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Abstract: The article is about the author’s experience in the pos-doctoral studies in
the Performance Studies Department of Tisch School of the Arts/NYU with Richard
Schechner, approaching the kind of research developed by the author, its antecedents
and what was unfolded from it. The aim is to present, in biographic way, the results of
the research and the process of creation in performance accomplished with the
theoretical approach from Richard Schechner and Victor Turner. The research included
the fieldwork as participant observer on the production process of the play YokastaS
directed by Schechner. The creation of a performance exhibited by the author in a
scientific meeting is considered as the last step of a transformation path and
passageways as she considers her studies in USA were in order to have an
anthropological work built through the researcher’s own experience.
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The essays in this book chart my personal voyage of discovery from traditional
anthropological studies of ritual performance to a lively interest in modern theatre,
particularly experimental theatre.
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Estou me referindo particularmente a teóricos da análise do discurso, como Michel Pêcheux,
Dominique Maingueneau, Eni Orlandi.
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sobre dilemas da analogia do drama para a vida social como referência teórica
para as questões metodológicas da pesquisa em artes cênicas, fui me
direcionando, conduzida por Turner, a aprofundar a teoria da performance e a
metodologia de criação artística de Richard Schechner como diretor. Assim,
em 2001, eu escrevia a ele sobre meus interesses e, uma vez recebida como
visiting scholar no departamento onde leciona e aceita como pesquisadora de
sua obra, logo tive a oportunidade de pedir para conhecer sua atuação artística.
Eu desejava conhecer o diretor de teatro, o “guru” do teatro experimental ame-
ricano que havia iniciado Victor Turner (1982, p. 9, 10). Diziam no departamen-
to de Performance Studies que de modo diferente do que ocorrera comigo, em
geral ali se chegava a Turner através de Schechner.
Grande parte de meus colegas de cursos eram atores e dançarinos. Entre
eles, havia também excelentes performers, e Marina Abramovic esteve numa
atividade coletiva do departamento, conversando sobre a performance que ha-
via apresentado na época em Nova Iorque, The House with the Ocean View.
Em uma das aulas do curso sobre as teorias da performance, “Ritual,
Play, and Performance”, cujo título no programa era “Ritual and Play Compared.
A Neurological Perspective on Ritual”, Schechner ministrou um workshop
que chamou de “Experiencing Light Trance”, para o qual devíamos estar ves-
tidos para dançar (ao lado do título da aula lia-se a observação “come dressed
to dance”). A participação neste workshop representou o primeiro passo de
realização do verdadeiro projeto que me levava para fora do país e para este
contexto acadêmico-artístico em particular. Minha intenção verdadeira, para
além daquela expressa acima no relatório para a agência financiadora, foi viver
um período de reclusão e rito de passagem para uma nova fase profissional e
pessoal. Afastada do cotidiano de trabalho e de meu meio-ambiente, viver en-
tre os americanos significaria experiência semelhante à vivida entre os Asuriní
do Xingu, o contato e comunicação com o outro que nos leva a refletir sobre
nós próprios e acionar processos de transformação e redefinição de identidade.
Nesse ambiente de artistas e pesquisadores e tendo Schechner como an-
fitrião, senti-me pronta para a travessia. Livre de compromissos estabelecidos
por outros – agora a livre-docência permitia a liberdade da autodeterminação –
, estranha em outra cultura de modo a ganhar igualmente a liberdade de agir
como um diferente, sentia-me muito à vontade para me comportar segundo
minhas próprias buscas. Schechner pedia para nos vestirmos com roupa leve,
modo adequado para o trabalho corporal que desenvolveria conosco, isto é,
exercícios de respiração e movimentos de dança em grupo. Eu fui com todos
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Após as apresentações públicas, final dessa etapa dos trabalhos da ECA com YokastaS, a atividade
seguinte de minha pesquisa foi entrevistar todos os atores, cujos depoimentos foram gravados e
constituem parte do material etnográfico.
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[…] contrariando a expectativa por parte do público e dos atores, o texto e sua
encenação sob uma direção constituíram a estrutura da proposta […] a principal
novidade residiria na importância do texto, particularmente na sua estrutura que
representaria as bases da proposta estética atual que reproduz, ao mesmo tempo,
os princípios da obra experimental de Richard Schechner.
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performances que assisti em Nova Iorque, realizadas por mulheres, nas quais o
erotismo se transforma, com a exclusão do “glamour” de peças íntimas deco-
rativas, e em seu lugar o sentido de proteção se sobrepõe à conotação sexual
ou sensual da nudez. Completariam a incorporação da personagem as unhas
enormes e coloridas das mulheres afro-novaiorquinas, as quais me fascinavam
pelo uso incondicional, fosse qual fosse a atividade por elas exercidas. E sandá-
lias havaianas.
Graziela Rodrigues me dirigiu na fase final de criação. Tomou forma o
grito das mulheres cree com o qual passei a interromper imediatamente o mo-
vimento da dança asuriní, substituído por uma posição estática. Somente uma
expressão facial era realizada: a boca se abria ao máximo possível juntamente
com o arregalar dos olhos. Os braços subiam ao máximo da altura possível
numa tensão, a partir de cujo clímax braços e músculos da face passavam a
relaxar, até o máximo possível do relaxamento. Em seguida, retornava à dança
das mulheres asuriní e me dirigia à mesa dos palestrantes, onde colocava nova-
mente a capa que deixara numa cadeira, no início da performance. Retirava-
me na seqüência e voltava à sala, terminada a música dos índios cree.
A dança foi realizada nas bordas da sala, em torno das cadeiras onde se
sentava o público, situado então no centro do espaço da coreografia. Às vezes,
fazia um gesto de convite à dança, com o braço e mãos. Num determinado
momento, ao som da música do ritual asuriní “tauva”, só de mulheres, cuja
dança é realizada em círculo, deixei o trajeto em torno do público e dancei num
espaço sem as cadeiras. Voltei a contornar as cadeiras e o público, até o mo-
mento do canto das mulheres cree, quando estancava o movimento da dança,
como já descrito.
Havia 15 pessoas participando do simpósio. Nos primeiros cinco minutos
da performance, cujo tempo foram os 20 minutos estabelecidos para cada co-
municação, um dos participantes se levantou e se retirou, depois de perguntar a
uma das organizadoras até quando eu ficaria fazendo “aquilo”. Penso que é
justamente a instauração de outro tempo, diferente da exposição oral convenci-
onal, que provocou nos presentes a reflexão sobre a forma como a performance
suscitava inquietações que tentavam responder. Uma das observações feitas
pelos participantes foi a de que a repetição do movimento, após um primeiro
momento de identificação de uma dança, deixava em suspenso conteúdos que,
não sendo expressos pelo código convencional da linguagem oral e científica,
aguardariam a própria participação do público para sua enunciação. Para mim,
como tive oportunidade de expor, respondendo à pergunta feita sobre a diferen-
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Recebido em 31/05/2005
Aprovado em 04/07/2005
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