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adaptadas à perspectiva de recitação contemplativa, baseadas nas instruções para meditação contidas no livro

Comentário Sobre o Ngondro


INSTRUÇÕES PARA AS PRÁTICAS PRELIMINARES CONCISAS DO BUDISMO TIBETANO

obra escrita por Chagdud Khadro


em referência à prática do Dudjon Tersar Ngondro, compilada dos Ensinamentos orais de

S.EMA. CHAGDUD TULKU RINPOCHE


“Ó ser nobre, você deveria pensar em si
como alguém que está doente,
no Darma como o remédio,
no seu amigo espiritual como um médico habilidoso
e na prática diligente como o caminho para a cura.”

Sutra Estruturado como uma Árvore


O NASCIMENTO HUMANO PRECIOSO “Homenagem! Ó Lama, constante protetor infalível, você que conhece:
As liberdades e dotes do nascimento humano são extremamente difíceis de serem obtidos.”

Eu contemplo a importância de ter um precioso nascimento humano dotado de todas as liberdades e condições
necessárias à prática espiritual... Quão raro é!
Quão incerto é o fato de obtê-lo novamente, já que a mente pode facilmente guiar-me a um reino não humano ou a
um renascimento humano não plenamente dotado...
Quão grandes devem ter sido minha virtude e aspiração prévias para que tenha acumulado essas afortunadas
condições atuais...
Eu contemplo até que a excepcional oportunidade contida nessa vida, que não deve ser tomada como certa ou
desperdiçada, torna-se claramente aparente...
Afinal, permito que a mente descanse em meditação natural e não-conceitual.

Penso naqueles que estão sofrendo nos reinos inferiores e que têm pouca possibilidade de obter um renascimento
humano, pois densos obscurecimentos os impedem de gerar mérito...
Penso nos que têm um corpo humano, mas que não são dotados das condições condutivas ao desenvolvimento
espiritual... Reflito sobre os que obtêm um nascimento humano mas o desperdiçam em buscas mundanas, ou
destroem sua oportunidade por fazer mal a outros...
Trago a lembrança de que, até para os praticantes, a posse desse tempo de vida continua tão incerta quanto a
duração de uma chama de vela ao vento... Surge em mim um sólido desejo de que todos os seres encontrem
liberação de circunstâncias espirituais empobrecidas.
Então minha mente relaxa.
As Quatro Contemplações Que Transformam a Mente 1
Ó Lama, que é a corporificação dos budas e bodisatvas das dez direções!
Que esta jóia que realiza desejos, que é o nascimento humano, não seja jogada irreparavelmente no oceano do samsara.
Ao invés disso, possa ser bem utilizada para criar mérito e obter reconhecimento da verdadeira natureza da mente.
Que aqueles que estão sofrendo em outros reinos possam obter um renascimento humano.
Que os seres humanos não dotados de condições espirituais possam encontrá-las.
Que aqueles dotados de condições espirituais possam realizar suas mais altas aspirações.
Que eu possa adquirir o poder de ajudá-los.
Então descanso minha mente.

Em todas as minhas vidas passadas tive inúmeros corpos. Cuidei, alimentei e defendi cada um deles.
Se todos os seus cadáveres fossem empilhados, formariam uma montanha do tamanho do Monte Meru.
O sangue que correu nesses corpos e as lágrimas que caíram em frustração formariam um enorme oceano.
Mesmo assim, não fui capaz de obter a iluminação nestas vidas.
Agora, através da acumulação de todo o meu mérito, alcancei esse atual nascimento extraordinário.
Vou utilizá-lo bem, para o máximo benefício de todos os seres sencientes!
Novamente, descanso a mente em meditação não-fabricada.

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A IMPERMANÊNCIA E A MORTE “Todo aquele que nasce é impermanente e fadado a morrer.”

Eu contemplo a impermanência – a progressão desde o nascimento até a velhice e a morte... as pessoas que vieram e se
foram, as posses, os cenários inconstantes, a representação caleidoscópica dos fenômenos...
Penso no universo em constante movimento; penso nas partículas subatômicas de meu próprio corpo, tão cinéticas que em
qualquer momento a sua existência e paradeiro são somente uma probabilidade...
Contemplo a morte, as incontáveis mortes que ocorreram no passado e as que ocorrerão, a incerteza sobre quando e como
a morte acontecerá novamente...
Imagino modos específicos como a morte pode vir, a súbita separação de amigos e familiares...
Contemplo até que a aparente coesão da vida é percebida como uma ilusão transparente...
Descanso a mente.

Reflito sobre como geralmente vivo negando a impermanência e, no entanto, sou surpreendido, uma e outra vez, quando
aquilo que acreditava ser sólido e duradouro, se desintegra e desaparece...
Lembro-me do sofrimento na hora da morte – o medo, a separação dos entes queridos e das posses – e lembro-me das
tumultuadas experiências do bardo após a morte...
Penso em como quase todos os seres, esquecidos da impermanência, perdem o seu senso de prioridade...
Reflito dessa forma até que em mim brota a compaixão por eles...
Então descanso além dos conceitos.

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Que todos os seres possam atingir uma realização tão profunda da impermanência, que permita-lhes purificar totalmente a
tendência de tomar as aparências como reais, e também todo o apego e aversão que isso acarreta.
Possa eu passar pelas transições da morte mantendo o reconhecimento da natureza da mente.
Que a minha realização se torne tão forte, que eu possa socorrer os demais do tumulto do bardo.
Então descanso a mente.

Eu me comprometo a viver e praticar com inabalável reconhecimento da impermanência.
Comprometo-me a realizar a verdadeira natureza de todos os fenômenos, positivos ou negativos, e a buscar a essência
absoluta.
Com essa resolução, relaxo em meditação não-fabricada.

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O CARMA “As ações virtuosas e as prejudiciais causam seus resultados inevitáveis.”

Eu avalio inteiramente minha situação cármica... Inspeciono as circunstâncias dessa vida para discernir os padrões cármicos
que foram estabelecidos no passado... Checo meus pensamentos e ações atuais, como uma indicação do que virá...
Nenhum ser senciente nos seis reinos prefere o sofrimento à felicidade, no entanto, quase todos nós criamos as causas para
a miséria... Esquecidos das consequências cármicas, agimos em busca de gratificação momentânea e então culpamos a
nossa má sorte em circunstâncias externas negativas, como se estas representassem ocorrências fortuitas do destino, ao
invés de resultados diretos da nossa própria conduta...
Agora, sem equívocos e sem pretender escapar dos resultados negativos se a não-virtude não for purificada, sou uma
testemunha honesta da minha própria conduta... Outros poderão louvar o meu comportamento correto, mas só eu posso
saber verdadeiramente se minhas ações não estão maculadas por uma motivação impura ou emoções venenosas... Eu terei
de viajar, mais cedo ou mais tarde, pelos bardos de pós-morte, despido de tudo, exceto da consciência e das forças do
carma... Por que revestir-me de hipocrisia e racionalizações agora, quando deverei desnudar-me então?
Contemplo dessa forma e descanso a mente.

Imagino as forças cármicas que subjugam agressores cruéis por ocasião de sua morte, a multiplicidade de agressão que
repercute sobre eles, as infinitas eras de tortura no inferno... Penso naqueles cujas vidas confortáveis são subitamente
esmagadas pela tragédia, a consequência inesperada de um carma insuspeito... Penso naqueles cujas vidas se mantêm
confortáveis e neutras, que extinguem as possibilidades de um bem-estar futuro por gastar os frutos do carma positivo
passado e não plantar as sementes para mais... Contemplo as vidas quase destituídas de oportunidades para agir com
virtude – seres do inferno cuja tormenta só os enfurece mais ainda, espíritos carentes cuja necessidade insaciável os obceca,
animais que são predadores por instinto... Pelo poder da compaixão, surge em mim a motivação de aliviar, de qualquer
maneira possível, todo o pesar causado pela ignorância do carma.
Agora relaxo em meditação não-fabricada.

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Que todos os seres possam aperfeiçoar a noção do que aceitar e do que rejeitar.
Que eu pare de culpar os outros e comece a purificar minha própria mente.
Possa eu criar causas para circunstâncias afortunadas através de uma atividade física bem disciplinada, palavras
bem escolhidas e intenção benéfica.
Rezo para que, em definitivo, possamos todos escapar completamente desse entrelaçamento desorientador do
carma e entrar na sabedoria primordial.
A mente descansa.

Eu me comprometo a agir de acordo com a mais refinada conduta e a meditar até estabelecer a mais alta visão.
Novamente descanso.

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O SOFRIMENTO “A natureza dos três reinos da existência cíclica é um oceano de sofrimento.”

Eu contemplo o sofrimento, focalizando os seis reinos... Imagino vi vidamente a exis tência em cada um deles...
Minha mente mente pode entrar em outros reinos através do poder da visualização, o que os fará se descortinarem
em minha experiência... O potencial para qualquer experiência reside na mente... Em contemplação, extrapolo de
um momento de dor que eu tenha efetivamente sentido – água fervente, talvez, ou cortantes ventos de inverno
adormecendo meus dedos dos pés e das mãos – para a dor extrema e toda abrangente dos infernos quentes e
gelados... Momentos de fome e sede magnificam-se na privação esfomeada e sedenta do reino dos espíritos...
Coloco-me no lugar de alguém preso numa zona de guerra, com medo constante de ser mutilado ou morto, cercado
pela devastação, separado de seus amigos e familiares, confrontado por uma desumanidade brutal e ódio... Até o
simples fato de regozijar-se com uma vitória violenta sobre o inimigo, cria um terrível carma... Quão mais trágica é
então a participação forçada na matança! Ninguém está isento da espiral descendente – nem os líderes, que serão
carmicamente responsáveis por cada ferimento e morte que ocorrer por causa de suas ordens; nem os soldados,
que executam a matança; nem as vítimas, que são alçadas para o bardo com suas mentes inflamadas pela raiva...
Nesse reino humano não há nenhuma escassez de sofrimento... Eu realmente me coloco dentro dessas situações e
permito-me a sentir o que os outros sentiram; entro em suas peles. Finalmente, minha mente anseia pela cessação.
Agora solto todos os pensamentos e descanso.

Penso nos incontáveis seres nos seis reinos... No decorrer de inumeráveis renascimentos cada um deles foi minha
mãe ou pai... estão presos em ciclos de miséria e não têm a menor idéia de como se desembaraçar... Penso em
suas condições e em mim brota a compaixão, como um desejo de que seu sofrimento atual seja imediatamente
aliviado e que, em definitivo, eles possam ser completamente liberados dos pesares do samsara.
E então novamente solto todos os pensamentos e descanso.

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Possa eu não ser levado pelo sofrimento e que eu possa ver tudo o que surge como purificação.
Que na confusão trazida pelo sofrimento, possa eu não criar causas cármicas para mais sofrimento.
Que eu possa alcançar o poder de guiar os outros das profundezas do samsara para um estado além do pesar.
Que todos os seres possam ser liberados dos ciclos intermináveis do sofrimento samsárico.
Relaxo em meditação não fabricada.

Eu me comprometo firmemente a praticar o caminho até atingir a liberação do sofrimento, por amor a todos os seres.
Anteriormente, quando eu mesmo estava me afundando no oceano do samsara, não podia socorrer os outros.
Agora, por intermédio dos meios hábeis do caminho, há esperança de escapar.
Tomo a resolução de não afundar novamente e não abandonar os outros.
Então descanso na paz do relaxamento natural.

“Lembrando-se disto, possa minha mente voltar-se para o dharma.”

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“Pobres seres, perdidos e confusos como um cego abandonado no meio de uma planície
vazia! É para o bem-estar desses seres que escutarei e colocarei em prática o Darma
profundo. Conduzirei todos eles, meus pais, atormentados pelas aflições dos seis reinos
da existência, ao estado búdico onisciente, libertando-os de todos os fenômenos cármicos,

tendências habituais e sofrimentos de cada um dos seis reinos.”

Patrul Rinpoche

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