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23/10/2020 Lei das Contravenções Penais

Caso N0 2
LEI DAS CONTRAVENÇÕES
PENAIS
1- O PROBLEMA:

Muitas pessoas se sentem prejudicadas pelo vizinho que de alguma forma lhe tira o sossego com atitudes que o
perturbam como barulhos, trepidações, cheiro desagradável, etc.

Das muitas situações que podem tirar o sossego do vizinho podemos citar:

1. Obra de Construção, que faz barulho (bate-estaca, escavadeira, caminhões), produz ruído
(compressor de ar, aparelho condicionador de ar, etc.), provoca trepidação no solo (bate-
estaca, bomba, motores), produz fumaça (queima de óleo, fogueira, etc.), que produz cheiro
(de cimento, de cal, de carbureto, etc.)

2. Supermercado ou Shopping, com aparelhos condicionadores de ar, compressores de câmaras


frigoríficas;

3. Escola com pátio aberto onde alunos fazem muito barulho no recreio ou na prática de
esportes;

4. Quadras para a prática de esportes que produzem barulhos de bola, grito de torcida, etc.;

5. Heliponto, com descida e subida de helicópteros ruidosos;

6. Criação de animais barulhentos, como passarinho que gostam de cantar, cachorros que
adoram latir, galos que anunciam o alvorecer;

7. Animais de estimação que ficam "tristes" quando a dona sai e ficam latindo e uivando o tempo
todo;

8. Local de reunião (clubes, associações, igrejas, etc.) com pessoas ruidosas e que falam alto ao
chegar e ao sair;

9. Igrejas com sino barulhento que nos acordam de hora em hora com ruidosas e caprichadas
badaladas;

10. Bar, Danceteria, Igreja quem tocam música alta e que não tem forro ou paredes com
atenuação acústica;

11. Quadra de ensaio de Escola de Samba;

12. Alarmes mal regulados que disparam a toda hora emitindo som estridente;

13. Estradas e rodovias muito próximas de conjuntos habitacionais e bairros residenciais;

14. Casa de Máquinas (de elevadores, condicionadores de ar, de bombas hidráulicas, exaustores
de churrasqueira, etc.) do próprio prédio que produz ruído, vibração;

15. Salão de Festas do próprio condomínio cujos usuários são muito "folgados" e fazem algazarra,
barulhos, gritam e cantam;

16. Vizinha do apartamento de cima que anda de salto alto e as crianças batem bola na sala;

2- O ERRO:

Por alguma razão que não vale a pena aqui discutir, as pessoas se lembram de uma lei municipal conhecida como
Lei do Silêncio que reconhecendo a necessidade de se produzir barulho, procura estabelecer limites de tolerância
como se a natureza humana tivesse algum mecanismo automático de regulagem e aceitação de barulhos.

A lei costuma ir mais longe: Estabelecendo um padrão de comportamento, define horários de dormir como se as
pessoas fossem iguais e tivessem todas as mesmas necessidades, hábitos e costumes.

Mas, esquecem-se que uma lei municipal tem aplicabilidade apenas nos aspectos relacionados com as atribuições
da Prefeitura e como guardião do uso e ocupação do espaço territorial urbano define, através da Lei de
Zoneamento e da Lei de Edificações, as atividades classificando-as em "conformes" e estabelecendo em que
"zona" podem ou não podem se estabelecer. Então divide o município em zonas, conforme seu uso, e estabelece
limitações de tráfego, de acesso, de uso e ocupação. Desse modo, o que a Prefeitura pode, legalmente, fazer é
suspender a Licença de Funcionamento de um estabelecimento quando uma lei municipal esteja sendo
desrespeitada. Por isso, nem sempre se consegue fazer cessar o incômodo. Um ruído, por exemplo de um
aparelho condicionador de ar, produz incômodo "sonoro" (ruido que se ouve) e também vibração do ar (que se
sente). Ambos produzem incômodos em nós. A Prefeitura mede apenas o ruido sonoro. A vibração da ventoinha
que vem pelo ar, que chega a causar trepidação dos vidros da janela, não é medida pela Prefeitura.

Não faz parte das atribuições da Prefeitura resolver questões relativas ao Direito de Vizinhança. Vale lembrar
que mesmo exercendo atividade legítma, lícita com licença, alvarás e tudo o mais o "perturbador" não tem o
direito de prejudicar o repouso ou o trabalho dos vizinhos, mesmo durante o dia.
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Então, qualquer ação que se venha a tomar chamando a Prefeitura na expectativa de que ela vai te ajudar é
totalmente inóqua (sem reultado prático) nesta questão.

Outro erro é tentar enquadrar o incômodo provocado pelo vizinho às Leis Ambientais que tratam da poluição por
poluentes sólidos, fumaça, vapor, líquidos, gases e poluição sonora. É claro que querendo construir uma estrada
por dentro de uma Reserva Ecológica, é preciso estabelecer limites de tolerância aos incômodos que a estrada irá
provocar a todo o meio ambiente, fauna e flora, daquela reserva, incluindo-se o incômodo que a estrada irá
causar às pessoas que, afinal de contas, também fazem parte da fauna local.

Então, qualquer ação que se venha a tomar chamando o IBAMA na expectativa de que ele vai te ajudar é
totalmente inóqua (sem resultado prático) nesta questão.

3- A LEI:

Perturbar o sossego do vizinho não é só desrespeito - É contravenção penal.

Chamamos genericamente como "ruído" mas pode ser um barulho, uma trepidação, uma vibração, um estampido
ou qualquer outra forma de propagação feita por ondas, audíveis (que se ouve) ou não audíveis (que não se
ouve), que caminham pelo ar, pelo solo, pela água ou por componentes construtivos como lajes e paredes.

O ruído provoca diminuição da potencialidade do indivíduo, diminuição esta que pode ser da capacidade de
concentração, da atenção, do discernimento, da compreenção, do raciocínio e de outros fatores do
comportamento, abalando seu estado psico-emocional causando irritação, apreensão, inquietação e outros
transtorno que quando começa pode até ser imperceptível mas que com a continuidade da perturabação vai
aumentando de forma gradativa, suave e contínua podendo atingir níveis intoleráveis e inaceitáveis ou pior causar
traumas e lesões, algumas de difícil cura como a perda da capacidade auditiva.

Um silvo suave, baixo e contínuo, que atua como um ruído de fundo pode, dependendo da frequência, produzir
estados cumulativos de irritação.

Já o estrondo ou um estampido como explosões em uma pedreira ou mesmo um estampido de uma bombinha de
fogo de artifício produz, não pelo barulho mas pela "expectativa", situação psicológica que se apodera de qualquer
pessoa que sabe que o estampido está na iminência de acontecer e fica esperando, segurando a ansiedade,
piscando os olhos e até "afastando o olhar".

Outra situação é o receio que o morador que mora em frente a uma agência bancária tem de que o assaltante
estoure uma dinamite no caixa eletrônico e com esta preocupação e apreensão não consegue ter um sono
tranquilo, não consegue ter sossego.

Preocupado não tanto com a fonte do ruído mas mais com os efeitos que os ruídos provocam nas pessoas, os
legisladores que criaram o Capítulo IV da Lei das Contravenções Penais postulam que "pouco importa que haja lei
que permita o funcionamento de certas atividades como bares, oficinas, igrejas, quadras esportivas, rodovias e
que tais atividades sejam lícitas e regulamentadas não se tem o direito de prejudicar o repouso ou o trabalho do
vizinho", que um Alvará de Funcionamento não autoriza, não dá o direito de perturbar os vizinhos.

Posso entender que no caso do roubo a banco com a explosão do caixa eletrônico, não importa se a polícia não
consegue evitar o assalto, mas eu tenho direito a dormir sossegado, sem sobressaltos, sabendo que o barulho da
explosão da dinamite vai ser abafado pelo isolante acústico e deste modo meu sono não será perturbado.

O "repouso" e o "trabalho" são o esteio da humanidade, direitos fundamentais do ser humano e é obrigação do
Estado protegê-los não permitindo a ninguém lesar tais direitos.

Outra situação é quando a água que brota pela parede da garagem, no subsolo, apresenta coloração ou cheiro de
combustível. O que costuma acontecer são tanques de combustíveis de postos de gasolina mal conservados e com
vazamento de combustíveis. Tais vazamentos são imperceptíveis e o combustível vazado se mistura à água do
subsolo que percolando pelo terreno pode sair no subsolo de algum imóvel. O morador do imóvel perderá o
sossego e nem vai conseguir dormir direito pensando que aquele combustível poderá pegar fogo e incendiar os
carros estacionados na garagem.

Para não perder tempo com tortuosos caminhos da Justiça Cível, a Lei das Contravenções Penais já tipifica como
"CONTRAVENÇÃO" e vai direto "ao que interessa" e dá garantias, por meio da Lei 9.099/95 de total objetividade
jurídica à ação tutelar.

Atento a tudo isso, o legislador foi sábio e enxergou longe, e fez com que a ação penal em tais infrações seja
pública incondicionada convocando o Estado para o procedimento policial e a ação penal.

Aquele que se acha prejudicado pelo vizinho deve procurar diretamente o Juizado Especial Criminal e não o
Juizado Especial Cível para ajuizar sua reclamação. Devemos entrender que "conforme o caso, a conduta do
sujeito lesa um interesse jurídico de tal importância que a ação penal deve ser inicada sem mesmo a
manifestação de vontade de qualquer pessoa".

O Decreto-Lei federal no 3.688 de 3 de outubro de 1941, conhecida como Lei das Contravenções Penais
estabelece em um dos seus capítulos:

Capítulo IV

Das Contravenções referentes à Paz Pública.

Artigo 42 - Perturbar alguém, o trabalho ou o sossego alheiros:

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I - com gritaria ou algazarra;

II - exercendo profissão incômoda ou ruidosa, em desacordo com as prescrições legais;

III - abusandode instrumentos sonoros ou sinais acústicos;

IV - provocando ou não procurando impedir barulho produzido por animal de que tem a guarda.

PENA: Prisão simples, de quinze dias a três meses, ou multa, de duzentos mil réis a dois contos de réis.

Veja a Lei 3688 por completo em .

Mais uma vez repito que não importa se o vizinho perturbador exerce atividade lícita e tem até Alvará de
Funcionamento pois a licença não dá a ele o direito de perturbar o sossego do vizinho. Lembro também que a
perturbação pode ocorrer de noite ou de dia e que pode até ser latidos do "querido" cachorro da vizinha.

Para garantir o Dreito ao Sossego, a LCP prevê a possibilidade de se exigir o cumprimento das seguintes ações:

1 - Fazer Cessar os efeitos o uso nocivo da propriedade, isto é a fonte da perturbação, podendo;

a - desligar a fonte produtora de perturbação. Caso se trate de equipamento imprescindível para o


funcionamento da empresa como uma geladeira numa sorveteria, a atividade toda deve ser
interrompida.No caso de apartamento de cima, impedir que a moradora ande de salto alto ou as
crianças deixem de jogar bola dentro do apartamento.

b - trocar por outro meio menos perturbador. Empregar um Cravador de Estacas que não se vale da
força do impacto para a cravação da estaca ou um compressor centrífugo ao inves do pistão.

2 - Isolar a fonte produtora da perturbação. Cercar o motor barulhento com isoladores, atenuadores ou
amortecedores sonoros e até confinando, se necessário, o motor dentro de um cubículo isolado. Cobrir a
Quadra de Esportes aberta. No caso do apartamento de cima, intercalar uma película de isolamento, de
atenuação ou de absorvição (dependendo do caso) entre o piso do apartamento de cima e o teto do
apartamento prejudicado. No caso da agência bancária que pode ser assaltada com dinamites, substituir o
vidro temperado que potencializa a ação da dinamite por elemento capaz de absorver o impacto do estouro
da dinamite

3 - buscar Solução Alternativa para o sossego do prejudicado. Como a perturbação é temporária (cravação
de estacas, por exemplo) transferir o domicílio do prejudicado para outro endereço, alugando uma casa ou
alojando-o num hotel.

Um bom exemplo é o caso da pessoa que exerce o trabalho de Vigilante Noturno e, como dá a entender a
denominação da profissão, trabalha durante e noite e dorme, como não poderia deixar de ser, durante o dia.
Uma obra de construção na vizinhança poderá perturbar o sossego do sono deste vigilante e além do "dia
mal dormido" a consequente sonolência poderá prejudicar o exercício pleno da profissão, diminuindo a
atenção, por exemplo.

4 - Indenizar os danos causados. Consertar as trincas que surgiram nas paredes da casa devido à
trepidação do terreno causada por equipamento da obra. Pagar a terapia necessária para o restabelecimento
do sossego que foi perturbado causando traumas. Pagar um ano de cursinho que o vestibulando vai ter que
fazer por perder o vestibular que foi realizado no dia seguinte ao do trauma.

5 - Multa. O magistrado pode determinar que o réu pague uma multa pelo não cumprimento da pena. A
multa tem finalidade de alcançar efeito compulsivo, a fazer cessar o dano e está prevista no art. 287 do CPC.
A forma de execução de sentença, tambem está perfeitamente delineada nos arts. 644 e 645 do mesmo
Código, estabelecendo que "se a obrigação consistir em fazer ou não fazer, o credor poderá pedir que o
devedor seja condenado a pagar uma pena pecuniária por dia de atraso no cumprimento, contado o prazo da
data estabelecida pelo Juiz".

Vale lembrar que "a pena pecuniária tem semelhança com a astreinte do direto francês e com a rebeldia a
injunction, que significa o comtempt of court do direito anglo-saxão e que além da multa pode levar a prisão.
Tem natureza, portanto coercitiva e não ressarcitória".

O valor da multa deve ser bem fixado pois seu caráter é mesmo de pena a impedir prossiga quem viole a
ordem social com a prática de ato reprovável, que aliás nada tem a ver com o valor a atribuir à causa.

3- ATENÇÃO:

Por fim, vale um alerta: A LCP - Lei das Contravenções Penais resolve muitos conflitos que surgem na área
do Direito de Vizinhança mas não resolve casos que envolve danos ao patrimônio, isto é, danos que o vizinho
ou a obra dele provocou no nosso imóvel como trincas e infiltrações.

A LCP tem como objeto a pessoa, ou melhor, o sossego da pessoa, e suas ações tramitam no Juizado
Especial Criminal, ao passo que problemas com a casa, sobrado ou edifício devem ser tratados na Justiça
Cível ou no Juizado Especial Cível.

Também é válido lembrar que não existe direito absoluto na comunhão social e cada pessoa, por
características próprias ou por limitações individuais como dificuldade de locomoção, reduzida capacidade
auditiva, potencial de certas sensibilidades e até por definição de "incapaz" dada a bebês, o direito de um se
estende até onde o direito de outro começa.

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Por tudo isso, ao deparar com problemas de incômodo causados pelo vizinho procure um Médico ou um
Fonoaudiólogo ou outro profissional da área médica pois os efeitos da perturbação deve ser claramente
elencados em função do tipo de atividade (dormir, estudar, fazer gravação, etc.) e assim caracterizar o
incômodo provocado.

Em seguida contrate um laboratório "acreditado" que possa realizar a medição do nível de perturbação, seja
sonora (que se ouve) e que pode chegar pelo ar entrando na casa pela janela ou passando pela parede ou
laje, vibração (causada pela rotação de um motor), trepidação (caminhão ou ônibus passando na rua) e que
chega pela estrutura do prédio.

Laboratório "acreditado" é o laboratório credenciado pelo INMETRO e que usa aparelhos com Certificado de
Aferição.

Não basta o técnico comparecer ao local e usando um aparelho dizer se SIM ou se NÃO há produção de
incômodos. Na maior parte dos casos deve ser feito um monitoramento, isto é, um acompanhamento por
algum período, por exemplo 1 semana, ao longo do qual os níveis de perturbação registrado pelo aparelho
possam mostrar que, durante todo o tempo ou em períodos determinados o nível de perturbação ultrapassa
os limites toleráveis.

Devo ressaltar que os "limites toleráveis" não são iguais para todos. Muitas vezes, para se defender, o
acusado pede o depoimento de outros vizinhos que venham a testemunhar "contra" e fala que existe sim
ruído mas que não chega a perturbar seu sossego. Isso é um "balde de água fria" no processo. As pessoas
têm percepção e sensibilidade diferentes, em intensidade e modo, então o que é "perturbação" para uns não
é, necessariamente para outros.

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ET-12\www\\DV\lcp42.htm em 28/12/2014, atualizado em 31/01/2016.

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