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Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (Unesp)

Instituto de Políticas Públicas e Relações Internacionais (IPPRI)


Programa de Pós-graduação em Desenvolvimento Territorial na América Latina e
Caribe (TerritoriAL)

ROSEANE OLIVEIRA RIOS

O PROJETO EDUCATIVO DA FUNDAÇÃO ODEBRECHT: UM ESTUDO SOBRE


SEUS FUNDAMENTOS

SÃO PAULO
2016
ROSEANE OLIVEIRA RIOS

O PROJETO EDUCATIVO DA FUNDAÇÃO ODEBRECHT: UM ESTUDO SOBRE


SEUS FUNDAMENTOS

Dissertação apresentada ao Programa de


Pós-graduação em Desenvolvimento
Territorial na América Latina e Caribe
(TerritoriAL), do Instituto de Políticas
Públicas e Relações Internacionais
(IPPRI) da Universidade Estadual Paulista
“Júlio de Mesquita Filho” (Unesp), como
exigência para obtenção do título de
mestre em Geografia, na área de
concentração “Desenvolvimento
Territorial”, na linha de pesquisa
Educação, Saúde e Cultura”.
Orientadora: Profª. Drª. Maria Nalva
Rodrigues Araujo Bogo.

SÃO PAULO
2016
ROSEANE OLIVEIRA RIOS

O PROJETO EDUCATIVO DA FUNDAÇÃO ODEBRECHT: UM ESTUDO SOBRE


SEUS FUNDAMENTOS

Dissertação apresentada ao Programa de


Pós-graduação em Desenvolvimento
Territorial na América Latina e Caribe
(TerritoriAL), do Instituto de Políticas
Públicas e Relações Internacionais
(IPPRI) da Universidade Estadual Paulista
“Júlio de Mesquita Filho” (Unesp), como
exigência para obtenção do título de
mestre em Geografia, na área de
concentração “Desenvolvimento
Territorial”, na linha de pesquisa
Educação, Saúde e Cultura”.
Orientadora: Profª. Drª. Maria Nalva
Rodrigues Araujo Bogo.

BANCA EXAMINADORA

______________________________________________
Profª. Drª. Maria Nalva Rodrigues Araujo Bogo (Universidade Estadual da Bahia)

______________________________________________
Profª. Drª Sílvia Aparecida de Sousa Fernandes (Universidade Estadual Paulista
“Júlio de Mesquita Filho”)

______________________________________________
Profª. Drª. Celi Nelza Zulke Taffarel (Universidade Federal da Bahia)

SÃO PAULO
2016
Aos educadores e educadoras do povo.
A todos que dedicam suas vidas à luta pela emancipação humana, realizando
batalhas diárias na perspectiva de construção de um novo amanhecer.
AGRADECIMENTOS

À minha família, sem a qual não teria conseguido ir adiante.


Ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra que, diariamente, me
ensinam que só a luta faz valer. Agradeço também ao Programa Nacional de
Educação na Reforma Agrária (PRONERA), que através do programa Residência
Agrária contribuiu na construção do Programa de Pós-Graduação em
Desenvolvimento Territorial na América Latina e Caribe, fruto da parceria entre
UNESP/ENFF/IPPRI/VIA CAMPESINA.
Aos educadores das escolas dos assentamentos e acampamentos da
Regional Baixo Sul, que me deram inestimável apoio; a todos com os quais pude,
também, contar com sua compreensão durante minhas ausências.
À minha orientadora Maria Nalva Rodrigues Araújo Bogo, ao professor João
Márcio Mendes Pereira e à professora Silvia Letícia Fernandes, que contribuíram
para o avanço do trabalho com importantes reflexões teórico-metodológicas.
Aos companheiros e companheiras de turma de quem levo lições importantes
para toda minha vida e com os quais compartilhei muitos momentos de alegria.
RESUMO

A educação pública passa a ter um papel estratégico no desenvolvimento de uma


pedagogia da hegemonia. Esta pesquisa, então, tem como objeto de estudo o
projeto educacional da Fundação Odebrecht e sua implementação na Bahia, em
uma região específica, identificada como Baixo Sul da Bahia. Fundamenta-se em
autores como Frigotto (1977 e 1983), Rodrigues (1998), Bryan (1983) e Bitencourt
(1991), que estudaram a atuação do empresariado na educação; também Calazans
(1993) e Leite (1999), no tocante a estudos da educação rural; Garcia (2009),
Campos (2009), Tautz (2010), nos estudos sobre as transnacionais e o
financiamento público; e Neves (2008) e Martins (2007) sobre a sociabilidade
burguesa. Para a depreensão dos resultados desejados, foram analisados como
fontes principais os projetos das escolas tomadas como fonte de investigação. Para
dar maior consistência à análise, contribuíram como fontes secundárias informações
contidas em folders, cartilhas, vídeos e fotografias, conseguidos em campo, nas
duas escolas. Além disso, sites das duas escolas foram, igualmente, fontes de
consulta. As categorias de análise eleitas foram educação e formação humana,
educação e trabalho, concepção de campo e gestão. Os resultados da pesquisa
evidenciaram que, desde a década de 1940, a empresa em tela se instalou na
região para desenvolver seus negócios e, a partir de 2003, centrou suas forças em
projetos educacionais para atender, principalmente, ao público de jovens e
adolescentes do campo. Tal projeto educacional, no entanto, apesar da
denominação Educação do Campo, apresenta, em seu bojo, os objetivos do
empresariado para formação da classe trabalhadora brasileira, ação que começa a
ser gestada também na década de 40; a isso, mescla elementos de continuidade da
educação rural enquanto pacote de medidas educacionais para o campo brasileiro.

Palavras-chave: Educação empresarial. Hegemonia. Fundação Odebrecht.


ABSTRACT

In this sense public education takes on a strategic role in developing a pedagogy of


hegemony. This research is the object of study educational project of the Fundação
Odebrecht and its implementation in Bahia in a specific region called Southern
Bahia. Justifying in authors like Frigotto (1977 and 1983), Rodrigues (1998) Bryan
(1983), Bitencourt (1991) who studied the role of entrepreneurship in education;
Calazans (1993), Leite (1999) for studies of rural education; Garcia (2009), Campos
(2009), Tautz (2010) in studies of transnational corporations and public funding and
Nenes (2008) and Martins (2007) on the bourgeoisie. For depression sociability find
the results were analyzed as sources main projects of the in two schools.To give
greater consistency to the analysis utilized as secondary sources information
contained in brochures, booklets, videos and photos obtained from field visit at two
schools. In addition, sites of the two schools were also reference sources .Elected
analysis category was education and human development, education and work, field
design and management. The results of this research showed that since the 1940s
screen in the company settled in the region to develop their business and, since 2003
, focused its strengths in educational projects to cater mainly to the audience of
young and adolescent field. Such educational project , however , despite the name
field Camp Education, brings in its wake the goals of the business for formation of
the Brazilian working class begins to be gestated in the 1940s, bringing together
elements of continuity of rural education as a package of educational measures to
the Brazilian countryside.

Keywords: Business education. Hegemony. Fundação Odebrecht.


RESUMEN

La educación pública pasa a tener un papel estratégico en el desarrollo de una


pedagogía de la hegemonía. Esta investigación, a su vez, tiene como objetivo de
estudio el proyecto educacional de la Fundação Odebrecht y su implementación en
el estado de Bahía, en una región específica, identificada como Baixo Sul da Bahía.
Está fundamentada en autores como Frigotto (1977 y 1983), Rodrigues (1988),
Bryan (1983) y Bittencourt (1991), quienes han estudiado la actuación del
empresariado en la educación; también Calazans (1993) y Leite (1999) en lo que se
refiere a los estudios de la educación rural; Garcia (2009), Campos (2009), Tautz
(2010), en los estudios sobre las transnacionales y la financiación pública; y Neves
(2008) e Martins (2007) sobre la sociabilidad burguesa. Para comprender los
resultados deseados se han analizado como fuentes principales los proyectos de las
escuelas tomadas como fuente de investigación. Para darle una mayor consistencia
al análisis, fuentes secundarias como informaciones contenidas en folletos, cartillas,
videos y fotografías, adquiridos en el campo, en las dos escuelas, han contribuido
con el trabajo. Además de eso, páginas web de las dos escuelas han sido,
igualmente, fuentes de consulta. Las categorías de análisis elegidas han sido
educación y formación humana, educación y trabajo, concepción de campo y
gestión. Los resultados de la investigación que, desde la década de 1940, la
empresa en tela se instaló en la región para desarrollar sus negocios y, a partir de
2003, centró su fuerza en proyectos educacionales para atender, principalmente, al
público de jóvenes y adolescentes del campo. Tal proyecto educacional, sin
embargo, pesa a la denominación Educación del Campo, presenta, en su esencia,
los objetivos del empresariado para la formación de la clase trabajadora brasileña,
acción que empieza a formarse también en la década de 40. A todo ello se mezclan
elementos de continuidad de la educación rural como paquete de medidas
educacionales para el campo brasileño.

Palabras clave: educación empresarial, hegemonía, Fundação Odebrecht.


LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Quadro 1 – Escolas de Ensino Médio do município de Igrapiúna...................... 68


Figura 1 – Vista panorâmica da Casa Familiar.................................................. 70
Figura 2 – Vista panorâmica da Casa Familiar.................................................. 70
Figura 3 – Quadra de esportes......................................................................... 71
Figura 4 – Veículo da Casa Familiar.................................................................. 71
Figura 5 – Placa onde está registrados os parceiros sociais da escola............. 77
Figura 6 – Vista Panorâmica do Colégio Casa Jovem II – Igrapiúna/BA........... 82
Figura 7 – Biblioteca e Infocentro da Casa Jovem II, Igrapiúna/BA .................. 82
Figura 8 – Placa de Inauguração do ACISO...................................................... 88
Figura 9 – Placa de Inauguração da Indústria do conhecimento....................... 89
Quadro 2 – Comparativo das categorias estudadas.......................................... 102
Quadro 3 – Montante de recursos públicos recebidos por meio de projetos e
programas................................................................................... 110
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

AMUBS Associação dos Municípios do Baixo Sul


BNDES Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social
CAR Companhia de Desenvolvimento e Ação Regional
CECJ II Colégio Estadual Casa Jovem II
CNER Campanha Nacional de Educação Rural
CBAR Comissão Brasileiro-Americana de Educação das Populações
Rurais
CFR-I Casa Familiar Rural de Igrapiúna
CNA Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil
CNI Confederação Nacional das Indústrias
COOPALM Cooperativa dos Produtores de Palmito do Baixo Sul da Bahia
COOPATAN Cooperativa de Produtores Rurais de Presidente Tancredo
Neves
COOPECON Cooperativa de Águas Continentais
COOPRAP Cooperativa das Produtoras e Produtores Rurais da Apa do
Pratigi
DIS Desenvolvimento Integrado e Sustentável
EJA Educação de Jovens e Adultos
EMITEC Ensino Médio por Intermediação Tecnológica
FAEB Federação da Agricultura e Pecuária do Estado da Bahia
FRVJ Fazenda Reunidas Vale do Juliana
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IDC Instituto Desenvolvimento e Cidadania
IDES Instituto de Desenvolvimento do Baixo Sul da Bahia.
INCRA Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária
OCT Organização de Conservação de Terras
ORT Organização Racional do Trabalho
OSCIP Organização da Sociedade Civil de Interesse Público
PAIS Programa de Agricultura Integrada e Sustentável
PCNs Parâmetros Curriculares Nacionais
PDCIS Programa de Desenvolvimento e Crescimento Integrado com
Sustentabilidade
SAICI Sociedade Anônima de Indústria e Comércio de Ituberá
SEAGRI Secretaria de Agricultura, Irrigação e Reforma Agrária do
Estado da Bahia
SENAC Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial
SENAI Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial
SENAR Serviço Nacional de Aprendizagem Rural
SESI Serviço Social da Indústria
TEO Tecnologia Empresarial Odebrecht
TESE Tecnologia Empresarial social Educacional
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO....................................................................................... 15
2 A EDUCAÇÃO EMPRESARIAL NO BRASIL....................................... 26
2.1 A Confederação Nacional das Indústrias (CNI) e formação da
força de trabalho................................................................................. 27
2.2 O empresariado e a educação rural................................................... 36
2.3 O Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (SENAR) atuação do
sistema S na escola púbica do campo............................................. 41
3 FUNDAÇÃO ODEBRECHT: EDUCAÇÃO E DESENVOLVIMENTO
SUSTENTÁVEL DO PDCIS.................................................................. 46
3.1 Histórico da Odebrecht: desenvolvimento para que e para
quem?................................................................................................... 46
3.2 Baixo Sul da Bahia uma história de exploração............................... 53
3.3 O Programa de Desenvolvimento Sustentável e Crescimento
Integrado com Sustentabilidade (PDCIS) e seus aparelhos
privados de hegemonia....................................................................... 59
4 A CASA FAMILIAR RURAL DE IGRAPIÚNA E O COLÉGIO
ESTADUAL CASA JOVEM II – ORIENTAÇÕES DA TECNOLOGIA
EMPRESARIAL ODEBRECHT PARA A EDUCAÇÃO........................ 66
4.1 Descrição do local e contexto educacional onde se localizam as
duas escolas........................................................................................ 67
4.2 A Casa Familiar Rural de Igrapiúna – CFR – I.................................. 68
4.2.1 Ingresso / Público atendido 71
4.2.2 Concepção de educação e formação 72
4.2.3 Concepção de educação e trabalho 75
3.2.4 Concepção de Gestão 77
3.2.5 Concepção de Campo 78

4.3 Colégio Estadual Casa Jovem (CECJ II): uma trágica experiência 80
de parceria público-privada
4.3.1 Ingresso / Público atendido 81
4.3.2 Financiamento / Parcerias 83
4.3.3 Concepção de educação e formação humana 83
SUMÁRIO

4.3.4 Relação Educação e trabalho 89


4.3.5 Concepção de Gestão 96
4.3.6 Concepção de Campo 100
4.4 Fundamentos da Educação empresarial 101
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS 113
6 REFERÊNCIAS 117
15

1 INTRODUÇÃO

Para a apresentação dos dados desta pesquisa, é explicitado o ponto


de partida e o contexto sob o qual se originou o objeto do estudo. Dessa forma,
a introdução ora desenvolvida contém um breve relato de minha atuação
enquanto militante de uma organização social e, também, como pesquisadora
da Educação do Campo. O trabalho segue, portanto, evidenciando a
concepção metodológica e os passos trilhados para análise e sistematização
dos dados recolhidos, organizando a investigação em sessões.

Ter acesso a um projeto de Educação do Campo gestado no seio do


Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), em 1999, após uma
visita à Escola Che Guevara, no Assentamento 05 de Maio, município de Santo
Amaro da Purificação/BA foi uma experiência marcante na minha trajetória
enquanto militante, pois foi, a partir de então, que tive a possibilidade de um
retorno às minhas raízes. Filha de camponês que necessitou sair do campo
para poder ir à escola, me foi possível conhecer a forma como os trabalhadores
rurais atuavam para conquistar a terra e como se organizavam para ter, ali,
condições dignas de sobrevivência.

A partir desse momento, surgiu o interesse pela causa dos


Trabalhadores Rurais Sem Terra e pelo estudo em torno da Pedagogia do
MST. Então, essencialmente, a leitura de três obras marcaram minha
formação: “Educação em Movimento”, de Rosely Caldart; “Educação e
Movimentos Sociais”, de Maria da Gloria Gohn; e “Uma Escola para o Povo”,
de Maria Teresa Nidelcoff. A descoberta da viabilidade de construção de uma
educação não apenas contestando o sistema oficial de ensino, mas, antes, que
permitisse construir, na dura realidade daqueles, outra forma de fazer
educação, levou-me, assim, a tomar a decisão de atuar pela educação e,
também, ingressar na causa pela terra junto ao MST.

No final de 1999, ingressei na monitoria do programa de Alfabetização


de Jovens e Adultos do Programa Nacional de Educação de Jovens e Adultos,
em áreas de Reforma Agrária/PRONERA1, o que me proporcionou uma

1 1
O Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (PRONERA) é um programa do
Governo Federal lançado em abril de 1998. Seu objetivo é implementar ações educativas para
16

aproximação maior com o MST e, especificamente, com o Setor de Educação.


Por meio do PRONERA, pude perceber o quanto o direito à educação foi
negado aos povos do campo e como estes, com sua resistência, conseguiram
ocupar o espaço da universidade que, historicamente, foi reservado à classe
burguesa.

Em 2002, ao concluir o Curso de Pedagogia na Universidade Estadual


de Feira de Santana (UEFS), tomei, pois, a decisão de ingressar no MST,
atuando no Setor de Educação, indo morar no Assentamento São Sebastião de
Utinga, município de Wagner/BA na Chapada Diamantina. Em seguida, fui
morar no Assentamento Moçambique em Itaetê/BA, onde atuei no Setor de
Gênero e lecionei em uma turma de alfabetização de jovens e adultos; foi, sem
dúvida, uma experiência marcante, visto que estava, cada dia mais convencida
de que valia a pena agir pela transformação social.

Nesse período, também tinha outras tarefas como monitoria do Curso


de Pedagogia da Terra e Letras da Terra, uma parceria entre
PRONERA/UNEB/Campus de Teixeira de Freitas/BA e coordenação da II
Turma de Magistério, também pelo PRONERA. Todos esses cursos foram
realizados no Assentamento 1º de Abril, em regime de alternância entre o
tempo escola e o tempo comunidade.

Em 2007, foi posto o desafio de ir para a região do Baixo Sul da Bahia,


com a tarefa de coordenar o Setor Regional de Educação do MST. A militância
permite esse conhecimento da realidade dos povos e amplia as convicções de
que, em todos os espaços, há necessidade de trabalho e superação da ordem
social vigente, porque em todos os espaços há exploração.

Desde então, minha atuação tem sido nessa região, onde são
enfrentados diversos desafios em organizar as escolas e desenvolver um
projeto educacional.

A atuação no Setor de Educação colocou-me em contato com as


dificuldades reais que os povos do campo enfrentam para acessarem a

as populações de jovens e adultos de áreas de Reforma Agrária. Esse programa é fruto das
reivindicações dos movimentos sociais do campo.
17

educação. O fechamento de escolas, a impossibilidade de prosseguimento nos


estudos por conta de dificuldades de deslocamento no transporte escolar e a
ausência de escolas de Ensino Médio no campo; a precarização na
infraestrutura, as objeções de todas as ordens enfrentadas pelos educadores.
A dificuldade de conciliar a militância no Setor Regional e com a atividade
específica da escola se colocou como desafio, porém foi um espaço de
compreensão melhor da relação escola, assentamento e movimento social.

Na região do Baixo Sul, além dos embates com as Secretarias


Municipais de Educação, que ofertam Educação Infantil e Ensino Fundamental,
com a Secretaria Estadual de Educação, pela construção de escolas de Ensino
Médio, há um embate com a Fundação Odebrecht, que tem escolas em seus
domínios, objetivando, dentre outros interesses, ofertar educação à classe
trabalhadora do campo. Desconfia-se, no entanto, das “boas intenções” da
Fundação, considerando que uma empresa capitalista, que explora a região há
mais de 60 anos, gerando exclusão social, pobreza e concentração de renda,
dificilmente, desenvolveria uma proposta de educação transformadora.

Na militância há muitas lutas a se fazer, estudo e trabalho são princípios,


mas durante um período longo a dimensão do estudo formal ficou em segundo
plano em minha vida diante da grande demanda de atividades da organização
social. Apenas em 2010 consegui retomar os estudos, ingressando na
Universidade Federal do Recôncavo da Bahia para o curso de pós-graduação
em Educação do Campo e Desenvolvimento Territorial no Semiárido Brasileiro,
concluído em 2012, com uma monografia que discutiu a “Educação do Campo
no Baixo Sul da Bahia: um território em disputa”. Na oportunidade, realizei um
estudo sobre a educação do campo no território mencionado, bem como os
agentes envolvidos: poder público, empresa privada e movimento social.
Passei, assim, a dedicar-me às questões territoriais e aos conflitos de terra na
região, estudando a forma como os latifúndios foram se constituindo.

A partir disso, tive, então, a motivação pessoal que faltava para


prosseguir as pesquisas que, após, resultaram na presente dissertação,
enquanto necessidade de aprofundar os estudos sobre a realidade
educacional, mediante um esforço para compreendê-la em sua totalidade,
18

conhecendo a intencionalidade da educação num sistema capitalista e seguir


contribuindo para a construção, implementação e defesa da Educação do
Campo. O trabalho de acompanhamento pedagógico, as discussões, as
reuniões, as observações realizadas neste contexto tem me facultado
identificar uma frágil responsabilização do Estado para com a educação dos
povos do campo na região; uma dura atuação do MST pela conquista deste
direito, que encontra obstáculos de diversas naturezas, inclusive aqueles
instituídos pelo próprio poder público para negá-los; e a presença da iniciativa
privada que, com apoio do mesmo Estado, tem contribuído para formar a
juventude camponesa, defendendo os objetivos do agronegócio.

Referido contexto, recebe tono muito peculiar para a realização de uma


investigação acadêmica, visto que a Fundação Odebrecht tem um projeto
educacional voltado à população do campo da região Baixo Sul do estado da
Bahia, sendo necessário, por conseguinte, estudar as ideias pedagógicas
desta empresa/fundação. Entendendo aqui, ideias pedagógicas na concepção
de (SAVIANI, 2007) "Por ideias pedagógicas entendo as ideias educacionais,
não em si mesmas, mas na forma como se encarnam no movimento real da
educação, orientando e, mais do que isso, constituindo a própria substância da
prática educativa" (p.6)

Do ponto de vista social, destaca-se a relevância do estudo pela


oportunidade de aprofundar o olhar sobre uma temática que está na ordem do
dia, ou seja, o processo de sucateamento da escola pública e as várias formas
de privatização. Ademais, ao possibilitar uma investigação voltada à realidade
em foco, estar-se-á contribuindo para ampliar o debate acerca da educação
ofertada no contexto do Baixo Sul, esclarecendo o projeto de educação,
formação e modelo de desenvolvimento de campo da referida fundação.

Com isso, os estudos ora desenvolvidos compreendem uma tarefa não


apenas acadêmica, mas também militante, visto que não houve o isolamento
ou distanciamento das atividades habitualmente desenvolvidas para dedicar-
me somente à pesquisa; o tempo disponível foi dividido entre estudo, com o
cumprimento das atividades exigidas pelo mestrado, e o trabalho nos
assentamentos e acampamentos, já que a metodologia da alternância
organizada em Tempo Escola e Tempo Comunidade favorece essa divisão
19

contínua de tarefas. Leituras, fichamentos e eventos científicos, bem como a


participação nas atividades de formação no Movimento dos Trabalhadores
rurais Sem Terra foram combinados; a participação em seminários e ciclos de
debates da Escola Nacional Florestan Fernandes contribuiu na formação, com
discussões a respeito de questões atuais que ajudaram na análise da
conjuntura. Ressalte-se que tal período representou um avanço nas
construções teóricas; os eventos e a convivência com pessoas de diversas
organizações sociais foi uma experiência singular, pois, do momento dedicado
ao aprendizado, concorreu para o cultivo da solidariedade e da mística
revolucionária.

O envolvimento com o tema pesquisado nos conduz a necessidade de


construir e buscar novas reflexões e conclusões sobre o tema da Educação do
Campo. A tarefa do pesquisador passa a ser, então, fundamental, pois: “[...]
tem o papel de apoderar–se da matéria, em seus pormenores, de analisar suas
diferentes forma de desenvolvimento e perquirir a conexão que há entre eles”
(MARX apud NETTO, 2011). Para depreender a atuação do empresariado na
educação para o campo no território do Baixo Sul da Bahia, requer-se esse
movimento de conexão do geral com o específico, compreendendo as
mediações e nexos que envolvem o objeto de estudo.

Assim, conhecer a realidade educacional do Baixo Sul é ir além dos


discursos proferidos baseados num conhecimento superficial; e mais: é ir além
dos dados estatísticos que, na maioria das vezes, são mascarados e, apesar
de apontar para algumas direções, podem ser interpretados de acordo com
intencionalidades diferentes. Dessa forma, essa pesquisa é orientada pela
questão: “Qual é a fundamentação pedagógica que orienta os projetos
educacionais da Odebrecht implementados no Sul da Bahia, considerando: o
Ingresso; Financiamento; Concepção de Educação e Formação Humana;
Relação Trabalho e Educação; Concepção de Gestão; Concepção de Campo:
Fundamentos da Educação empresarial e, as relações e nexos com a
pedagogia da hegemonia, e com a concepção de Estado alicerçada na parceria
publico- privado?”.

Traçar o objetivo da pesquisa que é investigar as propostas e as ações


educativas da Fundação Odebrecht no campo do Baixo Sul da Bahia é buscar
20

compreender como um modelo de sociedade orientado pelas políticas


imperialistas causam a concentração de renda e pobreza no campo brasileiro e

como os organismos internacionais influenciam a educação pública brasileira,


analisando como isso tem chegado ao campo através dos projetos de
responsabilidade social implementados pelas fundações empresariais. Já
quanto aos objetivos específicos, intentou-se: compreender a educação
empresarial no seu processo histórico, quando nascem nas indústrias e
chegam ao campo, além de mapear as ações educacionais da Fundação
Odebrecht no Baixo Sul por meio do PDCIS.

Os dados empíricos apresentados advêm da análise de projetos de


dois estabelecimentos de ensino, a Casa Familiar Rural de Igrapiúna e o
Colégio Estadual Casa Jovem II. Foram analisados, enquanto fontes principais,
o Projeto Político Pedagógico do Colégio Estadual Casa Jovem II e elementos
do projeto da Casa Familiar Rural de Igrapiúna (CFR – I), contidos no seu
Regimento Interno e projeto de inclusão digital denominado Caia na Rede,
registrando aqui que não foi possível analisar o projeto da segunda escola na
íntegra por dificuldade de acesso ao mesmo. Para dar maior consistência à
análise, recorreu-se a fontes secundárias, como informações contidas em
folders, cartilhas, vídeos e fotografias conseguidos a partir de visita de campo
nas duas escolas e em sites.

Para a análise, foi necessário um referencial teórico metodológico que


permitisse percorrer a investigação buscando explicações no conceito de
hegemonia, pedagogia da hegemonia e Estado. A delimitação da matriz de
análise: ingresso; financiamento; concepção de educação e formação humana,
relação trabalho e educação, concepção de gestão; concepção de campo e;
fundamentos da educação empresarial permitiu identificar as ideias
pedagógicas da empresa e as relações e nexos entre empresa, Estado e
escola.

Considerando as sistematizações clássicas sobre teoria pedagógica,


identificou-se que a Fundação Odebrecht pauta seu projeto educacional numa
concepção de educação identificada e denominada por (SAVIANI, 2007) de
produtivista, que na sua fase atual se configura como neoprodutivista.
Configurando-se em uma nova versão da “ teoria do capital humano", que com
21

a bandeira do "aprender a aprender", se encontra oficializada nos Parâmetros


Curriculares Nacionais (PCNs) que orientam as escolas públicas de educação
básica de todo o país. Somando-se a isto pode se constatar a incorporação de
propostas dos empresários organizados no movimento Todos pela Educação
nas politicas educacionais.

O recorte temporal deste objeto de estudo vai do período de 2003


(momento em que a Fundação Odebrecht decide centrar sua atuação na
educação da região) até 2013, ano em que o projeto do Colégio Estadual Casa
Jovem II, em parceria direta com a empresa Odebrecht, institui, formalmente,
um modelo de parceria público-privada na educação.

Dessa forma, o objeto dessa pesquisa é o projeto educacional da


Fundação Odebrecht e sua implementação na Bahia. A Odebrecht, desde a
década de 1940, instalou-se na região para desenvolver seus negócios e, de
2003 em diante, centra força em projetos educacionais, sobretudo, para
atender ao público de jovens e adolescentes do campo. A estratégia
educacional da Fundação Odebrecht faz parte do Programa de
Desenvolvimento e Crescimento Integrado com Sustentabilidade (PDCIS), que
envolve a participação do governo, da sociedade civil e de outras instituições
privadas.

O cenário político e econômico em que esta proposta começa a se


desenvolver têm raízes alicerçadas na reforma do Estado brasileiro elaborada
e coordenada por Bresser Pereira no governo de Fernando Henrique Cardoso.
O período que demarca esse governo (1995 a 1998/1999 a 2002) foi um marco
importante para a organização empresarial e seus projetos de sociedade. No
primeiro período as iniciativas se concentraram num grande esforço para
consolidação das medidas de ajustamento macroeconômico e na preparação
das bases sociais e legais para a interação entre aparelhagem estatal e
sociedade civil. Já o período seguinte, foi dedicado ao processo de
consolidação das novas funções econômicas e político-ideológicas do aparelho
de Estado, que de produtor direto de bens e serviços se firmou na função de
coordenador de iniciativas privadas. (MARTINS, 2007).

Esse projeto neoliberal foi consolidando suas bases e se reformulando


até chegar nas políticas denominadas de Terceira Via. Essas politicas não
22

significaram um projeto anticapitalista, mas uma reforma do sistema. Partindo


das questões centrais do neoliberalismo com o objetivo de torná-lo mais
compatível com sua base e princípios constitutivos a Terceira Via propõe a
transformação dos sujeitos históricos em voluntários e prestadores de
serviços. Indivíduos que não mais reivindicam direitos coletivos e sim, colocam-
se a disposição para fazerem sua parte na sociedade.

O Estado assume uma função educativa, trabalhando na criação de uma


nova subjetividade e de novos sujeitos políticos coletivos, com as tarefas de
assumir a responsabilidades sociais até então restrita à aparelhagem estatal.
A parceria público-privado é um dos pilares centrais do neoliberalismo, da
pilhagem que ocorre no Brasil de recursos públicos alocados para negócios do
setor privado.

Com o discurso de responsabilidade social, a Fundação Odebrecht, em


parceria com o poder público, desenvolve diversos projetos educacionais. O
pensamento crítico educacional vem, desde o período pós-golpe militar no
Brasil, empenhando-se pela identificação e compreensão das formas como o
capital, por meio da educação, vem consolidando processos de formação, a fim
de unificar o projeto burguês e conquistar a adesão da população ao seu
projeto societário.

Nesse contexto o conceito de hegemonia contribui para compreensão


de como a burguesia produz e reproduz seu processo de dominação social.
Enquanto visão de mundo de um grupo que se impõe sobre outros, sendo por
eles partilhados, a hegemonia burguesa estende seus tentáculos para a
educação, criando assim uma pedagogia hegemônica, a pedagogia do capital,
que assalta a subjetividade humana pela via dos currículos, dos projetos
políticos pedagógicos e do trabalho pedagógico.

Conforme “Neves e Martins” (2012), entende-se por pedagogia do


capital as estratégias de dominação de classe empregadas pela burguesia,
com a finalidade de se obter o consentimento do conjunto da população para o
seu projeto político nas diferentes formações sociais concretas, ao longo das
ações do capitalismo monopolista. Tais estratégias de educação política os
referidos autores chamam-nas de Pedagogia da Hegemonia. E os mesmos
autores acrescentam que as estratégias da Pedagogia da Hegemonia são
23

implementadas por intelectuais orgânicos, singulares e coletivos da burguesia,


mediante politicas públicas que, de modo geral e específico, propagam o papel
central das classes dominantes no ordenamento das instâncias executivas da
aparelhagem do Estado no modo de produção capitalista (“NEVES,
MARTINS”, 2012).

O objetivo principal da Pedagogia da Hegemonia, prosseguindo com


esses autores, é a conformação moral e intelectual do conjunto da população a
um padrão de sociabilidade, ou modo de vida, que coadune com as
necessidades de crescimento econômico e de coesão em cada período
histórico do modo de produção capitalista.

Observe-se que a criação das fundações pelas empresas tem esse


caráter de educar para o consenso, desenvolvendo projetos sociais e
educacionais. Somando ao seu objetivo central, tem-se que a Pedagogia da
Hegemonia promove a assimilação subordinada de frações da classe
trabalhadora ao projeto dominante, ao modelo sutilmente socializado, de modo
a torná-la corresponsável pelo projeto político do capital em seu conjunto: os
trabalhadores da empresa são conduzidos a pensar que são parte da empresa
e, por isso, se dedicam – inquestionavelmente – ao seu projeto.

No contexto escolar, a nova Pedagogia da Hegemonia se traduz como


inovação educacional, apresentando a Pedagogia das Competências, que se
encontra oficializada nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), que, por
sua vez, orientam as escolas públicas de educação básica de todo o país.
Somando-se a isso se pode constatar a incorporação das propostas dos
empresários organizados no movimento Todos pela Educação nas políticas
educacionais de seu governo.

Estudar as formas de organização do patronato rural brasileiro e seus


diferentes níveis de espaço e incidência, inclusive educacional, nos faz
perceber os elementos de continuidade e descontinuidade na educação rural
enquanto medidas educacionais de adestramento da classe trabalhadora
camponesa.

No decorrer deste estudo, é possível, pois, de acordo com objeto


proposto e com base nas fontes e dados levantados, compreender a incidência
24

e a forma que as empresas capitalistas, com a privatização da educação, mas,


também, no caso em pauta, com políticas públicas educacionais, vêm
pautando uma pedagogia hegemônica do capital.

Nesta pesquisa, não foi viável o cruzamento de informações e


entrevistas, por conta da densidade do objeto que, para ser melhor
compreendido, exigiu o mapeamento dos projetos da fundação que estão
interligados por aquilo que denominam mosaico. Tal tarefa encontrou institutos
e programas diversos que são fomentados e conduzidos pela fundação, numa
diversidade de ações características da empresa que possui uma variedade de
negócios que vão desde a construção civil à atividades agrícolas.

Especificamente, a pesquisa está organizada em quatro sessões,


sendo a primeira delas a introdução, seguida da segunda sessão que é um
estudo das origens das ações do empresariado na educação, que nasce nos
centros industriais, na tentativa de demonstrar como vem ocorrendo essa
atuação, identificando os elementos de continuidades e descontinuidades
desse processo. Este item aborda, também, como a educação empresarial que
surge na organização industrial para formação de sua mão-de-obra chega ao
campo com ações e programas que se pautam no modelo de educação rural, a
exemplo do Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (SENAR), criado em
1976, delineando uma forma específica de avanço do capitalismo no campo.

A terceira sessão retrata a atuação da Odebrecht no Estado da Bahia,


como se transformou empresa transnacional, valendo-se, especialmente, de
recursos público pela realização de grandes obras de infraestrutura que, na
maioria das vezes, desrespeitam direitos sociais e ambientais. A sessão
discorre, ainda, sua instalação na região do Baixo Sul da Bahia, seu
envolvimento com a concentração de terras e o modelo de parceria público-
privada que ali se estabeleceu, a partir dos anos 2000, com o programa de
governança denominado PDCIS.

A quarta sessão é resultado da análise comparativa de dois projetos


educacionais desenvolvidos no município de Igrapiúna/BA. O projeto da Casa
Familiar Rural de Igrapiúna (CFAR – I), escola particular comunitária, sem fins
lucrativos, conduzida por uma Organização da Sociedade Civil de Interesse
25

Público e Fundação Odebrecht, e o Colégio Estadual Casa Jovem II, ambas


pertencentes ao projeto estratégico da Fundação Odebrecht para a região.

2 A EDUCAÇÃO EMPRESARIAL NO BRASIL

A oferta de uma educação pública, gratuita e de qualidade está entre as


grandes aspirações da sociedade brasileira. Grupos de educadores e
organizações de trabalhadores têm, ao longo do tempo, empunhado
plataformas de luta para garantir melhorias na educação, já que a ampliação da
26

oferta não significou um avanço na qualidade do ensino; pelo contrário, essa


oferta vem sendo marcada pela precarização do ensino, sobretudo aquele
voltado para as camadas mais pobres da sociedade.

A expansão da oferta do ensino público promovida pela Lei 4024/61, Lei


de Diretrizes e Bases de 20 de dezembro de 19612 trouxe consigo uma
orientação privatista, permitindo que os empresários atuassem de maneira
mais intensa no sistema público educacional. As consequências dessa abertura
para atuação do empresariado na educação pública tem sido objeto de estudo
do pensamento crítico da educação brasileira, visto que essas interferências do
setor privado, não raro, têm se associado ao descaso enfrentado pela classe
trabalhadora no que se refere ao direito à educação.

São várias as formas de ação do empresariado na educação; este atua


na apropriação da educação como mercadoria, ofertando-a para um público
específico que pode pagar por essa mercadoria; na oferta de cursos
profissionalizantes, por meio de órgãos educacionais criados pelas indústrias e
com apoio do Estado, a exemplo do chamado “sistema S”, a ser logo mais
focalizado, e, mais recentemente, com parcerias público-privadas, com as
quais as escolas seguem sendo públicas, porém o setor privado as administra
inteiramente implementando-as. Vale ressaltar que essa atuação do
empresariado se desdobra em todas as modalidades de ensino.

Saliente-se que este Capítulo traz apontamentos sobre as origens das


ações do empresariado na educação, na tentativa de compreender como vem
ocorrendo essa interferência, identificando os elementos de continuidade e
descontinuidade desse processo. Destaca, também, como a educação
empresarial, que nasce na organização industrial, para formação de sua mão-
de-obra, chega ao campo, via ações e programas que se pautam no modelo de
educação rural, a exemplo do SENAR, criado em 1976, delineando uma forma
específica de avanço do capitalismo no campo.

2
A Lei nº 4.024, de 20 de dezembro de 1961, beneficia os proprietários do ensino,
especialmente no seu artigo 2º e 3º, que trata do direito à educação, e nos artigos 93 e 95 que
abordam a não exclusividade do dinheiro público às instituições de ensino públicas. Além
disso, os artigos 8º e 9º regularmentam a existência dos Conselhos Estaduais de Educação e
do Conselho Federal de Educação e a representação do setor privado nos mesmos.
27

O estudo do nascedouro da precarização da educação pública encontra,


na classe burguesa e suas instituições educacionais, uma forte influência sobre
o Estado, ao ditar demandas educacionais segundo as necessidades de mão-
de-obra do setor produtivo. Dessa forma, a educação para a classe
trabalhadora é concebida como preparação técnico-profissional que foi
alargando ao patamar mínimo de escolarização exigido pela modernização
capitalista e pelo processo de ocidentalização da sociedade brasileira (NEVES,
2008).

2.1 A Confederação Nacional das Indústrias (CNI) e formação da força de


trabalho

Tomando como referência os estudos de Frigotto (1977 e 1983), Bryan


(1983), Bitencourt (1991) e Rodrigues (1998), que analisaram os processos
educativos gestados no interior das indústrias, consegue-se identificar o forte
interesse e atuação do empresariado na educação brasileira. Asseguram os
referidos pesquisadores que esses grupos empresariais utilizam-se tanto de
recursos púbicos, para desenvolver a formação do trabalhador segundo as
necessidades da mão-de-obra, como da educação pública e do aparato do
Estado para formar trabalhadores segundo seus projetos. Além disso, a
influência das organizações patronais na educação da classe trabalhadora tem
um papel de – por meio de processos ideológicos – impedir a organização
dessa mesma classe.

Denominado por Rodrigues (1998) de Moderno Príncipe Industrial, a


Confederação Nacional das Indústrias, fundada em 1938, é o mais importante
aparelho de hegemonia da burguesia industrial. Essa organização patronal
criou o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI), o SESI (Serviço
Social da Indústria) e o Instituto Euvado Lovi (IEL), enquanto braços
pedagógicos que se constituíram numa rede de escolas privadas ligadas a
confederações de empresas de diferentes segmentos da economia,
financiadas com recursos que são considerados públicos ou parafiscais.

Recorrendo a antecedentes históricos, o contexto e as determinações


políticas e econômicas em que o SENAI foi criado (BRYAN, 1983) reportam à
28

criação de centros de treinamentos de trabalhadores no interior de empresas, a


partir da segunda metade do século XIX. Nesse estudo, é identificada a
influência norte-americana e de países europeus na elaboração de propostas
educacionais para trabalhadores. Nos Estados Unidos, por exemplo, esses
centros foram estabelecidos pelos grandes monopólios produtores de materiais
elétricos, químicos e gráficos; já na Alemanha e na Rússia, esses centros
foram implantados para atender a demandas das empresas ferroviárias.

Continuando com mencionado autor, afirma-se que essas ideias de


aprendizagem subordinadas aos interesses do capital chegaram ao Brasil em
1920, nas escolas de formação de ferroviários, com Robert Mange3 já que, na
época, o trabalho nas ferrovias constituía-se a principal atividade do país em
termos de força de trabalho empregada.

Subjacente às suas diferenças, as empresas ferroviárias


brasileiras encontram, nas primeiras décadas do século XX,
como barreira comum à subordinação do trabalho nas suas
oficinas, a organização do trabalhado com bases no ofício e o
consequente domínio exercido pelo trabalhador sobre o
processo de trabalho. A pequena escala em que se processa a
produção torna inviável a quebra de controle operário mediante
o parcelamento e distribuição de tarefas ou pela substituição do
oficial pela máquina. A substituição dos trabalhadores por
equivalentes encontráveis no mercado de trabalho ou
internamente à empresa não é fácil, nem garante que o novo
empregado não possua as mesmas características de
insubordinação do substituído, pois nos sistema tradicional de
aprendizagem imitativa em vigor, ocorre também a transmissão
da cultura operária, já que a grande maioria da força de
trabalho industrial em São Paulo, 90% em 1901, constituía-se
de estrangeiros que traziam, como parte de sua formação
profissional, ideologias políticas anticapitalistas. (BRYAN, 1983,
p. 21)

Como analisa o autor, a proposta de criar um espaço educativo para a


classe trabalhadora traz, em seu bojo, elementos que visam ao rompimento
com a cultura operária anticapitalista e a subordinação e dominação pela
educação. Seria uma proposta educacional que retirasse do trabalhador o

3
De origem suíça, filho de diplomata, nascido em 1885, o engenheiro Roberto Mange foi
intelectual ligado ao capital. Contratado em 1913 para lecionar desenho na escola politécnica
de São Paulo, é considerado o introdutor dos métodos tayloristas nas instituições de formação
profissional e nas organizações do trabalho no Brasil. Influenciou várias gerações de
engenheiros que, mais tarde, iriam ocupar cargos na burocracia estatal e nas empresas
públicas (Bryan, 1983).
29

domínio sobre os processos de trabalho e a quebra do controle do operariado


sobre a produção. Além disso, era necessário desenvolver uma educação que
formasse trabalhadores conformados, que não praticasse a insubordinação ao
sistema.

A formação subordinada dos trabalhadores enquanto necessidade do


empresariado foi, ao longo do tempo, ampliando seus tentáculos. As
instituições organizadas e desenvolvidas no âmbito das empresas e imbuídas
da Organização Racional do Trabalho (ORT) tiveram um efeito multiplicador até
que, mais tarde, em 1940, esse engenheiro, Robert Mange, incorporou as
ideias ao Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI) 4 que, a seu
turno, absorveu e adaptou a experiência europeia ao Brasil.

[...] a criação do SENAI, portanto, constituiu a extensão todo o


setor industrial da experiência, cuja eficiência já havia sido
comprovada, do ensino ferroviário. Extensão tornada
compulsória pela ação do Estado, tendo como principal objetivo
assegurar ao capital o controle da formação técnica e
ideológica da força de trabalho. A forma final em que se
cristalizou esse objetivo foi produto da conciliação das
propostas da burocracia governamental e dos representantes
do capital industrial. (BRYAN, 1983, p. 88).

O processo de formação do trabalhador executado até então requeria


um tempo de aprendizagem demasiadamente extenso e controle operário
sobre o modo de executar o trabalho. Essas características se colocavam
como empecilhos aos objetivos do capitalismo: maximização dos lucros e
reprodução das relações sociais que permitem sua reiteração (BRYAN, 1983).

Como possibilidade de conciliação entre interesses do empresariado e


do Estado, aos poucos, se deu a substituição dos operários pelo trabalhador
nacional de origem agrária, formado uma instituição sob controle das
indústrias. Nessa perspectiva, o Estado se alia aos empresários na
implementação de uma estrutura educacional que garantisse comportamentos

4
Desde sua criação, o SENAI é organizado e dirigido pela Confederação Nacional da Indústria,
regido pelo direito privado e vinculado ao Ministério da Educação. Possui estrutura federativa
com órgãos normativos, com a função de estabelecer as linhas gerais de atuação e órgãos
administrativos com a função de executar a política ditada pelos órgãos normativos (BRYAN,
1983).
30

e saberes específicos ao migrante rural que iria desenvolver tarefas no mundo


fabril que muito se distinguia do mundo rural.

A execução do trabalho supervisionado pelo mestre-artífice realizada


pelas indústrias não atendia mais às necessidades impostas pelo capital, pois
era controlada pelo trabalhador e difundia o que Bryan (1983) chama de uma
cultura operária que valorizava os resultados não pecuniários do trabalho;
também a decisiva participação do Estado, convocando a burguesia industrial a
garantir os centros de treinamento dos trabalhadores recebe destaque.

O Estado, portanto, ao preconizar a criação de restaurantes


nas indústrias e de escolas para formar a classe operária ou
impor medidas coercitivas à exploração da força de trabalho,
como a lei de férias ou o código de menores, não está
respondendo a situações conjunturais, mas lançando as bases
para a consolidação da produção capitalista de forma
duradoura. Ainda que a ação estatal seja percebida pelos
capitalistas individuais como opressora, como barreira à livre
acumulação de capital, longe de estar acima das classes, o
Estado age como „capitalista coletivo‟. (BRYAN, 1983, p. 82).

A ideia de que a formação do trabalhador não poderia se processar


autonomamente em relação ao capital fazia parte do ideário do governo
empossado em 1930 (Getúlio Vargas) e era acatada pelos intelectuais da
burguesia, fortalecendo a estratégia de controle institucional em substituição à
repressão direta. O objetivo era, por meio das instituições educacionais de
formação para o trabalho, substituir a formação mimética que ocorria nas
fábricas, sob controle dos artífices. O Estado impôs à burguesia industrial a
formação da força de trabalho a partir do trabalhador recém-urbanizado na
quantidade e com qualidade adequada ao seu projeto de desenvolvimento
econômico, dentro dos moldes capitalistas.

Esse projeto foi se consolidando e, da década de 1940 em diante, com


intencionalidades muito distintas daquelas dos grupos sociais que lutam pela
melhoria da educação pública, o empresariado brasileiro começa a criar as
bases que venham a garantir sua interferência na formação da classe
trabalhadora.

Em se tratando da formação profissional, Bittencourt (1991) estuda


aquela praticada no SENAI, entre 1975-1980, explanando a adesão da
31

instituição ao paradigma técnico-linear adotado no período pós-golpe, enquanto


necessidade de “formar indivíduos ajustados, subordinados às normas
comportamentais da empresa”. Observe-se que, tencionando tal preparo,
eficiente, produtivo e ajustado aos interesses hegemônicos da sociedade, tal
formação profissional “[...] significa reproduzir uma força de trabalho condizente
aos interesses da indústria e, também uma força de trabalho ajustada à
sociedade e as normas comportamentais do mundo do trabalho”
(BITTENCOURT, 1991, p. 99).

A atuação do Estado, criando um aparato jurídico e as condições para


que o setor industrial cumprisse seu objetivo de extrair dele mesmo o
financiamento para formação da mão-de-obra que garantiria a produtividade,
facilitou a consolidação desse projeto educacional do capital. Bryan (1983)
chama a atenção para a postura do empresariado, que, desde o início, se
coloca como condutor do processo educacional, porém, no que envolve os
custos financeiros, a perspectiva é de que esses sejam divididos com o Estado.
Na mesma linha, Frigotto (1983), ao refletir sobre a formação ofertada no
SENAI, SENAC e SENAR, identifica que “[...] tratam-se de instituições que
alimentam recursos vultosos da sociedade, às vezes, orçamentos maiores do
que os orçamentos de alguns estados, e cuja origem histórica acompanha a
própria gênese e as novas formas de organização do capitalismo no Brasil”
(FRIGOTTO, 1983, p. 02).

Essas instituições e seus projetos educacionais delineiam as formas


históricas específicas do avanço do capitalismo e como o trabalho se configura
em cada momento.

Seguindo com Frigotto (1982), o Serviço Nacional de Aprendizagem


Industrial (SENAI) surge em 1942, porém sua idealização foi sendo forjada
desde 1937; o Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (SENAR), em 1976; já
o SESI (Serviço social da Industria), também gerado pela Confederação
Nacional da Industria, em 1946, com a preocupção básica de intervir em
diversas áreas chamadas sociais (alimentação, saúde, higiene, moral e
civismos, habitação do trabalhador), que influenciam a relação homem-
trabalho, procurando proporcionar às empresas condições para maiores
índices de produtividade e atendimento dos seus compromissos. A esse
32

respeito, vale explicar, de forma ainda mais clara, a especificação que recebe o
trabalhado nesse tipo de formação profissional

A análise histórica do SENAI, e recentemente, do SENAR, sem


dúvida revela que são instituições que são produzidas para dar
respostas às novas formas que assume o capitalismo na
indústria e no campo. São, nesse sentido, instituições que
nascem – independentemente do vínculo jurídico ser público
ou privado, para desenvolverem a pedagogia das relações
capitalista de trabalho, e vão adaptando – na ótica do que
serve – esta pedagogia às novas formas que assume a divisão
do trabalho como resultante das novas formas de sociabilidade
do capital. Nesse sentido seu vínculo com a produção
capitalista é mais direto do que o tipo de prática pedagógica
das escolas de 1º e 2º grau. (FRIGOTTO, 1982, p. 44).

Ainda com Frigotto (1977), o estudioso identifica os elementos de


dominação e subordinação embutidos na proposta educacional do
empresariado para a classe trabalhadora. Ao ocupar-se dos efeitos da
escolaridade do SENAI, reconhece-os fundamentado na pedagogia que parte
de uma concepção de aprendizagem que está no saber fazer o que serve,
levando os educandos, desde a formação para o trabalho, a desenvolverem um
um conjunto de maneiras de ser, de agirem e de pensarem de uma sociedade
hieraquizada que relega à classe trabalhadora o trabalho manual, sem
possibilidades de autorganização e emancipação.

Nessa lógica de valores ensinados, Frigotto (1982), então, analisa que


se estabelece um código de prêmios e sanções com uma metodologia que leva
à competição, passando a ideia de que os avanços são conseguidos com
esforço pessoal e disciplina, ao cumprir metas estabelecidas por seus líderes.

Essa ideia de vencer na vida, pela ideologia do mérito e do espírito de


servidão, perpassa todo o projeto educacional do capital, pois coloca sobre o
indivíduo a responsabilidade em torno de suas conquista e de seus fracassos.
Note-se que essa perspectiva não é formulação antiquada, pois, como se verá
adiante, o desenvolvimento de habilidades e competências pressupõe que os
indivíduos que se esforcem e se dediquem serão promovidos, numa espécie de
autopromoção pelos esforços empreendidos. Frigotto (1982), assim, pondera
sobre a ideia – força que se desenvolve em todas as atividades desenvolvidas
pelo SENAI.
33

[...] aparentemente instituições de formação do tipo SENAI


tendem a ser concebidas como instituições cuja tarefa básica é
a qualificação técnica do trabalhador. Na realidade, porém, as
relações de trabalho-aprendizagem, a forma de organização
interna, os valores que se passam, as atitudes e hábitos que se
reforçam, as imagens de trabalhador bem sucedido e
fracassado, a figura do patrão, os traços, enfim, de
responsabilidades, assiduidade, responsabilidade,
pontualidade, etc. indicam que o ponto nodal é o de formar
bons trabalhadores, isto é, trabalhadores fabricados para
submeter-se, mais facilmente às relações sociais de trabalho
estabelecidas. Homens fabricados para aceitarem a
desqualificação do trabalho dada pela divisão do trabalho.
(FRIGOTTO,1982, p. 42).
A concepção de trabalho subjacente veiculada e desenvolvida nesse
projeto educacional não é o trabalho enquanto elemento fundamental, que
define a relação social que os homens estabelecem na produção de sua
existência, mas o trabalho assalariado definido pelas relações capitalistas.

Na consolidação e intensificação do seu projeto, a CNI, com o discurso


da baixa qualidade dos recursos humanos para aumentar a competitividade da
indústria brasileira na década de 1980, vê a educação básica como elemento
indispensável para a indústria competitiva. A força de trabalho não deveria
estar desprovida da educação básica. Como discurso para obter o consenso da
sociedade, Rodrigues (1988) sistematiza os télos5 como espécie de meta a ser
perseguida. Sobre essa estratégia do capital e sua atuação na educação, foi
construído o discurso de que o Brasil somente seria um país que superasse as
desigualdades sociais se passasse pela industrialização (década de 1960). Na
consolidação da industrialização, entre 1960 e 1980, a superação viria com o
desenvolvimento; já na década de 1980, o discurso construído pressupunha
que o Brasil teria que ser uma economia competitiva. A proposta era o
desenvolvimento de um estado moldado à imagem e semelhança do capital,
com a educação profissional concebida como alavanca para a industrialização.
Porém, com a consolidação da industrialização, não se poderia mais atribuir o
atraso ao modelo agrário exportador.

Ainda sobre o télos Rodrigues (1998) afirma,

5
Para análise do discurso que fundamenta a CNI, José Rodrigues utiliza o conceito de
metamorfose teleológica, sucessivos télos. Constitui-se de construção e reconstrução, no
discurso dos industriais que se caracteriza como télos societário, uma imagem construída pelo
discurso hegemônico, com o fito de se tornar uma meta a ser perseguida, incansavelmente,
pelo conjunto da sociedade, conduzida pela classe que o elaborou (RODRIGUES, 1998).
34

A veemente e constante pregação da inadequação funcional da


formação humana à economia sempre vem acompanhada de
previsões, com traços fortemente catastróficos, sobre o futuro
da economia, e consequentemente, da sociedade. Em outras
palavras, ou a formação humana adequa-se às novas
demandas da produção, da economia, ou não será jamais
atingido o télos. (RODRIGUES, 1998, p. 134)
Os empresários industriais brasileiros, através da confederação
nacional da indústria, desde sua fundação em 1938, sempre
estiveram presentes na luta hegemônico-pedagógica,
buscando criar os homens à sua imagem e necessidade.
(RODRIGUES, 1998, p. 135)

Acompanhando a dinâmica das mudanças no mundo do trabalho, no


final da década de 1980, com o Brasil ingressando na economia competitiva,
referida educação se estende para os 11 anos; e nos anos 1990, segundo
Ramos (2005), o Estado assume uma função de subsidiar os planos de
educação profissional. A desvinculação da educação profissional do Ensino
Médio aparece, também, baseada na ideologia de que o gasto com a educação
integrada seria desnecessário, pois aqueles que tinham condições de cursar o
Ensino Médio depois iriam para o nível superior. Além disso, a desvinculação
era uma necessidade para poder privatizar a educação profissional, abri-la à
iniciativa privada, já que o Ensino Médio, mesmo sendo livre à iniciativa
privada, era definido como de responsabilidade do Estado.

[...] poder-se ia dizer que a CNI aprofundou a formula da


improvisação impossível, já que o desenvolvimento atual das
forças produtivas estaria elevando as necessidades gerais de
conhecimentos escolares para a conformação da força de
trabalho industrial. (RODRIGUES, 1998, p. 138).

Essa nova formação que exigia velhas habilidades e uma capacidade


maior de abstração estava ligada, igualmente, ao autocontrole e aos pulsos
binários, substituindo os capatazes. A constituição desse novo exército de
reserva demandou uma base escolar mais larga e mais sólida. Rodrigues
(1998) declara que, apesar das variações do pensamento industrial sobre
educação e formação profissional, uma característica é invariante àquela de
que “a formação humana é tão somente uma variável a ser funcionalizada à
reprodução ampliada do capital, e, por esta razão, demanda cuidadoso
gerenciamento” (RODRIGUES, 1998, p. 141).
35

Martins (2007), em seu turno, esclarece que, mediante a incorporação


do paradigma produtivo flexível e da necessidade de elevação da
competitividade industrial do país, a partir dos anos 1990, passa-se a exigir
níveis mais elevados de conhecimento sistematizado pela escola, tanto na
preparação para o trabalho simples quanto na formação para o trabalho
complexo. Com o programa Livre para Crescer, o Instituto Herbert Levy
apresentou, em 1992, em documento intitulado Educação Fundamental e
Competitividade Empresarial — uma proposta para ação do governo, uma série
de metas e diretrizes para detalhar e aprofundar as proposições empresariais
para a educação escolar brasileira rumo à competitividade internacional do
país.

E mais recente a isso, ora caracterizada pelos governos ditos populares,


Lula (2003-2010) e o primeiro mandato do governo Dilma, até onde vão os
limites desta pesquisa, consoante Ramos (2005), é marcada, em um primeiro
momento, pela volta do discurso economicista e por um viés compensatório,
caracterizadores da educação profissional como sendo aquela oferecida
àqueles que não conseguiriam acessar o ensino superior. Nesse período,
buscou-se reverter o processo de privatização intenso dos anos 1990, mas não
se avançou muito. O Decreto nº 2.208/97 foi revogado e foram poucas suas
conquistas, sendo implementadas políticas como o Programa Escolas de
Fábrica, lançado em 2004 e baseado em parcerias do Estado com a iniciativa
privada para a formação profissional de jovens de 16 a 24 anos.

Marcado pela disputa entre os setores progressistas e conservadores da


sociedade brasileira pela hegemonia nesse campo da educação profissional, o
governo Lula desenvolve uma política de educação profissionalizante que se
processa mediante programas focais e contingentes, a exemplo dos programas
Escola de Fábrica, Integração da Educação Profissional ao Ensino Médio na
Modalidade de Educação de Jovens e Adultos (PROEJA) e da Inclusão de
Jovens (PROJOVEM). De uma política consistente de integração entre
educação básica e profissional, articulando-se os sistemas de ensino federal e
estaduais, passou-se à fragmentação iniciada internamente, no próprio
Ministério da Educação.
36

2.2 O empresariado e a educação rural

A análise crítica sobre o projeto capitalista para o campo brasileiro e as


formas de utilização da educação como instrumento de fortalecimento desse
projeto passa, principalmente, pela compreensão de como as ocupações
colonialistas tomaram, por meio da violência, as terras indígenas e de como foi
criada a propriedade privada da terra e sua lógica de exploração, produzindo
riquezas para uma minoria e pobreza e exclusão para uma maioria. As raízes
históricas brasileiras relacionam o projeto burguês para o campo ao regime de
escravidão, latifúndio e ao modelo de produção extrativista e agrícola
direcionado para o mercado externo.

Vale ressaltar que esse modelo imposto, no seu início, não trouxe
consigo a constituição da propriedade privada capitalista da terra, pois a coroa
é quem detinha a terra, e os exploradores colonialistas tinham apenas os títulos
de sesmarias, que lhes davam o direito de uso das terras reais (OLIVEIRA,
2010). Foi, então, a partir de 18/09/1850, que a Lei nº 601, conhecida como Lei
de Terras, tornou a terra uma mercadoria e consolidou-se a grande
propriedade rural que impediu os pobres de terem acesso a ela. As pesquisas
de Oliveira (2010) apontam esse trágico processo de exclusão a que foi
submetido o campo brasileiro a partir da exploração capitalista.

A discussão sobre a origem da propriedade da terra na questão


agrária não pode prescindir da afirmativa de que ela deriva dos
diferentes processos históricos pelos quais o país passou. Isto
quer dizer que a formação territorial brasileira deriva da forma
através da qual o capital submeteu a terra à lógica econômica
de exploração. (OLIVEIRA, 2010, p. 291).

Sobre a formação da classe trabalhadora camponesa Stédile (2005)


aponta que, com a crise do modelo agroexportador no século XX, surge o
campesinato brasileiro composto pelos quase dois milhões de pobres vindos da
Europa pós-guerra para trabalhar na agricultura brasileira, bem como a
população mestiça formada nos 400 anos de escravidão. Ainda conforme
mencionado autor, essa classe tinha duas funções nesse modelo: fornecer
mão-de-obra barata para a nascente indústria na cidade e exército de reserva
para a manutenção dos baixos salários, produzindo alimentos baratos para os
operários e matéria-prima agrícola para o setor industrial. O Brasil chegou à
37

década de 1960 com a agricultura modernizada, capitalista e um setor


camponês totalmente subordinado aos interesses do capital. Sobre isso, mais
uma vez com Stédile, sustenta-se.

Dessa forma, a lógica do modelo de industrialização


dependente atuava permanentemente de forma contraditória e
complementar, em que os camponeses, ao mesmo tempo que
se reproduziam e se multiplicavam enquanto classe tiveram
parcelas de seus membros, migrando para as cidades e se
transformando em operários. (STÉDILE, 2005, p.32).

Em se tratando de educação, percebe-se que o lugar que o camponês e


o próprio campo representavam na estrutura capitalista brasileira não
necessitava, incialmente, de políticas públicas, porque o campo era visto
apenas como local de exploração.

Essa formação social não exige uma qualificação da força de


trabalho, ocasionando até certo desprezo, por parte das elites,
em relação ao aprendizado escolar das camadas populares,
principalmente dos camponeses. (RIBEIRO, 2012, p. 279).

A educação rural concebida como educação destinada à população


agrícola constituída por todas aquelas pessoas para as quais a agricultura
representa o principal meio de sustento vem desde sua origem associada à
perda da autonomia dos agricultores, impondo um conhecimento estranho à
tradição e dinâmica da vida camponesa. Ribeiro (2012).

Sobre esse modelo educacional, os estudos de Calazans (1993)


apontam que o projeto de educação para o meio rural aparece, de forma
superficial e desarticulada, no cenário brasileiro, no fim do Segundo Império.
Contudo, somente a partir da primeira metade do século XX, é que a oferta de
educação rural foi implantada mais amplamente, porém não como uma
preocupação com a formação dos trabalhadores do campo e, sim, porque a
evolução das estruturas sócio agrárias do país obrigou a classe dominante do
campo a, minimamente, se preocupar com algumas mudanças, como, por
exemplo, a construção de escolas em seus domínios.

Foi no contexto da década de 1930 que emergiu o movimento conhecido


como “Ruralismo Pedagógico”, que teve o objetivo de propor uma escola
vinculada ao homem do campo condenando o urbanismo, colocando o
38

deslocamento do homem do campo como impulsionador de desordem social. O


Ruralismo Pedagógico, com intenções duvidosas, fundamentou-se baseado
nas ideias escolanovistas e progressistas de educação lançadas no manifesto
dos “Pioneiros da Educação Nova”, que, de sua parte, propunha, por meio da
educação, a fixação do homem no campo e uma escola integrada às questões
regionalistas, agregando diversos interesses: ideologia do colonialismo que,
defendendo as vidas campestres mascarava as preocupações dos
agroexportadores como o esvaziamento do campo; interesses das elites
urbanas preocupadas com a explosão sociais na cidade causada pelo êxodo
rural; e outros segmentos que queriam colocar o Brasil num destino econômico
agropecuário. (LEITE, 1999).

Dessa forma, o Ruralismo surge como proposta educacional não


comprometida com a formação da classe trabalhadora, mas como interesses
de segmentos dominantes em manter, naquele momento histórico, o indivíduo
no campo, ajustando-o ao meio rural, para fixação dos elementos de produção,
integrando todos nas obras de construção da unidade nacional para “[...]
tranquilidade, segurança e bem-estar do povo brasileiro”. (CALAZANS, 1993, p.
26). Entretanto, o caráter conservador desta proposta não apresentou
resultados, visto que a permanência do homem no campo está relacionada às
suas condições materiais de existência e não apenas aos apelos românticos e
idealistas que o ruralismo pedagógico propunha. A intencionalidade, mesmo
das elites com a educação rural, era inserir os povos do campo na dinâmica
produtiva do capitalismo e submetê-los, ideologicamente, ao projeto societário
burguês.

Com o processo de industrialização intensificado no país da década


de 1950 em diante, mediante a introdução de máquinas, novas tecnologias e
insumos agrícolas no campo – processos vistos como fundamentais para a
modernização –, as necessidades da mão-de-obra do campo mudaram e isso
impulsionou mudanças também na legislação educacional, modificações essas
que não propunham a formação do camponês, garantindo-lhe o acesso a uma
educação de qualidade e, sim, uma mera qualificação para as novas
necessidades do mercado.
39

No pós-guerra, em conformidade com a política norte-americana, foi


criada a Comissão Brasileiro-Americana de Educação das Populações Rurais
(CBAR), que, segundo Leite (1999), tinha o objetivo de implementar projetos
educacionais no meio rural, com a constituição de Centros de Treinamentos,
realização de Semanas Ruralistas e criação e promoção de Clubes Agrícolas e
dos Conselhos Comunitários Rurais. Organizaram-se, também, os programas
de Extensão Rural que, continuando com Leite (1999, p. 34), apesar de
proporem a melhoria de vida das populações rurais, reforçaram as condições
de dependência e “[...] a vivência democrática e cidadã ficou mais uma vez
submetida à vontade dos grupos dominantes”. Além disso, surgiu a Campanha
Nacional de Educação Rural (CNER), que repetia fórmulas de dominação e
não discutia a problemática rural. Com o objetivo de acompanhar os processos
produtivos e, em alguns cursos, até mesmo toda a escola rural, ficavam
encarregados de „capacitar‟ estudantes, tornando-os mais producentes para o
trabalho que iriam desempenhar, relegando à escola a tarefa de treinar, ao
invés de educar.

Esse processo se aprofunda nas décadas seguintes, com a expansão


da escolarização no campo. Programas como Movimento Brasileiro de
Alfabetização (MOBRAL), Programa Nacional de ações Socioeducativas e
Culturais para o meio rural (PRONASEC) e Programa de Expansão e Melhoria
da Educação no Meio Rural do Nordeste (EDURURAL), implantados nos anos
1970 e 1980, facilitaram o acesso dos povos do campo à escola; esta
educação, porém, descolada das questões sociais que envolviam o campo,
não dava conta de garantir o avanço das populações. Sobre esse período Leite
(1999) assevera que,

[...] a crítica que se faz, atualmente, sobre as mudanças


educacionais ocorridas no país com o advento dos militares, é
que o sistema educacional controlado pela ideologia de
caserna limitou-se aos ensinamentos mínimos necessários
para a garantia do modelo capitalista-dependente e dos
elementos básicos da segurança nacional. (LEITE, 1999, p.
52).

Além disso, Ribeiro (2012) completa:


40

Os escassos registros históricos existentes indicam que


diferentes modalidades de educação rural, como centros de
treinamentos, cursos e semanas pedagógicas efetuadas até os
anos de 1970, estiveram sob influência norteamericana, por
meio de agências de fomento que contavam com o apoio do
Ministério de Educação (MEC) [...] Partiam de uma visão
externa à realidade brasileira, na suposição de que as
populações rurais estariam sendo marginalizadas do
desenvolvimento capitalista. A política adotada para a
educação rural justificava-se, então, como resposta à
necessidade de integrar aquelas populações ao progresso que
poderia advir desse desenvolvimento. (RIBEIRO, 2012, p. 296).

Deduz-se daí que a política educacional destinada às


populações camponesas teve maior apoio e volume de
recursos quando contemplava interesses relacionados à
expropriação da terra e à consequente proletarização dos
agricultores. Associado a esses interesses, identificava-se o
projeto de implantação, por parte das agências de fomento
norte-americanas, de um modelo produtivo agrícola gerador da
dependência científica e tecnológica dos trabalhadores do
campo. (RIBEIRO, 2012, p. 297)

Desse modo, a educação rural funcionou como um instrumento formador


tanto de uma mão-de-obra disciplinada para o trabalho assalariado rural quanto
de consumidores dos produtos agropecuários gerados pelo modelo agrícola
importado. Os programas destinados a essas populações eram elaborados e
aplicados sem sua participação. As instituições encarregadas de implantar
aquelas políticas recebiam os „pacotes‟ fechados, de modo a não interferirem
nos objetivos, nas metodologias e nos conteúdos contidos nos programas.
Dessa maneira, os mesmos eram repassados aos centros comunitários, às
escolas e aos sindicatos tomados como parceiros, sem que tivessem
participado da elaboração dos referidos „pacotes‟ e sem, ao menos, ter
conhecimento de suas origens. (CALAZANS, 1993).

2.3 O Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (SENAR) atuação do


sistema S na escola púbica do campo
Na virada dos anos 1980 para 1990, o agronegócio emerge no Brasil
associado à produtividade e modernização da agricultura que, para “Leite e
Medeiros” (2012), trazem consigo uma tendência, por um lado, a controlar
áreas cada vez mais extensas e, por outro, a concentrar empresas com
controle internacional. De acordo com os autores citados, tal concentração é
41

marcada, também, pela verticalização: os grandes grupos controlam, hoje, o


mercado de insumos, o armazenamento, o beneficiamento e a venda, com
estratégia baseada em sua dinâmica de inserção no mercado internacional.
Vale ressaltar que essa modernização vem acompanhada de formas
degradantes de trabalho, da necessidade crescente de demandas por terras e
da destruição da natureza.
O campo brasileiro se configura, ainda, por ser um espaço em que
muitos têm pouca terra ou terra nenhuma e poucos têm muita terra, consoante
Oliveira (2004) expõe em seus estudos sobre a barbárie do agronegócio.
A soma das 27 maiores propriedades existentes no país,
atinge uma superfície igual àquela ocupada pelo Estado de
São Paulo e a soma das 300 maiores atingem uma área
igual à de São Paulo e Paraná. Por exemplo, uma das
maiores propriedades aquela da Jary/AS, que fica parte no
Pará e parte no Amapá, tem área superior ao Estado de
Sergipe. (OLIVEIRA, 2004, p. 27).

A concentração de terra segue sendo uma realidade, pois, como


apontado, a terra serve como “reserva patrimonial e de valor dos latifundiários”.
Isso significa que o discurso do agronegócio encobre a concentração de terra,
pois, quem que, de fato, produz e gera emprego no Brasil são as pequenas e
médias unidades. A grande propriedade no Brasil é, majoritariamente,
improdutiva.

A terra não é apropriada previamente para ser posta para


produzir, pois, mesmo sem produzir nada garante ao seu
proprietário a geração de riqueza. Ela funciona como reserva
de valor (realizada na venda da propriedade) ou, o que é mais
comum, como reserva patrimonial (utilizada como garantia
quando se vai ao sistema financeiro tomar empréstimos).
(OLIVEIRA, 2012, p. 302).

O agronegócio tem investido no discurso da produtividade, atribuindo a


si o mérito da produção do campo e criando seus meios tecnológicos de, cada
vez mais, avançar e oportunizar a formação de defensores do seu projeto.

Nesse contexto, a educação, como espaço privilegiado de formação dos


sujeitos, assume, no campo brasileiro, o papel de promover a subordinação e
transmissão de conhecimento necessário aos interesses da classe dominante,
que, a seu turno, preserva esse modelo de desenvolvimento destrutivo, usando
42

a escola para mediar as contradições da produção, para reproduzir a divisão do


trabalho baseado em classes e para reproduzir as relações de produção.

Para Carnoy (1987), a função da educação no sistema capitalista não é


apenas ideológica, mas econômico-reprodutivista, pois consiste em
desenvolver um exército de reserva qualificado; aumentar a produtividade tanto
diretamente como com quadros tecnocráticos e desejosos de controlar outras
frações da força de trabalho e como aparelhos repressivos no controle das
crianças.

A burguesia brasileira, tanto no campo como na cidade, tem a educação


como ferramenta de dominação e a atuação do empresariado na elaboração de
projetos e programas educacionais se estende ao campo de várias formas, a
exemplo, o Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (SENAR), instituído em
1991, entidade de direito privado, paraestatal, mantida pela classe patronal
rural, vinculada à Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA).
Integrante do Sistema S, o SENAR, dentre vários espaços de atuação na
formação da classe trabalhadora, desde 1995, passa a operar na rede de
ensino no Estado do Paraná, com um programa de educação ambiental
destinado a escolas públicas e privadas, denominado “Agrinho”. Esse
programa foi precursor e deu origem a outros programas desenvolvidos pelo
país, oferecendo base metodológica e conceitual para elaboração do programa
Despertar no Estado da Bahia.

O Referido Programa, enquanto ação de Educação Ambiental, é uma


trabalho do patronato rural na Bahia desenvolvido pelo SENAR em escolas da
rede pública. Com o objetivo de realizar formação profissional de
trabalhadores que vivem no campo, este serviço desenvolve cursos
profissionalizantes dando ao agronegócio respostas às necessidades da
formação do trabalhador:

Em síntese, compreende-se que a missão do SENAR é de


qualificar da força de trabalho no campo, de forma a atender às
demandas do agronegócio. Nos municípios, o SENAR
organiza-se a partir dos sindicatos rurais, espaço de
organização dos latifundiários locais. É a partir deste grupo que
se destinam as verbas do serviço para promoção de cursos
nas comunidades. As ações do SENAR não somente se
destinam ao público adulto inserido ou apto ao mercado de
trabalho, como também atuam no campo da educação escolar
43

através de projetos de Educação Ambiental destinados


especificamente às Escolas do Campo. (RIBEIRO, 2015, p.
21).

No Estado da Bahia, buscando estimular o desenvolvimento do


agronegócio e desenvolver nos trabalhadores aptidões para o
empreendedorismo, a abrangência das formações ocorre de acordo com as
cadeias produtivas expandidas em cada região. Tais ações se dão nas
comunidades rurais, com minicursos, em caráter de capacitação, organizados
por profissionais integrantes do próprio SENAR ou por sindicatos afiliados à
Federação da Agricultura e Pecuária do Estado da Bahia (FAEB).

Sua gestão na escola pública, em especial naquelas do campo, aflui da


temática da Educação Ambiental que, com a construção do discurso em defesa
do Meio Ambiente, promovem projetos de formação continuada para
professores, preparando-os como disseminadores da sua concepção de
Campo e de Meio Ambiente. No entanto, o pensamento critico ao modelo de
agricultura pautado no agronegócio aponta que a incidência desenfreada desse
modelo está, justamente, na ação de destruição do meio ambiente e nos riscos
à população.

Na Bahia, o programa está inserido em mais de 80 municípios do


Estado. Ao inserir-se no campo da educação pública com projetos
educacionais, o SENAR cumpre o papel de disseminar a ideologia do
agronegócio nesses espaços, produzindo um consenso sobre o mesmo.

Retomando Ribeiro (2015), sobre as atribuições das três instituições –


SENAR, prefeitura e Estado –, verificou-se como se desenham os
compromissos da Prefeitura Municipal para com o SENAR, cabendo a ela o
papel de disponibilizar as Escolas do Campo, seus docentes e alunos ao
programa e arcar com toda a infraestrutura necessária para a efetivação deste.
O município não participa da elaboração do conteúdo da grande temática
“Educação Ambiental”, seu papel é de organizar todo o processo, mobilizando
outras secretarias como cooperadoras do programa, criando mecanismos de
incentivo ao projeto. Quanto ao Sindicato Rural, observou-se que a sua
participação se dá na articulação das comunidades rurais, com a missão de
partícipe de todas as ações do programa, efetivando, também, parcerias com
44

as secretarias municipais e atuando, conjuntamente, com as comunidades


rurais.

A metodologia do programa baseia-se na pedagogia da escola ativa


ancorado nos quatro pilares da educação: aprender a aprender, aprender a
conhecer, aprender a fazer, aprender a ser e aprender a conviver (SERVIÇO
NACIONAL DE APRENDIZAGEM RURAL, 2014, p. 5). Certamente não é para
apoiar a pequena agricultura, tampouco para desenvolver políticas de reforma
agrária. É um conteúdo de debate ambiental, sem se relacionar aos impactos
ambientais provocados pelo monocultivo e o uso de agrotóxicos, características
fundantes da agricultura empresarial.

Em síntese, o SENAR (órgão patronal) promove todo o processo de


formação pedagógica dos educadores, via processo de formação continuada,
orientando as escolas na elaboração dos projetos, de modo que estes
assumam o papel de eixo transversal. Fica, ainda, a cargo do SENAR formar
os coordenadores municipais, os professores destacados para operacionalizar
o funcionamento do programa e a certificação dos professores que
participaram do mesmo. É importante ressaltar que o SENAR passou a fazer
parte do Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego, o
PRONATEC, em 2011, expandindo a oferta de cursos para jovens e adultos do
Brasil rural.

Essa participação do SENAR na rede pública reforça a ideia de que a


educação tem um papel estratégico no atendimento de expectativas do setor
produtivo no Brasil; este se apropria da educação como ferramenta para
recompor o exército de trabalhadores subalternizados no processo produtivo de
cada época. Rodrigues (1998), que estuda as instituições criadas
conjuntamente com a CNI e o Estado, pontua que as recentes legislações
educacionais são, sem dúvida, reflexos (quase diretos) do pensamento
pedagógico industrial. Há todo um aparato jurídico que ampara essa atuação
do empresariado na formação da classe trabalhadora. Desde a década de
1960, quando da vitória dos proprietários de estabelecimentos particulares de
ensino na disputa com os setores que defendiam a escola pública, os
interesses dos proprietários vêm sendo garantidos legalmente. Nesse
ambiente, o Estado, como mero gerenciador de investimentos, denota, cada
45

vez mais clara, a intenção do empresariado de auferir os recursos públicos


para benefícios próprios na privatização da educação do país.

3 FUNDAÇÃO ODEBRECHT: EDUCAÇÃO E DESENVOLVIMENTO


SUSTENTÁVEL DO PDCIS

Esta seção trata do histórico e da atuação da Odebrecht no estado da


Bahia. Os dados aqui apresentados foram obtidos mediante estudo de dois
livros escritos por Norberto Odebrecht: Educação pelo Trabalho – Tecnologia
Empresarial, publicado em 1991, que explicita a história de sua empresa e
sistematiza os fundamentos de sua filosofia e; Odebrecht e Desenvolvimento
46

Sustentável a visão e a ação de um empresário: o caso do Baixo Sul da Bahia 6,


que, desde uma visão pessoal, relata a história da empresa na mencionada
região, bem como o plano de governança desenvolvido com o poder público,
entidades e demais empresas. Outra referência consultada foi Baixo Sul da
Bahia uma proposta de Desenvolvimento Territorial, resultante de um trabalho
da Fundação Odebrecht, em janeiro de 2000, pelo Projeto Conhecendo o Baixo
Sul, com o objetivo de produzir um amplo diagnóstico da Microrregião que
permitisse, ao então Projeto Aliança com o Adolescente, ter um conjunto de
dados sobre oito municípios que compõem a região.

Para tecer uma análise crítica mais sedimentada, foram pesquisados


autores que contestam a ideia de desenvolvimento difundida pela empresa e
que atestam um desenvolvimento que desrespeita direitos sociais e ambientais.

3.1 Histórico da Odebrecht: desenvolvimento para que e para quem?

Segundo Garcia (2009), o Brasil está em terceiro lugar no ranking das


100 empresas de países “emergentes” com potencial para desafiar empresas
transnacionais estadunidenses e europeias. Dentre essas, encontra-se a
construtora Odebrecht, empresa capitalista considerada uma das maiores
transnacionais da América Latina. A Odebrecht tem negócios nos 05
continentes, sendo Brasil, América Central e América do Sul as regiões que
garantem mais lucros à empresa.

Trata-se de uma empresa de origem baiana, que teve como fundador


Norberto Odebrecht7. Firmou-se no estado, na década de 1940, e, após 1950,
expandiu sua atuação para os demais estados do Nordeste. No processo de

6
Com apoio de órgãos do Estado, Norberto Odebrecht publica um livro contando seus feitos no
desenvolvimento do Baixo sul, porém a história contada a partir de suas vítimas aponta a face
cruel do desenvolvimento. O livro foi publicado com a parceria da Fundação Odebrecht, o
Centro de Recursos Ambientais (CRA), hoje substituído pelo Instituto do Meio Ambiente e
Recursos Hídricos (Inema), autarquia da Secretaria do Meio Ambiente, e o Núcleo de Estudos
Avançados do Meio Ambiente (NEAMA) do Centro de Administração Pública e Governo.
7
Norberto Odebrecht (1920-2014) foi fundador da empresa Odebrecht. Engenheiro, nascido
em Recife, filho de Emílio Odebrecht, neto de imigrantes alemães. Os Odebrecht chegaram ao
Brasil no início do século XIX, imigração germânica no sul do país, Santa Catarina
(ODEBRECHT, 2004).
47

ampliação, avançou para o centro sul na década de 1960 e, já no final da


década de 1970, passou a ter uma ação internacional, diversificando ainda
mais seus negócios. A criação da holding, em 1980, na qual a Odebrecht é
administradora e possui maior número de ações de um conjunto de empresas,
foi fundamental para essa diversificação de investimentos.

Sua origem está no contexto da modernização da agroindústria


açucareira na região, datando de 1920 a criação, em Recife/PE, da firma e
construtora Isaac Gondin e Odebrecht Ltda., transformada, após, em Emílio
Odebrecht. Essa empresa, embrião da atual Odebrecht, foi contratada para a
construção de pontes, estradas, armazéns e portos para escoar a produção de
açúcar. Na década de 1940, a família Odebrecht mudou-se para Salvador,
quando Norberto Odebrecht assumiu os negócios de seu pai, em decadência,
fundando a Odebrecht S/A (ODEBRECHT, 2004).

A maioria das grandes firmas de construção civil nacionais surgiram por


volta da década de 1940 e são empresas de origem familiar. Um dos motivos
que explica o fato de três das maiores empresas de engenharia terem origem
nordestina é o grande número de obras de infraestrutura locais nas décadas de
1950 e 1960, principalmente por conta da SUDENE e das usinas hidrelétricas
na região – o potencial hidrelétrico do Nordeste é o mais explorado dentre as
regiões do Brasil.

A indústria de construção se transformou em multinacional na década de


1970, destacando, aqui, a forte presença do poder público no financiamento
das atividades dessas empresas desde sua origem até os dias atuais. A maior
área de ganho das empreiteiras deu-se na construção de hidrelétricas e
barragens. Foi nesse tipo de obra, aliás, que essas firmas mais auferiram
lucros e se consolidaram.

De acordo com Garcia (2009), outra importante alavanca para o ramo da


construção pesada nacional foi a Petrobrás e os seus requisitos na área de
engenharia.

Todas essas companhias prestaram serviços para a estatal e


tiveram lucros com isso, havendo o caso extremo da Odebrecht
que, em sua apresentação empresarial se orgulha de ter
construído para a empresa refinarias, plataformas, estradas,
prédios – inclusive o prédio-sede da BR na avenida Chile, no
48

Rio –, portos e ter perfurado nada menos do que 140 poços de


petróleo e gás no mar. Se o governo de Juscelino possibilitou
amplas encomendas para a construção civil brasileira, o regime
ditatorial constitui o período com maiores oportunidades para
essas empresas na história recente. (GARCIA, 2009, p.106).

Além disso, os estudos de Campos (2009) apontam que, junto ao


financiamento público das grandes obras, os governos ditatoriais fizeram um
governo benéfico ao grande capital, ao serem tomadas providências que
prejudicaram a classe trabalhadora.

Medidas como o rebaixamento do salário mínimo e restrições


para os aumentos salariais, imposição de silêncio aos
sindicatos, o incentivo às fusões de empresas, a criação das
poupanças compulsórias do FGTS, PIS e PASEP, a inação
forçada da justiça do trabalho e de mecanismos fiscalizadores
típicos propiciaram o crescimento dos lucros privados e a
consolidação de conglomerados empresariais. No caso da
construção civil, as restrições à justiça trabalhista e aos
mecanismos fiscalizadores – tais como imprensa, ministério
público – tiveram o efeito perverso de incrementar em grande
escala os acidentes de trabalho. (CAMPOS, 2009, p.106).
As grandes obras realizadas a partir de 1964 explicam, em boa medida,
o crescimento das grandes firmas de engenharia nacional no fim do período
ditatorial.

As empresas construtoras se organizaram em aparelhos


privados de hegemonia para garantir posições estratégicas no
aparelho de Estado, impulsionando medidas benéficas,
políticas favoráveis, além das obras de infraestrutura. Esses
organismos específicos asseguram a representação e
reivindicação dos interesses das construtoras dentro do
aparelho de Estado. Desde o final da década de 1950, foram
criadas diversas agências desse tipo, como a Câmara
Brasileira de Construção Civil (CBIC), em 1957, o Sindicato
Nacional da Indústria da Construção Pesada (SINICON), em
1959, e, por fim, a mais importante de todas, a Associação
Brasileira de Engenharia Industrial (ABEMI), em maio de 1964.
Esse último órgão reúne as principais empresas do ramo e tem
maior projeção que as outras agências, por ter interlocução
com a Petrobras e também maior acesso à mídia e à imprensa.
(CAMPOS, 2009, p. 107).

A partir dos anos 1990 com a vitória de Fernando Henrique Cardoso


para presidente do Brasil em 1994, foram introduzidas as políticas neoliberais
no país. O Plano Diretor da Reforma do Estado, publicado em 1995, de
49

autoria de Bresser Pereira pode ser considerado como marco da Reforma


Gerencial do Estado Brasileiro. Durante o primeiro mandato do Presidente
Fernando Henrique Cardoso, Luís Carlos Bresser Pereira, então ministro do
extinto Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado (MARE),
delineou os principais elementos do dito Novo Estado Brasileiro, buscando a
adequação da administração pública nacional a critérios da então moderna
administração gerencial. As atividades estatais foram divididas em dois grupos:
atividades exclusivas do Estado, executadas pela cúpula da Administração e
consistentes em legislação, regulação, fiscalização, fomento e formulação de
políticas públicas; e atividades não exclusivas do Estado, que consistem nos
serviços competitivos e atividades de apoio.

No âmbito da sociedade civil, formou uma complexa rede de


organizações estruturada em torno dos aparelhos formuladores e aparelhos
difusores da nova ideologia. Investiu na assimilação de outros organismos para
sua zona de influência para potencializar o alcance de seus objetivos. A noção
de responsabilidade social definiu o processo de construção da unidade
orgânica da classe para produzir os elementos materiais e simbólicos
necessários à edificação da nova sociabilidade requerida pelo Estado
capitalista neoliberal no Brasil.
A atuação desses organismos na segunda metade dos anos de 1990 foi
fundamental para conscientizar o empresariado sobre a importância da ação
coletiva e orgânica através da “responsabilidade social empresarial” e sobre a
necessidade de ampliar o número de organizações na sociedade civil.

Nos anos 2000 o Partido dos Trabalhadores, que havia liderado o


movimento de resistência parlamentar ao neoliberalismo nos anos de 1990,
seguiu na implementação de políticas delineadas no governo de Fernando
Henrique Cardoso (FHC). Os planos de governo e as alianças indicavam que a
disputa eleitoral daquele ano não se concentraria num embate entre projetos
pró e contra o neoliberalismo. Na verdade, o foco daquele pleito foi reduzido à
concorrência entre forças que desejavam assumir a condução das políticas
econômicas e sociais dentro dos limites estabelecidos por aquele projeto
(TAUTZ, 2010).
50

Em Tautz (2010, p. 252), o governo Lula (2003-2010) “[...] aprofundou


certo padrão de acumulação do capitalismo brasileiro inaugurado com as
privatizações e a liberalização dos anos 1990 baseado na formação de
conglomerados privados (nacionais e estrangeiros), fomentados por fundos
públicos, via capital estatal e paraestatal (empresas estatais e fundos de
pensão)”. A retomada do papel estatal e seu alinhamento à demanda dos
grupos empresariais com proporções sólidas no governo pré-Lula foi marcada
pela “[...] transferência massiva de recursos públicos, de forma não
transparente e sem o devido debate com a sociedade brasileira” e facilidades
do BNDES “[...] condições de crédito amplamente favorecidas, déficit de
transparência e ausência de contrapartidas sociais, ambientais e econômicas
nos contratos de financiamento”. Note-se que a Odebrecht está entre essas
empresas eleitas com esse benefício, pois tem facilidades creditícias e fiscais.

O governo investe em commodities e produtos de baixa tecnologia e


segue num modelo insustentável do ponto de vista econômico, já que se
especializa em produtos de baixo valor agregado.

No que se refere à dimensão social, vale lembrar que as empresas do


setor têm um baixo desempenho em termos de geração de empregos. Em
muitos casos, estes provêm do trabalho precário e, mesmo, análogo à
escravidão, como nos setores de etanol, e papel e celulose. Não faltam,
também, exemplos de participação e financiamento do BNDES a usinas de
cana autuadas pelo Ministério do Trabalho por manterem trabalhadores em
condições análogas à escravidão, como o caso da Brenco – adquirida
recentemente pela ETH Odebrecht; além de remoção de pessoas pelo
empreendimento, atração pelo empreendimento, centralização dos recursos no
exterior e dependência da tecnologia de ponta. Em se tratando de questões
ambientais os impactos recaem sobre as populações mais pobres, levando a
consequências, igualmente, do ponto de vista político, pois evidencia o
financiamento sem transparência e sem vigilância social, como, por exemplo, a
flexibilização da legislação ambiental. (TAUTZ, 2010).

O Brasil tem optado por um desenvolvimento pautado no modelo norte-


americano de exportar capital, via expansão e instalação de suas empresas
pelo mundo. Suas grandes empresas têm sido tratadas como motor do
51

crescimento econômico e do crescimento nacional, sendo o Estado o grande


investidor dessa expansão. Em 2003, o BNDS elaborou uma linha de crédito
específica para expansão das empresas brasileiras:

Assim, o BNDES alterou seu estatuto, e passou a apoiar


empresas com capital brasileiro na implantação de
investimentos e projetos no exterior, mas com ênfase
comercial, especialmente ligados aos projetos de integração
regional. (GARCIA, 2009, p. 14)

Além disso, as empresas são representadas por governos e pelos meios


de opinião pública como os motores de desenvolvimento nacional, capazes de
colocar o país no cenário competidor internacional. Interesses privados das
empresas são associados aos interesses nacionais.

Usando a estratégia de formação de consenso em torno de seus


interesses, essas empresas se sustentam na “responsabilidade social
corporativa”; são ações das mesmas junto às comunidades e à sociedade, que
permitem a elas penetrarem no seio da sociedade civil de diversas formas,
conduzindo sua marca junto a ações de caráter social-público, melhorando,
assim, sua imagem e assimilando e cooptando setores sociais que sofrem seus
impactos. Muitas vezes, as empresas buscam políticas compensatórias por
danos sociais e ambientais causados, sem mudar sua estratégia e sua ação,
não eliminando a possibilidade de danos futuros. (GARCIA, 2009).

Portanto, de maneira voluntária, as políticas de


„responsabilidade social‟ das empresas vêm crescendo,
vinculadas a políticas de marketing, e de criação de um
consenso social em torno de seu papel. A Construtora
Odebrecht divulgou R$ 32 milhões em projetos socioambientais
em 2007. As três transnacionais são signatárias do Pacto
Global da ONU. (GARCIA, 2009, p. 20)

Há uma atuação das empresas, ainda, no cinema brasileiro, em jornais e


em meios de comunicação; nas universidades, atuam, especialmente, nos
setores técnicos. O conhecimento desenvolvido é direcionado de acordo com
as necessidades das empresas, sendo elas também a opção de emprego para
estudantes, que condicionam seus interesses de pesquisa.
Outro ponto a ser colocado com relação ao percurso dessas empresas é
sua participação em concessões públicas, a partir das políticas neoliberais.
52

Com isso, todas as cinco grandes empreiteiras têm concessões nas áreas de
rodovias, telefonia, geração e distribuição de energia elétrica e outros, inclusive
no exterior, onde a Odebrecht tem contratos para exploração de estradas em
Portugal e de abastecimento de água na capital de Angola.
Essa tendência é tão acentuada que as empresas têm perdido
o seu caráter original de construtoras, convertendo-se em
conglomerados monopolistas com uma variada carteira de
investimentos, dentre os quais o de construção de obras de
infraestrutura se tornou minoritário. Assim, as organizações
Odebrecht incluem a famosa construtora e também uma
empresa muito maior, a Braskem, conglomerado petroquímico
que possui polos no Sul e no Nordeste, líder na América Latina
e o terceiro grupo petroquímico das Américas, atrás apenas
das gigantes Exxon e Dow Chemical. A empresa foi criada a
partir da privatização de empresas como a Salgema Indústrias
Químicas, PPH e Poliolefinas, nas décadas de 80 e 90. O
enorme tamanho da Braskem diminui o porte da construtora no
grupo como demonstram os números: 68,85% das receitas das
organizações Odebrecht em 2006 eram provenientes da
química e petroquímica, enquanto 30,89% eram oriundos da
construção e engenharia. Outros projetos da organização se
situam nas concessões rodoviárias, concessões de energia e
até no agronegócio, em que a empresa ETH, pertencente ao
grupo, pretende investir R$ 5 bilhões no setor de açúcar e de
álcool até 2014. (CAMPOS, 2009, p. 111-112)

A construtora Odebrecht foi expulsa do Equador por falhas graves na


obra da hidrelétrica San Francisco. O governo brasileiro participou dessa má
atuação da construtora, pois, ao emprestar dinheiro ao Equador para a
construção da hidrelétrica de San Francisco, o BNDES forneceu um pacote
fechado ao país, determinando a contratação de uma empresa brasileira para a
obra (no caso, a Odebrecht), bem como a aquisição de insumos e
equipamentos provenientes do Brasil. A construtora “transbrasileira” Norberto
Odebrecht, o Banco do Brasil e o BNDES fizeram estragos na vida de milhões
de equatorianos devido à sua participação na construção e no financiamento
de grandes projetos de infraestrutura que não apresentaram benefício coletivo
para o país. (LANDIVAR, 2009).

O Movimento dos Atingidos por Barragens denuncia os benefícios


promovidos pelo Estado brasileiro na construção de Santo Antônio, no Rio
Madeira, no Estado de Rondônia. A construção da hidrelétrica por Odebrecht e
Furnas, suas acionistas majoritárias, constitui-se numa Parceria Público-
53

Privada (PPP). Esse modelo de parceria se intensificou no último período,


principalmente nas obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).
As PPPs garantem que a participação de empresas públicas levem
investimento estatal e que as empresas privadas invistam o mínimo possível.
Nesse caso, o BNDES estará financiando R$ 6,1 bilhões dos R$ 8 bilhões
necessários para a construção de empresas transnacionais brasileiras na
América Latina; é o maior volume de recursos da história do BNDES destinado
para uma mesma obra e as consequências ambientais causadas pela
hidrelétrica já são visíveis.

Outro ponto a ser discutido é o financiamento da empresa em


campanhas eleitorais. A Norberto Odebrecht é a quinta maior doadora de
recursos para campanhas, direcionando seus investimentos em busca de
vantagens futuras como contratos, projetos de lei, empréstimos em bancos
estatais e regulações favoráveis.

3.2 Baixo Sul da Bahia uma história de exploração

A região do Baixo Sul da Bahia8, composta por 15 municípios, tem uma


média populacional de 359,109 habitantes, sendo que cerca de 46,7% da
população vive no campo (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E
ESTATÍSTICA, 2010). É potencialmente rica em recursos naturais. Abundante
em recursos hídricos, gás natural, minerais e clima favorável à agricultura, além
do potencial para a piscicultura e turismo. Recortado por ilhas, estuários e
baías profundas, pequenas enseadas e braços de mar que avançam terra
adentro, coberta por densa vegetação o Baixo Sul é uma região de grande
diversidade ambiental e paisagística. Dessa forma, tornou-se um atrativo para
os grandes projetos de exploração econômica, fazendo dele um espaço de

8
A região do Baixo Sul da Bahia, na nova divisão territorial, compreende os municípios de
Camamu, Igrapiúna, Maraú. Ituberá, Nilo Peçanha, Cairú, Gandú, Jaguaripe, Piraí do Norte,
Presidente Tancredo Neves, Teolândia, Taperoá, Wenceslau Guimarães e Valença. As
regiões, hoje chamadas de Recôncavo, Vale do Jequiriçá e Baixo Sul estiveram integrados no
passado, durante muitos séculos, tendo a cidade de São Salvador como polo aglutinador.
Apenas em meados do século XX, com o esgotamento do modelo agroexportador
estabelecido, as novas dinâmicas sociais daí advindas levaram à diferenciação e
reorganização desses territórios.
54

contradições sociais, marcado pela concentração de terra e renda e elevados


índices de pobreza e analfabetismo.

Situada na Capitania de Ilhéus, a construção da primeira vila 9 da região,


datada de 1534, constitui-se uma das mais antigas do período da colonização
do Brasil. A experiência colonizadora nesta localidade abateu, principalmente,
a vegetação nativa, a Mata Atlântica, e se estendeu para o extermínio humano
que, praticamente, dizimou os povos indígenas, Tupinambás e Aimorés, que
viviam no território.

Na cidade de Salvador, consolidou-se um vasto cinturão agrícola


destinado à produção de gêneros tropicais exportáveis, estabelecendo ali as
bases da sociedade colonial brasileira. A região do Baixo Sul tornou-se local
estratégico para a produção de alimentos destinados à manutenção da
metrópole. Ao longo do período colonial, as vilas da Capitania de Ilhéus
estavam de tal modo articuladas aos circuitos de produção e comercialização
de açúcar, fumo e mandioca do Recôncavo da Bahia de Todos os Santos que
mereceram o epíteto de “Vilas de Baixo”, uma referência não apenas à sua
posição geográfica, como também à sua condição política em face de
Salvador.

Tal empreendimento demandou uma vasta mão-de-obra escrava nos


locais onde a indígena não foi suficiente; nesses, formou-se um núcleo
escravista. Com isso, dados do IBGE revelam que 88% da população do Baixo
Sul é negra. Como já salientado, não diferente de outras regiões do Brasil,
após a Lei de Terras; e a lei de libertação dos escravos, conhecida como a Lei
Áurea, começa o processo de concentração fundiária no território, que teve seu
início com o processo de grilagem por parte de alguns empresários,
apossando-se de terras devolutas que estavam sobre o domínio de ex-
escravos fugidos e ou seus descendentes, durante quase um século.

9
Vila de São Jorge dos Ilhéus (1534), a partir da qual se desmembraram as Vilas de Nossa
Senhora do Rosário de Cairú (1608) – termo original dos municípios de Valença, Nilo Peçanha,
Wenceslau Guimarães, Taperoá, Teolândia, Presidente Tancredo Neves (território de
identidade do Baixo Sul) – e Nossa Senhora da Assunção do Camamu (1693), da qual se
originaram Igrapiúna e a antiga Vila de Santarém dos índios (1758) termo original dos territórios
atuais dos municípios de Ituberá, Piraí do Norte e Gandú (todos pertencentes ao Baixo Sul)
(ADAN, apud FIGUEREDO, 2010 p. 46).
55

Com a construção da ferrovia e, posteriormente, da rodovia, a região foi


perdendo importância econômica e passou por um processo de isolamento.
Apenas a partir da década de 1940, ressurgiu para uma nova etapa de
exploração econômica com a chegada de empresas que ali se instalaram.

Mesmo com todas as condições potencialmente favoráveis, os


indicadores de desenvolvimento econômico e social apresentam números que
se contrapõem a tal situação. As riquezas da região, historicamente, estão
concentradas nas mãos das grandes empresas que concebem ao Baixo Sul
um potencial para os grandes negócios e a agricultura camponesa e demais
atividades ligadas ao pequeno, como pesqueiros, marisqueiros, entre outros,
que, com suas poucas conquistas, resistem, ainda que se vejam, cada vez
mais, subordinados às leis de mercado. Assim, identificam-se, na Região do
Baixo Sul, 35 assentamentos de Reforma Agrária (desses, 15 vinculados ao
MST); 10 acampamentos, 67 comunidades quilombolas e negras (dessas
apenas 35 foram certificadas, isto é, tem a posse da terra); 01 comunidade
indígena, 05 colônias de pescadores, 09 Associações Pesqueiras e 03
assentamento Cédula da Terra. (GEOGRAFAR - UFBA, 2012).

Será retratada na sequência descrição da atuação da Odebrecht na


região e sua concentração, ao longo de quase 70 anos, de terra e riquezas,
bem como sua volta à região, ora propondo possibilidades de superação da
pobreza.

Na Bahia, além de desenvolver obras na capital, os trabalhos da


empresa Odebrecht se expandiram para o sul do estado para construção de
portos e pontes. Na região do Baixo Sul, chega, em 1949, para desenvolver
obras encomendadas pelo governo, já instalando atividades econômicas que
atestam o seu caráter explorador tanto das riquezas naturais como dos seres
humanos. Com atividades em toda a região, foi no município de Ituberá/BA,
que se concentrou a maior parte de seus negócios.

A instalação da empresa em uma região rica em recursos hídricos e


vegetação foi propícia para a consolidação de negócios, abrindo, assim, a
Sociedade Anônima Ituberá Comércio e Indústria (SAICI), tendo como sócios
os príncipes de Orleans e Bragança. A SAICI operava com geração e
distribuição de energia elétrica; extração, transporte e beneficiamento de
56

madeira e autoclavagem. Além disso, construiu uma vila residencial e um


campo de pouso, o que proporcionou uma exploração de instalações
aeroportuárias e agenciamento de passagens aéreas. Do mesmo modo que a
SAICI, outras empresas se acomodaram na região: a Standard Oil, atual Esso,
a Fiestone10, atual Michellan (que adquiriu enormes áreas agrícolas e as
utilizou para o plantio de seringueiras) e as Indústrias Matarazzo,
conglomerado empresarial paulista que se instalou plantando dendê.
(ODEBRECHT, 2004).

Mediante convênios com os governos municipais e estaduais, a empresa


foi se estabelecendo e intensificando a exploração da região, associando, de
forma auto elogiosa, sua chegada ao desenvolvimento. Em verdade, porém,
inescrupulosamente, posseiros foram expropriados na região para que suas
terras dessem lugar à exploração econômica empreendida. Nos escritos
elaborados por Odebrecht (2004), percebe-se que, rapidamente, ele foi se
constituindo como latifundiário, já que se vangloria por ter conduzido outras
empresas à região, como a Firestone, a quem vendeu terras, bem como a
“doação” de terras feita ao governo para construção de um núcleo colonial
japonês no município de Ituberá/BA. Os estudos de Silva (2013) apontam uma
grande investida de Odebrecht para a expropriação de terras de pequenos
posseiros. Com análise documental de processos que envolviam fazendeiros e
posseiros e desde relatos orais, o estudioso identificou o processo de grilagem
de terras que, depois, eram vendidas para outras empresas:

[Norberto Odebrecht] ganhou o título de terras devolutas entre


Igrapiúna e o km 29 da BA-250, uma grande extensão de terra
que cobre mais de 100 km². Odebrecht comprou-as de muitos
dos posseiros que viviam nas terras, embora eles não tivessem
o título legal de suas terras e as pessoas afirmarem que
aqueles que não quiseram vendê-las eram forçados a sair por
jagunços (bandidos contratados). Uma vez que seus títulos de

10
A Firestone, fabricante internacional de pneus, comprou “enorme área” (sic) de terra da
Odebrecht, por volta da década de 1950, onde implantou a monocultura da seringueira para
extração de látex (ODEBRECHT, 2004, p. 76). Atualmente, a fazenda pertence à Michelin.
Trabalhar na Firestone foi o destino de muitos homens e suas famílias da região depois de
terem suas terras expropriadas. No mesmo ano, com a criação da Sociedade Anônima Ituberá
Comércio e Indústria, foi instalada a Esso Standart do Brasil, que montou um terminal para o
abastecimento de gasolina no sul do Estado. Plantações de dendê e mamona foram
intensificadas no parque industrial da firma Indústrias Reunidas Matarazzo. Assim, a cidade de
Ituberá/BA ressurgiu no cenário, reencantando uma nova marcha de progresso. A companhia
Firestone fez também grandes plantações de maniçoba, no distrito de Igrapiúna/BA, para
extração de borracha
57

terras foram garantidos, Odebrecht fundou a SAICI (Sociedade


Anônima Industrial e Comercial de Ituberá), uma empresa
pública criada para explorar e processar as madeiras da região.
(FLESHER, 2006, p. 129-130 apud SILVA, 2013).

A ideia de progresso e desenvolvimento trazida pela empresa foi


desastrosa tanto do ponto de vista ambiental como para as populações nativas.
Outro dado importante foi o apoio do Estado para a consolidação desse
latifúndio na região. A Companhia de Melhoramentos Rurais e Urbanos
(COMEBA)11, empresa liderada pelo empresário Norberto Odebrecht, o Diretor-
Presidente, aparece em vários relatos como uma ameaça aos trabalhadores
que não tinham o título de suas terras. Norberto Odebrecht estava,
constantemente, envolvido em conflitos de terras com posseiros.

Sobre a atuação da Odebrecht na região, Silva (2013) destaca,

[...] a COMEBA, que se dedicava a empreendimentos


imobiliários e detinha a propriedade de inúmeras fazendas na
região; entre elas, as propriedades denominadas Antuerpia,
Namur, Pau Só e Contendas. Conquanto tenham, atualmente,
tais denominações, as propriedades „Antuerpia, Namur, Pau
Só‟ constituem-se de terras tradicionalmente conhecidas por
„Legua‟, „Sapucaia‟, „Sequeiro‟, „Coitinho‟, „Braço do Sul‟,
„Pancada do Veado‟, „Retiro‟, „Trepe e Desce‟ e „Retiro Velho‟”.
Essas terras eram ocupadas por posseiros, em sua maioria
negros, que tiveram as suas benfeitorias “avaliadas e
indenizadas” pela COMEBA, perfazendo um total de mais de
100 famílias de pequenos posseiros que, provavelmente, foram
obrigados a abandonar as terras que ocupavam, conforme
consta no já citado processo de “Reintegração de Posse”,
movido por Eugenio Ventura dos Santos contra a aludida
empresa e o empresário.

A própria autora do livro organizado por Odebrecht, Flexor (2004), em


artigo introdutório sobre a história do Baixo Sul, aduz à intensificação do
desmatamento da região como consequência da instalação de serrarias na
década de 1940, período que coincide com a chegada da empresa. A
exploração de madeira realizada por Norberto Odebrecht foi de forma tão
marcante que se tornou impossível escondê-la.

11
Entre os processos arquivados no Fórum municipal de Ituberá/BA, chamou a atenção o
processo de “Reintegração de Posse”,126, aberto no ano de 1962, movido por Eugenio
Ventura contra a COMEBA, que tinha como Diretor-Presidente, justamente, o empresário
Norberto Odebrecht. Carlos Vergne dos Humildes é citado como advogado de defesa da dita
“Companhia”, conforme consta nesta Certidão de Procuração, de 1959.
58

Vale destacar, ainda, a forma como o Estado atuou em favor da


consolidação dessa empresa, tornando seu patrimônio tão gigantesco.
Pesquisas de Silva (2013) denunciam os agentes públicos que atuavam nos
cartórios e nas delegacias de terras como coniventes com a violência nas
ações dos fazendeiros contra posseiros; tais agentes públicos eram os
delegados de terras12.

Outra questão que merece destaque é que, nos momentos de declínio


da empresa, o braço do governo se estendeu para que esta se reerguesse,
desenvolvendo obras em todo o Nordeste. Desse modo, aconteceu o avanço
da construtora para toda a região. Nos anos 1950, o governo Federal deu
prioridade à Odebrecht para o “desenvolvimento” do Nordeste, com a
concessão de incentivos fiscais e outros benefícios à empresa que se instasse
na região, assim como a criação de um órgão federal específico para o fomento
regional: a SUDENE – Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste.

A partir daí, com financiamento do Estado, intensificando a seu processo


de exploração, a empresa avança Brasil adentro e depois conquista esferas
internacionais13. Desse modo, a perpetualidade14 tem sido patrocinada pelo
Estado, pois, a cada momento de declínio, novas oportunidades de negócios
apareciam para reerguer esse patrimônio. Vale ressaltar que a Odebrecht está
no topo do desenvolvimento de projetos mais polêmicos na América Latina.
Porém, o discurso da responsabilidade social vem mascarando a
responsabilidade da empresa na degradação ambiental e direitos sociais.

12
Sobre os delegados de terras ver Silva (2013) e Garcez (2001).
13
Nos anos 1970, com a queda dos investimentos da SUDENE, a Odebrecht foi para o
Sudeste, onde ampliou seus negócios, investindo na área química. Ingresso da Petrobrás na
área de perfuração de petróleo e contratos de longo prazo. Em 1979, a empresa foi fortalecida
com a aquisição da CBPO e da Tenenge (Técnica Nacional de Engenharia S.A.), duas das
maiores construtoras brasileiras. Em 1986, ocorreu um novo fortalecimento da área de
engenharia: a Odebrecht comprou a Tenenge (ODEBRECHT, 2004). No setor hidrelétrico, nos
anos 1950, foi responsável pelos programas de construção de usinas hidrelétricas: UHE
Xavantes, UHE Capivara; anos 70: UHE Itaipu. Construiu a UHE Aracy II e conquistou a
confiança do governo Paraguaio. Fortalecida com a aquisição da CBPO e da Tenenge, duas
das maiores construtoras brasileiras, a Odebrecht expande sua presença internacional e
intensifica os investimentos no setor petroquímico.
(Disponível em: < http://www.odebrechtonline.com.br/materias/00201-00300/254/>. Acesso: 20
ago. 2015).
14
Nos escritos elaborados por Norberto Odebrecht e difundidos por meio da Tecnologia
Empresarial Odebrecht (TEO), o lema da empresa é “Ser, crescer e perpetuar”.
59

A criação da Fundação Odebrecht, em 1965, está ligada, principalmente,


a novas oportunidades de negócios, como isenção fiscal e captação de
recursos públicos. Nesse contexto, em 2003, surge o PDCIS (Programa de
Desenvolvimento e Crescimento Integrado e Sustentável) enquanto ação de
“governança participativa”, envolvendo toda a região do Baixo Sul da Bahia
num domínio da empresa enviesado pela produção, o beneficiamento e a
comercialização de produtos agrícolas, atividades pesqueiras e artesanais e,
junto a isso, um projeto educacional como parte integrante do programa. A
Fundação Odebrecht e os programas por ela geridos soam, pois, uma
estratégia da empresa de convencer a totalidade da sociedade quanto à
legitimidade de seus interesses específicos.

3.3 O Programa de Desenvolvimento Sustentável e Crescimento Integrado


com Sustentabilidade (PDCIS) e seus aparelhos privados de hegemonia

O Programa de Desenvolvimento Sustentável e Crescimento Integrado


com Sustentabilidade do mosaico de Áreas de Proteção Ambiental do Baixo
Sul da Bahia PDCIS é fomentado pela Fundação Odebrecht e, de acordo com
o documento de divulgação do próprio programa, cede Tecnologia Empresarial
Odebrecht e apoio financeiro.

De acordo com os dados fornecidos pelo site da Fundação desde 2003,


a Odebrecht coordena o PDCIS, que, a seu turno, concentra sua atuação em
11 municípios do Baixo Sul. O PDCIS tem o desafio de tornar essa região com
baixo índice de Desenvolvimento Humano em uma região próspera, de forma
socioeconômica e ambientalmente sustentável, fixando os jovens na zona rural,
integrados a suas famílias. A iniciativa constrói seus resultados por meio da
Governança Participativa, ou seja, envolvendo a comunidade, o Poder Público
(esferas federal, estadual e municipal), iniciativa privada e sociedade civil
(ODEBRECHT, 2015).

Para implementação desse programa, a Fundação Odebrecht


fundamenta suas estratégias na criação de uma rede de aparelhos privados,
que atua no plano educacional, produtivo, social e ambiental. Esses, além de
60

servirem como construtores ideológicos de um consenso da classe


trabalhadora camponesa em torno de seu projeto, servem, também, como
captadores de recursos públicos que disputam, no território, editais e
finaciamentos através do BNDES e do Fundo da Infância e Adolescência (FIA),
captando, ainda, recursos de entidades internacionais como será analisado
adiante.

Como estratégia de dominação das atividades produtivas no campo,


para cada capital, foi fundada uma instituição que trabalha com essas metas a
serem alcançadas. Em se tratando daquilo que a fundação chama de geração
do capital produtivo, há uma rede de cooperativas, Cooperativa de Produtores
Rurais de Presidente Tancredo Neves (COOPATAN), Cooperativa de Águas
Continentais (COOPECON ), Cooperativa dos Produtores de Palmito do Baixo
Sul da Bahia (COOPALM) e Cooperativa das Produtoras e Produtores Rurais
da Apa do Pratigi (COOPRAP) que trabalham com a produção, beneficiamento
e comercialização de produtos; a maioria das associações dos agricultores
pertence à Associação Guardiã da APA do Pratigi (CIAPRA) e os projetos da
fundação são desenvolvidos para essas comunidades associadas. Além disso,
o Instituto de Desenvolvimento do Baixo Sul (IDES) trabalha com o
agroecoturismo.

Existe, ademais, a geração do capital Social, voltado à cidania e


“construção de uma sociedade mais justa e igualitária”, com o Institututo Direito
e Cidadania (IDC) e o capital ambiental, com a “conservação ambiental
garantindo às futuras gerações o acesso sustentável aos recursos naturais”,
desde a Organização Conservação de Terras (OCT). (ODEBRECHT, 2004).

Para produção do “capital humano”, há uma rede de escolas que


ofertam cursos de educação através da formação profissional-técnica no
campo com o apoio da Casa Jovem e das Casas Familiares Rurais. O Colégio
Estadual Casa Jovem II funciona na Fazenda Vale do Juliana, que pertence à
Odebrecht, no município de Igrapiúna/BA, ofertando, em parceria, Educação
Profissional em Agroecologia.

Particularmente sobre a Casa Familiar Rural de Igrapiúna/BA, esta


surgiu da parceria entre as Plantações Michelin da Bahia Ltda. e da Fundação
Odebrecht, que oferta curso técnico profissionalizante em Agronegócio. Já a
61

Casa Familiar Agroflorestal, em Nilo Peçanha/BA, funciona junto à COOPRAP


e oferta curso de Educação Profissional Técnica em Florestas integrado ao
Ensino Médio. Há, também, a Casa Familiar das Águas, em Ituberá/BA, ligada
à cadeia produtiva da piscicultura; e a Casa Familiar Rural, em Presidente
Tancredo Neves, que se destina à cadeia produtiva da mandioca.

Esse projeto educacional, a ser analisado no próximo capítulo, tem como


público-alvo a juventude, entendida pelo programa como fomento para
transformar e disseminar de ideias em suas comunidades. Apesar de a rede de
escolas ser no campo, há uma estratégia de construção do consenso em toda
sociedade e, por isso, o programa desenvolve ações chamadas de
suplementares em espaços como conselhos e rede pública da região.
Formação dos Conselheiros para o fortalecimento dos Conselhos Municipais
de Direitos da Criança e do Adolescente (CMDCA) e Círculos de Leitura.

Também existe a parceria da Fundação Odebrecht com o Instituto


Fernand Braudel, em São Paulo, criado em 2008, com o projeto de inclusão
digital Caia na Rede; essa ação é uma parceria da Microsoft, Fundação
Odebrecht, OI e Dell. Há um Acordo de Cooperação, Hospedar a Cultura e a
Cidadania na Escola – pelo IDES –, que desenvolve projetos sob o tema
juventude, turismo e cidadania, em parceria com a empresa Evolution Gestão
de Serviços, no Projeto Eu adoro Ser Criança. O objetivo é apoiar a escola
pública do Ensino Fundamental I, por meio da arte e da ludicidade, e Pratigi
pela Educação; é uma parceria da Fundação Odebrecht com o Instituto
Chapada e consiste na formação de professores, coordenadores e gestores do
Ensino Fundamental I, tendo como parceiros institucionais Odebrecht, Natura,
Itaú, Banco do Brasil e parceiro técnico, o Tributo ao Futuro.

Constata-se que o O PDCIS se expande fundamentado nas orientações


dos organismos internacionais que, com a polítca de Terceira Via, estabelece
os fundamentos de uma sociedade sem conflitos, em que, dentro dos moldes
do sistema capitalista, cada grupo social exerça seu papel. Nesse modelo
harmônico de governança, não há espaço para conflitos sociais porque cada
um assume seu papel para promever o desenvolvimento, como afirma o
documento elaborado em parceria com a Fundação,
62

O Programa de Desenvolvimento e Crescimento Integrado com


Sustentabilidade (PDCIS), coordenado pela Fundação
Odebrecht, é fruto da Governança Participativa, ou seja, da
atuação conjunta entre Poder Público (Governo Federal,
Estadual e Municipal), iniciativa privada e sociedade civil. Essa
união se formaliza em prol de um objetivo comum, superior e
nobre: contribuir para a formação de uma população
estruturada em unidades-família, responsável pelo próprio
desenvolvimento sustentável.

Para a Governança Participativa realizar-se plenamente, cabe:


• ao Governo, atuar na consolidação de políticas públicas e na
garantia dos direitos fundamentais. Além de viabilizar parcerias
que assegurem a aplicação dos recursos públicos em ações
que atendam as necessidades e prioridades da comunidade.
• às empresas privadas, a prática da responsabilidade social,
realizando investimento social privado e transferindo
tecnologia.
• às organizações da sociedade civil, fazer acontecer as ações
com eficácia e eficiência, contribuindo para o processo de
desenvolvimento e crescimento integrado com sustentabilidade
da região onde atuam.
O foco dessa parceria, na região do Baixo Sul da Bahia, é o
jovem e sua família, que representam a força produtiva e
propulsora do desenvolvimento local. Esse propósito está
transcrito na missão da Fundação Odebrecht: “Educar para a
vida, pelo trabalho, para valores e superação de Limites” e
reforça o elemento que pulsa na raiz de todas as suas ações, o
espírito de servir. (FISCHER, 2007).

Encontra-se identificado neste projeto da Fundação Odebrecht o que


Martns (2007) chama de “individualismo como valor moral radical”. Estratégia
para a repolitização da política e destinada à nova coesão social. Para o autor,
essa “nova consciência sobre o novo individualismo” visa o reforço à
concepção unitária de mundo. Logo, esse envolvimento de todos para a
superação da pobreza no Baixo Sul significa,

[...] envolvimento progressivo do cidadão atomizado em


processos políticos mais simples, traduzidos em “novas
responsabilidades” com o meio ambiente, com sua família e
sua comunidade. Isso seria feito através do convencimento dos
cidadãos de que, independente de sua condição de classe e
situação econômica, a participação na vida social e política no
mundo de hoje é importante para a auto realização e para a
solução dos problemas sociais vividos por grupos comunitários.
Com efeito, estimula-se o desenvolvimento do “capital social”
pelo engajamento em grupos de auto-ajuda, clubes de
serviços, fundações e/ou frentes de voluntariado, visando o
63

incentivo à participação democrática minimalista no horizonte


histórico do próprio capitalismo. (MARTINS, 2007, p. 92)

Outra perspectiva apontada pelo mesmo Martins (2007) se refere à


adaptação dos sujeitos políticos coletivos à chamada “sociedade civil ativa”.
Em outras palavras, o objetivo é realizar um novo pacto social ou contrato
social por meio da concertação. Trata-se de uma ação para o amplo
envolvimento dos sujeitos políticos coletivos numa nova dinâmica de relações
de poder sob a hegemonia burguesa renovada; o estímulo à colaboração entre
capital e trabalho e de envolvimento de parcerias das organizações da
sociedade civil com a aparelhagem estatal.

Nesse caso, a empresa, enquanto sociedade civil que capta recursos e


coordena projetos dentro desse espaço de governança, e as populações teriam
que se esforçar fazendo “sua parte” para que os resultados fossem favoráveis,
substituindo os antagonismos e conflitos de classe pelo reconhecimento da
existência de simples diferenças entre os “atores sociais”. A meta consiste na
promoção do desenvolvimento econômico e social pelo envolvimento ativo e
cívico dos parceiros (empresariado, trabalhadores, organizações da sociedade
civil e aparelhagem estatal).

No terceiro plano, a estratégia de repolitização da política


dirigida também à chamada „sociedade civil ativa' corresponde
à criação de organizações de novo tipo para atuação no âmbito
comunitário. Neste plano, as organizações agiriam diretamente
nos espaços locais, segundo parâmetros comuns a todos e
definidos pela aparelhagem estatal, ou atuariam, de forma mais
abrangente, como centros de referência e articulação política
das demais, e, ainda, na orientação e mobilização de frentes
de voluntariado. (MARTINS, 2007, p. 102)

Em outros termos, trata-se da criação de uma ampla rede de aparelhos


privados de hegemonia, cuja responsabilidade seria difundir, de diferentes
modos, a concepção de mundo, os valores, as formas de pensar e de agir
compatíveis com a nova sociabilidade burguesa.

Outro aspecto a se destacar é a questão familiar. Há, em todos os


documentos, a preocupção em que esse jovem se integre com a família. Sobre
o papel atribuído à família, aliás, Martins (2007) aborda esse empenho,
afirmando que uma das formas de realização do chamado “conservadorismo
64

moral” seriam as políticas públicas destinadas à educação familiar. A família é


uma instituição básica da sociedade civil que precisa ser regulada e adaptada
pelo aparelho de Estado ao modo de vida contemporâneo.

Isso porque a instituição familiar seria responsável por conter


preventivamente a violência, criar laços de cooperação entre os
indivíduos, auxiliar na educação para o empreendedorismo e,
acima de tudo, assegurar em última instância a „proteção
social‟ de seus membros. As famílias introduziriam o senso de
pertencimento ao espaço comunitário em seus membros,
incutindo neles o germe contido na noção de capital social.
(MARTINS, 2007)

Como veremos adiante o jovem tem um papel de convencimento das


famílias a aderirem ao projeto de sociedade defendido pela empresa.

Esse mapeamento dá uma dimensão da interferência da Odebrecht na


região e como esta estende seus tentáculos, atuando em todas as esferas da
vida da população. Além disso, também ilustra como grupos empresariais
agem no setor produtivo, neste caso específico, no campo, formando mão-de-
obra segundo as suas necessidades, para produzirem para as cooperativas;
dessa forma, prepara, também, um exército de defensores de seu projeto, no
caso da juventude, que tem a tarefa de se tornar “empresários rurais”,
replicando esse modelo nas suas unidades familiares.

Martins (2007), que estudou as estratégias do capital no governo Lula, no


período 2003–2006, assegura que o então governo, simplesmente, ratificou
todos interesses da burguesia no país, inclusive quanto à consolidação do
padrão de sociabilidade do capital. O caminho seria trilhado pela definição de
um “novo projeto nacional” que tivesse “o social como eixo de
desenvolvimento”.

Com efeito, neste período de governo, a nova pedagogia da


hegemonia foi mantida em pleno funcionamento para reforçar
três objetivos pedagógicos estabelecidos na conjuntura
anterior, quais sejam: (a) consolidação da cidadania ativa
circunscrita à noção de voluntariado; (b) redirecionamento do
papel das organizações da sociedade civil para formar uma
ampla rede de difusão da nova sociabilidade; (c) fortalecimento
das organizações que atuam na execução das políticas sociais
em parceria com a aparelhagem estatal. Assim, sem alterar os
propósitos anteriormente firmados, a classe burguesa
65

conseguiu dar passos importantes para consolidar no Brasil um


novo padrão de sociabilidade, ampliando a adesão de
praticamente toda a sociedade ao seu projeto. (MARTINS,
2007 p. 240)

Ao longo de suas assertivas, mencionado autor identifica que, durante


esses anos, os principais aparelhos formuladores da ideologia da
responsabilidade social empresarial intensificaram suas ações para ampliar a
unidade burguesa e aprofundar o processo de sedimentação da nova
sociabilidade do capital. O aperfeiçoamento institucional e a ampliação e
qualificação das ações foram as grandes marcas da intervenção dos
organismos formuladores, que, à época, passaram a atuar de maneira mais
próxima e intensa.

Nos projetos coordenados pela Fundação Odebrecht no PDCIS, é


possível reconhecer a marca da responsabilidade social perpassando como
projeto de governo, junto ao empresariado, que, com seus institutos e escolas,
expandem aparelhos formuladores da ideologia da responsabilidade social.

4 A CASA FAMILIAR RURAL DE IGRAPIÚNA E O COLÉGIO ESTADUAL


CASA JOVEM II – ORIENTAÇÕES DA TECNOLOGIA EMPRESARIAL
ODEBRECHT PARA A EDUCAÇÃO

O estudo sobre as formas de exploração da Odebrecht na região do


Baixo Sul remete à leitura de um liame em torno do qual, em um dado
momento histórico (compreendido entre o final dos anos 1990 e início de 2000),
esta empresa incorpora o discurso da responsabilidade social como forma de
melhorar sua imagem e captar recursos públicos para angariar espaços de
difusão de sua ideologia.
66

A criação do PDCIS, enquanto programa territorial, é um aparelho


difusor das estratégias de educação para o consenso atuante no setor
produtivo e cultural. A educação escolar concebida pelo empresariado como
fator de desenvolvimento é, assim, posta, neste Programa, como causa e
consequência da pobreza, mascarando as reais razões dessa tragédia social
que está na desigualdade.

Em praticamente todos os locais em que a Odebrecht S.A. tem se


inserido, a Fundação Odebrecht desenvolve projetos de educação que
influenciam na rede pública, inferindo, também, com ações na educação
ambiental. Tal prerrogativa pode ser constatada nos boletins bimestrais
(“Odebrecht Informa”), disponíveis na Internet, sempre atualizados com
matérias sobre os projetos educacionais da empresa. Considerando a extensão
de atividades, no entanto, é, no Baixo Sul da Bahia, que se encontra a grande
investida da Fundação.

O presente capítulo, portanto, é resultado da análise comparativa de


dois projetos educacionais desenvolvidos no município de Igrapiúna/BA. O
projeto da Casa Familiar Rural de Igrapiúna (CFAR – I), escola particular
comunitária, conduzida pela Organização da Sociedade Civil de Interesse
Público da Fundação Odebrecht, e o Colégio Estadual Casa Jovem II, ambas
como parte integrante do projeto estratégico de parceria público-privada
instituído na região do Baixo Sul da Bahia, denominado PDCIS.

O recorte temporal deste objeto de estudo vai do período de 2003


(momento em que a Fundação Odebrecht decide centrar sua atuação na
educação da região) até 2013, ano em que o projeto do Colégio Estadual Casa
Jovem II, em parceria direta com a empresa Odebrecht, instituindo,
formalmente, um modelo de parceria público-privada na educação.

A análise objetiva identificar a concepção de educação da Fundação


Odebrecht enquanto modelo empresarial gestada para a população
camponesa, mostrando como seus interesses estão explícitos, tanto na escola
particular, a CFAR- I, gestada, financiada, organizada e conduzida por grupos
empresariais, como na escola pública estadual da qual esses grupos
empresariais são parceiros, no caso do Colégio Estadual Casa Jovem II,
construído em território da empresa Odebrecht, a Fazenda Reunidas Vale do
67

Juliana, já descrita anteriormente, e acompanhada pela OSCIP Casa Jovem,


que pertence Fundação Odebrecht.

Os estudos apontam que há um processo de privatização da educação


em curso, seguindo um movimento nacional, que começa a ser organizado nos
governos neoliberais e ganha força, no Brasil, com os governos populares,
iniciados em 2003, momento coincidente com o início da construção do referido
projeto educacional.

4.1 Descrição do local e contexto educacional onde se localizam as duas


escolas

O atual município de Igrapiúna/BA, outrora distrito de Camamu, foi


elevado à categoria de município em 1989. Situado no Baixo Sul da Bahia, a
uma distância de 330 km de Salvador, a capital do Estado, possui como
população atual 13.268 habitantes. Dentre essa população é importante
destacar que sua maioria é rural (67,9 %) e negra (84,6%).

Segundo dados disponibilizados pela Secretaria Municipal de Educação


de Igrapiúna, em 2012, o município contava com um total de 57 instituições
escolares; dessas, 50 estavam localizadas no campo; 53 ofertam o Ensino
Fundamenta I; e 04 ofertam o Ensino Fundamental II. As escolas do campo
estão distribuídas do seguinte modo: 01 na Comunidade Quilombola da
Laranjeira; 11 na zona marítima, em ilhas (Timbuca, Contrato, Pescaria,
Tubarões, Pedra Furada, Âmbar, Ponto e Anco); 02 em assentamentos do
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST); e as demais nas
diversas comunidades rurais e também em fazendas do município. Do total dos
4.016 educandos matriculados no município, 1.891 estavam na sede do
município e 2.125 no campo. Diante disso, identifica-se uma necessidade de
manutenção de escolas no campo para garantir o acesso dessa demanda. Já
quanto à oferta do Ensino Médio, o município dispõe de 03 instituições
escolares como demonstrado no quadro seguinte.

Quadro 1 – Escolas de Ensino Médio do município de Igrapiúna


68

Escolas de Ensino Médio do município de Igrapiúna

Instituição Município Localidade Entidades


Mantenedoras

Casa Familiar
Plantações
Rural de Fundação Odebrecht /
Igrapiúna/BA Empresa
Igrapiúna (CFR Mitsubishi
Michelin
– I)

Fazenda
Colégio Estadual Reunidas
Igrapiúna/BA Governo do Estado
Casa Jovem II
Vale do Juliana

Colégio Estadual
Sede do
Neilton Moreira Igrapiúna/BA Governo do Estado
município
Lima
Fonte: RIOS, 2014

A disposição das escolas e sua articulação revelam que, sobre o Ensino


Médio, as opções de oferta de educação para as populações camponesas
estão na sede do município e nos territórios dos grupos empresariais,
inviabilizando a construção de um projeto educacional que contemple,
efetivamente, as necessidades das populações camponesas; ou seja: os
fundamentos da educação para o campo, no município, são de base e
orientação empresarial como se verá logo mais à frente.

4.2 A Casa Familiar Rural de Igrapiúna (CFR – I)

A Casa Familiar Rural de Igrapiúna (CFR – I), localizada na BA 001,


Rodovia Ituberá – Camamu, Km 10, município de Igrapiúna/BA, é uma
Organização da Sociedade Civil de Interesse Público – OSCIP. Fundada em 26
de julho de 2007, faz parte do projeto educacional da Fundação Odebrecht, em
parceria com Plantações Michelin da Bahia Ltda. É particular, comunitária, sem
fins lucrativos e sobrevive de doações físicas e jurídicas.

A instituição oferta curso de Agronegócio na modalidade “Educação do


Campo”, faz parte do PDCIS e está diretamente ligada à Cooperativa de
Produtores do Palmito do Baixo Sul da Bahia (COOPALM). Atende, em média,
69

106 alunos, sendo 32 por turma. O curso tem duração de 03 anos, organizado
em 45 alternâncias, isto é, 15 por ano. A certificação dá-se por meio da
Secretaria Estadual de Educação.

A CFR – I é composta por salas de aula, espaços administrativos e sala


de professores, além de refeitório, laboratório de informática, biblioteca e
quadra poliesportiva. Também agrega uma Biblioteca15, com acervo específico
e atualizado. Dispõe de uma área total de 10 hectares para a realização de
aulas práticas e experimentos, cultivando, especialmente, seringueira, cacau e
pupunha. Quanto aos recursos didáticos, a CFRI conta com computadores com
acesso à Internet, telefone, carteiras de sala de aula, mesas de escritório,
mesa de reunião, aparelho de GPS, câmara fotográfica, datashow, geladeira,
freezers, fogão industrial. Além desses recursos, a escola possui várias
ferramentas, máquinas e implementos agrícolas para realização das aulas
práticas, dentre eles, enxada, facão, ancinho, regadores, facas de sangria,
material para enxertia de cacaueiros, tesouras de desbrotas, roçadeira,
microtrator, entre outros. Possui, ainda, um carro, comprado com recursos do
BNDES, que serve para as atividades de rotina da escola e para a condução
de profesores/monitores, na ida e volta à escola, e para visitação às famílias
dos alunos.
A descrição detalhada da estrutura e dos recursos da instituição se faz
necessária porque, se comparada às demais escolas do campo na região,
conclui-se que recebe um forte investimento. Boa parte desses equipamentos
formam adquiridos com recursos públicos. Analisando as fotos abaixo
percebe-se o quanto o ambiente escolar é atrativo para educandos do campo
que tem um histórico de estudar em escolas públicas em péssimas condições
de funcionamento.

Figura 1 – Vista panorâmica da Casa Familiar

15
O centro possui uma unidade da Indústria do Conhecimento - iniciativa do Serviço Social da
Indústria (SESI) que viabiliza a instalação de centros multimídia em municípios de baixa renda.
Em 2011, a CFR – I foi finalista do Prêmio Banco do Brasil de Tecnologia Social, recebendo um
vídeo institucional, certificado, troféu e folders.
70

Fonte: RIOS, 2015

Figura 2 – Vista panorâmica da Casa Familiar

Fonte: RIOS, 2015

Figura 3 – Quadra de esportes


71

Fonte: RIOS, 2015

Figura 4 – Veículo da Casa Familiar

Fonte: RIOS, 2015

4.2.1 Ingresso/ Público atendido

Para o ingresso dos educandos, geralmente, são divulgadas as vagas


em escolas públicas do campo; espaços públicos como secretarias de
educação e equipes das escolas vão às comunidades rurais falar da proposta
da escola e convidar os estudantes a participarem do projeto. O processo
seletivo leva em consideração a idade e a origem, se é ou não filho de
agricultor; em sendo, que este possua uma propriedade rural e tenha concluído
o Ensino Fundamental. A escola recebe educandos de toda a região, porém
apresenta restrições: 1) com relação à idade: mínima de 16 e máxima de 21; 2)
tem que ser filho de pequenos agricultores que possuam terra; a esse respeito,
72

a justificativa é que, para receber financiamento do Fundo da Infância e


Adolescência (FIA), os educandos devem pertencer a essa faixa etária e, além
disso, precisam ter uma propriedade para desenvolver o tempo em
comunidade. No fundo, significa uma forma de exclusão, já que aquele que não
tem terra não pode se matricular na CFR – I. Tal restrição, porém, também
aponta que a escola tem uma função estratégica, que é formar para conseguir
a adesão dos agricultores da região ao projeto cooperativo.

4.2.2 Concepção de educação e formação

Partindo da concepção de educação como possibilidade de


emancipação de todos os sentidos humanos, as análises de Frigotto (1999)
apontam a educação como um conjunto das relações sociais que se
apresentam no campo, uma disputa hegemônica cuja articulação das
concepções, dos conteúdos educativos e, mais amplamente, em todas as
esferas da vida, dos interesses de classe. Isso porque, intencionalmente, o
projeto educacional burguês que se utiliza de uma ciência, que separa os
objetos de conhecimento das mediações e conexões que os constituem, é uma
“ciência” que pode revelar as disfunções da realidade, mas não consegue
explicar o que as produz. (FRIGOTTO, 2012).

É nesse contexto de educação burguesa que nasce o projeto


educacional orientado pelos intelectuais da burguesia, concebendo uma
educação voltada para a classe trabalhadora apenas como veículo de
preparação para as necessidades do capitalismo em cada fase e espaço.

Na estratégia da Fundação, o seu projeto educacional desenvolvido na


CFR – I tem como missão “[...] a formação de adolescentes agentes de
desenvolvimento, educando-os para a vida, pelo trabalho e para valores, se
consolidando como um centro de geração e difusão de conhecimentos
aplicados a Agricultura Familiar”. (PROJETO CAIA NA REDE, 2011, p. 03).

Essa missão tem seus fundamentos na teoria do capital humano, que


credita à educação a responsabilidade pelo desenvolvimento, que, por sua vez,
fundamentado na Tecnologia Empresarial Odebrecht (TEO), sugere: “[...]
73

educando-os para a vida, pelo trabalho e para valores” responsabilizando os


jovens a superarem seus limites e com disciplina e trabalho promover o
desenvolvimento de suas comunidades. Um desafio imposto aos jovens é
conseguir mobilizar suas famílias e as demais a aderirem ao programa do
PDCIS, como está colocado no depoimento de um dos jovens sobre os
seminários realizados por eles na comunidade:

O Seminário Rural é a porta de entrada da informação. Após


apresentá-lo, conquistei o primeiro cooperado da COOPALM
em minha Comunidade, me orgulho muito disso” (Gilmar
Conceição. Comunidade de Andaiar, Igrapiúna/BA).
(ODEBRECHT, 2013)
No meu caso, fui convidado a filiar-me na Associação de
Agricultores na minha comunidade (Jairan Santos. Campo do
Meio, Igrapiúna/BA). (ODEBRECHT, 2013).

Esses depoimentos sistematizados no processo de avaliação das casas


familiares da região demostram que são tarefas dos jovens conquistar famílias
para as cooperativas e se filiarem à Associação Guardiã da APA do Pratigi
(AGIR)16.

Dessa forma, a educação praticada nessa instituição não busca a


formação integral do sujeito, mas uma tarefa específica de enquadrar o jovem
em um modelo já estabelecido pelo capital e torná-lo defensor desse modelo
(formar jovens empresários rurais, defensores do agronegócio). No tocante ao
perfil de formação aspirado, o projeto da referida escola não deixa dúvidas de
que é o empresário rural.

Deseja-se que, mediante o cumprimento dessa missão, a CFR-


I se torne, até 2015, referência nacional na formação de
adolescentes empresários rurais com a geração de
conhecimento aplicado ao campo aptos a atuarem no mundo
do trabalho. (PROJETO CAIA NA REDE, 2010, p. 04)
Em todo o projeto educacional do PDCIS e, especificamente, neste da
escola, a educação deve ser prática:

A educação de adolescentes privilegiando mais a prática que a


teoria, tendo como resultado maior a formação técnica e

16
A Associação Guardiã da APA do Pratigi (AGIR) é uma associação civil formada por 40
associações comunitárias, que atua no sentido de organização e mobilização das comunidades
da APA do Pratigi.
74

humana, a inclusão social dos beneficiários e o exercício da


multiplicação para o desenvolvimento de suas comunidades.
(PROJETO CAIA NA REDE, 2010, p. 03)

Como se pode observar, o conhecimento científico não é tão necessário


quanto o desenvolvimento de uma prática que seja propulsora do
desenvolvimento. Essa postura está ligada ao recebimento de influência de
novos conhecimentos e ao conhecimento de novas tecnologias transferidas,
essenciais para que o agricultor se insira no projeto do agronegócio e domine o
manejo de novas culturas introduzidas na região, no caso, o palmito.
A forma como se organizam as alternâncias, uma semana – no tempo
escola, onde também há aulas práticas na unidade de experimentação – e
duas semanas, comprova que a prática tem um peso maior do que o estudo,
pois, a cada semana de estudos no tempo escola, são dispensadas duas para
atividades práticas em suas comunidades.
Sobre a concepção de alternância da escola. Considera-se regime de
alternância:
Art. 12. A Casa Familiar Rural de Igrapiúna para atender as
necessidades dos educandos nela matriculados, está
organizada em turno integral, funcionando em regime de
alternância.
Primeiro Parágrafo. Considera-se regime de alternância na
Educação do Campo a metodologia de ensino em que o
educando desenvolvem seus estudos na propriedade rural,
com sua família durante duas semanas, consecutivas, e na
Casa Familiar Rural de Igrapiúna, uma semana, e assim
sucessivamente.
Parágrafo Terceiro. Num regime de alternância, a teoria é
colocada a serviço da prática, de forma interdisciplinar, num
processo de ação-reflexão-ação. (REGIMENTO INTERNO
CFR I, 2009, p. 08).

A valorização dos saberes da terra, enfatizada no projeto, deixa uma


clara intencionalidade de que é responsabilidade desse jovem desenvolver sua
comunidade. Ser um jovem responsável pelo seu próprio destino e a condição
para tornar-se um empresário rural é fazer parte do PDCIS. Em nenhum
momento, é passada a ideia de prosseguimento nos estudo. Seria uma forma
de educar para o trabalho simples, o trabalho apenas manual, sem
imprescindibilidade de avançar nos estudos; seria uma espécie de fixação dos
jovens no campo, porém atrelados ao modelo de desenvolvimento excludente
proposto pela Odebrecht ao campo do Baixo Sul. O termo protagonismo
75

juvenil, a ser desvelado adiante, faz parte do discurso e de todos os projetos da


Fundação.

A capacitação dos adolescentes, seu envolvimento nos projetos


educativos produtivos e a sustentabilidade requerem um público específico.
Para formar esse agente de desenvolvimento com formação prática, é
necessário ao jovem:

I. Ser filho ou filha de agricultor e residir na zona rural;


II. Ter idade mínima de 16 anos e máximo de 21 anos;
III. Ter espírito associativista e cooperativista;
IV. Ter potencial para desenvolver projetos produtivos; e
V. Ter capacidade de liderar o desenvolvimento de suas
comunidades (REGIMENTO INTERNO, 2009, p. 10)
O projeto da Casa Familiar Rural revela uma pretensão clara de formar
filhos de agricultores familiares; e estes são treinados a convencer suas
famílias a se integrarem ao agronegócio da região. Liderar o desenvolvimento
em suas comunidades é ser um defensor e executor do projeto cooperativo da
fundação. Para trabalhar no processo produtivo do projeto, há essa
inevitabilidade de convencimento do trabalhador rural a se associar, pois o
cooperativismo e o associativismo não fazem parte da cultura de todos os
agricultores da região. A metodologia da alternância busca a interação entre o
conceito e a aplicação prática, obtida a partir da implantação de agronegócios
na sede da CFR – I e, posteriormente, replicada nas propriedades das
unidades-família dos jovens beneficiados.

4.2.3 Concepção de educação e trabalho

Tomando como base a concepção de educação enquanto processo


permanente de construção, de formação humana, compreende-se que a
educação, o trabalho e a produção da vida são compreendidos como
dimensões históricas indissociáveis; logo, a reflexão atual sobre o trabalho
deve apreendê-lo como forma de expressão da produção da vida.

O trabalho é, então, compreendido em sua dimensão sócio histórica,


particularmente no que concerne ao trabalho no capitalismo. Na forma
capitalista como trabalho assalariado (separado do seu executor, pela
76

dominação do capital sobre os meios de produção e sobre o trabalho comprado


ou capital variável), é a negação da essência humana, da criatividade.

A CFR – I que pretende formar empresários rurais não expõe,


claramente, quais as bases materiais para que esses jovens sejam
empresários; apenas declara que, com o estudo de técnicas, eles realizarão
um trabalho de desenvolvimento de suas comunidades: aprender fazendo irá
garantir aos mesmos a progressão em seus próprios negócios. Por outro lado,
a pobreza e o desemprego no campo estão associados à falta de educação,
não necessariamente à concentração da terra e exploração dos recursos
naturais pelas grandes empresas.

A OSCIP Casa Familiar Rural de Igrapiúna/BA apresenta como


premissas:

A proposta pedagógica da Casa Familiar Rural é prover os


adolescentes, futuros empresários rurais, de informações úteis,
aplicadas e inteligentes dentro de um ambiente propício à sua
formação, no âmbito do desenvolvimento humano e técnico.
A base de todo o processo educativo empreendido na CFR-I é
o “aprender a fazer fazendo”, para que, ao final do ciclo de
formação de três anos, eles possam ter seus próprios negócios
solidamente estabelecidos, e para que as propostas de
melhoria de qualidade de vida, com aumento da renda familiar,
sejam efetivas e mensuráveis. (PROJETO CAIA NA REDE,
2010, p. 5 grifo do autor)

Conforme aduzido pela premissa: a educação busca a implementação


de diversos agronegócios nas unidades familiares e, por isso, é necessário o
conhecimento de técnicas.

Para isso, é necessário implementar diversos Agronegócios na


Sede da CFR-I, que representem a base do aprendizado.
Aliados aos agronegócios implantados, são disponibilizados
aos adolescentes as Fichas Pedagógicas de cada agronegócio,
que, a partir do sistema Construtivista de ensino, serão
apresentados os conteúdos teóricos necessários a uma sólida
formação técnica. [...] O aspecto fundamental do processo
pedagógico da CFR-I é o foco na socialização e
disseminação dos conhecimentos adquiridos pelos
adolescentes nas comunidades as quais fazem parte, para
que estes possam atuar como verdadeiros Empresários
Cidadãos. (PROJETO CAIA NA REDE, 2010, p. 5)
77

4.2.4 Concepção de Gestão

A CFR – I atua no sistema de Governança, com a sociedade civil e o


governo municipal, estadual e federal. Ela encontra-se instalada na própria
Michelin, em uma área cedida em regime de comodato para o seu
funcionamento. Quanto à manutenção financeira, a escola capta recursos via
projetos e convênios junto a Fundação Odebrecht, Banco do Brasil, BNDES 17,
Mitsubishi Corporation, Instituto Telemar e Plantações Michelin da Bahia, entre
outros parceiros.

Figura 5 – Placa com registro dos parceiros sociais da escola

Fonte: RIOS, 2015

Em 2013, a CFR– I foi credenciada, definitivamente, pelo Conselho


Estadual de Educação da Bahia e diplomou a primeira turma desse curso,
consolidando a instituição como uma unidade de ensino profissional. A CFR – I
teve concretizadas as obras de reforma e ampliação da sua sede, fruto da
parceria com o BNDES e a Fundação Odebrecht, e, ainda, firmou convênio
com a Secretaria da Educação do Estado da Bahia, no âmbito do Programa
Estadual de Apoio Técnico - Financeiro às Escolas Famílias Agrícolas (EFA) e
Familiares Rurais (EFR), de fundamental importância para a manutenção desta
entidade.

17
Nesse mesmo ano, o BNDES liberou recursos para a CFR – I reformar e ampliar sua sede, já
estando disponível o valor de R$ 707.084,18, que permitirá a construção de novas salas de
aula, de administração e de professores, além de refeitório, laboratório de informática,
biblioteca e uma quadra poliesportiva. (Para assistir vídeo na internet, acesse
www.youtube.com/watch?v=9SBYsCq2S_M).
78

Por se tratar de uma associação, os associados da CFR – I são os pais


dos estudantes e cada família é considerada uma unidade, tendo direito a um
voto. À medida que o(a) filho(a) ingressa na escola, automaticamente, os pais
ou responsáveis são associados. A assembleia geral de pais é o órgão máximo
da CFR – I, sendo composta, também, por um Conselho de Administração
(presidente e vice-presidente) e um Conselho Fiscal, além de um Diretor
Executivo, uma Coordenadora Pedagógica (responsável pela condução dos
trabalhos dos Monitores e Jovens) e um Coordenador Financeiro. As atividades
produtivas são organizadas pela Cooperativa de produção. Apesar da
participação dos pais, subentende-se que o objetivo de torná-lo um associado
fica por conta de sua participação no projeto cooperativo, pois são
desenvolvidos, com as famílias, vários projetos de formação, tanto por
intermédio da escola como da rede cooperativa.
A gestão supõe a participação de todos para a promoção do
desenvolvimento; uma gestão que promova a estruturação de um modelo
educacional que respeite a cultura tradicional, porém que se alie às demandas
da realidade do agronegócio. O objetivo é a replicação desse mesmo modelo
de gestão em outras regiões. A parceria com a Michelin se dá pela estrutura da
escola, que funciona, provisoriamente, com termo de comodato. Para além de
um consórcio entre empresas, os parceiros são o governo do Estado e o
município.

4.2.5 Concepção de Campo

O projeto não se refere ao campo especificamente; antes, aborda o


termo rural como lugar que necessita de novas tecnologias e da inserção no
modelo cooperativista como sinônimo de progresso. Diz respeito a um rural
com baixos índices de desenvolvimento humano e altos índices de
analfabetismo e, também, baixa renda, mas não cita os fatores dessa exclusão
e concentração de riqueza; é como se essas adversidades não fossem
produzidas por ninguém: o campo já nascera assim, enquanto tal, e a
educação (capital humano), associada aos demais capitais, irá promover a
79

modernização com o modelo de agricultura fundamentado no agronegócio


(curso de agronegócio), levando todos a se tornarem empresários rurais ou, de
outro modo, expandindo a subordinação da agricultura familiar ao agronegócio.

O campo aparece sempre como exuberante e rico, porém, com pessoas


pobres. O PDCIS, com seu projeto educacional, irá reverter esse quadro. Vale,
contudo, ressaltar que a ênfase às belezas naturais do campo está associada a
oportunidades de negócios, pois, pelo Instituto de Desenvolvimento
Sustentável do Baixo Sul da Bahia (IDES), a Fundação Odebrecht propaga um
projeto de agro ecoturismo18, conduzindo os visitantes a conhecerem toda a
cadeia produtiva dominada pela Odebrecht e a interligação entre os projetos,
aproveitando para conhecer as belezas naturais da região. Todo o campo do
Baixo Sul, por seu potencial em recursos naturais e beleza, passou a ser
oportuno aos negócios.

A Fundação Odebrecht trabalha com as oito metas do milênio19, porém


quatro delas são o foco do PDCIS: 1) acabar com a fome e a miséria; 2)
educação básica e de qualidade para todos; 7) qualidade de vida e respeito ao
meio ambiente; e 8) todos trabalhando pelo desenvolvimento. A CFR – I faz
parte do projeto estratégico da meta 2 e precisa de uma gestão compartilhada,
com participação de todos: comunidade, empresas, ONGs e Estado para
garantir seu cumprimento. Como afirma Baiardi (2007), defensor deste projeto,

Os elementos aduzidos mostram inequivocamente que o


modelo de CFR está proporcionando uma possibilidade de
diferenciação da pequena propriedade familiar rural, mantidas
suas características e mantidas as suas lavouras tradicionais,
mas não os tradicionais métodos de produção. Uma
intervenção que trabalha simultaneamente com animação de
adultos, educação alternada de jovens visando a criação de
novos valores e transferência de tecnologia, práticas visando a
elevação do capital social e articulação de atores como Estado,
centro de pesquisa e comunidade de produtores, está se
demonstrando mais eficiente que grandes intervenções
agroreformistas. (BAIARDI, 2007, p. 12)

18
Ver: http://www.ides.org.br/?secao=12.
19
1) acabar com a fome e a miséria; 2) educação básica e de qualidade para todos; 3)
igualdade entre sexos e valorização da mulher; 4) reduzir a mortalidade infantil; 5) melhorar a
saúde da gestante; 6) combater o HIV, a malária e outras doenças; 7) qualidade de vida e
respeito ao meio ambiente; 8) todos trabalhando pelo desenvolvimento.
80

Esse modelo pensado pela Fundação aparece e é defendido como uma


alternativa de superação da pobreza. A não prosperidade dos agricultores,
pescadores e demais grupos sociais que vivem na região não é consequência
da concentração de terra e renda e, sim, da falta de qualificação, que será
resolvida com ações sinérgicas e a união dos quatro capitais.

4.3 Colégio Estadual Casa Jovem (CECJ II): uma trágica experiência de
parceria público-privada

Sobre os municípios da região, é comum existirem escolas que, embora


mantidas pelas secretarias municipais, funcionam dentro dos limites privados
das fazendas para atenderem aos filhos de empregados e aos adultos na
modalidade de Educação de Jovens e Adultos (EJA).

A Fazenda Reunidas Vale do Juliana faz parte desse contexto, pois, o


município oferta, para filhos de empregados da Fazenda e comunidades do
entorno, Educação /Infantil, Ensino Fundamental I e EJA primeiro segmento. A
novidade está em que, no ano de 2003, a Fundação Odebrecht funda, também
em seus domínios, para atender o público jovem, um colégio estadual como um
projeto específico, a fim de desenvolver uma proposta educacional moldada
pelos princípios de uma educação empresarial, fazendo parte do grande
projeto educacional para a região, enquanto parte integrante do PDCIS.

O Colégio Estadual Casa Jovem II surgiu do Ato 7931, publicado no


Diário Oficial de 19/05/05, e Portaria 11315/06, publicada, em 16/08/06, no
Diário Oficial do Estado da Bahia. Em fevereiro de 2008, foi firmado um
convênio entre a Secretaria de Educação do Estado da Bahia e OSCIP Casa
Jovem. A construção e implantação desse colégio foi resultado de uma
articulação realizada pelo Sr. Norberto Odebrecht, proprietário da Fazenda
Reunidas Vale do Juliana, empresário, fundador e acionista principal da
Organização Odebrecht.

Dentre os projetos educacionais fomentados pela Fundação Odebrecht,


esse é o único intitulado Colégio Estadual; quanto aos demais, como descrito
no Capítulo II deste trabalho, são Casas Familiares Rurais. Essa é uma
instituição que, apesar de não pertencer à Fundação, tratar-se de uma escola
81

pública, faz parte do PDCIS e está ligada ao projeto produtivo da Cooperativa


dos Produtores de Palmito do Baixo Sul da Bahia (COOPALM), cuja
associação entre cooperativa e escola será explicada nos próximos itens.

De acordo com dados fornecidos no Projeto Político Pedagógico (PPP)


construído em 2012, tal Colégio é considerado de porte médio, atendendo a
492 educandos, num prédio escolar assim estruturado: 10 salas de aula; 01
cozinha bem equipada; 02 banheiros para estudantes, feminino e masculino,
que, somado a outros, equivalem a 10 sanitários; 01 área para recreação em
pátio coberto; 01 área esportiva: 01 quadra de esportes coberta; 01 campo com
grama sintética; 02 vestiários, masculino e feminino; 01 auditório; 01 sala de
recepção (vice-direção); 01 sala de direção; 01 sala de professores; 01
biblioteca; 01 sala de informática; 01 sala dupla para secretaria escolar; 01 sala
da coordenação pedagógica; e 01 almoxarifado. Se comparada as demais
escolas públicas da região, percebe-se, nela, o grande investimento do Estado,
fato esse que não se repete nas demais escolas do campo. O projeto foi
idealizado por Norberto Odebrecht que doou o terreno à Secretaria Estadual e
construiu a escola, sendo, depois, reembolsado pelo Estado quanto ao valor
gasto com a construção.

A equipe de funcionários é mantida pela Secretaria Estadual da


Educação e a coordenação pedagógica pela OSCIP Casa Jovem. É por meio
dessa OSCIP, aliás, que a Fundação Odebrecht acompanha o colégio e recebe
recursos de entes privados e federais que, assim, oferecem o apoio necessário
à escola.

Os níveis de ensino ofertados são: Ensino Fundamental II, na


modalidade regular; Educação Profissional – Técnico em Agroecologia
Integrado ao Ensino Médio; e Educação de Jovens e Adultos – EJA, atendendo
ao público do campo da região, incluindo assentamentos rurais, comunidades
quilombolas, demais comunidades rurais e filhos de empregados da fazenda,
abrangendo os municípios de Igrapiúna, Ituberá e Piraí do Norte, todos do
Baixo Sul da Bahia.
82

Figura 6 – Vista Panorâmica do Colégio Casa Jovem II – Igrapiúna/BA

Fonte: RIOS, 2012

Figura 7 – Biblioteca e Infocentro da Casa Jovem II, Igrapiúna/BA

Fonte: RIOS, 201

4.3.1 Ingresso / Público atendido

Há, para que aconteça o ingresso, uma ampla divulgação da abertura de


matrículas nas comunidades rurais, escolas e secretarias municipais, seguindo
o modelo da Secretaria Estadual, para os adolescentes, jovens e adultos de
comunidades rurais (incluindo assentamentos e comunidades quilombolas),
bem como filhos de assalariados que trabalham nas fazendas do entorno. No
83

caso, por ser um colégio estadual, as matrículas são abertas e o critério de


entrada é ter concluído o Ensino Fundamental pra o ingresso na escola.

4.3.2 Financiamento / Parcerias

A entidade mantenedora é a Secretaria Municipal de Educação. Esta,


porém, conta com a parceria da Prefeitura Municipal, que fornece o transporte
para educadores e educandos e, via OSCIP Casa Jovem, também recebe
recursos do Estado e de entidades privadas nacionais e internacionais, por
meio de projetos. Vale ressaltar que se trata de uma escola reconhecida como
de Porte Especial, o que garante a mesma o recebimento de um maior volume
de recursos, se comparada às demais escolas estaduais, porém não foi
identificado quais critérios o Estado utilizou para reconhecê-la como porte
especial.

4.3.3 Concepção de educação e formação humana

Com o objetivo de identificar os fundamentos que sustentam esse


modelo educacional, tido como referência regional em “Educação do Campo”,
foram analisadas, no (PPP) 2012, a concepção de educação e formação
humana, relação educação e trabalho, gestão e financiamento, no sentido de
demonstrar como a Odebrecht, via ações da Fundação Odebrecht, tem atuado
na educação pública, via PDCIS.

O desenvolvimento que se expressa em cada ser humano não advém de


uma essência abstrata, mas é um processo no qual o ser se constitui
socialmente, por meio do trabalho; é uma individualidade – e,
consequentemente, uma subjetividade – que se constrói, portanto, sob
determinadas condições histórico-sociais. Dessa forma, busca-se compreender
a concepção de educação contida no PPP do Colégio Estadual Casa Jovem II,
a fim de identificar que tipo de formação esta instituição pretende gerir a seus
educandos, essencialmente oriundos de comunidades campesinas, cuja
especificidade está na agricultura enquanto principal meio de sustento.
84

Informações sistematizadas do PPP do Colégio Casa Jovem II, dão


conta de que a Proposta Pedagógica fundamenta-se: 1) no sócio-
interacionismo-construtivista; 2) na Pedagogia da Autonomia de Paulo Freire;
3) na Ecopedagogia; e 4) na Educação para o desenvolvimento dos Valores
Humanos.

Além disso, o modelo de ensino é proposto em 4 pilares da educação.


Aprender a ser (identidade, autoestima, autoconsciência,
competência pessoal).
Aprender a conviver (respeito, ética, solidariedade, cooperação
e participação, competência social).
Aprender a fazer (habilidades, aptidões, criatividade,
flexibilidade, polivalência, competência produtiva).
Aprender a conhecer (conceitos, conhecimento, competência
cognitiva, compreensão do mundo). (PROJETO POLÍTICO
PEDAGÓGICO, CECJ II, p. 13)

Nessas condições, Duarte (2001), ao analisar o lema “aprender a


aprender”, dentre os quatro pilares, este pode ser denominado de “Pedagogia
do Aprender”, sistematiza, por sua vez, em quatro posicionamentos valorativos,
orientando a uma análise crítica em torno do que significam esses pilares da
educação. Primeiro, passa-se a ideia de que são mais desejáveis as
aprendizagens que o indivíduo realiza por si mesmo, nas quais está ausente a
transmissão, por outros indivíduos, de conhecimentos e experiências.
Segundo, é mais importante o aluno desenvolver um método de aquisição,
elaboração, descoberta, construção de conhecimentos, do que esse aluno
aprender os conhecimentos que foram descobertos e elaborados por outras
pessoas. Quanto ao terceiro posicionamento valorativo, este está em que a
atividade do aluno, para ser verdadeiramente educativa, deve ser impulsionada
e dirigida pelos interesses e as necessidades da própria criança. O quarto
posicionamento valorativo pauta a educação enquanto preparo dos indivíduos
para acompanharem a sociedade em acelerado processo de mudança; ou seja,
enquanto a educação tradicional seria resultante de sociedades estáticas, nas
quais a transmissão dos conhecimentos e das tradições produzidos pelas
gerações passadas era suficiente para assegurar a formação das novas
gerações, a nova educação deve produzir-se no fato de que vivemos em uma
sociedade dinâmica, na qual as transformações, em ritmo acelerado, tornam os
conhecimentos cada vez mais provisórios, pois um conhecimento que hoje é
85

tido como verdadeiro pode ser superado em poucos anos ou, mesmo, em
alguns meses (DUARTE, 2001).

Como se percebe, há uma orientação internacional seguida á risca


nesse projeto educacional da Fundação, cujo pano de fundo visa a criar
ilusões, camuflando problemas gerados pelo sistema capitalista. As pessoas
devem se preocupar com questões atuais dessa sociedade dinâmica, tais
como a questão da ética na política e na vida cotidiana, a defesa dos direitos
do cidadão e do consumidor, a consciência ecológica, o respeito às diferenças
sexuais, étnicas ou de qualquer outra natureza. Essa ideia converge com as
oito metas do milênio já citadas. Aprender a aprender significa, pois, o ser
humano ser capaz de conquistar as habilidades necessárias para alcançar um
posto no mercado de trabalho, passando a ideia de que não há mais
necessidade de críticas radicais ao capitalismo, afinal, na sociedade do
conhecimento, sobressai aquele que estiver mais qualificado. Novamente está
presente, portanto, a ideia da empregabilidade.

Há uma mistura de concepções no que se refere aos referenciais que


embasam a base filosófica, política e pedagógica, porém, destaca-se a
influência direta da filosofia empresarial na escola pública, por meio do quarto
referencial, a educação para o desenvolvimento dos Valores Humanos.

Três programas fundamentam a sua prática: Vivendo os


valores da organização não governamental, Universidade
Mundial Brama Kumares, pertencendo a Organização das
Nações Unidas (ONU), que reconhece os valores universais
como transcendentes as singularidades da herança cultural,
filosófica e social da humanidade: o Programa de Educação
para os Valores Humanos desenvolvidos pelo mestre indiano
Sri Sathya Sai Baba, utilizado nos diversos países do mundo,
há mais de vinte anos, não tem caráter religioso, doutrinário e
político, contribuindo para formar seres humanos íntegros,
livres do medo e do preconceito; Programa do livro “Aprender a
ser e conviver” de Margarida Serrão e Maria Clarice Balieiro,
desenvolvido pela Fundação Odebrecht através das suas
dinâmicas vivenciais que abordam os temas sobre identidade,
integração, comunicação, grupo, sexualidade, cidadania e
projeto de vida. (PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO – CECJ
II, p. 35)
86

A educação fundamentada em valores, conforme descrito no PPP e


declarado nos escritos de Odebrecht, tem sua origem na Universidade Mundial
Brama Kumares. A obra de educação, com base em Valores Humanos,
definida pelo mestre indiano Sathya Sai Baba, emergiu em 1968, quando este,
preocupado com o momento de crise moral e espiritual por que seu país, a
Índia, passava, resolveu fundar uma escola gratuita, incialmente, para meninas,
que, depois, foi estendida para todos os públicos.

Sathya Sai Baba doutrina que se deve utilizar a mente como instrumento
para a aprendizagem dos cinco valores: Paz, Verdade, Não-violência, Retidão
e Amor, alcançando, assim, a excelência humana. Desse modo, a mente, como
excelência humana, pode ser designada a partir da sua existência.

Analisando os escritos de Odebrecht (2013), conclui-se que há uma


orientação para a juventude no sentido de que ela deva investir para se tornar
jovens empresários, superando seus limites, afinal, os problemas não estão no
mundo, mas em cada um de nós. A concepção de educação, na verdade,
prevê uma inclinação para uma educação que forme o ser humano desde os
pressupostos da UNESCO, ou seja, uma concepção de melhoria do
capitalismo, alívio da pobreza, algo ligada à autoajuda, por meio do cultivo dos
Valores Humanos; uma ação bastante idealista, espiritual, com amor e crenças
religiosas.

Observe-se que tais fundamentos, no entanto, não derivam de lutas


entre classes; a questão não é o capital, é o homem, é cada um dos indivíduos;
todos se identificam como culpados e todos podem melhorar o mundo, há uma
espécie de mistura de concepções que, no fundo, ignora as questões materiais
da vida. Uma formação idealista que coloca as mudanças nas mãos do
indivíduo que coaduna com a ideia de protagonismo juvenil veiculada em todos
os projetos de formação da fundação. Termos como trabalho, exploração,
classes sociais e lutas sociais estão ausentes; enfatize-se ser uma formação
para integração do jovem ao modelo das elites, para o cumprimento das
necessidades do setor produtivo da região.

A perspectiva explicitada é formar o jovem empresário, criando a ilusão


na juventude de que eles podem ser empresários. Percebe-se, claramente, que
a intenção é transformar agricultura camponesa num aliado do agronegócio. O
87

agronegócio consegue impor-se não apenas nas relações de produção, mas,


também, nos projetos educativos, pois se apresenta como comprovação de
que o campo pode e deve ser um local de produção moderna, tecnológica,
capitalista. Esses fatos constroem a ideologia do agronegócio e a apresentam
como o caminho a ser seguido por todos aqueles que não aderiram às
inovações do capital. Há uma notável intenção nos objetivos e princípios de
criar uma ilusão na juventude de que o campo é um lugar de negócios, que
necessita, portanto, de jovens capacitados para serem empresários rurais.

Consolidar uma educação de qualidade que vise a formação


integral dos estudantes, o desenvolvimento do homem do
campo, da consciência ambiental, organizacional, empresarial,
comunitária cidadã dos campesinos assentados, ribeirinhos e
quilombolas, com vista a Educação Profissional em
Agroecologia e a sua atuação nas diversas áreas e práticas do
conhecimento. (PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO, CECJ,
2012).

Apesar de aparecer no projeto expressões como “Saberes da Terra”,


“Campo”, “Educação do Campo”, construídas no seio do movimento por uma
Educação do Campo, as análises apontam que esse é um Projeto de educação
rural com intencionalidade mascarada.

Frigotto (2012) fala em estratégia reiterativa da segmentação e do


dualismo como forma de subordinar os processos educativos aos interesses da
reprodução das relações sociais capitalistas, bem como do caráter dessa
subordinação na realidade brasileira. Nessa construção, percebe-se,
declaradamente, elemento da Teoria do capital humano, elemento específico
da teoria conservadora do desenvolvimento. A educação como um corpo
teórico disciplinar – Economia da educação –, que define a educação como
fator de produção, se explicita nas teorias do desenvolvimento.

A qualificação humana diz respeito ao desenvolvimento das


condições físicas, mentais, afetivas, estéticas e lúdicas do ser
humano (condições omnilaterais) capazes de ampliar
capacidade de trabalho na produção dos valores de uso em
geral como condição de satisfação das múltiplas necessidades
do ser humano no seu devir histórico. Está, pois, no plano dos
direitos que não podem ser mercantilizados e, quando isso
ocorre, agride-se eternamente a própria natureza humana.
(FRIGOTTO, 2012, p.31).
88

No seio desse modelo de educação, realizam-se os programas que são


elaborados, financiados e executados com os parceiros e com a participação
das comunidades, dentre eles: Círculos de Leitura (Parceria da Fundação
Odebrecht com Instituto Fernand Braudel/SP, iniciado em 2008); Centro de
Panificação Casa Jovem (curso de 200h em panificação e confeitaria, entre
outros); Projeto Horto Medicinal Casa Jovem; Horta Pedagógica Casa Jovem;
Projeto de Integração Comunitária, Conselho Externo; Parceria com a
Comunidade Quilombola Laranjeiras; Teatro na Escola; Ação Cívico-Social –
ACISo (convênio celebrado com o comando do Exército; o objeto deste
instrumento será executado por meio da realização, conjunta, de Ações Cívico-
Sociais – ACISO, efetivadas, semestralmente, na região do Vale do Juliana,
dentre outras ações de assistência e cidadania), Progestão; Percussão e
Sustentabilidade; Indústria do Conhecimento – SESI. Além disso, a escola
adere a todos os programas do governo para a Educação de Ensino
Fundamental e Médio, programas esses que vêm reforçar a concepção de
educação difundida, pois todos têm como prerrogativa o desenvolvimento do
espírito voluntariado, o trabalho em comunidade e as pequenas ações que
mudarão o mundo, conforme segue ilustrado.

Figura 8 – Placa de Inauguração do ACISO

Fonte: RIOS, 2015


89

Figura 9 – Placa de Inauguração da Indústria do conhecimento

Fonte: RIOS, 2015

O caráter subordinado das práticas educativas aos interesses do capital


em todas as fases do capitalismo deixa explicito seu caráter uma diferenciação
da educação ou formação humana para as classes dirigentes e a classe
trabalhadora. (FRIGOTTO, 2012).

4.3.4 Relação Educação e Trabalho

A concepção de trabalho ora adotada parte dos estudos de Frigotto


(2012), que, fundamentado na teoria marxista, concebe o trabalho como
atividade vital e criadora, mediante a qual o ser humano produz e reproduz a si
mesmo. O mesmo autor sustenta, também, que o trabalho, nas sociedades de
classes, é, dominantemente, alienador, degradando e mutilando a vida
humana; contudo, não se resume a pura negatividade, pelo fato de que
nenhuma relação de exploração, até o presente, conseguiu anular a
capacidade humana de criar e de buscar a superação da exploração.

Ciavatta (2009) reforça, apontando que o trabalho não é,


necessariamente, educativo; isso dependerá das condições de sua realização,
dos fins a que se destina, de quem se apropria do produto do trabalho e do
conhecimento que gera.

Na sociedade capitalista, a educação tem cumprido o papel de atender


às necessidades de formação de mão-de-obra necessária ao setor produtivo.
90

Na perspectiva das classes dominantes, historicamente, a


educação dos diferentes grupos sociais de trabalhadores deve
dar-se a fim de habilitá-los técnica, social e ideologicamente
para o trabalho. Trata-se de subordinar a função social da
educação de forma controlada para responder às demandas do
capital. (FRIGOTTO, 1999, p. 26).

Ao analisar um projeto educacional público, ainda que conduzido por


uma empresa, foi identificada uma evidente função dada à educação que não
se restringirá à formação para a emancipação humana; antes, compreenderá
uma preparação para o trabalho, especificamente o trabalho relacionado ao
projeto das cooperativas da região.

A questão da educação aparece, por um lado, na crítica à sua


perspectiva unilateral e restrita vinculada ao plano material
objetivo nas relações sociais capitalistas fundadas na
propriedade privada dos meios e instrumentos de produção, na
divisão social do trabalho, e nos processos de expropriação e
alienação que tais relações impõem, limitando o livre e solidário
desenvolvimento humano. (FRIGOTTO, 2012, p. 266).

A construção dessa proposta pedagógica alicerçada nas orientações


empresariais para a educação pública faz perceber que o sistema capitalista,
afora a exploração dentro de uma legalidade construída pela burguesia, torna a
educação pública um instrumento ao seu favor. Serão verificados, nos
parágrafos seguintes, as concepções, os princípios e os objetivos que norteiam
a educação escolar ofertada aos povos do campo que estudam nesta escola.

A começar pela justificativa desse projeto educacional, que se dá pela


obrigatoriedade de construção de um projeto escolar de Ensino Fundamental II
e Médio que

[...] valoriza a atuação dos jovens no mundo do trabalho,


promovendo a qualidade de vida, inclusão social e
desenvolvimento das comunidades que já atuam nos arranjos
produtivos do palmito, cacau e piscicultura e Programa de
Agricultura Integrada e Sustentável - PAIS. Esse pacto de
cidadania ambiental enfoca estratégias regionais que
respondam mais acertadamente às diferentes realidades
sociais, econômicas e ambientais. (PROJETO POLÍTICO
PEDAGÓGICO, CECJ, p. 9)
91

Há um irrefutável direcionamento da formação para o trabalho e, o que é


pior, o trabalho segundo as necessidades de mão-de-obra para o emprego nas
fazendas da região. A concepção de educação para o mercado de trabalho
(especificamente, o trabalho na agricultura da região e, mais especificamente
ainda, para a agricultura ligada aos projetos produtivos coordenados pela
Fundação Odebrecht, em particular, aqueles que se foram no âmbito das
cooperativas, alvo este, no entanto, que não é foco do presente estudo), além
de manter relações de exploração com os trabalhadores, expõe estruturas
construídas com recursos públicos em regime de comodato com as empresas.

Referida formação (de educação para o trabalho) encontra-se, manifesta


nos objetivos específicos do Projeto; trata-se de uma formação para o trabalho
camuflada, em que estes educandos são iludidos a se tornarem empresários
rurais.

Integrar o saber, o ser e o fazer no contexto educacional


fundamentado na concepção sócio-interacionista e no
desenvolvimento integral do ser humano, visando à iniciação
profissional em Agroecologia e a preparação básica para o
trabalho do/no campo.
Ampliar o papel de mobilidade social, fomentando possibilidade
de desenvolvimento de trabalho para a região, implantando um
modelo organizacional empresarial, visando o crescimento e a
sustentabilidade das unidades família.
Proporcionar uma educação profissional diversificada no
campo, visando a compreensão dos fundamentos científico-
tecnológicos dos processos produtivos, a valorização da terra,
o desenvolvimento sustentável e sua inserção no mundo do
trabalho. (PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO, CECJ II, 2012,
p. 12)

Atente-se para o fato de que tais itens, no fundo, apontam para uma
educação pública que busca o preparo de mão-de-obra para o projeto da
Odebrecht na região. Apesar de o primeiro objetivo versar sobre
desenvolvimento integral do ser humano, o segundo discorre sobre a
implantação de “[...] um modelo organizacional empresarial, visando ao
crescimento e a sustentabilidade das unidades família”. É patente a intenção
de tornar a escola pública um braço pedagógico da empresa, no sentido de
apreciar que a aplicação do modelo empresarial na agricultura é que vai
proporcionar o desenvolvimento para o campo, sendo uma forma de garantir
92

emprego à juventude. Ademais, a sustentação desse modelo depende,


também, de uma classe de agricultores que a defenda. Nesse caso, o Colégio
estadual compreende, pois, o espaço onde essa proposta ideológica é
veiculada.

Essa orientação empresarial está contida, de maneira explícita, nos


princípios da educação que empregam a tecnologia empresarial na educação
dos filhos dos trabalhadores:

Valorização do aluno como sujeito produtor do conhecimento e


participante do mundo do trabalho, utilizando a TES
(Tecnologia Empresarial Social) como um dos princípios
norteadores do trabalho.
Opção por uma concepção e metodologia em Educação para a
vida, para o trabalho e para transformação da comunidade.
Criar a TESE (Tecnologia Empresarial sócio educacional) para
ser utilizada pelo Colégio como filosofia empresarial.
(PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO CECJ, 2012, p. 14).

Nos programas praticados pelas escolas, veicula-se a mensagem de


que há falta de qualificação para o trabalho, com isso, é tarefa da escola
preencher essa lacuna, conforme se sugere na justificativa dos projetos. No
programa Círculos de Leitura, já descrito em capítulo anterior, afirma-se que a
falta de trabalho e, consequentemente, a pobreza estão associados a não
qualificação do trabalhador; dessa forma, o projeto escolar emana como uma
alavanca para o desenvolvimento, já que, por meio da escola, a vida das
pessoas irá melhorar.

Com o aumento do número de crianças nas escolas, a


precariedade do ensino e sua inadequação a realidade do
campo, além da ausência da cultura leitora apresentada pela
clientela do campo atendida pelo colégio, faz com que milhões
de jovens saiam das escolas sem ter nenhuma perspectiva
para sua vida de trabalho. O mercado de trabalho, embora
venha ofertando um crescente número de vagas, não
consegue preenchê-las face à falta de pessoal qualificado. A
capacidade de leitura e reflexão se tornou uma habilidade
essencial à mobilidade social e ao exercício da cidadania para
os jovens. (PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO, CECJ II,
2012, p. 16)

É importante destacar que essa ideia de trabalho está voltada ao


cooperativismo da região, proveniente do modelo implementado pela
93

Odebrecht e acompanhado dos eixos diversidade; e, nesse eixo, convergem as


expressões de construção de uma democracia sem lutas reivindicatórias, em
consonância com o que segue, quando se aborda a diversidade.

É um espaço de construção da solidariedade, da democracia


que busca o pertencimento dos valores locais e, não apenas,
de lutas reivindicatórias. É a postura dialógica que precisa ser
desenvolvida na educação, voltada para a inclusão e
pluralismo cultural, independente raça gênero, religião, cultura
ou outras formas de discriminação. (PROJETO POLÍTICO
PEDAGÓGICO CECJ II, 2012, p. 32)

Igualmente à resolução pacífica dos problemas, conforme o conceito de


cidadania.

A educação para a cidadania desenvolve o conhecimento, a


compreensão, as capacidades, as atitudes e os valores que
ajudam os jovens a desempenharem um papel ativo na sua
comunidade; estar informado e consciente dos seus direitos,
responsabilidades e deveres e adesão aos valores
democráticos (liberdade, igualdade, pluralismo, cooperação,
solidariedade e resolução pacífica dos conflitos). (PROJETO
POLÍTICO PEDAGÓGICO CECJ II, 2012, p. 32)

A análise crítica da concepção de educação para o trabalho, veiculada


nessa proposta, encontra suas bases no projeto burguês para a construção da
sociabilidade: a ideia de buscar outras formas que não aquelas reivindicativas
(no eixo diversidade) e a busca de resolução de problemas sem conflitos (no
eixo da cidadania) permitem uma formação para o trabalho em que os
indivíduos se encaixem numa relação social dada, na qual alguns detêm as
riquezas e outros trabalham para os detentores dessa riqueza.

Tal concepção de trabalho, embutida no projeto de escola, conduz à


ideia de “individualismo como valor moral radical” como um de seus princípios
políticos de articulação das estratégias de ação do capital sobre a cidadania
(MARTINS, 2007). Para o autor, esse preceito, fundamento nas estratégias que
a Terceira Via classificou de „política de vida‟ e „política gerativa‟, a serem
implementadas pelo Estado em parceria com organizações comprometidas
com o desenvolvimento social; uma espécie de libertação psicológica que
permita liberdade de escolhas e opções de vida.
94

A meta da “política de vida” é “libertar” os seres humanos


dos controles externos impostos pelos códigos
disciplinares de condutas rígidas para torná-los mais
aptos a tomarem iniciativas e decisões, a serem mais
ativos, criativos e independentes. O objetivo é criar uma
geração nova de adultos com o espírito empreendedor,
iniciativa individual e com senso de responsabilidade
social, isto é, um cidadão reflexivo. (MARTINS, 2007, p.
89).

Em relação à “política gerativa”, afirma-se que seria aplicada para


mostrar aos indivíduos libertos pela “política de vida” que eles possuem a
capacidade de se mobilizar no espaço comunitário para solucionar problemas
que transcendem à sua individualidade.

Vista de maneira crítica, a “política gerativa” e a “política de


vida” são na verdade estratégias destinadas a disseminar o
individualismo e incentivar o desenvolvimento do “capital
social”, remodelando as referências históricas de cidadania.
Ambas as estratégias se destinam à construção de novas
subjetividades, visando a preparação de um perfil humano que
combine a individualização da autonomia com a abertura para
o estabelecimento de laços de cooperação com os mais
próximos para reforçar a conservação. Com isso, através de
processos moleculares, a manutenção das relações sociais e
as relações de poder no capitalismo seriam sustentadas por
vários pequenos organismos, atuando em rede rumo à
consolidação da coesão cívica de novo tipo e impulsionadas
por uma nova sociabilidade expressa pela ideia de “cidadania
ativa”. Para tanto, a meta é desarmar os espíritos para relações
mais harmônicas em que a colaboração torna-se referência,
desarticulando, consequentemente, os organismos sociais
(partidos e os sindicatos) que ainda atuam numa perspectiva
de interesses de classe. (MARTINS, 2007, p. 89)

Note-se a tentativa de construir unidade moral, intelectual e política,


reunindo as diferentes forças sociais em torno de uma única concepção
renovada de mundo. Esse ser humano que mencionado modelo de educação
pretende formar é o ser humano capaz de superar limites para se integrar num
conjunto um pouco maior de questões, sem a perda de sua capacidade de
exercer seu autogoverno. (MARTINS, 2007).

Considerações como exploração do trabalho rural e pouca remuneração


aparecerem no projeto uma única vez; a ênfase nisso não é explorada, visto
que se busca politizar que os problemas relacionados ao trabalho estão
95

diretamente ligados à falta de qualificação, o que pode ser resolvido sem


conflitos e sem reivindicação, como detalhado anteriormente.

Sob a tarefa educativa do Estado neoliberal – qual seja, educar


os seres humanos para o afloramento das potencialidades
naturais (empreendedorismo, competitividade, individualismo) –
as grandes e complexas organizações, como os sindicatos e
partidos políticos, teriam que ser combatidas por significarem
uma oposição a esse trabalho educativo das massas.
(MARTINS, 2007, p. 44)

A educação para o campo do Baixo Sul, sob a ótica da Fundação


Odebrecht, é uma educação para formação da força de trabalho e inculcação
da ideologia do capital. A presença de Tecnologia Empresarial Odebrecht na
proposta pedagógica da escola condiciona elementos de uma orientação
empresarial para a formação de um público jovem e adolescente que frequenta
esta instituição. Dessa forma, há uma “preocupação” da iniciativa privada com
a educação dos pobres e essa preocupação estende-se para todas as áreas,
inclusive a do trabalho. A ideia contida nessa proposta pedagógica é a de que
a educação forme a mão-de-obra necessária para trabalhar nas fazendas e
fortalecer as cadeias produtivas lideradas pelas cooperativas ligadas à
Fundação.

Em 2003, essa área formada por onze municípios, foi escolhida


para receber o Programa de Desenvolvimento e Crescimento
Integrado e Sustentável (PDCIS Baixo Sul), tendo como missão
contribuir para geração trabalho e distribuição de renda para
unidades-famílias carentes, além de contribuir com a
educação, identificando novos talentos ( filhos de cooperados)
para formação dos empresários do futuro, e criar escola (
casas familiares) para dar formação agrícola aos jovens, que
multiplicam esse conhecimento com seus familiares e vizinhos.
Com isso, as famílias veem ampliadas as chances de
permanecer no campo com dignidade, e se forma uma geração
de agricultores que usa tecnologia e alcança produtividade
através da criação de cadeias produtivas lideradas pelas
cooperativas: COOPATAN, COOPECON, COOPALM,
COOPRAP e da conservação ambiental. (PROJETO
POLÍTICO PEDAGÓGICO, CECJ II, 2012, p. 9)

Dessa forma, podem-se destacar dois pontos fundamentais: a promessa


de emprego para a juventude camponesa (promessa essa, aliás, que, ao final,
não se concretiza) e a ideia de que, dentro do PDCIS, esses jovens se tornarão
empresários rurais; vale lembrar que o público que essa escola atende não tem
96

terra e, quando a possui, são em pequena quantidade, o que não garante a


sustentação da família, formando, com isso, defensores do projeto de
agricultura da empresa para a região, tornado a agricultura familiar/camponesa
com sua produção atrelada às cooperativas da Odebrecht, que, por sua vez,
terá o controle desde a produção, definindo o que cada um deve plantar, no
caso, o palmito, até a comercialização.

O conjunto de ideias contidas no projeto pedagógico do colégio passa a


ideologia de que apenas a qualificação é condição necessária para a
superação da falta de emprego e, principalmente, da pobreza. E, sem a
superação da sociedade de classes, é possível construir um campo justo, onde
todos fazem sua parte e são colaboradores para a harmonia, sobretudo, entre
patrões e empregados.

Os organismos internacionais, como o Banco Mundial, o Banco


Interamericano de Desenvolvimento (Bird), a Organização
Mundial do Comércio (OMC), e a Organização Internacional do
Trabalho (OIT), acolhem hoje os sucedâneos dos economistas
filantropos, que ditam para o mundo as reformas educacionais
para formar trabalhadores funcionais ao capital. (FRIGOTTO,
2012, p. 269)

Resta, pois, concluir que a educação pública ofertada pelo Estado e


conduzida pela Fundação Odebrecht para o trabalho não se norteia por seu
princípio educativo; antes, pelo contrário: exerce uma orientação técnica para o
trabalho simples, aliás, anote-se que, no projeto, em momento algum o termo
universidade, enquanto prosseguimento dos estudos, foi registrado. Em
síntese: trata-se da formação para o trabalho simples que está longe de
promover a emancipação do sujeito.

4.3.5 Concepção de Gestão

O modelo de gestão é pautado na parceria público-privado. Segundo


dados fornecidos pela antiga DIREC 05, hoje Núcleo Regional de Ensino, há 24
escolas do campo no Baixo Sul da Bahia, sendo que, dessas, 20 são anexos
das escolas das cidades e, em 08 deles, funcionam o Ensino Médio por
97

Intermediação Tecnológica (EMITEC) (RIOS, 2012). O Colégio Estadual Casa


Jovem II encontra-se numa situação privilegiada no Estado e na região, pois a
educação ofertada na Fazenda Vale do Juliana, por meio de parcerias com o
município e Estado, atende a todas as modalidades do ensino. Logo, percebe-
se que o empresariado investe na formação de sua mão-de-obra e, para tanto,
conta com o apoio do poder público, que financia suas ações.

Em termos de gestão partilhada, a OSCIP Casa Jovem, dirigida pela


Fundação, busca outras parcerias, a fim de garantir a formação dos educandos
em tempo integral.

Atendendo a uma proposta de gestão compartilhada, em


fevereiro de 2008 foi firmado um convênio entre a Secretaria de
Educação e OSCIP Casa Jovem que tem como missão mudar
paradigmas na Educação do/no Campo, promovendo uma
educação de qualidade, formando jovens na perspectiva do
desenvolvimento sustentável da região, através de um novo
modelo pedagógico e organizacional de trabalho, que inclua o
artigo 14 da LDB, que trata da garantia de uma gestão
democrática, constituindo mecanismos que possibilitem
estabelecer relações entre a escola, a comunidade local, os
movimentos sociais, os órgãos normativos do sistema de
ensino e os demais setores da sociedade. (PROJETO
POLÍTICO PEDAGÓGICO, CECJ II, 2012, p. 5)

Essa gestão democrática inclui, principalmente, a participação da


iniciativa privada, que desenvolverá habilidades empreendedoras, com a
implantação de um modelo empresarial para a educação.

Esse projeto visa promover uma educação do campo de


qualidade, formando o jovem na perspectiva de transformar o
Baixo Sul, atendendo ao projeto de desenvolvimento
sustentável da região, assegurando o seu acesso e
permanência no CECJ, a revalorização da consciência das
relações com a natureza, com o social, com a cultura da vida a
partir das dimensões igualitária, solidária e participativa,
implantando no CECJ um modelo organizacional empresarial,
tendo em vista o desenvolvimento das competências e
habilidades administrativas e empreendedoras da clientela que
assistimos. . (PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO, CECJ II,
2012, p.10)

Entendendo gestão enquanto proposta cujo modelo compreende a


participação de todos para o desenvolvimento do projeto, seu princípio
norteador está na
98

Integração de todos: Estudantes, Professores, Funcionários,


Pais, OSCIP e Comunidade instituindo uma comunidade de
aprendizagem onde a escola se constitui em foco irradiador.
Realização de acordos e parcerias financeiras e pedagógicas
com os governos do estado e município, para adquirir maior
autonomia e êxito no trabalho. (PROJETO POLÍTICO
PEDAGÓGICO, CECJ II, 2012)

Por meio do Projeto de Integração Comunitária, que, a seu turno, recebe


apoio da SEC/DIREC 05 e OSCIP Casa Jovem, formou-se um Conselho
Comunitário do Campo, para avaliação externa da contribuição do Colégio
Estadual Casa Jovem nas comunidades, assim como do desempenho dos
estudantes na comunidade, via formulário, que é preenchido com a
contribuição dos educadores.

Aqui, pressupõe, também, uma análise da Tecnologia Empresarial


Socioeducacional (TESE), pois, nos projetos das escolas estudadas, esta
emerge como princípio norteador de uma gestão educacional:

Desenvolvimento dos valores humanos, consciência de


cidadania e ecológica; Responsabilidade pessoal pela
formação do adolescente, jovens e adultos, através da
implementação do Projeto Político Pedagógico, Organizacional
e Financeiro; Valorização do aluno como sujeito produtor do
conhecimento e participante do mundo do trabalho, utilizando a
TES (Tecnologia Empresarial Social) como um dos princípios
norteadores do trabalho; Opção por uma concepção e
metodologia em Educação para a vida, para o trabalho e para
transformação da comunidade. Criar a TESE (Tecnologia
Empresarial Sócio Educacional) para ser utilizada pelo Colégio
como filosofia empresarial Integração de todos: Estudantes,
Professores, Funcionários, Pais, OSCIP e Comunidade
instituindo uma comunidade de aprendizagem onde a escola se
constitui em foco irradiador. Realização de acordos e parcerias
financeiras e pedagógicas com os governos do estado e
município, para adquirir maior autonomia e êxito no trabalho e
Valorização dos diferentes saberes no processo educativo.
(PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO CECJ II, 2012, p.15)

É pela TESE que os projetos educacionais conduzidos pela Fundação


Odebrecht desenvolvem seu plano de ação na escola pública. A Tecnologia
Empresarial Socioeducacional (TESE) é uma espécie de variante da TEO
(Tecnologia Empresarial Odebrecht) elaborada e adaptada para o ambiente
escolar. Uma espécie de receituário da empresa para a organização escolar.
99

Conforme informações disponibilizadas no site do Instituto Co-responsabilidade


20
pela Educação (ICE) , tal recurso tem sido aplicado em escolas públicas de
Ensino Médio Integral, sendo 160 escolas do Estado de Pernambuco; 60 no
Ceará; outras 23 em Sergipe; e mais 3 no Piauí. Também começou a
implementação no Ensino Fundamental (7º ao 9º ano) no do Rio de Janeiro.
Pondera-se, então, que, além da Bahia, a atuação da empresa já tem
incidência em muitas outras escolas públicas de outros estados, com a difusão
de sua ideologia educacional, operando como uma rede de empresários e
atuando na escola pública brasileira. Não concidentemente, a Tecnologia
Empresarial se desenvolveu nos estados do Nordeste, onde foi realizado o
diagnóstico educacional por meio do projeto Aliança com o Adolescente.

O material utilizado para análise/coleta de dados foi um Manual de


Operações para implantação do modelo de gestão. Tal manual tem como
princípio gestacional a compreensão de que a escola não é diferente da
empresa e, por isso, detém a possibilidade de transportar para a escola os
princípios que gerem uma empresa, como segue.

A gestão de uma escola em pouco difere da gestão de uma


empresa. Na realidade, em muitos aspectos, a gestão de uma
escola apresenta nuances de complexidade que não se
encontram em muitas empresas. Assim sendo, nada mais
lógico do que partir da experiência gerencial empresarial
acumulada para desenvolver ferramentas de gestão escolar.
(INSTITUTO CO-RESPONSABILIDADE PELA EDUCAÇÃO,
2005, p. 3)

E, em Marcos Antonio Magalhães, presidente do ICE,

A TESE (Tecnologia Empresarial Socioeducacional) foi


desenhada para levar esses conceitos gerenciais para o
ambiente escolar e permitir ao Gestor o atingimento dos seus
objetivos de maneira estruturada e previsível. Eu considero
esta metodologia a espinha dorsal do processo de
transformação da escola pública brasileira, tão mal planejada,

20
O Instituto Co-responsabilidade pela Educação(ICE) é uma entidade privada, sem fins
lucrativos, que atua, diretamente, no Ensino Médio, por meio de seus parceiros, o Instituto
Qualidade no Ensino (IQE) e o Instituto Alfa e Bato, bem como Ensino Médio Integral, Ensino
Médio Profissional e Ensino Fundamental de 7º ao 9º ano. Foi criado em 2000, por um grupo
de empresários, com apoio governamental, a partir de uma articulação para reestruturação do
Ginásio Pernambucano. Mobilização da sociedade e da classe empresarial com instituições
governamentais (http://www.icebrasil.org.br/wordpress/).
100

tão mal gerida e que produz, como consequência, resultados


tão pífios. Concluo com uma palavra de agradecimento ao Dr.
Norberto Odebrecht, por permitir que utilizássemos a TEO
como matriz para a sistematização do presente modelo.
(INSTITUTO CO-RESPONSABILIDADE PELA EDUCAÇÃO,
2005, p. 6)

A partir de 2004, a Tecnologia Empresarial Odebrecht (TEO), em


conjunto às recomendações do Relatório de Jacques Delors, mormente no que
se refere aos Pilares da Educação Contemporânea, é incluída como módulo de
estudos no processo de formação dos gestores. Nos centros educacionais
onde a TESE é implantada e aplicada, aparecem os termos “projeto de vida” e
“protagonismo juvenil”.

Os educandos são vistos, assim, como capital humano, melhorando a


imagem da instituição ao apresentarem bons resultados e elevando os índices
de aprovação nas avaliações externas. Há, ainda, a menção ao treinamento
dos jovens para se tornarem empresários e desenvolverem um espírito
comprometido com os valores e os princípios da organização. No manual,
constam as principais premissas que garantirão a boa aplicação dos princípios
empresariais na escola pública.

4.3.6 Concepção de Campo

Uma questão que se levanta é qual a intencionalidade de uma empresa


em ofertar educação para os pobres do campo? No modelo de
desenvolvimento previsto para o Baixo Sul pelo Grupo Odebrecht não há
espaço para o protagonismo das pequenas comunidades rurais. Trata-se de
um modelo de desenvolvimento articulado entre o poder público e a iniciativa
privada que tomou para si a tarefas de realizar educação conformando
principalmente a juventude a esse modelo. A concepção de campo da
Fundação é o campo do latifúndio, pois a Fazenda Vale do Juliana é um
latifúndio de aproximadamente 5.000ha com sua produção baseada no
agronegócio; e latifúndio e agronegócio são incompatíveis com agricultura
camponesa e seu projeto de Educação do Campo. Aqui a concepção de campo
101

é a mesma contida no projeto da CFR-I. Campo de riquezas desperdiçadas


pela falta de tecnologias adequadas para explorá-las, campos de riquezas
desperdiçadas e baixos indicadores sociais porque a população não está
qualificada o suficiente para explorá-las e, campo como oportunidade de
grandes negócios.

4. 4 Os fundamentos da educação empresarial


102

QUADRO 2 – Comparativo das concepções estudadas

Categorias Instituição

Casa Familiar Rural de Igrapiúna: CFR – I Colégio Estadual Casa Jovem II – CECJ

Educação profissional – Técnico em Agroecologia Integrado


Curso Técnico em Agronegócio Integrado ao Ensino ao Ensino Médio e Educação de Jovens e Adultos – EJA
Modalidade/Curso/ Médio
Metodologia Metodologia da Alternância Regular e tempo integral em algumas turmas através do
programa “Mais Educação”

Divulgação nas comunidades rurais, escolas e Divulgação nas comunidades rurais, escolas e secretarias
secretarias municipais, principalmente de educação municipais, principalmente de educação
Ingresso
Processo Seletivo usando os critérios da idade e ser Matricula aberta seguindo o modelo da Secretaria Estadual de
originário de pequeno proprietário rural Educação

Jovens filhos de agricultores com idade média de 16 a


Público Atendido Adolescentes, jovens e Adultos de comunidades rurais
18 anos
Parceria Público-Privado envolvendo:
 Secretaria Estadual de Educação Parceria Público-Privado envolvendo:
Modelo de Gestão  Fundação Odebrecht através da OSCIP Casa  Conselho de pais
Jovem  Secretaria Estadual de Educação
 Conselho Comunitário  OSCIP Casa Jovem
 Outras Empresas Privadas
BNDES
COOPALM
Secretaria Estadual de Educação
Fundação Odebrecht Secretaria Municipal de Educação
Financiamento/Parcerias
Michelin Fundação Odebrecht
Odebrecht
SESI
103

Prefeitura Municipal de Igrapiúna


Secretaria de Educação do Estado da Bahia
Tributo ao Futuro
Oi

Outras Empresas/Fundações
Círculos de Leitura (Instituto Fernand Braudel-SP)
SESI – indústria do Conhecimento
Casa Jovem e OSCIP
Centro de Panificação Casa Jovem
Horta Pedagógica Casa Jovem;
Conselho Externo
SESI – indústria do Conhecimento Parceria com a Comunidade Quilombola Laranjeiras;
Projeto Caia na Rede Teatro na Escola
Programas Secretaria Estadual de Educação Percussão e Sustentabilidade
Secretaria Estadual de Educação
Mais Educação
Escola Aberta à Comunidade
Projeto de Integração Comunitária
Progestão
Fundação e Exército Brasileiro
Ação Cívico Social – ACISO
104

Fundamenta-se nos quatro Pilares da Educação:


Educação para Empregabilidade
Sócio-interacionismo-construtivista;
Educação como negócio
Na Ecopedagogia;
Concepção de Educação Educação como fator de desenvolvimento
Educação para o desenvolvimento dos Valores Humanos
Educação para formar o ser humano integrado ao
Educação como fator de desenvolvimento
modelo capitalista
Educação para formar o ser humano integrado ao modelo
capitalista

Formar mão-de-obra para atuar nas cooperativas,


Formar mão-de-obra para atuar nas cooperativas
especificamente a do palmito
Formar Empresários Rurais
Concepção de Trabalho Formar Empresários Rurais Educar pelo trabalho é mais prática que teoria.
Educar pelo trabalho é mais prática que teoria Dentro dos princípios a educação é o negócio da escola – os
resultados tem satisfazer a comunidade e investidores

Parceria público- privada


Parceria público- privada
Concepção de Gestão Instituição particular
Instituição Pública

Grande potencial de recursos naturais. Grande potencial de recursos naturais.


Potencial que não está sendo bem explorado pelos que Potencial que não está sendo bem explorado pelos que nele
Concepção de Campo nele vivem. vivem.
Grandes oportunidades de negócios. Grandes oportunidades de negócios.
Lugar de pobreza. Lugar de pobreza.
105

Na análise dos dois projetos de educação (um particular, idealizado,


construído e conduzido pela Fundação Odebrecht e demais empresas, a CFR-
I) e o outro de uma escola pública estadual, também concebida pela Fundação
Odebrecht, mas construída e mantida pelo Estado e conduzida por ambos, o
caso do Colégio Estadual Casa Jovem II, constata-se não haver diferenciação
nas concepções de educação e formação, educação e trabalho e campo nas
duas propostas. Há particularizações na organização do trabalho pedagógico,
no ingresso, no financiamento e na gestão; há distinção nos cursos
trabalhados: a primeira delas oferta curso de agronegócio, já a segunda, de
agroecologia.

Essa não individualização ocorre, em especial, porque ambas pertencem


ao PDCIS, em que a orientação da Fundação Odebrecht é para a produção do
capital humano, dando-se a interligação com o modelo que trabalha com os
quatro capitais: humano, produtivo, social e ambiental, denominado de ações
sinérgicas. A propósito, o vocábulo sinergia aparece, constantemente, nos
documentos de orientação da Fundação.

Essas „ações sinergicas‟ são o caminho apontado pela


Fundação Odebrecht para reverter o quadro de pobreza que é
incompatívecom à exuberância natural, à rica história, ao
valioso patrimônio cultural e à larga potencialidade econômica
Nesse sentido a educação tem o papel de promover „de tornar
próspera e dinâmica uma área rural com grande potencial
ambiental, fixando os jovens talentos no campo.‟
(ODEBRECHT, 2015)

Os ainda escassos estudos revelam que a educação para o campo do


Baixo Sul, sob a ótica do agronegócio, é uma educação para formação da força
de trabalho e imposição de ideologia; verifica-se, pois, uma “preocupação” da
iniciativa privada para com a educação dos pobres, fato esse que se estende
para todas as áreas, inclusive do trabalho.

Todos esses projetos educacionais concorrem com uma carga


ideológica que implica a redução da atuação estatal no que se refere à
proteção social. Essa tarefa passa a ser complementada pelo mercado,
incentivando, também, que as pessoas passem a buscar a proteção social na
família e em organizações não-governamentais (MARTINS, 2007); eis,
106

portanto, a razão pela qual as escolas recebem a identificação de casas


familiares.

Essa atuação da Fundação Odebrecht na região do Baixo Sul remete a


estudos que afirmam que a burguesia brasileira não restringe sua atuação à
aparelhagem estatal (NEVES, 2005); em verdade, ela se amplia como uma
diversificada rede de organismos de obtenção do consentimento do conjunto
da sociedade e atrai outros sujeitos políticos coletivos e seus aparelhos a
esses projetos. As Fundações funcionam e atuam como aparelho privado de
hegemonia que abrange várias frentes, principalmente ações político-
educativas de naturezas diversas. Isso reforça a compreensão de que o Estado
não perdeu o seu papel pedagógico, simplesmente o redefiniu sob novas
formas. (MARITNS, 2007).

Desde 1999, a Odebrecht opera no Programa Aliança com o


Adolescente pelo Desenvolvimento Sustentável no Nordeste, com o Instituto
Ayrton Senna, a Fundação Kellogg e o BNDES. A ideia era atuar em regiões
com baixos Índices de Desenvolvimento Humano e fora do eixo dinâmico da
economia do Brasil. Esse programa, com a contribuição da Fundação
Odebrecht, transformou-se, em 2002, no Instituto Aliança com o Adolescente
(ODEBRECHT, 2010): uma participação de fundações nacionais, internacionais
e financiamento público por meio do BNDES.

Conclui-se, assim, que o modelo de governança instituído no Baixo Sul


mantém o discurso de que a solução para superação da pobreza está na
empresa recebendo financiamento público para realizar as ações e, por outro
lado, todos se esforçando para que isso aconteça, de tal modo que educação
fundamentada na TEO signifique a educação para vida, trabalho e valores.
Trabalha-se, ainda, com a possibilidade de soluções abstratas para problemas
que são causados no campo, como, por exemplo, a ausência de uma Reforma
Agrária.

Busca-se, com isso, a identificação de jovens talentosos, elevando-os à


condição de protagonistas em termos de empreendedorismo, objetivando-se,
assim, organizar a juventude local na perspectiva de gerar atividades
produtivas, reduzindo o êxodo rural da região. Esses programas e projetos
eram baseados na filosofia das Organizações Odebrecht, para as quais “se
107

aprende fazendo”, fato que se generalizou por outras iniciativas na linha da


responsabilidade social.

Essa ideia do protagonismo juvenil, tão difundida nos projetos


educacionais da Fundação, designa a atuação do jovem como personagem
principal de uma iniciativa, atividade ou projeto voltado para a solução de
problemas reais. O cerne do protagonismo, portanto, é a participação ativa e
construtiva do jovem na vida da escola, da comunidade ou da sociedade mais
ampla. O jovem seria responsável pelo seu destino em um projeto cuja
finalidade é o aprimoramento do jovem protagonista, comprometido com o seu
futuro; a concepção do individuo a ser formado é o indivíduo empresário rural.
Isso está presente no projeto da CFR – I e subtendido no Casa Jovem II,
quando se afirma que a fundamentação está na TESE. Há um incentivo, nos
projetos, para o desenvolvimento da Atitude Empresarial e da escola que
prepara o educando para o trabalho, enquanto formadora de cidadãos éticos,
aptos a “empresariarem” suas competências e habilidades; eficaz nos
resultados, superando a expectativa da comunidade e do investidor social,
tendo o estudante como parceiro na construção de seu projeto de vida, bem
como os pais como educadores familiares e, também, parceiros do
empreendimento.

É reforçada a ideia de Corresponsabilidade – Parceiros públicos e


privados comprometidos com a melhoria da qualidade do Ensino Médio.

Com relação à educação e ao trabalho, outro ponto importante está em


que o conceito de educar pelo trabalho é mais ação prática do que teórica.
Dentro dos princípios da educação (que é o negócio da escola), os resultados
têm de satisfazer a comunidade e os investidores.

A Fundação Odebrecht apoia-se no marco de uma educação


empresarial e a investida do Estado é na iniciativa privada, que tem com ela
interesses convergentes. A perspectiva ora explicitada está em formar o jovem
empresário, criando a ilusão na juventude de que ela pode ser empresária.
Percebe-se, enfim, que a intenção é transformar agricultura camponesa num
aliado do agronegócio. O agronegócio consegue impor-se não apenas nas
relações de produção, mas, também, nos projetos educativos, pois se
apresenta como comprovação de que o campo pode e deve ser um local de
108

produção moderna, tecnológica, capitalista. Esses fatos constroem a ideologia


do agronegócio e a apresentam como o caminho a ser seguido por todos
aqueles que ainda não aderiram às inovações do capital. Há uma
intencionalidade da Fundação em preparar não somente os funcionários, mas
todas as comunidades do entorno, já que a maioria dessas comunidades está,
de alguma forma, associadas às diversas cooperativas operadas pela
Odebrecht na região.

Outro aspecto a ser considerado está na apropriação dos termos


construídos pelos movimentos sociais no sentido de mascarar a real
intencionalidade da educação. Revelam-se, nos Projetos, expressões como
“Saberes da Terra”, “Campo”, “Educação do Campo”, “Agroecologia”, entre
outros. Porém, apesar da Fundação apresentar, em seus textos, uma
concepção de campo como lugar de vida, como espaço onde deve haver novas
relações de respeito à natureza, onde as famílias devem permanecer com
dignidade criando condições para a juventude se manter, acaba por defender
um modelo de produção empresarial, um modelo de expansão previsto para o
Baixo Sul pelo Grupo Odebrecht, no qual não há espaço para o protagonismo d
juvenil. Trata-se de um modelo de desenvolvimento articulado entre o poder
público e a iniciativa privada, que tomou para si a tarefas de realizar educação,
conformando, em particular, a juventude a esse modelo. Veja-se que a
concepção de campo da Fundação é o campo do latifúndio.

A presença do empresariado na definição dos rumos e do conteúdo da


educação escolar, passando da filantropia empresarial à responsabilidade
social, aplica-se mais às necessidades atuais do capital, caracterizando-se
como: incentivo ao desenvolvimento do capital social em comunidades rurais
carentes; estímulo ao crescimento do voluntariado; responsabilidade das
empresas em executar políticas sociais em diferentes áreas, procurando
transformar a sociedade civil numa instância de relações harmoniosas que se
identifica com as políticas neoliberais.

Freres (2008) declara que o desemprego é gerado pelo próprio sistema


capitalista. É ilusório achar que a educação garanta que o indivíduo seja
empregado. Desemprego grande, o sistema se utiliza disso para que haja
109

concorrência entre os indivíduos: apenas os melhores ocupam vaga no


mercado de trabalho e os demais ficam de fora.

Assim sendo, a crise estrutural do capital a educação passou a ser


tomada como fator decisivo para o crescimento econômico, cumprindo uma
dupla função: ideológica, por repassar os interesses da classe dominante; e de
reprodução de saberes que essa classe necessita, no caso, saberes voltados
para a produção. Porém prosseguindo com Freres (2008), tem-se que, nessa
particularidade histórica do capital, em que são poucos os empregos, cumpre-
se mais com a primeira que com a segunda dessas funções. Nesse contexto, a
ideologia da empregabilidade ganhou a cooptação da subjetividade dos
trabalhadores,

A ideologia da empregabilidade, portanto, não se origina de


uma invenção ingênua e desinteressada. Pelo contrário, está
envolto de um conteúdo ideológico que busca cooptar a
subjetividade dos trabalhadores em favor do próprio capital. A
lógica de responsabilizar os indivíduos por estar ou não
empregados esconde de todos que sua condição é
decorrente do tipo de organização social baseada na
exploração dos homens pelos homens. (FRERES, 2008, p.
68).

É importante, também, ressaltar que há um vasto volume de recursos


são disponibilizados pelo Estado para a implementação desse projeto
educacional, segundo informação solicitada ao BNDES pelo serviço de
informação, a respeito da parceria do BNDES com a Fundação Odebrecht para
apoio ao Programa de Desenvolvimento e Crescimento Integrado com
Sustentabilidade do Baixo Sul da Bahia (PDCIS), cujo início data de
23/11/2009. Os repasses de recursos não reembolsáveis do BNDES para o
PDCIS do começo dessa parceria até dezembro de 2013 somaram R$
10.141.300,09, para apoio a projetos das seguintes instituições: Casa Familiar
Rural de Igrapiúna (CFR – I), Casa Familiar Agroflorestal (CFAF), Cooperativa
dos Produtores de Palmito do Baixo Sul da Bahia (COOPALM), Cooperativa de
Produtores Rurais de Presidente Tancredo Neves (COOPATAN) e Cooperativa
dos Aquicultores de Águas Continentais (COOPECON).

Além disso, o quadro seguinte demostra os recursos que foram captados


do Fundo da Infância e Adolescência (FIA) que estão, em torno, dos
110

6.000.000,00. À pesquisa foi inviável fazer outros levantamentos financeiros;


contudo, as duas fontes mencionadas já são patentes para se observar o
volume de recursos que o Estado tem disponibilizado para os projetos.

Quadro 3 Montante de recursos públicos recebidos por meio de projetos e programas

Montante de
Ação suplementar Atividades desenvolvidas recursos públicos
recebidos
R$ 113.784,44 – 2014
Projeto de Formação de R$ não divulgado –
Leitores em Parceria da 2013
Círculos de Leitura Fundação Odebrecht com
R$ 270.096,37 – 2012
Instituto Fernand Braudel/SP,
criado em 2008 R$ 839.644,44 – 2011
R$ 617.333,33 – 2010
Projeto de inclusão digital uma R$ 644,429,32- 2013
parceria da Microsoft,
Caia na Rede R$ 450.768,50 – 2012
Fundação Odebrecht, OI e Dell
em um Acordo de Cooperação R$ 248.100,00 – 2010

R$ 263.261,15 – 2014
Construindo uma Formação de Jovens da
R$ 528.383,14 – 2013
Juventude Melhor Construção Civil
R$335. 200,90 – 2012
Desenvolve projetos com temas
juventude, turismo e cidadania
Jovem, Turismo e
(oficinas de turismo, educação R$ 146.470,60 – 2012
Cidadania
patrimonial e Círculos de
Leitura

Através do IDES desenvolve


projetos com temas juventude,
Hospedar a Cultura e a
turismo e cidadania (oficinas de R$ 163.338,02 – 2014
Cidadania na Escola
turismo, educação patrimonial e
círculos de leitura)

R$66.295,86 – 2014
Tem como objetivo apoiar a R$ 77.075,80 – 2013
escola pública do Ensino
Eu adoro ser criança R$ 93.834,89 – 2012
Fundamental I através da arte e
da ludicidade R$ 122.728,00 -2011
R$ 86.556,00 – 2010
É uma parceria da Fundação
Pratigi pela Educação R$ 1.146.585,62 –
Odebrecht com o Instituto 2014
Chapada que consiste na
111

formação de professores,
coordenadores e gestores do
Ensino Fundamental I, tendo
como parceiros institucionais
Odebrecht, Natura, Itaú, Banco
do Brasil e parceiro técnico o
Tributo ao Futuro

O Projeto Trilhando Caminhos R$ 198.511,40 – 2014


desenvolve ações Não divulgado – 2013
socioeducativas com
Trilhando Caminhos R$ 205,339,51 - 2012
adolescentes entre a faixa
etária de 12 a 18 anos, em R$ 580.954,59 – 2011
zonas urbanas periféricas R$ 546.233,00 – 2010

Promove formação com os


Conselhos Municipais dos
Formação Continuada R$ 112. 150,00 – 2014
Direitos da Criança e do
Adolescente

Articulação da Rede de
Monitoramento das Redes
Garantia dos Direitos da Não divulgado – 2014
de Garantia
Criança e do Adolescente

As ações do projeto serão


Monitoramento de Políticas
dirigidas a 96 Conselheiros de R$ 215.994,27
Públicas
Direitos e Tutelares

Fonte: RIOS, 2015

No seu projeto popular de desenvolvimento, o governo Lula, governo


que intensificou esse projeto, utilizou-se, principalmente, de um discurso de
“apoio” do empresariado organizado, a partir de seus institutos e fundações.
Baiardi (2007) coloca tais iniciativas como possiblidade de “emancipação” dos
assentamentos e, o que é mais grave, afirma que não é possível, no Baixo Sul,
um avanço na ausência dessas organizações.

Obviamente que o modelo CFR não é alternativa à reforma


agrária, mas pode ser alternativa a todos os mecanismos
atualmente utilizados visando a emancipação de
assentamentos. Uma simples estimativa dos gastos por família
para emancipar assentamentos e para transformar produtores
tradicionais em pequenos empresários cooperantes irá
demonstrar o quanto estes últimos são sensivelmente
menores. Resta a pergunta de se será possível implantá-lo na
ausência de organizações da sociedade civil como o IDES e a
Fundação Emílio Odebrecht. (BAIARDI, 2007, p. 12)
112

Esse modelo de educação pressupõe uma adesão dos agentes produtivos


atuantes na região ao modelo de desenvolvimento conformador em que a empresa se
recria ao longo do tempo mantendo sua hegemonia na elaboração de estratégias de
exploração econômica.
113

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Identificar os fundamentos do projeto educacional da Fundação


Odebrecht no campo do Baixo Sul da Bahia, analisando as suas concepções
de educação, foi um percurso de reflexão sobre o lugar estratégico que a
educação ocupa na construção de um consenso da população ao projeto
societário burguês. As Orientações da Tecnologia Empresarial Odebrecht para
a Educação instituem um modelo de escola pública e privada, financiada com
recursos públicos, como braço pedagógico de um modelo de desenvolvimento
excludente, que, com o discurso da inclusão social, responsabiliza a população
pelos seus sucessos e fracassos; no caso, mais fracasso do que sucesso. A
região do Baixo Sul é rica, porém, ao mesmo tempo, pobre, pois os pobres, por
falta de uma educação de qualidade, não estão sabendo explorá-la. Esse é o
discurso.

Com um histórico de grilagem de terras, exploração da classe


trabalhadora e financiamento público aos seus projetos, a Odebrecht, em um
dado momento, seguindo um movimento nacional, centra força na educação
com o objetivo de melhorar sua imagem e diversificar, ainda mais, seus
negócios.

No percurso metodológico, foram levantadas as ações educacionais da


Fundação Odebrecht na região, sendo encontrado um volume muito grande de
ações tanto no campo da educação formal como em espaços fora do âmbito
escolar. Houve uma dificuldade, muito grande, de coleta de dados e, dada a
densidade do objeto, optou-se pela análise dos projetos de duas escolas. As
questões foram respondidas em parte. Foram distinguidos os fundamentos
sistematizados nos projetos, sendo possível identificar, enfaticamente, a
orientação empresarial para a educação do campo, realizada em termos
metodológicos.

Com base na revisão de literatura e análise dos projetos das escolas


selecionadas para estudo, observou-se que a Fundação Odebrecht atua, de
forma direta, na educação da região, tanto na esfera privada quanto na esfera
pública, conduzindo um colégio estadual e desenvolvendo atividades nas
escolas públicas. Os espaços escolares fomentados e dirigidos pela Fundação
114

são aparelhos difusores de sua ideologia e veículos de intervenção direta da


Odebrecht nas comunidades.

Essa intervenção se dá pela inserção das famílias no PDCIS, numa rede


de produção, beneficiamento e comercialização de produtos ligados à rede de
cooperativas pertencentes à empresa na região.

O estudo aponta interesse latente da burguesia brasileira na educação


pública, porque é, por meio desta, que se formará a mão-de-obra necessária
para o setor produtivo. E tal interesse se intensifica na Educação Profissional,
pois é aí que se formarão os técnicos para o trabalho no setor industrial e nas
atividades do campo, com o agronegócio vem exigindo qualificação dos
camponeses, já que, historicamente, a essas populações, foi negada a
educação básica. Nesse contexto, o Estado brasileiro tem cumprido o papel de
criar o aparato legal e jurídico que garanta a atuação do empresariado na
educação.

O Ensino Médio integrado ao Ensino Profissional no campo da região do


Baixo Sul da Bahia está a cargo de grupos empresariais, pois, em um
município de pouco mais de 13 mil habitantes, a Fundação Odebrecht conduz
duas instituições. O PDCIS, enquanto programa territorial, é um aparelho
difusor do consenso em torno do projeto de exploração da Odebrecht na região
e, como espaço de governança, tem todo o suporte financeiro do Estado para
desenvolvimento de suas ações. Fundamentados na Teoria do Capital
Humano, a ideologia da empregabilidade, que é a responsabilização do
indivíduo por ter ou não um emprego, tem essas escolas como espaço fecundo
para o desenvolvimento das atividades empreendedoras, o que, numa
perspectiva crítica, permitindo afirmar que as políticas educacionais servem
para justificar o desemprego estrutural, pois, num mercado competitivo,
sobressairá aquele que conseguir desenvolver personalidade empreendedora,
conhecimento e habilidades que ajudam a superar limites e determinar o ritmo
de trabalho e valores.

Apesar de a pesquisa não ter dado conta de levantar dados


educacionais na região sobre o público, supõe-se duas consequências desse
investimento do poder público nas instituições escolares privadas. Primeiro;
quando se disponibilizam recursos públicos para as instituições dos projetos,
115

as demais escolas públicas deixam de ser atendidas, ainda que sejam notórias
as péssimas condições de funcionamento das escolas do campo na região.
Segundo: essas ações proporcionam um esvaziamento da escola pública, pois
as garantias de funcionamento das escolas privadas são melhores e atraem
um maior número de educandos.

Os estudos apontam, ainda, uma interligação muito forte entre as


empresas e institutos que atuam em vários setores, bem como uma forte
influência dos organismos internacionais, que ditam metas a serem cumpridas
e orientam esse tipo de parceria com o estado para superação da resolução de
problemas.

Os fundamentos da educação praticada pelo empresariado, que, nessa


região, centra seus negócios no campo, estão no desenvolvimento das
habilidades e competências mínimas para aquisição de novas técnicas e
ensino de manejos de novas culturas, de acordo com a cooperativa à qual a
escola está interligada. Na replicação do modelo de gestão empresarial nas
escolas, é preciso cumprir as metas estabelecidas pelos investidores e difundir
a ideologia de que, nesse campo de tantas riquezas e extrema pobreza,
dispensam-se conflitos, ocupações de terras, para a resolução dos problemas.
É necessária a união de todos: empresas, com sua responsabilidade social;
Estado, com políticas públicas coordenadas por essas empresas; e
comunidades, aderindo ao projeto e colocando seus filhos para estudarem e
aprenderem novas práticas de desenvolvimento.

Nesse projeto estratégico, a educação é fator de aperfeiçoamento,


tornando-se, ao mesmo tempo, causa e consequência da pobreza no campo.
Dessa forma, as questões ambientais, os direitos sociais negados, a
concentração de terra são mascarados, fazendo com que a população acredite
que a pobreza existe pela ausência de investimentos na educação; a empresa
é colocada no patamar de salvadora porque consegue buscar recursos tanto
de entes privados como governamentais para tirar a região desse atraso.

Há um discurso de que o investimento em educação tem produzido


capital humano e os fundamentos da TEO estão presentes na fala das
pessoas. Termos como “ações sinérgicas”, que implicam o trabalho interligado
para produzir os quatro capitais; espírito de servir, discursos proferidos para
116

levar os funcionários a mais e mais se dedicarem ao trabalho, protagonismo


juvenil como tornar o jovem responsável pelo seu futuro aparecem nas
mensagens dos governantes em espaços públicos.

Conclui-se que o PDCIS tem atuado como educador para o consenso da


população do Baixo Sul ao modelo de desenvolvimento traçado para esta
região. Esse aparelho de hegemonia veicula a ideologia da empregabilidade,
iludindo a juventude rural.

Vale dizer, também, que a inserção do empresariado na educação não é


algo novo. Iniciou-se na reestruturação produtiva, quando passou a ser
essencial aumentar a produtividade, a fim de que o Brasil pudesse entrar na
concorrência internacional por mercado. Porém, esse modelo ganhou força
com o governo Lula concretizando as políticas neoliberais desenhadas no
governo anterior.

O PDCIS, que existe desde 2003 na região, apesar do vasto volume de


recursos públicos movimentados, não tem cumprido a sua promessa de
redução da pobreza. Como horizonte a esse domínio do capital, há uma
necessidade de fortalecimento da Educação do Campo, enquanto projeto da
classe trabalhadora que luta por um campo livre da exploração do capital, em
que a qualificação humana não seja subordinada às leis do mercado.

Porém, na continuidade dos estudos, há uma necessidade de ir além,


buscar, no campo, como isso se configura na prática, tanto nas escolas como
nas comunidades de origem desses educandos. Uma questão encontrada foi o
processo de declínio do Colégio Estadual Casa Jovem II. Na análise dos dois
projetos, o modelo de instituição particular, como é o caso das Casas
Familiares Rurais, tem atendido melhor aos anseios da Fundação.

A Fundação Odebrecht pauta seu projeto educacional numa concepção


de educação neoprodutivista configurando-se em uma nova versão da “teoria
do capital humano", que com a bandeira do "aprender a aprender" orienta as
escolas públicas de educação básica de todo o país..
117

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