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DRAMA

MARCELO FROMER
A tragédia do titã
Guitarrista da banda de rock Titãs é vítima de acidente de trânsito em São
Paulo
Edwin Paladino e Rodrigo Cardoso

https://www.terra.com.br/istoegente/98/reportagem/a_tragedia_do_tita.htm

18/06/2001

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Marcelo Abate/ AE

Eram 10h da manhã de segunda-feira 11 quando o músico Marcelo


Fromer, guitarrista da banda Titãs, acordou em sua casa na Granja Viana,
município de Cotia (SP), para mais um compromisso profissional. Fez as
malas, almoçou e três horas depois avisou o caseiro Francisco Ivo: “Vou
para o Rio de Janeiro gravar”. Antes de se juntar aos outros Titãs para
iniciar as gravações do 13º disco da banda – o que aconteceria no dia
seguinte – Marcelo marcou um jantar com a namorada, a jornalista Karen
Kupfer, para as 22h. Era assim que o casal comemoraria o Dia dos
Namorados.

No fim da tarde de segunda, antes de se sentar à mesa com Karen,


Sem identificação, Marcelo
foi reconhecido no hospital
Marcelo vestiu tênis, calção vermelho, camiseta azul e saiu para fazer
por uma tatuagem do
Supermouse no braço cooper pelas ruas do Jardim Europa, zona oeste de São Paulo. Exatamente
às 18h30 daquele dia tudo que o músico havia programado desde a
manhã não seria mais possível. Marcelo, 39 anos, foi atropelado por uma
motocicleta, sofreu traumatismo crânio-encefálico e facial e foi internado em coma no Hospital
das Clínicas.

Sem documentos e sem ter sido socorrido pelo motoqueiro Vidal Cavalcante/ AE

que o atropelou, Marcelo só foi identificado quatro horas


depois do acidente. Sua namorada, intrigada com o atraso
do músico para o jantar, dirigiu-se ao 15º distrito policial
para comunicar o desaparecimento do músico e foi
informada de que um desconhecido fora atropelado e
transportado pelo Resgate para o Hospital das Clínicas. “Os
enfermeiros diziam que havia chegado um careca cheio de Em 1998, os Titãs no Terraço Itália, em São
tatuagem”, conta uma funcionária do hospital que Paulo: terça-feira 12, o grupo começaria as
gravações do 13º disco
trabalhava no momento da internação de Marcelo. E foi
justamente um desenho do personagem Supermouse,
tatuado no braço
Veronica Campos/ AE esquerdo do músico, que possibilitou sua identificação.

À 1h45 da terça-feira 12, Marcelo foi para a mesa de cirurgia.


Amigos, como o apresentador Serginho Groisman, os músicos Paulo
Miklos e Arnaldo Antunes, passaram a madrugada no hospital
aguardando notícias. Por volta das 6h, o neurocirurgião Hector
Navarro, responsável pela operação, chamou num canto os pais de
Marcelo – Joaquim e Lúcia – e explicou que o quadro era
Com Karen Kupfer, num jantar em
São Paulo, sexta-feira 8: ela
estranhou o atraso de Marcelo para o
jantar do Dia dos Namorados, na
noite de segunda-feira 11, e ligou
para a polícia
“extremamente grave”. “Somos amigos há 25 anos e fiquei chocado. Foi um acidente
estúpido”, disse Serginho Groisman.

Segundo o médico, Marcelo respirava com auxílio de aparelhos e tinha “obstrução das vias
aéreas com aspiração de sangue para os pulmões, hemorragias difusas, grande inchaço
cerebral e a pressão arterial estava sendo mantida por fortes medicamentos”. A apresentadora
Astrid Fontenelle, apesar de abalada, deixou o hospital no início da noite afirmando: “Enquanto
houver vida, há esperança”. Pouco tempo depois foi a vez de Karen, a namorada de Marcelo,
sair do hospital. Bem menos esperançosa, ela pedia para as pessoas rezarem para Deus e dizia
que Marcelo estava “praticamente desenganado”.

Sem socorro Marcelo tentava atravessar a avenida Europa, uma das mais movimentadas da
capital paulista, quando foi surpreendido pela motocicleta. O músico estava a cinco metros da
faixa de pedestres. Um auxiliar de cozinha viu o acidente e contou à polícia que “o motoqueiro
desequilibrou-se, mas não chegou a cair, e não prestou socorro à vítima”. Na cidade de São
Paulo é registrado um atropelamento a cada 44 minutos. Até a madrugada de quarta-feira o
autor do atropelamento não tinha sido identificado. Se isso acontecer, ele responderá processo
por lesão corporal culposa agravada por omissão de socorro e, se condenado, poderá cumprir
uma pena de até dois anos e meio de detenção.

Pela descrição da testemunha, que pediu para não ser Davi Zocoli

identificada, a polícia concluiu que Marcelo foi atropelado por uma


Honda Bizz ou por uma Yamaha Kripton, consideradas de
pequeno porte em comparação a outros modelos. “Marcelo sofreu
um afundamento na região esquerda do crânio e não teve
nenhuma fratura. Por isso, é provável que o capacete do
motoqueiro tenha atingido o músico”, diz o investigador Elson
Alexandre Sayão, que cuida do caso.
Com Paulo Miklos e Tony Belloto , num
Assim que foi informada do acidente, a ex-mulher do músico, Ana show em Brasília, em agosto passado.
Nos anos 80 (abaixo), a formação inicial
Cristina Martinelli, e os dois filhos, Max, 5 anos, e Alice, 7, que dos Titãs
moram em Portugal, embarcaram para o Brasil. “É uma situação
delicada. Marcelo é da família e viveu 12 anos com a minha
filha”, disse Ana Maria Martinelli, ex-sogra do músico, no saguão do hospital. Marcelo ainda é
pai de Suzi, 17, fruto de seu primeiro casamento.

Divulgação Um dos fundadores dos Titãs, em 1984, Marcelo aprendeu


sozinho a tocar guitarra. “Não sei ler música. Aprendi na raça”,
disse certa vez. Além da música, Marcelo tinha outras paixões:
futebol e gastronomia. “Nos anos 80, ele era um baita craque
de bola”, lembra Nasi, vocalista da banda Ira!. “Toda semana
íamos jogar uma partida de futebol e depois comer uma pizza
na padaria.”

Por conta de seus conhecimentos, em 1994 Marcelo tornou-se


Nos anos 80, a formação inicial dos Titãs
cronista esportivo, escrevendo para um jornal paulista. Em
1999, publicou o livro de culinária Você Tem Fome de Quê?.
Recentemente, Marcelo, dono de uma importadora de vinhos,
passou a escrever sobre gastronomia na revista Vinho Magazine e num site. O outro prazer era
a prática do cooper. “Ele corria todos os dias”, contava no hospital, em tom de lamento, a
amiga Clarisse Goldberg, na esperança de um milagre.
Epitáfio
Titãs
Devia ter amado mais
Ter chorado mais
Ter visto o sol nascer
Devia ter arriscado mais
E até errado mais
Ter feito o que eu queria fazer

Queria ter aceitado


As pessoas como elas são
Cada um sabe a alegria
E a dor que traz no coração

O acaso vai me proteger


Enquanto eu andar distraído
O acaso vai me proteger
Enquanto eu andar

Devia ter complicado menos


Trabalhado menos
Ter visto o sol se pôr
Devia ter me importado menos
Com problemas pequenos
Ter morrido de amor

Queria ter aceitado


A vida como ela é
A cada um cabe alegrias
E a tristeza que vier

O acaso…

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