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HISTÓRIA DE UM PROJETO
Álvaro Sebastião Teixeira Ribeiro*
O Projeto Filosofia na Escola alcança seu segundo ano de vida e, como toda a criança
de 2 anos já consegue dar passos seguros e fala por si mesma. Iniciativa conjunta dos
Departamentos de Filosofia e Teoria e Fundamentos da UnB, este é um projeto de
extensão permanente (DEX/UnB) que vem sendo desenvolvido na Faculdade de
Educação/UnB, tendo por objetivo principal criar espaços para promover a prática
filosófica com crianças, adolescentes e jovens, na Educação Infantil, no Ensino
Fundamental e no Ensino Médio em escolas da rede pública do Distrito Federal.
O embrião desta iniciativa começa a ser gerado ainda em 1996 onde, por iniciativa de
profissionais da UnB, é organizado um minicurso de extensão (16 horas), com objetivo
de fomentar a discussão em torno do tema na capital federal. Com a participação dos
professores Ann M. Sharp (co-autora do programa Filosofia para Crianças,
pesquisadora e professora do IAPC, Montclair State University, New Jersey), Walter O.
Kohan (Departamento de Filosofia, Universidade de Buenos Aires), Nelson Gomes,
Julio Cabrera e Agnaldo Couco Portugal (Departamento de Filosofia, Universidade de
Brasília), a atividade obteve um grande respaldo da comunidade. Com a participação de
mais de 100 (cem) alunos e ex-alunos da UnB, bem como professores das escolas
públicas e privadas do DF, o mini-curso desenvolveu-se com a apresentação de
trabalhos práticos e teóricos na área.
Neste mesmo período, também, são organizadas, para os professores da rede pública,
oficinas demonstrativas de Filosofia. São realizadas um total de 10 (dez) oficinas que
contam com a participação de mais de 200 (duzentos) professores e despertaram um
grande interesse pelo Projeto nascente.
Das escolas selecionadas foram indicados, de cada uma delas, até 5 (cinco)
profissionais, dentre eles 3 (três) ou 4 (quatro) regentes. Os participantes das escolas
totalizaram 18 (dezoito) profissionais, entre professores regentes, orientadores
educacionais, coordenadores pedagógicos e diretores de escolas.
O trabalho nas escolas começou a ser organizado após o curso inicial. As equipes de
trabalho foram compostas pelos profissionais do quadro permanente das escolas
participantes do Projeto, 4 (quatro) a 5 (cinco) profissionais e 2 (dois) mediadores (1
(um) professor da FEDF e 1 (um) estudante da UnB). Com o acompanhamento
constante da equipe de coordenação, deu-se início ao trabalho. A previsão inicial era a
de realização de uma aula de Filosofia por semana, com seu precedente planejamento e
posterior avaliação, bem como uma reunião mensal com todos os componentes, para
avaliação, planejamento e aprofundamento teórico. O planejamento e execução das
aulas aconteceram na própria escola e a reunião mensal, na UnB.
Apesar dos resultados alcançados pelo Projeto Filosofia na Escola, durante o ano de
1998, a avaliação final indicava a existência de alguns problemas. Percebe-se
claramente a deficiência da formação filosófica do cidadão brasileiro, o que leva os
professores a, também, não terem desenvolvidas habilidades básicas necessárias à sua
cotidianidade. O caráter da experiência desenvolvida, que traz uma inovação na prática
de ensino e os limites de recursos humanos empregados no Projeto, como era de se
esperar, também oferecem demandas difíceis de serem atendidas pela coordenação. O
caráter voluntário dos participantes, sendo que apenas alguns alunos da UnB receberam
modestas bolsas, também influenciava sobremaneira nas condições de trabalho.
Outras situações relevantes que tiveram influência no desenrolar do trabalho foram: as
dificuldades encontradas com a maioria das instâncias de coordenação da FEDF, local
(Escola), intermediária (Divisões Regionais de Ensino) e central (Departamento de
Pedagogia), para envolver-se ativamente do Projeto e a paralisação ocorrida em função
da greve decretada tanto na UnB, quanto na FEDF na primeira parte do ano. Em
decorrência desta greve, houve a paralisação, por opção do próprio grupo, quase que
total do projeto. A paralisação das atividades dificultou a implementação do Projeto,
minando o nível de compromisso de alguns professores que acabaram desistindo da
empreitada.
O processo decisório sobre essa paralisação dos trabalhos permitiu uma ampla discussão
no grupo. Foram organizados encontros para discutir-se aquele momento político vivido
nas escolas, algumas aulas foram desenvolvidas com crianças sobre temas relacionadas
com a greve. Apesar da riqueza filosófica proporcionada pelo momento, não se
conseguiu manter o grupo com a mesma unidade e, consequentemente, o Projeto saiu
debilitado no que concerne ao relacionamento e a motivação do pessoal envolvido. O
forte impulso que o curso inicial forneceu, com a paralisação das atividades, sofreu um
impasse desmotivador.
Neste processo de retomada das atividades tivemos a presença na UnB do Profº Dr.
Jorge Larrosa, da Universidade de Barcelona, que ministrou o curso "Liberdade e
Amizade na Experiência da Leitura". O curso teve a duração de 30 horas/aulas, tendo
participado do mesmo 20 (vinte) pessoas. Esta atividade contribuiu para pensar a
relação da literatura com a filosofia no Projeto.
Neste primeiro ano o Projeto procurou ser fiel aos objetivos de buscar inovação no
campo da área de Filosofia para Crianças, visando, não implementar um programa já
pronto (como o programa Lipman, com novelas para crianças e manuais para
professores), mas pesquisar a própria textualidade da pratica filosófica com crianças,
bem como criar métodos próprios de trabalho e elaborar instrumentos de registro e
avaliação da experiência.
O segundo ano de vida começou com uma mudança substantiva no Governo do Distrito
Federal. As eleições de 1998 mudaram o mapa político do Distrito Federal e
consequentemente a política educacional. Neste clima de mudança, a insegurança em
relação a continuidade do Projeto Filosofia na Escola foi geral, no entanto, o novo
governo garantiu a continuidade do Projeto que passaria por uma fase de avaliação, uma
vez completados os dois anos de duração, a final de 1999.
Além dos 3 (três) mediadores da área de Psicologia, Mariana Tavares Rabelo, Beatriz C.
dos Santos e Maria Alice Gomes de Oliveira, incorporaram-se, inicialmente ao trabalho
os seguintes mediadores: Francisco Gilson Rebouças Pôrto Jr, Herbert Luiz do
Nascimento, Simone Venâncio Fernandes e Tâmara Marisi Fernandes Vicentine,
estudantes do curso de Pedagogia da UnB. Do curso de Filosofia incorporam-se ao
Projeto os estudantes: Eronildo Silva Santiago, Rudhra Gallina, Valeska Maria Zanello
de Loyola e Wanderson F. Nascimento, bem como, Gabriela Lafetá Borges (mestranda
em História). Com a diversificação do grupo de mediadores o projeto encontra maiores
possibilidades interdisciplinares.
Logo após o congresso foi oferecido um mini-curso com a presença do Profº Dr. David
Kennedy, da Montclair State University, que aborda questões de filosofia da infância.
Houve participação de mediadores e professores do Projeto, bem como professores que
haviam participado do Congresso e buscavam aprofundar seus conhecimentos.
No mês de julho, de 26 a 30, ocorreu o 3º curso de formação "Filosofia na Escola",
desta feita, com a participação de estudantes e professores que não estavam vinculados
ao Projeto. O curso contou com a participação de 20 pessoas, que buscavam
conhecimento sobre a temática. Sua estruturação seguiu basicamente o padrão dos
cursos anteriores , tendo sido desenvolvido, desta vez, em 60 horas, com início em julho
e término em novembro 99, com a participação do Profº David Kennedy.
Durante este período a equipe passou por modificações com a saída dos trabalhos, dos
mediadores de Psicologia: Mariana, Alice e Isabel, por estarem iniciando um outro
projeto no Instituto de Psicologia, bem como, de outros mediadores, Simone e Tâmara
da Pedagogia e Eronildo, da Filosofia, por motivos pessoais. No entanto, no mesmo
período contamos com a adesão dos estudantes de Pedagogia, Ana Paula de Matos
Oliveira, Paula Fernandes e Maurício, da Psicologia (licenciatura) Juliana Merçon
Lestani e da Comunicação, Cristiano Torres, vindo a suprir as ausências relatadas
anteriormente. Os novos mediadores foram convidados após participação no 3º curso de
formação. Na reunião de agosto por demanda dos professores foi decidida a criação de
um grupo de estudos para o fortalecimento da formação filosófica dos professores,
coordenados pelo Profº Walter O. Kohan. Com a participação de cerca de 20 pessoas,
do Projeto, os encontros se realizaram quinzenalmente, de setembro a dezembro.
UM PROJETO CONTÍNUO...
Neste curto espaço de tempo, dois anos, o Projeto Filosofia na Escola consolidou-se
como um espaço experimental de crescente importância para o ensino da Filosofia na
Educação Infantil e no Ensino Fundamental. Foram buscadas alternativas ao Programa
de Filosofia para Crianças, de Matthew Lipman, alternativas estas, que têm dado ao
professor condições de textualizar a realidade vivida no espaço escolar e,
consequentemente, a utilização de textos que criam condições para uma reflexão com
base na realidade do aluno.
A filosofia nas escolas da rede pública de ensino encontraria espaço mais adequado para
sua implementação com a manutenção do tempo de coordenação pedagógica dos
professores e a autonomia da escola, condições estas fundamentais para a continuidade
e aprofundamento do Projeto. Um apoio efetivo por parte da administração pública seria
fundamental.
O impacto do Projeto tem sido percebido pelo interesse demonstrado por outras escolas
de Ensino Básico da Rede Pública do Distrito Federal e Estados circunvizinhos. O
interesse manifestado em outras escolas públicas do Distrito Federal originou a
realização de palestras e oficinas, assim como visitas de pessoas destas escolas a UnB.
A região circunvizinha do DF, o chamado entorno do Distrito Federal, já recebe
influência do Projeto, haja vista o curso ministrado em Paracatu e as perspectivas de
implantação do mesmo, naquela cidade.
Nas universidades brasileiras o Projeto também está sendo conhecido e já são muitas as
Instituições de Ensino Superior que demonstram interesse em conveniar-se com a UnB,
para desenvolvimento do mesmo. Podemos citar as Universidades de: Taubaté (SP),
Federal de Pelotas (RS), Estadual de Santa Cruz, Ilhéus (BA), Dom Bosco de Campo
Grande (MT), entre outras. Estão em andamento dois convênios internacionais com as
Universidades de Laval (Quebec-Canadá) e Estadual de Montclair (EUA).
O Projeto Filosofia na Escola, inicialmente previsto para durar 2 (dois) anos, encontra-
se frente à demanda para sua continuidade. Os resultados obtidos reafirmam a
necessidade dos currículos de contemplar a Filosofia, não só como disciplina, mas como
dimensão inesquecível da educação das crianças, adolescentes e jovens. O trabalho
desenvolvido ao longo destes anos com os professores regentes de classe, na Educação
Infantil e Ensino Fundamental - fases iniciais, demonstraram a possibilidade concreta
destes profissionais engajarem-se em investigações filosóficas coletivas. O Projeto tem
gerado uma atitude reflexiva nos professores, em que a discussão interdisciplinar surge
de forma enfática. A prática da sala de aula e a postura requisitada na prática de
filosofia, têm orientado a expansão dos princípios exigidos na ação filosófica.