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UNIVERCIDADE

CURSO DE DANÇA
DANÇA CONTEMPORÊNEA III
PROF.ª NATASHA MESQUITA

BERNARDO STUMPF RODRIGUES


01082010409

Relatório
(leitura do prólogo do livro “Movimento Total” de José Gil)

Para melhor compreendermos as ocupações desta obra, devemos,


primeiramente, atentar para o fato de que não estamos lidando com um escrito
sobre estilismos e/ou tecnicismos, tampouco historicidade da dança. Tratando-se
da obra de um filósofo, é importante certificar-se de que esta é uma investigação
analítico-reflexiva do objeto em questão. Gosto de analisar este prólogo como uma
primeira proposição dialética (tanto no sentido platônico do diálogo de pergunta,
resposta e refutação, quanto hegeliano de movimento sucessivo como solução
das contradições ao movimento anterior) para com o leitor, acerca das questões
abordadas no âmbito do espaço da dança, do corpo da dança, do espaço do
corpo.
Promovendo a dita estrutura dialética, a partir da proposição de dualismos
entre objetividade e subjetividade, realidade e virtualidade, corpo e espírito, o
filósofo nos transporta para uma espécie de ontologia do corpo em movimento,
onde nos faz refletir sobre a exoneração do movimento dançado da ditatoriedade
de todo e qualquer lugar conectado aos sistemas físico-mecânicos.
José Gil nos aponta para a idéia de um espaço objetivo, imposto, regrado,
newtoniano, que, no universo do dançarino entra em conflito com um espaço
construído, subjetivo, situado em algum lugar entre a realidade física e o
transcendente metafísico. Neste espaço conflitado, duas palavras guiam o início
da discussão: peso e esforço.

“Vencer o peso é o fim primeiro do bailarino”

No jogo de transformação espacial que o filósofo nos oferece ao deleite da


inquirição, o esforço utilizado na moldagem do espaço, no vencimento do peso,
opera no campo do deslocamento que “marca o nascimento da arte (...). Deixando
de adotar uma postura natural, o corpo dá-se um artifício, faz-se artificial”. Partindo
dessa artificialidade criada pelo artista, pelo dançarino, intencionando a
transformação, “o espaço do corpo é o corpo tornado espaço” e o peso passa a
acompanhar a protagonização do movimento que se faz dançado não por suas
características estéticas, mas por sua condição de recriação do elemento
fundamental espaço.
De maneira a possibilitar um discurso múltiplo, que permita a conexão com
os mais diversos planos de composição e consciência da dança, faço uma
transposição da aparente exatidão dos termos espaço, esforço e peso, da mesma
forma que o filósofo nos propõe um espaço não-físico, em sua totalidade, um peso
não-imutável na sua questão gravitacional e um esforço que vai além de sua
definição mecânica, para as habitações da dança contemporânea que discute -
não tratando de, mas, operando em, sendo tais problemáticas - o lugar do artista
como comunicador do homem no seu mundo e provocador da dialética fruitiva do
encontro performático.
José Gil já nos faz atentar para a impossibilidade de se pensar, no universo
da dança, o espaço como somente uma condição da existência material, que se
submete ao seu poder de divisão e localização, seja um espaço físico, seja um
espaço virtual; ainda devemos nos fazer refletir acerca do espaço como plano de
existência da matéria intelectual, espaço da psique, espaço do pensamento, que
nos permite analisar quais deslocamentos pertencem a esse plano.
Se o deslocamento marca o início da arte, através da artificialidade do ato
que se chamou artístico, o deslocamento do pensamento do homem acerca da
idéia de movimento dançado – O que se move? O que mover? Como mover? Para
que mover? – pode ser visto como uma primeira posição do que se observa hoje
na contemporaneidade da dança em sua relação com os espaços de operação.

“Vencer o peso é o fim primeiro do bailarino”

Vencer o peso, possivelmente, sempre foi, é e sempre será o fim primeiro


do bailarino. Faz-se necessário, neste sentido, analisar as habitações do termo
peso em cada período da história, em cada tendência que se apresentou como
campo do comum, quando se fez dança. Iremos nos ater ao período de nossa
contemporaneidade e a questão do movimento como comentário social.
Para se instaurar um conceito em cena, são necessárias duas coisas:
convidar e instigar. Sem um convite, sua proposição se torna monológica. Se o
convite não provocar uma afetação que traga o espectador para o universo
proposto, não há efetividade na instauração.
Na constante luta do artista com as operações do ato comunicador, o peso
que deve ser vencido participa do sistema mecânico, do sistema afetivo, do
sistema social. O esforço que se emprega na ânsia da vitória é um esforço físico,
intelectual, emotivo, político. No seguimento desde raciocínio, podemos nos
questionar sobre o espaço – os espaços – que participa desta multiplicidade de
contextos aos quais o filósofo nos permite ocupar com o pensamento.
Neste sentido, faz-se necessário atentarmos à anterioridade do prólogo:
Movimento Total. De forma apropriada, o título da obra nos força a imergir nos
mais profundos núcleos da consciência acerca da idéia do movimento, como força
propulsora da arte e da dança, em si.
Me arrisco: “A totalidade do movimento é o fim do bailarino”.

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