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Informativo 603-STJ
Márcio André Lopes Cavalcante

ÍNDICE
DIREITO ADMINISTRATIVO
CONCURSOS PÚBLICOS
 O grave erro no enunciado – reconhecido pela própria banca examinadora – constitui flagrante ilegalidade apta a
ensejar a nulidade da questão.
 O espelho de prova, com a motivação da avaliação do candidato, deve ser apresentado antes ou durante a
divulgação do resultado, sob pena de nulidade.

CONSELHOS PROFISSIONAIS
 Suspensão ou cancelamento do registro do profissional que atrasar anuidades.

DIREITO CIVIL
CONTRATO DE SEGURO
 A criação de nova espécie de seguro não possui a proteção da Lei de Direitos Autorais.

UNIÃO ESTÁVEL
 Imóvel doado por um companheiro para o outro deve ser excluído do montante partilhável, nos termos do art. 1.659,
I, do CC.

DIREITO DO CONSUMIDOR
RESPONSABILIDADE PELO FATO DO PRODUTO
 Produto de periculosidade inerente e ausência de responsabilidade civil.

RESPONSABILIDADE PELO VÍCIO DO PRODUTO


 O fornecimento de bem durável ao seu destinatário final põe termo à eventual cadeia de seus fornecedores originais.

CONCESSIONÁRIAS DE SERVIÇOS PÚBLICOS


 Prazo prescricional em caso de repetição de indébito de tarifas de água e esgoto.

DIREITO EMPRESARIAL
CÉDULA DE PRODUTO RURAL
 Juros moratórios e cédula de produto rural financeira.

DIREITO PROCESSUAL CIVIL


AÇÃO RESCISÓRIA
 Figura do revisor na ação rescisória.

COBRANÇA DE ANUIDADES
 Suspensão ou cancelamento do registro do profissional que atrasar anuidades.

Informativo 603-STJ (07/06/2017) – Márcio André Lopes Cavalcante | 1


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DIREITO PROCESSUAL PENAL


COMPETÊNCIA
 Competência para julgar o delito do art. 241-A do ECA praticado por meio de Whatsapp ou chat do Facebook: Justiça
Estadual.

PROVAS
 Obrigar o suspeito a colocar seu celular em “viva voz” no momento de uma ligação é considerado prova ilícita, assim
como as que derivarem dela.

TRIBUNAL DO JÚRI
 O testemunho por ouvir dizer, produzido somente na fase inquisitorial, não serve como fundamento para pronúncia.

DIREITO TRIBUTÁRIO
REFIS
 Homologação da opção pelo REFIS e prestação de garantia ou arrolamento.

DIREITO PREVIDENCIÁRIO
SALÁRIO DE BENEFÍCIO
 Cálculo do salário de benefício e décimo terceiro salário.

DIREITO ADMINISTRATIVO

CONCURSOS PÚBLICOS
O grave erro no enunciado – reconhecido pela própria banca examinadora – constitui flagrante
ilegalidade apta a ensejar a nulidade da questão

Importante!!!
O STF, em recurso extraordinário com repercussão geral reconhecida, firmou a seguinte tese:
"Não compete ao Poder Judiciário, no controle de legalidade, substituir banca examinadora
para avaliar respostas dadas pelos candidatos e notas a elas atribuídas" (RE 632.853).
Do voto condutor do mencionado acórdão, percebe-se que a tese nele constante buscou
esclarecer que o Poder Judiciário não pode avaliar as respostas dadas pelo candidato e as
notas a eles atribuídas se for necessário apreciar o conteúdo das questões ou os critérios
utilizados na correção, exceto se flagrante a ilegalidade.
Ao analisar uma prova para o cargo de assessor do MPRS, o STJ decidiu anular uma das
questões discursivas pelo fato de que ela possuía um grave erro no enunciado, o que
prejudicou o candidato na elaboração de sua resposta.
No enunciado da questão constou a expressão “permissão de saída”, mas na verdade o
examinador queria saber sobre a “saída temporária”, tanto que a resposta padrão do gabarito
envolvia este segundo instituto. Houve, portanto, uma troca dos conceitos.
A própria comissão examinadora reconheceu que houve o erro no enunciado, mas afirmou
que isso não atrapalhou os candidatos e, por isso, manteve as notas.
O STJ, contudo, não concordou com isso e anulou a questão. Se a própria banca examinadora
reconhece o erro na formulação da questão, não se pode fechar os olhos para tal constatação
ao simplório argumento de que referido erro não influiria na análise do enunciado pelo
candidato.
Vale ressaltar que o STJ afirmou que esta anulação não contraria o que decidiu o STF no
julgamento do RE 632.853 por duas razões:

Informativo 603-STJ (07/06/2017) – Márcio André Lopes Cavalcante | 2


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1) o candidato não está buscando que o Poder Judiciário reexamine o conteúdo da questão ou
o critério de correção para decidir se a resposta dada por ele está ou não correta. Em outras
palavras, não se quer que recorrija a prova. O que o impetrante pretende é que seja
reconhecido que o enunciado da questão apresenta um erro grave insuperável.
2) o STF decidiu que, em regra, não é possível a anulação de questões de concurso, salvo se
houver ilegalidade a permitir a atuação do Poder Judiciário. Em outras palavras, existe uma
“exceção” à tese fixada no RE 632.853. E, no presente caso, estamos diante de uma flagrante
ilegalidade da banca examinadora.
STJ. 2ª Turma. RMS 49.896-RS, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 20/4/2017 (Info 603).

Imagine a seguinte situação adaptada:


João participou de concurso para o Ministério Público e foi aprovado na 1ª fase.
Uma das questões da prova discursiva perguntava: “quais são as consequências caso um apenado fuja
durante uma ‘permissão de saída’?”
João respondeu a questão com base no instituto da “permissão de saída”, que é previsto no art. 120 da LEP.
Ocorre que, na verdade, o examinador se enganou no momento de redigir o enunciado da questão. Em
vez de “permissão de saída”, ele queria dizer “saída temporária”, que é um outro instituto, previsto no
art. 122 da LEP.
Assim, quando João recebeu o resultado da prova se assustou porque errou a questão e, no gabarito
padrão divulgado pela banca, exigia-se que a resposta fosse dada com base na análise do instituto da
“saída temporária”.
João interpôs recurso administrativo, tendo, contudo, sido negado o pedido do candidato. Na resposta, a
banca reconheceu que houve erro na formulação da questão por conta da troca das expressões. No
entanto, afirmou que isso não atrapalhava o recorrente no momento da resposta, considerando que a
“questão tinha como objetivo que o candidato expressasse as implicações decorrentes da fuga de um
apenado durante licença concedida, prescindindo-se de qualquer análise dos institutos referidos”.
Desta forma, a banca entendeu que não havia erro substancial que pudesse alterar a análise da questão,
devendo, portanto, a pontuação dada ser mantida.

João ingressou com mandado de segurança afirmando que o ato praticado foi ilegal e pedindo a
anulação da questão com a atribuição para si dos respectivos pontos. O pedido foi acolhido pelo STJ?
SIM.

Tese fixada pelo STF no RE 632853


Inicialmente, o STJ relembrou que o STF já analisou a controvérsia sobre a possibilidade ou não de o Poder
Judiciário realizar o controle jurisdicional sobre o ato administrativo que profere avaliação de questões
em concurso público, tendo sido fixada a seguinte tese:
Não compete ao Poder Judiciário, no controle de legalidade, substituir banca examinadora para avaliar
respostas dadas pelos candidatos e notas a elas atribuídas.
Excepcionalmente, é permitido ao Judiciário juízo de compatibilidade do conteúdo das questões do
concurso com o previsto no edital do certame.
STF. Plenário. RE 632853, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 23/04/2015 (repercussão geral) (Info 782)

O STJ afirmou: eu não desconheço a existência dessa tese fixada pelo STF, porém a situação concreta de
João é diferente daquilo que o Supremo decidiu. Isso porque o candidato não está buscando que o Poder
Judiciário reexamine o conteúdo da questão ou o critério de correção para decidir se a resposta dada por
ele está ou não correta. Em outras palavras, não se quer que recorrija a prova. Se esse fosse o pedido, isso
seria claramente vedado, com base na tese acima explicada, que proíbe que o Poder Judiciário substitua
a banca nos critérios de correção por ela adotados.

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O que o impetrante pretende é que seja reconhecido que o enunciado da questão apresenta um erro
grave insuperável, qual seja, a troca das palavras "saída temporária" por "permissão de saída", fato
reconhecido pela própria banca.
Dessa forma, tem-se, no presente caso, um distinguishing (distinção) em relação ao precedente do STF.
Assim, é possível reconhecer circunstâncias particulares do caso concreto e que permitem fazer uma
diferenciação com o objetivo de não subordiná-lo ao precedente do STF.

Além disso, o STJ tem afirmado que essa tese do STF no RE 632853 é a regra geral, mas que existe uma
exceção: se houver flagrante ilegalidade, o Poder Judiciário poderia rever questões de concurso. Veja um
precedente no qual o STJ afirmou a existência dessa “exceção”:
(...) II. É firme a compreensão do STJ no sentido de que "o reexame dos critérios usados por banca
examinadora na formulação de questões, correção e atribuição de notas em provas de concursos públicos
é vedado, como regra, ao Poder Judiciário, que deve se limitar à análise da legalidade e da observância
às regras contidas no respectivo edital" (STJ, AgRg no AREsp 266.582/DF, Rel. Ministro HERMAN
BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 07/03/2013). Na mesma linha, recentemente - em 23/04/2015 -, o
Plenário do STF, apreciando o Tema 485 da Repercussão Geral, nos termos do voto do Relator, Ministro
GILMAR MENDES, conheceu e deu provimento ao RE 632.853/CE, para fixar a tese de que "não compete
ao Poder Judiciário, no controle de legalidade, substituir banca examinadora para avaliar respostas
dadas pelos candidatos e notas a elas atribuídas. Precedentes.
Excepcionalmente, é permitido ao Judiciário juízo de compatibilidade do conteúdo das questões do
concurso com o previsto no edital do certame" (DJe de 29/06/2015). (...)
STJ. 2ª Turma. AgRg no RMS 46.998/SC, Rel. Min. Assusete Magalhães, julgado em 01/09/2015.

Dever da banca de formular questões com enunciados corretos


Como já dito, a própria banca examinadora reconheceu o erro na formulação da questão. Não se pode
fechar os olhos para tal constatação ao simplório argumento de que o referido erro não influiria na análise
do enunciado pelo candidato.
É dever das bancas examinadoras zelarem pela correta formulação das questões, sob pena de agir em
desconformidade com a lei e o edital, comprometendo, sem sombra de dúvidas, o empenho realizado
pelos candidatos durante quase toda uma vida.
Nas exatas e sábias palavras do Min. Og Fernandes:
“Quantas pessoas não levam dois, três, quatro, dez anos ou mais se preparando para concursos públicos,
para depois se depararem com questões mal formuladas e, pior, com desculpas muitas das vezes
infundadas, de que tal erro na formulação não influiria na solução da questão, como vejo acontecer na
presente hipótese.
Assim, tenho que o caso é de flagrante ilegalidade a admitir a declaração de nulidade da questão.”
Diante disso, o STJ declarou nula a referida questão.

Em suma:
O grave erro no enunciado – reconhecido pela própria banca examinadora – constitui flagrante
ilegalidade apta a ensejar a nulidade da questão.
STJ. 2ª Turma. RMS 49.896-RS, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 20/4/2017 (Info 603).

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CONCURSOS PÚBLICOS
O espelho de prova, com a motivação da avaliação do candidato, deve ser apresentado antes ou
durante a divulgação do resultado, sob pena de nulidade

Importante!!!
A banca examinadora do certame, por ocasião da divulgação dos resultados das provas, deve
demonstrar, de forma clara e transparente, que os critérios de avaliação previstos no edital
foram devidamente considerados, sob pena de nulidade da avaliação.
As informações constantes dos espelhos de provas subjetivas representam a motivação do ato
administrativo, consistente na atribuição de nota ao candidato.
Essa motivação deve ser apresentada anteriormente ou concomitante à prática do ato
administrativo, pois caso se permita a motivação posterior, isso pode dar ensejo para que se
fabriquem, forjem ou criem motivações.
Não é legítima a conduta da banca examinadora de divulgar o espelho de provas com a
motivação das notas após ser contestada na via judicial ou administrativa.
Destaque-se também que não há fundamentação válida se a banca apenas divulga critérios
muito subjetivos e a nota global dos candidatos, desacompanhados do padrão de resposta e
das notas atribuídas para cada um dos critérios adotados.
STJ. 2ª Turma. RMS 49.896-RS, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 20/4/2017 (Info 603).

No caso das provas discursiva e oral, etapas em que há uma maior discricionariedade por parte dos
examinadores, mesmo assim é necessário que sejam divulgados os critérios de avaliação dos
candidatos?
SIM. Realmente nas provas dissertativa e oral existe uma margem maior para que o avaliador se valha de
suas impressões. Justamente por essa razão, tais etapas devem adotar critérios de avaliação e correção
os mais objetivos possíveis, a fim de evitar violação ao princípio da impessoalidade.
Dessa forma, o ideal é que as bancas examinadoras forneçam espelhos de correção que permitam ao
candidato condições de identificar:
a) o padrão de resposta esperado pela banca examinadora para cada questão;
b) a pontuação válida para cada um dos critérios;
c) a nota que lhe foi atribuída em cada um deles; e, por fim,
d) a nota global obtida pelo candidato.

Essas exigências são necessárias para possibilitar o exercício do devido processo administrativo recursal,
consagrado no art. 5º, LV, da CF/88: “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados
em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.”.

Motivação do ato administrativo


Vale ressaltar que tais informações que deverão constar nos espelhos das provas subjetivas como forma
de atribuição de nota ao candidato representam a “motivação do ato administrativo”. Essa motivação do
ato administrativo é uma exigência expressa dos arts. 2º e 50, III e § 1º, da Lei nº 9.784/99, que trata do
processo administrativo no âmbito federal.

Motivação deve ser anterior ou concomitante à divulgação do resultado


A motivação deve ser apresentada anteriormente ou concomitante à prática do ato administrativo. Isso
porque entende-se que se fosse permitida a motivação posterior, isso poderia dar ensejo para que se
fabricassem, forjassem ou criassem motivações para burlar eventual impugnação ao ato. Em outras
palavras, se fosse permitida a motivação posterior, o Administrador mal intencionado poderia decidir do

Informativo 603-STJ (07/06/2017) – Márcio André Lopes Cavalcante | 5


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jeito que quisesse e, depois, quando questionado, apresentaria motivação apenas para refutar aquela
impugnação.
Não se deve, portanto, admitir como legítima a prática imotivada de um ato que, ao ser contestado na via
judicial ou administrativa, venha o gestor "construir" algum motivo que dê ensejo à validade do ato
administrativo.
Por essa razão, repita-se: a motivação deve ocorrer, em regra, antes ou durante a prática do ato
administrativo. Exceção: a jurisprudência entende que, no caso de remoção ex officio, a motivação pode
ser apresentada mesmo após o ato ter sido praticado. Nesse sentido: STJ REsp 1.331.224/MG.

Mesmo que o edital não preveja que a banca deve motivar a correção da prova, o candidato poderá
exigir essa providência
Alguns editais de concursos públicos não preveem os critérios de correção ou, às vezes, embora os
prevejam, não estabelecem as notas ou a possibilidade de divulgação dos padrões de respostas que serão
atribuídos a cada um desses critérios.
Em tese, com suporte na máxima de que "o edital faz lei entre as partes", o candidato nada poderia fazer
caso o resultado de sua avaliação fosse divulgado sem a indicação dos critérios ou das notas a eles
correspondentes, ou, ainda, dos padrões de respostas esperados pela banca examinadora.
Tal pensamento, no entanto, não merece prosperar, pois os editais de concursos públicos não estão acima
da Constituição Federal ou das leis que preconizam os princípios da impessoalidade, do devido processo
administrativo, da motivação, da razoabilidade e proporcionalidade.
Assim, mesmo que o edital não preveja que a banca deve motivar a correção da prova, o candidato tem
direito de exigir essa providência.

Resumindo:
A banca examinadora do certame, por ocasião da divulgação dos resultados das provas, deve
demonstrar, de forma clara e transparente, que os critérios de avaliação previstos no edital foram
devidamente considerados, sob pena de nulidade da avaliação.
As informações constantes dos espelhos de provas subjetivas representam a motivação do ato
administrativo, consistente na atribuição de nota ao candidato.
Essa motivação deve ser apresentada anteriormente ou concomitante à prática do ato administrativo,
pois caso se permita a motivação posterior, isso pode dar ensejo para que se fabriquem, forjem ou criem
motivações.
Não é legítima a conduta da banca examinadora de divulgar o espelho de provas com a motivação das
notas após ser contestada na via judicial ou administrativa.
Destaque-se também que não há fundamentação válida se a banca apenas divulga critérios muito
subjetivos e a nota global dos candidatos, desacompanhados do padrão de resposta e das notas
atribuídas para cada um dos critérios adotados.
STJ. 2ª Turma. RMS 49.896-RS, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 20/4/2017 (Info 603).

CONSELHOS PROFISSIONAIS
Suspensão ou cancelamento do registro do profissional que atrasar anuidades

Segundo o art. 8º da Lei nº 12.514/2011, para que os Conselhos Profissionais ajuízem


execução fiscal cobrando anuidades em atraso, é necessário que o total da quantia executada
seja de, no mínimo, quatro vezes o valor da anuidade.
Mesmo sem poder executar a dívida, o Conselho Profissional poderá adotar uma outra sanção
contra o inadimplente: poderá suspender ou cancelar seu registro profissional.

Informativo 603-STJ (07/06/2017) – Márcio André Lopes Cavalcante | 6


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Assim, o fato de os conselhos não poderem executar dívidas inferiores a quatro vezes o valor
cobrado anualmente da pessoa física ou jurídica inadimplente, não impede que seja feita a
suspensão ou o cancelamento do registro do profissional que deixar de efetuar o pagamento
das anuidades. Isso está previsto no art. 8º, parágrafo único, da Lei nº 12.514/2011.
No caso específico dos Engenheiros e Arquitetos, o cancelamento do registro somente pode
acontecer desde que o atraso seja de, no mínimo, duas anuidades consecutivas (art. 64 da Lei
nº 5.194/66).
STJ. 2ª Turma. REsp 1.659.989-MG, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 25/4/2017 (Info 603)./

Veja comentários em Direito Processual Civil.

DIREITO CIVIL

CONTRATO DE SEGURO
A criação de nova espécie de seguro não possui a proteção da Lei de Direitos Autorais

O direito autoral não pode proteger as ideias em si, mas apenas as formas de expressá-las. Isso
porque as ideias constituem patrimônio comum da humanidade.
Assim, não há proteção autoral a ideia de fazer uma determinada espécie de contrato, por mais
inovadora e original que seja. No máximo, o texto das cláusulas pode ser protegido.
A Lei de Direitos Autorais não pode tolher a criatividade e a livre iniciativa, nem o avanço das
relações comerciais e da ciência jurídica, que ficaria estagnada com o direito de exclusividade
de certos tipos contratuais.
Assim, a criação de nova espécie de seguro não possui a proteção da Lei de Direitos Autorais.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.627.606/RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 02/05/2017 (Info 603).

Imagine a seguinte situação adaptada:


“Calma Seguros” é uma seguradora que desenvolveu um tipo de seguro inédito e específico, destinado a
indenizar o segurado em caso de danos ambientais ocorridos durante o transporte de carga.
Como já dito, não havia no mercado esse tipo de contrato de seguro, tendo sido idealizado pela “Calma”.
Este tipo de seguro foi um sucesso e as demais seguradoras passaram a também oferecê-lo.
A “Calma” não gostou e propôs uma ação de abstenção de uso cumulada com reparação por danos
materiais contra as seguradoras que estavam oferecendo esse tipo de seguro. Segundo alegou a autora,
houve violação dos direitos autorais quanto à criação desse seguro.

A tese da “Calma” foi aceita pelo STJ?


NÃO.
A criação de nova espécie de seguro não possui a proteção da Lei de Direitos Autorais.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.627.606/RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 02/05/2017 (Info 603).

A Lei nº 9.610/98 trata sobre os direitos autorais. Em seu art. 7º esta Lei estabelece que “são obras
intelectuais protegidas as criações do espírito, expressas por qualquer meio ou fixadas em qualquer
suporte, tangível ou intangível, conhecido ou que se invente no futuro”.

Todavia, para não haver o engessamento do conhecimento, bem como o comprometimento da livre
concorrência e da livre iniciativa, a própria Lei de Direitos Autorais restringe seu âmbito de atuação,

Informativo 603-STJ (07/06/2017) – Márcio André Lopes Cavalcante | 7


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elencando diversas hipóteses em que não há proteção de exclusividade. Dentre aquilo que não pode ser
objeto de proteção como direito autoral estão as “ideias”. Veja o que diz o art. 8º, I, da Lei:
Art. 8º Não são objeto de proteção como direitos autorais de que trata esta Lei:
I - as ideias, procedimentos normativos, sistemas, métodos, projetos ou conceitos matemáticos
como tais;

Assim, o direito autoral não pode proteger as ideias em si, visto que constituem patrimônio comum da
humanidade. Vigora, no ordenamento jurídico, o princípio da liberdade das ideias, de forma que é proibido
que haja direito de exclusividade sobre elas.

Conclui-se, assim, que não há proteção autoral ao contrato, por mais inovador e original que seja; no
máximo, o texto das cláusulas contido no pacto pode ser protegido, mas não a ideia em si do contrato.

No caso concreto, as demais seguradoras não utilizaram indevidamente os textos do contrato de seguro
idealizado pela “Calma”. Elas utilizaram apenas a ideia de fazer um contrato com esse mesmo objeto.

Admitir que a Lei de Direitos Autorais ponha métodos, estilos e técnicas (contratuais ou não) dentre os
bens passíveis de proteção tolheria não só a criatividade e a livre iniciativa, mas também o avanço das
relações comerciais e da ciência jurídica, a qual ficaria estagnada com o direito de exclusividade de certos
tipos contratuais.

Desse modo, é possível a coexistência de contratos de seguro com a mesma temática comercializados por
corretoras e seguradoras distintas sem que haja violação de direitos autorais.

UNIÃO ESTÁVEL
Imóvel doado por um companheiro para o outro deve ser excluído
do montante partilhável, nos termos do art. 1.659, I, do CC

O bem imóvel adquirido a título oneroso na constância da união estável regida pelo estatuto
da comunhão parcial, mas recebido individualmente por um dos companheiros, através de
doação pura e simples realizada pelo outro, deve ser excluído do monte partilhável, nos
termos do art. 1.659, I, do CC/2002:
Art. 1.659. Excluem-se da comunhão:
I - os bens que cada cônjuge possuir ao casar, e os que lhe sobrevierem, na constância do
casamento, por doação ou sucessão, e os sub-rogados em seu lugar;
Ex: João e Maria vivem em união estável. Durante este relacionamento, João comprou um
apartamento. Embora adquirido pelo esforço comum do casal, na constância da união estável,
o imóvel foi doado por João, de forma graciosa, à Maria. Isso significa que, no momento que for
feita a dissolução da união estável, este bem não irá integrar o montante partilhável. João,
quando doou o imóvel, o fez quanto à sua metade sobre o bem, que antes pertencia a ambos.
STJ. 4ª Turma. REsp 1.171.488-RS, Rel. Min. Raul Araújo, julgado em 4/4/2017 (Info 603).

Imagine a seguinte situação hipotética:


João e Maria viviam em união estável.
Durante este relacionamento, João comprou um apartamento e o doou a Maria.
Alguns anos depois a união chegou ao fim e iniciou-se a discussão quanto a divisão dos bens.

Informativo 603-STJ (07/06/2017) – Márcio André Lopes Cavalcante | 8


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Se duas pessoas estão vivendo em união estável, a lei prevê regras para disciplinar o patrimônio desse casal?
SIM. O Código Civil estabelece que, na união estável, as relações patrimoniais entre o casal obedecem às
regras do regime da comunhão parcial de bens (art. 1.725). Em outras palavras, é como se as pessoas que
vivem em união estável estivessem casadas sob o regime da comunhão parcial de bens.

Como funciona o regime da comunhão parcial?


O regime da comunhão parcial é tratado pelos arts. 1.658 a 1.666 do CC.
Nessa espécie de regime, comunicam-se os bens que sobrevierem ao casal, na constância do casamento,
com exceção dos casos previstos no Código Civil.
Dito de outro modo, os bens adquiridos durante a união passam a ser de ambos os cônjuges, salvo em
algumas situações que o Código Civil determina a incomunicabilidade. Veja o que diz a Lei:
Art. 1.658. No regime de comunhão parcial, comunicam-se os bens que sobrevierem ao casal, na
constância do casamento, com as exceções dos artigos seguintes.

O art. 1.660 lista bens que, se adquiridos durante o casamento, pertencem ao casal:
Art. 1.660. Entram na comunhão:
I — os bens adquiridos na constância do casamento por título oneroso, ainda que só em nome de
um dos cônjuges;
II — os bens adquiridos por fato eventual, com ou sem o concurso de trabalho ou despesa anterior;
III — os bens adquiridos por doação, herança ou legado, em favor de ambos os cônjuges;
IV — as benfeitorias em bens particulares de cada cônjuge;
V — os frutos dos bens comuns, ou dos particulares de cada cônjuge, percebidos na constância do
casamento, ou pendentes ao tempo de cessar a comunhão.

O art. 1.659, por sua vez, elenca aquilo que é excluído da comunhão:
Art. 1.659. Excluem-se da comunhão:
I — os bens que cada cônjuge possuir ao casar, e os que lhe sobrevierem, na constância do
casamento, por doação ou sucessão, e os sub-rogados em seu lugar;
II — os bens adquiridos com valores exclusivamente pertencentes a um dos cônjuges em sub-
rogação dos bens particulares;
III — as obrigações anteriores ao casamento;
IV — as obrigações provenientes de atos ilícitos, salvo reversão em proveito do casal;
V — os bens de uso pessoal, os livros e instrumentos de profissão;
VI — os proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge;
VII — as pensões, meios-soldos, montepios e outras rendas semelhantes.

Situação do apartamento
João pediu para ter direito à metade do apartamento doado à Maria. Segundo alegou, o imóvel foi
adquirido durante a união estável com o esforço comum, devendo, portanto, ser divido entre eles.

A tese de João foi aceita pelo STJ?


NÃO. O referido apartamento, embora adquirido pelo esforço comum do casal, na constância da união
estável, foi doado por João, de forma graciosa, à Maria, de modo que essa doação, por força do disposto
no art. 1.659, I, do CC, afasta o bem do monte partilhável. Quando João fez a doação, ele doou justamente
a sua parte no imóvel, não tendo mais direito sobre ele.

É possível a doação de um cônjuge para o outro?


No regime da comunhão parcial de bens, é possível sim.

Informativo 603-STJ (07/06/2017) – Márcio André Lopes Cavalcante | 9


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É possível a doação de um cônjuge para o outro no caso de três regimes de bens:


 regime da separação convencional de bens
 regime da comunhão parcial (havendo patrimônio particular) ou
 regime da participação final nos aquestos (quanto aos bens particulares).

Em suma:
O bem imóvel adquirido a título oneroso na constância da união estável regida pelo estatuto da
comunhão parcial, mas recebido individualmente por um dos companheiros, através de doação pura e
simples realizada pelo outro, deve ser excluído do monte partilhável, nos termos do art. 1.659, I, do
CC/2002.
STJ. 4ª Turma. REsp 1.171.488-RS, Rel. Min. Raul Araújo, julgado em 4/4/2017 (Info 603).

DIREITO DO CONSUMIDOR

RESPONSABILIDADE PELO FATO DO PRODUTO


Produto de periculosidade inerente e ausência de responsabilidade civil

Importante!!!
Para a responsabilização do fornecedor por acidente do produto não basta ficar evidenciado
que os danos foram causados pelo medicamento. O defeito do produto deve apresentar-se,
concretamente, como sendo o causador do dano experimentado pelo consumidor.
Em se tratando de produto de periculosidade inerente (medicamento com contraindicações),
cujos riscos são normais à sua natureza e previsíveis, eventual dano por ele causado ao
consumidor não enseja a responsabilização do fornecedor. Isso porque, neste caso, não se
pode dizer que o produto é defeituoso.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.599.405-SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 4/4/2017 (Info 603).

Imagine a seguinte situação hipotética:


João sofreu uma lesão no tornozelo jogando futebol.
O médico receitou o anti-inflamatório “Vioxx”.
Após um mês fazendo uso do remédio, foi constatado que ele adquiriu uma doença renal em virtude dos
efeitos colaterais do medicamento.
João acabou falecendo em virtude do problema.
Diante disso, seus herdeiros ingressaram com ação de indenização contra o laboratório que produzia o
remédio alegando que o medicamento foi a causa da insuficiência renal aguda que gerou a morte de João.

O pedido dos autores foi acolhido pelo STJ?


NÃO.

Teoria do risco do empreendimento


No que tange à responsabilidade do fornecedor pelo chamado “acidente de consumo”, cumpre esclarecer
que o Código de Defesa do Consumidor acolheu a chamada “teoria do risco do empreendimento” (ou risco
da atividade), segundo a qual o fornecedor responde objetivamente (ou seja, independente da
demonstração de culpa) por todos os danos causados ao consumidor pelo produto ou serviço que se
revele defeituoso. Isso se justifica porque a atividade econômica é desenvolvida, precipuamente, em
benefício do fornecedor, de modo que ele deve arcar com os riscos que decorrem dessa atividade.

Informativo 603-STJ (07/06/2017) – Márcio André Lopes Cavalcante | 10


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Apesar de ser objetiva, esta espécie de responsabilidade não é irrestrita, integral, na medida em que
pressupõe o preenchimento de requisitos próprios. Além disso, existe a possibilidade de que ocorram
excludentes de responsabilidade.
Assim, a teoria do risco do empreendimento não se confunde com a teoria do risco integral.

Fornecedor de produto perigoso


O fornecedor de um produto que possui uma periculosidade inerente não responde objetivamente pelo
simples fato de ter colocado o produto no mercado. Para que ele responda, é necessário que tenha violado
o dever jurídico de segurança, o que se dá com a fabricação e a inserção no mercado de um produto
defeituoso.
Em outras palavras, não basta que o produto seja perigoso, é necessário que seja defeituoso.
O próprio CDC reconhece que há determinados produtos que são naturalmente perigosos:
Art. 8º Os produtos e serviços colocados no mercado de consumo não acarretarão riscos à saúde
ou segurança dos consumidores, exceto os considerados normais e previsíveis em decorrência de
sua natureza e fruição, obrigando-se os fornecedores, em qualquer hipótese, a dar as informações
necessárias e adequadas a seu respeito.

Diz-se, neste caso, que são produtos com periculosidade inerente.


Como se observa do art. 8º, os riscos normais e previsíveis, em decorrência da natureza ou da fruição do
produto, são absolutamente admissíveis e o fato de um produto ser naturalmente perigoso não significa
que ele seja defeituoso.

Conforme explica a doutrina:


“(...) Há produtos e serviços que têm o chamado risco inerente (...) assim entendido o risco
intrinsecamente atado à própria natureza, qualidade da coisa ou modo de funcionamento, como uma faca
afiada, medicamentos com contraindicações, agrotóxicos. Não é possível realizar determinados
tratamentos médicos sem altos riscos, como a cirurgia em paciente idoso e de saúde fragilizada, ainda que
o serviço seja prestado com toda a técnica e segurança. Embora se mostre capaz de causar danos, a
periculosidade desses produtos e serviços é normal e conhecida - previsível em decorrência de sua própria
natureza -, em consonância com a expectativa legítima do consumidor.” (CAVALIERI FILHO, Sérgio.
Programa de Responsabilidade Civil. 10ª ed. São Paulo: Atlas, 2012, p. 523)

Medicamentos são produtos de periculosidade inerente


Os medicamentos em geral podem ser qualificados como produtos de periculosidade inerente. Isso
porque todos eles, sem distinção, guardam riscos à saúde dos consumidores, na medida em que causam
efeitos colaterais, alguns com maior e outros com menor gravidade.

Conceito de produto defeituoso


A definição do que seja produto defeituoso pode ser encontrada no § 1º do art. 12 do CDC:
Art. 12 (...)
§ 1º O produto é defeituoso quando não oferece a segurança que dele legitimamente se espera,
levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais:
I - sua apresentação;
II - o uso e os riscos que razoavelmente dele se esperam;
III - a época em que foi colocado em circulação.

Informativo 603-STJ (07/06/2017) – Márcio André Lopes Cavalcante | 11


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O defeito do produto pode ser:


 Defeito de concepção técnica: erro no projeto, utilização de material inadequado ou de componente
prejudicial à saúde ou à segurança do consumidor;
 Defeito de fabricação: falha na produção; ou
 Defeito de informação: prestação de informação insuficiente ou inadequada.

Ainda que o medicamento tenha sido a causa da morte, só haverá responsabilidade se ficar comprovado
que o produto era defeituoso
Para a responsabilização do fornecedor por acidente do produto não basta ficar evidenciado que os danos
foram causados pelo medicamento. É necessário que fique demonstrado que o produto era defeituoso.
O “Vioxx”, assim como todo remédio anti-inflamatório, possui como reação adversa a possibilidade de o
paciente vir a desenvolver doenças renais graves.
Essa possibilidade vinha, inclusive, expressamente prevista na bula do medicamento.
Trata-se, portanto, de risco inerente a esse tipo de medicamento, cuja previsão foi devidamente
informada ao consumidor, por meio da bula que o acompanha.
Em se tratando de produto de periculosidade inerente, cujos riscos são normais à sua natureza
(medicamento com contra-indicações) e previsíveis (na medida em que o consumidor é deles
expressamente advertido), eventual dano por ele causado ao consumidor não enseja a
responsabilização do fornecedor. Isso porque não se trata de produto defeituoso.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.599.405-SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 4/4/2017 (Info 603).

RESPONSABILIDADE PELO VÍCIO DO PRODUTO


O fornecimento de bem durável ao seu destinatário final
põe termo à eventual cadeia de seus fornecedores originais

O fornecimento de bem durável ao seu destinatário final, por removê-lo do mercado de


consumo, põe termo à cadeia de seus fornecedores originais. A posterior revenda desse
mesmo bem por seu adquirente constitui nova relação jurídica obrigacional com o eventual
comprador. Assim, os eventuais prejuízos decorrentes dessa segunda relação não podem ser
cobrados do fornecedor original.
Não se pode estender ao integrante daquela primeira cadeia de fornecimento a
responsabilidade solidária de que trata o art. 18 do CDC por eventuais vícios que o adquirente
da segunda relação jurídica venha a detectar no produto.
Ex: a empresa “Via Autos” alienou um carro para João que, depois de dois anos utilizando o
veículo, vendeu o automóvel para Pedro. Em seguida, Pedro percebeu que o hodômetro do
carro havia sido adulterado para reduzir a quilometragem. Pedro não poderá exigir a
responsabilização da “Via Autos” pelo vício do produto.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.517.800-PE, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 2/5/2017 (Info 603).

Imagine a seguinte situação hipotética:


A empresa “Via Autos” alienou um carro para João.
Depois de dois anos utilizando o veículo, João vendeu o automóvel para Pedro.
No momento da celebração do contrato, o hodômetro do automóvel indicava que o veículo havia
circulado 22.000 km.
Algum tempo depois, Pedro levou o carro para a revisão na revendedora autorizada da marca Fiat e foi
então surpreendido com a notícia de que, apesar de o hodômetro apontar 25.000 Km rodados, pelos
testes realizados, o percurso efetivamente realizado pelo automóvel foi de 52.000 Km. Constatou-se,
Informativo 603-STJ (07/06/2017) – Márcio André Lopes Cavalcante | 12
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portanto, que houve uma adulteração do hodômetro a fim de parecer que o carro havia rodado menos
do que o efetivo.
Diante disso, Pedro ajuizou ação de rescisão de contrato de compra e venda cumulada com pedido de
indenização por danos materiais e moral contra João e a empresa “Via Autos” afirmando que eles são
solidariamente responsáveis pelo vício do produto, nos termos do art. 18 do CDC, considerando que todos
eles integravam uma mesma cadeia de fornecedores. Veja a redação da Lei:
Art. 18. Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem
solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou
inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles
decorrentes da disparidade, com a indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem
ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o
consumidor exigir a substituição das partes viciadas.

Na ação, Pedro afirmou que não era capaz de apontar com precisão o momento da adulteração ou qual
dos personagens envolvidos na cadeia negocial do automóvel seria o real responsável pela prática do
ilícito, razão pela qual ajuizou a demanda contra ambos.

A tese de Pedro poderá ser acolhida? A empresa “Via Autos” também possui responsabilidade neste caso?
NÃO.

Duas relações jurídicas distintas


No caso concreto, são constatadas duas relações jurídicas bem distintas:
a) a primeira, típica relação de consumo representada pela alienação do veículo da “Via Autos” para João.
Nesta hipótese, a empresa é fornecedora e João consumidor (destinatário final do produto);
b) a segunda, típica relação contratual civil, consistente na venda e compra do veículo usado realizada por
João a Pedro. Nesta segunda relação, não incide o CDC considerando se tratar de uma alienação entre
particulares.

Responsabilidade solidária somente dentro da mesma cadeia de fornecimento


Só se pode falar em responsabilidade solidária entre os fornecedores integrantes de uma mesma cadeia
de oferecimento de produtos e/ou serviços, não podendo ser responsabilizado prestador pertencente à
cadeia anterior à retirada de bem durável do mercado de consumo (a partir de sua aquisição pelo
destinatário final) por prejuízos constatados no futuro em virtude da revenda do referido bem.
Uma primeira cadeia de consumo foi formada e se encerrou quando a “Via Autos” alienou o veículo a João
(consumidor final). Uma nova e independente cadeia se iniciou quando João, que adquiriu o automóvel e
lhe deu destinação final, decidiu revender o referido bem a Pedro.
Em outras palavras, o bem desvinculou-se de uma cadeia de consumo quando saiu de mercado para
integrar o acervo patrimonial de seu destinatário final, ou seja, quando saiu da “Via Autos” e passou ao
patrimônio de João, que o adquiriu como consumidor (e não para revender). Após ter usado um tempo e
decidido alienar o carro, o veículo foi inserido em outra cadeia de consumo desvinculada da primeira.
Entre as duas relações de consumo, houve uma descontinuidade, uma quebra, o que justifica a ausência
de responsabilidade solidária.
Assim, a empresa “Via Autos” não possui nenhuma relação jurídica com Pedro, que deve voltar seu pleito
indenizatório única e exclusivamente contra João.

Em suma:
O fornecimento do bem ao seu destinatário final, por removê-lo do mercado de consumo, põe termo à
cadeia de seus fornecedores originais. A posterior revenda desse mesmo bem por seu adquirente
constitui nova relação jurídica obrigacional com o eventual comprador. Assim, os eventuais prejuízos
decorrentes dessa segunda relação não podem ser cobrados do fornecedor original.

Informativo 603-STJ (07/06/2017) – Márcio André Lopes Cavalcante | 13


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Não se pode estender ao integrante daquela primeira cadeia de fornecimento a responsabilidade


solidária de que trata o art. 18 do CDC por eventuais vícios que o adquirente da segunda relação jurídica
venha a detectar no produto.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.517.800-PE, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 2/5/2017 (Info 603).

CONCESSIONÁRIAS DE SERVIÇOS PÚBLICOS


Prazo prescricional em caso de repetição de indébito de tarifas de água e esgoto

Súmula 412-STJ: A ação de repetição de indébito de tarifas de água e esgoto sujeita-se ao prazo
prescricional estabelecido no Código Civil.
O prazo prescricional para as ações de repetição de indébito relativo às tarifas de serviços de
água e esgoto cobradas indevidamente é de:
a) 20 (vinte) anos, na forma do art. 177 do Código Civil de 1916; ou
b) 10 (dez) anos, tal como previsto no art. 205 do Código Civil de 2002, observando-se a regra
de direito intertemporal, estabelecida no art. 2.028 do Código Civil de 2002.
STJ. 1ª Seção. REsp 1.532.514-SP, Rel. Min. Og Fernandes, Primeira Seção, julgado em 10/5/2017
(recurso repetitivo) (Info 603).

Repetição de indébito
Ação de repetição de indébito (ou ação de restituição de indébito) é a ação na qual o requerente pleiteia
a devolução de determinada quantia que pagou indevidamente.
A ação de repetição de indébito, ao contrário do que muitos pensam, não é restrita ao Direito Tributário.
Assim, por exemplo, se um consumidor é cobrado pelo fornecedor e paga um valor que não era devido,
poderá ingressar com ação de repetição de indébito para pleitear valor igual ao dobro do que pagou em
excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável (art. 42,
parágrafo único do CDC).

Imagine agora a seguinte situação hipotética:


O condomínio de apartamentos “Bem Viver” instalou um poço artesiano para utilização de seus
moradores. O condomínio manteve um único hidrômetro, no qual recebe água da concessionária para
eventuais emergências caso o poço artesiano apresente algum problema.
Apesar disso, a concessionária, durante anos, continuou cobrando do condomínio a tarifa de água não
com base na medição do hidrômetro, mas sim por meio de um cálculo por estimativa, de acordo com o
número de apartamentos existentes no local.
Depois de alguns anos pagando assim, o condomínio decidiu ingressar com ação pedindo a restituição da
quantia paga indevidamente (repetição do indébito).

Discussão quanto à prescrição


A concessionária contestou a demanda argumentando que a pretensão de cobrança de boa parte dos
valores pelo condomínio estaria prescrita. Isso porque, segundo a empresa, o prazo prescricional seria de
5 anos, com base no art. 1º do Decreto 20.910/1932, que trata sobre os prazos de ações propostas contra
a Fazenda Pública.
O condomínio, por sua vez, argumentava que deveriam ser aplicados os prazos previstos no Código Civil.

Qual das duas teses prevalece na jurisprudência: a da concessionária ou do condomínio? O prazo é o do


Decreto 20.910/1932 ou do Código Civil?
Do Código Civil. O STJ editou uma súmula tratando sobre o tema:

Informativo 603-STJ (07/06/2017) – Márcio André Lopes Cavalcante | 14


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Súmula 412-STJ: A ação de repetição de indébito de tarifas de água e esgoto sujeita-se ao prazo
prescricional estabelecido no Código Civil.

O valor cobrado pelas concessionárias de água pela prestação do serviço possui natureza jurídica de tarifa
(preço público). Dessa forma, o regime aplicável é o de direito privado, devendo, portanto, a prescrição
ser regida pelo Código Civil e não por uma norma que é válida para as relações jurídicas da Fazenda Pública.

Mas, afinal de contas, qual é o prazo prescricional previsto no Código Civil de 2002?
Não existe um dispositivo específico no Código Civil tratando exatamente dessa situação. Em razão disso,
aplica-se o prazo de 10 anos, conforme preconiza o art. 205 do CC:
Art. 205. A prescrição ocorre em dez anos, quando a lei não lhe haja fixado prazo menor.

Ocorre que essas cobranças indevidas da tarifa de água são antigas e muitas vezes ocorreram ainda na
vigência do Código Civil passado. Dessa forma, é importante investigar: qual era o prazo prescricional
para a repetição de indébito de tarifas de água no Código Civil de 1916?
20 anos (art. 177 do CC/1916).

Em suma:
 Se o fato ocorreu sob a vigência do CC/2002: o prazo prescricional é de 10 anos;
 Se o fato ocorreu sob a vigência do CC/1916: o prazo prescricional é de 20 anos.

Algumas vezes, o fato ocorreu na vigência do CC/1916, mas a ação somente foi proposta quando vigorava
o CC/2002. Neste caso, deve-se analisar a situação concreta para verificar se, quando entrou em vigor o
CC/2002, já havia se passado mais da metade do prazo prescricional. Isso vai ser importante para definir
se a prescrição continua sendo contada como 20 anos ou passou para 10. Trata-se da regra de direito
intertemporal prevista no art. 2.028 do CC/2002:
Art. 2.028. Serão os da lei anterior os prazos, quando reduzidos por este Código, e se, na data de
sua entrada em vigor, já houver transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei
revogada.

Exemplo:
Repetição de indébito de tarifa de água e esgoto prescrevia em 20 anos no CC-1916. No CC-2002 foi
reduzido para 10 anos.
 Se o usuário pagou a tarifa cobrada indevidamente em 1991, em 2003 (data em que entrou em vigor
o CC), já havia se passado 12 anos. Logo, prevalece o prazo do CC-1916 e este usuário só terá mais 8
anos para ajuizar a ação.
 Se o usuário pagou a tarifa em 1994, em 2003 havia se passado apenas 9 anos. Logo, será aplicado o
novo prazo do CC-2002 (de 10 anos). A partir de 11/01/2003 (data da entrada em vigor do CC-2002)
iniciou o prazo de 10 anos para que o usuário ajuizasse a ação.

O STJ definiu esse tema em sede de recurso especial repetitivo e fixou a seguinte tese:
O prazo prescricional para as ações de repetição de indébito relativo às tarifas de serviços de água e
esgoto cobradas indevidamente é de:
a) 20 (vinte) anos, na forma do art. 177 do Código Civil de 1916; ou
b) 10 (dez) anos, tal como previsto no art. 205 do Código Civil de 2002, observando-se a regra de direito
intertemporal, estabelecida no art. 2.028 do Código Civil de 2002.
STJ. 1ª Seção. REsp 1.532.514-SP, Rel. Min. Og Fernandes, Primeira Seção, julgado em 10/5/2017 (recurso
repetitivo) (Info 603).

Informativo 603-STJ (07/06/2017) – Márcio André Lopes Cavalcante | 15


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DIREITO EMPRESARIAL

CÉDULA DE PRODUTO RURAL


Juros moratórios e cédula de produto rural financeira

No caso de cédulas de PRODUTO rural financeira (CPR-F), os juros também estão limitados a
1% ao ano, conforme prevê o DL 167/67 para as cédulas de CRÉDITO rural?
1ª corrente: NÃO. A limitação dos juros moratórios ao patamar de 1% ao ano, estabelecida
pelo art. 5º, parágrafo único, do Decreto-Lei 167/67, não se aplica à cédula de produto rural
financeira (CPR-F).
STJ. 3ª Turma. REsp 1.435.979-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 30/3/2017 (Info 603).

2ª corrente: SIM. Os juros de mora no caso de CPR-F deverão ficar limitados em 1% ao ano, nos
termos do art. 5º do Decreto-Lei nº 167/1967.
STJ. 4ª Turma. AgInt no AREsp 906.114/PR, Rel. Min. Raul Araújo, julgado em 06/10/2016.

Títulos de crédito
O título de crédito é um documento por meio do qual se prova que existe uma obrigação entre o(s)
credor(es) e o(s) devedor(es), nos termos do que ali está escrito.
O conceito tradicional de título de crédito foi dado há décadas por um jurista italiano chamado Cesare
Vivante: “título de crédito é o documento necessário para o exercício do direito literal e autônomo nele
contido ou mencionado”.
Essa definição foi adotada pelo CC-2002:
Art. 887. O título de crédito, documento necessário ao exercício do direito literal e autônomo nele
contido, somente produz efeito quando preencha os requisitos da lei.

Os títulos de crédito são muito importantes para a economia porque eles facilitam a obtenção e a
circulação do crédito, além de conferirem maior segurança para os credores. Ex: se a pessoa quer comprar
uma mercadoria, mas não tem dinheiro no momento, ela poderá assinar uma nota promissória e entregá-
la ao vendedor, comprometendo-se a pagar a quantia em 30 dias. Houve a concessão de um crédito de
forma simplificada e o credor terá em mãos uma garantia de pagamento. Com isso, mais negócios podem
ser realizados.

Títulos rurais
Existem alguns títulos de crédito que são gerais e mais conhecidos, como é o caso da letra de câmbio,
duplicata, cheque etc.
No entanto, a experiência mostrou que seria interessante que fossem criados alguns títulos de crédito,
com características específicas, para facilitar as negociações envolvendo determinados setores da
economia.
Em suma, verificou-se a necessidade de criar títulos de crédito específicos para algumas transações
empresariais.
No caso da atividade rural, por exemplo, foram idealizados quatro títulos de crédito específicos, chamados
de “títulos rurais”. São eles:
a) Cédula de crédito rural;
b) Cédulas de produto rural;
c) Nota promissória rural;
d) Duplicata rural.

Informativo 603-STJ (07/06/2017) – Márcio André Lopes Cavalcante | 16


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Cédulas de Produto Rural (CPR)


As cédulas de produto rural foram criadas pela Lei nº 8.929/94 com o objetivo de estimular o
financiamento privado da atividade rural. Existem duas espécies de CPR:
 CPR física (art. 1º da Lei);
 CPR financeira (art. 4º-A da Lei).

CPR física CPR financeira


A cédula de produto rural física (CPR física) é um Na CPR financeira, o produtor rural ou a
título de crédito por meio do qual o produtor associação de produtores emite a CPR, recebendo
rural ou a associação de produtores rurais o dinheiro correspondente a “X” produtos rurais
(inclusive cooperativas) se compromete, em um (ex: 100kg de café, tipo tal) e comprometendo-se
documento, a entregar produtos rurais, em um a fazer a liquidação financeira da CPR (pagar a
momento futuro, recebendo, desde já, o quantia emprestada) em determinada data e
pagamento por essa venda. segundo os juros ali estipulados.
No dia do vencimento, o produtor rural entregará Em vez de entregar o produto rural, o produtor irá
ao credor os produtos rurais prometidos. pagar ao credor o valor do que tomou
emprestado.
Em outras palavras, a CPR física representa a Em outras palavras, a CPR financeira representa a
documentalização de um contrato de compra e documentalização de um contrato de
venda de produtos rurais, por meio do qual o financiamento, por meio do qual o produtor rural
vendedor recebe o pagamento antecipadamente, (ou associação) recebe um valor em dinheiro,
comprometendo-se a entregar os produtos rurais comprometendo-se a pagar em uma
em uma determinada data. determinada data futura.
Caso o emitente seja inadimplente, o credor Caso o emitente seja inadimplente, o credor
poderá ajuizar ação de execução para a entrega poderá ajuizar ação de execução por quantia
de coisa. certa.
É parecida com uma duplicata mercantil. É parecida com uma nota promissória.
Art. 1º Fica instituída a Cédula de Produto Rural Art. 4º-A. Fica permitida a liquidação financeira
(CPR), representativa de promessa de entrega de da CPR de que trata esta Lei, desde que
produtos rurais, com ou sem garantia observadas as seguintes condições:
cedularmente constituída. I - que seja explicitado, em seu corpo, os
referenciais necessários à clara identificação do
preço ou do índice de preços a ser utilizado no
resgate do título, a instituição responsável por sua
apuração ou divulgação, a praça ou o mercado de
formação do preço e o nome do índice;
II - que os indicadores de preço de que trata o
inciso anterior sejam apurados por instituições
idôneas e de credibilidade junto às partes
contratantes, tenham divulgação periódica,
preferencialmente diária, e ampla divulgação ou
facilidade de acesso, de forma a estarem
facilmente disponíveis para as partes
contratantes;
III - que seja caracterizada por seu nome, seguido
da expressão "financeira".

Informativo 603-STJ (07/06/2017) – Márcio André Lopes Cavalcante | 17


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Feitas estas considerações, imagine a seguinte situação hipotética:


João, um avicultor, emitiu uma cédula de produto rural financeira (CPR-F), mediante a qual se obrigou a
pagar a quantia de R$ 100 mil (equivalente a 10 toneladas de frango) à Cooperativa agrícola que lhe
emprestou o dinheiro.
No contrato, ficou previsto que os juros moratórios seriam de 12% ao ano.
João tornou-se inadimplente e a cooperativa ajuizou execução de título extrajudicial.
O devedor apresentou embargos à execução afirmando que os juros de mora previstos no contrato eram
ilegais e que eles deveriam ficar limitados a 1% ao ano, conforme previsto no art. 5º, parágrafo único, do
DL 167/67 (que trata sobre as cédulas de crédito rural):
Art. 5º (...)
Parágrafo único. Em caso de mora, a taxa de juros constante da cédula será elevável de 1% (um
por cento) ao ano.

A tese de João é acolhida pelo STJ? No caso de cédulas de PRODUTO rural financeira (CPR-F) os juros
também estão limitados a 1% ao ano, conforme prevê o DL 167/67 para as cédulas de CRÉDITO rural?
Existem duas correntes sobre o tema:
1ª corrente: NÃO 2ª corrente: SIM
A limitação dos juros moratórios ao patamar de Os juros de mora no caso de CPR-F deverão ficar
1% ao ano, estabelecida pelo art. 5º, parágrafo limitados em 1% ao ano, nos termos do art. 5º do
único, do Decreto-Lei 167/67, não se aplica à Decreto-Lei nº 167/1967.
cédula de produto rural financeira (CPR-F). STJ. 4ª Turma. AgInt no AREsp 906.114/PR, Rel.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.435.979-SP, Rel. Min. Paulo de Min. Raul Araújo, julgado em 06/10/2016.
Tarso Sanseverino, julgado em 30/3/2017 (Info 603).
Embora haja alguma semelhança entre a Cédula A cédula de produto rural tem a mesma natureza
de Crédito Rural (CCR) e a Cédula de Produto Rural jurídica da cédula de crédito rural e, portanto, está
(CPR), no que tange a aspectos formais dos títulos, submetida ao mesmo regramento imposto à
o certo é que são títulos diferentes não se cédula de crédito.
podendo aplicar para a Cédula de Produto Rural Diante disso, deve ser aplicado à cédula de
(CPR) as normas previstas no Decreto-Lei 167/67 produto rural o mesmo tratamento conferido à
considerando que este diploma disciplina as cédula de crédito rural quanto aos juros de mora,
Cédulas de Crédito Rural (CCR). devendo, portanto, eles ficarem limitados em 1%
Se houvesse a equiparação entre da CPR à CCR, ao ano, nos termos do art. 5º do Decreto-Lei nº
isso retiraria a maior utilidade da CPR, que é 167/1967.
justamente servir de alternativa à CCR,
considerando que esta é submetida a um rigoroso
dirigismo contratual, principalmente no que tange
aos juros remuneratórios e aos encargos da mora.
Assim, a única limitação passível de ser imposta
aos juros de mora da CPR é o limite estabelecido
na Lei da Usura, qual seja, "o dobro da taxa legal"
(art. 1º do Decreto 22.626/1933).

Informativo 603-STJ (07/06/2017) – Márcio André Lopes Cavalcante | 18


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DIREITO PROCESSUAL CIVIL

AÇÃO RESCISÓRIA
Figura do revisor na ação rescisória

Importante!!!
Ainda existe a figura do revisor na ação rescisória?
• Nas rescisórias julgadas pelo TJ e TRF: NÃO. O CPC/2015 eliminou, como regra geral, a figura
do revisor em caso de ação rescisória.
• Nas rescisórias julgadas pelo STJ: SIM. Nas ações rescisórias processadas e julgadas
originariamente no STJ, mesmo após o advento do CPC/2015, continua existindo a figura do
revisor. Isso porque existe previsão específica no art. 40, I da Lei nº 8.038/90, que continua
em vigor.
STJ. Corte Especial. AR 5.241-DF, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 5/4/2017 (Info 603).

Relator
Quando um processo (recurso ou ação de competência originária) chega ao Tribunal (TJ, TRF, STJ, STF), é
sorteado um magistrado (Desembargador ou Ministro) para exercer a função de relator deste processo.
O relator examina o recurso antes dos demais magistrados e elabora um relatório e um voto que serão
levados ao colegiado para que os demais juízes (em sentido amplo) decidam se concordam ou não com as
conclusões do relator.
Em tese, os demais magistrados do Tribunal somente têm conhecimento detalhado do processo quando
este é levado a julgamento pelo relator. Tirando o relator, os demais magistrados não precisam levar um
voto escrito para a sessão de julgamento.

Revisor
O revisor é um outro magistrado, que tem o dever de examinar o processo antes de ele ir a julgamento e
de elaborar um voto escrito sobre o caso.
Assim, depois de o relator elaborar seu relatório, ele o encaminha ao revisor, que irá analisá-lo e, quando
tiver terminado de estudar o processo, irá liberá-lo para julgamento.
O art. 551 do CPC/1973 afirmava que era obrigatória a figura do revisor em três processos que tramitam
nos Tribunais: apelação, embargos infringentes e ação rescisória.

O que fez o CPC/2015?


O CPC/2015 não mais previu a figura do revisor. Não existe um dispositivo semelhante ao art. 551 do
CPC/1973. Diante disso, em regra, não mais existe revisor.

Por que se falou “em regra”?


Porque existe uma exceção: continua existindo a figura do revisor no caso de ações rescisórias julgadas
pelo STJ. Isso se deve ao fato de que há um dispositivo expresso na Lei nº 8.038/90 prevendo o revisor
nestes casos. Confira:
Art. 40. Haverá revisão, no Superior Tribunal de Justiça, nos seguintes processos:
I - ação rescisória;

Mas esse art. 40, I, da Lei nº 8.038/90 não foi revogado pelo CPC/2015?
NÃO. O CPC/2015 revogou expressamente onze artigos da Lei nº 8.038/90, dentre os quais não estava o
art. 40. Logo, conclui-se que, quando o legislador quis revogar algum dispositivo da Lei nº 8.038/90, ele o

Informativo 603-STJ (07/06/2017) – Márcio André Lopes Cavalcante | 19


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fez expressamente. Dessa forma, o CPC/2015 optou por não revogar o art. 40, I, restando mantida a figura
do revisor no caso de ações rescisórias julgadas pelo STJ.

COBRANÇA DE ANUIDADES
Suspensão ou cancelamento do registro do profissional que atrasar anuidades

Segundo o art. 8º da Lei nº 12.514/2011, para que os Conselhos Profissionais ajuízem


execução fiscal cobrando anuidades em atraso, é necessário que o total da quantia executada
seja de, no mínimo, quatro vezes o valor da anuidade.
Mesmo sem poder executar a dívida, o Conselho Profissional poderá adotar uma outra sanção
contra o inadimplente: poderá suspender ou cancelar seu registro profissional.
Assim, o fato de os conselhos não poderem executar dívidas inferiores a quatro vezes o valor
cobrado anualmente da pessoa física ou jurídica inadimplente, não impede que seja feita a
suspensão ou o cancelamento do registro do profissional que deixar de efetuar o pagamento
das anuidades. Isso está previsto no art. 8º, parágrafo único, da Lei nº 12.514/2011.
No caso específico dos Engenheiros e Arquitetos, o cancelamento do registro somente pode
acontecer desde que o atraso seja de, no mínimo, duas anuidades consecutivas (art. 64 da Lei
nº 5.194/66).
STJ. 2ª Turma. REsp 1.659.989-MG, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 25/4/2017 (Info 603).

Qual é a natureza jurídica dos Conselhos Profissionais (exs.: CREA, CRM, COREN, CRO etc.)?
Os Conselhos Profissionais possuem natureza jurídica de autarquias federais.
Exceção: a OAB que, segundo a concepção majoritária, é um serviço público independente, categoria
ímpar no elenco das personalidades jurídicas existentes no direito brasileiro.

Anuidades
Os Conselhos podem cobrar um valor todos os anos dos profissionais que integram a sua categoria. A isso
se dá o nome de anuidade (art. 4º, II, da Lei nº 12.514/2011).

Qual é a natureza jurídica dessas anuidades?


Tais contribuições são consideradas tributo, sendo classificadas como “contribuições profissionais ou
corporativas”.

Fato gerador
O fato gerador das anuidades é a existência de inscrição no conselho, ainda que por tempo limitado, ao
longo do exercício (art. 5º da Lei nº 12.514/2011).

Execução fiscal
Como a anuidade é um tributo e os Conselhos profissionais são autarquias, em caso de inadimplemento,
o valor devido é cobrado por meio de uma execução fiscal.

Competência
A execução fiscal, nesse caso, é de competência da Justiça Federal, tendo em vista que os Conselhos são
autarquias federais (Súmula 66 do STJ).

Informativo 603-STJ (07/06/2017) – Márcio André Lopes Cavalcante | 20


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Lei nº 12.514/2011 fixou número mínimo de anuidades em atraso para ajuizamento da execução
O volume de inadimplência nesses Conselhos profissionais é muito alto, o que fazia com que fossem
ajuizadas, anualmente, milhares de execuções fiscais, a maioria referente a pequenos valores,
abarrotando a Justiça Federal. Além disso, o custo do processo judicial muitas vezes era superior ao crédito
perseguido por meio da execução.
Pensando nisso, o legislador editou a Lei nº 12.514/2011, trazendo uma restrição de valor para que o
Conselho possa ajuizar a execução fiscal cobrando as anuidades em atraso. Veja:
Art. 8º Os Conselhos não executarão judicialmente dívidas referentes a anuidades inferiores a 4
(quatro) vezes o valor cobrado anualmente da pessoa física ou jurídica inadimplente.

Desse modo, o art. 8º da Lei acima referida traz uma nova condição para que os Conselhos profissionais
ajuízem execuções fiscais: o total da quantia executada deverá ser, no mínimo, quatro vezes o valor da
anuidade.
Vale ressaltar que no valor correspondente a 4 anuidades no ano do ajuizamento computam-se também
as multas, juros e correção monetária, e não apenas a quantidade de parcelas em atraso. Assim, o
processamento da execução fiscal fica desautorizado somente quando os débitos exequendos
correspondam a menos de 4 vezes o valor cobrado anualmente da pessoa física ou jurídica inadimplente,
tomando-se como parâmetro para definir este piso o valor da anuidade referente ao ano de ajuizamento,
bem como os encargos legais (multa, juros e correção monetária).

Cancelamento do registro profissional


Importante registrar que, mesmo não podendo ajuizar a execução caso a dívida não seja superior a 4
anuidades, os Conselhos poderão tomar outras medidas contra o inadimplente, como, por exemplo,
suspender/cancelar o seu registro profissional. Isso está previsto no art. 8º da Lei nº 12.514/2011:
Art. 8º (...) Parágrafo único. O disposto no caput não limitará a realização de medidas
administrativas de cobrança, a aplicação de sanções por violação da ética ou a suspensão do
exercício profissional.

No caso dos Engenheiros e Arquitetos, existe uma previsão expressa na Lei nº 5.194/66, que regulamenta
essas profissões, autorizando o Conselho a cancelar o registro profissional desde que o atraso seja de 2
anos consecutivos:
Art. 64. Será automaticamente cancelado o registro do profissional ou da pessoa jurídica que
deixar de efetuar o pagamento da anuidade, a que estiver sujeito, durante 2 (dois) anos
consecutivos sem prejuízo da obrigatoriedade do pagamento da dívida.

Vale ressaltar que essa suspensão ou cancelamento, para serem considerados válidos, precisam respeitar
as garantias constitucionais, dentre elas o contraditório e a ampla defesa.

Informativo 603-STJ (07/06/2017) – Márcio André Lopes Cavalcante | 21


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DIREITO PROCESSUAL PENAL

COMPETÊNCIA
Competência para julgar o delito do art. 241-A do ECA praticado
por meio de Whatsapp ou chat do Facebook: Justiça Estadual

Importante!!!
O STF fixou a seguinte tese:
Compete à Justiça Federal processar e julgar os crimes consistentes em disponibilizar ou
adquirir material pornográfico envolvendo criança ou adolescente (arts. 241, 241-A e 241-B
do ECA), quando praticados por meio da rede mundial de computadores (internet).
STF. Plenário. RE 628624/MG, Rel. orig. Min. Marco Aurélio, Red. p/ o acórdão Min. Edson
Fachin, julgado em 28 e 29/10/2015 (repercussão geral) (Info 805).

O STJ, interpretando a decisão do STF, afirmou que, quando se fala em “praticados por meio
da rede mundial de computadores (internet)”, o que o STF quer dizer é que a postagem de
conteúdo pedófilo-pornográfico deve ter sido feita em um ambiente virtual propício ao livre
acesso. Por outro lado, se a troca de material pedófilo ocorreu entre destinatários certos no
Brasil, não há relação de internacionalidade e, portanto, a competência é da Justiça Estadual.

Assim, o STJ afirmou que a definição da competência para julgar o delito do art. 241-A do ECA
passa pela seguinte análise:
• Se ficar constatada a internacionalidade da conduta: Justiça FEDERAL. Ex: publicação do
material feita em sites que possam ser acessados por qualquer sujeito, em qualquer parte do
planeta, desde que esteja conectado à internet.
• Nos casos em que o crime é praticado por meio de troca de informações privadas, como nas
conversas via Whatsapp ou por meio de chat na rede social Facebook: Justiça ESTADUAL.
Isso porque tanto no aplicativo WhatsApp quanto nos diálogos (chat) estabelecido na rede
social Facebook, a comunicação se dá entre destinatários escolhidos pelo emissor da
mensagem. Trata-se de troca de informação privada que não está acessível a qualquer pessoa.
Desse modo, como em tais situações o conteúdo pornográfico não foi disponibilizado em um
ambiente de livre acesso, não se faz presente a competência da Justiça Federal.
STJ. 3ª Seção. CC 150.564-MG, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 26/4/2017 (Info 603).

Inciso V do art. 109 da CF/88


O art. 109 da CF/88 prevê a competência da Justiça Federal comum em 1ª instância.
Veja a hipótese trazida pelo inciso V:
Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar:
(...)
V - os crimes previstos em tratado ou convenção internacional, quando, iniciada a execução no
País, o resultado tenha ou devesse ter ocorrido no estrangeiro, ou reciprocamente;

Este inciso fixa competência criminal da Justiça Federal. Consiste em competência estabelecida em função
da matéria.

Informativo 603-STJ (07/06/2017) – Márcio André Lopes Cavalcante | 22


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Requisitos para aplicação do inciso V


Para que o delito seja de competência da Justiça Federal com base neste inciso, são necessários três
requisitos:
a) que o fato seja previsto como crime em tratado ou convenção;
b) que o Brasil tenha assinado tratado/convenção internacional se comprometendo a combater essa
espécie de delito;
c) que exista uma relação de internacionalidade entre a conduta criminosa praticada e o resultado
produzido que foi produzido ou que deveria ter sido produzido.

Relação de internacionalidade
A relação de internacionalidade ocorre quando:
• iniciada a execução do crime no Brasil, o resultado tenha ou devesse ter ocorrido no estrangeiro;
• iniciada a execução do crime no estrangeiro, o resultado tenha ou devesse ter ocorrido no Brasil.

Desse modo, não basta que o crime esteja previsto em tratado ou convenção internacional para ser
julgado pela Justiça Federal.

Exemplos
Podemos citar os seguintes exemplos de crimes que poderão ser submetidos a julgamento pela Justiça
Federal com fundamento no art. 109, V, da CF/88, desde que haja relação de internacionalidade, por
serem previstos em tratados internacionais:
a) tráfico transnacional de drogas (art. 70, da Lei nº 11.343/2006);
b) tráfico internacional de arma de fogo (art. 18 da Lei nº 10.826/2003);
c) tráfico internacional de pessoas para fim de exploração sexual (art. 149-A do CP);
d) envio ilegal de criança ou adolescente para o exterior (art. 239 do ECA).

Todo crime praticado pela internet é de competência da Justiça Federal com base neste inciso V?
Obviamente que não. Segundo entendimento pacífico da jurisprudência, o fato de o delito ter sido
cometido pela rede mundial de computadores não atrai, por si só, a competência da Justiça Federal.
Para que o delito cometido por meio da internet seja julgado pela Justiça Federal, é necessário que ele
preencha os requisitos acima explicados.

Disponibilizar ou adquirir material pornográfico envolvendo criança ou adolescente


O ECA prevê três crimes que punem a conduta de disponibilizar ou adquirir material pornográfico
envolvendo criança ou adolescente. Veja:
Art. 241. Vender ou expor à venda fotografia, vídeo ou outro registro que contenha cena de sexo
explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente:
Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa.

Art. 241-A. Oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, distribuir, publicar ou divulgar por qualquer
meio, inclusive por meio de sistema de informática ou telemático, fotografia, vídeo ou outro
registro que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente:
Pena – reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa.
(...)

Art. 241-B. Adquirir, possuir ou armazenar, por qualquer meio, fotografia, vídeo ou outra forma
de registro que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou
adolescente:
Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.

Informativo 603-STJ (07/06/2017) – Márcio André Lopes Cavalcante | 23


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(...)

De quem será a competência para julgar esses delitos caso tenham sido praticados por meio da internet?
O STF decidiu que a competência é da Justiça Federal, com base no art. 109, V, da CF/88.
Os delitos acima listados são crimes que o Brasil, por meio de tratado internacional, comprometeu-se a
reprimir. Trata-se da Convenção sobre Direitos da Criança, adotada pela Assembleia Geral das Nações
Unidas, aprovada pelo Decreto Legislativo 28/90 e pelo Decreto 99.710/90.
Se o crime é praticado por meio de página na internet, o vídeo ou a fotografia envolvendo a criança ou o
adolescente em cenas de sexo ou de pornografia poderão ser visualizados em qualquer computador do
mundo. Ocorre, portanto, a transnacionalidade do delito.
Vale ressaltar que, tendo sido divulgado o conteúdo pedófilo por meio de alguma página da internet, isso
já é suficiente para configurar a relação de internacionalidade, porque o material se tornou acessível por
alguém no estrangeiro. Não é necessário que se prove que alguém no estrangeiro efetivamente tenha
acessado.

A tese firmada pelo STF ficou assim redigida:


Compete à Justiça Federal processar e julgar os crimes consistentes em disponibilizar ou adquirir
material pornográfico envolvendo criança ou adolescente [artigos 241, 241-A e 241-B da Lei 8.069/1990]
quando praticados por meio da rede mundial de computadores.
STF. Plenário. RE 628624/MG, Rel. Orig. Min. Marco Aurélio, Red. p/ o acórdão Min. Edson Fachin, julgado
em 28 e 29/10/2015 (repercussão geral) (Info 805).

De quem será a competência territorial neste caso?


A competência territorial é da Seção Judiciária do local onde o réu publicou as fotos, não importando o
Estado onde se localize o servidor do site: STJ. CC 29.886/SP, julgado em 12/12/2007.
E se o réu publicou as fotos no exterior? Esse crime poderá ser julgado pelo Brasil, por se enquadrar na
hipótese prevista no art. 7º, II, do CP, cumpridas as condições previstas no § 2º do mesmo art. 7º. Em
sendo preenchidos tais requisitos, o delito seria julgado no Brasil pela Justiça Federal, sendo competente
a Seção Judiciária da capital do Estado onde o acusado por último morou ou, se nunca residiu aqui, será
competente a Seção Judiciária do Distrito Federal (art. 88 do CPP).

Intepretação dada pelo STJ à tese fixada pelo STF no RE 628624/MG


Se você observar a tese do STF no RE 628624/MG, verá que ela é bem ampla e afirma que os crimes de
disponibilizar ou adquirir material pornográfico envolvendo criança ou adolescente, quando praticados
por meio da internet, são de competência da Justiça Federal.
O STJ, no entanto, interpretando a tese do STF, afirmou que nos casos em que o crime é praticado por
meio de troca de informações privadas, como nas conversas via Whatsapp ou por meio de chat na rede
social Facebook, a competência será da Justiça ESTADUAL.
As conversas via Whatsapp ou chat do Facebook precisam de internet para acontecer. No entanto, o STJ
afirmou que, nestes casos, a comunicação ocorre entre pessoas específicas, escolhidas pelo emissor da
mensagem. Trata-se, portanto, de uma troca de informações privadas que não estão acessíveis a qualquer
pessoa.
Diante disso, neste caso, não há competência da Justiça Federal porque a postagem de conteúdo pedófilo-
pornográfico não foi feita em um ambiente propício ao livre acesso.

Resumindo:
O STF fixou a seguinte tese:
Compete à Justiça Federal processar e julgar os crimes consistentes em disponibilizar ou adquirir
material pornográfico envolvendo criança ou adolescente (arts. 241, 241-A e 241-B do ECA), quando
praticados por meio da rede mundial de computadores (internet).

Informativo 603-STJ (07/06/2017) – Márcio André Lopes Cavalcante | 24


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STF. Plenário. RE 628624/MG, Rel. orig. Min. Marco Aurélio, Red. p/ o acórdão Min. Edson Fachin,
julgado em 28 e 29/10/2015 (repercussão geral) (Info 805).

O STJ, interpretando a decisão do STF, afirmou que, quando se fala em “praticados por meio da rede
mundial de computadores (internet)”, o que o STF quer dizer é que a postagem de conteúdo pedófilo-
pornográfico deve ter sido feita em um ambiente virtual propício ao livre acesso. Por outro lado, se a
troca de material pedófilo ocorreu entre destinatários certos no Brasil não há relação de
internacionalidade e, portanto, a competência é da Justiça Estadual.

Assim, o STJ afirmou que a definição da competência para julgar o delito do art. 241-A do ECA passa
pela seguinte análise:
• Se ficar constatada a internacionalidade da conduta: Justiça FEDERAL. Ex: publicação do material feita
em sites que possam ser acessados por qualquer sujeito, em qualquer parte do planeta, desde que
esteja conectado à internet.
• Nos casos em que o crime é praticado por meio de troca de informações privadas, como nas conversas
via Whatsapp ou por meio de chat na rede social Facebook: Justiça ESTADUAL.
Isso porque tanto no aplicativo WhatsApp quanto nos diálogos (chat) estabelecido na rede social
Facebook, a comunicação se dá entre destinatários escolhidos pelo emissor da mensagem. Trata-se de
troca de informação privada que não está acessível a qualquer pessoa.
Desse modo, como em tais situações o conteúdo pornográfico não foi disponibilizado em um ambiente
de livre acesso, não se faz presente a competência da Justiça Federal.
STJ. 3ª Seção. CC 150.564-MG, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 26/4/2017 (Info 603).

PROVAS
Obrigar o suspeito a colocar seu celular em “viva voz” no momento de uma ligação é
considerado prova ilícita, assim como as que derivarem dela

Sem consentimento do réu ou prévia autorização judicial, é ilícita a prova, colhida de forma
coercitiva pela polícia, de conversa travada pelo investigado com terceira pessoa em telefone
celular, por meio do recurso "viva-voz", que conduziu ao flagrante do crime de tráfico ilícito
de entorpecentes.
STJ. 5ª Turma. REsp 1.630.097-RJ, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, julgado em 18/4/2017 (Info 603).

Imagine a seguinte situação hipotética:


Ao fazer uma ronda, a polícia abordou João, suspeito de ser um traficante de drogas no bairro.
Durante a revista pessoal que estava sendo feita em João, seu telefone celular tocou.
O policial, então, ordenou: “atende aí e coloca no viva voz”.
Quem estava ligando para João era a sua mãe, tendo ela dito: “meu filho, vem pra casa agora. Tem um cara
mau encarado aqui e ele está perguntando onde está o material que você estava guardando para ele.”
Os policiais ouviram a conversa e obrigaram João a levá-los até a sua casa.
Chegando lá, com autorização da mãe de João, ingressaram na residência e encontraram uma grande
quantidade de droga.
João e o outro traficante foram presos em flagrante, depois denunciados e condenados.
A defesa impugnou a condenação afirmando que a prova obtida foi ilícita. Isso porque o réu foi obrigado
a reproduzir a conversa telefônica no sistema viva-voz do celular, sendo obrigado a produzir prova contra
si mesmo.

Informativo 603-STJ (07/06/2017) – Márcio André Lopes Cavalcante | 25


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O STJ concordou com a argumentação da defesa? A prova colhida é nula?


SIM.

A prova de que o réu era realmente traficante foi obtida por meio de flagrante violação ao direito
constitucional à não autoincriminação. Isso porque ele foi compelido a reproduzir, contra si, conversa
travada com terceira pessoa pelo sistema viva-voz do celular, que conduziu os policiais à sua residência e
culminou com a descoberta da droga. Qualquer tipo de prova contra o réu que dependa dele mesmo só
vale se o ato for feito de forma voluntária e consciente. No caso concreto, constatou-se que o condenado
foi obrigado a colocar a conversa no viva-voz.

O art. 5º, LXIII, da CF/88 assegura ao cidadão o direito de não se autoincriminar ou de não fazer prova
contra si mesmo, instituto também consagrado no Pacto de São José da Costa Rica, que foi internalizado
no País por meio do Decreto nº 678/1992.

Vale ressaltar que, como a prova foi ilícita na origem da diligência (oitiva da conversa no viva-voz), todos
os demais elementos informativos colhidos a partir dela também são ilícitos, por derivação. Trata-se da
aplicação da teoria do “fruto da árvore envenenada” (fruit of the poi-sonous tree). Já que a árvore está
envenenada (isto é, se uma prova é ilícita), os seus frutos (as demais provas obtidas a partir da prova ilícita)
também estarão envenenados como consequência lógica. Essa teoria foi expressamente consagrada no §
1º do art. 156 do CPP:
Art. 157. São inadmissíveis, devendo ser desentranhadas do processo, as provas ilícitas, assim
entendidas as obtidas em violação a normas constitucionais ou legais.
§ 1º São também inadmissíveis as provas derivadas das ilícitas, salvo quando não evidenciado o
nexo de causalidade entre umas e outras, ou quando as derivadas puderem ser obtidas por uma
fonte independente das primeiras.

Neste caso, não se pode dizer que tenha havido a chamada “descoberta inevitável”, que ocorre quando a
prova derivada seria descoberta de qualquer forma, com ou sem a prova ilícita. Isso porque ficou claro
que os policiais somente souberam da existência da droga por conta da conversa telefônica mantida entre
o suspeito e sua mãe no viva-voz.

Desse modo:
Sem consentimento do réu ou prévia autorização judicial, é ilícita a prova, colhida de forma coercitiva
pela polícia, de conversa travada pelo investigado com terceira pessoa em telefone celular, por meio do
recurso "viva-voz", que conduziu ao flagrante do crime de tráfico ilícito de entorpecentes.
STJ. 5ª Turma. REsp 1.630.097-RJ, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, julgado em 18/4/2017 (Info 603).

TRIBUNAL DO JÚRI
O testemunho por ouvir dizer, produzido somente na fase inquisitorial,
não serve como fundamento para pronúncia

O testemunho por ouvir dizer (hearsay rule), produzido somente na fase inquisitorial, não
serve como fundamento exclusivo da decisão de pronúncia, que submete o réu a julgamento
pelo Tribunal do Júri.
STJ. 6ª Turma. REsp 1.373.356-BA, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 20/4/2017 (Info 603).

Informativo 603-STJ (07/06/2017) – Márcio André Lopes Cavalcante | 26


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Procedimento do Tribunal do Júri


Quando a pessoa pratica um crime doloso contra a vida, ela responde a um processo penal que é regido
por um procedimento especial próprio do Tribunal do Júri (arts. 406 a 497 do CPP).

Procedimento bifásico do Tribunal do Júri


O procedimento do Tribunal do Júri é chamado de bifásico (ou escalonado) porque se divide em duas
etapas:
1) Fase do sumário da culpa (iudicium accusationis): é a fase de acusação e instrução preliminar (formação
da culpa). Inicia-se com o oferecimento da denúncia (ou queixa) e termina com a preclusão da sentença
de pronúncia.
2) Fase de julgamento (iudicium causae).

Sentença que encerra o sumário da culpa


Ao final da 1ª fase do procedimento do júri (sumário da culpa), o juiz irá proferir uma sentença, que poderá
ser de quatro modos:
PRONÚNCIA IMPRONÚNCIA ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA DESCLASSIFICAÇÃO
O réu será pronunciado O réu será impronunciado O réu será absolvido, desde Ocorre quando o juiz se
quando o juiz se convencer quando o juiz não se logo, quando estiver convencer de que o fato
de que existem prova da convencer: provado (a): narrado não é um crime
materialidade do fato e  da materialidade do fato;  a inexistência do fato; doloso contra a vida, mas sim
indícios suficientes de  da existência de indícios  que o réu não é autor ou um outro delito, devendo,
autoria ou de participação. suficientes de autoria ou partícipe do fato; então, remeter o processo
de participação.  que o fato não constitui para o juízo competente.
crime; Ex.: juiz entende que não
 que existe uma causa de houve homicídio doloso, mas
isenção de pena ou de sim latrocínio.
exclusão do crime.
Ex.: a única testemunha que
havia reconhecido o réu no IP Ex.: todas as testemunhas
não foi ouvida em juízo. ouvidas afirmaram que o réu
não foi o autor dos disparos.
Recurso cabível: RESE. Recurso cabível: APELAÇÃO. Recurso cabível: APELAÇÃO. Recurso cabível: RESE.

Imagine agora a seguinte situação hipotética:


Pedro foi morto com 5 tiros.
Foi instaurado inquérito policial para apurar o ocorrido.
Foram ouvidas duas testemunhas que afirmaram que não presenciaram o delito, mas que ouviram dizer
que o autor do homicídio foi João.
João foi, então, denunciado por homicídio doloso.
Durante a instrução as referidas testemunhas não foram mais localizadas e o único processual realizado
foi o interrogatório do réu que negou o crime.

João poderá ser pronunciado?


NÃO.

A Constituição Federal conferiu ao Tribunal do Júri a competência para julgar os crimes dolosos contra a
vida e os a eles conexos, afirmando que o veredicto dos jurados é soberano (art. 5º, XXXVIII).

Entretanto, a fim de reduzir os casos de erro judiciário, seja para absolver, seja para condenar, exige-se
que, antes de o réu ser submetido ao Júri, seja realizada uma instrução prévia, sob o crivo do contraditório
e da ampla defesa, perante o juiz togado.

Informativo 603-STJ (07/06/2017) – Márcio André Lopes Cavalcante | 27


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Ao final dessa instrução prévia, o juiz togado irá analisar se estão presentes a prova da materialidade e os
indícios de autoria. O réu somente será pronunciado, ou seja, levado a julgamento se esses dois requisitos
estiverem preenchidos. Veja o que diz o art. 413, caput, do CPP:
Art. 413. O juiz, fundamentadamente, pronunciará o acusado, se convencido da materialidade do
fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação.

Assim, muito embora a análise aprofundada dos elementos probatórios seja feita somente pelo Tribunal
Popular, não se pode admitir a pronúncia do réu sem que haja um mínimo de provas.

Essa primeira etapa do procedimento bifásico do Tribunal do Júri (iudicium accusationis) tem dois
objetivos principais:
 funciona como um filtro pelo qual somente passam as acusações fundadas, viáveis, plausíveis, idôneas
a serem objeto de decisão pelo juízo da causa (iudicium causae). São evitadas, com isso, imputações
temerárias;
 serve para que sejam produzidas provas, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, a fim de que
possam ser utilizadas no plenário do Júri.

Espécies de testemunha
As testemunhas podem ser classificadas de acordo com vários critérios. Um deles é o seguinte:
a) Testemunha DIRETA: é aquela que presenciou os fatos. Também chamada de testemunha visual.
b) Testemunha INDIRETA: é aquela que não presenciou os fatos, mas apenas ouvir falar sobre eles. É
também chamada de testemunha auricular ou testemunha de “ouvir dizer” (hearsay rule).

Testemunha de ouvir dizer (hearsay rule)


A testemunha de ouvir dizer não deve ter grande força probatória. Conforme explica o Min. Rogério
Schietti Cruz:
“A razão do repúdio a esse tipo de testemunho se deve ao fato de que, além de ser um depoimento pouco
confiável, visto que os relatos se alteram quando passam de boca a boca, o acusado não tem como refutar,
com eficácia, o que o depoente afirma sem indicar a fonte direta da informação trazida a juízo.”

Já decidiu o STJ:
(...) 6. A norma segundo a qual a testemunha deve depor pelo que sabe per proprium sensum et non per
sensum alterius impede, em alguns sistemas – como o norte-americano – o depoimento da testemunha
indireta, por ouvir dizer (hearsay rule). No Brasil, embora não haja impedimento legal a esse tipo de
depoimento, “não se pode tolerar que alguém vá a juízo repetir a vox publica. Testemunha que depusesse
para dizer o que lhe constou, o que ouviu, sem apontar seus informantes, não deveria ser levada em conta.”
(Helio Tornaghi). (...) (REsp 1.444.372/RS, 6ª Turma, Rel. Min Rogerio Schietti, julgado em 16/2/2016).

Desse modo, o réu não pode ser pronunciado unicamente com prova de “ouvir dizer”.

O testemunho por ouvir dizer (hearsay rule), produzido somente na fase inquisitorial, não serve como
fundamento exclusivo da decisão de pronúncia, que submete o réu a julgamento pelo Tribunal do Júri.
STJ. 6ª Turma. REsp 1.373.356-BA, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 20/4/2017 (Info 603).

Informativo 603-STJ (07/06/2017) – Márcio André Lopes Cavalcante | 28


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DIREITO TRIBUTÁRIO

REFIS
Homologação da opção pelo REFIS e prestação de garantia ou arrolamento

Mesmo que a pessoa faça a adesão ao REFIS, os seus bens que estavam penhorados na execução
fiscal continuam penhorados.
Para ter direito de aderir ao REFIS, a pessoa deverá oferecer uma garantia à União, salvo se o
crédito já estiver garantido em medida cautelar fiscal ou execução fiscal.
Diante da conjugação dessas duas regras acima, conclui-se que:
Excetuadas as hipóteses em que o crédito está garantido em medida cautelar fiscal ou
execução fiscal, a homologação da opção pelo REFIS está sujeita à prestação de garantia ou
arrolamento.
STJ. 1ª Seção. EREsp 1.349.584-MG, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 26/4/2017 (Info 603).

Imagine a seguinte situação hipotética:


A União ajuizou execução fiscal contra determinada empresa.
O juiz federal determinou a penhora de um imóvel da executada para pagamento da dívida.
Algum tempo depois, antes que o imóvel fosse alienado, a União editou a Lei nº 9.964/2000 prevendo a
possibilidade de que o devedor de tributos federais pudesse parcelar seus débitos. Esse parcelamento foi
chamado de REFIS (“Programa de Recuperação Fiscal”).
A empresa aderiu ao parcelamento. Para isso, teve que assinar um termo de confissão de dívida,
reconhecendo o débito e comprometendo-se a pagá-lo em 120 prestações mensais (10 anos).
Vale ressaltar, ainda, que, em regra, para que o devedor tenha direito de aderir ao REFIS, deverá oferecer
uma garantia à União, conforme previsto no § 4º do art. 3º da Lei nº 9.964/2000:
Art. 3º (...)
§ 4º Ressalvado o disposto no § 3º, a homologação da opção pelo Refis é condicionada à prestação
de garantia ou, a critério da pessoa jurídica, ao arrolamento dos bens integrantes do seu
patrimônio, na forma do art. 64 da Lei nº 9.532, de 10 de dezembro de 1997.
§ 5º São dispensadas das exigências referidas no § 4º as pessoas jurídicas optantes pelo Simples e
aquelas cujo débito consolidado seja inferior a R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais).

Tese da contribuinte
O parcelamento é causa de suspensão da exigibilidade do crédito tributário (art. 151, VI, do CTN).
Diante disso, a empresa alegou que, estando a dívida parcelada, a penhora que incide sobre o imóvel
deveria ser desconstituída.
Em outras palavras, com a adesão ao REFIS, a garantia dada na execução fiscal (penhora do imóvel) deveria
ser liberada.

A tese da empresa deve ser acolhida?


NÃO. A Lei nº 9.964/2000 expressamente prevê a manutenção da garantia conferida na execução fiscal
mesmo que a pessoa ingresse no REFIS. Veja:
Art. 3º A opção pelo Refis sujeita a pessoa jurídica a:
(...)
§ 3º A opção implica manutenção automática dos gravames decorrentes de medida cautelar fiscal
e das garantias prestadas nas ações de execução fiscal.

Assim, mesmo com a adesão ao REFIS, fica mantida a penhora promovida em execução fiscal.

Informativo 603-STJ (07/06/2017) – Márcio André Lopes Cavalcante | 29


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Vimos acima que a pessoa, para aderir ao REFIS, deverá oferecer uma garantia (art. 3º, § 4º). Se o
contribuinte que deseja aderir ao REFIS já tem um bem penhorado que cobre toda a dívida, mesmo assim
ele terá que oferecer a garantia administrativa para participar do parcelamento?
NÃO. A garantia para participar do REFIS está prevista, como já vimos, no art. 3º, § 4º. Vejamos novamente
a redação da Lei:
Art. 3º (...)
§ 4º Ressalvado o disposto no § 3º, a homologação da opção pelo Refis é condicionada à prestação
de garantia ou, a critério da pessoa jurídica, ao arrolamento dos bens integrantes do seu
patrimônio, na forma do art. 64 da Lei nº 9.532, de 10 de dezembro de 1997.

Veja que o § 4º começa com a seguinte expressão: “Ressalvado o disposto no § 3º”. O que isso significa?
Significa que a homologação da opção pelo REFIS depende da prestação de garantia ou arrolamento de
bens, salvo se o crédito já está garantido em medida cautelar fiscal ou execução fiscal.
Assim, se houver penhora em execução fiscal, o gravame deve ser mantido normalmente. A única
diferença é que a homologação da opção pelo REFIS não dependerá da prestação de nova garantia em
relação ao mesmo débito.
Dessa forma, em vez de liberar o bem penhorado na execução fiscal, cabe à parte "abater" da garantia
prestada administrativamente o valor que já foi objeto de constrição.

Por que a penhora na execução permanece?


Porque se houver a exclusão do Programa, o crédito tributário volta a ter exigibilidade e a execução fiscal
retomará seu curso, alienando-se o bem que estava penhorado. Nesse sentido:
Art. 5º (...)
§ 1º A exclusão da pessoa jurídica do Refis implicará exigibilidade imediata da totalidade do crédito
confessado e ainda não pago (...)

DIREITO PREVIDENCIÁRIO

SALÁRIO DE BENEFÍCIO
Cálculo do salário de benefício e décimo terceiro salário

O décimo terceiro salário (gratificação natalina) somente integra o cálculo do salário de


benefício, nos termos da redação original do § 7º do art. 28 da Lei nº 8.212/91 e § 3º do art. 29
da Lei nº 8.213/91, quando os requisitos para a concessão do benefício forem preenchidos em
data anterior à publicação da Lei nº 8.870/94, que expressamente excluiu o décimo terceiro
salário do cálculo da Renda Mensal Inicial (RMI), independentemente de o Período Básico de
Cálculo (PBC) do benefício estar, parcialmente, dentro do período de vigência da legislação
revogada.
STJ. 1ª Seção. REsp 1.546.680-RS, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 10/5/2017 (recurso repetitivo)
(Info 603).

Salário de benefício
Salário de benefício (SB) é um valor utilizado como base para se calcular a renda mensal dos benefícios.
Em outras palavras, o SB é a base de cálculo utilizada para se estimar o valor do benefício que será pago.

Informativo 603-STJ (07/06/2017) – Márcio André Lopes Cavalcante | 30


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Sobre o valor do SB incidirá uma alíquota prevista em lei e, assim, calcula-se o valor da renda mensal do
benefício (RMB).

Obs: não confunda salário de benefício com salário de contribuição:


Salário de benefício Salário de contribuição
É um valor utilizado como base para se É um valor utilizado como base para se
calcular a renda mensal dos BENEFÍCIOS. calcular o valor da CONTRIBUIÇÃO
previdenciária que será paga pelos segurados
da previdência social.

Vale ressaltar, no entanto, que, apesar de serem diferentes, eles estão interligados. Isso porque o salário
de benefício será calculado com base na média aritmética simples dos maiores salários de contribuição
correspondentes a 80% de todo o período contributivo (art. 29 da Lei nº 8.213/91). Assim, em tese, quanto
maior o salário de contribuição (maior o valor que o segurado pagava), maior será o salário de benefício
(valor que ele receberá).

1º passo para se definir o valor do benefício que será pago ao segurada: calcular o salário de benefício
O primeiro passo para se calcular o montante do benefício que será pago ao segurado será descobrir o
valor do salário-de-benefício.
Ex: no caso de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez, o salário de benefício será calculado com
base na média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição correspondentes a 80% de todo o
período contributivo (art. 29, II, da Lei nº 8.213/91). Isso significa que, quanto mais tempo a pessoa tiver
passado recebendo altos salários (e, consequentemente, pagando contribuição previdenciária
proporcional a esse valor), maior será o seu salário-de-benefício.
Além disso, deverá ser observada a nova regra do § 10 do art. 29:
Art. 29 (...) § 10. O auxílio-doença não poderá exceder a média aritmética simples dos últimos 12
(doze) salários-de-contribuição, inclusive em caso de remuneração variável, ou, se não alcançado
o número de 12 (doze), a média aritmética simples dos salários-de-contribuição existentes.

2º passo: renda mensal do benefício (RMB) / renda mensal inicial (RMI)


Renda mensal do benefício (também chamada de renda mensal inicial) é o valor que efetivamente será
pago ao segurado.
Como vimos acima, primeiro temos que descobrir o valor do salário de benefício. Depois, sobre esse valor
aplicamos uma alíquota prevista em lei. O resultado dessa operação equivale à renda mensal do benefício.
Ilustrando com uma fórmula matemática: RMB (ou RMI) = salário de benefício x alíquota

Ex1: o RMI do auxílio-doença é igual a 91% do salário-de-benefício, conforme previsto no art. 61 da Lei nº
8.213/91:
Art. 61. O auxílio-doença, inclusive o decorrente de acidente do trabalho, consistirá numa renda
mensal correspondente a 91% (noventa e um por cento) do salário-de-benefício (...)

Em fórmula matemática: RMI do auxílio-doença = salário-de-benefício x 0,91.

Ex2: o RMI da aposentadoria por invalidez é igual a 100% do salário-de-benefício, conforme o art. 44 da Lei:
Art. 44. A aposentadoria por invalidez, inclusive a decorrente de acidente do trabalho, consistirá
numa renda mensal correspondente a 100% (cem por cento) do salário-de-benefício (...)

Em fórmula matemática: RMI da aposentadoria por invalidez = salário de benefício.

Informativo 603-STJ (07/06/2017) – Márcio André Lopes Cavalcante | 31


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O valor recebido pelo segurado a título de 13º salário integra o cálculo do salário de benefício e,
consequentemente, o cálculo da RMI?
Redação ORIGINÁRIA das Depois da Lei nº 8.870/94 (atualmente):
Leis 8.212/91 e 8.213/91: SIM NÃO
O art. 28, § 7º da Lei nº 8.212/91 em conjunto com A Lei nº 8.870/94 alterou o art. 28, § 7º da Lei nº
o art. 29, § 3º da Lei nº 8.213/91 previam que o 8.212/91 e o art. 29, § 3º da Lei nº 8.213/91 e
13º salário integrava o salário de contribuição. afirmou expressamente que o décimo terceiro
salário NÃO pode ser considerado no cálculo do
salário de benefício.

Em suma, após a edição da Lei nº 8.870/94, o décimo terceiro salário não mais integra o cômputo do
salário de benefício, diante da vedação legal explícita.

Se as contribuições previdenciárias foram pagas antes da Lei nº 8.870/94, mas o benefício previdenciário
somente foi concedido após a Lei nº 8.870/94, no momento do cálculo do valor do benefício deverão ser
computadas as quantias recebidas a título de 13º salário?
NÃO. Os critérios para cálculo do benefício previdenciário devem observar a lei vigente na data de sua
concessão. Nesse sentido:
(...) A concessão de benefício previdenciário rege-se pela norma vigente ao tempo em que o beneficiário
preenchia as condições exigidas para tanto. Inteligência da Súmula 340/STJ, segundo a qual "A lei aplicável
à concessão de pensão previdenciária por morte é aquela vigente na data do óbito do segurado". (...)
STJ. 1ª Seção. REsp 1.369.832/SP, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, julgado em 12/6/2013.

Assim sendo, se o segurado somente reuniu as condições para obter o benefício previdenciário após a
vigência da Lei nº 8.870/94 (16/04/1994), não tem direito de computar os valores recebidos a título de
13º salário no cálculo da Renda Mensal Inicial (RMI).

Não importa que o Período Básico de Cálculo (PBC) do benefício esteja, total ou parcialmente, dentro do
período de vigência da legislação revogada. O que importa é que, se as condições para percepção do
benefício somente foram atendidas, posteriormente, a lei a se aplicar é aquela vigente à data do início do
benefício.

O STJ analisou o tema sob a sistemática do recurso repetitivo e fixou a seguinte tese:
O décimo terceiro salário (gratificação natalina) somente integra o cálculo do salário de benefício, nos
termos da redação original do § 7º do art. 28 da Lei nº 8.212/91 e § 3º do art. 29 da Lei nº 8.213/91,
quando os requisitos para a concessão do benefício forem preenchidos em data anterior à publicação
da Lei nº 8.870/94, que expressamente excluiu o décimo terceiro salário do cálculo da Renda Mensal
Inicial (RMI), independentemente de o Período Básico de Cálculo (PBC) do benefício estar, parcialmente,
dentro do período de vigência da legislação revogada.
STJ. 1ª Seção. REsp 1.546.680-RS, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 10/5/2017 (recurso repetitivo) (Info 603).

Informativo 603-STJ (07/06/2017) – Márcio André Lopes Cavalcante | 32


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EXERCÍCIOS
Julgue os itens a seguir:
1) Não compete ao Poder Judiciário, no controle de legalidade, substituir banca examinadora para avaliar
respostas dadas pelos candidatos e notas a elas atribuídas. ( )
2) O grave erro no enunciado – reconhecido pela própria banca examinadora – constitui flagrante
ilegalidade apta a ensejar a nulidade da questão. ( )
3) O espelho de prova, com a motivação da avaliação do candidato, deve ser apresentado antes ou durante
a divulgação do resultado, sob pena de nulidade. ( )
4) Os conselhos profissionais não podem determinar a suspensão ou o cancelamento do registro do
profissional que deixar de efetuar o pagamento das anuidades, salvo após o atraso ser superior a quatro
anuidades. ( )
5) A criação de nova espécie de seguro, desde que devidamente registrado no órgão competente, goza da
proteção da Lei de Direitos Autorais. ( )
6) O bem imóvel adquirido a título oneroso na constância da união estável regida pelo estatuto da
comunhão parcial, mas recebido individualmente por um dos companheiros, através de doação pura e
simples realizada pelo outro, deve ser excluído do monte partilhável, nos termos do art. 1.659, I, do
CC/2002. ( )
7) Em se tratando de produto de periculosidade inerente (medicamento com contraindicações), cujos riscos
são normais à sua natureza e previsíveis, eventual dano por ele causado ao consumidor não enseja a
responsabilização do fornecedor. ( )
8) (MP/PR 2017) Periculosidade inerente é aquela indissociável do produto e, não se confunde com a
periculosidade adquirida ao longo do processo de consumo. ( )
9) (DPE/MA 2011) O fornecedor de produtos e serviços considerados de periculosidade inerente está
dispensado de prestar informação acerca de seu uso. ( )
10) O fornecimento de bem durável ao seu destinatário final, por removê-lo do mercado de consumo, põe
termo à cadeia de seus fornecedores originais. A posterior revenda desse mesmo bem por seu adquirente
constitui nova relação jurídica obrigacional com o eventual comprador. Assim, os eventuais prejuízos
decorrentes dessa segunda relação não podem ser cobrados do fornecedor original. ( )
11) (Juiz TJPB 2015 CESPE) Na ação ordinária em que o consumidor almeje a restituição em dobro das tarifas
de água e esgoto, a perda da pretensão ocorre em cinco anos. ( )
12) (Juiz Federal TRF4 2012) Não é aplicável o prazo de prescrição de cinco anos previsto pelo art. 27 do
Código de Defesa do Consumidor na hipótese de ação de restituição de taxa de água e esgoto cobrada
indevidamente, pois não se trata de ação de reparação de danos causados por defeitos na prestação de
serviços, aplicando-se o prazo prescricional estabelecido pela regra geral do Código Civil. ( )
13) (Juiz TJ/MG 2012) É de 20 (vinte) anos o prazo prescricional da pretensão executiva atinente à tarifa por
prestação de serviços de água e esgoto, cujo vencimento, na data da entrada em vigor do Código Civil de
2002, era superior a dez anos; do contrário, o prazo será de 10 (dez) anos. ( )
14) O prazo prescricional para as ações de repetição de indébito relativo às tarifas de serviços de água e
esgoto cobradas indevidamente é de: (a) 20 (vinte) anos, na forma do art. 177 do Código Civil de 1916;
ou (b) 10 (dez) anos, tal como previsto no art. 205 do Código Civil de 2002, observando-se a regra de
direito intertemporal, estabelecida no art. 2.028 do Código Civil de 2002. ( )
15) Nas ações rescisórias processadas e julgadas originariamente no STJ, mesmo após o advento do
CPC/2015, continua existindo a figura do revisor. ( )
16) Compete à Justiça Federal processar e julgar os crimes consistentes em disponibilizar ou adquirir material
pornográfico envolvendo criança ou adolescente (arts. 241, 241-A e 241-B do ECA), quando praticados
por meio da rede mundial de computadores (internet). ( )
17) Compete à Justiça Federal a condução do inquérito que investiga o cometimento do delito previsto no
art. 241-A do ECA nas hipóteses em que há a constatação da internacionalidade da conduta e à Justiça

Informativo 603-STJ (07/06/2017) – Márcio André Lopes Cavalcante | 33


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Estadual nos casos em que o crime é praticado por meio de troca de informações privadas, como nas
conversas via whatsapp ou por meio de chat na rede social facebook. ( )
18) Sem consentimento do réu ou prévia autorização judicial, é ilícita a prova, colhida de forma coercitiva
pela polícia, de conversa travada pelo investigado com terceira pessoa em telefone celular, por meio do
recurso "viva-voz", que conduziu ao flagrante do crime de tráfico ilícito de entorpecentes. ( )
19) O testemunho por ouvir dizer (hearsay rule), produzido somente na fase inquisitorial, pode servir como
fundamento da decisão de pronúncia considerando que a competência constitucional para julgar os
crimes dolosos contra a vida é do Tribunal do Júri. ( )
20) Excetuadas as hipóteses em que o crédito está garantido em medida cautelar fiscal ou execução fiscal, a
homologação da opção pelo REFIS está sujeita à prestação de garantia ou arrolamento. ( )

Gabarito
1. C 2. C 3. C 4. E 5. E 6. C 7. C 8. C 9. E 10. C
11. E 12. C 13. C 14. C 15. C 16. C 17. C 18. C 19. E 20. C

Informativo 603-STJ (07/06/2017) – Márcio André Lopes Cavalcante | 34

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