesmente subsistir, para sequer ser
capaz de perguntar” (SANTOS, 2003, p. 3).
Warat propõe que o discurso ou a dogmática jurídica moderna e atual se utiliza
da institucionalização a-científica e acrítica que nos persuade com a deificação e
naturalização de alguns postulados político-jurídicos e sociais para assegurar a pseudo-
normalidade normativa que mantém o sistema da exclusão/dominação. Ou, o que nos
interessa mais no presente trabalho, as castrações das liberdades ou simplesmente
demonstra que esta não existe, senão quiçá na intencionalidade legal do legislador do
Estado democrático de (anti)Direito.
Esta estrutura - da reabertura democrática do sistema judicial enfrentou uma
crise de paradigmas, calcado, até então, em uma cultura jurídica autoritária e burocrática
advinda de um período de repressão e antidemocrático onde as faculdades de Direito
foram disseminadas para abarcar os anseios de uma determinada classe social,
transformando as faculdades em nascedouros de burocratas. Nessa época a tecnicização
dos cursos atendia a necessidade de formar quadros para o fortalecimento do Estado
Burocrático e conseqüentemente assegurar uma abertura “ampla e gradual” dentro dos
padrões do regime - a fim de enfrentar as pressões das classes médias urbanas que
desejavam ver seus filhos na Universidade, com o escopo primordial de suprir os
quadros da administração pública, ocorrendo, conseqüentemente, reformas educacionais
sempre dissociadas do contexto socioeconômico, fazendo com que se conseguisse a
fidelidade das novas gerações em troca de diplomas de nível superior, sem ter
conhecimento do sistema jurídico e muito menos da interdisciplinaridade inerente ao
Direito e a sua função de apaziguador de conflitos em uma sociedade com um número
cada vez mais destes e com complexidade também crescente – resultado: nascem as

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piores decisões possíveis. O que impede os aplicadores - e os estudantes, que é onde é


formado o problema, ou onde ele desemboca – de poderem apreender a realidade social
e a efetiva aplicabilidade da norma e não aplicar o fato à norma, mantendo a lógica da
generalidade e superficialidade fenomenológica. Na exposição de Salo de Carvalho
“este otimismo na razão sistematizadora ofuscou a pluralidade dos fenômenos existentes
na realidade e as infinitas formas de interpretá-los, impediu perceber inúmeras formas
de manifestação das verdades; [...] que transpõem os horizontes da moral”
(CARVALHO, 2008. p. 179-180).
O modelo de juridicidade atual é tão pretensamente a-temporal, que ao mesmo
tempo em que é denominado moderno, utiliza-se de instrumentos ultrapassados ou
melhor ineficazes para a resolução dos conflitos, em um tempo denominado moderno
onde o futuro é a conquista-objetivo principal ou melhor o futuro é daqui há dez
minutos, o Direito se preocupa, quase que unicamente com o passado, com os fatos já
ocorridos, raras as vezes e dependendo dos interesses em jogo que se cogita a prevenção
no mundo jurídico, normalmente a mecanicidade e a legalidade remetem à repressão ou
ressarcimento, ressurgindo a lógica que parece, esperamos que não, perpétua da
sobreposição do interesse econômico (ressarcimento) como guia, e a imunização dos
indesejados como solução (repressão).

Esta postura estatal, do Judiciário, com características já expostas acima,


formalista, legalista, mas ainda mais, com dispositivos legais gerais, inespecíficos, é não
só a causa da falibilidade imediata do sistema jurídico como sendo o principal
apaziguador de conflitos dada a multiplicidade das relações sociais, mas também a
estratégia para apaziguar os anseios por dispositivos regulamentadores legais/oficiais
sem nada regular e normatizar e em nada produzir efetivamente pela vida em sociedade.
Celso Fernandes Campilongo aponta como necessário um processo de
desinstitucionalização dos conflitos4 , permitindo dinamismo e especificidade entre os
postulados jurídico-dogmáticos ou enigmáticos (problematizáveis), através, como
proposto por François Ewald (FARIA, 1994, p. 66), de princípios norteadores e
sociologicamente extraídos e aferíveis, propondo um equacionamento dos benefícios e
dos riscos advindos desta sociedade moderna e suas relações sociais complexas, e após,
aí sim, poder-se efetivamente visualizar no Judiciário um ente de combate à
perversidade da legislação estatal oficial generalista.

No entanto, o Judiciário que se verifica ainda hoje no Brasil é o Judiciário fiel à


lei, à legalidade burguesa capitalista, formal e circunscrito às suas próprias atividades, o
que Campilongo denomina de “folclore judicial”, onde não se desenvolve uma
interpretação, existe um bloqueio, na melhor das hipóteses esse bloqueio é a
Constituição. Como eloqüentemente propõe Lopes “há vários sujeitos com poder de
veto, e poucos com poder de decisão” (FARIA, 1994, p. 90).
Desta forma, da análise do sistema jurídico e da resolução de conflitos de
interesses no Brasil, extrai-se que este sistema é basicamente uma pretensa máquina de

4
“há que se ter consciência de que a categoria „conflito‟, aqui, insere-se no contexto de uma ordem
capitalista periférica e dependente, simbolizando lutas históricas de sujeitos sociais que reivindicam
necessidades fundamentais capazes de erradicar a condição de exploração econômica, dominação política
e exclusão cultural.” (WOLKMER, Antonio Carlos . Pluralismo Jurídico: Fundamentos de uma nova
cultura do Direito. P. 85)

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garantia dos direitos e garantias conferidos pela legislação (direito adquirido e ato
jurídico perfeito), ou seja, parte-se do pressuposto que se tem algo a defender. No
entanto, os maiores problemas estão nos pseudo-direitos conferidos pela Constituição
Federal e nunca regulamentados, utilizando-se da prática generalista e sem qualquer
objetividade ou mesmo objetivo social, não atribuindo qualquer direito e consoante, não
havendo o que exigir do Judiciário, e estamo-nos imersos nesta cultura onde a falta dos
dispositivos legais regulamentadores e códigos é o maior entrave, ficando o indivíduo
imerso em sua estagnação, dominação, imobilidade social, cultural, político e
economica – desprovido de sua liberdade com autonomia se é que é possível liberdade
sem autonomia, acreditamos que não.

A liberdade abordada no texto, se refere à liberdade em sua generalidade e mais


especificamente na forma da de expressão, que por vezes é entendida como sendo um
ameaça ao modelo societário, e o é, dadas as rupturas e incongruências que se mostram
cada vez mais visíveis. Como propõe Warat

à medida que cada discurso crítico é sempre colidente com os


mecanismos de controle social, a possibilidade de algum
eventual diálogo quase sempre acaba sendo substituída por um
confronto aberto e explícito. E, no campo de luta, que é menos
acadêmico e mais político, os paradigmas vigentes se valem da
ironia ou da marginalização para neutralizar o contradiscurso –
isto quando não proíbem sua circulação ou cassam não só a voz,
mas a própria cidadania política de seu interior. (FARIA, 1988,
p. 26-7)

A par disto, abordaremos a batalha que é travada contra esta liberdade, os


mecanismos que são utilizados para corrompê-la e deslegitimá-la, quando não impedi-la
pela força, quando os argumentos não são bastantes e o apoio da massa popular alienada
na luta pela sobrevivência não se soma.

Judiciário X Liberdade – Um estudo de caso: Porto Alegre e a Marcha


O projeto „modernidade’ foi erigido a partir de uma promessa denominada
democracia. Que por sua vez era fundamentada a partir da igualdade – de participação,
de direitos e deveres etc. – e liberdade – respeito a toda forma de diferença. Em suma,
este projeto proclamava a tolerância. Somente tolerando a opinião alheia se consegue
uma harmonia social, ou seja, tolerância é um conceito que deve ser trabalhado sempre
que houver possibilidade de desrespeito à liberdade. Tolerância consiste na ausência de
repressão à liberdade de se manifestar. Na modernidade a palavra tolerância tomou um
significado de atitude de autoridade pública quando esta renuncia a possibilidade de
penalizar a opinião, ou sua manifestação. Voltaire já previa que a aceitação de
convicções políticas divergentes tomaram (riam) consistência, mostrando os perigos que
a intolerância poderia trazer. Para o autor, a discórdia é o grande mal do gênero
humano, e a tolerância é seu único remédio.
Como fora proposto em J. J. Rousseau, que acreditava na bondade dos homens,
que se reúnem através de um pacto de associação, não de submissão. Por isso, os
homens alienam parcela de sua liberdade e criam o sistema estatal, para que este

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defenda sua liberdade, e não a suprima, sendo assim, a liberdade de expressão se torna
inerente à cultura moderna, pois sem ela, todos os demais perderiam a razão. Ainda, há
bem pouco tempo, com essas promessas, se procurava afastar o fantasma comunista, em
um período de bipolaridade político-ideológico e cultural de guerra fria, este modelo era
representado como sendo um modelo de risco/insegurança, econômico,
político/ideológico, social.
Hoje, não mais existe o temor frente ao modelo comunista, não mais carecendo
que estas promessas façam tanto sentido quanto necessitavam antes, após a vitória do
modelo capitalista burguês, começam a ficar claras algumas falácias, começam a cair as
máscaras, tais como a igualdade, os direitos, a liberdade... Demonstrando ser o modelo
de sociabilidade do risco, por excelência, onde a insegurança não tem limites, assim
como não tem tido o crescimento econômico e o desenvolvimento tecnológico, ao lado
da desigualdade social, iminência de conflitos armados, catástrofes ambientais (...) a
modernidade dos riscos imprevisíveis e incalculáveis.

Um interessante mecanismo de contenção na sociedade moderna neoliberal é o


auto e recíproco-controle, uma das facetas do atual sistema neocontrolador donde os
indivìduos se policiam mutuamente pela moralidade burguesa do „politicamente
correto‟, tal ideologia permeia não apenas os indivìduos como também as instituições
privadas e governamentais. Como enfatiza Passeti “[esta polìtica está] atravessando as
existências, definindo comandos e obediências, disciplinando em lugares, e agora
também comunicando em fluxos, exigindo polìcia, consagrando a segurança”
(PASSETI, 2004. p. 156).

O sistema moderno foi constituído a partir da maior ficção já criada pelo


homem, através do Contrato Social, na qual os homens em comum acordo reconhecem
uma autoridade acima de todos, capaz de garantir sua segurança. Desta forma, deixou de
existir o selvagem, e passa-se a cultivar o outro, o estranho, o grupo subversivo, que
foge aos padrões, criados pelo humano „civilizado‟ e integrado ao sistema.

Neste contexto, permite-se que estes indivíduos sejam convocados à


(não)„participação‟ burguesa, participação de intensidade moderna e com a velocidade
dos meios de comunicação contemporâneos – da informática imediata - que invisibiliza
e suprime as resistências, transformando-os, a todos, em produtores não só de bens
materiais, como de consciência e postura indolente, como a programática
computacional. Como propunha Bauman, “A liberdade de consumo e a liberdade de
expressão não são politicamente dificultadas desde que se mantenham politicamente
ineficazes” (BAUMAN, 1989. p.141).
Este projeto moderno de liberdade, ou mais, a liberdade neoliberal carece de
regulação, controle e repressão – mormente quando estes indivìduos, as „classes
perigosas‟ não de adéquam à (não) participação neocontrolada; ou seja, repressão para
os descontroláveis. Para tanto, foi instaurado no modelo de sociabilidade neoliberal a
cultura do medo, gestionado para fins de criação da necessidade da sociedade de
controle, bem como identificação dos objetos de intervenção deste controle. A cultura
do medo e o clamor público pela segurança são os elementos utilizados pela máquina
estatal coordenada trans nacionalmente – através de políticas criminalizadoras e
seletivas - para a contenção de determinados setores e grupos. O medo assume a
característica maquiavélica de plataforma eleitoral, sendo discurso fácil e obrigatório de

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qualquer representante político, além de desenvolver setores responsáveis pela


segurança. O medo se torna obsessão e produto de venda, sendo a principal demanda de
leitores e telespectadores de notícias. Não obstante ter sido alargado o rol de direitos e
garantias constitucionalmente previstos “[...] na atualidade, a função real de controle das
massas inconvenientes e a simbólica de tutela de novos interesses sociais”
(CARVALHO, 2008, P. 89).
Faz-se uso das palavras de Bauman “os governos podem sentir-se aliviados,
ninguém ou quase ninguém pressionaria para que fizessem algo acerca de coisas que
eles são frágeis demais para agarrar e controlar” (BAUMAN,1999. p.127), o problema é
o “quase”, nessa esteira entram os movimentos sociais que tencionam no sentido
contrário, contra esse capital extraterritorial opressor e dominador, são frutos da
insatisfação com a opressão e inoperância do Estado, que não garante a dignidade
humana, mas algo tem que ser feito para preservar esta ordem tão segura e cômoda para
quase todos, ou melhor, para quem deve ser, como conseqüência são criminalizados e
enquadrados no crime de „porte ilegal de fala‟. Eles não possuem o direito de falar, são
baderneiros, perturbadores da paz e segurança pública e por isso, merecedores e
carecedores de punição exemplar, ou ao menos, o suficiente para que se calem.

Com a pseudo-liberdade concedida pelas constituições modernas liberais,


paralela as discrepâncias de poder, nas suas mais variadas formas (político, econômico,
cultural) – faz-se com que, quase natural ou por instinto, surjam as contestações. A falta
de credibilidade nas instituições democráticas gerou o terreno fértil para o
fortalecimento dos movimentos sociais, essa cultura consumista como conseqüência
cria uma sociedade frustrada e passiva de um lado e rebelde e geradora de alternativas
de outro. Existe uma lógica contraditória, pois a mesma sociedade que cria o “outro”,
cuida da sua repressão. Apesar de, a sociedade moderna caracterizar-se pela
fragmentação, ainda conseguem se unir grupos que contenham uma dada marca de
dominação em comum. Em consonância com Voltaire “posso não concordar com uma
só palavra do que dizeis, mas defenderei até a morte vosso direito de dizê-lo”
(VOLTAIRE, 2001. p.217). E em conjunto, fornecer a discordância que tem gerado o
repúdio estrutural e sistemático, pois a reflexão não faz parte da modernidade
neoliberal, ou pelo menos não pode fazer.

Via de regra, esses grupos dissidentes são inclusive passíveis de uma cartografia
social, pois normalmente pertencem à determinadas classes falhas, à raça estranha, à
gênero subordinado ou adepto de uma religião perigosa; ou à qualquer tipologia ou
forma de diferenciação que os torne não mais detentores de sua cidadania, mas
meramente um custo e objeto de política pública filantrópica subtraindo e
impossibilitando cada vez mais profundamente a possibilidade de manutenção ou
cultivação de uma alteridade pessoal individual e grupal.
Assim “a ameaça parte „de baixo‟, das vielas e cortiços, dos homens com
costumes „anômalos‟ e lìnguas incompreensìveis, das doutrinas revolucionárias e
instabilizadoras, do outro que está dentro como a peste” (RODRIGUES, 2004). E estes
devem ser contidos dentro do espaço que lhes é destinado na sociedade, o gueto ou a
penitenciária. O isolamento espacial, sempre foi a maneira encontrada quase que
instintivamente pelo poder para lidar com os setores inassimiláveis e problemáticos da
população, os ditos difíceis de controlar, principalmente quando o são por não
desejarem se acomodar. Existe em nossa sociedade a tendência cada vez maior de lidar

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com o indesejado dando um significado criminoso a estes atos e punindo-os com a


prisão. Pois assim, diminuímos a possibilidade do intercâmbio com a dessemelhança.

O modelo societário moderno-liberal transforma o exercício das liberdades em


motivação para movimentação da máquina repressiva estatal oficial, muitas vezes de
forma extra-oficial ou informal. Como brilhantemente propõe Édson Passetti:
do mesmo modo que uma criança abala a ordem das coisas
afirmando sua liberdade diante das regras fixas que lhes são
apresentadas, o sossego do governo do Estado é abalado por
aqueles que agitam provocando riscos. Eles são insuportáveis.
Assim, como criança que precisa ser educada, os agitadores
devem ser localizados, identificados, castigados e reeducados.
Ambos (crianças e subversivos) são caracterizados, pelas leis e
pelos saberes científicos, como pessoas perigosas, elementos
que pertencem a grupos que necessitam de tutorias, curas,
punições, banimentos. Formam, numa só pessoa, um duplo que
carece de educação para superar a infância da existência e
adentrar à vida adulta responsável dos que trabalham, pagam
impostos, votam, cumprem deveres e se vangloriam de obter
direitos. (PASSETI, 2004, p. 152)
Como propunha Antônio Negri e Michael Hardt, a presença do inimigo, não
demonstra clara e diretamente o que é o poder, mas permite com que, identificando esta
personificação da contestação se projete a insegurança e a partir dela – da insegurança,
ou da necessidade de segurança, incida o poder, a repressão, a força trans-estatal. Como
profere Hannah Arendt, “o clìmax do terror é alcançado quando o estado policial
começa a devorar os seus próprios filhos, quando o carrasco de ontem torna-se a vítima
de hoje” (ARENDT, 1985. p. 30).
Este é o gérmen do estado de terror em que vivemos. O combate repressivo à
contestação de situações perversas que o próprio sistema criou e ampliou através da
transformação da voracidade de lucro em Estado de Guerra permanente, Estado de
exceção contínuo5 . Segundo os autores, uma das estratégias de impedir a insurgência é
jogar o político contra o social e a justiça contra a liberdade.

Após esta ligeira contextualização sobre a criação do medo e do inimigo como


conseqüência automática da liberdade real, como resume Vera Malaguti Batista “o
medo tem sido o condutor das subjetividades e um poderoso aliado dos dispositivos de
controle social [...] a difusão do medo do caos e da desordem tem servido, [...] para
detonar estratégias de neutralização e disciplinamento do povo brasileiro” (BATISTA,
2003. p.1). Aliado a isto, o Sistema Judiciário como temos tentado demonstrar; e, os
efeitos reflexos perversos da modernidade na sociedade, principalmente
subdesenvolvida e subalterna.

5
“O conceito constitucional de „estado de exceção‟ é evidentemente contraditório – a constituição precisa
ser suspensa para ser salva -, mas esta contradição é resolvida ou pelo menos atenuada pelo entendimento
de que o período de crise e exceção é breve. Quando a crise deixa de ser limitada e e specifica,
transformando-se numa onicrise generalizada, quando o estado de guerra e, portanto, o estado de exceção
torna-se ilimitado ou mesmo permanente, como acontece hoje em dia, a contradição manifesta -se
plenamente, e o conceito adquire um caráter completamente diferente” (HARDT; NEGRI. 2005, p. 27).

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Propicia-se o cenário para as justificativas e motivações para o combate aos


movimentos sociais de contestação. No presente caso, a Marcha Global da Maconha,
embate o qual se pretende demonstrar neste trabalho - não colocando hierarquicamente
acima das abordagens feitas acima, apenas procurando entrelaçar a ponto de poder
demonstrar o caráter repressor-punitivo do Estado de Direito-controle Moderno.

No presente caso, a marcha que ocorreria no primeiro final de semana de maio,


milhares de pessoas em todo o mundo sairiam às ruas em mais de 200 cidades para
lembrar a luta política contra a proibição que tornou ilegal o cultivo de plantas da
espécie “Cannabis sativae” em quase todos os países do mundo, inclusive as grandes
capitais de vários Estados Federados do Brasil. No entanto, o referido movimento social
de contestação foi severamente combatido, pelos meios ideológicos, utilizando-se do
discurso ético moralista burguês antes mencionado; por meios jurídicos, através de
posicionamento do Judiciário, que foi provocado a se pronunciar, chancelando as
alegações de que seria apologia ao consumo de drogas e, portanto, crime; e através de
repressão policial, a fim de fiscalizar a(s) decisão (ões) judicial (is), a fim de proceder a
prisão em flagrante delito, o da apologia.

Neste sentido muito interessante a colocação de Maria Palma Wolff, acerca da


complexidade que tal situação envolve, para além da simples alegação da apologia ou
mesmo do consumo ou venda de entorpecentes, mas sim a mera personificação do
outro, do diferente, subversivo; quando se torna necessário a identificação e controle
repressão:

O uso de drogas e a criminalidade, em uma sociedade de


consumo, freqüentemente aparecem na cena pública como
ameaças, descontextualizadas de uma rede complexa de fatores
econômicos, políticos, subjetivos, ligados aos ideais sociais de
consumo. Alguns autores auxiliam-nos a pensar que o que é
percebido como ameaça, na verdade trata-se de risco produzido
como conseqüência do laço social. Estes fenômenos podem
então ser considerados „restos sociais‟. Estes restos, silenciados
sobre a origem, produzem riscos associados à vinculação do uso
de drogas com a rede de tráfico e à fixação em um imaginário
construído em torno da droga como – inimigo- a combater.
(WOLFF, 2005, p. 128)
Contextualizando ainda, internacionalmente, pela incursão dos Estados Centrais,
sobretudo os Estados Unidos da América, que se alçavam como empresários da
moralidade „assumindo a defesa da raça humana‟ na luta contra as drogas, difundindo a
imagem do demônio da droga “que se prestava como um desejo incontrolável de
prazeres exóticos, que debilita a força de vontade do indivíduo e faz aparecer nele
instintos bestiais de luxúria e ira incontroláveis” (OLMO, 1989).

Este controle que na sociedade moderna se faz pela via criminal, como se isso
pudesse não só resolver como apreender/compreender a complexidade das relações e
situações conflituosas – tornando o Direito Penal e as políticas criminais,
pretensamente, no principal (para não dizer o único) ente protetor, à salvaguardar a boa
convivência humana, retomando novamente a colocação de Nietzsche quando propõe
que uma vontade de poder se assenhorou de algo menos poderoso (o Direito, atualmente

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e, sobretudo o Penal) e lhe imprimiu a legitimação de uma função, estatizando a


personalidade/identidade de Narciso6 , assim como também deixa claro suas feridas –
paradoxos e incongruências.
Desta forma, se fez o repúdio à Marcha, que deveria ocorrer em diversas cidades
do Brasil, como ocorreu no restante do mundo. Movimento de apoio às políticas
antiproibicionistas que ocorreria sem qualquer cunho apologético – muito antes pelo
contrário, de acordo com os próprios organizadores internacionais, trata-se de
movimento com nítido caráter cultural e artístico, com atividades musicais, teatrais e
performáticas em geral, além da criação de espaço de debate com palestras, seminários
e exibições de documentários relacionados às políticas públicas, notadamente às ligadas
às drogas – lícitas e ilícitas.

No entanto, a regra, foi a proibição, como divulgado pela imprensa do Rio


de Janeiro, divulgou em trinta de abril de 2008 a ocorrência de prisão de cinco pessoas
que divulgavam o movimento através da distribuição de material informativo; além do
impedimento no Rio de Janeiro, a imprensa nacional noticiou a proibição das
manifestações em outras sete capitais: Belo Horizonte, Brasília, Cuiabá, Curitiba,
Fortaleza, João Pessoa e Salvador. Além da instauração de Inquérito Policial contra os
seus idealizadores em João Pessoa; o Ministério Público da Paraíba, através de
manifestação da Procuradora-Geral, atribuiu à Polícia a tarefa de intervenção. Em Porto
Alegre, o Jornal Zero Hora descreve a manifestação do Sub-Comandante Geral da
Brigada Militar, Coronel Paulo Roberto Mendes:

“Não vamos tolerar apologia às drogas. Nenhuma manifestação


a favor do uso da maconha será tolerada. Já estamos avisando
antes, para que eles nem tentem fazer nada do tipo.”
“(...) A ordem é clara: recolher todo o material e recolher ao
Judiciário. Em princípio, quem fizer apologia será alvo de um
termo circunstanciado.”

Desta forma, foram movimentados importantes pilares do sistema Justiça


brasileiro, o Ministério Público e o Judiciário, bem como o corpo policial de repressão.
Repressão que é feita através de mecanismos oficiais, extra-oficiais, jurídicos, culturais-
midiáticos e repressivos-punitivos. Não simplesmente contra a apologia, mas dela
utilizando-se para identificar e enquadrar determinado grupo dentro do modelo punitivo
estatal oficial brasileiro abrangente, vago e seletivo – para afastar liberdade de
contestação, a possibilidade de modificação do sistema político jurídico ideológico
burguês.
Importante salientar que, não só não é a droga em si o problema e o objeto das
políticas criminais proibicionistas contentoras, como o tratamento nesta empreitada
policialesca também não é uniforme e indiscriminada, donde, aos jovens de classe
abastada „infratores‟ (consumidores de alguma droga ilìcita) recebem o estereótipo e o
tratamento médico; já os jovens pobres, com toda a carga social pejorativa que
carregam, são enquadrados pelas malhas do sistema penal, pela criminalização.
Demonstrando ser sim, um processo visivelmente seletivo e discriminatório, para não

6
Sobre a politica criminal e sua identidade Narcísica, bem como suas perversidades e falibilidades ver:
CARVALHO, Salo de. Anti Manual de Criminologia. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2008.

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dizer genocida, que captura pelas vulnerabilidades e um fragmento do sistema de


afastamento e aprisionamento das classes perigosas.

A Marcha Global da Maconha, um movimento social por excelência dada a


relevância da discussão que há tanto tempo se suscita, mas a igual longo tempo se
protela e reprime, avançando mais em algumas localidades e estagnada em muitas
outras. O núcleo central da manifestação é possibilitar a discussão democrática e a livre
manifestação do pensamento acerca de política criminal que, ao longo do tempo,
produziu efeitos dramáticos em termos de incremento da violência, do encarceramento
massivo e da corrupção dos agentes estatais. O próprio Ministro do STF Marco Aurélio,
no voto proferido no HC 83.125 afirma que “não há Estado Democrático de Direito
sem observância da liberdade de expressão”. No caso proposto, trata-se, igualmente, de
exercício de livre manifestação do pensamento e de crítica, o que deve ser assegurado,
na qualidade de direito fundamental, pelo Judiciário, contra atos de coação como os
divulgados pela imprensa. Neste sentido, vale trazer a problematização da liberdade em
Thiago Rodrigues:
Liberdade que se coloca não como um fim ou bem supremo a
ser buscado como utopia, mas como uma prática a ser vivida
pelo questionamento constante das verticalidades e pela
afirmação de novos contatos que cortejem a supressão das
hierarquias e que passa pela identificação da justiça criminal
como uma força perpetuadora de agressões e violência.
(RODRIGUES,2004)

Dentro desse contexto, a desobediência civil consiste na luta pacífica, sem


confronto físico, como muitas vezes foi empregada na história, como é o caso de
Gandhi na independência da Índia, Martin Luther King na luta dos direitos civis dos
negros nos EUA (...). A manifestação tem sido usada como meio da sociedade para
refletir sobre determinados assuntos que seu preconceito não tolera. A desobediência
civil trata-se de um direito de exceção, sobretudo, em tempos de Estado de Exceção,
que não necessita de nenhum tipo de positivação, pois ele garante outro direito básico e
fundamental, como nesse caso, o da liberdade de expressão, sendo reconhecido como
um direito de resistência. Portanto, como explica Thoreau, “manifeste integralmente seu
voto e exerça toda sua influência. Jamais se deixe confiar por um pedaço de papel. Só é
indefesa uma minoria quando se conforma a maioria” (THOREAU, 2003. p. 26).
Muitas vezes somente através da manifestação de pensamento a sociedade ouve e
reflete. Não haverá mudanças sem críticas, não haverá liberdade enquanto houver o
opressor, pois este também está preso, como diria Rousseau, “o homem nasceu livre e
em toda parte se encontra sob ferros” (ROUSSEAU, 2006. p.14).

Não obstante toda a hostilidade e esforços para o impedimento, bem como os


esforços dos organizadores e colaboradores, dividindo posicionamentos diversos, tanto
dos órgãos judiciários como das posturas policialescas - Porto Alegre transforma-se em
ocasião, lamentavelmente, de exceção. Em virtude de ter sido impetrado habeas corpus
preventivo por Salo de Carvalho e Mariana Weigert, permitindo que a Marcha Global da
Maconha ou mais que o direito de liberdade, de movimento social, de contestação,
sobretudo em oposição aos movimentos proibicionistas e política criminal (movimento

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da Lei e Ordem; Defesa Social; Ideologia de Segurança Nacional...) o Direito Penal do


Inimigo7 - ocorresse sem embaraço policial.

Tendo em vista estar o modelo de sociedade moderna submetido, subjugado a


um Estado social mínimo e um Estado penal máximo. A atualidade do Direito Penal é
conduzida por uma perspectiva criminológica bio-psico-social sanitarista, onde são
identificados os indivíduos desviantes, contestadores e portadores da diversidade, que se
transformam em objeto da eliminação, contensão. Pautando as políticas criminais a
partir da criminologia do outro “do pária ameaçador, do estrangeiro perturbador, do
excluído e do desagradável, opera na perspectiva de diabolizar o criminoso, a estimular
os medos e as hostilidades populares e a sustentar que o Estado deve punir mais”
(CARVALHO, 2008. p. 150).

Mesmo após tentar mostrar que está claro que a falácia da substancialização do
crime e do criminoso, que fazem parte de determinados indivíduos ou classes, isto é
visível no mundo acadêmico, e ainda não abarca todo este, existindo ainda uma ou
várias gerações que fundamentam o poder repressivo do Estado em degenerescências
que são socialmente criadas pelo próprio sistema moderno atual tanto de produção
quanto de punição e não patologias individuais ou de determinados grupos
(seletivamente especificados), resultado da ampliação perversa das desigualdades
modernas e potencializadas suas vulnerabilidades, isto, somado à incidência dos
aparelhos repressivos oficiais, se obtém o nosso Estado de Penitência Social ou de
exceção permanente, onde são retiradas as liberdades constitucionalmente previstas,
mas quase nunca concedidas, ao menos para a maioria. Demonstrando claramente o
quanto é tênue a linha divisória entre violência legítima ou não, quanto mais em se
tratando de „segurança‟ nacional – que não se satisfaz, não tem limites e o pior, não
aufere resultados positivos.

Retomando o questionamento de Boaventura de Sousa Santos – poderá ser o


Direito emancipatório? Em um sistema de sociabilidade neoliberal que postula a
igualdade e liberdade controladas e vigiadas e onde se disseminam o medo e a
intolerância, os principais assombros da idade das Trevas – parece que não foram
vencidos ainda pela racionalidade, apenas ampliados e tornados mais perversos.

Ou, por fim, a liberdade e a dignidade proclamas pelas democracias neoliberais


burguesas individualistas são desmascaradas/denunciadas não tão metaforicamente
quanto gostaríamos por Eduardo Galeano “Dignidade era o nome de um dos campos de
concentração da ditadura chilena e liberdade o maior presídio da ditadura uruguaia”
(GALEANO, 1999. p. 42).

Conclusões

A conclusão é no sentido de salientar a importância de se levar em conta a


complexidade particularizada, não só do modelo societário brasileiro, mas de toda a
América Latina. Tendo em vista a multi-diversidade cultural, étnica e religiosa a ela

7
Sobre as discussões em torno de política criminal de drogas, sobretudo crítica da instrumentalidade
penal moderna ver: CARVALHO, Salo. A política Criminal de Drogas no Brasil: estudo criminológico e
dogmático. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2007.

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inerente, como proposto por Boaventura, remontando José Martì “a América Latina é o
oposto da Europa, longe está de ser um povo homogêneo, é plural, mestiça, [...] fundada
do cruzamento, muitas vezes sangrento entre o sangue europeu, ìndio e africano”
(SANTOS, 2006. p. 200). Particularização potencializada pela alta intensidade dos
fluxos relacionais advindos da globalização hegemônica e a perversidade de ampliação
e amplificação dos efeitos da modernidade neoliberal importada – e por sinal, bem cara.

Como já foi abordado, o individualismo é o grande mal a ser combatido na


modernidade, na medida em que acaba com a idéia de coletividade. Causando o medo
pela incerteza, nunca sabemos quando seremos a próxima vìtima do “outro” que não
conhecemos. “A promessa moderna de evitar ou derrotar uma a uma todas as ameaças à
segurança humana foi até certo ponto cumprida (...). O que, no entanto, deixou
flagrantemente de se materializar é a expectativa de liberdade em relação aos medos”
(BAUMAN, 2008, p. 169). Assim, a flexibilização dos direitos já adquiridos é o único
remédio para a insegurança aceito pela sociedade. Suprimindo o antigo Estado Social,
em detrimento do Estado Prisional, onde havia tolerância, agora há tolerância zero, tudo
que é sólido desmancha no ar.

Os defensores do sistema insistem em dizer There is no Alternative, no entanto,


discordando dessa lógica, nos atrevemos a apontar algumas possibilidades. O Direito,
como um território em disputa, deve ser disputado sem deixar nas “mãos invisìveis” do
mercado. O sentido comum teórico dos juristas aliena sua capacidade de observar seu
falho sistema exegético, alienando a percepção de considerar o descompasso entre a
realidade socioeconômica brasileira e o discurso jurídico. Para Warat, o combate a esse
pensamento é o discurso crítico, denunciando a falsa neutralidade, e colocando o jurista
como pertencente e interventor da ordem social.

No pensamento de Gramsci, a mudança pode se dar através da superestrutura.


Esse pensador cunhou o conceito de intelectual orgânico, que atuaria nas mudanças
necessárias, partindo de dentro do próprio sistema, e nesse contexto encontra-se também
o jurista. Os orgânicos fazem parte do organismo vivo e em constante transformação
que é a sociedade, em contrapartida ao intelectual tradicional defensor do status quo.

Todo grupo social, nascendo no terreno originário de uma


função essencial no mundo da produção econômica, cria para si,
ao mesmo tempo, organicamente, uma ou mais camadas de
intelectuais que lhe dão homogeneidade e consciência da própria
função, não apenas no campo econômico, mas também no social
e político: o empresário capitalista cria consigo o técnico da
indústria, o cientista da economia política, o organizador de uma
nova cultura, de um novo direito, etc (GRAMSCI, 2000, p. 15).

É nesse contexto que surge o jurista orgânico, como propõe Marx “os filósofos
(juristas) somente interpretaram o mundo de diversas maneiras, a questão, porém, é
mudá-lo” (MARX, 1995, p. 210). Mesmo, ocorrendo uma profunda reforma ou
reconstrução do sistema de justiça, seria a solução, talvez, para o Judiciário, porém
nunca a solução para os problemas da modernidade. Portanto o Judiciário não seria o
último garantidor de direitos. E sim, apenas mais um. Não podendo, o Direito, sozinho,
de forma alguma, possibilitar uma sociabilidade emancipatória.

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Neste sentido, para além do Poder Judiciário, importante trabalhar as questões


político-jurídico-culturais de forma trans disciplinar como - talvez única forma de
apreender e compreender a complexidade societária moderno-subalterna latino
americana de grandes contingentes de exploração e exclusão. Como proposto por
Antonio Negri e Giuseppe Cocco “[quando os sistemas jurìdicos, polìticos e culturais]
apresentam-se como mecanismo de universalização [...] o embuste é evidente: ter direito
aos direitos no neoliberalismo significa ter poder de compra, ser consumidor” (NEGRI;
COCCO. 2005. p. 53).
Porque a trans disciplinaridade? Não se desfazendo da interdisciplinaridade, pois
já poderia ser de algum avanço. Mas, ou não deu conta das complexidades e da
conflitualidade a ela inerente, ou ainda permanece a palavra poder, sendo última
instância. Ainda, a interdisciplinaridade, nada mais é que a congregação de saberes
científicos em direção a um objetivo. Pois bem, a sociedade moderna e em permanente
exceção (penitência, pauperismo, violência) necessidade de algo para além do saber
cientifico, juntamente com ele, mas também saberes que perpassem essa ciência, que
inegavelmente, vem permeada de preconceitos hegemônicos e com soluções
hegemônicas, para um povo tido como, na melhor das hipóteses, insurgente.

A interdisciplinaridade tem permitido a caída em reducionismos punitivos


afirmacionistas; como forma de dar vazão à voz feminista, à voz negra (do índio... a
questão do racismo), aos homossexuais, ao movimento contra o aborto, ao movimento
da segurança nacional contra o terrorismo - que aqui, transmuta-se em uma guerra
contra a criminalidade e seu conexo a droga - e etc.

Porém, a trans disciplinaridade permitiria, ir além do saber cientifico, mesmo


que integrado, mas importado. Propiciaria com que se possa reconhecer e valorizar o
conhecimento local, como característica inerente ao povo a que pertence, ao invés de
importar modelos prontos, analisar as questões sob o prisma local e visualizando os
efeitos que se propagarão; como diria José Martì “os governadores da República dos
Índios, aprendem ìndio” (SANTOS, 2006. p. 202). Propiciaria ainda a produção da
Biopolítica – donde se emaranham as questões econômicas, sociais, culturais, políticas
(...) bem como a discussão destes campos, não como autônomos que se influenciam,
mas como um só e que deve ser pensado e questionado de múltiplas formas.
Essas questões estruturais, aliadas ao clamor mestiço, transformariam as
adversidades político-jurídicas e culturais em imagens desestabilizadoras como a fome,
o trabalho forçado, a invasão cultural, o preconceito, a dominação patriarcal – a
subtração da liberdade – como na proposição poética da brasileira Cecília Meireles,
“liberdade – essa palavra, que o sonho humano alimenta: que não há ninguém que
explique, e ninguém que não entenda!” (MEIRELES. 1981. p. 75).

A liberdade, socialmente falando, nada mais é do que a tolerância com a


diferença, com o estranho e a privacidade/intimidade, não ser penalizado por recusar a
intromissão de outras pessoas em momentos específicos, lugares específicos e durante
atividades específicas. – estar longe de supervisão, e sem medo de reprovação.

Como propunha Bauman, “quando a experiência de opressão é comum, também


o é o esforço para a liberdade” (BAUMAN, 1989. P. 83); dessa forma, canalizando esta
supressão da liberdade transforma-se em uma forma de consciência rebelde que
produzirá a Multidão. Formação esta que preconiza e reside na mantença da diferença

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de seus integrantes, conglomerando todos os saberes encontrados em seu seio como


válidas, sejam eles científicos ou não. Não é um projeto meramente político ou uma
obra intelectual a ser apenas discutida nos fóruns dos detentores do saber, mas sim um
projeto a ser posto em prática por todos diariamente, como um exercício identitário,
como nas palavras de Oswald de Andrade “antes de se tornar um projecto polìtico,
nuestra América é uma forma de subjectividade e de sociabilidade. É uma forma de ser
e de viver permanentemente em trânsito” (SANTOS, 2006. p. 204).

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