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Oqecultvol 2 Porto PDF
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vo l u m e i i
Cultura e Desenvolvimento
em um quadro de
desigualdades
Marta Porto
c o l e ç ão c u lt u r a é o qu ê ?
vo l u m e i i
Cultura e desenvolvimento
em um quadro de
desigualdades
?
Marta Porto
?
8 9
provedor de formação humanística e desenvolvimento.
O texto de Marta Porto vem então propor o grande e
maior desafio que está na mudança de mentalidade em
relação a alguns aspectos que cercam o “termo” cultura:
a inclusão da cultura na pauta das políticas públicas, com
investimentos que possibilitem o efetivo exercício da gestão
cultural; a percepção dos programas culturais, não como
“ação social capaz de transformar indicadores históricos
de desigualdade”, mas como um direito assegurado pela
sociedade e, finalmente, a necessidade de repensar os
programas sociais que, utilizando para seus fins a formação
artística, promovem entre as populações carentes a ilusão
da ascensão pela fama na indústria de entretenimento.
A autora finaliza seu texto que, pleno de lucidez, traz por fim
a dimensão de uma sociedade que irá realizar justiça social Preâmbulo
ao garantir o acesso de seus bens públicos a todos os seus
cidadãos. A cultura, diverso e plural produto da expressão
humana e fator de desenvolvimento, talvez configure-se aí
como o mais importante conjunto de humanidades a ser
compartilhado por todos.
10 11
Entramos no século XXI, com todas as possibilidades
Cultura e cidadania
científicas e tecnológicas de superação das nossas
condições de desigualdade econômica e social. Infelizmente
são temas que a realidade brasileira não confirma essa tese. Ocupamos o
segundo lugar em mortes por armas de fogo em todo o
12 13
nossas tristezas e de nossa imensa desigualdade. O luxo I
supera o odor incômodo do lixo. cultura e
desenvolvimento:
Como pensar a importância das políticas culturais para o uma difícil relação
desenvolvimento a partir de uma cultura de desigualdades
construída culturalmente ao longo da história brasileira?
14 15
•A democratização política, econômica e social; estudos sobre este tema no país, o Instituto de Estudos do
•A consolidação da estabilidade macroeconômica; Trabalho e Sociedade - IETS, liderado por economistas e
• Uma ampla reforma de instituições que já fizeram seu estudiosos de peso no cenário nacional.
tempo, que não condizem com a sociedade aberta e de
mercado que se está construindo, e que impedem maiores A pauta correta, sob todos os pontos de vista, não exclui
ganhos de eficiência e uma maior equidade; por todo a dimensão cultural, certamente subentendida
• A redefinição do espaço público, de forma a consolidar em alguns dos itens acima, mas revela a forma indireta
a descentralização e a ampliar suas fronteiras para além da com que ela é tratada na totalidade dos documentos, e
esfera estatal; também nos debates públicos, sobre desenvolvimento
• O aumento dos investimentos em infra-estrutura, em que lideram a discussão no país. Certamente porque a
ciência e em tecnologia; cultura, antes de definir um caminho político próprio, com
• A reformatação de um amplo leque de políticas públicas, uma agenda clara, propositiva, de médio e longo prazos
visando obter uma maior transparência e, sobretudo, uma e de fácil compreensão para o cidadão comum, assume
maior eficácia do gasto público; uma postura dúbia ao tentar justificar a sua importância
• O redesenho da inserção do país no cenário econômico através de associações com outras agendas - a social e a
e político internacional. econômica, para ficar nas mais óbvias ¬que muitas vezes
roubam da cultura o que seria a sua maior contribuição: a
Trata-se, portanto, de uma agenda complexa - cuja formação de indivíduos com consciência crítica capazes
materialização requer o envolvimento de um amplo de propor mudanças em um modelo que raramente
leque de atores e uma profunda mudança no imaginário corresponde ao anseio humano por liberdade e justiça.
coletivo nacional.
Na área da cultura, o debate capaz de recuperar a sua
Os pressupostos acima foram retirados de um documento dimensão e importância política foi gradativamente
intitulado “Caminhos para o Desenvolvimento no Brasil”, substituído pela insuficiente discussão sobre os
elaborado por uma das principais entidades de pesquisa e mecanismos de financiamento à cultura, através da
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facilitação do acesso aos recursos privados. Substituímos sociedade fórmulas fáceis como as aplicadas nos editais
o essencial pelo acessório e em 20 anos colhemos o fruto de patrocínio, que exigem “contrapartidas sociais”
dessa escolha: a fragilização do sistema nacional de cultura, aos projetos financiados, ou o manejo, muitas vezes
com ausência de verbas públicas nos órgãos oficiais de inconseqüente, de termos padrões como “inclusão social”,
cultura, o desmonte de instituições de salvaguarda e “auto-estima” e tantos outros que, utilizados ad nauseam,
memória do patrimônio nacional, a má remuneração ou são esvaziados de sentido.
qualificação dos recursos humanos, mas, especialmente, a Neste texto, iremos, de forma introdutória, destacar
substituição da idéia de acesso amplo e universal a toda a
população brasileira, pela ação pautada em “público-alvo”.
Como em nenhuma
análises que colaborem para uma reflexão sobre este tema.
18 19
II Causas e conseqüências de uma política de incentivos
no reino do fiscais à cultura, adotada indiscriminadamente no
marketing:lideranças país desde 1985, pela qual empresas sem regulação
empresariais e o avesso adequada abatem um percentual do imposto devido ao
da cultura Tesouro Nacional, para estimular o ingresso de recursos
privados nas várias áreas da produção cultural. São as
leis de mecenato, que se implantam a partir de proposta
do Governo Federal com a Lei Sarney e, com ajustes
Alheia a boa parte dos avanços políticos que marcaram seqüenciais a partir de 1992, surgem nas figuras da Lei
nas duas últimas décadas as discussões em outros Rouanet, Lei do Audiovisual e, posteriormente, as leis
setores de atuação pública, a cultura caracterizou- estaduais e municipais, que incidem sobre impostos como
se, nos últimos anos, como uma área de disputa de ICMS, ISS e IPTU.
privilégios, personificados nos limites reivindicados para
a isenção fiscal dos diversos setores artísticos, pelo lobby Apesar da implantação do MINC em 1985, optou-se
de aprovação dos tetos permitidos nas comissões de por setorizar a discussão nos mecanismos financeiros
cultura e, naturalmente, pelas verbas publicitárias e de capazes de ampliar as verbas públicas a setores restritos
marketing das grandes empresas brasileiras, em especial da produção cultural, aqueles com maior capacidade de
e paradoxalmente das estatais. Assim, o campo teórico organização e pressão política. As leis de incentivo, nas três
por excelência das soluções coletivas, revela com crueza esferas do Estado, seus tetos de isenção e as estratégias
o traço mais contundente da elite nacional em relação às de preenchimento das planilhas disponibilizadas pelos
mazelas do povo: o prevalecimento dos interesses privados órgãos públicos deram a tônica da superficialidade política
e das soluções restritas a poucos sobre as necessidades que acometeu durante duas décadas o debate cultural no
de um corpo social diverso, a quem se nega o direito de país. Como em nenhuma outra área, a cultura do privilégio,
emancipação cultural e visibilidade pública. da ausência de preocupação com os movimentos sociais
e culturais de fora do que tradicionalmente se denomina
20 21
“produção cultural” esteve tão presente como nas políticas
culturais brasileiras.
de uma perspectiva
que o investimento em cultura se sustenta como “ação
preferencial de comunicação e marketing”, bem distante
22 23
Uma pesquisa encomendada pelo Ministério da Cultura “A participação da cultura em ações de
em 1997 à Fundação João Pinheiro registra de forma comunicação e marketing, por empresas públicas e privadas,
contundente a ausência de espírito público e a falta de em 1997, ocupa o primeiro lugar, com 53% das preferências
visão crítica dos burocratas do governo (gestão Francisco das empresas entrevistadas pela Fundação João Pinheiro.
Weffort, 1995-2002) e também dos dirigentes de Essa revelação consagra o marketing cultural como o meio
empresas que assumiram esse discurso e essa prática, mais importante para as empresas para divulgarem a
que ainda permeia o debate e o desenho das políticas de sua marca”. A evolução do comportamento empresarial
cultura brasileiras: de investimento em cultura, nos últimos anos, após a
modernização cultural levada a efeito pelo governo FHC,
Preferência das empresas por áreas de ações de comunicações - 1997
foi influenciada pela política de parceria entre Estado, das
leis de incentivo à comunidade cultural, implementada pelos
11%
Cultural
Científica
governos federal, estaduais e municipais (...). A pesquisa
7% Assistencial
Saúde de economia da cultura revelou ainda que, a partir de
Meio Ambiente
Esportiva
Educacional
1992, há um crescimento contínuo de empresas brasileiras
9% que investem em cultura como ação de comunicação e
53% marketing”.
3%
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benefícios conquistados pela população ao final de sua notas
vigência. A estratégia de identificar problemas e desafios
para a gestão pública, consensuados com outros atores
1. Fundação João Pinheiro, 1997, Disponível no site do Ministé-
da sociedade, indica a possibilidade de promovermos uma rio da cultura, www.cultura.gov.br.
parceria público-privada, com aplicação de incentivos
escalonados, para imprimir velocidade na resolução dessa
problemática. Podemos citar a área de infra-estrutura ou de
inclusão digital nas escolas e comunidades de baixa renda,
ou mesmo as que vêm sendo concedidas pelo Governo
na área editorial. Mas a transparência e a qualificação dos
gestores, mais a participação da população, devem ser
garantidas para preservar o sentido público de tal iniciativa.
28 29
IV A eliminação de privações de liberdades substanciais,
uma cultura para a argumenta-se aqui, é constitutiva do desenvolvimento”
(SEN, 2000)2.
política cultural
O desenvolvimento preconizado por Sen parte da idéia
de que cada indivíduo é agente ativo de mudança, e
não receptor passivo de benefícios. Sendo assim, um
desenvolvimento visto como um processo de expansão
O que se defende afinal é uma política cultural baseada em das liberdades reais que as pessoas desfrutam é um
preceitos culturais, na observância de valores e parâmetros desenvolvimento que vai muito além “do crescimento
que contribuam efetivamente para trazer um mote singular do PNB ou das rendas pessoais, industrialização, avanço
à discussão e ao processo de desenvolvimento. Não é o tecnológico ou modernização social. (...) As liberdades
isolamento da cultura de outras esferas da ação pública, dependem também de outros determinantes como as
mas a possibilidade de formular uma agenda capaz de se disposições sociais e econômicas (serviços de educação
legitimar de forma independente na vida pública. Uma e saúde) e os direitos civis (a liberdade de participar de
agenda que colabore para um tipo de desenvolvimento discussões e averiguações públicas)”3.
defendido pelo Prêmio Nobel de Economia Amartya Sen,
que mostra que a qualidade de nossas vidas deve ser medida Contribuir para a formação de agentes capazes de
não só por nossa riqueza, mas por nossa liberdade. participar da vida pública de forma consciente e ativa, em
uma sociedade capaz de estabelecer fóruns de diálogo e
“A expansão da liberdade é vista como o principal fim e o participação cidadã, é uma das ações mais desafiadoras das
principal meio do desenvolvimento. O desenvolvimento políticas culturais.
consiste na eliminação de privações de liberdade que
limitam as escolhas e as oportunidades das pessoas Uma política cultural que não tem como principais
de exercer ponderadamente sua condição de agente. destinatários artistas e produtores, mas o povo. Não
30 31
para entretê-lo, mas para criar oportunidades reais de
enriquecimento humano, de acesso ao conhecimento
produzido pela enorme diversidade cultural e ambiental
O reconhecimento do planeta, do reconhecimento da nossa e de outras
identidades culturais, de experiências culturais que
cultural passa a ser emocionem, que modifiquem a nossa maneira de ver e
elege o que vale a Uma política cultural voltada para as pessoas, de braços
dados com a ética, que valoriza a vida, a justiça e o
pena ser preservado, reconhecimento da diversidade. Capaz de promover
estimulado,
públicos leitores, de estimular a curiosidade sobre si e sobre
os outros, de expandir as experiências culturais e com elas
32 33
não beneficiários de outras políticas. Uma política para a
liberdade. E como se faz isso?
notas
O simples
reconhecimento 2. SEN, Amartya. Desenvolvimento com Liberdade. São Paulo:
Cia das Letras, 2001.
da diversidade 3. Idem.
34 35
V Quais os pilares de uma política de cultura pensada a
partindo da noção de partir desses princípios? Abaixo citamos um conjunto de
cidadania elementos propostos em documentos internacionais que
participativa podem contribuir para o debate sobre os fundamentos de
uma política cultural.
36 37
difusionista da cultura, como meio de melhorar o acesso fase adulta. Estímulos e incentivos proporcionados pela
da população à produção artístico-cultural vai sendo riqueza dos encontros culturais proporcionados ao longo
superada pela noção de diálogo e intercâmbio culturais, da vida, da nossa facilidade e curiosidade de apreendê-los
o que pressupõe que todos os atores sociais são capazes e transformá-los em dados importantes da experiência
de produzir cultura e estão em condições de igualdade humana. A cultura, tal qual ela é pensada no século XXI,
para trocar e experimentar novas práticas e experiências. é a experiência que marca a vida humana em busca do
Assim, a idéia de acesso passa a ser muito mais um desafio conhecimento, do alto aprimoramento, do sentido de
de estabelecer vias de diálogo, de encontro entre diferentes pertencimento e da capacidade de trocar simbolicamente.
num contexto de diversidades, do que de produzir linhas
programáticas baseadas na noção de entreter ou de levar “Um acesso desigual aos meios de expressão cultural, novos
a cultura ao povo. ou tradicionais, implica, não somente uma negação do
reconhecimento cultural, mas algo que afeta seriamente o
Acesso, então, é promover o diálogo de culturas em sentimento de pertencimento de indivíduos e comunidades à
contextos de igualdade e cooperação, disponibilizando sociedade do conhecimento, ou a sua exclusão dela. A cultura
a todos as mesmas condições para participar da vida possui laços múltiplos e complexos com o conhecimento. A
pública, imprimindo transparência à disputa por recursos, transformação da informação em conhecimento é um ato
garantindo bens e serviços culturais com a mesma qualidade cultural, como é o uso a que se destina todo o conhecimento.
em todos os espaços e a todos os setores da sociedade, Um mundo autenticamente rico em conhecimento há de ser um
independente de classe social ou local de moradia. mundo culturalmente diverso”. (Koichiro MATSUURA, 2002)
O acesso à cultura exige um ambiente comunitário e O valor que damos à cultura, a nossa ou a aprendida, é
político favorável à inserção cultural do indivíduo e dos aquele que aprendemos a dar. Assim a experiência cultural
grupos. A nossa disposição de aprender e dialogar com ocorre a partir do diálogo constante entre práticas criativas
universos diversos é fruto dos estímulos que recebemos próprias e o livre acesso aos acervos culturais tradicionais e
do ambiente vivenciado na infância, na adolescência, na contemporâneos. O tamanho da fissura no Brasil é grande,
38 39
e imagino que em boa parte dos países latino-americanos.
“Os números são eloqüentes: somos hoje 186 milhões de
brasileiros. Isso corresponde a 20 vezes a população de Por-
tugal, 5,5 vezes a da Argentina e 3 vezes a da França e da
Alemanha. A educação - estudantes e professores nos níveis
fundamental, médio, superior e pós-graduação - envolve 55
milhões de brasileiros. Cotejar esses números com os da pro-
Acesso, então, dução cultural nacional é deparar-se com um outro país. A
tiragem média de um romance no Brasil é de 3 mil exem-
é promover o plares, a ocupação média dos teatros é de 18% dos ingressos
diálogo de culturas
oferecidos, e o público médio do filme brasileiro é de 600 mil
espectadores. Vê-se que nem mesmo os inscritos na escola
40 41
Quem cuidará do lado humano, espiritual, do imaginário 4. A cultura como capital social promotora de
e do sonho se a cultura quer apenas o econômico, o desenvolvimento.
entretenimento, a disputa pelas verbas sociais? Nada
contra as dimensões culturais promotoras desses setores, O que é capital social? Vamos usar um trecho do discurso
mas o principal parece esquecido: o que nos torna de Enrique Iglesias, presidente do Banco Interamericano de
humanos não é a função e sim a inspiração. Desenvolvimento para ilustrar essa noção:
Nesse ponto, uma gestão cultural atenta a prover a “Há múltiplos aspectos da cultura de cada povo que podem
educação do que ela parece ter perdido, o conhecimento favorecer seu desenvolvimento econômico e social. É preciso
humanístico e a autonomia crítica, é a âncora desse descobri-los, potencializá-los e apoiar-se neles, e fazer isto
desenho. Um processo educacional e educativo com seriedade significa rever a agenda de desenvolvimento
enriquecedor, que amplie a visão de mundo e as de um modo que resulte, posteriormente, mais eficaz, porque
perspectivas de cada um, parte de dentro e de fora dos tomará em conta potencialidades da realidade que são da
muros escolares. Ganha relevância nos conteúdos gerados essência e que, até agora, foram geralmente ignoradas”.
pelos veículos de comunicação na internet, nos celulares e (IGLESIAS, 1997)
ipods. Nos bancos escolares e nos centros de cultura, nos
teatros, nas ruas e praças das cidades onde os encontros se Outra noção interessante é a de Michael Porter
tornam possíveis, quando promovidos de forma criativa e desenvolvida em seu artigo “Atitudes, Valores, Crenças e a
sistemática. Onde se abra espaço para o experimental, Micro Economia da Prosperidade” :
para o comunitário, para o estranho, que dialogando
com o tradicional, o clássico, o de sempre, produzam “Um papel importante para a cultura na prosperidade
novos sentidos, aprendizados já preconizados pela econômica continuará existindo, mas poderá ser muito
antropofagia cultural de Oswald de Andrade. bem um papel mais positivo. Aqueles aspectos particulares
de uma sociedade que originam inusitadas necessidades,
habilidades, valores e modos de trabalho serão os aspectos
42 43
característicos da cultura econômica. Os aspectos positivos
da cultura, como a paixão da Costa Rica pela ecologia, a
obsessão dos EUA com o conforto, a paixão do Japão por
jogos e desenhos animados serão fontes vitais de vantagem
competitiva difícil de imitar, resultando novos padrões
de especialização internacional, à medida que os países A experiência
cultural ocorre a
produzam cada vez mais os bens e os serviços nos quais sua
cultura Ihes dá vantagem única”. (PORTER, 2002) 6
44 45
consagrada pela UNESCO na Declaração do México, sobre as
Políticas Culturais, em 1997: “Em seu sentido mais amplo,
pode-se considerar a cultura como o conjunto dos traços
distintivos, espirituais e materiais, intelectuais e afetivos
que caracterizam uma sociedade ou um grupo social. Além
disso, ela engloba as artes e a literatura, os modos de vida, os
direitos fundamentais do ser humano, os sistemas de valores,
as tradições e as crenças”. Quando utilizo a palavra ativo,
quero me referir a sua definição como: “que exerce ação;
A cultura é legítima
que age, funciona, trabalha se move”, mas também como “a simplesmente
porque ela é a base da
totalidade dos bens de uma empresa, ou pessoa, inclusive os
direitos suscetíveis de avaliação”, e ao aproximar o conceito
de ativo da definição. 7
existência humana,
Poderia aqui defender as dimensões políticas, os pontos
e critérios que poderiam nos conduzir a uma boa política
é o valor que confere
cultural, já desenvolvido em outros textos autorais e dignidade e razão
de estarmos vivos e
melhor ainda por outros autores, mas quero apenas
defender a idéia de que a cultura é legítima simplesmente
porque ela é a base da existência humana, é o valor que
confere dignidade e razão de estarmos vivos e atuantes. atuantes
O desenvolvimento, esse feito com e para a liberdade, é
a possibilidade de encontrarmos em vida, e também de
cultivarmos. para as próximas gerações, condições que
46 47
além de suprir nossas necessidades, carreguem de sentido notas
a vida humana. Aqui a cultura ganha em dimensão e
relevância, oportunizando a todos sem distinção participar
4. ARAÚJO, Alcione. Educação e Cultura ao mesmo tempo
desse processo como protagonistas, alargando sua visão agora. Publicado no jornal Estado de Minas, 2005
de si e do mundo e por fim enriquecendo a nossa existência
5. IGLESIAS, Enrique. Cultura, educación y desarollo, Assem-
daquilo que é inadiável: a capacidade de imaginar essa vida bléia Geral da Unesco, Paris, 1997.
e de sonhar outras formas de viver mais solidárias, justas e
6. PORTER, Michel, in Harrison, Lawrence e Huntington,
por fim, alegres. Samuel. A Cultura Importa – Os Valors que Definem o Progresso
Humano. Editora Record, 2002.
7. BERBEL, Joatan Vilela. Ativo Cultural: um outro paradigma
para as políticas públicas de cultura, 2003.
48 49
VI b) Os movimentos comunitários, oportunidades e limites
tópicos de reflexão para o desenvolvimento local
50 51
O poder destes movimentos culturais expressos em
inúmeros exemplos espalhados pelo país, sem dúvida
alguma, traz um dado novo para o conjunto das práticas
sociais e de ocupação do espaço público que ainda não
foram devidamente absorvidas. Em parte, pela ausência de
políticas culturais.
54 55
Como lembra o intelectual colombiano José Bernardo
Toro em seu livro “A Construção do Público: cidadania,
Os projetos culturais, democracia e participação” ,
comunitários e Sesc Rio em 2002, que parece dar um sentido maior a esse
pilar da política cultural:
de periferias dos “A proteção dos direitos humanos, em uma sociedade
grandes centros cultural, requer a observância dos direitos culturais,
56 57
sem que se assegure o direito de existir, o direito à visibilidade, notas
o direito à diferença e à dignidade cultural”. (PIOVESAN,
2002). 9
8. TORO, J.Bernardo. A Construção do Público:cidadania, demo-
cracia e participação, Rio de Janeiro: Editora Senac Rio e X Brasil,
O desenvolvimento possível incluindo o cultural é uma ta- 2005.
refa contínua que exige reflexão e análise crítica. 9. PIOVESAN, Flávia. “Construindo a Democracia: prática cultu-
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60 61
Cultura, gestão e financiamento. Perfil
Plano Nacional de Cultura 2OO 1-2010 da Colômbia:
hacía uma ciudadanía democrática cultural. Bogotá, Minis-
tério da Cultura, 2001. Ensaísta e consultora, Marta Porto se graduou em
Plano Nacional de Cultura do México 2001-2006. la cultura em jornalismo. Já no início de sua carreira, decidiu
tus manos. Cidade do México, Plano Nacional de Desarollo 2001. trabalhar para tentar mudar a realidade, em vez de
reportá-la; nos diversos cargos públicos, privados e em
organismos internacionais que ocupou, esteve sempre
Convenio Andrés Bello www.cab.int.co à frente de projetos voltados para o campo social.
OEI www.oei.es A experiência na implementação de ações
www.minc.gov.br continuadas, em órgãos públicos e empresas,
a tornaram uma especialista em políticas de
www.unesco.org
comunicação e investimento social privado. Além
www.cepal.org.br disso, apontaram um caminho estratégico, que hoje
www.artecidadania.com.br se confunde com o que Marta enxerga como opção
viável de combate às desigualdades: ação escorada no
www.observatoriodefavelas.ogr.br pensamento, transformação de imaginários coletivos,
www. imagensdopovo.org. br formação de redes sociais.
www.xbrasil.net Autora de artigos e ensaios publicados na imprensa,
www.conaculta.gob.mx
em coletâneas de livros e revistas especializadas,
atualmente é diretora da (X)Brasil, escritório de
www.oas.org/udse/cic comunicação por causas.
www.aeroplanoeditora.com. br
62 63
Coleção Cultura é o quê?
?
?
O projeto gráfico dste livro foi composto no Estúdio
Quimera por Iansã & Inara Negrão para a Secretaria de
Cultura do Estado da Bahia, em Salvador. Sua impressão foi
feita pela Gráfica Esperança em papel reciclato, capa 120 g/
m2, e miolo 90 g/m2.