Uma Reflexão Acerca Da Vigilância Contemporânea Como Um Impacto Social Do Medo PDF

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UMA REFLEXÃO ACERCA DA VIGILÂNCIA CONTEMPORÂNEA


COMO UM IMPACTO SOCIAL DO MEDO: AS CONTRIBUIÇÕES DE
MICHEL FOUCAULT E ZYGMUNT BAUMAN
A reflection on the contemporary surveillance as a social impact of fear: the contributions of
Michel Foucault and Zygmunt Bauman

Fabio Costa Peixoto a

(a)
UFRJ, Rio de Janeiro, Rio de Janeiro – Brasil, e-mail: fabiocope@gmail.com.

Resumo
A temática do medo tem se constituído em um valoroso objeto de estudo que tem recebido uma
considerável atenção nas duas últimas décadas. Associados a ele, alguns temas paralelos também
receberam o devido destaque como a Segurança e a Vigilância e de onde o segundo será um dos focos
desta discussão oriundo da importância recebida por esta seja no que se refere como tema de pesquisa
tanto quanto uma preocupação cotidiana de maior parte dos moradores das grandes metrópoles quiça do
mundo. Visando reforçar a conexão entre o medo e a Vigilância adotou-se as abordagens de Michel
Foucault e Zygmunt Bauman com o propósito de aperfeiçoar a compreensão destas relações com o
processo de dominação social através destes autores que através de novos enfoques conseguiram captar
nuances típicas desta relação. Consequentemente, é possível destacar algumas conclusões relevantes
acerca dos olhares destes autores principalmente no que concerne a Vigilância, a sua composição e as suas
consequências, onde os primeiros são exemplificados pelo reforço dos aparatos de Vigilância sejam eles
de cunho físico ou simbólico que acabam por estimular a ação do poder disciplinas. Já as principais
consequências pode ser assinaladas através do aumento considerável dos sistemas de Vigilância
especialmente através da adoção de novas tecnologias onde aí são incluídas as técnicas de controle
individual. Nesta direção, esta reflexão buscou ressaltar mais ainda contribuição destes autores a Teoria
Social Contemporânea e consequentemente ao tema da Vigilância e de seus temas associados como a
Segurança, por exemplo. Ao destacarem processos de grande amplitude como a Era de Segurança, no caso
de Foucault e da Modernidade Líquida, como assinala Bauman, percebe-se o espraiamento dos mesmos
sobre as relações societárias repercutindo sobre as formas de controle social representados aqui pela
Vigilância que acabou por se transformar em uma estrutura direcionada a proteção tornou-se também em
um uma eficiente ferramenta de controle social.

3o Simpósio Internacional LAVITS: Vigilância, Tecnopolíticas, Territórios. 13 à 15 de Maio, 2015. Rio de Janeiro, Brasil, p. 680-
693. ISSN 2175-9596
PEIXOTO, Fábio. 681

Palavras-chave: medo, vigilância , Bauman, Foucault.

Abstract
The theme of fear has been constituted as a worthy object of study that has received considerable
attention in the last two decades. Associated with it, some parallel themes were also given due
prominence as the Security and Surveillance and where the second will be one focus of this
discussion coming from the amount received by this is in relation to research topic as much as an
everyday concern Most residents of large cities in the world perhaps. To strengthen the
connection between fear and Surveillance was adopted approaches of Michel Foucault and
Zygmunt Bauman in order to improve understanding of these relationships with the social
domination process by these authors through new approaches were able to capture nuances
typical of this relationship . Consequently, it is possible to highlight some relevant conclusions
about the looks of these authors especially with regard to surveillance, its composition and its
consequences, where the former are exemplified by strengthening surveillance devices whether
physical or symbolic nature which ultimately stimulate the action of the power disciplines.
Already the main consequences can be signaled by the considerable increase in surveillance
systems especially through the adoption of new technologies where individual control techniques
are the inclusion therein. In this direction, this reflection has sought to emphasize further
contribution of these authors to Contemporary Social Theory and consequently the subject of
surveillance and its associated issues such as security, for example. By highlighting large-scale
processes such as Security was in the case of Foucault and Modernity Net, as Bauman points out,
the spreading is noticed the same on corporate relations repercussions on the forms of social
control represented here by the surveillance which eventually turn into a targeted structure
protection has also become in a efficient tool of social control.
Keywords: fear, surveillance, Bauman, Foucault.

INTRODUÇÃO

A temática da vigilância tem sido frequentemente destacada na sociedade contemporânea como


as que são vivenciados nas grandes metrópoles onde a insegurança e o medo que estimulam
através de uma considerável força uma resposta a este ambiente pautado no perigo e no risco eis
que surge a Vigilância como uma saída pertinente para este clima.

Logo, ela se configura em um estímulo autoprotetivo individual e/ou coletiva que ocorre através
da implementação de aparatos de segurança e que se tornará o seu principal objeto de estudo, os
aparatos de Vigilância e mais propriamente, a Vigilância em sua dimensão mais ampla.

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Então, esta reflexão se propõe a conectar dois elementos importantes no contexto descrito, que
são o medo e uma de suas principais respostas, a Vigilância. Eles podem ser associados
especialmente através dos efeitos da ação do medo que se convencionou denominar como
“impactos sociais do medo” e a ascensão de uma Vigilância Líquida defendida por Zygmunt
Bauman.

Então, uma reflexão em torno destes elementos abrem caminhos relevantes para a análise
principalmente ao considerar que o medo pode ser um item que alimenta os aparatos de
Vigilância e este se retroalimenta medo com uma considerável frequência o que acaba por
fomentar um fenômeno complexo e que tem que ser compreendido em sua totalidade. Após a
explanação dos princípios basilares dos impactos sociais do medo e que vão possibilitar uma
consideração da importância adquirida pela Vigilância como estratégia para superar um ambiente
permeado predominantemente pelo risco e pela insegurança. Nesta direção, destaca-se a
relevância da Vigilância como um princípio estruturante através do foco na busca por Segurança
seja ela de cunho individual e/ou coletiva.

Assim é possível destacar a relevância que a Vigilância adquire neste contexto inserindo-a como
um significativo impacto social do medo como será analisado mais detidamente no item seguinte.

DEFININDO O IMPACTO SOCIAL DO MEDO

O medo se tornou um considerável elemento na dinâmica societária atualmente nas grandes


metrópoles o que estimulou a proliferação de diversas reflexões motivado principalmente pelo
contexto de crescimento acentuado da violência urbana no final dos anos 1980 incentivaram um
momento propício a partir dos anos 1990 para o texto favorecimento do fortalecimento dos
Estudos Urbanos significativamente neste período.

Da Criminologia, obteve-se a preocupação em compreender a ocorrência do crime e do medo que


porventura era gerado a partir dele como parte de um perfil desejado pelo criminoso como um
atrativo que o tornaria uma possível vítima inserindo-a em um certo perfil de vitimização.
Decorrente desta postura, a Criminologia passa a enfatizar o medo do crime como um elemento
de crucial importância no processo de construção do sentimento de insegurança como um
fenômeno social que não possui ligação direta com a taxa de ocorrência de crimes em um

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determinado espaço social o que acaba lhe conferindo uma considerável posição de um fenômeno
social que merece uma atenção especial.

Este fenômeno acaba adquirindo uma relevância ao se constituir em um objeto de estudo


complexo como assinalara Borges (2012) que se dedicou a compreender o medo do crime e as
suas relações sociais no caso da cidade do Rio de Janeiro através de suas “crenças de perigo” que
também se apropria de sua dimensão simbólica para justificar a sua atuação.

Já a Sociologia e a Antropologia Urbana adotaram o medo e as suas consequências como um


valoroso objeto de estudo ao enfoca-lo com a sua relação com a insegurança e as questões
relativas a Segurança Pública permitindo a criação de uma série de interpretações como aquelas
assinaladas por Teresa Caldera (2010); Cornélia Eckert (2012) e Luis Antônio Machado da Silva
(2004) e que contribuíram enormemente para um ambiente propício para que o medo se tornasse
alvo de diversas reflexões mais recentes de jovens autores como Najla Franco (2013) e Samuel
Jaenish (2013) que possibilitaram uma abordagem mais abrangente para se observar novos
aspectos e novas perspectivas sobre o medo.

Dentre estes, salienta-se a relevância dos impactos sociais do medo. Eles podem ser melhor
delimitados como uma consequência da ação do medo como uma variável de relevante peso que
passou a demonstrar uma gama de elementos associados ao medo.

Nesta direção, o medo passa a apresentar uma série de variantes (ou de seus aspectos) que
adquirem uma significância ao desnudar novas de relações e fenômenos sociais que são objetos
da atenção de diversos pesquisadores.

Um deles, os impactos sociais do medo serão objetos desta preocupação. Eles podem ser
caracterizados como os efeitos da ação do medo em suas múltiplas dimensões sejam eles,
subjetivas e/ou objetivas, acabando por recuperar o caráter difuso e insinuante do medo.

Logo, destacam-se os aspectos objetivos dos impactos sociais do medo que são derivados
diretamente do crime como, por exemplo, um aumento da taxa de ocorrência de furtos contra o
patrimônio e a degradação do espaço físico possuindo um efeito mais direto sobre este efeito do
medo.

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Outros elementos deste aspecto são exemplificados pelo reforço dos aparatos de segurança que
são estimulados por uma profusão de um medo difuso que é instaurado através da ação de
determinados atores como a mídia, por exemplo.

Estes aparatos podem representar um avanço considerável no que se refere ao estímulo a proteção
através destes aparatos sejam eles através de sistemas de vigilância como sistemas de
rastreamento, de câmeras e de registro assim como o reforço crescente da construção de
condomínios fechados como fortes indícios que fortalecem a importância destes aparatos.

Já o aspecto subjetivo pode ser representado pelas mudanças comportamentais e simbólicas


direcionadas a autoproteção principalmente de cunho individual que estariam relacionadas com
uma resposta a ação do medo. As primeiras podem ser melhor apontadas como algumas técnicas,
atitudes e estratégias direcionadas a autoproteção individual que vão caracterizam o cotidiano
dos moradores das grandes metrópoles principalmente.

Já os elementos simbólicos podem ser descritos como percepções, representações sociais e


discursos que conformam uma determinada situação social onde o medo passa a ser uma variável
significativa.

A RELEVÂNCIA DA VIGILÂNCIA NO MUNDO CONTEMPORÂNEO

O apontamento da importância adquirida pela Vigilância nas duas últimas décadas tem merecido
uma especial atenção devido principalmente a dedicação a um reforço crescente na busca por
segurança na sociedade contemporânea.

Nesta direção, ressalta-se um conjunto de transformações que se originaram na sociedade urbano-


industrial da segunda metade do século XIX e que se tornaram mais evidentes com a
consolidação das metrópoles com uma intensidade maior a partir da segunda metade do século
XX.

Elas sinalizam para uma crescente necessidade de aumentar o sentimento de segurança e


pretendendo reduzir os efeitos apresentados pelo risco em se tornar o próximo alvo do crime.
Esta situação esboça uma valorização da Vigilância seja a partir dos meados do século XX seja

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ela a partir dos meados do século XX seja ele representada pela implementação de uma segurança
privada1 e mais tardiamente uma Vigilância de base eminentemente tecnológica.

Derivado disto construiu-se aparatos de Vigilância constituídos por duas abordagens por serem
complementares apresentam uma considerável similitude que será destacada mais adiante.

Como foco principal deste momento da reflexão, será realizado uma discussão acerca dos
aparatos da Vigilância em vigor e como eles afetam as relações societárias em curso.

Ao se observar a necessidade de reforço da Vigilância, constatou-se que a presença de um


complexo aparato de Vigilância constituído de uma parte pautada em um sistema de
monitoramento através de câmeras e seguranças armados ou não mas principalmente através de
monitoramento eletrônico via redes sociais ou via rastreamento o que suscita a necessidade de um
estudo mais aprimorado sobre tal assunto.

Assim, os efeitos sociais do segundo formato de Vigilância é que a partir do qual urge a
necessidade de uma reflexão mais focada especialmente acerca dos efeitos disciplinares deste
fenômeno. Estes evidenciam um fortalecimento de ferramentas disciplinares no sentido da
redução dos riscos e dos perigos fomentados por uma certa aleatoriedade da ocorrência de crimes
que devem ser evitados através da sistematização de condutas e práticas que reduzam o risco e o
perigo de determinadas situações.

Então, a relevância da Vigilância torna-se um valioso objeto de estudo a receber a sua devida
atenção. Nesta direção, decidiu-se por selecionar como interlocutores importantes na tarefa de
compreender as nuances da Vigilância e de sua relação com o medo e de seus impactos sociais,
Michel Foucault e Zygmunt Bauman.

Devido ao fato destes autores interagirem satisfatoriamente entre as dimensões micro e macro de
análise permitiram a percepção dos detalhes de suma importância para a compreensão destas
relações será demonstrado no item seguinte desta reflexão.

CONTRAPONDO FOUCAULT E BAUMAN: DOIS OLHARES, UMA MESMA


PREOCUPAÇÃO

1 Aqui leia-se indivíduos dedicados a segurança individual ou de uma propriedade.

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A relevância da temática Vigilância tem sido frequentemente destacada a partir de inúmeros


estudos em diversos setores da Teoria Social. Dentre eles, dois se destacam e se tornam
importantes interlocutores: Michel Foucault e Zygmunt Bauman.

A justificativa para adoção destes autores se deve ao fato de que ambos possuem a mesma
preocupação que é a de compreender como ocorre as estruturas de dominação social sem, no
entanto recorrerem a uma vertente mais clássica do pensamento marxista, ao elaborarem a sua
análise.

Nesta análise, destacam-se seus olhares no caso de Foucault, de um pós-estruturalista e no caso


de Bauman, de um pós-moderno. Estas formas distintas de observar o objeto de estudo,
possibilita uma melhor compreensão dos impactos sociais do medo com um destaque maior para
a Vigilância e seus aparatos.

A abordagem pós-estruturalista2 proposta por Michel Foucault consegue ofertar uma série de
elementos especialmente no que se refere a dimensão microsocial que vai desde a ação de
micropoder atuante cotidianamente que vai se intensificando a partir da formatação dos corpos
através de sua docilidade seja através do incentivo ao “cuidar de si” que suscita uma série de
questões relacionadas a Segurança e Vigilância.

A partir deste instrumental teórico é possível elaborar uma reflexão acerca do medo (e de seus
impactos sociais) e o acirramento da necessidade da Vigilância e de seus aparatos como um
resultado da instalação de um Estado de Segurança como assinalado por Foucault.

Este contexto vai ofertar um objeto de estudo que vai se basear na Vigilância como um resultado
da implementação deste Estado de Segurança enfatizando a diminuição dos riscos e do perigo na
vida cotidiana.

2 Esta denominação acaba por funcionar como um restringidor da importância deste autor, pois ao permitir a
elaboração de um método de trabalho amplo e sem estar limitado as amarras propostas pelo método marxista de análise,
conseguiu captar nuances valiosas acerca das estruturas de controle social.

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A partir de outra perspectiva, é possível dialogar com Zygmunt Bauman no que tange a
Vigilância e principalmente ao referencia-la em um seu aspecto eminentemente líquido3
possibilitando uma abordagem mais intensa e dispersa sobre o que este autor convencionou
denominar como “modernidade liquida”.

Este autor vai elaborar duas relações que nortearão a interlocução com este autor: a relação entre
(in) segurança e vigilância e os efeitos da vigilância a partir de um olhar ético na direção em que
ela interage cotidianamente com a aprovação ou não dos mesmos.

Outro aspecto importante destacado por Bauman consiste da indicação de que a Vigilância
Líquida possuiria uma condição de pós-panóptico, ou seja, a Vigilância funcionaria como uma
ferramenta de controle tanto sobre os de “fora4” quanto os de “dentro”.

Esta colocação é consideravelmente emblemática, pois sinaliza para uma dubiedade da Vigilância
não como uma mera ferramenta de proteção, mas ela acaba funcionando como um instrumento de
controle social.

A partir da apresentação, a argumentação de Bauman adquire substância ao indicarem para novas


formas de controle social que adviriam de um conjunto de ferramentas que visariam o reforço da
segurança.

Logo, torna-se possível apontar para uma preocupação central de ambos os autores que visam
compreender como é elaborado a lógica dos instrumentos de controle social que mesmo
separados por décadas de diferença ainda guardam considerável semelhança em suas análises.

1. Michel Foucault e a análise da Vigilância

A amplitude da temática da Vigilância suscita uma abordagem com um amplo alcance e que
estimule uma interlocução com outros campos do conhecimento como a História e a Filosofia,

3 Por líquido, Bauman desejou enfatizar o caráter fluído das relações sociais no atual momento histórico onde acaba
por se configurar uma nova dinâmica social que é intensamente discutida pelo autor ao longo de suas inúmeras obras sobre
este assunto.

4 Este termo foi criado pelo próprio Bauman em sua obra “Globalização: as consequências humanas” a partir de uma
preocupação em uma melhor qualificação da exclusão e da inclusão na modernidade líquida.

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por exemplo. Neste sentido, Foucault oferta uma valiosa contribuição ao assinalar a expansão de
um processo societário que ele denominou como “Era de Segurança”.

Ele compreende como a “Era da Segurança” a partir de um intenso estímulo a Segurança seja ele
através de uma sociedade de segurança seja através de do incentivo a um espaço de segurança.
Eles são considerados indícios de um processo amplo que indica para a ascensão da segurança e
seus temas correlatos como a Vigilância, por exemplo, como o princípio norteador da
sociabilidade em vigor.

Foucault ressalta que a “segurança é uma certa maneira de acrescentar, de fazer funcionar, além
de mecanismos propriamente de segurança, as velhas estruturas da lei e da disciplina.“ (Foucault,
2008, p.14) . Estes são ressaltados cotidianamente como uma espécie de atualização das
estratégias de evitamento do risco e do perigo.

Logo, destaca-se a proposição em que Foucault defende a existência de uma sociedade de


segurança onde ocorre “efetivamente uma economia geral do poder que tenha a forma [de] ou
que, em todo caso, seja dominada pela tecnologia da segurança” (Foucault, 2008, p.15).

Este contexto então é salientado através de uma ênfase fornecida pela segurança e seu efeito mais
visível, a Vigilância. Ela pode ser alcançada a partir do estímulo a disciplina. Por este lado, a
disciplina mesmo sendo superada como uma era5 exerce então um caminho para o efetivo
exercício da Vigilância.

Inicialmente tem que considerar a disciplina como uma forma de exercício do mecanismo de
poder. Como exemplo deste poder, o poder disciplinas é produtor de saberes e discursos que
o sustentam e o definem. Esses saberes são responsáveis pelas construções de
subjetividades através da instauração e legitimação de discursos pretensamente verdadeiros.
Teodoro & Aquino, 2014, p.3).

Consequentemente, a criação de toda uma estrutura de exercício deste tipo de poder passando
pela ação deste poder alcançando a produção e a sua (re) produção através de saberes e discursos
acaba por efetuar um arcabouço de ações pautado no exercício da disciplina e em sua
representação mais palpável a Vigilância.

Nesta direção, a Vigilância

5 Transição esta destacada por Foucault o que permitiu a ascensão de uma Era de Segurança.

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atua como um mecanismo disciplinar a partir do momento em que se verifica


que é mais vantajoso vigiar que punir onde seu funcionamento ocorre através da
criação de um espaço no qual os acontecimentos serão conhecidos e as pessoas
serão vistos por um olhar imediato e anônimo. (Teodoro & Aquino, 2014, p.3)

Desta forma, o poder disciplinar via Vigilância se autosustenta pelo jogo de olhares calculados
por uma verdadeira “física do poder”. Consequentemente, o processo de exercício da Vigilância
gera um processo de despersonalização do poder que facilita a sua atuação.

Nesta, a Vigilância deixa de ser identificada como o indivíduo que a “possui” ou a exerce
ocorrendo uma dissociação do poder como domínio individual rumando para a sua
pulverização nos mais diversos setores da sociedade. O poder torna-se portanto, uma
engrenagem ou maquinaria na qual ninguém é operador. O aparelho inteiro produz poder
continuamente. (Teodoro & Aquino, 2014, p.4).

Desta forma, os mecanismos de Vigilância passam do ambiente da fábrica para onde foi
inicialmente pensada para o ambiente que não vai se preocupar diretamente com a disciplina dos
corpos diretamente, mas sim com a Vigilância especificamente.

Logo, observa-se que a Vigilância proporciona um jogo de olhares que fora promovido pela
disciplina e que foi largamente disseminado na rede de relações social em que vivemos.
Olhares que não se identificam, que agem anonimamente, mas devem ser identificar e
individualizar todos os alvos de seu exercício. (Teodoro & Aquino, 2014, p.7).

Então, instala-se um intenso processo de desindividualização e de invisibilidade, que facilitam


enormemente a sua empreitada pois eles dissociam a figura da Vigilância especificamente a uma
única pessoa e a transfere a um ente (ou uma instituição) que adquire um caráter significativo de
invisibilidade repercutindo sobre a eficiência este processo como demonstrado na instalação atual
de um pós-panóptico6.

Nesta direção, indicou-se para os mecanismos de poder, estes procedimentos de poder, devem ser
considerados como técnicas , ou seja, como procedimentos que foram inventados, aperfeiçoados,
que se desenvolvem sem cessar. Existe uma verdadeira tecnologia do poder, ou melhor, dos
poderes que tem a sua própria história (Foucault, 2008, p. 175)

6 Termo este amplamente discutido por Bauman em sua obra “Vigilância Líquida”

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Então, os processos de Vigilância principalmente aqueles que focam na de individualização


colaboram para o reforço da ação dos mecanismos de poder que se tornam cada vez mais
discretos e eficientes na busca de seus intentos.

2. Zygmunt Bauman e a sua reflexão sobre a Vigilância Líquida

Este autor apresenta uma ampla discussão acerca da ascensão de uma “modernidade líquida” que
é caracterizado pelo mesmo com um momento histórico (o atual) pautado em uma considerável
fluidez das relações societárias resultando em contextos e situações mais flexíveis que afetam
diversos aspectos da vida social como o amor, o capitalismo, o medo e a Vigilância.

Assim, este último elemento vai ser destacado por Bauman ao considera-la como um novo
formato de Vigilância muito mais ágil e complexa que me certo sentido supera e até intensifica a
Vigilância analisada por Foucault e que potencializada pela massificação da utilização da
tecnologia neste intuito

Neste ínterim, ressalta-se a preocupação central de Bauman que seria a de compreender as novas
formas de dominação sem no romper com a premissa de uma pós-modernidade (líquida).
Derivado disto, Bauman foca a sua atuação na compreensão desta Vigilância Líquida e sobre os
seus efeitos sobre a cotidianidade de seus moradores.

Logo, Bauman vai refletir sobre a instalação de uma Vigilância mais líquida a partir de uma
ênfase nas recentes estratégias de controle social.

Para obter tal intento, ele assinala que um diálogo com Foucault se torna essencial pois ele vai ser
o precursor dos estudos da Vigilância a partir da instalação de um poder disciplinar.

Assim, as novas práticas de vigilância baseadas no processamento de informação e não nos


discursos de Foucault tinha me mente, permite uma nova transparência, em que não somente os
cidadãos, mas todos nôs, por todo o espectro de papéis, que desempenhamos na vida cotidiana,
somos permanentemente checados, monitorados, testados, avaliados, apreciados e julgados.
A proposição que o poder se move a velocidade dos sinais eletrônicos na fluidez da modernidade
líquida, a transparência simultaneamente aumenta para uns e diminui para outros. (Bauman,
2013, p.19)

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O apontamento acima destaca a pressão que antes era exercido pela disciplina sobre os indivíduos
passa a exercida pela Vigilância que através de um controle mais efetivo.

Esta eficiência é ressaltada pelo autor quando ele afirma que o aspecto mais notável da edição
contemporânea da vigilância é que ela conseguiu, de alguma maneira forçar e persuadir
opositores a trabalhar em uníssono e faze-los funcionar de comum acordo, a serviço de uma
mesma realidade. (Bauman, 2013, p.29)

Assim, a ação da Vigilância consegue obter os mesmos resultados do que a disciplina mas que
adotando uma abordagem mais discreta do que anterior.

A novidade é colocada aqui através da contradição apresentada por Bauman quanto este afirma
que os principais meios de obter vigilância, ao que parece são as novas técnicas e tecnologias de
vigilância, que supostamente nos protegem, não de perigos distintos, mas de riscos nebulosos e
informes. As coisas mudaram tanto para os vigilantes quanto para os vigiados. (Bauman, 2013,
p.95)

Ela é destacada quando o indivíduo é protegido e controlado simultaneamente suscitando uma


reflexão instigante sobre os efeitos sobre a sociabilidade contemporânea. Este dilema alça a
Vigilância a um novo patamar que é o de ferramenta de controle social e da emergência de uma
sociedade de controle ressaltado por Bauman e confirmado por Gilles Deleuze7 quando o
“controle hoje tenha se tornado amplamente líquido, em oposição a operar nos espaços e recintos
físicos do pan-óptico“ (Bauman, 2013, p.123).

Logo, a interlocução com Bauman contribuiu para a visualização das novas nuances da
Vigilância e que passam a evidenciar um movimento dúbio acerca do mesmo que seria um
incentivo a proteção individual e/ou coletiva e ao mesmo tempo, a sua utilização como uma forte
ferramenta de controle social.

Algumas considerações preliminares

Com a finalidade de brevemente recuperar algumas questões importantes realizadas ao longo do


texto e amarrar mais solidamente a temática da vigilância em sua conexão com o medo.

7 Discussão realizada ao longo da introdução a obra de David Garland.

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Desta forma, a Vigilância constitui na visão de ambos os autores em ferramentas de proteção,


seja ele contra inimigos reais ou imaginários que acabaram em sua constante busca por
segurança se constituiu em instrumento de controle social. Neste sentido, cabe resultar a
existência de um binômino8 (liberdade/segurança) constantemente destacado por Bauman que
auxilia na compreensão deste fenômeno dúbio.

Nesta direção, a Vigilância adquiriu um status privilegiado por configurar além de um aparato
físico, mas um conjunto de instrumentos simbólicos e principalmente tecnológicas que reforçam
a sua ação e potencializam o seu alcance.

Assim, é possível destacar que o medo passa a alimentar uma vigilância mais efetiva que se
configurou em um fenômeno com um escopo maior.

Finalmente, a contribuição destes autores ao tema Vigilância possibilitaram uma reflexão rica e
que pode ser complementada com uma atualização dos referencias bibliográficos e um posterior
aprofundamento da discussão.

REFERÊNCIAS

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Bauman, Z. (1999). Globalização – as consequências humanas. Rio de Janeiro: Jorge Zahar


Editor.

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Ed. 34/EDUSP.

8 Neste binômio, Bauman assinala que sempre se pesa mais para um dos lados da dicotomia, o que acarreta a redução do
outro eixo.

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