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Hiperferritinemia: investigação e manejo


Atualizado em 19.08.2020 Tempo de leitura: 4 minutos Lívia Pessôa de Sant'Anna

Clínica Médica, Colunistas, Hematologia

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A hiperferritinemia é um achado comum na prática clínica, uma vez que a ferritina é um marcador de fase aguda e, portanto, encontra-se elevada em
diversas situações (ex.: sepse, malignidade, doença autoimune).

Em muitos casos, a hiperferritinemia é atribuída à sobrecarga de ferro, cuja principal causa é a hemocromatose hereditária. No entanto, há sobrecarga de
ferro de fato em menos da metade dos pacientes com níveis elevados de ferritina. As causas mais comuns de hiperferritinemia não relacionada à
sobrecarga de ferro são a doença hepática gordurosa não alcoólica e o etilismo.

Importante ressaltar que alguns fatores in uenciam o resultado da ferritina, como idade e sexo (ex.: mulheres no menacme tendem a ter valores mais
baixos de ferritina), assim como hábitos de vida (ex.: consumo de álcool, tabagismo). Por conseguinte, o valor da ferritina não deve ser avaliado
isoladamente; tais fatores devem ser considerados para determinar se realmente há hiperferritinemia ou não.

Sendo assim, uma investigação detalhada do aumento dos níveis de ferritina é fundamental para que seja estabelecido um diagnóstico correto,
permitindo então um tratamento adequado para cada indivíduo.

Leia também: Choosing Wisely: o que deve ser evitado na hematologia pediátrica?

Principais causas de hiperferritinemia


Sobrecarga de ferro primária: hemocromatose hereditária é uma doença autossômica recessiva que provoca o aumento da absorção intestinal de
ferro. Dessa forma, tal absorção não é regulada por suas reservas, levando ao acúmulo progressivo de ferro, pois não há nenhum mecanismo normal
para a excreção do seu excesso. O ferro em excesso se deposita em órgãos (ex.: fígado, coração), causando disfunção;
Sobrecarga de ferro secundária: politransfusão (ex.: hemoglobinopatias) ou iatrogenia (ex.: administração excessiva de ferro parenteral);
Não relacionadas à sobrecarga de ferro: condições comuns incluem doença hepática gordurosa não alcoólica e/ou obesidade, etilismo, infecções,
processos in amatórios (ex.: doença autoimune), malignidade, disfunção hepática.

Etapas importantes na investigação de hiperferritinemia


Anamnese e exame físico: aspectos que devem ser abordados na anamnese incluem história atual ou pregressa de doenças, história familiar de
hiperferritinemia, reposição de ferro, consumo de álcool e transfusões prévias. Durante o exame físico, recomenda-se pesar e medir o paciente para o
cálculo do índice de massa corpórea (IMC);
Exames laboratoriais: apesar de não ser altamente especí co ou sensível, o índice de saturação de transferrina é um marcador útil no diagnóstico
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diferencial da hiperferritinemia: valores maiores que 45% em mulheres e 50% em homens sugerem sobrecarga de ferro; no entanto, a presença de
valores normais não exclui a possibilidade de excesso de ferro (primário ou secundário).

Além da cinética de ferro, recomenda-se a realização de testes de função hepática, glicemia, per l lipídico, proteína C reativa (PCR), velocidade de
hemossedimentação (VHS) e pesquisa genética das mutações C282Y e H63D. Essa avaliação inicial ajuda no diagnóstico diferencial, norteando as etapas
subsequentes (ex.: na presença de anormalidades nos testes de função hepática, indica-se investigação de doença de Wilson, hepatite autoimune,
hepatite viral e de ciência de alfa-1 antitripsina).

Exames de imagem: exames de imagem do fígado contribuem na investigação da causa e na avaliação de dano hepático resultante do aumento da
ferritina. Ultrassonogra a pode revelar hepatomegalia, esteatose, desordens de vias biliares, cirrose e sinais de hipertensão portal. A ressonância
magnética é um método não invasivo capaz de avaliar a concentração hepática de ferro e a presença de brose.

Saiba mais: Mieloma múltiplo: atualizações de diagnóstico, estrati cação de risco e tratamento

Hemocromatose hereditária
Se o indivíduo apresentar a mutação C282Y em homozigose (C282Y/C282Y) ou tiver as duas mutações em heterozigose (C282Y/H63D), além de ferritina >
1.000 microgramas/L, indica-se a realização de biópsia de fígado para avaliar presença e gravidade do dano hepático, particularmente se os testes de
função hepática estiverem alterados e/ou se os exames de imagem sugerirem cirrose. Se o paciente tiver o diagnóstico de hemocromatose hereditária,
mas apresentar ferritina < 1.000 microgramas/L, o procedimento não é necessário de rotina, a menos que haja hepatomegalia e/ou disfunção hepática.

Em indivíduos com mutação C282Y ou H63D em heterozigose (C282Y/tipo selvagem ou H63D/tipo selvagem), é pouco provável que o aumento da
ferritina seja decorrente de distúrbio primário. Nesses casos, outras causas devem ser pesquisadas, incluindo mutações em outros genes associados à
hemocromatose hereditária (ex.: HJV, HAMP, TR2, SLC40A1).

Manejo da hiperferritinemia
As principais formas de remover o excesso de ferro são a ebotomia e a terapia quelante de ferro.

Com uma sangria de cerca de 450 mL, aproximadamente 250 mg de ferro são removidos. Além desse efeito direto, a queda de hemoglobina secundária à
perda sanguínea estimula a eritropoiese, o que mobiliza os estoques de ferro para a produção de mais hemácias, contribuindo ainda mais para a redução
dos níveis de ferritina. O intervalo entre as ebotomias depende dos valores de hematócrito, hemoglobina e ferritina do paciente. O procedimento está
indicado quando os níveis de ferritina encontram-se acima de 1.000 microgramas/L, mesmo em indivíduos assintomáticos, e não há um consenso em
relação ao valor alvo, porém muitos guidelines sugerem manter a ferritina entre 50 e 100 microgramas/L.

A quelação de ferro é o tratamento de escolha nos casos de sobrecarga de ferro secundária (ex.: beta-talassemia) e a opção de segunda linha no manejo
da hemocromatose hereditária (ex.: intolerância à ebotomia). O quelante mais utilizando na prática clínica é o deferasirox.

Autora:

Lívia Pessôa de Sant'Anna


Graduação em Medicina pela Faculdade Federal Fluminense (UFF) ⦁ Residência em Clínica Médica no Hospital Universitário Pedro
Ernesto (HUPE/UERJ) ⦁ Residência em Hematologia e Hemoterapia no Hospital Universitário Pedro Ernesto (HUPE/UERJ)

Referências bibliográ cas:

Ong SY, Nicoll AJ, Delatycki MB. How should hyperferritinaemia be investigated and managed?. European journal of internal medicine. 2016;33:21-27.
Senjo H, et al. Hyperferritinemia: causes and signi cance in a general hospital. Hematology. 2018;23(10):817-822.
Lorcerie B, et al. Diagnosis of hyperferritinemia in routine clinical practice. La Presse Médicale. 2017;46(12):e329-e338.

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