Você está na página 1de 10

MÚSICA PARA HISTORIADORES:

[RE]PENSANDOCANÇÃO POPULAR COMO DOCUMENTO E FONTE


HISTÓRICA

Autor:Diogo Silva Manoel1

INTRODUÇÃO

Pensar história e música é certamente algo extremamente complexoe que demanda


muito empenho, já que a aproximação dos historiadores com o universo sonoro-musical é
ainda incipiente. Apesar do estudo da música em forma de canção não estar sempre em voga
nas academias, nota-se que essa (re)aproximaçãocontinua a pairar pelos horizontes
acadêmicos.
Por ser um legado cultural de extrema importância para a humanidade, os sons e
sonoridades que permeiam nossas vidas foram e são uma faceta cultural muito apreciada pelos
indivíduos e sociedades ao longo dos tempos. Tanto por meiodos aparatos criados
pelaatividade humana, quantoos advindos danatureza, ou, simplesmente reproduzidos pela
voz, os sons contêm informações pouco exploradas até então pelos historiadores e outros
pesquisadores, principalmente a música como objeto de estudo.
Desde antes das primeiras civilizações, o ser humano convive com os sons da
natureza, e, durante opercurso da humanidade ao longo dahistória, a música desponta
comocontribuição cultural preponderante (apesar de não muitorecorrida) na laboriosa
tentativa dos historiadores em“ressuscitar”objetos e lugares por meio da prática histórica.
Certamente tratar da relação história e música como um campo de investigação
historiográfica é algo não muito frequente, principalmente devido os diversos aspectos que
permeiam questões teórico-metodológicas envolvidas na produção científica delimitada pelo
assunto em questão. A relação acadêmica entre a História e a música é algo que existe de fato,
porém, sabe-se que não é uma combinação muito frequente, principalmente quando se trata da
música popular. E também é uma atividade recente, pois nem sempre a historiografia se
preocupou em utilizar a música e a canção popular como fonte e objeto de estudos no
desenvolvimento de novas pesquisas.

1
Mestrando no programa de pós-graduação em História da Unesp/Assis, sob orientação da professora Dra.
Fabiana Lopes da Cunha.
“[…] uma ainda incipiente produção historiográfica tem voltado sua
atenção para o campo da música, pensando essa expressão cultural como objeto a
ser explorado e importante fonte de acesso às tramas que buscam dar sentido à
realidade estudada, esteja elalocalizada no passado recente ou em tempos
remotos.”(BRITO, 2007, p. 209,)

A questão é que desde meados dos anos 1970 até o presente momento há uma
quantidade significativa de trabalhos científicos que privilegiam a música e canção popular
como objeto de estudo. Mas, ao seremconfrontadoscom outras temáticas abordadas por
historiadores, é notável que o universo musical precise ser mais explorado. A proposta deste
texto não é de apresentar um extenso levantamento dessa produção historiográfica,
mas,apontar alguns teóricos que, citados nesta reflexão, são importantes para pesquisadores
que irão incursionar neste universo singular.
Possivelmente, tal produção aindaestá em fase embrional, e, espera-se que outros
pesquisadores possam interessar-se em utilizar a música como objeto cultural, sendo ela fonte
e objeto de estudo.Com base na produção historiográfica sobre o assunto,pode-se afirmar que
a utilização da música/canção como fonte documental traz à tona novas perspectivas
exploratórias ao revisitar e analisar determinados períodos e realidades.Sendo mais específico
em nossos objetivos, quando nos referimos ao termo canção,que é o foco desta reflexão,
estamos especificando que verso e música juntos formam a canção como tradicionalmente a
conhecemos.
A história cultural da música popular no Brasil vem se desenhando e tomando forma
aos poucos. É um trabalho um tanto intrincado para o historiador querer estabelecer relação
entre o conhecimento histórico e a música, pois nem sempre os acadêmicos, em sua maioria,
deram prioridade para essa relação tão intrigante, certamente devido à existência de questões
heurísticas que necessitem de atenção especial.O historiador que se enveredar por esse
caminho, primeiramente, irá se deparar com questões relacionadas ao balizamento
metodológico no trato com a documentação. O que é relevante ao se defrontar com um objeto
sonoro?Como interrogar as canções enquanto documento histórico? Como fazer uma análise
significativa entre os elementos musicais e o conteúdo presente nas letras do cancioneiro
popular? Seriam estudadosos elementos musicais apenas? Como fundir ambos os aspectos?
Acreditamos que o pesquisador é quemdeterminará quais serão os métodos e critérios
aoanalisar a sua documentação.
Como exemplos de análise háas possibilidades do estudo da música popular regional
brasileira, que é um tanto quanto complexa na atualidade devido as suas características
híbridas,consequência da quantidade e diversidade de elementos que compõem nossa música
e influenciada diretamente pela diversidade étnica desta terra. A diversidade de gêneros e
obras musicais é de uma vastidão imensurável em nosso território brasileiro, pois somos um
país que produz e faz a recepção/apropriação da canção como bem cultural. Essa forte ligação
que os indivíduos têm com a música realça as possibilidades dos historiadores de explorar
esses elementos culturais em seus trabalhos.
Além disso, o Brasiltambém é um país de uma pluralidade cultural imensa e intensa; a
música e os sons da nossa terra refletem essa majestosa diversidade que fora severamente
necessária para compor a identidade cultural da nação brasileira. O Brasil é de fato um país
sonoro e musical; a música está no cerne da população brasileira.Pode-se afirmar com
veemência que somos uma das maiores usinas sonoras do planeta (NAPOLITANO, 2002).

DOCUMENTO SONORO

A tão conhecida História Cultural dá amparo e condiçãonecessários para explorar


fontes históricas e objetos de estudo pouco tradicionais aos historiadores mais antigos;
consequência disso é a ampliação da variedade de fontes possíveis de serem trabalhadas nas
pesquisas acadêmicas em tempos atuais.É a mesma História Cultural, juntamente com a
antropologia, quem coloca em voga a Cultura como um dos principais objetos de estudo para
os historiadores e cientistas das humanidades.Posteriormente, a Nova História Cultural
deixará remanescentes estas novas possibilidades de pensar a pesquisa histórica, seus temas e
seus objetos.
Revisitar o passado através da nossa cultura musical é uma forma de indagar as
canções como expressões dos fatos sociais desse país. O historiador francês Marc Bloch, em
sua obra póstuma,dentre outras questões,faz uma reflexão sobre as opções de fontes
documentais possíveis de serem utilizadas pelos historiadores. Ele aponta a possibilidade dos
historiadores utilizarem fontes pouco tradicionais e afirma: “A diversidade dos testemunhos
históricos é quase infinita. Tudo que o homem diz ou escreve, tudo que fabrica, tudo que toca
pode e deve informar sobre ele”(BLOCH, 2002 p.79). Dessa forma não seriamentão as
músicas e canções um testemunho nítidoda vida social dos indivíduos em um contexto mais
amplo?
Certamente que sim.Não há dúvida de que as canções são vestígios importantes e
pouco utilizados pelos historiadores na tentativa de produzir um discurso histórico que tenha
como fonte primária um bem cultural de fácil poder de apropriação e disseminação, composto
por elementos que traduzem e ilustram a “realidade” de um período.As informações presentes
nas canções ajudam a ilustrar os acontecimentos sociais, políticos, econômicos e eventos do
cotidiano de determinado país. Grosso modo, podemos dizer que a canção é uma interlocutora
de acontecimentos culturais e sociais no mundo contemporâneo.Marc Bloch foi,
indiscutivelmente, um dos mais importantes historiadores do século XX que trouxe à tona tal
discussão. Há um consenso geral sobre sua severa importância na contribuição teórica para
incrementos no ofício do historiador. Bloch chegou a comparar a prática do historiador com a
de um luthier. (BLOCH, 2002; MORAES, 2013)
Sabe-se que houve a ampliação no uso da canção popular como fonte e objeto de
estudos acadêmicosem diversasáreas científicas desde meados da década de1960. Como
afirma Napolitano (2002, p.7) “A história, no seu frenesi contemporâneo por novos objetos e
novas fontes, tem-se debruçado sobre o fenômeno da música popular”. Já na década de 1990,
há uma grande ampliação da produção científica que privilegia a música como tema ou
objeto(MORAES, 2013). Começa aí a expansão do horizonte historiográfico brasileiro.
Sem medo de cometer algum equívoco, é possível afirmar que a canção é um bom
vestígio para reunir informações sobre diversos aspectos de um período histórico,
justamentepor seu poder de comunicação e apropriação pelos indivíduos. José Wisnik é um
pesquisador que trata da relação entre música e história e comenta que “[…] as canções
absorvem frações do momento histórico, os gestos e o imaginário, as pulsões latentes e as
contradições, das quais ficam impregnadas, e que poderão ser moduladas em novos
momentos, por novas interpretações”(WISNIK, 1999, p. 214). Tal afirmaçãosustenta e reforça
a utilização da canção como fonte documental, sendo esta um objeto impregnado de
informações relevantes sobre uma época,e que, consequentemente,transforma-se em algo
passível de ser interpretado. Da mesma forma que Wisnik ressalta a importância das
informações contidas em uma canção para convergência de um discurso histórico, Vinci de
Moraes enfatiza a relação intrínseca entre duas ciências distintas, mas que podem, se
utilizadas com esmero, contribuir para a historiografia. Isso se evidencia no trecho onde
afirmaque“[...] asrelações entre história, cultura e música podem desvendar processos pouco
conhecidos e raramente levantados pela historiografia” (MORAES, 2000, p. 203).
Possivelmente, ao estudar e analisar um fonograma, o pesquisador poderá se deparar
com informações únicas que somente a canção poderia revelar.Diferentemente de outros
documentos, a canção é algo que está absorvido pela população e isso gera inúmeras
possibilidades de garimpar informações sob diferentes óticas.
Ainda nesta vertente,tomando como exemplo a seguinte afirmação, Napolitano
relaciona a canção como uma forma artística de expressão que reflete as alterações sociais:
“[…] a canção ocupa um lugar especial na produção cultural, em seus diversos matizes, ela
tem o termômetro, caleidoscópio e espelho não só das mudanças sociais, mas, sobretudo das
nossas sensibilidades coletivas mais profundas”(NAPOLITANO2002, p.77). Napolitano
constata que a canção figura como a expressão artística que contém o reflexo do que sente
uma sociedade nos seus mais diversos aspectos.
O ponto crucial é que, apesar de se saber que a canção popular está repleta de
informações passíveis de serem questionadas, um desafiopreponderante para os pesquisadores
é o deidentificar um modo de balizar indagações teórico-metodológicas no processo de
pesquisa. Para tanto,é necessário questionar as fontes de pesquisa e objetos de estudo com
criteriosa e cuidadosa atenção.Ao pensarmos sobre como indagar nossas fontes,Marc Bloch já
apontava para a questão da investigação e análise dos documentos: “[…] os textos ou
documentos arqueológicos,mesmo os aparentemente mais claros e complacentes,não falam
senão quando sabemos interrogá-los” (BLOCH2002, p.79).
Esta é uma regra geral para todos os acadêmicos e catedráticos de História, em outras
palavras,é necessário saber como questionar as fontes para que se consiga alcançar o resultado
esperado, já quea maneira como indagamos uma fonte será refletida nas informações que elas
nos mostrará.Em suma, as respostas para as indagações dependem de como as perguntas são
formuladas pelo pesquisador.Apesar de o senso comum achar que é de fácil entendimento
estudar uma canção, por ser um objeto que aparentemente demonstra uma clareza muito
grande; a historiografia aponta para elaboração de uma análise cuidadosa. Como a música é
um complexo de informações musicais(sonoras) e não musicais, a metodologia apresentada
pelosAnnales cai como uma luva na hora de trabalhar com os fonogramas.
Após esta breve excursão pelos meandros que permeiam os limites entre música e
história, entende-se a canção/fonograma como um bem cultural rico em informações que
podem ser um vestígio interessante a ser utilizado em uma investigação histórica(MORAES,
2013; NAPOLITANO, 2001; WISNIK, 1999). A canção em si não é uma fonte meramente
sonora, ela é acompanhada de diversos elementos não musicais que contêm informações
extremamente preciosas para todo o processo de análise de um discurso.Seria possível então
nos apropriar de diversas nuances que as fontes e objetos selecionados poderão revelar ao
longo do processo de pesquisa. O grande poder de comunicação e disseminação de ideias
representadas pela canção traz à tona a reflexãosobre sua capacidade de traduzir determinadas
características de um período histórico somadas à realidade cultural e social do mesmo
período. Tais movimentos históricos e sociais são passíveis de estudos e análises, tendo como
base a cultura popular, desviando um pouco das pesquisas acadêmicas mais tradicionais. Crê-
se que as canções são elementos simbólicos cruciais para captar o espírito do tempo –
Zeitgeist –independentemente da época em que foram veiculadas.
A canção popular remete a uma possibilidade de entender os retratos culturais do
Brasil.Issosignifica que fonogramasnada mais são senão documentos que se podem escutar e
ainda analisar seus aspectos não musicais. Especificando ainda mais, quando a intenção for
utilizar a música como fonte documental,ao se esmiuçar seu objeto, o pesquisador se deparará
com três elementos documentais a princípio: a letra,a partitura e a canção em fonograma
como objeto da indústria cultural. Tem-se então a letra da canção, quesito importantíssimo,
pois nela estará inserida grande parte da mensagem veiculada por seu enunciador. Nela
também constam os elementos de linguagem verbal e poética.
Já na partitura está transcrita a canção em linguagem musical, e é preciso ser
conhecedor desta linguagem para poder traduzir informações correspondentes aos elementos
sonoros ali grafados. Por último, temos a canção como produto de uma indústria cultural.
Fazendo um apontamento cronológico, se pensarmos que a linguagem musical
começou a ser elabora e grafada em papel no século IX (BENNETT, 1986), consolidando
assim a partitura como a conhecemos tradicionalmente, temos então a possibilidade de
garimparmos mais de mil anos de vestígios sonorostranscritos em notação musical. A
humanidade possui um legado documental milenar, somados a uma preponderante questão: a
linguagem musical é universal. Se levarmos em consideração que“além de ser veículo para
uma boa idéia, a canção (e amúsica popular como um todo) também ajuda a pensar a
sociedade e a história.” (NAPOLITANO, 2002, p. 11). Agora, imaginemos a quantidade de
documentos históricos sonoro-musicais que possam existir somente no Brasil? Sem contar
que essa afirmação nos ajuda a indagar como a música é capaz de refletir os processos
históricos também no nosso país.
O artista interioriza algo e depois expressa ideias que ajudarão os pesquisadores a
pensar e a indagar a sociedade e a história. De acordo com Severiano (2008), a história da
música popular brasileira se inicia no final do século XVIII, e tem seu marco zero na figura
do músico Domingos Caldas Barbosa. São mais de duzentos anos de documentos musicais e
história do Brasil passíveis de serem utilizados como objeto ou fonte documental.
Continuando a ressaltar a importância da padronização da notação musical moderna, a
partitura figura como principal elemento de disseminação da música ocidental.

“[…] Uma obra de arte musical moderna, por menos complicada que seja, não
poderia ser produzida, nem transmitida, nem reproduzidasem os meios de nossa
notação: sem ela uma obra musical moderna não pode emgeral existir em lugar
algum e de nenhuma maneira, nem mesmo como umapropriedade interna de seu
criador.”(WEBER, 1995, p. 119)

O desenvolvimento da notação musical contribui para veiculação e documentação das


obras musicais. A partir dela foi possível que os artistas pudessem reproduzir determinada
música com um mesmo padrão em qualquer lugar do planeta, para isso bastou dominar a
linguagem musical.Supõe-se que, assim como a História da humanidade, que se inicia após a
invenção da escrita, a história da música para os historiadores começa no momento em que se
torna possível registrar os sons em forma de notação musical escrita em partitura. É nesse
exato momento, após tornar-se um documento propriamente dito, que a música passa a ajudar
os historiadores na compreensão da história.
Apesar de a música ser considerada um documento subjetivo, acredita-se que, ao ser
utilizada como fonte documental, analisada e manipulada com cuidado e conhecimento prévio
devido, ela se tornará um vestígio histórico interessante para se compreender certas realidades
do passado. Napolitano, em seu texto, alerta sobre as dificuldades e peculiaridades no trato
com música e, ainda, ressalta a importância de um procedimento metodológico severamente
cuidadoso.
“A música popular tem traduzido e iluminado, a um só tempo, as posições e os
dilemas não só dos artistas, mas também dos seus públicos e mediadores culturais
(produtores, críticos, formadores de opinião). Ao mesmo tempo, esse tipo de
problemática histórica só se torna possível na medida em que duas operações são
conjugadas pelo pesquisador: a construção de ferramentas teórico-metodológicas
claras e coerentes de análise das fontes (sobretudo as próprias fontes musicais); o
exame (auto) crítico da própria historiografia (acadêmica, de ofício ou amadora),
como parte formadora de tradições e memórias. No cotejo da obra/fonte histórica
com o pensamento historiográfico que emerge em torno dela é que podemos
redefinir a relação da música com a história.”(NAPOLITANO, 2002, p. 76)

Esta afirmação aguça uma questãopreocupantepara o pesquisador que está trilhando tal
percurso de análise.É importante construir um método que auxilie no processo de pesquisa,
norteando as observações acerca do assunto. Um bom balizamento metodológico será
preponderante na tentativa de executar uma investigação sintética, para que isso possarefletir-
se em um discurso sólido e dentro das perspectivas teóricas e metodológicas da historiografia
atual para a temática abordada. O historiador Marcos Napolitano, em sua obra intitulada
História&Música, através de uma leitura panorâmica desta relação, propõe algumas
aplicações metodológicas no trato da canção como objeto e fonte.
Na formulação e aplicação dos métodos possíveis, vale ressalvar a seguinte afirmação
de Vinci de Moraes,que atesta que o pesquisador da área de história e música pode “[…] criar
seus próprios critérios, balizas e limites na manipulação da documentação” (MORAES, 2000,
p. 210).
É uma questão essencial na elaboração de uma pesquisa dentro deste
camposeratencioso com as possibilidades de balizar o método teórico estabelecido, tendo
como referência pesquisadores expoentes nesse tipo de estudo.No Brasil, durante a década de
1990, aumentou significativamente a quantidade de trabalhos científicos e obras derivadas de
trabalhos acadêmicos que compõem a historiografia que trata da relação história e música. Há
desde trabalhos que utilizam a canção comofonte depesquisas e há pesquisas interessadas em
estudar a historiografia referente à música produzida ao longo dos anos (MORAES, 2013).

Repensando música e história

Tomando como base as informações aqui explanadas, é possível elencar algumas


conclusões; porém há uma convergência principal: a música/canção/fonograma é uma fonte
documental de características únicas. Na canção estão impressas, gravadas e talhadas
informações fundamentais sobre a vida de determinadas sociedades. Isso faz da canção um
documento histórico distinto, com a capacidade de nos revelar informações que outras
variedades documentais jamais conseguiriam.Para aqueles que pensam que a música apenas
reflete facetas culturais e artísticas a serem investigadas, certamente há um equívoco a ser
esclarecido. Sabendo interrogar as canções, elas poderão aflorar informações até então não
obtidas através de outras fontes. É nítido isso para pesquisadores que já se aventuraram a
fazer história usando obras musicais como fonte documental. A citação de Marcos Napolitano
sintetiza e nos ajuda a arrematar oporquêda necessidade deste ensaio.

“Num dos países mais ricos em diversidade sonora do mundo, com um lugar
privilegiado na história da música popular do século XX, dedicar-se à história da
música, pensada em diálogo com a história intelectual, social, política e cultural, é
dar um passo a mais na compreensão da própria sociedade e suas formas de auto-
representação. E ainda há muito por fazer”. (NAPOLITANO, 2007, p. 171)

Os historiadores devem verdadeiramente explorar o universo musical de nosso país e


autilização da canção como fonte e objeto de estudo no labor do ofício. É um banquete para
os pesquisadores devido às variedades de gêneros musicais no Brasil, já que somos um país
de grandes dimensões, com características culturais específicas em cada região. Não só se
fixando nas análises da música como objeto e fonte, o pesquisador também poderá explorar a
música fazendo estudos sobre sua produção historiográfica acerca do tema que ela aborda no
Brasil.Sem contar a necessidade de absorver conceitos de outras disciplinas para conseguir
elucidar com qualidade os objetivos de uma pesquisa na área.
Apesar de não ser uma unanimidade, há uma boa variedade de trabalhos significantes
presentes na historiografia brasileira. São obras que tratam de uma diversidade cultural muito
grande. Há obras importantes para ciência brasileira que tratamde gêneros desdeo samba, a
música caipira, passando pelo chorinho e outros tantos gêneros de origem brasileira. Tais
obras também poderão (e vão) servir como auxílio nos futuros trabalhos que possam vir a ser
produzidos.É severamente importante que haja interesse dos novos pesquisadores em avançar
na produção científica que privilegie o que o universo musical e sonoro. Estas pesquisas
podem servir para evidenciar as ciências humanas como um todo.Sim, são opções um tanto
quanto recentes para maioria dos pesquisadores, pois é algo pouco “tradicional” até mesmo
para academias. Se há muito que se fazer, espera-se que este breve ensaio aguce o faro por
novas possibilidades de se revisitar o passado por meio da música.
A história da música popular brasileira só tem a ganhar com o avanço do estudo dela
própria enquanto ciência. Não só ela, mas também isso tornarápossível a ampliação das
competências científicas dos profissionais, melhorando a qualidade de nossas pesquisas,
direcionando os caminhos para se fazer História e ciência com extrema qualidade.

Bibliografia:

BLOCH. Marc. “Apologia da História ou O ofício de historiador”. Rio de Janeiro: Zahar,


2001.
MORAES, J. G. Vinci. “História e Música: a canção popular e o conhecimento histórico”.
Revista Brasileira de História, São Paulo, v. 20, n. 39, 2000, p. 203-221
MORAES, J. G. Vinci. “História e Música no Brasil”.São Paulo : Alameda Editorial, 2013.
NAPOLITANO, Marcos. História e Música Popular: Um Mapa de Leituras e Questões.
Revista de História (2° semestre 2007),153-171.
_____________, Marcos. História e Música: história cultural da música popular.Belo
Horizonte, Autêntica, 2002
SEVERIANO, Jairo. “Uma história da música popular brasileira”. 1ª Edição. São Paulo,
2008.
TINHORÃO, José Ramos. “Pequena história da música popular: da modinha à lambada”.
6° Ed. São Paulo, 1991.
WISNIK, José Miguel. “O som e o sentido”. São Paulo: Companhia das Letras, 1999.
WEBER, Max. “Fundamentos racionais e sociológicos da música”. São Paulo: Edusp, 1995.

Você também pode gostar