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FISCALIZAÇÃO

TRIBUTÁRIA

Eduardo Zaffari
Obrigação tributária (fato
gerador): sujeito passivo,
ativo e solidariedade
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

 Reconhecer o fato gerador das obrigações tributárias principal e


acessória.
 Descrever as características, os direitos e as obrigações do sujeito
ativo e do sujeito passivo.
 Explicar o que é solidariedade conforme o Código Tributário Nacional.

Introdução
A relação jurídico-tributária é diferenciada de outras áreas do direito,
pois seus caracteres estão revestidos da estrita legalidade típica do ramo
específico do direito tributário. A obrigação tributária, como principal ou
acessória, embora busque elementos em outras áreas de direito, pode ser
definida a partir do direito tributário com seus elementos característicos.
Os sujeitos passivo e ativo da relação jurídico-tributária têm deveres
e direitos, os quais se contrapõem, em sua grande maioria. As garantias
que o sujeito passivo tem, constitucionalmente prescritas, são formas de
frear a voracidade fiscal que muitas vezes se apresenta. A solidariedade,
no direito privado, tem características próprias, pouco exploradas pela
maioria dos doutrinadores. Você aprenderá, neste capítulo, sobre as
características da solidariedade e as suas consequências.
2 Obrigação tributária (fato gerador): sujeito passivo, ativo e solidariedade

Fato gerador das obrigações tributárias


principal e acessória
A obrigação tributária, segundo Aliomar Baleeiro (2009), é o núcleo do direito
tributário, visto que se trata de um direito obrigacional. A concepção do jurista
baiano é correta, considerando que política orçamentária ou outros aspectos
quanto ao destino dos recursos tributários arrecadados são objetos do direito
fiscal. O direito tributário trata, basicamente, da relação jurídico-tributária
existente entre o sujeito passivo e o sujeito ativo da obrigação tributária.
A concepção de obrigação tributária consta no art. 113 do Código Tributário
Nacional (CTN), o qual prescreve que “a obrigação tributária é principal ou aces-
sória” (BRASIL, 1966, documento on-line). Ao se referir de forma tão ampla, em
verdade, não explica o que, de fato, é a obrigação tributária. Baleeiro (2009) afirma
que o direito tributário se vale da construção conceitual do instituto realizada pelo
direito privado em seu desenvolvimento. Sua ideia de que o direito tributário deve
se servir do conceito de direito privado para obrigação vai ao encontro de seu
entendimento de que a obrigação tributária consiste no dever de dar (dinheiro),
fazer (declarações, informar, etc.), deixar de fazer (importação proibida, deixar
de emitir notas fiscais, etc.) e tolerar (o exame de livros fiscais, etc.).
Entretanto, é Misabel Abreu Machado Derzi quem aponta características
da obrigação tributária que a tornam diferenciada da obrigação civil (BALE-
EIRO, 2009). A primeira característica advém da crítica de Paulo de Barros
Carvalho, jusfilósofo do direito, que explica que não se poderia atribuir às
obrigações acessórias a designação de obrigação. A obrigação, para o direito
privado, tem um cunho pecuniário, o que a obrigação acessória do direito
tributário não tem, pois se trata apenas de um fazer, não fazer ou tolerar. Por
essa razão, Paulo de Barros considera obrigação tributária tão somente o dever
de pagar tributo, enquanto as demais obrigações acessórias são chamadas pelo
doutrinador paulista de deveres instrumentais.
A segunda crítica é quanto à expressão acessória usada pelo CTN, pois as
obrigações acessórias não dependem da obrigação principal. Ao contrário do
conceito de acessoriedade do direito privado, em que a sorte do acessório deve
seguir a do principal, a obrigação acessória do direito tributário independe do
dever de pagar tributo (obrigação principal). Isso porque a obrigação de prestar
informações à Administração Tributária independe do dever de pagar o tributo.
A terceira característica da obrigação tributária é que esta denominaria
de obrigação principal tanto o tributo quanto as penalidades aplicadas pelo
auditor-fiscal, o que contrariaria o conceito de tributo constante no art. 3º do
CTN, em que não constituirá sanção de ato ilícito (BRASIL, 1966).
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Dentre as características do tributo, Ricardo Alexandre destaca o fato de ser uma


prestação compulsória, em que o contribuinte não tem a opção. O dever do con-
tribuinte de pagar o tributo é imposto por lei, independentemente de sua vontade.
Na obrigação tributária, não há a vontade do credor, que tem o dever prescrito em
lei de cobrar o crédito tributário (ALEXANDRE, 2017).

Porém, ao passo que apresenta as contundentes críticas, Misabel Derzi


afirma que tais críticas não desmerecem a redação do CTN, mas apenas
auxiliam na compreensão do instituto (BALEEIRO, 2009). A jurista aponta,
ainda, a lição dada por Souto Maior Borges, que explica que a obrigação
jurídica não é uma categoria lógico-jurídica, mas tão somente uma construção
jurídico-positiva do direito posto. Ou seja, a obrigação é definida pelo direito
posto e, muito mais do que ter atributos inerentes, cada ramo do direito po-
derá prescrever no direito positivo o que se constituirá a obrigação. Assim, a
descrição da obrigação tributária constante no CTN estaria em consonância
com o ramo específico do direito tributário, abarcando a obrigação tributária
tanto os deveres principais quanto os acessórios (BALEEIRO, 2009).
Nesse sentido, a conceituação de obrigação tributária deve ser buscada
no próprio direito tributário e passa, necessariamente, pela compreensão de
obrigação principal e obrigação acessória.
Primeiramente, é necessário se compreender que a distinção da obrigação
tributária em principal e acessória não é a mesma compreendida no direito
privado. A obrigação acessória não tem dependência da relação principal,
tendo ambas objetos distintos e consequências diversas.
Leandro Paulsen (2017), ao destacar que o contribuinte tem obrigação de
natureza contributiva, que significa o dever fundamental de pagar tributos,
afirma que a obrigação principal constitui nas “[...] obrigações de prestar
dinheiro, seja a título de tributo ou de multa [...]”, conforme redação do art. 113
do CTN (PAULSEN, 2017, p. 201). Assim, segundo sua definição de obrigação
principal, que se lastreia no Código, está presente o tributo e a sanção como
obrigação, mesmo não sendo a segunda um tributo na acepção do conceito
constante no art. 3º do CTN (BRASIL, 1966). Isso porque o doutrinador ex-
plica que as sanções não são tributo, mas têm caráter de obrigação principal.
Alexandre (2017, p. 329) afirma que “[...] a multa tributária não é tributo, mas
a obrigação de pagá-la tem natureza tributária”.
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O CTN, no art. 114, prescreve que o “fato gerador da obrigação principal é a situação
definida em lei como necessária e suficiente à sua ocorrência” (BRASIL, 1966, documento
on-line), demonstrando que apenas haverá a obrigação de pagar quando o fato em
que incide o tributo esteja previsto em lei.

As obrigações principais (de pagar), seja esta um tributo ou penalidade


decorrente do não pagamento de um tributo ou até mesmo de uma obrigação
acessória, devem observar a estrita legalidade, prevista no art. 150, I, da
Constituição Federal (BRASIL, 1988), e no art. 97, V, do CTN (BRASIL,
1966). A definição de Alexandre (2017) descreve a obrigação principal e,
por sua vez, já delineia a obrigação acessória, pois “em resumo, ao afirmar
que a obrigação tributária principal tem por objeto o pagamento de tributo
ou penalidade pecuniária (art. 113, § 1º), o CTN acabou por definir que tal
obrigação é sempre de dar (dinheiro), jamais de fazer ou deixar de fazer algo”
(ALEXANDRE, 2017, p. 330).
A obrigação acessória vem prescrita no parágrafo segundo do art. 113
do CTN, em que consta que “a obrigação acessória decorre da legislação
tributária e tem por objeto as prestações, positivas ou negativas, nela previstas
no interesse da arrecadação ou da fiscalização dos tributos” (BRASIL, 1966,
documento on-line). Dessa forma, consiste na necessidade de fazer, deixar de
fazer ou tolerar fatos expressamente previstos na legislação. Ao contrário da
obrigação principal, que consiste em dar dinheiro ao sujeito ativo, conforme
previsto em lei, a obrigação acessória não é patrimonial.
A ideia de que essa obrigação é acessória advém do fato de que são ati-
vidades previstas em lei, em razão de suas necessidades, conforme leciona
Alexandre (2017, p. 331) ao dizer que:

[...] a relação de acessoriedade, em direito tributário, consiste no fato de que


as obrigações acessórias existem no interesse da fiscalização ou arrecadação
de tributos, ou seja, são criadas com o objetivo de facilitar o cumprimento
da obrigação tributária principal, bem como de possibilitar a comprovação
deste cumprimento (fiscalização).
Obrigação tributária (fato gerador): sujeito passivo, ativo e solidariedade 5

Serão obrigações acessórias todas aquelas prescrições previstas em lei


que não consistam em dar dinheiro ao sujeito ativo, mas que auxiliarão na
fiscalização e/ou arrecadação, tais como prestar informações, registrar atos
e/ou fatos, disponibilizar, preencher documentos, dentre outras atividades.

Características, direitos e obrigações do sujeito


ativo e do sujeito passivo
Os sujeitos da relação jurídico-tributária têm características, direitos e obriga-
ções próprias, considerando a sua tipicidade. São características excepcionais
do sujeito ativo, que lhe colocam em supremacia, mas que determinam direitos
de proteção ao sujeito passivo.
O sujeito ativo é o credor da obrigação tributária, seja ela principal (receber
dinheiro), seja ela acessória (exigir atitudes positivas ou negativas do sujeito
passivo), o que lhe dá a prerrogativa de editar normas tributárias de fiscali-
zação, cobrar os tributos, fiscalizar, constituir o crédito tributário, inscrever
em dívida ativa e ajuizar execução fiscal. Mas apenas dois são os artigos
constantes no CTN que tratam sobre o sujeito ativo da relação tributária.
O primeiro deles, o art. 119, prescreve que o “sujeito ativo da obrigação é a
pessoa jurídica de direito público, titular da competência para exigir o seu
cumprimento” (BRASIL, 1966, documento on-line). O segundo, o art. 120,
apenas refere que da pessoa jurídica de direito público desmembrada seguirão
os mesmos direitos (BRASIL, 1966). O prescrito no art. 119 deixa claro o
poder do sujeito ativo de agir unilateralmente. Dada a supremacia do sujeito
ativo em relação ao passivo, é possível dizer que os atos desse sujeito têm
características especiais, quais sejam, “presunção de legitimidade e veracidade,
imperatividade, autoexecutoriedade e tipicidade” (DI PIETRO, 2017, p. 277).

O sujeito ativo realiza atos típicos administrativos, considerando a supremacia do


interesse público. Não obstante, os atos administrativos realizados pelo sujeito ativo
se submetem ao controle pelo Poder Judiciário quanto à sua legalidade.
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Os atos administrativos gozam de presunção de legitimidade e veraci-


dade, que significa que se presume o ato do sujeito ativo como praticado em
conformidade com a lei. O sujeito credor da relação jurídico-tributária é, e
deve ser, realizado na forma prescrita em lei. Além disso, os atos do sujeito
ativo são necessariamente verdadeiros. Por essa razão, quaisquer certidões,
atestados, declarações e informações prestadas pela Administração Tributária
gozam de veracidade presumida e boa-fé. Isso porque se trata de uma forma
de expressão da soberania do Estado, pois a necessidade de cobrança dos
tributos para a mantença da sociedade gera a necessidade de que não se tenha
um questionamento constante a cada ato do sujeito ativo da relação tributária.
Os atos do sujeito ativo gozam do atributo da imperatividade, pois se im-
põem ao sujeito passivo independentemente da concordância deste, podendo
impor obrigações ao contribuinte, e mesmo a terceiros, de forma unilateral.
Os atos do sujeito ativo que têm imperatividade são apenas aqueles que criam
obrigações aos administrados.
Outra característica importante é que os atos do sujeito ativo têm autoexe-
cutoriedade, pois são postos em execução independentemente da intervenção
pelo Poder Judiciário. Ao privado isso não é permitido, salvo raros casos, como
a legítima defesa ou a defesa da posse em caso de esbulho. O sujeito ativo pode
autoexecutar seus atos pelos meios coercitivos próprios, sem a necessidade
de postular a intervenção judicial, através dos meios diretos de que detenha,
mesmo forçando o sujeito passivo.
Os atos do sujeito ativo devem estar revestidos de tipicidade, visto que
deverão estar prescritos em lei e executados em sua conformidade. Essa
característica, que decorre do princípio da legalidade, prescreve que os atos
deverão estar vinculados à lei, constituindo, como garantia do cidadão, que
não se praticarão quaisquer atos arbitrários.
O sujeito passivo tem por dever um dar, um fazer, um deixar de fazer ou
um tolerar, os quais consistem em obrigações principal ou acessória. O não
cumprimento de quaisquer dessas obrigações, as quais devem sempre estar
prescritas em lei, acarretará na responsabilização do sujeito passivo. O art.
121 do CTN prescreve que o “sujeito passivo da obrigação principal é a pes-
soa obrigada ao pagamento de tributo ou penalidade pecuniária” (BRASIL,
1966, documento on-line). Já o art. 122 diz que “sujeito passivo da obrigação
acessória é a pessoa obrigada às prestações que constituam o seu objeto”
(BRASIL, 1966, documento on-line). Essas são as principais obrigações do
sujeito passivo da relação jurídico-tributária.
Dentre os direitos do sujeito passivo, encontram-se as limitações ao poder
de tributar, constantes nos artigos 150 a 152 da Constituição Federal de 1988
Obrigação tributária (fato gerador): sujeito passivo, ativo e solidariedade 7

(BRASIL, 1988). Esses direitos são garantias dos contribuintes que repre-
sentam a defesa de direitos individuais elencados na Carta Magna, como,
por exemplo, a impossibilidade de tributar livros e templos, o que preserva
o direito fundamental à educação e à liberdade religiosa. Igualmente servem
como preservação da forma federativa de Estado, posto que não se permite a
distinção entre entes federativos (PAULSEN, 2017). Por essa razão, consideram-
-se cláusulas pétreas as garantias do sujeito passivo constantes nas limitações
ao poder de tributar.

As cláusulas pétreas vêm prescritas no art. 60, § 4º, da Constituição Federal de 1988
(BRASIL, 1988), e representam cláusulas de dureza, em que algumas matérias sequer
podem ser objeto de iniciativa de discussão legislativa para a alteração da Constituição.
São matérias que jamais se poderão alterar nesta Constituição: “I — a forma federativa
de Estado; II — o voto direto, secreto, universal e periódico; III — a separação dos
Poderes; IV — os direitos e garantias individuais” (BRASIL, 1988, documento on-line).

Algumas garantias promovem a segurança jurídica, a justiça tributária e


a liberdade federativa, como os princípios da legalidade, da irretroatividade
e da anterioridade, previstos no art. 150, I, a, III, a, b e c, e no art. 195, § 6º,
todos da Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 1988). Tais garantias, a par
de significar um dever ao sujeito ativo de observar esses direitos, significam
que o ente tributante apenas poderá instituir ou majorar tributos conforme
expressa disposição legal. Igualmente não poderá a lei impositiva mais one-
rosa ser aplicada às situações pretéritas, o que importa na irretroatividade da
norma tributária. Nos dizeres de Paulsen (2017, p. 136), “não se pode admitir
que a atos, fatos ou situações já ocorridas sejam atribuídos novos efeitos
tributários, gerando obrigações não previstas quando da sua ocorrência”. A
garantia da anterioridade representa a necessidade de prévio conhecimento da
lei tributária mais gravosa, ou seja, o sujeito passivo tem o direito de calcular e
antecipar os efeitos da norma tributária que lhe impõe obrigações de recolher
tributos. Essa garantia se divide entre anterioridade de exercício, em que as
leis tributárias mais gravosas apenas terão aplicação ao contribuinte no ano-
-calendário seguinte, e anterioridade nonagesimal, em que haverá sempre
um interstício de 90 dias entre a publicação da lei instituidora ou majoradora
do tributo e sua incidência apta a gerar obrigações tributárias.
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Igualmente o sujeito passivo tem como direito a isonomia tributária, pres-


crita no art. 150, II, da Constituição Federal (BRASIL, 1988). Essa garantia
veda que sujeitos passivos que se encontrem na mesma situação sejam tratados
de forma desigual. Assim, todos aqueles que se encontrem em igual situação
profissional e/ou econômica têm iguais deveres e direitos na relação jurídico-
-tributária (PAULSEN, 2017). Garante-se, assim, a justiça tributária.
O sujeito passivo tem garantido, também, a impossibilidade do exercício do
confisco pelo sujeito ativo, nos termos do art. 150, IV, da Constituição Federal
(BRASIL, 1988). Isso representa a impossibilidade de tributação excessiva,
ou onerosa demais, que chegue ao ponto de absorver a própria fonte de tribu-
tação. Embora não conste na lei qual seria o limite máximo a representar um
confisco, o Supremo Tribunal Federal sinalizou, em 1999, na Ação Direta de
Inconstitucionalidade 2.010, ao tratar sobre contribuição previdenciária de
servidores públicos, que a tributação em um importe total de 25%, associado
ao imposto de renda de 27,5%, representaria confisco. Nesse aspecto, Paulsen
(2017, p. 144) destaca que “[...] a verificação do caráter confiscatório de um
novo tributo ou majoração se faz em face da carga tributária total a que resta
submetido o contribuinte, e não em face da onerosidade de cada tributo iso-
ladamente considerado”. Não se admitirá, destarte, uma tributação excessiva
considerando a totalidade de tributos recolhidos pelo sujeito passivo.
Embora constante dentre as limitações ao poder de tributar, as imunidades
tributárias e as vedações de instituição de tributos interestaduais e intermuni-
cipais representam uma falta de capacidade tributária do sujeito ativo (e não
propriamente um direito do sujeito passivo, mas um não direito do sujeito ativo)
e uma impossibilidade de ofensa ao pacto federativo entre os entes tributantes.

Solidariedade conforme o Código Tributário


Nacional
Inicialmente, é importante que se destaque que nem todo o sujeito passivo
será contribuinte, ou seja, aquele com a obrigação principal de pagar o tributo
previsto na lei. E mesmo dentre aqueles que têm o dever de pagar o tributo,
haverá o responsável tributário, que tem o dever de pagar o tributo por expressa
disposição legal. Como refere Baleeiro (2009, p. 721), “não há, pois, respon-
sabilidade fiscal senão aquela resultante expressamente da lei. O contribuinte
caracteriza-se pela relação pessoal e direta com o fato gerador: quem pratica,
em seu nome, o ato jurídico ou o fato previsto na lei”. O responsável, por sua
vez, “o terceiro — designado pelo art. 121 simplesmente de responsável — é
Obrigação tributária (fato gerador): sujeito passivo, ativo e solidariedade 9

obrigado no bojo de uma relação de colaboração com a Administração, para


a simplificação, a facilitação ou a garantia da arrecadação” (PAULSEN, 2017,
p. 214).
O contribuinte e o responsável tributário podem ser obrigados ao pagamento
do tributo. Entretanto, o dever de recolher o tributo decorre de diferentes hipó-
teses legais, surgem em momentos distintos e têm causas distintas. Enquanto
o contribuinte tem o dever próprio de arrecadar o tributo previsto em lei, ao
responsável somente surge o dever de recolher o tributo em nome do contri-
buinte (e com o dinheiro deste) em hipóteses e oportunidades expressamente
previstas em lei. Mais, ao responsável tributário apenas ser-lhe-á prescrita em
lei o recolhimento do tributo quando este não se desincumbir de seu dever de
colaborar com o fisco. Misabel Abreu Machado Derzi refere que “[...] o sujeito
passivo, da espécie responsável, não tem relação pessoal e direta com o fato
descrito no aspecto material da hipótese. Não reveste a condição de contri-
buinte, mas sua obrigação decorre de disposição expressa de lei” (BALEEIRO,
2009, p. 724). Observe-se, por oportuno, que os direitos e garantias previstas
ao contribuinte igualmente são resguardadas ao responsável tributário.
A solidariedade, no direito privado, decorre por expressa disposição legal
ou em decorrência de previsão contratual. Sua previsão legal consta dentre
os artigos 267 e 274 (solidariedade ativa), e dentre os artigos 275 a 285 (so-
lidariedade passiva) do Código Civil brasileiro (BRASIL, 2002). Gagliano e
Pamplona Filho (2017, p. 250) afirmam que:

Existe solidariedade quando, na mesma obrigação, concorre uma pluralidade


de credores, cada um com direito à dívida toda (solidariedade ativa), ou uma
pluralidade de devedores, cada um obrigado à dívida por inteiro (solidarie-
dade passiva). Embora não haja previsão legal específica, consignada nas
disposições gerais da solidariedade no Código Civil, nada impede que se
fale também em solidariedade mista, constituída pela vontade das partes,
submetida, intuitivamente, às regras que regulam as duas primeiras.

Os civilistas arrematam ao explicar que “[...] existe unidade objetiva da


obrigação (o objeto é único), embora concorram mais de um credor ou devedor,
cada um deles com direito ou obrigado, respectivamente, a toda a dívida”
(GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2017, p. 250).
A definição do direito privado é importante porque demonstra a grande
distinção da solidariedade prevista no direito tributário, o que se apresenta,
especialmente, no extenso tratamento dado pela legislação civilista e a parca
matéria constante no CTN, que a refere apenas em dois únicos artigos. Consta
a solidariedade prevista nos artigos 124 e 125 do CTN (BRASIL, 1966).
10 Obrigação tributária (fato gerador): sujeito passivo, ativo e solidariedade

O CTN prescreve, quanto aos efeitos da solidariedade, em seu art. 125:

[...] I — o pagamento efetuado por um dos obrigados aproveita aos de-


mais; II — a isenção ou remissão de crédito exonera todos os obrigados,
salvo se outorgada pessoalmente a um deles, subsistindo, nesse caso,
a solidariedade quanto aos demais pelo saldo; III — a interrupção da
prescrição, em favor ou contra um dos obrigados, favorece ou prejudica
aos demais (BRASIL, 1966, documento on-line).

Baleeiro (2009), embora refira que a legislação civil é aplicável, no que


caiba, à solidariedade tributária, define-a como “a solidariedade no direito
tributário é a passiva e resulta sempre da lei: não se presume, nem pode nascer
da vontade das partes. Tais características, per si, demonstram a distinção
entre ambas” (BALEEIRO, 2009, p. 728).
Primeiramente, é importante que se restrinja apenas à solidariedade passiva,
posto que, ao contrário do direito privado, não há a responsabilidade ativa no
direito tributário. Apenas haverá a solidariedade entre contribuintes ou respon-
sáveis tributários. Serão solidários para o fisco aqueles que tenham interesse
comum na situação que constitua no fato gerador da obrigação principal e
os que forem expressamente designados em lei. Talvez o melhor exemplo
de solidariedade vem nas normas relativas ao Imposto Predial e Territorial
Urbano (IPTU), em que os coproprietários serão igualmente responsáveis
pelo pagamento do tributo impago.
Diferentemente do direito privado, apenas serão solidários aqueles expres-
samente designados pela norma tributária, ou seja, não há a designação de
solidariedade por mera determinação do fisco ou vontade das partes.
Observe-se, também, que a solidariedade não é apenas uma forma de “in-
clusão do devedor”, mas um instituto de definição de grau de responsabilidade.
A lição de Misabel Abreu Machado Derzi, pela sua clareza, vale ser transcrita:

[...] a solidariedade não é uma espécie de sujeição passiva por responsabili-


dade indireta, como querem alguns. [...] A solidariedade não é, assim, forma
de inclusão de um terceiro no pólo passivo da obrigação tributária, apenas
forma de graduar a responsabilidade daqueles sujeitos que já compõem o pólo
passivo (BALEEIRO, 2009, p. 729).
Obrigação tributária (fato gerador): sujeito passivo, ativo e solidariedade 11

Misabel Abreu Machado Derzi é considerada uma das maiores juristas do país na
área tributária. Sua extensa obra e histórico, como Procuradora-Geral aposentada
do Estado de Minas Gerais e professora da Universidade Federal de Minas Gerais, e
participação nas mais importantes associações nacionais e internacionais de direito
fiscal e tributário lhe habilitaram a ser escolhida como comentadora da obra de Aliomar
Baleeiro, intitulada Direito tributário brasileiro.

Todavia, é Alexandre (2017) quem aborda as características dessa espe-


cial solidariedade. Primeiramente, não há o chamado benefício de ordem na
solidariedade, ou seja, o direito de um dos obrigados exigir que, primeiro,
seja exigida a obrigação dos demais não é possível no direito tributário. Todos
podem ser igualmente exigidos pelo fisco a qualquer momento e de forma
integral pela obrigação (ALEXANDRE, 2017).
Outrossim, a inexistência do benefício de ordem remete ao segundo efeito
da solidariedade, qual seja, o pagamento feito por qualquer devedor aproveita
a todos os demais. Qualquer um dos devedores que cumpra a obrigação, exo-
nerará os demais. Eventual direito de regresso entre os solidários competirá
ao âmbito civil.
A dispensa legal do pagamento (isenção) ou o perdão da dívida tributária
(remissão) aplicar-se-á a todos os obrigados da relação jurídico-tributária.
Esses benefícios se aplicarão de forma objetiva, ou seja, a todos os obrigados
em razão de critérios objetivos (sem relação às partes) ou em razão de critérios
subjetivos (em face de especial característica de determinada pessoa). No
primeiro caso (critério objetivo), o benefício aplicar-se-á a todos os obrigados
solidários; no segundo, apenas aos beneficiados pessoalmente pela isenção
ou remissão (critério subjetivo).
Por derradeiro, o CTN prescreve que a interrupção da prescrição, que é
o prazo extintivo para que o fisco cobre a obrigação tributária, aplica-se a
todos os solidários, seja essa interrupção para beneficiar ou não os devedores.
A interrupção do prazo de prescrição, quando cessada a causa que lhe inter-
rompeu, importa em nova contagem do prazo para o fisco exigir a obrigação
tributária (ALEXANDRE, 2017). O mesmo se dará quando qualquer um dos
solidários ajuizar uma ação anulatória em face do fisco, interrompendo a
prescrição, o que beneficiará mesmo os que não ingressaram com a ação em
face da Administração Tributária.
12 Obrigação tributária (fato gerador): sujeito passivo, ativo e solidariedade

ALEXANDRE, R. Direito tributário. 11. ed. Salvador: JusPodivm, 2017.


BALEEIRO, A. Direito tributário brasileiro. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009.
BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
Brasília, DF: Presidência da República, 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.
br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm. Acesso em: 20 out. 2019.
BRASIL. Lei nº. 5.172, de 25 de outubro de 1966. Dispõe sobre o Sistema Tributário Nacional
e institui normas gerais de direito tributário aplicáveis à União, Estados e Municípios.
Brasília, DF: Presidência da República, 1966. Disponível em: http://www.planalto.gov.
br/ccivil_03/leis/L5172Compilado.htm. Acesso em: 20 out. 2019.
BRASIL. Lei nº. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Brasília, DF: Pre-
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LEIS/2002/L10406.htm. Acesso em: 20 out. 2019.
DI PIETRO, M. S. Z. Direito administrativo. 30. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2017.
GAGLIANO, P. S.; PAMPLONA FILHO, R. Manual de direito civil: volume único. São Paulo:
Saraiva, 2017.
PAULSEN, L. Curso de direito tributário completo. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2017.

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