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Sentido Ilativo
- A CRIANÇA
- A RAZÃO IMPLÍCITA
Por vezes não conseguimos explicar bem porque razão suspeitamos da virtude
de uma pessoa ou porque razão confiamos noutra que mal conhecemos. É um
processo mental que passa de ponto para ponto por algum indício subtil, pela
mera probabilidade, por uma associação de ideias, por se guiar por uma lei de
experiência prévia, pelo testemunho de outros, pela impressão popular
expressa em provérbios, por uma memória longínqua.
- A CONVERGÊNCIA DE PROBABILIDADES
A convergência de probabilidades é um conceito que resulta da nossa
experiência pessoal, empírica ou reflectida, e da comunicação de outros. Mas
nós não aceitamos como válida a comunicação de qualquer um. Nós fazemos
um juízo sobre as pessoas, baseados em muitas das suas características, do
modo como usam a palavra, do modo como se comportam relativamente a
outros. Nenhum item por si, nesta avaliação, é suficiente para podermos definir
a pessoa ou como a avaliamos, mas é a convergência das várias impressões
que temos sobre a pessoa que nos faz construir o quadro geral que formamos
dela.
É esta fenomenologia que usamos sobre nós próprios, sobre os nossos amigos
e os nossos familiares, sobre as pessoas que nos são apresentadas ou que
entrevistamos, sobre o próprio mundo, que nos fazem retirar ilações sobre nós,
sobre os outros e sobre Deus.
Nós justificamos a adesão às certezas da vida não por inferência, mas pela
razão implícita, mesmo que para tal não tenhamos provas irrefutáveis. Os
exemplos que Newman dá são prolíficos: temos a certeza que o nosso “eu” não
é o único ser existente; que existe um mundo externo; que existe um sistema
constituído por partes e por um todo; que existe um universo regulado por leis;
que o futuro é determinado pelo passado; que existem cidades chamadas
Lisboa, Paris ou Londres, mesmo que nós nunca lá tenhamos estado; que
Paris ou Londres devem estar hoje mais ou menos como estavam ontem
quando lá estivemos, a menos que uma catástrofe tenha entretanto ocorrido.
Um céptico pode argumentar que equivale a um salto de fé, mas não se trata
de um salto porque o parecer favorável à fé tem uma dimensão cumulativa e de
tensão interna; trata-se mais de crescer para uma convicção e não tanto de cair
nela. A evidência da doutrina revelada baseia-se num agregar de
probabilidades e não na argumentação hábil sobre cada uma delas. Newman
usou o exemplo do polígono desenhado no círculo. À medida que o número de
lados aumenta ele tende a parecer-se com o círculo. Nunca é o círculo mas a
mente ignora a diferença e compreende-o como tal. Assim é, e só pode ser, o
nosso conhecimento de Deus: não uma completude mas uma propedêutica.
É necessário que o homem se deixe amar por Deus, aceitando com humildade
a revelação de Deus, com a mesma atitude da criança que não supõe existir
uma razão válida para que um adulto da sua confiança a engane ou lhe faça
mal. O argumento moral para a existência de Deus, sumariamente descartado
em Kant, reaparece em Newman. Swinburne afirmaria sobre a convergência de
probabilidades: "se colocarmos dez baldes furados, uns dentro dos outros,
teremos um contentor capaz de conter a água." Esse é o princípio físico da
matéria.