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FAMÍLIA “MESTIÇA”: PROPOSTA DE RECONSTRUÇÃO DO LÉXICO DAS

“QUALIDADES” A PARTIR DO OLHAR DA JUSTIÇA (RIBEIRA DO


SERIDÓ, SERTÕES DO SERIDÓ, 1793)
Matheus Barbosa Santos1
Helder Alexandre Medeiros de Macedo – Orientador2

Discute, a partir de um estudo de caso, as possibilidades de uso e apropriação de fontes


judiciais e eclesiásticas para a compreensão das dinâmicas de mestiçagens no sertão do
Rio Grande do Norte entre os séculos XVIII e XIX. Constitui parte das reflexões do
Projeto de Pesquisa História das mestiçagens nos sertões do Rio Grande do Norte por
meio de um léxico das “qualidades” (séculos XVIII-XIX) e de plano de trabalho específico
que tem como objetivo examinar as trajetórias pessoais e de formação dos agentes da
Justiça que produziram os documentos em que se registraram os indivíduos frutos das
mestiçagens, com o fito de se estabelecer um perfil acerca de quem nomeava pessoas com
as “qualidades” de “mestiço”, mameluco, pardo, mulato, cabra e curiboca.
Metodologicamente partiu de revisão historiográfica, seguida de leitura, transcrição e
análise do inventário post-mortem de d. Adriana de Holanda e Vasconcelos (1793),
moradora do Totoró de Cima, Ribeira do Seridó, que foi cruzado com fontes judiciais
(inventários, cartas de alforria, livros de notas) e eclesiásticas (batizados, casamentos,
óbitos) relativas ao Seridó dos séculos XVIII e XIX. O inventário supracitado, apresenta
terras de criação, plantação e produção de farinha (estas, na Ribeira do Cariri, Termo da
Vila Nova da Rainha, na Campina Grande, no sítio Boca de Cavalo; no Totoró de Cima;
na Serra de Santa Ana; e no Sítio Catolé, respectivamente), no qual haviam 24
escravos(as), em que destacamos a parda/mulata Tereza, mãe da escrava mestiça de pardo
e preta Luiza, esta, por sua vez, mãe da mulata Monica. Partindo das reflexões teóricas-
metodológicas sobre as “dinâmicas de mestiçagens”, discutidas por Eduardo França
Paiva, constatamos uma variação na “qualidade” da escrava Tereza entre o dia em que
ela foi listada no rol do inventário, e o dia em que foi feita a partilha dos bens, portanto,
levantamos a hipótese de que esta variabilidade seja fruto das percepções do escrivão do
processo, neste caso, João de Sousa e Silva, e que a escrava parda/mulata Tereza teve
uma filha e neta com “qualidades” diferentes em função dos pais das crianças serem de
“qualidades” diversas, ainda, que a “qualidade” de mulato, para além dos tons pejorativos
a que estava ligada, seja generalizante.

1
Discente do Curso de Bacharelado em História, Centro de Ensino Superior do Seridó (CERES),
Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Bolsista de Iniciação Científica (PIBIC-UFRN).
E-mail: matheusx1998@gmail.com.
2
Professor do Departamento de História, CERES, UFRN. E-mail: heldermacedox@gmail.com.
Palavras-chave: Seridó. Dinâmicas de mestiçagens. Justiça. Escrivão.

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