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Thiago Morato de Carvalho
Resumo: Roraima é um Estado peculiar, do ponto de vista Abstract: Roraima is a peculiar region, from the
geomorfológico e dos aspectos da dinâmica física/ecológica das áreas geomorphological view point and aspects of physical and
úmidas. Este estudo trata sobre os aspectos hidrogeomorfológicos ecological dynamics of wetlands. This study is about of
de Roraima, cujo objetivo é caracterizar os ambientes de áreas hydrogeomophological aspects in Roraima, aimed is to
characterize the wetlands environments and it´s relation
úmidas e sua relação com os aspectos fisiográficos da região. Estes
with the physiographic features of the region. These
estudos estão em andamento através do Laboratório de Métricas
studies are ongoing through the Landscape Metrics
da Paisagem do dep. de Geografia da Universidade Federal de Laboratory of Geography department, Federal University
Roraima. Foi realizada uma compartimentação dos sistemas of Roraima. Was used remote sensing and geoprocessing
agradacionais e denudacionais de Roraima baseada em técnicas de techniques to the compartments of agradationals and
sensoriamento remoto/geoprocessamento, vetorizados em diferentes denudationals systems of Roraima, vectorized at different
escalas, com maior detalhe para as morfologias da planície do scales, with detail to the morphologies of the Branco river
rio Branco. A bacia hidrográfica do rio Branco foi delimitada, e floodplain. The Branco river drainage basin was delineated
caracterizada algumas morfologias típicas como lagos e ilhas deste and characterized some typical morphologies, like as
sistema fluvial, com comparações entre as décadas de 1943 a 2013. lakes and islands of this river system, with comparisons
between the decades since 1943 to 2013. The Branco river
O rio Branco foi compartimentado em 4 segmentos, e discutido as
was compartmented into 4 segments, and discussed the
principais características deste ambiente. Dados sobre estes aspectos
main features of this environment. Morphological data on
morfológicos de Roraima são aqui apresentados, para que sirvam these aspects of Roraima are presented here to provide a
de base para discussões envolvendo o foco de estudo no âmbito das basis for discussions involving the focus of study within
Geociências e áreas afins. the geosciences and related areas.
Palavras-chave: Hidrogeomorfologia; Áreas Úmidas; Keywords: Hydrogemorphology; Wetlands;
Amazônia; Bacia Hidrográfica do Rio Branco; Roraima. Amazônia; Rio Branco Drainage Basin; Roraima.
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Lab. de Métricas da Paisagem – MEPA, Universidade Federal de Roraima/Dep. Geografia
E-mail: thiago.morato@ufrr.br
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Contribuições à Geologia da Amazônia - Volume 9
Síntese dos aspectos hidrogeomorfológicos do estado de Roraima, brasil
tossolos e podzolos. Região dominada por baixa ampli- Como descrito por King (1956) e Latrubesse e Car-
tude térmica, com elevadas temperaturas médias, preci- valho (2006) para a região de Goiás, usando a terminolo-
pitação bem distribuída, e um complexo sistema vegeta- gia de zona de erosão recuante. Ocorrem também neste
cional distribuído em áreas periodicamente inundadas compartimento as planícies fluviais incipientes, as quais
e áreas de terra firme. Estas características formam o têm suave caimento em direção ao rio Branco. Um tercei-
domínio morfoclimático amazônico (Ab´Saber, 1997). ro compartimento, com predominância de feições agrada-
Neste domínio desenvolve-se a bacia hidrográfica cionais, é caracterizado pelos sistemas lacustres do lavra-
do e por algumas áreas abertas ao sul da região. São áreas
do rio Amazonas, com cerca 6 milhões de km², drenan-
com extensos depósitos aluvionares e planícies fluviais
do desde a região da Amazônia andina, com cotas em
bem desenvolvidas, as quais atuam em cotas inferiores
torno de 4000 m, ao oceano atlântico por ~3.000 km de
a 200 metros. São regiões estáveis, com dissecação fraca,
extensão no sentido W-L. Dos 6 milhões de km² per-
caracterizada por uma superfície aplainada pela rede de
tencentes a bacia hidrográfica do Amazonas, cerca de
drenagem dos rios: Branco, Xeruini, Catrimani, Jufari e
3.8 milhões km² estão inseridos no Brasil. Roraima está
Jauaperi. Estes três últimos são rios que formam extensos
inserido integralmente na Amazônia, abrange 3% do to-
terraços meandriformes no sul de Roraima.
tal deste domínio morfoclimático, apresentando as mais
Na região nordeste de Roraima, situa-se uma ex-
variadas tipologias morfológicas do relevo e vegetação.
tensa área aberta, com uma fitofisionomia semelhante
Abrange morfologias de relevos baixos, arrasados por
aos campos de cerrado do Brasil central, no entanto são
intemperismo químico profundo (etchplanação), e rele-
ambientes diferentes do ponto de vista hidrogeomor-
vo acidentado, escarpado, formações tabulares (tepuyes)
fológico e inclusive do biogeomorfológico. Esta região
e serranas (inselbergs; hogbacks), com morfologias típicas
denomina-se de lavrado, termo regional de relevante
de forte controle estrutural, modelados por intempe-
importância para descrição do ponto de vista biogeográ-
rismo químico e físico, com predominância de sistemas
fico e cultural de Roraima (Carvalho e Carvalho 2012a;
denudacioanais (erosivo) (Carvalho e Carvalho 2012a). Carvalho e Carvalho, 2015) unidade pediplanada deno-
O relevo de Roraima é composto por diferentes as- minada por Franco et al (1975) de Campos do Rio Bran-
sociações de unidades agradacionais e denudacionais, co. Os principais rios desta porção são o Uraricoera e o
com altitudes variando entre aproximadamente 40 a Tacutu, formadores do rio Branco.
2400 m, sendo que 38% do Estado situam-se entre 40 e Na Venezuela, as áreas abertas adjacentes aos cam-
100 metros; 47% entre 100 e 500 metros e menos de 13% pos do lavrado de Roraima são denominadas de Gran
acima de 500 m. Três principais sistemas morfológicos Sabana, e na Guiana os campos do Rupununi (Eden,
do relevo podem ser identificados. Um compartimento 1964; Sinha, 1968; Morales, 1999). Nos campos da Gran
com cotas acima de 800 metros na região fronteira com a Sabana estas áreas estão situadas a cerca de 1000 me-
Venezuela, o sistema de montanhas Parima-Pacaraima. tros, contato norte do lavrado. Na Guiana as cotas são de
Neste compartimento serrano predominam as morfolo- aproximadamente 250 metros. Este sistema campestre
gias tipicamente denudacionais, com dissecação forte está situado em aproximadamente 70.000 km² ao norte
e controle estrutural, vales encaixados, serras forman- da Amazônia.
do hogbacks, inselbergs e formações tabulares (tepuyes), as Esta região do nordeste de Roraima abarca di-
quais estão associadas a antigas superfícies regionais de ferenças marcantes em termos de relevo, solo, vegetação
aplainamento (Carvalho, 2014). e drenagem, abrangendo 43.281 km². O relevo do lavra-
Um exemplo desta morfologia é o Monte Roraima. do de Roraima é suave, com cotas em torno de 50-200
Um segundo compartimento, intermediário, tem as co- metros, formadas por colinas dissecadas, localmente co-
tas entre 200 a 800 metros, intercalado por morfologias nhecidas como tesos, formas originadas pela dissecação
típicas denudacionais e agradacionais (prevalecendo a da drenagem entorno dos sistemas lacustres interconec-
primeira). O Sistema Parima-Pacaraima caracteriza-se tados por igarapés. Ocorrem também serras isoladas,
por ser uma região instável do ponto de vista evolutivo com altitudes entorno de 300-800 metros. A declividade
da paisagem, atuando como frente de recuo de escarpa, na região do lavrado varia entre 0°-5°, relevo plano, com
rebaixando o relevo (dissecando-o) por atividade mode- baixa energia (Carvalho e Carvalho 2012a).
ladora dos sistemas de drenagem, formando um comple- É uma região de aporte de material sedimentar,
xo sistema de serras e morros, o que explica a origem basicamente arenosos, provenientes das áreas adjacen-
dos inselbergs (testemunhos) desta região e dos tepuyes tes elevadas do escudo das Guianas. A baixa energia do
(Carvalho, 2014). relevo na região central do lavrado favorece a formação
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de um interessante sistema de lagos de formato circular, nentes e demais morfologias associadas. Para o mapea-
não fluviais. A formação destes lagos está associada às mento das morfologias denudacionais, foram utilizadas
águas pluviais e ao lençol freático, no período chuvoso imagens altimétricas da SRTM (radar interferométrico
formam uma grande extensão de áreas alagadas interco- da Shuttle Radar Topography Mission).
nectadas (Meneses et al, 2007). Estas imagens foram reamostradas para 30 metros,
Estas áreas são recortadas por igarapés intermiten- obtidas através do banco de dados EarthExplorer (http://
tes, os quais chegam a secar em vários locais durante a earthexplorer.usgs.gov), para toda a bacia hidrográfica
estiagem (agosto-maio). Associados aos igarapés estão do Amazonas, e tratados no Laboratório de Métricas da
os buritis. A vegetação dos buritizais torna-se mais com- Paisagem, onde estão disponíveis (http://ufrr.br/mepa).
plexa ao se aproximar das matas galerias dos rios maio- São imagens que possibilitaram identificar graus de dis-
res. Recobrindo o solo ocorrem ciperáceas e gramíneas secação do relevo, controle estrutural (indiscriminado),
em proporções que podem variar de acordo com a gra- com base no produto de imagem sombreada, útil para
nulometria e a umidade retida no solo (Carvalho e Car- vetorização das feições típicas denudacionais (serras,
valho 2012a). Relatos sobre a estrutura e composição da morros). Foram utilizadas para elaboração de perfis
vegetação herbáceo-graminosa, arbustos, arvoretas e ár- topográficos, transversais à planície do rio Branco, e o
vores mais encorpadas do lavrado podem ser encontra- perfil longitudinal, importante para compartimentação
dos em Barbosa e Miranda (2005), Veloso et al (1975). entre o alto, médio e baixo rio, segmentos identificados
com base nas quebras do gradiente ao longo do canal. A
MATERIAIS E MÉTODOS declividade e compartimentação altimétrica (hipsome-
tria) também foi caracterizada com base nos modelos
altimétricos da SRTM.
As descrições da morfologia do relevo foram
Os modelos da SRTM serviram para a delimitação
através de sensoriamento remoto, na escala 1:150.000, e
e extração automática da rede de drenagem da bacia
aproximações em 1:50.000 para o caso da planície flu-
hidrográfica do rio Branco, no algoritmo HAND (Hei-
vial do rio Branco. O uso de imagens permitiu identi-
ght Above Nearest Drainage), disponível para o programa
ficar formas representadas por morfologias típicas de
ENVI 4.7. A extração da drenagem foi ao nível do pixel
acumulação, ou seja, agradacionais (planícies fluviais;
(30 metros), importante para uma melhor definição dos
sistemas lacustres; aluviões); e as denudacionais, mor-
limites da bacia hidrográfica, que após o processamento
fologias típicas de processos erosivos (serras e morros o
foi feito um controle visual na escala 1:100.000. Este pro-
geral) com significativo controle estrutural. Estes dois
cedimento possibilitou comparar dados secundários dos
sistemas independem da escala, podendo ocorrer mor-
fologia típica agradacional de alguns metros quadrados limites da bacia do rio Branco, mostrando-se mais confi-
a centenas de quilômetros quadrados, o mesmo ocorre ável, eliminando erros, os quais são gerados pelo mape-
para sistemas denudacionais. Também não são siste- amento manual, principalmente quando elaborados em
mas isolados, onde morfologias de agradação se formam escala pequenas como 1:500.000 e menores.
comitantemente com as erosivas. O que foi levado em Foram utilizadas imagens de 1975 (Landsat 1/
consideração é a predominância das morfologias. São MSS) e 2013 (Landsat 8/OLI) para mapeamento das
sistemas que dão a noção de estabilidade ou instabili- ilhas e lagos da planície fluvial do rio Branco, categori-
dade, o que pode acarretar em erros do intérprete. Uma zados em classes relacionados a processos morfogené-
unidade com morfologia côncava a qual foi gerada por ticos, os quais tem uma relação de origem da unidade.
processos fluviais passados (paleocanais) colmatada por Fotografias aéreas do aerolevantamento da Força Aérea
sedimentos aluvionares, dá a ideia de estabilidade local, dos Estados Unidos de 1943 para caracterização da di-
porém temporária. Deve ser levado em consideração que nâmica do Complexo do Surrão-Praia Grande, ilhas em
um sistema não é fixo, é dinâmico e está dependente de processo de anexação à planície da margem esquerda
agentes externos (ventos, clima, fauna, antrópico) e in- do rio Branco, no trecho de Boa Vista. Estas fotografias
ternos (tectônico). aéreas foram georeferenciadas com base em imagens do
As imagens que permitiram identificar, em primei- Landsat 8 de 2013. As análises foram feitas nos progra-
ra aproximação, processos agradacionais foram as do mas Envi 4.7 e ArcGis 10, úteis na vetorização, extração
Landsat 7 (ETM+), produto Geocover 2000, mosaico da rede de drenagem e análises morfométricas dos sis-
disponível com resolução de 15 metros, utilizadas para o temas lacustres. O uso do algoritmo VLATE 2.0 para o
mapeamento das planícies fluviais, áreas abertas (cam- ArcGis, foi importante para análises estatísticas e mor-
pinaranas e lavrado), sendo possível identificar aspectos fológicas dos lagos, processado no Lab. de Métricas da
vegetacionais, áreas de acumulação sazonais e perma- Paisagem (Mepa/UFRR). Estas técnicas com base no
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sensoriamento remoto foram baseadas em estudos de: mentos do canal: 572 km pela margem esquerda, 562 km
Xavier (2001), Latrubesse e Carvalho (2006), Ferreira (central), 563 km pela margem direita, com índice de
et al (2008), Carvalho (2009b) e Carvalho e Carvalho sinuosidade de 1.10, caracterizando-o retilíneo (sinuosi-
(2012b). dade < 1.5) e um desnível de 49 metros, com gradiente de
8 cm/km.
RESULTADOS
Figura 2 - Perfil longitudinal trecho do rio Uraricoera e ao longo do rio Branco. Três significativas mudanças de gradien-
te longitudinal. 1 – Trecho do alto rio Branco, com mudança de gradiente na região do Bem Querer, planície pouco de-
senvolvida; 2 – Médio rio Branco, mudança de gradiente nas proximidades do rio Catrimani, marcando transição entre
o médio e baixo rio Branco, planície bem desenvolvida; 3 – Baixo rio Branco, e 4 - mudança de gradiente na proximidade
da foz com o rio Negro.
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Contribuições à Geologia da Amazônia - Volume 9
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Segmento I, desde a confluência dos rios Urari- do lavrado, extenso ambiente campestre de Roraima
coera/Tacutu até sul da ilha São Felipe (2,22°;-61,92°). com 43,281 km², ambiente dominado por feições agra-
Trecho do alto rio Branco, possuindo 107,20 km de com- dacionais, constituído por sistemas lacustres nas áreas
primento, gradiente de 13 cm/km, com índice de sinuo- abertas (lavrado), intercalados por pequenas elevações
sidade 1,05 (retilíneo), formando uma planície de fluvial suaves denominadas de tesos (Fig. 3), as quais atuam
de 355,54 km², perímetro de 234,02 km, cuja largura em cotas inferiores a 200 m (~50 a 200 m); região estável
média é de 3,2 km. Trecho com pouco desenvolvimen- com dissecação fraca, caracterizada por uma superfície
to da planície fluvial, devido ao controle estrutural do aplainada pela rede de drenagem dos rios Uraricoera,
Grabém Tacutu, com afloramentos rochosos no trecho Tacutu e Branco (Fig. 4).
final. Nesta região merece um destaque para o domínio
Figura 3 - A esquerda fotografia aérea exemplificando as morfologias dos tesos e veredas; a direita imagem derivada do
modelo digital de elevação. 1 - Tesos do lavrado, morfologias convexas; 2 - lagos circulares; 3 - igarapés associados a buriti-
zais.
O II trecho, desde sul da ilha São Felipe (2,22°;- de 405.226 km², e 126,795 km de perímetro. Possui um
61,92°), possui 151,674 km, com afloramentos rochosos acentuado gradiente de 14 cm/km. É o trecho de contato
na porção inicial (região do Bem Querer), ilhas de em- com o nível de base do rio Negro, marcado por significa-
basamento rochoso, gradiente de 6,59 cm/km, índice de tivas mudanças evolutivas da foz do rio Branco, a qual
sinuosidade de 1,10, formado por uma planície de inun- nos dias atuais está mais extensa, conforme análises dos
dação com 613,897 km², perímetro de 325,106 km, cuja paleocanais do antigo sistema do rio Negro, distante ~39
largura média é de 4,7 km, com maior desenvolvimento, km da margem atual, o que pode ser a explicação para
presença de paleocanais, e vegetação mais encorpada, este ultima segmento apresentar uma quebra significa-
onde o rio Branco passa a drenar em domínio da floresta tiva do gradiente no baixo rio Branco, nas proximidades
ombrófila mista, trecho o qual caracteriza-se como mé- da foz com o Negro. Esta região também apresenta pro-
dio rio Branco, até as proximidades a jusante da foz do blemas de classificação quanto ao rio Xeruini, discutido
rio Anauá. adiante.
O III trecho, iniciado cerca de 8 km a jusante da foz Com relação aos afluentes dos três principais rios
do rio Anauá (1,05; -61,34), é característico por apresen- de Roraima, destacam-se os do rio Uraricoera: Parica-
tar uma planície fluvial bem desenvolvida, extensos pa- ranã, Amajari e Parimé, formando uma área de drenagem
leocanais, maior concentração de lagos, com ilhas maio- de 49.951 km², cuja vazão média na foz é de 1.500 m³/s. Os
res e mais estabilizadas que no alto rio Branco e maior principais afluentes do Tacutu são o Surumu e Cotingo,
diversidade de paleocanais. Este trecho possui 254,70 formando uma área de drenagem de 42.671 km², cuja va-
km de extensão, índice de sinuosidade de 1.08, formando zão média na foz é de 1.280m³/s. Os principais afluentes
uma planície de inundação de 1.827,85 km², perímetro do rio Branco, pela margem esquerda, pertencentes ao
de 521,04 km, gradiente de 7 cm/km, cuja planície fluvial segmento I (alto rio Branco) são Quitauaú e Anauá. Cujo
apresenta uma largura média de 10 km. ambiente fluvial caracteriza-se por uma planície pouco
O IV segmento possui características similares desenvolvida, com largura média de 3,2 km, canal retilí-
ao III. No entanto, este apresenta uma quebra de gra- neo (índice de sinuosidade 1,05) e significativo potencial
diente marcante. O trecho possui 46,66 km de extensão energético, por exemplo, na região do Bem Querer, com
até a foz do rio Negro, com uma planície de inundação afloramentos rochosos onde há uma quebra do gradien-
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Figura 4 - Aspectos morfológicos agradacionais adjacentes à planície do alto rio Branco, campos do lavrado. Perfis topo-
gráficos transversais: 1 – Terraço (formação de buritizais); 2 – Levees associados a lagos (planície e ilha); 3 – Ilha anexada
à planície; 4 – Paleocanal por acreção lateral.
te longitudinal o qual marca a transição entre o alto e o direita possuem maior porte fluvial, com planície desen-
médio canal; e o rio Itapará, localizado no segmento III volvida, padrão meandriforme, e sistemas lacustres as-
(baixo Branco) cuja planície fluvial é mais desenvolvida, sociados à paleocanais, como os rios Cauamé, Mucajaí
com sistemas lacustres associados à paleocanais e esta- (segmento I), Catrimani e Água Boa do Univini (transi-
bilidade dos sistemas insulares. Os afluentes da margem ção do médio para o baixo Branco).
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Síntese dos aspectos hidrogeomorfológicos do estado de Roraima, brasil
A planície do rio Branco é composta por dife- às margens, com progressiva colmatagem de
rentes classes de sistemas lacustres (Tab. 1), ilhas alu- pequenos canais secundários, abrangem 10%
vionares, em diferentes posições marginais e centrais em do total, com maior representatividade no alto
relação ao canal (Tab. 2), e morfologias associadas aos Branco.
paleocanais e planícies meandriformes dos rios menores
(afluentes). − Lago de meandro abandonado: indicam canais
abandonados, porém associados ao abandonado
Tabela 1 - Classificação dos sistemas lacustres da planície
de meandros (em forma de ferradura), represen-
fluvial do rio Branco, para o ano de 2013. tam 2% do total, com maior representatividade
no baixo Branco, e médio, evidenciando um pa-
Classes Alto Médio Baixo Total % drão típico retilíneo no alto Branco.
44 10 294 348 41
Lagos menores − Lago espiras de meandros: indicam uma migra-
Lago de acreção lateral 41 19 25 85 10 ção em padrão meandriforme sucessiva do ca-
Lago insular de bancos
acrescidos
4 0 25 29 3 nal, com lagos compostos em forma de ferradu-
Lago insular de acreção ra, representam 2% do total, com maior repre-
14 33 91 138 16
lateral sentatividade no baixo Branco, no segmento IV.
Lago espiras de meandro 4 0 13 17 2
− Lagos insulares: são importantes para identifi-
Lago de meandro
abandonado
1 5 12 18 2 car o processo de estabilização de ilhas aluvio-
Lago de escoamento
3 9 14 26 3
nares, representativas do rio Branco em todo
impedido seu trecho, com exceção da falha do Bem Querer
Lago de canal abandonado 0 4 177 181 21
(ilhas rochosas – granitos e gnaisses). Os lagos
Total 111 80 651 842 100 insulares identificados foram o Lago insular de
acreção lateral, abrangendo 16% do total entre
Tabela 2 - Classificação das ilhas aluviais do canal do rio os sistemas lacustres, indicando processo de
Branco, para os anos de 1975 e 2013.
estabilização rápido, com formatos alongados,
Classe 1975 2013 Acréscimo
em maior ocorrência no baixo Branco; e o Lago
insular de bancos acrescidos que representam
Lateral Esquerda 37 38 1
3% do total, mais significativos no alto e baixo
Central 42 47 5
rio Branco, formados por sucessivos aportes de
Anexada Esquerda 9 11 2
barras arenosas, ao longo da ilha até cessar o
Lateral Direita 23 27 4
processo de estabilização pelo desenvolvimento
Anexada Direita 5 11 6 de uma vegetação arbórea.
Centro Direita 5 6 1
Os processos de mobilidade de morfologias flu-
Centro Esquerda 8 8 0
viais, como estabilização de barras arenosas formando
Total 129 148 19 ilhas, é comum no rio Branco, onde pode ser observado
há décadas tais mudanças, não em detrimento de ação
Foram identificados 842 lagos ao longo da planície antrópica, o que não significa que nos dias atuais ocorra
fluvial do rio Branco, os quais correspondem as classes (Carvalho, 2009c; Sander et al, 2013). As figuras 5 e 6
de lagos menores; canal abandonado; acreção lateral; exemplificam mudanças significativas no alto rio Bran-
meandro abandonado; espiras de meandro; e de lagos co. O rio Branco possui uma tendência de estabilização
insulares, devido à acreção lateral nos processos de es- de ilhas, favorecendo o incremento de ilhas por anexa-
tabilização das ilhas (Tab. 1):
ção lateral ou soldamento (bancos acrescidos). Estes
− Lagos menores: são de pequena extensão, cir- processos são perceptíveis com maior dinâmica no alto
culares, com índice de forma em média de 1.3 trecho, o qual possui uma relativa instabilidade em rela-
(circulares), representando 41% do total, mais
ção ao baixo rio Branco, estável e bem desenvolvido. O
significativos no baixo e alto rio Branco.
processo de anexação de ilhas à planície de inundação
− Lago de canal abandonado: representam canais ocorre mais significativamente ao longo da margem es-
colmatados pelo desvio do fluxo principal, po-
querda, caracterizado por maior grau de entrelaçamen-
rém sem uma definição de sua forma, corres-
to. Este processo pode ser observado pelo maior com-
pondem a 21%, com maior ocorrência no baixo
Branco. primento do canal ao longo da margem esquerda, até sua
foz com 572 km de extensão, cerca de 10 km a mais que
− Lago de acreção lateral: classe que representa
pela margem direita.
processos de anexação de ilhas estabilizadas
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Figura 5 - Ilha São Lourenço, proximidades de Boa Vista. Processo de soldamento a montante, estabilização de barra
arenosa (formação de ilha). A) imagem GeoEye 2011; B) fotografia aérea USAF-1964. (Fonte:Mepa/UFRR).
Figura 6 - Complexo ilha do Surrão-Praia Grande. Processo de soldamento a montante, e acreção lateral, margem
esquerda da planície de inundação (abandono de canal). A) USAF-1943; B) GeoEye 2011 (Fonte: Mepa/UFRR).
Foram classificadas ilhas de acordo com sua posi- processos de sedimentação na margem esquerda. Um
ção no canal, em laterais, centrais e anexadas (Tab. 2). caso interessante é o Complexo do Surrão-Praia Gran-
Observou-se que desde 1975 a 2013 ocorreu um progres- de, complexo formado pelas ilhas Canhapucari (Praia
sivo aumento de área insular, com 19 ilhas formadas, Grande), São Pedro e São Bento (Surrão), em frente a
sendo as categorias mais representativas por anexação cidade de Boa Vista (Fig. 6). Este complexo com 7,76
na margem direita e central, e pouca significância para km² está se anexando à margem esquerda do rio Branco
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Contribuições à Geologia da Amazônia - Volume 9
Síntese dos aspectos hidrogeomorfológicos do estado de Roraima, brasil
Figura 7 - Estabilização de barra arenosa (soldamento a montante de ilha). Praia Grande, Boa vista, alto rio Branco.
a uma taxa de 16.705 m²/ano. No caso particular da ilha depósitos aluvionares, como os do centro-sul de Rorai-
Canhapucari, com uma formação de depósitos de fundo, ma, região das campinaranas, e do nordeste, domínio do
conhecido como Praia Grande (local frequentado por lavrado, ambos com dissecação fraca, intercalados por
banhistas) (Fig. 7), ao longo das últimas décadas tem se igarapés, lagos e veredas; 47% entre 100 e 500 m, com
desenvolvido longitudinalmente, com perda lateral. Em formações serranas isoladas (inselbergs e hogbacks) com
71 anos houve um ganho de 155.240 m², um acréscimo de dissecação média a forte, maior predomínio dos pro-
25,75% de sua área, com taxa anual de 2,18 m². Com re- cessos denudacionais; e menos de 13% acima de 500 m,
lação a dinâmica lateral da ilha, entre 1943 a 1975 houve marcado pelos principais sistemas estruturais como a
uma perda lateral de 134,86 metros. No entanto, a par- Serra da Mocidade, da Lua e região do contato do Sis-
tir de 1975 houve um progressivo acréscimo lateral, com tema Parima-Pacaraima, com predomínio marcante dos
ganho de 68,6 metros até 2014, com acréscimo anual de processos denudacionais, com forte controle estrutural,
1,76 metros/ano. sistemas fluviais incipientes, com pouco desenvolvi-
Referente ao canal do rio Branco, na região em tor- mento e encaixados.
no do Complexo Surrão-Praia Grande, houve uma sig-
nificativa alteração da largura, na porção norte da Praia
DISCUSSÃO
Grande (ilha Canhapucari). Durante o período analisa-
do houve uma perda de 271,50 metros do canal, o qual
em 1943 possuía 1.164,63 m de largura; e em 2014 foi re- O Estado de Roraima insere-se como uma região
duzido para 893,13 m,. No entanto, na porção central da que representa as mais variadas tipologias morfológicas
ilha, margem esquerda, houve pouca diferença na alte- do relevo e vegetação (Costa, 2008; Beserra Neta e Ta-
ração do comprimento do canal, o qual manteve-se re-
váres Júnior, 2008). Abrange desde relevos baixos, arra-
lativamente estável durante os últimos 71 anos, porém o
trecho encontra-se em fase de anexação, devido a quebra sados por intemperismo químico profundo (etchplana-
do fluxo a montante do complexo do Surrão-Praia Gran- ção), com planícies fluviais bem desenvolvidas, das quais
de, favorecendo o abandono do canal em fase incipiente. destacam-se os principais rios com pelo menos 17.500
A Fig. 8 caracteriza as áreas úmidas de Roraima e km² de área úmida, o rio Branco, sendo o principal, com
associação com os aspectos morfológicos do relevo. Dois 3.419 km² de planície fluvial. Ocorrem formações de sis-
principais sistemas foram identificados em Roraima, temas lacustres fluviais e desconexos destes, formando
os sistemas agradacionais e denudacionais, sendo re- áreas periodicamente alagáveis, no lavrado e nas cam-
presentativo na região os denudacionais, com cerca de
pinaranas, por exemplo, no lavrado ocupam cerca de
135.000 km² (60% do Estado), seguido dos agradacio-
nais 90.000 km² (40%). 832,62 km², formando um sistema hidrogeomorfológico
interconectado por campos e veredas com 11.340 km² de
As altitudes variam entre 40 a 2400 m, classifica-
das nas seguintes proporções: 38% do Estado situam- extensão, constituindo morfologias típicas de sistemas
se entre 40 e 100 m, ambientes dissecados por sistemas agradacionais. Estas áreas úmidas em Roraima, levando
fluviais mais desenvolvidos, com baixo gradiente topo- em consideração somente rios com planícies fluviais de-
gráfico, e formações de sistemas de paleocanais, com senvolvidas, campos com sistemas lacustres, e áreas de
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Thiago Morato de Carvalho
Figura 8 - Sistemas geomorfológicos denudacionais, agradacionais e unidades associadas às áreas úmidas de Roraima.
influência de buritizais, estão em torno de 20.750 km² de do centro-sul de Roraima, as quais são interligadas por
extensão (Fig. 8). um estreito corredor NE-SE, formado pela dissecação do
Estas áreas úmidas estão distribuídas principal- sistema de drenagem do rio Branco.
mente nos sistemas agradacionais, abrangendo cerca Com relação às áreas úmidas que drenam o sistema
90.000 km2, destacando-se os sistemas lacustres e ve- denudacional, em uma área de 135.000 km2, são forma-
redas do lavrado, planícies fluviais bem desenvolvidas, das por rios menores, com planícies fluviais estreitas,
com extensos depósitos aluvionares constantemente re- com pouco desenvolvimento, rios encaixados e sem um
trabalhados pelos pulsos de inundação, as campinaranas desenvolvimento de sistema lacustres significativo. Es-
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Síntese dos aspectos hidrogeomorfológicos do estado de Roraima, brasil
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Figura 12 - Exemplos de depósitos de areias brancas modelados por ação eólica e fluvial. A – Depósito inativo,
aluvionar de paleomeandro, terraço do rio Xeruini; B – dunas parabólicas inativas, provável origem de antigos
depósitos aluvionares remodelados pelo vento (NE-SW), campos de dunas do Catrimani-Univini; C – Depósi-
tos ativos na planície fluvial do rio Xeruini; D – Depósitos ativos arenosos (areias marrons) do lavrado, tesos,
aspectos de dunas modeladas por ação eólica em conjunto com fluxo superficial de água (polifásica).
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Síntese dos aspectos hidrogeomorfológicos do estado de Roraima, brasil
riedade de ambientes promove uma distinta fauna e flo- especial relevância, caracterizações as quais podem ser
ra, especializadas a determinados ambientes o que pode feitas com base no que já foi proposto sobre estas uni-
levar a distribuição restrita de muitas espécies. dades e com base nas descrições dos sistemas fluviais. A
Em Roraima os ambientes agradacionais destacam- utilização de geotécnicas como o sensoriamento remo-
se por possuírem planícies fluviais bem desenvolvidas, to/geoprocessamento é fundamental para estas caracte-
em uma primeira análise, a área das planícies fluviais dos rizações. Outra conjectura relacionada à rede hidrográ-
principais rios formam 10.000 km² de área úmida atrela- fica desta região, é que as serras de Parima-Pacaraima,
da à dinâmica fluvial. Diferentemente das demais regiões que fazem a divisa do Brasil com a Venezuela, atuam
amazônicas, nas quais os rios são alóctones na maioria, ecológica e geomorfologicamente como divisor de águas.
em Roraima o sistema de drenagem têm suas nascentes Estas caracterizações regionais são importantes não só
situadas no Escudo Guianense, e em grande parte é autóc- para contextualizar os ecossistemas regionais amazôni-
tone, com exceção de cerca de 12.000 km² que nascem no cos, mas são também importantes para o entendimento
oeste da Guiana. Estes rios fluem por diferentes unidades evolutivo das superfícies de aplainamento de Roraima,
morfoestruturais que compõem a região de Roraima. assim como do ponto de vista de conservação, distribui-
Também destaca-se na paisagem as formações de ção da fauna e flora.
sistemas lacustres fluviais e os desconexos destes, for- Um tipo de sistema que se deve dar importância
mando ambientes periodicamente alagáveis, no lavrado são as áreas abertas, como o lavrado e as planícies de
(NE de Roraima) e as campinaranas (centro-sul de Ro-
areias brancas no centro sul do Estado (campinaranas).
raima). Por exemplo, no lavrado estes sistemas ocupam
Estes ambientes são áreas chaves para compreender
cerca de 832,62 km², formando um sistema hidrogeo-
aspectos evolutivos da paisagem, como os campos de
morfológico e ecológico interconectado por lagos e iga-
paleodunas (Catrimani-Univini; Serra Grande; Bonfim;
rapés com cerca de 3.300 km² de extensão, considerando
somente as áreas molhadas. No entanto, se considerar- Viruá, dentre outros), além de servirem de áreas fontes
mos o ambiente interconectado de campos em torno das das áreas úmidas do Estado, com relevantes por abriga-
áreas úmidas, os quais estão diretamente conectados, a rem uma fauna e flora especializada a estes ambientes
área deste sistema no lavrado é estimado de 11.000 km². (endêmicas), ciclagem de nutrientes, manter e controlar
O sistema de campinaranas no centro-sul de Roraima, a hidrodinâmica do fluxo superficial e subsuperficial da
considerando ás áreas abertas, abrangem cerca de 8.000 água.
km². Estas áreas úmidas em Roraima, levando em consi- Estes estudos possibilitam condições de estabe-
deração somente rios com planícies fluviais desenvolvi- lecer critérios de avaliação para o planejamento e ge-
das, lagos e áreas molhadas de influência de buritizais, renciamento do uso de ambientes de áreas úmidas, por
podemos estimar pelo menos 14.000 km² de área úmida. exemplo, lagos e áreas insulares, as quais são dinâmicas,
Porém, se formos levar em consideração os sistemas co- e vulneráveis à ação humana. São ambientes os quais ne-
nectados, adjacentes a estas áreas úmidas, funcionando cessitam de uma atenção do poder público, com intuito
como um sistema dinâmica em constante conexão devi- de caracterizar e gerenciar as ações da população, a qual
do a expansão da fase terrestre e aquática, estes ambien- faz uso destes ambientes. No entanto, deve-se ter certos
te podem chegar em torno de 30.000 km² em Roraima. cuidados ao interpretar determinados ambientes, sem
Neste contexto, a caracterização dos rios e tam- levar em consideração aspectos geomorfológicos e tam-
bém das unidades morfoestruturais de Roraima adquire bém os sócio-culturais.
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