Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Fonte: http://danielbensaid.org/L-autocritique-timoree-de-Jorge-Handal?
lang=fr
Os problemas abordados por Handal sob a pressão dos eventos não são,
portanto, problemas novos para o Partido Comunista Salvadorenho, mas
objeto já de dois decênios de debates internos e de convulsões.
É um malabarismo ideológico!
De onde poderia ter vindo essa ideia de dividir a revolução em duas etapas?
Handal perdeu repentinamente a memória. É necessário, portanto, refrescá-la.
Mesmo admitindo que Handal esteja sujeito a tais esquecimentos, ele teve
mais de vinte anos, depois da vitória da revolução cubana, para reencontrar
sua memória defeituosa e reatar o fio da história. Pois Castro, Guevara, Carlos
Fonseca (que é um vizinho de Handal na América Central) não esperaram
vinte anos para extrair as lições da Revolução Cubana e reatar, assim, o
diálogo revolucionário com seus grandes ancestrais Mella ou Mariátegui.
Handal não pode dizer que essa perspectiva não tenha atingido a América
Central. No artigo já citado, Carlos Fonseca escrevia em 1969: "A luta se
desenvolveu (de 1926 a 1936) sem que existisse um proletariado industrial. A
burguesia nascente traiu o povo nicaraguense e se abandonou à intervenção
yankee [...]. É necessário atualmente insistir no fato de que o nosso principal
objetivo é a revolução socialista, uma revolução que se propõe a pôr em
debandada o imperialismo yankee, seus agentes locais, os falsos oponentes e
os falsos revolucionários". Não fomos frugais diante da abundância das
citações e referências para mostrar adequadamente a que ponto as revelações
de Handal são tardias e genéricas, quanto a um debate que balança há um
século o movimento operário do continente. Foi necessária a formidável
persistência dos fatos e, sobretudo, a decolagem da revolução no próprio El
Salvador, de encontro à política do PC salvadorenho, para forçá-lo a essa
autocrítica.
Mais tarde, viria uma corrente marxista mecanicista para alimentar em álibis
teóricos a política de aliança e de subordinação à burguesia nacional seguida
pelos partidos comunistas stalinizados. Tratava-se de considerar as sociedades
latino-americanas como sociedades feudais, para melhor justificar a
perspectiva de desenvolvimento de um capitalismo nacional e antiimperialista,
implicando uma aliança estratégica com as burguesias nacionais. Essa
orientação, que é ainda, sob múltiplas variantes, a dos partidos comunistas
tradicionais (no Brasil, na Bolívia, na Argentina, no Chile, etc.) deve ser
compreendida no quadro da política internacional da burocracia soviética. Se
trata de uma política ao serviço da burocracia soviética, que acompanhou, ao
longo dos anos, todas as suas principais viradas: prova de que as ideias têm
também sólidas raízes materiais. Mas seria necessário concluir, ao contrário,
(o que Handal evita) que uma política realmente revolucionária na América
Latina passa também pela afirmação da mais completa independência diante
dos interesses e metas da burocracia soviética.
A Questão do Poder
Da mesma forma, ele não nega as alianças táticas com frações da burguesia:
"É evidente que não podemos, para o porvir, renunciar a tais acordos
rigorosamente limitados e que sirvam, a cada momento, a um objetivo
claramente definido [...]. A única condição de todo acordo com a burguesia,
acordo separado, prático, limitado a medidas definidas e adaptadas a cada
caso, consiste em não misturar as organizações e as bandeiras, nem direta nem
indiretamente, nem por um dia nem por uma hora e a nunca crer que a
burguesia seja capaz de conduzir uma luta real contra o imperialismo e não
entravar os trabalhadores e os camponeses (...)”.
Para derrubar Batista, Castro concluiu com setores burgueses um pacto
limitado, que "define uma estratégia comum para desfazer a ditadura pela
insurreição armada". Mas, desde a queda de Batista, ele consolida, em torno
do exército rebelde, os fundamentos do poder revolucionário, além de todo
controle dos órgãos formais do governo. À medida que avança e se aprofunda
o processo revolucionário, que se desenvolve a reforma agrária, que se
constrói o exército revolucionário, os representantes da burguesia retirar-se-
ão, um após o outro, para passar à oposição aberta e à contrarrevolução.
Mas uma rápida corrida tem início, então, pela direção do processo
revolucionário. No início de fevereiro de 1978, a Frente Sandinista passa de
novo à ação. O patronato bate logo em retirada e suspende a greve. Em julho,
constituem-se paralelamente à Frente Ampla de Oposição (FAO), de um lado,
que reagrupa a burguesia liberal de oposição, os stalinistas e a ala sandinista
terceirista e, do outro lado, o Movimento Popular Unificado (MPU), que reúne
22 organismos de massas (comitês, movimento estudantil, associações de
mulheres, etc.).
A cada passo das massas avante, a burguesia se desdobra para tentar negociar
sobre o tapete verde, sob a arbitragem do imperialismo americano.
Autocrítica inacabada
As duas outras questões abordadas por Handal em seu artigo, a via armada e a
unidade da esquerda revolucionária, são decisivas. Porém, Handal não vai ao
fundo das coisas. Passa longe disso.
1. Ele constata que "a ideia de via pacífica da revolução na América Latina é,
segundo ele, ligada ao reformismo". É, de fato, a primeira palavra da
estratégia revolucionária, mas não a última. Se a luta armada é necessária, a
partir do momento em que se objetiva a conquista do poder através da
destruição do aparelho de Estado burguês, ela não constitui por si só uma
linha divisória suficiente entre reforma e revolução. Existe também um
"reformismo armado" e organizações que praticam a conciliação de classe. O
papel dos Montoneros argentinos à época do retorno ao poder de Campora e
depois de Perón em 1973-74 é, quanto a isso, eloquente.
Mas, sobretudo, a afirmação da necessidade da luta armada não diz nada sobre
a forma dessa luta armada e sua inserção em uma estratégia revolucionária de
conjunto. Existe, porém, quanto a isso uma ampla experiência de mais de
vinte anos sobre o continente. Em Revolução na Revolução, Régis Debray
extraiu da lição cubana lições simplificadas e erradas, que privilegiavam o
foco de guerrilha rural e a ele subordinavam a construção do partido
revolucionário. À luz das múltiplas experiências dos anos sessenta, Debray
precisou retornar a essas concepções em um texto autocrítico, A Crítica das
Armas.
Notas