Você está na página 1de 2

Onde existir tempo existe o movimento, o estático só existe em teoria, a ausência do

movimento só existe no instante, por mais que tenhamos a impressão de que em


determinada situação é possível estagnar o movimento, o que é vivo sempre está em
movimento, mesmo que imperceptivelmente, algo está sempre se movendo dentro do
tempo, logo podemos dizer então que o tempo não passa, nós é que passamos. Como
tudo o que existe foi lançado para longe da origem, mesmo forças da natureza como a
luz, o som, a matéria, por mais que seja invisível a olho nu, está em movimento,
constantemente esculpindo o espaço.

Este exercício destinasse a idéia de tentar capturar através deste vídeo, o movimento em
existente em cada segundo de tempo, às vezes lento, às vezes acelerado, ele é
onipresente, acreditamos que para que fosse possível capturar a inércia total,
necessitaríamos do vazio completo, o qual sabemos não existir nas condições
atmosféricas a que vivemos.

Através da demonstração deste conceito tentamos também demonstrar a beleza e a


poesia que residem neste curto intervalo entre o que parece estático e o que se move,
consideramos está a dimensão temporal ideal da observação, da concepção da imagem
artística, o movimento ganha a riqueza de detalhes a qual o caracteriza como forma
única, momento único em que se É.

A idéia deste trabalho surgiu através da influência fílmica e conceitual criada pelo
cineasta russo Andrei Tarkovski. Sempre me impressionou muito a forma com que
criava as suas narrativas e a maneira com que capturava e criava o fluxo de tempo em
suas cenas, um ritmo muito particular que resulta numa diegese muito poética e ao
mesmo tempo realista, mais condizente com a nossa capacidade de observação e
absorção sensorial. Em seu livro Esculpir o Tempo, ele discorre sobre este conceito e
como funciona seu processo criativo:

O fator dominante e todo-poderoso da imagem cinematográfica é o ritmo, que expressa


o fluxo do tempo no interior do fotograma. [...] A imagem cinematográfica nasce
durante a filmagem, e existe no interior do quadro. [...] A montagem reúne tomadas
que já estão impregnadas de tempo, e organiza a estrutura viva e unificada inerente ao
filme; no interior de cujos vasos sanguíneos pulsa um tempo de diferentes pressões
rítmicas que lhe dão vida. [...] O tempo impresso no fotograma é quem dita o critério
de montagem, e as peças que «não se montam» - que não podem ser coladas
adequadamente - são aquelas em que está registada uma espécie diferente de tempo.
Não se pode, por exemplo, colocar juntos o tempo real e o tempo conceitual, da mesma
maneira que é impossível encaixar tubos de água de diâmetros diferentes. A
consistência do tempo que corre através do plano, a sua intensidade ou «densidade»,
pode ser chamada pressão do tempo; assim, então, a montagem pode ser vista como a
união de peças feita com base na pressão do tempo existente no seu interior.
(TARKOVSKI, A., Esculpir o Tempo, 2ª ed., trad. de Jefferson Luiz Camargo, São
Paulo, Martins Fontes, 2002, pp. 134-135).
Percebemos que para Tarkovski, cada take possui uma unidade temporal única e
singular, a montagem por mais que determine uma estrutura, está submissa ao ritmo
impresso em cada cena, em cada imagem. Em outra passagem ele fala sobre a questão
do movimento e a percepção pessoal do espectador:

Vejo então que a minha tarefa profissional é criar o meu fluxo de tempo pessoal, e
transmitir na tomada [no take] a percepção que tenho do seu movimento - do
movimento arrastado e sonolento ao rápido e tempestuoso - que cada pessoa sentirá a
seu modo. Juntar, fazer a montagem é algo que perturba a passagem do tempo,
interrompe-a, e, simultaneamente, dá-lhe algo de novo. A distorção do tempo pode ser
uma maneira de dar expressão rítmica. Esculpir o tempo! [...] Creio que um diretor
[um realizador] que monta os seus filmes facilmente e de várias maneiras é
superficial. (TARKOVSKI, A., pp. 136-144)

A criação da obra audiovisual que compõe este trabalho, tenta expor exatamente a idéia
de que por mais que cada um absorva de uma maneira pessoal esta dimensão do
movimento em relação ao tempo, o movimento é constante, seja através da força da
gravidade ou da movimentação dos átomos é ele que faz pulsar e dar o ritmo a vida, e o
mais importante, ele está impregnado de beleza, música e poesia.

Você também pode gostar