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IMPACTOS DA PANDEMIA DO NOVO CORONAVÍRUS SOBRE A

INDÚSTRIA BRASILEIRA E CATARINENSE EM 2020

Lauro Mattei1

Lilian Pellegrini Elias2


Matheus Rosa3

Breves notas sobre a indústria brasileira na década de 2010

O processo de perda relativa da participação industrial na produção agregada da


economia brasileira tem origem no esgotamento do modelo de substituição de
importações e na crise da dívida externa, fatos registrados ainda na década de 1980.
Com a reestruturação produtiva implementada na década de 1990, criaram-se as
condições para uma especialização da matriz produtiva em diversos setores, além de
facilitar a entrada e saída de capitais estrangeiros. Esse processo potencializou a
“desindustrialização” mais acentuada nas duas primeiras décadas do século XXI.

O crescimento expressivo da economia brasileira a partir de 2002-2003 começou


a ser interrompido com a emergência da crise mundial a partir de 2008. Em grande
medida, esse crescimento estava assentado no “boom das commodities”, estimulado
pelo crescimento vigoroso da demanda chinesa. Quando a crise se tornou sistêmica,
começaram a ocorrer quedas do superávit comercial do país. Esse fato colocou em
discussão a forma de inserção do Brasil no comércio internacional, além de colocar em
questão o tipo de bens e produtos que estavam sendo exportados. A partir de então
ganharam espaço diversos estudos sobre a estrutura de produção industrial neste novo
cenário mundial.
É neste contexto que os temas da reprimarização e da desindustrialização estão
inseridos e sendo debatidos. Neste caso, um dos aspectos relevantes a se observar é o

1
Professor Titular do Departamento de Economia e Relações Internacionais e do Programa de Pós-
Graduação em Administração, ambos da UFSC. Coordenador Geral do NECAT-UFSC e Pesquisador do
OPPA/CPDA/UFRRJ. Email: l.mattei@ufsc.br
2
Economista com doutorado em Ciências Econômica pela Unicamp. Pesquisadora do NECAT-UFSC.
Email: lilianpellegrini@gmail.com
3
Estudante de Economia na UFSC e bolsista do NECAT. Email: matheusrosa.1917@gmail.com
conteúdo tecnológico presente nos fluxos comerciais do país e seus possíveis efeitos
sobre a estrutura produtiva. Dados agregados da economia brasileira desde o início do
século XXI têm revelado um padrão de inserção do país no comércio externo que
poderá comprometer, no longo prazo, a competitividade e o dinamismo econômico.

De um modo geral, observa-se que esse processo revelou a existência de uma


crise no setor industrial, a qual está se generalizando, sobretudo nos ramos tradicionais
(setores mais intensivos em tecnologia), os quais vêm enfrentando dificuldades para
competir, tanto no mercado interno como externo, devido ao baixo grau de incorporação
tecnológica. Esse fato conduz a uma baixa competitividade da indústria de
transformação e provoca perda de dinamismo do conjunto da economia, uma vez que a
falta de ganhos de produtividade industrial impede um crescimento do PIB a patamares
mais elevados.

Neste cenário o país corre o risco de apresentar uma especialização produtiva


primária assentada na produção de bens agropecuários e produtos extrativos minerais,
concomitantemente com uma desestruturação do setor secundário, dada a baixa
capacidade de desenvolvimento tecnológico do setor industrial, especialmente do ramo
da indústria de transformação. A somatória desses dois fatores poderá ter impactos
bastante negativos sobre o desenvolvimento econômico e social do conjunto da nação.

A partir de 2014, o problema da perda relativa da participação industrial na


produção global do país tornou-se mais evidente à luz de diversos indicadores
produtivos. Por meio do Gráfico 1, registrou-se naquele ano uma queda de 3% na
produção acumulada, ao passo que em 2015 tal queda teve continuidade, porém de
forma bem mais acentuada, atingindo o patamar de 8,3%, maior retração percentual
desde o início da série histórica. Já em 2016 registrou-se uma retração da ordem de
6,4%, enquanto nos dois anos seguintes foram registrados saldos positivos, porém
pouco expressivos e incapazes de reverter a acentuada queda anterior (2,5% e 1%,
respectivamente). Por fim, em 2019 observou-se novamente saldo negativo da ordem de
1,1% no ano.

O conjunto dessas informações revela que o desempenho global do setor


industrial do país após o ano de 2010 foi extremamente precário, deixando visível a
tendência de desindustrialização e de reprimarização da economia brasileira. Registre-se
que os resultados bastante positivos obtidos no ano de 2010 - alta de 10,2% - só foram
possíveis diante da recuperação das atividades econômicas do país como reação à brutal
retração que ocorreu em 2009 em função da crise financeira global. Desta forma, nota-
se que em todos os anos posteriores ocorreram quedas expressivas e/ou reações com
pouca magnitude, as quais foram incapazes de compensar o processo contínuo de
perdas.

Gráfico 1: Produção Industrial Anual do Brasil – variação em relação ao acumulado do


ano anterior (2010 – 2019)

Fonte: PIM-PF IBGE; Elaboração: NECAT-UFSC.

Além disso, é importante ressaltar que essa queda no nível geral de produção
industrial também revelou um agravante ainda maior, ou seja, a perda de
competitividade desse setor, conforme pode ser verificado ao se analisar os saldos
obtidos pelas grandes categorias econômicas. Assim, como aponta a Tabela 1 ,nota-se
que as indústrias de Bens de Capitais e de Bens de Consumo Duráveis, representantes
da parcela industrial de maior complexidade e competitividade, foram aquelas que
apresentaram as maiores retrações na última década, registrando um recuo de 33,3% e
24,2%, respectivamente. Já o setor de bens de consumo semiduráveis e não duráveis,
mesmo com percentuais menores, também apresentaram resultados negativos. Portanto,
esses indicadores revelam a profunda crise que está instaurada no setor industrial do
país há mais de uma década.
Tabela 1: Variação da Produção Industrial do Brasil, por Grandes Categorias
Econômicas (2010 – 2019)

Bens de Capital -33,3%


Bens Intermediários -15,6%
Bens de Consumo Duráveis -24,2%
Bens de Consumo semiduráveis e não duráveis -6,5%

Fonte: PIM-PF IBGE; Elaboração: NECAT-UFSC.

Nesse sentido, o cenário em que a indústria brasileira iniciou o ano de 2020 não
era nada favorável, tanto em função dos efeitos negativos do processo de reestruturação
produtiva que ocorreu na década de 1990 como da crise anteriormente reportada em
relação à década de 2010. Tais situações levaram a uma redução da participação relativa
do setor no Produto Interno Bruto (PIB) do país, fato que pode ser mensurado tanto pela
retração de indicadores da produção física como pela perda significativa da
competitividade industrial.

Análise das atividades industriais no Brasil em 2020

Os dois primeiros meses de 2020 apresentaram pequenas variações positivas nos


níveis de produção as quais sequer chegaram a compensar as perdas dos dois últimos
anos. Assim, em janeiro ocorreu uma variação de 1% em relação ao mês imediatamente
anterior, enquanto em fevereiro o crescimento foi de apenas 0,9%. Essas pequenas altas,
quando comparadas aos mesmos meses do ano anterior, não representaram qualquer
possibilidade de retomada de um nível maior de crescimento, conforme dados do
Quadro 1. Com isso, em janeiro de 2020 observou-se uma retração de 0,9% em relação
ao mesmo mês de 2019, enquanto em fevereiro registrou-se uma queda de 0,3%.
Quando se analisa a variação percentual acumulada nos últimos 12 meses também
foram registradas retrações de 1% em janeiro e de 1,2% em fevereiro. Isso significa que
o comportamento da atividade industrial do país já sinalizava, mesmo antes do Brasil
ser afetado pela pandemia provocada pelo novo coronavírus, uma tendência
problemática de desempenho para o ano de 2020. É importante levar esse quadro em
consideração nas análises posteriores a esse período inicial, uma vez que as quedas da
produção industrial não decorrem apenas da pandemia, dado que o setor industrial do
país já se encontrava em um contexto de grandes fragilidades e debilidades.

Ainda de acordo com o Quadro 1, observa-se que no mês de março, quando a


pandemia de fato se instalou no país, houve grandes efeitos sobre os indicadores da
indústria, uma vez que a produção física registrou queda de 9,3% em relação ao mês
imediatamente anterior. Já em relação ao mesmo mês no ano de 2019 ocorreu uma
retração da ordem de -3,8%. No mês seguinte (abril) a queda continuou, porém com
variação negativa de grande monta: em relação ao mês anterior a retração foi de 19,5%,
enquanto o comparativo com abril de 2019 apresentou recuo de 27,5%.
Indiscutivelmente, abril se configurou como o pior mês durante o período de pandemia.
Com isso, ao final desses dois meses o acumulado do ano foi de -8,3%, enquanto o
comparativo dos últimos 12 meses registrou uma queda de 2,9%.

Quadro 1: Atividade Industrial no Brasil, 2020

No mês (com Mesmo mês ano


Mês No ano Doze meses
ajuste sazonal) anterior
Janeiro 1 -0,9 -0,9 -1
Fevereiro 0,9 -0,3 -0,6 -1,2
Março -9,3 -3,8 -1,7 -1
Abril -19,5 -27,5 -8,3 -2,9
Maio 8,7 -21,8 -11,3 -5,4
Junho 9,7 -8,8 -10,8 -5,6
Julho 8 -3 -9,6 -5,7

Fonte: PIM-PF IBGE; Elaboração: NECAT-UFSC.

A partir de maio, as variações mês a mês da Produção Física já esboçavam um


primeiro movimento de reação, como pode ser observado no Quadro 1. Todavia, os
dados comparados com os níveis de 2019 ainda demonstravam a disparidade decorrente
do efeito pandemia. Em maio de 2020, a produção industrial foi 21,8% inferior ao
registrado no mesmo mês de 2019. Junho e julho continuaram apresentando taxas
negativas nesse indicador, com retrações de -8,8% e -3%, respectivamente. Da mesma
forma, o acumulado no ano se manteve negativo, registrando uma retração de -9,6% em
julho.

Essas últimas informações mostram uma tendência de equiparação aos níveis de


produção de 2019, o que pode ser aferido através da diminuição do ritmo das quedas na
variação dos meses em relação aos seus correspondentes do ano anterior. Mas nesse
comparativo é preciso levar em consideração que os níveis de 2019 também eram
baixos e expressavam um quadro de fraco desempenho impulsionado pela crise
econômica. Portanto, os efeitos da pandemia sobre o nível de produção industrial
apenas desnudam um quadro complexo e preocupante do setor que, sem dúvida, está
longe ainda dos patamares anteriores à crise de 2014-2016.

Portanto, é relevante também observar como foi o desempenho acumulado em


2020 dos diferentes setores da indústria brasileira, conforme Tabela 2. De uma maneira
geral, nota-se uma queda expressiva das indústrias de Bens de Capitais e de Bens de
Consumo Duráveis, a primeira retraindo 20,3% e a segunda 33,8% no acumulado do
ano, percentuais que também reafirmam a tendência anterior de redução relativa da
participação desses setores no cômputo geral. As indústrias de Bens Intermediários e de
Consumo Semiduráveis e Não Duráveis também apresentaram resultados negativos,
porém em menor magnitude.

Tabela 2: Variação da Produção Industrial do Brasil, por Grandes Categorias


Econômicas, acumulado de 2020

Bens de Capital -20,3%


Bens Intermediários -5,3%
Bens de Consumo Duráveis -33,8%
Bens de Consumo semiduráveis e não duráveis -9,4%

Fonte: PIM-PF IBGE; Elaboração: NECAT-UFSC.

Desagregando por seções e atividades industriais, é possível ter uma visão mais
clara desse cenário. Como ilustra o Gráfico 2, no acumulado do ano, a grande maioria
das atividades registrou queda significativa, e apenas seis setores registraram variação
positiva no ano. São eles: Produtos Alimentícios (4,9%), o que é compreensível, dado
que é um setor de demanda contínua; Perfumaria e Produtos de Limpeza (4,1%), o que
possivelmente se explica pelas maiores demandas de produtos de higiene em
decorrência da pandemia; Derivados de Petróleo e de biocombustíveis (3,8%); Outros
Produtos Químicos (1,9%); Farmoquímicos e Farmacêuticos (1,9%), o que
provavelmente também deve ser consequência da pandemia; e Celulose, Papel e
Produtos de Papel (0,3%).

Todos os demais setores apresentaram resultados negativos, sendo a maior


retração registrada no setor de Veículos, Automotores e Carrocerias (-42,1%).
Destacam-se, também, as retrações nos seguintes setores: Artigos de Vestuário e
Acessórios (-36,4%), Couros, Artigos de Viagem e Calçados (-33,7%); Impressão e
Reprodução de Gravações (-33,6%); e Outros Equipamentos de Transporte (-33,2%).
Além destes, outros diversos setores apresentaram quedas na casa dos 20% e 10%.
Gráfico 2: Produção Física Industrial, por seções e atividades industriais –acumulado
no ano –Julho 2020 – (Base: igual período do ano anterior)

Fonte: PIM-PF IBGE.

Em síntese, os dados da produção física dos primeiros sete meses de 2020 no


Brasil, revelam, ao mesmo tempo, a continuidade de uma tendência de baixo
desempenho industrial, oriunda de um contexto de crise que se arrasta há quase uma
década, e a emergência de novas particularidades decorrentes da pandemia de COVID-
19. A Indústria Geral começa a esboçar reação na variação mensal, porém ainda
apresentando forte queda no acumulado do ano (-9,6%). Os setores de maior
competitividade foram os que mais retrocederam, registrando -20,3% na Indústria de
Bens de Capital e -33,8% na Indústria de Bens de Consumo Duráveis.
O Panorama geral da indústria catarinense nos primeiros sete meses de 2020

A trajetória da indústria de Santa Catarina no ano de 2020, em linhas gerais, tem


acompanhado as variações observadas em nível nacional. Como ilustra o Quadro 2, nos
dois primeiros meses foram registradas pequenas variações positivas, sendo 1,1% em
janeiro e 1,7% em fevereiro. O comportamento da indústria catarinense, portanto, assim
como no país, não apresentava nenhum sinal de retomada para um nível maior de
crescimento no período imediatamente anterior à eclosão da pandemia da COVID-19.

Quadro 2: Produção Física Industrial em SC, 2020 – Variação (%)


No mês (com ajuste Mesmo mês ano
Mês No ano Doze meses
sazonal) anterior
Janeiro 1,1 -0,5 -0,5 2
Fevereiro 1,7 1,9 0,7 1,9
Março -17,7 -15,9 -5,2 0,3
Abril -14,2 -30,9 -11,8 -2,6
Maio 5,7 -28,7 -15,5 -6,6
Junho 10,3 -12,2 -15 -7,5
Julho 10,1 -4,9 -13,4 -7,9
Fonte: PIM-PF IBGE; Elaboração: NECAT-UFSC.

Em consonância com o quadro nacional, a pandemia causou impactos a partir de


março, quando a variação da produção física industrial caiu -17,7% em relação ao mês
anterior. No mês de abril ocorreu nova queda, porém em menor magnitude (-14,2%). Já
nos meses seguintes (maio, junho e julho) houve uma mudança na trajetória, uma vez
que os resultados mensais passaram a ser positivos da ordem de 5,7%, 10,3% e 10,1%,
respectivamente. No entanto, essa recuperação ainda não foi suficiente para recompor as
perdas ocorridas nos meses de março e abril. Com isso, o comparativo com o
desempenho de 2019 segue sendo negativo.

Ao analisarmos a produção física industrial mês a mês de 2020 em relação a


2019, apenas em fevereiro houve uma variação positiva. Neste indicador, a taxa de
maior recuo aconteceu no mês de abril, quando foi registrada uma variação de -30,9%
em relação ao mesmo mês de 2019. Em julho, esse mesmo indicador mostra seu melhor
desempenho desde o início do impacto da pandemia, com uma variação de -4,9%,
indicando que também em nível estadual começa a se estabelecer uma tendência de
equiparação com os níveis de produção de 2019.
Cabe ressaltar que a variação de julho em relação ao mês anterior foi maior em
Santa Catarina do que em nível nacional. Enquanto no Brasil a alta foi de 8%, em Santa
Catarina o desempenho de julho registrou 10,1%. Contudo, a variação de julho
comparada com o mesmo mês de 2019 representa um maior recuo no estado,
comparativamente ao país (-4,9% em SC e -3% no Brasil), indicando que ainda há um
caminho mais longo no estado para que se retorne ao patamar de 2019.

Lembrando que o cenário apresentado pela indústria catarinense em 2019 já não


era favorável. Como podemos observar no Gráfico 3, o ano de 2019 foi de fraco
desempenho, a produção industrial catarinense apresentou comportamento próximo à
estagnação ao longo de todo o ano, tendo indicadores positivos tímidos em apenas cinco
dos doze meses. O crescimento acumulado de 2019 foi de 2,2%.

Gráfico 3: Produção Física Industrial em SC - Variação (%) no mês (com ajuste


sazonal) – 24 meses

Fonte: PIM-PF IBGE; Elaboração: NECAT-UFSC.

O desempenho mensal da indústria catarinense em 2020

No que se refere ao acumulado no ano de 2020 – janeiro a julho – Santa Catarina


apresenta retração de 13,4%. Desempenho que, na comparação com as outras Unidades
da Federação, situa Santa Catarina numa posição desfavorável. Como aponta o Gráfico
4, Santa Catarina fica atrás de pelo menos 9 estados no desempenho acumulado em
2020. Apenas os estados do Espírito Santo (-19,7%), Ceará (-18,2%), Amazonas (-
15,9%) e Rio Grande do Sul (-14,5%), apresentaram resultados piores do que os níveis
de Santa Catarina (a Pesquisa Industrial Mensal só conta com informações de 14
Unidades da Federação). A comparação com o resultado do Brasil, de -9,6%, também é
desfavorável, indicando que os impactos da crise econômica e da pandemia incidiram
de forma mais aguda na produção industrial de SC do que na do Brasil.

Gráfico 4: Pesquisa Industrial Mensal - Produção Física - Resultados Regionais


Acumulado no Ano - Julho/2020 - (Base: igual período do ano anterior)

Fonte: PIM-PF IBGE; Elaboração: NECAT-UFSC.

Podemos também observar as variações nos setores que mais afetaram a taxa
acumulada. Como apresenta o Gráfico 5, apenas o setor de Produtos Alimentícios
apresentou taxa positiva, com uma expansão de 2,5%. Todos os demais setores
apresentaram taxas negativas, sendo a mais expressiva registrada no setor de Veículos
Automotores, Reboques e Carrocerias (-34,3%). As indústrias de Artigos de Vestuário e
Acessórios (-31%), Metalurgia (-30,1%), Produtos Minerais não-Metálicos (-21%), e
Produtos Têxteis (-12,8%) também apresentaram taxas expressivas de retração.
Gráfico 5: Produção Física Industrial em SC, acumulado em 2020 por setores

Fonte: PIM-PF IBGE; Elaboração: NECAT-UFSC.

Em linhas gerais, os resultados mostram que em Santa Catarina as indústrias


com pior desempenho foram aquelas concentradas nos setores de Bens de Capital e de
Consumo Duráveis, repetindo o quadro verificado nacionalmente e reafirmando a
tendência dos anos anteriores. Nota-se, ainda, que o impacto da pandemia da COVID-
19 afetou de forma aguda todos os setores da planta industrial do estado, com exceção
do setor de Produtos Alimentícios que apresentou recuo na produção apenas no mês de
abril.

O acompanhamento da indústria catarinense ao longo do tempo permite perceber


que poucas das seções e atividades apresentavam bom desempenho nos meses
imediatamente anteriores a pandemia (janeiro e fevereiro) em relação aos mesmos
meses do ano anterior. Este foi o caso da Fabricação de produtos de borracha e de
material plástico e Fabricação de produtos têxteis, que cresceram acima dos 10% em
janeiro e 7% e 8,5% em fevereiro, em relação aos mesmos meses do ano anterior. As
duas atividades foram impactadas pela pandemia e apresentaram quedas consecutivas de
março a junho, voltando a crescer, mesmo que timidamente, apenas em julho. Na
Quadro 3 é possível observar de maneira mais detalhada o comportamento dos setores
industriais de Santa Catarina nos meses de março a julho de 2020 em relação aos
mesmos meses de 2019. Os meses selecionados foram aqueles mais atingidos pela
pandemia da COVID-19.

Quadro 3: Produção Física Industrial de Santa Catarina, variação dos meses de 2020
em relação ao mesmo mês do ano anterior (2019), por seções e atividades industriais

Seções e atividades industriais mar/20 abr/20 mai/20 jun/20 jul/20


Indústria geral -15,9 -30,9 -28,7 -12,2 -4,9
Fabricação de produtos alimentícios 4,9 3,1 -6 6,4 2,4
Fabricação de produtos têxteis -20,4 -49,7 -31,4 -2,3 2
Confecção de artigos do vestuário e
-32,8 -47,2 -46,8 -38,5 -32,3
acessórios
Fabricação de produtos de madeira -16,9 -18,4 -18,5 -0,7 -1,8
Fabricação de celulose, papel e produtos de
-3,7 -2,4 -4,5 -3,4 -7,2
papel
Fabricação de produtos de borracha e de
-16 -35,2 -19 3,7 4,8
material plástico
Fabricação de produtos de minerais não-
-17,8 -56,6 -37,8 -22,8 -9,7
metálicos
Metalurgia -25,2 -62,8 -58,4 -44,9 -9,8
Fabricação de produtos de metal, exceto
-17,8 -28,5 -23,8 -2,3 8,1
máquinas e equipamentos
Fabricação de máquinas, aparelhos e
-13,2 -37,1 -35,2 7,6 27,7
materiais elétricos
Fabricação de máquinas e equipamentos -22,4 -25 -21,4 -1,8 20,4
Fabricação de veículos automotores,
-33,5 -56,4 -53,1 -48 -31,8
reboques e carrocerias

Fonte: PIM-PF IBGE; Elaboração: NECAT-UFSC

A Fabricação de máquinas e equipamentos e de produtos de madeira, por sua


vez, já iniciaram o ano em queda, 10,7% e 0,7%, respectivamente, em janeiro, e 8,7% e
4,2% em fevereiro em relação aos mesmos meses do ano anterior. Com o início da
pandemia ambas viram aprofundar suas quedas para cerca de 20% entre março e maio.
Em junho apresenta se aproxima da estabilidade e em julho máquinas e equipamentos
recompõe parte das perdas com crescimento de 20,4%.

Os meses de março, abril e maio foram os meses cujos resultados da indústria de


Santa Catarina ficaram mais prejudicados em função da pandemia quando comparado
com os mesmos meses de 2019. O mês de maio apresentou indicadores negativos para
todas as seções e atividades industriais catarinenses. Nos meses de março e abril apenas
o indicador de Fabricação de produtos alimentícios foi positivo, 4,9% e 3,1%
respectivamente, mas em maio o recuo desse setor foi de 6%.
Por fim, os meses de junho e julho apresentam uma mudança no cenário na
comparação com o ano anterior. As seções e atividades industriais apresentam
crescimento em relação aos meses anteriores, o que recompõe parte das perdas.
Fabricação de máquinas, aparelhos e materiais elétricos cresce 7,6% em junho e 27,7%
em julho. A Fabricação de máquinas e equipamentos que apresentou quedas nos
primeiros seis meses do ano, cresceu 20,4% em julho. No entanto, algumas atividades
seguem apresentando em junho e julho fortes quedas na produção industrial em relação
aos mesmos meses de 2019, como são os casos da Fabricação de veículos automotores,
reboques e carrocerias; Confecção de artigos do vestuário; e acessórios e Metalurgia.
Em junho apresentaram quedas de 48,0%, 38,5% e 44,9%, respectivamente, e em julho,
31,8%, 32,3% e 9,8%. A Confecção de artigos do vestuário e acessórios chama
particular atenção, pois, junto da Fabricação de produtos têxteis, faz parte do setor
Têxtil e Confecção que é responsável por 21% dos empregos em Santa Catarina.

Considerações Finais

Inicialmente é importante destacar que o cenário da produção industrial do país


no início de 2020 já era complicado, mesmo antes da ocorrência da pandemia provocada
pelo novo coronavírus. Contudo, é inegável que a pandemia catalisou um processo de
perdas generalizadas em praticamente todos os setores da planta industrial. Esse “efeito
pandemia” pode ser visualizado tanto em nível nacional quanto estadual, especialmente
nas retrações da produção nos meses março e abril - os dois primeiros meses após a
confirmação do primeiro caso de COVID-19 no Brasil.

É preciso considerar, ainda, que as altas mensais de produção verificadas em


alguns setores a partir do mês de maio se relacionam com essa base negativa dos meses
anteriores, não significando, portanto, uma recuperação dos níveis de produção. De um
modo geral, esse aspecto pode ser verificado quando se analisam os dados acumulados
no ano, os quais registraram quedas significativas, tanto em nível nacional como na
maioria das unidades da federação. Não obstante, é preciso destacar também que em
alguns setores já se observou o início de dissipação dos impactos negativos de curto
prazo da pandemia, porém os resultados gerais ainda se encontram muito aquém
daqueles verificados no ano de 2019.

Em termos dos agregados setoriais, verifica-se que o saldo dos sete primeiros
meses do ano reafirma a tendência de perdas nos setores mais competitivos, em especial
naqueles setores que compõem as indústrias de Bens de Capital e de Consumo
Duráveis. São justamente esses dois grupos que apresentam maiores dificuldades para
retomar o nível de produção após os impactos mais expressivos da pandemia. Neste
sentido, é importante frisar que os setores que registraram saldos positivos no
acumulado do ano são justamente aqueles com maior nível de demanda contínua,
particularmente os produtos alimentícios, ou aqueles que possuem atividades produtivas
relacionadas, direta ou indiretamente, com demandas típicas do período de pandemia.

Quanto ao desempenho da indústria de Santa Catarina, verifica-se que, tanto os


impactos da pandemia bem como as tendências observadas a partir do mês de maio, são
muito similares ao quadro nacional. Todavia, deve-se registrar que o estado catarinense
obteve a quinta pior taxa acumulada dentre todas as unidades da federação, uma vez que
seus níveis de produção ainda são baixos, comparativamente aos resultados obtidos no
ano de 2019.

Tal desempenhado não pode ser atribuído exclusivamente à pandemia, uma vez
que nos meses de janeiro e fevereiro de 2020 a produção industrial catarinense
apresentou baixas taxas de crescimento, inclusive sem mostrar qualquer sinal de
recuperação em relação aos níveis do ano anterior, que também não foram nada
excepcionais. Já o período entre os meses de março e julho mostrou dois
comportamentos distintos: por um lado, altas taxas negativas em março (17,7%) e abril
(14,2%) e, por outro, um lento processo de recuperação nos meses seguintes (maio a
julho). Todavia, essa recuperação foi insuficiente para compensar as enormes perdas
ocorridas durante os dois primeiros meses da pandemia. Com isso, o resultado agregado
dos primeiros sete meses de 2020 continua negativo.

No caso da indústria catarinense, da mesma forma que na maioria das unidades


da federação, os maiores impactos da pandemia ocorreram justamente nos grupos de
bens de capital e de bens de consumo duráveis. Neste caso, verifica-se que as maiores
perdas ocorreram nos setores de metalurgia; veículos automotores, reboques e
carrocerias; produtos minerais não metálicos; e produtos têxteis. Apenas o setor da
indústria de alimentos apresentou resultados positivos em praticamente todo o período
de maior incidência da pandemia.

Diante do cenário de uma desaceleração da pandemia no estado, levando a um


relaxamento das medidas de isolamento social, delineia-se para os próximos meses uma
tendência de retomada das atividades industriais. Todavia, resta saber se essa retomada
terá fôlego suficiente para impulsionar a recuperação de setores-chave das áreas de bens
de capital e de consumo duráveis, ou se continuará concentrada apenas nos setores
menos competitivos, especialmente nos bens de consumo não duráveis.

Esse cenário de incertezas na produção industrial regional e do país recoloca


alguns aspectos que deverão permear os debates futuros na área industrial. Isto porque,
decorrente dos mais variados impactos da pandemia, reconfigurações das cadeias
globais deverão ocorrer e impor novos desafios ao processo produtivo industrial do país.
Com isso, fica claro que o Brasil necessita de uma nova estratégia econômica que seja
capaz de estancar o processo de desindustrialização em curso desde o início dos
programas de estabilização macroeconômica na década de 1990. Para tanto, são
necessárias revisões de todos os programas e políticas industriais, adequando-os aos
novos tempos, particularmente do Programa Brasil Produtivo.

Além disso, é urgente enfrentar o problema dos diferenciais de produtividade


entre os diversos segmentos produtivos, uma vez que tal diferencial entre pequenas,
médias e grandes empresas continua sendo extremamente significativo, chegando a
atingir o patamar de 50% entre o primeiro grupo em relação às grandes indústrias. A
resultante é que a produtividade agregada do setor industrial se torna baixa e prejudica a
competitividade do país no cenário internacional.

Soma-se a isso o fato de que o país precisa repensar a relação entre a elevada
importação de insumos e a exportação limitada de produtos manufaturados. Isto porque
o coeficiente de reexportação desses insumos é muito baixo, ou seja, o valor exportado
agregado é muito baixo em relação aos custos de importação. Com isso, a posição do
país em termos de coeficiente de exportações no cenário global é muito inferior em
relação ao espaço ocupado pelo Brasil dentre as principais economias mundiais. Neste
cenário, o tema da competitividade industrial do país é reposto, o qual não pode ficar
restrito a uma simples discussão da carga tributária, como costumeiramente tem sido
feito pelas entidades representativas do setor industrial.

Para tanto, dois aspectos são cruciais para aumentar a complexidade tecnológica
do país e gerar maiores níveis de competitividade. Por um lado, é necessário ampliar o
processo de inovação tecnológica dotando o setor de capacidades mínimas para
acompanhar as principais tendências globais, tanto em termos tecnológicos como em
termos de modelos de negócios. Por outro, é preciso ter em mente que a industrialização
do país deve ser um processo articulado a um sistema produtivo que seja capaz de
conformar cadeias produtivas que mobilizem segmentos locais, regionais e nacionais.

Por fim, é importante destacar que no momento em que as preocupações com o


meio ambiente ocupam espaço central nas agendas políticas, são necessários pesados
investimentos para modernizar o parque industrial na perspectiva de adequá-lo aos
novos tempos. Por isso, os desafios são imensos diante do processo histórico que, no
caso brasileiro, não seguiu a lógica observada em diversos sistemas econômicos
mundiais. Isto porque no Brasil a industrialização, que sequer foi completada, acabou
sendo seguida por um processo de reprimarização que deu impulso ao setor de serviços,
o qual dificilmente terá condições de promover um crescimento de longo prazo sem um
nível de demanda mais intenso do setor industrial.

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