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Um só Corpo, Um só Espírito, Um só Senhor

Book · April 2016

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1 author:

Jose Marion
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP)
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1ª Edição

“Pai Santo, guarda em teu nome aqueles que me deste, para


que sejam um, assim como nós” (João 17.11b).

Americana/SP
Impacto Publicações
2016

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UM SÓ CORPO, UM SÓ ESPÍRITO, UM SÓ SENHOR
A unidade dos cristãos é essencial antes da volta de Cristo!

Categoria: Cristianismo e Teologia Cristã


Copyright © 2016 Impacto Publicações

1ª edição: 2016

Pesquisa, organização e montagem de textos: Luiz Roberto K. Cascaldi


Revisão: Renata Balarini Coelho, Christopher Walker e Harold Walker
Capa: Carolina Sotero Bazzo
Diagramação: Eduardo C. de Oliveira

________________________________________________________________

M341u Marion, José Carlos


Um só corpo, um só espírito, um só senhor: a unidade dos cristãos
é essencial antes da volta de Cristo! / José Carlos Marion. _ São
Paulo: Impacto, 2016
308 p.

ISBN 978-85-65419-10-9

1. Ecumenismo 2. Unidade 3. Igreja


I. Título
CDU 28
________________________________________________________________

Publicado no Brasil com todos os direitos reservados por:

IMPACTO PUBLICAÇÕES
www.revistaimpacto.com.br
contato@revistaimpacto.com.br / (19) 3462.9893

Proibida a reprodução total ou parcial deste livro sem a autorização escrita dos
editores.

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Sumário

Agradecimentos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5
Prefácio . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 9

Capítulo 1
Divisão na Igreja, o mais nefasto dos pecados . . . . . . . . . . . . . . . . 21
Capítulo 2
As riquezas na diversidade dos evangelhos . . . . . . . . . . . . . . . . . . 37
Capítulo 3
Unidade do Corpo: utopia ou realidade? . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 53
Capítulo 4
Por que existem tantas divisões: alguns aspectos . . . . . . . . . . . . . . 79
Capítulo 5
A queda dos muros que nos separavam . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 113
Capítulo 6
Eles não fazem como nós . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 135
Capítulo 7
Uma cidade em busca da unidade em Cristo . . . . . . . . . . . . . . . 155
Capítulo 8
As raízes do Encristus: como se constrói a unidade . . . . . . . . . . . 177
Capítulo 9
É possível pensar na unidade? . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 195
Capítulo 10
Uma comunidade que vive a unidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 217

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Capítulo 11
O ministério da reconciliação: um dom de Deus para todos . . . . 245
Capítulo 12
A restauração de alianças quebradas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 265
Sugestões Bibliográficas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 289
Anexo 1
Características do Encristus . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 295
Anexo 2
Histórico dos eventos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 299

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Agradecimentos

N
ormalmente, os livros cristãos têm mais uma
característica biográfica e de interpretação bíblica.
Apresentam testemunhos, experiências, modelos
bem-sucedidos, estabelecimentos de princípios, etc.
Neste livro, procuramos dar um enfoque mais acadêmico
no sentido de pesquisar o que pessoas gabaritadas falam sobre o
assunto. Ficamos surpresos em identificar muitos escritos sobre
o tema (a maioria deles citados nas referências bibliográficas).
Buscamos algumas referências em livros (com uma linguagem
mais rebuscada) e outras, em ministrações e preleções (com uma
linguagem mais coloquial).
Dessa forma, começo meus agradecimentos ao Deus
Pai, Todo-poderoso que, na graça de Jesus Cristo, tem
inspirado, pelo Espírito Santo de Deus, tantas pessoas
(filhos de Deus) a compartilhar conosco revelações sobre
esse tema tão relevante para os nossos dias. Pudemos
absorver muita revelação desses irmãos, ainda que nossa
pesquisa não tenha sido exaustiva. Felizmente, há muito
para se explorar ainda.

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6 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

Para “filtrar” as minhas opiniões pessoais atenuando o risco


de erros, solicitei a grupos de pessoas que lessem os originais,
fazendo considerações sobre o texto e comentários referentes à
unidade da Igreja. Agradeço imensamente a estes grupos que
contribuíram para aperfeiçoar este livro. São eles:
1. participantes da equipe de serviço do ENCRISTUS (En-
contro de Cristãos na Busca de Unidade e Santidade).
Fazemos referência a esse grupo no corpo deste livro
e nos anexos;
2. componentes do presbitério da comunidade à qual estou
vinculado (são doze presbíteros à frente de quatro comu-
nidades que se uniram em Jundiaí); também falamos sobre
esse presbitério neste livro;
3. alguns participantes do “Curso de Preparação de Obrei-
ros” (CPO) na ministração da disciplina “Unidade da
Igreja” em setembro de 2015, em Jundiaí/SP.
Quero agradecer a irmãos preciosos que também fizeram a
leitura e trouxeram grande contribuição para nos abençoar. Em
especial, agradeço ao Luiz Roberto Cascaldi que, depois
de 27 anos como pastor de uma das mais importantes
denominações evangélicas do Brasil, aderiu ao chamado
ministerial a favor da unidade do Corpo de Cristo. Com a
visão voltada para a unidade da Igreja, esse pastor contribuiu
sobremaneira para este livro, compilando textos, sugerindo
inclusões, revisando e participando ativamente do aperfei-
çoamento desse material.
Por fim, quero fazer um agradecimento especial à minha
esposa Márcia1 (mãe dos meus quatro filhos, que até aqui nos

1 Márcia Maria Costa Marion é pastora, professora, esposa de José Carlos Marion,
coautora do livro Reconciliação: O Segundo Toque - A Unidade do Corpo de Cristo
e a Nova Evangelização.

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Agradecimentos 7

deram oito netos). Ela recebeu, de forma simultânea, esse


chamado do Senhor para trabalhar na unidade do Corpo de
Cristo, no Ministério da Reconciliação.
Márcia tem abraçado essa causa com paixão. Fizemos o
primeiro livro juntos sobre o tema: Reconciliação: O Segundo
Toque. Antes dele, já havíamos escrito Ontem, Hoje e Amanhã
com Jesus, livro no qual também fazemos referências à unidade.
Juntos, temos participado de diversos encontros sobre uni-
dade não apenas no Brasil, mas também em diversos países do
mundo. Nesse ponto, a parceria com Márcia é decisiva para mim:
sua fluência em línguas (inglês, italiano...) permite não somente
ser minha intérprete, mas também minha porta-voz. Ressalto que
sou uma negação em línguas (aliás, até no português). Durante
inúmeras noites, conversarmos e oramos sobre o teor deste livro.
Assim, temos estudado, participado de muitos eventos e
crescido juntos. A unidade tem sido nosso assunto nas conversas
e orações diárias. Não poderia pensar em trabalhar no tema sem
essa cumplicidade e aliança com minha amada.
Obrigado, Senhor, por todas essas maravilhas!

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Prefácio

B
eth Moore, autora de best-sellers, diz acreditar que um
escritor nunca deve parecer desesperado em querer
que os leitores gostem de sua obra. Simplesmente não
é conveniente. Ele deve dar o seu melhor e depois esperar os
resultados. Porém, em seu livro Liberte-se2, ela complementa:
É assim que eu penso, mas neste caso [livro citado], eu realmente
não consigo agir desta forma. O conteúdo destas páginas é tão
importante para mim, que desejo desesperadamente que se torne
importante para você também. E a mensagem é tão preciosa, que
espero ansiosamente que seja preciosa para você também.

É exatamente assim que me sinto. Escrevi diversos livros


profissionais e espirituais. Porém, nunca coloquei tanta expectativa
em algum dos livros anteriores como coloquei neste.

Minhas motivações com relação a este livro


Pelo menos dois motivos me impulsionaram a escrevê-lo. São os
seguintes:
2 MOORE, Beth. Liberte-se – Tornando a Liberdade em Cristo uma Realidade em
sua Vida. São Paulo: Editora Bom Pastor,, 2006.

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10 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

1. Imagino se estivesse a algumas horas de minha morte. Nesse


período que antecede minha partida, imagino que eu estivesse em
comunhão plena com Deus, com tanta intimidade a ponto de ter
certeza de que seus ouvidos estavam inclinados para ouvir aquela
que seria praticamente minha última oração.
Nessa angústia final, olho para as pessoas e vejo duas situações.
Vejo um grupo (família espiritual) que ajudei a conduzir a Deus,
que discipulei e auxiliei, agindo como sacerdote. Quero vê-los
unidos como no tempo em que estiveram comigo. Também
vejo outro grupo de pessoas, preciosas para mim, mas que não
conheceram a verdade e estão caminhando rumo à perdição.
Este segundo grupo é muito grande, imensamente maior do
que o primeiro. Qual dos dois grupos seria o alvo das minhas
orações? Sem dúvida, o segundo grupo, pois envolve a perdição
de muitos. Para mim, teria mais peso do que a unidade daqueles
que já estão no caminho. Porém, não foi assim que Jesus Cristo
agiu. Algumas horas antes de sua morte, ele orou:

Eu já não estou mais no mundo, mas eles estão no mundo [referindo-


-se aos seus discípulos], e eu vou para ti. Pai santo, guarda em teu
nome aqueles que me deste, para que sejam um, assim como nós
( João 17.11).

No verso 20, Jesus ora por aqueles que ainda crerão nele. Com
relação a estes, ele também ora:

... a fim de que todos sejam um; e como és tu, ó Pai, em mim e eu
em ti, também sejam eles em nós; para que o mundo creia que tu
me enviaste. Eu lhes tenho transmitido a glória que me tens dado,
para que sejam um, como nós o somos; eu neles, e tu em mim, a fim
de que sejam aperfeiçoados na unidade, para que o mundo conheça
que tu me enviaste e os amaste, como também amaste a mim ( João
17.21-23).

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Prefácio 11

Por que Jesus, em sua oração derradeira, enfatizou a uni-


dade de seus seguidores e não fez referência a uma infinidade
de criaturas de Deus que não recebeu revelação de sua Pessoa
para ser salva? A resposta é simples: segundo Jesus, o mundo
crerá nele ou simplesmente o conhecerá se nós, seus discípulos,
formos unidos.
É como se Jesus, antes de partir, nos desse o “mapa da mina”.
No mundo moderno, fala-se sobre “estratégia”, sobre como
atrair novos clientes, como fazer nosso negócio crescer, etc.
Mas parece que o Senhor nos deixou a “receita”. Assim como
os fãs de gastronomia são fiéis à receita ao preparar o alimento,
ou como o doente confia com todas as forças na receita médica
(vai imediatamente comprar o remédio receitado), parece-me
que, no mundo espiritual, também temos a receita para fazer
a boa obra de Cristo na Terra.
2. O segundo motivo, decorrente do primeiro, é a diminuição
assustadora de seguidores de Cristo no globo terrestre às
vésperas de sua volta. Segundo as estatísticas, dentre os mais
de 7 bilhões de habitantes neste planeta, apenas 2,1 bilhões
se dizem cristãos. Enquanto a Igreja de Cristo fala sobre sua
segunda vinda, mais de 5 bilhões de pessoas não sabem que
ele veio pela primeira vez. É muito triste.
Considerando-se ainda que, estatisticamente, dentre esses
“2,1 bilhões de cristãos”, há uma parcela relevante de pessoas
sem qualquer compromisso com Cristo, que não passam de
cristãos “nominais” ou de “fachada”, “religiosos”, indivíduos
que não congregam ou até desconhecem a Palavra de Deus,
a situação se torna ainda mais grave. Desde que se calcula a
participação do cristianismo na população, vivemos hoje o
menor percentual da história dos nascidos de novo. O maga-
zine Opera Mundi (20/12/2011) afirma que, em cem anos

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12 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

(de 1910 a 2010), o percentual mundial de cristãos caiu de


35% para 32%, enquanto o de islâmicos subiu de 9% para
23,4% no mesmo período.
Ressalte-se que o Brasil tem sido uma exceção. Segundo a
pesquisa do PEW Research Center3 realizada em 2014, 61% são
católicos, 26% são protestantes (anglicanos, batistas, pentecos-
tais...), mais de 8% não tem filiação religiosa e 5% pertencem a
outros credos. O processo de pentecostalização tem sido gigante
ao envolver perto de 40 milhões de pessoas. Apesar dessa ex-
pansão, notamos que o mundo religioso está muito pulverizado,
dividido, e isso impede que os números sejam melhores.
Sei que Deus é soberano sobre todas as coisas. Porém, sei
que, em minha geração, estamos perdendo terreno. Sei que
uma população incontável não conhece e muito menos crê que
Jesus foi enviado. Isso dói muito no nosso papel como Igreja de
Cristo. Nunca se viram tantas divisões na Igreja como nos nossos
dias. As estatísticas revelam em torno de 33 mil denominações
cristãs até a presente data. Creio numa oração dramática, com
lágrimas, de Jesus pedindo ao Pai a unidade para que o mundo
creia (ou conheça) que ele foi enviado para salvá-lo.
Apesar de ver uma Igreja atual voltada para o evangelismo e
preocupada em anunciar o Evangelho, sinto que uma mudança
de postura na busca de unidade poderia preencher em boa parte
esse vazio, essa perda proporcional da participação da Igreja na
Terra.
Creio que, se continuarmos tão desunidos, cada vez menos
o mundo crerá em Jesus e no Evangelho. Veja que grande
responsabilidade nós temos.
3 Site: http://www.pewresearch.org. O Pew Research Center (PRC) é um think tank
localizado em Washington DC que fornece informações sobre questões, atitudes e
tendências que estão moldando os EUA e o mundo.

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Prefácio 13

Está Cristo dividido?


Qual é a dificuldade que temos para acolher um irmão em
Cristo de outra denominação cristã? Como a doutrina pode
nos dividir se o Cristo que está em nós é o mesmo? Se rece-
bemos o mesmo Espírito? “Ora, o Senhor é Espírito; e, onde
está o Espírito do Senhor, aí há liberdade” (2 Coríntios 3.17).
Meditemos hoje sobre o fato de que, embora Cristo e o
Espírito Santo sejam Pessoas distintas da Trindade, são UM
na essência (João 14.16) e possuem a mesma tarefa, que é
a de dar-nos a luz, a força e a direção de que necessitamos
na vida. Pois, ao nos convertermos, foi-nos outorgado o
Espírito (Atos 2.38), que passou a habitar em nosso coração
(1 Coríntios 3.16). Quando nossa obediência ao Senhor é
resultado do mover do Espírito em nós, não temos outro
desejo além de servir por imposição do amor de Deus, que
reveste de glória os trabalhos mais humildes, no quais en-
contramos perfeita liberdade!
Se Cristo recebe uma pessoa, esta pessoa passa a ter o Es-
pírito Santo. Esta pessoa passa a ser meu irmão em Cristo.
As diferenças que poderiam nos separar são infinitamente
pequenas perto da grandeza de termos o mesmo Senhor, um
só Senhor. O Espírito que está em mim é o mesmo que está no
outro irmão. “Acaso, Cristo está dividido?” (1 Coríntios 1.13)
Exatamente nesse contexto de divisão na igreja de Coríntios,
Paulo roga (suplica, pede com humildade, insiste):
Rogo-vos irmãos, pelo nome de Nosso Senhor Jesus Cristo, que
digais todos uma mesma coisa, e que não haja entre vós dissenções;
antes sejais unidos em um mesmo pensamento e em um mesmo
parecer (1 Coríntios 1.10).

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14 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

Caminhos para a unidade da Igreja de Cristo


Quando falamos sobre unidade, pensamos no esforço pela unidade
visível entre igrejas separadas. Em algumas esferas, este “esforço”
é chamado de ecumenismo espiritual (unidade no Espírito): ou
seja, a tendência de fazer da Igreja de Cristo uma única família, a
Família de Deus (Efésios 2.19). Não se trata de arranjos políticos
e muito menos de uma igreja unitária, mas sim de uma unidade
na diversidade, o que normalmente se denomina de diversidade
reconciliada.
A unidade visível pressupõe a comunhão dos santos, a coexis-
tência pacífica. Esse entendimento mútuo pressupõe que os “cris-
tãos divididos” não mais enxerguem aos outros como adversários
hostis, mas como amados irmãos. Em outras palavras, podemos
ter comunhão com membros de diferentes denominações cris-
tãs sem abrir mão de tradições implementadas por fundadores
(principalmente no meio evangélico), mantendo as estruturas e
certa independência.
De maneira geral, duas linhas distintas têm sido utilizadas na
busca dessa unidade:
a. debates teológicos com a intenção de lapidar as posições
divergentes até se tornarem simplesmente tensões comple-
mentares (uma reflexão teológica séria, com muita oração,
perdão e a busca de revelação na Palavra: a Bíblia é tratada
como a única fonte para essas reflexões);
b. um ecumenismo mais voltado para as experiências espiri-
tuais (ecumenismo espiritual ou unidade no Espírito) do que
para os debates teológicos. Com base no Espírito Santo,
a centralidade de Jesus como Senhor e Salvador fica mais
evidente ao mesmo tempo em que se tem mais revelação
da Trindade na unidade do Pai, Filho e Espírito Santo.

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Prefácio 15

No que tange à busca da unidade por meio do debate


teológico, citamos, como exemplo, a conferência promovida
pela Comissão de Fé e Constituição do Conselho Mundial de
Igrejas realizada em Lima, Peru, em 1982. Nela, foram obtidos
acordos teológicos que revelam o posicionamento acolhedor
de várias igrejas acerca de temas vitais para a vivência eclesial,
como o batismo, a eucaristia (ceia) e o ministério. As igrejas
católica e luterana protagonizaram esses debates, que culmi-
naram na reconciliação (Declaração Conjunta sobre a Doutrina
da Justificação), assinada em cerimônia solene em 1999, destes
dois ramos do cristianismo divididos há mais de quatro séculos.
Assim, foi encerrada a principal divergência entre ambas: a base
bíblica para a salvação. Foram 32 anos de conversas para se
chegar ao consenso sobre a salvação, o que fez perder o sentido
o termo “protestante”4 no mundo cristão.
Apesar de respeitar e estimular essa linha de unidade,
entendemos que o caminho da experiência espiritual tem
sido uma providência de Deus, poderosa para os nossos dias.
A característica do Espírito Santo que une o Pai e o Filho,
sem dúvida, é unir a Igreja de Cristo, assim como o Pai e o
Filho são UM. Seja um caminho, seja outro, é importante
ressaltar que a busca da unidade descarta por completo qual-
quer tentativa de fusão, absorção ou incorporação (termos
usados no mundo empresarial). Cada igreja local compõe a
Igreja de Jesus Cristo na Terra, a igreja universal. De jeito
nenhum, entendemos, como já dissemos, a unanimidade,
o unitarismo ou a centralização eclesiástica como solução
para a unidade.

4 No dia 31 de outubro de 1999, na cidade de Augsburgo, foi assinado um documento


de reconciliação e harmonia teológica. Embora, de imediato, o consenso teórico não
tenha mudado a organização e a liturgia das duas igrejas (que permanecem separadas),
pelo menos no papel (documento) o termo “protestante” não existe mais, já que houve
perdão (reconciliação) das partes que originaram essa palavra.

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16 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

Pentecostais e carismáticos
Pentecostes não é somente o marco da fundação da Igreja de
Cristo, mas também da unidade do Corpo de Cristo. Um dos
efeitos imediatos do Pentecostes foi que os judeus devotos de
todas as nações presentes em Jerusalém, por ocasião da festa,
começaram a ouvir, cada um, em sua própria língua materna,
as grandezas de Deus (Atos 2.5-11), ao contrário da confusão
de línguas e da divisão entre os povos iniciadas na torre de
Babel (Gênesis 11). Todo povo sentia simpatia pela unidade
da igreja que se iniciava, e o Senhor acrescentava, dia a dia, os
que iam sendo salvos (Atos 2.47). Dentre os que criam, era
um o coração e a alma; estavam juntos, e crescia mais ainda
a multidão de crentes agregados ao Senhor (Atos 5.13,14).
Infelizmente, a igreja sofreu grandes divisões, principal-
mente no segundo milênio após sua criação. Porém, no início
do século 20, em Topeka, Kansas, houve um novo derra-
mamento do Espírito Santo chamado de Novo Pentecostes.
Em 1906, o pastor negro William J. Seymour, batizado no
Espírito Santo, iniciou, num velho galpão da Rua Azusa,
312, em Los Angeles/EUA, reuniões de avivamento que
também uniam negros e brancos que antes congregavam
separadamente. Mais uma vez, o Espírito Santo foi liberado
para a unidade do Corpo de Cristo. Nessas reuniões, que
agregavam pessoas de todo o mundo, “não se permitia uma
palavra indelicada contra inimigos ou outras igrejas; não se
permitia que se pensasse, falasse ou se ouvisse mal contra qual-
quer criatura; nunca buscava-se a defesa deste trabalho ou das
pessoas que lá estavam. O Espírito Santo não permitia críticas
ou comparações com outras denominações”.5
5 MARION, José Carlos e Márcia. Reconciliação: O Segundo Toque - A Unidade
do Corpo de Cristo e a Nova Evangelização. Americana/SP: Impacto Publicações,
2014, 2ª edição.

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Prefácio 17

Durante os anos de 1960, o derramamento do Espírito Santo foi


intensificado sobre as denominações tradicionais como episcopais,
luteranas, presbiterianas, batistas, metodistas, menonitas, etc. Porém,
no começo de 1967, Deus surpreendeu os protestantes ao derramar
o Espírito Santo e seus dons sobre um grupo de católicos romanos
nos Estados Unidos. Primeiramente, isso aconteceu em um retiro
de fim de semana perto de Pittsburgh (Pensilvânia – Universidade
de Duquesne) e, depois, nas reuniões de South Bend, Indiana e
East Lansing, Michigan. Esta “segunda onda” do Espírito Santo
no século 20 deu origem ao que chamamos hoje de carismáticos. É
interessante observar, no derramamento do Espírito Santo sobre os
católicos, a participação de protestantes (episcopais e presbiterianos)
e a leitura do livro A Cruz e o Punhal, de David Wilkerson. Isto
mostra o propósito de Deus em nos conceder seu Espírito para a
unidade do Corpo.
O movimento do Espírito continuou em 1970, expan-
dindo-se por toda parte do mundo como América Latina,
Escandinávia, França e Itália. Da metade dos anos 70 para
frente, alcançou Espanha, Portugal, África e Ásia (e a China
em especial, mais recentemente). Em outras palavras, essa
maravilhosa bênção atingiu todo o planeta no século 20,
chegando, de acordo com alguns cálculos atuais, o número
mundial de pentecostais e carismáticos a aproximadamente
700 milhões.
É maravilhoso ver que essa obra de Deus foi um evento
totalmente inesperado, sem nenhum planejamento humano,
sem nenhuma teoria “colocada em prática”. Não há destaque
para qualquer fundador ou pioneiro. Não houve autor, so-
mente aqueles que experimentaram e se transformaram por
completo. Assim, caso forem misturados numa mesma sala
pentecostais e carismáticos, não saberemos quem é quem.
Passamos a experimentar a unidade do Corpo no poder do

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18 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

Espírito Santo. Nessa hora, não identificamos mais negros e


brancos, pobres e ricos, líderes e liderados, clero e leigos, raças,
línguas, culturas, etc. Não há qualquer “jeito padronizado”.
Peter Hocken diz:6
Somente um movimento enviado diretamente do céu, sem fun-
dadores humanos em destaque, poderia pertencer tanto a todas as
igrejas como a todas as tradições cristãs. Uma importante consequ-
ência da unidade espiritual do movimento é que ele não pertence
mais intensamente a uma tradição eclesiástica do que a outra. Isto
significa que não há um movimento separado da renovação cató-
lica, um da renovação episcopal e outro da luterana... Há somente
um mover. Devemos tomar muito cuidado para lembrar que não
estamos falando sobre um mover separado da nossa própria igreja,
mas, sim, do segmento de um mover ecumênico do Espírito Santo
encontrado na nossa própria tradição.

Com o batismo no Espírito Santo, passamos a ter a experiência


de que o que nos une é maior do que o que nos divide. E o que
nos une? De maneira geral, observa-se que os batizados no Espírito
costumam apresentar um novo nível de encontro com Jesus. Essas
pessoas experimentam as palavras de verdade do Senhor sobre o
Espírito Santo: “Ele receberá do que é meu e vo-lo anunciará” (João
14.16). As pessoas experimentam e têm revelação da realidade
do Senhor Jesus de uma maneira viva. Têm revelação do amor
divino e de sua misericórdia. Testemunhas declaram ter visões
ou revelação da cruz de Cristo. É assim que o amor infinito do
Salvador é conhecido, nem tanto por se sentirem bem ou mal,
mas pelo próprio Senhor revelar o amor do seu coração que o
levou ao Calvário.
6 HOCKEN, Peter. One Lord, One Spirit, One Body – Ecumenical Grace of The
Charismatic Movement. The Word Among Us Press, Gaithersburg, Maryland, USA
e The Paternoster Press, Exceter, Devon, Great Britain,1987.

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Prefácio 19

Outro elemento é o novo conhecimento do senhorio de Jesus.


O tema mais comum em reuniões de pentecostais e carismáticos
é o de que “Jesus é o Senhor”. Os cristãos batizados no Espírito
Santo conhecem a fundo a verdade que Paulo escreveu aos corín-
tios: “Ninguém pode dizer que Jesus é o Senhor a não ser pelo Espírito
Santo” (1 Coríntios 12.3). Somente a iluminação interior da mente
do Espírito Santo pode trazer a certeza de que Jesus Cristo, o Filho
do Homem, o Filho de Deus, é verdadeiramente o Senhor que
exerce toda a autoridade no Céu e na Terra, entronizado à destra
da majestade e glória de Deus.
Aqui está nossa unidade: Jesus Cristo, um só Senhor! Quem nos
dá essa revelação é o Espírito Santo, um só Espírito que batiza
num só Corpo do qual Cristo é a Cabeça, a imagem do Deus
invisível, o Primogênito de toda a criação. Nele, foram criadas
todas as coisas; tudo foi criado por ele e para ele. Nele, todas as
coisas subsistem, ele tem toda a preeminência, nele habita toda a
plenitude da divindade.
Este é a imagem do Deus invisível, o primogênito de toda a criação;
pois, nele, foram criadas todas as coisas, nos céus e sobre a terra, as
visíveis e as invisíveis, sejam tronos, sejam soberanias, quer principa-
dos, quer potestades. Tudo foi criado por meio dele e para ele. Ele é
antes de todas as coisas. Nele, tudo subsiste. Ele é a cabeça do corpo,
da igreja. Ele é o princípio, o primogênito de entre os mortos, para
em todas as coisas ter a primazia, porque aprouve a Deus que, nele,
residisse toda a plenitude e que, havendo feito a paz pelo sangue da
sua cruz, por meio dele, reconciliasse consigo mesmo todas as coisas,
quer sobre a terra, quer nos céus (Colossenses 1.15-20).

Nele, nós somos UM! Aqui está nossa unidade! Aqui está a
Noiva de Cristo que, juntamente com o Espírito Santo, diz: “Ora
vem, Senhor Jesus!” (Apocalipse 22.20).

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Capítulo 1
DIVISÃO NA IGREJA,
O MAIS NEFASTO DOS PECADOS

N
o início de 2015, enquanto escrevo este capí-
tulo, vejo a notícia do massacre de pessoas do
jornal Charlie Hebdo, em Paris, França, por
dois jovens radicais islâmicos. Simultaneamente, tomo
conhecimento de um ataque a um mercado judeu por
outro extremista, deixando quatro reféns mortos, tota-
lizando 17 mortos nessa operação.
Em seguida, houve uma passeata de 3,5 milhões de
pessoas contra a violência e o radicalismo religioso. Líde-
res governamentais foram até Paris prestar solidariedade
aos franceses e anunciar um rigor maior no controle de
entrada e saída de suspeitos de extremismo religioso.
Roberto Da Matta7, em seu artigo Sou Charlie e
antropólogo8, comenta sobre a origem do radicalismo
religioso:
7 Roberto Augusto Da Matta é um antropólogo, conferencista, consultor, colunista
de jornal e produtor brasileiro de TV.
8 Jornal O Estado de São Paulo de 14/01/2015.

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22 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

Vejam a ironia, a era das grandes descobertas marítimas – os sé-


culos 15 e 16 –, com as consequentes catequeses e destruição das
civilizações e culturas do chamado ‘mundo novo’, coincide signifi-
cativamente com as ‘guerras religiosas’ na Europa, as quais – por seu
turno –, freudianamente, repetem as ‘guerras santas’ e ‘jihads’ entre
cruzados e infiéis islâmicos, iniciadas no final do ano mil. Seria um
exagero dizer que a noite do “massacre de São Bartolomeu” – 24
de agosto de 1572 – quando foram mortos 2.000 protestantes na
contagem católica; e 70.000 na contagem protestante foi o evento
fundador do fundamentalismo ocidental? Dele, foram paridos outros
radicalismos...

É claro que toda violência está no coração do homem, mas é


muito triste ler um comentário em que se admite que a divisão
da Igreja cristã, a Noiva de Cristo, possa ser o grande precedente
de eventos tão abomináveis quanto os que presenciamos hoje.
Yuri Rodrigo de Camargo, do Projeto Restauração do Tabernáculo
de Davi9, comenta que, ao caminhar por uma rua em frente a uma
congregação, leu: “Igreja de Cristo: Fundada em Jerusalém no ano 33
depois de Cristo”. Quantas denominações encontramos com placas
informando o seu fundador, o ano, o local, etc.? Yuri ainda diz:
Encontramos aqui algo interessante. Cada uma destas igrejas teve
um fundador, e foi inaugurada em um certo dia. Mas, a Igreja de
Jesus Cristo não é uma só? Como pode ter sido fundada tantas
vezes e com nomes tão diferentes? Jesus não é o fundamento da
Igreja? Então, por que hoje muitas igrejas se fundamentam em suas
próprias doutrinas, dogmas, visões e heresias? Afinal de contas, o
corpo de Cristo é uma denominação ou cada denominação é um
corpo de Cristo? Dizer que cada denominação é um membro do
corpo de Jesus não é possível, pois as igrejas estão muito divididas

9 Site: http://tabernaculodedavid.sites.uol.com.br/igreja.htm.

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Divisão na Igreja, o mais nefasto dos pecados 23

para serem um só corpo, e todos nós sabemos que um corpo com


membros divididos não sobrevive. Eu creio de todo o coração que
o verdadeiro corpo de Cristo é a Igreja, mas a Igreja que não tem
denominação, a Igreja que tem como fundador Jesus Cristo e, como
data de fundação, o dia de pentecostes, onde, através de seus após-
tolos, o evangelho começou a ser anunciado, várias congregações
foram surgindo e dando forma à Igreja do Senhor.

“O cristianismo não falhou; ainda não foi tentado”10


Conheço casais cristãos que convivem (ou conviveram) muito
bem em unidade mesmo sendo originalmente de denominações
cristãs diferentes.
Em 2008, foi publicado o livro A Mãe de Muitos Filhos11 que
narra a biografia do casal Elza e Franco; ela católica romana e ele
presbiteriano. Nos anos 70, eles iniciaram estudos bíblicos com
jovens de Barueri – SP, causando uma revolução junto a uma ge-
ração rebelde que, a partir destes estudos, rendeu-se ao nome de
Jesus. Os dons do Espírito fluíam com muito poder e graça. Todos
eram batizados no Espírito Santo, e eram comuns as profecias e
experiências de cura interior. Muitas pessoas foram libertas do
poder demoníaco. O amor ao próximo também era uma marca
na vida desses jovens. Embora Elza e Franco tivessem sido convi-
dados a retirar-se de suas respectivas igrejas, eles não repudiaram
suas denominações, crendo que um dia seriam reconhecidos por
elas (o que de fato aconteceu tempos depois).
Mesmo em meio a tantas perseguições, a família espiritual do
casal não parou de crescer. Eles também se reuniam em casas, um

10 Título inspirado em Hermas no Topo do Mundo – leitura de um texto cristão do


século 2. São Paulo/SP: Edições Paulinas, 2002, p. 88, de autoria de Eduardo Hoornert.
11
BRONZATTO, Maurício. Mãe de Muitos Filhos. São Paulo/SP: Edições Encenso,
2007, pp. 271 e 272. Texto de autoria de Pedro Arruda que o autor incluiu como
apêndice.

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24 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

dos aspectos bastante destacados no livro. Por mais de 40 anos,


o casal demonstrou que a unidade do corpo é possível desde que
aponte todas as coisas para Cristo. Hoje são milhares de cristãos
filhos deste casal com o DNA da unidade.
Um dos filhos espirituais do casal foi Pedro Arruda12, que,
ainda jovem em sua conversão a Cristo, teve a vida transformada,
sendo, hoje, um dos líderes. Foi exatamente ele que fez o apêndice
ao livro que conta a vida do casal de origem católica e evangélica.
Transcrevemos abaixo parte deste apêndice intitulado O Cristia-
nismo não falhou; ele ainda não foi tentado.
Quando Jesus diz em João 13.34: “Novo mandamento vos dou:
que vos ameis uns aos outros; assim como eu vos amei, que também vos
ameis uns aos outros”, entendemos ser este mandamento o resumo
de toda a vida cristã. Na verdade, este mandamento é antigo;
porém, ele é novo no sentido de ter como modelo e inspiração o
amor de Jesus.
No verso seguinte, Jesus mostra que a “marca” do cristão está
exatamente na visibilidade desse amor. Assim, todos saberão que
somos discípulos de Jesus: “Nisto todos conhecerão que são meus
discípulos, se vos amardes uns aos outros” (v. 35). Pela divisão da
Igreja que vivemos hoje, pelo antagonismo entre as denominações
cristãs, pela não manifestação de amor entre cristãos de denomina-
ções diferentes, podemos concluir, sem nenhum esforço, que não
praticamos este novo mandamento e, consequentemente, somos
conhecidos como uma “Igreja” desunida, motivo de escândalo
para os não cristãos. Diz Pedro Arruda13:
O que Cristo propôs como forma de vida não guarda muita relação

12 Pedro Arruda faz parte de uma comunhão de grupos espalhados pelo Brasil, do
conselho editorial da Revista Impacto e do Encristus. É professor no Curso de Prepa-
ração Profética, em Monte Mor-SP, e empresário na área de Educação para o Trânsito.
13
BRONZATTO, Maurício. Mãe de Muitos Filhos. Ibid.

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Divisão na Igreja, o mais nefasto dos pecados 25

com o que a sociedade cristã apresenta hoje. Embora a sociedade


manifeste certos aspectos originados no cristianismo legítimo vivido
pela Igreja, não podemos negar que a Igreja igualmente assimilou
muitos valores originados na sociedade e os acomodou em seu
interior. Assim como a sociedade cristã é fruto da influência da
Igreja, também é certo dizer que a Igreja, atual e na maior parte de
sua história, é influenciada pela sociedade. A Igreja é o sal que sal-
gou, mas que também perdeu muito de seu sabor. Conforme expôs
Leon Tolstoi, em o ‘Reino de Deus está entre nós’, há o equívoco
da legítima defesa que, de acordo com Mateus 5.39-42, não cabe ao
cristão, pois este jamais pode recorrer à violência, mesmo que seja
para se defender dela.

Um dos maiores erros da Igreja, embora pouco admitido, porque


os homens convivem muito bem com ele, é a divisão ou a falta
de unidade. Já assistimos muitas vezes a cristãos morrerem por
causa das mais diversas doutrinas. Em muitos casos, essa defesa
pela doutrina atropelou a unidade. Considerar a unidade significa
perda, pois ela implica aceitar aquilo que não está dentro de nós e,
consequentemente, qualquer concessão a ser feita resultará numa
redução da liberdade própria. Infelizmente a história da Igreja tem
sido também a história da divisão.

Martin Luther King, em sua luta contra a separação racista den-


tro da igreja americana, disse uma frase impactante: “Aprendemos
a voar como pássaros e a nadar como peixes, mas não aprendemos
a conviver como irmãos”. Realmente, se tivermos humildade, po-
deremos reconhecer que não mudamos nada em relação à época
em que essa frase foi declarada; muito pelo contrário, pioramos.
De acordo com Pedro Arruda, essa situação...
...intenta diretamente contra a oração de Jesus, registrada em João
17.21: "Para que todos sejam um, como eu e tu, ó Pai, somos UM

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26 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

para que o mundo creia. Se dar realidade à oração feita de acordo com
a vontade de Deus é uma ação do Espírito Santo, podemos concluir
que impedir a sua concretização é uma ação de Satanás, conforme
podemos observar em Daniel 10. Assim, cada vez que agimos
impedindo que a unidade dos cristãos pedida por Jesus se realize,
estamos a serviço de Satanás. Isto é forte, mas é verdade. Quando
Pedro foi repreendido por Jesus, ao tentar demovê-lo da intenção de
morrer na cruz, ficou claro que ele estava cogitando das coisas dos
homens a serviço de Satanás. Esta situação é muito exemplificada
na questão da unidade: são intenções humanas – às vezes boas – a
serviço de Satanás. Creio que Pedro não tinha consciência desta
gravidade, como também não a tem a maioria dos cristãos. Mesmo
quem admite falhar com a unidade pensa tratar-se de uma deficiência
humana, apenas uma carnalidade sem grande importância.

Doutrina, o grande problema?


Segundo Kris Vallotton, em seu livro Chuva Abundante14, há
uma diferença entre denominação e denominacionalismo. No
denominacionalismo, os cristãos se unem ao redor da doutrina e
se dividem quando discordam: “O ismo”, segundo ele, denota uma
ideologia, como no comunismo, no socialismo ou no humanismo.
Essas ideologias estão edificadas sobre distorções da verdade. São
mentiras patrocinadas por um plano diabólico. Ele está pessoal-
mente convencido de que “o ismo” do denominacionalismo é um
espírito maligno. Trataremos desse assunto mais detalhadamente
no capítulo 4 deste livro.
Paul E. Billheimer, em seu livro O Amor Cobre Tudo15, expõe
que de nada adianta acertar na doutrina e errar no espírito. A

14 VALLOTTON, Kris. Chuva Abundante – Como podemos transformar o mundo


que nos cerca. São Paulo/SP: Editora Vida, 2013.
15
BILLHEIMER, Paul E. O Amor Cobre Tudo: O padrão bíblico para a unidade no
corpo de Cristo. São Paulo/SP: Editora Vida, 1989.

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Divisão na Igreja, o mais nefasto dos pecados 27

inerrância bíblica não é mais importante do que o espírito corre-


to. Segundo ele, o pecado contra a unidade é o mais nefasto dos
pecados para a Igreja.
Quando a doutrina se torna mais forte do que o relacionamen-
to, do que a importância da “família cristã”, passamos a dividir as
nações em vez de atender nosso chamado de discipulá-las e uni-las.
Ainda nesse quadro, Pedro Arruda diz16:
Unidade não é um ecumenismo, resultado duma convenção política
entre as instituições, baseado no que um pode fazer pelo outro, mas
sim, como se referiu Dietrich Bonhoeffer, "no que Cristo fez por
ambos". Para usar a expressão de Watchman Nee, o "cristianismo
organizado" tornou-se uma máquina de produzir divisão em série,
numa velocidade cada vez maior. Parece que cada denominação traz
em si o gene da divisão, transmitido de geração em geração. O mun-
do cristão, a princípio, se dividiu entre romanos e orientais, depois
entre católicos e protestantes, entre pentecostais e conservadores,
carismáticos e tradicionais, e assim por diante. Se há algo bom nisso,
é o fato de que quanto mais proliferam as denominações, mais elas
perdem a importância – bebem do próprio veneno.

Não podemos nos conformar como que impossibilitados de fazer


algo, como que se isso fosse um destino inexorável e a oração de
Jesus ficasse sem resposta, ou adiada, para se cumprir somente após
a morte do último cristão. Ora, o fato é que Jesus tem apenas um
Corpo, irá ter apenas uma Noiva e apenas uma Esposa (Apocalipse
21.2). Jesus não é polígamo, muito embora seja esse conceito que se
passa quando cada um prepara apenas a sua noiva particular.

Paulo, citando o relacionamento entre Jesus e sua Noiva, a


Igreja, afirma:

16 BRONZATTO, Maurício. Mãe de Muitos Filhos. Ibid.

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28 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

...como também Cristo amou a igreja e a si mesmo se entregou por


ela, para que a santificasse, tendo-a purificado por meio da lavagem
de água pela palavra, para a apresentar a si mesmo igreja gloriosa,
sem mácula, nem ruga, nem coisa semelhante, porém santa e sem
defeito (Efésios 5.25-27).

Ainda, segundo Pedro Arruda:


Precisamos reconhecer o erro e admiti-lo. Não encobrir com expli-
cações, por mais teológicas que sejam, aprendendo com a história
para não repetir os caminhos errados. Estas coisas precisam ser
iniciativas do coração de cada um.

Uma das razões que desencadeou o processo de sucessivas divisões


foi a mudança de foco do cristianismo. A princípio, a Igreja apenas
reunia aqueles que tinham em comum o serviço ao Senhor Jesus
Cristo. O importante era o Reino de Deus; a salvação e outros
benefícios eram consequências deste engajamento. Com o passar
do tempo, especialmente depois de cessadas as perseguições, a re-
lação entre custo e benefício alterou-se drasticamente em favor dos
benefícios, especialmente os materiais. Nos dias de hoje, boa parte
das pessoas são motivadas a participar das igrejas pelos benefícios
pessoais que podem obter; primeiramente os materiais seguidos
dos espirituais e, somente depois, consideram-se quais seriam os
possíveis interesses de Deus, os quais certamente poucos entendem
e aos quais dão mínima atenção. Portanto, é necessário restabelecer
que a Igreja interessa a Deus e está para atender aos propósitos dele.
Os benefícios obtidos por servir a Deus, inclusive a salvação, são
apenas consequências.

Marcial Maçaneiro, falando a respeito das diferenças dentro


do Corpo de Cristo, diz17:
17 Anais do Encristus 2014. Ele pôs em nossos lábios a palavra de reconciliação.
Cachoeira Paulista/SP, Canção Nova, 14-16 de março de 2014, pp. 47, 49

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Divisão na Igreja, o mais nefasto dos pecados 29

Ter diferenças no corpo de Cristo – vários carismas mas um só Es-


pírito – não é problema. A Trindade é uma só e suas várias pessoas
têm suas propriedades; é uma grande comunhão. As diferenças na
reconciliação do corpo de Cristo apenas o enriquecem. Muitos ca-
rismas mas um só Espírito, muitos ministérios mas um só Senhor,
muitos dons mas um só Deus, um mesmo tronco e muitos ramos.
Isto nunca foi e nem é o problema. O problema é que a divisão se
torna um pecado quando começamos a fazer doutrinas, a pregar
e a buscar o Senhor como se Cristo estivesse dividido. Isso criou
uma história de feridas entre nós, feridas marcantes que estão hoje
atrapalhando as nossas famílias e o nosso testemunho.

No Espírito Santo o Pai é UM com o Filho e este é UM com o


Pai. O Espírito Santo consegue fazer com que as pessoas se amem e
estejam em unidade sem que uma absorva ou cancele a outra. Jesus
quer dizer nesse texto: A unidade e a comunhão entre vocês não é
um problema histórico ou doutrinal, mas é uma questão de santidade,
é questão de acolher um dom. É preciso primeiramente crer que a
unidade é possível para depois receber a graça".

Às vezes não nos conhecemos e falamos mal uns dos outros, não
oramos juntos e colocamos à nossa frente doutrinas que nos separam.
Mas hoje estamos aqui orando juntos, pedindo perdão pelas nossas
divisões, e isso tem sido um tema doutrinal.

Normalmente, cada pessoa que trabalha em favor da unidade


foi motivada por alguma decepção com a igreja dividida. Dom
Francesco Biasin18, na época um padre recém-ordenado, conta
sua história:19

18 Dom Francesco Biasin é bispo católico nascido na Itália e radicado no Brasil. É o


bispo diocesano de Barra do Piraí-Volta Redonda. Em 27/10/2012, o Papa Bento XVI
o nomeou membro do Pontifício Conselho para o Diálogo Inter-Religioso do Vaticano.
19
Anais do Encristus 2014. Ele pôs em nossos lábios a palavra de reconciliação. Ca-
choeira Paulista/SP, Canção Nova, 14-16 de março de 2014, pp. 69, 70.

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30 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

Em uma determinada tarde visitamos a basílica do santo sepulcro


e fui imediatamente atraído por aquele lugar onde, no chão, havia
um buraco onde teria sido fincada a cruz de Jesus. Coloquei-me
em adoração, prostrado, aproximadamente às três horas da tarde.
De repente escutei vários cultos, em várias línguas acontecendo ao
meu lado. Alguém me disse que eram várias igrejas que todos os
dias, naquela hora, cultuavam a Deus em memória da crucificação
de Jesus. Explicaram-me também que, por todos os séculos, aquela
basílica havia sido dividida de tal forma que havia poucos metros
para os ortodoxos bizantinos, outros poucos metros para os coptos,
outros para denominações orientais, etc.

Enquanto eu estava rezando e escutando aqueles cultos diferentes


dividindo o chão daquela basílica de tal forma que era impossível e
até proibido passar de um lugar para o outro, experimentei dentro
de mim uma dor muito grande pois lembrei-me da palavra que diz
que Jesus deu sua vida para reunir os filhos de Deus que estavam
dispersos ( João 11.52).

Parecia-me uma blasfêmia viva ver que naquele lugar os cristãos


não conseguiam nem sequer orar juntos na hora em que Cristo
entregou-se ao Pai por nós, pagando um caro preço para a nossa
salvação. Comecei a chorar convulsivamente e, de repente, brotou
dentro de mim essa oração: "Senhor, fazei-me instrumento de
reconciliação entre as tuas igrejas". Prometi então, naquele dia
e lugar, entregar minha vida para que Deus me usasse como um
simples instrumento para que a unidade pudesse acontecer.

É interessante como Deus prepara as pessoas. Eu nunca me expus


na igreja do Brasil; não é do meu feitio fazer "propaganda". Mas,
três anos atrás, na assembleia de bispos, fui eleito como o bispo
referencial para o ecumenismo e o diálogo inter-religioso. Senti
então dentro de mim que Deus tinha me preparado para ser,
antes do que o representante de uma instituição, de uma igreja,

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Divisão na Igreja, o mais nefasto dos pecados 31

uma pessoa tocada pelo Espírito Santo para trabalhar, orar e dar
a vida pela unidade.

Vemos que o que nos divide é, na grande maioria das vezes,


diferenças doutrinárias. Nesse sentido, Pedro Arruda ainda
afirma:20
Deus, ao criar o homem, não fez da unidade um acessório, mas
uma questão principal. Além de desfrutar da unidade com Deus,
também faz parte do plano de Deus que os homens desfrutem da
unidade entre si, daí Deus não ter criado dois seres nem mesmo dois
corpos, mas um só. "Se andarmos na luz como ele na luz está, temos
comunhão uns com os outros e o sangue de Jesus Cristo nos purifica
de todo o pecado (1 João 1.7). O pecado age diretamente contra
essa unidade, e fora da unidade com Deus não há vida, portanto há
morte. Lúcifer se separou de Deus, o homem também fez o mesmo,
estando sob condenação mortal.

Por outro lado, Deus insiste na restauração dessa unidade, em dar


vida novamente ao homem. Lutar pela unidade causa sofrimento,
e o próprio Deus não se poupou desse sofrimento. Quão difícil foi
para Jesus aprender humanamente a obediência pelo sofrimento e,
através dele, se aperfeiçoar, para aperfeiçoar a outros (Hebreus 2.18;
5.8; 1 Pedro 2.21). Jesus sofreu os sofrimentos físicos que culminaram
na sua morte de cruz, sem um momento sequer desobedecer ao Pai.
Sofreu ainda as consequências de nossa morte no inferno, tudo por
causa de nossos pecados (Isaías 53.5-7). Também foi muito angus-
tiante ao Pai virar o rosto e abandonar o seu Filho à morte de cruz
(Marcos 15.34). Tudo para restituir-nos a unidade. Ele nos deu de
graça, tornando-se exemplo para seguirmos em favor da manutenção
da nossa comunhão com aqueles pelos quais pagou este alto preço.
A unidade entre os filhos alegra Deus, pois torna compensador o
sacrifício do seu Primogênito.
20 BRONZATTO, Maurício. Mãe de Muitos Filhos. Ibid.

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32 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

Foi nesse mesmo espírito que Moisés agiu ao deixar o palácio real
e preferir ser um hebreu como de fato o era (Hebreus 11.24-27).
Daniel assim também procedeu, pois, apesar de manter uma vida
íntegra diante de Deus, expressou-se em oração como um pecador
responsável pela deportação de seu povo (Daniel 9.3-19). Esdras
também se sentiu como um dos culpados pelos pecados que fizeram
abater a tragédia sobre os judeus (Esdras 9.3-15).

Muitos outros exemplos ainda existem de pessoas que se fizeram


como erradas em seu coração para se habilitar a estar entre os cul-
pados e Deus. O contraexemplo foi apresentado pelos escribas e
fariseus, quando Jesus expôs a arrogância deles ao se excluírem do
povo. Acusavam os pais de terem assassinado os profetas, fazendo-
-se melhores e afirmando que não procederiam da mesma forma,
ao mesmo tempo em que estavam dispostos a fazer pior com o
Filho de Deus. Hipocritamente atualizavam o pecado do povo e, ao
invés de buscar misericórdia de Deus, se apresentavam como bons
(Mateus 23.25-30).

Em certa ocasião, Moisés recebeu uma denúncia de que havia


pessoas profetizando no arraial, sem conhecimento dele (Números
11.27-29). Semelhantemente os zelosos discípulos de Jesus também
se adiantaram a proibir a expulsão de demônios por pessoas que não
os acompanhavam (Lucas 9.49,50). Os discípulos de João Batista
também se sentiram extorquidos quando souberam dos batismos
feitos pelos discípulos de Jesus, com o consentimento do próprio
Jesus ( João 3.26-30). As atitudes de Moisés e de João Batista fo-
ram iguais à de Jesus, pois estavam sendo conduzidos pelo espírito
de unidade. O ciúme é um dos grandes males causadores de divisão,
porque age no coração das pessoas. Ele faz oposição ao amor e está
presente nos denunciantes bem-intencionados em defender o líder
e o grupo ao qual pertencem, mas não é correspondido pelos seus
líderes – que respondem com base no amor. Infelizmente, esta visão
menor nos dias de hoje contaminou de tal forma que nem mesmo os

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Divisão na Igreja, o mais nefasto dos pecados 33

líderes conseguem ter a atitude de Moisés, João Batista ou de Jesus.

Em Efésios 4.3, vemos que, preservando a unidade do Espírito que


nos foi dada, devemos prosseguir em busca da unidade da fé. Temos,
entretanto, assistido a uma caminhada em que os homens estão des-
truindo a unidade do Espírito, admitindo mais de um Senhor, mais
de uma fé, mais de um batismo, mais de um corpo (Efésios 4.4-6).

John Stott foi um dos grandes teólogos do século 20, um líder


cristão inglês, anglicano, que se notabilizou por muitos livros
cristãos que se tornaram best-sellers e por liderar um movimento
mundial de evangelismo. Diante de muitos ensinos que dele
recebemos, ressalto o seguinte:21
Algumas de nossas divisões não são apenas desnecessárias, mas
também uma ofensa a Deus e um empecilho para a propagação do
evangelho. Acredito que a unidade visível da igreja é biblicamente
correta e desejável na prática, e que devemos buscá-la efetivamente.
Ao mesmo tempo precisamos nos fazer uma pergunta simples, mas
inquisitiva: Se quisermos enfrentar aqueles que se opõem a Cristo
com frente cristã unida, que tipo de cristianismo vamos promover? A
única arma que pode derrotar os inimigos do evangelho é o próprio
evangelho. Seria uma tragédia se tivéssemos que abandonar a única
arma eficaz do nosso arsenal. Um cristianismo unido que não seja
verdadeiro não ganhará a vitória sobre as forças anticristãs.

Como Jesus Cristo nos deu a arma da unidade


O que precisamos fazer se estivermos convictos de que a divisão
é o grande pecado da Igreja, que é um empecilho para a pro-
pagação do Evangelho, que nos enfraquece na “luta” contra os
anticristãos, que depõe contra o Novo Mandamento que Jesus
nos ordenou (João 13.34), que é uma ação de Satanás, que a

21 STOTT, John. As Controvérsias de Jesus. Viçosa/MG: Editora Ultimato, 2015.

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34 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

defesa obsessiva da carga doutrinária que recebemos da nossa


denominação nos leva a mais divisões ainda, que Cristo não está
dividido, mas nós estamos, que não estamos sendo parceiros
de Jesus em sua oração pela unidade em João 17? Sem dúvida,
arrepender-nos.
A divisão é pecado. Mesmo que não participemos dela,
somos frutos dela. Assim, “se confessarmos os nossos pecados, ele
é fiel e justo para nos perdoar os pecados, e nos purificar de toda a
injustiça” (1 João 1.9).
É interessante que esse ensino de “confessar os nossos pecados”
venha logo após o mandamento de ter comunhão com os irmãos:
“Se, porém, andarmos na luz, como ele está na luz, mantemos comu-
nhão uns com os outros, e o sangue de Jesus, seu Filho, nos purifica
de todo pecado. Se dissermos que não temos pecado nenhum, a nós
mesmos nos enganamos, e a verdade não está em nós” (1 João 1.7,8).
Li uma vez que há duas coisas impossíveis de se fazer sozinho:
“casar e ser cristão”. Nós só somos cristãos com irmãos. Nós só
somos cristãos vivendo no Corpo. Viver no Corpo é ter comunhão
uns com os outros. Jamê Nobre diz:22
No meio pentecostal muitos dizem: ‘O sangue de Jesus tem poder!’.
Mas, onde está esse sangue? Um amigo meu dizia uma frase muito
enigmática: O sangue de Jesus tem poder e não tem! O sangue de
Jesus tem poder se andarmos na luz, pois "Se, andarmos na luz,
como ele está na luz, mantemos comunhão uns com os outros, e o
sangue de Jesus, seu Filho, nos purifica de todo pecado" (1 João 1.7).
Então, o poder do sangue de Jesus está na comunhão dos santos e é
na convivência com os irmãos que este sangue vai nos purificando
diariamente de todo pecado.

22 Mensagem ministrada na Unidade Missionária Cristã – UMC. Discernindo a


Ceia do Senhor. Jundiaí/SP, 05/07/2015.

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Divisão na Igreja, o mais nefasto dos pecados 35

Essa comunhão não se dá meramente no nosso “curral”


denominacional, mas no Corpo de Cristo. Isso é “discernir o
Corpo de Cristo” (1 Coríntios 11.28-30). É reconhecer que
tenho irmãos espalhados no globo terrestre, de denominações
e doutrinas diferentes, mas que são do Corpo.
Paulo (1 Coríntios 11.28-30) nos desafia a examinar se
é assim que procedemos, para, depois, participar da ceia
(comunhão). Com arrependimento e confissão do pecado
da divisão, certamente o sangue de Jesus será poderoso na
nossa vida e no Corpo.

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Capítulo 2
AS RIQUEZAS NA DIVERSIDADE
DOS EVANGELHOS

D
eus poderia ter estabelecido um único escritor
para englobar os quatro evangelhos, dando início,
assim, ao Novo Testamento (NT). Foi assim que
ele fez com o Antigo Testamento (AT), usando Moisés
para escrever o Pentateuco (ou Torá, nome que se dá aos
cinco primeiros livros do AT: Gênesis, Êxodo, Levítico,
Números e Deuteronômio). Se assim o fizesse com os
evangelhos, teríamos uma descrição uniforme das “boas
notícias” da salvação e vida eterna, desde o nascimento,
curas e milagres e ensinos até a morte, ressurreição e
ascensão de Jesus Cristo.

Deus gosta da diversidade


A uniformidade não é prioridade nos evangelhos e, conse-
quentemente, no Novo Testamento. Num período de mais ou
menos 50 anos, os 27 livros que compõem o NT foram escritos
por oito ou nove autores23 que se complementam.
23 A única dúvida é sobre a autoria da epístola aos Hebreus.

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38 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

Os evangelhos nem sempre concordam nos detalhes a respei-


to do que Jesus fez e ensinou. É bem verdade que temos os três
primeiros livros (Mateus, Marcos e Lucas) com o mesmo ponto
de vista, conhecidos como sinóticos. Porém, mesmo assim, há
diferenças entre eles.
O evangelho de João, por outro lado, difere bastante dos sinóti-
cos. Segundo a Bíblia de Estudo NTLH24, partindo do pressuposto
de que todo o material que se encontra nos quatro evangelhos seja
representado pelo número 100 (100%), a tabela abaixo mostra
como os quatro concordam e divergem um dos outros. A coluna A
traz a porcentagem do material de um evangelho que se encontra
também em outros evangelhos. A coluna B dá a porcentagem do
material de cada evangelho que não se encontra em nenhum dos
outros evangelhos.
A B
Marcos 93 07
Mateus 58 42
Lucas 41 59
João 08 92

Dessa forma, o evangelho de João possui 92% de conteúdo


que não consta nos outros evangelhos, e Lucas, 59%. Ainda que
o Espírito Santo não tenha exigido a uniformidade para os livros
inspirados por ele (exatamente porque ele é o Autor supremo
destes livros), observamos que a diversidade dos evangelhos não
se contradiz, mas é plenamente reconciliável.
Parece que Deus gosta da diversidade. Ganhamos muito
com a diversidade. A riqueza de informações de cada um dos
evangelhos (e dos outros livros do NT), na particularidade

24 Bíblia de Estudo Nova Tradução na Linguagem de Hoje. São Paulo/SP, Sociedade


Bíblica do Brasil, 2005.

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As riquezas na diversidade dos evangelhos 39

de cada autor, proporciona um requinte extraordinário na


compreensão e revelação da Palavra de Deus.
O importante para nós é que, como dissemos, todos os livros
neotestamentários (assim como toda a Bíblia) são inspirados pelo
Espírito Santo (um só Espírito), convergindo para um só Senhor,
uma só Cabeça (Jesus Cristo), visando a formar a família de Deus
(um só Corpo).

Sobre a missão de Jesus


O livro de Mateus, logo no início, descreve o propósito da vinda
de Jesus. No sonho de José, o anjo diz (sobre Maria): “E dará à
luz a um filho e chamarás o seu nome Jesus, porque ele salvará o seu
povo dos seus pecados” (1.21). Também Lucas 1.31, Marcos 14.62,
João 1.29, para citar um verso de cada evangelho, afirmam que
ele é o Salvador do mundo. Os quatro evangelhos, portanto, são
unânimes em afirmar categoricamente que Jesus se manifestou
em carne para ser o Salvador da humanidade.
Porém, João, em seu evangelho, complementa os sinóticos
dizendo que Jesus deveria morrer “não somente pela nação, mas
também para reunir em um corpo os filhos de Deus que andavam
dispersos” (11.52). No capítulo 10, João revela que Jesus estava
pronto para morrer por outras ovelhas, e que haveria “um só re-
banho com um só pastor” (10.11-16).
Isaías, quando profetiza a aparição, as dores e a glória do
Messias (700 anos antes de Jesus se manifestar como homem),
descreve: “Todos nós andávamos desgarrados como ovelhas; cada
um se desviava pelo caminho, mas o Senhor fez cair sobre ele a
iniquidade de nós todos” (53.6). Ele profetiza que Jesus morreria
pelas nossas transgressões e iniquidades e para nos unir num
só rebanho mediante sua morte na cruz (53.10-12). O que
fica claro nessas passagens é que a morte de Cristo nos lava

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40 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

de todo pecado, nos purifica e nos une. Pedagogicamente, é


como se fosse um propósito duplo. Não somos salvos para
viver separados, divididos.
A riqueza da diversidade do evangelho de João com os sinóticos
está plenamente reconciliada por Paulo. Entre outras passagens,
ele mostra, em Efésios 2, que somos (1) salvos pela graça de Deus
por meio da fé e que (2) Cristo, pela sua morte na cruz, destruiu
a inimizade que havia entre os dois povos (judeus e gentios),
unindo-os em um só corpo, nos dando a paz e nos levando de
volta para Deus (Efésios 2.13-19).
Ainda que as doutrinas cristãs possam ser expressões lícitas
de cada denominação cristã, é a união íntima e permanente
com Cristo e o amor entre os irmãos que têm Cristo que nos
caracterizam como membros do Corpo, como Família de Deus.

Sobre o evangelismo
Todos os três evangelhos sinóticos concluem seu relato com
a grande comissão que Jesus deu aos onze discípulos de ir
a todos os povos do mundo. O objetivo é que as pessoas se
tornem seguidoras de Jesus, ensinadas e batizadas a fim de ser
incluídas no Corpo (Mateus 28.18-20, Marcos 16.14-18 e
Lucas 24.36-49).
Da mesma forma que os sinóticos narram essa grande tarefa,
João também narra como Jesus apareceu depois da ressurreição e
disse: “Assim como o Pai me enviou, eu também envio vocês. Depois
soprou o Espírito Santo sobre eles e disse: recebam o Espírito Santo.
Se vocês perdoarem o pecado de alguém, esses pecados são perdoados;
mas se não perdoarem, eles não são perdoados” (20.21-23).
Todos nós, sem dúvida, somos enviados depois de receber
o Espírito Santo. Todavia, o que João acrescenta, além disso, é

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As riquezas na diversidade dos evangelhos 41

que somos também evangelistas quando buscamos a unidade do


Corpo. Ou seja, nossa comissão também inclui essa tarefa.
No capítulo 17, em que Jesus ora em favor dos seus seguidores
(oração sacerdotal), ele pede a Deus que seus discípulos sejam
enviados ao mundo para que as pessoas creiam. Porém, sabendo
que haveria uma condição para o mundo crer que Jesus foi en-
viado por Deus para salvar a humanidade, ele orou também para
que fôssemos UM entre nós e unidos com ele e o Pai (17.20-26).
No segundo capítulo de Atos, vemos muitas conversões e
batizados depois da mensagem de Pedro. A igreja nasceu unida
(v. 44), e essa unidade atraía a simpatia e caía na graça do povo.
Assim, o Senhor acrescentava a cada dia os salvos (v. 47).
Esta situação se repete no capítulo 5, em que se afirma que a
igreja costumava “reunir-se de comum acordo [estava unida] e o povo
lhes tributava grande admiração, grande estima e, por isso, crescia
mais e mais a multidão de crentes, tantos homens como mulheres,
agregados ao Senhor” (5.12-16). Em Atos 4.32, a igreja é descrita
como “uma só alma e um só coração”. A unidade era o ponto forte
da Igreja Primitiva e, assim, a igreja crescia (Deus acrescentava a
cada dia novos cristãos).25
Atualmente, observamos um esforço muito grande das igrejas
cristãs no evangelismo e em missões. Porém, o número propor-
cional dos cristãos em relação à população mundial está caindo.
A proporção de cristãos no mundo diminuiu nos últimos cem
anos. A conclusão é de um estudo global realizado pelo instituto
Pew Research Center (anteriormente citado).
Em números relativos, segundo a pesquisa, como já vimos
no prefácio, os seguidores do cristianismo, que eram de 35% em

25 Embora a Igreja Primitiva também tenha passado por divisões, como podemos ver
nas epístolas aos Coríntios.

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42 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

1910, caíram para 32% em 2010. Em 2014, calculam-se 2,1


bilhões de cristãos (nominais) para uma população de mais de 7
bilhões. Isso significa que o percentual caiu ainda mais para apenas
30%. Por outro lado, temos em torno de 5 bilhões de pessoas no
mundo que não são cristãs.
Por que estamos perdendo terreno e contemplando mais de
dois terços do mundo sem Cristo? Certamente, a falta de uni-
dade na Igreja cristã, a divisão em larga escala, tem cooperado
grandemente para “assustar” os não cristãos. Normalmente, o
evangelismo atual busca frutos para a própria denominação. O
particularismo de cada denominação vai contra a proposta de
evangelismo pela qual Jesus ora em João 17.21-23. O poder da
evangelização se encontra diminuído consideravelmente pelo fato
da desunião entre os que anunciam o Evangelho. Ultrapassamos,
como já dissemos, 33 mil denominações cristãs no mundo que
não se entendem.
Jesus diz que o evangelismo não se caracteriza somente pelo fato
de declararmos que somos dele, mas também que ele foi enviado
pelo Pai. E isso só terá credibilidade pelo testemunho da unidade.
Que bom que os diversos evangelhos nos levam a entender melhor
o propósito de Deus.
Harmonizar o evangelismo com a unidade da Igreja é funda-
mental. Hargrave26 diz:
A grande comissão que Jesus deu à Igreja é ir e fazer discípulos (Ma-
teus 28.19). Ele disse: “sejam minhas testemunhas em toda a terra”
(Atos 1.8). Mas o que significa testemunhar o Senhor? Significa
isto: “Eu oro para que eles sejam um, Pai, como nós Somos UM,
para que o mundo creia”. O muito que os cristãos têm falado sobre
Jesus, o mundo inteiro nunca creu e nunca crerá até que a Igreja se
26 HARGRAVE, Gary. Is Christ Divided? North Hollywood, CA, USA: Living Word
Publications, 2014, pg. 48.

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As riquezas na diversidade dos evangelhos 43

torne uma testemunha para toda a Terra. É tempo para que o grande
testemunho do Senhor Jesus Cristo venha à Terra, e de acordo com
João 17.21, este testemunho é a unidade do Corpo de Cristo.

A declaração de Gary Hargrave ajuda-nos a conciliar a ênfase


do evangelismo nos sinóticos com o evangelismo em João.

Sobre os sinais e maravilhas


Os três primeiros evangelhos mostram Jesus operando mi-
lagres, sinais e maravilhas, e, principalmente, expulsando
demônios (demonstrando que os poderes do mal estão der-
rotados, e que o domínio de Satanás está chegando ao fim).
João não usa parábolas (como os outros evangelhos sinó-
ticos) para os ensinos de Jesus, mas trabalha com diálogos
preciosos e discursos do Senhor. Em nenhum capítulo do
evangelho de João, fala-se de Jesus expulsando demônios.
Porém, João narra milagres e curas não simplesmente para
contar o que aconteceu (como observamos, em sua maioria,
nos sinóticos), e sim para levar as pessoas a crer nele. Os
milagres não eram um espetáculo a ser visto e admirado,
mas um sinal que aponta para Jesus e para quem, de fato,
ele é.
O primeiro sinal foi no capítulo 2, nas bodas de Caná:
“...e os seus discípulos creram nele” (2.11). O segundo milagre
foi em 4.43-54, passagem na qual Jesus cura o filho de um
funcionário público: “...então ele e toda sua família creram
em Jesus” (4.54). No capítulo seguinte de João, Jesus cura
um paralítico (5.1-18): “...e o homem curado foi contar aos
líderes judeus quem o havia curado era Jesus” (5.19). Em João
6.15, Jesus alimenta uma multidão multiplicando os pães,
sendo que o verso 14 relata que os que viram esse milagre
disseram: “...de fato, este é o profeta que devia vir ao mundo”.

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44 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

Neste mesmo capítulo (6.16-21), Jesus anda sobre as águas.


Mateus 14.33 narra que os discípulos adoraram Jesus di-
zendo: “...de fato, o Senhor é o Filho de Deus”.
No capítulo 9 de João, Jesus cura um homem cego de
nascença, sendo que, nos versos 35 a 37, Jesus se identifica e,
no verso 38, o ex-cego declara: “Eu creio Senhor! E se ajoelhou
diante dele”. No capítulo 11, Jesus ressuscita Lázaro (o maior
de todos os sinais), sendo que, depois de agradecer a Deus,
ora ao Pai no verso 42: “Eu sei que sempre me ouves, mas eu
estou dizendo isto por causa de toda essa gente que está aqui,
para que eles creiam que tu me enviaste”. No verso 45, diz:
“Muitas pessoas que tinham ido visitar Maria viram o que Jesus
tinha feito e creram nele”. Sobre esse assunto, João descreve em
20.30-31: “Jesus fez diante dos discípulos muitos outros milagres
que não estão escritos neste livro. Mas estes foram escritos para
que vocês creiam que Jesus é o Messias, o Filho de Deus. E para
que, crendo, tenham a vida eterna”.
Outras confirmações no livro de João mostram que os
milagres têm a finalidade de levar as pessoas a crer que Jesus
é o enviado do Pai. Nicodemos diz em 3.2: “Rabi, nós sabemos
que o Senhor é um mestre que Deus enviou, pois ninguém pode
fazer esses milagres se Deus não estiver com ele”. Isso também
ocorre em João 7.31.
Do capítulo 13 até o capítulo 17 de João, Jesus passa o
tempo todo com os discípulos. Na quinta-feira à noite (vés-
pera de sua morte), Jesus faz um discurso de despedida. Neste
discurso, no capítulo 14, Jesus afirma que ele e o Pai são UM
(um está no outro) e, se não conseguissem crer somente com
base nessas palavras, que cressem pelas obras que ele fazia (9-
11). Em seguida (12), Jesus diz: “Eu afirmo a vocês que isto é
verdade: quem crê em mim fará as coisas que eu faço [sinais] e

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As riquezas na diversidade dos evangelhos 45

até maiores do que estas, pois eu vou para meu Pai”. Jesus, ao
voltar para o Pai, daria aos seus discípulos o poder do Espírito
Santo (formando a Igreja, o seu Corpo). Assim, eles poderiam
fazer obras maiores do que o Senhor fez.
Ora, quando Jesus fala sobre a Igreja fazer coisas maiores
do que as que ele fez, está se referindo aos sinais que levam
as pessoas a crer que ele foi enviado pelo Pai. Essa é a lógica
dos sinais na visão de João. Agora, o corpo literal de Jesus
não está mais na terra, mas o seu corpo espiritual (a Igreja)
faria milagres ainda maiores. Mas que milagres poderiam
ser estes? O milagre de levar o mundo a crer que Jesus é o
enviado do Pai para salvar a humanidade! Não serão mais
grupos pequenos como aconteceu durante seu ministério,
mas muitos cristãos num universo de 5 bilhões de pessoas
que ainda não creem. Esse é o grande milagre que a Igreja
de Cristo pode realizar!
Assim, Jesus termina seu discurso de despedida em João
17.20-26, no qual, por diversas vezes, nos orienta a sermos
um com ele e o Pai, em perfeita unidade entre nós, para que
o mundo creia que ele foi enviado:
Não rogo somente por estes, mas também por aqueles que vierem
a crer em mim, por intermédio da sua palavra; a fim de que todos
sejam um; e como és tu, ó Pai, em mim e eu em ti, também sejam
eles em nós; para que o mundo creia que tu me enviaste. Eu lhes
tenho transmitido a glória que me tens dado, para que sejam um,
como nós o somos; eu neles, e tu em mim, a fim de que sejam aper-
feiçoados na unidade, para que o mundo conheça que tu me enviaste
e os amaste, como também amaste a mim. Pai, a minha vontade é
que onde eu estou, estejam também comigo os que me deste, para
que vejam a minha glória que me conferiste, porque me amaste
antes da fundação do mundo. Pai justo, o mundo não te conheceu;

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46 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

eu, porém, te conheci, e também estes compreenderam que tu me


enviaste. Eu lhes fiz conhecer o teu nome e ainda o farei conhecer,
a fim de que o amor com que me amaste esteja neles, e eu neles
esteja (grifos nossos).

Em João 17.11, Jesus ora também para que não haja divisão
entre os discípulos:
Já não estou no mundo, mas eles continuam no mundo, ao passo
que eu vou para junto de ti. Pai santo, guarda-os em teu nome, que
me deste, para que eles sejam um, assim como nós.

Este milagre é o de gerar Cristo para o mundo. O primeiro


passo é dizer a Deus: “Eu sou servo de Deus, faça-se em mim a tua
vontade” (Lucas 1.38); “Que a tua vontade seja feita aqui na terra
[na vida da igreja, no corpo] como é feita no céu” (Mateus 6.10);
“Não seja feito o que eu quero, mas o que tu queres” (Lucas 22.41b);
“Que seja feita a vontade do Senhor” (Atos 21.14b). A estratégia
da unidade não é nossa, mas de Deus. Porém, precisamos estar
disponíveis, abertos, sensíveis, dispostos a perder (tomar a cruz)
para que a oração de Jesus se concretize, e realmente sejamos um
só Espírito, um só Corpo num só Senhor.

Sobre o Espírito Santo


O Espírito Santo recebe um destaque especial no evangelho
de João.
Segundo a NTLH27, como nos outros evangelhos, o Espírito
desce e permanece em Jesus no começo de seu ministério (1.32),
e o Pai derrama do seu Espírito sobre Jesus (3.34). O que aparece
neste evangelho e não nos outros são os ensinamentos de Jesus a

27 Bíblia de Estudo Nova Tradução na Linguagem de Hoje. São Paulo/SP: Sociedade


Bíblica do Brasil, 2005. Comentários item 1.7: João e outros evangelhos.

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As riquezas na diversidade dos evangelhos 47

respeito do Espírito como “o outro auxiliador” que Deus enviaria


para tomar o lugar de Jesus (14.15-17,25,26; 15.26,27; 16.7-15).
A tarefa mais importante do Auxiliador seria fazer com que os
seguidores de Jesus se lembrassem de seus ensinamentos (14.26)
e guiá-los a toda a verdade (16.13). No fim, o Cristo ressusci-
tado e glorificado sopra o seu Espírito sobre os seus seguidores
(20.22,23; 7.39).
Os sinóticos falam sobre as graves consequências de pecar
contra o Espírito Santo (por exemplo, Mateus 12.31,32). Vemos
ainda nos sinóticos a grandeza da Trindade quando Jesus diz que
qualquer pecado contra ele poderá ser perdoado, mas contra
o Espírito Santo não será perdoado nem nesse século, nem no
futuro. Em outras palavras, negar a presença e o poder do Espírito
Santo naquilo que Jesus faz, dizendo que Jesus é servo de Satanás,
não pode ser perdoado. Este tema não é tratado no livro de João.
Por outro lado, conheceríamos muito pouco sobre o Espírito
Santo se não fosse o evangelho de João. Como é maravilhoso
observar essa integração dos evangelhos. Inúmeros livros sobre o
Espírito Santo têm sido escritos com base nos ensinamentos que
Jesus dá sobre ele no evangelho de João.

Sobre o maior dos mandamentos


Mateus é o único a narrar o discurso de Jesus sobre o juízo final
(25.31-46). Jesus fala sobre dois grupos que serão separados: os
bodes à esquerda, que irão para o tormento eterno, e as ovelhas à
direita, que possuirão como herdeiros o reino de Deus preparado
desde a fundação do mundo.
O que fizeram os separados para herdar a vida eterna com
Deus? Jesus diz: “Porque tive fome, e destes-me de comer; tive
sede, e destes-me de beber; era estrangeiro, e me hospedastes; estava
nu, e vestistes-me; adoeci e visitastes-me; estive na prisão, e fostes

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48 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

ver-me” (vv. 35,36). Em seguida, esse grupo pergunta: “Quando


fizemos isto?”. E Jesus responde: “Em verdade vos digo que quando
fizestes a um destes pequeninos irmãos, a mim o fizestes” (v. 40).
Os que foram condenados, o outro grupo, não praticaram
esse tipo de amor.
O que fica claro nesse momento é que não tem importância
o grupo religioso ou a denominação ao qual eles pertenciam.
Não foram importantes os rituais ou as doutrinas que segui-
ram, o zelo religioso, as interpretações bíblicas, as exegeses
e tantos detalhes que causam brigas e divisões. Para o juízo
final, o amor prevalece.
Exclusivamente em João 13.34,35, Jesus, pouco antes de
seu martírio, faz uma declaração contundente: “Um novo
mandamento vos dou: que vos ameis uns aos outros, como eu
vos amei a vós, que também vós uns aos outros vos ameis. Nisto
todos conhecerão que são meus discípulos, se vos amardes uns
aos outros”.
Tudo o que é novo sobrepuja os anteriores (que se tornam
menos relevantes). E o novo mandamento que Jesus deter-
mina dimensiona o tipo de amor: o amor de dar a vida. Jesus
não está falando sobre a quantidade de amor que devemos
ter (seria impossível amar tanto quanto Deus nos ama). Jesus
está falando sobre “como” amar. Esse modelo é o que custa
para nós, dói, é sacrificial, implica em perdas, pode trazer
sofrimentos. Este é o padrão: dar a vida, morrer.
Esse amor de perda, sacrificial, começa no nosso dia a dia,
na nossa casa, na nossa família. Em seguida, ele é aplicado
no âmbito da igreja, na nossa comunidade, para, daí sim,
estender-se a outros irmãos cristãos que não pensam como
nós, que possuem práticas diferentes daquelas que recebemos,
mas que constituem nossa família espiritual.

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As riquezas na diversidade dos evangelhos 49

Para chegarmos à unidade, a um só Corpo visível, é preciso


que entendamos que o amor do Novo Mandamento está acima
de todos os aspectos religiosos (como foi dito em Mateus 25),
incluindo as mais saudáveis doutrinas que aprendemos, os mais
relevantes rituais, os encontros solenes e reuniões santas que
fazemos ou qualquer outra prática.
Isso fica muito claro quando examinamos 1 Coríntios 13.
Este capítulo nos ensina que o amor é mais importante do que
o fato de praticar a Palavra, de ter os dons do Espírito e fé, de
transportar montes, entregar tudo o que se tem aos pobres e ofe-
recer o corpo para ser queimado sem, contudo, ter o verdadeiro
amor que vem de Jesus.
Essa é a marca dos discípulos de Jesus. Porém, as divisões
na Igreja hoje são tão gritantes que certamente o mundo não
enxerga mais esta marca. A igreja primitiva era admirada pelo
amor e pela unidade, o que a fez cair na graça do povo (Atos
2.47). Ali havia sim testemunho de que Jesus fora enviado pelo
Pai, e todos os dias acrescentava o Senhor à igreja aqueles que
se haviam de salvar.
Dessa forma, vemos que os evangelhos não são uniformes
e, assim, ganhamos com essa diversidade. Assim também é a
Igreja: temos diversos dons, ministérios e operações do Espírito:
Ora, os dons são diversos, mas o Espírito é o mesmo. E também
há diversidade nos serviços, mas o Senhor é o mesmo. E há diver-
sidade nas realizações, mas o mesmo Deus é quem opera tudo em
todos. A manifestação do Espírito é concedida a cada um visando
a um fim proveitoso. Porque a um é dada, mediante o Espírito, a
palavra da sabedoria; e a outro, segundo o mesmo Espírito, a palavra
do conhecimento; a outro, no mesmo Espírito, a fé; e a outro, no
mesmo Espírito, dons de curar; a outro, operações de milagres; a
outro, profecia; a outro, discernimento de espíritos; a um, variedade

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50 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

de línguas; e a outro, capacidade para interpretá-las. Mas um só e


o mesmo Espírito realiza todas estas coisas, distribuindo-as, como
lhe apraz, a cada um, individualmente (1 Coríntios 12.4-11).

E ele mesmo concedeu uns para apóstolos, outros para profetas,


outros para evangelistas e outros para pastores e mestres, com vistas
ao aperfeiçoamento dos santos para o desempenho do seu serviço,
para a edificação do corpo de Cristo, até que todos cheguemos à
unidade da fé e do pleno conhecimento do Filho de Deus, à perfeita
varonilidade, à medida da estatura da plenitude de Cristo, para que
não mais sejamos como meninos, agitados de um lado para outro
e levados ao redor por todo vento de doutrina, pela artimanha dos
homens, pela astúcia com que induzem ao erro. Mas, seguindo
a verdade em amor, cresçamos em tudo naquele que é a cabeça,
Cristo, de quem todo o corpo, bem ajustado e consolidado pelo
auxílio de toda junta, segundo a justa cooperação de cada parte,
efetua o seu próprio aumento para a edificação de si mesmo em
amor (Efésios 4.11-16).

Porque assim como num só corpo temos muitos membros, mas


nem todos os membros têm a mesma função, assim também nós,
conquanto muitos, somos um só corpo em Cristo e membros uns
dos outros, tendo, porém, diferentes dons segundo a graça que nos
foi dada: se profecia, seja segundo a proporção da fé; se ministério,
dediquemo-nos ao ministério; ou o que ensina esmere-se no fazê-
-lo; ou o que exorta faça-o com dedicação; o que contribui, com
liberalidade; o que preside, com diligência; quem exerce miseri-
córdia, com alegria (Romanos 12.4-8).

As denominações (grupos), da mesma forma, têm reve-


lações diferentes sobre alguns assuntos. Uma peça que falta
na nossa fé existe em outra parte do Corpo. Complemen-
tamos uns aos outros, e essa é a beleza dos evangelhos e do
cristianismo.

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As riquezas na diversidade dos evangelhos 51

Rubens Gonçalves28 afirma:


Será que dentro do padrão bíblico existe alguém a quem Deus tenha
conferido poderes especiais para determinar o que está DENTRO
ou FORA da comunhão com ele? Estamos nos referindo às preciosas
vidas que estão debaixo da cobertura e proteção do precioso sangue
de Cristo derramado na cruz do Calvário por toda a humanidade
(1 João 1.6,7).

Algumas das maiores ameaças e derrotas na Igreja acontecem por


causa do princípio destrutivo da divisão espiritual. O mesmo é ver-
dade para o reino satânico. Por outro lado, a maior provisão de Deus
para destruir o domínio do inimigo e eliminar as divisões está no
fato de “CUIDARMOS IGUALMENTE UNS DOS OUTROS”
(1 Coríntios 12.20-27).

Imagine uma congregação que só conhecesse o evangelho de


Mateus e outra que só conhecesse o evangelho de João. Essas duas
congregações teriam diferentes “caras”, estilos e modus operandi que
divergiriam frontalmente. Mas uma coisa é certa: ambas teriam o
mesmo alvo, que é Cristo. Sabemos que é do agrado do Pai que
todas as coisas convirjam para Cristo, e a Palavra de Deus nos leva
a ele (Efésios 1.10). Como é bom saber que, pelo Espírito Santo,
somos levados (os nascidos de novo) a um só Senhor, ainda que
sejamos diferentes na forma cultural, nos ritos, nas interpretações
doutrinárias. Louvemos ao Senhor pela maravilha que é a unidade
na diversidade.

28 GONÇALVES, Rubens. Inclusão é a Resposta da Unidade no Corpo de Cristo.


www.facebook.com/pages/Café-em-Comunhão, 01/07/2015.

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Capítulo 3
UNIDADE DO CORPO:
UTOPIA OU REALIDADE?

N
otícias pela mídia, principalmente pela in-
ternet, constam que, em 2014, na região do
Iraque e da Síria, “...cristãos foram expulsos de
suas casas, as mulheres cristãs foram estupradas, milha-
res de cristãos foram enforcados, fuzilados e até mesmo
crucificados. Tudo isso pelo fato de essas pessoas serem
cristãs. Suas casas, igrejas, mosteiros, conventos e outras
estruturas religiosas foram destruídas, padres e pastores
foram assassinados, freiras e monjas estupradas, crianças
cristãs foram vendidas como escravas ou obrigadas a se
casarem com militantes extremistas”.

O mundo está assustado com essa onda de violência


iniciada praticamente em setembro de 2001 com o ata-
que aos Estados Unidos. A partir daí, diversos outros
países têm sido alvos dos islâmicos radicais. Mais do
que nunca, nós, cristãos, estamos chegando à conclusão
de que nossa união é muito mais do que desejável; é
urgente e essencial.

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54 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

Unidade (ecumenismo) no sangue


Não se tem, com precisão, os números de quantos cristãos
foram assassinados e de quantos fugiram de suas casas e comu-
nidades. No entanto, os números preliminares são assustadores.
Antes de 2003, ano da invasão ao Iraque pela coalizão militar,
esse país tinha 1,5 milhão de cristãos. Atualmente, após várias
ondas e perseguições, calcula-se que existam apenas 400 mil.
Na Síria, antes do início da guerra civil, havia uma popula-
ção estimada de 3 milhões de cristãos. No final de 2014, esse
número caiu pela metade. Por causa desses tristes números, o
massacre e a expulsão dos cristãos do Iraque e da Síria podem
ser o pior genocídio que a humanidade presenciou nas últimas
décadas. O genocídio dos cristãos no Oriente Médio poderá
superar o genocídio de Ruanda que, em 1994, matou mais
de meio milhão de membros da minoria tutsis e membros
de outros grupos étnicos.
Líderes evangélicos americanos pediram socorro diante
das atrocidades regulares cometidas contra “cristãos” que
estavam sendo mortos ali. Calcula-se que, em 2014, dezenas
de instituições cristãs foram alvos de ataques e destruições
acompanhadas de execução. A mais alvejada foi a Igreja
Católica Siríaca (nove unidades); depois a Igreja Ortodoxa
Siríaca (sete unidades), seguida pela Igreja Católica Apos-
tólica Assíria do Oriente (três unidades), pela Igreja Cristã
Caldeu de Babilônia (diversas), pela Igreja Armênia Ortodoxa
(diversas), pela Igreja Presbiteriana, pela Igreja Latina e por
muitas outras igrejas evangélicas.
Houve grande consternação, angústia, tristeza e dor em
igrejas cristãs de diversos países do mundo. Orações, vigílias,
novenas foram feitas para que Deus Pai operasse em favor dos
nossos irmãos que estavam sendo barbaramente assassinados.

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Unidade do Corpo: utopia ou realidade? 55

Em 15 de fevereiro de 2015, 21 cristãos coptas egípcios


foram decapitados pelo Estado Islâmico. Em minha igreja, tão
logo soubemos da notícia, fizemos um clamor coletivo diante de
Deus chorando por esse acontecimento. A maioria esmagadora
da nossa comunidade nem sequer sabia quem eram os cristãos
coptas (se estão em comunhão com a Igreja Ortodoxa ou Cató-
lica Romana, como é sua liturgia, quem é o patriarca da igreja,
etc.). O importante é que eles são de Cristo, e isso nos faz irmãos.
O sangue derramado por nossos irmãos devido a essa
perseguição nos levou a uma unidade cristã, creio, até então
nunca vista nos tempos modernos. O fato de essas vidas esta-
rem morrendo por causa de Cristo não nos levou a perguntar
a que denominações pertenciam, quais suas doutrinas, seus
credos, suas confissões. Se morriam e não negavam o nome
de Cristo, então eram cristãos, eram nossos irmãos que fariam
parte daquele grupo descrito em Apocalipse 6.9-11, formado
por pessoas que foram mortas por amor à Palavra e por causa
do testemunho que deram.
Neste ano, nos unimos com irmãos de outras denominações
que também haviam derramado seu sangue. Chamamos essa uni-
dade de “Ecumenismo no Sangue”. Será que a igreja cristã se une
apenas quando o sangue desses mártires é derramado? Precisamos
chegar a esse ponto para mostrar ao mundo que somos uma só
igreja, um só rebanho e que temos um só Senhor? Será que, se
mostrássemos ao mundo que somos UM, que Jesus foi enviado
pelo Pai para nos salvar e nos unir, haveria todos esses extermínios?
Ao evidenciar as sementes deixadas por Jan Amos Comenius
(1592-1670), Assis29 destaca como terceira semente a unidade
dos cristãos:

29 ASSIS, Eliasaf. Sementes Escondidas na Terra de Ninguém. Americana/SP: Revista


Impacto, edição 80, 2014.

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56 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

Note quem critica a unidade: eles falam de posições confortáveis.


Estão longe do front" e alheios às reais pressões. Em prisões comu-
nistas ou islâmicas, católicos e evangélicos oram, celebram a ceia e
sofrem o martírio juntos. A igreja perseguida sobrevive porque é
unida. As trincheiras de agora nos sugerem que façamos o mesmo.
Só resistiremos em unidade.

Não precisamos desses extremos para mostrar que somos UM.


Antes da unidade (ecumenismo) no sangue, temos a unidade do
Espírito, a unidade da fé e a unidade do Corpo. Se buscarmos
diligentemente preservar a unidade do Espírito, que é a base de
todas as outras, certamente a Igreja de Cristo evidenciará “a mul-
tiforme sabedoria de Deus que se tornará conhecida dos principados
e potestades nos céus, segundo o eterno propósito que Deus Pai fez em
Cristo Jesus nosso Senhor” (Efésios 3.9-11).

Unidade do Espírito versus unidade da fé


No capítulo 4 de Efésios, temos referência a dois tipos de unida-
de: unidade do Espírito (v. 3), unidade da fé (v. 13) e alguns
entendem que este capítulo fala também sobre a unidade do
Corpo (v. 16).
Uma das melhores explicações que li sobre o assunto está na
apostila escrita por John Walker, páginas 19 e 20 (abaixo, grifos
nossos), intitulada Tudo Começa pela Unidade do Espírito para
Chegarmos à Unidade da Fé:30
Efésios 4.3 diz que “devemos nos esforçar diligentemente para
preservar a unidade do Espírito”. No grego fala: “usando diligência
para guardar a unidade do Espírito”. Não precisamos procurar a
unidade do Espírito, mas preservá-la, guardá-la, porque a unidade
é um fato do Espírito. Se vamos guardar alguma coisa é porque já

30 WALKER, John. Um Estudo Microscópico em Efésios. Americana/SP: Impacto


Publicações, data desconhecida

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Unidade do Corpo: utopia ou realidade? 57

a temos. Se temos o Espírito, temos a unidade, porque o Espírito


não está dividido, é um só. Se entendermos isto vamos preservar a
unidade que o Espírito já tem em si mesmo.

O capítulo 4 de Efésios se refere a dois tipos de unidade: unidade


do Espírito (v. 3) e unidade da fé (v. 13). Nossa vocação começa
com a unidade do Espírito e termina com a unidade da fé. Esta
ordem é de suma importância: a unidade da fé nunca deve vir
em primeiro lugar. Toda igreja que começa com a unidade da
fé termina em confusão e divisão. Os líderes estabelecem suas
doutrinas e só tem comunhão com aqueles que concordam com
eles. Dizem: você crê nisso ou não? Crê no batismo por aspersão
ou por imersão? Crê na Trindade ou só em Jesus? Que você acha
disto? Se discordar em um ponto, a pessoa está fora da comu-
nhão. Este é o processo do homem. Mas o processo de Deus é
começar com a unidade do Espírito para chegar à unidade da fé.
Se procurarmos o Espírito de Cristo em cada um e guardarmos
a paz nessa base, terminaremos com a unidade da fé, ou seja,
um só Corpo. Começa com um só Espírito e termina com um
só Corpo. Este processo de unidade é baseado no Espírito e na
Palavra (fé). O processo termina com a unidade da Palavra, mas
é preciso iniciá-la no Espírito.

É interessante que o autor destas palavras, como veremos no


capítulo 7, experimentou a impossibilidade de buscar a unidade
colocando a unidade da fé na frente da unidade do Espírito.
Assim, ele conclui:
Portanto, temos de procurar diligentemente guardar o que temos
em unidade. Cada um pertence a Cristo, tem o Espírito de Cristo.
Precisamos olhar para o Espírito que está em cada um de nós
e preservar e cultivar o que temos no Espírito. Se procurarmos
guardar a unidade da fé sem ter unidade do Espírito, teremos
doutrina sem realidade. Por exemplo, posso falar “Paz do Senhor”

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58 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

sem transmitir paz alguma. Mas se procurarmos preservar a


unidade do Espírito, vamos achar Cristo, a palavra viva, e chegar
à unidade da fé.

Outra maneira de ver este processo é substituir o termo “unidade


da fé” por “unidade do Corpo de Cristo”. De que adianta começar
com a unidade do Corpo de Cristo sem ter a unidade do Espírito de
Cristo? Se falamos: nós somos o Corpo de Cristo nesta cidade, não
temos o Espírito de Cristo porque estamos excluindo outros irmãos
da comunhão de Cristo. Isto não é unidade do Espírito. Precisamos
preservar a unidade do Espírito para produzir unidade do Corpo.
Se começarmos com doutrina, teremos divisão. Se começarmos com
amor (de Deus e não dos homens), teremos união.

A Igreja está muito dividida, e o que gera essa divisão é a ten-


tativa de forçar a unidade da fé em vez de preservar a unidade do
Espírito. Existem alguns líderes que não admitem que alguém
discorde de suas doutrinas e opiniões. A pessoa discordante não
encontra mais espaço em sua igreja e, muitas vezes, é excluída, tem
sua comunhão cortada. Isso se chama divisão. E muitas vezes isso
acontece por coisas tolas, pequenas, irrelevantes, que não ameaçam
a salvação de ninguém. Às vezes, irmãos que conviveram juntos por
muito tempo numa mesma igreja, quando saem, não conseguem
nem se olhar mais. A unidade do Espírito é uma aliança e, quando
agem assim, estão quebrando essa aliança. Isso é muito sério.
John Walker, no mesmo estudo citado31, continua dizendo:
Outro fator importante é a humildade. Se andarmos dignos da vocação
com toda humildade, estamos prontos para prosseguir rumo à unidade
do Corpo. Se procurarmos a unidade do Espírito com humildade,
iremos achá-la. Uma pessoa humilde tem união com qualquer membro
do Corpo, com qualquer pessoa que tem Jesus. Se ela tem o mesmo

31 WALKER, John. Um Estudo Microscópico em Efésios. Ibid.

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Unidade do Corpo: utopia ou realidade? 59

Espírito que eu, posso ter comunhão no Espírito com ela e assim
guardar a unidade do Espírito. Mas, se ao invés disto, procurarmos a
unidade da fé, perderemos tudo; pois mesmo tendo o Espírito de Jesus
basearemos nossa unidade em outras coisas, não no espírito. Vamos
discutir e ficar irados, e não chegar a lugar algum. Tudo isto porque
estamos procurando a unidade da fé antes da hora. Primeiro vem a
unidade do Espírito, depois a unidade da fé.

O aspecto que gostaria de enfatizar é que nós temos o Espírito. E


se temos o Espírito, devemos guardar a unidade dele. Geralmente
não conseguimos entender isto. Para nós é fácil entender unida-
de na base do que cremos ou não. Sabemos que cada um tem o
Espírito, mas não entendemos que é o mesmo Espírito. Portanto,
se deixarmos de olhar para a doutrina em si, e olharmos para o
Espírito de Cristo em cada vida, veremos que já temos unidade
e por isso devemos preservá-la. O Espírito em si tem o potencial
de unidade, mas enquanto não a reconhecermos em cada pessoa,
não teremos unidade em realidade. Para ter unidade do Espírito,
precisamos reconhecer que o Espírito que habita em nós é o
mesmo que habita em nosso irmão. Isto faz com que as outras
coisas se tornem insignificantes (grifos nossos).

Sem andar no Espírito não há possibilidade de o Corpo ser


restaurado à sua verdadeira união. Qualquer obra ou movimento
de restauração que não começar com esse andar no Espírito em
humildade, mansidão, guardando a unidade do Espírito, acabará
produzindo mais uma denominação. Se queremos uma igreja do
Novo Testamento, devemos ter homens do Novo Testamento,
que andem no Espírito, com a natureza de Jesus, em humildade.

Em 1 Coríntios 12.4,7-11, Paulo enfatiza que há um só Espírito.


Os dons são diversos, mas o Espírito é o mesmo (v. 4). Há muitas
manifestações, mas um só e o mesmo Espírito é quem opera todas
as coisas (v. 11). Em Efésios 4, Paulo está falando sobre andar no

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60 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

Espírito produzindo seus frutos. Para andar no Espírito, é preciso


guardar a unidade do Espírito, pois é o mesmo Espírito que realiza
todas as coisas.

Em Filipenses 2.1-4, o versículo 2 tem a mesma exortação de Efésios


4.3 em outras palavras. Ele representa a unidade do Espírito, pen-
sando a mesma coisa, tendo o mesmo amor, sendo unido em alma,
tendo o mesmo sentimento. E os versículos 3 e 4 são os frutos do
Espírito resultantes de um andar no Espírito. O próprio andar no
Espírito leva-nos à unidade da fé. É impossível achar o Corpo de
Cristo sem andar no Espírito. Ao invés de procurarmos o Corpo,
devemos procurar o Espírito e guardar sua unidade: desta forma o
Corpo vai aparecer.

Portanto, não devemos desanimar! Continuemos cren-


do, orando, buscando, esforçando-nos para preservar o
que o Senhor já construiu em nosso meio, entendendo
que existe um procresso em andamento. Não é fácil, pois
a grande maioria dos cristãos pensa de formas distintas,
tem origens e escolas diferentes, mas Jesus morreu pela
unidade, e precisamos depender do Espírito Santo para
construir essa obra em nosso meio. Que não haja em nosso
meio nenhum espírito de confusão, mentira, engano, di-
visão, orgulho, críticas. É um caminho novo, nunca antes
percorrido (Josué 3.4), mas está em andamento, e nosso
guia é o Espírito Santo!
Reinaldo Reis32 diz que somos privilegiados por esse
tempo na busca da unidade cristã. Ele afirma também que
temos um compromisso com a unidade e cita o arcebispo
Michael Ramsey numa entrevista ao jornal The Times,
em 1973:
32 Anais do Encristus 2014. Ele pôs em nossos lábios a palavra de reconciliação.
Cachoeira Paulista/SP, Canção Nova, 14-16 de março de 2014, p. 23.

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Unidade do Corpo: utopia ou realidade? 61

O ecumenismo, na sua totalidade, é obra do Espírito Santo, Espírito de


verdade e de amor agindo em nós, unindo-nos no amor, recriando-nos
na verdade – eis o que importa. Evitemos obstacular o Espírito com a
nossa estupidez, pouca abertura e falta de fé.

O caminho para se preservar a unidade do Espírito


Enfatizando a importância da unidade do Espírito, ressal-
tamos (e por muitas vezes abordaremos neste livro) Efésios
4, capítulo no qual, sem dúvida, encontramos a melhor
definição de unidade. Enfatizamos esse texto da Palavra e
continuaremos a fazê-lo:
Rogo-vos, pois, eu, o prisioneiro no Senhor, que andeis de modo
digno da vocação a que fostes chamados, com toda a humildade
e mansidão, com longanimidade, suportando-vos uns aos outros
em amor, esforçando-vos diligentemente por preservar a unidade
do Espírito no vínculo da paz; há somente um corpo e um Espí-
rito, como também fostes chamados numa só esperança da vossa
vocação; há um só Senhor, uma só fé, um só batismo; um só Deus
e Pai de todos, o qual é sobre todos, age por meio de todos e está
em todos (Efésios 4.1-6).

Paulo usa o verbo “rogar”, que tem a conotação de sú-


plica, de implorar misericórdia, um desejo do fundo do
coração. Ele roga para que andemos de forma digna da
nossa vocação, produzindo os frutos do Espírito Santo.
Somos vocacionados, escolhidos, predestinados para isso.
Paulo não está rogando a pessoas que não conhecem ou não
têm comunhão com Jesus, mas a cristãos aliançados com
Deus, a uma igreja-modelo do NT. Depois ele apresenta
algumas atitudes ou condições para que essa unidade seja
alcançada:

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62 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

• Humildade
Humildade é se deixar ser rebaixado ao máximo. É o
oposto de soberba. Davi orou ao Senhor: “Também da so-
berba guarda o teu servo, que ela não me domine; então, serei
irrepreensível e ficarei livre de grande transgressão” (Salmos
19.13). A soberba, para Davi, era o pior pecado. Um homem
que escreveu as mais belas poesias e cânticos, que tinha tanta
afinidade com Deus a ponto de desejar construir uma casa
para Ele, tinha tudo para tornar-se soberbo. No entanto,
ele se humilhou; Davi se considerava um pobre necessitado
(Salmos 40.17).
Quando pensamos em unidade, a condição fundamental
é a humildade, o quebrantamento. É olhar para Cristo e ver
que, mesmo tendo uma condição de glória, de rei do universo,
ele veio à terra e foi cuspido, espancado, crucificado. O salmo
22, ao nosso ver, deixa a entender que Jesus foi crucificado
nu, pois suas roupas foram sorteadas. Assim, a unidade requer
necessariamente humilhação da nossa parte, e este é um fruto
do Espírito apesar de não aparecer na lista de Gálatas 5.
Eu fico imaginando o risco que corremos ao achar, em
algum momento, que somos valiosos, que temos alguma
coisa preciosa, que estamos cumprindo toda a Palavra como
deveríamos. Qualquer coisa nesse sentido é extremamente
perigosa para a nossa vida e para a unidade.
Nos dias do reavivamento da Rua Azusa, em Los Angeles
(EUA), William Seymour passou muitas horas no púlpito,
com a cabeça em uma caixa, para que ninguém fosse glorifi-
cado além de Jesus Cristo.33

33 TENNEY, Tommy. A Unidade Cristã e o Reavivamento do Corpo de Cristo. São


Paulo/SP, Editora Ágape, 2013.

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Unidade do Corpo: utopia ou realidade? 63

Na semana em que escrevia este capítulo34, por três vezes eu


tive de pedir perdão. Uma das vezes me ajoelhei diante de uma
pessoa e pedi que orasse por mim. Duas vezes, me humilhei
porque não fui zeloso no sentido de preservar a unidade. Muitas
vezes, nós erramos, temos atitudes iguais às do mundo e nos
acostumamos, achamos que são normais. Mas a nossa vida deve
ser de humilhação, de experiências práticas de perdão. Quando
meu filho mais velho tinha aproximadamente 7 anos, eu tive uma
atitude dura com ele e, chegando ao meu trabalho, não sentia paz.
Saí do trabalho e voltei para casa a fim de lhe pedir perdão. Deus
quer que pratiquemos isso; caso contrário, não haverá unidade
na família, na igreja, no Corpo. Sem humilhação, não dá para
caminhar juntos. Quando nos sentimos muito felizes em relação
a nós mesmos, precisamos analisar se não estamos entrando no
patamar da soberba descrito por Davi, que é a pior coisa que pode
acontecer ao cristão.
Quando completei 60 anos, o Senhor “secou” o meu minis-
tério de pastor sênior em minha igreja (estava à frente havia 15
anos) e, sem explicar muito, levou-me a passar por um processo
de humilhação. Por anos, fiquei sentado no banco da igreja, pra-
ticamente sem ministrar, tendo de “engolir” coisas com as quais
não concordava. Foi sofrido, mas sabia que era um tratamento de
Deus para que ele me levasse até outra frente de trabalho, outro
ministério, que seria a unidade do Corpo. Não poderemos ser
agentes da unidade se não tivermos experiências de passar por
humilhações (e as minhas não pararam aí; continuam até hoje,
mas o Senhor tem me sustentado).
Paulo escreve que, para não ficar orgulhoso (soberbo) pelas
revelações que tinha, recebeu uma doença dolorosa que era como
um espinho na carne, como um mensageiro de Satanás que lhe

34 Jundiaí, 21/12/2014.

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64 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

dava bofetadas para impedir que se orgulhasse. Por três vezes, ele
orou ao Senhor, sem sucesso, para que lhe tirasse esse sofrimento
(2 Coríntios 12.1-10).
Um dos grandes problemas que levam à divisão na Igreja são
homens que recebem revelação, tornam-se conhecidos, às vezes
idolatrados, e não se quebrantam diante do Senhor, não exercitam
a humidade. Sem humildade extrema, não há unidade na Igreja.
Jesus ensinou:
Novo mandamento vos dou: que vos ameis uns aos outros; assim
como eu vos amei, que também vos ameis uns aos outros. Nisto
conhecerão todos que sois meus discípulos: se tiverdes amor uns
aos outros ( João 13.34,35).

Muitas vezes questionei, como já mencionei, esse mandamento:


“Como posso amar alguém como Jesus amou?”. Mas ele não está
referindo à quantidade de amor, mas à maneira como ele amou:
morrendo por nós! Sem morrer, sem perder, sem ter prejuízo, não
haverá amor de Deus. Este, muitas vezes, traz uma sensação de
perda, vergonha, dor, humilhação, morte. Esse amor caminha de
mãos dadas com a humildade.
Quando Paulo ensina que o marido deve amar a esposa como
Cristo amou a igreja (Efésios 5.25), ele não está dizendo que
deve amá-la porque é bonita, porque faz tudo certinho, porque
é submissa, mas porque Cristo nos amou. Essa é a motivação do
amor. Então, sem humilhação, não existe humildade e, se não
nos humilharmos diante dos outros, não haverá amor e unidade.
• Mansidão / Longanimidade
A palavra mansidão, numa versão bíblica italiana, é traduzida
como “doçura”. Precisamos ser dóceis uns com os outros para
que haja unidade. Docilidade é fruto do cristão. Sem mansidão,
afabilidade, não há unidade.

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Unidade do Corpo: utopia ou realidade? 65

O manso é aquele que não reivindica os próprios direitos. Jesus,


sendo Deus, não julgou como usurpação o ser igual a Deus. O
manso é aquele que está disposto a sofrer o dano. Como Paulo
escreveu aos coríntios, numa demanda entre irmãos, devemos
estar prontos a sofrer o dano em vez de tentar levar vantagem.
Ser manso significa usar a toalha, não a espada (João 13). É
deixar o egoísmo de lado e considerar o outro superior a si mesmo;
é cuidar dos interesses dos outros (Filipenses 2.3-5); é estar mais
interessado no avanço do reino de Deus do que no progresso
pessoal. É orar como João Batista: “Convém que ele cresça e que eu
diminua” (João 3.30). Todavia, não adianta humildade e mansidão
sem longanimidade.
Longanimidade é uma paciência multiplicada, um ânimo
longo, talvez o “setenta vezes sete” a que Jesus se refere em Mateus
18.22. Algumas versões da Bíblia em inglês traduzem este termo
como longsuffering, ‘sofrimento longo’ (em favor da unidade do
Corpo), associado à palavra ‘misericórdia’.
Se desejamos ser compreendidos e perdoados, devemos também
compreender e perdoar as falhas humanas. Por mais difícil e doloroso
que isso seja para nós, não será pior do que o que Jesus sofreu na
cruz por você e por mim. Ou seja, é algo possível de se suportar. O
propósito do fruto da longanimidade em nós nada mais é do que:
–– levar-nos a reconhecer que NENHUM de nós, seres
humanos, pode considerar-se melhor que outro;
–– levar-nos a reconhecer que devemos tolerar na fé, com
paciência, aqueles que não pensam como nós;
–– levar-nos a reconhecer que, sendo longânimos, temos o
dever de tratá-los com atitudes de amor e carinho, e não
afastá-los com impaciência e intolerância, num falso tes-
temunho cristão, envergonhando assim o nome de Deus.

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66 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

Ser longânimo com um irmão, principalmente de outra deno-


minação, significa ser longânimo com a Igreja (mesmo com seus
inúmeros erros) e, assim, fazer a vontade plena de Jesus.
Jesus perguntou a Saulo: “Por que me persegues?” (Atos 9.4).
Saulo de Tarso, que se tornaria Paulo, na verdade perseguia a
Igreja de Cristo, não a Jesus. Ora, Jesus disse, com efeito, que
perseguir a Igreja é perseguir a ele próprio. Isto significa que não
ser longânimo com a Igreja é não ser longânimo com Jesus. Atacar
irmãos na fé, ainda que diferentes de nós, é atacar Jesus. É como
se estivéssemos crucificando o Corpo de Jesus Cristo novamente.
• Amor
“...suportando-vos uns aos outros em amor”. Essa frase pode
trazer uma ideia errada de ”aguentar” (tolerar) o irmão. Con-
tudo, o sentido original da palavra é ”apoiar, sustentar, ajudar,
contribuir, abençoar, ser base”. Numa mensagem em um con-
gresso de cristãos, Álvaro Pauluci35 chamou-nos atenção para
esse aspecto: em inglês, existe o termo support que significa
”patrocinar, ajudar, dar coisas boas, promover alguém” (assim
como um pai suporta a família, sustenta). Então, suportar em
amor é dar, contribuir, fazer o melhor, oferecer o ombro ao
irmão.
Essas atitudes acima são instrumentos de Deus para a unida-
de do Espírito. Em seguida, Paulo diz que devemos nos esforçar
para preservar essa unidade “no vínculo da paz”. A unidade do
Espírito leva-nos à unidade do Corpo. Quando recebemos o
Espírito Santo, fomos batizados em um mesmo Corpo; então,
temos unidade no Espírito. Podemos até discordar em alguns
pontos doutrinários, mas somos unidos em Espírito.

35 Anais do Encristus 2014. Bênção e vida na unidade. Sorocaba/SP, 22 a 24 de


agosto de 2014, p. 26.

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Unidade do Corpo: utopia ou realidade? 67

Em Romanos 2.24, Paulo diz que “por vossa causa o nome


de Deus é blasfemado entre os gentios”. Ou seja, não viver o novo
mandamento de Jesus leva à discórdia, à desunião. Jesus afirmou,
em João 13.35, que seríamos conhecidos como discípulos dele se
amássemos uns aos outros. Tommy Tenney diz que “...o mundo
vai virar as costas para Deus por causa de vocês (que não amam, que
vivem a desunião, a divisão). Se Deus tem uma má reputação no
mundo hoje, é nossa culpa!”.36
Segundo Marcial Maçaneiro, falando sobre Efésios 4.1:37
Paulo, prisioneiro do Senhor, diz, então, que devemos juntos nos
encontrar e dizer que somos prisioneiros do Senhor e, com isso,
sermos livres. Assim, se somos livres, chamados a uma vocação
comum, membros uns dos outros, repartindo ministérios, então
“vivamos de um modo digno dessa vocação a que fomos chamados”,
pois a primeira coisa que nos tira essa dignidade é viver divididos.
É entre irmãos que dizem crer no mesmo Senhor que justamente
existe o foco das piores ofensas, dos piores ataques, dos piores
desamores. Então não sobra nada de verídico para evangelizar o
mundo e fica evidente que o Evangelho não funciona, a começar
dos que dizem crer.

O ensino da Igreja Católica, que é semelhante ao da Igreja Evan-


gélica, diz que a divisão entre nós tem três efeitos ruins: primeiro,
ela é uma ferida que dilacera o Corpo do Senhor; segundo, é um
escândalo porque tira o crédito no Evangelho; terceiro, é um pecado
e todas as vezes que a aceitamos estamos consentindo com a mesma.
Então, eu sinto essa divisão, mas não posso admitir ou consentir com
a mesma, mas me incomodar com ela. E todas as vezes que faço isso
estou afirmando que sou prisioneiro do Senhor. Se eu consentisse

TENNEY, Tommy. A Unidade Cristã e o Reavivamento do Corpo de Cristo. Ibid.


36

37
Anais do Encristus 2015. Batizados no amor que gera a unidade. Niterói/RJ,
21/03/2015, pp.19,22,26,27.

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68 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

com as divisões, se fizesse um ministério “mais fácil”, se brincasse


com tudo isso, estaria sendo escravo de outro senhor, daquele que é
o divisor, e não do verdadeiro Senhor Jesus Cristo.

Há um só Senhor, mas muitos ministérios para servi-lo. Mesmo entre


bispos e bispos há maneiras diferentes de servi-lo; entre pastores e
pastores há estilos diferentes, pois, a graça de Deus é multiforme (1
Pedro 4.10). A unidade da Igreja não é um túmulo oco. Ela não é
parada, muda, sempre igual. A Igreja tem muitos dons, faz muitas
coisas ao mesmo tempo e por isso desafina e às vezes erra.

Foi o Pai que fez a planta. A planta, o projeto em latim é “desíg-


nio”, desenho, design. O Filho é o mestre de obras, aquele que atua,
que realiza o projeto, que consolida a obra que o Pai desenhou. O
Espírito é o que dirige a construção para que a casa siga a planta
original. Então, um só Corpo e um só Espírito é um Corpo vivente.
Se alguém suja o pé, o Espírito vem e lava. Se alguém se fere, o
Espírito promove a cura, a restauração etc. Esse é o sinal da Igreja:
nós somos UM só Corpo e Espírito no Senhor.

Diferença nenhuma é causa de divisão. O Pai, o Filho e o Espírito


Santo são o exemplo disso. Diferenças não dividem, porque quando
somos escravos do mesmo Senhor, elas apenas nos convergem a ele.
Todas as divergências são modos de expressar a graça desde que se
aceite que o Senhor é o único Autor da graça.

Unidade do Corpo
No versículo 4 de Efésios 4, Paulo declara que há “um só Corpo, um
só Espírito e uma só esperança”. Antes, no capítulo 2 desse mesmo
livro, ele já havia abordado um só Corpo (v. 16) e um só Espírito
(v. 18), explicando que, por meio de Cristo, os judeus e os gentios
formam um só Corpo e têm acesso ao Pai no mesmo Espírito.
Jesus abriu um novo caminho pelo qual podemos chegar a Deus
por meio do Corpo e do Espírito.

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Unidade do Corpo: utopia ou realidade? 69

A unidade do Espírito exige que se fale sobre a unidade do


Corpo, pois esse é o seu objetivo. John Walker38 diz que a nossa
vocação é entrar no Corpo pelo Espírito Santo. Deus nos chamou
para andar na unidade do Espírito agora e alcançar a unidade
do Corpo depois. E, porque isto ainda não foi realizado, é que a
nossa vocação é uma esperança. A nossa esperança é a unidade do
Corpo no mesmo Espírito:
Ninguém gosta da ideia de espírito sem corpo (faz nos lembrar de
um fantasma). Quando os discípulos viram Jesus ressurreto, não
viram um espírito, mas um corpo ressurreto ( Jesus pediu para ser
apalpado, comeu com eles). Assim, ao falar da unidade do Espírito,
temos de pensar na unidade do Corpo. Há um só Corpo e um só
Espírito e estas duas coisas funcionando juntas são a esperança de
nossa vocação.

A Palavra é Deus e ela se tornou homem ( Jesus). O homem se fez


Espírito e todo homem que recebe este Espírito forma o Corpo.
Portanto, este homem que era visível (encarnação) se tornou invisível
(ascensão) e depois se tornou visível (Pentecostes) porque o Espírito
está no Corpo.

Nisto a oração de Jesus em João 17.21-23 se torna mais impactante,


pois Deus quer ter a mesma unidade com seu povo que ele já tem
com seu Filho através do Espírito Santo.

Quando aceitamos que Jesus é a cabeça e que nós somos


o Corpo dele aqui na terra, fica fácil entender que a união do
Corpo com o Espírito é a manifestação de Deus no mundo,
assim como Jesus encarnado foi a expressão de Deus no tempo
que esteve conosco. John Walker39 diz ainda que o Corpo é a
manifestação do Deus invisível no mundo visível. Deus sempre

38
WALKER, John. Um Estudo Microscópico em Efésios. Ibid.
39
WALKER, John. Um Estudo Microscópico em Efésios. Ibid.

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70 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

quis manifestar sua Glória, e ele a manifesta por meio do Corpo.


Portanto, este Corpo de Cristo, que tem o Espírito de Cristo,
manifesta a plenitude de Deus no mundo.
Paulo diz, em 1 Coríntios 12.13, que “em um só Espírito todos
fomos batizados em um corpo, quer judeus, quer gregos, quer escravos,
quer livres. E a todos nós foi dado de beber de um só Espírito”. O plano
de Deus é batizar no Espírito para entrar no Corpo e não para
se dividir, como vimos, principalmente, na igreja no século 20.
Que coisa preciosa é saber que todos bebemos de um só Espí-
rito. É o mesmo conteúdo (Espírito Santo) para cristãos batistas,
assembleianos, católicos romanos e ortodoxos, presbiterianos,
pentecostais, neopentecostais, carismáticos, não denominacionais
e tantas outras das dezenas de milhares de confissões cristãs.
Como é estimulante olhar para Efésios 4.2 (“com toda humil-
dade e mansidão, com longanimidade, suportando-vos uns aos outros
em amor”) e saber que essa prática nos fortalece na unidade do
Espírito pelo vínculo da paz, levando-nos à unidade do Corpo
(Efésios 4.15,16), para manifestar a glória de Deus na terra em
Cristo Jesus.
Somente uma Igreja unida (unidade do Espírito) sujeitará
todas as coisas neste mundo, pois Jesus, além de ser cabeça da
Igreja, também é a Cabeça de todo principado e potestade, com
autoridade sobre todas as coisas. Quem manifesta esta autoridade?
A Igreja unida! Quando formos UM!
Na verdade, a Igreja, como Corpo de Cristo, tem debaixo dos
seus pés todas as coisas: “E pôs todas as coisas debaixo dos seus pés”
(Efésios 1.22,23). Os pés de Cristo se referem ao seu Corpo (a
Igreja), pois todo corpo tem pés. Assim, todas as coisas sujeitas
à Igreja estão sujeitas a Cristo, que é a sua Cabeça e que, por sua
vez, sujeitará tudo a Deus.

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Unidade do Corpo: utopia ou realidade? 71

Lutando pela unidade


Asher Intrater, judeu messiânico, em uma de suas visitas ao Brasil40
relatou o seguinte:
A unidade sempre é uma prioridade para o reino de Deus
(Zacarias 14.9). Trabalhar pela unidade nunca é fácil. Significa
superar a oposição, nadar contra a correnteza, ajudar as pessoas
a resolver suas diferenças e lutar contra o diabo (Lucas 11.16-
17). É doloroso, porque envolve aproximar-se de pessoas que
nos machucaram. Contudo, a unidade é necessária para o bem
de todos.

Devemos lutar pela unidade. Aqui estão algumas traduções (de


versões em inglês) de Efésios 4.3 sobre como manter a unidade
do Espírito: Esforçando-nos para manter a unidade do Espí-
rito (King James); Tendo toda diligência… (AS); Fazendo um
esforço para preservar… (CE); Ansioso para manter… (ES);
Empenhe-se com diligência para viver juntos como UM…
(NL); Lute intensamente para guardar a unidade… (AMP).

Parte do esforço para alcançar a unidade é a comunicação. É


necessária muita comunicação para resolver as diferenças de
opinião. E isso pode ser desgastante. No entanto, o diálogo e a
discussão que fazem parte da aliança são o esforço necessário para
se chegar à unidade. O pecado causa mal-entendidos e confusão.
Estamos lutando para reverter a “maldição” da torre de Babel.

Outra razão é a ambição dos homens. Muitas pessoas querem che-


gar à liderança para o seu próprio benefício, então se separam dos
outros. Lutar por ambição impede que se lute pela unidade. Onde
há orgulho e ambição, o resultado geralmente é separação e divisão
(Provérbios 18.1).

40
Conferência “Israel, a Igreja e os Últimos Dias”. Jundiaí, Unidade Missionária
Cristã – UMC, 16 a 18 de novembro de 2014.

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72 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

Recentemente, vimos o quanto tem sido difícil para o primeiro-


-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, obter unidade para es-
tabelecer uma coalizão para o seu governo. Se não há unidade, não
haverá coalizão; se não há coalizão, não haverá governo. Assim como
o governo de Netanyahu depende da unidade dos partidos, o reino de
Yeshua ( Jesus) também depende da unidade no Corpo do Messias.

Há um paralelo entre a nação de Israel e o Corpo do Messias. Da


mesma forma que a coalizão do governo exige unidade entre os
líderes políticos, o reino de Yeshua ( Jesus) também necessita de
unidade entre os líderes espirituais. (É por isso que o chamado para
unidade de Efésios 4.3 é seguido pela passagem sobre a liderança
formada pelos cinco ministérios e o seu papel em levar o Corpo
de Cristo à unidade e maturidade em Efésios 4.11-15.)

A unidade no reino de Deus é encontrada dentro da Igreja ( João


17.23), dentro de Israel (Ezequiel 37.22), e também entre a Igreja e
Israel (é por isso que a unidade de Efésios 4.3 é precedida pela uni-
dade entre judeus e gentios em Efésios 2.14-16; 3.3-6). Da mesma
maneira que a unidade de aliança entre um homem e uma mulher
gera um filho, a unidade de aliança entre Israel e a Igreja também
dá à luz o reino de Deus na terra (Romanos 11.12-26).

Vamos nos empenhar com expectativa e diligência pela unidade


do Espírito em todas as esferas dos relacionamentos: desde o mais
individual (casamento) ao mais internacional (Israel e a Igreja). Não
importa quanto esforço ou dor sejam necessários, vamos lutar pelo
bem maior do reino de Deus.

Os cinco ministérios (unidade orgânica)


Como diz Asher no tópico anterior, a unidade do Espírito (Efésios
4.3) é seguida pela passagem sobre a liderança formada pelos cinco
ministérios, e seu papel é levar à unidade e maturidade em Efésios
4.11-15. Assim, podemos começar a pensar na unidade da fé.

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Unidade do Corpo: utopia ou realidade? 73

Conforme dissemos em nosso livro, Reconciliação: O Segundo


Toque:41
Davi foi uma autoridade legítima, ungida por Deus, com o
coração voltado para o Senhor. Ele ouviu a Deus e, assim, pôde
passar a visão, preparar materiais e preparar a nova geração.
Quem seria o Davi dos nossos dias? Novamente, o Novo Tes-
tamento tem a chave para o Velho Testamento. Paulo fala sobre
a unidade do Espírito até chegar à unidade da fé:

Efésios 4.11-16: “E ele mesmo concedeu uns para apóstolos,


outros para profetas, outros para evangelistas e outros para pas-
tores e mestres, com vistas ao aperfeiçoamento dos santos para o
desempenho do seu serviço, para a edificação do corpo de Cristo,
até que todos cheguemos à unidade da fé e do pleno conheci-
mento do Filho de Deus, à perfeita varonilidade, à medida da
estatura da plenitude de Cristo, para que não mais sejamos como
meninos, agitados de um lado para outro e levados ao redor por
todo vento de doutrina, pela artimanha dos homens, pela astúcia
com que induzem ao erro. Mas, seguindo a verdade em amor,
cresçamos em tudo naquele que é a cabeça, Cristo, de quem todo
o corpo, bem ajustado e consolidado pelo auxílio de toda junta,
segundo a justa cooperação de cada parte, efetua o seu próprio
aumento para a edificação de si mesmo em amor” (grifos nossos).

Esse texto bíblico nos mostra que, para chegarmos à unidade da


fé, para que o Corpo cresça ligado, para a edificação do Corpo,
precisamos estar fundamentados em apóstolos e profetas e ou-
tros ministérios. A unidade desses dons, com a participação de
profetas dando direção para a Igreja, apóstolos para a implanta-
ção desse processo, assim como pastores, mestres e evangelistas,
leva-nos a uma autoridade legítima, bíblica.

41
MARION, José Carlos e Márcia. Reconciliação: O Segundo Toque. Ibid.

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74 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

Vemos, no texto acima, o alvo dos cinco ministérios: “O


aperfeiçoamento dos santos para o desempenho do seu ser-
viço, para edificação do corpo de Cristo”. Os santos não são
aperfeiçoados para sentir-se alegres por ir para o céu. Antes,
são aperfeiçoados para uma obra ou serviço - a edificação do
Corpo. Não são três os alvos - aperfeiçoamento, ministério e
Corpo de Cristo -, mas um só. O aperfeiçoamento dos santos
é para a obra do ministério que, por sua vez, é para edificar
o Corpo. O alvo é a edificação do Corpo, e o meio são os
santos - cada um com o seu ministério. Então, o ministério
de edificação do Corpo não é só para os apóstolos, profetas,
evangelistas, pastores e mestres, mas também para todos os
santos. Nesse contexto, os cinco ministérios são os meios
que preparam os santos (todos os membros do Corpo) para
desempenharem seu serviço ou ministério a fim de edificar o
Corpo (grifos nossos).

John Walker completa o nosso ensamento acima:42


Por fim, o “...pleno conhecimento do Filho de Deus...”. O ponto de
vista de Deus sobre “conhecer” é diferente do nosso. Para nós,
conhecimento é algo fora de nós - estudar, ler, ser treinado até
saber uma coisa. Mas na Bíblia, quando o homem conhece sua
esposa, um filho é gerado! Não é um processo mental, mas uma
união íntima e real que produz uma nova vida. Conhecer Jesus,
então, é fazer parte dele, unir-se com ele. Conhecer a verdade
de Deus é participar da verdade, tê-la dentro de nós ou estar
dentro dela. Por isso, para conhecer Jesus, participamos do seu
corpo e sangue na ceia. Através de conhecê-lo (desta maneira),
nos tornamos “homem perfeito”. Ser homem perfeito é alcançar
“a medida da estatura da plenitude de Cristo” - a maturidade.

42
WALKER, John. Um Estudo Microscópico em Efésios. Ibid.

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Unidade do Corpo: utopia ou realidade? 75

E, aqui, o ciclo se completa, porque chegar à maturidade pode


ser o mesmo que chegar à unidade da fé – a igreja unida em
comunhão com Deus e com os irmãos, Cristo em sua plenitude
incluindo a Cabeça e o Corpo, a Igreja gloriosa, a Casa de Deus.
Este é o alvo dos cinco ministérios.

Rubens Gonçalves, em um de seus artigos, faz o seguinte


questionamento:43
A pergunta que surge é a seguinte: Será que a Igreja de Cristo ne-
cessita de apóstolos e profetas em nossos dias? Obviamente que sim!
Esses ministérios são dons de Deus no aperfeiçoamento do Corpo
para o desempenho do seu ministério (Efésios 4.8-16). Eles são
necessários e precisam funcionar para estabelecer um firme funda-
mento baseado nas Escrituras Sagradas. Esses ministérios estarão em
atividade até que o Corpo de Cristo amadureça na unidade prevista
pela oração sacerdotal de Jesus em João 17.21-23.

Assim, pensar em operacionalizar a Igreja com base nos cinco


ministérios não é uma tarefa fácil, mas também não é impossível.
No capítulo 7, damos um exemplo real de como o ministério
quíntuplo está em execução em Jundiaí.
Concluímos este capítulo ressaltando a “preservação da
unidade do Espírito”. No capítulo 10, tratamos de uma co-
munidade que, há mais de 40 anos, com aproximadamente 12
denominações cristãs diferentes, vive em unidade. Ela usa um
recurso importante que é denominado de “cortesia ecumênica”44,
cortesia na unidade do Espírito, com base na seguinte afirmação:
“Nas coisas essenciais (Cristo como centro), a unidade; nas coisas
não essenciais, a liberdade; em todas as coisas, o amor”.
43
GONÇALVES, Rubens. Ministérios Apostólicos – Um título, grife ou função?
Site: www.facebook.com/pages/Café-em-Comunhão, 11/07/2015
44
Anais do Encristus 2014. Solícitos em conservar a unidade no vínculo da paz. Rio
de Janeiro/RJ, 18-19 de outubro de 2014, pp. 11,12.

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76 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

1. Nas coisas essenciais, a unidade.


O que é essencial para nós? Jesus mesmo deu essa dica quando
disse a Maria que ela escolhera a melhor parte:
Indo eles de caminho, entrou Jesus num povoado. E certa mulher,
chamada Marta, hospedou-o na sua casa. Tinha ela uma irmã,
chamada Maria, e esta quedava-se assentada aos pés do Senhor
a ouvir-lhe os ensinamentos. Marta agitava-se de um lado para
outro, ocupada em muitos serviços. Então, se aproximou de Jesus
e disse: Senhor, não te importas de que minha irmã tenha deixado
que eu fique a servir sozinha? Ordena-lhe, pois, que venha ajudar-
-me. Respondeu-lhe o Senhor: Marta! Marta! Andas inquieta e te
preocupas com muitas coisas. Entretanto, pouco é necessário ou
mesmo uma só coisa; Maria, pois, escolheu a boa parte, e esta não
lhe será tirada (Lucas 10.38-42).

O essencial para nós é ter uma só coisa – Cristo como Senhor


da nossa vida! É entender que sua morte e ressurreição nos trouxe-
ram vida em abundância, e, por meio delas, recebemos o Espírito
Santo, o Espírito da unidade.
Cristo é a coisa mais essencial do universo. A Palavra diz que
“ele é antes de todas as coisas. Nele, tudo subsiste” (Colossenses 1.17).
Que coisa tremenda! Quando vou ingerir um medicamento,
sempre oro: “Jesus, sei que o princípio ativo deste medicamento
vem do Senhor, pois tudo subsiste em ti. Mesmo que não tenha
fé para orar por cura, sei que este medicamento é um instrumento
teu”. Não há nada que não venha de Jesus. “Ele, que é o resplendor
da glória e a expressão exata do seu Ser, sustentando todas as coisas
pela palavra do seu poder” (Hebreus 1.3). Ele é antes de todas as
coisas e sustenta todas as coisas. Ele é a essência de tudo! “Porque
dele, e por meio dele, e para ele são todas as coisas. A ele, pois, a glória
eternamente” (Romanos 11.36).

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Unidade do Corpo: utopia ou realidade? 77

2. Nas coisas não essenciais, a liberdade.


Dentro de nossa herança religiosa, temos tradições diferentes
e podemos ter paz e liberdade para fazer o que a tradição diz. Por
exemplo, nem todo cristão é obrigado a usar a mesma tradução
da Bíblia. Uns preferem a Nova Jerusalém, outros a Nova Versão
Internacional e outros a de João Ferreira de Almeida. É por meio
dessas diversidades que enriquecemos a unidade.
Se o mundo foi criado em sete dias ou em sete milhões de
anos, isso não é essencial, não muda em nada a nossa salvação.
Certos debates teológicos apenas entristecem o Espírito Santo.
Algumas coisas, só entenderemos quando alcançarmos a unidade
da fé (Efésios 4.13), que vem depois da unidade do Espírito. A
unidade da fé deve ser buscada e conquistada, enquanto a unidade
do Espírito já existe e precisa ser preservada e cuidada.
Eu não correria o risco de dar mais exemplos (no capítulo 10,
abordaremos este assunto). Porém, existem discussões acaloradas
entre denominações cristãs que, no fundo, não afetam a salvação
vinda de Jesus Cristo. A comunhão e o amor são mais relevantes
do que certos aspectos doutrinários.

3. Em todas as coisas, o amor.


Existem coisas que são essenciais; por exemplo, sentar-se à mesa
para partir o pão. A forma como o fazemos pode variar conforme
as nossas tradições ou o nosso entendimento da ceia (eucaristia).
Nesse caso, em vez de criticar e condenar quem faz diferente,
devemos amar (novo mandamento). Será que Deus se preocupa
com detalhes de como fazemos certas coisas? Claro que não, pois
acima de tudo está o amor. O importante é que tudo aponte para
Cristo, para quem todas as coisas devem convergir!

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Capítulo 4
POR QUE EXISTEM TANTAS DIVISÕES:
ALGUNS ASPECTOS

U
ltimamente, temos observado divisões radicais no Islã
originadas pelas interpretações diferentes do Corão.
Uma das extremidades que provocam terror sangui-
nário afirma estar em consonância com os ensinamentos do
fundamentalismo mulçumano. Por outro lado, dentre outros
seguidores do Corão, há reações garantindo que a violência
não tem absolutamente nada a ver com a religião revelada a
Maomé há 1.400 anos. Dizem que o “Islã é a religião da paz
e quem comete atrocidade em seu nome está desvirtuando seus
fundamentos”.
Se isso é verdade, como pode um mesmo livro levar a situa-
ções tão extremas? Segundo o cientista político egípcio Hamed
Abdel-Samad45, que afirma haver semelhanças entre o nazismo
e o fundamentalismo islâmico, quando o Corão é aplicado
sem nenhuma relativização, o resultado é sempre um regime
fascista, como o do Irã. O Hamas fez isto na Faixa de Gaza. A
mesma coisa também aconteceu na Somália e no Sudão. Não
42
Revista Veja. São Paulo/SP, Edição de 14/01/2015.

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80 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

há espaço para a democracia quando se faz essa interpretação


do Corão. O Islã diz que as leis são as leis de Deus, e isso não
é negociável.

Acontece a mesma coisa em relação à Bíblia


Não há dúvida de que a Igreja teve momentos de radicalismo
como a Inquisição, na Idade Média, com torturas, fogueiras e
tantas perversidades, sendo que há quem afirme que poderia ter
chegado a milhões de execuções. A Inquisição foi a maneira mais
bárbara de divulgar ideias, pois não permitia nenhuma forma de
contestação.
Assim como os católicos, na Inquisição, os protestantes
também, na Idade Moderna, perseguiram os fiéis, com direi-
to a torturas, execuções e espionagem da “polícia da fé” por
crimes como adultério, discordância dos dogmas protestantes
e bruxarias. Lutero perseguiu os anabatistas (que defendiam
o batismo válido apenas para adultos). Segundo o professor
Ângelo Adriano Faria de Assis46, essa discordância com rela-
ção ao batismo causou expulsão, encarceramento, tortura e
execução de milhares de pessoas. Lutero também perseguiu e
divulgou textos com críticas aos judeus. Estes escritos teriam
sido utilizados pela Alemanha nazista em pleno século 20.47
Da mesma forma, Calvino, na Suíça, promovia confissões,
denúncias, espionagens e visitas a residências, levando muitos
a prisões, torturas, julgamentos e, em alguns casos, à morte.
Muitos foram lançados à fogueira por ter sido conside-
rados hereges, por ter posições consideradas antibíblicas. É
interessante pensar como tudo isso é exatamente o oposto aos
ensinamentos de Jesus.
46
Site: www.revistadehistoria.com.br.
47
Há algumas afirmações neste sentido, mas não temos plena convicção disso.

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Por que existem tantas divisões: alguns aspectos 81

Segundo Kris Vallotton48, durante a Guerra Civil Ameri-


cana, muitos cristãos devotos lutaram a favor da escravidão.
Estes cristãos pegaram textos das Escrituras, como a epístola de
Paulo aos Colossenses, para dizer que tinham o direito dado por
Deus de escravizar pessoas: “Escravos, obedeçam em tudo os seus
senhores terrenos, não somente para agradá-los quando eles estão
observando, mas com sinceridade de coração, pelo fato de vocês
temerem o Senhor” (Colossenses 3.22). “Senhores, deem aos seus
escravos o que é justo e direito, sabendo que vocês também têm um
Senhor nos céus” (Colossenses 4.1). Infelizmente, eles entenderam
erroneamente essas passagens, e 620 mil pessoas morreram em
uma guerra civil para esclarecer tal equívoco.
Divisões surgem, às vezes, por uma questão de interpretação da
Bíblia (“A letra mata, mas o Espírito vivifica”; 2 Coríntios 3.6). Os
teólogos chamam isso de “hermenêutica pobre ou equivocada”.
Hermenêutica é a ciência de interpretar as Escrituras. Tirar um
verso do seu contexto, ignorar o contexto do capítulo ou livro,
o desconhecimento do contexto histórico e cultural, interpretar
certo texto ao pé da letra sem entender o espírito da Palavra (o
grande problema das divisões) são alguns exemplos disso. Imagine
se obedecêssemos literalmente à sugestão de Jesus de arrancar um
olho e cortar a mão direita (Mateus 5.29,30).
Quando Augustus Nicodemus49 fala sobre a questão de formar
líderes e pastores, diz que pode haver o risco de más interpretações
bíblicas se não houver uma adequada supervisão. Diz ele que “a
Bíblia, como instrumento de trabalho destes líderes, foi escrita há
dois mil anos em grego, hebraico e aramaico, numa cultura bastante
diferente da nossa. Um livro que tem sofrido nas mãos dos intérpretes

48
VALLOTTON, Kris. Chuva Abundante – Como podemos transformar o mundo
que nos cerca. Ibid.
49
NICODEMUS, Augustus. Polêmicas na Igreja. São Paulo/SP: Editora Mundo
Cristão, 2015.

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82 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

durante milênios e é reivindicado como base para toda sorte de heresias


e ensinamentos estranhos”. Ele defende a necessidade de preparo
para a liderança, de estudos, discipulado, comparações, leituras,
maturidade, humildade, santidade, oração e submissão a Deus.
É triste pensar que, da própria interpretação da Bíblia, surgem
tantas divisões.

As primeiras divisões na Igreja Primitiva


Qual foi a primeira tensão ocorrida na comunidade cristã? A
primeira polarização foi entre os judeus messiânicos de língua
hebraica em Israel e os imigrantes e convertidos ao judaísmo
cristão de língua grega (veja Atos 2.5-11.)


Ora, naqueles dias, multiplicando-se o número dos discípulos, houve
murmuração dos helenistas contra os hebreus, porque as viúvas deles
estavam sendo esquecidas na distribuição diária (Atos 6.1).

As tensões entre os dois “subgrupos” estavam relacionadas


a duas questões fundamentais: língua e dinheiro. Qual língua
seria usada nas discussões entre os responsáveis pelas decisões
importantes? Quais seriam os padrões para a distribuição do di-
nheiro doado à comunidade? Por incrível que pareça, segundo
Asher Intrater50, essas questões estão entre os principais desafios
que afetam a cooperação nas congregações e ministérios em
Israel nos dias de hoje.
Todavia, a igreja como Corpo de Cristo teve sua unidade
ameaçada na igreja de Corinto. Paulo trata esta divisão como
inaceitável em 1 Coríntios 1.10-18:
Rogo-vos, porém, irmãos, pelo nome de nosso Senhor Jesus
Cristo, que digais todos uma mesma coisa, e que não haja entre
vós dissensões; antes sejais unidos em um mesmo pensamento e

50
Boletim semanal Revive Israel. Site: www.reviveisrael.org., 2013.

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Por que existem tantas divisões: alguns aspectos 83

em um mesmo parecer. Porque a respeito de vós, irmãos meus,


me foi comunicado pelos da família de Cloé que há contendas
entre vós. Quero dizer com isto, que cada um de vós diz: Eu
sou de Paulo, e eu de Apolo, e eu de Cefas, e eu de Cristo.
Está Cristo dividido? Foi Paulo crucificado por vós? Ou fostes
vós batizados em nome de Paulo? Dou graças a Deus, porque
a nenhum de vós batizei, senão a Crispo e a Gaio, para que
ninguém diga que fostes batizados em meu nome. E batizei
também a família de Estéfanas; além destes, não sei se batizei
algum outro. Porque Cristo enviou-me, não para batizar, mas
para evangelizar; não em sabedoria de palavras, para que a cruz
de Cristo se não faça vã.

Se a Igreja é o Corpo de Cristo, é absurdo pensar em ser


de Apolo (embora fosse um notável líder cristão), ou de Pe-
dro (um dos doze apóstolos de Jesus), ou de Paulo. Quando
um quarto grupo confessa ser de Cristo, parece que algumas
pessoas não querem filiar-se a nenhum dos outros três grupos,
afirmando seguir a Cristo e a ninguém mais. Paulo afirma
que até esses são carnais, talvez justamente porque podem
se julgar superiores aos outros por não seguir a ninguém a
não ser Cristo.
Continuando esse mesmo assunto, no capítulo 3.1-9, Pau-
lo volta a falar sobre as dissenções, alegando que se devem à
falta de espiritualidade, chamando aqueles que fazem divisão
de carnais, sem revelação, crianças na fé cristã. Essas pessoas
achavam que seu líder (Apolo, ou Pedro, ou Paulo) era mais
importante do que os outros.
Este comportamento não deveria ser característico do cristão,
pois é assim que o mundo faz - tem preferências pessoais, ciúme,
contendas, brigas e despreza o essencial:

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84 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

E eu, irmãos, não vos pude falar como a espirituais, mas como a
carnais, como a meninos em Cristo.Com leite vos criei, e não com
carne, porque ainda não podíeis, nem tampouco ainda agora podeis,
porque ainda sois carnais; pois, havendo entre vós inveja, contendas
e dissensões, não sois porventura carnais, e não andais segundo os
homens? Porque, dizendo um: Eu sou de Paulo; e outro: Eu de
Apolo; porventura não sois carnais? Pois, quem é Paulo, e quem
é Apolo, senão ministros pelos quais crestes, e conforme o que o
Senhor deu a cada um? Eu plantei, Apolo regou; mas Deus deu o
crescimento. Por isso, nem o que planta é alguma coisa, nem o que
rega, mas Deus, que dá o crescimento. Ora, o que planta e o que
rega são um; mas cada um receberá o seu galardão segundo o seu
trabalho. Porque nós somos cooperadores de Deus; vós sois lavoura
de Deus e edifício de Deus (1 Coríntios 3.1-9).

Cristãos carnais, que fazem divisão, são como pessoas que


seguem as normas e os costumes do mundo e não são guiadas
pelo Espírito Santo. Também, as pessoas que dividem, apesar do
que dizem os versos acima, acham que têm a direção de Deus. No
capítulo 12 de 1 Coríntios, Paulo nos ensina que os membros do
corpo trabalham em cooperação para o bem do corpo inteiro. A
Igreja é o Corpo do Cristo ressuscitado, e, por meio dela, Cristo
vive e age no mundo.
Assim como os apóstolos evitaram que a primeira dissenção
em Atos 6 se tornasse uma divisão, oramos para que também
nós, homens de Deus, cheios do Espírito Santo, possamos ter
a sabedoria do alto para impedir que, em nossos dias, a divisão
continue a se disseminar em progressão geométrica. Certamente,
o Espírito Santo de Deus completará essa obra a fim de que
sejamos uma única Noiva (gloriosa) para a volta de Cristo.
A divisão da igreja de Corinto é um antiexemplo descrito
no Novo Testamento. Mostra como não devemos cair na

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Por que existem tantas divisões: alguns aspectos 85

mesma armadilha. Muitos irmãos têm comentado sobre esse


assunto. Por exemplo, Douglas Pinheiro51 diz:52
A segunda carta do apóstolo Paulo aos Coríntios foi escrita em
um contexto de profundo conflito. Aquela comunidade já possuía
uma inclinação às divisões internas. O egoísmo do velho homem já
latejava nos corações daqueles irmãos. Assim, o tema de fundo de
toda a carta era a unidade, visando que era uma comunidade que
estava muito dividida.

Primeiro, havia divisão porque uns estavam apegados a certos pre-


gadores, e outros a alguns ditos “superapóstolos”. Cada um fazia o
seu próprio “partido” (1 Coríntios 1.11-13).

Segundo, estavam divididos quanto à moralidade (1 Coríntios 5).


Havia um irmão pecando por incesto no meio da comunidade
criando cizânia (discórdia), querela, divisão.

Terceiro, estavam divididos em relação à ceia. Uns se esbanjavam na


ceia enquanto outros ficavam sem comer.

Quarto, divididos quanto aos dons espirituais: uns querendo se


sobressair em relação aos outros, e aquilo que era para ser uma
manifestação do Espírito acabou virando um espírito “de porco”
dividindo toda a comunidade, a ponto de Paulo enviar a carta para
exortá-los à unidade.

Foi nesse contexto que Paulo lhes escreveu essa segunda carta
e, dentre tantas exortações, disse-lhes que “Cristo nos conf iou o
ministério da reconciliação” (5.18). Ao “pé da letra” Paulo estava
se referindo a ele mesmo, ao ministério que Deus lhe havia
confiado.

51
Douglas Pinheiro é teólogo, professor e padre diocesano em Vargem Grande
Paulista/SP.
52
Anais do Encristus 2014. Ele pôs em nossos lábios a palavra de reconciliação.
Cachoeira Paulista/SP, Canção Nova, 14-16 de março de 2014, pp. 40,41.

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86 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

Vemos, assim, que a chamada Igreja Primitiva, antes da queda


de Jerusalém (ano 70), já vivia sinais de divisão. Porém, como
veremos no capítulo 11, esta Igreja deixa algumas “chaves” im-
portantes para buscar a unidade em nossos dias.

A perda do componente judaico na Igreja


Segundo o entendimento do arquidiácono Johannes
Fichtenbauer53 e diversos judeus messiânicos54, houve, já no
século terceiro, a separação entre os líderes gentios da igreja e
as congregações dos judeus messiânicos. Veja a descrição feita
por Johannes:
Começou, em pouco tempo, a haver uma atmosfera antijudaica em
todo o Império Romano como resultado das guerras dos judeus
com os romanos. Satanás sabia da importância e necessidade dessa
unidade dos dois componentes da Igreja e precisava, então, separá-
-los a fim de enfraquecer a parte horizontal da salvação. O diabo
sabia que mesmo tendo Jesus morrido e ressuscitado, isso não teria
tanto poder e importância desde que ele conseguisse destruir o fato
dos gentios e judeus cristãos serem UM. Isso porque essa unidade
representa a reconciliação e salvação da humanidade com Deus.

No ano 70 d.C. os judeus se revoltaram contra os romanos, que des-


truíram seu templo. Em 135 d.C. os judeus voltaram e reconstruíram
a cidade (a rebelião de Bar Kochba). Tempos depois, os romanos
novamente destruíram a cidade inteira de Jerusalém e dispersaram
os judeus (a Grande Diáspora). A partir daí os judeus passaram
a ser odiados pelos romanos e pelas nações. Ninguém queria ser
identificado como judeu; a reputação de alguém ficava manchada
quando era reconhecido como sendo amigo de um judeu.
53
Johannes Fichtenbauer é arquidiácono na cidade de Viena, na Áustria, e trabalha
com o Cardeal Schoenborn. É o líder europeu do Movimento Judaico Messiânico.
54
Um deles é Daniel C. Juster, Th.D., que, em seu livro That They May Be One
(Lederer Books, Carksville, Maryland), também cita outros.

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Por que existem tantas divisões: alguns aspectos 87

Isso se tornou muito problemático para todos os judeus, ortodoxos


e messiânicos, pois esse ódio dos romanos contaminou também os
cristãos gentios, que eram mais simpatizantes do Estado Romano.
Assim, eles se distanciaram dos judeus messiânicos. Não os con-
vidavam mais para as reuniões conjuntas ou aos seus líderes para
discussões teológicas. Já no 3º século, os líderes gentios separaram-se
das congregações judaica-messiânicas e, no fim do 4º século, a parte
judaica da igreja quase não existia mais. Restava somente a igreja
gentílica sem o componente judaico.

Para justificar esse acontecimento, os líderes da igreja gentílica cria-


ram uma teoria: a “Teologia da Substituição”, que dizia o seguinte:

a) visto que os judeus mataram a Jesus, Deus se irritou com eles e


revogou sua aliança com os mesmos;

b) como punição, Israel não era mais o povo de Deus;

c) a igreja dos gentios agora é o Novo Israel, o povo de Deus; não


pelo sangue, não pela carne, mas pelo Espírito, e agora “muito melhor”;

d) a parte gentílica deveria separar-se definitivamente da parte


judaica (o “cisma original”’), pois não precisavam mais dos mesmos.

Essa era, então, uma Teologia muito “perfeita” e que matou de


vez a unidade entre os componentes da aliança original. Todos os
principais líderes das igrejas dos primeiros séculos pregavam essa
Teologia. Alguns exemplos:

• A “Carta de Barnabé” (cerca de 100 d.C.) afirma: “Todos os


judeus perderam o seu direito de primogenitura e estão fora da
Igreja, porque seus líderes mataram a Cristo”.

• Irineu, o mais famoso bispo de Lyon (cerca de 195 d.C.) diz:


“Não será mais permitido aos cristãos viverem uma vida judaica
– ou é judeu ou é discípulo de Cristo”.

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88 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

• Orígenes (cerca de 254 d.C.) fez distinção entre “o velho Israel


segundo a carne” e o “verdadeiro Israel” segundo o Espírito,
que é a Igreja.

• Ambrósio (cerca de 397 d.C.) incitou seus seguidores cristãos


a queimarem as sinagogas judaicas para “ajudar a Deus na obra
de julgamento e purificação da Igreja”.

• João Crisóstomo (cerca de 407 d.C.) dizia que os cristãos não


deveriam ter nada a ver com os judeus, pois “era perigoso serem
contaminados pela sua doença espiritual”.

O imperador Constantino (após 300 d.C.), ao tomar o poder


e libertar a Igreja do jugo romano, disse aos bispos que daria à
Igreja o direito de governar o Império e que os mesmos seriam
seus parceiros. Entretanto, havia um preço: eliminar todos os
judeus do meio da Igreja. E, por causa dessa pressão, toda a raiz
judaica desapareceu de dentro da Igreja e ela perdeu todo o seu
componente judaico. Havia todo um ensino, uma legislação a
esse respeito, que se resumia no seguinte:

• Completa separação entre judeus e cristãos. Qualquer ele-


mento judaico deveria ser removido da Igreja e das suas
celebrações, inclusive a data da Páscoa. Aos cristãos, não
era permitido casar-se com judeus, ter amigos judeus, orar
juntos, etc.

• Os judeus perderiam toda a sua influência na sociedade cristã


e, no final, perderiam também seus direitos civis.

• Os judeus que quisessem ser batizados deveriam primeiro


renunciar a todo seu judaísmo e tornar-se gentios.

Mesmo que a Igreja normalmente não permitisse matar judeus


(ensinamento de Agostinho), eles eram objetos de ódio e de perse-
guição dos cristãos. Assim, a Igreja foi roubada da sua base, da sua

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Por que existem tantas divisões: alguns aspectos 89

fundação. Essa foi a primeira grande divisão na história da Igreja,


que foi seguida de muitas outras posteriormente, todas seguindo
o mesmo “método”, a Teologia da Substituição, que funcionava
assim: a igreja antiga (Israel) não era mais digna de representar a
Deus e deveria ser substituída por uma nova igreja, até que viesse
uma outra igreja mais nova ainda, e assim por diante.

É por esse motivo que hoje existem mais de 33.000 denominações


ou organizações cristãs diferentes no mundo e cada uma julga
ser a correta, a solução ou resposta de Deus para os problemas
do mundo. Este é o vírus mortal da divisão. Quem pode parar
isso? Como essa divisão pode ser curada? Como o Ecumenismo
Espiritual pode funcionar para ajudar no processo de unidade?
Precisamos entender algo: esse Ecumenismo não irá funcionar se
quisermos consertar o problema apenas pelos sintomas. A única
solução é voltar ao início e curar a primeira divisão. Enquanto
isso não acontecer estamos perdendo tempo.

Alguns fatores de divisões na Igreja

A mesa do Senhor
A Reforma Protestante do século 16 foi um dos aconteci-
mentos que marcaram a história da Igreja, a ponto de dividir
o cristianismo ocidental entre católicos e protestantes. Não
muito tempo depois, houve uma discussão que causou o
primeiro grande cisma entre os próprios reformadores e seus
seguidores.
A visão dos líderes da Reforma – Martinho Lutero, Ulrich
Zwínglio e João Calvino –sobre o sentido bíblico da santa
ceia, ou eucaristia, era divergente uma da outra, causando
divisão entre esses reformadores. Essa divisão repercute até
hoje com controvérsia nas igrejas evangélicas.

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90 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

Os pesquisadores Edson Pereira Lopes e Janniere Villaça da


Cunha Fernandes55 levantaram dados em cinco igrejas cristãs
evangélicas de diferentes denominações da capital paulistana. Essas
igrejas foram selecionadas por meio de suas respectivas instituições,
com a finalidade de salvaguardar sua identidade local.
Assim, compõem essa amostra: 1) Igreja Presbiteriana do
Brasil, localizada na zona leste de São Paulo; 2) Igreja Lute-
rana, localizada no Tremembé; 3) Igreja Batista, localizada no
bairro da Água Branca; 4) Igreja Pentecostal Assembleia de
Deus, ministério Belém, localizada no bairro de Vila Zilda;
5) Igreja Evangélica Apostólica Renascer em Cristo, locali-
zada no bairro do Tatuapé. Houve a preocupação em colher
dados das confissões de fé, dos tratados e dos estatutos dessas
comunidades com o objetivo de correlacionar suas crenças
relativas à santa ceia com a interpretação dos reformadores
Lutero, Zwínglio e Calvino.
Antes de entrarmos na pesquisa, é interessante lembrar que
há várias óticas acerca da ceia. Por exemplo, a Igreja Católica
crê na “transubstanciação”:
Transubstanciação é a conjunção de duas palavras latinas: trans
(além) e substantia (substância), e significa a mudança da substância
do pão e do vinho na substância do corpo e sangue de Jesus Cristo
no ato da consagração. Isto significa que esta doutrina defende e
acredita na presença real de Cristo na Eucaristia.56

Já as igrejas ortodoxa, anglicana, luterana e calvinista creem


na presença real de Jesus, mas não na transubstanciação. A
crença da transubstanciação se opõe à da “consubstanciação”,
pregada pela grande maioria das igrejas evangélicas:

55
Revista Ciências da Religião – História e Sociedade, volume 6, nº 2, 2008.
56
Site: https://pt.wikipedia.org/wiki/Transubstanciacao.

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Por que existem tantas divisões: alguns aspectos 91

Consubstanciação é a crença na presença espiritual de Jesus


nas espécies do pão e do vinho. Significa que Jesus se encontra
presente COM a substância do pão e do vinho sem, entretanto,
modificá-las ou transformá-las. O corpo e o sangue se juntam ao
pão e vinho, porém, a substância do pão permanece, juntamente
com sua aparência. 57

Harold Walker58 afirma o seguinte:59


Não estamos comendo algo transformado misticamente, porque
continua sendo pão e vinho, mas também não estamos comendo
e tomando apenas símbolos. Estamos ingerindo uma realidade
espiritual que só acontece quando obedecemos com coisas naturais,
coisas visíveis. Eu preciso dizer que a minha fé não é apenas espiri-
tual, mas também é física e irá mudar a minha vida física também.
Não é apenas meu espírito que é salvo; o meu corpo e a minha alma
também o são.

Deus nos deu essas coisas, essas matérias, o pão e o vinho, para que
possamos receber a vida de Jesus. Não são apenas símbolos, mas são
vida, porque estamos obedecendo à Palavra de Deus.

Por fim, há denominações cristãs que tratam os elemen-


tos da ceia como símbolos, isto é, aquilo que representa
ou sugere algo; aquilo que serve para evocar algo; um sinal
representativo.
As perguntas componentes da pesquisa foram elaboradas no
contexto dos debates dos reformadores.
57
Site: http://predmilson-perguntas.blogspot.com.br/2009/06/transubstanciacao-
-e-consubstanciacao.html.
58
Harold Walker é de Los Angeles/EUA e imigrou para o Brasil aos 7 anos de ida-
de. Palestrante, pastor, autor, editor, conferencista e empresário. Administrador da
Empresa Revista Impacto e da Escola Cristã Jundiaí, SP.
59
WALKER, Harold. Compreendendo a Ceia do Senhor. Ministração proferida na
UCM – Unidade Cristã Missionária, Jundiaí/SP, em 05/04/2015.

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92 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

1. Para você, o que é santa ceia?


b. Participação simbólica e memorial do corpo e do
sangue de Cristo.
c. Participação real do corpo e do sangue de Cristo de
forma espiritual.
d. Participação literal do corpo e do sangue de Cristo
de forma espiritual.

2. O que acontece com o pão e o vinho na hora da santa ceia?


a. Transformam-se simbolicamente no corpo e no
sangue de Cristo.
b. Transformam-se espiritualmente no corpo e no
sangue de Cristo.
c. Transformam-se literalmente no corpo e no sangue
de Cristo.

3. Cristo está presente na ceia de que forma?


a. Memorial.
b. Espiritual.
c. Literal.

Quadros de respostas
Tabela 1 – Resultados referentes à primeira pergunta: “Para você,
o que é a santa ceia?”
IGREJA Memorial Espiritual Literal
Igreja Presbiteriana do Brasil 37% 63% 0%
Igreja Evangélica Luterana do Brasil 0% 13% 87%
Igreja Batista Brasileira 65% 29% 6%
Igreja Assembleia de Deus – Belém 70% 17% 13%
Igreja Renascer em Cristo 56% 31% 10%

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Tabela 2 – Resultados referentes à segunda pergunta: “O que


acontece com o pão e o vinho na hora da santa ceia?”
IGREJA Memorial Espiritual Literal
Igreja Presbiteriana do Brasil 37% 63% 0%
Igreja Evangélica Luterana do Brasil 6% 27% 67%
Igreja Batista Brasileira 54% 42% 4%
Igreja Assembleia de Deus – Belém 63% 30% 7%
Igreja Renascer em Cristo 42% 53% 5%

Tabela 3 – Resultados referentes à terceira pergunta: “Cristo


está presente na ceia de que forma?”
IGREJA Memorial Espiritual Literal
Igreja Presbiteriana do Brasil 21% 79% 0%
Igreja Evangélica Luterana do Brasil 13% 13% 74%
Igreja Batista Brasileira 12% 82% 6%
Igreja Assembleia de Deus – Belém 22% 72% 6%
Igreja Renascer em Cristo 11% 81% 8%

Como se observa a partir desta coleta de dados, as divergências


são relevantes num assunto que é o centro do culto dos cristãos;
ou, pelo menos, era na Igreja Primitiva. Estas divergências con-
tribuem sobremaneira para a migração de membros e estimula
(considerando outros aspectos também) novas denominações
“pipocando” todos os dias.
Dessa forma, os pesquisadores concluem:
Diante do que nos é apresentado, tornam-se evidentes “ecos” do
cisma iniciado pela controvérsia entre os reformadores nas igrejas
evangélicas da atualidade, e percebemos que a santa ceia deixou de
ser um tema central nestas. Além da indecisão e incoerência apre-
sentadas nas respostas dadas à pesquisa feita, podemos também ter
como base para essa afirmação a acentuada migração dos evangélicos
para as mais variadas denominações.

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94 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

A respeito da mobilidade religiosa no Brasil, com base na pesquisa


realizada pelo Centro de Estatísticas Religiosas e Investigações
Sociais (Ceris) em 2004, segundo o qual, entre os evangélicos
históricos (batistas, presbiterianos, luteranos e adventistas do
Sétimo Dia) que migraram de suas igrejas, 21,3% continuaram
em outras denominações evangélicas históricas, enquanto 50,7%
migraram para igrejas evangélicas pentecostais (Assembleia de
Deus, Cristã do Brasil, Deus é Amor, Quadrangular, Internacional
da Graça de Deus, Universal do Reino de Deus, O Brasil para
Cristo e outras pentecostais).

Em se tratando dos evangélicos pentecostais que migraram


de suas igrejas, 40,8% continuaram em outras denominações
pentecostais e 40,2% migraram para as igrejas históricas. Com
relação à visão da santa ceia, a impressão que temos é que tan-
to faz para o cristão evangélico ser de qualquer denominação,
até mesmo porque a santa ceia tornou-se um assunto muito
pouco pregado na atualidade e, para muitos, ela é vista como
um simples ritual.

É muito triste concluir que a mesa, que é o centro da


aliança, o ponto principal da unidade, é um fator notório
das divisões do cristianismo.

A falta de perdão

Acho que todos nós cremos que a Reforma foi necessária num
momento sóbrio da igreja cristã. Porém, estudiosos da Palavra,
como Harold Walker, falam abertamente sobre uma “heresia
protestante”:60

60
Esta afirmação de Harold Walker foi feita por ocasião do “Dia do Perdão”, na
UMC – Unidade Missionária Cristã, num culto de reconciliação com pessoas feridas
pela divisão. Veja mais detalhes no capítulo 7. Este mesmo assunto é tratado por
Harold Walker no artigo “Perdão Total”, Impacto Editorial, 01/05/2014.

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Por que existem tantas divisões: alguns aspectos 95

Temos uma bendita herança protestante que recebemos pela


Reforma. Até aquela época as pessoas não tinham pleno co-
nhecimento que o perdão era dado gratuitamente por Deus.
As pessoas se açoitavam, jejuavam, pagavam com sacrifícios
pelos seus pecados e, depois, começaram a pagar em dinheiro
(indulgências). A Reforma trouxe a revelação de que Deus
perdoa o homem por Jesus Cristo, sem merecimento, sem
obras. Homens pagaram com suas vidas por ir contra o sistema
reinante e crer no perdão somente pela graça de Deus.

Entretanto, esses mesmos homens que nos trouxeram essa


tão grande bênção também nos trouxeram uma grande
maldição, porque não se perdoavam nas suas diferenças
doutrinárias. Assim, abriram as comportas para as inú-
meras divisões na igreja protestante. Aqueles que não
concordavam ou pensavam diferente em alguns conceitos
ou doutrinas eram excluídos do meio a que pertenciam.
Isso continua até hoje, trazendo um descrédito à igreja
cristã. Mas a mesma Bíblia que diz que Deus nos perdoa
por meio de Jesus Cristo, também diz que se não perdoa-
mos nossos irmãos, não seremos perdoados. A única coisa
que Deus nos pede é que perdoemos assim como fomos
perdoados. Assim, a graça da Reforma que foi revelada
pela obra de Cristo virou a “desgraça da Reforma” por
causa das nossas divisões, brigas, contendas e atitudes
sectárias uns para com os outros, o que tem causado um
fruto muito amargo (grifos nossos).

Isto é tão notório hoje, que vemos alguns tele-evangelistas


fazendo críticas abertas, publicamente ou pela televisão e
internet a irmãos de outras denominações. Não raramente,
observamos um pastor usando o púlpito para fazer críticas
contundentes a outras congregações.

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96 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

Em seu artigo “Perdão – A Essência do Evangelho”61, Chris-


topher Walker62, citando Philip Yancey63, relata:
Em qualquer igreja, comunidade ou família espiritual hoje, acharía-
mos pessoas rejeitadas e amarguradas porque não encontraram entre
os seguidores de Jesus aquele perdão que foi anunciado inicialmente
no Evangelho. Se Deus perdoa de forma tão ampla e gratuita, por
que seus filhos têm tanta dificuldade para fazer o mesmo?

Charles Williams disse o seguinte a respeito da Oração do Pai


Nosso: “Nenhuma expressão carrega maior possibilidade de terror
do que as palavras assim como nessa cláusula”. O que torna o “assim
como” tão aterrorizante? O fato de que Jesus simplesmente conecta
nossa absolvição pelo Pai ao nosso perdão contínuo aos outros seres
humanos.

Yancey exclama em seu livro: “O que torna o perdão tão importante


para que seja o ponto central de nossa fé?” É justamente para quebrar
esse ciclo interminável de não-graça e justiça humana que vem nos
escravizando, desde a entrada do pecado. É por isso que perdão faz
parte da própria essência do Evangelho, da missão divina de intervir
na história humana e nos introduzir na família de Deus. Não fomos
chamados para ser salvos e continuar presos em nossos próprios
padrões de certo e errado, acertando contas uns com os outros e
esperando que o outro tome iniciativa para pedir desculpa, quando
erra. Fomos chamados para uma natureza superior, para carregarmos
a semelhança do Filho de Deus.

Se não pudermos viver esse perdão uns com os outros, devemos


reavaliar a nossa própria relação de perdoados diante de Deus. Não

61
WALKER, Christopher. “Perdão, a Essência do Evangelho”. Revista Impacto.
Americana/SP: Editora Impacto Editorial, edição 52.
62
Christopher David Walker é pastor e mestre da Palavra, diretor e editor da Revista
Impacto, Americana/SP, filho de John Walker, nascido em Bloomington (Califórnia).
63
YANCEY, Philip. Maravilhosa Graça. São Paulo/SP: Editora Vida, 1999.

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Por que existem tantas divisões: alguns aspectos 97

adianta anunciarmos as boas novas aos outros, se não as experimen-


tarmos verdadeiramente em nossas próprias vidas.

Em última análise, o perdão é um ato de fé. Perdoando a outra pessoa,


estou confiando que Deus é um juiz melhor do que eu. Perdoando,
abandono meus próprios direitos de me vingar e deixo toda a questão
da justiça nas mãos divinas. Deixo nas mãos de Deus a balança que
deve pesar a justiça e a misericórdia. Embora o mal não desapareça
quando perdoo, ele perde o seu poder sobre mim e é assumido por
Deus, que sabe muito bem o que fazer.

A falta de entendimento da Trindade


Tenho visto que, no meio evangélico, muito pouco se ensina sobre
a Trindade. Pense na última pregação que você fez ou ouviu sobre
esse assunto. É provável que não se lembre.
Como nós poderíamos interpretar a afirmação de Jesus:
“Eu estou no Pai, ele está em mim, eu estou em vocês e vocês
estão em mim” (João 14.20)? Em seu livreto A Dança da
Trindade64, Christopher Walker, para representar a Trindade,
usa o termo pericorese, que vem de duas palavras gregas:
peri (em volta, ao redor) e chorein (dar lugar, abrir espaço
ou rodar, da qual vem também a palavra coreografia). Na
teologia, essa palavra significa “coabitação, compartilhar
completamente a vida um do outro sem, contudo, perder
a identidade”. Cada pessoa da Trindade se entrelaça com-
pletamente com as outras, contém e envolve as outras e, ao
mesmo tempo, é contida por elas.
Depois de demonstrar o aspecto admirável da Trindade no qual
um entra no outro, mistura-se com o outro, se entrelaça com o
outro sem perder a unidade, o autor diz:
64
WALKER, Christopher. A Dança da Trindade. Americana/SP: Impacto
Publicações, 2015.

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98 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

É com muita tristeza e dor no coração que afirmo: temos um cris-


tianismo monoteísta hoje que quer receber benefícios de Deus, mas
que não entende o que é Trindade, não entende para onde e para
que essa Trindade nos chamou. Somos cristãos que amamos nossa
própria vida e achamos que Deus deve ajudar-nos a ganhá-la, não
a perdê-la. E amar a própria vida é o que traz a divisão no Corpo.

O autor deste livreto continua dizendo:


“Oh! Como é bom e agradável viverem unidos os irmãos” (Salmo
133.1). Esse é o nosso alvo, mas como alcançá-lo? A Trindade é o nosso
paradigma! É o modelo de unidade e perfeição para a igreja. Jesus
repetiu várias vezes que a relação que tinha com o Pai era a mesma que
estava oferecendo aos discípulos. Está além de nós, parece impossível,
mas foi Deus que nos chamou para entrar na pericorese com ele.
Nós não precisamos inventar a unidade, graças a Deus, apenas entrar
naquela que já existe na Trindade! É só entrar na “dança” deles. Perca
sua vida, passe pela angústia juntamente com Deus e com os irmãos,
mas entenda que este é o seu propósito, é o seu chamado de vida.

O grande conflito da alma humana, da humanidade caída, é que


amamos a própria vida. Ao olhar para a unidade da Trindade, ficamos
encantados; mas, por amar a nós mesmos, não queremos entrar na
sua “dança”.

Jesus deu aos discípulos a mesma glória que recebera do Pai. Que
glória é esta? De um habitar totalmente dentro do outro, de um ser
perfeitamente unido em harmonia com o outro! Jesus entregou-se
totalmente ao Pai, entregou toda a sua vontade própria, veio à terra
não para agradar a si mesmo, mas para fazer tudo o que agrada ao
Pai, entregar toda a sua vontade própria. Ele não veio para cumprir
uma missão pessoal nem para desenvolver seu próprio projeto. E o Pai
glorificou a Jesus dando tudo a ele – uma entrega mútua e completa.
Isso é pericorese, isso é alegria, isso é realização, isso é unidade.

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Por que existem tantas divisões: alguns aspectos 99

Antes de existir a Igreja, a Trindade já existia. Deus Pai


não existia de forma solitária. Jesus diz que já vivia a glória da
Trindade antes da fundação do mundo (João 17.5). Este mo-
delo de unidade com entrega mútua e completa, com alegria,
com vida, é a glória que Jesus nos passa. Ela já está conosco,
repartida na Igreja (João 17.22); porém, agimos como se a
desconhecêssemos.
Quando olhamos para a tentação egoísta que assola a Igre-
ja em nossos dias, provocando competição, desconfiança e
ciúme, sabemos que a unidade na diversidade só será possível
no modelo da Trindade: um Deus em três Pessoas, existindo
numa íntima troca de amor.

O denominacionalismo
Segundo Kris Vallotton65, em seu livro Chuva Abundante, há
uma diferença entre denominação e denominacionalismo. No
denominacionalismo, os cristãos se unem ao redor da doutrina
e se dividem quando discordam. Ele diz: “O ismo denota uma
ideologia, como em comunismo, socialismo ou humanismo. Essas
ideologias estão edificadas sobre distorções da verdade. São men-
tiras patrocinadas por um plano diabólico. Estou pessoalmente
convencido de que o ‘ismo’ do denominacionalismo é um espírito
maligno”.
Isso ficou muito visível quando, na Reforma Protestante (e
nos movimentos seguintes), a ênfase na concordância doutrinal
tornou-se mais importante do que os relacionamentos. O au-
tor destaca que é fácil ver que as denominações cresceram por
meio da divisão, enraizadas na Reforma Protestante do século
16. Fomos denominados “protestantes” porque nascemos de

VALLOTTON, Kris. Chuva Abundante – Como podemos transformar o


65

mundo que nos cerca. Ibid.

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100 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

um protesto doutrinário (a palavra originalmente significava


“protestação”, mas logo assumiu o significado de “protestador”,
que persiste até hoje).
A prioridade pela doutrina em detrimento ao relacionamento,
segundo o autor:
...criou uma cultura que ameaça constantemente dividir as pessoas
do ponto que as une. Embora muitos cristãos admitam que pagam
um preço muito alto por relacionamentos feridos e divisões na
igreja, a mentalidade denominacional os leva a concluir que, para
evitar que isto aconteça, é preciso encontrar formas de “reforçar
a conformidade doutrinal” a fim de que não surjam desentendi-
mentos. Assim, o denominacionalismo também cria uma cultura
que critica qualquer um que pense diferente da tradição e teme
desesperadamente a inspiração. Pastores do denominacionalismo
resistem ao pensamento revelador, pois entendem que novas ideias
semeiam discordância, e a discordância ataca o sistema nervoso
central de suas igrejas.

Essas afirmações são muito fortes. Porém, se buscarmos a Deus


com sinceridade de coração, humildade, dispostos ao arrependi-
mento, certamente nos surpreenderemos com a reforma que Deus
quer realizar na Igreja.
Ressaltamos que denominação (o ato de denominar, dar
nomes, designar, intitular) por si só é diferente de denomina-
cionalismo e, claro, por si só isso não é pecado. Devemos lem-
brar que, no início a Igreja Primitiva era conhecida como “O
Caminho” (Atos 19.9, 23). Atos 11.26 diz que “pela primeira
vez foram chamados de cristãos”.
O denominacionalismo tem uma conotação sectarista (par-
tidarista, faccionista, atitude intransigente, intolerante). É a
tendência de achar que a “nossa igreja” é a expressão máxima

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Por que existem tantas divisões: alguns aspectos 101

da Igreja de Cristo. Como diz Silas Campos66, é a “síndrome


de Elias”: “Eu sou o mais zeloso e não sobrou ninguém além de
mim”. A resposta de Deus para esse tipo de pensamento é: “Eu
preservei sete mil; você não é o único!”.
Mark Shaw67 propõe, entretanto, que as denominações, como
foram originalmente concebidas, ou seja, como preservadoras da
verdade bíblica, seriam grandes motivadoras da unidade, exata-
mente porque resistem ao sectarismo e ao sincretismo, os dois
verdadeiros inimigos da unidade. Ele cita, em seu livro, Jeremiah
Burroughs, um reformador puritano do século 17 (que já lutava
pela unidade), que formulou a chamada “Teoria Denomina-
cional”, composta de seis pontos importantes que precisam ser
considerados no processo de unidade:
a. as diferenças doutrinárias são inevitáveis;
b. as diferenças doutrinárias em questões secundárias con-
tinuam sendo importantes;
c. as diferenças podem ser úteis;
d. nenhuma estrutura pode representar sozinha a Igreja de
Cristo em sua totalidade;
e. a verdadeira unidade é baseada no Evangelho comum
e deveria ser expressa pela cooperação entre as denomi-
nações;
f. a separação denominacional, por si só, não é divisionismo.

Na opinião daquele reformador, o fato de existirem nomes,


títulos, designações para grupos de cristãos, por si só, não é divi-
são. Na multiplicação, o Espírito Santo pode usar muitas frentes
66
CAMPOS, Silas. “O grande valor da unidade”. Site: www.voltemosaoevan-
gelho.com.,02/10/2012.
67
SHAW, Mark. Lições de Mestre. São Paulo/SP: Editora Mundo Cristão, 2004.

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102 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

com estratégias diferentes para a proclamação do Evangelho (no


capítulo 6 comparamos a Igreja com as Forças Armadas, que se
subdividem para atender inúmeras necessidades da nação). Por-
tanto, nosso objetivo aqui é deixar bem clara a distinção entre
denominacionalismo e denominação.

A falsa espiritualidade
A forma preferida para a redescoberta da irmandade entre os
cristãos é o chamado “ecumenismo espiritual”. Este caminho,
considerado pelos defensores da unidade da Igreja como o coração
do ecumenismo, começou com a Semana de Oração pela Unida-
de Cristã, pelo abade Paul Couturier, na França, em 1935. Paul
Couturier pode ser considerado o pai do ecumenismo espiritual.
Sua influência foi particularmente sentida pelo chamado Grupo
de Dombes, por Roger Schutz e pela comunidade de Taizé.
Esse tipo de ecumenismo pressupõe orações pela unidade
da Igreja, para santificação pessoal, pelo arrependimento
por tantas divisões, sempre buscando mais revelação. Nisto
vamos adquirindo espiritualidade (sendo influenciados pelo
Espírito Santo) para atingir realidades além das percepções.
Certamente, isto poderá nos levar a reunir com outros irmãos
para orar, estudar a Palavra, ter comunhão e experiência no
Espírito Santo juntos.
Por outro lado, existe uma chamada espiritualidade que, ao
contrário, gera divisões. Se, na parte de cima, temos o Espírito
Santo e suas demandas, na parte de baixo temos homens que, de
acordo com sua vivência cristã, deixando-se levar por emoções,
influenciados por culturas e tradições e mesmo teologias ou dou-
trinas, julgam estar de posse de alguma revelação extraordinária,
deliberando decisões que provocam cismas. A isso chamamos
de “falsa espiritualidade”.

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Por que existem tantas divisões: alguns aspectos 103

Num contexto em que a pessoa ou o grupo que se julga


“espiritual” está separado ou mesmo alienado de irmãos dife-
rentes (tornando-se incapaz de entender os outros), é possível
tornar-se intolerante, às vezes desprovido do amor ágape (um
amor que não se irrita com outros cristãos que praticam sua
fé de forma diferente), com forte poder de argumentação,
influenciado por seu meio cultural, por elementos religiosos
que levam a posições radicais. Tudo isso pode parecer espiri-
tualidade, mas não leva em conta atributos cristãos como a
humildade, o perdão e o amor.
Um exemplo forte que poderia se enquadrar nessa situação
é a primeira grande divisão da Igreja Cristã entre o ocidente
(Igreja Católica) e o oriente (Igreja Ortodoxa), no século 11.
Aparentemente, o motivo principal foi a discussão da proce-
dência do Espírito Santo (se vem somente do Pai ou do Pai
e do Filho). Porém, pontos possivelmente não tão relevantes
como ritos, pão da ceia (com fermento ou sem fermento),
vestes e barbas para o clero, datas diferentes da comemoração
da Páscoa, calendários e outros foram motivos decisivos para
grandes e pequenos cismas na Igreja.
Principalmente nos séculos 20 e 21, observamos vários gru-
pos ou pessoas que se dizem portadores dessa “espiritualidade”
e acabam sangrando ainda mais as feridas da divisão da Igreja.
Há aqueles que afirmam ter sido orientados pelo Espírito Santo
a se afastar de alguns irmãos (com os quais tinham comunhão).
Não levam em conta, porém, que o mesmo Espírito não pode
ir contra a própria Palavra, aos princípios bíblicos.

O egoísmo
Em Cristo fomos crucificados, em Cristo estamos mortos para
o pecado, para a carne, para o mundo e para nós mesmos. Mas

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104 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

também, em Cristo, estamos vivos porque ele ressuscitou e nos


deu uma nova vida. Assim ensina a Bíblia:
E ele morreu por todos, para que os que vivem não vivam mais para
si mesmos, mas para aquele que por eles morreu e ressuscitou (2
Coríntios 5.15).

Assim também vós considerai-vos mortos para o pecado, mas vivos


para Deus, em Cristo Jesus (Romanos 6.11).

Jorge Himitian68 declara a esse respeito:69


Quem está em Cristo é nova criatura. A característica comum de
todas as pessoas que não estão em Cristo é o egoísmo. Cada um vive
para si mesmo, é o centro de sua própria vida. Todo esforço, habili-
dade, preocupação, lucro, ganho é apenas para si próprio. Entretanto,
a característica comum de todos os que estão em Cristo, dos que
são novas criaturas, é que não vivem mais para si mesmos, mas para
Aquele que morreu e ressuscitou por eles. Jesus nos redimiu, com-
prou, resgatou e, por isso, nossa vida agora pertence exclusivamente
a ele. Estamos mortos para o pecado e para nós mesmos e agora
vivemos para Cristo. Esta é a principal mudança que caracteriza a
nova criatura.

Uma das provas do egoísmo no coração humano é jus-


tamente não considerar a opinião do outro, julgando-se
melhor ou maior. Em Lucas 22.26, Jesus disse: “Que não
seja assim entre vós; mas o que entre vós é o maior, torne-se
como o último; e o que governa seja como o servo”. Ora, se
ele mesmo disse isso, eu não tenho o direito de pensar e agir
de maneira diferente!
68
Jorge Himitian é pastor na cidade de Buenos Aires, Argentina, e por vários anos
tem servido a igrejas de diversas localidades, inclusive no Brasil.
69
Anais do Encristus 2014. Ele pôs em nossos lábios a palavra de reconciliação.
Cachoeira Paulista/SP, Canção Nova, 14-16 de março de 2014, p. 38.

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Por que existem tantas divisões: alguns aspectos 105

Antonio José70, falando sobre o egoísmo e a falta de humildade


que separam os cristãos, relata71:
Cristo é a nossa identidade e precisamos reconhecê-lo uns nos outros.
Nossas diferenças não são motivos suficientes para termos problemas
e nos evitarmos. Se eu reconheço o meu Senhor em você, devo fazer
o que Paulo diz em Filipenses 2.3,4: “Nada façais por espírito de
partido ou vanglória, mas que a humildade vos ensine a considerar
os outros superiores a vós mesmos. Cada qual tenha em vista não os
seus próprios interesses, e sim os dos outros”. Ou seja, considerá-lo
superior a mim. Assim, sempre tenho algo a aprender com você.

Que a humildade possa nos ensinar a considerar os outros mais im-


portantes que a nós mesmos. Se eu reconheço em você o meu Senhor,
não importa de onde você é, onde você congrega. Com certeza, nos
trataremos muito diferente se pudermos ver a identidade de Cristo
um no outro. Seremos capazes de servir diferente, de aprender mais
com o outro, de não olhá-lo com inveja ou como uma ameaça, mas
nos alegrarmos com o que Deus está fazendo em sua vida.

O particularismo (privilégio dos interesses individuais), para


Rui Luís Rodrigues, é um dos grandes problemas que geram
divisão. Na sua mensagem “Embaixadores da Reconciliação”,72
por algumas vezes ele destaca isto:
Ora, o verdadeiro sinal da conversão é a superação de todo particu-
larismo (agradar-se a si mesmo, viver de acordo consigo mesmo)...
Precisamos nos perguntar, com sinceridade, se o que nos impede
de darmos passos mais concretos na direção da plena reconciliação

70
Antonio José é padre, professor, pregador, cantor e diretor espiritual da Renovação
Carismática Católica no Estado do Rio de Janeiro. Autor dos livros Basta uma Palavra
e Sementes entre Lágrimas.
71
Anais do Encristus 2014. Solícitos em conservar a unidade no vínculo da paz. Rio
de Janeiro/RJ, 18 e 19 de outubro de 2014, pp. 20,21.
72
Anais do Encristus 2014. Ele pôs em nossos lábios a palavra de reconciliação.
Cachoeira Paulista/SP, Canção Nova, 14-16 de março de 2014,, pp. 54,55,56.

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106 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

não é, muitas e muitas vezes, o egoísmo particularista, o desejo de


fazermos as coisas à nossa própria moda e para nossa própria sa-
tisfação. [...] Morreremos pela fé e não morreremos para os nossos
particularismos? Isso não é possível, porque quem dá a vida pelo
testemunho de Cristo já cruzou o limiar que nos separa de todo
egoísmo; os verdadeiros mártires, assim como os verdadeiros santos,
são sempre ecumênicos em seu coração.

Não andar no Espírito73


Em Gálatas 5, Paulo exorta sobre a necessidade de andar no
Espírito para não satisfazer os desejos da carne (v. 16). Andar no
Espírito é fugir dos dois grandes desvios na vida cristã: legalismo
(o principal tema da carta aos Gálatas) e licenciosidade (usar a
liberdade da lei para dar ocasião à carne; v.13).
Andar na carne, em contraste com andar no Espírito, é ser
governado pela vida natural que herdamos de Adão. As obras
da carne, relacionadas nos versículos 19 a 22, incluem práticas
que consideraríamos absurdas para alguém que nasceu de novo
(como prostituição ou feitiçaria) e outras que podem nem
ser reconhecidas por muitos como obras da carne, por serem
mascaradas por uma falsa espiritualidade (como discórdias
e dissensões). O que mais chama a atenção, entretanto, em
relação ao tema de unidade no Corpo de Cristo é que, das 15
obras da carne citadas nesta passagem, quase metade pode ser
considerada responsável por causar divisão: (1) inimizades, (2)
rivalidades, (3) ciúme, (4) ambição egoísta, (5) discórdias, (6)
partidarismo ou facções e (7) inveja.
A lista dos frutos do Espírito começa com amor (vv. 22,23).
Portanto, a unidade é fruto do Espírito. Entretanto, se recebemos
Resumo da ministração do Pr. Christopher Walker. Anais do Encristus 2015.
73

“Unidade como fruto do espírito.” Sorocaba/SP, 29 e 30 de agosto de 2015.

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Por que existem tantas divisões: alguns aspectos 107

o Espírito, por que não andamos no Espírito? Por que não eviden-
ciamos os seus frutos? Se o Espírito é mais forte do que a carne,
por que estamos perdendo essa guerra na Igreja?
Existem várias respostas possíveis para essa pergunta. Uma
delas é que há uma decisão que cabe a cada um de nós. O Es-
pírito e a carne são duas forças opostas, guerreando no nosso
interior. Embora o Espírito seja muito mais forte do que a
carne – o único capaz de vencê-la –, por outro lado, a carne
é a única força que consegue impedir a obra do Espírito. Isso
acontece porque o Espírito não nos obriga a aceitá-lo nem
a lhe obedecer. Ele espera nossa cooperação, nosso convite.
Para que isso aconteça, precisamos saber identificar o que
é carne e o que não é. Enquanto acharmos que defender
uma posição, uma doutrina ou um ministério é uma atitude
espiritual, não permitiremos que o Espírito Santo vença a
nossa carne disfarçada de piedade.
O problema é exatamente a versatilidade da carne. Quando
pensamos que já nos livramos dela, que já foi crucificada e
rejeitada, ela reaparece com outro “visual”, com características
mais sutis, levando-nos a buscar nosso próprio interesse no
lugar do interesse de Cristo.
Quantas divisões foram e ainda são feitas em nome da
obra de Deus, por pessoas que acham que estão “defenden-
do a verdade”? Muitos acreditam piamente que não podem
permitir que alguém “roube seu ministério ou sua unção” ou
ataque a “verdade” que julgam “a mais correta”. Tudo isso,
muitas vezes, é a carne se disfarçando de ambição egoísta,
no desejo de se autopromover por orgulho, provocando os
outros, tendo inveja das posições alheias. Tem sido assim
em toda a história da Igreja, e ainda não aprendemos como
combater a raiz da divisão.

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108 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

Sabemos que o Espírito Santo é a única solução para vencer


essa guerra. Ele tem o poder e a capacidade para preparar a
Noiva de Cristo (que é única) no seu devido tempo. Entre-
tanto, há algo que precisa acontecer entre nós e o Espírito
Santo para que isso realmente se concretize.
Quanto poder o Espírito Santo já demonstrou em toda
a história, especialmente no último século? Quantos dons,
quantos milagres, quantos sinais e prodígios, quantos grandes
ministérios, quantas conversões? Mesmo assim, a Igreja não
ficou mais unida – muito pelo contrário!
A unidade ainda não veio porque não aprendemos a “andar
no Espírito”. Na verdade, nem chegamos a entender o que isso
significa. O Espírito não vai nos obrigar a fazer a vontade dele nem
interferirá no centro das nossas decisões sem a nossa permissão.
De acordo com Paulo, “os que são de Cristo Jesus crucifica-
ram a carne, com as suas paixões e concupiscências” (Gálatas
5.24). É neste contexto de não buscar os desejos da carne (que
não são apenas sensualidades ou prazeres do corpo, mas o desejo
de ter razão, defender a própria reputação, rejeitar quem pode
ameaçar minha posição, separar-se de quem pensa diferente)
que ele exorta: “Se vivemos no Espírito, andemos também
no Espírito” (v.25). Além disso, no versículo 26 Paulo reforça
a atitude que é necessária para andar no Espírito: “Não nos
deixemos possuir de vanglória, provocando uns aos outros,
tendo inveja uns dos outros”.
Andar no Espírito é não “procurar os seus interesses”
(1 Coríntios 13.5). Unidade é fruto do Espírito que tem a
mesma natureza de Cristo e do Pai. Na Trindade, ninguém
busca o próprio interesse. Se vivermos assim, eliminaremos
todas as divisões da Igreja que existiram ao longo dos séculos
(e ainda existem).

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Por que existem tantas divisões: alguns aspectos 109

O amor, que é o próprio Espírito Santo, é a doação de si mes-


mo. Precisamos entender que ele é uma pessoa, é o próprio Deus
habitando em nós. Ele concede dons, graça, alegria e milagres
sim, mas tudo com mansidão, sem nos forçar, de maneira sensível
como uma pomba. Portanto, se temos este Espírito, andemos
também por ele.
É preciso querer ter esse relacionamento de amor com Deus
e com as pessoas. Não é algo automático: “Recebi o Espírito e
imediatamente fui transformado numa pessoa que faz a vontade
de Deus”. Infelizmente não é assim. Mas não é por falta de poder,
porque ele está em nós. O motivo é que não estamos ouvindo a
sua voz.
Se não entendermos quem é o Espírito Santo e como podemos
corresponder à sua voz, continuaremos andando e vivendo na car-
ne. Defenderemos nossas ações carnais como se fossem espirituais
e dividiremos cada vez mais a Igreja.
Que Deus tenha misericórdia de nós! Que consigamos apren-
der a ouvir e dar valor à voz do Espírito e entrar nesta troca, porque
o relacionamento de amor é uma Pessoa. Jesus recebeu o Espírito
do Pai, mas o devolveu ao Pai. Nós recebemos o Espírito de Deus,
mas também devemos devolvê-lo a ele – nada para nós, nada para
nossa posição ou ambição. Todos os nossos desejos, intenções e
ambições pessoais devem ser entregues ao Pai e controlados pelo
Espírito Santo! Ele nunca busca interesses pessoais, mas nos leva
a uma entrega total e irrestrita a Deus.

Discernindo o tempo em que estamos vivendo


Já estamos vivendo tempos de perseguição, e a unidade é, então,
extremamente relevante para nós neste momento. Precisamos
dar as mãos e caminhar juntos nesse firme propósito de rejeitar,
em nome de Jesus, toda ação diabólica que trabalhe para dividir

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110 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

a Igreja do Senhor, pois a Palavra de Deus diz que “... as portas


do inferno não prevalecerão contra ela” (Mateus 16.18b). Mas isso
só ocorrerá se formos uma igreja unida e gloriosa. E sabemos
que cabe a nós tomar essa decisão, essa iniciativa.
Matteo Calisi74 define o ecumenismo espiritual como “ex-
periência espiritual”, e não “debate teológico”.75 O Encristus
é um exemplo dessa experiência – nossas comunhões, nosso
adorar, orar e partilhar da Palavra juntos. Isso dá ao Espírito
Santo a liberdade para agir.
Em nosso livro Reconciliação: O Segundo Toque76, falamos de
Peter Hocken77, que é considerado hoje um dos maiores escri-
tores do mundo no assunto unidade da Igreja. Hocken relata
quais são as bases mínimas para o exercício do ecumenismo
espiritual, para que não haja divisões na Igreja:

• toda pessoa necessita da graça salvadora de Jesus Cristo;


• essa salvação somente é realizada mediante a morte e a
ressurreição de Jesus Cristo, o único mediador entre Deus
e a raça humana;
• essa salvação é recebida mediante a fé em Jesus Cristo;
• Jesus Cristo é o eterno Filho de Deus;
• em sua ressurreição e ascensão, Jesus é Senhor de tudo,
tendo toda a autoridade nos céus e na terra;
• no Pentecostes, o Espírito Santo de Deus foi derramado
sobre toda a Igreja;
74
Matteo Calisi é líder internacional da RCC, fundador da Comunidade de
Jesus (Itália), membro da Fraternidade Católica da Associação e Comunidade
Carismática de Aliança de Direito Pontifício, presidente internacional da
Fraternidade Católica de Comunidades de Aliança e Associações Carismáticas.
75
CALISI, Matteo. Esperando Pentecostes – O quarto ecumenismo. Recife/
PE: Editora Comunidade Obra de Maria, 1ª edição, 2003.
76
MARION, José Carlos e Márcia. Reconciliação: O Segundo Toque. Ibid.
77
HOCKEN, Peter. One Lord, One Spirit, One Body. Ibid.

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Por que existem tantas divisões: alguns aspectos 111

• a plenitude do Espírito Santo derramado em Pentecostes


está disponível hoje;
• Deus fala aos crentes (cristãos) hoje por meio de seu Filho;
• as Escrituras são a Palavra de Deus inspirada;
• o evangelismo é uma ordem do Senhor para a Igreja;
• o propósito de Deus é ter um povo unido, formando um
só Corpo sob a Cabeça, que é Cristo, para glorificar o Pai
de todos.

Se essas são as realidades do Senhor reveladas a todos os


verdadeiramente batizados no Espírito Santo, então temos
a obrigação de, juntos, louvar a Deus por essas verdades,
agradecendo-lhe sua revelação e fazendo delas a base da nossa
contínua resposta.
Essas verdades básicas e fundamentais para a vida cristã e o exer-
cício do ecumenismo espiritual, se observadas, podem ajudar-nos
a olhar com caridade – sem dissimulação nem fingimento – para
aquelas realidades nas quais ainda sabemos existir diferenças de
ênfases ou interpretação. Isso não quer dizer que essas diferenças
não importem.
Num primeiro momento, essas verdades abrangeriam os ba-
tizados no Espírito Santo, nos quais haveria mais liberdade para
o Espírito agir. Num segundo momento, deveriam alcançar toda
a Igreja.
Como sabemos que o reino de Deus está se manifestando
hoje na Igreja? Como podemos afirmar que a unidade será uma
realidade viva e presente na terra antes da volta do Senhor Jesus e
em preparação para esta volta?
A esse respeito, concluímos este capítulo citando as palavras de
Silas Esteves por ocasião de um encontro de cristãos:

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112 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

Esse reino está se manifestando hoje! Como sabemos disso? Porque


estamos aqui hoje, porque acreditamos na unidade da família bendita
do Pai, porque aceitamos o senhorio de Jesus Cristo em nós, porque
cremos que as forças da divisão não vão mais reger nossa vida! Não
temos muitos anos mais para amadurecer a unidade; precisamos
fazê-lo hoje e rápido porque o tempo urge. O propósito de Satanás
é a destruição de toda carne e enquanto os cristãos viverem divi-
didos ele fica à vontade para “matar, roubar e destruir”, pois esse é
o seu propósito ( João 10.10). O que precisamos é cumprir o nosso
propósito, que é o de reconciliadores. Isso irá sufocá-lo e fará com
que seja expulso desse planeta. Um povo está se levantando hoje e
Deus “em breve esmagará debaixo dos vossos pés a Satanás”. (Ro-
manos 16.20). Ele será enviado para o seu lugar de destino, o abismo
(Apocalipse 20.3) e “a terra se encherá do conhecimento da glória
do Senhor, como as águas cobrem o mar”. (Habacuque 2.14). A
glória do Senhor, que é a unidade, cobrirá toda a terra! ( Joel 2.1-8)

Esse reino está vindo, está surgindo e crescendo cada vez mais na
vida do meu irmão. Se alguém entrar em nosso meio não consegue
mais discernir quem é crente, quem é católico, a qual congregação
ou denominação pertence, porque todos nós amamos uns aos outros
e temos um único Senhor. E, mais do que isso, somos UM e temos
como missão gerar a vida de Cristo no coração um do outro.

O reino de Deus em nós gera um povo que se ama, que se perdoa,


que abençoa um ao outro; um povo que não ofende, que não empurra,
que não menospreza, que não critica, que não minimiza o papel do
outro; pelo contrário, um povo que exalta e agradece a Deus, pois o
outro está fazendo o que ele próprio não consegue e não pode fazer.

Amém, que assim seja!

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Capítulo 5
A QUEDA DOS MUROS QUE NOS
SEPARAVAM

F
atos sobrenaturais aconteceram durante a crucificação,
segundo a versão de Mateus 27.45-53. Foram seis fatos
no ato da crucificação e um após a morte de Jesus, que
enumeramos abaixo:

(1) “E, desde a hora sexta, houve trevas sobre toda a terra, até
a hora nona” (v. 45).
(2) “E eis que o véu do santuário se rasgou em dois, de alto a
baixo” (v. 51).
(3) “... a terra tremeu...” (v. 51).
(4) “... as pedras se fenderam...” (v. 51).
(5) “... os sepulcros se abriram...” (v. 52).
(6) “... e muitos corpos de santos que tinham dormido foram
ressuscitados” (v. 52).
(7) “... e, saindo dos sepulcros, depois da ressurreição dele,
entraram na cidade santa, e apareceram a muitos” (v. 53).

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114 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

O caminho vertical na busca da unidade


Destes fatos sobrenaturais, Mateus narra um deles que aconteceu
no templo: “E eis que o véu do santuário se rasgou em dois, de alto
a baixo”. Às 15 horas, estavam os sacerdotes no templo para ce-
lebração. Simultaneamente à morte de Jesus, eles viram a cortina
grossa que os impedia de entrar no Lugar Santíssimo rasgar-se
ao meio. O Lugar Santíssimo era onde Deus se manifestava e ao
qual apenas o sumo sacerdote tinha acesso uma vez por ano para
fazer expiação. Ficou escancarado aquele lugar desconhecido que
ocultava a glória da presença de Deus. Era um “muro” que separava
o homem de Deus.
O muro se rompeu, significando que todos nós passamos
a ter acesso ao trono de Deus. O segredo do Santo dos Santos
terminava: todo homem agora poderia aproximar-se de Deus
pelo novo e vivo caminho, pelo sangue de Jesus (Hebreus
10.18-22). Este é um sinal maravilhoso que nos mostra que
não precisamos mais de intermediários para ir até a sala do
trono, mas pelo sangue de Jesus temos acesso a ela a qualquer
momento.
Jesus nos reconciliou com o Pai. Uma inimizade foi desfeita
para sempre e, assim, somos chamados de “amigos de Deus”.
Nada mais nos separa. Os portais eternos foram abertos para
os filhos de Deus. Um caminho na vertical foi liberado para
sempre.
O que Deus sonhou para nós é que todos nós fôssemos unidos
como irmãos e apenas um nele. Para tanto, ele usa o perdão que
Jesus obteve para nós na cruz e o nosso perdão mútuo (uns aos
outros). Sem o perdão de Deus por causa da expiação realizada
por Jesus, não há comunhão entre nós e Deus. Com base neste
perdão, nós alcançamos comunhão com os irmãos, porque cada
um perdoa os erros e ofensas dos outros.

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A queda dos muros que nos separavam 115

O caminho horizontal na busca da unidade


Interessante que há outro sinal como consequência da crucificação
e morte de Jesus que nenhum evangelista narra, mas que o Espírito
Santo revelou a Paulo. Trata-se da queda de um muro no pátio
do templo que separava os gentios dos judeus:
Naquele tempo estáveis sem Cristo, separados da comunidade de
Israel, e estranhos às alianças da promessa, não tendo esperança,
e sem Deus no mundo. Mas agora em Cristo Jesus, vós que antes
estáveis longe, já pelo sangue de Cristo chegastes perto, porque Ele
é a nossa paz, o qual de ambos os povos fez um; e, derrubando a
parede de separação que estava no meio, na sua carne desfez a
inimizade, isto é, a lei dos mandamentos que consistia em orde-
nanças, para criar em si mesmo dos dois um novo homem, fazendo
a paz, e pela sua cruz reconciliar ambos com Deus em um corpo,
matando com ela (cruz) as inimizades. E, vindo, ele evangelizou a
paz, a vós que estáveis longe, e aos que estavam perto; porque, por
Ele ambos temos acesso ao Pai em um mesmo Espírito. Assim, já
não sois estrangeiros, nem forasteiros, mas concidadãos dos santos
e da família de Deus” (Efésios 2.12-19; grifos nossos).

Na sua carta aos efésios, o apóstolo Paulo faz um contraste


entre os israelitas e os “estranhos”. Ele diz que existia um “muro”
que “separava” os dois grupos (Efésios 2.11-15). Paulo se referia
à “Lei dos Mandamentos” dada por meio de Moisés. Contudo,
a palavra “muro” usada por ele talvez tenha feito seus leitores
lembrar-se de uma barreira de pedra que realmente existia no
pátio do templo.
No século primeiro, o templo em Jerusalém tinha vários pá-
tios com acesso restrito. Qualquer pessoa podia entrar no Pátio
dos Gentios, mas apenas os judeus e os prosélitos podiam entrar
nos outros pátios do templo. Para separar as áreas reservadas das
áreas de acesso livre, havia um muro de pedra bem trabalhado,

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116 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

supostamente de 1,3 metros de altura. Segundo o historiador


judeu Flávio Josefo80, do século primeiro, foram colocadas nessa
barreira inscrições em grego e em latim, alertando os gentios a
não atravessá-la a fim de que não pisassem nos recintos sagrados.
Encontrou-se uma dessas inscrições no idioma grego. Ela
dizia: “Que nenhum estrangeiro ultrapasse a barreira e a cerca
em torno do santuário. Quem for apanhado fazendo isso,
será responsável pela sua morte que virá como consequência”.
Não podemos afirmar com convicção se houve a queda
literal dessa barreira ou se se trata de um fato simbólico. De
um jeito ou de outro, o que a Palavra de Deus nos ensina é
que, com a cruz, a inimizade entre os que são de Deus foi
destruída. Assim, o efeito da cruz não é somente a reconci-
liação do homem com Deus (rasgando o véu do templo),
mas também a reconciliação no meio do povo de Deus
(derrubando o muro no templo que separava os homens),
fazendo-nos um só Corpo.
Se o muro caiu, se Cristo desfez na sua carne a inimizade,
se na sua cruz ele matou a inimizade, se ele evangelizou a paz,
se somos concidadãos e uma só família, qualquer inimizade
reincidente significa levantar novamente uma parede, um
muro que foi destruído pelo penoso trabalho de Cristo.
Levantar muros é ir contra a obra de Cristo na cruz. Não
há outra saída senão arrependimento e atitude concreta de
perdoar e pedir perdão. Isto é necessário entre pessoas e
também entre líderes que separam, que dividem, isto é, que
constroem paredes.

80
JOSEFO, Flávio. História dos Hebreus. São Paulo/SP: Editora CPAD, 2004.
(Flavius Josephus, 37 a 100 d.C., é considerado um dos maiores historiadores
judeus de sua época).

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A queda dos muros que nos separavam 117

As leis dos mandamentos que consistiam em


ordenanças
Uma ilustração que me ajudou muito a entender o que significa
“desfazer a inimizade na sua carne”, isto é, a Lei dos Mandamentos
que consistia em ordenanças (sabendo que leis são limites, cercas
colocadas em nossa vida) foi o testemunho abaixo extraído do
livro Para que Todos Sejam Um81, de Ismael dos Santos :
Na França, na Segunda Guerra Mundial, havia um cemitério católi-
co. Alguns rapazes haviam perdido um de seus amigos e desejavam
enterrá-lo. Já era noite, e os canhões haviam silenciado. Levaram,
portanto, o corpo à porta do cemitério, onde um sacerdote estava
parado, observando:

– Nós queremos que ele tenha um enterro decente, disseram os


rapazes.

O padre perguntou:

– Ele é católico?

A resposta foi negativa, a que o padre acrescentou:

– Sinto muito. Se não é católico, os regulamentos não permitem


que seja enterrado aqui.

Então, frustrados e tristes, levaram o corpo e decidiram que, já que


não podiam enterrá-lo dentro do cemitério, iriam enterrá-lo bem
perto, do lado de fora da cerca. Encontraram um pequeno lugar, a uns
dois metros da cerca de madeira. Cavaram a sepultura e enterraram-
-no ali. Ao acordar no dia seguinte, levantaram e decidiram prestar
suas últimas homenagens ao saudoso amigo no seu túmulo. Porém,
não puderam achar o local onde o haviam enterrado; tinha desapa-
recido, e não podiam imaginar como isso acontecera.
81
CAMPOS, Ismael. Para Que Todos Sejam Um. São Paulo/SP: Editora Vida,
1993.

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118 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

Procuraram por toda a parte e, após uma hora de buscas infrutíferas,


resolveram perguntar ao sacerdote se sabia algo a respeito. Assim,
tiveram que contar toda a história. E o sacerdote respondeu:

– Bem, na primeira metade da noite eu fiquei acordado, sentindo


remorsos pela minha atitude intransigente com vocês; passei o resto
da noite mudando a cerca de lugar!

Foi exatamente o que Cristo fez: ele nos pôs dentro das promessas
e das alianças de Deus, numa ação que foi além da lei, pela graça.
Jesus simplesmente tomou a cerca e mudou-a de lugar. O Senhor
removeu a barreira, abriu o canal e agora judeus e gentios encontram-
-se juntos com Cristo.

Aleluia! A cruz foi a nova nota que soou na sinfonia dos planos
divinos. Nelas as mais intricadas desarmonias tiveram solução. O
Calvário tornou-se, verdadeiramente, o único terreno onde pode
crescer a frondosa árvore da comunhão. Pelo caminho que passa ao
pé da cruz, podemos chegar juntos a Deus.

Para Cristo, os mortos (aqueles que foram crucificados com


ele e batizados) estão unidos, a cerca foi destruída (pois ele
desfez na sua carne a Lei dos Mandamentos que consistia em
ordenanças). Se na cruz passamos para a condição de “cruci-
ficado para o nosso eu” (que gosta de inimizade, divisão), não
temos mais o direito de reivindicar nada para nós mesmos,
pois estamos mortos, e mortos não reivindicam.
A cruz foi erigida não somente para nos reconciliar com
Deus, mas também para nos fazer unidos, uma família. Se esta
situação não for nossa realidade, só o ato de perdoar e pedir
perdão nos reconcilia com a realidade da cruz, porque Jesus
é a nossa paz e nos fez um, destruindo a separação, a barreira
da inimizade.

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A queda dos muros que nos separavam 119

Jesus também morreu para nos unir


No Jardim do Getsêmani, Jesus orou ao Pai:
Agora, está angustiada a minha alma, e que direi eu? Pai, salva-me
desta hora? Mas precisamente com este propósito vim para esta
hora ( João 12.27).

Essa era exatamente a hora e o propósito da sua vinda: sua


crucificação e morte. Mas João também definiu o propósito
pelo qual Jesus se manifestou em carne, a sua missão específica
na terra. Disse ele (como já vimos no segundo capítulo deste
livro):
Caifás, porém, um dentre eles, sumo sacerdote naquele ano, advertiu-
-os, dizendo: Vós nada sabeis, nem considerais que vos convém que
morra um só homem pelo povo e que não venha a perecer toda a
nação. Ora, ele não disse isto de si mesmo; mas, sendo sumo sa-
cerdote naquele ano, profetizou que Jesus estava para morrer pela
nação e não somente pela nação, mas também para reunir em um
só corpo os filhos de Deus, que andam dispersos ( João 11.49-52;
grifos nossos).

Jesus veio para morrer por nós, para nos salvar, nos purificar
de toda injustiça, escrever nosso nome no Livro da Vida. Se to-
dos apenas fossem salvos, já seria maravilhoso, mas, diz o verso
52 que ele morreu também para que esses salvos não ficassem
dispersos, mas se unissem em um só Corpo. Então, entendemos
que Jesus morreu para dois propósitos: salvar e unir.
Isaías 53 narra que andávamos desgarrados como ovelhas.
Cada um se desviava pelo seu caminho, mas o Senhor fez cair
sobre Jesus a iniquidade de todos nós. Assim, a morte de Jesus
na cruz nos tira da condição de desgarrados, de separados uns
dos outros.

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120 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

Por tudo isto, a Bíblia nos ensina que ele (Jesus) verá o fruto
do trabalho de sua alma e ficará satisfeito. O fruto do trabalho de
Jesus é ver sua Igreja unida entre si (caiu o muro que separava)
e unida à Trindade (rasgou o véu que impedia o acesso a Deus).
Jamê Nobre82 diz a esse respeito:
“Porque ele é a nossa paz, o qual de ambos fez um...” Não havia
amizade entre nós, mas a carne de Jesus produziu paz entre nós.
Tempos atrás, eu li um artigo de um judeu que comentou sobre
o acordo de paz feito nos EUA entre Nasser e Ben Gurion. Esse
articulista dizia que não havia sido feito um acordo de paz, mas de
trégua. Ou seja, “se você não atirar em mim, eu não atiro em você”.
Explicando o sentido da palavra “shalom” na língua hebraica, ele
explicou que “paz” seria se um israelense fosse em direção ao Egito
e não precisasse de visto e nem que houvesse fronteira. E vice-versa.

A paz que Deus fez conosco tirou toda barreira, toda parede de se-
paração. Hoje podemos falar com Deus a qualquer momento. O véu
foi rasgado e agora podemos entrar em Sua presença. Se estivermos
em Cristo não teremos barreiras entre nós, pois o véu foi rasgado
também de entre nós. O sangue nos aproximou e a carne de Cristo
nos fez um. Não que devemos ser um, mas somos UM em Cristo
Jesus. O que precisamos é crer nisso. Deus não amarrou ou trancou
a inimizade, mas a destruiu por completo. Assim, quando estamos
em Cristo a inimizade não tem poder sobre nós. O segredo é não
sair de Cristo! (grifos nossos).

Consumando a missão de Jesus


Para que a primeira parte nos alcance, que é a salvação, devemos
dizer “sim” a Cristo, arrepender-nos dos nossos pecados e confessar
que Jesus é o nosso Senhor.
Anais do Encristus 2014. Ele pôs em nossos lábios a palavra de reconciliação.
82

Cachoeira Paulista/SP, Canção Nova, 14-16 de março de 2014,, p.12.

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A queda dos muros que nos separavam 121

Quando Pedro termina sua mensagem em Atos 2, seus ouvintes


ficam aflitos e perguntam: “Irmãos, que devemos fazer?” (v. 37).
Ao que Pedro responde:
Arrependam-se e cada um de vocês seja batizado em nome do
Senhor Jesus Cristo para que os seus pecados sejam perdoados e
vocês receberão de Deus o Espírito Santo (v. 38).

Como sabemos, os que se arrependeram e foram batizados


chegaram a um número de quase três mil. Juntaram-se à Igreja
de Cristo e passaram a dar testemunho da obra de Deus.
Mas, para que a segunda parte aconteça, que é a unidade
da Igreja, nós também precisamos dizer “sim” ao Senhor e
arrepender-nos por não estarmos unidos, como é desejo dele,
como está em João 17.11, 21-23. Assim, é necessário que
estejamos dispostos a nos unir, permanecer juntos, respeitar,
amar, servir o Corpo de Cristo, ter vínculos com todos os
irmãos nascidos de novo não importando a denominação ou
a forma que creem.
A maior concentração cristã para a busca da unidade já
ocorrida na história foi na cidade de Kansas City, Missouri,
EUA, em 1977.83 Dois pontos extremos foram marcados nesta
reunião.
O primeiro, o momento mais inesquecível da conferência,
aconteceu quando Bob Mumford chegou ao clímax de sua
mensagem, numa das sessões da noite no estádio. Erguendo
sua Bíblia no ar, ele exclamou: “Se você der uma olhadinha no
final desse livro, verá que Jesus vence”. Uma multidão de cerca
de 50 mil pessoas bradou em aprovação com 15 minutos de
louvor e aplausos extáticos.
83
Descrito no livro de John Walker e outros, A Igreja do Século 20: a história
que não foi contada. Impacto Publicações, Americana/SP, 2013 (4ª edição).

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122 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

O segundo foi durante uma profecia que levou a enorme assem-


bleia a ajoelhar-se em lágrimas de arrependimento. Para mostrar
como a busca da unidade é relevante, gostaria de transcrever aqui
um trecho da palavra dada pelo Espírito Santo naquela ocasião:84
Apresentem-se diante de mim com corações quebrantados e espíri-
tos contritos, pois o Corpo do meu Filho está quebrado (ou partido).

Apresentem-se diante de mim com lágrimas e lamentações, pois o


Corpo do meu Filho está quebrado.

A luz está amortecida, meu povo está disperso, o Corpo do meu


Filho está quebrado.

Eu dei tudo que tinha no corpo e sangue do meu Filho. Ele


derramou-se na terra. O Corpo do meu Filho está quebrado.

Abandonem os pecados dos seus pais e andem nos caminhos de


meu Filho.

Retornem para o plano do seu Pai, retornem para o propósito do


seu Deus.

O Corpo do meu Filho está quebrado.

O Senhor diz para vocês: permaneçam em unidade um com o outro


e não deixem nada separá-los.

E, de modo nenhum se separem um do outro por causa das suas


desconfianças, amarguras e de suas preferências pessoais, mas
segurem-se um ao outro.

Porque estou para deixar vocês passarem por um tempo de prova


e teste severos, e vocês terão de estar em unidade um com o outro.

Mas eu digo também isto: eu sou Jesus, o rei vitorioso. E tenho


prometido a vocês a vitória.

84
WALKER, John e outros. A Igreja do Século 20: a história que não foi
contada. Ibid.

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A queda dos muros que nos separavam 123

Ainda que, possivelmente, alguns leitores não tenham par-


ticipado da divisão da Igreja, certamente nossos pais espirituais
participaram. Se, eventualmente, não precisamos arrepender-nos
por nós mesmos, devemos arrepender-nos pelos pecados de nossos
antepassados (líderes, fundadores de nossa denominação cristã).
Veja que a profecia acima chama isso de “pecado dos nossos pais”.
Expressões como “corações quebrantados”, “espíritos contri-
tos”, “lágrimas e lamentações”, “retornem para o plano do seu
Pai”, “desconfianças, amarguras, preferências pessoais” devem
levar-nos a uma postura de arrependimento. Somos responsáveis
(ou nossos pais o são) pela desunião da Igreja. O caminho de Jesus
é a unidade. Por sua morte na cruz, a parede que nos separava foi
destruída. Se levantamos muros, estamos em pecado e precisamos
do arrependimento.

Sem quebrantamento a unidade do Corpo não


aparecerá
Em sua apostila Um Estudo Microscópio de Efésios (já citada no
capítulo 3), John Walker85 diz que Paulo (1 Coríntios 12):
...queria que os coríntios entendessem que há um só Corpo. Eles
enfatizavam os dons do Espírito mas tinham orgulho e divisões.
Precisavam entender que o batismo no Espírito implicava no batismo
no Corpo. Não se pode valorizar o Espírito e desprezar o Corpo. Por
isto Paulo explicou que a divisão entre eles era a prova de que não
estavam andando no Espírito e, sim, na carne (1 Coríntios 3.1-4).
O Espírito leva à unidade do Corpo, mas a carne provoca divisão.

As coisas do Espírito são profundas, e a vida no Espírito é comple-


xa. Os movimentos que mais enfatizam o Espírito deveriam estar
manifestando mais e mais a unidade do Corpo, mas não estão.

85
WALKER, John. Um Estudo Microscópico em Efésios. Ibid.

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124 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

Parece que quanto mais as pessoas recebem do Espírito, ao invés


de se humilharem, se exaltam. Elas tendem a se orgulhar pelos
resultados dos seus dons e ministérios e acham que estão ajudando
Deus a realizar a sua obra. Estes ministérios têm, até, bons resultados
(curas, milagres, visões, numerosas conversões, grandes igrejas), mas
não estão produzindo a unidade do Corpo.

No entanto, por meio de humilhação, quebrantamento,


perdão, submissão ao tratamento de Deus e arrependimento,
seremos levados a rejeitar todo orgulho e exaltação. Renome
e grandes ministérios não mais atrairão pessoas, porque en-
tenderemos que é necessário ser quebrantado e diminuído
para que Cristo seja glorificado. Este espírito de humildade e
quebrantamento trará a presença de Jesus e formará o Corpo,
porque este é o Espírito de Jesus.

O perdão como a maior marca


No livro Perdão Total 86, a última capa diz o seguinte:
Perdoar totalmente é tão espetacular quanto qualquer milagre.
Estamos falando de uma façanha maior do que escalar o Monte
Everest. Significa o maior marco na peregrinação espiritual de
qualquer pessoa... (grifos nossos)

Temos grandes marcos em nossa vida: o dia do nas-


cimento (comemoramos todos os anos), o dia do casa-
mento, o dia do nascimento de um filho, o dia em que
ingressamos na universidade ou no primeiro emprego, o
dia em que perdemos uma vida muito valiosa, o dia em
que ganhamos um grande prêmio (pouco comum, mas
real para alguns) etc.

86
KENDALL, R.T. Perdão Total - Superando o Maior Desafio de Deus. São
Paulo/SP: Editora Matrix, 2011.

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A queda dos muros que nos separavam 125

Qual desses dias poderia ser eleito como o principal? Talvez,


poderíamos ter mais clareza se pensássemos na própria pessoa
de Jesus. Qual foi o dia mais importante para Jesus? Jesus faz
alguma alusão a isso?
Poderíamos dizer que o dia da encarnação de Jesus teria
sido o mais relevante? De certa maneira sim. Foi o dia em que
Deus deixou por um tempo sua condição de eterno, infinito,
todo-poderoso para se tornar um embrião no ventre de uma
adolescente. Sua natureza humana o levou a tornar-se mortal,
finito, dependente de todos os cuidados de uma mulher, sua
criatura.
Ou teria sido o dia do seu batismo no Rio Jordão, cumprin-
do toda a justiça do Pai, ficando cheio do Espírito Santo, sendo
equipado para realizar a sua obra daí para frente, recebendo a
estonteante declaração do Pai: “Este é o meu filho amado em quem
me comprazo”?
Ou teria sido em Lucas 4, na sinagoga, quando leu a profecia
do profeta Isaías e no final disse: “Hoje se cumpriu estas Escrituras
aos seus ouvidos”? Teria sido o dia da sua morte na cruz? Ou o dia
da sua ressurreição? Ou o dia da sua ascensão?
Em João 12.27, Jesus afirmou o propósito para que veio:
“Agora, está angustiada a minha alma, e que direi eu? Pai,
salva-me desta hora? Mas precisamente com este propósito
vim para esta hora” (grifos nossos). Poderíamos dizer que
Jesus veio para muitas finalidades: falar do seu reino, falar
do Pai, curar, libertar, ensinar o amor e a graça, demonstrar
o poder de Deus, profetizar, anunciar o final dos tempos,
etc. Mas todos estes atributos são secundários perto da razão
específica da encarnação de Cristo. Ele veio primordialmente
para cumprir um propósito, para um momento específico:
morrer na cruz.

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126 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

Há sete frases que Jesus disse na cruz. Quem crê no Evangelho


sabe que não é coincidência, pois as frases abaixo resumem o plano
de Deus. São frases profetizadas (antecipadas) muito tempo antes
pelos profetas do Velho Testamento:

1. Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste?


(Marcos 15.34)
2. Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem.
(Lucas 23.34)
3. Hoje mesmo estarás comigo no Paraíso. (Lucas 23.43)
4. Mulher, eis aí, o teu filho; filho, eis aí a tua mãe.
(João 19.26,27)
5. Tenho sede. (João 19.28)
6. Está consumado. (João 19.30)
7. Pai, a ti entrego o meu Espírito. (Lucas 23.46)

Qual dessas frases têm mais impacto para a nossa salvação?


No aspecto prático, sem dúvida é a segunda frase, na qual Jesus
libera o perdão para a humanidade. Não podemos entender, com
a nossa mente limitada, a profundidade da morte de cruz à qual
Jesus se submeteu bebendo do cálice amargo, derramando seu
sangue por nós.
Porém, sabemos que o dia da crucificação foi o dia do perdão.
Somente o Filho do Homem, Jesus Cristo, tem o poder de perdoar
pecados (Mateus 9.6). Só ele pode tirar nossa culpa e tomar sobre
si os pecados de todos os homens, porque só ele é o Filho de Deus,
só ele é sem pecado, só ele é justo e não nasceu da semente de
Adão, pois tornou-se homem pela concepção do Espírito Santo.
O que Deus espera que façamos imediatamente após receber
tão grande dádiva? Que, imensamente agradecidos, pratiquemos

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A queda dos muros que nos separavam 127

com o nosso próximo este ato de amor. Isto fica claro em Mateus
18.21-35 quando o Rei (Deus) perdoa uma dívida impagável de
um servo (nós), demonstrando seu grande amor e sua graça. To-
davia, o Rei requer que o servo perdoado (livre) também perdoe
aos seus companheiros. Assim como Deus teve misericórdia de
nós, devemos igualmente ter misericórdia dos outros: “Assim como
Cristo vos perdoou, fazei vós também” (Colossenses 3.13b).
Aqui, portanto, fica claro que, quando Deus perdoa ao pecador,
isso se reflete na convivência dos irmãos na fé. Receber perdão de
Deus e perdoar aos outros são duas coisas que andam lado a lado.
Isto fica muito claro na “Oração do Pai Nosso” em que Jesus clama:
“Perdoa-nos as nossas dívidas, assim como nós temos perdoado os
nossos devedores” (Mateus 6.12 – grifos nossos).
Em outras palavras, assim como nós tivemos o dia do perdão
que nos redimiu, que nos fez novas criaturas, teremos também o
dia do perdão para as pessoas que nos devem, que nos ofenderam.

Quando deve ser este dia?


Imediatamente! Jesus nos ensina que, se estivermos no altar ofe-
recendo nossa oferta a Deus (ou financeira, ou louvor, ou ação
de graças, ou adoração, etc.) e lembrarmos que algum irmão tem
queixa contra nós, deveremos deixar a oferta na frente do altar e
ir imediatamente fazer as pazes com ele para depois levar nossa
oferta a Deus (Mateus 5.23,24).
É interessante que devemos deixar a oferta em suspenso. Se
entregarmos, não terá valor algum para Deus. Porém, não po-
demos levá-la de volta para casa; afinal, seria fácil esquecer nossa
missão do perdão no momento seguinte. Assim, é como se eu
tivesse de pagar uma conta e deixasse no meu quarto um lembrete
enorme para não esquecer uma obrigação que precisa ser quitada.
Isso atrapalha meu sono, porém é necessário para que eu esteja

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128 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

consciente de algo que poderia esquecer com facilidade. Assim, a


oferta não entregue ficaria em lugar visível e público para eu saber
que, enquanto eu não resolver a questão, minha consagração a
Deus estará prejudicada. Quem não está em paz com seu irmão
não está em paz com Deus (Mateus 5.22).
Outro momento em que Jesus nos adverte da urgência do
dia do perdão é detectado na hora em que fazemos nossas
orações (Marcos 11.24-26). No momento da oração, em que
temos mais sensibilidade à voz do Espírito Santo, estamos
sujeitos a nos lembrar de pessoas que nos ofenderam. Neste
momento, paramos de orar e liberamos o perdão, pois, se não
o fizermos, o nosso Pai que está no céu também não perdoará
as nossas ofensas.
Portanto, de que adianta orar se Deus não nos liberar o
perdão? Se alguém não nos perdoa, esse alguém não nos ouve
e, mesmo que ouça, não poderá nos beneficiar, pois não está
em paz conosco. Creio que o mesmo acontece com Deus. Os
nossos pecados nos separarão de Deus enquanto não forem
perdoados. Em outras palavras, sem perdoar, eu oro em peca-
do, e, enquanto estiver pecado, certamente a oração não tem
efeito. Assim, se eu paro de orar, fica um alerta: “Por que não
estou orando mesmo?” Porque não houve o dia do perdão para
aqueles que me ofenderam.
Encobrir pecados nos leva a enfermidades, a distanciamento
de Deus. Davi disse que, enquanto ele se calou (encobriu seu
pecado), seus ossos envelheceram, ele chorava o dia inteiro
(gemidos), suas forças foram se acabando e seu humor de-
sapareceu. Mais do que isso, ele sentia que as mãos de Deus
pesavam sobre ele. Então, o salmista tomou a decisão de
confessar seu pecado, sua maldade, e Deus perdoou os seus
pecados (Salmo 32).

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A queda dos muros que nos separavam 129

Imagine que, enquanto não perdoarmos, enquanto não houver


o dia do perdão, as nossas ofertas (dízimos), o louvor, a adoração
e, até mesmo, as nossas orações não terão significado no mundo
espiritual. Por isso, o dia do perdão é urgente.

Como deve ser o dia do perdão?


O texto de Marcos 10 citado anteriormente pode nos induzir
a entender que basta uma declaração de perdão diante de
Deus para, em seguida, eu continuar na minha oração e ficar
tudo bem. Talvez, isto possa ser verdade em certas situações.
Porém, Jesus nos ensina em Mateus 18.15-17 como deve ser
o ritual do perdão:
Ora, se teu irmão pecar contra ti, (1) vai e repreende-o entre ti e ele
só; se te ouvir, ganhaste teu irmão; mas, se não ouvir (2) leva ainda
contigo um ou dois, para que pela boca de duas ou três testemunhas
toda palavra seja confirmada; e, se não escutar, (3) dize-o à igreja...
(Mateus 18.15-17b, numeração nossa).

Esse ensino de Jesus mostra que deve existir um esforço grada-


tivo de nossa parte no sentido de acerto. Nada pode ser tratado
de forma superficial e casual, mas estrategicamente. É algo que
não pode ser adiado sem chegar a um desfecho.
O importante nesse texto é que ele nos desafia também no
sentido contrário: quando somos nós que ofendemos e o ofendido
não nos procura. Claro que, nesse caso, não vamos repreender o
irmão, mas vamos suplicar seu perdão com humildade. Se ele não
aceitar nosso pedido, pediremos a ajuda de pessoas comuns entre
nós, ofensor e ofendido. Não havendo resultado ainda, pediremos
a ajuda da igreja. Nos três versos anteriores aos citados acima em
Mateus 18, fica claro que todo nosso esforço nesse assunto é para
que ninguém se perca (Jesus está falando de salvação).

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130 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

Nesse caso, Deus ensina: a) que o silêncio não é a voz do perdão;


b) que não se deve colocar uma pedra em cima; c) que o tempo
não fará esquecer; d) que sentir-se ofendido é normal, pois todos
somos sensíveis; e) que não devemos comentar com ninguém
sobre o assunto, mas ir ao encontro do desafeto.
Muitas vezes, as pessoas dizem que sequer conseguem ser
recebidas pelo seu desafeto para perdoar ou pedir perdão.
Nestes casos, sugiro que enviem uma carta, um e-mail, uma
mensagem, sempre com muita humildade. Não dando certo,
deverão pedir a ajuda de pessoas que se relacionam com o
desafeto.
No ano em que escrevi este texto, senti, num momento de
oração e reflexão, como se “um filme” da minha vida passasse
diante de mim. Foram destacadas quatro pessoas com quem
tive sérios problemas: um amigo da minha pré-adolescência
a quem causei grande mal por ignorância; uma ex-namorada
com quem não agi decentemente; uma funcionária contra a
qual testemunhei na justiça, prejudicando-a, conforme orien-
tação do advogado da empresa (ela era gerente e agiu de má fé
contra a empresa); e um irmão que fez um grande mal contra
mim e minha família.
No final, foi como se o Senhor me dissesse: “Põe em ordem
a tua casa...” (2 Reis 20.2). “Senhor”, disse eu, “mas três desses
casos aconteceram há mais de 40 anos, e eu não te conhecia, não
sabia deste teu mandamento!”
Mas aprendi algo muito importante nesse dia: que, junta-
mente com o ato de perdoar ou pedir perdão, eu exalto a pessoa
de Cristo que me amou quando eu era inimigo de Deus. Ele
morreu para me perdoar sendo eu ignorante, inimigo. Quan-
do me dirijo a um desafeto do passado, a primeira coisa que
ressalto é o grande perdão na cruz do qual eu fui objeto. O ato

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A queda dos muros que nos separavam 131

do perdão em nome de Jesus é evangelístico, é o maior louvor


a Deus em Jesus Cristo que podemos praticar. É um ato para
manifestar as obras de Deus (João 9.3b).
Veja o que Jesus ensina: “Se teu irmão pecar contra ti, vai e
repreende-o entre ti e ele só; se te ouvir, ganhaste teu irmão”. O que
significa “ganhaste teu irmão”? Se eu sou cristão e ganho um irmão,
significa que a família de Cristo está aumentando na terra! Não
é este o propósito de Deus? Agregar cada um daqueles que ainda
serão salvos? Mesmo que o nosso desafeto já seja salvo, sem perdão
para o próximo, em inimizade, o perdão de Deus será retirado (ve-
remos isso no item seguinte). Assim, perdão está relacionado com
testemunho, com evangelismo; tudo para a glória de Deus Pai.
Usando os bons recursos de busca que temos hoje, consegui
localizar duas dentre as quatro pessoas citadas. A misericórdia de
Deus (“Misericórdia quero, e não sacrifícios”; Oseias 6:6) permitiu
que tudo corresse bem, e o Senhor foi exaltado. Porém, nos outros
dois casos, o primeiro e o terceiro da lista acima, não consegui
localizar os envolvidos. Numa reunião de um grupo de homens
cristãos (“levar à igreja”), apresentei aqueles pecados aos irmãos.
Eles oraram e choraram comigo. Senti que realmente aquele era
o dia do perdão. Nesses casos, orei arrependido e me tornei um
abençoador daquelas vidas.
Você imagina eu não poder me acertar com a pessoa que ofendi
e orar por ela? Imagine que eu continue orando por ela não por
um dia, nem por uma semana, nem por um mês, mas por um
ano! Será que essa pessoa não terá uma revelação de Jesus e que a
minha oração fervorosa não levará Deus a alcançá-la? Confessei
o meu pecado, inclusive para alguns irmãos que agiram como
testemunhas e com poder de deliberação. O que eu quero dizer é
que o Deus soberano tira proveito até de erros terríveis cometidos
por nós para a sua glória.

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132 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

O que fica claro nos princípios de Mateus 18.15-17 é o cami-


nho para o dia do perdão: tente inicialmente; não dando certo,
busque ajuda de um ou dois irmãos; não chegando a um final
feliz, busque ajuda da igreja (um grupo de irmãos com quem você
se relaciona, com quem tem comunhão). Nesse caso, este grupo
de irmãos terá o poder de Deus para deliberar o perdão (“Porque
onde estiverem reunidos dois ou três no meu nome, aí estou eu no
meio deles”, Mateus 18.20).
Veja o que Jesus fala nos dois versos seguintes:
Em verdade vos digo que tudo o que ligardes na terra será ligado no
céu, e tudo que desligardes na terra será desligado no céu. Também
vos digo que, se dois de vós concordarem na terra acerca de qualquer
coisa que pedirem, isto lhes será feito por meu Pai que está nos céus
(Mateus 18.18,19, grifos nossos).

Além disso, eu estou confessando os meus pecados: “Se confes-


sarmos os nossos pecados, Ele é fiel e justo para nos perdoar os pecados e
nos purificar de toda a injustiça” (1 João 1.9). E o mais importante
é que ele nos purifica dos nossos pecados com o seu sangue.

Se eu não perdoar, o que vai acontecer?


Como está bem claro em Mateus 18, Deus pode retirar o perdão
que foi concedido:
Então o seu senhor, chamando-o à sua presença, disse-lhe: servo
malvado, perdoei-te toda aquela dívida, porque me suplicaste. Não
devias tu, igualmente, ter compaixão do teu companheiro, como eu
também tive misericórdia de ti? E, indignado, o seu senhor entregou-
-o aos atormentadores, até que pagasse tudo o que devia. Assim,
vos fará, também, meu Pai celestial se do íntimo não perdoardes
cada um a seu irmão (vv. 32 a 35 – grifos nossos).

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A queda dos muros que nos separavam 133

Também, após a oração do “Pai Nosso”, Jesus acentua:


Porque se perdoardes aos homens as suas ofensas, também o vosso
Pai celestial vos perdoará a vós. Se, porém, não perdoardes aos
homens as suas ofensas, também vosso Pai vos não perdoará as
vossas ofensas (Mateus 6.14,15 – grifos nossos).

Parece-me que, se não perdoarmos ao nosso irmão (depois


de conhecer esse mandamento do perdão), poderemos perder a
comunhão com Deus. Afinal, se ele ainda nos considera culpados
(já que poderia retirar o perdão), este pecado se torna uma pare-
de, um muro no nosso relacionamento. Obviamente, não posso
afirmar isso com toda a convicção. Mas o que nos conforta é que
Deus é o Pai das misericórdias. Ainda que estivermos levantando
um muro entre nós e ele, sua misericórdia continua ativa e, quem
sabe, mais intensa ainda, pois ele quer que este muro, que já foi
derrubado por Jesus na cruz, desapareça para sempre em nossa
vida. Mas não vale a pena correr riscos nessa área.
A proposta de sermos um só Espírito, um só Corpo e termos
um só Senhor, pressupõe não existirem inimizades entre irmãos.
E isso não se aplica apenas àqueles que congregam conosco, mas
também a irmãos de outras denominações. Pressupõe não haver
julgamentos.
Não existindo inimizades (desfeitas por Jesus na sua carne ao
ser crucificado), eu posso ter comunhão com irmãos nascidos
de novo de qualquer denominação cristã, ainda que as nossas
doutrinas não tenham harmonia; ainda que os estilos de louvar e
adorar a Deus sejam diferentes; ainda que as formas de culto ou
reuniões sejam divergentes. Qualquer diferença é pequena perto
do fato de servirmos ao mesmo SENHOR!

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Capítulo 6

ELES NÃO FAZEM COMO NÓS

E
m Marcos 9.34-37, Jesus fala pela segunda vez sobre sua
morte e ressurreição. E, exatamente neste contexto, há
uma discussão entre seus discípulos a respeito de quem
é mais importante.

Mas eles guardaram silêncio; porque, pelo caminho, haviam


discutido entre si sobre quem era o maior. E ele, assentando-se,
chamou os doze e lhes disse: Se alguém quer ser o primeiro, será
o último e servo de todos. Trazendo uma criança, colocou-a no
meio deles e, tomando-a nos braços, disse-lhes: Qualquer que
receber uma criança, tal como esta, em meu nome, a mim me
recebe; e qualquer que a mim me receber, não recebe a mim, mas
ao que me enviou.

Jesus reage a esse quadro pegando uma criança, colocando-a


no colo e dizendo que quem a recebesse estaria recebendo a
ele mesmo, recebendo ao Pai. E conclui declarando: “se alguém
quer ser o primeiro, será o último e servo de todos”.

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136 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

O contraexemplo
Tudo ficaria muito bem se eles refletissem sobre o exemplo de
Jesus e se calassem. Mas João, em seguida, comenta:
Mestre, vimos um homem que, em teu nome, expelia demônios, o
qual não nos segue; e nós lhe proibimos, porque não seguia conosco.
Mas Jesus respondeu: Não lho proibais; porque ninguém há que faça
milagre em meu nome e, logo a seguir, possa falar mal de mim. Pois
quem não é contra nós é por nós (vv. 38-40).

Em Lucas 9.50, a resposta de Jesus para essa colocação de


João é a seguinte: “Não o proibais, pois quem não é contra vós
outros é por vós”. Em Lucas 11.23, em outro contexto, há uma
declaração semelhante, mas invertida: “Quem não é por mim, é
contra mim”. Podemos deduzir, a partir dessas afirmações, que
aquele homem que expulsava demônios tinha um relaciona-
mento com Jesus que os discípulos desconheciam.
Jesus deixou a entender, a João e seus companheiros, que só
alguém que conhece a Jesus e é conhecido por ele pode expulsar
demônios. Devemos evitar o perigo de julgar as pessoas por
nossos formatos e convenções, sem saber o quanto a pessoa
conhece Jesus e quanto é conhecida por ele.

Fatos importantes sobre esse texto


É importante ressaltar que:
a. numa versão mais antiga, é subentendido que o
homem expulsava demônios no “poder do nome de
Jesus”. Aquele homem não estava usando o nome
de Jesus como “mágica”, como visto em Atos 19.13.
Ele também não tinha o perfil de iníquo, como em
Mateus 7.21-23.

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Eles não fazem como nós 137

b. Ele estava do lado de Jesus, trabalhando a favor de Jesus,


embora não fizesse parte daquele grupo privilegiado que
andava com o Senhor.
c. Jesus era conhecido por aquele homem e o conhecia; caso
contrário, não haveria a operação do Espírito de Cristo na
ação da libertação.
d. Essa colocação inoportuna de João (mas muito importante
para nós) ocorre diante da “cruz anunciada” por Cristo, ou
seja, em Marcos 9.31 ele havia explicado como cumpriria
sua missão.
e. No exemplo em que ele pega a criança (Marcos 9.36), está
se referindo a “pequeninos” que creem nele, que podem
ser crianças, outros seguidores (Marcos 9.42-50) ou, até
mesmo, os que são fracos na fé (1 Coríntios 8.9-13);
f. No verso 41 de Marcos 9, Jesus ensina que aquele que der
um copo de água em seu nome a alguém que é de Cristo
(mesmo que não seja do nosso grupo, da nossa doutrina)
com toda certeza receberá sua recompensa. Há um galardão
especial para quem ama aqueles que, como nós, foram
aceitos por Cristo.
g. Jesus repreende o sectarismo. Em Atos 10.15, diante da
atitude de desobediência de Pedro, o Espírito Santo diz:
“Não faças tu comum ao que Deus purificou”.

Dake, em sua Bíblia de Estudo87, diz sobre o texto acima de


Marcos 9:

Uma lição para o cristianismo dividido que existe hoje... Os verda-


deiros crentes amarão cada pessoa de outra igreja e a apreciarão, e ao
seu trabalho, como se pertencesse à sua própria igreja.

87
Bíblia de Estudos Dake. São Paulo/SP: Editora Atos.

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138 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

Um segundo e terceiro contraexemplos


Um fato semelhante e muito interessante ocorreu com Moisés:
... tirando do espírito, que estava sobre ele, o pôs sobre aqueles
setenta anciãos; e aconteceu que, quando o espírito repousou sobre
eles, profetizaram; mas depois nunca mais. Porém no arraial ficaram
dois homens; o nome de um era Eldade, e do outro Medade; e
repousou sobre eles o espírito (porquanto estavam entre os inscritos,
ainda que não saíram à tenda), e profetizavam no arraial. Então
correu um moço e anunciou a Moisés e disse: Eldade e Medade
profetizam no arraial. E Josué, filho de Num, servidor de Moisés,
um dos seus jovens escolhidos, respondeu e disse: Moisés, meu
senhor, proíbe-os. Porém, Moisés lhe disse: Tens tu ciúmes por
mim? Quem dera que todo o povo do Senhor fosse profeta, e que
o Senhor pusesse o seu espírito sobre ele! (Números 11.26-29)
(grifos nossos)

Sem dúvida, somos tentados a ter atitudes reprováveis como a


de João e Josué no texto acima. Quantas vezes nos colocamos num
nível superior e dizemos: “Não concordo com procedimentos de
certas igrejas e quero proibir que eles façam desse jeito, ou quero
que o Senhor impeça que eles façam isso que não me agrada.
Não é do jeito que penso ser o certo. Não é assim que meu grupo
procede. Não é assim que aprendi com a Bíblia”.
Hoje nós temos, muitas vezes, a mesma atitude de Josué. Gos-
tamos de “domesticar” o Espírito Santo e achar que ele só deve
fazer aquilo que pensamos ser correto. Que bom que o Espírito
Santo não se prende a nós e, algumas vezes, “nos escandaliza e faz
loucuras inimagináveis”!
Quantas vezes temos um procedimento reprovável como o
de Pedro em Atos 10, rejeitando uma ordem de Deus em relação
a outro grupo (ou pessoas) que não era exatamente como Pedro

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Eles não fazem como nós 139

queria que fosse, a ponto de desobedecer a Deus dizendo: “De


modo nenhum, Senhor, pois nunca comi uma coisa comum,
imunda”? Por três vezes, este fato se repete. Deus teve de insistir
com Pedro para que não chamasse “de impuro aquilo que ele havia
purificado” (vv. 10-16).
Pedro era fiel à Lei e, no entendimento dele, achava que a
religião dos judeus não permitia que fizessem amizades com
não judeus, mesmo que estes fossem amados e escolhidos
por Deus.
Pedro era um “diamante bruto” que precisava ser lapidado
ainda mais um pouco depois de Pentecostes. E o Espírito
Santo fez isso e mostrou-lhe que os gentios convertidos
(ou em busca de Deus) não eram “cristãos (ou pessoas) de
segunda classe”. Esta é a mensagem para nós: para Deus,
não existem filhos de segunda categoria. No século 20, todas
(repito, todas) as denominações cristãs foram visitadas pelo
Espírito Santo!

Entendendo a graça
Sabe por que Pedro agiu assim e nós também agimos de
maneira semelhante muitas vezes? Porque Pedro ainda não
entendia plenamente (nem nós) a graça de Deus! Ele ainda
não entendia plenamente a linha divisória de João 1.17, que
diz que “a lei veio por intermédio de Moisés, mas a graça e a ver-
dade vieram por meio de Jesus”. Pedro ainda tinha dificuldade
de entender que os gentios não precisavam cumprir os rituais
do Velho Testamento para tornar-se povo de Deus. Mas, mais
tarde, ele veio a entender perfeitamente, pois escreveu em sua
carta que o “amor cobre multidão de pecados” (1 Pedro 4.8).
Entender a graça é pelo Espírito Santo, pois muitas vezes a
graça nos escandaliza.

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140 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

De fato, a graça de Deus é escandalosa. Existe um exemplo


maravilhoso de graça no famoso livro Os Miseráveis de Victor
Hugo.88 Jean Valjean acabara de sair da prisão onde tinha pagado
pena injustamente. Faminto, bateu à porta de um bispo muito
bondoso (bispo Myriel, conhecido como “senhor Benvindo”), que
fez questão que se sentasse à mesa com ele e ainda lhe deu pernoite,
para escândalo de sua criada. Jean viu onde a criada guardara os
valiosos talheres de prata com que fora composta a mesa. Decidiu
acordar bem cedo e furtá-los. Mais tarde, foi pego pelo inspetor
de polícia, Javert, que não saía de seu rastro. As peças de prata do
bispo foram reconhecidas e Javert se dirigiu à casa do bispo com
Valjean para que as devolvesse antes de retornar à prisão.
“Olha como esse desgraçado pagou pelo bem que lhe fez, bispo.
Roubou seus talheres de prata” – disse Javert, imponente, à porta
do bispo, quando Jean Valjean abriu o saco e retirou de lá seus
pertences. Mas, para surpresa do inspetor e do próprio Valjean, o
bispo Myriel simplesmente replicou: “Não. Eu dei tudo a ele. E
você esqueceu outros utensílios. Olha, leve esses daqui também”.
Graça é você abençoar e tratar bem aquele que o trai e rouba o que
lhe pertence. O bispo cobriu o pecado daquele homem miserável
e ainda lhe deu muito mais – isso é graça que superabunda onde
abunda o pecado. Essa atitude do bispo mudou por completo a
vida de Jean Valjean. Ele se converteu.
Não tem nada mais emocionante que a graça de Deus. Até
a fé, para sermos salvos, é pela graça, vem de Deus. A fé é um
dom de Deus para que ninguém se glorie. Graça é 100% ação
de Deus – ele faz tudo, e nós somos apenas seus instrumentos.
Paulo, um perseguidor da igreja, teve a vida revolucionada pela
graça de Deus. Em Romanos 11.6, ele diz que “se é pela graça,
já não é mais pelas obras”, pois, se fosse pelas obras da lei, já não

88
HUGO, Victor. Os Miseráveis. São Paulo/SP: Editora Martin Claret, 2014.

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Eles não fazem como nós 141

seria mais graça. É com a graça de nosso Senhor Jesus Cristo que
devemos tratar as pessoas. É com esta graça que devemos tratar
irmãos de outras denominações, ainda que eles tenham doutrinas
diferentes de nós e não façam como nós.
Deus é soberano e está acima de todas as coisas. Em nossa vo-
cação pela unidade, tenhamos a atitude de Paulo, que disse em 1
Coríntios 9.22: “Para com os fracos tornei-me fraco, para ganhar
os fracos. Tornei-me tudo para com todos, para de alguma forma
salvar alguns”. Amém!
São três grandes ícones da Bíblia, Josué, João e Pedro, que ti-
verem um juízo errado ao não querer abençoar aqueles que Deus
abençoava. Será que nós, com a letra na mão, podemos ter atitudes
assim, que divergem do Espírito Santo? Certamente.
Quantas vezes desejamos tolher a liberdade do Espírito, cor-
rendo o risco (e nem percebemos isso) de querer domesticar e
monopolizar o Espírito de Deus em favor de nossa eclesiologia?
O Espírito é quem dá vida ao Corpo de Cristo, à Igreja, de modo
muito especial e diversificado. O Espírito Santo é o ponto de
unidade da Igreja e concede dons da maneira como deseja: “Mas
um só e o mesmo Espírito opera todas estas coisas, repartindo
particularmente a cada um como ele quer” (1 Coríntios 12.11).
Há momentos em que o Espírito Santo quer unanimidade
(Atos 1.14, 2.46, 4.26, etc.). Em outras situações, este mesmo
Espírito quer diversidade de dons, ministérios, operações, manifes-
tações: “... a cada um, para o que for útil: palavra de sabedoria,
palavra de ciência, fé, dons de curar, operações de maravilhas,
profecia, variedade de línguas, interpretação de línguas [...] tudo
para a edificação do corpo” (1 Coríntios 12).
Como nós temos dificuldade em enxergar a versatilidade do
Espírito para que, agindo como ele, as pessoas possam confessar

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142 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

que Jesus Cristo é o Senhor! Walter Kasper afirma: “A função do


Espírito é trazer o evento Jesus Cristo de forma única e definitiva para
sua realização na Igreja e na história do mundo”.89 Este autor cita
também Irineu de Lyon que diz:
Em qualquer lugar em que esteja a Igreja, aí se encontra também o
Espírito de Deus, aí estão a Igreja e toda a graça. Ele dá vida, inspira,
estimula e preserva a igreja, sempre na Sua liberdade de agir.

Situações práticas
As Forças Armadas do Brasil, subordinadas ao Ministério
da Defesa (unidade militar), são constituídas pela Marinha,
pelo Exército e pela Aeronáutica. São instituições nacionais,
permanentes e regulares que têm como missão constitucional
zelar pela defesa da pátria. Cada força tem sua divisão, seus
regimentos, suas brigadas capazes de realizar operações mili-
tares independentes. Por exemplo, o Exército tem as divisões
de Infantaria, Cavalaria e Artilharia. E existem muitas outras
subdivisões indispensáveis, como bombeiros, polícia militar,
rodoviária e outras que trazem tantos benefícios a todos nós.
São formas diferentes de operar com um mesmo propósito.
Assim também é a Igreja.
Fico imaginando o mover do Espírito Santo quando ele
quer alcançar regiões fortes em tráficos de drogas, crimi-
nalidade, prostituição... Como capacitará os soldados que
penetrarão nestes redutos? Ou quando o objetivo são regiões
de pobreza extrema e miséria, que tipo de “armamento” ele
proverá? Ou ainda em lugares onde prevalecem trevas visíveis
com seitas demoníacas, locais onde Satanás impera sobre
os habitantes deste “gueto”, como será sua estratégia? Ou
em relação a moradores de rua, “cracolândia”, prostíbulos?
89
KASPER, Walter. Que Todos Sejam Um. São Paulo/SP: Edições Loyola,2008.

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Eles não fazem como nós 143

Ou como o Evangelho será levado até populações agressi-


vamente oprimidas, sem perspectivas ou, ainda, para ricos
que colocam a esperança no dinheiro?
O propósito de Deus é fazer o bem, como está escrito
em Atos 10.38: “Como Deus ungiu a Jesus de Nazaré com
o Espírito Santo e com virtude; o qual andou fazendo o bem
e curando a todos os oprimidos do diabo, por que Deus era
com ele”. Certamente, este deve ser o propósito da Igreja,
no nome de Jesus, no poder do Espírito Santo. Hoje, vejo
muitos ministérios que fogem ao “padrão ideal” desejado
por outros grupos, agindo com ousadia, adentrando em
campos que poucos fariam.
É lógico que a metodologia não será, para cada caso, no
modelo de que determinados grupos gostam e entendem como
satisfatória. Os métodos não serão os tradicionais dentro do
perfil com o qual muitos estão acostumados. O padrão não
será o convencional. É mais fácil avaliar segundo o nosso senso
crítico do que olhar para os frutos de cada trabalho. Infeliz-
mente, atitudes assim trazem críticas entre os cristãos gerando
divisões, como se não fosse o Espírito Santo que lá está ou
como se a obra não fosse de Jesus. Esse juízo não é bom e não
colabora em nada para a unidade da Igreja.
Paulo usou de estratégias diferentes para alcançar grupos
diferentes:
Porque, sendo livre para com todos, fiz-me servo de todos para ga-
nhar ainda mais. E fiz-me como judeu para os judeus, para ganhar
os judeus; para os que estão debaixo da lei, como se estivesse debaixo
da lei, para ganhar os que estão debaixo da lei. Para os que estão
sem lei, como se estivesse sem lei (não estando sem lei para com
Deus, mas debaixo da lei de Cristo), para ganhar os que estão sem
lei. Fiz-me como fraco para os fracos, para ganhar os fracos. Fiz-me

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144 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

tudo para todos, para por todos os meios chegar a salvar alguns. E
eu faço isto por causa do evangelho, para ser também participante
dele (1 Coríntios 9.19-23).

As “três ondas” do século 20


No século 20 presenciamos, especialmente, grandes manifestações
do Espírito Santo, não só relativas a curas, libertações, batismos
no Espírito Santo, mas também à revelação da Palavra divulgada
num grande número de livros e pela mídia em geral.
Tudo começou vinte séculos atrás, no dia de Pentecostes.
De acordo com Atos 2, o Espírito Santo foi derramado sobre
um grupo de 120 pessoas reunidas num cenáculo. Um dos
efeitos imediatos foi que judeus devotos “de todas as nações
debaixo do céu” (v. 5), presentes em Jerusalém por ocasião
da festa, começaram a ouvir, cada um em sua própria língua
materna, as grandezas de Deus (vv. 8-11). Assim, a confusão
de línguas e a divisão entre os povos, iniciadas na torre de
Babel, começaram a ser desfeitas.
Segundo Vinson Synan90, no século 20, encontramos
pentecostais e carismáticos, que chamamos de “primeira
onda” e “segunda onda” respectivamente. Os “pentecostais”
constituem um povo que concebeu e popularizou a doutri-
na da evidência inicial do falar em línguas no batismo do
Espírito Santo. No início do século 20, foram expulsos das
suas denominações e obrigados a implantar suas próprias
igrejas. Alguns estudiosos denominam esse grupo de pente-
costais clássicos. O termo carismático foi usado pela primeira
vez em 1963 para designar os novos pentecostais, membros
das igrejas católica romana e protestantes que falavam em

90
SYNAN, Vinson. O Século do Espírito Santo – 100 anos do avivamento
pentecostal e carismático. São Paulo/SP: Editora Vida, 2011.

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Eles não fazem como nós 145

línguas estranhas, mas não consideravam essa prática uma


evidência obrigatória da experiência pentecostal. A “terceira
onda” não tem uma denominação exata. Alguns a chamam
de neopentecostais ou neocarismáticos.
A primeira reação de grande parte da Igreja como um todo foi
“que eles não fazem como nós”. O pentecostalismo, inicialmente,
foi perseguido e rejeitado durante décadas. Não houve o cuidado
da Igreja de avaliar (assim como João, em Marcos 9.38) se aquele
mover convergia para Cristo, bem como não houve prudência
(assim como Josué, em Números 11.28) para identificar que era
o Espírito Santo que operava.
Essa mesma rejeição ocorreu na década de 1960 com os “ca-
rismáticos” pelas principais igrejas protestantes tradicionais (todos
receberam a renovação do Espírito Santo; daí o nome “Renovação
Carismática”) e inicialmente também pelos renovados da Igreja
Católica Romana. Entendo que essa atitude é muito semelhante
à de Pedro em Atos 10, visto acima (não querer se misturar com
aqueles que pareciam não ter a mesma doutrina).
Hoje o número de pentecostais e carismáticos ultrapassa 700
milhões. Porém, vejam como os pentecostais foram tratados (e
excluídos do que era o “cristianismo respeitável”) por mais de
cinco décadas. Segundo Synan, nas reuniões em que Jesus era o
centro e com manifestações do Espírito Santo...91
... eles eram barulhentos e, para alguns, desordeiros. Sua adoração
estava além do entendimento daqueles que não conheciam a espi-
ritualidade interior que orientava o movimento. Acima de tudo, os
pentecostais eram pobres, desprivilegiados, sem instrução e alheios
às “últimas tendências teológicas” que interessavam à maior parte
do protestantismo.
91
SYNAN, Vinson. O Século do Espírito Santo – 100 anos do avivamento
pentecostal e carismático. Ibid.

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146 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

A reação comum às igrejas modestas e ao povo pobre era de


rejeição, embora os pentecostais, a despeito de ser o que eram,
realizassem um trabalho benéfico para a sociedade, ministrando
aos pobres e excluídos, que se sentiam hostilizados e pouco à
vontade com a sofisticação e a riqueza das igrejas tradicionais.
Práticas como falar em línguas, profecias e expulsão de demônios
eram consideradas subprodutos bizarros da ignorância religiosa e
de um entusiasmo desenfreado. Observe que essa mútua rejeição
era da própria Igreja de Jesus Cristo.

Não se prenda ao convencional


Normalmente, nós gostamos do convencional, das coisas formais
que aprendemos a praticar na nossa igreja. O que foge disso, cor-
remos o perigo de achar que não é de Deus. E se não é de Deus,
de quem é então?
Imagine se, na nossa congregação, ouvíssemos a notícia de que
há um homem com o dom de cura. Para curar mudos e cegos,
ele usa cuspe, saliva. Em um caso de cura de cego, ele misturou
cuspe com terra formando barro e passou no olho do cego, pe-
dindo para ele ir se lavar. Você iria glorificar a Deus pelas curas ou
gerar dúvidas em seu coração? Que método anti-higiênico! Será
que isso vem de Deus? Pois é. Esse homem foi Jesus. Em Marcos
7.33, ele cuspiu e colocou um pouco de saliva na língua do mudo.
Em Marcos 8.23, ele cuspiu e passou a saliva nos olhos do cego.
Em João 9.6, ele cuspiu no chão, fez um pouco de lama com a
saliva, passou a lama nos olhos do cego e pediu-lhe para se lavar
no tanque de Siloé. E todos foram curados.
Precisamos tomar cuidado ao julgar aquilo que não é con-
vencional, principalmente em se tratando dos “neopentecos-
tais”. Podemos ter também uma atitude farisaica, que tanto
criticamos no Novo Testamento. Pior, corremos o risco de ir

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Eles não fazem como nós 147

contra o Espírito Santo que não é nem um pouco convencio-


nal. Isto aconteceu em Mateus 12.22-32, quando os fariseus
acusaram Jesus de estar expulsando demônios por Belzebu.
Jesus rebateu dizendo que era pelo poder de Deus que ele fazia
aquilo, e terminou o diálogo dizendo que era uma blasfêmia
contra o Espírito Santo, e que, para esse tipo de pecado, não
há perdão nem agora nem no futuro. Veja o risco que corremos
ao afirmar que certas práticas não são de Deus. Se não são de
Deus, então só podem ser do diabo. Repito: que risco enorme
corremos ao julgar! Além do mais, Jesus afirma no texto acima
que atitudes como essas são de pessoas que não ajuntam, mas
espalham; que esse tipo de atitude é ser contra ele.
O exemplo do avivamento da Rua Azusa tinha o propósito
de unidade (principalmente entre negros e brancos) e que se es-
palhasse pelo mundo nessa base. Mas houve um efeito colateral
que provocou muitas divisões. As críticas eram ferozes, pois fugia
totalmente do convencional. Além do mais, alguns beneficiados
por esse avivamento se ensoberbeceram, discordando do rumo
das coisas e provocando divisões.
A despeito disso, o objetivo do Espírito Santo continua
sendo a unidade da Igreja. Deus quer curar não apenas as dis-
sensões recentes causadas por razões pessoais ou secundárias,
mas também as cisões profundas e milenares que separam os
cristãos verdadeiros. Grande parte da estratégia das igrejas ao
longo dos séculos tem sido combater grupos cristãos conside-
rados “adversários”.

Quantas feridas, quanto sangue derramado!


Sabemos que a primeira grande divisão foi entre a Igreja Cató-
lica Romana e a Igreja Ortodoxa, em 1054. A segunda grande
divisão, tão retumbante quanto a primeira, foi o chamado

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148 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

Protestantismo, a Reforma de Lutero em 1517. Se parássemos


por aí, já teria sido terrível. Duas grandes feridas já estavam
estabelecidas. Mas, infelizmente, não parou.
Em nosso livro Reconciliação: O Segundo Toque, citamos al-
guns exemplos clássicos de divisões na história da Igreja, citando
Robert H. Nichols:92
Após a Reforma de Lutero, a grande onda de reavivamento que ela
tinha provocado logo arrefeceu. Surgiram grandes disputas teológicas
inúteis alargando cada vez mais a brecha entre os grupos protes-
tantes. Em 1577, os luteranos proclamaram um credo chamado de
Fórmula da Concórdia, que definia como seria o credo luterano. Ela
condenava o calvinismo, principalmente a doutrina da predestinação,
perpetuando a separação dos luteranos e reformados.

No século 17, na Holanda, uma profunda diferença teológica surgiu


entre os protestantes. Teólogos holandeses extremados pregavam que
Deus destinava alguns à salvação e outros à perdição. Surgiu, então,
um partido chamado arminiano (por causa de Armínio, um de seus
líderes), que rejeitava essas ideias e afirmava “que Cristo morreu
por todos, e que o propósito de Deus, desde o princípio, foi salvar
a todos os que creem em Cristo”. Esse ensino espalhou-se por toda
a Holanda e Inglaterra e, depois, pela América.

Os puritanos – Foi um grupo que insistia para que o culto da igreja


inglesa se libertasse de muitas coisas, como as vestimentas e os apa-
ratos cerimoniais, e também se opunha ao governo dos bispos. Eram
pessoas de moral severa, firmes em suas convicções e estudiosas da
Bíblia. Teologicamente, seguiam Calvino.

Os anabatistas – Estes rejeitavam os ensinos da igreja medieval e de-


fendiam a interpretação reformada do cristianismo, mas não seguiam

92
NICHOLS, R. Hasting. A História da Igreja Cristã. São Paulo/SP: Editora
Cultura Cristã, 2004.

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Eles não fazem como nós 149

os luteranos, nem os zuinglianos, como também não se juntavam às


igrejas oficiais. Organizavam sociedades de cristãos convertidos em
bases voluntárias, seguindo os ensinamentos do Novo Testamento e o
modo de viver dos cristãos primitivos. Ainda que bem-intencionados,
porém, a divisão começou a se multiplicar. A doutrina deles era uma
concepção particular a respeito da Igreja, e sustentavam que eram
uma comunidade de pessoas convertidas, e que ninguém tinha nada
a ver com isso. A crença acerca do batismo é que este só deveria ser
ministrado aos adultos, que poderiam entendê-lo pela conversão.
Os que se filiavam eram batizados, pois o batismo na infância era
considerado ineficaz. Por isso, foram chamados de anabatistas, “os
que batizavam novamente”. Não admitiam a existência de uma igreja
oficial reconhecida pelo Estado sob o controle do poder civil. Por
isso, se separavam e não se aproximavam das igrejas reformadas que
eram reconhecidas pelo Estado.

Durante o século 19, várias igrejas livres se desenvolveram: batistas,


congregacionais, metodistas, presbiterianas, Sociedade dos Amigos
e outras comunidades menores. Assim, o século 19 termina com
diversas denominações na igreja cristã – além da Católica Romana,
a Católica Ortodoxa Grega, a Católica Ortodoxa do Oriente, a
Luterana, a Luterana Reformada, a Presbiteriana, a Presbiteriana
Episcopal, a Metodista, a Batista, a Congregacional, a Anglicana, a
Episcopal, os Movimentos Unitarianos, Trinitarianos e Universa-
listas, Missões Estrangeiras, Puritanos, Calvinistas, Menonitas, etc.

O movimento carismático, sobretudo o carismático católico em


1967, deu um novo alento à unidade pela presença do Espírito
Santo. Todavia, mais uma vez fomos surpreendidos com mais di-
visões. Surgiram as chamadas “Comunidades Cristãs Evangélicas”,
dando-se margem às iniciativas de dissidentes de congregações que
formaram suas próprias “igrejas”. Assim, o cristianismo tornou-se
uma “fábrica” de fazer divisões.

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150 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

As gerações atuais trazem o sinal das divisões cristãs do pas-


sado. Quem poderá sarar tais feridas? Quem poderá reunir, em
unidade, o cristianismo ainda dividido? Quem poderá levar, ao
mundo que tanto precisa da paz legítima, a verdadeira paz que
está somente em Cristo? Temos absoluta necessidade de um
Pentecostes sem barreiras, que reúna os cristãos na unidade para
uma nova unção do Espírito dada a todos. Somente assim, os
cristãos, reunidos na unidade e unidos entre si por vínculos de
amizade, humildade e amor, serão novamente para as nações
como luz e sal da terra.
Reinaldo Reis93 concluiu sua mensagem “A Reconciliação na
História da R.C.C.” dizendo que...
Santo Agostinho dizia que o sinal de que temos o Espírito é quando
nosso coração palpita pela verdade da comunhão. Esse é o sinal. Não
é orar em línguas, fazer milagres, mas, sim, o desejo de comunhão.
O diabo ri da nossa organização, zomba dos nossos propósitos
apostólicos, mas ele treme quando resolvemos nos unir e nos amar!

A “terceira” onda
Em 1983, ainda segundo Vinson Synan,94 C. Peter Wagner,
professor de crescimento da igreja do Seminário Teológico
Fuller, propôs a existência de uma “terceira onda” do Es-
pírito Santo que estaria invadindo indiscriminadamente
as igrejas. Segundo ele, como já vimos, a “primeira onda”
foram os pentecostais, enquanto a “segunda onda” incluía
os carismáticos das igrejas protestantes históricas e da Igreja
Católica Romana. Para fins didáticos, estamos considerando
essa conceituação de Wagner.
93
Anais do Encristus 2014. Ele pôs em nossos lábios a palavra de reconciliação.
Cachoeira Paulista/SP, Canção Nova, 14-16 de março de 2014, p.23.
94
SYNAN, Vinson. O Século do Espírito Santo - 100 anos do avivamento
pentecostal e carismático. Ibid.

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Eles não fazem como nós 151

Embora a “terceira onda” não tenha sido um movimento


organizado ou muito definido, a proposta de Wagner encaixou-
-se com perfeição no pensamento de milhares de pastores
e congregações do mundo inteiro. Fatos novos como “riso
santo, cair no Espírito, dança na presença de Deus, cânticos
espirituais, sinais e maravilhas, curas, libertação (exorcismo),
prosperidade, etc.” passam a contemplar as igrejas na virada
do século.
No Brasil, passamos a observar o desenvolvimento de
grandes igrejas com ênfase em milagres, expulsão de demô-
nios, sinais e maravilhas, dons espirituais, revelações do Es-
pírito Santo, etc. Parte destas igrejas tornou-se gigantesca (as
“megaigrejas” começaram nos Estados Unidos, sem vínculos
denominacionais). Essas igrejas passaram a usar os veículos da
mídia; normalmente, necessitam de muitos recursos para sua
sobrevivência e expansão e os buscam ostensivamente (citando
versículos bíblicos e testemunhando prosperidade). Isto tem
gerado inúmeras críticas. Por outro lado, a Bíblia tem sido o
centro da ação dessa “terceira onda” (ainda que haja críticas
com relação à sua interpretação).
Nossa dúvida é se estamos novamente, já no século 21,
apregoando novas rachaduras na Igreja de Cristo. Todavia,
devemos perguntar: Jesus está ali? Os sinais em larga escala são
do Espírito Santo? Somos capazes de julgar o que é de Deus?
Quais são os frutos nas pessoas que se convertem (os nascidos
de novo) nestas igrejas? Repito, eles não agem conforme os padrões
convencionais, mas isso não é motivo para que os abominemos
em nosso coração.
Usa-se a analogia da praia para explicar a “terceira onda”. As
ondas se formam da mesma massa de água e atingem a mesma
praia. As ondas estão interligadas, porém chegam à praia em

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152 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

momentos diferentes. Mesmo com três ondas e diversas manifes-


tações, o movimento do Espírito Santo é permeado pela unidade.
Segundo Synan95, essa análise vê a renovação no Espírito Santo
como o único movimento coeso do qual participam todos os tipos
de indivíduos, comunidades, culturas e línguas, num grande con-
junto de diferentes circunstâncias. Isso explica a imensa e confusa
diversidade evidente hoje em dia:
Hoje, nosso desejo, depois de um século de sucessivos derramamen-
tos do Espírito Santo, no século 20, seria ver a Igreja muito mais
unida do que realmente se presencia. Porém, ainda aguardamos a
consumação dessa obra de união no meio do povo de Deus, que-
brando as barreiras criadas por “línguas” diferentes de doutrinas,
tradições e costumes.

Embora o mover pentecostal-carismático já tenha superado muitas


paredes divisórias no século passado, alcançando indistintamente
gente de todas as denominações cristãs e mostrando que Deus não
faz acepção de pessoas (Atos 10.34), as divisões e preconceitos entre
os seguidores de Jesus continuam muito fortes. Aliás, infelizmente,
devemos reconhecer que a experiência pentecostal gerou um número
maior ainda de divisões denominacionais no meio do cristianismo.

Porém, segundo Synan, desde o princípio os cristãos pente-


costais e carismáticos têm ignorado as barreiras denominacionais
para compartilhar doutrinas, adoração e comunhão. Assim, em
1980, estávamos diante do maior movimento popular ecumênico
da história do cristianismo. Nas grandes cruzadas de cura de Oral
Roberts e Kathryn Kuhlman, católicos e protestantes, negros e
brancos, homens e mulheres, jovens e idosos, misturavam-se na
multidão sem se preocupar com as bases teológicas e culturais dos
vários grupos. Com o tempo, passou a ser comum ver um padre
95
SYNAN, Vinson. O Século do Espírito Santo - 100 anos do avivamento
pentecostal e carismático. Ibid.

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Eles não fazem como nós 153

católico, um pastor anglicano e um evangelista pentecostal divi-


dindo a mesma plataforma nos jantares da Adhonep (Associação
de Homens de Negócio do Evangelho Pleno) ou em milhares de
outras conferências, avivamentos, cruzadas e missões patrocinadas
por uma multidão de igrejas e organizações paraeclesiásticas.
Não há dúvida de que precisamos lutar e ter discernimento do
caráter exclusivista e sectário que permeia muitas denominações.
Parece, para algumas denominações, que o céu foi feito só para
elas e que a salvação só existe em sua denominação e, em questões
bíblicas, só a interpretação delas é válida. Para elas, somente sua
liderança é bíblica, somente sua maneira de orar é válida e a pre-
gação do Evangelho só é correta com base no estilo delas.
Isto é querer “domesticar” e limitar o Espírito Santo. Oremos
para Deus abrir nossos olhos espirituais. Claro, precisamos estar
atentos a heresias, falsos profetas e até falsos cristos; porém, não
julgando com base na doutrina que aprendemos, mas sempre
perguntando: Jesus está ali? É obra do Espírito Santo? Não vamos
incorrer no mesmo erro que muitos cometeram ao condenar os
pentecostais e carismáticos porque eles faziam diferente daquilo
que estavam acostumados a fazer.

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Capítulo 7
UMA CIDADE EM BUSCA DA UNIDADE
EM CRISTO

J
undiaí, no Estado de São Paulo (conhecida como “De-
cápolis”, pois é cercada por dez cidades), é uma cidade,
ao nosso ver, com um propósito profético no que tange
a unidade do Corpo. Ultimamente, tenho observado alguns
mestres, profetas e evangelistas vindo para esta cidade sem
entender bem o porquê, mas dizendo que Deus os enviou.
Faço parte de uma união de comunidades (quatro comunidades
que se uniram em 2011), com doze presbíteros, sendo que apenas
dois nasceram na cidade. Os demais são de outras cidades, estados
e, até, de outros países. Faço parte do Conselho de Pastores da
cidade, e é muito difícil ver um desses líderes que nasceram aqui.
Assim, das centenas de denominações cristãs na cidade, é muito
raro encontrar pastor ou ministro jundiaiense.

Alguns líderes mais relevantes


Quero citar dois exemplos de pastores que vieram de outro estado
(e até mesmo de outro país) e tiveram participação relevante no
processo de unidade do Corpo.

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156 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

Um dos pastores mais conhecidos na cidade é Jamê Nobre.


Casado há 44 anos com Irani Nobre e pai de quatro filhos,
envolvido na obra de Deus há quase 46 anos, iniciou seu
ministério em Maués, Amazonas, em 1970, procurando viver
a prática de igreja nas casas. Após um período no Amazonas,
foi fazer um curso bíblico em Cianorte, Paraná, retornando
em seguida para o Amazonas, onde ficou noivo. Retornou a
São Paulo para se casar e voltou para o Amazonas. Voltando
para São Paulo, foi um dos pastores da congregação em São
Caetano do Sul, depois em Juquiá, litoral sul de São Paulo,
em seguida Várzea Paulista e, finalmente, está em Jundiaí até
hoje. Dedicou-se a ajudar pastores solitários, ajudando-os
a integrar-se ao convívio de outros pastores e assistindo-os
pessoalmente e como família. É isso o que faz até hoje no
Brasil e fora dele.
Por outro lado, Deus levantou o irmão John Walker
(falecido em 2007), californiano, que deixou os Estados
Unidos em 1964 com a esposa e seis filhos para tornar-se
missionário, por conta própria, no Brasil. A princípio, a
família foi para Lagoa Santa, uma pequena cidade perto de
Belo Horizonte, MG, e, um tempo depois, mudou-se para
Rubiataba, Goiás. A produção e a divulgação de literatura
cristã em larga escala, encontros (eventos) com pastores de
todo o Brasil, preleções em muitas igrejas no país (e outras
atividades) levaram a família a tornar-se conhecida em todo
o Brasil.
Desde o início do ministério de John Walker, houve um en-
tendimento de que a volta de Jesus só poderia acontecer quando
a Igreja se tornasse gloriosa:
... como também Cristo amou a igreja e a si mesmo se entregou por
ela, para que a santificasse, tendo-a purificado por meio da lavagem

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Uma cidade em busca da unidade em Cristo 157

de água pela palavra, para a apresentar a si mesmo gloriosa, sem


mácula, nem ruga, nem coisa semelhante, porém santa e sem defeito
(Efésios 5.25-27).

Como seria possível atingir este alvo de Deus, a Igreja gloriosa?


Para ele, a resposta estava no capítulo anterior (o capítulo 4) de
Efésios:
E ele mesmo concedeu uns para apóstolos, outros para profetas,
outros para evangelistas e outros para pastores e mestres, com
vistas ao aperfeiçoamento dos santos para o desempenho do
seu serviço, para a edificação do corpo de Cristo, até que todos
cheguemos à unidade da fé e do pleno conhecimento do Filho de
Deus, á perfeita varonilidade, à medida da estatura da plenitude
de Cristo, para que não sejamos mais como meninos, agitados de
um lado para outro e levados ao redor por todo vento de doutrina,
pela artimanha dos homens, pela astúcia com que induzem ao
erro (Efésios 4.11-14).

Entendia que, para isso acontecer, a Igreja precisava


de apóstolos, e que estes só poderiam ser levantados num
ambiente de palavra restaurada, onde fluísse a graça pura, a
Palavra viva e a presença do Espírito Santo. Só assim, Jesus
Cristo poderia preparar a Igreja para a sua volta.
Em Atos 2.42, observamos que os primeiros cristãos
perseveraram na doutrina dos apóstolos. Baseando-se neste
versículo, John Walker se perguntava: onde está a doutrina
dos apóstolos nos nossos dias? Onde estão os profetas falando
sobre a visão de Deus para a igreja dos nossos dias? Entendia
que a igreja precisava da Palavra restaurada – não só por meio
de seminários e estudos, mas da prática, como se fosse uma
espécie de laboratório para experimentos, para, a partir daí,
ser reformada.

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158 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

A união dos dons apostólico e profético


Em 1985, dois dos filhos de John Walker estiveram visitando
a Igreja Peniel em Jundiaí, sob a liderança de Jamê Nobre. Eles
ficaram impressionados com a base forte na Palavra de Deus
ensinada nessa congregação. Jamê trazia um ensino muito sólido
da Palavra, todos os domingos de manhã, a um grupo de aproxi-
madamente 50 pessoas.
John Walker ficou fascinado por aquilo que lhe foi relatado
pelos filhos. Imaginou que era este o ideal de Deus: trabalhar,
discipular um grupo de homens que poderia multiplicar a visão
profética, a Palavra viva, criando uma estrutura para o desenvol-
vimento dos dons apostólicos.
Assim, manifestou interesse em mudar para Jundiaí. Foi muito
bem recebido por Jamê Nobre e sentiu realmente que aquele era
um campo para o seu chamado. Seu dom profético, somado ao
dom apostólico de Jamê, juntando-se a outros pastores, mestres
e evangelistas da congregação, os fariam avançar na proposta da
unidade orgânica dos cinco ministérios.
Houve um tempo de oração com os filhos, até Deus confirmar
que Jundiaí seria seu destino. Sentiram que o tempo em Rubiataba,
Goiás, estava terminado. O grupo de pessoas que eles discipulavam
naquela cidade era, em sua maioria, composto por irmãos simples,
lavradores, com pouco perfil para ser um “laboratório” da Palavra
profética. Assim, deixaram Goiás com uma congregação forma-
da, buscando consolidar o propósito de Deus para a sua vida. O
tempo em que estiveram em Goiás foi bom. Deus permitiu que
semeassem muito por meio da literatura, de palestras e seminários,
principalmente sobre a visão profética.
A unidade desejada com a Peniel parecia perfeita. A junção do
dom profético de John Walker com o dom apostólico de Jamê

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Uma cidade em busca da unidade em Cristo 159

Nobre seria, segundo muitos irmãos, uma experiência fabulosa


de unidade orgânica. Porém, não havia precedentes de como fun-
cionaria esse corpo orgânico com dons diferentes e, infelizmente,
esses dons profético e apostólico, em vez de complementar-se,
foram conflitantes. Houve uma interrupção de comunhão, o que
frustrou o sonho de pessoas que criam na restauração da Igreja
praticando-se os cinco ministérios.

A reconciliação e os frutos
Depois de 15 anos dessa tentativa malsucedida de unidade, houve
uma iniciativa de Harold Walker (filho de John) e Jamê Nobre na
busca de reconciliação e perdão, visando principalmente à cura
de muitos irmãos que ficaram feridos.
Assim, tivemos uma reunião histórica em minha casa no dia 8
de março de 2001 com a presença de John Walker, Jamê Nobre,
Harold Walker, Christopher Walker, Élcio Barbosa, Francisco
Vanderlinde, Abnério Cabral e Paulo Manzini. Depois, tivemos
uma segunda reunião no dia 27. O propósito era tirar as raízes de
amargura entre nós para abrir o caminho do retorno da autoridade
de Deus na igreja em Jundiaí e no Brasil.
O assunto tratado nessa reunião se referia, obviamente, à
divisão ocorrida em 1986 na Peniel. O texto da Palavra de Deus
refletido foi Efésios 4, e foi constatado que, na época, buscou-se
primordialmente a unidade da fé (aspectos doutrinários). Con-
cluiu-se que foi ignorada a perseverança na unidade do Espírito
(o relacionamento, o amor, a unidade do Corpo).
Quando o Espírito Santo nos deu essa consciência (abriu nosso
entendimento), houve um profundo sentimento de arrependi-
mento, e os irmãos, comovidos, pediram perdão uns aos outros.
Vimos o Senhor operar grandemente naquele dia, e um milagre
maravilhoso foi consumado na liberação de perdão.

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160 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

Este milagre abriu as portas para um caminho inverso da


divisão: a unidade. Boa parte desse grupo começou a se reunir
na busca do cumprimento da oração de Jesus em João 17.21:
“Para que todos sejam um, como tu, ó Pai, o és em mim, e eu em
ti; que também eles sejam um em nós, para que o mundo creia
que tu me enviaste”. Esses pastores reconciliados faziam parte
de quatro comunidades cristãs de Jundiaí. Depois de anos
de encontros e reuniões, cada vez mais próximos, o Espírito
nos levou, no dia 26 de fevereiro de 2011, à unidade destas
quatro comunidades (Comunidade Cristã Pró-Família, Cen-
tro Comunitário Cristão, Comunidade Cristã Missionária e
Comunidade Cristã “Ide”).
É maravilhoso constatar que a base desta unidade é composta
de 50% de líderes da Peniel de 1986. Isso mostra que a cura da
liberação do perdão em 2001 trouxe vida e união ao Corpo de
Cristo, permitindo tempos de paz e a experiência de um novo
caminho que nunca tínhamos percorrido. Detalhes desta unida-
de são tratados no nosso livro Reconciliação: O Segundo Toque.96
Hoje, somos uma união de comunidades: éramos quatro e
nos tornamos uma no dia 26 de fevereiro de 2011. Formamos
um presbitério de 12 pastores; estamos aprendendo a exercitar na
unidade o presbitério composto de dons apostólicos, proféticos,
pastorais, mestres e evangelistas. Desde então, de segunda a sexta,
entre outros grupos, temos irmãos que oram das 5h30 às 7 horas
da manhã. A cada mês, fazemos uma torre de vigia de 24 horas
de orações ininterruptas (estamos na 70ª torre na data em que
escrevo este livro).
Os pastores que participaram dessa reconciliação têm con-
tribuído para diversas frentes de unidade da igreja em diversos
lugares; dentre eles, o Encristus (Encontro de Cristãos em Busca
96
MARION, José Carlos e Márcia. Reconciliação: O Segundo Toque. Ibid..

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Uma cidade em busca da unidade em Cristo 161

da Unidade e Santidade), o United in Christ, o Creces, etc. Além


do mais, houve reconciliação entre vários outros pastores da cidade
com os irmãos dessa congregação de Jundiaí.

O “Dia do Perdão”
Assim, depois da reunião de 8 de março de 2001, Deus começou
a nos unir como líderes (irmãos que outrora estiveram briga-
dos), mas não havia nenhum planejamento e sim reuniões bem
naturais e espirituais. Continuávamos discordando de algumas
coisas como no passado, mas isso não nos afetava mais em nada.
Concordamos que, quando discordássemos de algo, isso não nos
causaria problemas. Da mesma forma que não escolhemos nossos
irmãos carnais, também não escolhemos nossos irmãos espirituais
– é Deus quem nos dá os mesmos. Deus não garante que todos
irão pensar da mesma forma, mas que todos fazem parte de uma
mesma família. Todas as nossas reuniões (presbitério) são em volta
de uma mesa. Comemos e bebemos juntos para sempre ter em
memória a Nova Aliança.
No final de setembro de 2013, Harold Walker esteve minis-
trando sobre o tema “perdão total” no evento de centenas de
pastores liderado por Jamê Nobre em Poços de Caldas/MG. Ali,
tivemos muita clareza de que o perdão no Corpo é uma condição
para recebermos o perdão de Deus consumado na cruz (Mateus
6.15; 18.35).
Nesta ministração, um irmão ainda machucado pela divisão
da Igreja Peniel em 1986 (ele não sabia da reunião de 2001 em
que houve a reconciliação) despertou o desejo de que os antigos
líderes curados estendessem este pedido de perdão e reconciliação
aos que haviam participado daquela divisão.
A partir disso, pensamos em outras pessoas que não conhece-
ram o perdão e a reconciliação de 2001 e decidimos fazer uma

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162 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

reunião geral em 3 de dezembro de 2013 que chamamos de “O


Dia do Perdão”. Nos mobilizamos para relacionar todas estas
pessoas, trazendo um convite por escrito, por e-mail, por telefone
e tivemos uma grande presença.
Ressaltamos num convite escrito por nós:
Sentimos que há irmãos que desconhecem o evento do perdão
total ocorrido em 2001 e que ainda sofrem pela divisão de 1986.
Sua presença é muito relevante para a cura total das cicatrizes que
ficaram. Neste dia, estaremos abertos para agendar, se necessário,
reuniões particulares. Por favor, esteja conosco.

Felizmente, essa reunião aconteceu. Nosso salão estava lotado,


e Harold Walker começou dizendo:
Nosso desejo ao planejar essa reunião foi glorificar o Senhor Jesus.
Só podemos dizer como Daniel (Daniel 9) que “a nós pertence a
confusão de rosto, a vergonha, mas a Deus a glória e a honra para
todo o sempre”. Não temos nenhum propósito prático em vista,
nenhum desejo de produzir algo a não ser tornar público algo que
Deus tem feito em nossa vida e oramos para que isso seja benéfico
para muitas pessoas que talvez ainda tenham problemas com isso,
ou talvez não tenham.

Oramos para que o Espírito Santo nos conceda a graça de remo-


vermos qualquer obstáculo que ainda esteja atrapalhando a vida
de qualquer pessoa nesta noite. Assim, nosso intuito é contar
em breves palavras a história do que aconteceu e testemunhar a
reaproximação e ligação que Deus fez entre nós. Cremos que o
testemunho disso pode ser uma palavra de Deus aos corações e
ajudá-los a entender o caminho que estamos trilhando, pois es-
tamos bem firmados em cima desse alicerce que está contido na
passagem de Efésios 4.

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Uma cidade em busca da unidade em Cristo 163

A história desta reconciliação começou em uma viagem em que


me encontrei com Jamê Nobre e conversamos sobre a situação
lamentável da igreja em Jundiaí e sobre a perda da autoridade de-
vido à falta de unidade, das divisões e das mágoas. Falamos sobre
a possibilidade de juntarmos alguns homens envolvidos na divisão
que havíamos experimentado. Se pudéssemos simplesmente nos
reunir e ficar calados, já seria uma grande vitória.

A ideia dessa reunião de reconciliação seria para curar as amarguras,


restaurar esta parte do Corpo de Cristo em que estávamos envol-
vidos e restaurar a autoridade de Deus na igreja. Se fizéssemos a
nossa parte, começaríamos a trazer um pouco de saúde ao Corpo
de Cristo de modo geral. Esta primeira reunião aconteceu em 8 de
março de 2001. O propósito era tirar as raízes de amargura entre
nós para abrir o caminho para o retorno da autoridade de Deus
na igreja em Jundiaí e no Brasil.

Nesta reunião, John Walker leu os primeiros versos de Efésios


4 e confessou que, apesar de ter ensinado e pregado sobre estes
versículos, não os havia entendido nem praticado e pediu perdão,
especificamente a Jamê Nobre, por não ter mantido a unidade do
Espírito nem procurado sustentar um ao outro em amor. Houve
um quebrantamento maravilhoso.

Foi como se as comportas de uma represa tivessem arrebentado. Foi


um reconhecimento claro, definido de que a unidade do Espírito foi
quebrada por nossas atitudes, de nossa família, ao chegarmos em
Jundiaí. Aquela situação havia prejudicado seriamente o Corpo de
Cristo e, então, houve um conserto disso reconhecendo que foi um
erro, que infelizmente é possível pregar esse texto e não entendê-lo
ou praticá-lo. O irmão John Walker, já falecido em 2007, deixou
anotado em sua agenda:

“Não sabemos as consequências, mas o importante é que houve


um rompimento da heresia protestante de que é possível pregar a

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164 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

Palavra e dividir. O Espírito Santo quer desvendar a diferença entre


agir no Espírito e agir na alma. Estamos no início de uma grande
reforma. Esta reunião foi algo histórico que aconteceu e produ-
ziu mais peso ainda. Quanto mais perto estamos uns dos outros,
mais possibilidades existem de problemas. Mas possuímos armas
diferentes e não queremos mais cometer a heresia de entender a
Palavra na mente e não praticá-la; de achar que se pode dividir,
ser magoado, magoar e mesmo assim prosseguir porque 'Deus
vai abençoar. Deus está dizendo 'basta' para esse tipo de situação.
Ele é longânimo mas perde a paciência quando persistimos em
continuar agindo do mesmo jeito. Ele está mudando as regras do
jogo. Nossa tarefa é anunciar, praticar isso e ajudar a intermediar
em situações semelhantes.” (grifos nossos)

Em seguida, Jamê Nobre tomou a palavra dizendo:


Algo que estava bem forte no coração do presbitério era que
deveríamos chegar aqui e, mais do que qualquer outra coisa,
pedir perdão aos irmãos por causa das coisas que aconteceram
lá atrás, pedir perdão porque não fomos diligentes o suficiente
para fazer essa reunião antes. De fato, Deus fez uma obra em
nosso coração.

Por volta de 1987, ocorreu um fato interessante. Eu estava pre-


gando uma série de palavras exatamente sobre o perdão e, em meu
coração, decidi que já havia perdoado todo o ocorrido. Entretanto,
eu não queria ver John, Harold ou Christopher. Cria que estava
tudo perdoado e, como Jundiaí é uma cidade grande, ficamos muito
tempo sem nos ver. Certo dia, eu estava em meu escritório e Harold
me telefonou dizendo se poderia passar rapidamente em minha
casa naquele momento pois precisava muito falar comigo. Pensei
comigo: “Mas eu não quero conversar; já está tudo perdoado, não
tem mais problemas”. Foram minutos intermináveis aguardando
a chegada dele.

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Uma cidade em busca da unidade em Cristo 165

Quando ele chegou, eu me levantei e, num impulso, o abracei. Mas,


então, ele me disse: “Vocês publicaram um livro e eu queria saber
onde é a gráfica”. Fiquei indignado com o fato e perguntei a Deus
porque o Senhor havia feito aquilo comigo. Ele me disse que queria
mostrar-me que eu já havia perdoado, mas precisava ver Harold
novamente, precisava estar junto. Depois disso nos encontramos
naquela viagem que ele relatou no início e, até hoje, continuamos
a andar juntos.

Dou graças a Deus por esse tempo, por esse momento que tem
sido muito gratificante. Como Harold disse, nossa intenção, em
hipótese alguma, é tentar produzir alguma coisa para que alguém
volte. Nossa intenção é que todos que foram afetados estejam livres
diante de Deus para seguir naquilo que ele está lhes mostrando, sem
nenhuma dívida ou marca. A única dívida que temos e que nunca
conseguiremos pagar é a dívida do amor uns aos outros. Assim, eu
me regozijo, me alegro por esse momento, pois Deus tem feito uma
obra muito grande entre nós!

Após a fala de outros irmãos, decidimos tomar a ceia juntos


e sentimos que entrávamos num novo tempo na vida da igreja.

Capelania ecumênica em Jundiaí


No ano de 2013, tentou-se implantar uma capelania evan-
gélica no Hospital São Vicente de Paula, considerado o mais
importante de Jundiaí, pois atende várias cidades menores da
região. Este hospital foi fundado pela Sociedade Vicentina há
mais de cem anos e, por muitos anos, contava apenas com
uma capelania católica, conduzida pela Pastoral da Saúde da
diocese de Jundiaí. Embora continue sendo propriedade dos
vicentinos, há vários anos o hospital é mantido pela prefeitura
e pelo SUS. A implantação de uma capelania evangélica era
anseio dos evangélicos há muito tempo, mas, por causa de

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166 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

problemas conjunturais e políticos, não foi possível, gerando


impasse e frustração. A diretoria do hospital, porém, estava
trabalhando num projeto de humanização e também desejava
uma capelania mais abrangente e atuante e deu todo o apoio
ao processo.
Por iniciativa do secretário da saúde na época, Dr. Cláu-
dio Miranda, evangélico da Igreja Batista e do presidente do
Conpas (Conselho de Pastores), Mauricio Araújo, pastor da
Igreja Presbiteriana, marcou-se uma reunião na casa de D.
Vicente Costa, bispo católico da diocese de Jundiaí com o
objetivo de esclarecer os fatos, tentar superar os impasses e
abrir caminho à participação dos evangélicos na capelania do
hospital. A reunião foi bem-sucedida, e marcou-se outra reu-
nião para o dia 2 de agosto de 2013 no gabinete do vereador
Dirlei Gonçalves, pastor da Igreja do Evangelho Quadrangu-
lar. Foram convidados Maurício de Araújo, pastor presidente
do Conpas na época, os três presidentes anteriores, de outras
denominações evangélicas, o bispo católico D. Vicente Costa,
que levou três padres, e o vereador Rogério Ricardo da Silva,
da Renovação Carismática Católica. Nem sei por que, mas eu
também fui convidado para essa reunião histórica.
Tinha tudo para ser um “ecumenismo político”. Porém,
Francisco Vanderlinde, pastor e ex-presidente do Conpas,
trouxe uma palavra sobre perdão, relatando o testemunho de
David Du Plessis que, cheio do Espírito Santo, foi o primeiro
pentecostal (Assembleia de Deus) a investir no ecumenismo
espiritual na segunda metade do século passado. À medida
que a palavra foi sendo proferida, o Senhor tocava em nosso
coração, sendo que, no final da ministração, houve uma pre-
sença tão forte do Espírito Santo que gerou arrependimento
e pedido de perdão por preconceitos e julgamentos de ambas
as partes.

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Uma cidade em busca da unidade em Cristo 167

Sentimos que era a vontade do Senhor tudo o que estava acon-


tecendo. O que era para tratar apenas de um projeto comum de
capelania passou a ser uma reunião de comunhão bimensal deste
grupo (e outras adesões, como um bispo anglicano, um bispo
de origem ortodoxa, etc.), com café da manhã, almoço, louvor,
muita comunhão, oração, estabelecimento de projetos comuns e
estudo da Palavra.
Dessa forma, passamos a experimentar uma capelania no
hospital com católicos e evangélicos em parceria. Em 2014,
houve um curso para formar esses capelões cristãos, com 40 pes-
soas. Em 2015, iniciamos um novo curso, também ministrado
por católicos e evangélicos, para 80 pessoas. No final de 2014,
o diretor do hospital, no final do seu mandato, manifestou sua
alegria falando sobre a paz que o hospital vinha experimentando
com a implantação desse novo modelo de capelania hospitalar, o
que vinha somar em muito aos esforços de humanização daquele
importante local.

Primeira reunião geral entre católicos e evangélicos


No dia 18 de maio de 2015, nas instalações da Ciesp em
Jundiaí, promovida oficialmente pela Cúria Diocesana e
pelo Conselho de Pastores, aconteceu o “Encontro pela
Unidade dos Cristãos” com o tema “Jesus Cristo é o Senhor
de Todos” e a acolhida e apresentação de Dom Vicente e
Pr. Isaías. O lema do encontro, “Dá-nos um pouco da tua
água” (João 4.7), extraído das palavras que o Senhor Jesus
dirigiu à mulher samaritana, foi escolhido por demonstrar a
disposição do Senhor de aproximar-se de pessoas separadas
por barreiras religiosas e culturais, sendo um exemplo a ser
seguido por quem deseja cooperar com a unidade. Ao dizer
“dá-me da tua água”, estou dizendo que preciso de você e
estou aberto a você.

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168 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

No dia seguinte, Francisco Vanderlinde enviou-nos um e-mail


relatando o seguinte:
A sala que comporta mais de 200 pessoas sentadas estava pratica-
mente lotada. Havia diversos pastores, sendo que de nossa congrega-
ção foram 12 ou 13 membros. O encontro começou no horário com
um ambiente tranquilo. Após as saudações iniciais de Dom Vicente
e Pr. Isaías (presidente do Conselho de Pastores), cantamos o hino
“Ao único”, dirigido por Pr. Alexandre, que fluiu muito bem. Tivemos
um momento de oração de pedido de perdão a Deus pelas atitudes
não cristãs de ambas as partes, o que foi feito pelo Pe. Tom e por
mim. Em seguida, tivemos dois cânticos dirigidos pelo grupo do Pe.
Wilson e a palavra de D. Vicente baseada em 1 Pedro 4, sobre o viver
cristão. Ele falou um pouco também sobre o tema básico do encontro,
inspirado em João 4, no encontro de Jesus com a samaritana. Foi
uma boa mensagem sobre amor, aceitação e serviço que deve haver
entre nós. Falou em romper com o passado marcado por agressões,
divisões e amarguras e disse em alto e bom tom: “Ninguém é dono
da verdade; Jesus é o caminho, a verdade e a vida”.

Em seguida, Pr. Alexandre conduziu o cântico “Como Zaqueu”, que


fluiu muito bem por ser bem conhecido. Pr. Isaías também falou
baseado em João 4 e nos convidou a viver um novo tempo de acei-
tação e reconhecimento uns dos outros. Assim como Jesus viu algo
na samaritana, temos de aprender a ver o valor do irmão. Em dado
momento, lembrou a frase de Martin Luther King: “Aprendemos
a nadar com os peixes, voar com os pássaros, mas não aprendemos
a conviver como irmãos”. Após a palavra, o bispo Carvalho (evan-
gélico) orou representando a capelania, juntamente com uma das
visitadoras católicas que lá estava presente. Em seguida, de mãos
dadas, oramos juntos o “Pai Nosso” numa versão “ecumênica”. .
Após isso, houve um momento de “abraço da paz”, que foi uma
verdadeira explosão de amor entre os presentes. (...) Em seguida,
todos os padres e pastores presentes proferimos a bênção de Arão

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Uma cidade em busca da unidade em Cristo 169

e encerramos com o Pr. Isaías convidando a todos, com a concor-


dância de D. Vicente, para a Marcha para Jesus em 29 de agosto.

Este é um relatório resumido. Em relação a um encontro parecido


que tivemos na câmara, este foi muito melhor e houve uma percep-
tível presença do Espírito Santo ali entre nós. Creio que uma das
razões tem sido os encontros que temos de dois em dois meses nos
últimos dois anos e o trabalho da capelania do Hospital São Vicente,
que tem sido um elemento catalisador de unidade. Um dos irmãos
lá presentes, ao sair, disse ter ouvido ruído de chuva e que algo ma-
ravilhoso vem por aí. Creio que outros que compareceram poderão
dar seu parecer e ter uma ideia melhor do todo... (grifos nossos).

Unidade com Israel Messiânico


Asher Intrater (judeu messiânico) esteve em Jundiaí/SP por três
vezes (sendo que uma dessas vezes, em 2010, em um encontro em
Sorocaba/SP). Nessa ocasião, ele declarou que, pela sua agenda,
seria impossível estar mais vezes no Brasil, mas o Espírito Santo
acabou fazendo com que ele viesse mais duas vezes. Ele tem enfa-
tizado por todo o mundo a importância da unidade da Igreja com
Israel cristão. Diz que o Evangelho começou a chegar aos confins
da terra no movimento mundial de missões no fim do século 19.
Naquela mesma época, Deus começou a trazer de volta os judeus
para Israel. Depois, no início do século 20, Deus derramou seu
Espírito Santo e começou o avivamento pentecostal. As pessoas
da igreja começaram a falar em línguas outra vez, e o povo judeu
começou a falar em hebraico novamente, dentro da terra de Israel.
Agora que o avivamento espiritual está chegando a toda parte do
mundo, e as pessoas estão orando por Israel, o corpo messiânico
de Israel está sendo gerado. Jesus viu tudo isso dois mil anos atrás
conforme Asher:97
97
Anais da conferência “Israel, a Igreja e os Últimos Dias”. Jundiaí/SP: UMC
– Unidade Missionária Cristã, 16 a 18 de novembro de 2014, p. 24.

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170 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

Ele viu três coisas acontecendo: com a Igreja, com Israel e com as
nações. Em relação à Igreja, o evangelismo mundial e o batismo no
Espírito Santo. Quando isso acontecer e atingir o mundo inteiro, o
povo judeu voltará para Israel. Por quê? Porque quando o evangelho
chegar aos confins da terra, estará próxima a hora da volta de Jesus,
e ele não voltará para uma Jerusalém vazia; ele vai voltar para uma
Jerusalém cheia de pessoas.

Com relação a Israel, primeiro ele viu a destruição, depois o exílio de


quase dois mil anos. Há mais de 100 anos, os judeus começaram a
voltar e nas últimas décadas alguns começaram a ser salvos. Depois,
haverá um avivamento na terra e convidarão Jesus para voltar.

Com relação ao mundo, ele viu que o diabo, vendo tudo que está
acontecendo, nervoso, tentará impedir esses profetas, esses mo-
vimentos, a Igreja e Israel. Nos últimos dias, ele vai levantar um
movimento mundial e unir todas as nações no intuito de levantar
uma religião inimiga, assim como o islamismo, que odiará a Igreja
e Israel. Estas coisas vão acontecer nos últimos dias e, quando tudo
isso acontecer, Jesus voltará.

Mateus 23.37-39: "Jerusalém, Jerusalém, que matas os profetas e


apedrejas os que te são enviados! Quantas vezes quis eu ajuntar os
teus filhos, como a galinha ajunta os seus pintos debaixo das asas, e
tu não quiseste! Eis que a vossa casa vai ficar-vos deserta; porque eu
vos digo que desde agora me não vereis mais, até que digais: Bendito
o que vem em nome do Senhor."

Como Jesus vai voltar para estabelecer o seu reino sobre as nações,
nós precisamos pregar o evangelho do reino para as nações. Como
ele vai voltar para Israel, os judeus precisam crer nele e lhe dar as
boas-vindas quando ele voltar. Então, estes são os dois pré-requisitos
para Jesus voltar: o evangelho do reino sendo pregado às nações e
o avivamento na nação de Israel. Os judeus são fechados em rela-
ção ao evangelho, mas, graças a Deus, pela primeira vez na história

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Uma cidade em busca da unidade em Cristo 171

existem mais de 15 mil judeus messiânicos em Israel que creem em


Jesus, e todos estão repetindo este versículo: “Bendito é aquele que
vem em nome do Senhor!” (grifos nossos).

Asher, na sequência, estimula dois elementos para termos maior


interação com os judeus:
Nós, como povo judeu, reconhecemos que temos uma “dura cerviz”
e que não é fácil apresentar-nos o evangelho. Existem várias ferra-
mentas de comunicação que podem ajudar, mas a melhor estratégia
é o amor. Procurem formas diversas de amar os judeus, pois, apesar
de termos muita história, conhecimento, cultura e religião, nosso
povo não tem uma experiência real com o amor de Deus.

A segunda forma é aprender um pouco mais do nosso povo e da nossa


história. Quando a Igreja se separou totalmente de Israel, isso não
foi correto aos olhos de Deus, pois ela sempre deveria ter mantido
essa conexão. Criou-se uma visão de que a igreja e o evangelho eram
contrários aos judeus, e isso foi um grande erro. Assim, é preciso
colocar o evangelho de volta no seu contexto histórico, entendendo
que ele é uma continuação dos profetas de Israel. Jesus veio como a
continuação da aliança de Deus com Davi, e a Igreja é uma extensão
do reino de Deus em Israel. Quando os judeus percebem que os
cristãos têm interesse pela vida e pelos costumes deles, isso gera uma
abertura em seu coração e facilita a comunicação, o evangelismo, a
parceria e a unidade.

Temos, como igreja em Jundiaí, uma forte aliança com Asher


que foi firmada pelo Espírito Santo. Sua declaração, finalizando
sua última visita, reflete o caráter espiritual dessa aliança:98
Há um grande tesouro, uma bênção de Deus na igreja do Brasil,
mas também há um tesouro de Deus em Israel. Minha intenção é

Anais da conferência “Israel, a Igreja e os Últimos Dias”. Guarulhos/SP:


98

Ministério Verbo Vivo, 14 a 16 de novembro de 2014, p. 2.

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172 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

fazer essa conexão para que o tesouro da igreja do Brasil passe para
Israel e o que Deus fez em Israel possa abençoar o Brasil, que haja
uma conexão da igreja brasileira com o remanescente messiânico
em Israel. Nosso desejo é construir relacionamentos, oferecer nossa
amizade, amor, fé e aliança e cremos que, se isso acontecer, o poder
de Deus vai fluir de forma poderosa sobre todos nós.

Paulo diz que, mesmo que a maioria do povo judeu ainda não tenha
recebido o Senhor, Deus ainda tem um plano para esse povo e ele
se cumprirá no futuro. Depois, ele dá algumas razões para provar
isso. A primeira razão sou eu mesmo! Eu sou judeu, sou do povo
de Israel e, se esse plano não fosse verdade como é, que eu poderia
estar aqui? Pense sobre isso. Dois mil anos depois, eu, Asher Intrater,
estou em um lugar do outro lado do mundo, um lugar que Paulo nem
sabia que existia e que hoje é chamado de “Estado de São Paulo”
falando de Jesus Cristo! Se você está aqui hoje e tem a vida eterna,
o perdão dos pecados, é cheio do Espírito Santo, você deve isso a
Paulo, que decidiu pregar o evangelho fora de Israel. E o fato de
que eu também estou aqui é uma prova de que Deus não acabou
com seu propósito para os judeus. Vocês estão ligados conosco,
queiram ou não queiram, e nós estamos ligados a vocês e, juntos,
formamos uma só família espiritual! (grifos nossos).

Hoje, em função dessa mensagem, há um grupo em Jundiaí


que profere diariamente, com o Israel Messiânico, esta declaração:
“Bendito o que vem em nome do Senhor!”

Unidade orgânica
O capítulo 4 de Efésios (como vimos no capítulo 3 deste livro) fala
de três tipos de unidade: a unidade do Espírito (v. 3), a unidade
da fé (v.13) e a unidade do Corpo (v. 16). Porém, para chegar à
unidade da fé e do Corpo, é fundamental passar pela unidade or-
gânica (de funcionamento) para a edificação do Corpo de Cristo:

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Uma cidade em busca da unidade em Cristo 173

a operação pelo funcionamento integrado e harmônico dos cinco


ministérios: apóstolos, profetas, evangelistas, pastores e doutores
(mestres) (Efésios 4.11,12). Sem dúvida, este é o grande desafio
a ser cumprido. Como dissemos, isto foi tentado em 1985/86 na
Igreja Peniel em Jundiaí. Não fluiu e, muito pelo contrário, trouxe
divisão. Mas, pela graça de Deus, houve reconciliação, perdão e
arrependimento em 2001 conforme narrado nesse capítulo.
A partir desse perdão, como já vimos, alguns pastores da an-
tiga Peniel começaram a reunir-se com outros pastores, em volta
da mesa (até hoje acontece isso), num delicioso café da manhã,
onde, a princípio, buscávamos a unidade do Espírito, sonhando
com um caminho inverso da divisão. As primeiras dificuldades
foram sendo superadas quando, às vezes no início, outras vezes na
metade e outras no final, alguém sugeria que tomássemos a ceia.
Sentimos que esse ambiente era o ideal para encontrar a integração
dos dons ministeriais.
Havia entre nós apóstolos, profetas, pastores, mestres e evan-
gelistas. Como isso funcionaria, não sabíamos. Porém, com base
no perdão inicial em 2001, olhando para a mesa constantemente
(lembrando sempre a Nova Aliança), tomando às vezes a ceia do
Senhor, víamos que a renovação do perdão era constante. Lava-
mos os pés uns dos outros, confessamos julgamentos passados que
fizemos uns dos outros havendo arrependimento e reconciliação,
incluindo terceiros (pessoas que não faziam parte desse ministério,
mas tinham sido ofendidas).
Esse processo levou praticamente dez anos. Quando vimos que
a identificação e a aceitação dos dons de cada um estavam fluindo
no amor, pudemos, então, no início de 2011, consolidar a unidade
das quatro comunidades envolvidas. Hoje somos um presbitério
de doze pastores reunindo-se semanalmente, cuidando do gover-
no da igreja. Nesta base, também damos cobertura a dezenas de

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174 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

outras comunidades. Entendemos que, para o funcionamento do


ministério quíntuplo, não há necessidade de fusão – as comuni-
dades podem manter sua identidade. Em amor, os presbíteros
unidos podem “governar” as comunidades nas suas diversidades.
O Espírito Santo encaminhará esse processo. Não há recei-
ta para isto. Todavia, alguns princípios são indispensáveis: a
reconciliação, o perdão (às vezes lavar os pés), o amor e a busca
da direção de Deus. Com isso, observamos outros frutos: re-
conciliação com congregações envolvidas em problemas no
passado; encontros e comunhão com líderes de outras comu-
nidades; aproximação e comunhão com líderes (vários bispos)
de outras igrejas (como católica, ortodoxa, anglicana, etc.);
eventos conjuntos com diversas denominações (Marcha para
Jesus, almoços, reuniões de louvor e adoração, etc.) e visitas
para comunhão ou ministração da Palavra entre líderes de
várias congregações.

Outras experiências em Jundiaí


Mais grupos que visam ao ecumenismo espiritual têm-se for-
mado nesta cidade. Um exemplo importante é o grupo Acolher
(narramos em detalhes no nosso livro Reconciliação: O Segundo
Toque) em 2013.
No primeiro semestre de 2014, tivemos um evento de dois
dias99 com dois líderes da Comunidade Aleluia, de Augusta (Ge-
órgia/USA), Bob Garrett (evangélico) e Don Almeter (católico).
Falamos sobre essa comunidade no capítulo 10 deste livro.
No final de 2014, tivemos um encontro com a “igreja local”
(Árvore da Vida) no qual houve perdão mútuo por desentendi-
mentos no passado.
99
Conferência “Para Que Todos Sejam Um” sobre o tema “Um só Senhor, uma
só fé, um só batismo” (Efésios4.5). Jundiaí/SP, 12 e 13 de março de 2014.

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Uma cidade em busca da unidade em Cristo 175

Por tudo isto, entendemos que Jundiaí tem um chamado


profético para a unidade.
Comentando sobre Jundiaí, Jamê Nobre diz:100
Os primeiros bandeirantes chegaram aqui e ampliaram sua visão para
prosseguir em busca de terras e de índios para serem escravizados.
De modo semelhante, Deus tem nos trazido aqui não para ficar em
Jundiaí para sempre, mas para ir adiante aonde Deus quiser nos levar.
A diferença fundamental é que temos ido para levar o evangelho
e libertar pessoas, e não para escravizar ninguém. Interessante que
Moçambique foi um dos países que mais forneceram escravos para
a região de Recife e Salvador, mas agora vejo que temos ido para lá
não com espírito colonizador, mas com espírito de submissão aos
pastores locais, para ajudá-los a mudar sua história.

Qual é, então, a vocação de Jundiaí? Penso ser um misto de aventu-


ra, saída, busca e conquista. Temos sido enviados a muitos lugares
no Brasil e no mundo. Se você embarcou no “avião” dessa cidade e
tem aqui permanecido, você tem misturado sua história, vocação
e destino conosco. Talvez você não faça parte das equipes que vão
de avião ou de carro, mas com certeza pode ser um daqueles que
ficam e sustentam os que vão com oração e recursos financeiros. A
lista dos países tem crescido e esperamos que cresça até chegarmos
à última nação do mundo. Lembre-se que você se misturou a uma
história e agora tem também um destino conosco!

De fato, hoje, Jundiaí faz o inverso que os bandeirantes fize-


ram. Daqui, por exemplo, Deus tem enviado Jamê Nobre, com
seu dom apostólico, para dar assistência pastoral a muitos estados
brasileiros ministrando a pastores (exceto, por enquanto, em
Roraima, Amapá e Alagoas). Tem atendido pastores solitários (e
outros) em todos os continentes do mundo (exceto a Oceania).
100
Mensagem ministrada em 28/06/2015 na UMC – Unidade Missionária Cristã.

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176 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

Harold Walker (filho de John Walker) tem a vocação de pro-


duzir e distribuir literatura no Brasil e para outros países. Criou
e lidera uma Escola de Profetas em Monte Mor/SP, com alunos
vindos de todo o Brasil (e já funciona também em outros estados).
Lidera um grupo de pastores e líderes (juntamente com outros
irmãos desta cidade) de diversos estados brasileiros. Com seu dom
profético, tem ministrado a Palavra no Brasil e em todo o mundo.
É ele quem tem trazido Asher Intrater e trabalhado em busca da
unidade com os judeus messiânicos.
Deste presbitério do qual faço parte, sendo o menor de
todos eles, quis Deus, em sua grande misericórdia, dirigir meu
ministério, juntamente com outros irmãos, para a busca da uni-
dade da Igreja de Cristo. Estou integrado (com minha esposa) a
outros irmãos de todo o mundo que também tiveram esse cha-
mado específico. Costumo dizer que “foi para isso que eu nasci”.
Louvo a Deus por ter vindo ao mundo para uma geração que se
chamará “Geração Curada”.
Ainda, em Jundiaí, temos os últimos presidentes do
conselho de pastores (dentre eles, destaco Francisco Vanderlinde,
do nosso presbitério), voltados a buscar a unidade da Igreja de
Cristo, inclusive com os católicos. A Marcha para Jesus, em agosto
de 2015, incluindo católicos e muitas denominações evangélicas,
contou com um “exército” de 20 mil cristãos (5% da população de
Jundiaí). Em certo momento, quase todos se ajoelharam, pediram
perdão por seus erros, e oraram pela cidade.
Deus levantou ainda nesta cidade o bispo Dom Vicente
Costa, que é natural da Ilha de Malta, como um grande defensor
da unidade do Corpo de Cristo. Ele tem participado ativamente
e envolvido os padres de sua diocese (que abrange mais de 11 mu-
nicípios e inúmeras congregações da região) a praticar a unidade
do Espírito com os evangélicos.

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Capítulo 8
AS RAÍZES DO ENCRISTUS:
COMO SE CONSTRÓI A UNIDADE

N
o Brasil, existe o Conic – Conselho Nacional de
Igrejas Cristãs –, que se reúne em busca do serviço
a Deus, visando a aumentar a comunidade cristã
e o testemunho do Evangelho no Brasil. As igrejas que são
membros do conselho (Presbiteriana Unida, Síria Ortodoxa
de Antioquia, Evangélica de Confissão Luterana do Brasil,
Episcopal Anglicana do Brasil, Cristã Reformada e Católica
Apostólica Romana) têm como compromisso ecumênico tes-
temunhar a unidade em Cristo, respeitando a identidade de
cada igreja particular.
Todavia, a busca da unidade e o diálogo religioso são de-
senvolvidos a partir de diálogos teológicos com forte atuação
em direitos humanos e outras áreas que abrangem aspectos
políticos.
Ao contrário do Conic, o Encristus – Encontro de Cristãos na
Busca de Unidade e Santidade (www.encristus.com.br) – visa à
vivência espiritual e à comunhão, com a participação intensa dos
dons do Espírito Santo.

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178 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

Discorrendo acerca do Encristus


Vejamos um pouco do que é o Encristus, segundo um de seus
participantes, Marcial Maçaneiro.101

O Encristus é um encontro que tem a finalidade de promover a


unidade entre os cristãos. A união causa alegria e a divisão causa
tristeza. Unidade e santidade são os dois valores que sempre quere-
mos encontrar. No caminho da santidade, vamos nos encontrando
e unindo e, no caminho da unidade, vamos nos santificando. Não
dá para separar uma da outra.

É um encontro de irmãos marcados, em sua grande maioria, por


alguma experiência do Novo Pentecostes, com vários estilos de
espiritualidade, itinerário, missão, tradição, etc.

É, também, um movimento ministerial e profético. Muitas pesso-


as são profetas da divisão, da divergência e isso tem sido passado
pelo coração, pelos afetos; pessoas falam mal umas das outras,
se combatem de púlpito, não se encontram, não reconhecem a
santidade no caminho do outro, reduzem a igreja a etiquetas,
nomes e endereços.

Ninguém combinou o Encristus. Ele não foi criado por homens.


O Senhor é quem nos tem unido pela sua graça. Ninguém dentro
dele é “solto”, sem igreja, pois não queremos somar dividindo ain-
da mais. Não somos uma nova “fundação”, mas servos da comu-
nhão, ministros da unidade, comprometidos com a comunidade a
que pertencemos. Todos têm o seu lugar onde comungam o pão
e o vinho, onde estão alicerçados e comprometidos, compondo,
assim, a grande Igreja. Somos marcados com o selo do Espírito

101
Marcial Maçaneiro é teólogo, professor e editor, verificador do MEC para
cursos de Filosofia e Teologia no Brasil, membro do Comitê Teológico SCJ
Internacional e assessor da CNBB para o diálogo ecumênico. Atualmente, dá
aulas de Teologia na PUC em Curitiba-PR.

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As raízes do Encristus: como se constrói a unidade 179

e o Senhor Jesus é o nosso vínculo. Nosso nome não provém de


uma sigla, instituição ou endereço, mas de cada um que aqui
participa. O nome da igreja que Jesus reconhece é “NÓS” – ele
não reconhece as divisões.

Em todos os lugares e épocas, a cristandade tem pregado para a


sociedade um tipo de vida que não existe em seu próprio meio. A
graça tem sido comercializada, vaidade e poder têm sido colocados
acima do ministério. O testemunho do Evangelho tem sido ferido
pela desunião, pelo contrassenso, pelo desrespeito às diferentes
expressões. Torna-se necessário, então, uma reconciliação, uma
prática voltada para o que Jesus diz em João 17.21: “Para que
todos sejam um, como tu, ó Pai, o és em mim, e eu em ti; que
também eles sejam um em nós, para que o mundo creia que tu
me enviaste”. (grifos nossos).

O ponto fundamental da unidade, da comunhão entre


as diversas denominações evangélicas com católicos, judeus
messiânicos e outras confissões cristãs parte necessaria-
mente do perdão mútuo. Sem perdão, não há reconciliação,
não há comunhão, não há unidade. “Não podemos sentar à
mesa sem antes lavar os pés uns dos outros.” Assim, as raízes
do perdão devem ser o início de qualquer iniciativa de
unidade.

As raízes do Encristus
As raízes do Encristus estão exatamente num grupo de “pionei-
ros da unidade” que entendeu e praticou essa verdade, abrindo
portas, em vários países do mundo, para a unidade, para o
ecumenismo espiritual. Ecumenismo espiritual é a experiência
espiritual que prevalece sobre os debates teológicos. É o amor
prevalecendo sobre as diferenças doutrinárias.

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180 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

Outros encontros começaram na base do perdão, oração,


dons do Espírito, que certamente ajudaram a encontrar a
linha da experiência do Espírito Santo no Encristus. Diversas
iniciativas (não vamos explorar todas) existiram até chegarmos
ao Encristus no Brasil.
Sempre houve cristãos lutando pela unidade, principal-
mente após a Reforma no século 16. Normalmente estes
reconciliadores surgiam diante de crises consequentes da
divisão. A Guerra dos Trinta Anos (1618-1648), causada
por rivalidades políticas entre católicos e protestantes, sem
dúvida devastou a Europa e acirrou ainda mais o veneno
da divisão. Nessa época, surgiu, segundo Walker 102, Geor-
gius Calixtus (1586 – 1656), teólogo “incompreendido,
difamado e rejeitado por seus contemporâneos que lutou
solitário contra a mentalidade religiosa sectária de sua
época”. A tônica deste teólogo, ainda segundo o autor
citado, “era mostrar que os pontos em comum entre as
igrejas cristãs eram mais importantes do que os pontos
de divergência”.
Cita ainda que, em agosto de 1645, 26 teólogos cató-
licos, 28 luteranos e 24 reformados iniciaram, na cidade
de Torun, na Polônia, o que chamaram de Colloquium
charitativum ou “consulta amorosa”. “Houve grande ex-
pectativa: mais de 50 mil convidados compareceram para
acompanhar o evento.” Infelizmente, depois de três meses,
detectou-se o fracasso desse encontro, já que, segundo o
autor citado, “as delegações estavam mais interessadas em
expor as interpretações heréticas das outras do que em
mostrar os pontos comuns”.

WALKER, Christopher. A Dura Luta para Reunir os Irmãos Divididos.


102

Americana/SP, Revista Impacto, edição 80, 2014.

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As raízes do Encristus: como se constrói a unidade 181

Muito tempo depois, em 1934, o abade Paul Couturier


lançou a “Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos”103, que
pretendia unir os fiéis numa grande intercessão, vista por ele
como um “mosteiro invisível” que abraçava toda a ecumene.
Couturier introduziu o conceito de um período de três dias
de oração pela unidade da igreja em Lyon, França, em 1932.
Isso acabou evoluindo para uma prática que é preservada no
mundo todo de 18 a 25 de janeiro, conhecida como a Se-
mana de Oração pela Unidade Cristã. Ele também começou
diálogos interdenominacionais no monastério de La Trappe
des Dombes, hoje em dia o Grupo de Dombes, que se reúne
todos os anos para diálogos e oração. Presentemente, já na
sexta década, o Grupo de Dombes tem status independente,
o que permite que desenvolva pensamentos e diálogos ecu-
mênicos de alto nível. Sua produção criativa tem formado a
base para muitos diálogos e comissões oficiais.
Em 1940, Roger Schultz, aos 25 anos de idade, deixou
seu país (Suíça) para viver na França. No começo da Segun-
da Guerra Mundial, fixou-se na pequena cidade francesa de
Taizé, dando abrigo aos refugiados da guerra, inclusive a ju-
deus. Em seguida, ele passou a receber também crianças sem
família. Sendo um homem de oração constante, durante o
inverno de 1952-1953, fundou oficialmente a Comunidade
de Taizé, cuja regra principal é a vida comunitária na prática.

103
A prática da Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos foi introduzida
em 1908 pelo padre Paul Wattson, fundador de uma comunidade religiosa
anglicana que, em seguida, entrou na Igreja católica. A prática de oração foi
desenvolvida e aperfeiçoada nos anos de 1930 pelo Pe. Paul Couturier, de Lyon,
que apoiou a oração “pela unidade da Igreja segundo a vontade de Cristo e em
conformidade com os instrumentos que Ele quiser”. Nos seus últimos escritos,
Pe. Couturier viu esse evento como um meio que permitia à oração universal
de Cristo “entrar e penetrar em todo o Corpo cristão”. Ela deve crescer até
se tornar “um imenso e unânime brado de todo o povo de Deus que pede a
Deus este grande dom”. Fonte: http://w2.vatican.va/content/benedict-xvi/pt/
audiences/2012/documents/hf_ben-xvi_aud_20120118.html.

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182 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

Esta comunidade permanece nesse mesmo espírito até hoje,


estendendo-se a vários países do mundo como uma grande
marca na unidade de cristãos.
Em 1947, em meio às ruínas da Segunda Guerra Mundial,
surgiu na Alemanha a Irmandade Evangélica de Maria, um
autêntico avivamento em um círculo bíblico formado por
jovens moças que se reuniam com madre Basileia Schlink.
Na carência total de bens materiais e segurança humana, elas
decidiram ficar juntas para iniciar uma vida comunitária e
compartilhar o pouco que tinham, seguindo o modelo dos
primeiros cristãos, na simplicidade dos ensinamentos de Jesus.
A maioria das moças era luterana, mas havia também meto-
distas e outras denominações. Sua maior característica era a de
ser discípulas de Jesus (cabe lembrar que a visão da unidade
sempre foi para todo o Corpo de Cristo, sem representar uma
denominação específica).

Homens levantados para a unidade espiritual


Além de Paul Couturier, Roger e Max Thurian, de madre
Basileia Schlink e de todas as conversações ecumênicas desen-
volvidas desde o Congresso de Edimburgo (1910) e mesmo
antes, que culminaram na constituição do Concílio Mundial
de Igrejas, podemos elencar três grandes apóstolos modernos
que darão substância a uma nova fase da uidade espiritual
(ecumenismo espiritual): David Du Plessis, Matteo Calisi e
Giovanni Traettino.
Esses homens não só inspiraram o Encristus, como também
outros movimentos de unidade com base no Espírito Santo (vi-
vência espiritual) tais como “Unidos em Cristo” (Estados Unidos
e Canadá), “João 17” (Estados Unidos), Kairós (Itália), Comunità
Di Gesù (Itália, Brasil e outros), etc.

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As raízes do Encristus: como se constrói a unidade 183

David Du Plessis foi pastor das Assembleias de Deus, mais


tarde conhecido como "Senhor (Mister) Pentecostes". Iniciou
aquilo que chamamos de “Ecumenismo Espiritual”. Ele teve uma
revelação de Deus para pregar sobre o perdão que os pentecostais
deveriam conceder aos cristãos tradicionais pela sua oposição à
experiência com o Espírito Santo. Andava com um “button”
(broche) no paletó com os números “70 x 7”, que lembrava as
palavras de Jesus em Mateus 18.22: que devemos perdoar setenta
vezes sete vezes no dia.
Seis anos antes do advento da Renovação Carismática Cató-
lica, Du Plessis fez seu primeiro contato com líderes católicos.
Quando de sua participação no Concílio Mundial de Igrejas,
em Nova Délhi, foi convidado a visitar o Vaticano para ex-
plicar o pentecostalismo a vários teólogos e historiadores que
realizavam um estudo detalhado do movimento. No Vaticano,
encontrou-se com o Cardeal Bea, chefe da "Secretaria para a
Promoção da Unidade Cristã", a quem falou sobre o pente-
costalismo. Du Plessis sugeriu ao cardeal Bea tornar a Bíblia
acessível a todos os católicos do mundo em sua própria língua:
“O Espírito Santo fará com que o livro ganhe vida, e isso vai
mudar vidas e renovar a Igreja”.
Quando esse diálogo foi reportado ao papa João XXIII, este
afirmou serem as palavras de Du Plessis uma revelação de Deus
à qual os católicos deveriam atentar. Se o envolvimento de Du
Plessis com líderes evangélicos tradicionais já causava críticas e
rejeição dos líderes pentecostais, a visita ao Vaticano causou ainda
maior furor.
Embora tenha sido desprezado pelos pentecostais, líderes das
igrejas tradicionais e católicos romanos continuaram a cercá-lo
e apoiá-lo. Em 1964, foi convidado pelo cardeal Bea para ser
o único observador pentecostal do Concílio Vaticano II. Nessa

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184 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

histórica assembleia de cardeais, Du Plessis ofereceu o perdão


aos católicos e viu uma esperança para a renovação. Somente
dois anos depois do término do Vaticano II, a renovação caris-
mática começou entre os católicos romanos em Pittsburgh, na
Pensilvânia.
Du Plessis dirigiu a equipe pentecostal nos diálogos entre
católicos e pentecostais em 1982. Ele também participou da
Conferência Carismática Católica em Roma em 1986, quando
ouviu o papa Paulo VI pronunciar suas bênçãos sobre a renovação
carismática. Du Plessis exerceu um papel profético e tornou-se
figura-chave para lançar fogo ao movimento carismático nas
igrejas tradicionais e ao ecumenismo espiritual dessas igrejas.
Em maio de 1981, na Conferência Internacional dos líderes
da Renovação Carismática no Vaticano, Du Plessis, como disse-
mos, tinha no seu paletó o distintivo “70 x 7” e, com um gesto
profético, tirou o mesmo e o pregou no paletó do jovem católico
leigo Matteo Calisi, apertou-lhe a mão e disse: “Que você possa,
irmão, tornar-se ministro de reconciliação entre as igrejas, em-
baixador da reconciliação”. Foi uma espécie de transferência de
autoridade, uma unção para que Calisi se tornasse um apóstolo
do ecumenismo espiritual.
Nesse evento, o jovem Matteo foi muito tocado, pois tinha
sido recebido (juntamente com outros) pelo papa João Paulo
II nos jardins do Vaticano. E, no mesmo dia em que recebeu a
palavra profética do “Senhor Pentecostes”, tinha feito contato
com a Comunidade Caserta, dirigida pelo pastor Giovanni
Traettino (Igreja Evangélica da Reconciliação, de Caserta,
Nápoles, Itália), com o objetivo de um diálogo ecumênico.
Matteo conta:104
104
Anais do Encristus 2012. Pluralidade e mutualidade para a unidade. Poços
de Caldas/MG, setembro de 2012.

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As raízes do Encristus: como se constrói a unidade 185

Fiquei muito impressionado pela paixão e amor verdadeiros do pas-


tor Du Plessis pela unidade do Corpo de Cristo. Até então, minha
relação com os evangélicos não era muito boa, mas, ao perceber a
paixão e generosidade desse ministro em relação aos católicos, toda
a minha perspectiva foi mudada. Ele foi, inclusive, perseguido in-
justamente pelos irmãos da sua própria denominação devido à sua
proximidade com católicos. Dali em diante, ele fez da sua vida um
ministério de reconciliação e, graças ao seu ministério, muita gente de
várias igrejas diferentes entrou na graça do batismo com o Espírito
Santo. A partir de então, passei a estudar e me dedicar à Palavra de
Deus, sofrendo a paixão de Jesus pela unidade dos cristãos diante
das divisões (grifos nossos).

Naquele tempo o Espírito Santo me inspirava sonhos proféticos.


Mesmo após meu casamento, estes sonhos continuaram por mui-
tos anos. Hoje reconheço que eram proféticos, que era o Espírito
Santo preparando o meu coração para ir às nações e encontrar
denominações que eu ainda não conhecia. Estudava com muitos
jovens no Instituto de Teologia Ecumênica em Bari, que é filiado
à Faculdade Angélico em Roma, e sentíamos que era importante
dar mais solidez a esse ministério de reconciliação. Assim nasceu
a Comunidade de Jesus, que é uma comunidade dentro do grande
“quadro” da Renovação Carismática Católica, mas com uma missão
ecumênica, de unidade.

Atos concretos de amor pela unidade


A unidade entre Matteo e Traettino começou a transformar o
cenário de inimizade entre evangélicos e católicos. Embora eles
caminhassem juntos nesse propósito, somente em 1992 houve
um fato mais concreto que abalaria o mundo espiritual. Por
ocasião do 25º aniversário da Renovação Carismática Católica,
no estádio de Bari (Itália), com a participação de diversos pas-
tores valdenses, metodistas, batistas pentecostais, apostólicos,

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186 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

das Assembleias dos Irmãos e numerosos sacerdotes católicos,


o pastor Giovanni Traettino manifestou sua fraternidade com
esse gesto eloquente que daria uma forte aceleração ao processo
ecumênico. Lavou publicamente (diante de 20 mil participan-
tes) os pés de um líder da Renovação Carismática em sinal de
mútua reconciliação (curiosamente lavou os pés do padre An-
tonio Belpiede, cujo sobrenome significa “belo pé”). Segundo
Traettino, a presença do Senhor naquele estádio poderia ser
tocada com a mão, tão forte era a unção sobre todos. Segundo
ele, “foi uma tarde de profunda cura pessoal e coletiva”.
Em 1995, Matteo Calisi dirigiu uma cerimônia de lava-pés
diante de 60 mil pessoas, na conferência da Renovação Caris-
mática Católica em Rimini, Itália, quando um cardeal africano e
diversos bispos católicos lavaram os pés de Traettino. O perdão mútuo
se concretizava. As portas se abriram para um novo tempo no
ecumenismo espiritual para diversos países do mundo. Matteo
declarou que, nesse momento, o sangue de Jesus Cristo entrou
naquele estádio e purificou anos de ódio, ressentimentos, divisões,
barreiras, orgulho confessional, juízos, antagonismo, mitologias.
No início deste século (2005), os efeitos do perdão ministrados
por estes dois apóstolos do ecumenismo espiritual atingiram a
Argentina, com a participação do pastor Jorge Himitian e outros
pastores por intermédio do Creces (Comunhão Renovada de
Evangélicos e Católicos no Espírito Santo). Essa iniciativa contou
com o apoio, o estímulo e a participação do cardeal Jorge Bergoglio,
arcebispo de Buenos Aires e presidente da Conferência Episcopal
Argentina, eleito papa em março de 2013 com o nome Francisco.
Em 28 de julho de 2014, o Papa Francisco visitou a Igreja
Evangélica da Reconciliação de Caserta, na Itália, igreja diri-
gida por Traettino, que contou também com a participação
de Matteo e Himitian. Sem nenhum protocolo, ele fez uma

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As raízes do Encristus: como se constrói a unidade 187

visita-surpresa ao pastor Traettino e foi tomar café em sua casa.


Depois, de mãos dadas, foram à igreja de Traettino e disse: “Eu,
como bispo de Roma, peço perdão por aqueles católicos que
foram responsáveis pela perseguição aos pentecostais” (perse-
guição que ocorreu no regime militar de Benito Mussolini e
na qual houve mártires juntamente com os judeus). O papa
pediu perdão pela perseguição à igreja evangélica no período
do fascismo na Itália. Pelo que sabemos, foi a primeira vez que
um papa entrou em uma igreja evangélica: tudo em favor do
perdão, da reconciliação.

O Brasil e a unidade espiritual


Matteo Calisi, que, como vimos, fundou a Comunidade de Jesus,
hoje em vários países no mundo (seu principal carisma é a unida-
de), sentiu a direção de Deus de vir para o Brasil em 2006, pois já
havia estado aqui por inúmeras vezes e sabia que existiam várias
comunidades com o mesmo carisma da unidade. Dom Filippo
Santoro, bispo do Rio de Janeiro à época, também italiano de Bari,
sugeriu-lhe para plantar esta semente do ecumenismo espiritual
no Brasil iniciando pelo Rio de Janeiro, apresentando-o à irmã
Doris Hoyer de Carvalho105, porque esta fazia um trabalho bem
semelhante ao dele.
Antes disso, houve um encontro na Itália entre Matteo, Tra-
ettino, Jorge Himitian e Jamê Nobre. Neste encontro, eles se
aliançaram com o objetivo de introduzir a unidade espiritual no
Brasil (este mover de unidade espiritual já existia na Argentina,
como dissemos, por intermédio do Creces). Matteu, então no
Brasil, foi convidado, juntamente com os irmãos de sua comu-
nidade e cristãos de outras denominações, a participar de uma
grande concentração na Comunidade Canção Nova (Cachoeira
105
Doris Hoyer de Carvalho é fundadora da Comunidade Bom Pastor no Rio
de Janeiro/RJ que, em 2015, completou 40 anos de fundação (1975).

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188 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

Paulista/SP) que fazia parte da Catholic Fraternity (Fraternidade


Católica, que coordena as “Novas Comunidades Carismáticas
Católicas”). Matteo foi presidente da Catholic Fraternity por
muitos anos. Apesar de já ter estado em vários congressos re-
gionais no Brasil, esse foi o primeiro congresso internacional
realizado fora da Itália.
O monsenhor Jonas Abib, fundador da Comunidade Canção
Nova, recepcionou de 5 a 6 de novembro daquele ano (2006),
além de Matteo e muitos missionários, o bispo Tony Palmer e o
arcebispo Sean Larkin (ambos da igreja anglicana) e o pastor não
denominacional Alan Fonseca.
Naquela celebração, televisionada para todo o país, diante de
70 mil pessoas presentes, Sean, Tony e Alan tomaram a iniciativa
de pedir perdão pela divisão da igreja cristã e manifestaram o
desejo de lavar os pés dos padres e bispos. Houve um silêncio, e
a bacia com água foi preparada. Convidaram três representantes
da Igreja Católica: Dom Tavares, Monsenhor Jonas e Matteu
Calisi, e lavaram e ungiram seus pés.
Da mesma forma, em seguida, esses irmãos católicos pediram
perdão e também lavaram e ungiram os pés de Sean, Tony e Alan,
representando os irmãos evangélicos. Houve um silêncio total.
As pessoas presentes relataram que era possível sentir a presença
do Espírito Santo de forma marcante.
A lição do Espírito Santo se repetia naquele momento para
alcançar a unidade: primeiro, lavam-se os pés para depois sentar-se
106
Izaías Carneiro é fundador e presidente da Comunidade Coração Novo, com
sede no Rio de Janeiro/RJ.
107
Angela De Bellis é responsável pela Comunidade de Jesus no Brasil (Rio de Janeiro/
RJ) desde 2006, cuja sede é em Bari, Itália, tendo como fundador e presidente Matteo
Calisi (Comunità di Gesù).
108
Iete Aleixo é membro consagrado desde 1981 e secretária para a missão ecumênica
da Comunidade Bom Pastor, com sede no Rio de Janeiro/RJ.

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As raízes do Encristus: como se constrói a unidade 189

à mesa. Este é o ensinamento de Jesus em João 13. Não funciona


primeiro sentar-se à mesa, pensar em ceia ou comunhão antes do
arrependimento, do perdão, de lavar os pés.
Nesse evento, estavam presentes os irmãos católicos do Rio
de Janeiro, Izaías Carneiro106, Angela De Bellis107 e Iete Aleixo108.
Estes passaram a ser parceiros, juntamente com outros irmãos,
do Encristus, colunas levantadas por Deus para o crescimento da
unidade espiritual no Brasil.
Após Matteo Calisi conhecer o Pe. Marcial Maçaneiro (na
época, assessor da CNBB para o ecumenismo), foi marcado um
encontro para 15/11/2007 onde estiveram presentes, além de
vários irmãos católicos do Rio de Janeiro e do Pr. Jorge Himitian
(Buenos Aires, Argentina), diversos pastores evangélicos convi-
dados por ele: Jamê Nobre (Jundiaí, Brasil), Christian Romo
(Concepción, Chile), Anésio Rodrigues (Osasco, Brasil)109 e Sérgio
Franco (Rio de Janeiro, Brasil). Esse núcleo, dirigido pelo Espírito
Santo, ousadamente marcou um novo encontro para Lavrinhas/
MG (2008), onde estiveram reunidas 177 pessoas (entre evan-
gélicos e católicos), originando oficialmente o Encristus. Assim,
os pastores Jamê Nobre e Jorge Himitian (considerado por nós
também como apóstolo da unidade) se tornaram instrumentos
de Deus para esse mover no Brasil como resultado do encontro
na Itália, como descrevemos anteriormente.
Nesse encontro, além dos irmãos acima citados, estava presente
o irmão Reinaldo Beserra dos Reis110, um dos líderes da Renovação
Carismática Católica, indicado pelo monsenhor Jonas Abib, sendo
assim também um fundador do Encristus.
109
Anésio Rodrigues, pastor da Comunidade Carisma em Osasco/SP, indicou para
substituí-lo os pastores Rui Luis Rodrigues e Álvaro Luiz Paulucci, da mesma comu-
nidade, que permanecem ativos na busca da unidade entre cristãos.
110
Reinaldo Beserra dos Reis reside em Sorocaba/SP, é membro fundador, professor
e palestrante da RCC – Renovação Carismática Católica do Brasil.

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190 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

Prática da unidade no Espírito no Encristus


O Encristus favorece o encontro de evangélicos e católicos
que desejam buscar a santidade e a unidade fraternalmente,
movidos pela efusão do Espírito Santo que experimentam
em suas comunidades. Esse encontro tem um sentido es-
piritual, discipular, bíblico e apostólico. Não se trata de
uma “comissão interconfessional”, nem de uma instância
representativa dos dirigentes das comunidades participantes
– embora algumas se façam representar por líderes, bispos
ou delegados oficiais. Trata-se, sobretudo, de um encontro
de irmãos e irmãs que se reconhecem chamados pelo Senhor
Jesus Cristo a uma vida de santidade e unidade, conforme
o Evangelho.
As raízes do Encristus mostram que não pode haver
unidade sem o perdão mútuo que, muitas vezes, é consu-
mado por lavar os pés uns dos outros. Durante 500 anos,
católicos e evangélicos se digladiaram com muitas acusações
e intolerâncias. Aquele que se chama “o divisor” (o diabo)
transformou diferenças de linguagens em heresias que afas-
tam, transformou o modo de ser de uma comunidade em
barreiras que a separam de outras, transformou diferenças
em divergências.
Essa divisão não é corrigida apenas pelo fato de se realizar
um encontro, mas com arrependimento, perdão, humilhação,
lavando os pés uns dos outros. É como se fosse uma segunda
conversão. A partir desses atos de perdão e reconciliação, nós
nos tornamos uma geração curada, sem muros, para amar e
ter comunhão.
Nas nossas reuniões, buscamos a experiência espiritual. O
Espírito Santo se manifesta nesse ambiente de reconciliação,
de pessoas arrependidas e perdoadas umas pelas outras. Numa

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As raízes do Encristus: como se constrói a unidade 191

reunião pequena com a equipe de serviço do Encristus, padres


e pastores lavaram os pés de uma irmã ferida pela divisão da
igreja e houve cura. É este Espírito que permeia a unidade. É
isto o que os apóstolos do ecumenismo espiritual (Du Plessis,
Calisi e Traettino) nos ensinaram. Assim, pedir perdão, perdoar
e lavar os pés são práticas indispensáveis para a unidade do
Corpo de Cristo.
Considerando os séculos que nos distanciaram e a heran-
ça das divisões, temos reconhecido que cada aproximação
entre nós – na oração, diálogo e amizade – já é uma graça
que opera cura nas feridas da divisão. O tratamento das
feridas pode ser lento, diante da imensidão do Corpo de
Cristo, mas é eficaz!
Nesse sentido, temos reconhecido também que o Encristus
é mais uma profecia do que uma estrutura; mais um ato de
adoração em penitência pelas divisões do que uma assembleia
de igrejas e comunidades. A obra é do Espírito Santo. Outros
sinais certamente o Senhor dará, conforme seu beneplácito
para a Igreja, mas nosso objetivo é que cada um de nós va-
lorize sobremaneira o tesouro da graça que tem sido a nossa
própria comunidade, com um olhar inclusivo, que vislumbre
também as comunidades dos demais. Afinal, é no lugar onde
estamos que a graça cotidiana brota otimizando as relações,
os aprendizados, as celebrações, como primeiro terreno onde
palmilhamos nosso discipulado.
O diálogo de reconciliação entre nós, com vistas à plena
comunhão, espera de cada um o seu melhor, levando aos
encontros aquilo que a graça tem proporcionado a cada
comunidade. Então, nós nos aproximamos uns dos outros
e partilhamos tudo juntos como um só Corpo e “membros
uns dos outros” no Senhor:

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192 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

Porque assim como em um corpo temos muitos membros, e nem


todos os membros têm a mesma operação, assim nós, que somos
muitos, somos um só corpo em Cristo, mas individualmente somos
membros uns dos outros (Romanos 12.4,5).

Possíveis frutos de um coração ecumênico


Como descrevemos no nosso livro Reconciliação: O Segundo
Toque,111 as experiências de perdão desses apóstolos da unidade
têm-se repetido em nosso meio.
No decorrer (ou até mesmo antes) de encontros sistemá-
ticos de oração e louvor (às vezes no Espírito, às vezes com
ministração da Palavra, com compartilhamento de dons, etc.)
de irmãos de denominações diferentes, o Espírito Santo tem
produzido:

• convicção de pecado pelas nossas divisões ou pelas di-


visões de nossos pais espirituais, ou de nossas denomi-
nações, ou pela atitude errada de julgarmos, em nosso
coração, irmãos de outras denominações;
• convicção de pecado por trairmos grupos de pessoas
(denominações ou não) dos quais recebemos amor e
alimento espiritual e aos quais renunciamos por algumas
diferenças ou discordância (às vezes, até de maneira
crítica);
• convicção de pecado pelos nossos antepassados, que
agiram de forma cruel e crítica com irmãos ou grupos
por achar que eram os donos da verdade (por exemplo,
não foram apenas os católicos que perseguiram judeus
na inquisição da Idade Média, mas também alguns
reformadores protestantes);
111
MARION, José Carlos e Márcia. Reconciliação: O Segundo Toque. Ibid.

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As raízes do Encristus: como se constrói a unidade 193

• convicção de pecado quando começamos uma unidade


segundo a graça de Deus e a conduzimos (ou nossos
líderes a conduzem) rumo aos padrões da nossa de-
nominação;
• convicção de pecado quando iniciamos o ecumenismo
com irmãos cristãos e, nesse percurso (ou antes), fazemos
críticas a práticas tradicionais ou teológicas das quais
discordamos, esquecendo que o aspecto relevante em
nos unir (centralidade em Cristo) deve ser suficiente
para estarmos juntos.

Essas convicções de pecados (e outras) geram arrependimen-


to. Assim, para o ecumenismo espiritual tornar-se saudável, esse
arrependimento nos leva a pedir perdão publicamente (ao grupo
ecumênico) e, às vezes, a lavar os pés uns dos outros.
Nossa experiência é que a reconciliação do Corpo de Cristo
pressupõe pedir perdão publicamente (com liberação de perdão
aos ofendidos) e, se possível, expressar esse fato de maneira con-
creta lavando os pés. Grupos ecumênicos que escolheram esse
caminho têm funcionado com muita unção. Assim, o demônio
da divisão é desativado.
A reconciliação do Corpo de Cristo é um golpe fatal e total-
mente indesejado pelo pai das divisões. Não há dúvida de que
virão perseguições, oposições, desistências e até traições. Assim,
o ecumenismo espiritual deve ser revestido de oração, de amor
ágape, de longanimidade e do(s) fruto(s) do Espírito Santo.
Os apêndices 1 e 2 deste livro falam sobre as características do
Encristus e sobre o histórico dos eventos.

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Capítulo 9

É POSSÍVEL PENSAR NA UNIDADE?

S
e olharmos para esses grupos como instituições, como
organizações, certamente essa unidade é pouco provável.
Cada um deles tem doutrinas e estruturações pratica-
mente inegociáveis. A base histórica e as tradições de cada
denominação representam um alicerce muito sólido, impossível
de ser ameaçado.
Em outras palavras, é impraticável pensar em unidade entre
denominações, instituições, organizações cristãs que trazem uma
carga histórica doutrinal, cultural e sociológica estabelecidas,
em alguns casos, por séculos de vivência. São ritos, liturgias,
particularidades que fundamentam toda doutrina que marca a
denominação. Nossa proposta não é essa.

Que tipo de unidade?


Nossa proposta de unidade é entre pessoas cristãs, entre filhos de
Deus. A expressão “uns aos outros” aparece mais de 50 vezes no
Novo Testamento (e muitas vezes no Velho). O mais conhecido
é o novo mandamento de Jesus:

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196 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

Um novo mandamento vos dou: que vos ameis uns aos outros; como
eu vos amei a vós, que também vós uns aos outros vos ameis. Nisto
todos conhecerão que sois meus discípulos, se vos amardes uns aos
outros ( João 13.34,35).

A maioria das expressões “uns aos outros” é acompanhada do


verbo amar. Porém, encontramos a expressão relacionada aos
verbos “receber, não julgar, perdoar, lavar os pés, ensinar, ad-
moestar, sujeitar, saudar, servir, consolar, considerar, confessar
culpas, não irritar, não invejar, suportar, edificar, ser benigno,
bondoso, misericordioso”, etc. É interessante que todos estes
verbos, que indicam ação, estão normalmente no imperativo,
no sentido de mandamento, ordenança. É lógico que esses
mandamentos não devem ser praticados exclusivamente nos
nossos “currais denominacionais”, mas entre todos os cristãos.
Se dermos valor a uma questão bíblica baseada no número
de vezes em que ela é mencionada na Bíblia, segundo Tommy
Tenney112 , chegamos a um dado interessante:
A palavra “dízimos” aparece 24 vezes; “ofertas”, 265. “Jejum” e “oração”
são mencionadas mais de 100 vezes cada uma. Esses são, obviamente,
conceitos importantes. No entanto, a palavra “juntos” é mencionada
484 vezes, e “se reuniram”, 97 vezes.

O autor mencionado acima usa duas páginas de seu livro citan-


do as frases bíblicas que abordam a palavra “juntos” e “reunidos”
para enfatizar sua importância, ressaltando como Deus quer que
façamos tudo JUNTOS.
A Palavra nos ensina a pensar nesses termos. Filipenses 4.8 diz:
Finalmente, irmãos, tudo o que é verdadeiro, tudo o que é respeitável,
tudo o que é justo, tudo o que é puro, tudo o que é amável, tudo o

112
TENNEY, Tommy. A Unidade Cristã e o Reavivamento do Corpo de
Cristo. Ibid.

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É possível pensar na unidade? 197

que é de boa fama, se alguma virtude há e se algum louvor existe,


seja isso o que ocupe o vosso pensamento.

Temos um mesmo Pai. Não precisamos orar o “Pai Nosso”


como um “avestruz”, com a cabeça escondida na terra. Porém,
como ponto de partida, ressaltamos os cuidados que devemos ter
com o irenismo. Irenismo, na teologia cristã, refere-se às tentativas
de unificar cristãos utilizando a razão como um atributo essencial.
Esse termo, no grego, significa “paz” ou “atitude de quem busca
paz”. Pressupõe que “seria lícito sacrificar a verdade para evitar
conflitos”. Esse pacifismo, de certa forma, evita fazer análises das
heresias; assim, nunca se critica ninguém.
No século 17, houve tentativas por meio de esforços humanos
no sentido de unir católicos e protestantes. Um dos exemplos foi
o do rei James I da Inglaterra, que acreditava que a tradução única
da Bíblia (que ele encomendou) poderia trazer reconciliação entre
as diversas facções religiosas protestantes. Ainda que a versão King
James, muito utilizada na língua inglesa, tenha trazido uma gran-
de contribuição, infelizmente o uso de uma única tradução não
levou (e não leva) à unidade. Outras tentativas existiram, havendo
encontros e fóruns com esse mesmo objetivo.
Em outras palavras, o irenismo seria o “contato superficial entre
cristãos, como se não houvesse diferenças doutrinárias, culturais e
rituais”; como se a unidade fosse “tapinhas nas costas” deixando
de lado nossas diferenças, fazendo “vistas grossas” com o objetivo
de paz. Assim, o irenismo evita discussões que gerem polêmicas:
visa a colocar “panos quentes” sobre um monte de questões sérias
que dividem a igreja. Claro que não é com esse tipo de unidade
que sonhamos.
Também achamos difícil a unidade por meio de um processo de
diálogo, por mais sério que seja, que nos leve a uma uniformidade
na interpretação bíblica, na doutrina, no culto, na cultura cristã.

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198 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

Como vimos no capítulo 2, com base nos próprios evangelhos,


parece que Deus gosta da diversidade. Assim, buscamos uma
unidade no Espírito que não seja uma igreja uniforme, mas uma
unidade dentro de uma legítima diversidade; uma unidade que
não signifique “fazer de conta que não tem coisas que não precisam
ser resolvidas” (irenismo). Será isso possível?

Existe unidade entre evangélicos?


Vamos pensar, por exemplo, nos evangélicos que têm como
base de fé a mesma Bíblia, estruturados com base na Reforma
Protestante, com estilos muito parecidos de cultuar e muitas
outras semelhanças.
Sem nenhum propósito de crítica, respeitando a todos, vamos
destacar alguns pontos que são tratados como quase irreconciliá-
veis, tratando de grandes denominações:

–– guardar o sábado como ordem constante nos dez mandamentos


ou ter o domingo como dia do Senhor?
–– cear uma vez por semana, ou uma vez por mês ou uma vez
por ano (coincidindo com a Páscoa)?
–– os elementos da ceia são símbolos, tipificação, presença de Deus,
transubstanciação ou consubstanciação?
–– batismo por imersão ou por aspersão?
–– batizar quando criança (algumas igrejas evangélicas têm
essa prática) ou somente quando há entendimento (quando
jovem, adulto)?
–– crer que os dons espirituais aconteceram só por ocasião da Igreja
Primitiva ou continuam existindo até hoje?
–– manter o tradicionalismo, ou o pentecostalismo ou o neopen-
tecostalismo?

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É possível pensar na unidade? 199

–– dízimo é mandamento, um princípio do Velho Testamento que


deve ser praticado também na Nova Aliança ou não?
–– prosperidade deve ser pregada e ensinada ou o evangelho é só
para a salvação?
–– diante de um mundo perverso, devemos ensinar certos “com-
portamentos” aos cristãos (usos e costumes) ou isso é uma função
que cabe somente ao Espírito Santo?
–– aceitamos o divórcio em algumas situações ou o casamento é
indissolúvel, não abrindo exceções?
–– etc.

É claro que, ao conversar sobre unidade com evangélicos,


serão ressaltados como pontos que nos unem a Bíblia (fonte
inerrante de toda a verdade), Jesus (como Senhor e Salvador,
sua morte na cruz, ressurreição e ascensão, sua segunda vinda),
a obra do Espírito Santo e Deus como um só Pai de todos nós.
Em outras palavras, os evangélicos sempre vão dizer: “Temos
o Espírito Santo, e Jesus Cristo é o nosso único Senhor”.
Podemos olhar para a igreja evangélica113 e pensar numa
pluralidade de estilos, formas, ritos, teologias, doutrinas que
parece não incomodar os irmãos, exceto quando se percebem
algumas aberrações heréticas. Porém, mesmo assim, não se
nota uma ação conjunta de “caça às bruxas”.
Podemos investir horas dialogando sobre as diversidades
somente no meio evangélico na busca de um denominador
comum e afirmar categoricamente que não há a menor
chance, por processos naturais, de harmonizar tudo isso. Ou,
simplesmente, podemos obter uma permissão para um irmão
evangélico cear em outra congregação diferente da sua. O

113
Calculam-se entre 700 a 800 milhões de evangélicos no mundo hoje.

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200 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

que dizer sobre qualquer tentativa de convergir com outras


denominações cristãs consolidadas, como a igreja católica, a
ortodoxa, a anglicana, os judeus messiânicos ou outros? Há
esperança de podermos contribuir com a oração de Jesus “para
que sejamos um” (João 17.21)? Certamente se tivermos um só
Espírito, um só Senhor.

Conhecendo um pouco os judeus messiânicos


( judeus cristãos)
Joel Chernoff114 é o CEO da Messianic Jewish Alliance of Ame-
rica (Aliança Judaica Messiânica da América). Em entrevista
recente ao The Jewish Journal, ele afirmou que existem hoje
cerca de 800 congregações judaicas messiânicas no mundo.
Considerando que, em 1967, não existia nenhuma, sem dúvida
é um impressionante crescimento.
Ele afirma, referindo-se a Jesus: “O judaísmo messiânico
é a corrente judaica que cresce mais rapidamente desde 1967.
Calculamos que exista mais de um milhão de judeus messiânicos
no mundo. Os judeus estão-se tornando crentes em Yeshua”. Ele
baseia suas afirmações no censo realizado junto à população
judaica:
As congregações messiânicas são compostas na sua grande maio-
ria por judeus vindos de todos os ramos do judaísmo tradicional,
mas também há pessoas oriundas de diversas denominações evan-
gélicas. Por isso, algumas congregações são formadas por judeus
e gentios que cultuam conjuntamente, num misto de igreja e
sinagoga. Essa aproximação e crescimento, segundo o movimento
messiânico, eram previstos. A conversão recente de tantos judeus
ao Messias Jesus é mais um sinal evidente de que as promessas de

Fonte: http://shalom-israel-shalom.blogspot.com.br/2012/06/impressio-
114

nante-crescimento-do-movimento.html.15/06/2012

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É possível pensar na unidade? 201

Adonai para o seu povo estão se cumprindo nestes últimos dias.


O Senhor prometeu que muitos se voltariam para ele, formando
o “remanescente” para o qual o Messias muito em breve virá!

Mesmo assim, há uma grande resistência por parte dos ortodoxos,


que temem que grupos cristãos tentem usar essa proximidade
para converter os judeus ou forcem uma unificação teológica
entre judaísmo e cristianismo. Porém, os líderes do movimento
messiânico ressaltam que nesses tempos proféticos fica cada vez
mais evidenciada uma onda sem precedentes de amor cristão
pelo povo judeu.115

No Brasil, localizado em Belo Horizonte/MG, o Ministério


Ensinando Sião dá cobertura à Congregação Har Tzion (Mon-
te Sião). Como eles informam, num ambiente de liberdade
e de comprometimento com a verdade, essa congregação
restaura o contexto bíblico original do século primeiro no
qual judeus e gentios adoravam juntos, unidos em comunhão
e amor como família de Deus e corpo do Messias.
Como congregação, a Har Tzion é reconhecida pela
UMJC – Union of Messianic Jewish Congregations (União das
Congregações Judaico-messiânicas) e é hoje considerada a
maior congregação judaico-messiânica da América Latina.
Comprometida com o estudo bíblico e com as raízes judaicas
e bíblicas da fé, a comunidade da Har Tzion recebe judeus,
não judeus e descendentes de judeus que buscam um am-
biente onde possam expressar a adoração ao Eterno (Deus)
e a seu Filho Yeshua (Jesus), respeitando-se o chamado e a
vocação de cada um: judeu como judeu, gentio como gen-
tio, mas uma só família do Eterno. Como Yeshua (Jesus) é
Senhor das comunidades judaico-messiânicas, eles não têm
problemas em ter comunhão com esses irmãos.
115
Traduzido e adaptado do Jewish Journal por Jarbas Aragão

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202 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

Asher Intrater, falando sobre os judeus messiânicos, disse o


seguinte:116
Todas as pessoas, independentemente da sua nacionalidade, devem
demonstrar amor, orar e pregar para os judeus, pois são pessoas
comuns que precisam ouvir de Jesus. Entretanto, o Senhor está
levantando entre os próprios judeus, pessoas para fazer isso. Então,
existem dois tipos de testemunhos que devem ser dados aos judeus:
o amor e a oração da Igreja em todas as nações, e o testemunho dos
próprios judeus convertidos.

Ainda, como um “pedido de perdão” ao povo cristão,


concluiu Asher:
Muitos judeus messiânicos apresentaram uma visão errada para a Igre-
ja, deixando Jesus e a Igreja à parte e valorizando ao extremo a nação,
a história, a cultura e os costumes judaicos. Isso foi um grande erro,
pelo qual pedimos perdão e estamos procurando corrigir em todos os
lugares onde ensinamos. Jesus deve estar em primeiro lugar, e todas as
demais coisas irão se encaixar. Nada pode ser mais importante do que
Jesus e sua mensagem, sob o risco de nos desviarmos da mensagem
principal do evangelho. Alguns instrumentos e símbolos judaicos até
podem estar presentes em algumas reuniões, mas tudo deve apontar
para Jesus, para o reino de Deus; só ele deve ser o centro de tudo.
Se estas coisas, entretanto, se tornarem importantes por si mesmas,
então perderemos a essência da mensagem e a visão (grifos nossos).

Os judeus precisam receber Jesus da mesma forma que todas as


pessoas, pois não existe outra maneira de ser salvo. Mas, para pregar
a eles, é preciso ser sensível à sua cultura e conhecer seus costumes,
assim como com todas as demais nações do mundo. Os judeus são
fechados em relação ao evangelho, mas, graças a Deus, pela primei-

INTRATER, Asher. Conferência “Israel e o Reino de Deus”. UMC – Unidade


116

Cristã Missionária. Jundiaí/SP, fevereiro/2012.

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É possível pensar na unidade? 203

ra vez na história, existem mais de 15 mil judeus messiânicos em


Israel que creem em Jesus117, e todos estão repetindo este versículo:
“Bendito aquele que vem em nome do Senhor!”.

Há dois mil anos que o diabo está tentando impedir que isto acon-
teça, mas ele não conseguirá cumprir esse seu intento. O Senhor vai
voltar e o povo já está em posição de lhe dar as boas-vindas. O diabo
será lançado fora, expulso desse planeta, e nós ganharemos. Os dois
pré-requisitos estão se cumprindo: o evangelho do reino está sendo
pregado em todo o mundo e existem muitos judeus em Jerusalém
dizendo “Bendito aquele que vem em nome do Senhor!”.

Em seu boletim semanal Revive Israel, Asher afirma:118


Unidade é o produto final do amor. Se eu amo você, e você me ama,
e todos nos amamos – então a totalidade do nosso amor nos une.
Ser “um” é uma condição espiritual, divinamente inspirada (Efésios
5.31,32); tornar-se unido é o processo humano ou manifestação
visível da posição de ser um. Somos “um” no Senhor, mas temos
muito trabalho pela frente para nos tornarmos unidos.

Yeshua ( Jesus) orou para que fôssemos um em João 17; em João 18,
ele entrou no Jardim do Getsêmani com seus discípulos. João registra
sua oração pela unidade, enquanto os outros evangelhos registram
a oração do Getsêmani: “Que não seja como eu quero, e sim como
tu queres” (Mateus 26.39). Vamos colocar as duas orações juntas.

A oração do Getsêmani de obediência até à morte era o preço


necessário para que chegássemos à unidade de João 17. Após a
oração do Getsêmani, Yeshua ( Jesus) foi preso e conduzido até a
sua crucificação. Na cruz, ele pagou o preço para que os pecadores
fossem salvos e os cristãos fossem um. A cruz é o preço para tornar
possível nossa “unidade com Deus”. (grifos nossos).
117
Segundo Joel Chernoff, citado neste tópico, há muitos mais espalhados pelo mundo.
118
INTRATER, Asher. O Preço da Unidade. Boletim Revive Israel (www.reviveisrael.
org), 16/03/2015.

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204 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

Falando acerca da dificuldade da Igreja de aceitar a unidade


com Israel, Asher conclui:119
A revelação de Paulo não foi que os gentios podiam ser salvos. Pe-
dro entendeu isso muito antes naquela visão do lençol descendo do
céu (Atos 10 – 11). A revelação de Paulo foi que os cristãos gentios
se tornariam um enorme corpo internacional, e que passariam a ser
parceiros com os mesmos direitos de Israel. Efésios 3.6: “.... que os
gentios são coerdeiros, membros do mesmo corpo e coparticipantes
da promessa em Cristo Jesus por meio do evangelho.”

Foi difícil para os primeiros judeus messiânicos aceitar que os


gentios podiam se tornar coparticipantes com eles. Eles pensavam
que os gentios eram menos importantes. Eles precisavam se
humilhar para compreender a beleza e a importância da Igreja
internacional. Hoje, nós, judeus messiânicos, precisamos fazer
o mesmo.

De igual forma, é difícil para a Igreja entender a importância de


Israel. A Igreja é muito espiritual e numerosa (Apocalipse 7.9).
Contudo, parte do destino da Igreja é ser “enxertada” em Israel
(Romanos 11.17). Israel veio primeiro. A Igreja nasceu de Israel e é
inserida em Israel. Israel e a Igreja foram “feitos” um para o outro.
A plenitude da Igreja libera a salvação de Israel; e a plenitude de
Israel libera o destino da Igreja. (grifos nossos)

Comentamos mais sobre este assunto no capítulo 7 deste livro.

Catolicismo, a maior denominação cristã


Há muita semelhança entre o catolicismo romano e a igreja
ortodoxa. Dentre essas semelhanças, a profissão de fé é um guia
para ambas as denominações. Esta profissão de fé, chamada de

119
INTRATER, Asher. Judeus e Gentios – O mistério da unidade. Boletim Revive
Israel (www.reviveisrael.org), 16/01/2015

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É possível pensar na unidade? 205

“credo”, usa a expressão “creio na santa igreja católica”, que não se


refere ao catolicismo romano ou ortodoxo, mas à igreja universal,
a Igreja de Jesus Cristo.
O Credo ou Símbolo Niceno-Constantinopolitano é uma
declaração de fé cristã aceita pela Igreja Católica e pela Igreja Or-
todoxa. O nome está relacionado ao Primeiro Concílio de Niceia
(325 d.C.), no qual foi adotado, e com o Primeiro Concílio de
Constantinopla (381), no qual foi aceita uma versão revista. Por
esse motivo, ele pode ser referido especificamente como Credo
Niceno-Constantinopolitano para distingui-lo tanto da versão de
325 d.C. como das versões posteriores que incluem a Cláusula
Filioque (a parte que fala sobre o Espírito Santo, acrescentando
“e do Filho”: “... e procede do Pai e do Filho”):
Creio em um só Deus, Pai todo-poderoso, Criador do céu e da terra,
de todas as coisas visíveis e invisíveis. Creio em um só Senhor, Jesus
Cristo, Filho Unigênito de Deus, nascido do Pai antes de todos
os séculos: Deus de Deus, luz da luz, Deus verdadeiro de Deus
verdadeiro, gerado não criado, consubstancial ao Pai. Por ele todas
as coisas foram feitas. E, por nós, homens, e para a nossa salvação,
desceu dos céus e encarnou, pelo Espírito Santo, no seio da Virgem
Maria e se fez homem. Também por nós foi crucificado sob Pôncio
Pilatos; padeceu e foi sepultado. Ressuscitou ao terceiro dia, con-
forme as Escrituras; e subiu aos céus, onde está sentado à direita
do Pai. E de novo há de vir, em sua glória, para julgar os vivos e os
mortos; e o seu reino não terá fim. Creio no Espírito Santo, Senhor
que dá a vida, e procede do Pai; e com o Pai e o Filho é adorado e
glorificado: ele que falou pelos profetas. Creio na Igreja una, santa,
católica120 e apostólica. Professo um só batismo para remissão dos
pecados. Espero a ressurreição dos mortos; E a vida do mundo que
há de vir. Amém.

120
Universal

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206 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

O credo professado constantemente nas missas pelos católicos


romanos121 é a seguinte:
Creio em Deus Pai todo-poderoso, criador do céu e da terra. E em
Jesus Cristo, seu único Filho Nosso Senhor, que foi concebido pelo
poder do Espírito Santo, nasceu da Virgem Maria, padeceu sob
Pôncio Pilatos, foi crucificado, morto e sepultado, desceu à mansão
dos mortos, ressuscitou ao terceiro dia, subiu aos céus, está sentado
à direita de Deus Pai todo-poderoso, donde há de vir a julgar os
vivos e mortos. Creio no Espírito Santo, na santa Igreja Católica
(universal), na comunhão dos santos, na remissão dos pecados, na
ressurreição da carne, na vida eterna. Amém.

Esse resumo da profissão de fé mostra que não há divergência


com as denominações cristãs. Creio que qualquer cristão possa
recitar este texto sem contradição com a Palavra de Deus.

A Igreja Ortodoxa122
Segundo a Wikipédia (Enciclopédia Livre), a Igreja Ortodoxa
(do grego órtos: “reto, correto” e dóxa: “doutrina, opinião” ou,
literalmente, "igreja da opinião correta") ou Igreja Católica Or-
todoxa é uma comunhão de igrejas cristãs autocéfalas, herdeiras
da cristandade do Império Bizantino, que reconhece o primado
de honra do patriarcado ecumênico de Constantinopla desde
que a sede de Roma deixou de comungar com a ortodoxia.
Reivindica ser a continuidade da igreja fundada por Jesus,
considerando seus líderes como sucessores dos apóstolos.
A Igreja Ortodoxa tem aproximadamente dois mil anos,
contando-se a partir da Igreja Primitiva (reivindicação tam-
bém da Igreja Católica Romana), e aproximadamente mil
anos contando-se a partir do Cisma do Oriente ou Grande
121
Calcula-se que haja 1,1 bilhões de católicos romanos no mundo hoje.
122
Calcula-se que haja 250 milhões de ortodoxos no mundo hoje.

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É possível pensar na unidade? 207

Cisma, em 1054. Desde então, os ortodoxos não reconhecem


a primazia papal, a Cláusula Filioque; não aceitam os dogmas
proclamados pela Igreja Católica Romana em séculos recen-
tes, tais como a Imaculada Conceição e a infalibilidade papal.
Também não consideram válidos os sacramentos ministrados
por outras confissões cristãs.
Apesar de católicos romanos e ortodoxos terem uma his-
tória comum, que começa com a fundação da Igreja e com a
difusão do cristianismo pelos apóstolos, uma série de dificul-
dades ocasionou o progressivo distanciamento entre Roma
e os patriarcas. Primeiramente, veio a quebra da unidade
política. Com a divisão do Império Romano em 395 d.C.,
a queda do Império Romano do Ocidente em 476 d.C. e o
fracasso da tentativa de Justiniano I de reunificar o Império
a partir de 535 d.C., o Oriente e o Ocidente deixaram de
ter o mesmo governo. Tempos mais tarde, com a ascensão
do Islã, as trocas econômicas e os contatos por via marítima
entre o Império Bizantino, de língua grega, e o Ocidente, de
língua latina, tornaram-se mais difíceis, e a unidade cultural
deixou de existir.
Apesar de várias diferenças teológicas, organizativas e de
espiritualidade consideráveis, a Igreja Ortodoxa é, em mui-
tos aspectos, semelhante à Igreja Católica: preserva os sete
sacramentos, o respeito a ícones e o uso de vestes litúrgicas
nos seus cultos (denominados de “divina liturgia”). Seus fiéis
são chamados de “cristãos ortodoxos”.
No conjunto, a Igreja Ortodoxa é a terceira maior confissão
cristã, contando, em todo o mundo, com aproximadamente
250 milhões de fiéis, concentrados sobretudo nos países da
Europa Oriental. As igrejas ortodoxas mais importantes são
a Igreja Ortodoxa Grega e a Igreja Ortodoxa Russa.

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208 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

Ainda que a Igreja Ortodoxa reivindique ser a única cor-


reta, podemos sim nos aproximar desses irmãos, pois, como
vimos no item anterior (católico), a profissão de fé é coerente
com a essência em que os cristãos creem.

Unidade no Espírito (ecumenismo espiritual)


Ainda que Efésios 4.2 nos exorte a “guardar a unidade do Es-
pírito pelo vínculo da paz”, certamente, com as nossas divisões,
deixamos escapar tão grande privilégio do Corpo de Cristo.
Entendemos que, por negligenciar e mesmo não discernir
o Corpo unido (1 Coríntios 11.29), não vivemos hoje esta
unidade espiritual no vínculo da paz. Como reconquistar esse
tempo perdido?
Um primeiro aspecto da unidade no Espírito (ecumenismo
espiritual) é que não pode ser alcançado por esforço humano.
É obra do Espírito Santo. A unidade da Igreja só pode ser
alcançada pela ação do Espírito Santo de Deus. Se a Igreja
nasceu por obra do Espírito, e a unidade dela ocorreu em
Pentecostes, só por um Pentecostes renovado isto poderá
acontecer. Só o Espírito Santo poderá realizar na sua plenitude
a oração de Jesus antes de sua morte: “para que todos sejam
um” (João 17.21).
Muitas tentativas já foram feitas dentro da ideia de unidade
espiritual, mas sem frutos. Tentativas de acordos teológicos,
de pacificação entre cristãos como o Irenismo, relativismo
doutrinal, diálogos ecumênicos com busca de acordos, pro-
postas de encontrar denominadores comuns, todos foram
frustrados. É o Espírito Santo quem nos conduz à verdade
integral e, como diz Walter Kasper...123

123
KASPER, Walter. Que Todos Sejam Um. Ibid.

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É possível pensar na unidade? 209

... ele cura as feridas de nossas divisões que até hoje ainda sangram.
O Espírito é o amor entre o Pai e o Filho, ao mesmo tempo a parte
interior e exterior de Deus. Sem a comunhão do Espírito, sem es-
piritualidade de comunhão, a comunhão institucional torna-se uma
mera máquina sem alma. Uma espiritualidade ecumênica, portanto,
será primeiramente uma espiritualidade bíblica e irá expressar a si
própria na leitura e estudo simples da Bíblia, que, para todos os
cristãos, é o testemunho fundamental universal da salvação de Deus
na história, cumprindo em Jesus Cristo (grifos nossos).

Dentro dessa proposta de ecumenismo espiritual (unidade do


Espírito), continua Kasper:
A confissão sobre o caráter único e o significado salvífico universal
de Cristo irá preservar a fé cristã do relativismo e do sincretismo
em seus encontros com outras denominações cristãs, mas também
da arrogância.

Nessa base bíblica, centralizado na salvação exclusiva por meio


de Jesus Cristo, partilhando a Palavra, orando, com comunhão,
é que podemos criar o ambiente adequado para o Espírito Santo
operar.
Certamente, nesses momentos, estaremos experimentando o
Espírito Santo. Portanto, uma espiritualidade ecumênica (unidade
do Espírito) é uma espiritualidade de oração, de comunhão, de
Palavra. Nesse ambiente, os diferentes dons do Espírito estarão
agindo para servirmos uns aos outros (1 Coríntios 12.4-11). Em
nossas reuniões, cada um trará a sua contribuição (1 Coríntios
14.26); o amor paciente, que tudo espera, que tudo suporta, que
não se incha de orgulho, que não se irrita, que não é ciumento,
que serve aos outros (1 Coríntios 13) será potencializado pelo
Espírito Santo. Essa atmosfera certamente nos levará ao perdão
e ao arrependimento, levará à reconciliação sem que os irmãos

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210 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

cristãos sacrifiquem sua identidade, levará a um ambiente sadio


sem que um irmão queira absorver o outro, respeitando seus dons
e sua alteridade (fato ou qualidade de uma coisa ser diferente de
outra; natureza ou condição do que é outro, do que é distinto).
Nessa espiritualidade, não se busca proselitismo, não se trata
de conversão de uma para outra igreja, mas de uma conversão
para a verdade plena de Jesus Cristo. Significa crescermos juntos
para alcançar a estatura de Cristo. Significa encontrarmos um
Pentecostes renovado para que a oração sacerdotal de Jesus seja
consumada em nossa vida.

Alguns cuidados na busca da unidade do Espírito


A unidade do Espírito não trata de um indiferentismo dogmático.
Também não trata de anular a forma como outro irmão cristão
pratica sua fé. Num ambiente de amor e visitado pelo Espírito
Santo, teremos conversas em que haverá complementação da
revelação que Deus tem dado a cada um. Não podemos conceber
que somos detentores com exclusividade de verdades plenas que
não foram reveladas a outros irmãos. Somos sim a família de Deus.
Em janeiro de 2014, fui passar um mês em Camerino, Itália,
num curso de italiano. Já no ônibus, indo de Roma a Camerino,
conheci o irmão Izaías. Ele, muito conhecedor de história, me
impressionou explanando seus conhecimentos sobre a Itália an-
tiga. Tivemos mais de duas horas de comunhão e imaginei como
seria agradável passar esse mês com uma pessoa tão vibrante. Já
na cidade, descobri que ele era de uma denominação cristã com
práticas doutrinárias muito diferentes daquelas em que eu cria.
Porém, aquela comunhão inicial nos deu base para conversar
muito sobre assuntos espirituais. Percebi que estávamos desar-
mados, sem preconceitos. Interessante que o primeiro assunto
tratado tenha sido o perdão. Creio que aquele mês de convivência

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É possível pensar na unidade? 211

nos edificou grandemente na fé e na revelação da Palavra. Vimos


que as diferenças, as diversidades se transformaram em riquezas
para o crescimento de ambos. Diversas de suas explicações com-
plementaram meu entendimento e, pelo que ele me disse, pude
complementar igualmente sua vida espiritual.
Achar que só nós temos a revelação plena das Escrituras, sem
dúvida, é uma presunção muito grande. Achar que Deus não fala
com os irmãos das denominações “x” ou “y” como fala conosco é
querer “domesticar” o Espírito Santo. Assim, um primeiro passo
em direção à unidade do Espírito é reconhecer que a presença
do Espírito Santo não é monopólio da minha congregação. Ora,
se o Espírito Santo está com outros irmãos, certamente, pelos
dons diversificados, ministérios e diversidades de operações (1
Coríntios 12.5-7) há revelações que não temos e, com humildade,
sem preconceitos e dialogando, seremos enriquecidos por essas
diversidades do Espírito.
Um encontro, por exemplo, entre evangélicos e católicos que
narramos em nosso livro Reconciliação: O Segundo Toque, é de
um grupo chamado Acolher. Na amizade entre duas meninas na
escola e no encontro das duas famílias (uma católica e outra evan-
gélica), nasceu o desejo de perpetuar essa comunhão reunindo-se
constantemente para conversar, comer juntos, orar, ler a Palavra
e, posteriormente, dialogar sobre as riquezas das revelações que
cada um tinha na sua fé. Esses dois pais, por terem discípulos,
decidiram, após autorização dos seus líderes eclesiásticos, levar
às reuniões as pessoas dos seus respectivos grupos. Pelo fato de
as reuniões serem nas casas, houve necessidade de multiplicar os
grupos depois de se adquirir algumas experiências.
Nossa proposta é, em primeiro plano, por meio de diálogo, co-
munhão, oração e estudo da Palavra, redescobrir a unidade que já
temos, centrados em Jesus Cristo. Aqui, como dissemos, tesouros

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212 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

que irmãos têm nesta área, quando intercambiados, nos ajudam


a enriquecer nossa fé. Em nossas reuniões de vivência espiritual,
adquirimos confiança mútua. É claro que, com o passar do tempo,
aliados, vivendo o amor e o perdão, podemos (e devemos) conver-
sar sobre pontos de diversidade no que tange a doutrinas, tradições,
heranças que cada um tem. Estes diálogos, no amor, não visam a
fazer proselitismo (aliás, a unidade espiritual não pressupõe trazer
outros irmãos para a nossa denominação), muito menos criticar
os irmãos que têm uma prática diferente da nossa. O diálogo na
unidade sempre leva a esclarecer as razões de práticas diferentes
das nossas. Como dissemos nos capítulos anteriores, temos mais
coisas que nos unem (que são relevantes) do que coisas que nos
dividem (que normalmente não são relevantes).

É possível cada um fazer parte deste mover? Como?


Um ponto fundamental para ver a oração de Jesus (João 17.21-
23) ser realidade na Igreja hoje é, assim como o próprio Jesus
fez, orar. Não orar esporadicamente, mas ter um tempo diário
para isso, uma oração insistente, constante, perseverante.
Uma prática que o Conpas (Conselho de Pastores de Jundiaí)
teve em suas orações semanais é que cada pastor deveria orar pelo
sucesso (crescimento, avivamento, etc.) de outras congregações que
não apenas a sua. E, de preferência, deveriam orar por algumas
denominações com as quais não simpatizassem ou que tivessem
criticado em algumas ocasiões.
Orar pela unidade significa interceder pelo sucesso de outras
denominações, principalmente por aquelas cujas práticas doutri-
nárias não compartilhamos, por aquelas que nos parecem estar
distantes dos nossos conceitos teológicos ou por pessoas de outras
denominações que conhecemos. Após algum tempo de oração,
fique atento, pois Deus Pai lhe dará amor por essas pessoas ou

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É possível pensar na unidade? 213

denominações. A primeira coisa a ser feita é aproximar-se, com


humildade, de irmãos cristãos dessas outras denominações. En-
contraremos esses irmãos no trabalho, na fila do caixa, na rua, na
família, no rol de amigos, etc.
Servir a esses irmãos com o melhor que temos é um man-
damento bíblico. Em situação de dúvida, devemos enfatizar
que reconhecemos ser irmãos em Cristo e que a sua denomi-
nação é por nós respeitada, que não temos nenhum desejo de
proselitismo (“pescar no aquário”), mas de ter comunhão no
Espírito Santo. Como dissemos no início deste capítulo, amar,
perdoar, servir uns aos outros é indispensável.
Haverá um momento que o Espírito Santo irá preparar
para a reconciliação. Na verdade, de alguma forma, por pen-
samentos, palavras, atitudes ou omissões criticamos ou des-
confiamos daqueles irmãos. Com o coração arrependido, esse
é o momento de pedir perdão. Às vezes, como na oração de
Daniel (capítulo 9), temos de pedir perdão por outros irmãos
da nossa denominação e/ou por tantos anos de divisões. Você
pode estar certo de que, nesse momento, haverá reciprocidade:
ambas as partes se arrependerão. Aqui, as feridas que podem
estar durando séculos (as divisões são antigas) serão curadas, e
passaremos a ser chamados e reconhecidos como uma geração
curada.
Quando as barreiras começam a ser derrubadas, é o momen-
to de se pensar em uma reunião que abranja, inicialmente, o
aspecto social, de preferência em volta de uma mesa. Comer
juntos é lembrar a Nova Aliança. Gradativamente, introduzi-
mos uma oração, mais à frente um estudo da Palavra e, assim,
sucessivamente.
É lógico que, nessas etapas, devemos nos submeter aos nossos
líderes, pastores, padres e bispos (não podemos tomar iniciativa

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214 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

de abrir nossa casa para esse tipo de reunião sem a autorização


dos nossos líderes). Também não podemos esconder da nossa
congregação esse propósito de Deus para a nossa vida.
Em nenhum momento, seja na aproximação, seja nas reuniões,
façamos uso de críticas em relação aos aspectos doutrinários, por
mais estranhos que sejam. Esse é o momento de buscar as riquezas
que cada um tem no que tange à revelação da Palavra.
É claro que, um dia, as diferenças doutrinárias, num ambiente
de paz e amor, com sabedoria do alto, serão abordadas. Nesse
momento, o Espírito Santo agirá de tal maneira que nenhuma das
partes se sentirá ofendida. E mesmo que as diferenças continuem,
o amor que nos une será maior.
Nunca se preocupe com o futuro, com a maneira como a
igreja será curada. Esta é uma tarefa do Espírito Santo. “Não por
força nem por violência, mas pelo meu Espírito, diz o Senhor dos
Exércitos” (Zacarias 4.6b). Não podemos imaginar como será a
unidade que o Espírito Santo produzirá para nos tornarmos a
sua Noiva gloriosa, mas sabemos que ele o fará. Nosso papel é o
mesmo de Maria que, sem conhecer homem algum, gerou pelo
Espírito Santo o Filho de Deus dizendo “sim” à proposta de Deus:
No sexto mês, foi o anjo Gabriel enviado, da parte de Deus, para
uma cidade da Galileia, chamada Nazaré, a uma virgem desposada
com certo homem da casa de Davi, cujo nome era José; a virgem
chamava-se Maria. E, entrando o anjo aonde ela estava, disse:
Alegra-te, muito favorecida! O Senhor é contigo. Ela, porém, ao
ouvir esta palavra, perturbou-se muito e pôs-se a pensar no que
significaria esta saudação. Mas o anjo lhe disse: Maria, não temas;
porque achaste graça diante de Deus. Eis que conceberás e darás à
luz um filho, a quem chamarás pelo nome de Jesus. Este será grande
e será chamado Filho do Altíssimo; Deus, o Senhor, lhe dará o trono
de Davi, seu pai; ele reinará para sempre sobre a casa de Jacó, e o

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É possível pensar na unidade? 215

seu reinado não terá fim. Então, disse Maria ao anjo: Como será
isto, pois não tenho relação com homem algum? Respondeu-lhe
o anjo: Descerá sobre ti o Espírito Santo, e o poder do Altíssimo
te envolverá com a sua sombra; por isso, também o ente santo que
há de nascer será chamado Filho de Deus. E Isabel, tua parenta,
igualmente concebeu um filho na sua velhice, sendo este já o sexto
mês para aquela que diziam ser estéril. Porque para Deus não haverá
impossíveis em todas as suas promessas. Então, disse Maria: Aqui
está a serva do Senhor; que se cumpra em mim conforme a tua
palavra. E o anjo se ausentou dela (Lucas 1:26-38; grifos nossos).

Que possamos todos ter um coração aberto para o cumprimen-


to da oração de Jesus em João 17.21 e, como Maria, possamos
afirmar: “Eis aqui o servo do Senhor; cumpra-se em mim segundo
o teu propósito!”.

A parousia (a volta de Jesus) e a unidade cristã


Há um bom tempo, começou a congregar conosco uma
família vinda de outra região que procurava uma igreja que
se adaptasse às suas heranças religiosas. Recebemos aqueles
visitantes com muita alegria. Porém, ao conversar com eles,
vi algumas diferenças relevantes e imaginei que seria muito
difícil eles continuarem conosco.
Porém, para a nossa surpresa, depois de participar algumas vezes
dos nossos cultos, eles tomaram a decisão de congregar conosco.
Um tempo depois, com aquela liberdade de irmãos, perguntei-lhes
o que havia contribuído para a decisão de permanência, sendo
que, a meu ver, havia congregações que se adequavam muito mais
às características deles. A resposta me deixou perplexo: “É porque
todos os finais de reunião vocês bradam, (depois de um dirigente
falar: ‘o Espírito e a Noiva dizem’): Maranata, ora vem Senhor
Jesus” (Apocalipse 22.17,20).

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216 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

Se naquele momento essa resposta me surpreendeu, com o


tempo fui entender que era uma poderosa oração de unidade.
Hocken124 diz que esta frase é a oficial confissão de todo o Corpo
de Cristo: “Todos os cristãos deveriam estar unidos orando o final
da oração das Escrituras: ‘Amém. Vem, Senhor Jesus!’ (Apocalipse
22:20)”. Ele afirma que a oração da unidade “Maranata” (na língua
grega significa “O Senhor Vem”) está intimamente ligada com a
oração do capítulo 17 de João pela unidade dos cristãos.
Hocken cita ainda que essa oração foi ensinada pelo abade
Abbé Paul Couturier de Lyon, na França, considerado o primei-
ro apóstolo da unidade do século 20. Couturier viu que a única
oração pela unidade que todos os cristãos poderiam compartilhar
de maneira completa era a oração do próprio Jesus “para que todos
sejam um, como tu, ó Pai, o és em mim, e eu em ti” (João 17.21).
Ele desenvolveu essa forma de oração (Maranata) pela unidade
cristã na forma que Cristo deseja e pelo significado que ele deseja.
A perspectiva do capítulo 17, ainda segundo a visão de Cou-
turier, é enfatizar grandemente o papel do Espírito Santo na pa-
rousia. A oração por unidade, envolvendo a oração de Jesus (para
que todos sejam um como ele e o Pai são um), é uma oração no
poder do Espírito. A oração do Espírito para que os cristãos sejam
UM e o clamor do Espírito “Vem, Senhor Jesus” estão associados,
porque a segunda vinda será o final do ajuntamento na unidade
plena do reino de Deus.
Como é bom estar cheio de esperança (Romanos 15.13) e
poder olhar para a volta de Jesus e, juntamente em unidade com
todos, confessar em alto e bom som: “Maranata! Ora, vem Senhor
Jesus!”. Ainda hoje, na unidade das quatro comunidades, sempre
bradamos essa oração.

HOCKEN, Peter. The Glory and the Shame. Reino Unido: Eagle, Guildford,
124

Surrey, 1994.

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Capítulo 10

UMA COMUNIDADE QUE VIVE


A UNIDADE

N
ão existe fórmula padronizada para praticar a uni-
dade do Espírito. Pelo contrário, há diversidade no
modo como o Espírito Santo opera. Este capítulo
busca mostrar que existem sim grupos de irmãos de diferentes
denominações cristãs praticando esta unidade. Destacaremos a
COMUNIDADE ALELUIA125, de Augusta, Geórgia (EUA),
que é uma “comunidade de vida” (mais de 700 pessoas moram,
em sua grande parte, num único bairro). Também queremos,
ao exemplificar, resumir como esta comunidade, de mais de
40 anos de experiência, entende o que é unidade do Espírito
(ou ecumenismo espiritual) mantendo-se com cerca de 12
denominações cristãs diferentes.
Todas as declarações neste capítulo foram feitas por seus
líderes Dan Almeter (católico) e Bob Garrett (evangélico), em
ministrações realizadas em Jundiaí nos dias 12 e 13 de março de
2014, no evento “Um só Senhor, Uma só Fé, Um só Batismo”.
125
Há outras comunidades ecumênicas de vida. Na Austrália, existe uma nos mesmos
moldes da Aleluia. Existem também comunidades de vida entre católicos e evangé-
licos, mas não são ecumênicas.

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218 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

Estivemos ainda, em julho de 2013 e julho de 2015, visitando


e constatando o funcionamento dessa comunidade.

Declarações de experiências vividas por mais de


40 anos
Os irmãos desta comunidade dizem que a unidade do Corpo
de Cristo é importante para Jesus. Isso é visto na oração de
Jesus em João 17. Devido a esse fato, é parte do trabalho de-
les, como discípulos, orar e trabalhar pela unidade cristã. Isto
vale para os cristãos de todos os lugares. Para a Comunidade
Aleluia, é um chamado especial, assim como um desafio e um
prazer. Por ser tão importante, dizem eles:
O diabo nos ataca de todas as maneiras que pode. Por amarmos a
unidade, devemos resistir às táticas do diabo, sendo sábios como
as serpentes e gentis como as pombas. Nós nos posicionamos,
como comunidade, no testemunho da obra de unidade que o Es-
pírito Santo está fazendo entre os cristãos de todas as tradições,
no mundo todo. Juntos, labutamos para viver uma unidade de
amor com comunhão prática diariamente. Juntos, oramos para
os líderes nas nossas denominações para que encontrem uma
maneira de resolver as diferenças entre nós. Juntos, podemos,
cada um de nós, labutar para crescer em santidade para chegar
à verdade. Juntos, trabalhamos para manter relacionamentos
de amor, apesar das diferenças que temos, sendo “rápidos em
perdoar e em pedir perdão”. Juntos, oramos com Jesus: “Pai, faz
com que eles (nós) sejam um”. Juntos, dizemos com Jesus: “Para
os homens é impossível; para Deus, porém, todas as coisas são
possíveis!” (Mateus 19.26).

Esses irmãos começaram a Alleluia Community Covenant


(Aliança da Comunidade Aleluia) com a declaração: “JESUS É O
NOSSO SENHOR!”. Este é o alicerce da unidade. Eles dizem:

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Uma comunidade que vive a unidade 219

Quanto mais cada um de nós fizer para viver como discípulo zeloso
do nosso Senhor Jesus, mais unidade todos nós teremos. Quanto
mais unidade tivermos, mais viveremos a profecia para os outros
membros do Corpo de Cristo. Cremos que é o próprio Deus que
nos chamou para sermos um povo ecumênico no Espírito. Trata-se
de um elemento essencial do chamado da nossa comunidade.

A missão fundamental da Comunidade Aleluia, segundo seus


líderes citados acima, é “trabalhar pela unidade no Corpo de Cristo
e ser uma voz profética para a unidade no Corpo de Cristo”. Eles
explicam:

No final do capítulo 16 de João, Jesus disse: “No mundo tereis afli-


ções. Mas tenham ânimo! Eu venci o mundo.” ( João 16.32b – NIV)
No capítulo seguinte, em sua oração por unidade, Jesus suplica que
“para que eles possam ser um.” ( João 17.11, NIV; grifos nossos)

Parte da provisão de Deus para vencer o mundo parece estar ligada à


unidade entre seu povo. Diz 1 João 1.7: “Se andarmos na luz, como
ele está na luz, temos comunhão uns com os outros...” (NIV). Andar
na luz leva à comunhão, e andar nas trevas leva à divisão.

João 17.23 diz: “Eu neles e eles em mim. Que eles possam ser levados
à completa unidade para que o mundo saiba que tu me enviaste e
que eu os amei como tu me amastes” (NIV).

No entendimento desses líderes, as Escrituras parecem


indicar que:

a. a desunião impede que nos tornemos plenamente o que


Deus nos chamou para ser;
b. a clareza do nosso testemunho ao mundo parece estar
diretamente ligada à nossa unidade.

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220 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

A Comunidade Aleluia crê que trabalhar para a unidade


cristã é um mandamento para o Corpo de Cristo como um
todo. Também crê que é um chamado especial e privilégio
deles ser profetas da unidade na vida diária da comunidade.
Eles sabem que não podem resolver todas as questões doutri-
nárias que têm dividido as igrejas, pois esta tarefa, segundo
eles, pertence aos bispos, aos líderes denominacionais, aos
pastores, aos mestres da Bíblia, aos teólogos, etc. Nesta base,
eles afirmam:
Cremos, fervorosamente, que é nossa tarefa profetizar ousa-
damente, por meio da nossa vida, que os cristãos de diferentes
igrejas e tradições podem e devem amar uns aos outros. E mais
ainda, podemos compartilhar uma comunhão diária de modo
rico e que dê suporte, enquanto mantemos nossa fé nas nossas
tradições cristãs.

Oração contínua pela unidade no Espírito (ecumenismo


espiritual)126
Na vigília de oração desta comunidade, cada membro comum
tem a incumbência de orar uma hora por dia, 365 dias por
ano, a oração da unidade. Todas as vezes que oram, por uma
hora, cada participante declara:

Pai, o Senhor nos chamou para uma unidade que é difícil nesta era
por causa das muitas divisões denominacionais. Ajuda-nos a ser
fiéis aos nossos chamados denominacionais individuais, de modo
a guardar e proteger a obra da unidade que tu estás fazendo na
Comunidade Aleluia.

Esta comunidade começou em uma reunião de oração em 1973, numa casa, onde
126

um grupo de irmãos ficou preso por uma nevasca que durou todo o final de semana.
Nessa oportunidade, Deus falou com eles para praticar a unidade e mostrar ao mundo
que isso é possível. Assim, a oração é o norte de tudo para eles.

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Uma comunidade que vive a unidade 221

Em seguida, eles dizem (note a natureza dupla da oração):


Devemos (1) ser fiéis aos nossos chamados denominacionais, (2)
de modo que guarde e proteja a obra de unidade de Deus em nosso
meio. Nosso chamado para uma unidade prática é difícil; porém,
cremos fervorosamente que o que Deus nos mandou fazê-lo, nos
dará graça para fazê-lo.

Quanto aos termos “ecumênico” e “multidenominacionais”,


sabendo que não são bem aceitos por muitos cristãos, eles
declaram:
Demos o nome a este ensino de formação de “Nossa Natureza
Ecumênica”. O título, e como decidimos que ele fosse, é um
estudo em si sobre as dificuldades que enfrentamos quando
buscamos a unidade cristã. Durante muitos anos, a comunidade
tem utilizado os termos “ecumênico” e “multidenominacional” de
modo intercambiável. Utilizamos o termo “multidenominacional”
porque o prefixo “multi” significa que temos diferenças devido
às muitas tradições cristãs representadas na Comunidade Ale-
luia. O termo “denominacional” significa que buscamos mostrar
claramente que mantemos nossa identidade juntamente com as
nossas várias tradições eclesiásticas. Entretanto, devido ao fato
de a Aleluia ter o chamado de trabalhar na unidade, escolhemos
utilizar “ecumênico” para descrevermos a nós mesmos. Por quê?
Porque entendemos que isso sugere uma resposta ativa ao Espí-
rito Santo para trabalhar em prol da unidade cristã. Apesar de
o termo “multidenominacional” descrever um corpo que inclui
várias tradições eclesiásticas (e, portanto, é um termo aceitável),
ele não reflete a obra dinâmica em relação à unidade cristã que
o termo “ecumênico” implica. Isto está em conformidade com a
missão da Comunidade Aleluia para trabalhar em prol da unidade
no Corpo de Cristo.

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222 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

O termo “multidenominacional”, dizem eles, também pode


ser problemático para os católicos, porque a Igreja Católica
não se vê como uma denominação dentre outras. Ao mesmo
tempo, o termo “ecumênico” pode ser problemático em alguns
círculos protestantes-evangélicos-carismáticos, porque dá a
conotação de liberalismo – um ajuntamento de pessoas que se
denominam cristãs, mas com níveis variáveis de consideração
pela verdade.
Alguns católicos também ficam ressabiados com a palavra “ecume-
nismo”, pois creem que denota “acabar com as distinções” e “nivelar
as diferenças”, aceitando-se algum tipo de denominador comum
doutrinário ao nível mais baixo. Podemos falar de sermos ecumê-
nicos. Entretanto, não estamos falando de nos juntarmos à custa da
verdade. O ecumenismo autêntico não suporta relacionamento
com o ecumenismo liberal, que busca unidade, desrespeitando-se
as diferenças doutrinárias. Os protestantes e católicos na Aleluia
mantêm as distinções de suas respectivas tradições. Não obstante,
tomamos posição unida sobre o que é comum relativo às Escrituras
e aos credos antigos – o que C. S. Lewis chama de “Cristianismo
Puro e Simples (grifos nossos).

Resumindo, segundo a Comunidade Aleluia, ecumenismo não


é como as políticas intergovernamentais ou internacionais, em que
você tem uma meta comum e pode achar um meio-termo para
chegar lá com estratégias e táticas. Ecumenismo é descobrir juntos
o que Deus quer e como ele quer.
Ora, sabemos que a vontade de Cristo para a igreja é a unidade;
ele orou por isso na noite anterior à sua morte. Sabemos que esta
unidade tem sido quebrada já quase desde seu início. O esforço
ecumênico é descobrir, hoje, como esta vontade de Cristo deverá
ser entendida e posta em prática. Também não é lidar somente
com relações pessoais. Tem a ver, acima de tudo, com comunhão.

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Uma comunidade que vive a unidade 223

Comunhão significa participar, compartilhar em todos os dons


e em todas as graças que Cristo transmitiu à Igreja por meio do
Espírito Santo.

Também deve ser mencionado que os “não-denominacionais” (um


cristão que não segue nenhuma doutrina eclesiástica em particu-
lar) serão bem-vindos na Aleluia contanto que sejam batizados
e que não queiram transformar a Comunidade Aleluia em uma
igreja não denominacional (grifos nossos).

Ecumenismo espiritual (unidade do Espírito)


Ecumenismo espiritual é uma questão de todos nós sermos reci-
pientes de tudo aquilo que Cristo quer que se torne vida em sua
Igreja. Isso envolve não somente pensamentos e teologia, mas
também tudo o que é vivo na vida cristã. Envolve, sobretudo,
toda a profundidade da nossa fé. Não é somente uma questão
de acordos aqui e ali entre as pessoas da igreja; significa que
o corpo todo da igreja tem de assimilar essa fidelidade maior
a Cristo e ao Evangelho. Nesta linha, seus líderes declaram:
Isto parece resumir bem o papel da Aleluia no ecumenismo. Esta-
mos nos esforçando para descobrir o que Deus quer e como ele
quer. Queremos entender e pôr em prática a vontade de Cristo
para a unidade. Católicos e protestantes, juntos, na Aleluia, querem
participar e compartilhar essas graças e dons que o Espírito Santo
concedeu a cada uma das tradições da fé. Estamos nos esforçando
para viver uma comunhão mais profunda juntos, vivendo a vida
cristã juntos, esforçando-nos para viver o Evangelho da maneira
mais fiel e radical possível.

O termo usado não só na Comunidade Aleluia, mas de ma-


neira geral por grande parte dos grupos que buscam a unidade,
é explicado por seus líderes. Eles mostram que tudo tem como
alicerce a humildade:

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224 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

A humildade evidente nesta visão autocrítica e penitente forma a


base para a vereda do ecumenismo. Isso inclui conversão e renovação,
sem as quais não pode haver ecumenismo nem diálogo. Isto leva
ao conceito de “ecumenismo espiritual”. Ecumenismo espiritual é
o chamado dado por Deus à Comunidade Aleluia e é o meio pelo
qual o Espírito Santo tem derramado sobre nós uma graça incrível
e quase incomparável.

O que é “ecumenismo espiritual”? Todos os fiéis deveriam se lembrar


de que quanto mais esforços fazem para viver vidas mais santas de
acordo com o Evangelho, mais irão aprofundar a unidade cristã e
colocá-la em prática. Pois, quanto mais íntima for a união com o
Pai, com a Palavra e com o Espírito, mais profunda e fácil será a
capacidade de crescer em amor fraternal mútuo. Esta mudança de
coração e de santidade de vida, juntamente com oração pública e
privada pela unidade dos cristãos, deverá ser considerada como a
alma de todo o movimento ecumênico que tenha por mérito o nome
de “ecumenismo espiritual”.

Um dos nossos chamados principais, como indivíduos da co-


munidade, é crescer em santidade. Isto significa que estamos
buscando ficar cada vez mais profundos na comunhão com as
três Pessoas da Santíssima Trindade. Na medida em que protes-
tantes, católicos, não denominacionais e judeus messiânicos são
transformados à semelhança de Cristo, as diferenças se tornam
cada vez menos importantes para eles, e sua oração é que desa-
pareçam por completo.

Um dos pontos críticos desta comunidade, bem como em


outros grupos em busca da unidade, é a participação na ceia
(sentar-se à mesa). A Santa Ceia ou Eucaristia difere-se muito entre
os evangélicos e, consequentemente, da Igreja Católica. Assim, os
irmãos da Aleluia dizem:

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Uma comunidade que vive a unidade 225

Não sabemos para onde o nosso viver neste chamado ecumênico de


Deus nos levará. Para onde nos levará mais 40 anos de caminhada
na unidade? Pode ser que todos nós teremos permissão de estar
à mesma mesa do Senhor! Veja o que Deus já fez! Não podemos
limitar o que ele pode fazer no futuro.

Os irmãos entendem que viver juntos como cristãos do Novo


Testamento, apesar das diferenças relativas ao entendimento
doutrinário e às práticas devocionais, é um trabalho poderoso
para a unidade cristã. Quanto a isto, eles dizem:

O amor de um para com os outros, e o respeito pelas tradições de-


nominacionais dos demais, assim como pela herança de cada um,
resistem ao plano do diabo, de longa data, de fragmentar o Corpo de
Cristo em divisões intermináveis. Não podemos, contudo, desprezar
as diferenças que precisam ser resolvidas. Nós, juntamente com a
Igreja toda, estamos sobrecarregados pelas antigas hesitações e falta
de compreensão e preconceitos mútuos que devem ser vencidos para
que vivamos plenamente na unidade do Pai.

A prática da unidade espiritual


Como podem estes irmãos viver em unidade em meio a várias
diferenças enquanto trabalham e oram para que uma unidade
mais abrangente venha? A seguir, relacionamos algumas dicas
úteis para uma vida em um ambiente ecumênico:

• Podemos decidir que a unidade é importante o su-


ficente para valer a pena toda a frustração e o trabalho
duro que ela nos leva a enfrentar. Também podemos nos
lembrar de que, se Jesus quer a unidade, então quem
somos nós para permitir que o conforto, que as opiniões
ou que as preferências atrapalhem sua vontade?

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226 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

• Lembre-se de como Pedro teve de ser instruído por


Deus para que se abrisse para os gentios, e lembre-se
de como ele respondeu quando outros não gostaram
do que estava acontecendo? Pedro teve de se defender
de alguns irmãos circuncidados por ter permitido que
os gentios recebessem o arrependimento para a vida
(Atos 11.18). Ele explicou que o Espírito Santo caiu
sobre eles (Cornélio e os que estavam reunidos com
ele) antes mesmo que Pedro chegasse ao ponto de orar
pelo Espírito Santo (Atos 10.44,45). “Se Deus deu o
mesmo dom para eles como Ele deu para nós quando
cremos no Senhor Jesus Cristo, quem era eu (Pedro)
para resistir a Deus” (Atos 11.17).
• Somos ecumênicos por causa do que Deus está fazendo.
Deveríamos resistir a Jesus?
• Podemos nos esforçar para viver o Evangelho do modo
mais pleno possível, do nosso próprio jeito, fiéis às nos-
sas próprias tradições. Duas pessoas vivendo vidas cristãs
vigorosas, em amor com Jesus, e fazendo tudo o que
puderem para segui-lo (mesmo se estiverem fazendo de
modo diferente) serão capazes de ser mais unidas do que
duas pessoas mornas experimentando os mesmos moveres,
mesmo se vierem da mesma tradição.
• Podemos fazer do “amor o nosso alvo”. “Agora, pois,
permanecem a fé, a esperança e o amor, estes três, mas
o maior destes é o amor” (1 Coríntios 13.13). Barton
W. Stone, um dos fundadores do movimento religioso
americano, do qual surgiram as denominações Discípulos
de Cristo e Igreja de Cristo, disse uma vez: “Nas coisas
essenciais, unidade. Nas não essenciais, liberdade. Em
todas as coisas, o amor”.

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Uma comunidade que vive a unidade 227

• Podemos orar juntos. Os documentos sobre o ecume-


nismo do Concílio Vaticano dizem muita coisa sobre a
oração em comum:
Para amar uns aos outros, como Jesus nos ensina... acontece
a mais completa expressão na oração em comum... Quando
irmãos e irmãs que não estão em perfeita comunhão uns
com os outros se juntam em oração, a oração deles é a alma
do movimento ecumênico. Esta oração é um meio muito
efetivo de petição para a graça da unidade – uma genuína
expressão dos laços que até agora ligam um ao outro. A oração
em comum dos cristãos é um convite do próprio Cristo para
que visite a comunidade daqueles que invocam o seu Nome.

Tais declarações podem ser difíceis em um ambiente


ecumênico. Católicos romanos veem isso como algo
autoritário. Os protestantes não reconhecem essa au-
toridade, e alguns até se opõem à ideia de uma forte
autoridade centralizada. Nós (católicos e protestantes)
não podemos parar de utilizar declarações das autorida-
des das nossas igrejas a fim de sermos fiéis ecumênicos,
mas devemos estar sensíveis e ser equilibrados no uso
de tais declarações.

• Podemos nos reunir e fazer coisas juntos. A Escritura


nos exorta a reunir-nos com os irmãos e irmãs. “Pois onde
houver dois ou três reunidos em meu nome, ali estarei com
eles” (Mateus 18.20). Quando nos reunimos em grupos
de apoio, as orações dos homens, as orações das mu-
lheres, as reuniões dos adultos, as reuniões dos anciãos,
os agrupamentos pastorais, as assembleias de ensino, as
reuniões das equipes de trabalho, etc., dizemos de um
modo especial: “Vem, Senhor Jesus”, e como resultado

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228 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

da nossa natureza ecumênica quando nos reunimos,


dizemos: “Vem, Jesus, edificar a unidade entre nós; vem
construir a unidade na tua Igreja inteira”. Quando nos
reunimos, nossa estrutura ecumênica como comunida-
de, em si, é a oração, a oração que pede que Jesus cure
a divisão e termine a obra que ele começou em nós.

• Podemos trabalhar para ser sensíveis no modo como


falamos em áreas em que temos diferenças. Podemos
trabalhar duro para não nos ofender quando alguém
falar de um jeito que não é muito sensível segundo a
nossa perspectiva denominacional. Quando falamos
“da Igreja”, devemos ser claros quando é uma ou outra.
Estamos falando da nossa igreja, da nossa paróquia, da
nossa denominação ou do Corpo total de Cristo?

• Podemos viver na luz para resolver os problemas que


desafiam a nossa unidade, em vez de reprimir nossas
frustrações e deixar que elas inflamem. Podemos ser
tentados a pensar que levantar problemas é trabalhar
contra a unidade. Na verdade, se os problemas que têm
a ver com a nossa natureza ecumênica são trazidos à tona
da maneira certa e com o coração certo, e se eles são
respondidos do modo certo e com o coração correto, a
unidade é destacada. Diz 1 João 1.7: “Se andarmos na
luz como ele está na luz, temos comunhão uns com os
outros”, e Efésios 5.13: “Mas tudo o que é exposto à
luz se torna visível”.

• Verdade é verdade, não importa de onde venha.


Podemos fazer um esforço para aprender sobre as
crenças e práticas de outras denominações e receber
delas. Precisamos aumentar nosso conhecimento sobre

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Uma comunidade que vive a unidade 229

as doutrinas da nossa própria igreja, aprender sobre


a fé e as práticas específicas de outras denominações
representadas na Aleluia, e isso produz frutos extras
na nossa vida:
»» tornamo-nos mais capazes de evitar ofender um
irmão ou irmã quando entendemos mais sobre a
tradição religiosa ou o conjunto de crenças do qual
outros irmãos e irmãs são provenientes;
»» tornamo-nos mais capazes de evitar ofender um
irmão de outra crença quando conhecemos as áre-
as de extrema diferença entre as tradições e temos
consciência das áreas que podem ter uma forte carga
emocional;
»» à medida que compartilhamos nossa fé com pessoas
de outras tradições, não precisamos começar justa-
mente por aquelas áreas em que as maiores diferenças
existem. Algumas verdades são mais importantes do
que outras. (As crenças de que Jesus morreu em uma
cruz e ressuscitou dos mortos pelos nossos pecados
são mais importantes para a nossa unidade do que
se os católicos e protestantes compartilham a mesma
tradução da Bíblia, ou se a Terra foi criada em
sete dias de 24 horas). Uma diretriz para isso seria
começar a compartilhar áreas em que temos algum
terreno comum. À medida que o relacionamento e
a confiança aumentam, podemos começar a lidar
com áreas nas quais podemos ver coisas de modos
diferentes (grifos nossos).
• Podemos reservar práticas devocionais específicas das
nossas tradições eclesiásticas para ocasiões em que estamos
com pessoas da nossa própria tradição. Por exemplo, não

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230 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

deveríamos rezar o terço em uma reunião ecumênica de


grupos de apoio, nem deveríamos realizar um estudo
bíblico que exija que todos utilizem a versão King James,
Almeida, etc.
• Se o grupo ecumênico tiver um subgrupo grande de
uma tradição e subgrupos menores de outras tradições,
o subgrupo maior poderá e deverá buscar diligentemente
manter suas tradições, suas terminologias, seu estilo pecu-
liar da comunidade (falaremos mais sobre isso no tópico
“Cortesia ecumênica”).
• Podemos utilizar a Bíblia frequentemente. A autoridade
das Escrituras é uma regra de fé importante tanto para
os católicos quanto para os protestantes. Uma das coisas
mais empolgantes experimentadas depois do batismo no
Espírito Santo é uma fome intensa de ler a Palavra de Deus
e aplicá-la à própria vida. Compartilhar a aplicação à vida
das Escrituras é uma das atividades mais empolgantes e
benéficas da vida comunitária.
Hoje em dia, é claro, nenhuma tradução da Bíblia é
oficialmente aceita por todos os católicos e protestantes,
tampouco há um acordo pleno a respeito de que livros
são aceitos no cânone. As traduções aprovadas por ambas
as confissões de fé variam desde as extremamente literais
(Vulgata e Interlinear Grego) até as paráfrases (Bíblia Viva e
Good News Bible). As traduções mais utilizadas na Aleluia
(Bíblia de Jerusalém e Nova Bíblia Católica Americana,
Nova Versão Internacional, Versão Protestante Padrão
Revisada) vão das literais até as paráfrases.
A nossa abordagem na Aleluia tem sido permitir que aque-
les que estão falando, ensinando ou escrevendo utilizem a
tradução com a qual se sintam mais confortáveis. Os que

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Uma comunidade que vive a unidade 231

ouvem são estimulados a trazer o próprio exemplar da


Bíblia para acompanhar a leitura; ou anotar a referência
das Escrituras e consultá-la mais tarde em suas traduções
favoritas. Por ser muito importante e levar uma grande
carga emocional com relação às Escrituras, esta é uma área
na qual devem ser exercitados muito amor e tolerância.
• Podemos esperar que nossos irmãos e irmãs em Cristo
estejam agindo com boa consciência quando tomam
decisões que temos dificuldade para entender – quando
indivíduos trocam de denominações em uma comunida-
de multidenominacional, por exemplo, sua decisão pode
ter muito impacto. Pode ser particularmente difícil se a
mudança for de católico para protestante ou de protes-
tante para católico. Podemos andar em comunhão com
pessoas que tomam decisões que cremos estar erradas,
desde que as decisões tenham sido tomadas com boa
consciência. Os líderes da comunidade deveriam agir
como um tipo de “amigo da consciência”, ajudando o
indivíduo, membro da comunidade, a formar e ser fiel
à sua própria consciência.
»» O “cabeça” do relacionamento de liderança da
comunidade, relativo a cuidado e prestação de
contas, deve sentir-se livre para compartilhar suas
convicções pessoais. Porém, ao fazê-lo, deve ser
muito cuidadoso para não interferir no direito de
escolha da pessoa. Deve encorajar o indivíduo a
buscar conselho dos obreiros da sua denominação
atual, dos obreiros da denominação à qual está
pensando filiar-se e dos amigos em que confia.
No final do processo de discernimento, os líderes
da comunidade devem ser capazes de garantir que
os membros que labutam com a decisão de um

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232 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

indivíduo em particular de mudar de denomi-


nação descansem no fato de que ele tomou uma
decisão em boa consciência, com liberdade e fé.
»» Em uma comunidade ecumênica, não é bom buscar
convertidos de outras denominações. Todos nós es-
tamos livres para compartilhar de forma apropriada
aquilo em que cremos. Assim, quando outros que
estejam buscando a verdade nos pedirem ajuda
para encontrar o que buscam, não precisaremos
ficar na defensiva sobre compartilhar um ponto
de vista da denominação. Afinal, nosso propósito
primário não pode ser trazer unidade por meio
de persuasão de todos os demais filiados à nossa
tradição. Temos de considerar toda a amplitude da
questão da unidade. “Se o Senhor não edificar a
casa, em vão trabalham os trabalhadores” (Salmos
127.1) Os católicos receberam claras instruções so-
bre o parágrafo 4 do Decreto sobre o Ecumenismo,
que declara: “Entretanto, é evidente que quando
os indivíduos desejam comunhão católica plena,
a preparação e a reconciliação deles são uma ação
que, em sua natureza, é distinta da ação ecumênica.
Porém, não há oposição entre ambas, uma vez que
ambas procedem dos caminhos maravilhosos de
Deus”. Conforme o bispo Raymond Lessard, um
bispo aposentado da diocese de Savannah, disse à
nossa Comunidade Católica Aleluia em 2001, en-
quanto se referia ao ecumenismo: “Algo muitíssimo
importante é parar de tentar converter a outra parte.
Este não é o propósito do ecumenismo. Você tem de
ser convertido! Este é o convite do Espírito Santo!”
(grifos nossos).

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Uma comunidade que vive a unidade 233

Cortesia ecumênica (unidade do Espírito no vínculo


da paz)
Um dos elementos críticos para viver em paz e unidade com
os outros na comunidade ecumênica é o princípio da “cortesia
ecumênica” – o modo de expressar as palavras e a maneira de
se relacionar com os demais grupos, pois todos pertencem
a todos, não somente aos membros de uma tradição ecle-
siástica. Não se podem fazer coisas que somente as pessoas
de uma igreja aceitariam e entenderiam. Por exemplo, seus
líderes citam:

Seria insensível para um católico pôr-se em pé, pegar um microfone


em uma reunião ecumênica e pedir que todos rezem uma “Ave-
-Maria” quando formos orar para a cura de alguém. Fazer isso,
sabendo que os protestantes estão na reunião, seria desconfortável,
pois seria insensível e não inclusivo. Uma melhor maneira de lidar
com isto seria conduzir o povo a “orar no Espírito” para a pessoa que
necessita da cura. Do mesmo modo, provavelmente seria totalmente
insensível da parte dos evangélicos levantar-se em uma reunião de
oração e dizer: “Somente as Escrituras nos dão a revelação de Deus
sobre o que o cristianismo realmente é”. Uma melhor maneira de
expressar isso seria dizer: “As Escrituras dizem assim e assim, por-
tanto, devemos fazer isso”.

Em outras palavras, se devemos ser corteses nas reuniões das nossas


comunidades, temos de nos relacionar de modo a reconhecer que
o grupo pertence a todos os que estão presentes e não somente aos
da nossa denominação ou da nossa tradição. Isto não significa que
precisamos esconder nossa identidade e nossas convicções. Mas
significa, de fato, que precisamos expressá-las com cuidado, de uma
maneira cortês, do mesmo modo como expressaríamos o cristianismo
no nossos ambientes de trabalho.

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234 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

Há ainda um traço importante para a cortesia ecumênica que


eles chamam de “cortesia minoritária”:
Se quisermos que o ecumenismo prospere, precisaremos desejar
algum tipo de equilíbrio. As maiorias dominantes costumam ser in-
sensíveis às demais. Frequentemente, os católicos tendem a presumir
muita coisa. É muito fácil ficar falando sobre os bispos católicos, os
párocos católicos ou a “Igreja” e querer dizer Igreja Católica, como se
os outros cristãos não pertencessem à Igreja. A maioria dominante
precisa se curvar para mostrar que o grupo é formado por todos os
presentes. Se a maioria não for humilde, rapidamente ela se tornará
opressora. Por outro lado, os que são minoria precisam evitar ficar
ofendidos. Pode parecer que a maioria dominante esteja deliberada-
mente ignorando a minoria. Não costuma ser algo deliberado, nem
uma questão de preconceito. É simplesmente ser insensível se você
está na maioria dominante (grifos nossos).

Há ocasiões em que a minoria, segundo seus líderes, precisa


apontar pessoalmente a falta de sensibilidade. Simplesmente deixar
as ofensas para lá ou deixá-las inflamar-se poderá dar lugar a um
solo fértil para que a amargura crie raízes. Isso é bem verdade com
relação às crianças. As crianças não têm maturidade para evitar
ofender umas as outras. Quando elas fazem isso, a situação precisa
ser abordada com amor e com respeito.

Eventos da comunidade e o compartilhamento desta


unidade com outros
Claro que problemas surgem. Por isso, é importante ter docu-
mentos escritos, conselhos, etc. Para resolver conflitos, os irmãos
têm várias diretrizes:
Nossa Aliança, Regra de Vida e Documentos de Fundamento são
escritos de modo a ser inclusivos tanto para católicos, como para

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Uma comunidade que vive a unidade 235

protestantes. Nossos Ensinos de Formação também são inclusivos


para ambos. Quando as diferenças doutrinárias entram em cena,
compartilhamos essas diferenças abertamente e com respeito. A
comunidade tem um “Conselho Ecumênico” constituído prima-
riamente de clérigos católicos ordenados e de protestantes do
clero, que se reúnem mensalmente. É uma grande oportunidade
para discutir e para trabalhar juntos pela unidade dentro da comuni-
dade, assim como para dialogar, com respeito, sobre as nossas várias
tradições e doutrinas eclesiásticas.

Também, durante todo o ano letivo, a Comunidade Aleluia recebe as


reuniões/almoços mensais do clero da Aleluia e de clérigos de outras
áreas. Este grupo, chamado de “Aliança dos Pastores da Augusta
do Sul” (SAPA), tem feito muita coisa para fomentar a unidade e a
colaboração nos eventos ecumênicos. Estes eventos incluem sediar o
culto do Dia Nacional de Oração, de Augusta, em maio, patrocinar
uma grande caminhada todos os anos na Sexta-Feira Santa (isto
inclui centenas de pessoas de muitas igrejas, que apoiam as cam-
panhas e obras antiaborto e que conduzem iniciativas educativas
que dão instruções aos clérigos e aos conselheiros sobre a agenda
radical homossexual). E a lista continua...

Pelo fato de a Comunidade Aleluia ser ecumênica desde o começo,


os números de conferências ecumênicas, de reuniões de oração e
de eventos que patrocinamos não podem ser enumerados. Devido
à nossa natureza ecumênica, tivemos a oportunidade de influenciar
muitas igrejas católicas e protestantes com relação à renovação”
(grifos nossos).

Católicos e protestantes na Aleluia têm sido abençoados por


poder evangelizar juntos, especialmente por meio do Seminário
Vida no Espírito. As divisões que existem entre os cristãos são,
sem dúvida, o maior obstáculo para a pregação bem-sucedida
do Evangelho. Porém, as ações realizadas para vencê-lo estão

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236 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

exercendo um papel importante para compensar o escândalo


e dar credibilidade aos cristãos que proclamam que Cristo é
aquele em quem todas as coisas e pessoas estão reunidas em
unidade. Como evangelizadores, devem oferecer a fé de Cristo
e não a imagem de um povo dividido e separado por brigas que
não edificam, mas a imagem de um povo maduro na fé e capaz
de encontrar um ponto de encontro além das tensões reais,
graças a uma busca compartilhada, sincera e desinteressada da
verdade. Sim, o destino da evangelização está certamente ligado
ao testemunho de unidade dado pela Igreja. Esta é a fonte de
responsabilidade e também de conforto.
Existe uma ênfase em como passar um legado para as novas
gerações. São cuidados denominacionais para manter os princípios
que norteiam a comunidade:

Nós, que vivemos em um ambiente ecumênico, enfrentamos um


dilema que deve ser resolvido se quisermos alinhavar a fé que resta
às nossas tradições denominacionais, de uma maneira que guarde e
proteja a obra de unidade que Deus está fazendo na Comunidade
Aleluia. Devemos encontrar maneiras de praticar, de fomentar e de
transmitir para os nossos filhos o patrimônio particular da nossa
denominação, assim como o nosso modo de vida, enquanto mante-
mos o testemunho profético da nossa unidade multidenominacional.
Alguns desses processos acontecem nas famílias; alguns, nas igrejas
às quais as famílias da Aleluia pertencem.

Temos descoberto que há necessidade de encontrar um modo de


passar esses elementos para frente também dentro da experiência
da comunidade. Para fazer isso, temos desenvolvido agrupamentos
na comunidade que ajudam a fomentar elementos da vida cristã
específicos aos membros de um subagrupamento (isto é, católico
ou protestante), ou denominação.

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Uma comunidade que vive a unidade 237

Alguns pensamentos conclusivos


Uma grande Conferência Carismática Nacional foi realizada na
cidade do Kansas em 1977. Ela encheu o estádio de futebol ame-
ricano da cidade. Milhares participaram. Nesta conferência, Deus
falou sobre um mover profético, isto é: “Chorai e pranteai pelo
Corpo do meu Filho que está quebrado!”.

Cada um de nós pode ver a forma da unidade e o meio de atingi-


-lo de modo diferente. Porém, nenhum de nós pode se sentar
passivamente e não desejar a obra da unidade pela qual Jesus
orou em João 17.

João Paulo II nos lembrou da correlação entre ser unificado e ser


agente efetivo de Jesus em um mundo desviado quando disse:
“Cristo chama a todos os seus discípulos para a unidade. Os crentes
em Cristo, unidos para seguir as pegadas dos mártires, não podem
permanecer divididos. Se eles quiserem verdadeiramente e de
modo efetivo se opor às tendências do mundo para reduzir a falta
de poder do mistério da redenção, eles deverão professar juntos a
mesma verdade sobre a Cruz”.

A unidade é um elemento essencial da vida cristã. Qualquer pessoa


que deseje viver plenamente para Jesus deverá compartilhar Sua
fome de unidade entre Seu povo.

Nós, na Aleluia, cremos que o Espírito Santo está fazendo


algo poderoso neste dia para juntar os cristãos em unidade de
todas as linhas teológicas. Também sabemos que esta unida-
de é representada de forma concreta na mesa do Senhor. Os
católicos são chamados para permanecer fiéis à disciplina da
igreja neste ponto da história, incapazes ainda de partilhar da
mesa do Senhor com seus irmãos e irmãs protestantes. Oramos
ferventemente pelo dia em que poderemos partilhar juntos
da mesa do Senhor.

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238 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

Se, como Agostinho disse, o sinal da presença do Espírito Santo


é “o amor da unidade,” precisamos dizer que o Espírito Santo está
trabalhando hoje, sobretudo onde podemos encontrar um entusias-
mo vívido pela unidade cristã, onde o povo trabalha para ela e onde
está desejoso de sofrer para obtê-la.

O cardeal Walter Kasper, ex-líder do Concílio Pontifico do Vaticano


para a Promoção da Unidade Cristã, é outro profeta da unidade. Em
seu livro,127 ele declara:

“Um dia o dom da unidade nos pegará de surpresa, igual a um evento


que testemunhamos há apenas dez anos. Se você perguntasse aos
transeuntes na Berlim Ocidental na manhã de 9 de novembro
de 1989: ‘Quanto tempo mais você acha que a parede ficará de
pé?’, a maioria com certeza iria responder: ‘Ficaríamos contentes
se nossos netos pudessem passar pelo Portão de Brandenburg al-
gum dia’. Ó noite memorável em que o mundo viu algo totalmente
inesperado em Berlim! É minha firme convicção que um dia nós
também esfregaremos os olhos maravilhados porque o Espírito de
Deus quebrou as paredes aparentemente intransponíveis que nos
dividem, e nos dará as boas-novas por meio de cada um de nós para
uma nova comunhão. Tomara que não tenhamos de esperar outros
400 anos” (grifos nossos).

Abordagem multidenominacional
Aqui estão alguns outros pensamentos sobre as bases da abordagem
multidenominacional da Comunidade Aleluia:

1. Somos ecumênicos porque cremos que Deus nos chamou


para sermos ecumênicos. Portanto, nós fazemos o que faze-
mos por convicção, não por conveniência – ou até mesmo
por preferência. Não podemos decidir ignorar isso, uma
127
KASPER, Walter. Que Todos Sejam Um. Ibid.

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Uma comunidade que vive a unidade 239

vez que é algo que integra o nosso chamado para sermos


juntos, uma comunidade. Ser ecumênico é um elemento
que define o nosso viver. É difícil, mas as dificuldades não
nos detêm.
2. Cremos que nosso chamado para a unidade está fundado
na autoridade das Escrituras e nas antigas tradições da
Igreja; ele é afirmado pelas denominações protestantes e
é afirmado pela autoridade eclesiástica católica romana,
conforme expresso nos documentos do Vaticano II.
3. Cremos que há necessidade (por causa da ruptura no
Corpo de Cristo) de que a Igreja mude – e, de fato, ela
irá mudar. Não temos o quadro final de como as coisas
ficarão, mas cremos firmemente que o status quo não
continuará para sempre.
4. Nossa abordagem é fundamentada no princípio e no
acordo de que aceitamos o batismo uns dos outros. Cremos
que a ruptura pode ser reparada.
5. Juntamo-nos como irmãos e irmãs de Jesus. Cremos que
nos juntamos como membros da família de Deus e que,
na verdade, estamos relacionados com base nisso.
6. Cremos que nossa abordagem é fundamentada na verda-
de. É parte do plano de Deus para a sua Igreja. É o jeito
dele. Cremos que Deus coloca em cada indivíduo uma
fome da realidade da solidariedade em Cristo.
7. Nossa abordagem é de proteção. Ela protege os seguintes
conceitos e crenças:

• Aceitamos uns aos outros com boa consciência.


Confiamos uns nos outros em fidelidade.

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240 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

• Não somos ordenados a aceitar as doutrinas e dogmas


uns dos outros, mas, de fato concordamos em respei-
tar a consciência daqueles cuja doutrina e dogmas
diferem dos nossos.
• Concordamos em encorajar cada pessoa a que viva
fielmente o que professa. Há muitas questões especí-
ficas nisso para nós.
• Concordamos em ser sensíveis e a amar uns aos outros.
Isto requer conhecimento de questões.
• Concordamos em estar abertos na nossa comunicação,
buscando a verdade objetiva e a unidade. Para isso
não estamos fechados, não somos polêmicos nem nos
opomos.
• Concordamos em ser submissos às nossas autoridades
eclesiásticas e denominacionais.
• Cremos que devemos convidar uns aos outros e os
nossos filhos para que vivamos a aliança, especifica-
mente nesta questão.
• Cremos que a liderança da comunidade é responsável
por liderar, ensinar e supervisionar esta questão.
• Concordamos em pedir aos que têm autoridade sobre
nós, em nossas comunidades, que trabalhem pela
unidade.
• Cremos que essa abordagem de fidelidade e submissão
à igreja e às autoridades denominacionais é o cami-
nho mais rápido para a unidade final.
• Concordamos em promover, ativamente, a conscien-
tização do andamento desta questão.

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Uma comunidade que vive a unidade 241

• Concordamos em eliminar as contendas e as críticas


em nosso meio.
• Concordamos em dar suporte ao progresso ecumênico
iniciado pela autoridade da igreja.
• Concordamos em olhar para frente, não para trás;
não para o presente, e não para o status quo.
• Concordamos que todos os cristãos são chamados para
trabalhar para o avanço do Evangelho.
• Temos o direito, como cristãos, de nos juntar em uma
missão e de focar o uso dos nossos dons no propósito
de fazer avançar a causa da unidade.
• Cremos que os leigos são membros plenos da comuni-
dade e que são chamados para evangelizar e edificar
a igreja. Nisso, somos chamados para trabalhar com
a igreja local e com as autoridades denominacionais.
Como parte dessas estruturas, temos o direito e a
obrigação de falar aquilo em que cremos para aqueles
que possuem a autoridade certa.

Aliança na comunidade
Virgínia Norton, participante desta comunidade, moradora e
membro pleno da Vila da Fé, descreve a aliança na comunidade:
Jesus é o nosso Senhor!

O Senhor nos chamou para fazer uma aliança solene com ele e uns
com os outros a fim de sermos um povo que louva. Aceitamos o
senhorio de Jesus em nossa vida individualmente e como um povo.
Ele destruiu nosso isolamento e nos juntou.

Comprometemo-nos a nos subordinar totalmente às nossas alianças

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242 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

primárias relativas ao casamento, ao celibato e à igreja, como irmãos


e irmãs no Senhor, confiando nossa vida a ele e uns aos outros nele.

Prometemos edificar, exortar, admoestar e ouvir uns aos outros; a


sermos prontos a perdoar e a pedir perdão; a assistir uns aos outros
na busca da vontade perfeita de Deus em todas as coisas.

Em Sua santa alegria e paz, portanto, entregamos nossa vida a


Jesus; com relação a tudo referente ao passado, presente e futuro,
concordamos em:

1. amar uns aos outros como irmãos e irmãs em Cristo;

2. ser fiéis aos nossos compromissos e à oração comunitária, à


comunhão e ao serviço, sempre buscando a visão e o crescimento
para o qual o Espírito nos chamou;

3. aceitar responsabilidades para a promoção da ordem na co-


munidade;

4. fomentar o crescimento da comunidade, aceitando responsa-


bilidades para um programa de iniciação e formação cristã na
vida comunitária;

5. reconhecer a liderança dos coordenadores e concordar em


obedecer, corrigir e orar por eles;

6. aceitar nossa responsabilidade financeira com relação à comu-


nidade;

7. estar firmes nesta aliança e fortalecer uns aos outros;

Prometemos amar e encorajar uns aos outros à santidade. Cremos


que este é o caminho que Deus escolheu para a nossa santificação.
Nós, voluntariamente, pedimos que ele nos use. Consideramos isso
um compromisso solene e sério que fizemos livremente, conscien-
temente e com fé.

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Uma comunidade que vive a unidade 243

Os princípios fundamentais da Comunidade Aleluia estão


escritos em menos de 300 palavras. Eles têm moldado e susten-
tado esse povo há mais de 40 anos.

Uma primeira experiência de um grupo enviado


Em julho de 2015, pela primeira vez, enviamos um grupo de
12 pessoas (evangélicos e católicos) para passar um mês nessa
comunidade para vivenciar essa prática na chamada “Vila da Fé”.
Foram muito bem recebidos e amados por esses 700 irmãos.
Participaram das atividades diárias e experimentaram como é pos-
sível viver na unidade do Espírito no vínculo da paz. Experimen-
taram a humildade, a mansidão e o amor na sua expressão maior.
Cada irmão dessa comitiva foi recebido em uma casa. Assim,
a experiência também foi particular de cada um com uma família
em especial que vive a unidade do Espírito.
A comunidade ofereceu, além dessas experiências, por um
valor módico, a hospedagem, toda alimentação, palestras sobre a
vivência em unidade, curso de inglês, passeios e diversos eventos
que testemunharam como é possível a vida em unidade.
O grupo participou das reuniões caseiras, da reunião geral de
louvor e adoração, do Relógio de Oração (24 horas por dia) e das
reuniões denominacionais: aos finais de semana, os católicos iam às
missas (em uma das igrejas da região), e os evangélicos escolhiam
uma das denominações (são 12)128 para cultuar a Deus.
Assim, viveram a unidade na diversidade sem querer a uni-
formidade.

128
Estas igrejas estão localizadas na cidade de Augusta, Geórgia.

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Capítulo 11

O MINISTÉRIO DA RECONCILIAÇÃO:
UM DOM DE DEUS PARA TODOS

R
ECONCILIAR significa estabelecer a paz (entre pes-
soas que não estão em acordo), renovar uma amizade,
restituir a graça de Deus. Jesus Cristo é o grande
personagem da reconciliação: do homem com Deus, entre os
homens, da natureza com os céus, de todas as coisas com Deus.
Algumas passagens nos ensinam isso:
Mas Deus prova o seu amor para conosco, em que Cristo morreu por
nós, sendo nós ainda pecadores. Logo, muito mais agora, tendo sido
justificados pelo seu sangue, seremos por ele salvos da ira. Porque se
nós, sendo inimigos, fomos reconciliados com Deus pela morte de
seu Filho, muito mais, tendo sido já reconciliados, seremos salvos
pela sua vida. E não somente isto, mas também nos gloriamos em
Deus, por nosso Senhor Jesus Cristo, pelo qual agora alcançamos a
reconciliação (Romanos 5.8-11).

Porque foi do agrado do Pai que toda a plenitude nele habitasse, e


que, havendo por ele feito a paz pelo sangue da sua cruz, por meio
dele reconciliasse consigo mesmo todas as coisas, tanto as que estão
na terra, como as que estão nos céus. A vós também, que noutro

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246 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

tempo éreis estranhos, e inimigos no entendimento pelas vossas


obras más, agora, contudo, vos reconciliou no corpo da sua carne,
pela morte, para perante ele vos apresentar santos, e irrepreensíveis,
e inculpáveis... (Colossenses 1.19-22).

Somos embaixadores – nossa missão


Pela reconciliação em Cristo, nossos pecados não nos são mais
imputados. Não nos é mais atribuída culpa, não somos mais
punidos, fomos perdoados. Porém, essa missão de reconciliador
nos é passada de uma forma muito clara como um mandamento:
Ora, tudo provém de Deus, que nos reconciliou consigo mesmo por
meio de Cristo e nos deu o ministério da reconciliação, a saber,
que Deus estava em Cristo reconciliando consigo o mundo, não
imputando aos homens as suas transgressões, e nos confiou a palavra
da reconciliação. De sorte que somos embaixadores em nome de
Cristo, como se Deus exortasse por nosso intermédio. Em nome de
Cristo, pois, rogamos que vos reconcilieis com Deus (2 Coríntios
5.18-20; grifos nossos).

Bem-aventurados os pacificadores, porque eles serão chamados de


filhos de Deus (Mateus 5.9).

Note que este ministério não trata de algo como os dons que
Deus reparte com cada um como quer. Aqui é para todos. Deus
nos deu o ministério da reconciliação. Esse é um passo antes da
unidade, pois não há possibilidade de sermos um sem estarmos
reconciliados.
Ministério significa uma missão, uma função, uma “profis-
são”, uma atividade, um cargo. Significa que somos executores
da reconciliação, somos embaixadores, representantes de grau
mais elevado dos céus aqui na terra. Somos emissários, enviados,
mensageiros de Deus em Cristo Jesus no mundo onde vivemos.

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O ministério da reconciliação: um dom de Deus para todos 247

É interessante que o termo “embaixador” envolve a pala-


vra “diplomacia”, que é a arte de representar os interesses de
um país estrangeiro (o reino dos céus) em relações de paz e
conciliação.
Silas Esteves diz que:129
Nossa sociedade é marcada pela divisão. Vemos isso nos lares, nas
empresas, nos negócios, nos relacionamentos familiares, nas igrejas.
Existe uma praga que se manifesta de todas as formas para produzir
divisão e caos nas comunicações interpessoais. Entretanto, Deus
nos deu a palavra da reconciliação e precisamos sair desta postura
passiva de ficar esperando Jesus resolver todos os problemas, pois ele
já colocou essa missão, incumbência e capacitação em nossas mãos.

Igreja de Cristo, vamos sair da arquibancada, da torcida para que


Jesus volte e resolva tudo, e vamos nos posicionar e apresentar como
ministros de reconciliação para trazer solução à sociedade corrompi-
da pelo pecado. Vamos acrescentar algo mais à nossa evangelização.
Além de dizer "Jesus te ama", vamos amar as pessoas como Jesus as
ama. Sair do discurso e entrar na prática!

Sempre precisaremos achar em nosso coração reconciliação em as-


suntos irreconciliáveis. Deus não irá enviar outro reconciliador, pois
ele já o fez e nos deu essa missão. Por isso não podemos simples-
mente ficar assentados sobre os "comentários" da divisão, analisando
suas causas e problemas, mas nos posicionar como os instrumentos
da solução. Isso nos arranca da confusão de uma era da Igreja em
que havia apenas uma instituição humana que tentava substituir a
verdadeira Igreja de Cristo.

Houve uma época em que as denominações nos prendiam em


nossos "currais" e não podíamos conhecer e amar uns aos outros.

129
Anais do Encristus 2014. Solícitos em conservar a unidade no vínculo da paz.
Rio de Janeiro/RJ, 18 e 19 de outubro de 2014, pp. 33,34.

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248 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

Vamos continuar, sim, sendo fiéis aos nossos dogmas, fiéis ao que
aprendemos, fiéis às nossas congregações e àqueles que nos cobrem
e guiam em Deus, mas compreendamos que SOMOS UM! Uni-
dade não é algo futuro, mas atual! Aliás, Jesus "é o mesmo ontem,
hoje e eternamente" e ele é UM com o Pai (Hebreus 13.8). Então,
unidade é esse estado de reconciliação, perdão, amor e aceitação
constante, esta recusa em abrir minha boca para falar o mal contra
meu irmão e propagar a divisão. Todos somos partes disso, e não
somente os líderes, padres, bispos, pastores. Essa é uma "pílula"
difícil de engolir, pois quando existe um impasse tendemos a
chamar alguém para resolver, mas temos esse ministério dado por
Deus e precisamos crescer nele.

Todos temos dons e ministérios diversos dados por Deus que


não são para autopromoção, mas para o bem comum de todo o
Corpo (1 Coríntios 12). Entretanto, o dom e ministério dado de
forma comum a todos é o da reconciliação. Talvez você ainda não
reconheça alguns de seus dons específicos, mas esse é um que você
tem com certeza.

Ao falar sobre o tema “Embaixadores da Reconciliação”, Rui


Luis Rodrigues130 faz uma afirmação contundente:

Creio que, a partir de alguns trechos desse documento (carta-


-encíclica Ut unum sint, escrita pelo papa João Paulo II em maio
de 1995), vamos ser especialmente encorajados nessa missão de
embaixadores da reconciliação. Que fique patente, logo de início, que
não estaremos habilitados para falar aos homens sobre reconciliar-se
com Deus, se nós mesmos não estivermos reconciliados uns com os
outros. Sem reconciliação, profunda e completa, a missão da Igreja
é inviável e se torna mentirosa!.

Anais do Encristus 2014. Ele pôs em nossos lábios a palavra de reconciliação.


130

Cachoeira Paulista/SP, Canção Nova, 14-16 de março de 2014, p. 52.

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O ministério da reconciliação: um dom de Deus para todos 249

Missão é diferente de visão


A missão é uma incumbência, um encargo, um ofício, uma co-
missão “diplomática”, uma função nobre a se cumprir. Essa res-
ponsabilidade nos é dada pelo Espírito Santo. Portanto, trata-se de
um dever, uma tarefa, uma função que vem de Deus. Na verdade,
nós, como cristãos, devemos entendê-la como um mandamento,
uma motivação no coração colocada por Deus.
Por outro lado, podemos perguntar: como vamos desempenhar
essa tarefa? Aqui vem a “visão”, a estratégia, o como fazer, o dis-
cernimento operacional, a percepção, a previsão. Nós refletimos,
julgamos, pensamos e estabelecemos uma imagem de como isso
acontecerá E isto envolve fé. Jesus nos ensina a orar com fé e já
imaginar o resultado a ser obtido:
E Jesus, respondendo, disse-lhes: Tende fé em Deus; porque em
verdade vos digo que qualquer que disser a este monte: Ergue-te
e lança-te no mar, e não duvidar em seu coração, mas crer que se
fará aquilo que diz, tudo o que disser lhe será feito. Por isso vos
digo que todas as coisas que pedirdes, orando, crede que recebestes,
e tê-las-eis (Marcos 11.22-24).

Para receber algo pela fé, fazemos uma imagem daquilo que
queremos. Já nos enxergamos sem o problema que será removido
(o monte); já nos vemos curados, libertos, conforme o assunto
tratado com Deus em oração. Para crer que já recebemos, preci-
samos imaginar a conquista.
Hebreus 11 (que nos ensina sobre a fé) fala sobre esperar coisas
que ainda não vemos, mas que já existem segundo nossa esperança
(aquilo que pode ser visto foi feito daquilo que não se vê, mas
se espera ver). Para isso, temos de “desenhar” na nossa mente o
desejado. Saindo um pouco do campo espiritual, temos alguns
exemplos de visão fartamente citados nas literaturas.

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250 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

Quando, em outubro de 1971, foi inaugurada a Dis-


neyworld em Orlando, Flórida, Walt Disney, considerado um
dos maiores “engenheiros da imaginação”, já tinha morrido
havia cinco anos. Após o irmão dele, Roy Disney, ter cor-
tado a fita de inauguração, alguém disse que era uma pena
Disney não estar lá para ver tudo aquilo. “Ele viu tudo isso, e
é por isso que você pode ver hoje”, respondeu Roy. Em outras
palavras, aquilo que não se vê não foi feito do que é visível
(Hebreus 11.3).
Kris Vallotton131, ao lembrar o que Michelangelo disse
em relação ao anjo esculpido (“Vi o anjo no mármore e o
esculpi para libertá-lo”), afirma que, com os olhos naturais,
ele viu uma rocha, mas, com a imaginação, enxergou um anjo
aprisionado numa pedra. Assim, ele conclui que, quando
imaginamos alguma coisa na mente, ocorre um fenômeno
no espírito que nos leva a querer ver com os olhos naturais
aquilo que sentimos no coração. Quando as pessoas visua-
lizam algo (principalmente algo vindo de Deus, como, por
exemplo, João 17,21-23), isto cria um ímpeto sobrenatural
para agarrar a visão e vê-la cumprida, construída, fundada,
ou seja, realizada.
Será que podemos imaginar, para o cumprimento da ora-
ção de Jesus (o que certamente acontecerá mediante a obra
do Espírito Santo), cristãos nascidos de novo – ortodoxos,
católicos, adventistas, congregacionais, anglicanos, evangé-
licos, neopentecostais, etc. – assentados à mesma mesa em
comunhão, tomando a ceia do Senhor? Claro que sim.
Não havendo profecia (visão), o povo perece; porém o que guarda
a lei, esse é bem-aventurado (Provérbios 29.18).

VALLOTTON, Kris. Chuva Abundante – Como podemos transformar o mundo


131

que nos cerca. Ibid.

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O ministério da reconciliação: um dom de Deus para todos 251

Em outras versões, o texto é traduzido assim: “Onde não há


revelação divina, o povo se desvia”. É como se disséssemos que
as pessoas que não têm visão vivem sem rumo. Mas, quando as
pessoas têm uma visão, elas “guardam a lei”, ou seja, refreiam
as escolhas para não perder a visão. Segundo Kris Vallotton (no
mesmo livro), a visão fortalece nossas energias, capacita-nos a
dizer “não” para certas coisas e “sim” para outras. Também nos
dá coragem de suportar dificuldades no caminho para chegar ao
nosso destino.
Visão é ter um propósito. Se Deus já nos falou que temos
unidade no Espírito, que somos UM só Corpo, que temos um
só Senhor, imaginemos isso, pratiquemos isso, ainda que seja em
dose homeopática ou um trabalho de abelha (polinização) ou
de formiguinha. Olhemos a unidade de forma pacífica (vínculo
da paz), longânime, humilde, em amor a outros irmãos. Assim,
nossa missão de reconciliação começará a ser vivida, ainda que
seja visualizando modestos resultados, mas realizando a vocação
para que fomos chamados (Efésios 4.1-5).

Ainda sobre visão


No nosso livro Reconciliação: O Segundo Toque132, discor-
remos sobre visão. Falamos que a palavra “visão” tem um
enorme significado no serviço do Senhor. A visão é o que
nos dá o incentivo espiritual. É aquilo que nos mantém
unidos ao Senhor, dando-nos um sentido de propósito e
destino. Sem visão, nós nos desintegramos. Sem um destino
nos tornamos indisciplinados. A visão une. A falta de visão
produz divisão.
A visão é aquilo que leva o povo de Deus a uma unidade co-
esiva. Tem um poder fortalecedor, emancipador e sustentador.
132
MARION, José Carlos e Márcia. Reconciliação: O Segundo Toque. Ibid.

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252 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

Sem visão, somos despedaçados e esparramados sem nenhum


controle. Ver o propósito eterno de Deus nos provê uma
visão que nos governa. Lamentavelmente, muitos cristãos
não são capazes de perceber a visão de Deus e o interesse do
Senhor. Em lugar disso, frequentemente medem o interesse
de Deus em função dos próprios interesses. O resultado é
que muitos dos filhos de Deus carecem de incentivo espiri-
tual, não percebem o sentido do propósito eterno de Deus
na sua obra e se encontram divididos com respeito aos seus
objetivos.
Deus deseja revelar-nos sua intenção com o objetivo de nos
tirar de nós mesmos de tal maneira que seu coração e seu interesse
possam tornar-se nosso coração e nosso interesse.
Jessie Penn-Lewis133 escreveu:
A alma sempre quer ter uma visão celestial que a separa das coisas
terrenas. Os olhos do coração devem ser iluminados para conhecer
a esperança de seu chamamento. Quanto mais clara for a visão,
mais nos abandonaremos ao Espírito Santo, para que ele alcance o
seu intento, e mais intensa será a sede de Deus – uma fornalha de
desejo intenso que há de ser criada pelo mesmo Espírito eterno, o
que é a suprema condição para se conhecer a Deus.

De acordo com a Bíblia, a visão sempre precede a construção. A


revelação sempre precede a obra. Temos de prestar especial atenção
a esse princípio espiritual e essencial. Podemos ver o que Deus quer
que construamos para ele? No entanto, antes de construir, temos
de ver com clareza o que será o edifício. Moisés precisou ver a
arquitetura do Tabernáculo antes de estar pronto para construí-lo.
Foram precisos 40 dias na Montanha Sagrada de Deus para que ele
recebesse por revelação o traçado do Tabernáculo.
133
PENN-LEWIS, Jessie. Guerra contra os Santos. Monte Mor/SP: Editora dos
Clássicos, 2001. (Escritora e conferencista cristã do Reino Unido – 1861-1927).

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O ministério da reconciliação: um dom de Deus para todos 253

Da mesma maneira, o rei Davi teve primeiro de receber a visão


da Casa de Deus antes que seu filho Salomão pudesse mais tarde
construí-la.

De acordo com o mesmo princípio espiritual, antes que o após-


tolo Paulo se convertesse em sábio mestre construtor, primeiro
teve de ter a visão celestial do Senhor Jesus Cristo e seu Corpo.
“Pelo que, ó rei Agripa, não fui desobediente à visão celestial”
(Atos 26.19).

De igual maneira, antes que possamos construir de acordo


com a forma de pensar de Deus, temos primeiro que ter uma
revelação do padrão Divino.

O propósito eterno de Deus é a visão transcendental, o padrão


que Deus tem dado ao homem para que possa construir para ele,
viver para ele e satisfazê-lo. Desta maneira, o grau de utilidade
que podemos ter para ele é, de grande maneira, determinado,
no tanto que somos capazes de ver ou não a última meta divina.

Uma infinidade de cristãos trabalha e constrói, mas desconhece


o objetivo de seu trabalho. Apesar de que podem ter visto par-
cialmente algumas das metas de Deus, têm errado em conhecer
o produto terminado. Como resultado disso, os trabalhos e
esforços têm-se tornado insuficientes para alcançar o que é
mais anelado pelo coração do Senhor. Que Deus nos revele a
sua visão para que possamos fervorosamente dedicar-nos à sua
construção (grifos nossos)

Ingredientes para o estabelecimento da visão


A Igreja Primitiva, criada no ano 33 d.C. pelo Espírito Santo
começa perfeita, até a queda de Jerusalém (ano 70), como po-
demos ver a partir de Atos 2.42. Porém, logo após seu início,
como observamos em 1 Coríntios 1.10 em diante, ela passa a

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254 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

ser alvo de divisões. Assim, a oração de Jesus em João 17 era


também em favor da igreja do primeiro século. E assim ela vem
se comportando até os nossos dias, com sucessivas divisões.
Por outro lado, segundo Daniel Juster134, a igreja antes da
queda de Jerusalém nos legou aspectos-chaves que certamente
nos enriquecem para participarmos do cumprimento da oração
de Jesus de João 17 e os ensinos de Paulo em Efésios 4. São,
pelo menos, quatro chaves que podem também nos ajudar no
estabelecimento da visão para a unidade.

1. Havia em cada cidade uma igreja unida.


No livro de Apocalipse, vemos isso com clareza quando as
cartas são enviadas às igrejas de Éfeso, Esmirna, Tiatira, Sar-
des, Filadélfia e Laodiceia. Ao contrário dos escritores atuais,
os apóstolos advertiam insistentemente contra a divisão e a
discórdia. Podemos ter a visão de uma igreja unida (unidade
no Espírito) em nossa cidade?

2. Esta igreja estava em contato (ligada) com as raízes judaicas.


Os apóstolos eram judeus. Portanto, os valores bíblicos
judaicos foram conservados (Romanos 3.1 em diante). Com a
queda (e repúdio) de Jerusalém135, com o declínio dos dons do
Espírito Santo derramados em Pentecostes, com a influência
da cultura helênica (grega) e romana (ocidental), as novas
lideranças gentílicas se afastaram gradativamente das raízes
judaicas. Podemos ter uma visão que considera a relevância
do Velho Testamento e o papel que o povo de Israel ainda
possui como parte do Corpo de Cristo?
134
JUSTER, Daniel C. That They May Be One. Clarksville, Maryland, USA:
Lederes Books: A Division of Messianic Jewish Publishers. 2009.
135
Com a dispersão de Israel, que volta para a terra prometida como nação
somente em 1948.

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O ministério da reconciliação: um dom de Deus para todos 255

3. A igreja estava familiarizada com os dons sobrenaturais do


Espírito Santo.
Era uma vivência constante com o poder do Espírito. Paulo,
em suas cartas, orientava a maneira como os dons do Espírito
deveriam ser praticados. É certo que, no início do século 20,
ainda que de forma pouco organizada, essa familiarização foi
retomada. Podemos ter a visão dos dons fluindo na liberdade
do Espírito em nossas reuniões e com os irmãos de outras
denominações cristãs?

4. A igreja do primeiro século enfatizava o governo plural na base


do ministério quíntuplo.
Os apóstolos, profetas, evangelistas, pastores e mestres eram a
liderança padrão para a Igreja. Podemos ter a visão de líderes da
nossa cidade se reunindo para orar, viver a Palavra e abençoar a
igreja da nossa cidade?
Ainda que estejamos distantes da unidade da fé, alguns aspectos
destas chaves da igreja antes da queda de Jerusalém poderão (ou
deverão) fazer parte da nossa visão.

Estabelecendo a visão
O que acontecerá em nossas esferas de influência na sociedade
em que vivemos se, em vez de promovermos ou fomentarmos
divisões e barreiras, vivermos plenamente um estilo de vida de
reconciliadores? Certamente a comunicação começará a mudar
dentro da nossa casa, do nosso trabalho, da nossa comunidade,
da nossa cidade.
O que acontecerá com a Igreja de Cristo, em consonância
com a oração de Jesus em João 17.21-23, se olharmos para a
igreja discernindo o Corpo de Cristo? Jesus não dá opção se

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256 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

queremos ou não viver em unidade com nossos irmãos. Não


havendo unidade ainda, a reconciliação é o caminho.
Como vimos, antes da sua morte, Jesus orou para o Pai con-
ceder uma igreja unida “para que o mundo creia”. Parece-nos
que a unidade é a visão central para almejarmos a Casa eterna.
E isto nós podemos fazer. Certamente precisamos passar pela
condição de “pedras vivas lavradas”. Precisamos passar como
trigos moídos para ser um só pão, ou como uvas esmagadas para
tornar-nos um vinho delicioso. Porém, isto é bom, pois daí sairá
a beleza da Noiva. Que tal orarmos assim?
Senhor, eu assumo o meu ministério de reconciliador no Corpo de
Cristo para a minha geração! Meu desejo é ser uma geração curada!
Meu desejo é que haja uma revelação diária em cada um de nós que
temos a palavra da reconciliação dada pelo próprio Deus. Jesus veio
para isso, viveu dessa forma e deixou esse “manto” para cada um que
ele reconciliou com o Pai. Para tanto, Senhor, ajuda-me a praticar
este propósito; ajuda-me a ter a visão correta. Eu creio na unidade
da família bendita de Deus.

Jesus nos ensinou a orar “venha o teu reino” (Mateus 6.10a).


Será que esse reino está vindo, está surgindo e crescendo cada
vez mais na minha vida e na vida do meu irmão? Se alguém
entrar em nosso meio, numa reunião de louvor e adoração,
não conseguirá mais discernir quem é evangélico e quem
é católico, à qual congregação ou denominação pertence,
porque, na unidade do Espírito, todos nós amamos uns aos
outros e temos um único Senhor. E, mais do que isso, somos
UM e temos como missão gerar a vida de Cristo no coração
uns dos outros.
Jesus disse a Pedro: "Simão, Simão, eis que Satanás vos re-
clamou para vos peneirar como trigo! Eu, porém, roguei por ti,
para que a tua fé não desfaleça; tu, pois, quando te converteres,

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O ministério da reconciliação: um dom de Deus para todos 257

fortalece os teus irmãos" (Lucas 22.31,32). O Senhor está nos


ensinando que não há nada que passamos na vida que não seja
para ministrar a outros e fortalecê-los.
Todas as situações difíceis que vivemos sempre têm e sempre
tiveram o propósito de criar em nós respostas para outros. Nin-
guém é resposta para si mesmo. O próprio Jesus não veio para si
mesmo nem enviou ministérios de reconciliação como resposta
para eles mesmos. Na unidade, estamos constantemente vivendo
essa realidade, ministrando uns aos outros.
Na sequência da oração que Jesus nos ensinou (Mateus 6.10b),
ele diz: “seja feita a tua vontade, assim na terra como no céu”. No
céu não há divisão. A única divisão que houve foi desfeita por Deus
expulsando Lúcifer e seus seguidores. Em Apocalipse 4 e 5 (dentre
outras passagens bíblicas), podemos ver a perfeita unidade no céu.
Na oração do Pai Nosso, fica claro que a vontade de Deus
plenamente realizada no céu também é para ser realizada na terra,
nos nossos dias, na nossa geração. Deus quer que seu reino aqui
na terra seja como é no céu. Podemos ter a visão deste reino de
Deus aqui na terra como um só Corpo? Claro que sim. O Espírito
Santo está conosco para atingirmos essa vontade de Deus.
Podemos nos esforçar para manter a unidade do Espírito, em
paz, e contemplar a Igreja como um só Corpo, um só Espírito,
uma só esperança, um só Senhor, uma só fé, um só batismo, um
só Deus, Pai de todos os cristãos, o qual é sobre todos e por todos
e em todos (Efésios 4.3,6)? Claro que sim. A Palavra de Deus diz
que esta é a nossa vocação, que fomos chamados nesta esperança.
O Espírito Santo está em nós para alcançar esta vocação.
Podemos nos enxergar, embora sendo muitos, como um só
pão, um só Corpo, porque todos participamos de um mesmo
pão (1 Coríntios 10.17)? Claro que sim! “Porventura o cálice da

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258 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

bênção que abençoamos, não é a comunhão do corpo de Cristo?”


(1 Coríntios 10.16). Nesta linha, passamos a ter discernimento
(distinguimos, diferenciamos, avaliamos, medimos) o Corpo de
Cristo espalhado na terra para não mais comer e beber para o nosso
juízo (1 Coríntios 11.29). Assim não haverá mais entre nós fracos
e doentes e muitos que dormem (1 Coríntios 11.30).
Podemos ter a visão de que, mesmo sendo muitos, somos UM
só Corpo em Cristo e individualmente membros uns dos outros
(Romanos 12.5)? Claro que sim! Somos membros de irmãos dos
cinco continentes ainda que não nos conheçamos na carne.
Porque assim como o corpo é um, e tem muitos membros, todos os
membros, sendo muitos, são um só corpo, assim é Cristo também.
Pois todos nós fomos batizados em um Espírito, formando um cor-
po, quer judeus, quer gregos, quer servos, quer livres, e todos temos
bebido de um Espírito. Porque o corpo não é um só membro, mas
muitos (1 Coríntios 12.12-14; grifos nossos).

...para que não haja divisão no corpo, mas, antes, tenham os mem-
bros igual cuidado uns dos outros (1 Coríntios 12.25; grifos nossos).

Deixe o Espírito Santo lhe dar uma visão da unidade do Corpo.


Todas as vezes em que for tomar a Ceia (comunhão), pense como
você seria feliz se pudesse comer e beber, sem preconceitos, com
qualquer irmão em Cristo, não importando a denominação ou a
doutrina, mas sabendo que em Cristo somos UM.

Alguns níveis de prática da unidade espiritual


A partir do nosso chamado para enfatizar mais intensamente a
reconciliação do Corpo de Cristo, observamos algumas práticas
interessantes de unidade espiritual. Procuramos, a partir dessas
observações, dispô-las em cinco níveis diferentes sem querer
afirmar que não haja outras formas.

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O ministério da reconciliação: um dom de Deus para todos 259

O Espírito Santo, em sua soberania, está realizando, con-


forme a multiforme sabedoria de Deus, incontáveis formas
de o Corpo de Cristo se unir para consumar a oração de Jesus
em João 17. Aqui, repetimos, estamos destacando experiências
observadas. Uma delas, porém, a última, desejada por todos os
que sonham ver a unidade da Igreja, aparentemente ainda não
foi experimentada em sua plenitude.
Os níveis observados são:

1. coração aberto para a unidade e a reverência, o reconhe-


cimento de outros cristãos que não pertencem à mesma
denominação;

2. o exercício de algumas práticas de unidade (ecumênicas)


pontuais e esporádicas para edificação e para que o mundo
creia que Jesus foi enviado pelo Pai;

3. o comprometimento com irmãos de outras denomina-


ções, por meio de aliança explícita ou não, para desen-
volver atividades comuns, ter comunhão e compartilhar
dons;

4. o estabelecimento de uma comunidade de vida, nas quais


cristãos de diversas denominações estejam aliados não só
no propósito de busca de santidade, amor e serviço, mas
também se unam geograficamente, residindo num mesmo
bairro ou condomínio;

5. a unidade plena, a comunhão plena, com base na qual os


cristãos de diversas denominações deveriam estar aliados
a ponto de sentar-se à mesa para a ceia do Senhor, para a
comunhão, para o partir do pão.

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260 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

A visão de um povo grande e poderoso (adaptado da


ministração de Silas Esteves)136
Para quando será o que Pedro profetizou em Atos 2.16-20 citan-
do o livro de Joel? Pode ser que, parcialmente, tenha acontecido
em Pentecostes, mas sabemos que esta profecia ainda se realizará
plenamente.
E acontecerá, depois, que derramarei o meu Espírito sobre toda a
carne; vossos filhos e vossas filhas profetizarão, vossos velhos sonha-
rão, e vossos jovens terão visões; até sobre os servos e sobre as servas
derramarei o meu Espírito naqueles dias ( Joel 2.28,29).

Ainda, e cremos que em muito breve, haverá um derrama-


mento do Espírito Santo em toda a terra, e Jesus voltará. Algo que
me impressiona nesse texto é que esse derramamento será "sobre
toda carne", e não somente sobre todo cristão. Entretanto, o que
precederá esse dia?
Tocai a trombeta em Sião e dai voz de rebate no meu santo
monte; perturbem-se todos os moradores da terra, porque o Dia
do SENHOR vem, já está próximo; dia de escuridade e densas
trevas, dia de nuvens e negridão! Como a alva por sobre os montes,
assim se difunde UM POVO GRANDE E PODEROSO, qual
desde o tempo antigo nunca houve, nem depois dele haverá pelos
anos adiante, de geração em geração ( Joel 2.1,2).

Não somos um povo pequeno e fraco; em Deus somos gran-


des, fortes e vigorosos. Um povo poderoso está levantando-se
em nossos dias. O mundo vive hoje em trevas espessas, mas não
devemos olhar para isso, mas para o alto, de onde vem a nossa
redenção (Lucas 21.28). Assim, podemos ter esperança, alegria,
encorajamento, força, pois está chegando a hora da nossa vitória.
136
Anais do Encristus 2014. Solícitos em conservar a unidade no vínculo da paz.
Rio de Janeiro/RJ, 18 e 19 de outubro de 2014 (texto adaptado).

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O ministério da reconciliação: um dom de Deus para todos 261

O reino de Deus está dentro do nosso coração, portanto,


"não vos entristeçais, porque a alegria do Senhor é a vossa força"
(Neemias 8.10). Não há nada que nos possa abater, pois
"quando sou fraco, então, é que sou forte" (2 Coríntios 12,10)
e "tudo posso naquele que me fortalece" (Filipenses 4,13). Jesus
veio para nos reconciliar com o Pai e, se vivermos nele, que é
o lugar onde devemos estar, seremos fortes. Em nós mesmos,
não temos e não somos nada, mas nele temos e somos tudo.
Sozinhos, somos fracos, mas juntos somos fortes. Não é mais
hora de grandes líderes isolados se levantarem, mas de se levan-
tar um povo grande, forte, unido, vigoroso, cheio do Espírito
Santo e do reino de Deus no coração! Homens e mulheres
conscientes do seu ministério de reconciliação e cheios da
palavra de autoridade e poder para restaurar a terra.
É singular o que Deus está fazendo em nossa geração. Tudo o
que não aconteceu nas gerações anteriores está acontecendo hoje,
em nossos dias. O reino de Deus está em nós, mas ainda sem visível
aparência, sem grandes sinais. Há muita gente buscando sinais,
mas esses nos seguirão: "E eles, tendo partido, pregaram em toda
parte, cooperando com eles o Senhor e confirmando a palavra por
meio de sinais, que se seguiam" (Marcos 16.20). Todas as manifes-
tações de curas, milagres e libertações que estão acontecendo em
nossos dias são para que andemos mais rápido, não para nos fazer
parar e "escrever livros" sobre esses sinais. Todos eles são apenas
para confirmar, para cumprir o pleno propósito da unidade do
Corpo de Cristo na terra em nossa geração.
À frente dele vai fogo devorador, atrás, chama que abrasa; diante
dele, a terra é como o jardim do Éden; mas, atrás dele, um deserto
assolado. Nada lhe escapa. A sua aparência é como a de cavalos; e,
como cavaleiros, assim correm. Estrondeando como carros, vêm,
saltando pelos cimos dos montes, crepitando como chamas de fogo
que devoram o restolho, como um povo poderoso posto em ordem

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262 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

de combate. Diante deles, tremem os povos; todos os rostos empa-


lidecem. Correm como valentes; como homens de guerra, sobem
muros; e cada um vai no seu caminho e não se desvia da sua fileira.
Não empurram uns aos outros; cada um segue o seu rumo; arremetem
contra lanças e não se detêm no seu caminho ( Joel 2.3-8).

Somos UM povo grande, lindo, poderoso, cheio do poder


do Espírito Santo. Diante de nós, a terra é como o jardim do
Éden e atrás de nós como um deserto assolado, pois nada nos
escapará, nem governos naturais nem espirituais. Nenhuma
enfermidade nos atacará (Isaías 53.4,5) pois haverá em nós a
atmosfera do reino de Deus – saúde, alegria, encorajamento,
luz, força, fé, amor, unidade! Porém, se continuarmos divididos,
haverá somente o oposto disso tudo.
Enquanto todo mundo está se lamentando ao ver as tragédias,
a escuridão, a maldade, as pragas que estão vindo sobre a terra,
um povo diferente está se levantando e dizendo: "Está chegando
a hora, o reino de Deus está chegando, a alegria da unidade está
sendo restaurada!". Assim como existem a tristeza, a escuridão
e a devastação da divisão, existem também a alegria, a luz e a
restauração da unidade!
Diante desse povo, tremem todos os povos. Hoje em dia, diante
da atuação da Igreja, ninguém tem medo. Pelo contrário, a Igreja
tem sido apenas motivo de sarcasmo, críticas e divisões. Mas uma
Igreja poderosa e unida está se levantando, e a terra toda tremerá
por causa da autoridade que vem pela unidade do povo de Deus.
"Cada um vai no seu caminho e não se desvia da sua fileira."
Cada um fica no seu pelotão, na sua congregação! O ministério
da reconciliação não faz proselitismo, "não empurram uns aos
outros", não se acotovelam, não falam mal, não criticam, mas
abençoam aqueles que fazem diferente. O reino de Deus em
nós gera um povo que se ama, que se perdoa, que abençoa um

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O ministério da reconciliação: um dom de Deus para todos 263

ao outro; um povo que não ofende, que não empurra, que não
menospreza, que não critica, que não minimiza o papel do
outro. Pelo contrário, um povo que exalta e agradece a Deus,
pois o outro está fazendo o que ele próprio não consegue e não
pode fazer.
Que a Palavra de Deus seja viva em nosso coração, que
desperte em nós a palavra da reconciliação e levante uma com-
panhia poderosa de reconciliadores. Sabemos que o Reino está
chegando, que o final está próximo, e que o surgimento de um
povo poderoso virá como resultado do grande derramamento do
Espírito Santo sobre toda a terra. É isso que somos: um sinal de
que Deus está se movendo na Terra nessa hora. Vamos manter
os nossos pelotões, mas conscientes de que somos UM só povo,
um só exército! SOMOS UM!

Conclusão
Segundo Jorge Himitian137, alcançaremos a unidade da fé à
medida que cada pessoa, grupo ou denominação deixar de lado
seus critérios próprios, suas convicções pessoais ou grupais, suas
doutrinas e credos particulares e voltar, todos nós, à revelação
dada por Deus por meio de seus apóstolos e profetas do primeiro
século (Efésios 2.20; 4.11-13).
A volta de Cristo será para uma Igreja gloriosa que ele mesmo
levará à perfeição:
Cristo amou a igreja e a si mesmo se entregou por ela, para que
a santificasse, tendo-a purificado por meio da lavagem de água,
pela palavra, para apresentar a si mesmo igreja gloriosa, sem má-
cula, nem ruga, nem coisa semelhante, porém santa e sem defeito
(Efésios 5.25-27).

137
HIMITIAN, Jorge. Projeto do Eterno. São Paulo/SP: Editora Atos Gospel, 2010.

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264 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

Enquanto aguardamos a unidade da fé, cabe a nós preservar


a unidade do Espírito a todo custo, com oração, louvor, ação
de graças. A unidade da fé é um processo que chegará no dia
em que todos nós crermos da mesma forma.
Ainda, segundo Himitian, Deus está operando e unindo sua
Igreja (a unidade do Corpo, Efésios 4.16). Chegará o dia em
que todos nós, filhos de Deus, formaremos um único Corpo
bem unido e sob uma única Cabeça, que é Cristo!
E este será o povo poderoso, um só Corpo, que se ama, que
se perdoa, que abençoa um ao outro no poder do Espírito Santo,
que não tem hierarquia, já que seu Comandante supremo é o
SENHOR JESUS CRISTO!
Exercitemos nossa missão de reconciliadores. Tenhamos
uma visão que corrobore com a oração de Jesus em João
17.11, 21-23. Que a unidade do Corpo seja um tema diário
de nossas orações!

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Capítulo 12

A RESTAURAÇÃO DE
ALIANÇAS QUEBRADAS138

A
Palavra de Deus nos ensina que Jesus vai voltar: “Esse
Jesus, que dentre vós foi elevado para o céu, há de vir as-
sim como para o céu o vistes ir” (Atos 1.11b). Sabemos
que Jesus virá ao encontro de sua Igreja, e que essa Igreja será
“gloriosa, sem mácula, nem ruga, nem coisa semelhante, mas santa
e irrepreensível” (Efésios 5.27).
Sabemos que não vivemos plenamente uma igreja santa
e irrepreensível em nossos dias – longe disso. Experimen-
tamos uma igreja dividida, fragmentada. Como sabemos,
experimentamos uma igreja que se acostumou a quebrar
alianças por suas constantes divisões. Assim, precisamos de
arrependimento e de restauração (recuperação de algo que
foi perdido, reestabelecimento):
Arrependei-vos, pois, e convertei-vos, para que sejam apagados os
vossos pecados, e venham assim os tempos do refrigério pela presença
do Senhor, e envie ele a Jesus Cristo, que já dantes vos foi pregado.
138
Consideramos algumas ministrações de Harold Walker no Curso de Preparação
de Obreiros em agosto de 2015 na UMC – Unidade Missionária Cristã, Jundiaí/SP.

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266 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

O qual convém que o céu contenha até aos tempos da restauração


de tudo, dos quais Deus falou pela boca de todos os seus santos
profetas, desde o princípio (Atos 3.19-21).

Aliança e a punição quando ela é quebrada


Deus fez promessas a Abraão. Coisas grandiosas e tremendas
deveriam acontecer com ele e seus descendentes. Porém, em Gê-
nesis 15, parece que surgem dúvidas em seu coração (vv. 2,3). É
como se Abraão estivesse pedindo alguma garantia de que aquelas
promessas maravilhosas de fato se cumpririam.
A dúvida maior era sobre o herdeiro prometido, já que
seu único herdeiro era um escravo nascido em sua casa. É
como se Abraão colocasse “Deus na parede”. A primeira
coisa que Deus fez foi levá-lo para fora da tenda, desafiá-lo a
contar as estrelas do céu e prometer a ele: “Assim será a tua
descendência” (v. 5).
Ainda que Abraão cresse (v. 6), novamente surgiram as
dúvidas (v. 8). Assim, Deus tomou a iniciativa de estabelecer
uma aliança com ele nos moldes comuns aos homens da época.
O padrão da aliança consistia em cortar um animal ao meio,
e as pessoas que estavam se aliançando passavam entre as duas
partes do animal, sobre o sangue derramado (aliança de san-
gue). O não cumprimento da aliança implicaria, para quem
a quebrasse, que a mesma seria cortada ao meio à semelhança
daquele animal.
Foi nesta base que Deus fez a aliança com Abraão. Ele ordenou
que se cortassem ao meio uma bezerra, uma cabra, um carneiro
(todos de 3 anos de idade) (vv. 9,10).
E sucedeu que, posto o sol, houve escuridão, e eis um forno de fuma-
ça, e uma tocha de fogo, que passou por aquelas metades. Naquele

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A restauração de alianças quebradas 267

mesmo dia fez o Senhor uma aliança com Abrão, dizendo: À tua
descendência tenho dado esta terra, desde o rio do Egito até ao grande
rio Eufrates... (vv. 17,18).

A tocha de fogo que passou pelo corredor de animais mortos


era o próprio Deus. Assim, ele fez uma aliança de sangue com
o homem como garantia de que sua promessa se cumpriria.
Segundo Asher Intrater,139 “o Criador do Universo se prendeu a
um relacionamento com um ser humano ao fazer com Abraão uma
aliança de sangue”.
O termo “aliança” aparece por mais de 200 vezes na Bíblia.
Depois de Gênesis (23 vezes), o segundo livro em que esse termo
mais aparece é Jeremias (21 vezes).
No livro de Jeremias, por exemplo, Deus mostra que a seriedade
da aliança não é apenas naquelas que são feitas entre ele (Deus) e
os homens, mas também nas que são feitas entre os homens. No
capítulo 34, Jerusalém estava sitiada pelos babilônios e prestes
a sucumbir. O povo de Israel vinha escravizando seus próprios
irmãos havia muito tempo, o que era proibido na Lei de Moisés.
Numa tentativa de sensibilizar o coração de Deus, fizeram uma
aliança entre si e liberaram os escravos hebreus. Deus ficou feliz,
pois finalmente eles cumpririam sua Lei. Entretanto, no dia
seguinte, quebraram a aliança e chamaram os escravos de volta.
Vejam como Deus se indignou com eles:
Portanto assim diz o Senhor: Vós não me ouvistes a mim, para
apregoardes a liberdade, cada um ao seu irmão, e cada um ao seu
próximo; pois eis que eu vos apregoo a liberdade, diz o Senhor, para
a espada, para a pestilência, e para a fome; e farei que sejais espanto
a todos os reinos da terra. E entregarei os homens que transgre-
diram a minha aliança, que não cumpriram as palavras da aliança
139
INTRATER, Asher. Relacionamentos de Aliança. Americana/SP: Editora Im-
pacto, 2015. No prelo.

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268 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

que fizeram diante de mim, com o bezerro, que dividiram em duas


partes, e passaram pelo meio das suas porções; a saber, os príncipes
de Judá, e os príncipes de Jerusalém, os eunucos, e os sacerdotes, e
todo o povo da terra que passou por meio das porções do bezerro;
entregá-los-ei, digo, na mão de seus inimigos, e na mão dos que
procuram a sua morte, e os cadáveres deles servirão de alimento
para as aves dos céus e para os animais da terra ( Jeremias 34.17-20).

Parece que a ira de Deus se acende quando a aliança, ainda


que seja entre homens, é quebrada. Nesse caso, Deus se irou
principalmente porque se tratava de uma aliança de sangue – eles
passaram no meio de bezerros cortados. Ele ficou indignado e
puniu os infratores.

A Nova Aliança no sangue de Jesus


Na ceia, que tipo de aliança nós celebramos? A Nova Aliança no
sangue de Jesus. É semelhante àquela que vimos em Gênesis e que
aparece em todo o Velho Testamento. Há muitos versículos no
Novo Testamento que falam sobre o sangue de Jesus. É verdade
que a Nova Aliança é de graça e incondicional, que nós não a
merecemos e que podemos nos aproximar do trono da graça com
confiança (Hebreus 4.16). Tudo isso é verdade, mas também é
verdade que é algo muito sério. A oferta do Filho de Deus não
é pouca coisa. Quem não discerne o Corpo (1 Coríntios 11.29)
nem leva a vida cristã a sério não entende o que é uma aliança
de sangue.
Nossa vida não nos pertence. Fomos comprados por um
preço altíssimo que custou uma aliança de sangue. Não somos
livres para fazer o que quisermos, pois Jesus pagou um alto
preço de sangue por nós. Celebramos a ceia entendendo quão
miseráveis somos. Deus não nos olhou como inimigos. O
Cordeiro de Deus derramou o seu sangue em nosso favor e,

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A restauração de alianças quebradas 269

assim, pertencemos a ele. Somos eternamente gratos a Jesus,


que perdoou os nossos pecados e continua perdoando. Por isso,
precisamos ter consciência e temor das consequências de não
levar essa aliança a sério.
Que o Espírito Santo vivifique sua Palavra e produza o
temor de Deus em nós na Nova Aliança no sangue de Jesus.
O que você acha de um marido que trai a esposa e chega em
casa tranquilo, como se nada sério tivesse acontecido? É pecado
trair, mas muito pior do que trair a aliança do casamento é agir
com leviandade. A quebra de uma aliança tem consequências.
A Nova Aliança não é brincadeira; é verdade que é de graça e
sem merecimento, mas é uma aliança de sangue, e precisamos
entender a seriedade disso.
Tendo pois, irmãos, ousadia para entrarmos no santíssimo lugar, pelo
sangue de Jesus, pelo caminho que ele nos inaugurou, caminho novo e
vivo, através do véu, isto é, da sua carne, e tendo um grande sacerdote
sobre a casa de Deus, cheguemo-nos com verdadeiro coração, em
inteira certeza de fé; tendo o coração purificado da má consciência,
e o corpo lavado com água limpa, retenhamos inabalável a confis-
são da nossa esperança, porque fiel é aquele que fez a promessa; e
consideremo-nos uns aos outros, para nos estimularmos ao amor e às
boas obras, não abandonando a nossa congregação, como é costume
de alguns, antes admoestando-nos uns aos outros; e tanto mais,
quanto vedes que se vai aproximando aquele dia (Hebreus 10.19-25).

Deixemos a Palavra de Deus penetrar em nós. Não há necessi-


dade de ficarmos abatidos e condenados. A única coisa necessária
é confessar nossos pecados e receber o perdão de Deus. Não há
merecimento, mas haverá consequências se não houver sinceri-
dade. Não podemos ser legalistas, libertinos ou religiosos. Mas, se
chegarmos com coração verdadeiro diante dele, experimentaremos
alegria e singeleza no coração.

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270 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

No Velho Testamento, como vimos, havia um corredor en-


tre os animais partidos. Mas, na Nova Aliança, passamos pela
própria carne partida do Senhor Jesus. Ele foi partido na cruz
para que pudéssemos “comer” dele. Na cruz, ele derramou seu
sangue para que pudéssemos “beber” dele. Por isso, tenhamos
liberdade e ousadia para entrar no santíssimo lugar pelo sangue
de Jesus que foi derramado em sua morte. O véu, a sua carne,
foi rasgada e inaugurou um caminho novo e vivo para nós.
Parafraseando, ele “abriu um corredor por sua carne rasgada
a fim de que passássemos no meio do Cristo partido”. Se ele
ficasse vivo, não poderíamos passar, mas ele morreu.
Aquele que foi partido ressuscitou e, agora, temos “um grande
sacerdote sobre a casa de Deus” (Hebreus 10.21). Ao mesmo tempo
em que Jesus é o Cordeiro partido, ele também é o sacerdote que
nos recebe no “fim do corredor”.
Como devemos chegar a ele? Sem mentira ou fingimento,
mas com verdade e luz. Devemos ser exatamente aquilo que os
outros veem em nós, sem hipocrisia. Chegamos a Deus e à ceia
reconhecendo que somos pobres necessitados, que não merecem
favor algum. Porém, somos aceitos por Deus. Ele ama a sinceridade
e a verdade. Ele não tem problema com pecado, porque ele tem a
solução. Ele tem problema com a religiosidade, pois esta encobre
o pecado e nos faz fingir que somos santos. Então, “aproximemo-
-nos, com sincero coração, em plena certeza de fé, tendo o coração
purificado de má consciência e lavado o corpo com água pura”
(Hebreus 10.22).
Ter um “coração purificado da má consciência” é ter os peca-
dos confessados, é andar na luz. Assim que fazemos algo errado,
devemos procurar alguém e confessar o pecado (Tiago 5.16)
para ficarmos com a consciência limpa diante de Deus. “Corpo
lavado com água limpa” se refere ao batismo. Não se deve tomar

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A restauração de alianças quebradas 271

a ceia sem ser batizado. No batismo, nossa mente é purificada


porque recebemos o perdão pelo sangue. O que lava é o sangue,
não a água. Mas, se eu não obedecer à Palavra e não for batizado,
o sangue não me lavará. Só posso ter a consciência purificada se
eu for batizado.
Portanto, tendo o corpo purificado com água limpa, a
mente purificada pelo sangue e um verdadeiro coração na
luz, “retenhamos inabalável a confissão da nossa esperança,
porque fiel é aquele que fez a promessa; e consideremo-nos uns
aos outros, para nos estimularmos ao amor e às boas obras, não
abandonando a nossa congregação, como é costume de alguns,
antes admoestando-nos uns aos outros; e tanto mais, quanto
vedes que se vai aproximando aquele dia” (Hebreus 10.23-25).
Duas coisas são muito importantes.
1. Que Deus nos ama tanto que nos deu seu Filho, o
que ele tinha de mais precioso. Ele não precisa provar
mais nada, pois já deu tudo. Ele não precisa nos dar
um carro novo ou uma casa nova para provar que nos
ama. Ele já deu seu próprio Filho – o resto ele dará
“de lambuja”. Romanos 8.31,32 diz: “Que diremos,
pois, a estas coisas? Se Deus é por nós, quem será contra
nós? Aquele que nem mesmo a seu próprio Filho pou-
pou, antes o entregou por todos nós, como não nos dará
também com ele todas as coisas?” A ceia é a celebração
de um amor incompreensível: Deus nos ama apesar
daquilo que somos. Ele nos ama porque ele é bom.
Podemos confiar no seu amor porque ele verdadeira-
mente ama. E a prova disso, como vimos, é que ele
deu seu próprio Filho, fez uma aliança de sangue por
meio do próprio Filho. Então, entremos com ousadia,
confiança e alegria.

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272 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

2. Mas entremos também com temor, porque o Deus que


nos ama também tem ciúme, ira e vingança. Devemos
ter cuidado com o uso que fazemos desse presente tão
maravilhoso. Grande alegria e grande temor devem
andar juntos. Nossa vida cristã terá um “apagão” se não
tivermos o “fio negativo” e o “fio positivo”. Se tivermos
só a alegria, não haverá o fio negativo e, se tivermos só o
temor, não haverá o fio positivo. Para haver luz os dois
fios são necessários.

A Bíblia nos ensina ainda (1 Coríntios 11.27-32) que a falta


de discernir o Corpo de Cristo provoca fraquezas, doenças e so-
nolência. Quando não reconhecemos que os outros irmãos são
do Senhor (incluindo as denominações cristãs), que pertencem
a Cristo, que fazem parte do mesmo Corpo de Cristo que nós,
deixamos de receber a graça de Deus que está sobre eles, e isso
provoca em nós fraqueza, pois todos necessitamos uns dos outros.
Quando eu não discirno Cristo na vida do irmão, eu fecho meu
coração a ele. Assim, não seria necessário pesquisar porque eu
vivo tão fraco, tão sonolento, tão doente, perdendo a percepção
espiritual das coisas – basta ver como está minha relação com a
igreja, com os irmãos.

O ciúme da aliança
Porque se voluntariamente continuarmos no pecado, depois de ter-
mos recebido o pleno conhecimento da verdade, já não resta mais
sacrifício pelos pecados, mas uma expectação terrível de juízo, e um
ardor de fogo que há de devorar os adversários. Havendo alguém
rejeitado a lei de Moisés, morre sem misericórdia, pela palavra de
duas ou três testemunhas; de quanto maior castigo cuidais vós será
julgado merecedor aquele que pisar o Filho de Deus, e tiver por
profano o sangue da aliança com que foi santificado e ultrajar ao

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A restauração de alianças quebradas 273

Espírito da graça? Pois conhecemos aquele que disse: Minha é a


vingança, eu retribuirei. E outra vez: O Senhor julgará o seu povo.
Horrenda coisa é cair nas mãos do Deus vivo (Hebreus 10.26-31;
grifos nossos).

Essa passagem deve ser lida com muita atenção. Fomos com-
prados por um preço de valor incalculável – o sangue de Jesus. É
de graça e podemos entrar com intrepidez, pois Deus nos ama.
Ele já nos provou que somos filhos amados. Ele torce por nós e
quer nos dar todas as bênçãos espirituais em Cristo Jesus. Mas, se
banalizarmos isso, se não zelarmos, se profanarmos essa aliança
e não a valorizarmos, “se vivermos deliberadamente em pecado,
depois de termos recebido o pleno conhecimento da verdade, já
não resta sacrifício pelos pecados; pelo contrário, certa expectação
horrível de juízo e fogo vingador prestes a consumir os adversários”
(Hebreus 10.26,27). Ou seja, só restará a ira de Deus.
Mas entendamos que não podemos revidar ou exercer vingança
sobre ninguém. A Bíblia nos ensina a fazer o bem ao nosso inimigo,
falar bem daquele que nos trata mal, andar a segunda milha, etc.
Sabe por que temos de agir com bondade para com todos? Porque
a vingança é de Deus: “A mim pertence a vingança; eu retribuirei.
E outra vez: O Senhor julgará o seu povo” (Hebreus 10.30). Não
que a vingança não exista, mas é Deus quem a exerce, não nós.
Se o teu inimigo tiver fome, dá-lhe pão para comer, e se tiver sede,
dá-lhe água para beber; porque assim lhe amontoarás brasas sobre
a cabeça, e o Senhor te recompensará. (Provérbios 25.21,22)

Podemos pensar que isso é injusto, mas é porque não somos


juízes. Deus é o Juiz e haverá um dia terrível em que ele julgará o
mundo com justiça. Existem milhões de pessoas cometendo atro-
cidades e maldades terríveis contra o próximo – tráfico humano,
abuso de menores, corrupção de todos os tipos... E qual será a

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274 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

consequência de tudo isso? A Bíblia diz que todo mal que fizermos
se voltará contra nós. Ou seja, por toda a eternidade sofreremos
pelos males praticados contra os outros. Quem sofre injustiça na
terra terá recompensa no céu, mas quem pratica injustiça na terra
será eternamente castigado com a ira de Deus.
Portanto, Jesus já nos livrou dessa ira. Tudo o que fizemos e
que fazemos para os outros, Jesus já levou sobre si. A Bíblia diz
que Deus nos livra da ira vindoura se levamos essa questão a
sério (1 Tessalonicenses 1.10). Deus somente quer de nós sin-
ceridade, coração verdadeiro e grato. Se pecarmos e errarmos,
peçamos perdão, levantemo-nos e caminhemos. Temos um
Deus maravilhoso, um sacerdote maravilhoso e um sacrifício
maravilhoso.
Assim, não brinquemos com Deus. Ele é muito amoroso,
mas também é muito ciumento. Ele nos deu seu próprio Filho e,
se não zelarmos desse presente e não o valorizarmos, teremos de
enfrentar a ira vindoura.

Unindo cristãos individuais em corpos


Derek Prince,140 ao escrever sobre a “restauração de todas as
coisas” (Atos 3.19-21), afirma diz que Jesus voltará do céu para
a terra e que o processo de restauração divino é baseado prin-
cipalmente nos dois povos com os quais Deus estabeleceu uma
aliança na terra: Israel e a Igreja. Ele diz ainda que os princípios
são revelados no plano natural da restauração de Israel (que por
séculos andou como povo desterrado) e são igualmente aplicáveis
à restauração da Igreja no plano espiritual (que também por
séculos esteve em um exílio semelhante a Israel, longe de sua
herança espiritual doada por Deus).

PRINCE, Derek. Anatomia do Corpo de Cristo. Americana/SP: Editora Impacto


140

Publicações. Mensagem revisada e atualizada em março de 2010.

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A restauração de alianças quebradas 275

Ele exemplifica a profecia que prediz tanto a restauração de


Israel quanto a da Igreja, citando o vale dos ossos secos (Ezequiel
37.1-10). Neste vale, os ossos secos, desligados e espalhados,
sobrenaturalmente se ajuntam a suas respectivas juntas; depois,
são cobertos por ligamentos, músculos, carne e pele tornando-
-se fisicamente perfeitos, com fôlego (espírito), levantando-se e
constituindo-se um exército grande em extremo (“sobremodo
numeroso”).
A restauração é o propósito soberano de Deus claramente
revelado nas Escrituras. Prince, já citado, declara que “assim
como Deus usou Ezequiel, ele também usará homens escolhi-
dos e qualificados por ele mesmo para efetuar sua restauração”.
Cremos que estes homens são os fiéis à aliança de sangue feita
por Jesus.
Em Efésios 4.15,16, Paulo nos ensina que o propósito de Deus
para nós é que cresçamos como juntas espirituais encaixadas no
Corpo de Cristo:
Antes, seguindo a verdade em amor, cresçamos em tudo naquele que
é a cabeça, Cristo, do qual todo o corpo, bem ajustado, e ligado pelo
auxílio de todas as juntas, segundo a justa operação de cada parte,
faz o aumento do corpo, para sua edificação em amor.

Em Colossenses 2.18 e 19, Paulo fala de crentes que são levados


ao engano espiritual. Derek Prince (já citado), referindo-se a estes
versículos, mostra os dois requisitos para se preservar do erro:

Primeiro, ser firmemente unidos com a Cabeça (Cristo); segundo, ser


firmemente unidos por juntas e ligamentos com os nossos irmãos.
Nosso relacionamento pessoal com Cristo é primordial, mas não é
suficiente. Temos que estabelecer um relacionamento certo com os
outros crentes aos quais Deus tem nos ligado no Corpo.

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276 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

Ele trata juntas como o relacionamento pessoal entre os


cristãos que Deus uniu. Já os ligamentos (que são as fibras
de tecido que mantêm os ossos ligados nos lugares em que
se formam as juntas) seriam essenciais para conservar cada
junta forte e segura – exatamente o papel do compromisso
de aliança.
Na visão de Ezequiel, Deus operou sobrenaturalmente
nos ossos individuais para uni-los em corpos, agindo, a partir
daí, em corpos completos. Segundo Prince, “nos nossos dias
Deus ainda está ajuntando cristãos individuais em corpos,
isto é, em igrejas locais, no levantamento do seu exército
grande em extremo”. Portanto, nossos relacionamentos
(juntas) e alianças (ligamentos) deverão estar firmes para o
Corpo receber a vida abundante que vem da Cabeça. Para
essa restauração completa do Corpo, cabe a nós buscar a
restauração das alianças quebradas, refazendo “a unidade do
Espírito no vínculo da paz”.
Ao tomarmos a ceia do Senhor, reconhecemos um compromis-
so de aliança uns com os outros, como os ossos do corpo humano
que são ligados pelos ligamentos em um só corpo. Reconhecemos
que éramos “ossos secos” e que, pela cruz de Cristo, fomos unidos,
tornando-nos um só Corpo e recebendo a vida que nos liga, o
Espírito Santo.
Derek Prince lembra-nos que:
Entre os povos semíticos descritos na Bíblia, a maneira normal de
duas pessoas entrarem em uma Aliança era participar solenemente
de uma refeição juntas e, especialmente, comer de um só pão e
beber de um só cálice. Por esta razão foi apropriado que Jesus
iniciasse a Nova Aliança com uma refeição solene na qual cada
pessoa participou do mesmo pão e bebeu do mesmo cálice (Mateus
26.20-28). Por meio deste ato único, todos que participavam dele

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A restauração de alianças quebradas 277

eram, daquele momento em diante, ligados numa Aliança sagrada.


Desde então, a participação na ceia do Senhor tem sido, do ponto
de vista de Deus, uma renovação desta Aliança por meio da qual
todos os que participam são ligados ao Senhor e uns aos outros
(grifos nossos).

Ao participar da ceia do Senhor, reconhecemos que somos


irmãos, membros da mesma família divina. Renovamos o
compromisso de amor mútuo, de perdão, de cuidar uns dos
outros e, do ponto de vista cristão, até dar a vida pelo irmão;
de usar nossas provisões para suprir a necessidade do irmão e
vice-versa; de alegrar-nos com as vitórias dos irmãos e sofrer
com eles as dores de suas aflições; de não romper relações com
os irmãos, ainda que em certos pontos não haja um pensamento
único (diversidade). Renovamos, então, o compromisso de ser
sincero, transparente e continuar amando ainda que tenhamos
de ser exortados. Enfim, confirmamos o propósito do amor
incondicional, assim como somos amados por Cristo, que é o
centro dessa aliança.
Não bastassem todos esses termos da aliança, Derek Prince
ainda ressalta:

Além do mais, minhas obrigações de Aliança não se limitam a


você pessoalmente. Elas se estendem também àqueles com quem
você está em aliança. Se A está em aliança com B, e B está em
aliança com C, então, por este fato, A está em aliança com C, e
C com A. Isto explica porque os compromissos de aliança, assim
como os ligamentos, podem ligar todos os ossos no Corpo de
Cristo. Cada osso é diretamente ligado com os que estão próximos
a ele, mas estes, por sua vez, são ligados aos outros. Desta maneira,
todos os ossos estarão interligados para formarem um só corpo.

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278 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

As consequências de uma aliança quebrada


Em uma reportagem no jornal O Estado de São Paulo acerca
do censo de 2010,141 comentou-se que o Brasil ultrapassou a
marca de 40 milhões de evangélicos. A reportagem diz:
A cidade de São Paulo viveu uma pulverização evangélica sem
precedentes na última década. Segundo os novos dados do censo,
o número de evangélicos sem laços com uma igreja determinada
aumentou mais de quatro vezes entre 2000 e 2010, enquanto a
quantidade de fiéis que frequentam templos menores cresceu 62%
nesse período. Só na cidade de São Paulo, nestes dez anos houve
um crescimento de 825 mil fiéis (grifos nossos).

O artigo comentou ainda que está havendo uma migração


de fiéis das grandes denominações para as “igrejas menores”. O
censo informou que apenas a Congregação Cristã do Brasil perdeu
74.200 membros somente na cidade de São Paulo; a Universal do
Reino de Deus perdeu 72.620; os adventistas, batistas, luteranos
e Deus é Amor são igrejas que estão decaindo, e esse fluxo, essa
migração, está acontecendo para igrejas evangélicas não determi-
nadas e pequenos templos que estão se desenvolvendo.
O texto não diz que houve abandono da fé, mas uma
transferência dos fiéis das igrejas maiores para as menores.
Então, é como se houvesse um “cardápio” de acordo com o
qual as pessoas escolhessem o “prato” mais adequado a elas.
Dessa forma, vão-se perdendo os vínculos com autoridade e
liderança, com compromissos, levando as pessoas a passar por
vários lugares, o que traz, na prática, um esgotamento espiri-
tual, um desapontamento ou frustração com lideranças e com
Deus, levando-as a afastar-se das igrejas.

ROSSI, Amanda. São Paulo viu a pulverização evangélica na última década. Jornal
141

O Estado de São Paulo, edição de 7 de julho de 2012.

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A restauração de alianças quebradas 279

Segundo o antropólogo Ronaldo de Almeida (artigo cita-


do), da Unicamp e do Cebrap, o novo mapa da configuração
evangélica da capital paulista é fruto da especialização: “O
sujeito se identifica principalmente como evangélico, mas
hoje ele molda sua experiência religiosa”.
Nesta mesma reportagem, o vereador (na época) Carlos
Apolinário diz que “o crescimento das igrejas evangélicas
menores é muito visível. Seus fundadores são pastores que
já pertenceram a igrejas evangélicas maiores”.
Quase sempre, infelizmente, o fluxo de um cristão de
uma denominação para outra implica em quebra de aliança,
pois houve afastamento (muitas vezes sem nenhum acordo
ou explicações) de irmãos que “sentavam juntos à mesa”
para cear.

Classificação percentual dos grupos religiosos e comparação com o Censo 2000

73,6
64,6

22,2
15,4
7,4 8
1,3 2 0,3 0,3 1,8 2,7 0,2 0,1

Católica Evangélica Espírita Umbanda e Outras Sem Não sabe/


Apostólica Candomblé religiosidades religião não declarou
Romana
2000 2010

Fonte: IBGE, Censo Demográfico 2000/2010

Os ligamentos (alianças) foram rompidos, e as juntas


se desarticularam. No comentário do antropólogo citado,
“maior infidelidade” significa, para nós, números crescentes
de quebra de alianças.

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280 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

O pior são os pastores saindo (normalmente brigados) de


uma denominação, fundando outra. Os pastores que ficam e os
que vão embora louvam a Deus com a maior espontaneidade,
cada um com a sua congregação, como se tudo estivesse normal.
Assim, alianças são rompidas com muita frequência, e isso até é
considerado “fato normal”.
Essa aceleração de quebra de alianças é desenfreada desde os
reformadores que, por discordar entre si, preferiram separar-se
a perdoar-se. Isso ganhou proporções gigantescas no século 20
com os movimentos pentecostais e carismáticos, cujo objetivo
inicial, com o derramamento do Espírito Santo, era a unidade.
Essas quebras de alianças (paradigmas) abriram as “porteiras”
para uma igreja frágil e fragmentada. A permissividade também
levou cristãos a fortalecer-se na quebra de alianças nos casamen-
tos, chegando-se a um número astronômico de divórcios dentro
das igrejas. Para não se alongar nos exemplos, concluímos que
nunca a instituição da família esteve tão debilitada como nos
nossos dias.

Há cura para as alianças quebradas?


Claro que sim! Cremos que Deus já começou a profetizar
sobre os ossos secos (Ezequiel 37) e já podemos ouvir o
barulho dos ossos se batendo e juntando. Já conseguimos
ver algumas juntas se encaixando (teria muitos exemplos
para contar), alguns tendões (ligamentos) se formando,
músculos e carnes crescendo, peles se estendendo. A oração
de Jesus em João 17 pela unidade está para se cumprir. O
Espírito Santo está preparado para soprar e trazer vida ao
Corpo a fim de que nos tornemos um “exército sobremodo
numeroso” como vimos no capítulo anterior, “um povo grande
e poderoso”.

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A restauração de alianças quebradas 281

Porém, o que podemos fazer? Ficar aguardando a ação plena


de Deus e dando continuidade às “quebras de alianças” sem li-
mites? Claro que não! O texto que usamos para introduzir este
capítulo (Atos 3.19-21) inicia dizendo: “Arrependei-vos, pois, e
convertei-vos...”.
A primeira coisa a fazer é reconhecer que nós, a nossa geração,
somos “quebradores de alianças” e fazemos isso espontaneamente,
sem nenhum pudor, sem temor a Deus.
Porém, se dissermos que pecamos e confessarmos os nossos
pecados de divisão, ele é fiel e justo para nos perdoar os pecados
e nos purificar de toda injustiça. Assim, passaremos a andar
na luz, como ele está na luz, e teremos comunhão uns com os
outros e o sangue de Jesus Cristo nos purifica de todo o pecado
(1 João 1.6-10, paráfrase nossa).

A segunda coisa que o texto fala é “convertei-vos”. Mas


poderíamos dizer: “Eu já sou convertido, já nasci de novo,
já fui batizado...”. Exatamente este é o tema do nosso livro
Reconciliação: O Segundo Toque.142 Baseado em Marcos 8.22-
26, Jesus cura um cego que não recuperou plenamente sua
visão no primeiro toque de Jesus e via homens como árvores
que andavam. Assim, Jesus tornou a impor as mãos em seus
olhos (o segundo toque) e ele ficou totalmente restabelecido
e passou a ver distintamente e de longe a todos.
A Palavra de Deus nos ensina que todos estão cegos espiri-
tualmente (o Evangelho está encoberto por Satanás, como diz
Paulo em 2 Coríntios 4.4). Portanto, precisamos de um toque
de Deus para a nossa salvação. O Espírito Santo, pela obra da
cruz, vivifica o nosso espírito (novo nascimento) e passamos a
ter revelação de Jesus Cristo.
142
MARION, José Carlos e Márcia. Reconciliação: O Segundo Toque. Ibid.

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282 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

Porém, em virtude de nossas culturas eclesiásticas e das


divisões, ainda que não sejamos mais “cegos espiritualmente”,
não conseguimos ver e amar os cristãos de outras denominações
que possuem doutrinas diferentes da nossa, não conseguimos
distingui-los como filhos de Deus, como irmãos em Cristo.
Essa visão míope e distorcida faz com que os vejamos apenas
como “árvores que andam”. Assim, precisamos nos converter
para a unidade do Corpo de Cristo. Se reconhecermos isto,
certamente, depois do arrependimento, o Senhor Jesus nos
dará este “segundo toque” e “cairemos” de amor pela Igreja
unida do nosso Senhor Jesus Cristo.

Confessar com arrependimento e honrar a aliança


No texto da primeira carta aos Coríntios, capítulo 11, ao referir-
-se às divisões desta igreja, Paulo fala sobre a ceia e nos alerta para
não a tomarmos indignamente. Ele nos exorta a uma autoanálise,
a um julgamento: “Examine-se, pois, o homem, e, assim coma o
pão, e beba do cálice, pois quem come e bebe sem discernir o corpo,
come e bebe juízo para si” (vv. 28, 29). Isto significa perguntar
a si mesmo: “Eu faço parte do Corpo de Cristo, tenho aliança
com o Corpo, tenho comunhão com este Corpo?” Claro que a
conotação não é apenas com uma célula Corpo, mas com todo o
Corpo. Ainda que fisicamente isto seja impossível, espiritualmente
podemos nos identificar com o Corpo no seu sentido mais amplo.
Se eu venho de alianças rompidas, é certo que a ceia que tomo
exclui, no mundo espiritual, grupos de irmãos com os quais tive
comunhão no passado. E isso precisa ser consertado. Esse conserto
pode ser, dependendo do exame que cada um faz, apenas com
Deus, e/ou com alguns irmãos, e/ou com uma congregação.
A Palavra de Deus nos ensina a “confessar nossas culpas uns aos
outros e orar uns pelos outros para sermos curados” (Tiago 5.16).

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A restauração de alianças quebradas 283

Entendo que a forma de confessar pecados depende da “publicida-


de” do pecado e da posição que a pessoa ocupa na igreja. Quanto
mais pública for a pessoa, quanto mais público for o pecado, mais
pública deverá ser a confissão.
No item anterior, falamos que confessar a Deus é o caminho
correto. Porém, quando, por exemplo, uma pessoa conhecida
reconhece que errou ao dividir sua igreja (congregação), levando
parte do rebanho (não só quebrando a aliança, mas “permitindo”
que outros também o fizessem), o correto é, além de reconciliar-se
com sua ex-liderança (irmãos que caminhavam juntos), confessar
que essa atitude não é bíblica para ambas as congregações.
Em 1987, começamos a Igreja Cristo Salva em Jundiaí. Era
uma igreja próspera, abençoada. Para nossa surpresa, de repente,
Deus nos tirou dela e nos levou para morar nos Estados Unidos
(1990) por dois anos. Ele queria falar conosco e nos preparar para
outra missão. Nós nos despedimos da igreja em paz. Fomos aben-
çoados e enviados pela igreja. Passamos o bastão para um pastor
com um potencial de levar a igreja a um crescimento maior ainda
(e, de fato, isso aconteceu).
De várias maneiras, o Senhor falou que nossa missão naquela
igreja havia terminado, que ele tinha um novo projeto para nós.
Porém, na nossa volta para o Brasil em 1992, fui seduzido por ho-
mens para voltar àquela igreja, desobedecendo à ordem do Senhor.
É claro que isso não daria certo. Ficamos lá por pouco tempo
e saímos para fazer a obra que o Senhor tinha para nós. Deixamos
uma “rachadura”, uma mancha para trás, pois tomamos a ceia
com aqueles irmãos e os deixamos. Isto foi uma quebra de aliança.
Muitos anos depois, fui dirigido pelo Espírito Santo a voltar
àquela igreja (agora no município de Itupeva) e, publicamente,
pedi perdão para o pastor a quem havia passado o “bastão”

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284 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

em definitivo e para toda a congregação. Confessei também o


fato à nossa atual congregação e vimos Deus Pai operar ma-
ravilhosamente naquela igreja (uma das maiores, atualmente,
da região), como também na igreja em que eu estava, com o
objetivo claro de trabalhar pela unidade. Uma aliança quebrada
foi restaurada.
A partir daí, ao longo de nossa história, tivemos algumas
situações de pastores que estavam conosco e sentiam direção
de expandir, multiplicar, ir com uma velocidade maior do que
a nossa. Tivemos casos de restauração de alguns pastores que
vieram buscar abrigo conosco. Ao liberar esses pastores, tínha-
mos direção do Espírito Santo para: a) liberar alguns membros
da nossa igreja a fim de ajudá-los nessa nova jornada; b) pagar,
no caso de serem remunerados pela igreja, um ano de salário e
INSS para que eles se sentissem seguros no suprimento de sua
família na nova jornada; c) abençoá-los e enviá-los tomando
a ceia do Senhor na despedida, deixando claro que não estava
havendo uma quebra de aliança, mas, na paz de Deus, seria
uma expansão do reino de Deus. Hoje, temos aliança com
todos eles e frequentemente somos convidados a estar em suas
congregações.
Conhecemos um pastor, muito famoso em Uberlândia/
MG, que, ao descobrir que alguns de seus pastores queriam
retirar-se com um grupo, evitou esta rachadura (quebra de
aliança) abençoando-os, fazendo tudo com transparência e
ajudando-os a iniciar uma nova obra, concedendo-lhes salário
(por um tempo) e liberando excelentes obreiros para ajudá-los.
A partir daí, este pastor, que preferiu enviar a dividir, viu sua
congregação crescer vertiginosamente.
Numa outra cidade, uma igreja soube que outra denominação
cristã estava chegando àquela cidade. Com a visão do reino, esta

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A restauração de alianças quebradas 285

igreja concedeu, por dois anos, alguns obreiros para ajudar na


implantação da nova congregação. Não os tratou como concor-
rentes, inimigos, mas como parceiros do Espírito Santo para a
expansão do reino de Deus.
Assim, é necessário, com transparência, diante do Espírito
Santo, ouvir de Deus como restaurar as alianças quebradas de
acordo com cada situação – mas também evitar que alianças sejam
rompidas por pessoas que saem de uma congregação. Nesse caso
(não que estimulemos a saída, mas, em alguns casos, ela parece
inevitável), os que nos deixam devem ir com a bênção pastoral,
enviados em paz pela igreja. É certo que diversas denominações
não concordam com isso, mas, repito, rachaduras, quebras de
alianças, à luz do Espírito Santo podem ser evitadas. A visão de
reino ameniza essa decisão, e passamos a ser testemunhas de que
Jesus realmente foi enviado “para que o mundo creia”.
Estamos em tempos de restauração e, certamente, Deus Pai
encaminhará cada coração arrependido para entrar nestes “tempos
de refrigério”. Assim, os céus não conterão mais o Senhor Jesus
(Atos 3.21), e ele poderá voltar. Amém!

O perdão que cura


Nada como o perdão como o grande recurso que Deus nos dá
para curar feridas, rachaduras, divisões, alianças quebradas.
Neste livro, citamos várias situações de relacionamentos
rompidos sendo curados pelo perdão. No capítulo 7, mostra-
mos que a autoridade de Deus na igreja de Jundiaí foi restau-
rada a partir da liberação do perdão, inicialmente entre dois
homens. No capítulo 8, narramos como o mover pela busca
da unidade do Corpo de Cristo alcançou países a partir da
proposta da prática do perdão por intermédio de um homem.
No capítulo 10, relatamos sobre uma comunidade na qual onze

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286 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

denominações cristãs diferentes convivem juntas há mais de 40


anos, pois seu lema é “ser rápido em perdoar e pedir perdão”.
Essa prática, felizmente, tem acontecido em diversas esferas. O
Congresso Cristão Lausanne 3 (que contou com a participação
de quatro mil líderes de 198 diferentes países que trabalham com
missões), realizado em 2010 na Cidade do Cabo, África do Sul
(“Um Chamado à Humildade, à Integridade e à Simplicidade”)
teve, dentre diversos acontecimentos, um momento especial
chamado de “Perdão regado de oração”:143
No último dia, a comissão brasileira, liderada pelo pastor Key
Yuasa, tomou a iniciativa de escrever uma carta pedindo perdão à
igreja africana pela triste história de escravidão no Brasil. Um dos
momentos mais emocionantes foi quando, após a leitura da carta,
durante a reunião regional da África, os líderes africanos pediram ao
grupo de sete brasileiros que representava a comissão que ficassem de
joelhos. Em meio a lágrimas, os irmãos da África oraram longamente
anunciando o perdão aos brasileiros; enquanto oravam, lembravam
o sofrimento vivido por mulheres e filhos, sem maridos e pais, que
foram trazidos cativos para o Brasil. Espontaneamente, um grupo de
africanos foi até a reunião da comissão brasileira e orou novamente
por eles. Nada poderia traduzir melhor e reunir os sentimentos de
todos do que a oração. O perdão foi regado pela beleza da oração.

Outro fato marcante, ainda em relação ao Brasil, no 7º


Congresso da Restauração (25/02/2013, Belo Horizonte/
MG), Peter Hocken (indicado pelo Vaticano para o diálogo
inter-religioso), autor de diversos livros sobre unidade e reno-
vação carismática, fez um comovente e emocionante pedido de
perdão aos judeus messiânicos. Este pedido se referia à perse-
guição da Igreja Católica aos judeus durante a Inquisição e em
143
Site: http://www.ultimato.com.br/revista/artigos/328/licoes-e-desafios-de-
-lausanne-3-para-a-igreja-de-cristo.

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A restauração de alianças quebradas 287

outros períodos.144 Este evento foi organizado pelo Ministério


Ensinando de Sião – Brasil, com a presença de centenas de
judeus messiânicos.
O papa Francisco, em 28 de julho de 2014, durante viagem
à cidade de Caserta (no sul da Itália) onde se reuniu com seu
amigo pessoal e pastor evangélico Giovanni Traettino e outros
pastores presentes de diversos países, pediu perdão pelas per-
seguições cometidas na Itália pelos católicos aos pentecostais
durante a Segunda Guerra Mundial. Diversas outras vezes,
este mesmo papa pediu perdão por motivos semelhantes (por
crimes da Igreja contra povos originários, na colonização, à
Igreja Valdense por perseguições, aos povos indígenas, etc.).
Antes dele, o papa João Paulo II já havia pedido perdão pela
Inquisição, pelo silêncio das autoridades eclesiásticas diante do
genocídio de judeus durante o nazismo, etc. Em dois mil anos
de história da Igreja Católica, não se sabe de outros papas que
tenham empregado tantas vezes a expressão “eu peço perdão”!
Esses pedidos de perdão coletivo têm fortalecido a busca da
unidade da Igreja de Cristo. É perceptível o avanço que esta-
mos tendo no “preparo do solo” para que a oração de Jesus de
João 17.21-23 se torne realidade pela ação do Espírito Santo.
Porém, este solo estará pronto para a ação do Espírito quando
nós, individualmente, reconhecermos que contribuímos para esta
chaga no Corpo, na Igreja. Às vezes, diretamente, não cometemos
tal pecado, mas os nossos “pais espirituais” o fizeram. Então, para
nos tornarmos uma geração curada, o perdão é indispensável.
No Encontro de Cristãos em Busca da Unidade e Santidade
(Sorocaba, 2012), senti, num ambiente de muito amor entre
católicos e evangélicos de diversas denominações, um forte desejo
144
Site: https://www.youtube.com/watch?v=RFyetNIAYew.

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288 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

de pedir perdão aos irmãos. Quis pedir perdão aos católicos por
todas as vezes em que os julguei, acusando-os em pleno púlpito,
duvidando da salvação deles. Meu pedido de perdão não foi à
Instituição, mas às pessoas em cuja vida aprendi a ver Cristo. Além
do mais, até minha juventude, frequentei ao catolicismo e, certa-
mente, ao deixá-lo com críticas, quebrei a aliança que tinha com
irmãos nascidos de novo. A partir desse fato, Deus Pai começou
a prosperar meu ministério neste mover.
Essa não foi a primeira vez em que eu fiz isso. Havia tam-
bém quebrado a comunhão com outros irmãos evangélicos
(com os quais havia participado da ceia) em, pelo menos, duas
denominações evangélicas.
A partir do momento em que nos sentamos à mesa, como
estudamos neste capítulo, com irmãos com quem estamos con-
gregando, passamos a ter aliança com eles. Se, por um motivo
de força maior, nos retirarmos desse Corpo aliançado, devemos
fazê-lo na luz, com a bênção e a liberação desses irmãos.
É importante, para não sermos instrumentos de impedimen-
to na concretização da oração de Jesus em João 17, que façamos
um exame da nossa jornada na Igreja de Cristo. Certamente, o
Espírito Santo nos revelará se estamos andando na luz e tendo
comunhão uns com os outros. Se assim agirmos, o sangue de
Jesus Cristo nos purificará de todo pecado (1 João 1.6,7).
Ter comunhão uns com os outros significa permanecer em
aliança, e alianças quebradas são restauradas unicamente pelo
perdão. Aliás, a Palavra de Deus nos ensina a reconciliar-nos
“depressa” com o irmão para que a nossa jornada como mem-
bros do Corpo seja validada pelo Pai Eterno (Mateus 5.22-26).
Louvado seja o nosso Senhor Jesus Cristo! Amém!

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SUGESTÕES BIBLIOGRÁFICAS145

ARRUDA, Pedro. A Comunhão Nossa de Cada Dia. CCC Edições,


Monte Mor/SP, 2010.
ASSIS, Eliasaf. Sementes Escondidas na Terra de Ninguém. Americana/SP:
Revista Impacto, Edição 80, 2014
BELMONTE, Kevin. O Livro dos Milagres – O poder extraordinário
de Deus atuando ao longo da história. Editora Thomas Nelson
Brasil, Rio de Janeiro/RJ, 2015.
BILLHEIMER, Paul E. O Amor Cobre Tudo: O padrão bíblico para
a unidade no corpo de Cristo. Editora Vida, São Paulo/SP, 1989.
BRONZATTO, Maurício. Mãe de Muitos Filhos. Edições Encenso,
São Paulo/SP, 2007.
CALISI, Matteo. Esperando Pentecostes – O quarto ecumenismo.
Editora Comunidade Obra de Maria, Recife/PE, 2003.
CAMPOS, Ismael. Para Que Todos Sejam Um. Editora Vida,
São Paulo/SP, 1993.
145
Nem toda a bibliografia aqui elencada foi citada neste livro. O objetivo é informar
ao leitor quantas publicações existem sobre esse tema. Claro, existem muitos outros
títulos que não foram aqui referenciados.

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290 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

CANTALAMESSA,Raniero. Preparate le vie del Signore: Per una


Evangelizzazione Ecumenica Mondiale in Preparazione Dell'anno
Duemile (Collana Fede e Annuncio). Edição italiana, EDB, 1994.
COLONA, Carlo. Cattolici ed Evangelici Insiene: è Possibile? Napoli,
Itália: Sapienza e Vita, 2015.
CURTIS, A. Kenneth; LANG, J. Stephen; PETERSEN, Randy. Os
100 Acontecimentos Mais Importantes da História do Cristianismo.
Editora Vida, São Paulo/SP, 2011, 4ª edição.
FAITH, Warner. The Charismatic Century – The Enduring Impact of
the Azusa Street Revival. Nova York/EUA, 2006.
FINTO, Don. Your People Shall Be My People. Regal, Venitura,
Califórnia, USA, 2001.
HARGRAVE, Gary. Is Christ Divided? North Hollywood, CA, USA:
Living Word Publications, 2014.
HIMITIAN, Jorge. Projeto do Eterno. Editora Atos Gospel.
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HOCKEN, Peter. Roman Catholics and Non-Denominational
Christians – Why we need each other. Palestra. Roma/Itália, 30
de abril de 2003.
HOCKEN, Peter. The Challenges of the Pentecostal, Charismatic
and Messianic Jewish Movements (Ashgate New Critical Thinking
in Religion, Theology, and Biblical Studies). Ashgate e-book, 2009.
HOCKEN, Peter. One Lord, One Spirit, One Body – The Ecumenical
Grace of the Charismatic Movement. Publ. Paternoster, 1987.
HOCKEN, Peter. The Glory and The Shame. United Kingdom: Eagle,
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HUGO, Victor. Os Miseráveis. Editora Martin Claret, São Paulo/SP, 2014.
INTRATER, Asher. Aliança. Americana/SP: Editora Impacto, 2015.
No prelo.

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Sugestões Bibliográficas 291

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2004
JUSTER, Daniel C. That They May Be One. Clarksville, Maryland,
USA: Lederes Books, A Division of Messianic Jewish Publishers.
2009.
KASPER, Walter. Que Todos Sejam Um. Edições Loyola, São Paulo/
SP, 2008.
KENDALL, R.T. Perdão Total – Superando o maior desafio de Deus.
Editora Matrix, São Paulo, 2011.
MAÇANEIRO, Marcial. O Caminho Ecumênico: Aos cinquenta anos
do Concílio Vaticano Segundo. TQ – Teologia em Questão, Facul
dade Dehoniana, Taubaté/SP.
MARION, José Carlos e Márcia. Ontem, Hoje e Amanhã com Jesus.
Editora Desena, Campinas/SP, 2009.
MARION, José Carlos; CASCALDI, Luiz Roberto. A Marca dos Filhos
– O único sinal que nos identifica como cristãos. Publique, Brasília/
DF, 2013, 2ª edição.
MARION, José Carlos e Márcia. Reconciliação: O Segundo Toque
– A Unidade do Corpo de Cristo e a Nova Evangelização. Impacto
Publicações, Americana/SP, 2014, 2ª edição.
MARION, José Carlos e Márcia. Reconciliation: The Second Touch.
Rio de Janeiro/RJ: APED, 2013.
MOORE, Beth. Liberte-se – Tornando a liberdade em Cristo uma
realidade em sua vida. Editora Bom Pastor, São Paulo/SP. Ano
desconhecido.
NICHOLS, Robert Hasting. A História da Igreja Cristã. Editora
Cultura Cristã, São Paulo/SP, 2004.
NICODEMUS, Augustus. Polêmicas na Igreja. Editora Mundo
Cristão, São Paulo/SP, 2015.

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292 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

PENN-LEWIS, Jessie. Guerra contra os Santos. Editora dos Clássicos,


Monte Mor/SP, 2001.
PRINCE, Derek. Anatomia do Corpo de Cristo. Americana/SP:
Editora Impacto Publicações. Mensagem revisada e atualizada em
março de 2010.
RUIBAL, Ruth. Unidade no Espírito. Universidade da Família,
Pompeia/SP, 2010.
SCHMITT, Charles P. Raiz em uma Terra Seca – Uma nova visão da
história da Igreja. Editora Atos, São Paulo/SP, 2003.
SYNAN, Vinson. O Século do Espírito Santo: 100 anos de avivamento
pentecostal e carismático. Editora Vida, São Paulo/SP, 2009.
TENNEY, Tommy. A Unidade Cristã e o Reavivamento do Corpo de
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YANCEY, Philip. Maravilhosa Graça. Editora Vida, São Paulo/SP,
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WALKER, Christopher. A Dança da Trindade. Impacto Publicações,
Americana/SP, 2014.
WALKER, John. Um Estudo Microscópico em Efésios. Impacto
Publicações. Americana/SP. Data desconhecida.
WALKER, John e outros. A Igreja do Século 20: A história que não
foi contada. Impacto Publicações, Americana/SP, 2013 (4ª edição).
WOLFF, Elias. Os Caminhos do Ecumenismo no Brasil. Editora
Paulus, São Paulo/SP, 2002.
WOLFF, Elias. A Unidade da Igreja – Ensaio de eclesiologia ecumênica.
Editora Paulus, São Paulo/SP, 2007.
WOLFF, Elias. O Que é o Ecumenismo. Editora Paulus, São Paulo/
SP, 2012.
VALLOTTON, Kris. Chuva Abundante – Como podemos transformar
o mundo que nos cerca. Editora Vida, São Paulo/SP, 2013.

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Sugestões Bibliográficas 293

ARTIGOS
“Aspetando la Pentecoste, IL Quarto Ecumenismo.” Entrevista a
Matteo Calisi e a Giovanni Trattino, Edizioni IL Mensagero, Padova,
Itália, 1996.

“From Aldersgate to Azusa Street: Wesleyan, Holiness, and Pentecos-


tal Visions of the New Creation.” Editado por Henry H. III Knight,
Eugene, OR, EUA, 2010.

“The Charismatic Century – The Enduring Impact of the Azusa Street


Revival.” Warner Faith, New York/USA, 2006.

“Unitatis Redintegratio – Decreto do Concílio Vaticano II sobre o


Ecumenismo.” CNBB, Editora Paulus, São Paulo/SP, 2005.

“Igreja no Mundo – Um Pentecostes Unificador.” José Carlos Marion


e Carlo Collonna. Americana/SP: Impacto Editorial, Revista Impacto,
edição de 29/04/2011.

ANAIS DO Encristus146
2008: Temas Livres e Testemunhos - Lavrinhas/SP – 30/04 e 01/05
2009: “Jesus e o mistério da Igreja” - Mariápolis/SP – 16 a 18/10
2010: “Trindade, lugar de unidade e serviço” - Rio de Janeiro/RJ –
20 a 22/08
2011: “Curados no Corpo de Cristo” - Pouso Alegre/MG – 05 a 07/08
2012: “Acolhidos no Corpo de Cristo” - Sorocaba/SP - 24 a 26/08
2013: “Pai Nosso” - Sorocaba/SP – 23 a 25/08
2014: "Ele pôs em nossos lábios a palavra da reconciliação" - Cachoeira
Paulista/SP (Comunidade Canção Nova) - 14 a 16/03
Alguns Anais estão em forma de gravação (CD ou DVD) e outros já foram transcritos
146

em forma de Apostilas. Para maiores informações e pedidos: www.encristus.com.br.


E-mail: luizcascaldi@terra.com.br.

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294 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

2014: "Bênção e vida na unidade" - Sorocaba/SP – 22 a 24/08


2014: "Solícitos em conservar a unidade no vínculo da paz" - Rio de
Janeiro/RJ, 18 e 19/10
2015: "Batizados no amor que gera a unidade" - Niterói/RJ, 21/03
2015: “Unidade como fruto do Espírito” - Sorocaba/SP, 29 e 30/08

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Anexo 1

CARACTERÍSTICAS
DO ENCRISTUS

1. Cristocêntrico – como diz a própria sigla, buscamos san-


tidade e unidade em Cristo, fundamento da Igreja (cf. 1
Coríntios 3.11). Somos cientes de que a unidade do Corpo
de Cristo é um dom do Espírito para a Igreja-Esposa, no
vínculo da Nova Aliança (cf. Efésios 5.25). Nenhuma de
nossas comunidades pretende confundir-se ou absorver-se
reciprocamente, mas convergir em Cristo Senhor, parti-
lhando, como irmãos, o discipulado do Evangelho. Tendo
consciência de que a desunião dos cristãos comporta feridas
históricas, entendemos que a cura dessas mesmas feridas
seja obra do amor de Deus, pelo Espírito Santo que nos foi
dado (cf. Romanos 5.5).

2. Fraterno – Os participantes do Encristus se reconhecem


como irmãos e discípulos do mesmo Senhor (cf. João 13.35).
Nossos encontros são marcados pela escuta do Evangelho,
valorização do que a graça divina tem feito em cada pes-
soa, adoração e testemunho comum. Há representantes
de comunidades e ministérios tanto tradicionais quanto

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296 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

mais recentes. Há ministros ordenados (pastores, presbí-


teros e bispos) e há ministros leigos (pregadores, obreiros,
adoradores, intercessores). Todos procuram acentuar mais
a fraternidade batismal e discipular do que os títulos e car-
gos – sem menosprezar a função de cada qual na sua igreja,
edificada pelo ministério pastoral.

3. Bíblico – A Palavra de Deus nos convida a viver congre-


gados em torno de Jesus como ramos unidos ao tronco
(cf. João 15.16,17; Romanos 12). Deus nos quer curados
de todo receio e divisão e visa à nossa reconciliação como
discípulos de Jesus (cf. João 17.21-23; 1 Coríntios 3.3-11;
2 Coríntios 5.18; Efésios 4.1-6; Atos 2.42-47). Quando
nos perguntam “como” ou “por que” nos reunimos, res-
pondemos com as palavras bíblicas: “Nisto conhecerão todos
que sois meus discípulos: se tiverdes amor uns aos outros” (João
13.35). Nenhuma voz é capaz de cancelar o chamado de
Jesus para seus discípulos: “Que todos sejam um, para que o
mundo creia” (João 17.21-23). Entendemos que o Encristus
acontece quando obedecemos a essa palavra bíblica.

4. Batismal – Nós concordamos fundamentalmente com o


princípio de que o batismo é um sacramento e ordenança do
próprio Jesus, celebrando-o com água, em nome do Pai e do
Filho e do Espírito Santo (cf. Mateus 28.19). Algumas de nos-
sas comunidades necessitam reconhecer o batismo ministrado
pelos demais (cf. Efésios 4.5). Apesar disso, dispomo-nos a
ver, uns nos outros, os frutos da graça operante. Em comum,
reconhecemos nossa condição de pecadores e a necessidade
da graça justificante que nos capacita às boas obras (Efésios
2.8-10). Reconhecemos, ainda, que nosso discipulado tem
sido corroborado pelo derramamento do Espírito Santo sobre
católicos e evangélicos, com a efusão de dons e carismas.

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Anexo 1 - Características do Encristus 297

5. Espiritual – O Encristus é um caminho que trilhamos


juntos, no Espírito de Cristo (cf. 1 Coríntios 12.4). Somos
cientes dos séculos de distância que nos afastam historica-
mente. Somente pela graça é que podemos acolher o dom da
unidade, que cresce com a nossa busca comum de santidade
(cf. Efésios 4.4). O mesmo Espírito Santo nos ungiu e nos
congregou no único Senhor Jesus, antecipando na oração e
na amizade aquela unidade plena que esperamos viver um
dia, no nível mais amplo de nossas igrejas, comunidades
e ministérios (cf. 1 Coríntios 12.13). Ninguém, por si só,
está capacitado para prosseguir no caminho da santidade e
da unidade se não for guiado pelo Paráclito, com vínculo
de caridade (cf. 1 Coríntios 13.13).

6. Apostólico – Como crentes e discípulos, somos herdeiros


da fé apostólica manifestada no início da igreja cristã: “per-
severaram na doutrina dos apóstolos e na comunhão, no partir
do pão e nas orações” (Atos 2.42). Esta herança comum nos
anima e nos compromete a dar “testemunho da ressurreição
do Senhor Jesus” à semelhança dos apóstolos (cf. Atos 4.33).
Queremos orar uns pelos outros, vivendo em amor, para
que todos se edifiquem mutuamente sobre o alicerce dos
apóstolos e profetas, tendo como pedra angular o Cristo
ressuscitado (cf. 1 Pedro 2.4-7). Buscando unidade e san-
tidade, ouvimos a exortação de Pedro: “Finalmente, sede
todos de igual ânimo, compadecidos, fraternalmente amigos,
misericordiosos, humildes...” (1 Pedro 3.8). Como nos ensina
Paulo, a nossa reconciliação em Cristo é ao mesmo tempo
ministério e apostólico (cf. 1 Coríntios 5.17,18).

7. Eclesial – O Encristus é eclesial, pois nos reconhecemos


membros do Corpo de Cristo, remidos na sua morte e
ressurreição e vinculados mutuamente pelo Espírito Santo,

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298 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

pelo batismo e pelo amor fraterno (cf. Romanos 12). Além


disso, entendemos que a Igreja de Cristo queira crescer em
nossas comunidades como ramos daquela videira que o
Senhor plantou pela Palavra, pela justificação e pela ação
renovadora do Espírito Santo – que é Espírito de unidade
e paz (cf. João 15.5-9; Gálatas 3.27,28; Efésios 4.4). O
Encristus não é “eclesiástico” (sentido institucional), mas
“eclesial” (sentido discipular): todos os seus participantes,
cada qual a seu modo, estão vinculados a igrejas e comuni-
dades organizadas, onde partilham sua fé de modo fraterno,
servidor e apostólico, confessando Jesus Cristo, conforme
as Escrituras.

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Anexo 2

HISTÓRICO DOS EVENTOS

FUNDAÇÃO DO Encristus: 2008


TEMA: Livre, com testemunhos diversos
Lavrinhas/SP – 30 de abril e 01 de maio de 2008
Preletores:
–– Mons. Jonas Abib (fundador da Comunidade Canção
Nova/Brasil)
–– Prof. Matteo Calisi (fundador da Comunidade de Jesus,
Bari/Itália)
–– Pr. Jorge Himitian (Igreja Cristã da Argentina e presidente
do Creces)
–– Bp. Alan Fonseca (igreja não denominacional/USA)
–– Rev. Tony Palmer (Igreja Anglicana/Inglaterra; partiu para
o Senhor em julho de 2014)
–– Pe. Marcial Maçaneiro (assessor da Comissão para o
Ecumenismo da CNBB/Brasil)

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300 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

–– D. José Moura (presidente da Comissão para o Ecumenismo


da CNBB/Brasil)

Testemunhos:
–– Pr. Abilio Chagas (Igreja Comunicação e Missão Cristã/
Bauru/Brasil)
–– Sra. Doris Hoyer (fundadora Comunidade Bom Pastor/
Rio de Janeiro/Brasil)
– – Pe. Enrique (fundador da Comunidade Aliança de
Misericórdia/São Paulo/Brasil)
–– Pr. Silvestre (Igreja Batista/São Paulo/Brasil)

1º Encristus 2009
TEMA: “Jesus e o mistério da Igreja”
Mariápolis/SP – 16 a 18 de outubro de 2009
Preletores:
–– Pe. Marcial Maçaneiro, SCJ (Taubaté/Brasil)
–– D. Francesco Biasin (bispo de Pesqueira e membro da
Comissão para o Ecumenismo da CNBB/Brasil)
–– Pr. Jamê Nobre (Comunidade Cristã Missionária/Brasil)
–– Pr. Jorge Himitian (Igreja Cristã da Argentina)
–– Pr. Rui Luís Rodrigues (Comunidade Carisma/Brasil)
–– Prof. Matteo Calisi (fundador da Comunidade de Jesus,
Bari/Itália)

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Anexo 2 - Histórico dos eventos 301

2º Encristus 2010
TEMA: “Trindade, lugar de unidade e serviço”
Rio de Janeiro/RJ – 20 a 22 de agosto de 2010
Preletores:
–– D. Orani João Tempesta, Cist (arcebispo do Rio de Janeiro;
atualmente, cardeal)
–– Sra. Angela De Bellis (Comunidade de Jesus/RJ)
–– Sra. Iete Aleixo (Comunidade Bom Pastor/RJ)
–– Pr. Rui Luis Rodrigues (Comunidade Carisma/Osasco/SP)
–– Pr. Jamê Nobre (Comunidade Cristã Missionária/Jundiaí/
SP)
–– Pr. Vinci Barros (pastor da igreja em Vitória/ES)
–– Pr. Jorge Himitian (Igreja Cristã da Argentina)
–– Pe. Marcial Maçaneiro, SCJ (Taubaté/SP)

3º Encristus 2011
TEMA: “Curados no Corpo de Cristo”
Pouso Alegre/MG – 5 a 7 de agosto de 2011
Preletores:
–– Sr. Reinaldo Beserra dos Reis (Renovação Carismática
Católica/Sorocaba/SP)
–– Pr. Jamê Nobre (Comunidade Cristã Missionária/Jundiaí/
SP)
–– Sr. Pedro Arruda (Comunidade Católica)
–– Sra. Iete Aleixo (Comunidade Bom Pastor/RJ)

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302 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

–– Federico Palácios (Córdoba/Argentina)


–– Tony Sanches (Kansas City/EUA; partiu para o Senhor em
julho de 2015)
–– Pr. Rui Luís Rodrigues (Comunidade Carisma/Brasil)

4º Encristus 2012
TEMA: “Acolhidos no Corpo de Cristo” (1 Pedro 2.7-11)
Sorocaba/SP - 24 a 26 de agosto de 2012
–– Palestra 1 – “Hospitalidade para a unidade” (Pe. Marcial)
–– Palestra 2 – “Pluralidade e mutualidade para a unidade”
(Prof. Matteo Calisi)
–– Palestra 3 – “O Espírito Santo como dom para anunciar a
Palavra de Deus” (Pr. Rui Rodrigues)
–– Palestra 4 – “O serviço como dom” (Pe. Wagner)
–– Testemunhos: Sra. Angela De Bellis e Prs. José Carlos e
Márcia Marion
–– Palestra 5 – “Tudo para a glória de Deus” (D. Francesco
Biasin e Pr. Jamê Nobre)

5º Encristus 2013
TEMA: “Pai Nosso” (Mateus 6.9-13)
Sorocaba/SP – 23 a 25 de agosto de 2013
–– Palestra 1 - “Adoção de filhos, base da vida de oração”
(Pe. Marcial Maçaneiro)
–– Palestra 2 - “A horizontalidade da vida de oração” (Sr. Pedro
Arruda)

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Anexo 2 - Histórico dos eventos 303

–– Palestra 3 - “O reino, objeto da oração” (Pe. Douglas


Pinheiro)
– – Palestra 4 - “Perdão como condicionante da oração”
(Pr. Harold Walker)
–– Palestra 5 - “Orando, vencer o mal da divisão” (Pr. Rui
Rodrigues)

6º Encristus 2014
TEMA: "Ele pôs em nossos lábios a palavra da reconciliação"
(2 Coríntios 5.18-20)
Cachoeira Paulista/SP (Comunidade Canção Nova) - 14 a 16
de março de 2014
–– Palestra 1 – “Tempo de reconciliação” (Pr. Jamê Nobre)
– – Palestra 2 – “A reconciliação na história da R.C.C.”
(Sr. Reinaldo Bezerra dos Reis)
–– Palestras 3 e 4 – “Não imputando aos homens as suas
transgressões” (Sr. Pedro Arruda e Pr. José C. Marion)
–– Palestras 5 e 6 – “Deus mesmo nos exorta” (Pr. Jorge
Himitian e Pe. Douglas Pinheiro)
–– Palestras 7 e 8 – “Embaixadores da reconciliação” (Pe. Marcial
Maçaneiro e Pr. Rui Rodrigues)
–– Testemunho – Comunidade Aleluia/EUA (Bob Garrett e
Dan Almeter)
–– Palestras 9 e 10 – “Reconciliai-vos com Deus” (Pr. Jorge
Himitian e D. Francesco Biazin)

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304 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

7º Encristus 2014 – REGIONAL SÃO PAULO


TEMA: “Bênção e vida na unidade” (Salmo 132 ou 133)
Sorocaba/SP – 22 a 24 de agosto de 2014
–– Palestra 1 – “Um só Corpo: A unidade da Igreja como
profecia e como missão” (Sr. Pedro Arruda)
–– Palestra 2 – “A santíssima Trindade como paradigma da
unidade da Igreja (Pr. Christopher Walker)
–– Palestra 3 – “A unidade da Igreja no projeto paterno de
Deus (Pr. Álvaro Luiz Paulucci)
–– Palestra 4 – “Os esforços pela unidade da Igreja ao redor
do mundo (Pr. José C. Marion)
–– Palestra 5 – “A unidade da Igreja e a renovação da vida
comunitária (Pe. Douglas Pinheiro)
–– Palestra 6 – “A dimensão escatológica da unidade cristã”
(Pr. Rui Rodrigues)

8º Encristus 2014 – REGIONAL RIO DE JANEIRO


TEMA: “Solícitos em conservar a unidade no vínculo da paz”
(Efésios 4.3)
Rio de Janeiro/RJ, 18 e 19 de outubro de 2014
–– Palestra 1 – “Conservar a unidade do espírito no vínculo
da paz” e “Cortesia ecumênica” (Pr. José Carlos Marion)
–– Palestra 2 – “Foram chamados pela primeira vez de cristãos
(Pe. Antonio José)
–– Palestra 3 – “De discípulos à plenitude de Cristo (Pr. Silas
Esteves)

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Anexo 2 - Histórico dos eventos 305

– – Palestra 4 – “O poder do ministério de reconciliação


(Pr. Silas Esteves)

9º Encristus 2015 – REGIONAL RIO DE JANEIRO


TEMA: “Batizados no amor que gera a unidade”
Niterói/RJ, 21 de março de 2015
–– Introdução – Pr. José Carlos Marion
–– Palestra 1 - "Andeis na vocação a que fostes chamados"
(Prof. Matteo Calisi)
–– Palestra 2 - "A unidade de Espírito" (Pe. Marcial Maçaneiro)
–– Palestra 3 - "Revesti-vos de amor" (Pr. Silas Esteves)
–– Testemunho – Irmã Doris Hoyer de Carvalho

10º Encristus 2015 – REGIONAL SÃO PAULO


TEMA: “Unidade como fruto do Espírito” (Gálatas 5.16-26)
Sorocaba/SP, 29 e 30 de agosto de 2015
–– Palestra 1 – “O fluir do Espírito Santo na unidade do
Corpo” (Pr. Bruno Ierullo, Igreja Cath The Fire, Canadá)
–– Palestra 2 – “Amizade para unidade” (Sr. Pedro Arruda)
–– Palestra 3 - “A promessa e a vida no Espírito (Pr. Christopher
Walker)
– – Palestra 4 - Testemunho (Irmã Ádola – Irmandade
Evangélica de Maria, Curitiba/PR)
–– Palestra 5 – “Os frutos do Espírito: perseverando na
unidade” (Pe. Marcial Maçaneiro)
–– Palestra 6 - Testemunho (Sr. Reinaldo B. dos Reis)

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306 Um só Corpo, um só Espírito, um só Senhor

–– Palestra 7 – “A carne vencida pelo Espírito” (Pe. Douglas


Pinheiro)
–– Palestra 8 – “Ser Igreja para os outros” (Pr. Rui Rodrigues)
–– Domingo às 7h30 – Missa celebrada pelos padres Douglas
Pinheiro e Marcial Maçaneiro e culto evangélico ministrado
pelos pastores José Carlos Marion e Luiz Roberto Cascaldi.

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