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ISSN 0103-6602

UMA ORIENTAÇÃO PARA

PROJETOS

DE TESES OU DISSERTAÇÃO

TEREZA LÚCIA HALLIDAY E HENRIQUE LEVY

Recife, dezembro de 1991.

COLEÇÃO FLABEL

Nº 03

1
ÍNDICE

1. UTILIDADE DO PROJETO ........................................................... P. 04

2. CONSIDERAÇÕES SORRE A ESCOLHA DO TEMA ................. P. 05

3. A COMPOSIÇÃO DO PROJETO

3.1. Título ...................................................................................... P. 07


3.2. A Introdução........................................................................... P. 08
3.3. A exposição do problema....................................................... P. 08
3.4. A justificativa do estudo.......................................................... P. 09
3.5. Os objetivos da pesquisa........................................................ P. 09
3.6. As definições dos conceitos................................................... P. 09
3.7. A revisão da bibliografia......................................................... P. 11
3.7.1. Marco teórico................................................................ P. 12
3.7.2. Estudos já realizados.................................................... P. 12
3.8. A metodologia......................................................................... P. 13
3.9. O orçamento........................................................................... P. 14
3.10. A conclusão e o cronograma.............................................. P. 14
3.11. As referências bibliográficas.............................................. P. 15

4. A IMPORTÂNCIA DAS LEITURAS E DO ESTILO................................ P. 15

5. REFERÊNCIAS RIBLIOGRÁFICAS...................................................... P. 18

2
UMA ORIENTAÇAO PAPA PROJETOS
DE TESES OU DISSERTAÇAO

Para amenizar os sentimentos de desorientação,


ansiedade e insegurança, costumeiros em
estudantes no fase de redação de um projeto de
tese ou dissertação, organizamos o presente
roteiro1. Compõem-se de quatro partes: uma
introdução sobre a utilidade e flexibilidade do
projeto, considerações sobre a escolha do temo,
dicas quanto à composição do projeto e, finalmente,
comentários pessoais sobre a leitura e o estilo2.

Tereza Lúcia Halliday - Ph. D. em, Comunicação Pública pela University of


Maryland (EUA), M.S. em Jornalismo Agrícola peia University of Wisconsin
(EUA). Professora Adjunta IV do Departamento de Letras e Ciências
Humanas da Universidade Federal Rural de Pernambuco - UFRPE.

Henrique Levy - Ph.D. em Sociologia University of Maryland (EUA); M.S. em


Sociologia University of Wisconsin (EUA). Professor Adjunto IV do
Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal de Pernambuco
– UFPE.

_______________________________
1
Nossa experiência discente e docente está circunscrita às Ciências Humanas (notadamente
Comunicação, Sociologia, Administração, História e Ciência Política). Apesar desta limitação,
esperamos que, em linhas gerais, este roteiro possa auxiliar estudantes de outras áreas.
2
Usamos alternadamente os termos "tese" e "dissertação" para referirmo-nos indistintamente tanto
ao trabalho de fim de curso de mestrado como ao de fim de doutorado. Veja as notas seguintes.

3
1. A UTILIDADE DO PROJETO

Lembre-se de que, ao trabalhar no PROJETO, você está trabalhando na


própria DISSERTAÇÃO ou TESE3. Está construindo os ALICERCES
CONCEITUAIS e METODOLÓGICOS sem os quais você se perderia no
processo de pesquisa. Começar a pesquisa sem ter um projeto amarrado é por
o corro adiante dos bois e atolar-se lá no frente, com um trabalho mal
costurado, tanto em termos teóricos como em termos metodológicos.
Tenha em mente que quase todas as páginas do PROJETO serão
aproveitadas no texto da tese4. Apenas, o que você anuncia no projeto, com o
verbo no futuro, como declarações de intenções, na tese aparecerá com o
verbo no passado, como relato das intenções cumpridlas5.
Por outro lado, não se aflija ao sentir a pesquisa tomando corpo próprio,
como se estivesse "traindo" o projeto. Ele é uma coisa ORGÂNICA, em
movimento, provisória. É um dos seus estágios de amadurecimento
aproveitado na dissertação ou tese, porém, aumentada com o que você
consultou até o dia de "fechar" o trabalho.
As descobertas que a pesquisa trará poderão ultrapassar as questões de
pesquisa ou hipóteses propostas no projeto. Espera-se que o projeto
ultrapasse a si mesmo, não no sentido de um desvio substancial de seus
parâmetros, do contrário, de nada serviria como planta da construção da tese,
mas no sentido de um CRESCIMENTO em Insighf e profundidade. Outras
questões surgirão assim como dados em maior quantidade do que você pode
analisar dentro dos limites do seu trabalho. Eles transbordarão os limites do

______________________________
3
Encontramos em Matos (1989), uma referência ao termo "dissertação" como datando do século
XVII enquanto "tese seria do século XIV
4
Oliveira et al. (1981, p.3) definem TESE como "um documento que tem a função de conduzir um
agrupamento lógico, sustentando e defendendo um ponto de vista especifico e fornecendo solução para
um dado problema"; enquanto DISSERTAÇÃO "representa uma discussão sistemática sobre um
determinado assunto, não constituindo tema original. Seu objetivo é mais restrito que o da tese".
Exatamente o inverso do trio de ambos os termos em inglês, onde “theses” é aplicado ao trabalho escrito
de conclusão de mestrado e "dissertation" refere-se ao que chamamos no Brasil de tese de doutorado.
5
Acreditamos que este roteiro também possa servir para projetos de monografia, cujas normas de
redação são apresentadas como ( ... ) et al(1981). Estes autores a definem como “um trabalho de
divulgação cientifica que, exaustiva e compreensivamente, trata de um problema ou assunto específico.
Geralmente é escrito de acordo com um plano bem elaborado, cobrindo todos os aspectos do assunto". O
aluno que desejar utilizar este roteiro para o seu projeto de monografia, verifique com o seu orientador a
adapitabilidade das sugestões aqui oferecidas.

4
projeto e você NÃO se ocupará deles na dissertação, mas mostrará que está a
par das dimensões não estudadas, propondo-as no texto final do relato da
pesquisa, como caminhos a explorar em futuros estudos.O que você precisa
mostrar no seu projeto (e no texto final da dissertação) é CONGRUENCIA no
exposição, CLAREZA no encadeamento das idéias e FAMILIARIDADE com
seu tema. Claro que você NÃO sabe tudo sobre ele, do contrário não estaria
pesquisando! O segredo do sucesso é: reescrever, reescrever e, finalmente,
reescrever!

2. CONSIDERAÇÕESSOBRE A ESCOLHA DO TEMA

Antes de decidir sobre um tema de tese, lembre-se de que você vai conviver
muito tempo com ele, às vezes em condições adversas, portanto é melhor que
seja um assunto, não apenas para estimular os seus neurônios mas também
para tornar-se uma “curtição”. Se bem que, como em um trabalho artístico,
produzir uma tese ou dissertação também é uma criação do espírito. Como tal,
requer vibração com o que está-se criando e buscando a fim de que o seu
trabalho não seja "apenas" o cumprimento de um "requisito parcial para o
obtenção do grau de mestre (ou de doutor)". Que seja, além disso, um trabalho
útil ao campo de conhecimento onde sua tese se insere, e uma viagem
inesquecível na estrada do seu aprimoramento profissional e do crescimento
pessoal.
Por outro lado, existem limitações concretas na implementação, de um projeto
de tese. Nada mais frustrante do que escolher um tema que o apaixona, mas
que seja inviável, por vários motivos, desde a falta de dinheiro até, a falta de
orientador. Uma das preocupações para garantir um bom começo de trabalho é
perguntar-se o seguinte:
A. CUSTO FINANCEIRO: Tenho acesso à verba para material, transporte,
entrevistas, cópias xerográficas? Se não disponho de dinheiro, nem meu
nem de patrocinador, que tipo de estudo conduzir sozinho, com um mínimo
de despesas?
B. O TEMPO ENVOLIDO: Posso completar esta pesquisa, inclusive a redação

5
final das conclusões (que exigirá reescrever muitas vazes), dentro do prazo-
limite para o depósito do minha tese? Como reduzir a idéia/problema a um
âmbito de proporções manejáveis, dentro do tempo disponível?

C. VIABILIDADE LOGÍSTICA E METODOLÓGICA: De que maneira vou colher


os dados? Há disponibilidade de material a pessoas como fontes de
pesquisa na minha área de escolha? Se a melhor técnica de pesquisa para
este problema é inviável, que outros procedimentos posso considerar?
D. A LEGITIMIDADE DO TEMA DENTRO DO PROGRAMA: Corno justificar a
minha pesquisa em termos do título de mestre ou doutor no qual aspiro? De
que maneira meu tema se relaciona com a área de concentração do meu
programa de mestrado ou doutorado?
E. DISPONIBILIDADE E ORIENTADOR: No corpo docente do meu programa
existe um cuja especialidade e/ou linha de pesquisa e/ou interesses
acadêmico-profissionais se afinam com o meu tema? Caso contrário, que
outros interesses meus seriam compatíveis com os orientadores:
disponíveis?
F. LATITUDE IDEOLÓGICÁ: De que maneira os meus laços com meu
empregador, religião, partido político, associação de classe, parentes ou
qualquer outro grupo poderão influenciar a minha pesquisa? De quanta
liberdade disponho para assumir uma postura crítica e objetiva ou adotar
certo paradigma de pesquisa sem sofrer "patrulhagens" e discriminações?
E, no caso de sofrê-las, até ande poderei aguentá-las sem comprometer o
trabalho e minha saúde mental?
Consciente dessa questão e havendo contornado ou resolvido as limitações
a que elas se referem, você estará mais preparado para compor o seu
projeto.
O roteiro que oferecemos a seguir NÃO é a "Tábua de Moisés". O
SEU PROJETO deve conter, em certa ordem lógica, todos os itens
comentados por nos, mas você pode recriar-lhes a sequência de
acordo com o seu caso específico (desde que a “Introdução” seja no
começo, do contrário seria “criatividade” demais).

6
3 A COMPOSIÇÃO DO PROJETO

Para pensar o projeto e arma-lo, você precisa cobrir certas etapas entes
de dar-lhe a forma final. Ei-las:
(1) Escolha do tema.
(2) Delimitar os objetivos da pesquisa (assim, estará determinando o
âmbito do trabalho - o que está incluído e o que cai fora do estudo a
realizar).
(3) Levantar e bibliografia permanente.
(4) Definir bem os conceitos que compõem o quadro de referência do
assunto.
(5) Descrever o problema, situação ou fenômeno a ser pesquisado.
(6) Justificar a importância do estudo proposto.
(7) Escolher o marco-teórica que servirá de baliza a analise dos dados.
(8) Escolher a metodologia a ser empregado.
(9) Elaborar um cronograma para a pesquisa.
(10) Rascunhar a Introdução.
Depois de organizar-se desta forma e ter todos os elementos de
composição do projeto, você passará a dar forma e uma escrita final ao
mesmo. Para esta tarefa ofereceremos o seguinte roteiro:

3.1. Título
O título do projeto é, geralmente, um nome provisório para a dissertação ou
tese, a não ser que você tenha tido um sonho, a imagem do mesmo gravada
em ouro e "soprada" por alguma bibliotecária. Aliás, consultar uma bibliotecária
de sua universidade é importantíssimo antes de "batizar" a tese definitivamente.
Ela poderá orienta-lo(a) sobre as palavras-chaves que devem constar do título
para que seu trabalho seja classificado e recuperado em diferentes bancos de
dados, conforme os tópicos e áreas onde ele seria relevante. Isto sem prejudicar
sua criatividade pessoal. Em todo caso, tanto para o projeto como para a
discussão, evite títulos muito curtos ou excessivamente longos.

3.2. A Introdução
A Introdução do seu projeto deve ser curta, concisa, direta. Na dissertação

7
ou tese propriamente dita, a introdução será mais longa, podendo incluir,
inclusive, a narração de suas dores, obstáculos, impasses e decisões "em
cours de route". No PROJETO ela não deve ser confundida com a
EXPOSIÇÃO DO PROBLEMA, que vem mais adiante.
EXEMPLO DE UM COMEÇO DE INTRODUÇÃO: "Este projeto nasceu com
minha preocupação com de ....................................... e da necessidade de
promover um melhor conhecimento da ............................. como fenôneno da
maior relevância no campo de ...................... (citar a Área de conhecimento
que dá o nome ao seu programa de mestrado). Com este trabalho,
proponho-me a (estudar/investigar/analisar) ........................... Usarei como marco
teórico e como procedimento metodológico. A exposição do Problema e a
Revisão da Bibliografia, apresentados mais adiante darão respaldo a estas
escolhos."
Feche a Introdução com alguma citação inspiradora, pertinente a
suas preocupações filosóficas do tema.
A INTRODUÇÃO SERÁ ESCRITA POR ÚLTIMO, quando você tiver o
projeto armado em seus itens subsequentes, uma vez que é um resumo de
todos eles (objetivos, justificativa ou relevância do estudo, âmbito da pesquisa,
marco teórico, metodologia). A INTRODUÇÃO É A CARTA DE
APRESENTAÇÃO DO PROJETO.

3.3. A exposição do problema


Nesta seção, você descreve a situação ou fenômeno que a(o) preocupa,
intrigo ou interessa, especificando os principais CONCEITOS ou VARIÁVEIS
envolvidas (Lembre-se toda variável implica num conceito, mas nem todo
conceito é uma "variável"). Você pode subdividir esta seção em sub-itens tais
como "Antecedentes históricos", "Situação sócio-econônica da(a) .....................,
"Perfil da(o) ....................... " “A Região de ..........................”. Não deixe de
explicar por que se trata de um problema, ou de uma área ambígua ou obscura
de conhecimento daquele assunto.
A exposição do problema pode ser mais curta no Projeto e deve ser mais
longa no relatório de pesquisa que você apresentará em forma de dissertação
de mestrado ou tese de doutorado. Mas, mesmo no projeto, deve conter os
pontos essenciais, geralmente indicados pelos subtítulos que você escolher

8
para organizá-la.

3.4. A justificativa do estudo


Uma boa exposição do problema a ser investigado desaguará numa boa
justificativa para estudá-lo. Nesta seção você pode explicar por que este
assunto ou aspecto é digno de ser estudado.

3.5 O(s) objetivo(s) da pesquisa


Uma boa maneira para delinear os objetivos da pesquisa é perguntar-se- a si
mesmo(a):
- O que eu quero realmente descobrir, analisar, compreender melhor?
- O meu "problema" de pesquisa será melhor esclarecido se eu investigar os
seus elementos constituintes, a relação entre dois ou mais elementos, o
ANTES e o DEPOIS de um fenômeno, ou uma conjunção de fatores?
-DISTO TUDO, O QUE EU POSSO REALMENTE INVESTIGAR?
Veja que os objetivos já terão sido brevemente enunciados na
INTRODUCÁO6. EXEMPLO DE EXPOSIÇÃO DOS OBJETIVOS. "Em vista do
que acabei de expor (na Exposição do Problema, evidentemente), esta
pesquisa terá por objetivo(s), ou visará a .............................. .

3.6. As definições dos conceitos


Ao definir, de antemão, os conceitos utilizados no tratamento do seu tema
de pesquisa, você sinaliza que seu trabalho NÃO vai ser um blá, blá, blá e que
o problema será objeto de discussão, acima do nível de mesa de bar. AS
DEFINIÇÕES VARIAM PARA UM MESMO CONCEITO, dependendo do
enfoque do pesquisador, da sua especialidade, da sua orientação filosófica
e/ou do âmbito da pesquisa. O conceito de "beijo" pode ser definido corno:
"movimento muscular dos lábios em condições X de temperatura e ritmo
cardíaco"; ou "expressão de afeto entre os habitantes de determinadas regiões
do terra", ou ainda “um instante d'infíni qui fait um bruit d’abeille”
A primeira definição do conceito "beijo" foi dada por um físico; a Segunda,
por um antropólogo de Marte; e a terceira, pelo escritor francês Edmond
______________________________
6
Tornamos a lembrar que a INTRODUÇÃO é a seção que você redigirá POR ÚLTIMO!

9
Rostand em "Cyrano de Bergerarc". Cada uma das três definições acima capta
um aspecto da realidade do conceito BEIJO.
Os conceitos principais usados na sua pesquisa, também designados como
“conceitos-chaves”, serão definidos de acordo com o seu uso corrente em
sociologia, psicologia, administração de empresas, economia, ciência política
(ou qualquer que seja o poço de saber de onde você se abasteça). Serão
também definidos de acordo com o "corte" que você deu na realidade para
poder apreendê-la, de acordo com o âmbito e o ângulo de sua pesquisa.
VOCÊ DIRIA NESTA SEÇÃO: "No âmbito desta pesquisa, os seguintes
conceitos serão usados com as seguintes definições ....................... (listá-los
em ordem alfabética, seguidos das respectivas definições adotados por você)".
Quando aplicável, dar a DEFINIÇÃO CONCEITUAL, seguida da DEFINIÇÃO
OPERACIONAL. Por exemplo, a definição operacional de "idoso" varia de
acordo com o teor do pesquisa e os interesses do pesquisador. Se a variável
"idoso" entra na sua pesquisa, você precisa definir este conceito de maneira a
focalizar a realidade estudada com um mínimo de ambiguidade: "Para os
efeitos deste pesquisa idoso é a cidadão com um mínimo de 70 anos de idade
(ou 65, ou 68, desde que estabeleça um critério e atenha-se a ele)."
Você tanto pode construir as suas próprias definições para os conceitos
utilizados no seu trabalho, de acordo com o enfoque e âmbito da pesquisa,
como pode adotar uma definição legitimada por alguma instituição ou autor.
Neste caso, assinalaria a opção assim: "neste trabalho o conceito "minifúndio"
é definido conforme a classificação do INCRA" (ou do IBGE, ou do FAO).
Segue-se o enunciado da definição. Ou ainda: "Utilizaremos a definição de
Nico Poulantzos7 para quem "aliança de classes significa ....”.
Para um aprofundamento da importância dos conceitos e suas definições
na produção de conhecimento científico, veja Mendonça (1958) e Hegenberg
(1974). Familiarize-se também com o Dicionário de Política de Norberto Bobbio
o qual, em seus mini-ensaios sobre os verbetes ali selecionados, dá uma visão
clara das diferentes acepções que um mesmo conceito pode ter através da
História e como os conceitos são definidos de acordo com as perspectivas
______________________________
7
Citar referência bibliográfica sem esquecer o n° da página de onde copiou ou parafraseou a definição.

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filosóficas ou ideológica de seus usuários.
Tenha em conta, que uma pesquisa sem uma cuidadosa explicação do que
você entende por ... (o que quer que você esteja a referir-se) já começa como
pesquisa mal feita. Se na poesia, a ambiguidade no uso dos termos pode
aumentar a qualidade do poema, no ciência a redução da ambiguidade é
requisito básico de um trabalho acadêmico de qualidade. Quanto mais um
termo usado em sua pesquisa for do tipo que "todo mundo sabe o que é", mais
necessidade tem de ser delimitado numa definição precisa.

Ainda sobre o uso dos conceitos e suas definições, vale lembrar Kenneth
Burke (1966):
“Não somente a natureza dos termos que usamos afeta a natureza de
novas observações como também dirigem a nossa atenção para uma área, de
preferência outra. Mudas das chamadas "observações" são apenas implicações
daquela terminologia particular em cujos termos as observações foram feitas.
Em suma, muito do que consideramos observações sobre a realidade pode ser
apenas uma decorrência das possibilidades implícitas numa determinada
escolha de termos. (...) Mesmo se uma determinada terminologia é um
REFLEXO da realidade, por sua própria natureza como terminologia, ela tem
de ser uma SELEÇÃO da realidade e assim, precisa funcionar como uma
REFLEXÃO da realidade" (BURKE, 1996, pp. 45-46).

3.7. A revisão de bibliografia


Esta parte deve incluir TUDO o que se pode conseguir em matéria de livro,
artigo, pesquisa, tese- de dissertação manuscrita, que TENHA RELEVÂNCIA
para o seu projeto. Autores que dêem respaldo à sua abordagem e autores
contrários à sua abordagem, mas cuja citação reforce - por oposição - o que
você quer focalizar na sua dissertação ou tese.

Esta parte do projeto (e da tese futura) não é uma mera menção “Fulano
disse, sicrano descobriu, beltrano recomenda ...”. Cada obra, idéia, autor citado
TEM DE SER CONECTADOS POR VOCÊ ao assunto de seu trabalho.
Em geral, a revisão da bibliografia, ou "revisão do literatura", pode ser
dividida em dois grandes sub-itens:

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3.7.1. Marco teórico
As idéias, teorias, filosofias, abordagens que são o alicerce conceituai,
teórico, filosófico de sua pesquisa, NOTE QUE UMA PARTE DO MARCO
TEÓRICO JÁ APARECE NA SEÇÃO ONDE VOCE EXPLICITA O USO DOS
CONCEITOS. Os conceitos são parte do marco-teórico. As vezes, um ou dois
conceitos-chaves apenas formem o cerne de um marco teórico. Por exemplo,
um estudo que se proponha usar o conceito: de "luta de classes" para explicar
a interação entre certos grupos sociais; ou uma pesquisa que reúna os
conceitos de "ato retórico" e "ato político" como base teórica para analisar a
atuação de determinado governo; ou ainda um trabalho que pretenda analisar
papéis sociais ou comportamento político à luz dos conceitos de "intelectual
orgânico", segundo Antônio Gramsci, "animador cultural", segundo Joffre
Dumazedier, ou "agente de comunicação rural", conforme Juán Diaz
Bordenove.
Seja como sub-iten de "Revisão da Bibliografia", seja como seção
independente, o marco teórico precisa ser bem explicado e conectado com seu
trabalho porque ele servirá de baliza tanto à sua pesquisa, quanto ao
julgamento de banca examinadora.
VOCÊ PODE COMEÇAR ESTE SUB-ITEN DIZENDO: “O problema que
me proponho a investigar pode ser visualizado (esclarecido, entendido,
abordado) dentro de (através de) pelo menos duas (três, quatro, etc) teorias
(perspectivas, abordagens).” Não esqueça de desenvolvê-las e explicitar com
qual delas vai trabalhar e por que.

3.7.2. Estudos já realizados


Aqui trata-se sobre os estudos já realizados sobre o seu temo (ou tópicos
específicos) e, de algum modo, relacionados com ele. Aqui você mostra as
contribuições de outros pesquisadores ao esclarecimento de sua questão e
assinala as LACUNAS – o que é que ficou de fora das pesquisas deles e que
você tentará abordar, na sua maneira de contribuir, para sanar alguma(s)
dessas lacunas.
O FORMATO AQUI NÃO É FIXO. Você pode desenvolver a revisão da
bibliografia da maneira que lhe parecer mais coerente com sua pesquisa. Mas
mantenha o espírito e propósito dessa seção: demonstrar que você conhece o

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bibliografia pertinente, que sabe separar o que é relevante do que é irrelevante
e usar os autores como seus ALIADOS na construção do seu caso.

3.8. A Metodologia
Pode ser dividia, como seção, em:
(a) ÂMBITO DA PESQUISA - aqui você dirá algo como - “Para viabilizar este
projeto selecionei (escolhi, vou limitar-me a)............... “. Ao definir o âmbito da
pesquisa você especifica o grupo, fenômeno, variáveis a examinar, local,
textos, material específico que será observado e analisado. Você esclarece o
QUE (ou QUEM), ONDE, QUANDO e COMO pesquisará.
(b) COLETA E ANÁLISE DOS DADOS - aqui, você menciona os procedimentos a
serem adotados para reunir a informação de que você necessita e o
instrumento de análise a ser utilizado no tratamento dessa informação - se
usará amostragem aleatória ou não, e por que, se utilizará outros critérios de
objetividades e como. Você pretende usar, por exemplo, entrevistas?
Questionários por correio? Gravação de história de vida? Dados secundários?
Recenseamentos? Análise de textos? Que combinação de técnicas você
pretende utilizar? No caso da análise, aplicará textos estatísticos? Fará
comparações de percentagens? Ou relatos? Não se esqueça de explicar
porque a combinação escolhida por você, de métodos a técnicas, serve melhor
ao seu propósito de pesquisa.
Provavelmente sua metodologia seguira os passos dos métodos e técnicos
de pesquisa da linha de trabalho de seu orientador. Se ele tiver seriamente
comprometido em ser seu guia durante o processo, ninguém melhor do que ele
(ele) para dar-lhe a orientação metodológica. Mas ele poderá também sugerir
que procura um colega/pesquisador cuja prática metodológica seja de especial
utilidade para seu projeto.
Qualquer que seja o procedimento metodológico adotado, é importante ler
cuidadosamente sobre ele (ou eles) em livros de metodologia e técnicas de
pesquisa. Se a orientação do orientador é imprescindível, SE É VERDADE
QUE "PESQUISA SE APRENDE FAZENDO", é igualmente inegável, a ajuda
que a experiência de outros pesquisadores, registradas em manuais e relatos
de pesquisas pode trazer ao mestrando/doutorando ainda inseguro no seu
exercício acadêmico de produzir um trabalho dentro dos ditames do gênero

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"tese" ou "dissertação".
Nossa experiência acadêmica, quer como mestrandos na Universidade de
Wisconsin (Modison, EUA), quer como doutorandos na Universidade de
Maryland (EUA), quer como orientadores em programas de pós-graduação de
duas Universidades federais brasileiras, tem nos ensinado que é mais
proveitoso para o aluno trabalhar com a metodologia da preferência e com,
potência do orientador, ou então, trocar de orientador.

3.9 Orçamento8
Todo projeto de tese ou dissertação deve trazer uma estimativa dos custos
da pesquisa: cópias xerográficas, correio, transporte, preparo de questionários,
contratação de serviços (computação, digitação/datilografia, análise, estatística,
entrevistadores, .... ), assim como a menção da(s) fonte(s) financiadora.

3.10. A Conclusão e o Cronograma


Nesta parte final do projeto você diz qual contribuição sua pesquisa espera
dar no seu campo especializado. Menciona se tem verba de alguma agência de
fomento a pesquisa, se contará com ajuda logística de alguma organização
(seu empregador, ou algum outro patrocinador). E, em vista das dificuldades ou
facilidades expostas, propõem um CRONOGRAMA salientando a DATA
LIMITE DO DEPÓSITO DA DISSERTAÇÃO OU TESE.
Há uma tendência do pesquisador iniciante a empolgar-se com a COLETA
DE DADOS e consumir quase todo o tempo do cronograma em mais uma
observação de campo, mais um achado documental, mais uma coleta de
depoimento. Por seus percalços e surpresas, a fase de coleta de dados se
presta facilmente a conferir um lado heroico à pesquisa. Contudo, o MAIS
IMPORTANTE da pesquisa, o VERDADEIRO INDICADOR DA QUALIDADE
DO PESQUISADOR é a fase inglória da ANÁLISE DOS DADOS e da SÍNTESE
e IMPLICAÇÕES DOS RESULTADOS. O fazer sentido dos dados colhidos,
iluminá-los como marco teórico escolhido e tirar as conclusões.
______________________________
8
As pessoas que receberam a primeira versão deste Roteiro não encontrarão no texto este item
"orçamento". Talvez porque estejamos, os dois, tão acostumados a fazer pesquisa sem verba,
cometemos este lapso, agora.

14
Infelizmente, mestrando e doutorandos tendem a deixar “um resto de tempo”
para esta etapa importantíssima, que coincide com o estágio de saturação do
autor com seu trabalho e é feito de afogadilho, sob a pressão do prazo de
entrega e do cansaço. Lembre-se disto quando fizer o seu cronograma e faça
(deixe) espaço privilegiado para a análise. Nunca esqueça de que é preciso
TEMPO para redigir uma vez, duas, três, quatro vezes, ou quantas vezes
sejam necessárias para produzir um trabalho acadêmico decente.

3.11. As referências bibliográficas


Do projeto (como do texto final da dissertação ou tese) devem constar, em
ordem alfabética de autor, TODAS as fontes consultadas (livro, noticia,
reportagem, carta, relatório, depoimento, declarações, seja em forma de
escrita, seja gravadas em áudio ou vídeo). Consulte uma bibliotecária sobre o
formato da lista de referência bibliográfica, com a qual você fechará o texto de
seu projeto.
Com relação às "Notas de pé de página", é mais econômico e mais fácil de
consultar se você juntá-las em uma lista única, ao fim do texto, denominada de
"Notas" e enumerá-Ias de um a n'. Essas notas aliviam o texto de observações
entre parênteses e demonstram sua paciência e meticulosidade em apontar
paralelos, oposições e trazer adendos que tornem o trabalho mais claro e mais
rico.

4. A IMPORTÂNCIA DAS LEITURAS E DO ESTILO


As "dicas" acima são meros lembretes. O mestrando ou doutorando deve
ter plena familiaridade com a literatura tratada nos disciplinas cursadas,
particularmente as disciplinas em Métodos e Técnicas de Pesquisa. Ignorância
só vai causar-lhe ansiedades, angústia e depressão durante a elaboração de
tese. Geralmente a dificuldade de saber como começar a pesquisa denota
pouco conhecimento dessa bibliografia.
Para refrescar a memoria, há dois livrinhos por CLÁUDIO DE MOURA
CASTRO, Ph.D. em Educação; A PRÁTICA DA PESQUISA (1977) e seu
irmãozinho ESTRUTURA E APRESENTAÇÃO DE PUBLICAÇÕES
CIENTÍFICA - (1976), pela Editora McGraw-Hill do Brasil. Do mesmo autor, o
artigo “Memórias de um Orientador de Tese” (1979). Também, PESQUISA

15
SOCIAL MÉTODOS E TÉCNICAS (1985), por Robert Richardson et al, da
Editora Atlas. Por Humberto Eco, você tem COMO SE FAZ UMA TESE (1989),
da Editora Perspectiva.

UMA PREFERÊNCIA DE ESTILO


Havendo escrito nossas tese de mestrado e doutorado em língua inglesa,
acostumamo-nos a redigir nossos trabalhos acadêmicos individuais, mesmo
em português, usando a primeira pessoa do singular. Da primeira vez que um
de nós apresentou um "paper" a orientadora americana usando o pronome
“we” (por hábito brasileiro) ela indagou: "quem é o outro autor?", uma vez que
usar a primeira pessoa no plural num trabalho científico em inglês, ou significa
que mais de um autor está assinando aquela produção, ou que o autor é a
rainha da Inglaterra, a quem se permite usar o “plural majestático”, sendo uma
só pessoa, segundo observações bem humoradas da Profª Kathleen Jamieson,
diretora da Annenberg School of Communication.
No Brasil, constatemos a prática continuada de, não somente o autor
individual utilizar a primeira pessoa do plural como também o uso abundante de
forma reflexiva ("procedeu-se a ........................ ", “registrou-se que .................”,
“concluí-se que ..............”. Segundo nos foi explicado, é uma questão de
modéstia e de impessoalidade "científica" no estilo brasileiro.
O problema com a forma reflexiva numa tese ou dissertação é que ela
lembra os "relatórios de agências governamentais" onde a responsabilidade da
autoria costuma ficar ambígua, por razões que preferimos não especular. A
nós, nos dá a impressão de que o pesquisador que use a forma reflexiva não
quer assumir a autoria de suas idéias e conclusões. E como nossos
orientandos nunca puderam nos convencer do contrário, preferimos que ele
escrevam seus projetos e textos finais de tese/dissertação usando e primeira
pessoa do singular (ou, no caso dos que se identificarem, profundamente com
soberanos britânicos, a primeira pessoa do plural). Desencorajamos a forma
reflexiva porque à um estilo que mascara a subjetividade, ao abster-se do
pronome "eu", e distancia-se da objetividade e da transparência imprescindível
no discurso acadêmico.
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corrigido. Agrademos ao colega Roberto Benjamin por nos ter apontado esta lacuna na primeira versão.

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5. RFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BURKE, Kenneth. Languaqe as Simbolic Action. Berkeley: University of
California Press, 1966. 514 p.
CASTRO, Cláudio de Moura. Memórias de um orientador de tese. In NUNES,
Edson de Oliveira (Org.). A aventura do sociológica. Rio de Janeiro: Zahar,
1979. pp. 309/326.

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