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O começo de tudo: O pretexto necessário.

Primeiramente, antes de expor tudo que foi observado e entendido nessa


etnografia, vale a pena também reportar o que veio antes disso. O que faz com que as
aulas de Agronomia seja um ambiente interessante para ser observado? Deve-se
começar então pelo pretexto existente para que essa etnografia tenha sido feita: Os
rumores sobre o curso.
Foi passado para mim, com toda certeza, que os ‘’agroboys’’ são de extrema
arrogância, mal educados, antipáticos e que possuem costumes estranhos. Como por
exemplo, suas vestimentas, com botas de ‘’roça’’ e muitas vezes blusas quadriculadas e
jaquetas cinzas. Criticaram também o seu modo de conversar, sempre fazendo piada
sobre plantas e discutindo o tipo específico de grama que a PUCPR põe nos jardins do
campus. Além de sempre assimilarem os agronômos com caminhonetes e carroças por
acharem que faz mais sentido uma ‘’agroboy’’ andar nesses transportes em vez de
outros.
É visto a partir disso que o curso de agronomia é pré julgado pelos seus colegas de
outros cursos, apenas pelo seu curso ter como foco as plantas, os animais e a produção
neste meio. Desse modo, o curso acaba ganhando uma má fama, e uma exclusão social
no meio em que se convive. Não somente os cursos de humanidades o excluem, como
também alguns de saúde, design e arquitetura entre outros. E é nesse meio, que
encontram-se os calouros da universidade, e a pergunta que se deve ter todo o momento
em seus anos de faculdade: ‘’Por que?’’. Por que o curso é tão excluído socialmente? Por
que tantas piadas, tantos pensamentos negativos sobre um curso que, assim como os
outros, trás satisfação ao aluno e nos traz maior conhecimento sobre a natureza e o
mundo? Os alunos desse curso seriam pessoas tão ruins assim para que esse pré
julgamento continue se perpetuando pelas paredes dos blocos da PUCPR? Nessas
perguntas, então criei uma teoria do que poderia ser todo esse julgamento. A pergunta
central que me levaria a fazer essa etnografia: ‘Um curso por si só, que define o rumo da
sua vida, pode mudar a personalidade de seus alunos ao ponto em que todos se tornam
padrões do nosso próprio curso? Será que todos nós carregamos consigo cada vez mais
características únicas do nosso próprio curso a cada dia a mais que passamos dentro da
sala de aula? Se sim, até a que ponto isso pode ser considerado positivo?
Nessa etnografia, pretendo desvendar as minhas dúvidas e curiosidades sobre o
assunto. Vendo de uma vez por todas se pré julgamos o curso de agronomia, ou se
realmente todo aluno vira fruto da própria área que escolhe pertencer; estudar.
Etnografia: suas dificuldades, desenvolvimento e descobertas.
Começando este trabalho, fui inicialmente procurar saber sobre os horários de
aula. Com muita dificuldade tive acesso às algumas grades horárias, de alguns turnos e
períodos diversos. O primeiro momento que tive real contato com o ambiente didático
deles foi no nono período. Era em torno de 15-16 alunos. Pelo modo que se vestiam, a
barba e o cabelo bem feito, presumi em primeiro momento o que poderia ser uma boa
condição financeira. Não estava errada. A maioria comentava de fazendas no interior,
além de alguns terem comentado que não pagam sua faculdade. Tendo assim, um auxilio
familiar para concluir a graduação. Tinham grupos bem separados, com 4 ou 5 em cada
grupo. Eles, eram, de certo modo, bem humorados uns com os outros. Havia uma boa
socialização entre os grupos, e o fato de ter uma convidada entre eles não atrapalhou
muito isso. Apesar das separações dos meios sociais existentes na sala, eu diria que em
torno de ¼ da sala usava uma jaqueta cinza, grossa, com um símbolo no meio e o nome
de cada um em cima. Posteriormente conversei com os alunos e a jaqueta é uma forma
de representação do curso deles. Eles usam realmente como um uniforme. Assim como
nas áreas da saúde é comum usar jaleco para fazer os seus estudos.
Confesso que no primeiro momento, tive dificuldades em achar as reais aulas que
acontecem no período noturno. Por motivos de final de semestre, muito das aulas já
haviam acabado e logo, não consegui começar o meu trabalho de campo. Esse primeiro
momento com o nono período por exemplo, não foi uma aula. Foram orientações sobre o
TCC e datas de entrega do trabalho. Depois desse momento de orientação, conversei
com algumas meninas que me ajudaram a procurar mais turmas no horário do noturno.
Achamos que teria aula no prédio amarelo da PUC, o prédio de humanidades, na sala A1
e A2. Porém, encontrei apenas uma sala com alunos, sendo que esses estavam fazendo
prova. Após aquela prova, no horário de 19h45 até 21h15, não haveria mais nenhuma
aula no dia de terça. Entretanto, consegui me misturar com alguns deles a partir das
semanas em que fiquei procurando os horários das matérias. E acabei me aproveitando
disso para tirar algumas informações, e também ouvi-los conversar algumas vezes sobre
a matéria.
Alguns deles dos quais eu conversei, era do terceiro período. Eles têm aula sobre
‘’estrutura e funcionamento de plantas’’, uma matéria na área de botânica. Eles pareciam
nervosos após sair da prova desta matéria pela dificuldade nos nomes que tinham que
saber para ir bem. Eles me explicaram que esta matéria é de grande importância no curso
deles, sendo uma das matérias que eles dão mais foco. Explicaram que pelos diferentes
tipos de plantas que existem, existem também diferentes estruturas internas. A espessura
do caule, o comprimento da raiz, se ela é forte ou não, os sistemas circulatórios que
existem dentro da planta e tudo mais. E saber disso tudo é entender melhor cada espécie
de planta que, um dia, eles irão se cultivar. Perguntei então se eles procuram conhecer
muitas plantas no dia a dia deles. Eles responderam que normalmente eles sabem alguns
tipos, por eles já terem contato a mais tempo. Nesta pergunta, acabei me lembrando de
uma piada feita por outros cursos sobre a agronomia. O fato de eles saberem o nome
científico das gramas do campus da PUC. Perguntei então se eles sabiam o nome
científico de alguma planta que tinha no jardim da PUC, eles riram um pouco. Disseram
que se tentarem, conseguem acertar. Pois todos os tipos de grama que existem tem um
aspecto bem distintos um do outro. O que eles chamaram de grama Mato Grosso, por
exemplo, tem maior crescimento em curto prazo. Logo, eles não arriscariam dizer que
seria esse tipo de grama. Mas muitos do curso debatem sobre isso, uma vez ou outra, e
tentam adivinhar a grama dos jardins. Para eles, a espécie de grama que tinha maior
possibilidade de ser era, mesmo não sabendo o nome científico, a grama esmeralda.
Essa grama, pelas minhas pesquisas e pelo que foi falado, é uma grama mais curta, que
precisa de muito sol e possui uma boa resistência em questão de ser pisoteada. Depois
dessa conversa com um grupo de agrônomos, notei que voltei para casa observando a
grama por uns dois dias, e concordo com eles quando digo que a grama ‘’Zoysia
Japônica’’ (esmeralda) tem grandes chances de ser a grama que se vê nos jardins da
PUCPR.
Também pude socializar com um grupo do primeiro período. Mesmo eu não tendo
assistido nenhuma aula deles, eu os observei antes da prova pela porta. Uma classe bem
unida, conversando sobre a prova que começaria sobre agricultura de precisão. Tinham
as mesmas vestimentas que o nono período, a jaqueta cinza, alguns com o cabelo e a
barba bem feita e outros nem tão arrumados assim. Mais tarde, após a prova, pude
conversar com alguns alunos. Eles tiveram maior facilidade de conversar comigo sem
achar tão estranho. Conversaram bastante da prova e as questões em si sobre processos
envolvidos na produção agrícola, trabalho com drones para mapeamento de lavouras e
também o georreferenciamento da propriedade. 2/3 responderam que essa era uma das
matérias mais interessantes do período, e se animaram para me contar um pouco mais
sobre essa matéria. Após isso, eles falaram de algumas piadas que eles ouviram sobre a
agronomia. Eles não pareciam se importar realmente, eles tinham muitas piadas internas
também. Mas, de certa maneira, eles terminaram esse assunto fazendo uma crítica aos
outros cursos, por agirem como ignorantes por falarem dessa maneira sobre outro curso.
Vale a pena explicar que essa crítica veio de um comentário que uma das meninas do
primeiro período ouviu, onde uma pessoa falava em um grupinho que a agronomia não
servia para nada. Que os alunos dessa área estudavam 5 anos só para aprenser a fazer
horta. O que acarretou a crítica feita pela agronôma. Entretanto, mesmo depois de um
deles ter feito essa fala, uma conversa um tanto quanto negativa sobre o curso de
arquitetura começou. Falando das vestimentas um tanto quanto sociais deles, e o modo
sério de conversar. Eles estranhavam o curso de arquitetura. Iniciando assim mais um
ciclo universitário, aonde a antropologia descreve de uma maneira bem simples de
entender, onde o Mesmo vê o Outro e cria uma estranheza. E após isso, acaba por fazer
um pré julgamento sobre ele.
Isso me fez pensar o primeiro motivo do qual escolhi essa etnografia, o pré
julgamento que existente entre um curso e outro. E, a partir de algumas conversas,
descobri que a maioria das coisas que falavam era verdade, realmente. Eles gostam de
usar blusa quadriculada, bota e, muitas vezes, a jaqueta do curso deles – o motivo por
trás disso veio mais tarde em uma conversa com um menino do primeiro período também.
Eles usam essa jaqueta também, porquê fazem muitas experiências com terra e plantas,
e no cinza as sujeiras não aparecem tanto. - Muitos deles são filhos de fazendeiros, mas
muitos também trabalham para pagar a faculdade – essa informação é mais específica
sobre o primeiro período. -. São simpáticos, porém não muito sociáveis. Alguns gostam de
agronomia principalmente por ser um trabalho solitário e sem estresse para eles. Eles
possuem sim, suas características coletivas que muitos outros cursos acabam por achar
negativo e criticar. Mas ao meu observar, é mais um ciclo universitário visto em um gosto
diferente do meu pela vida. E notoriamente, pode-se ver que faz parte do ciclo pré julgar
um curso e ser julgado também por outro. As ciências sociais pré julgam os agrônomos,
os agrônomos pré julgam os arquitetos e assim continua o eterno retorno – como diria
Nietzsche.

Conclusão: A resposta, os julgamentos, a universidade.


A partir desses pequenos momentos que pude ter com o curso de agronomia, tive
tempo para responder a pergunta foco que fiz neste trabalho. Afinal, um curso pode afetar
sua personalidade de alguma maneira? Acredito que sim. Obviamente, entre o nono
período e o primeiro período, haviam diferenças em questão de conversas e vivências.
Mas mesmo assim, eles partilham do mesmo modo de falar sobre o curso, o mesmo
esteriótipo visual, as mesmas piadas e estilos musicais – Música gaúcha é a favorita
deles. Eu vi pelo menos duas turmas colocarem após a conversa sobre o TCC. -. Então, é
possível ver que segue uma linha de características desse curso. Chegando então ao
pensamento que a representação física dos cursos seriam os seus alunos. Sobre o
quanto isso pode ser prejudicial, isso varia. Quanto mais o curso te fecha no seu próprio
mundo, menos chance de encher outras visões e vivências você terá. O grupo de
Agronomia, por exemplo, é um grupo que não gosta de conversar com outros cursos, nem
do bloco amarelo e nem no bloco verde. Isso acaba fazendo o que eles não se integrem
muito na própria faculdade e seus diferentes habitats.
Isso vale para todos os cursos de todas as faculdades: todos vivem dentro de uma
zona social confortável; uma bolha. Onde todos tem um pensamento semelhante. Mas
nem sempre viver dentro dessa zona é o melhor. Temos que entender as diferenças dos
outros cursos, e apreciar de certo modo eles por serem dessa maneira. Por proporcionar
outros campos de visão e ideias sobre o mundo. Afinal, a faculdade serve para tornar
seus alunos conhecedores de nossas áreas, e não ignorante de outras. Logo, concluo
que os agrônomos são um outro gênero existente dentro dessa família de cursos que a
PUCPR proporciona. Eles têm suas maneiras de viver e se comunicar, são julgados por
serem diferentes, mas também julgam por acharem outros diferentes. Acabo essa
etnografia afirmando que o equilíbrio na sociedade universitária que existe. E a prova
disso pode ser encontrado em uma simples frase: Ser julgado, mas julgar também.

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