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FUNDAMENTOS DA

PSICOMOTRICIDADE

Autoria: Rosana Pazim Nalesso

1ª Edição
Indaial - 2020
UNIASSELVI-PÓS
CENTRO UNIVERSITÁRIO LEONARDO DA VINCI
Rodovia BR 470, Km 71, no 1.040, Bairro Benedito
Cx. P. 191 - 89.130-000 – INDAIAL/SC
Fone Fax: (47) 3281-9000/3281-9090

Reitor: Prof. Hermínio Kloch

Diretor UNIASSELVI-PÓS: Prof. Carlos Fabiano Fistarol

Equipe Multidisciplinar da Pós-Graduação EAD:


Carlos Fabiano Fistarol
Ilana Gunilda Gerber Cavichioli
Norberto Siegel
Julia dos Santos
Ariana Monique Dalri
Marcelo Bucci
Jairo Martins
Marcio Kisner

Revisão de Conteúdo: Bárbara Pricila Franz


Revisão Gramatical: Equipe Produção de Materiais

Diagramação e Capa:
Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI

Copyright © UNIASSELVI 2020


Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri
UNIASSELVI – Indaial.

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XXX p.; il.

ISBN XXXXXXXXXXXXXX
ISBN Digital XXXXXXXXXXXXXXXXX
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Impresso por:
Sumário

APRESENTAÇÃO.............................................................................5

CAPÍTULO 1
Psicomotricidade............................................................................ 7

CAPÍTULO 2
Desenvolvimento Psicomotor.................................................... 61

CAPÍTULO 3
Diagnóstico dos Distúrbios e as Abordagens Teórico-
Práticas de Aplicação da Psicomotricidade............................115
APRESENTAÇÃO
Não existe uma definição para psicomotricidade, pois ela não é uma pessoa.
Portanto não apresenta uma definição única, mas unanimemente está relacionada
à concepção de movimento de forma integrada e organizada, a qual em detrimento
às experiências vivenciadas pelo indivíduo, cria uma ação que é o resultado de
sua individualidade, linguagem e socialização. Envolve suas interações sensório-
motoras, psíquicas e cognitivas, no entendimento das capacidades que compõe
o seu único ser e sua expressão, partindo do movimento, dentro de um contexto
psicossocial.

Sua intervenção está subdividida em três grandes vertentes: a reeducação,


a educação e a terapia, sendo a primeira dirigida para a soma dos movimentos,
a segunda voltada para o âmbito educacional e a terceira se preocupando com a
psique do movimento. Parte, portanto, de uma abordagem inter e transdisciplinar,
compondo uma gama de conhecimentos distribuídos em várias áreas do saber,
como a psicologia, fisiologia, antropologia, biologia, educação e as relacionadas
a estas. Esses saberes possibilitam, usando o corpo como mediador, trazer uma
abordagem do movimento humano, objetivando favorecer a integração deste
indivíduo tanto internamente como externamente, com o mundo dos objetos e
outros indivíduos.

Em sua trajetória histórica e evolutiva, foi sustentada por várias teorias e


práticas, até sua consolidação, apresentando como base o desenvolvimento
psicomotor e o aprendizado, em que cada teórico contribuiu com suas
fundamentações, aliadas ou isoladas a outros teóricos. Essas teorias, entre
elas as de Wallon, Piaget e Ajuriaguerra, permearam entre observações das
habilidades psicomotoras, a importância do movimento para o desenvolvimento
da psique infantil, a construção da imagem e esquema corporal, a relação
do tônus ​​muscular com as habilidades motoras, os distúrbios do desenvolvimento
psicomotor como fraqueza motora, entre outras. Fato é que a maneira como os
psicomotricistas absorvem essas teorias e as compreendem interfere na prática
profissional deles, condicionando a maneira como usam o instrumento corpo,
objetivando otimizar as funções psíquicas.
C APÍTULO 1
PSICOMOTRICIDADE

A partir da perspectiva do saber-fazer, são apresentados os seguintes


objetivos de aprendizagem:

Saber:
 Definir o conceito, principais teóricos, fundamentos e elementos básicos da
psicomotricidade.

 Apresentar a história e emergência da psicomotricidade, bem como sua


evolução até a atualidade.

 Conhecer a intervenção profissional em psicomotricidade e a atuação da equipe


interdisciplinar dentro deste contexto.

Fazer:
 Adquirir conhecimentos sobre o surgimento da psicomotricidade até os dias
atuais.

 Reconhecer os elementos básicos que integram a psicomotricidade, bem como


a atuação da equipe interdisciplinar nesta ciência.
Fundamentos da Psicomotricidade

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Capítulo 1 PSICOMOTRICIDADE

1 CONTEXTUALIZAÇÃO
A psicomotricidade é uma ciência que vem sofrendo, com o decorrer dos
anos, até atingir seu processo de consolidação, diversas influências, contando
com a contribuição de muitos campos do conhecimento. Está fundamentada em
estimular o esquema e a imagem corporal; e um de seus elementos necessários é
a afetividade, a qual consegue determinar a maneira como crianças, adolescentes,
jovens e adultos visualizam o mundo, bem como a maneira como se manifestam
nele.

Durante esse processo de evolução da psicomotricidade, foram surgindo


várias teorias e práticas, objetivando o trabalho e a compreensão do corpo. Quem
nunca ouviu falar em Jean Piaget? Ele nasceu na Suíça e foi um psicólogo que
dedicou seus estudos à psicologia evolutiva, revolucionando os conceitos de
inteligência infantil e provocando grandes mudanças nos antigos conceitos de
educação e aprendizagem (FRAZÃO, 2020).

Esse teórico contribuiu muito para o desenvolvimento da psicomotricidade,


tanto na áreas da biologia como da psicologia, interagindo fases de
desenvolvimento cognitivo, corporal, social e afetivo. Fato é que, por meio dessas
teorias, a psicomotricidade passa a ser encarada como uma atividade total do
organismo, expressando a completa personalidade, correspondendo a uma
análise global do indivíduo (BEE; BOYD, 2011).

Contudo, essas teorias e práticas foram desenvolvidas para reforçar a ideia


de que não se pode compreender o movimento somente sob a ótica anatômica,
fisiológica, psicológica ou social, mas sim em uma dimensão holística. Essa
dimensão necessita associar-se a uma gama de conhecimentos interdisciplinares
e sistêmicos os quais associam as estruturas biopsíquicas e relacionais (COSTA,
2011).

A intervenção interdisciplinar da psicomotricidade é desenvolvida por meio


da terapia, educação e a reeducação psicomotora, que somadas com a ação
de ensinar dos profissionais, devem formar cidadãos críticos, conscientes e
reflexivos. Portanto, essas metodologias devem prestigiar, no indivíduo, qualquer
que seja a faixa etária dele, seu lado afetivo, cognitivo, social, aspecto físico, o
toque e quantos mais aspectos que estimulem os elementos psicomotores rumo
à totalidade em sua assistência, caracterizando assim o ser humano em toda sua
essência (SBP, 2003).

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Fundamentos da Psicomotricidade

2 HISTÓRICO, EVOLUÇÃO E
ABORDAGEM EMERGENTE DA
PSICOMOTRICIDADE
Antes de iniciarmos nosso estudo sobre o histórico, evolução e abordagens
emergentes da psicomotricidade, gostaríamos de trazer a você algumas definições
e entendimentos sobre o termo “psicomotricidade” e suas respectivas dimensões
psíquica e motora. Vamos então a algumas dessas definições...

2.1 PSICOMOTRICIDADE: DEFINIÇÃO


Podemos definir a psicomotricidade como uma área transdisciplinar voltada
ao estudo e à investigação do desenvolvimento biocultural humano nas suas
relações e influências, recíprocas e sistêmicas, que cursa entre o psiquismo
e a motricidade (FERNANDES; GUTIERRES FILHO, 2012). Sobre algumas
definições de psicomotricidade, vamos refletir a respeito do que alguns autores
descrevem:

• É a ciência que tem como objeto de estudo o homem


através do seu corpo em movimento e em relação ao seu
mundo interno e externo, bem como suas possibilidades de
perceber, atuar, agir com o outro, com os objetos e consigo
mesmo. Está relacionada ao processo de maturação, em
que o corpo é a origem das aquisições cognitivas, afetivas
e orgânicas. Psicomotricidade, portanto, é um termo
empregado para uma concepção de movimento organizado
e integrado, em função das experiências vividas pelo
sujeito cuja ação é resultante de sua individualidade, sua
linguagem e sua socialização (ABP, 2019).

• “A psicomotricidade é a otimização corporal dos


potenciais neuro, psico-cognitivo funcionais, sujeitos as
leis de desenvolvimento e maturação, manifestados pela
dimensão simbólica corporal própria, original e especial do
ser humano” (LOUREIRO apud ISPE-GAE, 2007, s.p.).

• Para Nicola, uma conceituação atual de psicomotricidade


é que esta ciência nova, cujo objeto de estudo é o homem
nas suas relações com o corpo em movimento, encontra
sua aplicação prática em formas de atuação que configuram
uma nova especialidade. A psicomotricidade estuda o
homem na sua unidade como pessoa (NICOLA, 2004, p. 5).

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Capítulo 1 PSICOMOTRICIDADE

Após descrevermos alguns conceitos relacionados à psicomotricidade,


queremos então, para que você possa compreender as duas dimensões dessa
ciência, comentar sobre os seguintes cursos: psiquismo e motricidade, iniciando como
a dimensão relacionada ao psiquismo. Podemos compreender o psiquismo como
sendo constituído por um conjunto do funcionamento mental, que está integrado por:
sensações, percepções, imagens, emoções, afetos, aspirações, representações,
simbolizações, fantasmas, medos, projeções, conceptualizações, ideias, construções
mentais etc., bem como a complexidade dos processos relacionais, que envolvem
algum tipo de relação ou relacionamento, e sociais, que estão na sua origem.

Já a dimensão motricidade é compreendida como a soma de expressões


mentais e corporais, que envolvem funções posturais, tônicas, somatognósicas e
práxicas que as mantêm e as sustentam. Devemos então conceber a motricidade
como comportamento e resposta adaptativa, total e unificada, ação porque mobiliza
sensibilidades corporais corticalizadas. Isso é representado pela interiorização
dialética do mundo interior com o exterior, desde o corpo e a natureza, ao social
e cultural, coordenando múltiplas representações em um raciocínio ideocinético e
flexível, cuja elaboração e execução gestual surgem profundamente conectadas e
harmoniosas (FERNANDES; GUTIERRES FILHO, 2012).

Considerando o termo técnico funções posturais, podemos


definir a postura como o alinhamento biomecânico do corpo, tendo
como funções a manutenção do equilíbrio, suporte e estabilização.
Considerando o termo funções tônicas, podemos definir o tônus
muscular como um executor (efetor) de suma importância no
desenvolvimento motor da criança, garantindo, além das atitudes,
todos os sentidos de postura, mímica e emoções dos quais vêm
as atividades motoras. A qualidade tônica pode ser traduzida
como rigidez/espasticidade ou relaxamento muscular. Portanto, a
função tônica está relacionada à qualidade deste tônus. A função
somatognósica é uma função superior do sistema nervoso, sendo
definida como a percepção de que todo mundo tem essa percepção
do próprio corpo. Em suma, é o conhecimento do próprio corpo em
relação ao ambiente. Já a função práxica depende primordialmente
do controle de áreas superiores do córtex encefálico: área motora
primária, área suplementar e córtex pré-motor, sendo responsáveis
por realizar a integração das funções mentais e motoras para que
possa ocorrer a elaboração gestual com os movimentos adquiridos
pelo aprendizado (FERNANDES; GUTIERRES FILHO, 2012).

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Fundamentos da Psicomotricidade

2.2 HISTÓRICO E EVOLUÇÃO DA


PSICOMOTRICIDADE
Quando nos remetemos ao histórico da psicomotricidade, lidamos com o fato
de que sempre se valorizou o corpo humano, desde os primórdios da antiguidade.
Gregos, na cultura deles, exaltavam excesso do culto ao esplendor, visto que
as imagens de esculturas estavam comumente presentes em locais públicos.
Havia, naquela época, sob concepções distintas entre os filósofos, o dualismo
entre corpo e alma. Platão apresentava uma dicotomia entre psico – motricidade,
em que havia cisão entre corpo e alma. Essa dicotomia era considerada na
antiguidade um dualismo radical dentro do ser humano, havendo, portanto, essas
duas realidades (MACHADO; TAVARES, 2010). Temos então a França como
imprescindível para o surgimento da psicomotricidade, sendo conhecida como
o “berço da psicomotricidade”, conforme será contextualizado posteriormente.
No decorrer da história, o termo psicomotricidade surge partindo de um discurso
médico, neurológico, por Karl Wernick, neuropsiquiatra austríaco (1870), que
realizava estudos na área das afasias (áreas relacionadas a perda total ou parcial
da capacidade de expressão e/ou compreensão da linguagem falada ou escrita).
No início do século XIX, houve a necessidade de atribuir nomes para as zonas
do córtex cerebral localizadas além das regiões motoras. Psiquiatras também
se apropriaram da psicomotricidade para classificar os fatores patológicos.
Entendam, portanto que o termo psicomotricidade parte de uma necessidade
médica de achar uma área de estudo que explicasse alguns fenômenos clínicos
(MACHADO; TAVARES, 2010; MORIZOT, 2019).

Agora vamos nos remeter ao início do século XX, quando, no campo da


patologia, partindo dos estudos de Dupré (1907), renomado psiquiatra francês,
que observa a psicomotricidade através de uma linha psiquiátrica (psiquismo-
motricidade), as pesquisas são direcionadas à debilidade motora nos débeis
mentais, com a preocupação básica voltada aos distúrbios psicomotores
(MACHADO; TAVARES, 2010; MORIZOT, 2019). Devemos ressaltar que esse foi
um período em que a preocupação apenas fazia abrangência ao corpo e seus
respectivos distúrbios, descartando-os de áreas relacionadas às emoções e ao
cognitivo. Aqui a síndrome era o destaque e havia três estigmas principais: falta
de destreza, sincinesias e paratonias, as quais não se atribuíam como lesões do
sistema piramidal, mas apenas a uma insuficiência. Durante várias gerações,
predominaria o paralelismo psicomotor, ou seja, a associação estreita entre o
desenvolvimento da psicomotricidade, inteligência e afetividade.

Também cabe ressaltar que, durante as primeiras décadas desse século,


pela ocorrência da 1ª Guerra Mundial, quando as mulheres davam firme entrada
no trabalho formal, suas crianças eram abrigadas em creches, sendo que a escola

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Capítulo 1 PSICOMOTRICIDADE

francesa teve aqui sua influência em nível mundial para a psiquiatria infantil,
pedagogia e psicologia (LUSSAC, 2008).

Seguindo na história, a partir de 1925, as pesquisas de Henri Wallon,


médico psicólogo, tornam-se relevantes. Ele se ocupa do movimento humano e
o atribui conotação fundamental como instrumento na construção do psiquismo.
Enfatiza o comportamento tônico e o vincula à emoção e à estruturação do
caráter. Considera o movimento a primeira estrutura relacionada ao meio. Essas
características permitiram a Wallon integrar o movimento ao afeto, à emoção,
ao meio ambiente e aos hábitos do indivíduo, discursando sobre o tônus e o
relaxamento (LUSSAC, 2008; MORIZOT, 2019). Ainda nesse ano começam a
despertar as primeiras práticas reeducativas, por Georges Heuyer, membro titular
da primeira cadeira europeia de psiquiatria infantil. Utilizando a nomenclatura
“psico-motricidade”, designa a estreita relação entre o desenvolvimento motor,
inteligência e afetividade, de indicação da terapêutica e de prognóstico.

Já na década de 30, incorporam-se novas noções, partindo de pesquisas


no campo da Psicologia e da Psicanálise. Em 1935, Edouard Guilmain,
neurologista, desenvolve um exame psicomotor, através do qual era realizado um
diagnóstico, determinando então as vias terapêuticas. Esse fato tinha influência
no prognóstico, propondo exercícios de atenção, educação sensorial e trabalhos
manuais. Também nessa década despertam as contribuições de Jean Piaget
(1936), tanto nas áreas da Biologia como da Psicologia, interagindo fases de
desenvolvimento cognitivo, corporal, social e afetivo. Já Gesell elabora uma
escala de desenvolvimento, a qual apresenta vínculos com faixas etárias.

Vamos agora adentrar no segundo período da evolução da psicomotricidade,


marcado por uma identidade que precedia a institucional, a teórica e prática.
No século XX, 1947, Julian de Ajuriaguerra, médico psiquiatra, associando
as contribuições de Dupré, Wallon e Piaget, realiza com clareza a delimitação
dos transtornos psicomotores que tramitam entre o neurológico e o psiquiátrico,
partindo das técnicas reeducativas. Ele redefine o conceito de debilidade
motora, considerando-a como uma síndrome com suas próprias particularidades.
Ajuriaguerra aproveitou os subsídios de Wallon em relação ao tônus ao estudar o
diálogo tônico. O psiquiatra faz uma atualização no conceito de psicomotricidade,
unindo-a ao movimento, passando para a história da psicomotricidade como
o único que rompeu de forma efetiva com o imperialismo neurológico e com o
conceito de paralelismo psicomotor de Dupré (LUSSAC, 2008; MACHADO;
TAVARES, 2010).

A psicomotricidade passa então a ser vista como uma atividade total do


organismo, expressando a completa personalidade, correspondendo a uma
análise global do indivíduo. Essa nova visão reflete uma forma motora aliada às

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Fundamentos da Psicomotricidade

características da totalidade do comportamento do indivíduo e isso caracteriza


então a ruptura do imperialismo neurológico. Podemos traduzir isso como
a libertação do polo psicomotor do polo orgânico. Aqui a abordagem torna-
se psicofisiológica, aliada aos afetos e emoções. Está então concretizado o
afastamento da óptica do dualismo cartesiano e, agora sim, o termo psico-
motricidade perde o seu hífen (MORIZOT, 2019).

O diálogo tônico é um termo bastante utilizado em nosso


estudo, motivo pelo qual merece ser melhor explorado. As reações
emocionais se inserem no enredo da evolução geral, manifestando-se
através de todo tipo de atitude, mímica e vocalização consequentes
da perda do equilíbrio ou, pelo contrário, como expressões de alegria
do lactente ao conseguir maior controle sobre o seu equilíbrio. Em
todas essas manifestações, o tônus está presente e os estágios
da teoria de Henri Wallon destacam o aspecto tônico-emocional
no contexto da psicomotricidade. Para auxiliá-lo em sua pesquisa,
sugiro como leitura:

Movimentos espontâneos do diálogo tônico-postural e


atividades expressivas. Estilos clin. São Paulo, v. 18, n. 3, p. 613-
625, dez. 2013. Disponível em: <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.
php?script=sci_arttext&pid=S1415-71282013000300012&lng=pt&nr
m=iso>. Acesso em: 13 jul. 2020.

Convidamos você para uma reflexão sobre o seguinte


questionamento: Na trajetória da história e evolução da
psicomotricidade, em qual momento a palavra psico-motricidade
perde o hífen, passando a ser escrita da seguinte forma:
psicomotricidade?

Chegamos à década de 50, na qual há o afloramento das técnicas reeducativas


dirigidas aos distúrbios psicomotores, resultado dos incansáveis trabalhos de
Ajuriaguerra, Diatkine, Lebovici, entre outros, no Hospital Henri-Rouselle. Elabora-
se, portanto, nova abordagem terapêutica, incluindo exame psicomotor, métodos
e técnicas adaptadas aos diversos transtornos. Essa metodologia assinala

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Capítulo 1 PSICOMOTRICIDADE

importantes eixos da psicomotricidade dos tempos modernos: equilíbrio dinâmico e


estático, coordenação viso-motora, organização espacial e temporal, estruturação
do esquema corporal, lateralidade e domínio tônico. Em 1963, a psicomotricidade
torna-se uma especialidade oficial, sendo criado o Certificado de Reeducação
concedido pelo Hospital Henri Rouselle (MORIZOT, 2019).

Atualmente o mundo está crescendo com maior rapidez e as exigências


sociais com o indivíduo estão cada vez maiores. A sociedade demanda de
indivíduos atuantes, críticos, que se expressem, posicionem-se e se comuniquem
com clareza. Aqui reside a enorme necessidade do desenvolvimento motor no
processo de ensino aprendizagem. Isso fará com que o ser humano enfrente as
situações do dia a dia com maior capacidade e desenvoltura.

2.3 HISTÓRIA E ABORDAGEM


EMERGENTE DA
PSICOMOTRICIDADE NO BRASIL
Estamos iniciando agora nossos estudos sobre a emergência da
psicomotricidade no Brasil, onde a ciência surge no século XX. Como então a
psicomotricidade torna-se emergente? Saiba que esse fato iniciou durante o período
da 1ª Guerra Mundial, visto, conforme relatado anteriormente na França, onde as
mulheres trocavam sua função doméstica pelo trabalho industrial, repassando os
cuidados com os filhos às creches. Surge então grande atenção dirigida para a
psicomotricidade, por estar no ambiente escolar o lugar onde as crianças podem
ser melhor observadas em relação aos movimentos corporais que apresentam.

Antônio Lefévre, sob a influência das obras de Ajuriaguerra, foi um dos


principais difusores da psicomotricidade; Helena Antipoff também foi uma grande
difusora, retratando sua experiência teórica e prática em deficiência mental
para ser aplicada em escolas brasileiras; doutora Dalila de Costallat, atuando
junto ao ministério da educação brasileiro, a partir dos anos 70, com Helena
Antipoff, trocam experiências de experiências desenvolvidas na Argentina com as
pesquisas realizadas no Brasil (SANTOS, 2013).

Vamos agora remontar essa história partindo dos anos 60, em que corpo
e o movimento eram valorizados como elementos coadjuvantes em áreas
diversificadas da reabilitação. Referia-se muito pouco à “psicomotricidade”, pois
nós a desconhecíamos. Conhecíamos sim a assistência, a deficiência mental,
motora e sensorial, em que o público-alvo era a comunidade das Escolas
Especiais, Instituições e Classes hospitalares.

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Fundamentos da Psicomotricidade

Somente pudemos ter acesso às primeiras informações e cursos de


psicomotricidade, através de profissionais que vinham da Europa, visto nossa
literatura ser escassa nesse assunto. Em 1967, Marly Guimarães Froes Peixoto
contribuiu com um trabalho precursor, quando retornou de cursos na Itália e na
França, divulgando relevantes dados, elaborando um rico documento sobre a
psicomotricidade (1967). Um ano depois (1968), em Belo Horizonte, introduz-
se a Reeducação Psicomotora, em que a avaliação psicomotora foi introduzida
como parte do diagnóstico psico-pedagógico. Em 1968, Simonne Ramain traz ao
Brasil o método Ramain, iniciando a primeira formação no Brasil. Esse curso tinha
duração de três anos e contemplava práticas vivenciais e técnicas com estágio.

O livro Distúrbios neuróticos da criança foi publicado por Grünspun em 1976,


no qual cinquenta páginas de um só capítulo foram dedicadas aos distúrbios da
psicomotricidade. Um fato importante também veio com a contribuição de Antonio
Lefebvre, neuropsiquiatra, que realizou um trabalho com crianças brasileiras,
publicando posteriormente uma escala de desenvolvimento psicomotor, utilizando
em sua pesquisa o público infantil na faixa de 3 a 7 anos.

Em São Paulo no Sedes Sapientiae, ocorreu a inclusão de atividades


psicomotoras na clínica infantil do curso de Psicologia, conduzidas por Ana
Maria Poppovic, em 1953. Em 1969 foi incluída no currículo a disciplina
“Psicomotricidade”, tendo como professora Berenice Villela de Andrade.

2.4 EVOLUÇÃO E ECLOSÃO DA


PSICOMOTRICIDADE NO BRASIL
A psicomotricidade teve sua eclosão aqui no Brasil no início da década de
70, quando foram destacadas suas tendências, uma generalista, que consistia em
práticas motoras na área da educação ou reeducação da abordagem corporal.
A outra abordagem diz respeito às correntes que aplicavam métodos ou linhas
de trabalho, resultado dos cursos iniciais, nos quais eram utilizados métodos
Ramain, Le Boulch, Picq & Vayer, Hughette Bucher e Dalila Costallat. Havia
profissionais que faziam a opção por linhas ecléticas, utilizando partes de várias
correntes. Regina Morizot (ABP, 2019) cita que nessa década o acesso à área da
psicomotricidade era muito limitado e as informações eram apenas obtidas por
profissionais em seu retorno a cursos no exterior. Mesmo assim, houve a eclosão
da prática no país, em que a tônica designava que qualquer abordagem corporal
era considerada como psicomotricidade (ABP, 2019; MORIZOT, 2019). O quadro
a seguir retrata alguns marcos da evolução da Ppicomotricidade no Brasil.

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Capítulo 1 PSICOMOTRICIDADE

QUADRO 1 – MARCOS DA EVOLUÇÃO DA PSICOMOTRICIDADE NO BRASIL

ANO EVOLUÇÃO
Subdivisão da disciplina de Psicomotricidade em I e II. Psicomotricidade I, lecionada por Stella
Leme Sampaio, com conteúdo programático: Psicomotricidade I: Lateralidade; Desenvolvimento
1970 motor; Mensuração de orientação espacial e temporal; Noção evolutiva do esquema corporal;
Problemas de linguagem. Psicomotricidade II: diferentes tratamentos, materiais e instrumentos
utilizados no trabalho com crianças, adolescentes e adultos.
Françoise Desobeau, uma das fundadoras da Sociedade Internacional de Terapia
1976 Psicomotora, realiza um curso no Rio de Janeiro, sendo um marco revolucionário,
introduzindo outra ótica da prática: a terapia psicomotora.
Beatriz Sabóia é titulada pela Sociedade Internacional de Terapia Psicomotora,
1977 cumprindo todas as normas e exigências de uma Banca Internacional, sendo
reconhecida oficialmente como psicomotricista.
1979 1° Encontro Nacional de Psicomotricidade em São Paulo com a Dra. Soubiran e Dra. Costallat.
Fundada a Sociedade Brasileira de Terapia Psicomotora, na Clínica Beatriz Sabóia no
1980
Rio de Janeiro.
A Sociedade efetiva os primeiros sócios titulares, com a inclusão de currículo e monografia,
1982 apresentada a uma banca formada pelo Conselho; realização do I Congresso Brasileiro
de Psicomotricidade no estado do Rio de Janeiro.
Realizado o primeiro Curso de Pós-Graduação em Psicomotricidade no Instituto
1983
Brasileiro de Medicina e de Reabilitação (IBMR/RJ).
II Congresso Brasileiro de Psicomotricidade foi em Belo Horizonte com o
1984
tema: Corpo Integrado.
Iniciados Cursos de Pós-Graduação em Psicomotricidade na Faculdade Estácio de Sá e
1986 um Curso de Educação e Reeducação como Especialização em Terapia Psicomotora na
Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).
Autorizada e reconhecida pelo MEC a primeira Graduação em Psicomotricidade, com a
duração de quatro (4) anos, no Instituto Brasileiro de Medicina de Reabilitação (IBMR-RJ).
1990
SócioPsicomotricidade Ramain – Thiers criou sua formação que se transformou logo em
especialização, no Rio de Janeiro.
Solange Thiers desenvolveu uma teoria, fruto de muita experiência, estudos e pesquisas e
1991
apresentou ao mundo científico a SocioPsicomotricidade Ramain –Thiers.
A Psicomotricidade Aquática é desenvolvida e coordenada por Jocian Machado Bueno,
1998
em Curitiba e Fortaleza.
A TransPsicomotricidade é desenvolvida por Marta Lovisaro e Carlos Eduardo Costa,
2000
sediada na UERJ(R.J.).
Formação em Psicomotricidade: Multiplicidades do Cuidar, coordenada por Etelvina França
2004
e Vânia Belli, com sede na Clínica Agathon, no Rio de Janeiro.
2005 II Seminário Mineiro de Psicomotricidade: Interfaces da Psicomotricidade.
III Seminário Mineiro de Psicomotricidade: Imagem Corporal na Contemporaneidade: o
2009
brincar e a virtualidade.
Presença do psicomotricista Ricardo Alves com o curso: Jogo Psicomotor na Educação
2013
e lançamento de seu livro: O corpo do Professor.
Psicomotricidade Heurística, coordenada por Martha Lovisaro, Lecy Consuelo Neves e
2017 Claudia Lovisaro, no Rio de Janeiro. Curumin, formação desenvolvida e coordenada por
Ricardo Alves e Sabrina Toledo, no Rio de Janeiro.
Aión, formação criada e coordenada por Marcelo Antunes, no Rio de Janeiro. O plenário da Câmara
2018
dos Deputados aprovou o projeto de Lei nº 795/03, regularizando a profissão do psicomotricista.
FONTE: Adaptado de ABP (2019) e Morizot (2019)

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Fundamentos da Psicomotricidade

Como você pôde acompanhar, neste tópico pudemos nos remeter à história,
trazendo uma abordagem sobre conceitos da psicomotricidade sob o ponto de
vista de alguns autores. A história da psicomotricidade no Brasil e no mundo se
fez emergente sob a influência de vários de seus teóricos, que contribuíram para
sua evolução e importância nos dias de hoje. Alguns marcos dessa história foram
destacados, objetivando que você possa ter a compreensão de todos os fatos que
a colocam hoje como uma ciência, aliada ao pleno desenvolvimento infantil.

3 PRINCIPAIS TEÓRICOS
E FUNDAMENTOS EM
PSICOMOTRICIDADE
A psicomotricidade, como toda área da ciência, vem sofrendo, com o passar
dos anos, até se consolidar, distintas influências científicas e a contribuição de vários
campos do conhecimento. Foram surgindo, então, teorias e práticas objetivando
o trabalho e a compreensão do corpo. É necessário que você compreenda que
não se pode entender o movimento apenas por um ponto de vista anatômico,
fisiológico, psicológico ou social, mas como uma dimensão holística, associada
a um conjunto de conhecimentos interdisciplinares e sistêmicos que associam as
estruturas biológicas, psíquicas e relacionais. Vamos agora fazer uma abordagem
para que possamos adquirir conhecimentos que nos permitam construir um modelo
teórico que dê legitimidade científica à psicomotricidade. São relevantes, para esse
constructo, os seguintes aspectos (FERNANDES; GUTIERRES FILHO, 2012):

• A descoberta, pelos neurologistas, de problemas psicomotores, quando


perceberam que alguns sintomas de expressão motora, comuns
a determinadas lesões corticais, também teriam a chance de ser
detectados em pessoas fisiologicamente sãs, associando-os, assim, a
questões psicológicas e à noção de problemas psicomotores.
• A aquisição de conhecimentos oriundos da circunstância do hospitalismo,
como pelo desenvolvimento das teorias da vinculação, que mostram o
fundamental papel da ligação afetiva da criança com a mãe, bem como
consequências de carências afetivas.
• A inteligência ter origem na ação que se fundamenta na teoria de Piaget
ao demonstrar como a inteligência é um processo progressivo de
assimilação e acomodação ao envolvimento, indo desde os primeiros
gestos reflexos até o pensamento hipotético e dedutivo na adolescência,
tendo como estrutura-base a iniciativa motora exploratória da criança.
Sobre os termos citados, a assimilação sugere um processo de

18
Capítulo 1 PSICOMOTRICIDADE

adaptação dos estímulos externos às estruturas mentais internas do


sujeito, enquanto a acomodação sugere um processo complementar de
adaptar essas estruturas mentais à estrutura dos mesmos estímulos.
• A linguagem tônico-emocional de Wallon, sendo essa fundamental para
o desenvolvimento da psique da criança, tendo sua origem nas primeiras
trocas tônico-emocionais com a mãe ou seu substituto.

A linguagem ou diálogo tônico-emocional, encontrado nos trabalhos


de Wallon e Ajuriaguerra, consiste em um dos elementos mais importantes
da prática psicomotora e que lhe confere maior especificidade. Note
que a tonicidade consiste em uma função indispensável para o alerta e
a vigilância, assegurando condições seletivas e energéticas. Sem elas,
nenhuma atividade mental seria executada. No contexto da organização
da psicomotricidade, a tonicidade é o seu alicerce primordial, garantindo
atitudes, posturas, mímicas e emoções, de onde surgem todas as
atividades motoras humanas. Saiba, portanto, que ela faz parte da
primeira unidade do modelo de organização funcional do cérebro humano
de Lúria, que consiste na unidade de regulação tônica de alerta e dos
estados mentais. Alexander Romanovich Luria é um neuropsicólogo russo,
que, sem dúvida, é um dos expoentes do século XX em pesquisas para
a compreensão dos processos psíquicos. Para que você aprofunde seus
estudos sobre o diálogo tônico-emocional, indicamos que futuramente
faça as seguintes leituras:

MARTINS, Rui Fernando Roque. O diálogo tónico-


emocional na intervenção e na formação do psicomotricista.
Dissertação de Mestrado em Reabilitação Psicomotora.
Universidade de Lisboa. Faculdade de Motricidade Humana.
Rui Dias Florêncio, 2018. Disponível em: https://www.
r e p o s i t o r y. u t l . p t / b i t s t r e a m / 1 0 4 0 0 . 5 / 1 5 1 6 0 / 1 / 2 0 1 8 _ % 2 0
M e s t r a d o % 2 0 O % 2 0 D i a % C C % 8 1 l o g o % 2 0 To % C C % 8 1 n i c o -
Emocional%20na%20Interven%C3%A7%C3%A3oe%20na%20
forma%C3%A7%C3%A3o%20da%20psicomotricidade_%20
Flor%C3%AAncio%2C%20Rui.pdf. Acesso em: 8 jul. 2020.

FONSECA, Vitor da. Desenvolvimento psicomotor e


aprendizagem [recurso eletrônico]. Porto Alegre: Artmed, 2008. pp.
41-55.

19
Fundamentos da Psicomotricidade

3.1 PRINCIPAIS TEÓRICOS DA


PSICOMOTRICIDADE
Como um dos principais teóricos da psicomotricidade apontamos Henri
Wallon (1879-1962). Vamos então partir para um estudo sobre as teorias dele.
Nasceu em Paris e iniciou sua vida profissional com a filosofia e a medicina
psiquiátrica. Revolucionou vários conceitos da época, tendo sido consagrado
com a psicologia e a quebra de paradigmas sobre educação convencional. Em
sua teoria pedagógica, afirma que, para que haja desenvolvimento intelectual,
há necessidade da interação afetiva, movimento, inteligência e formação do
eu como pessoa, ou seja, não basta apenas de um simples cérebro (SANTOS,
2011). Com relação aos esquemas cibernéticos e triunfais desenvolvidos por
Piaget, conforme veremos adiante, Wallon contrapõe uma maneira de pensar a
criança e o seu desenvolvimento em uma perspectiva dialética de globalidade-
unidade (FONSECA, 2008). Portanto, saiba que vários autores ligados a obra
dele, como Zazzo, consideram a obra de Wallon como um dos melhores meios de
estudo e de análise para a compreensão do desenvolvimento biopsicossocial da
criança (FONSECA, 2008). “Para Wallon, o estudo da criança não é apenas um
instrumento para a compreensão do psiquismo humano, mas também um modo
particularmente privilegiado para contribuir para a sua educação” (FONSECA,
2008, p. 12). Defende que a infância é uma idade única e fecunda para a
compreensão da natureza humana, em que o atendimento é a tarefa primordial
da educação. Sua preocupação pedagógica é extremamente forte e concreta,
motivo pelo qual sua obra é muito importante para a psicomotricidade. No
pensamento Wallonriano, torna-se impossível dissociar a ação da representação,
a tonicidade da emoção, o gesto da palavra, o psiquismo do motor, ao passo
que esta é o resultado da inteligência das circunstâncias. Esse autor nos remete
às contradições e à versatilidade mental como as expressões da dialética da
personalidade da criança. Portanto, Wallon confere a sua teoria uma dimensão
dialética que reside entre o orgânico e o social, entre o indivíduo e a sociedade,
entre o corpo e o cérebro, entre o psíquico e o motor, entre o emocional e o
racional. Para Wallon, portanto, o objetivo da psicologia é acabar de vez com os
“clássicos dualismos” corpo-alma, indivíduo-sociedade, biológico-social, natura-
cultura etc. (FONSECA, 2008; SANTOS, 2011).

São alguns prelúdios psicomotores do pensamento de Wallon (FONSECA,


2008):

• Motricidade: no decorrer do desenvolvimento intrauterino e após o


nascimento, ela é uma das mais ricas maneiras de se interagir com o
envolvimento externo, sendo um instrumento privilegiado de comunicação
da vida psíquica. Por meio dela, a criança expressa suas necessidades

20
Capítulo 1 PSICOMOTRICIDADE

neurovegetativas de bem ou mal-estar, contendo em si uma abordagem


afetiva e de interação, traduzida em comunicação somática não-verbal
bastante complexa, muito prévia ao surgimento da linguagem verbal
propriamente dita.
• Simbiose fisiológica: o bebê inicia mergulhado em uma absoluta
dependência social, dependendo da intencionalidade vigilante do
adulto que o cerca, sem o qual a sua própria sobrevivência poderia
ser colocada em risco. Essa fase é denominada pelo autor como
simbiose fisiológica, na qual o bebê não é capaz de distinguir suas
necessidades de sobrevivência com respostas motoras adaptativas
que permitam satisfazê-las. Essa simbiose tem sua compensação na
simbiose afetiva segura, executada pelos adultos experientes e estes
sim podem realizar respostas motoras prontas e eficazes, em que a
significação afetiva securizante é de uma enorme relevância relacional e
emocional, provocando entre o adulto e a criança (ser experiente e o ser
inexperiente) uma relação íntima e profunda.
• Hipotonicidade: anteriormente à aquisição da motricidade autônoma,
o bebê apresenta uma motricidade relacional, um diálogo tônico que
cria vínculos e um contágio emocional bastante intensos, contrastando
então com uma inaptidão total. É nessa fase que a hipotonicidade que
caracteriza os músculos da coluna vertebral e do controle da cabeça
são condicionantes para toda a motricidade, partindo de um equilíbrio
fundamentalmente co-equilibrado pelos outros, o qual se identifica
descontínuo e sincrético em muitas das suas manifestações.

Sincrético: que foca a totalidade, o conjunto, o global, o


indiferenciado. É uma síntese de elementos diferentes que possuem
sua origem em pontos de vista, teorias filosóficas ou visões de mundo
distintas.

• Deslocamentos ativos ou autógenos: A partir dos


deslocamentos exógenos vão emergir, de forma endógena e
neurologicamente integrada, os deslocamentos autógenos, que
se apresentam como respostas e reações do próprio corpo para
com o mundo exterior. A integração sensorial proprioceptiva cede
espaço à integração e à produção de posturas e de movimentos
do corpo no espaço, estando incluída aqui a interação com o
mundo dos outros e dos objetos.

21
Fundamentos da Psicomotricidade

Em todos estes deslocamentos, os sentidos tátil-cinestésico


e vestibular adotam papéis preferenciais da interação com o
mundo, culminando em apropriar-se em definitivo da postura
bípede e preensão, sugerindo uma transição autônoma que
passa da vinculação dependente anterior à desvinculação
independente posterior, conferindo à motricidade e à ação
a função de construção do psiquismo e da percepção
(FONSECA, 2008, p. 17).

• Deslocamentos práxicos: os deslocamentos práxicos, também


denominados como deslocamentos dos segmentos corporais,
baseia-se no diálogo entre si e o meio, cada vez mais distinto e
com respostas da totalidade do corpo, com integrações de puras
atitudes gestuais e mímicas, concretizando o que foi adquirido
nos primeiros hábitos sociais, permitindo funções criadoras e
construtivas, co-criadoras e co-construtivas das coordenações
e das aprendzagens psicomotoras. A integração sensorial
exteroceptiva diverge das anteriores, visto agora se projetar a
exploração, na descoberta e no conhecimento do mundo exterior,
ao invés do mundo interior do eu corporal. Essa integração está
centrada em telerreceptores auditivos e visuais, possibilitando
que os deslocamentos locomotores do corpo no espaço e os
deslocamentos preensores da mão com os objetos forneçam à
criança uma nova concepção de si mesma e da realidade.

• Integração sensorial proprioceptiva e exteroceptiva: saiba


você que Wallon é um dos primeiros autores europeus que vai
em busca de uma justificativa neuropsicológica, em termos de
comportamento e neurofisiológica para a função tônica. Sem
sombra de dúvidas, Wallon é o precursor das relações entre a
função tônica, a expressão emocional, o comportamento e a
aprendizagem humana e que o tônus é o suporte e a segurança
da motricidade e que a sua expressão nos estados de hipertonia,
hipotonia, paratonia, distonia, eutonia etc. é a representação da
acomodação perceptiva e expressiva da sua afetividade.

• Dados interoceptivos, proprioceptivos e exteroceptivos:


Wallon defende a premissa que a coordenação/motricidade frente
a uma resposta ao meio se baseia na integração das reações
interoceptivas, que posteriormente vão se basear nas reações
proprioceptivas, que, por sua vez, irão preparar as reações
exteroceptivas. O quadro a seguir descreve sistemas e ações que
exemplificam essas reações.

22
Capítulo 1 PSICOMOTRICIDADE

QUADRO 2 – REAÇÕES E RESPECTIVAS AÇÕES


Reações / sistemas Ações
Interoceptivas (Sistemas Interoceptivos Subentendem Sucção, deglutição, nutrição,
os mecanismos filogenéticos de sobrevivência pré- respiração, eliminação, vigilância,
figurando a memória da espécie humana). bem-estar etc.
Proprioceptivas (Sistema Proprioceptivo - os sentidos Interação mãe-filho, diálogo tônico-
vestibular e tátil-cinestésicos assumem a preferência emocional, conforto tátil, atenção
na interação com o mundo exterior, culminando na visual sustentada, segurança
apropriação da postura bípede e da preensão. vestibular e gravitacional, posturas,
atitudes etc.
Exteroceptivas (Sistemas Exteroceptivos – as aquisições Exploração de objetos,
motoras são neurologicamente assumidas, as redes comunicação e interação, jogo,
sinápticas e o crescimento axo-dendrítico orienta já a praxias etc.
criança para as funções pré-simbólicas).
FONTE: Adaptado de <https://www.larpsi.com.br/media/
mconnect_uploadfiles/c/a/cap_01_82_.pd>.

A figura a seguir ilustra o sistema de integração psicomotora, citado no Quadro 2.

FIGURA 1 – SISTEMA DE INTEGRAÇÃO PSICOMOTORA

FONTE: Fonseca (2008, p. 20)

• Evolução da psicomotricidade: Wallon processa a evolução da criança sob


uma dialética de desenvolvimento em que se apresentam fatores metabólicos,

23
Fundamentos da Psicomotricidade

morfológicos, psicotônicos, psicoemocionais, psicomotores e psicossociais.


Vamos aqui ressaltar os aspectos psicomotores mais específicos, em que
Wallon destaca os seguintes estádios (propostos por ele): impulsivo, tônico-
emocional, sensório-motor, projetivo, personalístico, da puberdade e da
adolescência. No quadro a seguir vejamos cada qual de maneira resumida.

QUADRO 3 – ESTÁDIOS DO DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR


Estádio Características
Estádio Os movimentos e os reflexos se apresentam como simples descargas de
impulsivo energia muscular, nos quais reações tônicas e clônicas se apresentam
(recém-nascido) sob a forma de espasmos descoordenados sem significado ou intenção.
Estádio tônico- A consciência demonstra suas primeiras aquisições que, embora ainda
emocional (dos sincréticas e confusas, anunciam a chegada do movimento significativo, isto
6 aos 12 meses) é, do movimento para alguma coisa e para algum fim. O movimento emerge
como um dos principais meios de comunicação da vida psíquica do bebê,
visto ser por meio dele que ocorre o relacionamento e a interação com o
envolvimento exterior, quer das coisas quer das pessoas.
Estádio Aumentam e multiplicam-se as relações da criança com o seu ambiente,
sensório-motor sendo assim a maturidade na organização das suas sensações, ações
(dos 12 aos 24 e emoções, do estádio anterior impulsivo e dependente do outro, passa
meses) a novos encadeamentos de causa e efeito, provocando no outro novas
disposições para satisfazer as suas necessidades.
Estádio A percepção dos objetos e a sua descoberta pela respectiva manipulação
projetivo (dos 2 (Wallon 1958, 1959, 1963, 1969) torna possível a organização das primeiras
aos 3 anos) representações, verdadeiras intenções gestuais e figurações motrizes
baseadas nas múltiplas associações sensório-motoras adquiridas. A
atitude postural adquire, neste estádio, a sua verdadeira autonomia, com
uma segurança gravitacional emocionalmente projetada no mundo, o que
lhe proporciona maior disponibilidade para a conquista do real.
Estádio Está voltado para a pessoa e o enriquecimento do eu, com a
personalístico construção da personalidade, em que a consciência corporal adquirida
(dos 3 aos 4 paulatinamente ao longo dos estádios anteriores e a aquisição da
anos) linguagem se tornam os principais componentes integrados.
Estádio Marca uma separação mais nítida entre o eu e o não eu e concomitantes
categorial (dos subuniversos. A diferenciação internalizada entre o espaço subjetivo
6 aos 11 anos) e o objetivo leva igualmente à separação do outro de forma mais
consistente e não tão dependente ou confusional, dando início a uma
relação com os outros e com os objetos mais independente.
Estádio da A “crise da puberdade” registra a passagem da infância à adolescência,
puberdade e da visível em termos somáticos e biológicos, em que se operam transformações
adolescência evolutivas significativas, como em termos psicológicos e sociais. A
intensidade e o volume dos seus efeitos irão variar muito com a cultura
e a época em que o jovem estará inserido. Complexas transformações
somáticas e modificações psicofisiológicas decorrentes da maturação
sexual irão novamente ocorrer no tripé motor-afetivo-cognitivo.
FONTE: Adaptado de Fonseca (2008)

24
Capítulo 1 PSICOMOTRICIDADE

FIGURA 2 – ESTÁDIOS DO DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR POR WALLON (1945)

FONTE: Fonseca (2008, p. 37)

A psicogenética walloniana nos retrata uma perspectiva dialética do


desenvolvimento da pessoa em sua totalidade, em que o motor, o afetivo e o cognitivo
interagem com coerência ao longo da ontogênese. Nessa óptica multifuncional, a
dimensão biológica do ser humano já é social, visto o biológico ser geneticamente
social. Partindo dessa premissa é que o psíquico assume simultaneamente o social
e o biológico e só internamente a esta integração e interação de elementos pode-se
entender a natureza biopsicossocial do ser humano.

Passamos agora aos estudos do teórico Eduard Guilman (1901-1983),


médico neurologista, que tem a base de seu estímulo calcada nas pesquisas
de Henri Wallon. Inicia a prática psicomotora, direcionando os estudos sobre
a reeducação psicomotora por meio do desenvolvimento de um exame com o
intuito de estabelecer um diagnóstico, a indicação de um tratamento terapêutico
e um prognóstico. O teórico acreditava que os distúrbios de comportamento
apresentavam na reeducação psicomotora o tratamento indicado. As finalidades
dessa reeducação eram apontadas para três linhas de ação, a saber: por meio de
exercícios de atitudes reeducar a atividade tônica, de equilíbrio e de mímica; por
meio do exercício de dissociação e a coordenação motora melhorar a atividade
de relação, sendo o lúdico sua ferramenta de apoio; desenvolver o controle motor
(SANTOS, 2011).

Agora faremos uma abordagem sobre o teórico Julian de Ajuriaguerra (1911-


1993), médico formado na França, mundialmente reconhecido pelos seus trabalhos
no contexto da neurofisiologia e neuropatologia e, fundamentalmente, no campo

25
Fundamentos da Psicomotricidade

que interessa mais à teoria da psicomotricidade, ou seja, o da neuropsiquiatria


infantil. Não podemos protelar por mais tempo uma primeira abordagem da
perspectiva multifacetada desse autor. Ele nos permite completar e concretizar um
sentido multi e transdisciplinar da psicomotricidade, que devemos agora entender
ser hoje indispensável a todos os especialistas em desenvolvimento humano,
quando aqui a questão é o estudo, compreensão, caracterização e intervenção
sobre a personalidade total, completa e evolutiva da criança e do jovem. Esse
teórico aprofundou seus estudos no âmbito da patologia, descrevendo de maneira
objetiva os transtornos psicomotores que se situam entre o neurológico e o
psiquiátrico, com uma nova redefinição sobre o conceito de debilidade motora
quando a considera uma síndrome com todas as suas particularidades. Sua
atuação é maior na neuropsiquiatria infantil, atrelando o desenvolvimento infantil
ao neurológico (FONSECA, 2008; SANTOS, 2011). Precisamos ressaltar que, em
sua trajetória, calcado em suas teorias, pesquisas e experiências clínicas, elimina
definitivamente o dualismo cartesiano da psico-motricidade, em que a grafia da
palavra perde o hífen, cedendo lugar a um novo grafismo: psicomotricidade. Os
trabalhos desse autor contextualizam (FONSECA, 2008):

1. Esquema corporal: é a representação global que se tem do próprio


corpo, situando-se em um plano mais neurofuncional. Envolve integração
neurológica de posturas e de programas motores, interagindo com a
percepção espacial de objetos. É um subsistema necessário à realização
da ação, sendo a imagem mental do corpo registrada no âmbito cerebral,
mais exatamente no âmbito parietal, visto o lobo parietal apresentar como
funções a integração das percepções e a elaboração das respectivas
praxias.
2. Imagem do corpo: traduz-se como uma expressão com maior
foco na abstração e na representação consciente e inconsciente,
envolvendo a autopercepção. É uma expressão que enfatiza a
abstração e representação inconsciente e consciente do corpo. Além
da autopercepção, envolve o autoconceito conceitualizado, a própria
noção do eu, denominado como self, o indivíduo de emoções vividas e
integradas à atitude.
3. Membro fantasma: revela a persistência alucinatória, a ilusão
dolorosa, a representação mental de membro ou membros ausentes
ou desenervados (Figura 1), sensação experienciada pelo indivíduo
amputado após situação traumática. A ilusão do membro fantasma no
amputado reflete a persistência no indivíduo da consciência do corpo na
sua totalidade, não importando a subtração ou a diminuição anatômica
ou física ocorrida ou existente, em situações de agenesia (ausência
congênita completa ou parcial de um órgão ou tecido).

26
Capítulo 1 PSICOMOTRICIDADE

FIGURA 3 – REPRESENTAÇÃO DO HOMÚNCULO SENSORIAL

FONTE: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:1421_Sensory_
Homunculus_-_PT.png>. Acesso em: 8 jul. 2020.

4. Anosognosia: refere-se ao desconhecimento ou negligência de


membros hemiplégicos, em detrimento a lesão hemisférica. São
exemplos de anosognosia o não reconhecimento da paralisia de um
hemicorpo; a não aceitação em reconhecer um distúrbio corporal.

27
Fundamentos da Psicomotricidade

FIGURA 4 – ÁREAS AGNÓSICAS HEMISFERIAISDIREITA E ESQUERDA

FONTE: Fonseca (2008, p. 112)

5. Somatognosia: é sinônimo de noção corporal, que nada mais é


do que o conhecimento das partes do corpo. É uma noção criada e
proposta pelo próprio Ajuriaguerra, que incorpora a ontogênese da
psicomotricidade e da aprendizagem. Ajuriaguerra a compreende como a
tomada de consciência do corpo tanto em sua totalidade como em suas
respectivas partes, apresentando ligação e interrelação com a evolução
dos movimentos intencionais, ou seja, a tomada de consciência do corpo
como realidade vivida e convivida (FONSECA, 2008).

28
Capítulo 1 PSICOMOTRICIDADE

FIGURA 5 – SOMATOGNOSIA

FONTE: Fonseca (2008, p. 110)

Ontogênese (ou ontogenia) diz respeito à origem e ao


desenvolvimento de um organismo, sendo comum falar em ontogenia
em referência ao período que vai do momento da fertilização do ovo
até que o organismo alcance sua forma madura e completamente
desenvolvida.

Dando prosseguimento aos nossos estudos sobre os teóricos da


psicomotricidade, passamos então a falar sobre Jean Piaget (1896-1980), figura
central na teoria cognitivo-desenvolvimental. Seu nome soa como grande influente
no campo da educação durante a segunda metade do século 20, ao ponto de
praticamente se tornar sinônimo de pedagogia. Não existe, entretanto, um método
Piaget, como ele próprio gostava de frisar. Piaget nunca atuou como pedagogo.
Antes de mais nada, Piaget foi biólogo, tendo dedicado a vida dele a submeter à
observação científica rigorosa o processo de aquisição de conhecimento pelo ser
humano, particularmente pela criança (FERRARI, 2008).

Suas descobertas tiveram forte impacto na pedagogia, entretanto, de


alguma maneira, demonstraram que transmitir conhecimentos é uma limitada

29
Fundamentos da Psicomotricidade

possibilidade. Acreditava que não é possível fazer com que uma criança aprenda
o que ainda não apresenta condições de absorver e, mesmo que apresente
condições, só se interessará por aquilo que lhe faça falta em termos cognitivos
(FERRARI, 2008). Para o cientista suíço, isso ocorre porque o conhecimento
ocorre por descobertas que a própria criança faz, mecanismo este que outros
pensadores anteriormente a ele já haviam intuído, no entanto, ele submeteu esse
feito à comprovação na prática. Piaget observa que todas as crianças parecem
passar pelos mesmos tipos de descobertas sequenciais sobre seu mundo,
cometendo os mesmos tipos de erros e chegando às mesmas conclusões.

Esse suíço, doutor em ciências naturais, é considerado um dos grandes


detentores do conhecimento do desenvolvimento cognitivo, tornando-se um
dos mais respeitáveis representantes da psicologia da aprendizagem e do
desenvolvimento, demolindo o que era considerado como padrão educacional de
sua época. Durante sua trajetória, pesquisou e observou o processo de aquisição
do conhecimento. Inserido em criteriosa metodologia científica, explicava
o desenvolvimento da inteligência nas pessoas, enfatizando a fase infantil,
motivo pelo qual sua ciência é denominada de Epistemologia Genética, sendo
considerado pela fundamentação de sua teoria como o “pai do construtivismo”.
O teórico compreende que, desde o nascimento até o início da adolescência, o
pensamento infantil passa por quatro estágios, os quais findam quando se atinge
o alcance da capacidade plena de raciocínio (BEE; BOYD, 2011).

Piaget defende a identidade e a continuidade dos vários períodos do


desenvolvimento, enquanto Wallon encara e pesquisa as diferenças e as
descontinuidades desses períodos.

Aponta como objetivo atingir, ao contrário de Wallon e também de


Vygotsky, a lei geral do pensamento, considerando a inteligência
como uma forma superior de adaptação biológica, não especificando
como ela decorre igualmente do surgimento de processos de
adaptação de inequívoca origem social (BEE; BOYD, 2011, p. 12).

Nesta contextualização sobre inteligência e os processos de adaptação, o


meio ambiente transforma-se em agente do desenvolvimento do intelecto, ao
passo em que oferta exercícios e estímulos, que irão potencializar a inteligência,
afirmando que a inteligência humana pode e necessita ser exercitada para que
possa ser aperfeiçoada e assim possa evoluir. A tradução de sua teoria fornece
a compreensão que é por meio do simbólico e dos movimentos corporais que o
intelecto atua, sendo que sua construção começa partindo da atividade motora
da criança, aproximadamente e primordialmente nos primeiros sete anos de
vida. Dessa maneira, o teórico compreende o corpo como um instrumento da
inteligência, levando em consideração que a interferência da motricidade no
intelecto ocorre anteriormente à aquisição da linguagem. Partindo dessa premissa,

30
Capítulo 1 PSICOMOTRICIDADE

a função tônica e a coordenação dos esquemas terão reconhecimento da


psicologia para que se torne objeto de estudo. Nesse contexto, a teoria genética
de Jean Piaget está fortalecida e passa a ter sua extensão para a educação sob
a denominação Construtivismo Piagetiano (FONSECA, 2008; BEE; BOYD, 2011).

O termo intelecto é definido como inteligência e a inteligência como a


capacidade ou faculdade do aprendizado, compreensão ou fácil adaptação.
Está relacionado ao cognitivo, que está relacionado ao movimento para o
estabelecimento da comunicação com o meio. A teoria de Wallon atribui à
maturação e aprendizagem um processo de desenvolvimento do intelecto,
enriquecidas pelo intercâmbio emocional e a comunicação com o outro.

• Construtivismo piagetiano

Piaget define quatro conceitos como básicos no processo de desenvolvimento


infantil e intelectual, conforme é ilustrado no quadro a seguir.

QUADRO 4 – CONCEITOS BÁSICOS NO PROCESSO DE


DESENVOLVIMENTO INFANTIL E INTELECTUAL
Conceito Processo de desenvolvimento
Assimilação Como assimilação define-se a capacidade do indivíduo na incorporação
de uma ideia ou um novo objeto ou ideia em estruturas já consolidadas ou
já construídas pela criança. Subjetiva, a assimilação é um termo que faz
alusão a uma parte do processo de adaptação do ser humano.
Acomodação O indivíduo após assimilar as características externas, as acomoda para
suportar as pressões do ambiente. Portanto, a acomodação seria uma tendência
orgânica para ajustar-se a um novo objeto, uma reestruturação da assimilação
Esquemas de São maneiras de como o indivíduo interage com o mundo, organizando
ação em sua mente a realidade para poder compreendê-la, desenvolvendo
então a inteligência. Partindo da assimilação e acomodação, a criança
apresenta comportamentos baseados em reflexos, podendo-se observar
que o movimento, um dos conhecimentos básicos da psicomotricidade,
é a primeira forma de comunicação do indivíduo, relacionando ao
desenvolvimento da psicomotricidade. Esses reflexos são transformados
posteriormente, segundo Piaget, em esquemas de ação.
Equilibração Forma de adaptação que procura maximizar as interações organismo-meio
através da construção de novos instrumentos de compreensão e ação sobre a
realidade. Trata-se de um ponto de equilíbrio entre a assimilação e a acomodação,
sendo considerada como um mecanismo auto-regulador, primordial para garantir
à criança uma interação eficiente dela com o meio-ambiente.
FONTE: Adaptado de Gross (2020)

31
Fundamentos da Psicomotricidade

Sugiro a você que faça uma pesquisa sobre reflexos primitivos,


que são respostas automáticas e estereotipadas apresentadas frente
a um determinado estímulo externo. Eles fazem-se presentes no
nascimento, devendo ser inibidos ao longo dos primeiros meses,
quando há o surgimento dos reflexos posturais. Essa pesquisa faz-
se relevante visto a presença destes reflexos mostrar integridade
do sistema nervoso central. Já a sua persistência mostra disfunção
neurológica.

Para que você possa aprofundar seus conhecimentos sobre


reflexos primitivos, agregando maiores conhecimentos às teorias de
Piaget, acesse o site:

<https://www.fcm.unicamp.br/fcm/neuropediatria-conteudo-
didatico/exame-neurologico/reflexos-primitivos>.

• Os estágios de desenvolvimento segundo Piaget

Vamos agora apresentar, segundo Piaget, os quatro períodos que marcam


o desenvolvimento intelectual da criança, ou seja, os períodos no processo
evolutivo da espécie humana, que o teórico classifica como “o que o indivíduo
consegue fazer melhor”, em diferentes faixas etárias no decorrer de seu processo
de desenvolvimento. São eles:

• 1º período: sensório-motor (0 a 2 anos).


• 2º período: pré-operatório (2 a 7 anos).
• 3º período: operações concretas (7 aos 11 anos).
• 4º período: operações formais (11 aos 15-16 anos).

1) Período sensório-motor (zero a dois anos, há literatura que


faz essa referência de 3 a 7 anos): neste período, a inteligência
sensório-motora apresenta como características a ausência de
pensamento, representação ou linguagem. Saiba que nesse período
a atividade intelectual é estritamente sensorial e motora quando

32
Capítulo 1 PSICOMOTRICIDADE

há interação com o meio ambiente. Esse período se subdivide


em seis subestádios, que serão abordados mais profundamente
no Capítulo 2. São eles: o exercício dos reflexos (até 1 mês); as
primeiras adaptações adquiridas e a reação circular primária (1
a 4 meses); as adaptações sensório-motoras intencionais e as
reações circulares secundárias (4 a 8 meses); a coordenação dos
esquemas secundários e sua aplicação às situações novas (8 a 12
Meses); a reação circular terciária e a descoberta dos meios novos
por experimentação ativa (12 a 18 Meses); a invenção dos meios
novos por combinação mental e a representação (18 a 24 meses)
(FONSECA, 2008; SOUZA; WECHSLER, 2014).

QUADRO 5 – SUB ESTÁGIOS DO PERÍODO SENSÓRIO-MOTOR


Estágio Características
Os efeitos da experiência estão centrados nos mecanismos providos
Estágio
de hereditariedade: sucção, preensão, choro etc. ainda que as
reflexo
aprendizagens estão ainda submetidas à esfera dos reflexos.
Tendência de exercitar os esquemas descobertos a partir dos reflexos
Estágio das
e por meio de comportamento repetitivos. Os exercícios dos primeiros
reações
esquemas mentais são denominados reações circulares primárias,
circulares
sendo que neste estágio as reações circulares estão centradas no corpo
primárias
do bebê, como aprender a levar o dedo na boca.
Elementos externos ao corpo do bebê passam a ser incorporados aos
Estágio das
esquemas até então construídos. Há o início do engatinhar e manipular coisas
reações
com mais intensidade, sendo que as imitações passam a ser sistemáticas.
circulares
O bebê torna-se capaz de produzir eventos interessantes descobertos, por
secundárias
acaso, o que envolve atividades de maior complexidade e intencionalidade.
As atitudes do bebê objetivam uma meta pré-determinada, emergindo um
Estágio da comportamento instrumental e a busca ativa por objetos desaparecidos. O
coordenação bebê tenta usar meios tais quais esquemas desenvolvidos em outras situações,
dos esquemas generalizando padrões de comportamento previamente adquiridos, sendo
secundários que no decorrer das generalizações, os esquemas vão sendo modificados,
porém o bebê apenas retém os que funcionam para remover o obstáculo.
O bebê ou já aprendeu ou está aprendendo a andar, saindo em busca
de novidades. Muda seu foco, não se atendo apenas na ação ou nos
Estágio das
objetos que servem de meios para alcançar determinados fins, passando
reações
a ter curiosidade pelos objetos sob um outro ponto de vista. Coloca em
circulares
prática, o ensaio-e-erro para a descoberta de propriedades dos objetos,
terciárias
enquanto vai acomodando seu próprio comportamento a eles e passa a
assimilar novos esquemas sem dificuldade.
Início da Transição para o próximo período de desenvolvimento, no qual a criança torna-
representação se capaz de usar símbolos mentais e palavras para fazer referência a objetos
ausentes. Esse fato representa a libertação do aqui e agora, introduzindo a criança
no mundo das possibilidades. Por conta da capacidade desta representação
mental, a criança pode elaborar a reconstrução de vários deslocamentos
invisíveis do objeto, fase essa que revela o início da descentração.
FONTE: O autor

33
Fundamentos da Psicomotricidade

1) Período pré-operatório (2 a 7 anos): após o estágio anterior (sensório-


motor), dá-se sequência a esse estágio, que compreende a faixa etária
de dois até aproximadamente sete anos. Há literatura que compreende
esse período como de 3 a 7 anos. Saiba que aqui ocorre um grande
avanço do desenvolvimento, visto estar nesse período o desenvolvimento
da linguagem. Há, portanto, maior sociabilização, com intercomunicação,
o que Piaget denominou de “socialização da ação”. Note que ainda
existe o egocentrismo, em que é difícil (ou impossível) colocar de
forma abstrata o ponto de vista de outro indivíduo, sendo que o mundo
é contextualizado a partir da sua perspectiva. Podemos então afirmar
que a socialização é colocada pela metade, visto o egocentrismo da
criança dificultar a comunicação com o próximo. Podemos exemplificar
da seguinte forma, conforme o que Piaget denominou de “monólogos
coletivos”: imagine você muitas crianças falando simultaneamente, sem
que uma tenha compreensão da outra. Agora veja que interessante,
na ótica do teórico, assim que a linguagem estiver mais aprimorada,
ocorrerá a fase dos “porquês”, que surge por volta de cinco anos e meio.
Talvez você já tenha tido essa vivência, em que a criança quer que tudo
tenha uma explicação, que nada acontece por acaso e que você não tem
resposta para satisfazê-la, devido às perguntas serem sobre assuntos
triviais (GOULART, 2005; SOUZA; WECHSLER, 2014).

2) O período operatório concreto (7-11 anos) e formal (11 a 15-


16 anos): período caracterizado por uma fase de transição entre a
ação e as estruturas lógicas mais gerais, em que há duas ordens de
operações: operações lógico-matemáticas e infralógicas. Há literatura
que compreende estes estágios no período de 8 a 11 anos (concreto) e
após os 12 anos (formal). Vamos descrever cada qual.

Operações lógicas: apresentam como referência operações lógicas


matemáticas, as quais Piaget denominou “agrupamentos”. Essas operações
são detectadas durante dois períodos de desenvolvimento (GOULART, 2005;
SOUZA; WECHSLER, 2014):

a) operatório concreto, em que as principais aquisições cognitivas


matemáticas desenvolvidas residem na classificação e seriação,
subsequentemente se desenvolvem a multiplicação lógica e
compensação simples. Poderá haver aquisição de conhecimentos tais
quais a consolidação e conservação de número, operações infralógicas
que estão contextualizadas à conservação física, como peso, volume
e substância. Pode-se também constituir o espaço, o qual lida com a
conservação de comprimento, superfície, perímetros, horizontais e
verticais, entre outras aquisições. Essas operações infralógicas e lógicas

34
Capítulo 1 PSICOMOTRICIDADE

aparecem neste período, pois têm como base algo concreto. Note que
aqui ainda não há formação para a capacidade de abstração, que ocorre
somente no período operatório formal. É por esse motivo que este
período é o penúltimo estágio para se desenvolver o nível mais alto de
raciocínio: a abstração.
b) operatório formal, que ocorre a partir dos doze anos, em que já há
formação do pensamento para abstrações. Aqui o indivíduo já é capaz
de desenvolver maiores conhecimentos matemáticos. São exemplos a
realização de compensações complexas, razão/proporção, seguida pela
probabilidade e indução de leis ou correlação.

As operações infralógicas, embora se desenvolvam


paralelamente às operações lógico-matemáticas, apresentam
algumas diferenças. Apresentam como propriedades características
o apoio em objetos e figuras contínuas, dependem da proximidade
espaço-temporal, dependem da posição e distância dos objetos
discretos que podem ser classificados e seriados. Conforme Piaget,
a descrição em termos gerais do desenvolvimento das relações entre
indivíduo e meio identifica que, na fase das operações concretas,
as operações lógico-aritméticas e infralógicas se associam em
sistemas de conjunto das transformações para que sejam realizadas
atividades perceptivas, bem como outras atividades. Portanto, a
representação oferece possibilidades para que a criança aprenda
um conjunto das transformações e realize as atividades perceptivas
e outras atividades, em nível de coordenação de pontos de vista (
GOULART, 2005; SOUZA; WECHSLER, 2014).

Para que você aprimore seus conhecimentos referentes às


operações infralógicas, leia a matéria O Estágio das Operações
Concretas: Suas Características Mais Relevantes, acessando o
site: <http://www.gestaouniversitaria.com.br/artigos/o-estagio-das-
operacoes-concretas-suas-caracteristicas-mais-relevantes>.

35
Fundamentos da Psicomotricidade

Passamos agora para a abordagem do teórico Lev Semyonovich Vygotsky


(1896-1934), russo, estudioso em psicologia, considerado pertencente ao campo
cognitivo-desenvolvimental devido ao fato de ter como primeira preocupação o
entendimento das origens do conhecimento da criança. Vygotsky foi um pioneiro
nas pesquisas das funções psíquicas superiores na antiga União Soviética. A
teoria dele recebeu forte influência do Materialismo Histórico de Marx. Defendeu
que as formas complexas de pensamento são geradas nas interações sociais e
que a intervenção adulta é de suma importância nas aprendizagens infantis. O
que então o diferenciava das teorias de Piaget? “Um aspecto fundamental: ele
estava convencido de que formas complexas de pensamento têm suas origens em
interações sociais” (BEE; BOYD, 2011, p. 37). Conforme o teórico, o aprendizado
de novas habilidades cognitivas tem a condução de um adulto ou criança mais
habilidosa, como um irmão mais velho, que estrutura e modela a experiência de
aprendizagem da criança. Esse processo posteriormente foi denominado por
Jerome Bruner como “andaimagem”. Vygotsky sugere que, para essa prática ser
alcançada, há necessidade de orientação e denomina esse processo interativo
como “zona de desenvolvimento proximal”, a qual constantemente é ampliada,
sempre com a inclusão de tarefas mais difíceis (BEE; BOYD, 2011).

O significado do termo empregado por Vygotsky, em sua teoria,


zona de desenvolvimento proximal, refere-se a gama de tarefas
que são muito difíceis para uma criança fazer sozinha, porém
podendo ser executadas com sucesso por intermédio da orientação
de um adulto ou de uma criança com maior experiência.

Vygostsky era um dos teóricos adeptos das teorias cognitivo-


desenvolvimentais, tal qual Piaget. Porém, haviam distinções entre
o pensamento desses dois teóricos. No que consistiam essas
distinções?

Vale trazer aqui uma abordagem sobre as Teorias da aprendizagem, por


representarem uma tradição teórica bastante distinta daquelas apresentadas
pelos teóricos cognitivo-desenvolvimentalistas, em que o enfoque é dado da
maneira como o ambiente molda a criança do que em como a criança compreende
suas experiências. Esses teóricos, portanto, não trazem a concepção que a

36
Capítulo 1 PSICOMOTRICIDADE

genética ou as tendências inatas são relevantes, considerando o comportamento


humano grandemente plástico e podendo ser modelado por processos de
aprendizagem previsíveis. São três teorias da aprendizagem importantes: o
modelo de condicionamento clássico de Pavlov, o modelo de condicionamento
operante de Skinner e a teoria sociocognitiva de Bandura (BEE; BOYD, 2011).
Vamos, portanto, trazer aqui uma abordagem sucinta sobre essas teorias, seus
precursores e suas respectivas concepções:

• Condicionamento clássico: consiste em uma resposta automática ou


não condicionada, consistindo em uma emoção ou reflexo, podendo ser
desencadeada por um novo indício, que aqui chamamos de estímulo
condicionado, após ter sido combinada inúmeras vezes com esse estímulo.
Ivan Pavlov (1849-1936) desenvolve essa teoria com a salivação de seu
cão, a qual envolve adquirir novos sinais para respostas já existentes.
Com relação ao ser humano, o que o teórico preconiza que ao tocar um
bebê no queixo, ele se voltará na direção do toque, iniciando o “sugar”.
Portanto, na terminologia técnica do condicionamento clássico, esse toque
é um estímulo não condicionado e “virar e sugar” apresentam-se como
respostas não condicionadas, visto o bebê estar programado para agir
dessa forma, por reflexos automáticos. Em suma, o aprendizado acontece
quando algum estímulo novo é introduzido ao sistema (BEE; BOYD, 2011).
• Condicionamento operante: (condicionamento instrumental). É o
processo por meio do qual a frequência de um comportamento pode
aumentar ou diminuir em detrimento ao comportamento de suas
consequências. Vamos entender isso...Se o comportamento aumenta,
fala-se em “reforço”; se diminui, fala-se em “punição”. Burrhus Frederic
Skinner (1904-1990), psicólogo, descobriu esses princípios realizando
uma série de estudos com animais, acreditando influenciarem muito o
desenvolvimento humano (BEE; BOYD, 2011).

Se há um reforço positivo, há um estímulo adicionado ou a consequência


aumenta um comportamento. Vamos exemplificá-los: elogio, sorriso, comida,
abraço ou atenção atuam como reforços positivos para a maioria dos indivíduos na
maior parte do tempo. Já o reforço negativo poderá aumentar um comportamento,
visto poder envolver o término ou a remoção de um estímulo desagradável.
Exemplificando, se uma mãe se depara com seu filho chorando e pedindo colo
e a princípio você̂ o ignora, mas finalmente o pega no colo, o que acontecerá?
Ele irá parar de chorar. Como resultado podemos deduzir que o comportamento
de dar colo ao filho foi negativamente reforçado pela cessação do choro e,
dedutivamente, essa mãe ficará propensa a pegá-lo no colo da próxima vez que
ele chorar. Simultaneamente, o choro do filho provavelmente foi positivamente
reforçado por ter ganho atenção. Resultado: provavelmente o filho irá chorar em
ocasiões semelhantes (BEE; BOYD, 2011).

37
Fundamentos da Psicomotricidade

• Teoria sociocognitiva de Bandura: esta variação de teoria de


aprendizagem de Albert Bandura (1986, 1989) não obteve grande
adesão entre psicólogos do desenvolvimento, porém acrescentou
várias outras ideias fundamentais. O que então o teórico afirma? Que
o aprendizado nem sempre requer reforço direto; que o aprendizado
também pode acontecer meramente como resultado de observar
alguém realizando alguma ação, sendo denominada aprendizagem
observacional ou modelação, a qual está envolvida em uma larga
variedade de comportamentos. O teórico também defende outra classe
de reforço, que denomina de reforços intrínsecos, sendo internos,
como o sentimento de orgulho de uma criança quando descobre como
desenhar uma estrela. No entanto, mais relevante em sua contribuição
foi a transposição da brecha entre teoria da aprendizagem e teoria
cognitivo-desenvolvimental, quando enfatiza elementos cognitivos
(mentais) importantes na aprendizagem observacional. Denomina, a
partir de então, sua teoria de “teoria sociocognitiva” substituindo o termo
de “aprendizagem social”, como foi originalmente rotulada (1986, 1989).
Para entendermos essa transição, citamos como exemplo que o teórico
inicia seu enfoque no fato de que a modelação pode ser utilizada como
um veículo para aprender informação abstrata e habilidades concretas
(BEE; BOYD, 2011).

Na modelação abstrata, o observador deduz uma regra que


pode ser a base do comportamento do modelo, então aprende
a regra e o comportamento específico. Uma criança que vê
seus pais sendo voluntários um dia por mês em um banco
de alimentos pode deduzir uma regra sobre a importância de
“ajudar os outros”, mesmo se forem seus pais (BEE; BOYD,
2011, p. 41).

O termo reforço positivo, dentro do contexto apresentado,


refere-se ao processo de fortalecimento de um comportamento
pela apresentação de algum estímulo prazeroso ou positivo. Já
reforço negativo faz alusão ao processo de fortalecimento de
um comportamento pela remoção ou cessação de um estímulo
desagradável.

38
Capítulo 1 PSICOMOTRICIDADE

Neste tópico você aprendeu que vários teóricos contribuíram para a


evolução da psicomotricidade, que, como toda ciência, foi baseada em teorias e
experiências, cada qual contribuindo com seus respectivos fundamentos. Hoje,
consolidada, passou por distintas influências científicas e a contribuições de
vários campos do conhecimento. Todos os estudiosos nos mostraram que não
se pode compreender o movimento apenas por um ponto de vista anatômico,
fisiológico, psicológico ou social, mas como uma dimensão holística. Toda essa
adesão de conhecimentos descrita nesta abordagem no faz compreender que a
psicomotricidade foi construída a partir de vários fundamentos teórico-prático que,
hoje, consolidados, garantem a legitimidade científica à psicomotricidade.

4 ELEMENTOS BÁSICOS DA
PSICOMOTRICIDADE
O estudo dos principais elementos psicomotores e suas respectivas etapas
de evolução permitirá a você compreender melhor o desenvolvimento psicomotor
que será abordado posteriormente, sendo essa compreensão de suma importância
para a atuação do profissional atuante na educação e psicomotricidade infantil.

1.1 PRINCIPAIS ELEMENTOS


PSICOMOTORES E RESPECTIVAS
ETAPAS DE EVOLUÇÃO
Vamos agora realizar uma análise sobre os elementos, suas respectivas
etapas de evolução e sua ação na prática da psicomotricidade.

1.1.1 Esquema corporal


O esquema corporal se define como organização das sensações relativas
aos dados do mundo exterior, notando-se aí dois sentidos na atividade motora
cinética, dirigida para o mundo exterior. O sistema nervoso desenvolvido e
amadurecido é o grande responsável pela construção e elaboração do Esquema
Corporal, sendo simultaneamente paralelo a evolução sensório-motora. Saiba,
portanto, que a educação do Esquema Corporal é o ponto-chave de toda prática
educativa (FETAC, 2009).

39
Fundamentos da Psicomotricidade

Wallon define o esquema corporal como “um elemento de base indispensável


à criança para formação da sua personalidade; é a representação mais ou menos
global, mais ou menos específica e diferenciada que tem do seu próprio corpo”
(WALLON, 1975, p. 105). Portanto, deve estar claro para você que o esquema
corporal não é algo que se possa ser ensinado, nem adquirido com treinamento,
mas sim é construído gradativamente e na mente da criança, conforme a utilização
que ela faz de seu corpo.

Quando então a criança constrói o esquema corporal? Jean Le Boulch,


educador físico, médico e psicólogo, é precursor (1966) do Método da Psicocinética
que propõe uma ciência do movimento humano aplicada ao desenvolvimento
humano. Isso é, propõe a educação pelo movimento no contexto das ciências da
educação. Vamos então descrever essa construção sob sua ótica (LE BOULCH,
1992 apud IMAI, 2007), que, em sua concepção, define três etapas para essa
construção:

• Primeira etapa: “corpo vivido” (até os 3 anos): correspondente ao


período sensório-motor, descrito por Piaget, em que a criança, desde
o nascimento, organiza-se em várias sensações que vão aparecendo,
na medida em que acontece o amadurecimento do sistema nervoso.
Essa primeira etapa, do corpo vivido, finaliza quando a criança passa a
reconhecer seu corpo como objeto. Até esse momento, ela nomeava ela
mesma na terceira pessoa, em que passa então a utilizar os pronomes:
meu, minha, eu (IMAI, 2007).
• Segunda etapa: “corpo percebido” (3 aos 7 anos): etapa correspondente
à organização do esquema corporal. Na etapa anterior, esse conceito era
infundado, ao passo que descrevia uma atividade perceptiva, em que só
era possível o desenvolvimento após a chegada da maturação da função
de interiorização. Agora, associado à imagem visual do corpo estarão
as sensações táteis e cinestésicas correspondentes. Ocorre, portanto, a
partir dos três anos, a função de interiorização, possibilitando, “o retorno
da criança a si própria”. A origem desse processo está no reconhecimento
da imagem do outro, que está externo a ela e tem início com a imagem
do corpo materno, em que então ela adquire o conhecimento de seu
corpo (IMAI, 2007);
• Terceira etapa: “corpo representado” (7 aos 12 anos): última etapa, na
qual a criança estrutura seu esquema corporal, adquirindo a noção tanto
do todo como de partes do seu corpo. Gradativamente a criança passa
à descentralização, em que seu corpo é um objeto no espaço, não como
referência. Esse fato possibilita à criança a criação de outros pontos de
referência que são externos a ela, não se encontrando centrados no
próprio corpo (IMAI, 2007).

40
Capítulo 1 PSICOMOTRICIDADE

4.1.2 Tônus
Podemos conceituar o tônus como a tensão fisiológica dos músculos,
permitindo assim que a criança relaxe e movimente suas articulações, assegurando
seu equilíbrio estático e dinâmico, coordenação e postura independentemente
da posição que seu corpo adote, esteja ela parada ou se movimentando. É,
portanto, um estado normal de resistência e elasticidade, tanto de um tecido como
órgão, preparando e sustentando o movimento, bem como determina posturas.
Thompson (2000) define o tônus residual como o tônus de base, sempre presente
nos músculos e fixando segmentos. Já o tônus de postura ocorre quando o corpo
se opõe à ação da gravidade, envolvendo o sistema muscular, principalmente os
músculos extensores, que não se desenvolve verdadeiramente antes dos 8 anos
de idade. Finalmente, o tônus de força, que ocorre quando o corpo ou segmento
faz resistência oposta (THOMPSON, 2000).

Há uma grande confusão entre os conceitos de tônus e trofismo,


visto que muitos profissionais os utilizam de forma incorreta, gerando
muita polêmica com relação a esses termos. Vamos então tornar
esse assunto mais claro para que você o compreenda. O tônus
diz respeito ao estado involuntário da contração ou tensão elástica
natural dos músculos do corpo. O trofismo tem relação com o volume
da massa muscular existente no corpo, podendo ser aumentado em
determinadas partes do corpo, o que é conhecido como “hipertrofia”,
podendo aumentar tanto o volume como a força do músculo.

1.1.1 A coordenação motora: global e


fina
Inicialmente, queremos que você compreenda a definição de coordenação
motora. Ela pode ser definida como a habilidade de todo ser humano para
sincronizar os seus movimentos com a utilização de vários sistemas, como
o sistema nervoso e o sistema músculo esquelético e articular, sendo então
dividida em coordenação motora fina e grossa. Desenvolve-se gradativamente no
indivíduo e você deve ter em mente que desde a mais tenra idade esse conjunto
de habilidades começa a ser utilizado (IMAI, 2007).

41
Fundamentos da Psicomotricidade

• Coordenação global

É o resultado da harmonia das ações musculares, que é dependente do


controle motor e da capacidade de equilíbrio postural. Note que o equilíbrio está
subordinado ao controle do cerebelo, às sensações proprioceptivas, labirínticas e
cinestésicas (IMAI, 2007).

A criança, por meio de movimentos e experiências, sai em busca de seu eixo


corporal, procurando seu centro de gravidade e, por meio da adaptação, busca
um equilíbrio melhor. Essa coordenação e suas experimentações direcionam a
criança à aquisição da dissociação de seus movimentos, no intuito de executar uma
atividade distinta em cada membro. Vamos aqui exemplificar as fases evolutivas
da coordenação global falando sobre a marcha. A marcha apresenta, no decorrer
desse processo, uma significativa participação, concedendo ao indivíduo uma
independência. Essa independência, para que seja alcançada pela criança,
enfrentará quedas e movimentos treinados, até que se atinja o equilíbrio necessário
para que ela se locomova. Veja bem, a criança, em média, ao redor dos 12 a 15
meses, posteriormente ao estágio anterior de engatinhar, executa seus primeiros
passos, em que pode alcançar seus objetos desejados (IMAI, 2007).

O termo dissociação de movimentos se refere às condições de


se realizar múltiplos movimentos simultaneamente, cada membro
realizando uma atividade diferente. A coordenação global e a
experimentação levam a criança a adquirir a dissociação de movimentos.

• Coordenação motora fina

Esta coordenação motora está relacionada à habilidade e destreza manual.


Como então definir a destreza? São habilidades motoras delicadas, nas quais
são executados movimentos precisos de dedos e mãos. São exemplos os
movimentos de preensão, em que se pode segurar objeto na mão ou em sua
palma. Os movimentos de preensão evoluem desde uma preensão reflexa até
os movimentos finos digitais. Saiba você que essa evolução é um marco claro no
desenvolvimento da criança, que por meio disso vai se apoderando gradativamente
do meio. Vale a pena ressaltar que, para que a criança a desenvolva, como a ação
da escrita, necessitará do desenvolvimento de sua coordenação óculo–manual
(viso–motora), em que a visão deverá acompanhar os movimentos da mão. O
quadro a seguir expressa a evolução da preensão, conforme Guillarme.

42
Capítulo 1 PSICOMOTRICIDADE

QUADRO 6 – DESENVOLVIMENTO DA PREENSÃO SEGUNDO GUILLARME (1983)


Idade Desenvolvimento
3 meses Movimento reflexo involuntário, próximo ao reflexo de “graspingreflex (reflexo
de preensão), que desaparece por volta dos 4-5 meses, surgindo a verdadeira
preensão.
4–5 O bebê segura o objeto ao tocá-lo, ainda com preensão continua incerta, a mão
meses plana por baixo do objeto, em seguida, o objeto é pego pelos três últimos dedos
(preensão cúbito-palmar). Inicia a coordenação oculomotora (olho – mão).
6 meses Realiza preensão dígito – palmar, flexão simultânea dos quatro últimos dedos.
8 meses Realiza pinça inferior (rádio-palmar), a criança segura o objeto entre a última
falange do indicador e a borda do polegar.
9 – 10 A criança opõe o polegar aos demais dedos, realizando a pinça superior (toma
meses o objeto entre a polpa do polegar e o indicador, gesto especificamente humano
de preensão).
Após Aperfeiçoamento das praxias; favorecidas pelas necessidades da vida social,
aprendendo atos como beber em xícara, servir-se de uma colher, abrir caixas,
pegar objetos e atirá-los, transportar objetos.
FONTE: Adaptado de Guillarme (1983, p. 34 apud IMAI, 2007)

Portanto, temos que concordar com Guillarme (1983), quando ele


afirma ser a preensão uma ação complexa, visto atingir sua forma definitiva
em aproximadamente um ano. Já a aquisição da escrita é um processo de
desenvolvimento que ocorre dependente de alguns fatores, sendo possível
partindo de algum grau de desenvolvimento intelectual, motor e afetivo. Na
verdade, para que ocorra a escrita, a mão necessita de ação motora que possibilite
a sua execução. Essa motricidade se inicia por meio de experiências do corpo e a
gradual independência das articulações do membro superior, desde o ombro até
os dedos (AJURIAGUERRA, 1988, p. 9).

Para que você amplie seus conhecimentos referentes à


coordenação motora global e fina e seu respectivo desenvolvimentos
por idade, acesse o link:
<https://neurosaber.com.br/coordenacao-motora-como-ela-se-
desenvolve-por-idade/>.

1.1.1 Lateralidade (dominância lateral)


A natureza do homem lhe confere um lado do corpo dominante, em que olhos,
ouvidos, pé e mão de um determinado lado são usados da melhor maneira. Esta

43
Fundamentos da Psicomotricidade

lateralidade é definida por volta dos 3 aos 4 anos, em que se instala a dominância
lateral e é geralmente concluída entre 6 – 7 anos, normalmente predominando o
lado direito (destro). Bee e Boyd (2011) definem, em sua obra, que a lateralidade
é uma forte preferência por utilizar principalmente uma das mãos, desenvolvendo-
se entre os 3 e os 5 anos. É fato que o lado dominante irá desenvolver maior força
muscular e rapidez.

Define-se, portanto, como dominância homogênea, quando há domínio de


um mesmo lado de três níveis: o olho, mão e pé. Já a utilização indiscriminada
de ambas as mãos é definida como ambidestro. Quando um dos três níveis
contraria a dominância lateral estabelecida nos outros dois níveis, a dominância é
classificada como cruzada. Para que você compreenda, um bom exemplo é se a
criança utiliza a mão direita, o olho e pé esquerdos. É importante que você tenha
a compreensão que definir a lateralidade na criança possibilita que ela se perceba
e tenha a consciência dos lados direito e esquerdo do corpo dela. Ela poderá,
contudo, identificar esses conceitos no que se refere a objetos ao seu redor; em
relação à pessoa na sua frente, entre outras detecções. Essa lateralidade traz
uma grande contribuição em sua organização espacial, na percepção de seu
eixo corporal, sua localização no meio e ao seu redor, utilizando seu corpo como
referência no espaço.

Para que você amplie seus conhecimentos sobre lateralidade,


sugiro a seguinte leitura: BEE, Helen; BOYD, Denise. A criança em
desenvolvimento. Porto Alegre: Artmed. 12. ed. 2011, pp. 116-117.

1.1.1 A organização espacial


A organização espacial está relacionada à tomada de consciência do próprio
corpo, em outras palavras, de seu esquema corporal. A partir da referência do
próprio corpo é que há a orientação em relação a pessoas e objetos tanto em
movimento como em posição estática.

É uma propriedade essencial para a nossa vida social, visto possibilitar,


por meio do espaço e relações espaciais, o estabelecimento de relações entre
as coisas, possibilitando a observação, comparação, combinação, agrupamento
e classificação dos objetos, conforme determinados atributos, chegando aos
conceitos desses objetos e suas respectivas categorizações (IMAI, 2007).

44
Capítulo 1 PSICOMOTRICIDADE

Exemplificando, operações aritméticas envolvem relações de agrupamento


que dependem da noção espacial; ler e escrever são desenvolvidos em um
espaço, orientação e sentido.

Seguimos então tratando do desenvolvimento da organização espacial e sua


divisão em quatro etapas, as quais têm seu marco em aquisições significativas,
as quais são classificadas como: conhecimento das noções, orientação espacial,
organização espacial e compreensão das relações espaciais (IMAI, 2007):

• Conhecimento das noções: este conhecimento é adquirido por volta


dos três anos, concomitante aos termos relacionados ao espaço.
Exemplificando, são desenvolvidas noções situacionais como fora,
dentro, atrás, afrente, estar alto ou baixo etc.; noções de tamanho (que
aparecem por volta dos 4 anos) como espessura, largo, grande, estreito,
pequeno etc.; noções de posição, como estar de pé ou sentado, curvado
ou reto; noções de movimento, como se abaixar ou levantar, rodopiar,
correr ou andar, cair e se levantar etc.; noções de formas, inclusive
geométricas como retângulos ou quadrados etc.; noções de qualidade
como ter pouco ou muito, encher ou esvaziar etc.
• Orientação espacial (relação corpo X objeto): é a tomada de
consciência da situação de seu corpo em relação ao ambiente.
Nessa etapa, conhecendo as noções anteriormente citadas, a
criança necessitará aprender a sua orientação e a orientação das
coisas, desenvolvendo noções de geometria projetiva e euclidiana
simultaneamente. Falando um pouco de cada uma delas, a geometria
projetiva fornece a possibilidade da conquista do espaço projetivo, em
que a figura ou o objeto estão sob a visão de um observador que tem sua
própria visão da figura ou do objeto, conquista observada tardiamente
na perspectiva da representação do desenho, ocorrendo ao redor dos
8 a 9 anos. Sobre a geometria euclidiana, ela traz a possibilidade do
reconhecimento de dimensões e formas. As aquisições de noções serão,
por exemplo, de uma fila, estar frente a frente, colocar-se costas contra
costas, ter uma memória espacial que lhe direcione para um trajeto ou
orientações sobre alterações de pontos de referência. O resultado dessa
etapa de desenvolvimento é de a criança poder orientar-se em seu meio,
estando preparada para a assimilação e orientação no papel, orientando-
se e organizando-se com relação aos objetos, podendo então passar
para o desenvolvimento da etapa seguinte.
• Organização espacial: a criança, nesta etapa, começa a organizar os
objetos, combinando várias orientações, não utilizando seu corpo como
referência, escolhendo então outros pontos, colocando-os conforme
várias orientações. As aquisições, nesta etapa, são sobre noções de
direção, distância, previsões para antecipação ou transposição. Adquire

45
Fundamentos da Psicomotricidade

o desenvolvimento da noção da memória espacial, possibilitando a ela o


descobrimento da falta de um objeto, a reprodução de um desenho que
visualizou anteriormente, não se esquecendo das simbologias gráficas
e respectivas direções. De posse desses conhecimentos, irá para a
próxima etapa.
• Relações espaciais: você poderá observar que esta etapa diverge
muito das anteriores, baseando-se somente no raciocínio, partindo de
situações especiais bastante precisas. Podemos exemplificar essa
etapa com a percepção de relações com o simetrismo (bilateralidade),
oposições (lados opostos), ritmicidade (ritmo), inversões (posições
contrárias), elementos subtraídos (retirados/eliminados) ou adicionados
(somados/ acrescentados). Veja que a criança já adquire habilidade para
desenhar plantas como as de sua casa ou de sua escola, transcrever o
trajeto de sua casa até a escola.

O conhecimento das noções, etapa do desenvolvimento


da organização espacial, desenvolve-se por volta dos 3 anos,
possibilitando para a criança várias aquisições de desenvolvimento.
Quais prejuízos poderiam ocorrer, em crianças com atraso do
desenvolvimento neuropsicomotor, que tardiamente desenvolvem
esse conhecimento?

4.1.5 A organização temporal


Assim como a organização espacial, a organização temporal não é um
conceito nato do indivíduo. Como podemos então diferenciá-lo? Bem, vamos
apresentar algumas de suas características. Tanto o espaço como o tempo são
construídos gradativamente e correspondem à elaboração de um sistema de
relações; ambas são construídas mentalmente. Porém, conceituar o “temporal”
engloba a noção de sucessão, estando intimamente relacionado ao ritmo e
este envolve noções de ordem, duração e sucessão. Veja, portanto, que o
“temporal” faz-se presente já na fase embrionária da criança, estando presente
primeiramente nos registros do corpo da criança. Vamos exemplificar isso,
registro dos ritmos espontâneos como o cardíaco e respiratório, respiratório,
fome, alternância vigília–sono, ritmo das atividades musculares, locomoção, as
primeiras palavras. Concorda que todos esses registros estão vinculados ao
“tempo”? Citamos a fome, que conforme citações de Piaget (1975, p. 294 apud
IMAI, 2007), as primeiras impressões a respeito do tempo surgem no período

46
Capítulo 1 PSICOMOTRICIDADE

sensório motor, como exemplo, “quando, gritando de fome, o bebê reclama a sua
comida, com maior ou menor êxito, ele tem conhecimento de certas durações,
como a da espera” (PIAGET, 1975, p. 294).

Portanto, diferentemente da organização espacial, a organização temporal se


refere à habilidade de situar-se em função dos acontecimentos e suas respectivas
sucessões; da duração dos intervalos; da cíclica renovação de alguns períodos;
da irreversível peculiaridade do tempo. Quatro são as etapas do desenvolvimento
da organização temporal, sendo elas a ordem e sucessão; duração dos intervalos;
renovação cíclica de certos períodos; e e ritmo. O quadro a seguir resume essas
etapas e suas respectivas características.

QUADRO 7 – ETAPAS DO DESENVOLVIMENTO DA ORGANIZAÇÃO TEMPORAL


ETAPA CARACTERÍSTICAS
Colocação dos fatos do dia a dia em ordem cronológica. Exemplos: o
que aconteceu antes e depois; fazer primeiro e por último; o ontem,
Ordem e
hoje e amanhã. São aquisições que possibilitam a percepção da ordem
sucessão
e sequência dos acontecimentos. Aos 5 anos, adquire-se a noção de
sequência lógica.
Os fenômenos que acontecem com o decorrer do tempo são percebidos,
Duração dos
como os que apresentam relação ao tempo ser curto, longo, noções de
intervalos
hora, minuto e segundo.
Renovação
cíclica Há a percepção de que o tempo é determinado pelos dias (como manhã,
de certos tarde e noite), semanas e estações do ano.
períodos
Abrange a noção de ordem, sucessão, duração, alternâncias. Presente
Ritmo
na vida da criança desde sua vida intrauterina.
FONTE: Adaptado de Imai (2007)

Neste tópico você aprendeu que, para o desenvolvimento psicomotor ser


compreendido e as intervenções psicomotoras sejam realizadas, há a necessidade
do conhecimento dos principais elementos psicomotores e suas respectivas
etapas de evolução. Portanto, os princípios básicos da Psicomotricidade estão
relacionados aos elementos psicomotores.

4 INTERVENÇÃO PROFISSIONAL
Vamos agora versar sobre a intervenção profissional e o papel de vários
profissionais no campo da psicomotricidade, iniciando com a definição do
profissional “Psicomotricista”. Para a Sociedade Brasileira de Psiquiatria

47
Fundamentos da Psicomotricidade

(SBP, 2003), trata-se do profissional da área da educação e saúde que atua


pesquisando, ajudando, prevenindo e cuidando do indivíduo na aquisição, no
desenvolvimento e nos distúrbios da integração somatopsíquica (SBP, 2003).
As áreas de atuação estão concentradas na Educação, Clínica e Institucional,
incluindo aqui a reeducação e terapia, a consultoria e Supervisão.

Com relação à intervenção psicomotora, vamos apontar três áreas básicas


dessa atuação, conforme Mello, abordando posteriormente cada qual e suas
respectivas abordagens:

Nos estudos dos pesquisadores recentes, são apontados três principais


campos de atuação ou formas de abordagem da Psicomotricidade:
1. Reeducação Psicomotora; 2. Terapia Psicomotora; e 3. Educação
Psicomotora. Embora em certos trabalhos esses três níveis de atuação
cheguem a confundir-se, existem características próprias em cada um
deles (MELLO, 2002, p. 33).

• Reeducação psicomotora

Ação pedagógica que utiliza a ação do corpo, objetivando a normalização do


comportamento global da criança, favorecendo todos os aspectos de sua formação
integral em situação de aprendizagem. Quando é necessária sua intervenção?
Quando são identificados na criança traços no seu desenvolvimento que a
impossibilitem de efetuar alguns aprendizados, ou mesmo quando não se consegue
acompanhar o ritmo dos processos, gerando déficits afetivos e/ou emocionais.
Apresenta-se como uma aliada do ambiente escolar, possibilitando ajustes
necessários para suprir as demandas dos processos de ensino-aprendizagem.
São prestados nesta abordagem atendimento a portadores de debilidades motoras,
instabilidades e atraso psicomotor, disfunções tônicas e posturais, coordenação e
equilíbrio, bem como déficits percepto-motores. Em suma, esta abordagem lida com
déficits dos elementos psicomotores na qual falamos anteriormente (MELLO, 2002).

• Terapia psicomotora

É uma abordagem que associa o movimento corporal com a interação


social e a aprendizagem. Nesta aprendizagem são associadas disciplinas lógicas
e linguísticas (matemática e português), podendo ser feita em muitas fases da
vida, com maiores benefícios para as crianças. Esses benefícios consistem em:
auxiliar a coordenação motora; atuar na autoestima e seu desenvolvimento;
reabilitar indivíduos acidentados; melhorar a sociabilização; atuar nas dificuldades
de aprendizagem, entre outros. Esta abordagem é indicada para grandes
perturbações e a adaptação é de ordem patológica. Quando aplicada ao público
infantil, torna-se uma abordagem praticamente ludoterápica, em que a maneira de
brincar é uma maneira de comunicação e expressão privilegiada para a criança.

48
Capítulo 1 PSICOMOTRICIDADE

• Educação psicomotora

Nesta abordagem, qualquer que seja o método e experiência propostos, o


profissional tem que considerar funções psicomotoras e valências físicas que
quer reforçar. Esta abordagem está voltada para o âmbito educacional, sendo
oportuno que você compreenda que ela também apresenta uma divisão composta
por duas principais correntes relacionadas a psicomotricidade funcional (PF) e a
psicomotricidade relacional (PR).

A psicomotricidade funcional objetiva educar sistematicamente as distintas


condutas motoras, possibilitando assim, uma maior integração social e escolar.
Nesta o educador passa a ser o modelo que deve ser seguido e ele então direciona
a tarefa que será realizada. Impõe dificuldades para que ocorra a interatividade
dos envolvidos, inibindo assim o desenvolvimento da criatividade e autonomia.

A Psicomotricidade Relacional (PR) é um método criado por André Lapierre


e Anne Lapierre, que defende que a educação deve ir além dos conteúdos do
currículo formal, envolvendo a atenção aos aspectos afetivos e emocionais e o
desenvolvimento integral da criança. Prioriza o trabalho grupal, enfatizando a
imprescindibilidade da comunicação corporal e do jogo espontâneo. Tem seu foco
em metodologias não diretivas, em que sua principal ação se desenvolve por meio
de jogos, propiciando a capacidade de representação, imaginação e criatividade
(GOMES; BATISTA; FIGUEIREDO, 2015).

Os autores Lapierre e Aucouturier apresentam um papel relevante na prática


psicomotriz, visto sempre apresentarem posturas científicas, demonstrando a
intenção de inovar no fazer pedagógico, sempre defendendo a formação pessoal
do psicomotricista.

A verdade é que as concepções teórico-práticas de Aucouturier


e Lapierre em relação à prática psicomotriz educativa diferem
quanto à concepção sobre a intervenção do psicomotricista, mas
estão muito próximas no que se referem à reeducação e a terapia.
Hoje em dia, ambos buscam no campo da psicanálise seus
fundamentos teóricos para justificar a prática que propõem, e esta
tendência passa a se constituir em alicerce da psicomotricidade
relacional proposta por eles (NEGRINE, 1995, p.74).

Le Boulch (1988) defende que se retermos somente a atenção da criança


em maneiras gestuais codificadas, o movimento acaba por perder seu caráter
expressivo, considerando os jogos de imaginação e simbólicos como primordiais,
valorizando assim a expressão. Esses jogos apresentam um papel central nas
terapias psicomotoras, por estimular a função imaginativa, etapa indispensável
para que ocorra o desenvolvimento pessoal e social da criança.

49
Fundamentos da Psicomotricidade

A PR é um processo mais espontâneo por parte dos envolvidos, consistindo


em atividades mais livres que possui modelos variados. Há nessa corrente de
educação psicomotora o desenvolvimento da criatividade e da interatividade
entre os educandos, possibilitando um ambiente que proporcione aos alunos a
transferência de circunstâncias de conflitos da realidade para o imaginário. O
educador assume, portanto, distintos papéis e ações para que a realidade seja
assimilada, não sendo o centro da tarefa, mas sim um facilitador. Passa então
o educador a ser um modelo que deverá ser seguido, direcionando a tarefa a
ser realizada, criando dificuldades para que haja interação dos envolvidos, como
também dificuldades para que haja criatividade e autonomia. Nesse processo há
previsão e planejamento e o educador tem o conhecimento do que irá acontecer.

Esse fato diverge da PR, em que o improvável acontece várias vezes. Isso
possibilita experiências mais ricas, uma vez que cada aluno apresenta uma
bagagem de conhecimentos que adquiriu no meio em que vive. Portanto, a PR
é compreendida como jogos e brincadeiras que a criança executa em seu dia
a dia, que passam então a serem incorporados como elemento pedagógico,
incorporando o lúdico como facilitador das inter-relações pessoais. A PR trabalha
com os aspectos positivos da criança, preocupando-se com o que ela sabe fazer e
não com o que não sabe, em suma, auxiliar a criança a superar suas dificuldades,
esquecendo suas inabilidades.

A educação psicomotora deve ser praticada desde a mais tenra idade;


dirigida com perseverança, permitindo assim prevenir inadaptações difíceis de
corrigir quando já se encontram estruturadas. Conforme Lordani e Blanco (2019),
a Educação Psicomotora objetiva o estímulo ao desenvolvimento da criança em
seus aspectos motores, cognitivos e socioafetivos. Essa prática, quando indicada,
deve ser aplicada desde o início do processo de escolarização, centralizando-a
na construção de abstrações conceituais, voltadas ao trabalho mental, cognitivo,
em que há situações de relativa imobilidade corporal. A educação psicomotora na
Educação Infantil apresenta-se como uma alternativa metodológica que poderá
oferecer a aprendizagem através do movimento corporal e da indissociação
dos aspectos cognitivos, afetivos e psicomotores. Entre seus benefícios, pode-
se destacar o auxílio ao aluno na potencialização de seu aprendizado escolar e
na prevenção de prováveis dificuldades de aprendizagem, bem como apresentar
eficácia no processo de alfabetização.

Vamos citar como exemplo dessa abordagem a “Psicocinética”, uma


verdadeira maneira de educação psicomotora, calcada no conhecimento das leis
do desenvolvimento, a qual qualifica a ação educativa integradora e globalizada.
Consiste em um método pedagógico, compondo uma forma educativa
fundamental correspondente aos primeiros estágios de desenvolvimento do ser
humano. Também é uma maneira de promover o desenvolvimento da tomada de

50
Capítulo 1 PSICOMOTRICIDADE

consciência a respeito do próprio corpo e as respectivas adaptações posturais


indispensáveis durante a aprendizagem nas demais fases evolutivas do ser
humano. De zero aos doze anos de idade, a educação psicocinética corresponde
a uma original educação psicomotora (LE BOUCH, 1977).

Valências físicas, determinadas geneticamente, também podem ser


denominadas de qualidades físicas, capacidades motoras, capacidades
físicas, são aptidões potenciais físicas do indivíduo, abrangendo
movimentos desde os mais simples aos mais complexos. São todas
as qualidades físicas motoras que podem ser desenvolvidas por meio
de treino ou intervenção (intervenção psicomotora), frequentemente
classificadas em vários tipos: força, resistência, velocidade, agilidade,
coordenação, flexibilidade, mobilidade e equilíbrio.

Para que você adquira conhecimentos sobre a educação


psicocinética proposta por Jean Le Boulch e sua grande influência
na área de Educação Física e psicomotricidade, indico o seguinte
site: <https://repositorio.ufrn.br/jspui/bitstream/123456789/20519/1/
ChristyanGiulliannoDeLaraSouzaSilva_DISSERT.pdf>.

Portanto, no que concerne a métodos de intervenções psicomotoras, tanto


a terapia, como a educação e a reeducação psicomotora, devem objetivar o
desenvolvimento de indivíduos críticos, conscientes e reflexivos. Por meio do afeto,
aliado a essas práticas, os profissionais psicomotricistas devem alicerçar a teoria e a
prática, derrubando seus muros, devendo estar sempre atento às necessidades que
devem ser percebidas nos pacientes de forma global. A atuação em psicomotricidade
deve ocorrer em qualquer faixa etária, sendo que sua abordagem beneficia idosos,
pessoas com deficiências, crianças, indivíduos com depressão, hipertensos,
sequelas de Acidente Vascular Cerebral (AVC), entre outras comorbidades. Não se
deve, de forma alguma, negligenciar o aspecto afetivo, o toque, a sociabilização
(promovendo atividades grupais), o cognitivo (desenvolvendo a concentração e
assimilação), o aspecto físico (estimulando os elementos psicomotores como a
percepção óculo-pedal, manual, equilíbrio, lateralidade, a flexibilidade, coordenação
motora tanto global como fina), entre outros aspectos imprescindíveis para que a
intervenção se faça efetiva e resolutiva.

51
Fundamentos da Psicomotricidade

1.1 MULTIPROFISSIONALIDADE
Inicialmente apresentaremos para você a diversidade de profissionais
que exercem a psicomotricidade como prática terapêutica e de aprendizado.
Sabemos que atualmente um grande número de profissionais de diferentes
áreas (multiprofissionalidade) utilizam a psicomotricidade em distintos contextos
e diferentes idades, em locais tais como escolas, clínicas de reabilitação,
academias, hospitais, entre outros. Como exemplo, em instituições psiquiátricas,
a psicomotricidade pode somar-se às medidas de intervenções terapêuticas no
campo da saúde mental, de modo que seu perímetro de atividades se estenda
para além da medicalização. Atuam, portanto, no campo da psicomotricidade,
profissionais médicos de várias especialidades, psicólogos, psicopedagogos,
educadores físicos, fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais, fonoaudiólogos,
entre outros. No entanto, não caracterizam a interdisciplinaridade em sua
essência, mas sim cada profissional atuando dentro da sua especialidade com a
psicomotricidade, sem que haja troca de conhecimentos.

Diante desta diversidade de profissionais atuantes na área da


psicomotricidade, há delimitações para cada um deles? Há um órgão
de classe que possa regulamentar essa prática e suas respectivas
competências para esss diferentes áreas? Bem, diante desta
multiprofissionalidade, o que vemos é que as competências acabam
por invadir algumas intervenções, podendo acarretar em conflitos
dentro das áreas envolvidas com esta intervenção profissional. A
regulamentação da atividade profissional do Psicomotricista, por meio
do PLC nº 74/2018, estabelece que “poderão exercê-la os portadores
de diploma de curso superior em Psicomotricidade, bem como
graduados nas áreas de saúde ou de educação com diploma de pós-
graduação em Psicomotricidade, desde que possuam especialização
em Psicomotricidade” (CFF, 2020, s.p.). Um dos motivos pode residir
no fato de que a clientela é bastante diversificada, como bebês de
alto risco, crianças em fase de desenvolvimento e/ou com retardo no
desenvolvimento global; portadores de necessidades especiais com
deficiências sensório- motoras, cognitivas e psíquicas; distúrbios
sensoriais, perceptivos, motores e relacionados a sequelas de lesões
neurológicas, idosos, entre outros.

52
Capítulo 1 PSICOMOTRICIDADE

1.1 INTERDISCIPLINARIDADE
Para tratarmos de interdisciplinaridade em psicomotricidade, apresentaremos
a você exemplos de alterações e questões relacionadas aos portadores de
síndromes genéticas e neurológicas. Elas podem se manifestar como: alterações
motoras: alterações de tônus, acarretando déficits de postura e movimento;
alterações na linguagem, interferindo na organização do pensamento e na
sociabilização; alterações comportamentais, acarretando dificuldades nos
relacionamentos pela inadequação perante a sociedade; alterações estéticas,
como os dismorfismos, podendo estar presentes tanto em face como no corpo,
causando estranheza perante os olhares dos que os observam, por vezes se
refletindo em sentimentos de pena, interferindo na autoestima do indivíduo;
alterações cognitivas, interferindo no aprendizado; internações hospitalares
recorrentes, interrompendo vida escolar ou social, entre outros (DORNELES;
BENETTIA, 2012).

Com essa exposição, esperamos que você reflita sobre a interdisciplinaridade


requerida em intervenções psicomotoras. São várias as intervenções necessárias,
requerendo vastos saberes, visto estarem envolvidos aspectos motores, psíquicos,
cognitivos, estéticos, afetivos, comportamentais, de linguagem, entre outros.
Portanto, a interdisciplinaridade refere-se a uma abordagem epistemológica
dos objetos de saberes, questionando a visão fragmentada da realidade, pois
refere-se a uma relação entre disciplinas. Há, nessa exposição de alterações que
possam fazer parte de indivíduos que necessitem da intervenção psicomotora, a
necessidade de afinidades maiores entre determinadas áreas e não considerar
que há necessidade de áreas específicas para essa intervenção seria cair em um
formalismo mecânico e fragmentado.

A psicomotricidade tem-se mostrado aliada, criando


oportunidades de multiplicar sua ação em conjunto com outras
ciências e teorias de maneira funcional para a melhoria do
ensino, da saúde e da qualidade de vida. Seja por meio da
Ciência, Biologia, Filosofia, Psicologia, da Educação Física,
podemos dizer que há um consenso quanto ao fato do processo
de aprendizagem (ou construção dos saberes) depender
das virtudes de sentimento, sensibilidade, criatividade, da
imaginação e da afetividade enquanto busca do prazer
(satisfação/realização) pessoal (DORNELES; BENETTIA,
2012, p. 1783).

53
Fundamentos da Psicomotricidade

Sobre a expressão citada no texto: “Não considerar que há


necessidade de áreas específicas para essa intervenção seria cair
em um formalismo mecânico e fragmentado”, estabeleça as relações
que apresenta com o tema psicomotricidade e interdisciplinaridade.

5.3 TRANSDISCIPLINARIDADE
Para que você compreenda o caráter transdisciplinar da psicomotricidade,
vamos definir esse campo transdisciplinar como o estudo e investigação das
relações e as influências recíprocas e sistémicas que permeiam o psiquismo e
a motricidade. Portanto, a transpsicomotricidade, como citamos anteriormente
no Quadro 1, teve seu desenvolvimento no Brasil a partir de 2000, por meio de
pesquisas realizadas pelo Prof. Dr. Eduardo Costa e pela Profª. L. D. Martha
Lovisaro, ambos Psicomotricistas Clínicos e Educacionais na Universidade do
Estado do Rio de Janeiro. Essas pesquisas buscavam a ampliação de reflexões
sobre a prática psicomotora por meio do pensamento complexo, entendendo-o
como a capacidade de considerar tanto as influências internas como externas
recebidas, buscando a compreensão da multidimensionalidade do ser humano
sob essas influências (ABP, 2019).

Essa transpsicomotricidade objetiva se ordenar com as linhas inclusivas


e libertárias em Educação, bem como com a humanização da Saúde. São
seus objetivos: estudar o corpo do indivíduo em movimento em suas múltiplas
interações; transcender a questão do dualismo corpo-mente, executando
poliocularmente uma ampliação nas já existentes leituras psicomotoras; incluir
a abordagem ecológica, espiritual, artística, entre outros vários fatores que
compõem a unidade e diversidade que é o ser humano (COSTA, 2011). Portanto,
a transpsicomotricidade:

É a viagem em busca de um modo de pensamento capaz de


respeitar a multidimensionalidade, a riqueza, o mistério do real;
e de saber que as determinações – cerebral, cultural, social,
histórica – que se impõem a todo pensamento co-determinam
sempre o objeto de conhecimento. É isto que eu designo por
pensamento complexo (MORIN, 1980, p. 14 apud COSTA, 2011).

Neste tópico, você aprendeu sobre a intervenção profissional e o papel de


vários profissionais no campo da psicomotricidade, suas áreas de atuação, que
estão concentradas na Educação, Clínica e Institucional. Você pôde também

54
Capítulo 1 PSICOMOTRICIDADE

adquirir conhecimentos sobre as intervenções psicomotoras contextualizadas no


campo da Reeducação; Terapia e educação, sendo que no âmbito educacional
essas intervenções apresentam duas principais correntes relacionadas: a
psicomotricidade funcional (PF) e a psicomotricidade relacional (PR), objetivando
o desenvolvimento de indivíduos críticos, conscientes e reflexivos. Pôde
compreender a psicomotricidade no âmbito multidisciplinar, interdisciplinar e
transdisciplinar, em que a transpsicomotricidade se aproxima da realidade atual
dessa ciência, objetivando se ordenar com as linhas inclusivas e libertárias em
Educação, bem como com a humanização da Saúde.

6 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
Após a descrição de uma breve narrativa da história e do desenvolvimento
da psicomotricidade e alguns de seus principais teóricos e suas respectivas
fundamentações, bem como de vários autores e instituições, pudemos constatar
que não há um conceito ou uma definição única para o termo psicomotricidade,
existindo olhares plurais. Teorias sobre o desenvolvimento psicomotor e teorias
da aprendizagem puderam compor essa abordagem, elucidando que cada qual
contribui de forma positiva para a evolução dessa área.

A maneira como os psicomotricistas absorvem as teorias psicomotoras e dão


assistência à psicomotricidade influenciam sua prática profissional, condicionando
a maneira como utilizam o instrumento corpo, objetivando otimizar as funções
psíquicas.

Fato também constatado é a imprescindibilidade do conhecimento dos


elementos básicos que compõe a assistência psicomotora, em que o estudo
dos principais elementos psicomotores e suas respectivas etapas de evolução
permitirão ao profissional a melhor compreensão do desenvolvimento psicomotor,
sendo essa compreensão de suma importância para a atuação do profissional na
educação e psicomotricidade infantil.

Dentro desse contexto, é importante destacar que o esquema corporal é


o responsável pela organização das sensações relativas aos dados do mundo
exterior. Há, portanto, a necessidade do desenvolvimento e amadurecimento do
sistema nervoso, visto sua imprescindibilidade na construção e elaboração do
Esquema Corporal, por estar envolvido com a evolução sensório-motora. Fica
claro, portanto, a compreensão que a educação do Esquema Corporal é o ponto-
chave de toda prática educativa.

Relacionado ao aspecto intervencionista na área da psicomotricidade,


pudemos constatar que há basicamente três áreas de atuação: educação,
55
Fundamentos da Psicomotricidade

reeducação e terapia psicomotora, o que exige que essa área tenha o caráter
interdisciplinar e transdisciplinar, com multiprofissionais aliando vários saberes,
bem como a ampliação de reflexões sobre a prática psicomotora por meio do
pensamento complexo, entendendo-o como a capacidade de considerar tanto
as influências internas como externas recebidas, buscando a compreensão da
multidimensionalidade do ser humano nessa relação.

Esses profissionais não devem deter para si todos os conhecimentos dos


vários objetos de assistência que a psicomotricidade necessita, visto essa
fragmentação repercutir negativamente no resultado da assistência prestada
ao indivíduo. Portanto, é notória a conclusão que, para que atuem nessas
intervenções, os profissionais devem ter conhecimento do conteúdo expresso
neste capítulo, partindo da adoção das teorias apresentadas e suas respectivas
premissas ou a soma de várias delas, compondo assim sua estratégia de
intervenção com base científica.

Por fim, por ser a psicomotricidade uma profissão não regulamentada e, por
vezes, profissionais de várias áreas possivelmente adentrarem em intervenções
delimitadas a outras profissões, acreditamos que podem ocorrer conflitos de
atuação e intervenção profissional em determinadas áreas. É sob esse aspecto
que se faz necessária a prática da inter/transdisciplinaridade nas intervenções
psicomotoras, incluindo nessa assistência a abordagem ecológica, espiritual,
artística, entre outros vários fatores que compõem a “unidade e diversidade”
que é o ser humano. Só assim será garantindo ao indivíduo uma assistência
psicomotora “holística”.

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58
Capítulo 1 PSICOMOTRICIDADE

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WALLON, H. Psicologia e educação da infância. Lisboa: Estampa, 1975.

60
C APÍTULO 2
DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR

A partir da perspectiva do saber-fazer, são apresentados os seguintes


objetivos de aprendizagem:

Saber:
 Promover o conhecimento sobre as etapas do desenvolvimento psicomotor e
as atividades psicomotoras adequadas às necessidades individuais de cada
criança.
 Estudar os estágios de desenvolvimento segundo Piaget.
 Valorizar a avaliação psicomotora como instrumento de observação,
reflexão e tomada de decisões frente às demandas individuais, com base no
desenvolvimento psicomotor.

Fazer:
 Ilustrar ao futuro profissional o conhecimento sobre a evolução e aspectos
relacionados ao desenvolvimento psicomotor.
 Agregar, por meio da observação e avaliação de suas características evolutivas,
experiências sensoriais, motoras, afetivas e sociais repletas de significados
frente às demandas necessárias para o desenvolvimento infantil.
Fundamentos da Psicomotricidade

62
Capítulo 2 DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR

1 CONTEXTUALIZAÇÃO
A psicomotricidade privilegia a interação entre o domínio cognitivo, afetivo
e motor, objetivando educar ou reeducar o movimento, havendo assim uma
íntima ligação com a transdisciplinaridade. Temos uma condição básica para
que a psicomotricidade possa ser praticada com eficácia, “o conhecimento do
desenvolvimento psicomotor”. Este pode ser descrito como um processo de caráter
contínuo, no qual ocorre, além do desenvolvimento motor (DPM), a evolução
da comunicação, inteligência, afetividade, sociabilidade e aprendizagem, de
maneira simultânea e global. A mudança e a estabilidade do desenvolvimento
humano acontecem por meio de vários aspectos da pessoa, ou seja, por meio do
desenvolvimento físico, cognitivo e psicossocial. Esses aspectos estão interligados,
cada um influenciando o outro no decorrer da vida (PIOVESAN et al., 2018).

O DPM ocorre em etapas, as quais dependem do desenvolvimento e maturação


do sistema nervoso central (SNC), ocorrendo em todas as crianças, porém cada qual
apresenta seu ritmo de aquisições. Para que essas etapas ocorram, as estruturas
neurológicas devem estar razoavelmente bem formadas, principalmente, o cérebro
e as funções sensoriais exteroceptivas, como a visão, audição, tato, paladar e olfato.
Embora esta maturação desempenhe papel básico no desenvolvimento de padrões
de movimento fundamentais, certamente não pode ser-lhe atribuída a única influência.
As condições do ambiente, propiciando oportunidades para a prática, instrução,
encorajamento e o cenário ambiental, desempenham papel relevante no grau
máximo de desenvolvimento que os padrões de movimento primordiais alcançam
(GALLAHUE; OZMUN, 2003). Tanto fatores internos, como o sexo e a genética, como
externos, que envolvem o meio, interferem nesse desenvolvimento, que se apresenta
como fator determinante na aquisição do aprendizado, na reeducação do tônus, da
postura, da direcional idade, do ritmo e lateralidade.

Portanto, quando falamos a você sobre desenvolvimento psicomotor, estamos


integrando o desenvolvimento sensorial, motor e cognitivo. E não poderíamos
deixar aqui de citar Jean Piaget, que tanto contribuiu com a psicomotricidade, ao
apresentar sua teoria sobre o conhecimento construído por cada sujeito a partir
da sua interação com seu ambiente. Piaget esteve preocupado em encontrar
os mecanismos comuns aos mais diferentes sujeitos, ainda que vivessem em
diferenciadas contingências culturais (FONSECA, 2008).

Para que o desenvolvimento psicomotor seja acompanhado e possam ser


detectadas alterações, as crianças devem ser avaliadas e observadas. Com a
finalidade dessa avaliação servir como um instrumento de direção, deve-se estabelecer
instrumentos de confiança para avaliar, analisar e estudar o desenvolvimento das
crianças em suas distintas etapas evolutivas. As maneiras de avaliar o desenvolvimento
motor de uma criança podem ser várias, porém nenhuma é perfeita e nem abrange
63
Fundamentos da Psicomotricidade

todos os aspetos do desenvolvimento. Podem ser utilizadas objetivando mensurar uma


determinada característica motora ou social de um indivíduo, comparando assim seus
resultados com os de outros indivíduos. Estes sim permitirão determinar o avanço ou
atraso motor de uma criança naquele aspecto avaliado (VIVAS, 2010).

2 FUNCIONAMENTO DO
DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR
Para que você possa compreender de forma correta a importância do
desenvolvimento psicomotor no desempenho das crianças, é necessário entender
como esse processo ocorre. Por ser o desenvolvimento motor responsável pelas
habilidades e/ou dificuldades motoras e progressão do intelecto que o indivíduo
apresentará, há a necessidade da organização de todas as estruturas anatômicas
responsáveis pelo seu funcionamento. Vamos então passar a uma abordagem
dessas estruturas e suas funcionalidades no desenvolvimento psicomotor.

2.1 SISTEMA NERVOSO (SN)


O Sistema Nervoso (SN) é o responsável pelo movimento e a integração do
homem às condições do meio ambiente, coordenando e controlando todas as
ações do organismo. Divide-se em duas partes principais, para fins descritivos:
o Sistema Nervoso Central (SNC), que engloba o encéfalo e a medula espinal
e o sistema nervoso periférico, que consiste nos nervos cranianos e espinais
e seus gânglios associados. No sistema nervoso central, o encéfalo e a medula
espinal são os principais centros nos quais ocorrem a correlação e integração
das informações nervosas. É o SNC que coordena a integração entre as ideias
e sensações, faz a interpretação dos estímulos originários da superfície do
corpo, seleciona e busca informações, canalizando-as para as regiões motoras
correspondentes do cérebro, para que posteriormente sejam enviadas a respostas
adequadas, variando de indivíduo para indivíduo (SNELL, 2019).

Por meio dos neurônios, nome conferido à célula nervosa e a todos os


seus processos, excitável, ocorre a recepção e condução do impulso nervoso. A
maturação deste sistema é fator determinante para que haja o desenvolvimento
psicomotor, sendo imprescindível também considerar nesse processo fatores
relacionados à forma como o indivíduo interage com o meio. O SN é o responsável
por algumas habilidades que são essenciais para o desenvolvimento psicomotor
da criança, permitindo a ela, por exemplo, a manipulação de objetos da cultura em
que vive (SNELL, 2019).

64
Capítulo 2 DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR

A evolução neural oferece uma evolução ou integração sensório-motora


que ocorre por meio do SNC em operações cada vez mais complexas. O
desenvolvimento encefálico é um processo contínuo fundamental na vida do ser
humano e suas alterações oferecem a adaptação ao meio e ao convívio social.
Isso, portanto, interfere no comportamento. Tronco encefálico, cérebro e cerebelo
são as estruturas que constituem o encefálo, sendo que elas apresentam as
funções apresentadas a seguir. O tronco encefálico é responsável pelo controle
cardiovascular, respiratório e da musculatura ocular, participando também das
vias auditivas e de vários reflexos (como a tosse, o espirro e a deglutição);
localizado na porção central do cérebro está o hipotálamo, responsável pelo
controle dos movimentos autonômicos e controle endócrino; o córtex cerebral,
nobre estrutura do SNC, envolvido com a percepção sensorial, funções cognitivas
de aprendizagem, de memória, planejamento motor voluntário, visão, audição,
tato, paladar, fala, escrita etc.; cerebelo, responsável pela coordenação dos
movimentos precisos do corpo, equilíbrio e regulação do tônus muscular
(ANDRADE; LUFT; ROLIM, 2004).

FIGURA 1 – SISTEMA NERVOSO CENTRAL

Legenda: Tallo encefálico: Tronco encefálico

FONTE: <https://commons.wikimedia.org/wiki/File:SISTEMA_
NERVIOSO_CENTRAL.jpg>. Acesso em: 24 jul. 2020.
65
Fundamentos da Psicomotricidade

O desenvolvimento motor é viabilizado pelo processo biológico evolutivo


e social no decorrer da vida, que ocorre através da biologia individual, das
necessidades de tarefa e do ambiente (ANDRADE; LUFT; ROLIM, 2004). Para
cada faixa etária, há características significativas do movimento, em que são
adquiridos e aparecem determinados comportamentos motores com relevantes
repercussões no desenvolvimento da criança. É importante que você saiba que
cada aquisição tem influência na anterior, tanto no domínio motor como mental,
por meio das experiências e trocas com o meio.

Portanto, desde o nascimento, a maturação do SN fornece a aprendizagem


progressiva das habilidades. Conforme determinada área encefálica amadurece,
há a exibição de comportamentos que correspondem àquela área amadurecida,
desde que tal função seja estimulada. Posto isso, o desenvolvimento do
comportamento fica restrito à maturação das células do SNC. Podemos
exemplificar da seguinte forma: considerando que bebês e crianças possam
desenvolver movimentos complexos, seus níveis de coordenação e controle motor
fino apenas poderão ser alcançados posteriormente ao término da formação da
mielina, que ocorrerá na adolescência (KOLB; WHISHAW, 2002 apud ANDRADE;
LUFT; ROLIM, 2004).

• Mielinização

Vamos passar agora a uma abordagem dos aspectos de maturação do


SN. O recém-nascido (RN) não apresenta seu SN desenvolvido totalmente
e as fibras nervosas ainda não conseguiram desenvolver integralmente sua
função relacionada à transmissão do impulso nervoso. Um processo crucial no
desenvolvimento neuronal é a criação de bainhas ou coberturas, em torno de
axônios separadamente, que os isolam uns dos outros eletricamente e melhoram
a condutividade dos nervos. Essas bainhas são compostas de uma substância
chamada mielina (Figura 2) e o seu processo de desenvolvimento é denominado
mielinização. A sequência desse processo segue padrões de desenvolvimento
tanto céfalo-caudais quanto próximo-distais. Podemos exemplificar esse fato
citando os nervos que inervam as células musculares nas mãos. Eles são
mielinizados precocemente aos que inervam os pés. A mielinização é mais rápida
durante os primeiros dois anos após o nascimento e segue em um ritmo mais
lento durante toda a infância e a adolescência. Para que você tenha ideia da
sequência desta maturação mielínica, as partes do cérebro que estão envolvidas
na visão alcançam a maturidade por volta do segundo ano, em contraste às
partes do cérebro que governam os movimentos motores, as quais não estão
totalmente mielinizadas até aproximadamente os 6 anos de idade (BEE; BOYD,
2011). Com relação a este processo de mielinização, há vários relatos sobre a
maturação da mielinização, como ter início no quinto mês de vida intrauterina e
sendo completado entre 15 a 20 anos de idade. Diament (1978, p. 286) cita em

66
Capítulo 2 DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR

sua obra ser “razoável admitir que os ciclos de mielinização possam refletir na
maturação funcional do cérebro e que, portanto, podem ser relacionados com a
emergência e gradual diferenciação, no homem, de padrões de comportamento
como locomoção, manipulação de objetos e instrumentos, fala e linguagem”.

Os termos desenvolvimento céfalo-caudal e próximo-distais,


dentro do contexto apresentado, significam, respectivamente, que o
desenvolvimento segue a progressão gradual da cabeça em direção
aos pés e desenvolvimento a partir do centro do corpo para as suas
partes mais distantes.

A função da bainha de mielina é permitir uma condução do impulso em alta


velocidade, aspecto imprescindível para o adequado desempenho das funções.
Portanto, para que o desenvolvimento psicomotor ocorra, há necessidade que
também ocorra o processo de mielinização, de maneira sincronizada e ordenada,
nas fibras de sistemas com funções relacionados. No SNC, a mielina surge em
sistemas que conduzem impulsos sensoriais ao córtex cerebral e, depois, nos
sistemas que fazem a correlação dos dados sensoriais ao movimento (CORIAT,
1991). A interação do bebê com o meio é de extrema importância para a ocorrência
do processo de mielinização, sendo que a sua exposição a estímulos ambientais
que exijam o funcionamento de determinadas vias acelerarão o processo de
mielinização.

FIGURA 2 – BAINHA DE MIELINA

FONTE: <https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Neuron_
pt.svg>. Acesso em: 14 ago. 2020.

67
Fundamentos da Psicomotricidade

2.2 ÁREAS CEREBRAIS E


MATURAÇÃO NA APRENDIZAGEM
Como aprendizado, podemos compreender o resultado da recepção e da
troca de informações que ocorre entre o meio ambiente e os distintos centros
nervosos. Dessa forma, a aprendizagem parte de um estímulo de natureza físico-
química oriundo do ambiente, transformando-se assim em impulso nervoso pelos
órgãos dos sentidos. Esse impulso, que a inervação sensitiva transporta, percorre
em seu trajeto o tronco cerebral, via tálamo, chegando até um centro nervoso do
córtex cerebral correspondente à natureza do estímulo. Dessa forma, o estímulo
visual termina no lobo occipital, o auditivo no temporal, o táctil ou somestésico no
lobo parietal (ANDRADE; LUFT; ROLIM, 2004).

As áreas de chegada dos estímulos ou sensações são denominadas "zonas de


projeção" ou "primárias". O estímulo projetado nessas áreas primárias é denominado
“sensação”, ou seja, a projeção desse estímulo nas zonas primárias é uma informação
no seu modo elementar e incompleto, sem significado de elaboração e conhecimento,
porém é um trajeto obrigatório para a percepção. Através de neurônios de associação,
essa informação que alcançou a zona primária passa a ser transmitida para a área
secundária. Essa decodificação para a área secundária acarreta a "percepção”,
traduzida pela formação de imagens sensoriais que correspondem ao estímulo. “Na
percepção, as imagens (auditivas, visuais e tácteis) recebem significados, de forma
que permitem que a pessoa veja e reconheça, por exemplo, esse é o rosto de minha
mãe, a voz do meu amigo etc. (ANDRADE; LUFT; ROLIM, 2004).

A área de estímulos de sensação deverá evoluir para a área da


percepção, para que a criança reconheça o rosto e a voz de sua mãe.
Como deverá ser o funcionamento estrutural do desenvolvimento
psicomotor para que isso ocorra?

“Os neurônios das áreas de associação das partes do cérebro


responsáveis pela funções sensorial, motora e intelectual estão mielinizados
em algum grau na época em que as crianças entram na escola. Entretanto,
dos 6 aos 12 anos, as células nervosas nessas áreas tornam-se quase
completamente mielinizadas” (BEE, BOYD, 2011, p. 114).

68
Capítulo 2 DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR

O recém-nascido não apresenta suas áreas secundárias


amadurecidas. Seria mais comum apresentarem sensações ou
percepções?

As áreas terciárias ou de integração são responsáveis pelas associações


entre os sentidos, sendo assim, das áreas secundárias prossegue-se às terciárias,
ocorrendo, portanto, a adição e combinação dos aspectos concernentes ao
estímulo. Como exemplo, podemos citar: esta é minha mãe, que fala comigo
de forma suave, reconheço seu cheiro e posso sentir a maciez da sua pele.
Veja bem, esses processos ocorrem no cérebro em milésimos de segundos
e envolvem várias estruturas sub corticais. É importante que você saiba que a
divisão estrutural e funcional das áreas primária, secundária e terciária ocorre no
lobo occipital, parietal e temporal (BITTENCOURT, 1985).

Com relação à memória e linguagem, esses aprendizados possibilitam vários


outros aprendizados, desenvolvendo-se juntos e apoiando um ao outro. Conforme
Romanelli (2003), a linguagem é a fixadora da aprendizagem (não a motora)
e a memória despertará seus conteúdos por meio da fala. Quais zonas são as
responsáveis pelo desenvolvimento da linguagem? A área de Weirnicke ou de
compreensão da fala, que fica no lobo temporal. Temos a área de Broca, zona
ligada à área motora da fala, que fica no lobo frontal esquerdo, relacionada à
emissão de sons cada vez mais próximos daqueles percebidos.

FIGURA 3 – ÁREAS CEREBRAIS DE LINGUAGEM (BROCA E WERNICKE)

FONTE: <https://commons.wikimedia.org/wiki/
File:BrocasAreaSmall.png>. Acesso em: 5 ago. 2020.

69
Fundamentos da Psicomotricidade

A região frontal do cérebro está associada ao planejamento, controle e


execução dos movimentos voluntários. Nessa região, o movimento ocorre da
seguinte maneira: há primeiro a intenção de movimento, elaborado no córtex
pré-frontal (importante na atenção); em seguida, a informação se dirige para a
área pré-motora, localizada entre o lobo pré-frontal e a área motora, que tem
a responsabilidade de organizar a sequência motora; depois a informação é
projetada na área pré-motora, localizada no giro pré-central, a qual emitirá os
impulsos, via medular, para o órgão efetor (musculatura), com o objetivo de
executar o movimento que foi planejado. Há muitas outras estruturas responsáveis
por dosar esse movimento como sua força, velocidade, fornecendo feedback
constante ao movimento (ANDRADE; LUFT; ROLIM, 2004).

FIGURA 4 – ÁREA DO CÓRTEX PRÉFRONTAL

FONTE: <https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/a/
ab/Prefrontal_cortex.png>. Acesso em: 5 ago. 2020.

Sugiro, para que você compreenda melhor a neurofisiologia do


movimento e sua organização hierárquica, acessar o site: <http://
pesquisa.ufabc.edu.br/bmclab/wp-content/uploads/2018/09/2-
Neurofisiologia-do-movimento.pdf>.

70
Capítulo 2 DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR

• O desenvolvimento motor e a maturação

São três as categorias do movimento observável: movimentos estabilizadores,


que correspondem às funções de equilíbrio e sustentação, movimentos
locomotores, correspondendo à mudança de localização e movimentos
manipulativos, correspondentes a funções de apreensão e recepção de objetos
(GALLAHUE; OZMUN, 2003). Você verá que, conforme a idade, essas categorias
se apresentarão em distintos estágios, a saber:

• Primeira infância (2 a 6 anos): estão se desenvolvendo habilidades


percepto-motoras, porém ainda há confusão com relação ao esquema
corporal, temporal e espacial e direção. O refinamento do controle motor
ainda não se encontra estabelecido, mesmo que em desenvolvimento
rápido nesta faixa etária (GALLAHUE; OZMUN, 2003; ANDRADE;
LUFT; ROLIM, 2004). A maturação das áreas terciárias ainda não se
completou e o lobo frontal, envolvido com o planejamento e execução
das atividades não se encontra totalmente mielinizado, prejudicando
tanto o planejamento e organização das ações como a capacidade de
concentração. A área pré-frontal (atenção) sem maturação dificulta
manter-se a atenção, de maneira que há dificuldades na realização de
uma de suas responsabilidades, ou seja, inibir estímulos irrelevantes,
tornando a criança distraída (ANDRADE; LUFT; ROLIM, 2004).
• Segunda infância (6 aos 10 anos): a preferência manual e os
mecanismos perceptivos visuais estão fortemente estabelecidos. Nesta
fase, a maioria das habilidades motoras fundamentais apresentam
potencial de definição, porém atividades envolvendo olhos e membros
se desenvolvem de forma lenta. Há a transição de habilidades motoras
básicas para as complexas, como exemplo, desenvolvem-se jogos
de liderança e habilidades atléticas. Esse fato ocorre nesta fase em
detrimento do aprendizado motor promovido pela maturação da área
pré-frontal associado às experiências da criança. Esta é a fase na qual
a região pré-frontal progride em sua maturação, possibilitando melhor
planejamento e associação consciente de mais de um movimento.
Saiba que, há a mielinização da área pré-frontal nesta fase, mas não
total e contínua, a qual deverá ocorrer durante as próximas fases, até
aproximadamente os 18 anos (BITTENCOURT, 1985 apud ANDRADE;
LUFT; ROLIM, 2004).
• Adolescência (entre os 10 até os 20 anos ou mais): Nesta fase
é estimado um comportamento motor caracterizado por etapas de
habilidades motoras especializadas. O início desta fase é sinalizado
por uma transição e combinação dos padrões motores maduros. Há a
enfatização, precisão e habilidade em desempenhar jogos e movimentos
relativos aos esportes. A habilidade e a competência são limitadas. Já

71
Fundamentos da Psicomotricidade

a segunda etapa desta fase é sinalizada por uma autoconsciência dos


recursos físicos e pessoais, bem como de suas limitações, por isso a
escolha e concentração para um determinado esporte, focando em
melhorar a competência. Ainda está ocorrendo a maturação progressiva
da área pré-frontal. Veja bem, essa região também se associa aos
significados e valores que continuamente são construídos na trajetória
do desenvolvimento humano. A terceira fase é caracterizada pelo uso
permanente das habilidades adquiridas, em que há redução das áreas
de procura por habilidades atléticas, havendo maior especialização
no refinamento de habilidades. Esta fase é marcada por provável
mielinização e amadurecimento das áreas corticais e as alterações no
comportamento motor são advindas da modulação da atividade neural
em detrimento da experiência. As experiências motoras vivenciadas
irão modular a atividade neural, transformando-a em mais eficiente
e sincronizada, o que caracteriza o aprendizado motor do sujeito
(GALLAHUE; OZMUN, 2003; ANDRADE; LUFT; ROLIM, 2004).

No Brasil, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)


considera adolescente o indivíduo com idade entre 12 até 18 anos
de idade completos. Já a organização Mundial de Saúde (OMS)
considera adolescência o período da vida que compreende o início
aos 10 anos e o término aos 19 anos completos. Para a OMS, divide-
se a adolescência em três fases: Pré-adolescência (10 aos 14 anos
completos), Adolescência (15 aos 19 anos completos) e Juventude
(15 aos 24 anos). Já para alguns autores (BRASIL ESCOLA, 2020),
a adolescência é dividida em três fases:

• Pré-puberdade: desenvolvimento físico acelerado e busca por maior


proximidade com os adultos.
• Puberdade: início por volta dos treze anos, marcada pela maturidade
dos órgãos reprodutores.
• Pós-puberdade: entre quinze e vinte anos, fase em que deve demonstrar
responsabilidade diante das cobranças do meio social, como a escolha
profissional, estruturar as relações com o sexo oposto e a formação da
identidade, necessitando cada vez menos da ajuda intelectual dos adultos.

FONTE: BRASIL ESCOLA. Adolescência. 2020. Disponível


em: https://brasilescola.uol.com.br/educacao/periodo-de-
transformacoes.htm. Acesso em: 23 jul. 2020.

72
Capítulo 2 DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR

Portanto, o processo evolutivo requer a intersecção de vários fatores,


que abrangem o desenvolvimento constitucional, relacionado à integridade e
maturação do sistema nervoso, constituição física, capacidade intelectual etc.,
ao desenvolvimento psicomotor, intelectual, afetivo-social e às experiências
transmitidas pelos agentes sociais, representados pela família, escola, sociedade.
Fica fácil então você ter a compreensão que qualquer falha em um desses
fatores pode ter como consequências atrasos, disfunções ou vários transtornos
neuropsiquiátricos diversos e, como consequência, o aprendizado será
comprometido.

2.3 ESTRUTURAS OU FUNÇÕES


PSICOMOTORAS
Vamos resumidamente trazer a seguir uma abordagem sobre as funções
psicomotoras.

• Imagem corporal: é um conjunto de sensações referentes ao próprio


corpo. A junção da imagem corporal com o esquema corporal dará início
às funções psicomotoras (CACEMIRO; PIRES, 2009).
• Esquema corporal: é o resultado da consciência que a pessoa vai
tomando gradativamente da experiência do corpo e do modo como
ele se coloca em relação ao meio. É a estrutura básica para formar
a personalidade da criança. Conforme Meur; Staes (1991 apud
CACEMIRO; PIRES, 2009, p. 4):

Até os oito anos a criança adquire a representação global


de seu próprio corpo. A criança percebe-se e percebe
tudo o que a cerca, em função de si mesma. Uma criança
que é capaz de situar seus membros uns em relação aos
outros progressivamente localizará objetos, as pessoas, os
acontecimentos em relação a si, depois entre eles.

• Tônus: este conceito está atrelado à fisiologia, ou seja, mesmo em


repouso, nossos músculos recebem uma leve tensão, o que gera o
equilíbrio estático e dinâmico, coordenação e postura, independentemente
da postura adotada, parados ou em amplo movimento. Está presente em
todas as funções motrizes do organismo como o equilíbrio, coordenação,
movimento etc., sendo o alicerce desta motricidade. Também está
relacionado aos estados afetivos e emocionais da criança, sendo que
a relação tônico-emocional atua no desenvolvimento da criança. Notem
que a tonicidade afeta a maneira como percebemos nós mesmos e o
mundo ao nosso redor (THOMPSON, 2002; CACEMIRO; PIRES, 2009).
73
Fundamentos da Psicomotricidade

• Equilíbrio/equilibração: o equilíbrio pode ser traduzido como a


capacidade em manter-se firme sob uma base reduzida, parado (estático)
ou em movimento (dinâmico), por meio de ações musculares específicas.
Já a equilibração corresponde exclusivamente à postura bípede do ser
humano, considerada um fenômeno locomotor sem paralelos, sendo
que somente o ser humano é o mamífero com o pé plantígrado. Esta
habilidade lhe confere apoio, impulsão e locomoção. O equilíbrio é a
base dos movimentos, sem equilíbrio, não há desenvolvimento motor
(FONSECA, 2004).
• Lateralidade: pode ser definida como a tradução de uma dominância
motora relacionada aos segmentos direitos ou esquerdos e em relação
a uma aceleração do amadurecimento dos centros sensitivo-motores
de um dos hemisférios cerebrais. Além de corresponder a dados
neurológicos, sofre influência de alguns hábitos sociais, sendo definida
durante o crescimento, representada por maior força e agilidade do
lado direito ou esquerdo. A partir desse conhecimento, a criança inicia
o desenvolvimento de habilidades tais quais força para chutar uma bola
ou brincar com um martelo, coordenação e precisão para desenhar
e recortar, preferência e domínio, ligados à dominância cerebral
(CACEMIRO; PIRES, 2009; BRITES, 2018).
• Organização espacial e temporal: também denominada de estruturação
espacial, refere-se a organização do mundo exterior, tomando como base
inicialmente o próprio referencial, seguida a pessoas ou objetos em posição
estática ou em movimento. Já a estruturação ou organização temporal
refere-se à habilidade de situar-se frente à sucessão dos acontecimentos;
da duração dos intervalos; da renovação cíclica de certos períodos e do
caráter irreversível do tempo. (CACEMIRO; PIRES, 2009).
• Dissociação de movimentos: basicamente é quando realizamos
diversos movimentos simultaneamente, cada membro realizando uma
atividade diferente. É importante para a psicomotricidade a dissociação
de cintura escapular e pélvica por meio de exercícios, essenciais para
o desenvolvimento de uma marcha adequada e equilíbrio muscular
durante o desenvolvimento de posturas. “A coordenação global e a
experimentação levam a criança a adquirir a dissociação de movimentos.
Isso significa que ela deve ter condições de realizar múltiplos movimentos
ao mesmo tempo, cada membro realizando uma atividade diferente”
(OLIVEIRA, 2008, p. 41).
• Ritmo: caracterizado pela realização ordenada de um movimento,
por exemplo, dançar acompanhando uma coreografia, pular corda, a
música. Vale ressaltar que, para que haja ritmo, é imprescindível que
haja a organização espaço-temporal. O ritmo abrange noções de ordem,
duração e sucessão, estando presente desde a vida embrionária da
criança. O ritmo se registra primeiramente no corpo da criança na forma

74
Capítulo 2 DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR

de: ritmo cardíaco, respiratório, de fome, alternância vigília–sono, ritmo


das atividades musculares, da locomoção, das palavras. Também está
presente na movimentação espontânea da criança, em movimentos
que ela descobre, não nos que ela imita. Portanto, “a vivência corporal
do tempo, através do ritmo, ocorre desde o nascimento da criança; ela
antecede a percepção temporal que é elaborada posteriormente” (IMAI,
2007, p. 47).
• Relaxamento/relaxação: o termo relaxamento costumeiramente é
utilizado para todo e qualquer recurso de modificação tônico-postural.
Métodos que proporcionam essas modificações são denominadas
“relaxação”, que significa a ação de relaxar. Em suma, o termo
relaxamento seria melhor empregado para definir o estado que o
sujeito atinge quando submetido a qualquer técnica de relaxação.
Posteriormente, essa função como técnica (relaxação) será abordada,
a qual tem sua base nos estudos de Schültz. Sua obra, denominada
Treinamento Autógeno (Berlim – 1908) apresenta como objetivos os
princípios da psicomotricidade, enquanto ciência, que são: oferecer
ao corpo, por meio do trabalho voltado para a percepção e para o
movimento, um lugar, uma presença, permitindo que a criança seja o
ATOR e não simplesmente o NARRADOR (MATTOS, 2018).

Para que você absorva maiores conhecimentos sobre as estruturas


e funções psicomotoras, podendo assimilá-las com exemplos
práticos para melhor compreensão sobre essa temática, indico o site:
<https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/4974268/mod_resource/
content/1/Componentes%20psicomotores_T%C3%B4nus%2C%20
Equil%C3%ADbrio%2C%20No%C3%A7%C3%A3o%20
Corporal%2C%20Orienta%C3%A7%C3%A3o%20Espa%C3%A7o-
temporal%2C%20praxias.pdf>.

Neste tópico você aprendeu que, para que o desenvolvimento psicomotor


ocorra e haja desempenho das crianças com relação ao desenvolvimento
motor, responsável pelas habilidades e/ou dificuldades motoras e progressão
do intelecto que o indivíduo apresentará, há a necessidade da organização de
todas as estruturas anatômicas responsáveis pelo seu funcionamento. O SN é
o responsável pelo movimento e a integração do homem às condições do meio
ambiente, coordenando e controlando todas as ações do organismo. Portanto, a
evolução neural e sua respectiva maturação oferece uma evolução ou integração
sensório-motora que ocorre por meio do SNC em operações cada vez mais

75
Fundamentos da Psicomotricidade

complexas. Essa maturação possibilita que as estruturas e funções motoras


sejam desenvolvidas, propiciando assim a aquisição de habilidades para o
desenvolvimento psicomotor.

3 DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR
Passaremos agora a uma abordagem do desenvolvimento psicomotor,
ressaltando que muitos autores se referem ao desenvolvimento psicomotor
e neuropsicomotor (DNPM) da mesma maneira e apresentando os mesmos
elementos. Um exemplo disso está na avaliação do desenvolvimento
neuropsicomotor utilizada por profissionais da área da saúde, que é baseada
em marcos definidos pela escala de desenvolvimento Denver II, a qual é um
instrumento para avaliar o desenvolvimento social, motor e linguagem. Outro
exemplo está na definição de DNPM por Marcondes (1994), que cita em sua
obra que o DNPM consiste na aquisição progressiva de habilidades motoras e
psicocognitivas.

A noção de desenvolvimento está associada a uma evolução contínua,


geralmente não se apresentando de forma linear e ocorrendo por meio de vários
aspectos, como afetivo, cognitivo, motor e social. Essa evolução contínua não
deve ser determinada nem vista somente por processos biológicos, mas vinculada
à cultura, sociedade, a interações e práticas, que é o ponto mais relevante para o
desenvolvimento humano (BEZERRA, 2020).

Para Imai (2007, p. 35)

o desenvolvimento psicomotor abrange o desenvolvimento


das funções de todo o corpo e das suas respectivas partes. O
corpo possibilita à criança, através dos movimentos e da ação
exploratória, a aquisição de conhecimentos, promovendo o
desenvolvimento cognitivo.

Para Conceição (1984 apud REZENDE, 2003)

compreende-se desenvolvimento psicomotor como a interação


existente entre o pensamento, consciente ou não, e o
movimento efetuado pelos músculos, com ajuda do sistema
nervoso. Desse modo, cérebro e músculos influenciam-se e
educam-se, fazendo com que o indivíduo evolua, progredindo
no plano do pensamento e da motricidade.

76
Capítulo 2 DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR

3.1 ASPECTOS DO
DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR
Durante o processo de desenvolvimento psicomotor, os aspectos intelectual,
emocional e racional da criança são indissolúveis, devendo ela ser vista em sua
totalidade. Também deve-se considerar suas habilidades como um aspecto que
deve ser desenvolvido de maneira significativa e prazerosa. Para que possamos
compreender o desenvolvimento psicomotor, deve-se evidenciar a individualidade
da criança, bem como sua subjetividade. Veja bem, embora as fases de
desenvolvimento devam ser comuns a todas as crianças, os aspectos afetivos,
físicos, sociais e o meio em que vivem com a família variam e isso é que torna
a subjetividade fator determinante na avaliação do desenvolvimento psicomotor.
Portanto, as etapas do desenvolvimento psicomotor não podem ser consideradas
apenas como uma maturação neurológica, mas, sim, como um processo relacional.
Pode-se afirmar que a ininterrupta evolução do desenvolvimento psicomotor
envolve nesse processo relacional o meio, no qual cultura, sociedade, práticas
e interações assumem extrema relevância no processo de desenvolvimento
humano. Portanto, a própria vida da criança determinará seu desenvolvimento,
exemplificando, sua somatória de oportunidades é quem desenvolverá suas
competências e, quanto maiores forem essas oportunidades, maiores serão seus
ensejos de tomarem para si a cultura na qual está inserida (BEZERRA, 2020).

Para Ibiapina (2007), além da maturidade neurológica, o desenvolvimento


humano está relacionado com os estímulos ambientais que recebe. Vamos
então versar sobre as manifestações neurológicas que podem ocorrer durante
o desenvolvimento psicomotor da criança. Quando acompanhamos o processo
de evolução das crianças, devemos partir da premissa de que há manifestações
que estarão presentes e serão normais somente por um período, devendo então
desaparecerem. Se porventura esse desaparecimento for retardado, ocorrerão
condições patológicas.

Ocorrem várias atividades automáticas ao nascimento, como a sucção e


a marcha automática. Posteriormente, essas atividades deverão ser inibidas,
desaparecendo e dando lugar a atividades mais complexas, voluntárias ou
automatizadas, elaboradas em níveis superiores. Surgirão aperfeiçoadas,
enriquecidas por elementos intelectuais e afetivos. Os reflexos primitivos são
respostas automáticas e estereotipadas frente a algum estímulo externo. Fazem-
se presentes no nascimento e necessitam ser inibidas ao longo dos primeiros
meses, quando emergem os reflexos posturais (FCM, 2020). Portanto, embora
sua presença demonstre a integridade do SNC, sua persistência demonstra que
há disfunção neurológica. Podemos citar como exemplo a sucção reflexa e a
marcha reflexa, que devem desaparecer ao redor dos dois meses de idade. A

77
Fundamentos da Psicomotricidade

preensão plantar some por volta dos nove meses. No entanto, vejam que exemplo
interessante, o reflexo cutâneo-plantar, que se apresenta em extensão no primeiro
semestre de vida, já no segundo semestre poderá se apresentar em flexão,
indiferente ou em extensão, mas após a aquisição da marcha independente,
deverá ser sempre em flexão (FCM ,2020).

Quando então nos referimos a manifestações neurológicas que ocorrem


no desenvolvimento psicomotor, podemos dizer que se distribuem em reflexas
transitórias, evolutivas e permanentes, conforme expresso no Quadro 1. Portanto,
para as bases da aprendizagem e da maturação do SN, poderemos conceituar
o neurofenótipo (características neurológicas observáveis em um organismo) da
criança com base nesses três tipos de manifestações (DIAMENT, 1978). Na
criança, a formação de reflexos condicionados constitui uma nova etapa no
seu desenvolvimento. O que queremos demonstrar a você é o quão importante
é o conhecimento das habilidades motoras já conquistadas pela criança e a
preocupação que o psicomotricista deve ter com a sequência do surgimento
dessas habilidades. Queremos que você reflita, portanto, ao ter conhecimento
sobre o desenvolvimento psicomotor, que, no caso de incapacidade da criança
para executar determinada tarefa, é possível que nunca tenha atingido tal etapa,
como também há a possibilidade que tenha regredido a um estágio anterior do
desenvolvimento. É sob esse aspecto que as alterações nas manifestações
neurológicas podem comprometer o desenvolvimento psicomotor da criança.

QUADRO 1 – MANIFESTAÇÕES NEUROLÓGICAS DO DNPM


MANIFESTAÇÕES CARACTERÍSTICAS
NEUROLÓGICAS
Permanentes Estas manifestações são constantes no ser humano e
praticamente não se alteram. Exemplo: reflexos incondicionados
e sensibilidades primitivas como os reflexos abdominais,
patelares etc.).
Evolutivas Manifestações reflexas automáticas que devem sumir com a
evolução, cedendo lugar à mesma atividade, mas como voluntária.
Exemplo: sucção, preensão, apoio plantar, marcha reflexa.
Reflexas transitórias Devem sumir com a evolução e apenas retornarem caso haja
uma condição patológica. Exemplo: Moro, Magnus De Kleijn.
FONTE: Adaptado de Magalhães (2012)

78
Capítulo 2 DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR

Por desenvolvimento compreende-se a capacidade do ser em


executar funções cada vez mais complexas, correspondendo também a
termos como maturação e diferenciação celular. É um processo complexo
tanto estrutural como funcional que está associado ao crescimento,
à maturação e aprendizagem (MAGALHÃES, 2012). Conceitua-se
desenvolvimento psicomotor como um processo contínuo durante o qual
ocorre a evolução da inteligência, comunicação, afetividade, sociabilidade
e da aprendizagem de maneira simultânea e global. É decorrente de
etapas e dependente da maturação do sistema nervoso central. Muitos
educadores apontam para o fato de a hora da brincadeira ser o momento
mais oportuno para o desenvolvimento neuropsicomotor infantil,
em que a ludicidade, as experimentações, a dinâmica dos jogos e
a capacidade imaginativa despertam elementos fundamentais para
proporcionar o crescimento. Villela, Hurigil e Cunha (2017) citam em
sua obra que a avaliação clínica do neurodesenvolvimento engloba as
áreas motora, de coordenação, de linguagem e social, designando o
desenvolvimento psicomotor. Portanto, quando pesquisamos os conceitos
tanto do desenvolvimento psicomotor como neuropsicomotor, acabamos
no deparando com muitas similaridades de termos que se refiram ao
desenvolvimento infantil (SANTOS, 2016).

Fonseca (2008) cita em sua obra que, conforme os autores russos


pavlovianos, o desenvolvimento é um condicionamento abrangente de
atos sofisticados do comportamento, que são, por sua veze, associações
de reflexos. Ou seja, na criança, o desenvolvimento psicomotor aparece
primeiro nos analisadores sensoriais e somente posteriormente nos efetores
motores. Já no animal, ocorre o inverso, ou seja, desenvolvem-se primeiro os
efetores motores para possibilitarem a locomoção precoce e posteriormente
se desenvolverão os analisadores distais da visão e da audição, os quais
possibilitarão melhores condições de locomoção, orientação e sobrevivência.
Portanto, a criança inicialmente adquire a habilidade de focar a atenção e o
espaço, sem a qual não poderia estabelecer contato com os outros, ou até
mesmo com os objetos que a rodeiam, e é por meio dessa apreensão de
espaço que poderá criar movimentos como verdadeiras tarefas objetivas
voltadas para os objetos, buscando-os e manipulando-os.

79
Fundamentos da Psicomotricidade

3.2 ETAPAS DO DESENVOLVIMENTO


PSICOMOTOR
Vamos iniciar a abordagem das etapas do desenvolvimento psicomotor,
referente ao: desenvolvimento motor, intelectual, social e emocional (FURTADO,
2018; MISODOR, 2008; PORTAL EDUCAÇÃO, 2020):

1.1.1 Recém-nascido
• Motor: dorme muito (equivalente a 18/20h/dia); levanta a cabeça;
apresenta reflexos primitivos, posição em flexão e hipertonia generalizada.
• Intelectual: realiza sucção e produz sons por prazer.
• Social/emocional: reconhece voz humana, tendo preferência pela voz materna,
apresenta visão com foco a 20-30 cm; emite sons como vocalizações.

1.1.2 1 a 3 meses
• Motor: dorme muito (equivalente a 18/20h/dia); levanta a cabeça e, ao
terceiro mês, é capaz de manter a cabeça erguida; afina e adapta reflexos
primitivos. No primeiro mês, posição em flexão e hipertonia generalizada;
está em desenvolvimento progressivo da visão e já é capaz de focar
objetos a 90 cm de distância.
• Intelectual: realiza sucção; continua produzindo sons por prazer; segue
com os olhos as pessoas em movimento e consegue olhar por alguns
segundos um brinquedo; leva objetos à boca.
• Social/emocional: o choro cessa com a chegada da mãe quando a escuta;
acima dos dois meses, sorri (sorriso social); apresenta imobilização
ao ouvir voz familiar; ao terceiro mês, reconhece os pais; balbucia de
maneira espontânea e por resposta.

1.1.3 3 a 6 meses
• Motor: consegue apoiar-se nos antebraços, levantar a cabeça em
decúbito ventral; tem controle completo da cabeça ao redor dos
quatro meses e assim consegue ampliar seu campo visual; consegue
permanecer sentada com apoio; segura voluntariamente objetos,
estendendo as mãos quando algo lhe é oferecido; segura objetos com

80
Capítulo 2 DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR

a palma das mãos e os quatro dedos; por volta dos quatro meses, o
controle das mãos é mais fino, sendo capaz de segurar em um brinquedo.
• Intelectual: realiza sucção; produz sons por prazer; grita; faz sons como se
estivesse conversando; procura de onde vem os sons; consegue vocalizar
com espontaneidade, principalmente quando está em relação; segue com
os olhos; leva objetos à boca; a partir dos quatro meses, começa a imitar
alguns sons que ouve a sua volta; por volta do sexto mês, compreende
algumas palavras familiares como seu nome, "mamã", "papá"...
• Social/emocional: vira a cabeça reagindo ao chamado por seu nome;
retribui sorrisos; mantém contato físico como apalpar e se comunicar;
reconhece seus pais; emite vocalizações e balbucio prolongados com
maior riqueza nas emissões vocais; no quinto mês, faz distinções entre
as pessoas conhecidas e aquelas desconhecidas.

1.1.4 6 a 9 meses
• Motor: nesta fase há um grande desenvolvimento da motricidade, em que
músculos, equilíbrio e controle motor estão mais desenvolvidos, sendo
capaz de se sentar direito sem apoio e de fazer as primeiras tentativas
de se pôr de pé, agarrando-se a superfícies de apoio; consegue virar
sobre o abdome (do decúbito ventral no dorsal; no oitavo mês vira do
abdome as costas e das costas ao abdome; consegue permanecer em
pé com apoio; evolui para pegar objetos entre polegar e indicador; já
consegue permanecer sentada sem apoio por bastante tempo; começa a
engatinhar; no nono mês, consegue levanta-se sozinho apoiando-se em
grades e dar passos laterais na cama.
• Intelectual: consegue tocar seu reflexo no espelho sorrindo; realiza
transferências de objetos de uma mão para outra; diverte-se quando
lança objetos; tem atenção sobre si.
• Social/emocional: dá início à socialização; participa de brincadeiras
estabelecendo relação social, como palmas e esconder-se; gosta de
morder; já consegue reconhecer rostos familiares, tendo medo de
estranhos (sétimo mês); balbucia espontaneamente e por resposta.

1.1.5 9 a 12 meses
• Motor: fica em pé sozinha, porém com apoio; consegue caminhar segurando
em algum lugar com ambas as mãos; pega ou larga objetos quando lhe
solicitam; já consegue segurar objetos realizando movimento de pinça; no
décimo mês, consegue colocar um cubo em uma taça sem soltar.

81
Fundamentos da Psicomotricidade

• Intelectual: seus atos são intencionais como levantar roupas, abrir


armários para pegar algo; consegue imitar gestos, ruídos e sons; repete
palavras e aponta para o que quer.
• Social/emocional: consegue imitar e aprender a pronunciar duas ou
três palavras; tem a compreensão do que é “proibido” (“não”); entende
mandamentos verbais simples; reconhece seus pais; apresenta interesse
na exploração do ambiente, quer ver tudo, tocar tudo e levar a boca; está
mais colaborativo; a partir dos dez meses, maior interesse pela interação
com outros bebês.

1.1.6 12 a 18 meses
• Motor: caminha e ajoelha sozinha, sendo que a partir do décimo sexto
mês, a criança já é capaz de caminhar e de se manter de pé com
segurança e movimentos melhor controlados; sobe escadas utilizando
as mãos; nesta fase, o equilíbrio é inicialmente bastante instável, visto os
músculos dos membros inferiores ainda não estarem bem fortalecidos;
apresenta melhora da motricidade fina pela sua prática em segurar
um objeto, manipulando-os e passando de uma mão para a outra e o
largando deliberadamente.
• Intelectual: com doze meses, começa a falar as primeiras palavras; é capaz
de empilhar objetos, a partir do décimo segundo, solta um cubo dentro
da taça; com dezoito meses, consegue fazer torre de três cubos; enche
recipientes e amassa; com dezoito meses, é capaz de nomear um desenho.
• Social/emocional: tem ciúme, apresenta rivalidade nas brincadeiras;
desenvolve o egocentrismo, coopera no vestir, colocando peças simples
de roupas; demonstra ansiedade de separação, manifestada quando o
separa da mãe, mesmo que brevemente; também demonstra ansiedade
na presença de estranhos, sendo uma etapa normal do desenvolvimento
emocional da criança, manifestando-se quando pessoas desconhecidas
o abordam diretamente.

1.1.7 18 a 24 meses
• Motor: já consegue correr; mas cai com frequência; consegue subir
escadas sem auxílio; pega ou solta objetos, quando lhe é solicitado; tem
movimento de pinça; liberar, as habilidades de apreender e alcançar
objetos encontram-se bem desenvolvidas; é capaz de realizar traços
com maior controle; ao redor do vigésimo mês, será capaz de transportar
objetos na mão enquanto caminha.

82
Capítulo 2 DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR

• Intelectual: seu aprendizado é mediante manipulação ativa dos objetos;


consegue estudar os efeitos das suas atitudes e atividades; é capaz de
formar frases rudimentares; aos 18 meses, pede as coisas usando uma
palavra; por volta do vigésimo ao vigésimo quarto mês é capaz de brincar de
faz de conta, exemplificando, finge que joga chá de um bule para uma xícara,
coloca açúcar e bebe. Essa capacidade demonstra que está começando a
compreender a diferença entre o que é real e o que é imaginário.
• Social/emocional: tem interesse por outras crianças; adquire confiança
básica, com senso de autonomia; exacerba a “Birra” frente ao
negativismo; apresenta maior tolerância à separação dos pais; partindo
do vigésimo ao vigésimo quarto mês, à medida que começa a ter maior
consciência de si própria, física e psicologicamente, começa a alargar
os seus sentimentos sobre ela própria e sobre os outros, desenvolvendo
a empatia; já desenvolve a capacidade de refletir sobre o que os outros
sentem, sendo bastante sensível à aprovação/desaprovação dos adultos.

1.1.8 2 a 3 anos
• Motor: conforme aumenta seu equilíbrio e coordenação, a criança
consegue saltar ou saltar de um pé para o outro quando corre ou anda;
torna-se mais fácil a manipulação e utilização de objetos com as mãos,
como utilizar um lápis de cor para desenhar ou um talher para comer
sozinha; inicia gradualmente o controle dos esfíncteres, na ordem
de primeiro o intestino e após a bexiga; a criança é capaz de realizar
atividades de vida diária sozinha, como escovar os dentes, tomar banho,
comer, entre outras.
• Intelectual: há evolução rápida da linguagem e a sua imaginação não
possui limites. É nesta fase que a criança começa a acreditar em lendas,
personagens imaginários, entre outros; vão se desenvolvendo suas
competências linguísticas e a criança inicia suas expressões de outras
maneiras, que não apenas a exploração física. Junta competências
físicas e linguagem, auxiliando assim seu desenvolvimento cognitivo;
consegue produzir regularmente frases de três e quatro palavras. Após o
trigésimo segundo mês, é capaz de conversar com um adulto utilizando
frases curtas; ao redor do trigésimo segundo mês, começa a apreender
o conceito de sequências numéricas simples e de diferentes categorias.
Exemplificando, conta até dez e consegue formar grupos de objetos como
oito animais de plástico podem ser duas vacas, três porcos e três zebras.
• Social/emocional: a socialização já é possível nesta fase, visto que a
criança se torna mais curiosa; considera tudo ao seu redor fascinante,
além do fato de ser muito observadora; busca novas conquistas;

83
Fundamentos da Psicomotricidade

quando está próximo de completar três anos, está pronta para interagir
com outras crianças; a partir do trigésimo segundo mês, já deve reagir
melhor quando é separada da mãe e ficando no aguardo de outra
pessoa, embora algumas crianças consigam esse progresso com menor
ansiedade que outras; nesta fase, as birras são uma das maneiras mais
comuns da criança chamar a atenção, e, normalmente, estão atreladas
a mudanças ou a acontecimentos ou ainda podem estar relacionadas a
uma resposta aprendida.

1.1.9 3 a 5 anos
• Motor: já consegue correr com habilidade e ficar em postura unipodal
(sobre um pé ); sobe escadas alternando os pés; consegue desenvolver
atividades como andar de bicicleta, skate, saltar e pular, caminhar para
trás, na ponta dos pés; consegue desenhar pessoas, desenvolvendo
os traços conforme a idade; consegue copiar figuras geométricas; faz
laço nos sapatos; consegue cortar papel e figuras; é cada vez mais
independente ao nível da sua higiene; é já é capaz de controlar os
esfíncteres, principalmente durante o dia.
• Intelectual: desenvolve processos mentais como percepção, memória,
raciocínio pré-lógico; apresenta pensamentos mágicos como
superpoderes e amigos imaginários; aos 5 anos, consegue reconhecer
distinções entre alto/baixo, atrás/diante; repete sequências de três
algarismos; compreende a maior parte do que ouve e o seu discurso é
compreensível para os adultos; com quatro anos, inventa histórias; dos
quatro aos cinco anos, aparecem diagnósticos de déficit de atenção,
dificuldade de atenção e de concentração e hiperatividade, pois a energia
da criança é muito alta, levando a uma inquietação bem intensa.
• Social/emocional: desenvolve iniciativa; permanece o egocentrismo,
tendo dificuldade em cooperar e partilhar; tem noção do certo ou errado
conforme regras; desenvolve o moral; faz muitas perguntas; tem
interesse nas tarefas dos adultos; é capaz de se separar da mãe durante
curtos períodos de tempo; consegue se controlar de maneira mais eficaz
e é menos agressiva; entre três a quatro anos, com brincadeiras, a
criança inicia sua percepção sobre o masculino e o feminino, descobrindo
os órgãos genitais. É neste período que ocorre a manipulação dos órgãos
genitais, visto que a criança percebe o prazer que isso proporciona.
Dos quatro aos cinco anos, ocorre o chamado “Complexo de Édipo”, no
qual ocorrem sentimentos de desejo e rivalidade com relação aos pais.
A agitação se faz muito presente nessa fase, cabendo aos pais terem
paciência para repetir regras e limites impostos em casa (PORTAL
EDUCAÇÃO, 2020).
84
Capítulo 2 DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR

1.1.10 5 a 6 anos
• Motor: estabelece-se a preferência manual, em que a criança é capaz
de se vestir e despir sem ou com pouca ajuda, assegurando assim sua
higiene com autonomia; apresenta rápido desenvolvimento muscular
com grande atividade motora e maior controle dos movimentos.
• Intelectual: já consegue ter fluência na fala, utiliza corretamente
pronomes, plural, tempos verbais; apresenta vasto interesse por
palavras e a linguagem; já tem conhecimento das cores, os números
etc.; seu vocabulário já está amplo, manifestando grande interesse
pela linguagem, falando incessantemente; apresenta capacidade
para memorizar histórias e as repetir; já apresenta capacidade para
agrupamento e ordenamento de objetos tendo em conta o tamanho
(do menor ao maior); dos cinco anos em diante, entende conceitos de
"antes" e "depois", "em cima" e "em baixo" etc., bem como conceitos de
tempo: "ontem", "hoje", "amanhã".
• Social/emocional: a criança demonstra entrosamento com a rotina familiar;
seus pensamentos já auxiliam o entendimento da procura por pensar
antes de falar qualquer coisa; quer adquirir algumas responsabilidades e
ter autonomia; tem seu universo atrelado à figura materna, buscando ser
aceita, ter carinho e acolhimento, situações imprescindíveis por parte
da mãe; a imagem da criança tem muita influência em sua educação
e formação, a qual deverá motivá-la em atividades esportivas de seu
interesse; está aprendendo a partilhar, a aceitar as regras e a respeitar
a vez do outro. Deve-se respeitá-la e apoiá-la para que se sinta segura,
fazendo adesão a modelos importantes, para que saiba enfrentar as
dificuldades futuras com maior tranquilidade.

1.1.11 6 a 12 anos
• Motor: escreve com maior destreza; realiza movimentos mais seguros e
complexos.
• Intelectual: sua imaginação está em pleno florescimento; apresenta
necessidade de expressão; apresenta escrita cursiva; após o sexto ano,
distingue o lado esquerdo do direito e a manhã da tarde e, nesta faixa
etária, aprende a ler e escrever; após o sétimo ano, aprende a enumerar
os dias da semana e dizer o número dos dedos das mãos; após os oito
anos, desenvolve operações lógicas; aos dez anos, consegue ler um
trecho fácil e repeti-lo da memória e repetir seis algarismos.
• Social: progride sua autonomia; repete no meio extrafamiliar as
experiências que vivenciou em casa; dá preferência por brincadeiras
grupais, nas quais pode exercer suas habilidades.
85
Fundamentos da Psicomotricidade

3.3. ÁREAS PSICOMOTORAS


Pudemos aprender que o desenvolvimento psicomotor engloba várias áreas,
sendo cada qual essencial para a formação do indivíduo. O desenvolvimento
psicomotor adequado propicia o domínio sobre o próprio corpo, movimentos,
como também dos aspectos cognitivos e emocionais. Portanto, o desenvolvimento
de habilidades atreladas à lateralidade; organização espacial e temporal;
coordenação motora; e esquema corporal é imprescindível para o desenvolvimento
da criança. Quando as áreas psicomotoras são estimuladas de forma adequada,
as crianças tendem a se desenvolver de maneira satisfatória. Quais são as
áreas psicomotoras? Qual sua contribuição no processo de desenvolvimento da
criança?

• Coordenação motora global: habilidade associada ao controle e à


organização da musculatura global destinada totalmente aos movimentos
complexos executados pela criança. Como são estimuladas? São
estimuladas por meio de tarefas que lidam com a força. São exemplos o
pular, saltar, correr, dançar. Podem ser simuladas em brincadeiras como
pular corda, pega-pega, amarelinha, entre outras. Por meio da coordenação
global, a criança adquire a habilidade de dissociar movimentos, tendo
condições de executar múltiplos movimentos simultaneamente, em que
cada parte do corpo poderá realizar uma atividade diferente, havendo uma
conservação de unidade de gesto (BRITES, 2018).
• Coordenação motora fina: antagônica à anterior, está atrelada ao domínio
e à organização dos músculos pequenos (como movimento das mãos, da
face e visual). Aqui as atividades devem ser voltadas para a musculatura
que exerce atividades mais refinadas. Como desenvolver estas habilidades?
Atividades, ou feitas na escola ou em casa, como o recorte de figuras,
colagens, legos (encaixe) e até mesmo praticar a escrita são primordiais
para o progresso dessa área psicomotora. Amarrar os sapatos também é
um ótimo exercício para a coordenação fina (BRITES, 2018).
• Organização temporal: essa habilidade tem como competência saber
avaliar o tempo dentro da ação, ou seja, é a habilidade adquirida pela
criança para ter organização tomando como base o ritmo empregado em
seu próprio ritmo (ritmo das suas experiências, que apresentam começo,
meio e fim. A orientação temporal está intimamente relacionada com a
orientação espacial, pois quando há deslocamento em um determinado
espaço, isto é feito com um determinado tempo. Em suma, esta
habilidade ocorre por meio de ritmos, conceitos de duração, intervalos,
continuidade, simultaneidade e sucessão. Essa organização associa-se
ao fato de saber distinguir o “rápido do lento”. Isso propicia à criança a
noção do tempo para a execução de uma tarefa. Como estimular esta

86
Capítulo 2 DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR

habilidade? Impor diferentes ritmos de caminhada e corrida, arremesso


de bolas de diferentes pontos etc. (BRITES, 2018).
• Organização espacial: esta habilidade se refere à orientação e à
estruturação do mundo exterior da criança, podendo ser definida
como ter “consciência da relação do corpo com o meio em que está
inserido”. Porém, para que a criança possa ter a percepção de objetos
no espaço, necessita, primeiramente, ter uma boa imagem corporal,
sendo esta utilizada como ponto de referência. Esta habilidade envolve o
aprendizado gradativo sobre noções de situações como fora, dentro, fora,
baixo e alto; de tamanho, como fino, grosso, pequeno, grande, médio; de
posição, como estar sentado, em pé ou deitado; de movimentos como
baixar, levantar, descer, subir, de formas, como estar vazio ou cheio.
Como desenvolver esta habilidade? Brincadeiras como ciranda, circuito
de obstáculos com os olhos fechados etc. (BRITES, 2018).
• Lateralidade: é a propensão que o ser humano apresenta de usar
preferencialmente mais um lado do corpo que o outro. Representa um
predomínio motor, uma dominância de um dos lados. Ocorre em três
níveis: mão, olho e pé. É a habilidade responsável por simbolicamente
ter a conscientização dos dois hemisférios do corpo, ou seja, o direito
e esquerdo. Também está associada à noção de externo e interno.
Auxilia a criança a estabelecer a noção dos lados da estrutura espacial
e corporal. Com este conhecimento, a criança inicia o desenvolvimento
das estruturas corporais que tem mais força, coordenação, preferência
e domínio. Quais atividades estimulam esta habilidade? Atividades
unipodais, nas quais se utiliza apenas uma perna, ou um braço,
atividades que envolvem equilíbrio (BRITES, 2018).

Neste tópico você aprendeu que o desenvolvimento psicomotor abrange


o desenvolvimento das funções de todo o corpo e das suas respectivas partes.
Durante esse processo, os aspectos intelectual, emocional e racional da criança
são indissolúveis, devendo ser visto em sua totalidade. Também pôde notar que
o Sistema Nervoso é o responsável pelo movimento e a integração do homem
às condições do meio ambiente, coordenando e controlando todas as ações do
organismo, e que sua maturação possibilita que as estruturas e funções motoras
sejam desenvolvidas, propiciando assim a aquisição de habilidades para o
desenvolvimento psicomotor. Portanto, a evolução contínua do desenvolvimento
psicomotor não deve ser determinada nem vista somente por processos
biológicos, mas vinculada às diversidades culturais, sociais, interativas e práticas,
que é o ponto mais relevante para o desenvolvimento humano.

87
Fundamentos da Psicomotricidade

4 OS ESTÁGIOS DE
DESENVOLVIMENTO INFANTIL
SEGUNDO PIAGET
Jean Piaget é um dos maiores vultos do conhecimento moderno, tendo
influenciado todos os campos da psicologia e da pedagogia. Apresenta
uma proposta construtivista, que busca compreender o desenvolvimento do
indivíduo. O trabalho de Piaget representa para a atualidade o que de mais
relevante se produziu no século XX no campo da Psicologia do desenvolvimento
infantil, embora, a rigor, Piaget não possa ser qualificado como psicólogo do
desenvolvimento (FONSECA, 2008; CAVICCHIA, 2010).

Não se conhece uma teoria da aprendizagem de Piaget, nem qualquer


tentativa neurobiológica ou neuropsicológica para explicá-la, todavia a
sua contribuição para o desenvolvimento cognitivo da criança é uma obra
extraordinária, quer em termos quantitativos como qualitativos (FONSECA,
2008, p. 74). Piaget dedicou parte de seu interesse aos estudos cognitivos sobre
crianças que apresentavam déficit mental e de aprendizagem, possibilitando o
esclarecimento para o desenvolvimento delas. O pesquisador concluiu que, de
maneira geral, esse desenvolvimento apresenta como características as mesmas
sequências de raciocínio cognitivo que as crianças ditas como normais, porém se
apropriando de regras de aplicação em um ritmo mais moroso e de uma forma
inacabada, apresentando períodos de oscilações e regressões.

Sua contribuição é inovadora no contexto da avaliação


do potencial cognitivo, pois, ao contrário da perspectiva
psicométrica e padronizada, acabou por criar instrumentos mais
flexíveis, quer na administração, quer na cotação, permitindo,
ainda, a sua adequabilidade a crianças com perturbações de
desenvolvimento (FONSECA, 2008, p. 74).

Com relação ao termo “perspectiva psicométrica”, significa


dizer que se enxerga a inteligência como algo que pode medir-se e
partindo dessa premissa saber se o indivíduo necessita de atenção
especial e se possivelmente terá êxito escolar.

88
Capítulo 2 DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR

A proposta de Piaget tem como um dos pontos fundamentais o sentido que


ele atribuiu à palavra “conhecer”, traduzindo-a como o ato de organizar, estruturar
e explicar o mundo que nos rodeia. Inclui aqui o meio físico, os valores, as ideias,
as relações humanas, a cultura de uma maneira mais ampla, partindo do vivido
ou experienciado. Em suma, para Piaget, a produção do conhecimento ocorre
partindo da ação do ser sobre o meio em que habita, apenas se constituindo com
a estruturação da experiência que lhe concede atribuir significação. Portanto,
a significação é o resultado da possibilidade de assimilação. Para Piaget, o
significado de “conhecer” é a inserção do objeto em um sistema de relações,
partindo das ações realizadas sobre este objeto (CAVICCHIA, 2010).

Esse questionamento que Piaget formulou pela primeira vez aos 15 anos de
idade direcionou suas pesquisas em todo decorrer de sua vida: como o ser vivo
consegue adaptar-se ao meio ambiente? Partindo desse questionamento, une
a problematização da adaptação biológica à problematização do conhecimento,
concluindo suas duas ideias centrais, a saber (CAVICCHIA, 2010).

• 1º: a adaptação biológica de todo organismo vivo, bem como


toda conquista intelectual, realiza-se por meio da “assimilação”
de um dado exterior, no sentido de transformação. O que isso
representa? Para suas ideias, o conhecimento não é visto
como uma cópia, mas uma integração em uma estrutura mental
pré-existente que, simultaneamente, vai ser parcialmente
transformada por essa integração.
• 2º: fatores normativos do pensamento são correspondentes às
relações, ou seja, as necessidades de equilíbrio que se observam
no plano biológico. Para Piaget, pelo fato de o conhecimento
ser resultado de trocas entre o organismo e o meio, essas
trocas são responsáveis pela construção da própria capacidade
de conhecer. Como resultado ocorre a produção de estruturas
mentais que, pelo fato de serem orgânicas, não são programadas
no genoma, mas surgem como resultado das solicitações do meio
ao organismo. A alteração organismo-meio acontece por meio do
que Piaget denomina de processo de adaptação, com seus dois
aspectos complementares: a assimilação e a acomodação.

Assim, segundo Piaget, a inteligência humana concretiza-se na adaptação


do homem ao mundo exterior, adaptação essa que tem na sua perspectiva dois
componentes (Figura 5) (FONSECA, 2008, p. 75):

a) Assimilação: do mundo exterior para a criança.


b) Acomodação: da criança para o mundo exterior.

89
Fundamentos da Psicomotricidade

FIGURA 5 – COMPONENTES DA ADAPTAÇÃO DO HOMEM E O MUNDO EXTERIOR

FONTE: Fonseca (2008, p. 75)

A inteligência, para Piaget, é a resultante e o resultado da experiência do ser


humano, através de uma experiência como ação, como motricidade, que o sujeito
concomitantemente integra (assimilação) e incorpora (acomodação) o mundo
exterior e o vai modificando. Em suma, o sujeito, ao transformar o mundo exterior,
transforma o seu mundo interior, transformando-se em si próprio.

Piaget (1973 apud FONSECA, 2008, p. 75) enfatiza em sua obra que:

possui uma visão da inteligência ou da cognição humana como


uma adaptação biológica específica de um organismo complexo
a um envolvimento igualmente complexo, um sistema cognitivo
extremamente ativo, que seleciona e interpreta a informação
do envolvimento à medida que constrói o seu conhecimento.

Piaget retrata, portanto, com esse processo de adaptação, um sistema de


interação com o mundo exterior de adaptação biológica, em que os componentes
“assimilação e a acomodação” não se dividem, nem se separam, sendo
simultâneos e complementares, intrinsecamente unidos.

Mas como esses termos assimilação e acomodação estão presentes nas


ideias de Piaget? A assimilação corresponde à aplicação do que já se conhece
e adquire, em que a interpretação do mundo exterior por meio de objetos,
situações etc. é o que mentalmente podemos dispor para lidar com tais dados.
Exemplificando, uma criança pode fingir que um pedaço de madeira é um carro,
porque o “assimila” ao seu conceito mental de carro. Em outras palavras, incorpora
o objeto dentro da estrutura de conhecimento que possui de carros (FONSECA,
2008).

A acomodação significa o ajuste do conhecimento em resposta às


características especiais de um objeto ou de uma dada situação, levando-se em

90
Capítulo 2 DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR

conta as suas propriedades e relações objetivas e concretas. É por meio dela que
se obtém a noção estrutural dos atributos da informação em questão. Isso permite
que se desencadeie respostas adaptativas, logo motoras, a tais condições do
envolvimento. Como exemplo, quando a criança quer imitar os gestos da mãe,
tenta “acomodar-se” ou ajustar-se no seu aparelho mental aos detalhes do
comportamento do seu modelo de ação (FONSECA, 2008).

Na visão de Piaget, a inteligência ou cognição humana é uma


adaptação biológica, específica de um organismo complexo a um
envolvimento igualmente complexo (PIAGET,1973 apud FONSECA,
2008, p. 75). Esse processo de adaptação apresenta como
componentes a assimilação e a acomodação. O que cada um desses
componentes sugere?

Passamos agora a uma análise deste modelo funcional de assimilação-


acomodação em termos psicomotores. Ambos fornecem igualmente uma concepção
global sobre o desenvolvimento cognitivo e sobre as suas mudanças estruturais e
graduais, primordialmente ocorridas pela experiência e maturação. A assimilação
está envolvida na integração multissensorial e a acomodação está mais enfocada
na elaboração motora. Falando em termos evolutivos, a criança necessita passar
primeiro por uma fase de assimilação (receptiva ou de input), para poder chegar,
posteriormente, a uma fase de acomodação (expressiva ou de output). Sendo
assim, a relação com o mundo exterior é estabelecida por meio da circularidade
entre as percepções (assimilação) e as ações (acomodação). Esse conjunto de
adaptações corporalizado pela motricidade transformará a inteligência prática e
sensório-motora em inteligência reflexiva e gnósica. Portanto, a criança apresenta
reorganizações sucessivas, de maneira gradual, caracterizando o pensamento da
criança desde o período sensório motor até alcançar o pensamento formal. Em
suma, a aprendizagem caracteriza-se pela relação infinita entre a assimilação,
a qual utiliza as funções sensoriais e a acomodação, que se utiliza da utilização
motora, preferencialmente. Portanto a questão da motricidade está claramente
explícita na obra de Piaget, conforme explica Fonseca (2008, p. 78).

91
Fundamentos da Psicomotricidade

Piaget defende que ao assimilar dados fornecidos


pelo meio, o indivíduo constrói formas pensamento, que ele
denominou inteligência reflexiva ou gnósica.

4.1 OS ESTÁDIOS NO
DESENVOLVIMENTO COGNITIVO
Pudemos compreender que, para Piaget, a construção de conhecimento
pode ser explicada pelo desenvolvimento. Essa teoria construtivista piagetiana
procura responder à seguinte questão: como se passa de um estado de menor
conhecimento para um estado de maior conhecimento? Sua autenticidade
consistiu em ter tomado a decisão de procurar respostas no comportamento
das crianças, do nascimento à adolescência, antes de procurá-las na história da
ciência. Suas ideias defendem que, para se conhecer um objeto ou uma situação,
há a necessidade da ação sobre ele, transformando-o e compreendendo o
processo dessa modificação. Sua perspectiva sequencial de desenvolvimento, de
estádios precedentes a estádios subsequentes, é a base para a construção de
escalas evolutivas. Elas apresentam como propósito a orientação para a avaliação
longitudinal e o ensino de aptidões cognitivas para crianças que apresentam
condições de dificuldade (FONSECA, 2008).

Há uma semelhança entre a maneira pela qual a criança organiza a sua


experiência e a lógica de classes e relações. As distinções entre os níveis de
expressão dessa lógica resultam do funcionamento das estruturas mentais
em distintos momentos de sua construção. Esse funcionamento produz,
estruturalmente, o que Piaget nomeia como “estádios” de desenvolvimento
cognitivo. Os estádios, portanto, representam as etapas pelas quais ocorre a
construção do mundo pela criança.

Piaget fez distinção entre quatro períodos no desenvolvimento das


estruturas cognitivas. Os estádios apontam as possibilidades do ser humano e a
concretização ou realização dessas possibilidades está vinculada ao meio no qual
a criança se desenvolve, visto que a capacidade de conhecer resulta das trocas
do organismo para com o meio. Segundo Piaget, o pensamento infantil passa
por quatro estágios, desde o nascimento até o início da adolescência, quando
a capacidade plena de raciocínio é atingida. Os critérios para a definição de
estádio se baseiam na constância na ordem de sucessão; estrutura de conjunto,
apresentando períodos de preparação e de consolidação e na integração

92
Capítulo 2 DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR

das estruturas inferiores nas posteriores. Vale ressaltar que as estruturas


correspondem aos estádios de inteligência.

Esses períodos estão relacionados ao desenvolvimento da afetividade e da


socialização da criança. São eles: estádio da inteligência sensório-motora; estádio
da inteligência simbólica ou pré-operatória; estádio da inteligência operatória
concreta; estádio da inteligência formal (FONSECA, 2008; SOUZA; WECHSLER,
2014).

• Estádio da Inteligência Sensório-Motora (0 a 2 anos): apresenta


como características: ser de extrema relevância para o desenvolvimento
cognitivo; base de todos os processos cognitivos do sujeito; primeiras
maneiras de pensar e se expressar (inteligência prática, resolução
de problemas de ação); padrões de comportamento que podem ser
aplicados a diferentes objetos em diferentes contextos (construção do
real objeto permanente, estruturas espaço-temporais e causais; presença
de reflexos hereditários; essencialmente prático, por não haver, ainda,
a função simbólica. Há nesta faixa etária o desenvolvimento de uma
inteligência prática, realizada por meio de percepções e movimentos,
apresentando uma coordenação sensório-motora das ações, não
utilizando a exatidão do pensamento. Portanto, esse estádio de
inteligência consegue resolver alguns problemas de ação, como alcançar
objetos afastados. Este estádio está subdividido em seis subestádios. O
primeiro se refere aos reflexos do recém-nascido e os outros cinco estão
relacionados à organização das percepções e hábitos e à inteligência
totalmente sensório-motora. Esses subestádios possibilitam ao indivíduo
organizar a sua experiência no constructo de seu mundo, relacionados
ao objeto, espaço, causalidade e tempo (FONSECA, 2008; SOUZA;
WECHSLER, 2014).

• Subestádio I: o Exercício dos Reflexos (até 1 mês). O bebê nasce com


reflexos hereditários, mas a medida em que são colocados em prática,
exemplificando, a primeira mamada, esse reflexo já sofre influência do
meio, necessitando assim, ser adaptado. Uma estimulação da palma
da mão provocará, automaticamente, uma reação reflexa de preensão.
Portanto, a atividade reflexa caracteriza uma atividade cognitiva da
criança em seu primeiro mês de vida (FONSECA, 2008, MENESES,
2012).

• Subestádio II: as Primeiras Adaptações Adquiridas e a Reação Circular


Primária (1 a 4 meses). Após realizar, casualmente, uma ação que
traz satisfação, a criança repete muitas vezes a mesma ação, o que é
chamado de reação circular. Como circulação primária, denomina-se a

93
Fundamentos da Psicomotricidade

manipulação do próprio corpo da criança, sendo um exemplo a sucção


do polegar, que primeiramente é um movimento aleatório e sua repetição
posteriormente é em detrimento à satisfação que este ato gera na criança
(FONSECA, 2008; MENESES, 2012).

• Subestádio III: as Adaptações Sensório-Motoras Intencionais e as


Reações Circulares Secundárias (4 a 8 meses). Período caracterizado
pelo aparecimento das reações circulares secundárias direcionadas para
os objetos, ou seja, o foco da ação é externo à criança, como quando
ela descobre um brinquedo e o usa para brincar. As reações circulares
secundárias marcam a passagem entre a atividade reflexa e a atividade
propriamente inteligente, aparecendo pela primeira vez um elemento
de previsão de acontecimentos. Nesse estádio as crianças apresentam
as primeiras antecipações de movimentos relativos à trajetória de um
objeto, já conseguindo fazer distinção quando semi-oculto (FONSECA,
2008; CAVICCHIA, 2010; MENESES, 2012).

• Subestádio IV: a Coordenação dos Esquemas Secundários e sua


Aplicação às Situações Novas (8 a 12 Meses). Neste estádio ocorre um
desenvolvimento na coordenação das reações circulares secundárias,
em que a criança apresenta maior controle sobre a manipulação do
meio externo, conduzindo atos voltados a um objetivo, ou seja, há
intencionalidade em suas ações. Também neste estádio a criança
desenvolve melhor a noção de permanência do objeto, buscando
ativamente objetos desaparecidos. Exemplificando, a criança utiliza a
preensão e afasta objetos que possam estar escondendo aquilo que
quer. Há aqui a capacidade do comportamento deliberado, dotada de
intencionalidade (FONSECA, 2008; MENESES, 2012).

• Subestádio V: a Reação Circular Terciária e a Descoberta dos Meios


Novos por Experimentação Ativa (12 a 18 Meses). Neste estádio as
atividades imitativas apresentam a imitação deliberada e a tarefa lúdica
apresenta a reação circular terciária, em que a criança explora objetos
desconhecidos utilizando todos os meios que conhece. São exemplos
atividades como levantar, pegar, soltar, sacudir e repetições destes
esquemas. Neste subestádio, a elaboração do objeto é caracterizada
pela experimentação e procura por novidade, sendo que a reação
circular surge como um esforço para a captação das novidades em si
mesmas. As reações circulares terciárias testam ações objetivando
a obtenção de resultados parecidos, ao invés de somente realizar a
repetição dos movimentos que lhe trouxeram satisfação (FONSECA,
2008; CAVICCHIA, 2010; MENESES, 2012).

94
Capítulo 2 DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR

• Subestádio VI: a Invenção dos Meios Novos por Combinação Mental


e a Representação (18 a 24 meses). Nesta fase acontece a transição
entre a inteligência sensório-motora e a inteligência representativa, que
se inicia ao redor dos dois anos, com o surgimento da função simbólica.
Há o domínio da permanência do objeto, ou seja, há representação dos
objetos ausentes e de seus deslocamentos. Em relação ao subestádio
anterior, as invenções não se realizam de maneira prática, mas passam
ao nível mental, em que a criança inicia a capacidade de representar
o mundo exterior em sua mente, por meio de imagens, memórias e
símbolos. Em tarefas lúdicas, ela é capaz de “fazer de conta”, “fingir”,
fazer “como se”: é o “símbolo motivado” (COLE, 2003; MENESES, 2012).

• O Estádio Pré-Operatório ou Simbólico (2 a 7 anos): este período


realiza a transição entre a inteligência propriamente sensório-motora e
a inteligência representativa, passagem esta que não acontece por meio
de mutação brusca, mas sim por meio de mudanças lentas e sucessivas.
Quando a criança alcança o pensamento representativo, ela necessita
reconstruir o objeto, o espaço, o tempo, categorias lógicas de classes
e respectivas relações para este recente plano da representação. Essa
reconstrução ocorre dos dois aos doze anos, contemplando os estádios
pré-operatório e operatório concreto. Entre os 5 e 7 anos, estágio
geralmente chamado de “intuitivo”, há uma evolução que leva a criança,
aos poucos, à maior generalidade. Entre 2 a 7 anos, o pensamento da
criança fica dominado pela representação imagística de caráter simbólico,
em que a criança adota as imagens como substitutos do objeto e pensa
realizando relações entre imagens. Em suma, são características deste
estádio: o aparecimento da linguagem, condicionante para todos os
esquemas mentais; a função simbólica ser primordial; a criança assumir
a identidade, apesar das transformações que seu corpo passa; a criança
adquirir a capacidade de se colocar no lugar dos outros; o egocentrismo
estar muito presente durante toda essa fase ( CAVICCHIA, 2010;
SOUZA; WECHSLER, 2014).

• O Estádio Operatório Concreto (7 aos 11 anos): ao redor dos 7 anos,


a atividade cognitiva da criança torna-se operatória, com a adesão da
reversibilidade lógica, a qual surge como uma propriedade das atitudes
da criança, propícias a se realizarem em pensamento ou interiormente.
Dominar a reversibilidade no contexto da representação, ter a capacidade
de se representar um ato e um ato inverso ou recíproco que o anula
auxiliam no constructo de novos invariantes cognitivos. É um período
caracterizado por uma fase de transição entre a ação e as estruturas
lógicas mais globais, em que há duas ordens de operações: as lógico-
matemáticas e as infralógicas. As principais aquisições cognitivas

95
Fundamentos da Psicomotricidade

matemáticas que ocorrem neste período são a seriação e a classificação


e, posteriormente, ocorrem a multiplicação lógica e compensação
simples. Neste estádio, as operações lógico-matemáticas partem dos
objetos, como na tentativa de juntá-los em classes, multiplicá-los, ordená-
los etc., porém não ocupam o objeto de forma interna. A criança deixa de
ser tão egocêntrica e já consegue se colocar abstratamente no lugar do
outro, permitindo-se aumentar sua empatia com atitudes e sentimentos
com os outros (CAVICCHIA, 2010; SOUZA; WECHSLER, 2014).

Para que você aprimore seus conhecimento sobre os estádios


da teoria piagtiana e sobre operações lógico-matemáticas e
as infralógicas, indico a leitura do seguinte site: <http://www.
unifafibe.com.br/revistasonline/arquivos/cadernodeeducacao/
sumario/31/04042014074217.pdf>.

• O Estádio das Operações Formais (11 a 15-16 anos): algumas


literaturas consideram este período mais extenso, envolvendo a
adolescência. Este é o estádio em que há a passagem do “pensamento
concreto para o formal”. A estrutura formal conquistada neste estádio é
elaborada partindo da estrutura operatória, peculiar do período anterior.
Vamos relembrar...naquele estádio a criança tinha o pensamento concreto
sobre cada problema à medida que eles apareciam, não relacionando
suas soluções e teorias gerais. Já no adolescente observa-se o interesse
por problemas abstratos e sua facilidade na elaboração das respectivas
teorias que trazem uma abordagem política, filosófica, ética, ou seja,
particularmente a respeito de sistemas que objetivem mudar o mundo.
Essa maneira de raciocínio é denominada hipotético-dedutivo. Por volta
dos 11 e os 15-16 anos, as operações se desligam progressivamente do
plano da manipulação concreta, podendo chegar a conclusões por meio
de hipóteses, sem que haja a necessidade de observação e manipulação
que sejam reais. Saiba que as alterações de estrutura, a probabilidade
de encontrar maneiras originais e inusitadas originais para a organização
dos esquemas não cessa nesse estádio, prorrogando-se em nível
superior (RIZZI; COSTA, 2004; SOUZA; WECHSLER, 2014).

96
Capítulo 2 DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR

O estádio Operatório Concreto é caracterizado pelo pensamento


concreto sobre cada problema à medida que eles aparecem, em que
não se estabelecem relações entre soluções e teorias gerais. Esse
pensamento concreto cede lugar, no Estádio das Operações Formais,
ao raciocínio denominado hipotético-dedutivo. O que justifica essa
mudança de pensamentos?

Neste tópico você conheceu a contribuição de Piaget para o desenvolvimento


psicomotor, defendendo que o conhecimento é construído por cada sujeito,
quando este interage com seu ambiente. O pesquisador procurou detectar como
o indivíduo constrói seu conhecimento, procurando, organizando e assimilando
a seu estado anterior de conhecimento, defendendo, portanto, que os indivíduos
devem passar por estágios de desenvolvimento. Também pôde compreender
que sua obra consiste em dividir estes estágios em períodos, os quais estão
relacionados ao desenvolvimento da afetividade e da socialização da criança.

5 AVALIAÇÃO PSICOMOTORA:
OBSERVAÇÃO, REFLEXÃO E
TOMADA DE DECISÃO
A avaliação abrange comparações daquilo que é observado. Trata-se de
uma sistemática de dados através da qual se determinam as transformações
comportamentais da criança e em que medida essas mutações acontecem.

O ato de avaliar está a serviço da obtenção do melhor resultado possível


e pode-se dizer que está implicado na disposição de acolher. É a possibilidade
de partir de uma situação da maneira como se apresenta, satisfatória ou
insatisfatória. Portanto, a sistemática de dados será conseguida na determinação
de transformações de comportamento psicomotor, que poderão ser observadas
por meio da análise de circunstâncias comprometidas, como exemplo estão as
ações de construção e de desenho livre (BRETAS et al., 2005; LUCKESI, 2000).

97
Fundamentos da Psicomotricidade

5.1 AVALIAÇÃO PSICOMOTORA


Investigar o processo evolutivo da criança e identificar problemas relativos
ao seu desenvolvimento psicomotor tornam possível a realização de uma
intervenção precoce em seus atrasos evolutivos e a implementação de programas
de estimulação para crianças com distúrbios de desenvolvimento, em risco, ou
apenas com a intenção de enriquecimento do ambiente estimulador (BRETAS et
al., 2005).

Conforme Bretas et al. (2005, p. 404):

o objetivo formal da intervenção precoce é reduzir os efeitos


negativos de uma história de alto risco, que normalmente
caracteriza a evolução de crianças deficientes ou de risco,
pois muitas crianças sofreram a influência de vivências
empobrecidas, no meio familiar e em ambientes como
creches e escolas. A organização psicomotora humana
engloba, em primeiro lugar, a organização motora de base e,
posteriormente, a organização proprioceptiva, suspensão dos
reflexos, produtos de maturação mesencefálica e medular;
a organização do plano motor, a melodia do movimento, o
enriquecimento gnósico, a socialização, produtos da maturação
talâmica; a automatização, o ritmo, o espaço, a linguagem, a
percepção do corpo, produtos da maturação cortical.

A avaliação psicomotora, via de regra, acontece em detrimento a vários


propósitos. Geralmente, avalia-se a criança na tentativa de se detectar certas
dificuldades psicomotora, de maneira que possibilite a elaboração de um
programa de treinamento para que possam ser estimuladas habilidades que ainda
não foram adquiridas.

5.2 OBSERVAÇÃO E AVALIAÇÃO


PSICOMOTORA
Conforme Imai (2007, p. 58), “a avaliação é fundamental para o trabalho
psicomotor, e toda ação educativa precisa da observação, e esta implica a
avaliação”. Para que haja a “intervenção em Psicomotricidade”, esta deve
ser precedida de uma “observação Psicomotora”, que deverá ter como base
a aplicação de instrumentos de avaliação de cunho psicomotor. Após essa
aplicação, o avaliador poderá ter condições de traçar o “Perfil Psicomotor intra
individual”, e descrever, portanto, áreas psicomotoras fortes e fracas, as quais
retratarão os déficits psicomotores apresentados individualmente. “A observação

98
Capítulo 2 DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR

mediada pela avaliação é primordial para o trabalho psicomotor, onde toda ação
educativa precisa da observação e esta implica a avaliação” (IMAI, 2007, p. 58).

Quando a avaliação psicomotora é feita por um docente em


uma Instituição de Ensino, ela contribui com a interação professor-
aluno, acompanhando sua evolução, planejando, observando e
registrando esses momentos. Cabe ao docente, nesse processo
de reflexão, partindo da avaliação, direcionar sua prática. Isso nos
leva a compreender que os conhecimentos do professor relativos
ao desenvolvimento infantil, da especificidade de cada criança,
aliados àqueles fornecidos pela avaliação psicomotora, auxiliarão na
compreensão que as crianças apresentam seu próprio ritmo. Note que,
em algumas fases do desenvolvimento, algumas crianças poderão se
destacar, ou por estar adiante ou atrás das outras (IMAI, 2007).

Afinal, quais informações sobre o desenvolvimento psicomotor os resultados


das avaliações psicomotoras oferecem? É possível obter informações sobre o
desenvolvimento dos cinco principais elementos psicomotores: esquema corporal,
lateralidade, coordenação motora (global e fina), organização espacial e temporal.
Dessa maneira, o processo de avaliação tem como base comparar o que pode
ser observado com o que se tem conhecimento a respeito do desenvolvimento
psicomotor. Exemplificando, essa avaliação deverá ter como base o que se
espera que a criança tenha capacidade para realizar em uma determinada etapa
do seu desenvolvimento.

Portanto, o processo de avaliação não deve ter como limite a observação do


desempenho de uma criança quando esta executa tarefas específicas, devendo
se estender ao acompanhamento do desenvolvimento no dia a dia da criança,
por meio da observação e da comparação da evolução do seu desempenho na
realização das tarefas. Conforme exemplificamos anteriormente, se feito em uma
escola, o constante acompanhamento da criança requer um olhar reflexivo e
sensível do docente, com foco no olhar compromissado com o desenvolvimento e
práticas psicomotoras da criança. Esse “olhar” poderá lhe possibilitar reflexões e
consequentes alterações nas práticas psicomotoras que podem ser desenvolvidas.

99
Fundamentos da Psicomotricidade

A avaliação é imprescindível no que tange ao trabalho


psicomotor. Portanto, qualquer ação educativa necessita ser
observada, implicando para isso na aplicação da avaliação. Baseado
nessa afirmação do autor, o que possibilitam as informações obtidas
com os resultados das avaliações psicomotoras?

5.4 INSTRUMENTOS DE AVALIAÇÃO


PSICOMOTORA
Muitos protocolos têm sido utilizados para a detecção de alterações no
desenvolvimento motor, baseados na teoria neuro-maturacional, visto destacarem
a avaliação de reflexos primitivos e aquisições neuropsicomotoras desejadas
para cada idade. Portanto, existem vários instrumentos de avaliação que ajudam
na detecção das crianças de risco e esses testes e escalas de desenvolvimento
auxiliam tanto na triagem e diagnóstico quanto no planejamento e progressão do
tratamento, caso alguma anormalidade seja detectada.

Vamos trazer uma abordagem mais detalhada da Bateria de Psicomotricidade


(BPM) e o teste de Denver II. Também são citados na literatura alguns outros testes
que avaliam crianças menores, como (VIEIRA; RIBEIRO; FORMIGA, 2009): Age
and Stage (ASQ), que avalia, entre 2 a 66 meses, o desenvolvimento motor grosso
e motor fino, problemas de capacidade de resolução e habilidades pessoal-social,
habilidades de comunicação; Bayley Scale of Infant Development (Bayley II e III),
que avalia , entre 1 a 42 meses, o desenvolvimento motor grosso e motor fino,
linguagem, cognição, comportamento, emocional-social; Alberta Infant Motor Scale
(AIMS), que avalia, de 0 a 18 meses, o desenvolvimento motor grosso .

Bateria psicomotora (BPM) de Vitor da Fonseca


A bateria psicomotora (BPM) de Vitor da Fonseca (1995) é um instrumento
usado na avaliação psicomotora em crianças com déficit de aprendizagem,
objetivando a análise de crianças com deficiência mental (REZENDE, 2003).
Segundo Fonseca (1995), a qualidade do perfil psicomotor da criança, porque
reflete o grau de organização neurológica das três principais unidades, segundo
Luria, está indubitavelmente associada ao seu potencial de aprendizagem, quer
em termos de integridade, quer fundamentalmente em termos de dificuldade. São
algumas de suas características: não é um instrumento de avaliação psicomotora
validado; avalia o desempenho da criança numa situação formal, ou seja, fora do
contexto do dia a dia; possibilita verificar o reflexo das experiências vivenciadas

100
Capítulo 2 DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR

no contexto de seu desenvolvimento pelo perfil psicomotor; pode retratar o


desenvolvimento dinâmico através da aplicação de muitas avaliações durante
um período de tempo, acompanhando cada fase do desenvolvimento psicomotor
da criança; aplicada em crianças nas idades entre 4 a 12 anos; apresenta uma
perspectiva mais qualitativa do que quantitativa; seu período de avaliação, com
avaliador treinado, varia de 30-40 minutos; sua utilização não faz diagnóstico de
déficits neurológicos, nem lesões cerebrais, identificando crianças com déficit de
aprendizagem motora (SOUZA, 2016).

Conforme Imai (2007), a BPM tem como referência o modelo psiconeurológico


do funcionamento mental de A. R. Luria (Figura 6), sendo um instrumento de
observação psicoeducacional que tem como base um conjunto de tarefas, as
quais permitem fazer o diagnóstico de déficitis de função, ou mesmo substanciar
a sua ausência. Constitui-se de sete fatores, sendo eles: tonicidade, equilibração,
lateralidade, noção do corpo, estruturação espácio-temporal, praxia global e praxia
fina, cada qual definido em termos psiconeurológicos e divididos em subfactores.

A teoria de Luria propõe, conforme Figura 7, que a primeira


unidade funcional regula o tono, a vigília e os estados mentais; a
segunda unidade obtém, processa e armazena as informações
vindas do mundo exterior e a terceira unidade se responsabiliza por
programar, regular e verificar a atividade mental. São características
comuns das unidades funcionais possuírem estrutura hierarquizada,
contendo cada uma delas áreas primárias (motoras de projeção),
áreas secundárias (motoras superiores) e terciárias (áreas de
associação) (RODRIGUES; CIASCA, 2010).

FIGURA 6 – SUBFATORES (26) QUE DIVIDEM A BPM


FATORES PSICOMOTORES SUBFATORES
Tonicidade 4
Equilibração 3
Lateralização 1
Noção do Corpo 5
Estruturação Espaço-temporal 4
Praxia Global 6
Praxia Fina 3
FONTE: <http://drb-m.org/bateriapsicomotora1.pdf>. Acesso em: 16 out. 2020.

101
Fundamentos da Psicomotricidade

A BPM trata-se de um dispositivo distinto das escalas de desenvolvimento motor.


Contudo, permite a detecção de défices funcionais em termos psicomotores, cobrindo
a integração sensorial e perceptiva que se relaciona com o potencial de aprendizagem
da criança. Para Fonseca (2010, p. 115), “a BPM é útil para fins de “identificação
e de despistagem de dificuldades de aprendizagem e de psicomotricidade”, sendo
possível a reunião de dados que possibilitam chegar a um diagnóstico.

FIGURA 7 – RELAÇÃO ENTRE OS FATORES PSICOMOTORES


E AS UNIDADES FUNCIONAIS LURIA

FONTE: <https://slideplayer.com.br/slide/7315156/>. Acesso em: 16 out. 2020.

Como são os resultados obtidos pela BPM? O resultado da BPM é obtido após
serem cotados os quatro parâmetros e de todos os subfactores, sendo a cotação
média de cada fator arredondada e transferida para a página na qual se encontra
o perfil psicomotor. Todas as tarefas propostas pela BPM são pontuadas em perfis
psicomotores (Figura 8). A interpretação desses resultados e a obtenção de um
perfil permitirá ao observador encaminhar e definir as estratégias reabilitativas que
devem ser implementadas em seu programa de intervenção. Conforme Fonseca
(2010), a aplicação da BPM possibilitará a detecção qualitativa das relações e
das interações, tanto funcionais como desviantes, sendo que dela poderão ser
extraídos dados sistemáticos relevantes para a detecção qualitativa de distúrbios
psicomotores e de aprendizagem, objetivando contribuir para a compreensão dos
problemas de aprendizagem e de desenvolvimento na criança (ROCHETE, 2018).

Vamos então resumir como é feita a pontuação da BPM...A BPM é composta


por 7 fatores psicomotores, descritos anteriormente, dividido por 26 subfatores,
constituindo-se de 42 tarefas. Cada fator é pontuado de 1 a 4, conforme o
desempenho da criança, sendo um referente ao perfil apráxico, 2 ao dispráxico,
3 ao eupráxico e 4 ao hiperpráxico. Somando-se as pontuações dos sete fatores,
obtém-se o escore que possibilita classificar o perfil psicomotor geral (Figura 8)
em deficitário (7 a 8 pontos), dispráxico (9 a 13 pontos), normal (14 a 21 pontos),
bom (22 a 26 pontos) ou superior (27 a 28 pontos), ou seja, quanto maior o escore,
melhor é o perfil psicomotor da criança (CAMPOS et al., 2008).
102
Capítulo 2 DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR

QUADRO 1 – ESCALA DE PONTOS DOS PERFIS PSICOMOTORES


ESCALA DE PONTUAÇÃO-PERFIL
1 Realização imperfeita, incompleta e descoordenada (fraco) Perfil apráxico
2 Realização com dificuldades de controle (satisfatório) Perfil dispráxico
3 Realização controlada e adequada (bom) Perfil eupráxico
4 Realização perfeita, econômica, harmoniosa e bem Perfil hiperpráxico
controlada (excelente)
FONTE: Fonseca (1995, p. 20)

De acordo com Fonseca (2010 apud ROCHETE, 2018), a BPM pode ser
aplicada como instrumento psicopedagógico por qualquer educador para detectar
crianças que não apresentam as competências psicomotoras condizentes com a
aprendizagem e o seu desenvolvimento. Por meio da aplicação da BPM, procurar-
se-á avaliar qualitativamente o déficit psicomotor que está caracterizando o
aprendizado da criança. Tenta-se adquirir uma compreensão próxima à maneira
como funciona seu cérebro e, concomitantemente, dos mecanismos que formam
a base dos processos mentais da psicomotricidade.

Para que você compreenda melhor as etapas da avaliação


psicomotora por meio da BPM, com as respetivas fases de
observação e pontuações (Controle respiratório; Aspecto Tipológico)
e avaliação dos sete fatores que as compõem, indico o site: <http://
drb-m.org/bateriapsicomotora1.pdf>.

• Escala de desenvolvimento Denver II (Teste de triagem de Denver II)

Na tentativa de realizar o acompanhamento objetivamente do


desenvolvimento neuropsicomotor de crianças entre zero a seis anos,
Frankenburg et al. (1990 apud MOREIRA et al., 2010) desenvolveu o protocolo de
Denver II, sob o título de Denver II Screening Manual. Também é conhecido como
Exame de Desenvolvimento Infantil da População de Denver (EDIPD). Constitui-
se de um instrumento de identificação precoce das condições de desenvolvimento
da criança. O teste de triagem de Denver II é o teste de rastreamento de risco
de desenvolvimento infantil mais usado em nosso país, como também é
empregado em vários países (MORAES et al., 2010). Este instrumento abrange a
avaliação de comportamento social e pessoal, linguagem e habilidades motoras
preconizadas como características do desenvolvimento. “O desenvolvimento
cognitivo da criança é avaliado pela capacidade de compreensão de instruções,

103
Fundamentos da Psicomotricidade

conceituação de palavras, nomeação de figuras e habilidades pessoal-social”


(SOUZA; CHAGAS; AMOROSO, 2018, p. 720).

Avalia quatro áreas/categorias, a saber: motor-grosseiro, motor fino-


adaptativo, linguagem e pessoal-social (MORAES et al., 2010).

A conduta motora está associada à maturação do sistema


nervoso, correspondendo ao controle das aquisições motoras. A
conduta de linguagem abrange as percepções de sons, imagens
e suas respostas, enquanto a conduta adaptativa compreende
a reação da criança frente a objetos e situações. Já a conduta
pessoal-social corresponde à avaliação do comportamento
frente a estímulos culturais (MORAES et al., 2010, p. 150).

O teste de DENVER II não é um teste de avaliação dos coeficientes de


inteligência e de desenvolvimento, mas possibilita a avaliação da condição atual do
desenvolvimento maturacional da criança, não devendo ser usado como um instrumento
diagnóstico. É um teste evolutivo que mensura a aquisição de determinadas
funções de desenvolvimento em relação à idade cronológica da criança. Possibilita
avaliar rapidamente o estado de determinadas funções e, assim, definir estratégias e
procedimentos de estimulação do desenvolvimento psicomotor. Muito prático, pode ser
aplicado em Unidades Básicas de Saúde (UBS), ambulatórios, consultórios, clínicas,
unidades pediátricas em hospitais, creches, pré-escolas e serviços especializados em
distúrbios do desenvolvimento infantil (BRÊTAS et al., 2005; VIVAS, 2019).

Por essa escala, a avaliação do desenvolvimento deve ser baseada nos


marcos definidos pela escala de desenvolvimento Denver II, devendo ser avaliados
o desenvolvimento social, motor e da linguagem. O teste de Denver avalia, em
cada uma das quatro áreas, os seguintes aspectos, ilustrados no quadro a seguir
(VIVAS, 2019; FCM, 2020).

QUADRO 2 – AVALIAÇÃO DO DESENVOLVIMENTO PELA


ESCALA DE DESENVOLVIMENTO DE DENVER
Área Avaliação
Motora Motora Fina: habilidades que incluem as capacidades de coordenação,
concentração e destrezas manuais. Como exemplo estão os desenhos.
Motora Grossa: avalia a coordenação corporal e os movimentos, como o
lançamento de uma bola com as mãos.
Social Avalia a relação da criança com o seu meio ambiente. Exemplificando,
seu comportamento quando está em sociedade.
Linguagem Avalia o processo de aquisição da linguagem, como também sua evolução
e a capacidade da criança de ouvir e se comunicar.
FONTE: Adaptado de Vivas (2019)

104
Capítulo 2 DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR

Vamos citar alguns parâmetros utilizados na escala de Denver II para a


avaliação motora fina. Como exemplos de desenvolvimento do desenho na
infância, a Figura 9 ilustra desenho da idade de 2 anos, em que a característica
do desenho é representada por rabiscos, sendo que, depois de alguns meses,
a criança começa a nomear o que o rabisco representa. Já a Figura 10 ilustra
desenho de 4 a 5 anos, em que a figura humana tem mais detalhes e os desenhos
representam histórias ou eventos (FCM, 2020).

FIGURA 9 – REPRESENTAÇÃO DE DESENHO DE CRIANÇA DE 2 ANOS

FONTE: FCM (2020, s.p.)

FIGURA 10 – REPRESENTAÇÃO DE DESENHO DE CRIANÇA DE 4 A 5 ANOS

FONTE: FCM (2020, s.p.)

Vamos entender como é feita a interpretação do teste de Denver (VIVAS,


2019). Primeiramente, é necessário questionar os familiares sobre as ações da
criança, como: realização dos elementos que estão à esquerda da linha traçada
ou aqueles que cruzam a linha. É considerado:
105
Fundamentos da Psicomotricidade

• Falha absoluta: caso a criança falhe na realização de um teste que


geralmente é executado por 90% das crianças de sua faixa etária
cronológica.
• Falha relativa: caso a criança não passe em um teste no qual 75% das
crianças de suas faixas etárias, é recomendada aos pais uma maior
estimulação.

Contabiliza-se, portanto, apenas as falhas absolutas, as quais podem ser


avaliadas como problemáticas ou duvidosas. Considera-se problemática
quando há duas ou mais falhas em duas ou mais áreas e duvidosa se apenas
uma área tem duas ou mais falhas (VIVAS, 2010).

Para que você acompanhe o desenvolvimento do teste de


Denver II em uma aplicação em criança de 3 anos, indico o site
correspondente ao Canal de Heloisa Vidigal no Youtube, disponível
em: <https://www.youtube.com/watch?v=pSEO31mq9UM>.

Neste tópico você aprendeu que a avaliação do desenvolvimento infantil é


uma atividade complexa, exigindo uma observação ininterrupta nos primeiros
anos de vida e o conhecimento de normalidade do desenvolvimento infantil. Esse
processo de avaliação e observação permite a detecção precoce de transtornos
do desenvolvimento infantil, possibilitando o encaminhamento das crianças
com déficits para terapias eficazes. Portanto, a avaliação psicomotora pode ser
utilizada como parâmetro para observar as condições psicomotoras dos indivíduos
avaliados, objetivando ações preventivas para otimizar o desenvolvimento infantil,
trabalhando assim para que este esteja cada vez mais compatível com a idade
cronológica do indivíduo.

6 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
Quando falamos em Desenvolvimento Psicomotor da criança, estamos
nos referindo a um processo contínuo e evolutivo, que envolvem aspectos
relacionados à motricidade, cognição, comunicação, emoção, da relação consigo,
com os outros e com o ambiente e do próprio processo de aprendizagem em que
a criança adquire novos conhecimentos, habilidades, princípios e mudanças de
comportamento que culminam em um salto no seu desenvolvimento. Para cada
idade corresponde um movimento característico significativo e a aquisição ou o

106
Capítulo 2 DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR

surgimento de determinados comportamentos motores acarretam em resultados


importantes no desenvolvimento da criança. Uma aquisição influencia a anterior,
tanto no domínio mental como no motor, por meio da experiência e troca com
o meio. Nesse sentido, o desenvolvimento psicomotor ocorre concomitante à
maturação do sistema nervoso e as suas estruturas. Portanto, devemos considerar
que as manifestações ocorridas na maturação desse sistema poderão interferir no
desenvolvimento infantil.

No processo de desenvolvimento psicomotor, a criança deve ser vista em sua


totalidade, em que não se pode separar o ser intelectual do emocional e racional,
sempre considerando suas habilidades como um campo a ser desenvolvido de
modo prazeroso e significativo. Fato é que, para que esse processo aconteça
de maneira adequada, é fundamental considerar e respeitar a subjetividade de
cada criança. É necessário salientar que cada criança é única e isso sim é o que
chamamos de subjetividade.

Isso nos leva a considerar que, embora as fases do desenvolvimento são


comuns para todos, os aspectos físicos, afetivos, o meio social e o ambiente
familiar variam de criança para criança. Isso reforça a ideia de que crianças da
mesma faixa etária podem se comportar de maneiras distintas umas das outras,
mesmo inseridas no mesmo ambiente.

A estimulação do desenvolvimento psicomotor, por meio do estímulo das


áreas motoras, utilizando as estruturas psicomotoras, é fundamental para
que aconteça a interação dos movimentos com a emoção e a cognição do
indivíduo. Portanto, os fundamentos da psicomotricidade estão alicerçados pelas
estruturas psicomotoras e estas evoluem ao longo do tempo, concomitante
ao desenvolvimento psicomotor, proporcionando seu desenvolvimento e
estruturação. Na prática psicomotora, estas estruturas ou funções psicomotoras
devem ser utilizadas, objetivando primordialmente a evolução do sujeito, conforme
as situações vivenciadas nessa prática e os objetivos do trabalho.
O desenvolvimento cognitivo humano é a base dos estudos de Piaget, sendo
que sua teoria se mantém como modelo mais abrangente da cognição infantil.
Esse desenvolvimento está expresso em estágios, permeando entre o sensório-
motor e o estágio das operações formais, dirigindo-se para a construção das
estruturas intelectuais próprias do raciocínio hipotético-dedutivo.

É necessário, portanto, que o desenvolvimento psicomotor seja avaliado


e acompanhado. Para isso são utilizados vários instrumentos para a avaliação
do desenvolvimento psicomotor. Pôde-se observar que a literatura aponta para
dois instrumentos que são mais utilizados, como a escala de desenvolvimento
Denver II, em que são avaliados o desenvolvimento social, motor, linguagem
e desenho. Já sobre a BPM trata-se de um dispositivo distinto das escalas de

107
Fundamentos da Psicomotricidade

desenvolvimento motor, permitindo a detecção de défices funcionais em termos


psicomotores, cobrindo a integração sensorial e perceptiva que se relaciona com
o potencial de aprendizagem da criança.

Podemos então concluir que, a observação sobre o desenvolvimento


psicomotor, aliado a uma constante avaliação, possibilitarão adquirir conhecimentos
que contribuirão para que práticas psicomotoras forneçam condições favoráveis
ao desenvolvimento psicomotor da criança. Além do mais, à medida que esse
desenvolvimento se processa, estará acontecendo o desenvolvimento em outras
áreas imprescindíveis para a criança, como neurológica, psicológica e motora.

Devemos então considerar que a investigação do processo evolutivo


da criança e a detecção de problemas relacionados ao seu desenvolvimento
psicomotor propiciarão uma intervenção precoce em atrasos evolutivos. Isso
favorecerá a implementação de programas de estimulação para crianças que
apresentem distúrbios de desenvolvimento, estejam em risco, ou apenas com a
intenção de enriquecer o ambiente estimulador, reduzindo os efeitos negativos
dessas alterações do desenvolvimento.

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www.teses.usp.br/teses/disponiveis/61/61132/tde-05062017-161606/publico/
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112
Capítulo 2 DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR

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Disponível em: https://br.psicologia-online.com/teste-de-denver-o-que-e-
aplicacao-e-interpretacao-260.html. Acesso em: 24 ago. 2020.

113
Fundamentos da Psicomotricidade

114
C APÍTULO 3
DIAGNÓSTICO DOS DISTÚRBIOS E AS
ABORDAGENS TEÓRICO-PRÁTICAS DE
APLICAÇÃO DA PSICOMOTRICIDADE.
A partir da perspectiva do saber-fazer, neste capítulo você terá os seguintes
objetivos de aprendizagem:

Saber:
 Classificar as Síndromes psicomotoras e respectivos distúrbios psicomotores
relacionados.
 Apresentar metodologias de semiologia psicomotora para detecção de
diagnóstico e posterior intervenção específica.
 Demonstrar as intervenções psicomotoras, bem como a observação e
acompanhamento supervisionado das práticas psicomotoras.

Fazer:
 Identificar a aplicação de abordagens teórico-práticas subjacente ao processo
de Observação e Diagnóstico Psicomotor.
 Agregar experiências sensoriais, motoras, afetivas e sociais no desenvolvimento
infantil, frente aos distúrbios psicomotores diagnosticados.
Fundamentos da Psicomotricidade

116
Capítulo 3 DIAGNÓSTICODOSDISTÚRBIOSEASABORDAGENSTEÓRICO-PRÁTICASDEAPLICAÇÃODAPSICOMOTRICIDADE.

1 CONTEXTUALIZAÇÃO
Sendo a psicomotricidade uma integração de funções psicomotoras, ela pode
sofrer transformações relativas à intensidade, ao número e à velocidade. Nestes
casos podemos afirmar que há a composição de quadros causados por vários fatores,
o que conceituamos como síndromes psicomotoras, o que necessitaria de uma
intervenção calcada em terapia. Fato é que, quando falamos em intervenção
psicomotora, não estamos nos referindo apenas a intervenções que atuem em
transtornos psicomotores. Essas intervenções vão além de solucionar e atuar em
alterações psicomotoras quando já instalados os quadros de déficit cognitivo e
motor. A educação e reeducação psicomotora são exemplos dessas intervenções,
em que procura-se o desenvolvimento psicomotor por meio de atividades lúdicas,
e o brincar e jogar fazem parte da evolução desse desenvolvimento, trazendo à
criança sua bagagem motora, para que perpetue na fase adulta. Devemos,
portanto, enaltecer a importância da psicomotricidade na educação infantil, bem
como sua contribuição para o desenvolvimento global da criança, proporcionando a
ela a consciência de si própria e de seu meio de inserção. As teorias psicomotoras
muito contribuem para o desenvolvimento da psicomotricidade como ciência. Seus
vários teóricos contribuíram para que, na atualidade, suas ideias sejam colocadas
em prática, em quaisquer níveis de intervenção psicomotora. Seu legado afirma que
o vínculo movimento, pensamento e afetividade devem caminhar juntos, para que o
desenvolvimento infantil caminhe para a integralidade.

2 SÍNDROMES PSICOMOTORAS:
DISTÚRBIOS PSICOMOTORES
Estudar as síndromes psicomotoras, dentro da psicomotricidade, é realizar
uma análise entre as relações do sistema nervoso e a atividade psicomotora,
compreendendo assim uma rica contribuição para a compreensão de todo o
período de desenvolvimento de um organismo, visto o modelo patológico constituir-
se como um modelo extremamente válido para o estudo da evolução psicomotora.
Isso é importante não apenas por propor comparações associadas e criteriosas
entre crianças normais e com alterações de desenvolvimento e de aprendizagem,
mas também por propor comparações de atribuições e arranjos de interação que
surgem nas mesmas idades ou em idades sucessivas, apresentando distintos
estágios e classes neurodisfuncionais (FONSECA, 2008).

Em 1907, Enerrst Dupré, neuropsiquiatra, partiu para suas pesquisas


na psicomotricidade com estudos clínicos para observar pacientes, definindo
assim a síndrome da debilidade motora, conforme abordaremos a seguir

117
Fundamentos da Psicomotricidade

(OLIVEIRA; BAGAGI, 2009). Pôde então evidenciar uma íntima relação entre
o desenvolvimento motor, intelectual e afetivo. Este paralelismo psicomotor
definiu uma proposta para a superação ao dualismo cartesiano – corpo e mente
(OLIVEIRA; BAGAGI, 2009). Jean de Ajuriaguerra, por volta de 1959, defendia a
ideia de que o distúrbio psicomotor não apresentava necessariamente uma causa
orgânica, embora não excluísse essa probabilidade. Mantinha, portanto, a tese
relacional e/ou ambiental. Focava, portanto, na vivência corporal como causadora
de problemáticas (FERNANDES; GUTIERREZ FILHO, 2012).

Henri Wallon, médico psicólogo, em 1925 ofereceu suas contribuições para


a psicomotricidade, por meio de sua avaliação a respeito dos estágios e as
disfunções do desenvolvimento motor e mental. Demonstrou em seus estudos
uma distinção que nos possibilita estabelecer relações entre o aspecto afetivo,
motor, emocional, ao meio ambiente a aos hábitos individuais (OLIVEIRA;
BAGAGI, 2009). Esse teórico expõe quatro síndromes psicomotoras, traduzindo
assim a relação entre os distúrbios motores e perturbações psíquicas em distintas
dimensões funcionais: “Síndrome de assinergia motora e mental; síndromes
psicomotoras de hipertonia; síndrome de automatismo emotivo-motor e síndrome
de insuficiência frontal e pré-frontal” (KROCK, 1995, p. 28).

Vamos aqui fazer uma distinção entre os termos síndromes


e disfunções. Denomina-se síndrome uma condição clínica que é
caracterizada pela soma de sinais ou sintomas associados e caracterizados
em uma mesma patologia, desencadeados simultaneamente no
paciente, unidos por mais de um agente causal, tendo várias origens,
sendo, portanto, difícil apresentar um diagnóstico sobre as etiologias
desse quadro vulnerável. Por distúrbio, entendemos uma alteração nas
condições físicas ou mentais do indivíduo, afetando a funcionalidade de
algo na rotina. Pode-se dizer que é uma disfunção do Sistema Nervoso
Central no cérebro que ocasiona desequilíbrio patológico por alguma
alteração violenta de ordem natural. Esses distúrbios acarretam em
problemas que podem retardar a maturação das funções do Sistema
Nervoso Central (SNC), geralmente podem ser identificados na infância
e persistem na vida adulta, comprometendo a habilidade intelectual
(ESTÂNCIA BELAVISTA, 2019; SANTOS, 2020). Quando há um distúrbio
do desenvolvimento, a denominação mais adequada é “distúrbios do
neurodesenvolvimento”, os quais implicam em problemas neurológicos
que podem intermediar com a aquisição, retenção, ou aplicação de
habilidades ou a soma de informações específicas. Podem abranger
disfunção da atenção, memória, percepção, linguagem, resolução de
problemas ou a maneira de interagir socialmente (SULKES, 2018).

118
Capítulo 3 DIAGNÓSTICODOSDISTÚRBIOSEASABORDAGENSTEÓRICO-PRÁTICASDEAPLICAÇÃODAPSICOMOTRICIDADE.

2.1 SÍNDROME DE DEBILIDADE


MOTORA E MENTAL
Vamos agora caracterizar a síndrome de debilidade motora e mental. Dupré,
neurologista francês, em 1915, partindo de suas pesquisas clínicas, descreveu a
síndrome da debilidade motora. Seus componentes são a sincinesia, paratonias
e inabilidades, sem que lhes sejam conferidos danos ou lesão do sistema
extrapiramidal. Rompeu com as suposições da correspondência que associam a
localização neurológica e distúrbios motores da infância, formulando o conceito
de psicomotricidade por meio de uma linha filosófica neurológica, ressaltando o
paralelismo psicomotor, em que há uma relação íntima entre o desenvolvimento
da psicomotricidade, afetividade e inteligência. Portanto, há três mãos de acesso
ligadas ao conceito de psicomotricidade: a doença cortical, a neuropsiquiatria e a
neurofisiologia (LEVIN, 2003).

A relação dos transtornos motores e mentais foi, para Dupré (1915), de simples
coexistência e não de subordinação, pois ambas denotam uma insuficiência do
desenvolvimento cortical, cuja causa poderá ser, eventualmente, uma disfunção
cerebral mínima, uma encefalopatia infantil ou fetal ou mesmo uma regressão
atávica, utilizando as suas palavras (FONSECA, 2008). Dupré (1915) ponderou a
patologia psicomotora, não somente vinculando-a à epilepsia, mas a Síndromes
tais quais a Síndrome Parkinsoniana, síndromes frontais e pós encefalopatias. Os
distúrbios tais quais a paratonia, catatonia, incontinência postural, adiadococinesias,
sincinesias patológicas (contralaterais e de imitação), assinergias, ataxias, apraxias
etc. incorporaram para sempre o vocabulário clínico e são extraordinariamente
aperfeiçoadas em toda a obra de Wallon (FONSECA, 2008).

Como adiadococinesias entendemos a capacidade de executar


movimentos rápidos, repetidos e alternados; ataxias cerebelares na
marcha apresentam-se como marcha rápida, irregular, base alargada
e oscilação lateral; as assinergias são definidas como a perda da
capacidade de associar músculos em conjunto para a execução
de movimentos complexos, traduzida como falta de coordenação;
sinergias espasmódicas são ações associadas de dois ou mais
elementos anatômicos ou biológicos, em que o resultado reflete na
realização de um movimento, aqui referido como forma de espasmo,
ou seja, hipertonia muscular.

119
Fundamentos da Psicomotricidade

As sincinesias apresentam-se como movimentos que não respondem ao


controle cortical, que é desencadeado pelo sistema piramidal. São considerados
como elementos da debilidade motora e estão associados a paratonias e
inabilidades. Veja bem, podem estar presentes em sujeitos que estejam
psiquicamente dentro da normalidade e/ou que apresentem intelecto superior.
Essas sincinesias poderão se apresentar tanto na face (expressão e movimento)
como nos segmentos (hipertonias). Como exemplo das faciais, podemos citar os
movimentos involuntários da face quando realizamos movimentos com outros
segmentos do corpo. Como exemplo de sincinesias segmentares, podemos citar
o descontrole nos movimentos de braços, dedos, mãos, involuntários quando o
indivíduo realiza movimentos voluntários contralateralmente (TEIXEIRA, 2011).

Sobre a paratonia, seus resultados são a ausência de precisão, de


delicadeza, de destreza, de dissociação, de disponibilidade, de harmonia
cinética etc. Podemos definir a paratonia como uma insistência para com a
rigidez muscular, que se caracteriza por uma errada incontinência das reações
tônicas. Podemos exemplificar a paratonia quando uma criança corre e seus
membros inferires e superiores se movimentam desordenadamente e encontram-
se rígidos (dissociação); caminhando ou em pé há uma desarmonia; ou mesmo
quando solicitam sua disponibilidade, a rigidez aumenta (BARBOSA; SILVEIRA;
OLIVEIRA, 2014). Nesta síndrome poderão ocorrer inabilidades relacionadas a
sinais de dispraxias (disfunção neurológica caracterizada pela incapacidade de
executar movimentos), sendo uma disfunção neurológica que impossibilita o
cérebro em seu desempenho para movimentos corretos. Entendemos como
praxia o reflexo da organização gnósica multifacetada e multimodal. Quando
este reflexo não possibilita o recebimento de informações exatas e controladas,
há uma desestruturação e uma incoordenação, gerando inabilidades nas funções
psicomotoras. Quando estamos frente a um quadro de apraxia severa ou
dispraxia ligeira, esse fato nos demonstra que a função motriz apresenta suas
imagens extintas e adulteradas. Como resultado, teremos as funções motoras
desorganizadas, apresentando rigidez e dismetria, visto a sintonia ideomotora não
ter sido efetivada em tempo hábil (FONSECA, 2008).

Note que o termo dispraxia verbal do desenvolvimento consiste na


dificuldade para articulação da fala. Todos estes sinais apresentam alterações na
função, alterando o emocional, afetivo e relacional, visto poderem ocorrer risadas
incontroladas, sinergias espasmódicas, difíceis e sem controle, quer da palavra,
dos gestos e mímicas, provocar atos impulsivos, causar inquietude, instabilidade
etc. Estas ações poderão resultar em um comportamento bizarro, acidental e
episódico, que claramente estão implicados nestes distúrbios (FONSECA, 2008).

120
Capítulo 3 DIAGNÓSTICODOSDISTÚRBIOSEASABORDAGENSTEÓRICO-PRÁTICASDEAPLICAÇÃODAPSICOMOTRICIDADE.

Na Síndrome de liberação piramidal, em que ocorre lesão do neurônio


motor superior, no sistema nervoso central, poderão ocorrer os distúrbios
relacionados ao tônus. Notem que a hipertonia elástica, denominada
espasticidade, ocorre nas lesões piramidais, opondo-se à lesão do
sistema extrapiramidal, caracterizada pela hipertonia plástica e também
caracterizada pela hiperreflexia. Distonias, paratonias, adiadococinésias
(movimentos alternados), sincinesias labiais e contralaterais, alterações
de postura (desequilíbrios repentinos), entre outros distúrbios ocorrem
pela liberação do sistema piramidal, vindo de encontro aos distúrbios
ocorridos na síndrome de debilidade motora e mental (DIETRICH, 2016).

2.2 SÍNDROME DE ASSINERGIA


MOTORA E MENTAL (SÍNDROME DE
INSUFICIÊNCIA CEREBELAR)
Os distúrbios cerebelares apresentam várias etiologias, dentre elas as
malformações congênitas, ataxias (perda ou irregularidade da coordenação
muscular) hereditárias e doenças adquiridas, sendo sua sintomatologia atrelada à
causa. Caracteristicamente incluem a ataxia, que se apresenta como uma marcha
rotineira, porém com alargamento de base, resultado da incoordenação muscular
(USIGLI, 2017). Assinergia foi um termo introduzido por Babinsky (1914), referindo-
se a uma insuficiência cerebelar, evidenciada primordialmente quando ocorre
falta de equilíbrio e na marcha, detectáveis em bebês no primeiro ano de vida,
no início de sua marcha e na embriaguez. Nestes casos há vacilação do tronco
e os membros inferiores alargam a base de sustentação, surgindo o reequilíbrio
sucessivamente, com titubeamentos e cambaleamentos. Os membros superiores
balançam dismetricamente. A queda é laboriosamente controlada, sem convicção,
nem manutenção correlativa de segmentos imobilizados e descontrolados
posturalmente, que refletem uma marcha tortuosa e em ziguezague.

“No caso da assinergia, pelo contrário, as contraturas onerosas escondem-


se por detrás de uma hipertonia sem plasticidade, quase uma paralisia agitante e
inconsistente, como se se tratasse de uma incontinência ou persistência tônica”
(FONSECA, 2008, p. 60).

Portanto, a assinergia declara uma síndrome de insuficiência cerebelar e


mesencefálica, com repercussões diretas nos processos motores e indiretas
nos processos mentais, fundamentalmente na atenção e na concentração. A
121
Fundamentos da Psicomotricidade

insuficiência de regulação cerebelar revela-se, porém, não só na marcha, como


na imobilidade, no equilíbrio estático e dinâmico e também nos movimentos finos
e elaborados das extremidades (FONSECA, 1992). No equilíbrio, tal insuficiência
de tipo axial tende a evocar oscilações multidireccionais e reequilíbrios bruscos,
sem o jogo gradual e oportuno das sinergias posturais ativas e passivas.

A assinergia motora é estritamente marcada pela ausência de estabilidade, em


que, quando fixam-se e/ou deslocam-se segmentos corporais, estes apresentam-se
instáveis e imprecisos. A assinergia e a ataxia, bem como suas consequências mais
leves, ocasionadas por insuficiência ou imaturidade cerebelar e vestibular, irão interferir,
sem sombra de dúvidas, tanto em processos motores como mentais (FONSECA, 2008).

Clarice, 48 anos, mãe de Douglas, 1 ano e meio, acaba de levar


seu filho a uma consulta neurológica. Chegando lá, referiu que a
criança, ao andar, perde o equilíbrio, cai muito e parece que seus braços
não acompanham seus próprios passos. O médico então examinou
a criança, colheu o histórico familiar detalhado e solicitou um exame
de imagem para concluir o diagnóstico, uma Ressonância Nuclear
Magnética. A princípio, conferiu à criança uma hipótese diagnóstica
de Síndrome de Insuficiência Cerebelar, já a encaminhando para um
tratamento motor e um acompanhamento psicológico. Sobre esta
síndrome, quais distúrbios espera-se encontrar na avaliação motora?

2.3 SÍNDROME DE HIPERTONIA


– CORÉIA MOTORA E MENTAL
(SÍNDROME DE INSUFICIÊNCIA
MESENCEFÁLICA OU
EXTRAPIRAMIDAL INFERIOR E MÉDIA)
Vamos fazer uma rápida explanação sobre as estruturas do Sistema
Extrapiramidal (SEP). Na história da evolução das espécies (filogenética), é a
estrutura mais antiga e de condução mais lenta, composto pelo tálamo, cerebelo e
gânglios da base. Estes componentes, por meio de suas conexões, estão envoltos em
muitos processos, incluindo a modulação do controle motor, sendo que a disfunção
de seus componentes está associada aos transtornos dos movimentos (GODEIRO
JUNIOR; FELÍCIO; PRADO, 2006). Em suma, trata-se de um sistema imprescindível
da arquitetura neurofuncional tanto dos processos motores como mentais.
122
Capítulo 3 DIAGNÓSTICODOSDISTÚRBIOSEASABORDAGENSTEÓRICO-PRÁTICASDEAPLICAÇÃODAPSICOMOTRICIDADE.

Os distúrbios ocasionados pela sua insuficiência funcional mais conhecidos


são a atetose (perturbação motriz elaborada) e do tônus. Esta alteração do tônus se
apresenta como uma flacidez descerebrada, em que não há fixação nem suporte para
o movimento, produzindo como disfunções: déficit de controle postural, incoordenação,
distonias, movimentos involuntários caóticos e coreicos, os quais envolvem o
movimento harmônico e a fluidez da cinética, bem como a sequencialização
ideocinética, fazendo com que a inervação recíproca da musculatura proximal e distal
do tronco e extremidades torne-se instável (FONSECA, 2008).

Frente a um quadro de insuficiência extrapiramidal, os reflexos passam a não


ser corretamente inibidos, tornando-se exacerbados e exagerados, interferindo
assim, tanto na qualidade da atividade motriz como mental e postural. Podemos
então traduzir esta insuficiência como um modo peculiar de flutuação hipo-
hipertonia, com predomínio dinâmico, que pode se manifestar tanto no aspecto
motriz (macromotor – na marcha; e micromotora – na preensão), como na
linguagem. Vamos exemplificar estes distúrbios na linguagem, na oromotricidade,
interferindo na fluência e articulação de palavras; na grafomotricidade, apresentando
sinais de produzir uma grafia adequada, bem como apresentar uma expressão com
emotividade exacerbada, em que sua ligação com o psiquismo parece ser clara.
Toda essa explanação remete ao teórico Wallon, que afirma haver uma semelhança
funcional e disfuncional que determina o sinergismo entre os processos motores
e os mentais (GODEIRO JUNIOR; FELÍCIO; PRADO, 2006). O quadro a seguir
expressa os distúrbios referentes às estruturas do Sistema Extrapiramidal.

QUADRO 1 – DISTÚRBIOS REFERENTES ÀS ESTRUTURAS


DO SISTEMA EXTRAPIRAMIDAL
ESTRUTURA DISFUNÇÕES PSICOMOTORAS
Tálamo Déficit de atenção; acinesia; alterações de linguagem e amnésia;
hemianestesia; dor; defeitos no campo visual e déficit de atenção; perda
sensitiva; dores paroxísticas e hemiataxia contralaterais ao lado do
corpo afetado; distonia; mioclonias e asteríxis (uma mioclonia de caráter
negativo, em que não há inibição muscular); heminegligência; apatia;
agitação; sonolência e coma.
Cerebelo Astasia (dificuldade para se manter em pé); abasia (dificuldade para
marcha, com caráter ebrioso); dismetria (dificuldade em atingir um alvo);
decomposição (movimentos realizados em fases); disdiadococinesia
(dificuldade na realização de movimentos rápidos, alternantes e
coordenados; tremor.
Gânglios da Síndrome hipocinética: bradicinesia; hipertonia plástica; tremor de
base repouso de baixa frequência e elevada amplitude, além de instabilidade
postural. Síndromes hipercinéticas: coréia; balismo; distonia; e atetose.
FONTE: Godeiro Junior; Felício; Prado (2006, p. 49-51).

123
Fundamentos da Psicomotricidade

Sobre esses distúrbios, a catatonia pode interferir na atividade motora automática


e voluntária, apresentando sinais de prostração, ausência de mímica, apresentando
perda da capacidade de empregar gestos ou sinais como símbolos de sentimentos
ou ideias (amimia) e rigidez (hipertonia plástica), sugerindo assim uma negação
da expressão motora, traduzida como negativismo ou passividade. Na negação,
ocorrem sinais de oposição e, em resposta, há contraturas de prevenção relacional.
Na passividade, emergem modos de inércia motora ou ecopraxias, ecomimias e
ecolalias estereotipadas, podendo estes distúrbios estarem associados com crises
de fúria catatônica e descargas motoras inconsequentes e, muitas vezes, em forma
de agressividade (GODEIRO JUNIOR; FELÍCIO; PRADO, 2006; FONSECA, 2008).

A coreia corresponde a uma contração involuntária, espasmódica, irregular,


apresentando-se com abundância de grupos musculares, geralmente vinculados à
susceptibilidade e insuficiência da atividade motriz. Observamos aqui um tipo de dança tônico-
clônica envolvendo os componentes tônico-posturais de suporte, mais notável nas estruturas
da face e dedos, ou seja, nas principais áreas da expressão mímica, podendo até somar
outras perturbações mentais concomitantes, como nos estados de adinamia e de acinésia ou
de hipercinésia (GODEIRO JUNIOR; FELÍCIO; PRADO, 2006; FONSECA, 2008).

Podemos definir como ecopraxia a imitação involuntária dos


movimentos de outras pessoas; ecomimia (ou ecopatia) é a repetição
involuntária, como uma imitação das mímicas de outras pessoas; ecolalia
a repetição de sílabas, palavras ou frases imediatamente após ouvi-
las ou depois de algum tempo. Com relação aos termos relacionados
à cinética, a adinamia se refere à apatia, ou seja, falta de dinamismo,
prostração; acinesia é conceituada como ausência de movimento e
hipercinasia como movimentos involuntários que aparecem em algumas
doenças do sistema nervoso central, atividade muscular aumentada
(PORTAL SÃO FRANCISCO, 2020; HIPERCINESIA, 2020).

2.4 SÍNDROME DE AUTOMATISMO


MOTOR E EMOCIONAL (SÍNDROME
DE INSUFICIÊNCIA DIENCEFÁLICA
OU EXTRAPIRAMIDAL SUPERIOR)
Conforme Fonseca, 2008, p. 66-67:

124
Capítulo 3 DIAGNÓSTICODOSDISTÚRBIOSEASABORDAGENSTEÓRICO-PRÁTICASDEAPLICAÇÃODAPSICOMOTRICIDADE.

Em termos filogenéticos, o diencéfalo, nos seus núcleos


optoestriados, constitui uma espécie de cérebro primitivo; em
muitos vertebrados, constitui mesmo o substrato funcional
mais complexo. Nos primatas e no ser humano, porém, a
camada óptica ou talâmica serve de passagem aos feixes
piramidais, e de estação de transição entre as relações
eferentes e aferentes com o córtex frontal, ao mesmo tempo
que é a sede privilegiada da sensibilidade orgânica protopática
e de regulação vasomotora e secretória.

Estes centros, uma vez lesados, elaboram reflexos exacerbados, paresias,


hipertonias, movimentos coreico-atetósicos, entre outros. Também podem ocorrer
reações sensitivas do sistema simpático, humor variado alterando entre ansiedade,
euforia, e, primordialmente, ocorre uma incoordenação dos automatismos pouco
divergentes, implicando no envolvimento de grandes grupos musculares. A
disfunção optoestriada é, particularmente de caráter assimétrico nas suas funções
motrizes, em que a hemiplegia é a maneira mais completa, caracterizando-se por
uma lesão hemisférica contralateral, praticamente impossibilitando o movimento
voluntário. Os membros apresentam-se completamente impotentes, existindo
somente algumas contrações sincinéticas. Por outro lado, a musculatura da
mímica facial é afetada em menor proporção. “O tronco exibe ligeiras afecções
piramidais, enquanto as extremidades acusam, incontestavelmente, contraturas
em flexão na mão e em extensão e em abdução no pé” (FONSECA, 2008, p. 67).
A insuficiência estriada e mesencefálica apresenta manifestações atetósicas.

2.5 SÍNDROME CÓRTICO-


ASSOCIATIVA (SÍNDROME DE
INSUFICIÊNCIA FRONTAL)
Os lobos frontais (LF direito e esquerdo) são os elementos constituintes da
porção mais anterior dos hemisférios cerebrais, perfazendo 2/3 do córtex cerebral.
Envolve posteriormente o córtex motor, o qual é o responsável pelos movimentos
voluntários do hemicorpo contralateral, e anteriormente às áreas pré-motoras e o
córtex pré-frontal (CPF) (ALBUQUERQUE, 2002).

Em detrimento a sua responsabilidade, o LF impede todos os impulsos


afetivos, ordenando e categorizando o afluxo aferente de informações e de
impressões sensoriais (intra e extrassomáticas). Confere-lhes expressão de
harmonia, precisão e eficácia e, após, conforme as situações, previsões e
preferências refletidas, faz a sequência espaço-temporal de todas as suas
atividades conscientes. Sua insuficiência volta-se para a determinação de

125
Fundamentos da Psicomotricidade

modos e tipos de apraxia, amnésia e afasia, colocando em risco a qualidade da


expressão, adaptação e comunicação do indivíduo (FONSECA, 2008).

Podemos caracterizar a atividade frontal pelo seu poder efetivo de iniciativa


e de orientação mental, resumindo em uma palavra “intencionalidade”. Sua
tarefa supera todas as outras funções psíquicas, em uma realidade integrativa
presidida a todas as reações simples e automáticas do psiquismo. A função
frontal é também denominada como função executiva, submetendo-se ao seu
comando prioritário e hierárquico todas as funções relativas à medula, cerebelo,
sistemas extrapiramidais e piramidais e formação reticular. Esta função envolve o
sinergismo, automatismos, quadros emotivos e desejos, os quais somam-se para
alcançar determinado objetivo (FONSECA, 2008).

Diante dessa obra funcional e essa organização complexa, as disfunções


ou insuficiências frontais irão produzir efeitos heterogêneos no que concerne ao
comportamento e aprendizagem, entre os quais estão inclusos:

a inércia (da agitação subcortical à passividade frontal),


anorexia, bradicinesia, paratonias, hipotonia, apraxias, mutismo,
hiperatividade, apatia, depressões hipomaníacas, indecisão,
impaciência, inatenção, subjetividade radical, confusão
espaço-temporal, hiperestesia psíquica, despersonalização,
digressões e associações inoportunas, divórcio entre a ação
e a representação, tautologias puras etc. (FONSECA, 2008,
p. 69).

A Síndrome pré-frontal apresenta variações contrastantes entre inércia


e agitação, afetividade e rabugices; euforia e depressão. Há uma busca por
equívocos, portanto, uma instabilidade mental. Vale ressaltar que a atividade
pré-frontal está no exercício da função tônica, garantindo uma inteligência
guiada, sensata e ininterrupta (KROCK, 1995). Conforme Albuquerque (2002), o
córtex pré-frontal é a região do lobo frontal mais constantemente associada às
capacidades metacognitivas, funções executivas e de comportamento social.
Está dividida em três áreas distintas, correspondendo ao córtex dorsolateral,
orbitofrontal e frontomedial. Albuquerque (2002), em seu artigo, sistematiza a
natureza dos déficits que resultam das lesões do lobo frontal conforme a divisão
proposta do córtex pré-frontal, em que são consagradas a existência de três
síndromes: dorsolateral, frontomedial e orbitofrontal (Figura 1).

Compreende-se, portanto, as síndromes psicomotoras como uma empatia


funcional estabelecida entre processos motores e psíquicos, desfrutando do
mesmo cérebro e mesmo corpo, motivo pelo qual a psicomotricidade não passa
de uma expressão corporal da atividade psíquica.

126
Capítulo 3 DIAGNÓSTICODOSDISTÚRBIOSEASABORDAGENSTEÓRICO-PRÁTICASDEAPLICAÇÃODAPSICOMOTRICIDADE.

FIGURA 1 – SÍNDROMES PSICOMOTORAS RELACIONADAS


ÀS ESTRUTURAS DO LOBO FRONTAL

FONTE: Albuquerque (2002, p. 75)

2.6 DISTÚRBIOS PSICOMOTORES


COMO SINTOMA DE TRANSTORNO
EMOCIONAL

Os distúrbios psicomotores podem emergir em diferentes circun-


stâncias, inclusive na ocorrência de um transtorno emocional. Não é difícil
estabelecer esta relação. Distúrbios psicomotores podem estar atrelados
aos transtornos afetivos. As crianças são acometidas como um todo, en-
volvendo muitos aspectos, como os que se referem às áreas psicomotoras:
comportamento, atenção, lateralidade, noção de espaço-tempo, entre out-
ras Grünspun (1980 apud JOSÉ; COELHO, 2002, p. 111), classifica estes
distúrbios nos seguintes grupos:

127
Fundamentos da Psicomotricidade

• Instabilidade psicomotora: há uma instabilidade no lado afetivo da


criança, afetando seu intelecto, resultando em: déficit de concentração
e atenção, falhas em sua coordenação motora; hiperatividade, oscilação
comportamental, problemas escolares com dificuldades para a
compreensão, déficit para ler e escrever, bem como dificuldades para ver
o que está colocado na lousa. Podem ocorrer em algumas circunstâncias
relacionadas à impulsividade, desatenção, sensibilidade extrema,
hiperatividade, agitação, dificuldade diante de frustrações, entre outros.
Hoje, estas circunstâncias atingem grande percentagem da população
escolar, refletindo nas disposições mentais e os estados afetivos de
muitas crianças e jovens na sociedade agitada atual. As crianças
apresentam uma predominância de uma atividade muscular ininterrupta e
incessante, não finalizando as atividades que foram iniciadas, revelando
instabilidade tanto emocional como intelectual. Apresentam também
déficit de atenção e concentração; ausência de coordenação geral e
motora fina; são hiperativas e têm o equilíbrio prejudicado; déficit em
formular conceitos e processar a percepção, como discernir tamanhos,
figura-fundo, orientação espaço-temporal; déficit na alteração da palavra
e comunicação, apresentando déficit de linguagem e distúrbios da
palavra; emocionalmente são impulsivas, explodem fácil, são sensíveis,
frustram-se facilmente; apresentam alterações de sono, desenvolvendo
movimentos enquanto dormem; apresentam disfunções no processo
do pensamento abstrato e dificuldades em atividades escolares, como
ler, escrever; funções aritméticas, morosidade nas tarefas, dificuldade
de copiar da lousa, entre outras manifestações (FONSECA, 2008;
SMPSICOPEDAGOGIA, 2010; INSTITUTO NEUROSABER, 2017).
• Fragilidade psicomotora/Debilidade psicomotora: estão inclusas
aqui duas situações características, já mencionadas na síndrome de
debilidade motora e mental: a paratonia, em que estão limitadas às quatro
extremidades corporais ou somente duas e a sincinesia. Nesta última há a
ativação sem necessidade de alguns músculos para um certo movimento.
• Inibição psicomotora: aqui somam-se às características da debilidade
psicomotora, somando como componente a ansiedade, que está sempre
presente e constante. A criança se apresenta com sobrancelhas franzidas;
cabisbaixa; alterações na coordenação motora; alterações de conduta,
dentre outros (SMPSICOPEDAGOGIA, 2010). As crianças com inibição
psicomotora refletem um estado de ansiedade constante, podendo
desenvolver disfunções de glândulas, pele, aparelho circulatórios e
tiques, rendimento além das crianças com debilidade psicomotora,
porém costumam fracassar em provas individuais como chamadas orais,
em detrimento ao eu quadro de ansiedade (BRITO, [s/d]).
• Problemas de lateralidade: um indivíduo que apresenta transtornos na
psicomotricidade poderá ter sua lateralidade comprometida. Um exemplo

128
Capítulo 3 DIAGNÓSTICODOSDISTÚRBIOSEASABORDAGENSTEÓRICO-PRÁTICASDEAPLICAÇÃODAPSICOMOTRICIDADE.

seriam dominâncias de algumas partes do corpo resultar em problemas


de coordenação e outros. Vale ressaltar a ocorrência da lateralidade
cruzada, quando tais dominâncias não se apresentam do mesmo lado do
corpo. Outra questão seria a lateralidade cruzada. Para José e Coelho
(2002, p. 114), “além da dominância da mão, existe também a do pé,
do olho, do ouvido”. Caso estas dominâncias não estejam presentes
do mesmo lado, isso é caracterizado como lateralidade cruzada, há
uma evidência nos distúrbios psicomotores, resultando em deformação
do esquema corporal. São exemplos comuns desse distúrbio a mão
direita ser dominante e o olho esquerdo ser dominante; mão direita ser
dominante e o pé esquerdo ser dominante. Fato é que normalmente
essas crianças referem alto índice de fadiga; caem frequentemente;
apresentam pouca coordenação; instabilidade na atenção; alterações de
linguagem como dislalias (distúrbio da fala, caracterizado pela dificuldade
em articular as palavras, basicamente na má pronúncia do “R” e “L”),
língua enrolada, entre outros.
• Imperícias: este distúrbio apresenta menor gravidade, sendo que a
criança manifesta inteligência normal, embora haja alguma frustração pela
dificuldade de realizar algumas ações que demandem refinada habilidade
manual. Há também dificuldades para realizar a coordenação motora fina,
com objetos quebrados constantemente; escrita irregular; movimentos
grosseiros e alto grau de fadiga (SMPSICOPEDAGOGIA, 2010).

Para que você aprimore seus conhecimentos sobre a lateralidade


cruzada, leia a reportagem da revista crescer, acessando o site: <http://
revistacrescer.globo.com/Crescer/0,19125,EFC406249-2216,00.html>.

“Toda a emoção e todo o pensamento exprimem-se e


atualizam-se em mímicas, gestos e praxias, como se a motricidade
consubstanciasse uma linguagem do psiquismo” (FONSECA, 2008,
p. 55). Qual a relação entre os distúrbios psicomotores e transtornos
emocionais?

129
Fundamentos da Psicomotricidade

Neste tópico você aprendeu que o estudo das síndromes psicomotoras, dentro da
psicomotricidade, possibilita a realização de uma avaliação entre as relações do sistema
nervoso e a atividade psicomotora, compreendendo assim uma rica contribuição para a
compreensão de todo o período de desenvolvimento de um organismo, visto o modelo
patológico constituir-se como um modelo extremamente válido para o estudo da
evolução psicomotora. Este estudo possibilita comparar o desenvolvimento de crianças
normais com as alterações e distúrbios oriundos dessas síndromes e as prováveis
complicações no desenvolvimento psicomotor nas esferas motora, cognitiva e afetiva.

3 SEMIOLOGIA PSICOMOTORA
PARA UM DIAGNÓSTICO E UMA
INTERVENÇÃO ESPECÍFICA
Vamos iniciar este tópico traduzindo a palavra semiologia, podendo defini-la
como o estudo dos sinais das doenças.

Berges (1991, p. 18 apud FERNANDES; GUTIERREZ FILHO, 2012)


conceitua a semiologia na psicomotricidade como:

o estudo, a individualização dos sinais psicomotores a partir dos quais se


perspectiva o corpo em relação, por meio dos problemas psicomotores,
nos quais o corpo em relação, por meio dos problemas psicomotores,
nos quais o corpo se situa num espaço de ação (a motricidade, o agido)
em relação estreita com o espaço e representação.

É fato então que a semiologia psicomotora não pode ser vista apenas com a
abordagem da causa, mas contextualizada em uma abordagem tônico-emocional,
em que o corpo fala, não separando a objetividade da subjetividade, em que se
deve tanto ver como observar (FERNANDES; GUTIERRES FILHO, 2012).

Para Bretas (2005), investigar o processo de evolução da criança e a detecção


de problemas relativos ao seu desenvolvimento psicomotor propiciam a intervenção
precoce em atrasos do desenvolvimento e a implementação de programas de
estimulação para crianças com distúrbios de desenvolvimento, em risco ou apenas com
o propósito de enriquecimento do ambiente motivador. A semiologia psicomotora, por
meio do estudo dos sinais psicomotores, detectados por meio da avaliação, objetiva
possibilitar a intervenção precoce, reduzindo os efeitos deletérios de uma história de
alto risco, que geralmente caracteriza a evolução de crianças deficientes ou de risco.

Conforme Rosa Neto et al. (2005), os sintomas psicomotores a serem


estudados na semiologia psicomotora apresentam-se como evidentes alterações

130
Capítulo 3 DIAGNÓSTICODOSDISTÚRBIOSEASABORDAGENSTEÓRICO-PRÁTICASDEAPLICAÇÃODAPSICOMOTRICIDADE.

motoras, cognitivas, de coordenação e equilíbrio, dificultando o desenvolvimento


normal da criança. Um exemplo está no acometimento da praxia fina, de modo que
a criança apresenta déficit de programação aos movimentos voluntários, portanto
as tarefas que decorrem desta habilidade, requisitam precisão e equilíbrio, porém
estão comprometidas em detrimento às emoções criadas pela criança. Ao nível
da semiologia psicomotora, podem ser observados distúrbios de tonicidade,
problemas práxicos e problemas espaço-temporais (DANTAS, 2015). De acordo
com Grunspun (2003), na semiologia da psicomotricidade são relevantes a
detecção da integridade do esquema corporal, da tonicidade e do equilíbrio.

Os sinais refletem costumeiramente uma relação dupla com o universo, sendo


elas: tônica, fantasmática, emocional, simbólica e vivenciada; motriz, tanto nos
aspectos objetivos como subjetivos, como também simbólicos e fantasmáticos.
Esta dualidade de relação traduz todas as formas de se expressar, relacionar, agir,
pensar e se comunicar. Desse modo, o sinal psicomotor não apresenta em sua
contextualização a lógica neuromotora ou neuropsicológica, indo além disso para
uma analogia que corresponde a outros aspectos, lesões, funções e situações.

Portanto, há a necessidade de se obter duas vertentes semiológicas: uma


relacionada ao corpo real e à maneira como funciona e outra relacionada ao corpo
psicológico e imaginário, cada qual delimitando sua perspectiva de atuação. Sobre
cada qual, vamos ver alguns aspectos: a clínica médica atua sob o aspecto do ver
o positivo no objeto e espaço. Já a clínica psicomotora contextualiza o olhar e o
desejo, colocando em jogo tanto o corpo como a palavra, ou seja, o corpo real e o
simbólico (FERNANDES; GUTIERRES FILHO, 2012).

3.1 PROBLEMA PSICOMOTOR


Como conceituar um problema psicomotor? Fernandes e Gutierres Filho (2012, p.
139) o definem como “um estado afetivo penoso, uma insegurança causada no corpo
por uma emoção que modifica algo ao inverter a ordem natural da realidade, tentando
dominar, pela persuasão o espírito do outro e fazendo alterar a sua intencionalidade”.
Seria então o sintoma uma defesa da psiquê frente a um desarranjo psíquico ou
biológico, tendendo a expressar-se através da via privilegiada do corpo. Dantas
(2015) cita em seu artigo o nome perturbação ao problema psicomotor, referindo-
se ao fato destas perturbações serem muito frequentes hoje em dia, reforçando a
importância da psicomotricidade como intervenção possível em uma criança com
essas perturbações. Podemos então, por essa definição, dizer que as alterações
psicomotoras resultarão em problemas psicomotores, referentes às dificuldades
afetivo-emocionais, expressando-se em problemas no controle motor do corpo.
Portanto, as alterações psicomotoras traduzem-se por problemas no desenvolvimento
motor infantil, ocasionados por questões de cunho emocional. O quadro a seguir
expressa as alterações psicomotoras e suas respectivas características: 131
Fundamentos da Psicomotricidade

QUADRO 2 – ALTERAÇÕES PSICOMOTORAS E RESPECTIVAS CARACTERÍSTICAS


Agitação Aceleração e exaltação de toda a atividade motora, geralmente secundária
psicomotora a taquipsiquismo proeminente. Costumeiramente associada a conflitos e
à conduta agressiva direcionada ao mundo externo, outras pessoas ou
elementos.
Lentificação Traduz-se pela desaceleração da atividade psíquica, denominada
psicomotora bradipsiquismo, apresentando toda a atividade motriz voluntária lenta,
morosa, denominada “inibição psicomotora”.
Estupor A atividade espontânea é perdida globalmente, em que está vigente tanto
o grau de consciência como a capacidade sensório-motora preservados
e de capacidade sensório-motora para que se reaja ao ambiente. Estão
aqui envolvidas atividades voluntárias tais quais comunicação verbal e
não-verbal, mímica, olhar, gesticulação e marcha. Poderá haver restrição
ao leito. O tônus poderá se apresentar como hipertonia e hipotonia.
Catalepsia Exacerbação tônica comprometendo a mobilidade passiva de muitos
segmentos corporais. Há hipertonia do tipo plástico da musculatura
globalmente.
Estereotipias Repetições automáticas e padronizadas de certa ação motora, sinalizando
motoras perda do controle voluntário do domínio motor, em que há repetição
gestual. Exemplificando, há repetição de gestos manuais várias vezes ao
dia. Normalmente está vinculado a quadros de alterações do psiquismo
como a esquizofrenia.
Maneirismo Modo de estereotipia motora que se caracteriza por movimentos
excêntricos, normalmente elaborados, que vão na busca de algum
objetivo, mesmo que bizarro, esdrúxulo.
Tiques Atitudes coordenadas, repetitivas, que resultam de contrações rápidas
e intermitentes e que, normalmente, envolvem um grupo de músculos
atuando em suas relações de acordo com o normal, acentuando-se mais
quando há ansiedade.
Conversão Emergência aguda de sintomas físicos, como paralisia, cegueira,
anestesias, parestesias, etc., de causa psicogênica, ocorrendo
normalmente em circunstâncias de estresse, ameaça ou conflito
intrapsíquico ou interpessoal significativos.
Flexibilidade O indivíduo ou parte dele (segmentos) é posicionado por um examinador,
serácea permanecendo imóvel: “Homem de Cera”, ocorrendo na esquizofrenia
catatônica.
Cataplexia Perda repentina do tônus muscular com queda, comum nos quadros de
narcolepsia.
Apraxias Impossibilidade ou dificuldade em executar atos ou gestos complexos,
por lesão neural.
ALTERAÇÕES DA MARCHA
Captocormia O indivíduo caminha com o tronco para frente.
Abasia Impossibilidade para marcha, motivada por alterações no sistema
nervoso.
Astasia Impossibilidade de ficar em Ortostatismo.
FONTE: Adaptado de Dalgalarrondo (2008); Forte (2011).

132
Capítulo 3 DIAGNÓSTICODOSDISTÚRBIOSEASABORDAGENSTEÓRICO-PRÁTICASDEAPLICAÇÃODAPSICOMOTRICIDADE.

3.2 DIAGNÓSTICO PSICOMOTOR


Nenhum diagnóstico é possível sem que o indivíduo seja avaliado, pois
sem uma avaliação psicomotora a intervenção ocorrerá sem a individualidade,
obrigando o sujeito a se adaptar a condutas que não lhe são específicas.
Conforme Dantas (2015), quando o diagnóstico é elaborado de maneira concreta
e correta e, portanto, de maneira precoce na vida da criança, a intervenção
indicada pode diminuir o impacto dos sintomas, possibilitando assim que a vida
da criança ocorra de maneira adaptada. Esta intervenção necessita ser reavaliada
e, se necessário, ajustada aos períodos e situações de vida de cada criança, ou
seja, à medida que se desenvolve, mudam suas necessidades, as quais também
evoluem e, portanto, a maneira de intervir necessita ser congruente (DANTAS,
2015). O exame psicomotor, portanto, é instrumento necessário para a elaboração
de posterior conduta. Esse exame psicomotor deverá ter como premissas:

• A compreensão corporal por uma abordagem global, devendo ser


considerados elementos tanto relacionais como funcionais.
• “A inscrição das expressões psicomotoras do sujeito no momento atual
com seu caráter lábil” (FERNANDES; GUTIERRES FILHO, 2012, p.
139).

O diagnóstico psicológico tem seu desenvolvimento em duas divergentes


esferas, que, às vezes, em sua prática, acabam se contradizendo:

1. Utilização de instrumentos específicos para exames de operações


mentais, evidenciando comportamentos objetivos e competências
funcionais.
2. Análise das relações de afeto e da comunicação intra e interpessoal
sem relação estreita com fatores externos, funcionais, cognitivos e
comportamentais.

É óbvio que cada diagnóstico e respectivas condutas estarão vinculados à


formação profissional, aos objetivos e às metas que se deseja alcançar. Portanto,
o diagnóstico psicomotor respalda-se nas várias teorias psicomotoras, as quais
relacionam “a motricidade, o cognitivo, a afetividade e as relações. Note que temos
duas áreas da ciência: a psicologia e a medicina, uma não excluindo a outra,
ao contrário, a psicomotricidade as liga ao corpo” (FERNANDES; GUTIERRES
FILHO, 2012, p. 140).

• Objetivos do diagnóstico psicomotor: seu objetivo é reconhecer a


existência de um problema psicomotor, que exigirá um procedimento
concomitantemente subjetivo, ou seja, pela observação ativa; e objetivo,

133
Fundamentos da Psicomotricidade

através da utilização de instrumentos que possam identificar habilidades


expressivo-relacionais, possibilitando uma tradução sobre o grau das
competências concretas e potenciais e as formas de relação do indivíduo.
Este diagnóstico deverá pesquisar a atitude sempre contextualizada com
a relação. Desconsidera o atraso psicomotor e considera a interação
psicomotora que expressa, primordialmente as maneiras da relação
do indivíduo com seu próprio corpo relativo ao corpo do profissional
psicomotricista. Em suma, estabelecer um diagnóstico não é tarefa fácil,
em detrimento à complexidade do ser humano (GROSS, [s/d]).

3.3 EXAME PSICOMOTOR


O exame psicomotor não deve se restringir à detecção de funções do sistema
piramidal, extrapiramidal ou cerebelar, em que os distúrbios são sistematizados
e vinculados a uma ação motora ou não. Deve, portanto, avaliar a motricidade
holisticamente, tanto pela realização motora como pela intenção de desejo de
realizar este movimento, avaliando o corpo relacionado ao espaço e períodos
vividos e formais. Portanto, conhecer as metodologias para a realização da
avaliação dos fatores psicomotores, designadamente da tonicidade, equilíbrio,
lateralidade, noção de corpo, estruturação espaço-temporal, praxia global e praxia
fina, bem como conceitualizar a sua interpretação clínica, como referência para o
estabelecimento de um programa pedagógico-terapêutico em crianças, faz parte
dos objetivos da semiologia em psicomotricidade.

O que queremos dizer é que deve ser considerado, no sintoma psicomotor,


“gestos, posturas, tônus emocional-relacional, a característica do movimento
e como o sujeito está envolvido na ação-relação com todas as decorrências
vinculadas à identidade do sujeito” (FERNANDES; GUTIERRES FILHO, 2012, p.
140). Podemos dizer que este exame não se trata de ser estudado pela descrição
dos outros, mas sim do que ele próprio fala.

O exame psicomotor deve ter como objetivo o reconhecimento de que forma


a criança lida com seu corpo por meio de alguma atividade, usando seu corpo
como instrumento de relação com os outros em um tempo e espaço e em um
nível que possibilite prazer ao avaliado. Há vários testes que podem ser úteis para
orientar e referenciar a avaliação, desde que sejam utilizados completamente e
associados à abordagem dinâmica. Os diagnósticos realizados por médicos e
neurológicos auxiliam na intervenção profissional, mas não substituem os que
são adquiridos pelo observacional. Podem inclusive ser utilizados como apoio dos
testes de inteligência que, se preciso, necessitam ser aplicados por uma psicóloga
da equipe multidisciplinar (AREDES, 2009).

134
Capítulo 3 DIAGNÓSTICODOSDISTÚRBIOSEASABORDAGENSTEÓRICO-PRÁTICASDEAPLICAÇÃODAPSICOMOTRICIDADE.

Este exame deve ser composto por provas de maior exatidão, que
requeiram, caso possível, tanto o paciente colaborando como momentos em
que possa ocorrer observação espontânea. Com certeza será mais preciso se
houver a oportunidade das duas situações no decorrer do exame, possibilitando
uma análise mais criteriosa da atividade do paciente nos graus de consciência e
inconsciência.

Com relação ao exame psicomotor, ele deverá ser aplicado respeitando a


faixa etária da criança. Por exemplo, em crianças de 0 a dois anos, deverão ser
avaliadas as atividades reflexas em resposta à estimulação sensorial; evolução
das posturas: sentada, de pé e de marcha. Já para uma criança de dois a cinco
anos, deverão ser observados como comportamentos a coordenação óculo-
manual, coordenação dinâmica geral, equilíbrio, controle do próprio corpo,
organização perceptiva e linguagem.

Conforme o que foi expresso em consonância ao desenvolvimento


psicomotor, para a identificação de problemas de psicomotricidade, devemos
considerar que cada criança é única. Esta é a importância de conhecê-la em
um todo, identificando seus déficits para poder auxiliá-la. Para detectar se a
criança apresenta problemas de psicomotricidade, deve-se realizar a avaliação
psicomotora, por meio de exercícios específicos, que averiguem os seguintes
aspectos: qualidade do tônus, se há rigidez ou relaxamento muscular; a qualidade
do gesto como a dissociação manual e dos membros superiores e inferiores;
agilidade; equilíbrio; coordenação; lateralidade; organização temporoespacial;
grafomotricidade (GROSS, [s/d]). Essa avaliação pode revelar, na criança,
respeitadas as características próprias do seu desenvolvimento, se existem
atrasos no desenvolvimento motor e perturbações de equilíbrio, coordenação,
lateralidade, sensibilidade, esquema corporal, estrutura e orientação espacial,
grafismo, afetividade etc. Esses problemas podem ser detectados tanto na Pré-
escola como nas séries iniciais, em maior ou menor grau, ocorrendo de diversas
causas, tais como: debilidade intelectual; problemática emocional; retardos de
maturação; desarmonias tônico-motoras (GROSS, [s/d]).

3.4 ESTUDO DA FUNÇÃO MOTORA:


MODELO TEÓRICO
Apenas o panorama psicomotor, calcado no resumo das várias disciplinas,
possibilitará ao movimento significado completo, subjetivo e objetivo. Pode-se,
portanto, contrapor várias modalidades de pesquisa da função motora, cada qual
com sua semiologia e objetivo, tendo como menção um modelo teórico próprio
(FERNANDES; GUTIERREZ FILHO, 2012).

135
Fundamentos da Psicomotricidade

Conforme Fernandes; Gutierres Filho (2012, p. 144-145):

Sobre um modelo neurológico clássico, o objetivo é verificar a


integridade do Sistema Nervoso; sobre um modelo neurológico
menor: o objetivo é verificar a integração neurofisiológica
entre o órgão, a estrutura e a função; sobre o modelo
neuropsicológico: o objetivo é verificar a organização práxica
e as funções simbólicas; no modelo psicológico, o objetivo
é a análise da idade motora e/ou cognitiva; no modelo
psicodinâmico, o objetivo é verificar a personalidade do sujeito
e a estruturação do seu “eu”; no modelo psicomotor, o objetivo
é analisar a qualidade motora, o movimento expressivo da
vida emocional, a relação psicomotora e o estilo psicomotor do
corpo em relação.

3.5 TOMADA DE DECISÃO CORPORAL


É importante entender que há necessidade de um diagnóstico preciso para
que se possa tomar decisões viáveis na terapia. Veja um exemplo: quando uma
criança tem déficits tanto no âmbito funcional como na expressão e comunicação,
a psicomotricidade deve priorizar o trabalho do corpo concomitante a um trabalho
verbal. A finalidade da tomada de decisões para uma intervenção nas perturbações
psicomotoras é oferecer à criança uma maior autonomia comportamental, física,
cognitiva e emocional. Planejar um programa de intervenção psicomotora tem por
objetivo possibilitar o autocontrole, usando métodos que auxiliem a criança a falar
por si própria. Há, ainda, a chance de propiciar ajudas do exterior, recrutando
estímulos importantes para a execução de uma atividade, objetivando prevenir o
excesso de informação.

A psicomotricidade como maneira de intervenção por intermédio do corpo


fornece um recurso mais importante para responder às muitas circunstâncias em
que a adaptação está comprometida, e em que é necessário um entendimento
interligado do funcionamento da criança nas muitas dimensões comportamentais,
partindo do motor, dirigindo-se ao afetivo até ao cognitivo (DANTAS, 2015). Isso
se justifica pelo fato de poder oferecer à criança a chance para que seu corpo fale
e de fazê-lo significativo na relação com o outro. Em um segundo momento, o
terapeuta poderá realizar um trabalho funcional relacionado à psicopedagogia ou
pedagogia. Há dois planos de modalidades de ação para trabalhar a experiência
corporal, a saber (FERNANDES; GUTIERREZ FILHO, 2012):

• Psicomotricidade: fornece ao corpo agido, àquele que se expressa,


fala e desenvolve ações e reações, a possibilidade do surgimento da
própria identidade, favorecendo assim que se estabilize a relação afetiva

136
Capítulo 3 DIAGNÓSTICODOSDISTÚRBIOSEASABORDAGENSTEÓRICO-PRÁTICASDEAPLICAÇÃODAPSICOMOTRICIDADE.

e funcional com o próprio corpo e para com o outro, o espaço, o tempo


e o objeto. Este experimento favorece expressar e resolver os conflitos,
procurando outras soluções diante dos contratempos relacionais e/ou
funcionais, a solução da proporção afetiva de maneira a usar o corpo de
maneira real e adaptativa. Aqui o objetivo é adquirir, por meio da distância
do próprio questionamento, do controle do corpo, que caminha tendo
uma perspectiva do real, controle das emoções, pensamento, relação e
realidade (FERNANDES; GUTIERREZ FILHO, 2012).
• Relaxação: este é um experimento que traz a compreensão do corpo
vivido, na inexistência de uma ação real, possibilitando a emergência
e a extensão dinâmica do local simbolizado sem qualquer restrição
espaço temporal. A relaxação, quando experiência tônico-emocional
e fantasmática, possibilita ao corpo reviver e restabelecer, através da
relação primária, um certo diálogo tônico-emocional do indivíduo consigo
e com o outro (FERNANDES; GUTIERREZ FILHO, 2012).

Neste tópico você aprendeu que a semiologia psicomotora deve abranger


não somente a causa das disfunções psicomotoras, mas também as dimensões
tônico-emocionais, não separando a objetividade da subjetividade. Pôde
acompanhar também que a investigação do processo de evolução da criança e
a detecção de problemas relativos ao seu desenvolvimento psicomotor fornecem
dados para a interpretação do diagnóstico correto, propiciando uma intervenção
precoce em atrasos do desenvolvimento e a implementação de programas de
estimulação para crianças com distúrbios de desenvolvimento, em risco, ou
apenas com o propósito de enriquecimento do ambiente motivador. É por meio
da semiologia psicomotora que deverá ser detectado o problema psicomotor, para
que sejam adotadas as intervenções específicas, possibilitando assim a tomada
de decisões.

4 APLICAÇÃO DAS TEORIAS DA


PSICOMOTRICIDADE
A psicomotricidade, como ciência, evoluiu em sua história até seu processo de
consolidação, várias influências científicas de distintos campos do conhecimento,
surgindo práticas e teorias objetivando trabalhar e compreender o corpo. É
óbvio refletirmos que houve várias desconformidades teóricas que provocaram
algumas desarmonias relacionadas ao olhar e como trabalhar o aspecto corpóreo
das pessoas. Partindo dessa premissa, será apresentada neste tópico uma
abordagem sobre como as teorias sobre a psicomotricidade estão sendo postas
em prática e quais suas contribuições no contexto da psicomotricidade.

137
Fundamentos da Psicomotricidade

• Aplicações da teoria de Jean Le Boulch

Para o francês Jean Le Boulch, a corrente educativa da psicomotricidade


emergiu na França, em 1966, pelo aspecto frágil da Educação Física, em que os
profissionais educadores físicos não conseguiam o desenvolvimento de educação
integral do corpo (FERREIRA, 2006). Ele acreditava que esses profissionais
focavam a prática pedagógica em aspectos relacionados à realização dos
movimentos, objetivando que a ação educativa chegasse a movimentos
perfeitos, de maneira mecânica (LE BOULCH, 1983). Soares (1996) cita que a
psicomotricidade na educação física das escolas brasileiras ocorreu como o
primeiro movimento, a partir da década de 70, que articulava o desenvolvimento da
criança concomitantemente ao ato do aprender, por meio de processos cognitivos,
afetivos e psicomotores. Buscava, portanto, a integralidade na formação dos
educandos, rompendo assim com o dualismo cartesiano corpo-alma. Integra-se,
então, o movimento na formação da personalidade humana.

Conforme a definição de Le Boulch (1987a), a psicomotricidade é uma ciência à


luz de procedimentos motores por expressão do amadurecimento e desenvolvimento
da totalidade psicofísica do homem, fazendo com que seja descoberto o corpo
por meio da relação do mundo interno com o externo e a sua competência de se
movimentar e agir. Dessa maneira, possibilitar tanto ao adulto como à criança
manifestar suas ações e movimentos de maneira harmoniosa, usando o corpo.

A educação psicomotora de Le Boulch (1983) expressa relevância a uma educação


do corpo que vá ao encontro de um desenvolvimento na totalidade do indivíduo,
apontando como objetivo principal na escola o preparo ao aluno para a vida. Usa
metodologias pedagógicas revigoradas, auxiliando a criança para que se desenvolva
da melhor forma possível, proporcionando dessa maneira uma adequada formação
da vida social dos alunos. Para alcançar essa premissa, a educação psicomotora visa
trabalhar na profilaxia de problemas de déficits escolares de muitas causas, como:
“afetividade; leitura e escrita; atenção; lateralidade e dominância lateral; matemática e
funções cognitivas; socialização e trabalho em grupo” (CASTRO, 2009, p. 1).

Para Le Boulch (1983), o intuito primordial da educação através do movimento


no ensino fundamental é auxiliar para que ocorra o desenvolvimento psicomotor
dos alunos e para alcançar esse objetivo, os alunos dependem simultaneamente
das suas evoluções de personalidade, bem como de seus êxitos escolares. Sob
essa ótica, a psicomotricidade atua baseada no esquema e imagem corporal.

No término dos anos do ensino fundamental, a educação psicomotora se apropria


de situações-problemas para desenvolver as funções perceptivas (de interiorização),
percepção e estruturação do espaço, e a percepção temporal. Procura otimizar e
reforçar determinados fatores de execução, a saber: “força muscular, a flexibilidade

138
Capítulo 3 DIAGNÓSTICODOSDISTÚRBIOSEASABORDAGENSTEÓRICO-PRÁTICASDEAPLICAÇÃODAPSICOMOTRICIDADE.

articular, velocidade, resistência e tolerância; e ainda procura melhorar as soluções


posturais e gestuais; utilizando também os jogos com regras e jogos esportivos, e por
último as atividades de expressão rítmica” (CASTRO, 2009, p. 1).

A educação psicomotora de Jean Le Boulch utilizada no ensino fundamental


é direcionada às crianças de seis a doze anos, incluindo crianças com certo tipo
de déficits escolares, auxiliando-as a se desenvolver da melhor forma possível,
objetivando uma preparação para a vida social dos alunos (CASTRO, 2009).

Atualmente, fixar uma distinção inflexível entre a psicomotricidade


e a educação física, parece não ser inteligente, visto os educadores
poderem usufruir de características de ambas as abordagens na
prática pedagógica (FERREIRA, 2006). Quais diferenças podemos
apontar entre a educação física e atividade psicomotora?

• Aplicações da teoria de Vitor da Fonseca

Vitor da Fonseca, português, é doutor em Neuropsicologia da psicomotricidade


e ainda desempenha as funções de docente das disciplinas de Perturbações
do Desenvolvimento, Psicomotricidade e Dificuldades de Aprendizagens.
Segundo Fonseca (1988, p. 12), “a psicomotricidade constitui uma abordagem
multidisciplinar do corpo e da motricidade humana. Seu objetivo é o humano total
em suas relações com o corpo, sejam elas integradoras, emocionais, simbólicas
ou cognitivas, propondo-se desenvolver faculdades expressivas do sujeito”.

Na opinião de Fonseca (1988), a psicomotricidade corresponde a uma


previdência preventiva essencial, capaz de favorecer à criança a transformação
de comportamento que as aprendizagens escolares obrigam. A sua importância
consiste em avaliar e diagnosticar se há obstáculos familiares e sociais que
impossibilitam o desenvolvimento global da criança, em que evoluir seu esquema
corporal, sua ordenação espaço-temporal e seu desenvolvimento psicotônico
invade um espaço infra-estrutural de toda a atividade psíquica superior.
Fonseca (1998) preocupa-se com os déficits escolares, como as dificuldades
de aprendizagem, as conhecidas D.As: dislexias, discalculias, as disgrafias,
as disortografias, o que ele chama de as epidemias das escolas, que para ele
apresentam-se como resultado de uma deficiência de adaptação psicomotora,
englobando questões de desenvolvimento motor de organização espacial,
dominância lateral, construção práxica e estabilidade emotiva-afetiva, podendo
refletir em modificações do comportamento da criança.

139
Fundamentos da Psicomotricidade

O trabalho psicomotor de Fonseca é feito em escolas, clínicas e clubes, tendo


caráter preventivo, dirigido a alunos que não possuem déficit escolar; terapia
psicomotora, destinada a alunos com problemas de aprendizagem, como também
um olhar para portadores de necessidades especiais. Como Fonseca avaliaria
essas situações? Lembram da BPM, definida no Capítulo 2? A BPM (bateria
psicomotora), elaborada por Fonseca (1995), consiste em um instrumento
indicado para a avaliação psicomotora de crianças com déficit de aprendizagem.
É por meio desse instrumento que avaliaria o perfil do aluno (CASTRO, 2009).

Segundo Fonseca (1988, p. 368):

a identidade da Psicomotricidade e a validade dos conceitos que


empregam para se legitimar revelam uma síntese inquestionável
entre o afetivo e o cognitivo, que se encontram no motor. É a
lógica do funcionamento do sistema nervoso, em cuja integração
maturativa emerge uma mente que transporta imagens e
representações e que resulta de uma aprendizagem mediatizada
dentro de um contexto sócio-cultural e sócio-histórico.

“Uma dificuldade (ou distúrbio) de aprendizagem refere-se a


um atraso, desordem ou retardo do desenvolvimento em um ou mais
processos da fala, leitura, escrita, aritmética ou outro resultado escolar do
sujeito causado por uma desvantagem psicológica devido a uma possível
disfunção cerebral e/ou distúrbios emocional ou comportamental. Ela não
é o resultado de retardo mental, privação sensorial ou de fatores culturais e
educacionais” (LEAL; NOGUEIRA, 2012, p. 53). Conceituamos a dislexia
do desenvolvimento como um transtorno específico de aprendizagem de
causa neurobiológica, apresentando como características dificuldade em
reconhecer precisamente e/ou fluentemente a palavra, na habilidade de
decodificação e em soletração (ABD, 2016). Sobre a discalculia, podemos
conceituá-la como um transtorno específico de aprendizagem com
prejuízo no domínio da matemática, não podendo ser justificada por
outras alterações neurológicas, sensoriais, motoras e/ou cognitivas
(INSTITUTO ABCD, 2019). Já a disgrafia pode ser definida como uma
alteração que afeta a funcionalidade da escrita desenvolvida pela criança.
Por fim, a disortografia se diferencia da disgrafia, por estar relacionada
a uma deficiência que afeta as aptidões da escrita, ou seja, é um déficit
centrado na estruturação, organização e produção de textos escritos
(INSTITUTO NEUROSABER, 2018).

140
Capítulo 3 DIAGNÓSTICODOSDISTÚRBIOSEASABORDAGENSTEÓRICO-PRÁTICASDEAPLICAÇÃODAPSICOMOTRICIDADE.

• Aplicações da teoria de André Lapierre e Bernard Aucouturier

André Lapierre, criador da Psicomotricidade Relacional, conceituada como um


método, ressalta o importante vínculo que há entre o indivíduo, a motricidade, a
psique, a afetividade, a emoção e o cognitivo, objetivando descartar as chances de
se realizar uma abordagem psicopedagógica e terapêutica limitada, insatisfatória,
pobre e ineficaz e, principalmente, deletéria ao desenvolvimento infantil. Santos
(2011) cita que André Lapierre e seus colaboradores, na década de 60, seguem
a trajetória da Psicomotricidade Relacional, ora praticada por educadores,
reeducadores e terapeutas em geral, referindo-se ao âmbito pedagógico como seu
maior campo de atuação. Essa prática prioriza a comunicação verbal espontânea,
mas enfatiza a não verbal, por intermédio do corpo e da corporeidade, em que o
componente e a vivência simbólica dos conflitos mais profundos apresentam um
conteúdo inconsciente que passa a ser comunicado. Esse conteúdo é, então,
trazido e revelado, possibilitando, assim, aos necessitados de educativa especial
e/ou dificuldade de aprendizagem, desvendar seus déficits relacionais e ajudando
a superá-los. Dessa maneira, essa prática atua positivamente nos aspectos psico-
afetivos relacionais, tendo como proposta criar um espaço de liberdade, favorável à
realização de jogos e brincadeiras, que poderão atuar como facilitadores no processo
de expressão e exteriorização dos conflitos internos, atuando a Psicomotricidade
Relacional diretamente nas dificuldades de adaptação escolar e social.

Na década de 70, por meio de André Lapierre, estabelece-se definitivamente


a Psicomotricidade Relacional. Insere-se nesta prática de André Lapierre e
Bemard Aucouturier (1977 a 1980), André e Anne Lapierre, em 1982, os quais
procuram o reencontro com a esfera psíquica do corpo e a esfera corporal do
psiquismo (SANTOS, 2011).

Os teóricos valorizam a simbologia dos gestos, isto é, estudar a interpretação


dos símbolos contextualizados no gesto dos indivíduos. Calcada em uma pedagogia
do respeito e da descoberta, a psicomotricidade no ensino fundamental, segundo
os teóricos, vem a ser caracterizada como um trabalho psicopedagógico inédito, em
que as condutas preestabelecidas e sua determinação ocorre pelas intenções e por
meio da proposição de que só se transmite bem aquilo que se vive. Psicomotricistas
ajudam as crianças em seu processo de aprendizagem, por meio de um tripé,
composto por: afeto, cognição e motricidade (CASTRO, 2009; SANTOS, 2011).

Qual então seria o contexto relacional estabelecido pelos teóricos? A


priorização da relevância da vida em grupo, em que esta ação pedagógica será
um estudo permanente: “aberta à criatividade das crianças, à observação e à
análise de seus comportamentos e à própria criatividade dos teóricos em questão,
os quais propõem novas direções de pesquisa às crianças (e aos adultos) com
o intuito de sondar seus reais interesses” (CASTRO, 2009, p. 1). Essa prática

141
Fundamentos da Psicomotricidade

possibilita o convite à autonomia criativa, tornando-se imprescindível repensar


tanto a escola tradicional quanto a formação dos educadores. Apenas alterando os
valores, prestigiando o ser ao invés do ter, isto é, focando a atenção no processo
de evolução do indivíduo é que será favorecida a sua integralidade.

A Simbologia do Movimento procura enaltecer o simbolismo do gesto, seu


significado primitivo, mostrando que a prática psicomotora por si só é uma maneira
de simbolização. Esses teóricos, apesar de tomarem posse de algumas teorias
Freudianas, Walloriana, Piagentianas, entre outros autores, não se subordinam a
escola de pensamento alguma. Buscam conceitos etológicos (comportamento animal),
ontogenéticos (origem e desenvolvimento de um organismo desde o embrião);
filogenéticos (organismos vivos e as relações existentes entre eles) ou existenciais.
Aqui a educação é encarada como o desenvolvimento das potencialidades individuais
de cada criança, sentido abrangente que possibilita a inexistência da reeducação,
propondo que tudo se transforma em educação (CASTRO, 2009). Para Lapierre e
Aucouturier, o jogo e a brincadeira infantil são aspectos básicos e fundamentais na
prática psicomotora dentro do contexto pedagógico, uma vez que eles trazem questões
do consciente e inconsciente (SANTOS, 2011, p. 32). O contexto relacional consiste
em um elo da prática relacional, em que o psicomotricista necessita apresentar
disponibilidade para escutar permanentemente o outro. Essa escuta possibilitará
ajuste constante e recíproco gerando acordos, os quais podem se apresentar de forma
alternada, complementar, cooperacional, em que deverá haver colaboração.

Com relação à prática da psicomotricidade relacional: no ambiente escolar,


na abrangência psicopedagógica, sua atuação se identifica de maneira mais
preventiva, procurando maximizar o desenvolvimento integral das crianças,
trabalhando no aspecto positivo nas relações interpessoais, reafirmando e
renovando-as. No ambiente empresarial, introduz seus preceitos na área de gestão
de pessoas, com o intuito de propiciar maior integração, estimular a criatividade
e a autoconfiança. Prega as premissas de que a relação é a base para o
desenvolvimento das qualidades pessoais, procurando resgatar a autoafirmação,
autoestima e sucesso pessoal do colaborador e da própria organização. No
âmbito da clínica, tem caráter menos preventivo, com demanda mais específica,
contextualizando as alterações oriundas do campo motor, psico-social e do
aprendizado, nas dimensões afetivas e cognitivas. Apresenta suas características
próprias, contando com sessões individuais, como também em algumas condutas
especiais como a amnésia e o processo de estabelecer diagnóstico em público
infantil necessitam da participação da família e escola (SANTOS, 2011).

• Aplicações da teoria de Julian de Ajuriaguerra

Julian de Ajuriaguerra (1911-1993), francês de origem espanhola,


neuropsiquiatra, psicanalista, pesquisador e teórico, discípulo de Henri Wallon,

142
Capítulo 3 DIAGNÓSTICODOSDISTÚRBIOSEASABORDAGENSTEÓRICO-PRÁTICASDEAPLICAÇÃODAPSICOMOTRICIDADE.

tem seus estudos aprofundados no campo da patologia, descrevendo de maneira


objetiva os transtornos psicomotores que cursam entre o neurológico e o psiquiátrico,
rearranjando o conceito de debilidade motora ao tratá-la como uma síndrome
com todas as suas particularidades. Seu campo de atuação mais proeminente é a
neuropsiquiatria infantil, atrelando o desenvolvimento infantil ao neurológico. Adepto
da interação médicopedagógica, conceito esse registrado em seu Manual da
Psiquiatria Infantil (SANTOS, 2011). Para Fonseca (2008), este teórico delineou com
clareza os transtornos psicomotores, alternando entre o psiquiátrico e o neurológico.
Vamos aqui citar Leo Kanner, psiquiatra austríaco, nascido em 1894, que em 1943
descreveu a síndrome do aspecto autístico como um distúrbio de desenvolvimento.
Para Leo Kanner, o autismo é um distúrbio de desenvolvimento que se traduz por
falta de capacidade de relacionamento com os outros, acarretando em atrasos e
erros na utilização da linguagem, ser obcecado na manutenção do ambiente sem
alterações a e atitudes com repetições (GAUDERER, 1985).

Vamos apresentar agora a relação entre a aplicação da teoria de Ajuriaguerra


e as dificuldades escolares das crianças, tema abrangente, em que o teórico
resgata a possibilidade de deficiências instrumentais cognitivas ou orgânicas,
inserindo o que denominou “distúrbios de personalidade” em evolução, nos quais
os conflitos propiciariam gerar desde uma negativa aberta à escola, caracterizada
por comportamentos oposicionistas, surtos de raiva e cólera, ou uma negativa
passiva, explícita como uma falta de interesse. Nesse mesmo sentido de causas,
contextualiza as síndromes de inibição intelectual, em que as crianças sofrem
pela falta de dedicação à atividade intelectual, mesmo que queiram, originando
como efeito uma gama de comportamentos, vinculados à atenção e fixação de
conhecimentos, comprometendo assim o aprendizado (LIMA, 2015).

Considerar esses distúrbios e associá-los à personalidade não ganham de


Ajuriaguerra explicações mais detalhadas. Com relação aos transtornos relacionados
à aprendizagem e à vida escolar, o que encontramos no Manual de Ajuriaguerra é,
incontestavelmente, uma categorização mais ampliada em relação à proposta por
Kanner, que considerava o autismo como uma lógica restrita a fatores orgânicos.
Podemos perceber que Ajuriaguerra é fiel perante um molde analítico da função,
caracterizado pela procura de relações funcionais entre os fatos que sempre está
propensos a uma adaptação do sujeito ao contexto em que está inserido (LIMA, 2015).

As contribuições de Kanner e Ajuriaguerra identificaram a forma como,


no início do século XX, evoluiu o questionamento, no campo da psiquiatria,
das abordagens relacionadas à criança e, em específico, das dificuldades de
aprendizagem.

Ajuriaguerra desenvolveu vários estudos que põem em questão cada um dos


fatores até então vinculados como prováveis motivos da incapacidade de leitura.

143
Fundamentos da Psicomotricidade

Ajuriaguerra (1983, p. 318) cita estes distúrbios como:

distúrbios perceptivos, distúrbios de linguagem, distúrbios


da organização espaço-temporal, distúrbios de lateralização,
distúrbios afetivos e fatores constitucionais, relativos à herança
genética. Sem chegar a alguma conclusão, questiona-se
se seria mais apropriado falar de dislexias, conforme alguns
autores germânicos que distinguiriam então uma dislexia verbal
e auditiva de uma dislexia espacial ou uma dislexia óptica,
em relação com imagens visuais deformadas, e uma dislexia
acústica, que consiste em surdez para matizes fonéticos.

Conforme Ajuriaguerra (1988), a escrita é um hábito e linguagem, sendo


construída por meio da organização motriz, coordenação fina dos movimentos.
É uma tarefa que respeita exigências exatas de estruturação espacial, visto a
criança elaborar sinais orientados e unidos conforme regras, transformando a
escrita em uma atividade espaço-temporal.

• Aplicações da teoria de Jean Piaget

Considerado um dos maiores conhecedores do desenvolvimento cognitivo, Jean


Piaget (1896-1980), transforma-se em um dos mais relevantes representantes da
psicologia da aprendizagem e do desenvolvimento, derrubando os protótipos educacionais
da época. É considerado o pai do construtivismo, compreendendo que, desde o
nascimento até o início da adolescência, a mente infantil perpassa os quatro estágios,
findando quando se alcança a capacidade total do raciocínio. Piaget compreende o corpo
como um instrumento da inteligência, e considera que a intervenção da motricidade na
inteligência ocorre previamente à aquisição da linguagem (SANTOS, 2011).

Seus ensinamentos saíram da literatura e hoje podem ser vistos na prática e


dentro das salas de aula. Considera-se relevante salientar que, atualmente, com o
ensino de nove anos e o aluno ingressando no ensino fundamental precocemente,
somado à lei do “não reprovar”, surge a necessidade de se retornar aos estudos
de Piaget, principalmente no que tange aos estágios que ele propõe, no afã
tentativa de reforçar que é preciso repensar as propostas pedagógicas para este
novo momento da educação (MASTELLA, 2014).

Mastella (2014) cita, em seu artigo, ser primordial o entendimento do


desenvolvimento humano dentre os primeiros anos de vida, capacitando assim o
educador, o qual deve adquirir esta aptidão para compreender as características
psíquicas, biológicas e comportamentais da criança em determinada etapa
específica de seu crescimento, propiciando a detecção de prováveis déficits no
processo, como também a intervenção adequada. Essa é a contribuição de Jean
Piaget para a vivência prática, o qual buscou a compreensão dos mecanismos

144
Capítulo 3 DIAGNÓSTICODOSDISTÚRBIOSEASABORDAGENSTEÓRICO-PRÁTICASDEAPLICAÇÃODAPSICOMOTRICIDADE.

mentais que o ser humano usa na captação do mundo e averiguou o processo


do constructo do conhecimento, baseado na evolução do pensamento até a
adolescência. Esse conhecimento revolucionou a forma de pensar sobre a infância.

Segundo Lefrançois (2008 apud GOMES; GHEDIN, 2012, p. 229), “a teoria


de Piaget causou um grande impacto no currículo escolar ao enfatizar que a
aprendizagem é muito mais do que apenas deslocar informações de fora para
dentro da criança”. Desse modo, surgiu o construtivismo, o qual consiste em
uma abordagem para ensinar e aprender, na qual a criança tem papel central
e ativo na construção do conhecimento. Esse método construtivista parte do
princípio de que a criança deve ser estimulada a pensar criticamente e de forma
independente, ou seja, que o aluno seja capaz de construir coisas novas a partir
de sua ação e mediação de seu professor. A teoria Piagetiana defende a ideia
de que só há aprendizado quando houver desenvolvimento. Em outras palavras,
o indivíduo desenvolve-se e isso o leva a aprender sobre o mundo e sobre si
próprio. Veja que ele reforça que a maturação, experiência ativa, equilibração e
interação social são as forças modeladoras do aprendizado. Portanto, em sala de
aula, é necessário que se respeite a ocasião em que o indivíduo esteja apto para
aprender certo conteúdo, propiciando a ele experiências nas quais consiga agir
ativamente no processo, atingindo um equilíbrio entre o que ele já conhece e o
que lhe é novo e que necessita adquirir conhecimentos por meio da interação com
outros indivíduos. Portanto, na prática, é necessário que o professor considere
esses aspectos para que haja a efetivação do aprendizado e construção de
conhecimentos de seus alunos (GOMES; GHEDIN, 2012).

Piaget colocou para a educação, a inspiração de considerar que o


conhecimento não é algo finito, mas sim um processo de formação de distintos
estados atingidos pelo conhecimento (GOMES; GHEDIN, 2012). A teoria piagetiana
possibilita ao professor saber quando ensinar certo conteúdo e de que maneira
deve ser ministrado, pois por meio dos estágios estudados, há a possibilidade de
identificar o desenvolvimento dos indivíduos e o que lhes é adequado aprender em
determinado estágio. Resumindo, torna-se relevante o respeito ao desenvolvimento
do aluno e a maneira como ele aprende, cabendo ao professor propiciar ao indivíduo
as chances necessárias para essa construção (GOMES; GHEDIN, 2012).

• Aplicações da teoria de Henri Wallon

Henri Wallon (1879-1962), médico, psicólogo e educador, tem sua biografia


calcada em um perfil de um teórico que procurou a integração entre a atividade
científica e a ação social. A teoria de Wallon é muito promissora à ciência
psicomotora, visto este teórico, ao pesquisar o desenvolvimento infantil, ter focado
a motricidade, buscando nela o surgimento da emoção e da razão. São muitas
as abordagens da psicomotricidade que podem ser contextualizadas, a partir de

145
Fundamentos da Psicomotricidade

Wallon (CARVALHO, 2003, p. 1) “a exemplo a formação da imagem corporal e dos


distúrbios psicomotores; porém optamos, nesta oportunidade, por refletir sobre os
rumos mais gerais que a Educação Psicomotora tende a assumir, ao adotarmos
a psicogenética walloniana como referência básica”. Seus estudos e observações
entre centenas de crianças em ambiente e circunstância hospitalar, bem como de
adultos mutilados da guerra, direcionaram-no para a formulação do desenvolvimento
em fases conforme descrito no Capítulo 1, no qual retratamos os principais teóricos
da psicomotricidade, suas ideias, fundamentos e princípios, contribuindo cada qual
para que a psicomotricidade evoluísse como uma ciência de vários saberes.

Dantas (1983) destaca que, sob a ótica de Wallon, há a constatação da


simultaneidade dos progressos intelectuais e transformações praticadas no domínio
da personalidade. Portanto, para Wallon, a condição mais relevante para a formação
da personalidade não está no meio físico, mas sim no meio social. Sob esta projeção,
devemos compreender que a Educação Psicomotora deve objetivar, sobretudo,
as funções comunicativas-afetivas-sociais, traduzida pela motricidade de relação,
movimentos e respectivos objetivos de seus sujeitos. Queremos expor que sua teoria
privilegia a interação educador-educando e educando-educando em uma esfera
psicomotora, por meio dos gestos, posturas e atitudes, que desenvolvem um franco
diálogo corporal contextualizado nas maneiras sensório-motoras e intuitivo-emocionais.

Wallon é taxativo quando se refere à dialética: homem X mundo; indivíduo X


cultura. Para Wallon (1986, p. 150) “não há reação motora ou intelectual que não
implique um objeto fabricado pelas técnicas industriais, pelos costumes, pelos
hábitos mentais do meio. A atividade da criança só pode efetuar-se a propósito e
por intermédio de instrumentos que lhe forneçam tanto o aparato material quanto
a linguagem em uso ao seu redor”.

Portanto, fica a cargo do educador interagir seus alunos com o meio físico-cultural,
criando desafios para que este seja explorado, identificado, estudado e transformado.
É a hora de provocar seus sentidos, de movimentá-lo, de motivar sua curiosidade
e estimular sua criatividade. Essa empreitada na Educação Psicomotora alterna
gradativamente a construção do indivíduo no aspecto afetivo na relação com outros
indivíduos com a elaboração da realidade pelo indivíduo epistêmico na sua relação com
a realidade, interpretada pelo universo físico, simbólico, conceitual (CARVALHO, 2003).

Para Carvalho (2003, p. 1):

O desenvolvimento da motricidade de relação e a da realização


pertencem ao universo da Educação Psicomotora, conforme
nos sugeriu a leitura da psicogenética de H. Wallon. Trata-se
de um trabalho que envolve o sujeito, os outros (entre os quais
a figura do educador destaca-se como mediador) e os objetos
(produções histórico-culturais).

146
Capítulo 3 DIAGNÓSTICODOSDISTÚRBIOSEASABORDAGENSTEÓRICO-PRÁTICASDEAPLICAÇÃODAPSICOMOTRICIDADE.

As Figuras 2 e 3 ilustram a esquematização das motricidades de relação e


realização, bem como seus respectivos predomínios de ação (CARVALHO, 2003).

FIGURA 2 – MOTRICIDADE DE RELAÇÃO, CUJO PREDOMÍNIO DA AÇÃO


(PSICOMOTRICIDADE) É DE CARÁTER AFETIVO, VOLTADO À CONSTRUÇÃO DO EU

FONTE: Carvalho (2003, p. 1)

FIGURA 3 – MOTRICIDADE DE REALIZAÇÃO, CUJO PREDOMÍNIO


DA AÇÃO (PSICOMOTRICIDADE) DO SUJEITO É DE CARÁTER
COGNITIVO, VOLTADO À CONSTRUÇÃO DO MUNDO

FONTE: Carvalho (2003, p. 1)

Conforme as Figuras 2 e 3, podemos afirmar que a Educação Psicomotora,


baseada na teoria walloniana, é um constructo que monitora e provê o
desenvolvimento da criança e dos jovens em suas variáveis, focada em sua tarefa
e disseminada em campos funcionais, a saber: a motricidade, a cognição e a
afetividade. Fica a critério da Educação Psicomotora então fornecer os recursos
sociais, afetivos, linguísticos, culturais, físicos, espaciais, materiais e pedagógicos
que possibilitam ao indivíduo determinar uma interação próspera em seu meio,
movimentando neste, componentes para seu desenvolvimento, partindo dos
recursos que ela mesma dispende em certo momento e, obedecendo suas

147
Fundamentos da Psicomotricidade

exigências e inclinações que podem estar dirigidas mais para si (centrípetas) e/ou
mais para o mundo (centrífugas). Falamos mesmo em uma escolha da motricidade
relacional sobre a motricidade de realização, evidenciando que no desenvolvimento
da Educação Psicomotora esta necessita contemplar o princípio da alternância
funcional do desenvolvimento, conforme estabelecido por H. Wallon. Dessa
maneira, a teoria walloniana apresenta grandes contribuições para a compreensão
das relações entre educando e educador, situando a escola como um meio
essencial para o desenvolvimento dos indivíduos. “A noção de domínios funcionais
entre os quais vai se distribuir o estudo das etapas que a criança percorre serão,
portanto, os da afetividade, do ato motor, do conhecimento e da pessoa" (WALLON,
1995, p. 117). Estas são construções teóricas que auxiliam no entendimento dos
processos de desenvolvimento, sendo colocados como indicadores na condução
dos processos ensino-aprendizagem (FERREIRA; ACIOLY-REGNIER, 2010).

Como entender o enfoque psicogenético walloniano? Esse


enfoque traz à luz a gênese das funções psicológicas. Considera o
desenvolvimento um constructo progressivo, resultado da relação entre
o indivíduo e o meio, compreendendo o desenvolvimento por meio de
fases. Wallon apresenta como característica em sua teoria a definição
do desenvolvimento do indivíduo em campos funcionais, identificados
como movimento, afetividade e inteligência, constituindo a tríade que o
teórico utiliza como referencial permanente para procurar entender o
constructo do Eu, da personalidade e do indivíduo como ser biológico e
social. H. Wallon, portanto, projetou pesquisar o indivíduo em toda sua
complexidade, em uma prospecção multidimensional e integrada. Em sua
teoria psicogenética, a linguagem apresenta espaço destacado, sendo
considerada instrumento e suporte do pensamento, propiciando com este
uma relação de reciprocidade (CARVALHO, 2003; PERDIGÃO, 2014).

A teoria de Wallon é importante para a prática pedagógica


na Educação Infantil por compreender a criança como um ser
completo, contradizendo as concepções que a enxergam como “ser
fragmentado” (FARIA, 2015). A quais aspectos Wallon se referia
quando afirmava em sua teoria que a prática pedagógica deveria ter
a concepção da Educação Infantil de maneira desfragmentada?

148
Capítulo 3 DIAGNÓSTICODOSDISTÚRBIOSEASABORDAGENSTEÓRICO-PRÁTICASDEAPLICAÇÃODAPSICOMOTRICIDADE.

Neste tópico você aprendeu que cada autor apresenta suas características
peculiares a respeito do espaço destinado à prática de educação psicomotora
no âmbito pedagógico. Para alguns, a aplicação de sua teoria pode acontecer no
ambiente escolar, para outros em quadra poliesportiva ou em qualquer lugar que
possibilite tal prática. Para outros mais exigentes, o meio deve ser mais específico,
com harmonia e aconchego. Mas sem dúvida a contribuição de cada qual faz
atualmente da psicomotricidade uma ciência inter/transdisciplinar, somando saberes.

5 INTERVENÇÕES PSICOMOTORAS
Podemos distinguir dois tipos de intervenção psicomotora: a terapêutica
e a educativa. Vamos aqui conceituar cada qual. Na intervenção terapêutica,
contextualizamos a terapia e a clínica psicomotora. Já na intervenção educativa
lidamos com um caráter puramente preventivo, o qual objetiva facilitar o
desenvolvimento do indivíduo, que, de maneira geral, é dirigido às crianças em
circunstâncias escolares. Procura intervir com a criança e o grupo em movimento;
por meio da prática espontânea ou organizada, beneficiando a integração de si
em relação ao outro e ao meio. A intervenção psicomotora não está restrita ao
público infantil, tendo sua ação no decorrer da vida e com pessoas entre todas as
faixas etárias (CARVALHO, 2003).

A intervenção educacional ou reabilitacional mediada pela psicomotricidade


deve objetivar a facilitação da tomada de consciência do corpo e de
seus distintos segmentos no espaço e tempo, focando a dissociação e a
flexibilidade das relações entre posições e lugares de referência, colocando
em evidência as funções psíquicas de atenção, percepção, imagem,
memória, processamento simultâneo e sequencial de dados internos e externos,
simbolização, expressividade estética e artística (FONSECA, 2008).

5.1 INTERVENÇÃO EDUCACIONAL

• Educação psicomotora

A Educação Psicomotora é uma educação abrangente que, além de


possibilitar o desenvolvimento no campo intelectual, afetivo, social e motor da
criança, oferece-lhe segurança, organizando suas relações com os distintos meios
em que necessita evoluir. Alia-se à estimulação do desenvolvimento psicomotor o
despontar da criatividade, auxiliando para a formação integral, desenvolvendo suas
possibilidades, levando o sujeito à tomada de consciência de seu corpo através do
movimento (TASSI; BATISTA, 2014). A Educação Psicomotora deve ser trabalhada
149
Fundamentos da Psicomotricidade

na pré-escola, em que são elaborados os primeiros passos para o desenvolvimento


global da criança, como no fator social, cognitivo, afetivo, físico, dentre outros. A
prática educativa em psicomotricidade tem tomado papel relevante na educação
infantil em seu meio escolar, auxiliando os aprendizados escolares (NASCIMENTO;
MACHEDO, 1986). É nesse contexto educacional que a criança necessita ser
favorecida ao ganhar experiência ativa, visto ser onde desenvolverá tanto seu lado
psíquico como o motriz, propiciando passar por vivências concretas, por meio de
boas atividades físicas de cunho recreativo, que possibilitem a consolidação de
hábitos de seu desenvolvimento corporal, mental e social (BARROS et al., 2012).

A Educação Psicomotora, conforme o que já expusemos, está em


conformidade com a teoria psicogenética de Wallon, ao passo que respeita a
complexidade do ser humano, entendendo-o em sua multidimensionalidade
psíquica, corporal e social, lançando propostas para a superação das dicotomias
corpo-mente, indivíduo-sociedade e razão-emoção, patrimônio da ótica cartesiana
de homem que percorre várias reflexões ocidentais (CARVALHO, 2003).

• Reeducação psicomotora

“A Reeducação Psicomotora é uma aliada da escola, possibilita os ajustes


necessários que algumas crianças necessitam para atender às demandas dos
processos de ensino-aprendizagem” (PROMOVIMENTO, 2017). Esta intervenção
visa possibilitar uma nova perspectiva, dirigida às crianças que desenvolvem os
distúrbios psicomotores ou perturbações psicomotoras. Conforme coloca Meur e
L. Staes (1991), a reeducação psicomotora é direcionada às crianças que sofrem
perturbações instrumentais, como déficits ou atrasos psicomotores. Podemos
falar de reeducação psicomotora na medida em que o psicomotricista permite ao
indivíduo se organizar e estabelecer representações simbólicas que permitem as
aprendizagens e a atividade mental (DESOBEAU, 2019). Trata-se de diagnosticar
as causas do problema e de fazer um balanço das aquisições e das carências,
antes de fixar um programa de reeducação.

Meur e Staes (1991, p. 23) afirmam que:

A reeducação psicomotora – como qualquer outra reeducação


– deve começar o mais cedo possível: quanto mais nova for
a criança sob nossa responsabilidade, menos longa será a
reeducação. É relativamente fácil fazer com que uma criança bem
nova adquira as estruturas motoras ou intelectuais corretas; geral
para o específico; quando uma criança apresenta dificuldades de
aprendizagem, o fundo do problema, em grande parte, está no
nível das bases do desenvolvimento psicomotor. Mas se a criança
já assimilou esquemas errados, o educador deverá primeiro fazer
com que os esqueça, antes de poder inculcar-lhe os esquemas
corretos. A reeducação é urgente sobretudo para os problemas

150
Capítulo 3 DIAGNÓSTICODOSDISTÚRBIOSEASABORDAGENSTEÓRICO-PRÁTICASDEAPLICAÇÃODAPSICOMOTRICIDADE.

afetivos. Quanto mais o tempo passa, mais a criança se bloqueia


em um tipo de reações, sente-se mais angustiada, e as punições
ou observações de seus conhecidos só agravam essa angústia. A
reeducação ajudará a adotar um novo comportamento e, pouco a
pouco, os que a cercam a verão de forma mais positiva.

A reeducação psicomotora é um processo que deve ser diagnosticado e


trabalhado o mais cedo possível, pois será mais fácil desconstruir e construir as
condutas psicomotoras precocemente, por isso não é aceitável a existência de lacunas
durante esse processo de reeducação, embora possa ocorrer que muitas crianças ao
final deste processo não adquiram um resultando satisfatório (BARROS et al., 2012).

Dentro da psicomotricidade e da reeducação psicomotora, o foco de trabalho


é o movimento do corpo da criança, a qual concebe experiências para que este
corpo possa se desenvolver em torno de si e do mundo que a cerca. E é no
decorrer do processo de desenvolvimento e aprendizagem do corpo dessa criança
que podemos levá-la a uma vida educacional e social mais apropriada, caso
contrário, se não houver uma boa experiência, essa criança poderá apresentar
distúrbios que dificultaram esse processo de ensino-aprendizagem.

Le Boulch (1987b, p. 27) nos diz que “A aplicação de uma


educação psicomotora integrada ao conjunto das disciplinas escolares
passa pela formação do professor primário”. Partindo dessa premissa,
há a necessidade de planejamento, elaboração e desenvolvimento
da psicomotricidade propriamente dita quando se inicia a educação
infantil, como também no início dos anos do ensino fundamental,
visto por meio dela o aluno ser compreendido de maneira integral.
Porém, se durante essa longa trajetória o aluno não obtiver contato
com profissionais qualificados, ou mesmo despreparados, ele não
desenvolverá sua “bagagem motora”, nem a levará para a fase adulta.
É necessário, portanto, desenvolver nesse aluno uma metodologia
de trabalho denominada de reeducação psicomotora. Quais ações
deverão ser desenvolvidas nessa metodologia?

• Ludicidade na educação e reeducação psicomotora

Vamos trazer agora uma abordagem sobre a “Ludicidade e psicomotricidade”,


analisando a utilização do lúdico na intervenção de crianças com ou sem
dificuldades no âmbito da psicomotricidade, tanto na Educação como na
Reeducação Psicomotora, destacando o papel do jogo e da brincadeira como

151
Fundamentos da Psicomotricidade

atividades lúdicas e como instrumento para o desenvolvimento global da criança.


Como os jogos e brincadeiras podem contribuir para o desenvolvimento de uma
criança com dificuldades psicomotoras? No que concerne ao desenvolvimento
psicomotor da criança, a intervenção lúdica vem se transformando em elemento
fundamental para esse processo. Partindo do lúdico, utilizando os jogos e
brincadeiras, a criança se sente motivada e incitada a aprender mais. Sob essa
ótica, novos objetos e ambientes são desbravados, exigindo da criança novas
práticas que podem ser facilmente adquiridas usando a ludicidade (RIBEIRO;
FERNANDES; MARQUES, 2017).

De acordo com Silva Junior (2005, p. 21):

O movimento, por ser uma necessidade básica do ser humano,


faz-se mais intensamente na infância e deve ser explorado
amplamente, a fim de que a criança possa ter o processo
de crescimento ativado. O movimento não intervém apenas
nesse aspecto, pois além de colaborar com o desenvolvimento
também pode influir no temperamento individual de cada um.

Por esse motivo o lúdico deve estar conectado à aprendizagem e ao


desenvolvimento psicomotor da criança desde muito cedo, sendo que por meio
da ludicidade a criança desenvolve a socialização e a interação com outros
colegas, além de ajudar o professor a identificar várias características da criança,
pois na brincadeira ela representa o que presencia e o que sente, como destaca
Teixeira (2014, p. 18) “quando a criança brinca, está manipulando sua realidade,
modificando-a, interagindo diretamente com os objetos; é uma relação íntima de
construção e descontração do real para a fantasia”. O lúdico vem conquistando
seu espaço na sociedade, principalmente na educação em que deve ser
incorporado nas práticas de desenvolvimento das habilidades psicomotoras
e associadas a ele. Nesse sentido o papel do professor é fundamental, sendo
ele responsável por mediar o conteúdo e o conhecimento para que as crianças
possam ter uma aprendizagem eficaz e satisfatória. Sendo assim, ao propor uma
atividade, o professor deverá deixar a criança à vontade, pois, através da troca
de experiências com outros colegas, da criatividade e da busca de soluções, a
criança conseguirá construir seu próprio conhecimento (TEIXEIRA, 2014).

Vamos versar sobre a importância do “brincar e do jogar. Na Educação


Infantil, a criança procura a experiência lúdica por meio de seu corpo, arranjando
conceitos e ganhando esquema corporal. Faz-se necessário que toda criança
desempenhe todas suas etapas de desenvolvimento e, para que isso ocorra, é de
extrema relevância a interpelação da psicomotricidade, propiciando que a criança
entenda seu corpo e as formas de se expressar por meio dele, situando-se no
tempo e no espaço (ROCHA; LÍRIO, 2010). Tamanha é a importância do “brincar”
que, conforme o Referencial Curricular Nacional (1998 apud ROCHA; LÍRIO,

152
Capítulo 3 DIAGNÓSTICODOSDISTÚRBIOSEASABORDAGENSTEÓRICO-PRÁTICASDEAPLICAÇÃODAPSICOMOTRICIDADE.

2010), para que haja o desenvolvimento infantil, a criança necessita brincar,


obtendo satisfação e alegria para que possa crescer. Também necessita do jogo
como maneira de equilíbrio entre ela e o mundo. Assim, por meio do lúdico, ela se
desenvolve (ROCHA; LÍRIO, 2010).

Pais e mesmo alguns educadores desconhecem o valor e a relevância que


se deve atribuir ao brincar para o desenvolvimento físico e psíquico das crianças,
visto para muitos o brincar não passar de um passatempo, sem objetivos
importantes. Estamos nos referindo ao brincar somente para distrair a criança em
tarefas que sejam prazerosas para ela. Essa conotação já ocorria nos tempos
mais remotos de nossa sociedade, nos quais não se atribuía a devida atenção
à criança e, quem dera, a seu brincar, sendo que os jogos eram exclusivamente
sociais (ROCHA; LÍRIO, 2010).

Dentro do ambiente escolar, o professor deve atuar como facilitador durante


o brincar. Necessita ser capaz de interpretar os jogos que a criança executa sem
querer se preocupar em julgar o mérito de suas ações. Sempre que necessário
deverá adicionar elementos, objetivando proporcionar momentos mais ricos de
probabilidades de exploração. Apenas propiciar espaços físicos e materiais não
é o suficiente para que as crianças executem seus jogos, é primordial delimitar
as pautas de intervenções pedagógicas para auxiliar a criança a se desenvolver
a partir da tarefa lúdica (ROCHA; LÍRIO, 2010). O trabalho alicerçado nessa
fundamental ação possibilita perceber, baseado nas observações seletivas que
são executadas, que a habilidade de imitar indica, de certa maneira, a evolução da
capacidade da percepção e do desenvolvimento do pensamento, primordialmente,
das mutações dos processos mais básicos em processos superiores. A
observação da criança em suas brincadeiras, isenta de bases teóricas, traduz-se
por deixar ir embora o fundamento do ato. Quando há ausência de fundamento
teórico, isso dificulta a compreensão do que acontece quando a criança brinca
(ROCHA; LÍRIO, 2010).

São exemplos de atividades lúdicas motoras mais específicas dentro de


sala de aula e também fora dela “quebra cabeça do corpo; atividades lúdicas que
envolvem a coordenação motora grossa e fina como pintura, massinha, desenho
etc” (TASSI; BATISTA, 2014, p. 11).

As brincadeiras e os jogos são maneiras de conhecer o mundo através


da interação psicossocial, procurando nessas atividades uma forma aceitável
e eficaz de aprendizagem para o desenvolvimento psicomotor da criança. Os
aprendizados conquistados através da intervenção psicomotora são válidos, mas
necessitam de uma comunicação recíproca e de relações com o conhecimento,
de compromissos sociais, de estímulo, interesse, dedicação e responsabilidade
para com a prática educativa e o ensinar/aprender do aluno.

153
Fundamentos da Psicomotricidade

O desenvolvimento psicomotor é uma habilidade que evolui do geral para


o peculiar. Está presente em todas as tarefas evolutivas da motricidade das
crianças, auxiliando no conhecimento e poder do seu próprio corpo, por essa
razão a intervenção psicomotora por meio dos jogos lúdicos com a criança que
demonstra alguma perturbação psicomotora é muito expressiva e precisa para
o seu próprio desenvolvimento e para adquirir percepções sobre si mesma
e sobre os outros. Posto isso, o trabalho executado com o lúdico propicia à
criança uma evolução no controle do seu corpo, crescendo e melhorando suas
habilidades motrizes, ultrapassando os obstáculos, tomando novos horizontes,
atingindo assim o enfrentamento de novos desafios motores, cognitivos e afetivos
(RIBEIRO; FERNANDES; MARQUES, 2017).

Para que você veja alguns exemplos de brincadeiras


psicomotoras e jogos psicomotores, indicamos os seguintes vídeos:
<https://www.youtube.com/watch?v=UyQkDfk8JCY>; <https://www.
youtube.com/watch?v=ruqAOjxhNcU>.

• Psicomotricidade em meio aquático

Muitos designam, quando se defrontam com atividades recreativas na


piscina, de atividades psicomotoras. Veja bem, não podemos nos referir à prática
psicomotora quando consideramos as atividades de natação, hidroterapia e menos
ainda a recreação aquática. A aprendizagem, conforme a psicomotricidade, não
se aliena somente ao prazer, mas se fundamenta em fruto de saber científico, por
meio de estudos e práticas experenciadas na água, documentados por poucos
brasileiros (FERNANDES; GUTIERRES FILHO, 2012).

Como contextualizar a psicomotricidade em meio aquático? Para Bueno (1998),


a psicomotricidade em meio aquático proporciona estímulo às potencialidades
do indivíduo, usando a água como meio de ação globalizada, intermediando
movimentos e sua relação com o espaço, objeto, consigo mesmo ou com o outro.
É calcada na espontaneidade e ações criativas, partindo da premissa de que as
capacidades devam nascer naturalmente e não deve haver comando, necessitando
ser motivadas para progressivamente evoluir nas necessidades individuais.

É uma soma de ações que usam a via de exteriorização do corpo como


recurso para otimizar as relações do sujeito para consigo mesmo, com os
outros, com objetos, com a água e dentro desta, usando como recurso às várias
experimentações corporais, à experiência simbólica e às distintas maneiras de se
expressar e comunicar (FERNANDES; GUTIERRES FILHO, 2012).
154
Capítulo 3 DIAGNÓSTICODOSDISTÚRBIOSEASABORDAGENSTEÓRICO-PRÁTICASDEAPLICAÇÃODAPSICOMOTRICIDADE.

A psicomotricidade aquática deve propiciar o inter-relacionamento entre o


prazer e a técnica, por meio de técnicas pedagógicas criativas, primordialmente
sob o formato de jogos, que incitem comportamentos inteligentes de interação
entre o sujeito com o meio líquido, objetivando seu desenvolvimento, assim,
propiciando a integração social, afetividade, lazer, recreações, prazer, entre
outros fatores relevantes para a formação global do sujeito. Veja que esse recurso
em psicomotricidade poderá proporcionar benefícios tanta para a educação e
reeducação psicomotora, como para a terapia psicomotora (SILVA; BOFI, 2010).

Vamos agora versar sobre os dois eixos da motricidade em meio aquático: o


primeiro relacionado à psicomotricidade funcional, que utiliza como referencial inicial
as características psicomotoras da criança avaliada por meio da padronização de
testes, servindo de exercício como atividade-meio e utilizando métodos orientados,
não permitindo espaço à exteriorização da expressividade motora. Um segundo
eixo adota a psicomotricidade relacional, que contextualiza o ato de brincar como
atividade-meio, utilizando o jogo como componente pedagógico, privilegiando
a criação, representatividade e imaginação. Contudo, o importante no contexto
da prevenção primária e secundária relacionada ao desenvolvimento infantil é
otimizar os efeitos aquáticos com suas propriedades dinâmicas, físico-químicas na
abrangência corporal de cada criança e aqui reside a motivação de seu sucesso
motor no meio aquático (FERNANDES; GUTIERRES FILHO, 2012).

Fernandes e Gutierres Filho (2012, p. 77-78) elencaram os objetivos desta


intervenção:

possibilitar a todas as crianças uma experimentação corporal


múltipla e variada dentro d’água; favorecer o desenvolvimento
integral da criança pelas vivências corporais significativas no
meio aquático, utilizando movimentos técnicos e simbólicos
como estratégia de ação; desenvolver o vocabulário psicomotor
e resgatar o sentimento lúdico de receptividade, descoberta e
curiosidade no meio aquático; estimular a vivência simbólica da
criança com e na água, com o outro, com os objetos e consigo
mesma; provocar a comunicação como meio de intervenção,
socialização e exteriorização da criança no meio aquático.

5.2 TERAPIA PSICOMOTORA


A terapia psicomotora intervém em alterações do desenvolvimento, de
aprendizagem e/ou do comportamento, como também em patologias de ordem
psíquica que alteram a qualidade de vida do sujeito. É indicada para todos os
problemas que transformam os seguintes domínios: coordenação global e fina,
planejamento, sequencializada e execução do gesto; percepção visual, auditiva,

155
Fundamentos da Psicomotricidade

tátil-cinestésica; tonicidade; orientação espaçotemporal; lateralidade; aquisição


da escrita e comunicação verbal e não-verbal.

Na Terapia Psicomotora, o espaço relacional instituído por meio do diálogo


corporal é extremamente relevante. O psicomotricista deverá garantir que, no
transcorrer da terapia haja continuidade e integridade do indivíduo, possibilitando
os elos e as associações entre o aqui e agora, e o experenciado há meses, ou
seja, todos estes aspectos dirigidos para o experenciado de vida passado. Essa
relação de experiência de vida corporal é fundamental para a terapia psicomotora,
sendo ela quem vai possibilitar ao indivíduo, que com frequência não consegue
alcançar a expressão simbólica de sua vida fantasística, reviver e recolocar em
jogo as circunstâncias dolorosas e conflitivas (DESOBEAU, 2019).

A clínica psicomotora objetiva ser uma intervenção que procura propiciar


condições para que a criança desenvolva globalmente suas necessidades de
desempenho físico, motor, cognitivo, emocional e intelectual. A dificuldade de agir
corporalmente em decorrência de um déficit relativo à psicomotricidade intervém
negativamente no desenvolvimento infantil, dificultando a criança de experenciar
situações próprias do mundo infantil (CABRAL, 2011).

Vamos exemplificar o trabalho de Jardim e Santos (2020), educador físico,


que narra em seu artigo o desenvolvimento de trabalhos com idosos, deficientes,
crianças, indivíduos com depressão, hipertensos, Acidente Vascular Encefálico,
alterações articulares, entre muitas outras comorbidades. O profissional
desenvolve em seu trabalho o estímulo às dimensões afetivas, estimulando a
cooperação, o toque, a interação através de atividades grupais durantes as aulas,
a cognição, com estímulo aos indivíduos com déficit de concentração, utilizando
a memorização de exercícios, de objetos utilizados, como também nomes de
colegas durante a atividade. Finaliza sua terapia com foco no aspecto físico, com
exercícios de circuito funcional, motivando os elementos psicomotores: percepção
óculo-pedal, manual, lateralidade, equilíbrio, flexibilidade nos alongamentos,
coordenação motora e o desenvolvimento de exercícios contra resistência para
otimização do quadro articular e fortalecimento muscular, também promovendo
caminhadas e conversas que lidam com o cotidiano.

• Psicomotricidade e relaxação – um processo (psico)terapêutico

Para que se especifique as condutas indicadas em psicomotricidade,


deve-se dirigir o foco às manifestações corporais e suas significações, sendo
as intervenções flexíveis e adaptáveis às peculiaridades individuais, mantendo
contudo o intuito base de mediar a procura da alteração de atitude do indivíduo
consigo mesmo e, como consequência, com os distintos contextos em que ele
interatua.

156
Capítulo 3 DIAGNÓSTICODOSDISTÚRBIOSEASABORDAGENSTEÓRICO-PRÁTICASDEAPLICAÇÃODAPSICOMOTRICIDADE.

Podemos afirmar que a comunicação é um dos aspectos dominantes


no transcorrer da intervenção. “É pela comunicação de um gesto, de um
comportamento, da respiração, da máscara facial (rubor, palidez, riso, choro, rugas
de expressão etc.) das modulações tônicas, que se gere o diálogo corporal e a
proxêmica na relação terapêutica em psicomotricidade” (MAXIMIANO, 2004, p. 87).

O tônus é o meio de comunicação ressaltado em psicomotricidade. Não só


mantém a adaptação da "atitude" muscular, como promove um diálogo, o qual
está inerente à expressão dos contatos corporais, à voz, por meio do tom, da
fluência e da projeção, ao padrão respiratório e ao ritmo pessoal que interfere na
estruturação temporal das interações. As experiências do corpo propiciadas em
psicomotricidade e relaxação, poderão ser permeadas por meio de um simples
toque corpo a corpo, objetos como lenços, bolas, bastões e cordas, que ocasionam
muitas vezes uma ação passageira, ou mesmo pela automassagem, a qual seria
menos invasiva, mais segura e normalizadora das tensões por ansiedade ou
expectativas das primeiras etapas de intervenção (MAXIMIANO, 2004).

Nessa intervenção, o terapeuta de psicomotricidade dirige a alteração


vivida do tônus, propiciando o acesso a um estágio de maior descontração, pela
comunicação, por meio da sugestão e da palavra. Saiba você que a palavra é
relevante na antecipação de fenômenos tônicos, nomeando e qualificando os
segmentos corporais, para que se manifeste um ambiente seguro que induza a
uma relação terapêutica tranquilizadora (MAXIMIANO, 2004).

Portanto, a psicomotricidade e relaxação possibilitam a consciencialização da


função tônica, permitindo diferenciar desta e a expressão concreta do movimento.
Esta intervenção exige do paciente a disponibilidade passiva de seu corpo, em um
estágio passivo de entrega e confiança, possibilitando a representação ausente de
expressão motora, entregando-se às sensações proprioceptivas que possibilitam
a reelaboração das experiências traumáticas marcadas na memória tônica.
Permite, portanto, a percepção tônica na totalidade de seus aspectos relacionais,
colocando o indivíduo em comunicação consigo mesmo, sentindo seu corpo
como receptor de ritmos ao contato, à voz, ao olhar do outro que intermedia esta
relação terapêutica, em uma esfera de construção de identidade, do simbólico e
das representações. A atitude terapêutica, gerir a distância, a forma de mediação
corporal em relação ao indivíduo são as maneiras primordiais que tornam possível
a gradativa tomada de consciência das experiências vivenciadas e do seu reflexo
nas unidades psíquicas e corporais inseparáveis. Dessa maneira, as estratégias
e a maneira como se institui a relação terapêutica são o alicerce necessário de
trabalho da psicomotricidade e relaxação (MAXIMIANO, 2004).

157
Fundamentos da Psicomotricidade

A palavra proxêmica tem sua origem no latim proximus,


traduzido por perto. Em outras palavras, a noção de se comunicar por
intermédio de chegar mais perto ou se manter longe. Suas maneiras
de movimentação podem ser por translação, em que há movimento
do corpo, ou por expansão, em que ocorre contração de estruturas
do corpo. Afinal, qual o significado de alguém chegar mais perto ou
distanciar-se de você? Há uma proximidade que pode ser considerada
como abuso? Há um distanciamento que pode ser traduzido por
desprezo? Saiba, portanto, que o estudo desse conjunto intrigante que
estabelece relações entre distância e seus respectivos significados
é denominado de comunicação proxêmica. Exemplificando, estudos
mostram que entre 45cm e 1,20m é uma distância considerada zona
pessoal, sendo uma distância coerente para qualquer comunicação
normal de colegas ou no trabalho. Após isso, por volta de uns 3
metros e meio aproximadamente, é considerada zona social e, além
disto, zona pública (PENNAFORT, 2018).

Neste tópico você aprendeu que os profissionais psicomotricistas necessitam


estar capacitados para intervir em psicomotricidade, quer no âmbito educacional,
reeducacional ou na terapia, atendendo qualquer faixa etária conforme a
necessidade demandada. Deve-se ter em mente a importância da participação
do educador no cotidiano escolar da criança, visto este possuir um papel de
extrema importância no processo de aprendizagem. O respeito e a compreensão
da subjetividade individual da criança e o ambiente no qual está inserida são
imprescindíveis para que ocorra a estimulação de seu desenvolvimento psicomotor.

6 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
Nesta abordagem, pudemos concluir que o estudo das síndromes
psicomotoras, dentro da psicomotricidade, significa realizar uma análise entre as
relações do sistema nervoso e a atividade psicomotora, compreendendo assim
uma rica contribuição para a compreensão de todo o período de desenvolvimento
de um organismo, visto o modelo patológico constituir-se como um modelo
extremamente válido para o estudo da evolução. Teóricos da psicomotricidade, por
meio de seus estudos teórico-práticos, contribuem com a semiologia psicomotora,
quando deflagram estágios do desenvolvimento psicomotor e suas respectivas
disfunções. Portanto, os distúrbios apresentados pelas síndromes psicomotoras

158
Capítulo 3 DIAGNÓSTICODOSDISTÚRBIOSEASABORDAGENSTEÓRICO-PRÁTICASDEAPLICAÇÃODAPSICOMOTRICIDADE.

estão diretamente relacionados com as estruturas anatômicas disfuncionais,


acarretando em transtornos de ordem tônica, comportamental, de lateralidade, de
esquema corporal, de equilíbrio, coordenação global e fina, cognição, entre outros
distúrbios relacionados aos elementos psicomotores.

Sobre a semiologia em psicomotricidade, podemos considerar que a


semiologia psicomotora não pode ser vista apenas com a abordagem da causa, mas
contextualizada em uma abordagem tônico-emocional, na qual o corpo fala, não
separando a objetividade da subjetividade, em que se deve tanto ver como observar.
A semiologia psicomotora, por meio do estudo dos sinais psicomotores, detectados
por meio da avaliação, objetiva possibilitar a intervenção precoce, reduzindo
os efeitos deletérios de uma história de alto risco, que geralmente caracteriza a
evolução de crianças deficientes ou de risco. É fato concluirmos que nenhum
diagnóstico é possível sem que o indivíduo seja avaliado, pois sem uma avaliação
psicomotora a intervenção ocorrerá sem a individualidade, obrigando o sujeito a se
adaptar a condutas que não lhe são específicas. Quando o diagnóstico é elaborado
de maneira concreta e correta, portanto, de maneira precoce na vida da criança, a
intervenção indicada pode diminuir o impacto dos sintomas, possibilitando assim que
a vida da criança ocorra de maneira adaptada. Portanto, conhecer as metodologias
para a realização da avaliação dos fatores psicomotores, designadamente da
tonicidade, equilíbrio, lateralidade, noção de corpo, estruturação espaço-temporal,
praxia global e praxia fina, bem como conceitualizar a sua interpretação clínica,
como referência para o estabelecimento de um programa pedagógico-terapêutico
em crianças, faz parte dos objetivos da semiologia em psicomotricidade.

Constatamos, ao longo da disciplina que as intervenções psicomotoras


permeiam entre a terapêutica e a educativa. Em ambas as abordagens, a
psicomotricidade deve objetivar a facilitação da tomada de consciência do
corpo e de seus distintos segmentos no espaço e tempo, focando a dissociação
e a flexibilidade das relações entre posições e lugares de referência, colocando
em evidência as funções psíquicas de atenção, percepção, imagem, memória,
processamento simultâneo e sequencial de dados internos e externos,
simbolização, expressividade estética e artística.

As intervenções psicomotoras não podem ser demandadas à revelia. É um


processo que deve ser diagnosticado e trabalhado o mais cedo possível, pois
será mais fácil desconstruir e construir as condutas psicomotoras precocemente,
por isso não é aceitável a existência de lacunas durante esse processo de
reeducação. Da mesma forma, não é aceitável que o educador apenas ministre
as atividades psicomotoras, como a ludicidade por meio de jogos e brincadeiras,
e não as observe dentro do desenvolvimento infantil. Por esse motivo o docente
deve conectar o lúdico ao aprendizado e ao desenvolvimento psicomotor da
criança desde muito cedo, sendo que por meio da ludicidade a criança desenvolve

159
Fundamentos da Psicomotricidade

a socialização e a interação com outros colegas, além de ajudar o professor a


identificar várias características da criança, pois na brincadeira ela representa o
que presencia e o que sente.

Considera-se, portanto, que pais e mesmo alguns educadores desconhecem o


valor e a relevância que se deve atribuir ao brincar para o desenvolvimento físico e
psíquico das crianças, visto para muitos o brincar não passar de um passatempo, sem
objetivos importantes. Apenas propiciar espaços físicos e materiais não é o suficiente
para que as crianças executem seus jogos, sendo primordial delimitar as pautas de
intervenções pedagógicas para auxiliar a criança a se desenvolver a partir da tarefa
lúdica. A observação da criança em suas brincadeiras, isenta de bases teóricas, traduz-
se por deixar ir embora o fundamento do ato. Quando há ausência de fundamento
teórico, isso dificulta a compreensão do que acontece quando a criança brinca.

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