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Cidade Universitária “Prof. José Aloísio de Campos”Jardim Rosa Elze.
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| Literatura e Filosofia: curtos-circuitos |
APRESENTAÇÃO
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO
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3 Ambos ensaios constam da segunda edição de Ensaios e anseios crípticos (2012), não
figurando a primeira edição, de 2011, pela Editora da Unicamp.
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(MOISÉS, 2004, p. 217). Interessa-nos este verbete de Massaud Moisés por elencar as
duas grandes características presentes na poesia japonesa da época e que o haikai
herdará: a brevidade e a inscrição das estações do ano. Veloz em sua estrutura, como
se querendo chegar mais rápido ao leitor, sua busca pelo “reino da sensação” percorre
uma natureza sem fim e faz do próprio haikai uma poesia das sensações.
9 “El haiku se ocupa sólo de la vida. Es como la flor de la existencia, y se despreocupa del
más allá, pero desvela en las cosas una naturaleza divina inmanente a ellas”. Tradução
literal nossa.
10 Cf. especialmente a oitava parte da obra História da cultura japonesa (1986, p. 149-
182), de José Yamashiro.
11 “Se lanzó a una vida de pobreza e peregrinaje para aprender directamente de la natu-
raleza”.
12 “Excesivasimplicidad, prosaísmo, juegos verbales”.
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vel a obra de Masuda Goga, O haicai no Brasil (1998), que tenta seguir
a trilha de imigrantes japoneses entre as décadas de 1930 e 1940 que
compuseram haikais no Brasil – embora a obra se limite até a década
de 1950, ela constitui um bom corpus de haikaístas da primeira me-
tade do século.
Ao passo que alguns modernistas brasileiros se interessaram pelo
haikai, pela sua rapidez e, digamos, pela sua aparente simplicidade na
composição (não percamos de vista o largo salto temporal operado
aqui), outros poetas certamente foram mais longe, no sentido de res-
gatar a tradição nipônica, ou pelo menos percorrer o caminho trilha-
do por Bashô no século XVII e que, de algum modo, é o “caminho” do
haikai. Invariavelmente é neste caminho que Leminski se insere.
Como o haikai encontra solo fértil em nossa literatura, antes
precisamos demarcar o interesse por um certo Oriente. Quando pen-
samos neste “Oriente distante”, e mais especificamente no Japão, é
mais ou menos comum recorremos ao chavão de “país fechado”, ideia
que ficou no imaginário de certo Ocidente.
Sempre que falamos de Japão, imaginamos, portanto, a terra do
poente, de samurais, clãs, imperadores. Terra de grandes templos e
de gueixas que tanto dedilharam o imaginário ocidental pela beleza
cintilante. Falar da cultura japonesa é falar de uma cultura imageti-
camente rica, profusa visual e gestualmente, o que ratifica o nosso
imaginário de país das exuberâncias e do fascínio. Muito se buscou
traduzir a essência da alma japonesa, se isto é possível. Esse é o pon-
to de partida das investigações do antropólogo Claude Lévi-Strauss
acerca do Japão. Sempre deixando claro em seus escritos sobre a cul-
tura japonesa a sua dificuldade de tratar de um país em que não
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15 Para uma leitura mais aprofundada, vale conferir também a obra do historiador e di-
plomata pernambucano Oliveira Lima, No Japão: impressões da terra e da gente (1997).
Aplaudida por amigos como Gilberto Freyre, a obra de Oliveira Lima é um preciso tes-
temunho das riquezas da história e da cultura nipônica, embora, tenha-se em mente,
seja uma “impressão” de um diplomata que documenta não só o cultural, mas também
as transformações políticas e sociais daquele país.
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que vive, ouve/escuta a noite, quer dizer, é noite; o segundo, que cha-
mamos de haikoans, quando a poesia se encontra com o enigma dos
koans Zen-budistas; o terceiro, o vazio, quando a sua poesia encontra
o caminho do meio, isto é, quando se dá a vivência do nada.
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A noite
me pinga uma estrela no olho
e passa
(LEMINSKI, 1983, p. 73).
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20 Leminski (1994).
21 Blanchot (2011, p. 177-186).
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Com esses três haikais, podemos concluir que todos eles olham
as estrelas e mantêm relação (de movimento ou não) com ela. Esse
desejo de tornar-se estrela, que é um desejo de tornar-se o objeto,
união Zen-budista do sujeito com o objeto (o poema em estado de
chegar a ser objeto, pois todo o universo é aquele objeto, no caso,
tudo é a estrela) também pode significar uma relação mallarmeana.
Temos aqui um Leminski que digere as constelações de Mallarmé
para seus haikais búdicos e contemplantes. Basta lembrarmo-nos dos
versos finais do antológico “un coup de dés jamais n’abolira le hasard”:
[...] Uma constelação
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Ângulo 2 – Haikoans
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to”. Embora aqui não caiba uma leitura apurada deste olhar para o
social nos haikais de Caprichos e relaxos, o que nos interessa é como
neste segundo poema o olhar para o cotidiano se apresenta como
um olhar fotográfico e com uma linguagem próxima deste cotidiano
(o gole, isto é, uma marca da oralidade). Neste segundo haikai temos,
então, a abertura para o encontro da palavra (signo verbal) com a
imagem (não-verbal). O interstício. As imagens-mundo que a palavra
poética fabrica. Pois cada gole também carrega o seu conjunto de ima-
gens-mundo, ou imagens dinâmicas.
Com os seguintes haikais, podemos concluir que a operação
do movimento pendular, do mais metalinguístico ao mais foto-
gráfico do cotidiano, é o próprio movimento pendular da escritu-
ra leminskiana, que vai do erudito ao popular, transando todas as
ondas, a escritura em laboratório, o devir da escritura movente. Par-
timos agora para o encontro do haikai com o koan na natureza da
palavra búdica, ou o que chamamos de haikoan. Para isso, citemos
o seguinte haikai de Ideolágrimas:
Duas folhas na sandália
o outono
também quer andar
(LEMINSKI, 1983, p. 99).
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deságua
m’água.
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Ângulo 3 - Vazio
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culo XIX. Entre poetas e filósofos, muitos falaram deste encontro vida/
morte. Foi possível, então, olhar para a morte31.
Sem perdermos de vista aquela máxima heideggeriana de que
a temporalização da temporalidade é uma possibilidade para as
modalidades de existência do Dasein, vemos que, quando o poema
traça a transitoriedade da árvore, a temporalização foi já materializa-
da na linguagem. Tempo que é o agora, ou o “‘fluxo’ dos agora” (HEI-
DEGGER, 2011a, p. 518).
Então, o “fim” quer dizer uma espécie de “ponto final” na exis-
tência? Não, responderia o budismo. Para o budismo, a morte é uma
transmigração, quer dizer, travessia. Um ciclo contínuo que só é rom-
pido quando se alcança o satori (iluminação). É a morte um mal? Em
determinados pontos do pensamento antigo, tanto o bem, quanto a
vida, e até Deus, estão para o ser, assim como todo o contrário está
para o não-ser. Se olharmos para um certo Oriente, e se lembrarmo-
-nos do escritor-samurai Yukio Mishima, encontramos aquilo que
Blanchot chama de morte como tarefa artística32. Mishima se prepa-
rou (fisicamente) para a morte, cultuou o corpo para que a bainha da
espada pudesse cumprir o ritual. Nos samurais do Japão medieval,
31 Desde um Montaigne (2010, p. 59), para o qual “filosofar é aprender a morrer”, passan-
do por Schopenhauer (2000, p. 59), que via a morte como “musa da filosofia”, até o ra-
dicalismo de Emil Cioran, que rompe de vez com as distâncias vida/morte, que pensa
uma morte que ocupa a vida em toda a sua estrutura, uma morte “pura e sublime” (CIO-
RAN, 1990, p. 95). Não só a filosofia problematizou a morte. A literatura configurou-
se um espaço privilegiado para a morte. A escritura carrega a morte, tese defendida
pelo crítico literário Maurice Blanchot, que via em seus autores de predileção – Kafka,
Baudelaire, Rimbaud, Mallarmé e Hölderlin – um espaço literário que era um espaço
da morte, uma ideia em que o homem se dissimula na morte (cf. BLANCHOT, 2011, p.
275). Blanchot entende que a literatura possui um direito à morte pois esta é o poder
prodigioso do negativo, ou a liberdade, pois a morte resulta no ser. Ora, aqui as teses
de Blanchot nos são úteis, pois constituem uma abertura para aquilo que Heidegger
defende, em Ser e tempo, no parágrafo 49, de que “a morte é um fenômeno da vida”
(HEIDEGGER, 2011a, p. 321), uma interpretação existencial da morte e do ser-para-a-
-morte, que já é, em si, uma possibilidade existenciária do Dasein – tese do parágrafo
52 (cf. HEIDEGGER, 2011a, p. 336). Ora, na ontologia heideggeriana, o ser é ser-para-o-
-fim porque é temporal, logo, a finitude é um caráter da temporalização do Dasein.
32 Conferir Blanchot (2011, p. 131).
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O som da água
A terceira linha do haikai representa o resultado da interação en-
tre a ordem imutável do cosmos e o evento
(LEMINSKI, 2013, p. 109-112, grifos do autor).
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39 Convém notar que o nada já foi aberto por Heidegger pela angústia. Se Heidegger, em
Ser e tempo, viu na angústia a abertura privilegiada para o nada – ou manifestação do
nada, como escreve em Que é metafísica? (HEIDEGGER, 1989, p. 39) –, em Os conceitos
fundamentais da metafísica Heidegger verá no tédio (na manifestação do tédio) o li-
bertar-se do ser-aí.
40 Mais uma vez somos levados a Caprichos e relaxos, especialmente em um poema bas-
tante peculiar pela sua sonoridade e pela sua forma: “ver / é dor / ouvir / é dor / ter
/ é dor / perder / é dor” (LEMINSKI, 1983, p. 59). Um poema que dialoga com um dos
haikais de La vie en close, onde temos “ver é violento / que golpe / aplicar no vento?”
(LEMINSKI, 1994, p. 114).
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No haikai acima, não nos parece que se está entediado por isto
ou aquilo (o que Heidegger chama de primeira forma de tédio, o en-
tediar-se por algo43), mas por algo indeterminado, que não se sabe:
vazio – note-se que Heidegger nomeia esta indeterminação de se-
gunda forma de tédio44, e aí se dá a dialogação com o haikai, pois o
vazio absorve este ser-entediado: ser-deixado-vazio, pois “o que nos
deixa vazios é o entediante” (HEIDEGGER, 2011b, p. 153). O poema
deu espaço para o vazio porque ele se fez vazio, mergulhou no vazio
agudo. E quantos de nós não nos entediamos a todo o momento,
não somos absorvidos por esse vazio agudo (que Heidegger chama
de tédio profundo). Aberto o ser-aí, o haikai subsequente completa a
aurora da tonicidade afetiva:
Fruto suspenso
a que susto
pertenço?
(LEMINSKI, 1994, p. 124).
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CONCLUSÃO
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REFERÊNCIAS
BANDEIRA, M. Estrela da vida inteira. 12.ª ed. Rio de Janeiro: José Olympio,
1986.
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sando Paulo Leminski. Rio de Janeiro: Lamparina, 2004.
GOGA, M. O haicai no Brasil. Trad. José Yamashiro. São Paulo: Oriento, 1988.
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trópolis: Vozes; Bragança Paulista, SP: Editora Universitária São Francisco, 2011a.
HESÍODO. Teogonia: a origem dos deuses. 3.ª ed. São Paulo: Iluminuras, 1995.
IZUTSU, T. Hacia una filosofía del budismo zen. Madrid: Trotta, 2009.
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LEMINSKI, P. O pós-rir. Folha de São Paulo, São Paulo, 1. jan. 1986. Ilustra-
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LEMINSKI, P. O ex-estranho. Org. Alice Ruiz, Áurea Leminski. 3.ª ed. São Pau-
lo: Iluminuras, 2001.
LEMINSKI, P. Ensaios e anseios crípticos. 2.ª ed. Campinas, São Paulo: Edi-
tora da Unicamp, 2012.
LIMA, M. R. Alguns dados estão lançados. In: DICK, André; CALIXTO, Fa-
biano (Orgs.). A linha que nunca termina: pensando Paulo Leminski. Rio de
Janeiro: Lamparina, 2004, p. 95-124.
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MOISÉS, M. Dicionário de termos literários. 12.ª ed. São Paulo: Cultrix, 2004.
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TARKOVSKY, A. Esculpir o tempo. 2.ª ed. Trad. Jefferson Luiz Camargo. São
Paulo: Martins Fontes, 1998.
VAZ, T. Paulo Leminski: o bandido que sabia latim. Rio de Janeiro: Record,
2001.
YAMASHIRO, J. História da cultura japonesa. 2.ª ed. São Paulo: Ibrasa, 1986.
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Os rastros da memória na literatura
brasileira: uma abordagem hermenêutica1
Ramon Diego Câmara Rocha2
CONSIDERAÇÕES INICIAIS
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6 Cabe aqui uma consideração acerca desse tempo do narrado. Este corresponderia ao
tempo no qual se desenvolvem os acontecimentos transpostos na narração, diferen-
ciando-se do tempo do narrar.
7 Sobre o tempo do narrar, é importante que se diga que este é o tempo em que, por
meio do discurso, a narração se estabelece, ou seja, é um tempo de revisitação do fato
na narrativa.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
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REFERÊNCIAS
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ASSIS, M. de. Memórias póstumas de Brás Cubas. São Paulo: Martin Cla-
ret, 2006.
AZEVEDO, Á. de. Lira dos vinte anos. São Paulo: Martins Fontes, 1996.
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BOSI, Alfredo. História concisa da literatura brasileira. 2. ed. São Paulo, Cultrix,
1975.
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Machado de Assis: “Memórias póstumas de Brás Cubas”,
um olhar hermenêutico da realidade1.
Erick Camilo da Silva Gouveia2
INTRODUÇÃO
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um lado era fixa, baseada numa divisão rígida de suas camadas (esta-
mentos), por outro lado, começava a permitir um movimento relacio-
nado ao surgimento de “classes” sociais, com certa mobilidade, mas,
como veremos no decorrer de nosso trabalho, sem legitimidade, e
por isso, sem poder político.
Em muito poderíamos justificar a necessidade de contextualizar
as Memórias póstumas de Brás Cubas (2014), principalmente, por ser
uma obra na qual seu autor realizou arguta análise da situação social
de seu momento, mesmo que, de forma assente acerca desta, seja
“(...) sua vocação verdadeira: contar a essência do homem, em sua
precariedade existencial” (COUTINHO, 2004, p. 159). Alguns de seus
contemporâneos – notadamente Sylvio Romero, que “(...) negou a
autenticidade do retratista” (FAORO, 1988, p. 477) – não conseguiram
alcançar o cerne da obra machadiana, que se debruçava analitica-
mente sobre as relações sociais de sua época. Partimos do pressu-
posto de que Machado não estava preocupado em fazer cópia fiel, ao
modo da compreensão da mímesis aristotélica como simples repro-
dução do real, mas em problematizar as instituições e não menos as
relações que encadeavam o tecido social. Este, posto a descoberto,
numa escrita que vai à lama do solo e ao estrume a ele misturado
para tecer uma genealogia das camadas dominantes, mesmo que es-
sas já estejam caracterizadas desde o início do romance, como assi-
nala Roberto Schwarz quando diz que “O tom é de abuso deliberado,
a começar pelo contra-senso do título, já que os mortos não escre-
vem” (2000, p. 17) (sic).
A genealogia, que as Memórias póstumas de Brás Cubas expõe
no capítulo “O menino é pai do homem” (ASSIS, 2014, p. 75), coloca
o traço das vicissitudes de caráter na formação dos indivíduos mais
abastados da sociedade brasileira. O apanágio de “retratista” não en-
contrava em Machado eco. Disso apercebeu-se Roger Bastide, desta
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Finalmente, o aspecto de uma escrita, que não reproduz, mas
reinventa a realidade, baseia-se no par aristotélico mímesis/mythos,
sendo o primeiro a representação ou agenciamento dos fatos e o se-
gundo “o quê” se representa, nesse caso a “composição de intriga”,
que, não obstante, segundo Paul Ricoeur, “(...) devem ser considera-
dos operações e não estruturas” (2010, p. 59). Se, para nós, a escrita
machadiana das Memórias póstumas de Brás Cubas comporta este
aspecto de “representação ou agenciamento” e o mythos – sendo
este as ações vinculadas na representação –, esta “dimensão configu-
rante” aproxima-se da operação que, segundo Gadamer, nos fala da
real consumação do jogo em arte se dá através da “transformação em
configuração” (GADAMER, 1997). Desse modo, essa ação nos mostra
que o que havia não há mais. O mundo em que ocupamos o nosso lu-
gar é completamente “suspenso”, sem “transição” ou “intermediação”.
O próprio Gadamer ressalta que esta operação vai além, pois, “(...)
na medida em que [esta operação] é configuração, encontrou em si
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REFERÊNCIAS
ASSIS, M. de. Memórias póstumas de Brás Cubas. Porto Alegre: L&PM, 2014.
ASSIS, M. de. Papéis avulsos. São Paulo: Penguin Companhia das Letras,
2011.
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GOUVEIA, Erick Camilo da Silva. Mia couto: as águas do tempo que desa-
guam na alma. Garanhuns: Trabalho de Conclusão de Curso em Letras – Lín-
gua portuguesa e suas literaturas, Faculdade de Ciências, Educação e Tecno-
logia de Garanhuns, Universidade de Pernambuco, 2011.
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| Literatura e Filosofia: curtos-circuitos |
https://www.ufpe.br/ppgfilosofia/images/pdf/pf12_artigo80001.pdf -
Acesso em: 15 de junho de 2017.
LIMA, L. C. Pensando nos trópicos: Luiz Costa Lima. Rio de Janeiro: Rocco, 1991.
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RICOUER, P. Tempo e narrativa: o tempo narrado. Vol. III. São Paulo: WMF
Martins Fontes, 2010c.
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Balzac: a capitalização do espírito humano1
INTRODUÇÃO
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cedo ele vislumbrou não querer trilhar o mesmo caminho que seu
pai, um funcionário público.
Balzac não foi sempre Balzac, nasceu Balssa. Honoré de Balzac,
autor de Ilusões perdidas, era filho de Bernard-François e neto de um
camponês que tinha “Balssa” como sobrenome. A vida na província
parecia não seduzir o então jovem Balzac. Paris, ainda com aspirações
de glória, de riqueza e monarquia (ainda que no início do século XIX)
habitava os sonhos de Balzac. Vale lembrar que a partícula “de” no
nome representava então nobreza e poder. Assim, na surdina, Ho-
noré se ocupou de inserir em seu nome o “de” a fim de imprimir uma
ancestralidade nobre à sua genealogia.
Não consideramos aqui a vida de um autor como uma chave
essencial de interpretação da sua obra ou o contrário. Contudo, tão
candente é o reflexo da vida de Balzac em seus romances, que re-
cusar essa possibilidade seria incorrer em um lapso. A transição da
província para a cidade, os desejos de glória, fortuna e sucesso tão
presentes nos personagens balzaquianos, incluindo o de nossa pos-
terior análise, Lucien de Ilusões perdidas e denota a empreitada da
obra do autor francês.
Há uma interpenetração na vida e obra de Balzac, por uma agu-
da concepção de mundo, conforme assevera Lukács:
Dos colóquios do Wilhelm Meister goethiano, passando por Bal-
zac e chegando até Tolstói, existe uma ininterrupta cadeia de
cumes de unidade orgânica entre eficácia literária e profundida-
de teórica. A grandeza poética desses gigantes da literatura de-
pende estreitamente da altitude de sua concepção de mundo.
(LUKÁCS, 1968, p. 231).
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burguês, o qual chega à ruína graças ao seu desejo de ser aceito pe-
los ilustres de Paris e às tramas maquinadas por esses últimos.
A obra de Balzac, entretanto, não é um diário de desabafos.
Além da “busca de uma escrita que abarque tudo, o charme das pai-
sagens e os mecanismos da indústria papeleira, as verdades eternas
e as qualidades das cortinas” (TAILLANDIER, 2009, p. 15), Balzac é pio-
neiro em seu estilo. Seu olhar penetrante sobre a sociedade, longe
de matizar esta com elementos transcendentais, como os autores
alemães do movimento “Tempestade e ímpeto” 3, tenta dissecá-la
com um realismo que consegue capturar as nuances de seu tempo.
Apesar do desejo de ser um novo Napoleão, sua literatura não visa-
va os grandes feitos dos homens de seu tempo, mas a mesquinhez
escondida no verniz social, a barbárie não moralizada que fazia de
tudo por status, que “esquece primeiro a morte do pai do que aquele
que pôs a mão em seu bolso” (MAQUIAVEL, 2005, p.209). Desvendar
o que há por trás do gesto de uma filha que prefere ver a ruína de seu
pai a perder um vestido novo para ir a uma festa, como acontece no
emblemático Pai Goriot (1834): essa é a empreitada de Balzac.
Balzac era um esgrimista. Quando tratamos aqui do ofício de
esgrimista estamos nos reportando à ideia da esgrima refletida por
Benjamin. Este último retirou essa imagem do poema de Baudelaire,
“O sol”, no qual o autor de As flores do mal diz: “exercerei a sós a minha
estranha esgrima” (BAUDELAIRE, 2009, p.98). Ao pensar no homem
da multidão, aquele que vive nos grandes centros, embrutecido pela
correria, pelo modo capitalista de viver, Benjamin destaca que “a ima
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5 En effet, dans la fabrication de cet objet estéthique nouveau qu’est la ville de province, une
logique différente est en gestation tout autant qu’une estétique. Tout La Comédie humaine
proteste contre une oposition simpliste, du type blanc contre noir, entre Paris et la province.
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traço idílico e mais que isso, a província de Balzac rompe com a tradi-
ção literária em torno da província constituída por autores como
Montigny em “Le Provincial à Paris”, ou Jacob-Kolb em “Le Fron-
deur ou observations sur les mœurs de Paris et de province, au
commencement du XIXème siècle” (1829) que não ultrapassam
o tema do retorno do provinciano a Paris, e seu conformismo
denuncia um conhecimento muito superficial da província. [...] a
província não poderia aceder ao romance senão a partir de uma
dupla recusa – aquela do passado, mas igualmente aquela do
exotismo. (MOZET, 1998, pp. 28, 29)6.
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9 “le type du roman de la désillusion, le type d’un roman dans lequel on montre com-
ment les idées fausses, mais apparues par nécessité, des personages sur le monde, se
brisent nécessairement au contact de la force brutale de la vie capitaliste”.
10 É importante esclarecer que o termo “escritor” será utilizado algumas vezes para desig-
nar aquele que produz literatura, no caso da Obra Ilusões perdidas nossa remissão mais
frequente será a Lucien, personagem principal. Distinções como: poeta, escritor, jorna-
lista e autor eram, à época, tênues, sendo frequentemente utilizadas por Balzac para
o mesmo personagem. Contudo, vale ressaltar que o uso de diferentes denominações
indica diferentes referenciações ao personagem. Recorrentes vezes o personagem é
chamado de “o grande poeta da província”, expressão carregada de ironia posto que
usada em momentos de frustração na capital.
11 “ jeunesse voulait le pouvoir et le plaisir”.
12 “Illusions perdues sont l’épopée tragi-comique de la capitalisation de l’espírit”.
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Após ver a quantia que carregava ser consumida quase por com-
pleto no percurso da viagem, Lucien enfrenta outro choque com as
implacáveis regras da sociedade francesa: a senhora de Bargeton por
quem ele nutria esperanças de um feliz relacionamento dispensa-o
ao entender que o poeta da província era apenas mais um jovem a
tentar a sorte e representaria para ela um estorvo em um futuro mui-
to próximo. Pelas mãos do barão du Châtelet o laço de Lucien foi cor-
tado com a senhora de Bargeton: homem ardiloso e conhecedor das
convenções advertiu-a sobre a temeridade de uma mulher chegar a
Paris fugida com um jovem, o barão “falara a linguagem da sociedade
a uma mulher da sociedade” (BALZAC, 2010, p. 185). Ela compreen-
deu bem essa linguagem. Desprezou de maneira cordial o poeta, dei-
xando-o sozinho em Paris e verificou em seguida que cada palavra
do barão sobre a sociedade era uma profecia: mulheres muito mais
perspicazes, jovens muito mais instruídos, convenções que a provín-
cia desconhece. Balzac cria, inclusive, um neologismo para retratar a
situação da senhora de Bargeton, que nesse momento é símbolo da
província recém chegada na capital: era preciso se “desangoulemisar”
(BALZAC, 2010, p. 189).
Essa necessidade, de se despir dos modos da província, não tar-
dou a ser despertada em Lucien. Já em seus primeiros passeios pelos
bulevares de Paris o jovem espelhou-se nos homens da capital, olhou
para sua casaca e não percebeu “nenhuma casaca naqueles jovens
elegantes, [e] se percebia um homem de casaca, era um velho fora
da lei, um pobre diabo” (BALZAC, 2010, p. 196). Além da casaca todo
o conjunto estava em desalinho, era gritante a diferença entre ele e
o conjunto parisiense; por fim “reconheceu a feiura de seus trapos, os
defeitos que marcavam de ridículo sua roupa ultrajantemente des-
graciosa” (BALZAC, 2010, p. 196).
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“É preciso tudo ousar para tudo ter” (LUKÁCS, 1999, p.64) 13.
Tudo ousar para tudo ter? Sim, essa é a regra infernal das relações
entrecortadas pelo capitalismo. A ousadia da aposta será a perspec-
tiva do amor e também do jogo, sem nenhuma garantia de sucesso.
É na constelação de estranhamento e aspirações de um
universo de aparências que Balzac constrói o personagem Lucien
Chardon. Apesar de deter outros desdobramentos, vamos nos ater
a dois aspectos importantes dos elencados por Walter Benjamin
e presentes em Balzac, a saber, a perda da noção tradicional de
tempo e sua ligação com a conjunção jogo e sorte que atravessa
o modo de agir dos personagens, se pensarmos nas construções
elaboradas pelo autor de Esplendores e misérias das cortesãs e o
modo de viver reificado dos indivíduos dos grandes centros, con-
forme a abordagem benjaminiana.
“O homem novo tem que emergir das ruínas do antigo” (ROUA-
NET, 1990, p. 52). Essa assertiva demonstra de maneira concisa o movi-
mento de constante desejo de adequação e mudança de sentido por
aqueles que se reconhecem diferentes em um mundo que não reco-
nhece o diferente. O jovem Lucien ao chegar esfuziante à Paris sentiu-
-se “surpreso com a multidão para qual era um estranho, esse homem
imaginativo sentiu algo como uma imensa diminuição de si mesmo.
[...] Paris transformar-se-ia num terrível deserto.” (BALZAC, 2010, p. 191).
Tal sentimento não foi exclusividade da criação balzaquiana, pelo con-
trário, o modo autômato, a rapidez, e embrutecido afiguram o modo
de receber aqueles estranhos a esses ritmos, bem como o imperativo
da adequação, sem a qual a miséria seria o destino dos que se recusam
ou não conseguem inserir-se nessa engrenagem.
13 « Il faut tout oser pour tout avoir. » Essa assertiva, tomada como exemplar por Lukács, é
na verdade de Balzac, encontra-se na p. 202, do Vol. II das Ilusões perdidas. Ministrando
uma terrível preleção sobre a verdadeira face da sociedade, ambiciosa, egoísta e bru-
tal, Vautrin, personagem que assumirá o lugar central da obra seguinte (Esplendores e
Misérias das Cortesãs), se encarrega de despir Lucien de suas derradeiras ilusões.
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14 Frascati foi uma das principais casas de jogo de Paris. Ficava na rua de Richelieu, nº
108. (nota do próprio Balzac, em Ilusões perdidas, vol. I, p. 497).
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15 A prostituição masculina é um tema abordado por Balzac no Pai Goriot. Como é pre-
visível para a moral da época, o rapaz que se vendia não era mal visto, ao contrário
era considerado um conquistador e orgulhava-se de exibir como troféus as damas de
virtude com quem já havia se relacionado.
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David Séchard e toda sua família, com exceção do Pai Séchard, o qual
comandado pela sua avareza não se apiedará de seu filho, mesmo
estando este na prisão. É importante apontar que o fracasso das ilu-
sões de Lucien, como um redemoinho, põe toda sua família em uma
desgraça financeira e moral.
O retorno de Lucien à província nada se parece com sua despedi-
da, pois enquanto nesta última temos o poeta em uma diligência, seu
retorno foi uma verdadeira viagem de um mendicante: dormindo ao
relento, na boleia de carruagens como um clandestino, a ainda junto a
animais. Qual não fui sua surpresa ao despertar pela manhã e perceber
que se encontrava como clandestino da Senhora de Bargeton! Contu-
do, as frustrações ainda o aguardavam em Angoulême. A ligação da
última parte de Ilusões perdidas com o restante da obra é atestada pelo
próprio Balzac, no Prefácio da Terceira Parte, de 1844: “há três causas,
de uma ação perpétua, que unem a província a Paris: a ambição do
nobre, a ambição do comerciante enriquecido, a ambição do poeta.
O espírito, o dinheiro e o grande nome vêm buscar a esfera que lhes
é própria” (BALZAC, 2010, p. 255). Nas seções anteriores da obra teste-
munhamos a ambição do nobre que tritura a ambição do poeta, aqui
na terceira e última seção, temos a ambição do poeta espezinhada
pela ambição desmedida do comerciante enriquecido.
Irão orquestrar a desgraça sobre Lucien e sua família os ricos ti-
pógrafos da região, os irmãos Cointet, já mencionados na análise so-
bre a província, Petit-Claud, ex-colega de colégio de Lucien e Cérizet,
aprendiz do próprio David Séchard. Cérizet encarna a ambição des-
leal que atravessa a província e a capital: assim como ele trai David
em Angoulême, trai Cesár Birotteau, o pródigo perfumista16 de Paris.
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essa resposta, Ève foi obrigada a contratar uma ama, pois seu leite se-
cara!” (BALZAC, 2010, pp. 47-66). A resposta em questão é uma carta
recebida de Paris, enviada por um antigo amigo de Lucien, falando
dos feitos do grande poeta da província em sua estadia na capital.
Não nos deteremos nos detalhes do fracasso material sofrido
pelo protagonista Lucien e sua família, basta mencionar que David
é preso por causa da dívida e o próprio pai o deseja nessa condição
para extorquir o seu segredo. Todas as maquinações engendradas na
província contra o inventor são a coroação daquilo que ocorria em
Paris e tal como na capital, na província, o espírito inventivo e os laços
familiares são vencidos pela ambição, pelo desejo de ter. A máxima
de tudo ousar para tudo ter pelejou contra a cobiça e o acúmulo dos
que tudo já possuíam e perderam.
Vencido pelos tipógrafos da região, David perdeu também suas
ilusões, a sua “descoberta entrou na fabricação francesa como o ali-
mento em um grande corpo. Graças à introdução de materiais dife-
rentes do trapo, a França pôde fabricar papel mais barato do que em
qualquer outro país da Europa” (BALZAC, 2010, p. 240). Tal golpe, de
ver a invenção que quase lhe custara a vida, revolucionar o mercado
europeu sem que dela pudesse tomar parte, o fez renunciar comple-
tamente à vocação de inventor.
Lucien? Não suportou ser a razão da ruína de sua família e deci-
diu se suicidar. Entretanto, enquanto olhava para as águas onde iria
se afogar, foi abordado por um abade espanhol que passava em uma
diligência que o persuadiu a não mais tirar sua vida e lhe transmi-
tiu os valores dos homens desonestos. Parecia que toda a sua per-
manência em Paris havia sido brincadeiras de criança. O domínio do
mundo não haveria de passar pelas inspirações belas, ou pelo sim-
ples desejo de vencer, mas por uma conjugação que vai da aparência
ao controle de tudo:
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fiel empregada de muitos anos, que, como todos da casa, vivia sob o
rigoroso regime do senhor Grandet. “A necessidade tornou tão ava-
renta a pobre moça, que Grandet acabou por gostar dela, como se
gosta de um cão, e Nanon deixara que lhe pusessem no pescoço uma
coleira tão pontuda cujas farpas já não a farpeavam” (BALZAC, 2006,
p. 36), assim era a constituição da fiel servidora da casa.
Em torno dos Grandet, havia ainda duas famílias que disputa-
vam a mão da rica herdeira da fortuna: os Cruchots e os Des Grassins,
únicos com o acesso franqueado à casa do homem que tudo media e
calculava, inclusive quem poderia cortejar sua filha. Para além dos in-
teresses provincianos, um evento surpreende a todos: a chegada do
sobrinho do senhor Grandet: Charles, rapaz parisiense, filho de seu
irmão Guillaume Grandet. O motivo de sua chegada à província era
fatal: sem o saber, o jovem fora enviado pelo pai com uma carta des-
tinada ao irmão, na qual continha uma sinistra sentença: confiava-lhe
seu filho único, Charles, pois logo em seguida ele se suicidaria. Moti-
vo: não suportaria encarar a sociedade em sua condição de falência,
mergulhado em uma dívida de dois milhões de francos.
A partir desse momento a narrativa assume novos contornos:
o pai Grandet se ocupa em mandar embora para as Índias o seu so-
brinho, Eugénie se apaixona por ele, a grande Nanon se ocupa em
mediar a avareza de seu patrão com a vontade de sua filha e, por fim,
a mãe de Eugénie é eclipsada na obra. A pujança da avareza daque-
la casa parece ocupar os espaços que poderiam ser de sentimentos
afetivos maternos.
Na obra Eugénie Grandet, temos construído um dos persona-
gens mais avarentos de toda literatura universal, talvez perdendo
apenas para o avarento de Molière. Cumpre aqui fazermos uma in-
cursão na caracterização dos elementos constitutivos da avareza
para verificarmos a encarnação desta na personagem balzaquiana.
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19 “Au lieu du roman édifiant qu’une image édulcorée pouvait présenter, toutes insistent
sur la violence. On y voit une inversion du conte de fées, et dans Eugénie une Belle
au bois dormant condamnée à la jouissance fantasmatique, et transposant dans son
amour l’avarice de Grandet”.
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tal paixão que o vemos protagonista de uma das cenas mais emble-
máticas de toda a Comédia Humana,
Vendia [o senhor Grandet] colheitas e transmutava tudo em
ouro e prata, que iam juntar-se secretamente aos sacos empi-
lhados no gabinete. Chegaram enfim, os dias de agonia, durante
os quais a forte constituição do bom Grandet pelejou contra a
destruição. Quis ficar sentado ao pé do fogo, diante da porta do
gabinete. Puxava para si e enrolava todas as cobertas e dizia: -
Guarde, guarde, para ninguém roubar. Quando conseguia abrir
os olhos, nos quais se refugiara toda a sua vida, voltava-os para
a porta do gabinete onde jaziam seus tesouros, dizendo à filha:
- Estão lá? Estão lá? – com uma voz que denotava uma
espécie de pânico.
- Estão papai.
- Cuide do ouro, ponha o ouro na minha frente.
Eugénie espalhava os luíses sobre a mesa, e ele fica horas
inteiras com o olhar fixo nos luíses. (BALZAC, 2006, p. 183).
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tão magnética pelo ouro ou metais preciosos, como a prata, tem uma
razão de ser: é a maior fonte de entesouramento. Ora, a condição para
que uma mercadoria exerça o papel de medida de valor são as suas
propriedades qualitativas e quantitativas. Naturalmente, a conjugação
desses dois elementos irá mensurar o poder e o alcance da medida de
valor. As diversas formas de medida de valor têm variações significati-
vas no elemento qualitativo: peles, sementes, animais de modo geral,
plantações, podem ter enormes variações qualitativas referentes ao
clima e outras tantas adversidades, até a moeda em papel sofre com
variações externas,20 já
O ouro e a prata são sempre idênticos a si mesmos [...] na qua-
lidade de meios de circulação eles oferecem a vantagem sobre
outras mercadorias, de que a seu peso específico elevado, o qual
representa um peso relativamente grande em pouco espaço, [...]
o alto valor específico dos metais preciosos, sua duração, sua re-
lativa indestrutibilidade, sua inalterabilidade ao ar [...] indepen-
dentemente de sua raridade, a grande maleabilidade do ouro e
da prata comparados com o ferro e até com o cobre impede que
se lhes utilize para ferramentas, tirando-lhes em grande parte a
qualidade sobre a qual repousa o valor de troca dos metais em
geral. (MARX, 2008, p. 193-194).
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
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REFERÊNCIAS
AGUIAR, M. S de. A avareza na literatura: a paixão de “ter” através dos tem-
pos. In: MARQUES, Haroldo (org.). Os sete pecados capitais. Belo Horizonte:
Autêntica, 2001. p. 27-52.
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BALZAC, H. de. Escroquerias. In: BALZAC, H. de. Código dos homens ho-
nestos ou a arte de não se deixar enganar pelos larápios. Trad. Léa No-
vaes. Nova Fronteira. São Paulo: 1998. p. 55-70.
BALZAC, H. de. Ilusões perdidas. Trad. Leila de Aguiar Costa. São Paulo:
Abril, 2010. v. I.
BALZAC, H. de. Ilusões perdidas. Trad. Leila de Aguiar Costa. São Paulo:
Abril, 2010. v. II.
BALZAC, H. de. Para onde levam os maus caminhos. In: BALZAC, H. de.
Esplendores e Misérias das Cortesãs. Tradução: Ilana Heineberg. Porto
Alegre: L&PM, 2007. pp. 297-397.
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Afluências da escrita narrativa e filosófica e
espaço literário em A Peste, de Albert Camus1
INTRODUÇÃO
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5 Em português: O avesso e o direito, Núpcias, A morte feliz. A propósito deste último li-
vro, lembremos Duarte Mathias na análise comparativa que realizou entre O estrangei-
ro e A morte feliz em seu estudo A felicidade em Albert Camus: “Abramos um pequeno
parêntesis sobre A Morte feliz, de que muito se falou como sendo um primeiro rascu-
nho de O Estrangeiro. Ora, esta impressão não resiste a uma leitura mais atenta. Com
efeito, para além de algumas afinidades inegáveis, tais como o insubstituível décor
argelino, a quase homonímia dos nomes principais e o relato de um crime que está na
base de ambos os livros, nada na realidade assemelha as duas obras separadas uma da
outra pelo espírito e pela forma. Não se vê, de resto, possível confronto entre os dois
romances porquanto A Morte Feliz, sem embargo do equilíbrio e da beleza de algumas
páginas, é uma obra sem envergadura, desalinhada e fragmentária” (MATHIAS, 1978,
p. 120). A homonímia da qual nos fala Mathias Duarte se refere ao nome dos dois pro-
tagonistas: Patrice Mersault, de A morte feliz e Meursault, de O estrangeiro.
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6 Camus tentou se alistar como soldado, mas a tuberculose que o acometia desde 1930,
quando tinha 17 anos, o impediu. Essa doença “controlava sua vida no dia-a-dia – ele
tossia sangue, muitas vezes ficava exausto [...] foi declarado inapto para dar aulas e
para o serviço militar” (ARONSON, 2007, p. 41). Ele sofreu ao longo de toda sua vida vá-
rias recaídas, incluindo crises de hemoptise, que o obrigou a se retirar de suas tarefas
para se tratar. Por isso, durante a guerra sua atuação na Resistência se fez através dos
editoriais que escrevia no jornal clandestino Combat, do qual era editorialista e dava
voz a toda uma comunidade de resistentes.
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LITERATURA E POIESIS
Sua literatura pode ser traduzida como uma ‘poiética’, cuja criação
se alicerça numa confluência da ética – tomada no sentido de uma mo-
ralidade de agir no mundo –, com uma estética inscrita na linhagem
7 Segundo Onfray, em L’ordre libertaire – la vie philosophique d’Albert Camus, “Camus
s’inscrit donc dans le lignage français des philosophes existenciels, mais surtour pas
existencialiste [...] Camus fut três tôt associé à l’existencialisme; aussi vite, il protesta de
cette assimilation” (ONFRAY, 2012, p. 13). Em grande medida as afinidades que apro-
ximavam Camus e Sartre estavam na paixão em comum pelo teatro, e na “rejeição de
todo esquema de compreensão que não se centrasse na experiência e ações huma-
nas” (ARONSON, 2007, p. 96).
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8 A influência do escritor russo sobre Camus vai além do pacifismo moral, como nos
mostra Todd em relação ao aspecto romanesco desse autor que tanto atraiu o franco-
-argelino. Em meio a uma séria crise de tuberculose de Camus, escreve Todd: “O escri-
tor acha que vai morrer, com sua grande obra por fazer, e pensa em Tolstoi. “nascido
em 1928. Escreveu Guerra e paz entre 1863 1869. Entre 35 e 41 anos.” Camus tem trinta
e seis anos. “Melville aos 35 anos: ‘Consenti na aniquilação’”. Nos períodos difíceis Ca-
mus reencontra seus guias romanescos, Melville e Tolstoi. Ele faz balanços:”Setembro
de 1949. O único esforço de minha vida, sendo que o resto me foi dado, e amplamente
(salvo a fortuna, que me é indiferente): viver uma vida de homem normal. Eu não que-
ria ser um homem dos abismos, esse esforço desmedido não serviu para nada. Pouco
a pouco, em vez de ter cada vez mais êxito em meu empreendimento, vejo o abismo
se aproximar.” Camus registra suas reações: “Fim de outubro de 1949. Recaída [grifo
meu]. [...] Depois de uma certeza tão longa de cura, esse retorno deveria me arrasar.
De fato, está me arrasando. Mas, depois de uma série ininterrupta de arrasamentos, fi-
nalmente me leva a rir, eis-me liberto, a loucura também é libertação.” Ele se detém em
Hawthorne, Shelley, Keats – mais um tuberculoso –, e Melville, mais uma vez Tolstói,
Fichte, Stendhal, Rimbaud, Delacroix, Maritain” (TODD, 1998, p. 516).
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10 Segundo Lodge, “o fluxo de consciência foi um termo cunhado por William James, o
psicólogo irmão de Henry James, o romancista, para definir o fluxo contínuo de pen-
samentos e sensações na mente humana. Mais tarde os críticos literários tomaram-no
emprestado para descrever um tipo específico de ficção moderna que tentava repro-
duzir esse processo” (LODGE, 1992, p. 51).
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13 Do ponto de vista dessa relação entre ética e estética na obra de Camus, ver o artigo de
Danilo Rodrigues Pimenta: A filosofia posta em imagens de Albert Camus. Disponível em:
https://seer.ufs.br/index.php/prometeus/article/download/8611/6847
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
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17 Costa Pinto, tratando da questão do narrador nos romances de Camus, sublinha esse
traço de linhagem literária à qual o autor pertence, através de um ponto de análise de
Roger Quilliot em Présentation de La Peste: “Em A Peste, a monotonia trágica dos fatos,
que transforma suas personagens (Tarrou, Rambert, Grand) em “mimos”, é conseguida
pela auto-aniquilação do narrador, que só descobrimos ser o dr. Rieux no último ca-
pítulo. “Num certo sentido, ele é todas as personagens” anotou Camus sobre Rieux à
margem do manuscrito do romance. Essa identidade entre Rieux e as demais persona-
gens, porém, é uma identidade negativa, pois cada uma delas veste uma máscara que
a despersonaliza, de modo a melhor submetê-la ao “olhar curioso do moralista, hábil
em distinguir as atitudes comuns das reações de grupo ou de classe” (Quilliot). E isso
só é possível porque a voz de Rieux se destaca de seu corpo, porque ele desaparece
sob a ação do autor/narrador” (PINTO, 1998, p. 139).
18 Ainda de acordo com Costa Pinto “o exemplo singulariza as sentenças, transforman-
do-as em máximas que, a partir de Montaigne, tendem a compor um quadro mais
fragmentário. É como se, tendo os Ensaios estabelecido o horizonte de representações
próprio ao moralista, os aforismos de La Rochefoucauld ou Vauvenargues pudessem
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19 Para Blanchot, “o caráter narrativo não é percebido quando nele se vê o relato verda-
deiro de um acontecimento excepcional, que ocorreu e que alguém tenta contar. A
narrativa não é o relato do acontecimento, mas o próprio acontecimento, o acesso
a esse acontecimento, o lugar aonde ele é chamado para acontecer, acontecimento
ainda por vir e cujo poder de atração permite que a narrativa possa esperar, também
ela, realizar-se” (BLANCHOT, 2016, p. 08).
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REFERÊNCIAS
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-guerra. Tradução de Caio Liudvik. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2007.
BARRETO, V. Camus: vida e obra. Rio de Janeiro: José Álvaro, Editor S.A.,
1970.
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NUNES, B. Ensaios filosóficos. (Org.) Victor Sales Pinheiro. São Paulo: Mar-
tins Fontes, 2010.
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TODD, O. Albert Camus: uma vida. Tradução de Monica Stahel. Rio de Ja-
neiro: Record, 1998.
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