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Genética

Genética

Gabriel Marcos Domingues de Souza


Graziela dos Santos Barni
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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

Barni, Graziela dos Santos


B262g Genética / Graziela dos Santos Barni, Gabriel Marcos
Domingues de Souza. – Londrina: Editora e Distribuidora
Educacional S.A., 2014.
176 p.

ISBN 978-85-68075-72-2

1. Biologia Molecular. 2. Evolução. I. Souza, Gabriel


Marcos Domingues de. III. Título.

CDD 575.1
Sumário

Unidade 1 — Introdução à genética .............................1


Seção 1 Importância da genética na vida, na sociedade e para o
estudo da biologia ................................................................3
1.1 Histórico da genética ...........................................................................3
1.2 Organismos geneticamente modificados ..............................................7
1.3 Insulina e bactérias ..............................................................................8
1.4 O poder das células-tronco ..................................................................9
Seção 2 Conceitos fundamentais e o material genético ...................10
2.1 Enfoque genético à biologia ...............................................................10
2.2 Genética e as perguntas da biologia...................................................12
Seção 3 O material genético ............................................................17
3.1 A base molecular da informação genética..........................................17
3.2 Especificando a sequência de aminoácidos de uma proteína ............19
3.3 O programa de investigação genética ................................................21
3.4 DNA: o material genético ..................................................................23
3.5 RNA: conceitos e processamentos .....................................................31

Unidade 2 — Bases da hereditariedade .......................43


Seção 1 Primeira Lei de Mendel .......................................................46
1.1 Experimentos de Mendel....................................................................46
1.2 Meiose e suas relações com a Primeira Lei ........................................48
1.3 Noções de probabilidade ...................................................................48
1.4 Genealogias e heredogramas .............................................................51
Seção 2 Segunda Lei de Mendel .......................................................54
2.1 Experimentos de Mendel....................................................................54
2.2 Relações com a meiose e formação dos gametas ...............................56
2.3 Alelos múltiplos .................................................................................56
2.4 Estudo de herança nos grupos sanguíneos ..........................................57
vi GENÉTICA

Seção 3 Extensões e alterações das bases da hereditariedade ..........61


3.1 Interação gênica ...............................................................................61
3.2 Genes ligados ....................................................................................63
Seção 4 Determinação sexual e herança genética............................69
4.1 Cromossomos sexuais ........................................................................69
4.2 Sistema XY .........................................................................................69
4.3 Anomalias e cromossomos sexuais humanos ....................................70
4.4 Cromatina sexual ...............................................................................71
4.5 Herança ligada ao sexo ......................................................................72
4.6 Sistema X0 .........................................................................................75
4.7 Sistema ZW .......................................................................................76
4.8 Sistema Z0 .........................................................................................76

Unidade 3 — Citogenética e genética do câncer .........81


Seção 1 Citogenética humana ..........................................................83
1.1 As células ..........................................................................................83
1.2 Organização dos cromossomos humanos ..........................................84
1.3 Indicações clínicas para a análise cromossômica ..............................89
1.4 Identificação cromossômica...............................................................91
1.5 Mutações e seus efeitos sobre o fenótipo ...........................................93
1.6 Agentes mutagênicos químicos ..........................................................97
1.7 Agentes mutagênicos físicos...............................................................98
1.8 Classificação das mutações com base no tipo
de alteração molecular ......................................................................99
1.9 Alterações cromossômicas ...............................................................100
Seção 2 Bases genéticas do câncer ................................................107
2.1 Proliferação celular e o câncer .........................................................107
2.2 Genômica e genética do câncer.......................................................108
2.3 Base genética do câncer ..................................................................109
2.4 Mutações e a base genética do câncer .............................................110
2.5 Condições para que ocorra o câncer ................................................112
Sumário vii

Unidade 4 — Biologia molecular, biotecnologia e


evolução ..............................................121
Seção 1 Conceitos fundamentais....................................................123
1.1 Replicação do DNA .........................................................................124
1.2 Transcrição ......................................................................................128
1.3 Tradução ..........................................................................................134
Seção 2 Biotecnologia....................................................................138
2.1 Técnicas em biologia molecular .......................................................138
2.2 Enzimas de restrição ........................................................................139
2.3 Eletroforese ......................................................................................141
2.4 Sondas .............................................................................................142
2.5 Transferência de Southern ................................................................144
2.6 Clonagem gênica .............................................................................145
2.7 Reação em cadeia da polimerase (PCR) ...........................................147
2.8 Sequenciamento .............................................................................150
2.9 Era das ômicas .................................................................................152
Seção 3 Genética evolutiva ............................................................154
3.1 Variações moleculares .....................................................................154
3.2 Evolução molecular .........................................................................156
3.3 Homologia e filogenia .....................................................................161
Apresentação

Neste livro, iremos abordar um dos mais importantes campos das ciências
biológicas, a genética.
Essa área de conhecimento se consolidou com a descoberta de trabalhos
realizados por um monge chamado Gregor Johann Mendel, que nos levou a
entender como as características eram transmitidas, ao longo das gerações,
nos organismos. Outros estudos feitos por vários pesquisadores, dentre eles,
Watson e Crick, revelaram a estrutura da molécula de DNA, impulsionando
ainda mais avanços no conhecimento sobre a genética.
Na Unidade 1, veremos a importância da genética na vida, na sociedade e
para compreensão de alguns conceitos e estudos biológicos, desde os estudos
de Mendel até descobertas atuais, levando-nos a entender que o material ge-
nético (DNA) é o principal responsável por estabelecer os parâmetros da vida.
A herança de características biológicas tem como base os trabalhos de
Mendel. Na Unidade 2, iremos discutir as bases da hereditariedade através
dos experimentos realizados por ele, onde veremos como os genes são
transmitidos ao longo das gerações.
Na Unidade 3, discutiremos sobre a citogenética e a genética do câncer.
Diversos estudos têm revelado que o câncer é uma doença genética. Abor-
daremos a relação entre genes e câncer, considerando como as mutações,
alterações cromossômicas, vírus e os agentes ambientais exercem seus papéis
no desenvolvimento dos cânceres.
Em nossa última unidade, trataremos dos conceitos em biologia mole-
cular, biotecnologia e evolução, discutindo como o DNA se replica, bem
como os detalhes específicos dos processos de transcrição e tradução e as
variações moleculares que podem levar à especiação e à evolução molecular
das espécies.
Unidade 1
Introdução à genética
Graziela dos Santos Barni

Objetivos de aprendizagem: Nesta unidade apresentaremos a impor-


tância da genética na vida, na sociedade e como seus estudos ajudaram
a elucidar algumas dúvidas no campo da Biologia. Vamos obter uma
visão geral da história, seus campos de estudo e o crescimento dessa
importante área do conhecimento.

Seção 1: Importância da genética na vida, na


sociedade e para o estudo da biologia
Os conhecimentos em genética humana devem pro-
mover nos leitores o desenvolvimento das habilidades
de tomar decisões, reconhecer alternativas e aplicar
informações. Os estudantes devem ser preparados
para utilizar os conceitos da área para entender e
opinar em relação a aspectos sociais e éticos desse
campo de conhecimento. Além disso, o estudo da
genética pode ajudar na compreensão das diferenças
individuais, aceitando a diversidade e reconhecendo-a
como regra, e não como exceção. Nesta primeira
seção, iniciamos abordando toda a história da arte
que levou aos conhecimentos em genética que temos
disponíveis hoje, fazendo um breve comparativo, desde
os tempos de Mendel até o uso das células-tronco
embrionárias no século XXI.
Seção 2: Conceitos fundamentais e o material
genético
O estudo dos genes tem sido uma poderosa ferra-
menta para a compreensão dos sistemas biológicos,
revelando características gerais da herança e diferença
das espécies. A necessidade de estudar uma ampla
gama de características biológicas e genéticas levou
a uma gama de termos e conceitos que auxiliam na
compreensão desses eventos. Nesta seção, iremos
conhecer os conceitos amplamente utilizados em
genética, seus significados e importância biológica.

Seção 3: O material genético


A resolução da estrutura do DNA foi, com certeza,
a descoberta mais importante do século XX, con-
duzindo a uma era excitante e intensa de pesquisas
biológicas. O conhecimento da estrutura forneceu
indícios óbvios sobre as funções do DNA como ma-
terial genético, o qual deve ser replicado e passado
para cada nova célula e nova geração, assim como
servir de instrução para a síntese de proteínas. Nesta
seção, iremos conhecer as características dos nossos
ácidos nucleicos: DNA e RNA e sua importância para
a origem e continuidade da vida.
Introdução à genética 3

Introdução ao estudo
Caro(a) acadêmico(a)! Por meio do estudo desta unidade você irá entender
os aspectos que levaram ao crescimento e futuro da ciência genética, seus
campos de estudo e sua importância na sociedade atual. Também será possível
conhecer as terminologias mais utilizadas em genética e as informações quanto
à natureza do material genético: DNA e RNA, suas diferenças e a importância
desses ácidos nucleicos.

Seção 1 Importância da genética na vida,


na sociedade e para o estudo da
biologia
Podemos observar que a história da genética funde-se nas primeiras ideias
sobre os mecanismos que envolvem o processo reprodutivo, seja na espécie
humana ou em plantas e animais, cuja domesticação transformou nossa cultura.
Assim, os conhecimentos sobre a reprodução vegetal e animal, empíricos ou
não, remontam os primórdios da agricultura e pecuária.

1.1 Histórico da genética


Neste tópico, você verá alguns aspectos históricos da genética, tais como
as primeiras ideias sobre a reprodução humana (teoria pré-formista), uma
visão cronológica do desenvolvimento da genética e sua definição. Mais
especificamente sobre os mecanismos que envolvem a hereditariedade em
humanos, as primeiras ideias descritas soam bastante curiosas e permitem uma
boa discussão com seus alunos. Tanto Hipócrates (460 a.C.-377 a.C.) quanto
Aristóteles (384 a.C.-322 a.C.) desenvolveram hipóteses para o mecanismo de
herança. Foi no século XVII, no entanto, que prevaleceu a teoria pré-formista,
cujos postulados descreviam o espermatozoide como o reservatório de um ser
humano pré-formado, o homúnculo, delegando ao sexo feminino o papel de
“terreno fértil”, onde tal célula é depositada e se desenvolve.
Na sequência, observe a Figura 1.1, que apresenta uma cronologia de alguns
eventos importantes na história da genética.
4 GENÉTICA

Figura 1.1 Cronologia da genética

1868 Apresentação dos 1869 Friedrich Mieschner 1900 Experimentos mendelianos


trabalhos de Gregor indentificou, no núcleo celular, “redescobertos” e aceitos pela
Mendel com ervilhas substância de caráter ácido comunidade científica

1905 O termo “genética”, 1904 Teoria cromossômica 1902 A alcaptonuria é a primeira


como ciência, é cunhado da herança doença humana conhecida como
por William Elateson de causa genética

1911 Experimentos de 1913 Primeiros mapas de 1927 H. Muller realiza


Morgan com moscas ligação experimento que indicam que
da fruta confirmam a os raios X ocasionam mutações
teoria cromossômica

1953 Criação do modelo 1944 Confirmação de que 1941 Teoria de que um


dupla-hélice do DNA, por o DNA é a molécula da gene codifica uma proteína
James Watson e Francis Crick hereditariedade

1970-1973 Purificação
1977 Fred Sanger desenvolve a
1966 Descoberta do das enzimas de restrição e
tecnologia de sequenciamento
código genético uso na tecnologia do DNA
do DNA
recombinante

2001 Término do Anos 1990 1986 Desenvolvimento da


sequenciamento do Primeiros genomas técnica de PCR
genoma humano e início da descritos
era pós-genômica
Primeiros exames
de DNA (DNA
fingerprinting)
2008 Discussões
Início da era da terapia
controversas sobre as novas
gênica e dos organismos
tecnologias e possibilidades
geneticamente
inauguradas pela genômica
modificados
sobre clonagem humana
e animal, alimentos 1996 Ovelha Dolly —
geneticamente modificados primeiro animal clonado
e uso de células-tronco a partir de uma célula
embrionárias em foco adulta

Fonte: Mello (2008).

Uma vez que os processos genéticos são fundamentais para a própria vida, a
ciência da genética unifica a biologia e funciona como seu centro. Desse modo,
não é surpreendente que a genética tenha uma longa e rica história. Seu ponto
de partida foi o jardim de um mosteiro da Europa Central da década de 1860,
onde Gregor Mendel, um monge agostiniano, realizou uma série de experimen-
tos com ervilhas durante uma década. O trabalho de Mendel mostrou que as
características dos seres vivos são transmitidas dos genitores para as proles de
maneira previsível. Este monge concluiu que as características das ervilheiras, tais
como altura da planta e cor da flor, são controladas por unidades descontínuas de
Introdução à genética 5

herança, que atualmente são chamadas de genes. Posteriormente, concluiu que


cada característica da planta é controlada por um par de genes e que os membros
de um par de genes se separam durante a formação de gametas (a formação dos
óvulos e dos espermatozoides) (KLUG et al., 2010).
Mendel realizou seus experimentos previamente ao conhecimento da es-
trutura e do papel dos cromossomos. Cerca de 20 anos depois de seu trabalho
ser publicado, os avanços em microscopia possibilitaram aos pesquisadores a
identificação dos cromossomos e o estabelecimento de que, na maioria dos
eucariontes, os membros de cada espécie têm um número de cromossomos
característicos, denominado número diploide (2n), na maioria de suas células.
Por exemplo, nós humanos temos um número diploide de 46 cromossomos, ou
23 pares de cromossomos. Os membros de um par são idênticos em tamanho
e localização do centrômero, uma estrutura à qual se ligam as fibras do fuso
durante a divisão celular (KLUG et al., 2010).
Nas últimas décadas do século XIX, os pesquisadores também descreveram
o comportamento dos cromossomos durante as duas formas de divisão celular,
a mitose e a meiose. Na mitose, os cromossomos são copiados e distribuídos,
de modo que cada célula-filha receba um conjunto diploide de cromossomos.
A meiose é associada à formação de gametas. As células produzidas por meiose
recebem somente um membro de cada par cromossômico, e, nesse caso, o
número de cromossomos resultante é denominado número haploide (n). Essa
redução no número de cromossomos é essencial se a prole que surge da união
de dois gametas parentais deve manter, ao longo das gerações, um número
constante de cromossomos característicos de seus genitores e de outros mem-
bros da espécie (KLUG et al., 2010).
No início do século XX, Walter Sutton e Theodore Boveri notaram, indepen-
dentemente, que os genes, de acordo com a hipótese formulada por Mendel, e os
cromossomos, como eram observados ao microscópio, têm várias propriedades
em comum e que o comportamento dos cromossomos durante a meiose é idêntico
ao comportamento presumido dos genes durante a formação dos gametas. Por
exemplo, os genes e os cromossomos existem aos pares; além disso, os membros
de um par gênico e os membros de um par cromossômico se separam um do outro
durante a formação dos gametas. Com base nestas informações, Sutton e Boveri
propuseram, individualmente, que os genes estão contidos nos cromossomos.
Essa proposição é a base da teoria cromossômica da hereditariedade, a qual
afirma que as características hereditárias são controladas por genes localizados
6 GENÉTICA

nos cromossomos, os quais são fielmente transmitidos por meio dos gametas,
mantendo a continuidade genética de geração a geração (KLUG et al., 2010).
Os geneticistas encontraram muitos exemplos diferentes de características
hereditárias, entre 1910 e em torno de 1940, possibilitando-lhes testar essa
teoria repetidamente. Às vezes, os padrões de herança diferiam dos exemplos
simples descritos por Mendel, mas a teoria cromossômica da herança podia
ser aplicada. E continua a explicar como as características são transmitidas de
geração a geração em uma variedade de organismos, inclusive os humanos
(KLUG et al., 2010).
Desde os experimentos de Mendel, vários pesquisadores e outras pesquisas
surgiram para tentar entender e aprofundar os segredos do DNA. Quatorze anos
depois de o genoma humano ter sido mapeado, a genética continua a ser a área
que desperta mais interesse na investigação científica, embora a tradução das
recentes descobertas em tratamentos médicos tenha sido lenta. Um estudo da
Sciencewatch, da Thomson Reuters, verificou que 7 dos 13 principais investiga-
dores de 2010 trabalham nesta área, sendo que Eric Lander, do Broad Institute
of Harvard e do Massachusetts Institute of Technology (MIT), foi considerado o
investigador mais popular do mundo. O trabalho deste biólogo engloba o ma-
peamento genético de doenças como o câncer de pulmão (GENÉTICA..., 2011).
Na última década, tanto o meio acadêmico-científico quanto os meios de
comunicação passaram a divulgar os grandes avanços da ciência no campo
da genética. Normalmente, quando se fala no assunto, as pessoas rapidamente
associam a genética com o DNA e os testes de paternidade. Não é uma asso-
ciação incorreta, mas genética não se limita a isto.
Genética é a ciência que estuda os genes. A partir de suas descobertas,
desenvolveram-se a biotecnologia, a engenharia genética, a clonagem, os pro-
dutos transgênicos, o uso terapêutico das  células-tronco etc. São assuntos
muito comentados atualmente e, com frequência, eles se tornam manchetes
do noticiário. Mas o que isso tem a ver com o nosso cotidiano?
Bem, em primeiro lugar, isso está relacionado diretamente com a nossa exis-
tência, pois a genética é a base do ser humano. Ela é responsável pelas nossas
variabilidades e diferenças, bem como pelas nossas semelhanças. Todos nós
apresentamos 46 cromossomos e cerca de 30.000 genes: portanto, numerica-
mente, somos todos iguais. Porém, a combinação desses genes e as permutações
ocorridas no processo de divisão celular (a meiose, especificamente) garantem
nossas diferenças (BRAUN, 2005).
Introdução à genética 7

Questões para reflexão


Uma das áreas que tem crescido muito no campo da genética é o
estudo dos cromossomos. O estudo dos cromossomos humanos tem
grande importância, porque, entre outros motivos, algumas doenças
estão diretamente relacionadas a alterações cromossômicas. Como po-
dem ocorrer essas alterações? Nós contribuímos para que elas ocorram?

São 23 cromossomos que vêm de nosso pai através dos espermatozoides e


23 vêm da mãe, através do óvulo. Isso totaliza 46 cromossomos, que dão origem
à célula-ovo, que, por sua vez, irá se transformar no embrião e no feto, até o
nascimento do indivíduo, transmitindo-lhe a maioria das suas características e
predisposições. Durante seu desenvolvimento e sua existência, você precisará
se alimentar, se cuidar, quando alguma doença aparecer, realizar algum tipo
de tratamento etc. Pois bem, vamos verificar como a genética se relaciona às
nossas necessidades de sobrevivência.
Para começar, você pode estar se perguntando: o que a genética tem a
ver com a minha alimentação? Muita coisa. Grande parte dos alimentos que
consumimos participou de um processo chamado melhoramento genético,
isto é, foram isoladas determinadas características “marcantes” e — através de
cruzamentos específicos ou hibridização — alimentos aprimorados passaram
a ser produzidos. Convém lembrar que esses procedimentos, realizados cienti-
ficamente nos dias de hoje, não são tão novos assim. Desde a Pré-história, por
meio de enxertos de plantas e dos cruzamentos seletivos, o ser humano tem
adaptado a natureza às suas necessidades (BRAUN, 2005).

1.2 Organismos geneticamente modificados


O aprimoramento genético tem a função de adequar determinado alimento
às necessidades do homem moderno, facilitando a sua produção, possibilitando
maior número de safras anuais, tornando-o mais resistente às pragas, enrique-
cendo-o no aspecto nutricional etc. É o que acontece com o milho híbrido,
o trigo e a soja, entre outros. Sobre os alimentos geneticamente modificados,
os transgênicos, há uma grande polêmica; pois de um lado encontram-se os
cientistas, alterando determinado alimento a fim de adequá-lo às necessidades
8 GENÉTICA

socioeconômicas, enquanto, do outro, estão os ambientalistas, que acreditam


que este produto não deve ser consumido, pois não se sabe ao certo o que
pode ocasionar em nossa saúde, em longo prazo.
Vamos pensar em uma hipótese bem prática. Imagine que exista uma laranja
bem graúda, cuja produção seja rápida e grande, mas com sabor extremamente
ácido. Este seria um fruto bonito, do qual se produziria muito suco, mas que não
seria aceito pelo mercado devido à sua acidez. Já outra laranja é extremamente
doce, pequena e de baixa produtividade. Graças à manipulação genética, podem-
-se isolar os genes responsáveis pela característica doce da segunda laranja, e
insere-se este material genético no cromossomo da primeira. O resultado é uma
laranja doce, graúda, com muita polpa e de fácil produção (BRAUN, 2005).
Nos últimos anos, também se descobriu que algumas doenças humanas são
provocadas por deficiências genéticas. Descobertas como essas intensificaram-
-se ainda mais com as novas técnicas de biologia molecular, que possibilitou a
criação de medicamentos mais eficazes, bem como a otimização dos métodos
de diagnóstico e tratamento de várias doenças.

1.3 Insulina e bactérias


Um bom exemplo disto é a produção de insulina por meio da engenharia
genética. Com a tecnologia do DNA recombinante, é possível obter organismos
com características novas ou ainda não existentes na natureza. Desse modo,
células de bactérias podem ser programadas para produzir a insulina. Este
hormônio (insulina) é de suma importância para controlar a taxa de açúcar no
sangue, garantindo níveis apropriados à sobrevivência humana.

Para saber mais


Faça a leitura do artigo: “Tendências do diabetes melittus no Brasil: o papel da transição nutricional”.
Disponível em: <http://www.scielosp.org/pdf/csp/v19s1/a04v19s1.pdf>.

Há algumas décadas, pessoas diabéticas dependiam da insulina retirada de


cadáveres e, posteriormente, do pâncreas de suínos. Nos últimos 20 anos, graças
à engenharia genética, esse procedimento não é mais utilizado, dependendo
exclusivamente da atuação de bactérias.
Introdução à genética 9

1.4 O poder das células-tronco


Nos últimos anos, a utilização de células-tronco e a terapia gênica pas-
saram a ser amplamente discutidas na comunidade científica e nos meios de
comunicação. Vale a pena ressaltar que terapia gênica e células-tronco não
estão diretamente vinculadas. O uso de células-tronco apresenta-se bastante
promissor, já tendo apresentado alguns resultados positivos, por exemplo, na
recuperação do músculo do coração — o miocárdio — em casos de infarto.
Mas ainda é muito cedo para atribuir às células-tronco a capacidade de cura
tão esperada pela população para os mais variados males. Muitas pesquisas
ainda precisam ser feitas.
A terapia gênica ainda continua incipiente, uma vez que, para se obter total
sucesso, é necessário alterar a informação errante do material genético no nú-
cleo celular. Teoricamente, sabe-se o caminho para se conseguir solucionar o
“erro genético”, mas ainda se encontram limitações tecnológicas que precisam
ser desenvolvidas para garantir seu uso terapêutico (BRAUN, 2005).
A utilização da informação genética permite que a qualidade de vida apre-
sente um avanço quantitativo e qualitativo, baseando-se em melhores medica-
mentos, novos diagnósticos, seleção de espécies mais rentáveis e produtivas
para a agricultura e a pecuária.
A genética encontra-se cada vez mais inserida na vida do ser humano. Já
passou o tempo em que falar de genética era abordar as pesquisas com ervi-
lhas do monge Gregor Mendel, o “pai da genética”. Hoje, graças aos avanços
tecnológicos, o material genético tem sido mapeado, decifrado e manipulado.
Resta saber até onde vai o limite humano.

Atividades de aprendizagem
1. Atualmente, é possível retirar células de um feto em desenvolvimento
no útero da mãe e determinar seu cariótipo. Que informações impor-
tantes a análise desse cariótipo pode fornecer?
2. Os cromossomos humanos podem ser estudados em células do
sangue. Essa análise pode ser feita tanto em linfócitos quanto em
hemácias? Justifique sua resposta.
10 GENÉTICA

Seção 2 Conceitos fundamentais e o


material genético
É uma observação diária de que a prole de camundongos são camundongos
e a prole de humanos são humanos. O que é extraordinário sobre esse fato é que
cada camundongo e cada ser humano começam a vida como uma única célula, o
resultado da fertilização de um ovócito por um espermatozoide, e que os ovócitos
fertilizados de camundongos e humanos são muito parecidos. Eles certamente
não têm semelhança com os organismos adultos aos quais darão origem.
Vamos verificar como essa diferenciação ocorre?

2.1 Enfoque genético à biologia


Todos os organismos multicelulares, plantas e animais, sofrem um processo
de desenvolvimento que transforma o zigoto na planta ou animal adulto. As
novas células surgem como resultado de grandes números de divisões celula-
res, e essas células diferenciam-se tanto morfológica quanto bioquimicamente
para atender a uma variedade de funções, tornando-se, por exemplo, células
sanguíneas, células nervosas, células musculares e células secretoras. Por meio
dessa diferenciação, as células tornam-se organizadas em tecidos e órgãos, cujas
formas e funções são características de cada espécie. Assim, as propriedades
biológicas de um organismo são o produto final de uma sequência de etapas
de desenvolvimento (GRIFFITHS et al., 2008).
Isso significa que os zigotos contem a informação que especifica a sequência
de etapas de desenvolvimentos e as propriedades biológicas do organismo que
são o produto final desse desenvolvimento. Essa informação foi supostamente
passada de genitor para a prole nos gametas que se juntaram para formar o zigoto.
Qualquer que seja a base física da passagem da informação, segundo Griffiths
et al. (2008), ela deve ter quatro propriedades. Veja, a seguir, quais são elas.

2.1.1 Diversidade de estrutura


As estruturas celulares que levam a informação sobre o desenvolvimento e
a função devem ser capazes de existir em um imenso número de formas dife-
rentes, cada uma especificando um aspecto diferente do organismo complexo.
Deve haver informação sobre o desenvolvimento de todos os tipos diferentes de
células, tecidos, órgãos e processos bioquímicos que caracterizam a espécie.
Introdução à genética 11

2.1.2 Capacidade de se replicar


A fusão de um gameta masculino e um gameta feminino produz um único
camundongo, embora esse camundongo venha, na maturidade sexual, a pro-
duzir um número imenso de gametas que contêm a informação necessária
para fazer outra geração de camundongos. Deve haver algum mecanismo de
replicação para copiar a estrutura portadora de informação, de modo que ela
possa ser passada do genitor para a prole.

2.1.3 Mutabilidade
Os membros individuais de uma espécie não são idênticos; mesmo assim,
a prole tende a se assemelhar com os genitores. As diferenças na cor da pele
e forma do cabelo que diferenciam típicos africanos subsaarianos dos típicos
europeus do Norte são herdadas por seus filhos, não importando em que con-
tinente eles nasceram. Contudo, os europeus do Norte são descendentes de
grupos que saíram da África há dezenas de milhares de anos e, na época dessa
migração, assemelhavam-se a seus ancestrais africanos. Nos anos intercalares,
as mudanças nas informações sobre a cor da pele e forma dos cabelos ocorre-
ram e se espalharam pela prole tanto dos emigrantes quanto dos parentes que
ficaram em seus lares. As estruturas portadoras das informações, então, têm
de ser capazes de sofrer mudanças, chamadas mutações. Todas as espécies
que existem surgiram da evolução de espécies ancestrais que se diferenciaram
delas em uma variedade de características. Camundongos e humanos têm um
ancestral em comum. Assim, em alguma época do passado, devem ter surgido
mutações que alteraram algumas das informações passadas entre os pais e a
prole, e essas mudanças devem ter sido herdadas. Tais mutações podem re-
sultar em alterações relativamente pequenas em alguma propriedade de um
organismo, tal como cor da pele, ou em grandes alterações na forma, tais como
as que diferenciam os humanos dos camundongos. O acúmulo de um grande
número de mutações pode até mesmo resultar na formação de estruturas to-
talmente novas, tais com os membros dos vertebrados.

2.1.4 Tradução
Não é suficiente que exista um mecanismo apenas para transferir informa-
ções sobre um organismo de uma geração para outra por meio do zigoto. Um
mapa deve conter a informação necessária para especificar um automóvel,
por exemplo; mas, sem a maquinaria da fábrica, funcionários e energia, não
12 GENÉTICA

seria fabricado o carro. Analogamente, o zigoto e as células que surgem de


suas divisões devem ter uma maquinaria que possa ler a informação herdada e
traduzi-la em uma grande diversidade de estruturas biológicas que constituem a
forma e a função do organismo. Além disso, esses eventos de tradução devem
ocorrer em épocas determinadas do desenvolvimento do organismo e em algu-
mas partes do organismo, mas não em outras. A informação sobre a estrutura
química da hemoglobina, por exemplo, deve ser traduzida em moléculas de
hemoglobina, começando em certo estágio do desenvolvimento de um feto,
e esse evento traducional deve ocorrer na medula óssea, mas não nas células
neurais que irão constituir o cérebro.
Os elementos básicos do sistema de informação herdada atualmente são
chamados genes, termo introduzido em 1909 por Wilhelm Johannsen, que
investigava a herança genética em feijões. A coleção de todos os genes em um
organismo é chamada de genoma. O campo da genética envolve a diversidade,
replicação, mutação e tradução da informação nos genes (GRIFFITHS et al.,
2008).

Questões para reflexão


Possuímos de 25 mil a 30 mil genes em nosso genoma. Até agora, foram
fornecidas patentes para mais de 6 mil desses genes. Será que as empre-
sas ou indivíduos estariam qualificados para patentear genes humanos?

2.2 Genética e as perguntas da biologia


A ciência da genética começou com o trabalho do monge austríaco
Gregor Mendel, que publicou o resultado de seus experimentos em cruza-
mentos entre linhagens que haviam herdado variações em ervilhas, em 1865.
Mendel (Figura 1.2) não só obteve resultados experimentais de cruzamentos
controlados, como também deduziu a existência de distintos “fatores” que
levaram a informação sobre o desenvolvimento dos genitores para a prole. No
começo do século XX, tornou-se aparente que a informação que especifica o
desenvolvimento dos organismos estava contida nos cromossomos do núcleo
celular (GRIFFITHS et al., 2008).
Introdução à genética 13

Figura 1.2 Gregor Mendel

Fonte: Smithsonian Libraries (2014).

Os padrões de herança de características nos cruzamentos entre linhagens


de diferentes variantes herdadas, descobertos e escritos sistematicamente por
Mendel, correspondem aos padrões de distribuição dos cromossomos nos
gametas na meiose. À medida que as pesquisas sobre herança continuavam,
foram descobertas informações sobre várias características situadas em pe-
quenos trechos de material, os genes, situados em pontos diferentes ao longo
dos cromossomos. A estrutura química do material genético e o modo pelo
qual os genes especificam as informações permaneceram desconhecidos até
a metade do século XX. A despeito dessa falta de conhecimento, foi possível
uma grande quantidade de manipulações genéticas que deram um meio para
investigar propriedades biológicas em geral. Como os genes afetam pratica-
mente todas as estruturas e funções de um organismo, ser capaz de identificar
e determinar o papel dos genes é uma etapa importante ao mapear os vários
processos subjacentes à determinada propriedade particular. É interessante que
os geneticistas estudem não apenas os mecanismos hereditários, mas todos os
mecanismos biológicos (GRIFFITHS et al., 2008).
A chave para a análise genética de uma propriedade biológica é examinar
os efeitos das mutações. Descobriu-se que bombardear um organismo com
raios X ou tratá-los com substâncias químicas induz um grande número de mu-
tações com efeitos claros sobre a morfologia do organismo. Algumas mutações
14 GENÉTICA

correspondem a deleções observáveis ou duplicações de pequenos trechos do


material cromossômico. Pelos resultados dos cruzamentos entre as linhagens
portadoras de mutações diferentes, algumas perguntas importantes podem ser
respondidas. Duas alterações de mutações ocorrem no mesmo gene ou em
genes diferentes? Quais as consequências desenvolvimentais e fisiológicas de
combinar mutações diferentes no mesmo organismo?
Essas técnicas experimentais de induzir mutações, que as localizam em
cromossomos e as combinam de diferentes modos, continuam a fornecer um
poderoso método para investigar tanto o desenvolvimento quanto as vias fisio-
lógicas e bioquímicas que constituem a biologia dos organismos. Um exemplo
dos estudos da mosca-das-frutas Drosophila ilustra o que pode ser aprendido
dessas técnicas. Nos anos de 1920 e 1930, foram descobertas algumas mutações
na mosca-das-frutas que fazem as antenas se desenvolverem em estruturas tipo
pernas, enquanto outras mutações e combinações de mutações fazem aparecer
um par extra de assas, transformando uma mosca de duas asas em um inseto
com quatro asas. Outros estudos de mutantes desses tipos revelaram muito
sobre como os membros se desenvolvem em todos os organismos com vários
membros. Além disso, essas mutações deram um forte suporte para a posição
dos evolucionistas e anatomistas de que as asas, pernas e antenas, em organis-
mos diferentes, são variações de uma estrutura básica, podendo ser convertidas
de uma para outra na evolução (GRIFFITHS et al., 2008).
O acúmulo de evidências que começou nos anos de 1920 levou à conclu-
são de que o DNA é o material genético. O poder analítico da investigação
genética aumentou imensamente mais recentemente pelo conhecimento da
estrutura química do DNA, de como a informação no DNA é convertida em
moléculas de atividade celular e como sinais bioquímicos das células contro-
lam que informação genética será lida por células em partes diferentes em sua
história de vida. A Figura 1.3 resume a conexão entre o organismo todo, sua
constituição celular e as estruturas subjacentes cromossômicas e moleculares
que levam a informação sobre o organismo.
Introdução à genética 15

Figura 1.3 Ampliações sucessivas levam o material genético de um organismo a um foco mais nítido

Cada cromossomo
O DNA é uma
Organismo Cada núcleo é uma longa
Um par dupla hélice.
(humano) celular molécula de DNA,
O corpo específico de
contém um e os genes são
humano é feito cromossomos.
complemento regiões funcionais
de trilhões de desse DNA.
idêntico de
células.
cromossomos
em duas cópias.
Cada cópia é
um genoma.

Fonte: Griffiths et al. (2008).

É importante perceber que não há estágio na vida de um organismo em que


a informação genética pare de ser lida. As moléculas com atividade fisiológica
estão sendo produzidas o tempo todo, em parte em resposta a mudanças na
fisiologia do organismo e, em parte, porque as moléculas no organismo estão
sendo degredadas e precisam ser substituídas. Além disso, as células têm um
tempo de vida limitado, e novas devem ser produzidas por divisão celular, com a
produção de novas cópias de seus conteúdos. Portanto, a replicação do DNA,
a mutação e o processamento da informação especificada pelo DNA continuam ao
longo da vida do organismo. Assim, a compreensão de fenômenos genéticos é
um enfoque unificador para a compreensão de uma grande variedade de pro-
cessos na vida de um organismo em todos os estágios, não apenas durante o
desenvolvimento de um adulto a partir de um zigoto (GRIFFITHS et al., 2008).

Para saber mais


A análise genética, usando organismo com mutações, é um método poderoso para investigar
vias bioquímicas, fisiológicas e metabólicas. O desenvolvimento da tecnologia do DNA recom-
binante iniciou a Era da Clonagem e dos Transgênicos. Faça a leitura do artigo: “Saber científico
e saber espontâneo: opiniões de alunos do ensino médio sobre transgênicos”.
Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/ciedu/v14n1/09.pdf>.

A genética também é a base de nossa compreensão da evolução. A mudança


evolutiva é a consequência das diferentes taxas de reprodução de organismo,
16 GENÉTICA

tendo características herdáveis diferentes. Como resultado dessa reprodução


diferencial de diferenças herdáveis, a população sofre mudanças na frequência
na qual variantes diferentes são representadas em gerações sucessivas. A popu-
lação evolui à medida que surgem novas variantes herdadas e tornam-se mais
comuns. O processo de evolução orgânica não pode ser compreendido sem
invocar vários fenômenos genéticos, tais como mutação, padrões de reprodução
e a tradução da informação genética na forma e funcionamento de um indi-
víduo. As explicações evolutivas são, em grande parte, explicações genéticas.
No passado, os biólogos evolutivos reconstruíram correlações evolutivas
entre espécies diferentes comparando um número limitado de diferenças
morfológicas e fisiológicas entre elas. Não era possível saber o quanto dois
organismos tinham ficado diferentes em todas as propriedades biológicas desde
sua divergência evolutiva. Com o advento das técnicas de sequenciamento de
DNA em larga escala, os biólogos evolutivos agora podem comparar genomas
inteiros de espécies, bem como determinar a quantidade de divergências que
ocorreu em diferentes partes desses genomas. Viu-se, por exemplo, que ocorreu
muito pouca mudança genética na divergência dos humanos e chimpanzés em
sua evolução desde seu ancestral primata comum. Todavia, essas diferenças
estão manifestadas no sistema nervoso central, na musculatura da língua e
lábios, no controle motor fino dos apêndices superiores e na postura, mudan-
ças que fazem uma imensa diferença entre a vida de humanos e chimpanzés
(GRIFFITHS et al., 2008).
Vemos, então, que, cada vez mais, as técnicas genéticas de análise fornece-
ram possibilidades inigualáveis para a compreensão de problemas biológicos.
A genética não é apenas um dos muitos aspectos do estudo da biologia. A
análise genética é uma via de enfoque para quase todas as propriedades dos
sistemas vivos.

Atividades de aprendizagem
1. Cite algumas técnicas genéticas utilizadas nos dias atuais.
2. O que são aberrações cromossômicas?
Introdução à genética 17

Seção 3 O material genético


A estrutura dos organismos e seus ativos processos fisiológicos são baseados,
na maior parte, em proteínas. A informação genética para a síntese dessas pro-
teínas pelas células esta contida no DNA (ácido desoxirribonucleico). Convido
você a aprofundar seus conhecimentos nesse universo magnífico que é o estudo
do material genético. Você está pronto? Vamos lá!

3.1 A base molecular da informação genética


Uma molécula de DNA é feita de dois filamentos enrolados um no outro,
em uma longa dupla-hélice. Cada um dos dois filamentos consiste em um
arcabouço feito de cópias repetidas de um açúcar, chamado desoxirribose, e
fosfato; de cada grupo açúcar-fosfato ao longo do arcabouço, projeta-se uma
base nucleotídica. Existem quatro tipos diferentes de bases nos nucleotídeos
no DNA: adenina (A), timina (T), guanina (G) e citosina (C). Na molécula em
dupla-hélice, o arcabouço açúcar-fosfato de cada filamento esta por fora da
hélice, enquanto cada base nucleotídica projeta-se para dentro e faz par com
o filamento oposto (Figura 1.4). Devido ao espaço ocupado pelas bases nu-
cleotídicas, a adenina sempre pareia com timina, enquanto a guanina sempre
pareia com citosina. As bases que formam pares são ditas complementares.

Figura 1.4 A dupla-hélice

Fonte: Griffiths et al. (2008).


18 GENÉTICA

O DNA é composto de duas cadeias nucleotídicas mantidas unidas pelo


pareamento de A com T e G com C. Essa estrutura molecular fornece a base
para as quatro propriedades que caracterizam a informação genética.

3.1.1 Diversidade de estrutura


Embora existam apenas quatro tipos de nucleotídeos em um único filamento
de DNA, esses nucleotídeos podem estar em qualquer ordem, e o trecho de DNA
correspondente a determinado gene pode ter qualquer tamanho. Assim, um tipo
de gene pode ter a sequência TTACGGACCT nas posições 147 e 156, enquanto
outro gene pode ter GCATACGATC nas mesmas posições. Mesmo que os genes
tenham apenas 100 bases de tamanho (eles são muito maiores), haveria apenas 4¹°°,
ou cerca de 1.000.000¹° tipos diferentes possíveis. Como ocorre cada sequência
diferente, mas o número de sequências efetivamente diferentes ainda é enorme.

3.1.2 Habilidade de se replicar


Devido ao pareamento de A em um filamento com T no outro, e C em um
filamento com G no outro, cada filamento contém uma especificação com-
pleta de seu filamento pareado complementar. Na replicação da dupla-hélice,
a primeira etapa é a separação dos dois filamentos complementares. Então, é
feito um novo filamento-filho em cada um dos filamentos separados. Onde o
filamento-molde tem um A, o novo filamento feito contém um T, um T fará par
com A, um C com G e um G com C. O resultado é a produção de duas cópias
idênticas da dupla-hélice original (Figura 1.5).

Figura 1.5 A forquilha de replicação

Dupla hélice original de DNA


Duplas
hélices
idênticas DNA
Sentido
de DNA polimerase
sendo
formadas

Nucleotídeos livres

Fonte: Griffiths et al. (2008).


Introdução à genética 19

O DNA é replicado pela deselicoidização dos dois filamentos da dupla-hélice


e pela construção de um novo filamento complementar sobre cada um dos
filamentos separados da dupla-hélice original.

3.1.3 Mutabilidade
No curso da replicação, uma base incorreta pode ser colocada ou bases
podem ser perdidas ou duplicadas. Caso ocorra tal evento, a nova cópia de
DNA e todas as cópias decorrentes dessa cópia serão diferentes da molécula
ancestral. Terá ocorrido uma mutação herdável.

3.1.4 Tradução em forma e função


De algum modo, determinada sequência de A, T, G e C deve ser usada
pela célula para criar moléculas de proteínas com sequências particulares
de aminoácidos. Além disso, alguma parte do DNA deve agir como um sinal
para a maquinaria da célula de que a tradução de determinado gene em uma
sequência de aminoácidos deve ocorrer em algumas células, em determinados
tecidos e em certas épocas do desenvolvimento e vida do organismo. Como
a maquinaria da célula usa a sequência de bases para determinar tanto as se-
quências de aminoácidos nas proteínas quanto à época e o local de produção
dessas moléculas proteicas?

3.2 Especificando a sequência de aminoácidos de


uma proteína
A transformação da informação na sequência de nucleotídeos em uma se-
quência de aminoácidos em uma molécula que irá dobrar-se para fazer uma
proteína compreende duas etapas: transcrição e tradução (Figura 1.6).
20 GENÉTICA

Figura 1.6 Transcrição e tradução

Fonte: Science Source (2013).

3.2.1 Transcrição
A primeira etapa em transformar a informação no DNA em uma sequência
de aminoácidos é a transcrição da sequência de nucleotídeos no DNA em
uma molécula correlata, o RNA mensageiro (mRNA), que também tem um
arcabouço de nucleotídeos como estrutura. O RNA mensageiro é composto
da molécula de ácido ribonucleico (RNA), que é uma sequência de nucleotí-
deos similar ao DNA exceto por conter ribose em vez de desoxirribose em seu
arcabouço e ter o nucleotídeo uracil (U) em lugar de timina. Na transcrição,
a dupla-hélice de DNA é separada em dois filamentos únicos, e um desses
filamentos serve de molde para a construção de uma sequência de RNA uni-
filamentar. O processo de transcrição, que ocorre no núcleo, é muito similar
ao processo de replicação do DNA, porque o filamento de DNA serve como
molde para fazer um filamento de mRNA. O mRNA, cópia da molécula original
de DNA, é chamado de transcrito. O RNA que é produzido diretamente da
transcrição do DNA pode, então, ser alterado para produzir um mRNA final
(RNA mensageiro). Essa alteração consiste em remover trechos do transcrito
original que não codificam aminoácidos (GRIFFITHS et al., 2008).
O RNA final transcrito é uma espécie de “cópia funcional” do DNA. A pro-
dução desses transcritos serve a três funções importantes na célula. Primeiro,
aumenta o número de cópias de informação genética disponível para a célula a
qualquer tempo. Embora a célula contenha apenas uma cópia de cada uma das
moléculas de DNA que é herdada de cada um de seus genitores, a transcrição
Introdução à genética 21

pode produzir um grande número de cópias funcionais de cada gene. Além


disso, cada uma dessas cópias funcionais pode ser usada mais de uma vez pela
maquinaria funcional em sua produção de proteínas. Segundo, o RNA mensa-
geiro resolve o problema da congestão do tráfego. Como seu nome indica, o
RNA mensageiro deixa a vizinhança imediata dos genes na célula, onde muitos
genes estão sendo transcritos e geralmente passados para o citoplasma da célula,
onde esta disponível à maquinaria celular de produção de proteínas. Terceiro, a
estabilidade e o tempo de vida das moléculas mensageiras atuam como controles
do quanto de determinada proteína será produzido (GRIFFITHS et al., 2008).
Durante a transcrição, um dos filamentos de DNA de um gene serve como
molde para a síntese de uma molécula complementar de RNA.

3.2.2 Tradução
A produção de uma cadeia de aminoácidos com base em uma sequência
de nucleotídeos ocorre no processo de tradução. Como uma sequência feita
apenas de quatro tipos diferentes de nucleotídeos pode gerar uma sequência
de aminoácidos composta de 20 tipos diferentes de aminoácidos? A solução
é que a sequência de nucleotídeos no mRNA é “lida” em grupos sucessivos
de três nucleotídeos ao longo da cadeia de mRNA. Cada grupo de três é um
códon (GRIFFITHS et al., 2008).
AUU CCG UAC GUA AAU UUG
Códon Códon Códon Códon Códon Códon
Como existem, então, 4 × 4 × 4 = 64 trincas códon e apenas 20 aminoáci-
dos, mais de um códon pode corresponder a cada aminoácido. Por exemplo,
AUC, AUU e AUA, codificam o aminoácido leucina. Existem também códons
de fim, tais como o UAG, que indicam o final da sequência traduzida. Esse
processo de transcrição, tradução e regulação dos genes será melhor abordado
na Unidade 4 deste livro.

3.3 O programa de investigação genética


3.3.1 A necessidade da variação
A essência do método genético como meio para explicar fenômenos bio-
lógicos é o uso das diferenças genéticas entre os organismos. Dentre as espécies,
existem diferenças de ocorrência natural entre membros individuais das po-
pulações. Por exemplo, cerca de um terço de todos os genes codificantes de
22 GENÉTICA

proteínas em espécies de reprodução sexuada apresenta alguma variação entre


indivíduos na sequência de aminoácidos que eles codificam. Esse polimorfismo
genético é uma fonte rica de material para o estudo das bases da variação
biológica entre indivíduos (GRIFFITHS et al., 2008).
Quando nenhuma variação herdada de ocorrência natural está disponível
para determinada característica, a variação genética pode ser produzida no la-
boratório usando radiação de alta energia a substâncias químicas para produzir
mutações. Falamos anteriormente que o genoma fornece informações para o
desenvolvimento de vegetais, animais e microrganismos. Do mesmo modo que
um corpo pode ser dissecado usando um bisturi para tentar compreender suas
funções, uma variação genética pode ser usada para entender as vias normais
do desenvolvimento de um organismo. A dissecação genética, em geral, é feita
em um gene de cada vez, onde cada gene é identificado e sua função investi-
gada (GRIFFITHS et al., 2008).
Em adição à compreensão da base das diferenças entre os membros individuais
de uma espécie, pode ser usado o método genético para estudar os eventos
evolucionários (que será abordado na Unidade 4) que resultam na grande diver-
sidade biológica, suas formas e funções. As diferenças entre as formas e funções
das espécies, e o resultado da divergência evolutiva, podem estar relacionados
a diferenças nos genomas desses organismos pela técnica de sequenciamento
de DNA. Vários genomas já foram sequenciados, incluindo o genoma humano.
A variação genética é a diferença genética entre os indivíduos, sendo o foco
dos métodos genéticos de estudo das propriedades biológicas.
James Watson (um geneticista microbiano americano) e Francis Crick (um
físico inglês) descobriram a estrutura do DNA em 1953. Seu modelo da estrutura
de DNA foi revolucionário. Eles propuseram uma definição de gene em termos
químicos e, fazendo isso, abriram o caminho para a compreensão da ação
gênica e da hereditariedade a nível molecular. Uma medida da importância
da sua descoberta é que a estrutura em dupla-hélice tornou-se um ícone, que
é cada vez mais visto frequentemente em pinturas, em esculturas e, mesmo,
em playgrounds (GRIFFITHS et al., 2008).
A história começa na primeira metade do século XX, quando o resultado de
vários experimentos levou os cientistas a concluírem que o DNA é o material
genético, e não outra molécula biológica tal como um carboidrato, proteína ou
lipídeo. O DNA é uma molécula simples feita apenas de quatro nucleotídeos.
Assim, foi necessário compreender como essa molécula tão simples podia ser o
mapa para a incrível diversidade de organismos na Terra (GRIFFITHS et al., 2008).
Introdução à genética 23

O modelo da dupla-hélice proposto por Watson e Crick foi feito com base
nos resultados de cientistas anteriores a eles. Eles se basearam em descobertas
anteriores da composição química do DNA e proporções de suas bases. Além
disso, imagens de difração de raios X revelaram ao olho treinado que o DNA
é uma hélice de dimensões precisas. Watson e Crick concluíram que o DNA é
uma dupla-hélice composta de duas cromátides de nucleotídeos ligados que
se enrolam uma na outra (GRIFFITHS et al., 2008).
A estrutura proposta do material hereditário imediatamente sugeriu como
ele poderia servir como um mapa, e como esse mapa poderia ser transmitido
ao longo das gerações. Primeiro, a informação para fazer um organismo está
codificada na sequência de bases dos nucleotídeos que compõem os dois fila-
mentos de DNA da hélice. Segundo, devido às regras de complementaridade
de bases descobertas por Watson e Crick, a sequência de um filamento deter-
mina a sequência de outro filamento. Desse modo, a informação genética na
sequência de DNA pode ser transmitida de uma geração para a seguinte, e cada
um dos filamentos separados de DNA, servindo como um molde para produzir
novas cópias da molécula. Nesta seção, enfocaremos o DNA, sua estrutura e
a produção de cópias do DNA em um processo chamado de replicação. Exa-
tamente como o DNA é replicado ainda é uma área ativa de pesquisa 50 anos
após a descoberta da dupla-hélice. Nossa compreensão atual do mecanismo de
replicação dá um papel central a uma máquina proteica, chamada replissomos.
Esse complexo de proteínas coordena as numerosas reações que são necessárias
para a rápida e precisa replicação do DNA (GRIFFITHS et al., 2008).

3.4 DNA: o material genético


Segundo Griffiths et al. (2008), vamos revisar o que se sabia sobre os genes e
DNA na época em que Watson e Crick começaram sua história e colaboração:
1. Genes — os “fatores” hereditários descritos por Mendel — eram conheci-
dos como associados a características específicas, mas sua natureza física
não era compreendida. Similarmente, as mutações eram conhecidas
como alterações no funcionamento do gene, mas não era compreendido
o que uma mutação era exatamente.
2. A hipótese de um gene — uma proteína postula que os genes controlam
a estrutura das proteínas.
3. Os genes são conhecidos como levados nos cromossomos.
24 GENÉTICA

4. Os cromossomos consistem em DNA e proteínas.


5. Os resultados de uma série de experimentos, começando nos anos de
1920, revelaram que o DNA era o material genético.

3.4.1 Descoberta da transformação


Frederick Griffiths fez uma curiosa observação no curso de experimentos
na bactéria Streptococcuspneumoniae realizados em 1928. Esta bactéria, que
causa pneumonia em humanos, é normalmente letal em camundongos. Entre-
tanto, algumas linhagens dessa espécie bacteriana evoluíram para ser menos
virulentas (menos capazes de causar doenças ou morte). Os experimentos de
Griffiths estão resumidos na Figura 1.7. Nesses experimentos, Griffiths usou duas
linhagens que são distinguíveis pelo aparecimento de suas colônias quando
cultivadas em culturas laboratoriais. As células dessa linhagem são encapsuladas
em polissacarídeos, dando às colônias um aspecto liso; assim, essa linhagem
é identificada como S. A outra linhagem de Griffiths era um tipo não virulento
mutante que cresce em camundongos, mas não era letal. Nessa linhagem, a
capa de polissacarídeo está ausente, gerando colônias de aspecto rugoso; essa
linhagem é chamada R (GRIFFITHS et al., 2008).

Figura 1.7 Transformação das células r em células S


(a) (b) Linhagem R

Camundongo morre

Camundongo vive
Células vivas
da linhagem S

(c) (d)
Linhagem R

Camundongo morre
Camundongo vive

Linhagem S
Linhagem S morta pelo calor Células vivas
morta pelo calor da linhagem S

Fonte: Griffiths et al. (2008).


Introdução à genética 25

Griffiths matou algumas células virulentas por aquecimento. Ele, então,


injetou células mortas por calor em camundongos. Os camundongos sobrevi-
veram, mostrando que o envoltório das células não causa a morte. Entretanto,
os camundongos injetados com uma mistura de células virulentas mortas pelo
calor e células vivas não virulentas morreram. Além disso, as células vivas po-
diam ser recuperadas dos camundongos mortos. Essas células davam colônias
lisas e eram virulentas em uma subsequente injeção. De algum modo, os restos
celulares das células S aquecidas tinham convertido células R vivas em células
S vivas. Esse processo é chamado de transformação.
A etapa seguinte foi determinar que componente químico das células
doadoras mortas tinha causado essa transformação. Essa substância tinha
mudado o genótipo da linhagem receptora e, portanto, podia ser candidata a
ser o material genético. Esse problema foi resolvido por experimentos feitos
em 1944, por Oswald Avery, com a colaboração de Colin MacLeod e Mclyn
MacCarty (Figura 1.8). Seu enfoque ao problema foi destruir quimicamente
todas as principais categorias de substâncias químicas no extrato das células
mortas, uma de cada vez, e descobrir se o extrato tinha perdido a habilidade
da transformação. As células virulentas tinham um revestimento polissacarídico
liso, enquanto as células não virulentas não tinham. Assim, os polissacarídeos
eram um candidato óbvio a ser o agente transformante.

Figura 1.8 DNA é o agente transformante

Extrato de linhagem S

Sem componentes Polissacarídeos Proteína


Lípidios RNA RNA
destruídos destruídos destruída
destruídos destruído destruído

Camundongo morre Camundongo morre


Camundongo morre Camundongo morre Camundongo morre
Camundongo vive

Linhagem S viva
recuperada Nenhuma linhagem S viva recuperada

Fonte: Griffiths et al. (2008).


26 GENÉTICA

Entretanto, quando os polissacarídeos foram destruídos, a mistura ainda


podia se transformar. Proteínas, gorduras e ácidos ribonucleicos (RNA) foram
todos mostrados como não sendo o agente transformante. A mistura perdia sua
habilidade transformante apenas quando a mistura doadora era tratada com
a enzima desoxirribonuclease (DNase), que quebra o DNA. Esses resultados
indicaram fortemente que o DNA era o material genético. Atualmente, é sabido
que os fragmentos do DNA transformante que conferem a virulência entram
no cromossomo bacteriano e substituem suas contrapartes que conferem a não
virulência (GRIFFITHS et al., 2008).
A demonstração de que o DNA é o princípio transformante foi a primeira
demonstração de que os genes são compostos de DNA.

3.4.2 A estrutura do DNA


Mesmo antes de a estrutura do DNA ser elucidada, os estudos genéticos
indicaram que o material genético deve ter três propriedades principais, baseado
na obra de Griffiths et al. (2008):
1. Como essencialmente cada célula do corpo de um organismo tem a
mesma constituição genética, a replicação fiel do material genético em
cada divisão celular é crucial. Assim, as características estruturais do
DNA devem permitir uma replicação fiel. Essas características estruturais
serão consideradas mais adiante nesta unidade.
2. Como ele deve codificar uma constelação de proteínas expressas por
um organismo, o material genético deve ter conteúdo informacional.
A informação codificada no DNA é decifrada para produzir proteínas.
3. Como as alterações hereditárias, chamadas mutações, fornecem a matéria-
-prima para a seleção evolutiva, o material genético deve ser capaz de mu-
dar em raras ocasiões. Entretanto, a estrutura do DNA deve ser estável, de
modo que os organismos possam se basear em sua informação codificada.

3.4.3 A estrutura do DNA antes de Watson e Crick


Considere a descoberta da estrutura da dupla-hélice de DNA por Watson
e Crick como a solução de um complicado quebra-cabeça tridimensional.
Para resolvê-lo, Watson e Crick usaram um processo chamado “construção
de modelo”, no qual eles reuniram os resultados de experimentos anteriores
e continuados (as peças do quebra-cabeça) para formar o quebra-cabeça
Introdução à genética 27

tridimensional (modelo de dupla-hélice). Para saber como o fizeram, primeiro,


precisamos conhecer que peças do quebra-cabeça estavam disponíveis a Wat-
son e Crick em 1953 (GRIFFITHS et al., 2008).

3.4.4 Os blocos estruturais do DNA


A primeira etapa do quebra-cabeça era o conhecimento dos blocos estruturais
básicos do DNA. Como substância química, o DNA é bem simples. Ele contém
três tipos de componentes químicos: (1) fosfato; (2) um açúcar chamado desoxir-
ribose; e (3) quatro bases nitrogenadas: adenina, guanina, citosina e timina. Os
átomos de carbono nas bases têm números para facilitar a referência. O açúcar
no DNA é chamado “desoxirribose” porque tem apenas um átomo de hidrogênio
(H) no carbono 2’, ao contrário da ribose (componente do RNA), que tem um
grupo hidroxila (OH) nessa posição. Duas das bases, adenina e guanina, têm
uma estrutura de dois anéis, característica de um tipo de substância chamada
purina. As outras duas bases, citosina e timina, têm uma estrutura com um só
anel, chamada pirimidina. Os componentes químicos do DNA são dispostos em
grupos chamados nucleotídeos, cada um composto de um grupo fosfato, uma
molécula de desoxirribose e qualquer uma das bases (Figura 1.9). É conveniente
chamar cada nucleotídeo pela primeira letra do nome da sua classe: A, G, C ou T.
O nucleotídeo com a base adenina é chamado de desoxiadenosina 5’-monofos-
fato, em que 5’ refere-se à posição do átomo de carbono no anel de açúcar ao
qual o único grupo (mono) fosfato é ligado (GRIFFITHS et al., 2008).
28 GENÉTICA

Figura 1.9 Bases nitrogenadas do DNA

Timina
Adenina

Guanina

Citosina

D = Desoxirribose
(açúcar)
P = Fosfato
Ligação de
Hidrogênio

Fonte: Science Source (2013).

3.4.5 As regras de Chargaff da composição de bases


A segunda peça do quebra-cabeça usado por Watson e Crick veio de um
trabalho feito por Erwin Chargaff. Estudando uma grande seleção de DNA de
organismos diferentes, Chargaff estabeleceu algumas regras empíricas sobre as
quantidades de cada tipo de nucleotídeo encontrado no DNA. Para as informações
seguintes também foram utilizadas as referências de Griffiths et al. (2008):
1. A quantidade total de nucleotídeos pirimidínicos (T + C) é sempre igual
à quantidade total de nucleotídeos purínicos (A+G).
2. A quantidade de T é sempre igual à quantidade de A, e a quantidade de
C é sempre igual à quantidade de G. Mas a quantidade de A+T não é
necessariamente igual à quantidade de G+C.
Introdução à genética 29

3.4.6 Análise de difração de raios X do DNA


A terceira e mais controversa peça do quebra-cabeça veio de dados de dia-
fração de raios X na estrutura do DNA, em que os dados disponíveis sugerem
que o DNA é longo e fino, e tem duas partes similares, que são paralelas umas
as outras e correm ao longo da molécula. Os dados do raio X mostraram que
a molécula é helicoidal (em espiral) (GRIFFITHS et al., 2008).
A estrutura tridimensional decifrada por Watson e Crick é composta de
duas cadeias lado a lado (“filamentos”) de nucleotídeos torcidos na forma de
uma dupla-hélice. Os dois filamentos de nucleotídeos são mantidos juntos por
pontes ou ligações de hidrogênio entre as bases de cada filamento, formando
uma estrutura como uma escada em espiral. O arcabouço de cada filamento é
formado de unidades alternadas de fosfato e desoxirribose que são conectadas
por ligações fosfodiéster (GRIFFITHS et al., 2008).
O DNA é uma dupla-hélice composta de duas cadeias de nucleotídeos
mantidas juntas pelo pareamento complementar de A com T e G com C.
A descoberta de Watson e Crick da estrutura do DNA é considerada por
alguns a descoberta biológica mais importante do século XX, e mereceu prêmio
Nobel para Maurice Wilkins em 1962 (Rosalind Franklin morreu de câncer em
1958, e o prêmio não é concedido após a morte). O motivo de essa descoberta
ser considerada tão importante é a dupla-hélice, além de ser consistente com
os dados anteriores sobre a estrutura do DNA, preenche os três requisitos para
uma substância hereditária (GRIFFITHS et al., 2008).
A estrutura em dupla-hélice sugere como o material genético pode deter-
minar a estrutura das proteínas. Talvez a sequência de pares de nucleotídeos
no DNA determine a sequência de aminoácidos na proteína especificada por
este gene. Em outras palavras, algum tipo de código genético pode escrever a
informação no DNA como uma sequência de nucleotídeos e, então, traduzi-las
em uma linguagem diferente de sequências de aminoácidos na proteína, como
veremos nas unidades seguintes. Se a sequência de bases do DNA especifica
a sequência de aminoácidos, então é possível uma mutação pela substituição
de um tipo de base por outro em uma ou mais posições. Como Watson e Crick
disseram nas palavras de conclusão de sua publicação de 1953 na Nature, re-
latando a estrutura de dupla-hélice do DNA: “Não escapou à nossa percepção
que o pareamento específico que postulamos sugere imediatamente um possível
mecanismo de cópia para o material genético” (GRIFFITHS et al., 2008).
30 GENÉTICA

3.4.7 Replicação semiconservativa


O mecanismo de cópia ao qual Watson e Crick se referiam é chamado de
replicação semiconservativa, como podemos observar na Figura 1.10 abaixo:

Figura 1.10 Replicação semiconservativa

Os dois
filamentos da
dupla hélice
parental
desenrolam-
se, e cada um
especifica um
novo filamento-
filho pelas regras
de pareamento de
bases

Antigo

Novo

Fonte: Griffiths et al. (2008)

Na replicação semiconservativa, a dupla-hélice de cada molécula-filha


de DNA contém um filamento da molécula original de DNA e um filamento
recém-sintetizado. Entretanto, na replicação conservativa, a molécula parental
de DNA é conservada, e uma única dupla-hélice-filha é produzida, consistindo
em dois filamentos recém-sintetizados. Na replicação dispersiva, as moléculas-
-filhas consistem em filamentos, cada um contendo segmentos de ambos, DNA
parentais e DNA recém-sintetizados. Na Figura 1.11, podemos observar os três
modelos alternativos para replicação do DNA (GRIFFITHS et al., 2008).
Introdução à genética 31

Figura 1.11 Três modelos para replicação do DNA

Replicação
semiconservativa

Replicação conservativa

Replicação dispersiva

Fonte: Griffiths et al. (2008)

3.5 RNA: conceitos e processamentos


Usando seus conhecimentos recém-adquiridos das sequências de DNA de
genomas inteiros, os cientistas foram capazes de determinar o número de genes
em vários organismos, tanto simples quanto complexos. No início, não houve
surpresas; a bactéria Eschechiria coli tem cerca de 3.200 genes, enquanto a
mosca de frutas Drosophilamelanogaster tem cerca de 13.600 genes. O au-
mento de complexidade foi suposto como requerendo mais genes e, assim, as
primeiras estimativas foram de que nosso genoma tivesse 100.000 genes.
Em uma conferência enfocada nas pesquisas genômicas em 2000, os cien-
tistas começaram com uma reunião informal, que seria vencida pela pessoa
que obtivesse a previsão mais próxima do número real de genes no genoma
humano. Os números variaram de cerca de 26.000 a cerca de 15.000 genes
(GRIFFITHS et al., 2008).
Os primeiros pesquisadores tiveram bons motivos para pensar que a infor-
mação genética não é transferida diretamente do DNA para a proteína. Em uma
32 GENÉTICA

célula eucariótica, o DNA é encontrado no núcleo, enquanto as proteínas são


sintetizadas no citoplasma. Mas quem seria o intermediário neste processo?

3.5.1 Os primeiros experimentos sugerem um RNA


intermediário
Em 1957, Elliot Volkin e Lawrence Astrachan fizeram uma significativa ob-
servação. Eles descobriram que uma das mais marcantes mudanças moleculares
que ocorrem quando E. coli é infectada pelo fago T2 é um rápido surto de síntese
de RNA. Além disso, esse RNA induzido por fago é renovado rapidamente,
isto é, seu tempo de vida é curto, da ordem de minutos. Seus surgimento e
desaparecimento sugerem que o RNA pode ter algum papel na expressão do
genoma de T2 necessário para fazer mais partículas do vírus. Mas afinal, quais
são as propriedades e características do RNA?
De acordo com Griffiths et al. (2008), as características gerais do RNA im-
portantes são:
1. O RNA é geralmente uma cadeia de nucleotídeos unifilamentares, ou
seja, uma fita simples, não uma dupla-hélice como no DNA. Uma con-
sequência é que o RNA é mais flexível e pode formar uma variedade
muito maior de formas moleculares tridimensionais complexas do que
pode o DNA bifilamentar. Um filamento de RNA pode se dobrar de tal
modo que algumas de suas próprias bases podem fazer par com outras.
Tal pareamento intramolecular de bases é um determinante importante
da forma do RNA.
2. O RNA tem o açúcar ribose em seus nucleotídeos, em vez da desoxir-
ribose encontrada no DNA. Como os nomes sugerem, os dois açúcares
diferem na presença ou ausência de apenas um átomo de oxigênio. O
açúcar RNA contém um grupo hidroxila (OH) ligado ao átomo de car-
bono 2’, enquanto o açúcar DNA tem apenas um átomo de hidrogênio
ligado ao átomo de carbono 2’. A presença do grupo hidroxila no átomo
de carbono 2’ facilita a ação do RNA em muitos processos celulares
importantes.
Como um filamento individual de DNA, um filamento de RNA é formado
por um arcabouço de fosfato e açúcar, com uma base covalentemente ligada à
posição 1’ em cada ribose. As ligações açúcar-fosfato são feitas nas posições 5’ e 3’
do açúcar, como no DNA; logo, uma cadeia de RNA terá uma ponta 5’ e uma 3’.
Introdução à genética 33

3. Os nucleotídeos de RNA (chamados de ribonucleotídeos) contêm as


bases adenina, guanina e citosina, mas a base pirimidínica uracil (abre-
viada por U) está presente no lugar de timina.
Uracil forma pontes de hidrogênio com adenina do mesmo modo que a
timina faz. Além disso, uracil é capaz de fazer pareamento de bases com
G. As bases U e G formam pares de bases apenas durante o dobramento
do RNA e não durante a transcrição. As duas pontes de hidrogênio que
podem ser formadas entre U e G são mais fracas que as duas que se
formam entre U e A. A habilidade de U parear com A e G é o principal
motivo por que o RNA pode formar estruturas complicadas, muitas das
quais são importantes em processos biológicos.
4. O RNA, como as proteínas, mas não como o DNA, pode catalisar reações
biológicas. O nome ribozima foi criado para as moléculas de RNA que
funcionam como enzimas proteicas.

3.5.2 Classes de RNA


Os RNA podem ser agrupados em duas classes gerais. Uma classe de RNA
codifica a informação necessária para fazer cadeias polipeptídicas (proteínas).
Chamamos essa classe de RNA mensageiro (mRNA), porque, como um men-
sageiro, esses RNAs servem como intermediários e passam a informação do
DNA para a proteína. Chamamos as outras classes de RNA funcionais, porque
o RNA não codifica a informação para fazer proteínas. Em vez disso, o próprio
RNA é o produto funcional final. Como o RNA é uma molécula tão versátil,
ele pode atender a muitos papéis funcionais e participar de uma variedade de
processos celulares (GRIFFITHS et al., 2008).
RNA mensageiro: as etapas pelas quais um gene influencia o fenótipo são
chamadas de expressão gênica. Para a grande maioria dos genes, o RNA transcrito
é apenas um intermediário necessário para a síntese de uma proteína, que é o
produto final funcional que influencia o fenótipo (OTTO; NETTO; OTTO, 2013).
RNA funcional: à medida que sabemos mais sobre os detalhes íntimos da
expressão gênica e regulação, torna-se aparente que os RNAs funcionais caem
em uma variedade de classes e têm papéis diversos. Novamente, é importante
enfatizar que os RNAs funcionais são ativos como RNA; eles nunca são tradu-
zidos em polipeptídeos (GRIFFITHS et al., 2008).
34 GENÉTICA

As principais classes de RNA funcionais contribuem para várias etapas na


transferência da informação do DNA para a proteína, no processamento de
outros RNA e na regulação do RNA e níveis de proteínas nas células. Duas
dessas classes de RNA funcionais são encontradas tanto em procariontes quanto
eucariontes: RNA transportadores e RNA ribossômicos (GRIFFITHS et al., 2008;
OTTO; NETO; OTTO, 2013).
RNA transportados (tRNA): são moléculas responsáveis por levar o ami-
noácido correto para o mRNA no processo de tradução (será abordado com
detalhes na Unidade 4 deste caderno).
RNA ribossômico (rRNA): são moléculas dos principais componentes dos
ribossomos, que são grandes máquinas macromoleculares que guiam a mon-
tagem da cadeia de aminoácidos pelo mRNA e tRNA.
Toda a coleção de tRNA e rRNA é codificada por um pequeno número de
genes. Entretanto, embora os genes que os codificam estejam em pequeno
número, os rRNA respondem por uma grande percentagem do RNA na célula,
porque eles são tanto estáveis quanto transcritos em muitas cópias. De acordo
com Griffiths et al. (2008), outra classe de RNA funcionais participam do pro-
cessamento do RNA e são específicos dos eucariontes:
Pequenos RNA nucleares (snRNA): são parte de um sistema que processa
os RNA transcritos nas células eucarióticas. Alguns snRNA unem-se a várias
subunidades proteicas para formar o complexo ribonucleoproteico de proces-
samento (o spliceossomo), que remove íntrons dos mRNA eucarióticos.
Finalmente, uma grande fração dos genomas eucarióticos é transcrita em
um grupo diverso de RNA funcionais que participam na regulação da expres-
são gênica em muitos níveis. Duas classes desse RNA funcional, microRNA e
pequenos RNA de interferência, podem ser codificadas por grandes partes dos
genomas eucarióticos:
MicroRNA (miRNA): recentemente, foram reconhecidos pelos cientistas
como tendo um amplo papel na regulação da quantidade de proteínas produzidas
por muitos genes eucarióticos (OTTO; NETTO; OTTO, 2013).
Pequenos RNA de interferência (siRNA): ajudam a proteger a integridade
dos genomas de plantas e animais. os pequenos RNA de interferência inibem
a produção de vírus e impedem a dispersão de elementos de transposição para
outros loci cromossômicos (GRIFFITHS et al., 2008).
Introdução à genética 35

Questões para reflexão


Depois de conhecermos algumas estruturas no DNA e suas funções,
você considera os íntrons importantes? Se eles não tivessem alguma
contribuição, será que já não deveriam ter sido eliminados do DNA
ao longo das gerações?

A primeira etapa na transferência da informação do gene para a proteína


é produzir um filamento de RNA cuja sequência de bases é complementar à
sequência de bases de um segmento de DNA, às vezes, seguido de modificação
desse RNA para prepará-lo para seus papéis celulares específicos. Assim, o RNA
é produzido por um processo que copia a sequência de nucleotídeos do DNA.
Como esse processo é reminiscente da transcrição (cópia) de palavras escritas,
a síntese do RNA é chamada de transcrição. O DNA é dito sendo transcrito em
RNA, e o RNA é chamado de transcrito (GRIFFITHS et al., 2008).
Como a informação vai do DNA para as proteínas? A replicação era a me-
tade simples da questão estrutural do DNA e funções. A questão mais difícil foi
como a molécula de DNA — uma molécula muito grande composta de apenas
quatro nucleotídeos (adenina, timina, citosina e guanina) — poderia funcionar
como molde para a síntese de tantas proteínas diferentes? Os nucleotídeos são
um tipo de código para a síntese de proteínas? Como o código é lido? Sabia-se
que a síntese proteica ocorria em associação com os ribossomos, mas como
esse processo funciona?
No início, muito do que se determinou sobre DNA e biologia molecular foi
descoberto a partir de trabalhos com bactérias e bacteriófagos. No entanto, a
noção de que proteínas não podem ser feitas diretamente a partir do DNA partiu
de estudos com eucariotos. Sendo assim, reconheceu-se que em eucariotos o
DNA reside dentro do núcleo, enquanto que a síntese de proteínas ocorre no
citoplasma. Ponderou-se que a informação genética deveria ser transportada a
partir do DNA no núcleo para o citoplasma da célula, por algum intermediário.
O mecanismo de transcrição será mais bem explicado na Unidade 4 deste livro.
36 GENÉTICA

Para saber mais


Mais de 210 tipos de células são descritos nos manuais de histologia. A variedade no tamanho,
formas e funções está atribuída à ativação ou inativação de determinados genes. Algumas
dessas células, como as células epiteliais e os fibroblastos, têm essencialmente o mesmo papel
em diferentes órgãos e sistemas.

Atividades de aprendizagem
1. O processo de transcrição e tradução é muito importante para a sín-
tese de proteínas. Descreva o que significa cada um desses processos
e em qual região celular eles ocorrem.
2. Uma anomalia genética autossômica recessiva é condicionada por
uma alteração da sequência de DNA. Um homem portador dessa
anomalia apresenta a sequência timina-citosina-timina, enquanto sua
mulher que é normal apresenta a sequência timina-adenina-timina.
A análise do DNA de um filho do casal mostrou que ele é portador
tanto da sequência de bases do pai quanto da mãe. O filho terá a
doença? Por quê?
Introdução à genética 37

Fique ligado!
Nesta unidade você aprendeu que:
A genética é uma área utilizada nas mais variadas atividades, princi-
palmente aquelas relacionadas a novas pesquisas médicas, biomédicas
e ambientais.
Percebemos que a genética é a ciência que estuda os genes e os meca-
nismos envolvidos na sua hereditariedade e que o homem utiliza essa
ciência desde os tempos mais remotos, mesmo que de forma empírica.
Como uma disciplina moderna, ela começou nos anos de 1860, com o
trabalho de Gregor Mendel, que primeiro formulou a ideia da existência
de genes.
Hoje sabemos que um gene é uma região funcional da longa molécula
de DNA que constitui a estrutura fundamental de um cromossomo.
O DNA é composto de quatro nucleotídeos, cada um contendo um
açúcar desoxirribose, fosfato e uma de quatro bases: adenina (A), timina
(T), guanina (G) e citosina (C).
Vimos que a informação não é transferida diretamente do DNA para
a proteína, pois, em uma célula eucariótica, o DNA está no núcleo,
enquanto a proteína é sintetizada no citoplasma.
A transferência da informação do DNA para uma proteína requer um
intermediário. Esse intermediário é o RNA.
O RNA é uma fita simples, seu açúcar é a ribose e, ao invés de timina,
ele possui uracil (ou uracila) em seus nucleotídeos.

Para concluir o estudo da unidade


Querido estudante, chegamos ao final desta etapa e espero ter auxiliado
você nesta trajetória sobre os estudos da genética. Aproveite e continue
aprofundando seus conhecimentos sobre o tema, por meio de leituras na
literatura específica. Algumas encontram-se nas referências bibliográficas.
Boa leitura e bons estudos!
38 GENÉTICA

Atividades de aprendizagem da unidade


Com base nos conhecimentos adquiridos ao longo desta unidade,
Responda aos seguintes questionamentos:
1. Os 24 tipos de cromossomos encontrados no genoma humano po-
dem ser prontamente identificados citologicamente por uma série
de procedimentos específicos de coloração. Existem três métodos
de coloração comumente utilizados que podem distinguir os cro-
mossomos humanos: padrão de bandas Giemsa; padrão de bandas
Q e padrão de bandas R. Para situações particulares, uma série de
técnicas especializadas podem ser utilizadas. Existe uma técnica que
envolve especificamente a coloração da região do centrômero de
cada cromossomo e de outras regiões que contêm heterocromatina
constitutiva. A heterocromatina é o tipo de cromatina definida pela sua
propriedade de permanecer no estado condensado e de assumir uma
coloração escura nas células que não então se dividindo (interfase).
Esse procedimento citológico especial é conhecido como:
a) Padrão de bandas C.
b) Padrão de bandas de alta resolução.
c) Padrão de bandas R.
d) Hibridização in situ por fluorescência.
e) Eosina/hematoxilina.
2. A inativação do cromossomo X acontece nas células somáticas em
mulheres normais (mas não em homens normais), onde um dos cro-
mossomos X é inativado em uma fase precoce do desenvolvimento,
portanto igualando a expressão dos genes ligados ao X nos dois se-
xos. Nas células normais femininas, a escolha de qual cromossomo
X deve ser inativado é aleatória, sendo mantida em cada linhagem
clonada. Deste modo, mulheres são mosaicos no que se diz respeito
à expressão de genes ligados ao X; algumas células expressam alelos
X herdados do pai, mas não herdados da mãe, enquanto outras fazem
o oposto. Este padrão de expressão de gene diferencia muito genes
ligados ao X dos genes “imprintados” (que também são expressão de
apenas um alelo, porém determinados pela origem parental, e não
Introdução à genética 39

aleatoriamente), como também da maioria dos genes autossômicos


que são expressos em ambos alelos. A região promotora de muitos
genes na inativação do cromossomo X é extensivamente modificada
pela adição de um grupo metila à citosina (NUSSBAUM et al., 2008).
O cromossomo X inativo pode ser identificado:
a) Através da presença de três cromossomos no par 16.
b) Citologicamente, pela presença de uma massa heterocromática,
chamada Corpúsculo de Barr.
c) Citologicamente, pela presença de inúmeros núcleos com
heterocromatina.
d) Através da replicação tardia na anáfase.
e) Através de um cariótipo com a presença de 47 cromossomos.
3. A informação genética está contida no DNA nos cromossomos, dentro
do núcleo celular. No entanto, a síntese de proteínas, processo pelo
qual a informação codificada no genoma é verdadeiramente utilizada
para especificar funções celulares, ocorre no citoplasma. Essa com-
partimentalização reflete o fato de que o organismo humano é um
eucarionte. Isso significa que as células humanas possuem um núcleo
genuíno que contém o genoma, que é separado do citoplasma por
uma membrana nuclear. A ligação molecular entre esses dois tipos
relacionados de informação (o código do DNA dos genes e o código
de aminoácidos das proteínas) é o ácido ribonucleico (RNA). A es-
trutura química do RNA é semelhante à do DNA, exceto que cada
nucleotídeo no RNA possui um componente açúcar ribose no lugar
da desoxirribose; além disso, a uracila substitui a timina como uma
da pirimidinas do RNA (NUSSBAUM et al., 2008). Uma diferença adi-
cional entre RNA e o DNA é que o RNA, na maioria dos organismos,
existe como uma molécula de filamento único, enquanto o DNA,
como uma hélice dupla. Para que aconteça a produção de aminoá-
cidos e, posteriormente, proteínas, acontece um evento chamado de
transcrição, que tem como características:
a) O RNA é sintetizado a partir do molde do DNA, carregando a
informação codificada sob a forma de RNA mensageiro.
b) O RNA é transportado até os ribossomos das células, onde acon-
tece a formação de vitaminas.
40 GENÉTICA

c) Atuam os genes de RNA-não-codificadores, cujo produto final é


um RNA, não uma proteína.
d) Os íntrons são mantidos na transcrição, pois serão importantes
para a produção proteica.
e) O RNAt é codificado através do DNA.
4. As características de gene único, provocadas por mutações em genes
do genoma nuclear, são frequentemente denominadas mendelianas
porque, assim como as características das ervilhas de jardim estudadas
por Gregor Mendel, ocorrem, em média, em proporções fixas entre
a descendência de tipos específicos de acasalamentos. As doenças
de gene único conhecidas até o momento listam 3.917 doenças com
padrões mendelianos, sendo que destas, 3.310, ou cerca de 84%,
são provocadas por mutações e, 1.990, genes. O número de doenças
com causas genéticas reconhecidas e o número de genes nos quais
as mutações podem provocar a doença não são os mesmos, porque
diferentes mutações no mesmo gene podem provocar diferentes do-
enças, e mutações em genes diferentes podem provocar doenças se-
melhantes ou indistinguíveis. Os restantes 16% das doenças na OMIM
são patologias com claros padrões de herança mendeliana, mas os
genes mutantes responsáveis ainda são desconhecidos (NUSSBAUM et
al., 2008). A herança monogênica ou mendeliana se caracteriza por:
a) Determinada por características fenotípicas, que nunca terão ma-
nifestação no genótipo.
b) Se distribuírem de maneira contínua na população, apresentando
diversos fenótipos intermediários, de um extremo ao outro.
c) Constituída de muitos genes situados em diferentes lócus.
d) Determinada por diversos genes, com influência ambiental.
e) Ser determinada por um gene apenas, apresentando genótipos e
fenótipos distribuídos conforme padrões característicos.
5. Gregor Mendel nasceu em 20 de julho de 1822, em um pequeno povoado
chamado Heinzendorf, na atual Áustria. Ele foi batizado com o nome
de Johann Mendel, mudando o nome para Gregor após ingressar para
a ordem religiosa dos agostinianos. Foi ordenado sacerdote no ano
de 1847. Entre os anos de 1851 e 1853, estudou História Natural na
Introdução à genética 41

Universidade de Viena. Neste curso, adquiriu muitos conhecimentos


que foram de extrema importância para o desenvolvimento de suas
teorias (leis). Aproveitou também os conhecimentos adquiridos do
pai, que era jardineiro, para começar a fazer pesquisas com árvores
frutíferas. Em 1856, já fazia pesquisas com ervilhas, nos jardins do
monastério. Sua teoria principal era a de que as características das
plantas (cores, por exemplo) deviam-se a elementos hereditários.
Como passava grande parte do tempo dedicando-se às atividades
administrativas do monastério, foi deixando de lado suas pesquisas
relacionadas ao estudo da hereditariedade. Morreu em 6 de janeiro
de 1884 sem que tivesse, em vida, seus estudos reconhecidos. É so-
mente no começo do século XX que alguns pesquisadores puderam
verificar a importância das descobertas de Mendel para o mundo da
genética. “Cada caráter é condicionado por um par de fatores que se
separam na formação dos gametas”. Mendel, ao enunciar essa lei, já
admitia, embora sem conhecer, a existência das seguintes estruturas
e processo de divisão celular, respectivamente:
a) Cromossomos, mitose.
b) Núcleos, meiose.
c) Núcleos, mitose.
d) Genes, mitose.
e) Genes, meiose.
42 GENÉTICA

Referências
BRAUN, C. F. S. Genética: como as pesquisas genéticas estão presentes no cotidiano.
2005. Disponível em: <http://educacao.uol.com.br/disciplinas/biologia/genetica-como-as-
pesquisas-geneticas-estao-presentes-no-cotidiano.htm>. Acesso em: 30 mar. 2014.
GENÉTICA é o campo de estudo mais popular. Pfarma, 15 mar. 2011. Disponível em: <http://
pfarma.com.br/noticia-setor-farmaceutico/carreira-farmaceutica/519-genetica-e-o-campo-de-
estudo-mais-popular.html#ixzz2xVL6gyRR>. Acesso em: 21 jul. 2014.
GRIFFITHS, A. J. F. et al. Introdução à genética. 9. ed. Rio de Janeiro: guanabara Koogan, 2008.
KLUG, W. S. et al. Conceitos de genética. 9ed. Porto Alegre: Artmed, 2010.
MELLO, J. L. J. Genética. Associação Educacional Leonardo da Vinci (ASSELVI). Indaial:
Asselvi: 2008.
NUSSBAUM, Robert L. et al. Thompson & Thompson genetica médica. 7. ed. Rio de
Janeiro: Elsevier, 2008.
OTTO, P. A.; NETTO, R. C. M.; OTTO, P. G. Genética médica. São Paulo: Roca, 2013.
Unidade 2
Bases da
hereditariedade
Gabriel Marcos Domingues de Souza

Objetivos de aprendizagem: Nesta unidade, queremos levá-lo a


compreender os mecanismos de transferência da informação através
da descendência.
Você irá compreender como a segregação dos cromossomos, demons-
trada por Gregor Mendel, promove a herdabilidade das características
oriundas dos pais.
Estudaremos diferentes características e extensões da segunda Lei de
Mendel, juntamente com as variações em suas proporções, levando-nos
a entender os mecanismos de ligação gênica, estudados por Morgan.
E, por fim, conheceremos os sistemas dos cromossomos sexuais, que
determinam o sexo dos indivíduos e influenciam no aparecimento de
síndromes e anomalias.

Seção 1: Primeira Lei de Mendel


Nesta seção, serão apresentados os primórdios para
que as bases da genética possam ser compreendidas.
Através da análise dos experimentos clássicos de
Mendel e suas conclusões que determinam a sua Pri-
meira Lei da Hereditariedade, você irá compreender a
importância da probabilidade e heredogramas, além
de retomarmos conceitos aplicados nessa realidade,
como, por exemplo, a meiose.
Seção 2: Segunda Lei de Mendel
Ainda tratando das conclusões dos experimentos
de Mendel, abordaremos novos conceitos acerca de
sua Segunda Lei da Hereditariedade. Compondo tais
princípios, entenderemos a relação dos mesmos na
formação de gametas, grupos de alelos múltiplos
e a herança relacionada aos sistemas de grupos
sanguíneos.

Seção 3: Extensões e alterações das bases da


hereditariedade
Nesta seção, trataremos de fatores particulares
àqueles citados nas seções anteriores acerca da
formação de gametas, analisaremos casos em que
genes podem interagir ou se encontrarem ligados
no cromossomo, tratando de pleiotropia, epistasia,
herança qualitativa, permutações, e análise de mapas
cromossômicos.

Seção 4: Determinação sexual e herança genética


Encerrando a nossa unidade, trataremos mais a fundo
dos cromossomos sexuais, aqueles que determinam o
sexo dos indivíduos. Analisaremos a herança ligada ao
sexo, fatores que serão mais bem abordados ao estu-
darmos os diferentes sistemas que podem ser encon-
trados em diferentes organismos e suas peculiaridades.
Bases da hereditariedade 45

Introdução ao estudo
Um dos grandes colaboradores para os conhecimentos de genética, que
hoje são base para novas tecnologias, foi o monge Gregor Mendel (1822-1884).
Mendel vivia em um mosteiro na Áustria, e suas pesquisas como botânico fo-
ram concentradas na espécie Pisum sativum, ou ervilha-de-cheiro. Além disso,
tinha no monastério, à disposição de sua pesquisa, um jardim e uma estufa.
A ervilha oferecia muitas vantagens para a investigação genética: era fácil de
cultivar, crescia rapidamente e produzia muitas sementes. Porém, o seu grande
sucesso, além de ter escolhido a planta “certa”, foi usar o seu conhecimento
em matemática para relacionar os resultados com a interpretação matemática
e formulação de hipóteses. Por dez anos ele acompanhou, observou, anotou
e, enfim, interpretou seus resultados com algumas conclusões importantes
que inferiram princípios básicos de herança, porém, somente após a morte de
Mendel é que seu trabalho foi redescoberto, entendido (por volta do início do
século XX) e recebido seu devido valor. É por suas experiências que ele recebe
o título de “Pai da Genética”.
Gregor Mendel cultivou 29 mil pés das ervilhas para pesquisar como suas
características eram passadas de geração em geração. Na verdade, seu real
objetivo era o de criar vegetais híbridos e safras mais resistentes, já que a maio-
ria dos biólogos da época afirmava que as características dos genitores eram
transmitidas ao se combinarem nos descendentes, que seriam um meio-termo
dos pais. De fato, com os conhecimentos que você obterá ao longo dessa
nossa unidade, você poderá inferir que, desse modo, a diluição de todas as
características hereditárias acabaria por acontecer. Por que depois de algumas
gerações, além de indagações básicas, como por exemplo, se essa combinação
de características dos pais realmente acontecesse. Por que alguns filhos são mais
altos ou mais baixos que seus genitores e não apresentam uma estatura média?
O meticuloso trabalho de Mendel nos leva a concluir que existiam unidades
(os genes) que sempre atuavam em pares, um de cada genitor. Após um tempo,
percebeu-se que tais genes poderiam atuar de forma dominante ou recessiva,
o que explicava como uma característica se ausentava por várias gerações até
reaparecer, esse e outros pontos surgirão ao longo de nossa unidade e você
poderá encontrar respostas e dicas no texto de seu livro.
46 GENÉTICA

De fato, Mendel não conseguia explicar nem reconhecer a natureza física


dos genes, fatores que puderam ser mais bem explanados com trabalhos poste-
riores, como por exemplo, nos relatos de Watson e Crick, Marshall Niremberg,
dentre outros que os levaram aos holofotes do reconhecimento e premiações,
como prêmios Nobel e elaboração e desenvolvimento dos princípios da enge-
nharia genética. Porém, fique tranquilo, querido aluno, esses e outros fatores
mais específicos podem ser encontrados nas outras unidades de seu livro.

Seção 1 Primeira Lei de Mendel


As bases dos conhecimentos genéticos se devem aos estudos de Gregor
Mendel. Através de seus experimentos ele descobriu a presença de um fator,
que era herdado dos parentais e se manifestava na prole. Após muitos anos,
os relatos de Mendel foram compreendidos e, hoje, sabemos que esses fato-
res são os genes. Nesta seção, estudaremos as experiências de Mendel e suas
conclusões que determinam a sua Primeira Lei da hereditariedade. Veremos a
importância da probabilidade e como analisar heredogramas, além de relacio-
narmos a divisão celular por meiose com a transmissão dos fatores herdados.

1.1 Experimentos de Mendel


Mendel trabalhou com cruzamentos de plantas que apresentavam caracte-
rísticas que ele chamava de puras, ou seja, que produziam descendentes com
características que não variavam de uma geração para outra. Ele trabalhou
com sete características antagônicas: textura da semente (lisa × rugosa), cor
da semente (amarela × verde), forma das vagens (lisa × rugosa), cor das vagens
(amarela × verde), posição das flores (axial × terminal), altura da planta (alta ×
baixa) e revestimento da semente (cinza × branco).
As primeiras plantas puras, que começaram a produzir descendentes, ele de-
nominou de geração parental ou pais (P). Os descendentes da geração parental
foram denominados de F1, ou primeira geração de filhos. Os descendentes da
autofecundação de F1 constituíram a geração F2. Ele determinou também que
aquela característica que se mantinha integralmente na geração F1 seria domi-
nante, e recessiva aquela que aparecia em F2, só que com menos frequência.
Ele observou, para todas as características que estudou, que em F2 sempre
obtinha a proporção de 3:1 entre as variedades dominantes e recessivas, res-
pectivamente. No caso da cor das ervilhas, por exemplo, ao cruzar indivíduos
Bases da hereditariedade 47

puros verdes com amarelos, na geração F1 todas as sementes seriam verdes.


No entanto, ao realizar a autofecundação destes descendentes, a geração F2
apresentava 75% de sementes verdes e 25% de sementes amarelas, ou seja,
para cada 3 verdes, havia uma amarela.
Com isso, Mendel concluiu que:
Um par de fatores era responsável pelo aparecimento de uma caracterís-
tica em cada organismo;
São os pais que contribuem com apenas um fator de cada par;
O organismo com os dois fatores diferentes, para a mesma caracterís-
tica pode manifestar apenas uma (dominante) e a outra não aparecer
(recessiva);
Durante a formação dos gametas, cada um apresenta apenas um fator,
indo apenas um, portanto, para cada gameta;
A partir dessas conclusões é que foi enunciada a Primeira Lei de Mendel,
também conhecida como Lei da Segregação Independente:
“Cada caráter é determinado por um par de fatores genéticos. Estes, na
formação dos gametas, são separados e, desta forma, pai e mãe transmitem
apenas um fator para seu descendente”.

Questões para reflexão


Como ocorre a formação dos gametas na meiose?

Hoje, sabemos que estes fatores são os chamados genes. Os genes apre-
sentam versões diferentes, chamadas de alelos. Os alelos de determinado gene
estão situados na mesma posição, chamada lócus, em cromossomos homólo-
gos. Um organismo que possui dois alelos diferentes para determinado lócus
é chamado de heterozigoto, e aquele que possui dois alelos iguais para um
lócus é chamado de homozigoto. Cada indivíduo possui um conjunto de genes
chamado de genótipo e um conjunto de características morfológicas determi-
nadas pelos genes e influenciadas pelo ambiente, conhecido como fenótipo.
As características observadas por Mendel eram todas fenotípicas, mas a partir
delas ele pôde inferir o que estava acontecendo com seu genótipo.
48 GENÉTICA

Atividades de aprendizagem
Defina alelo dominante e alelo recessivo.

1.2 Meiose e suas relações com a Primeira Lei


A pesquisa de anos de Mendel foi publicada em um trabalho em 1866,
mas na época passou despercebida. Somente em 1900 ela foi redescoberta
e tornou-se base para o trabalho de Walter Sutton, que relatou o fato de que
cada par de cromossomos homólogos consiste em um cromossomo materno
e um cromossomo paterno. Ele também comprovou que os pares segregam-se
independentemente em gametas durante a meiose, confirmando o que Mendel
já havia relatado.
Antes de a meiose ocorrer na fase S da intérfase, cada cromossomo se du-
plica e produz duas cópias de cada alelo. Os cromossomos homólogos se sepa-
ram na anáfase I, o que separa os dois alelos. Esta separação dos cromossomos
homólogos caracteriza o princípio da segregação independente de Mendel. Na
anáfase II, são as cromátides dos cromossomos que foram duplicados que se
separam, proporcionando a cada gameta um único alelo de cada lócus, como
já previa Mendel pelo mesmo princípio de segregação.
Apesar de Mendel não saber da existência dos cromossomos, ele pôde
formular, a partir dos cruzamentos que fez e dos resultados que obteve, os
princípios de hereditariedade com sua Primeira Lei, hoje confirmados pelo
comportamento dos cromossomos durante a meiose.

Atividades de aprendizagem
Que tipos de gametas os indivíduos AA, Aa e aa podem produzir?

1.3 Noções de probabilidade


Além de ser considerado o Pai da Genética, Mendel também introduziu, por
meio de seus conhecimentos matemáticos, noções de probabilidade. Mendel
Bases da hereditariedade 49

tentava prever estatisticamente seus resultados, mas considerava seus cruza-


mentos eventos ao acaso, o que é o princípio da probabilidade. E, para isso,
mais uma vez a escolha do seu objeto de estudo favoreceu os experimentos,
pois produzia muitos descendentes, ideal para testes estatísticos.
A probabilidade de um evento ocorrer pode ser definida como o quociente
entre o número de resultados favoráveis e o número de resultados possíveis.
Os resultados obtidos aproximam-se dos esperados à medida que se aumenta
o número de vezes de um evento ocorrer.

Questões para reflexão


Qual a probabilidade de cair o número 6 quando jogamos um dado?

A probabilidade de sair o número 6 no lançamento de um dado é de 1/6,


ou seja, a cada seis tentativas em uma delas esperamos que saia o número 6.
No entanto, pode não sair o número 6 em nenhuma delas, mas se aumentar-
mos o número de lançamentos, esta probabilidade tende a aumentar também.
A proporção fenotípica encontrada por Mendel de 3:1 não significa, por
exemplo, que um casal com quatro filhos tenha três deles com característica
dominante e o outro com característica recessiva. Pode ser que todos apresentem
a mesma característica, porém, se esse casal tiver muitos filhos, a proporção
fenotípica seria bem próxima de 3:1.
Podemos, agora, estender a definição de probabilidade a mais de um evento.
Se quisermos descobrir qual a probabilidade de um ou outro evento ocorrer,
como devemos proceder?
Para determinar, por exemplo, a probabilidade de sair o número 1 ou o
número 6 no lançamento de um dado, usamos a regra da adição, ou seja, a
probabilidade de sair o número 1 é de 1/6 e a probabilidade de sair o número
6 também é de 1/6, então a probabilidade é assim definida:
P = 1/6 + 1/6 = 2/6 = 1/3
A regra da adição é definida quando dois eventos são mutuamente exclu-
sivos, a probabilidade de que um ou outro ocorra é a soma das probabilidades
de cada evento isoladamente.
50 GENÉTICA

Agora, se desejamos saber a probabilidade de ocorrer dois eventos indepen-


dentes e iguais, por exemplo, como sair o número 3 em dois dados lançados
ao mesmo tempo, como devemos proceder?
Como os eventos são independentes, ou seja, a chance de sair o número 3
em um dado não interfere de sair o número 3 no outro dado, usamos a regra
da multiplicação. A probabilidade de sair o número 3 em um dado é de 1/6
e a probabilidade de sair o número 3 no outro dado também é de 1/6, então:
P = 1/6 × 1/6 = 1/36
A regra da multiplicação conclui que a probabilidade de dois ou mais even-
tos independentes ocorrerem ao mesmo tempo é o produto das probabilidades
de cada um isoladamente.
Outro caso: a probabilidade de ocorrer dois eventos independentes e dife-
rentes, como em um lançamento de dados, e obter em um deles o número 1
e no outro o número 6, pode ser calculado como? Nesse caso, existem duas
possibilidades: quando a ordem importa e quando a ordem não importa. No
primeiro caso, devemos proceder da seguinte maneira:
P(1) = 1/6
P(6) = 1/6
P(1 e 6) = 1/6 × 1/6 = 1/36
Agora, quando a ordem não importa, então, o cálculo será:
P(1 e 6) = 1/36
P(6 e 1) = 1/36
P(1 e 6) ou P(6 e 1) = 1/36 + 1/36 = 2/36 = 1/18
Compreendendo um pouco de probabilidade, podemos, agora, aplicar os
conhecimentos aos experimentos de Mendel. Em uma de suas observações,
na geração parental, ele cruzou indivíduos puros amarelos com indivíduos
puros verdes. Os indivíduos puros amarelos eram homozigotos dominantes
(AA) e os puros verdes eram homozigotos recessivos (aa). Durante a meiose, os
indivíduos amarelos geram apenas gametas A e indivíduos verdes, gametas a.
A probabilidade do gameta A encontrar o gameta a é dada pela multiplicação
das probabilidades isoladas:
P(gameta A) = 1
P(gameta a) = 1
P(Aa) = 1 × 1 = 1
Bases da hereditariedade 51

Seguindo isso, na F1 espera-se que todos os indivíduos sejam Aa, o que foi
observado por Mendel. Estes descendentes produzem gametas A (50%) e ga-
metas a (50%), lembrando que os alelos se separam na formação dos gametas.
A probabilidade de um gameta feminino A encontrar um gameta masculino A
é dada pela multiplicação das probabilidades de cada gameta:
P(A e A) = P(A) × P(A) = 1/2 × 1/2 = 1/4
No caso de heterozigotos, há duas opções: o gameta feminino A pode se
encontrar com o gameta masculino a, ou o gameta feminino a pode encontrar-
-se com o gameta masculino A, formando, nos dois casos, um heterozigoto.
Neste caso, o cálculo isolado de cada uma das possibilidades e a soma são
necessários: é a regra da ocorrência de dois eventos independentes e diferentes
onde a ordem não é importante:
P(A e a) = 1/2 × 1/2 = 1/4
P(a e A) = 1/2 × 1/2 = 1/4
P(Aa) = P(A e a) + P(a e A) = 1/4 + 1/4 = 2/4 = 1/2
Em F2, Mendel esperava as proporções genotípicas: 1/4 AA: 2/4 Aa: 1/4 aa ou,
1:2:1. Já para as proporções fenotípicas é usada a regra dos eventos mutuamente
exclusivos, ou seja, a probabilidade de ocorrerem sementes amarelas é deter-
minada pela soma das probabilidades de ocorrer o genótipo AA ou o Aa:
P(amarela) = P(AA) + P(Aa) = 1/4 + 2/4 = 3/4
Já a probabilidade de ocorrerem sementes verdes em F2 é dada pela proba-
bilidade do genótipo aa, sendo assim, 1/4. Portanto, as proporções fenotípicas
esperadas em F2 por Mendel eram 3/4 amarelas: 1/4 verdes, ou 3:1. Em ambas
as proporções, genotípicas e fenotípicas, Mendel conseguiu constatar que
ocorriam em todas as características que ele estudou.

Para saber mais


Acesse o link a seguir e compreenda ainda mais os princípios de probabilidade aplicados à genética:
<http://www.sobiologia.com.br/conteudos/Genetica/leismendel9.php>.

1.4 Genealogias e heredogramas


Em um heredograma, pode-se representar a árvore genealógica de uma fa-
mília, mostrando a herança de uma característica. Os homens são representados
52 GENÉTICA

graficamente por quadrados e mulheres são representadas por círculos. Um traço


horizontal simples entre homem e mulher representa uma reprodução de um ca-
samento não consanguíneo; já um traço duplo representa uma reprodução de um
casamento consanguíneo, em que os cônjuges são parentes próximos. Os filhos de
uma reprodução são representados por círculos e/ou quadrados ligados por uma
linha vertical aos seus genitores. As pessoas representadas por quadrados e/ou
círculos escuros apresentam características de interesse dentro do heredograma.

Figura 2.1 Heredograma

Fonte: Do autor (2014).

Para analisar um heredrograma ou uma genealogia, temos de prestar atenção


e reconhecer padrões que estão associados a diferentes modos de herança.
Dentre os padrões, podemos destacar: características autossômicas recessivas;
características autossômicas dominantes; características recessivas ligadas ao
X; características dominantes ligadas ao X e características ligadas ao Y. Cada
uma destas tem suas particularidades, que serão expostas a seguir.
Característica autossômica recessiva: em ambos os sexos, esta caracterís-
tica aparece em igual frequência, no entanto, ela tende a pular gerações.
Geralmente, os genitores que dão origem ao um indivíduo afetado não
são afetados. No caso de os genitores serem heterozigotos para a carac-
terística, sua prole tem 25% de chances de ser afetada. Estas chances
aumentam quando a prole provém de casamentos consanguíneos.
Bases da hereditariedade 53

Característica autossômica dominante: como a característica autossômica


recessiva, esta também apresenta igual frequência entre os sexos, porém,
neste caso, não pula gerações. A prole afetada tem no mínimo um genitor
afetado também, a menos que este descendente possua uma nova mutação.
Quando um dos genitores é afetado, ou seja, se ele é heterozigoto e o outro
genitor não é afetado, a prole tem 50% de chances de ser afetada. Quando
ambos os genitores não são afetados, a característica não é transmitida.
Característica recessiva ligada ao X: neste caso, a frequência em homens
é maior que em mulheres, lembrando que mulheres são XX e homens
são XY. O homem herda apenas uma cópia do alelo no seu cromossomo
X, e se este alelo for o alelo recessivo ele já demonstra a característica;
as mulheres, no entanto, precisam que os dois X apresentem a cópia do
alelo recessivo para serem afetadas. A característica pula de gerações,
pois homens afetados geralmente nascem de mulheres não afetadas. Uma
mãe portadora, ou seja, heterozigota, tem 50% de chances de gerar filhos
afetados. Este é um tipo de característica que não é passada de pai para
filho, pois se o descendente for menino, o pai passou o seu Y, mas se o
descendente for menina e o pai for afetado, então as filhas serão portadoras.
Característica dominante ligada ao X: geralmente, neste caso, as mulheres
são mais afetadas do que homens, mas ambos podem ser afetados. Esta é
uma característica que também não pula gerações. Filhos afetados devem
ter mães afetadas, e filhas afetadas podem ter pai ou mãe afetados. Sendo
assim, pais afetados passam a característica para todas suas filhas e as
mães heterozigotas passarão a característica para 50% de seus filhos e
50% de suas filhas.
Característica ligada ao Y: neste caso, somente homens serão afetados, pois é
passada do pai para todos os filhos. É caracterizada por não pular gerações.

Atividades de aprendizagem
Observando o heredograma apresentado anteriormente, qual tipo de ca-
racterística está representada pelos indivíduos escuros?
54 GENÉTICA

Seção 2 Segunda Lei de Mendel


Nesta seção, iremos compreender como Mendel concluiu suas observações
com relação à segregação dos fatores ao longo das gerações. Mendel queria
entender como duas características eram transmitidas para a prole. Para isso,
avaliou em seus experimentos as cores e a textura das sementes de ervilha. Suas
conclusões o levaram a criar uma segunda lei de hereditariedade e, por meio
dela, entenderemos a relação dos mesmos na formação de gametas, grupos de
alelos múltiplos e a herança relacionada aos sistemas de grupos sanguíneos.

2.1 Experimentos de Mendel


O estudo de uma característica por vez que Mendel fez, chamado de monoi-
bridismo, levou-o a resultados e conclusões importantes. No entanto, sugiram
dúvida, por exemplo, como seriam os descendentes de um indivíduo de semente
amarela e lisa com outro de semente verde e rugosa? Nestes casos, chamados de
di-hibridismos, Mendel pôde analisar os cruzamentos que envolviam dois tipos
de características e pôde também enunciar mais uma Lei da Genética.
Mendel realizou o cruzamento entre ervilhas puras para duas características
dominantes (sementes amarelas e lisas) com ervilhas puras para duas caracte-
rísticas recessivas (sementes verdes e rugosas). Em F1, ele observou que todas
as sementes eram amarelas e lisas e as utilizou para realizar a autofecundação
entre estes descendentes. A geração F2 mostrou-se diversificada, apresentando
quatro tipos de sementes: 9/16 de amarelas e lisas, 3/16 de verdes e lisas, 3/16
de amarelas e rugosas e 1/16 de verdes e rugosas. Dois destes genótipos ele
já havia observado, mas os genótipos amarela/rugosa e verde/lisa eram novi-
dade, pois nem na geração paterna nem em F1 ele havia os observado. Este
fato permitiu que Mendel concluísse que a herança da cor era independente
da herança da forma da semente e que o par de fatores responsáveis pela cor
se distribuía entre os descendentes sem influenciar na distribuição do par de
fatores responsáveis pela forma da semente.
Esta se tornou, então, a Segunda Lei de Mendel, e pode ser assim enunciada:
“Os fatores para duas ou mais características segregam-se no híbrido, distri-
buindo-se independentemente para os gametas, onde se combinam ao acaso”.
Bases da hereditariedade 55

Com os conceitos de alelos e cromossomos, podemos dizer que:


“Pares de alelos localizados em cromossomos não homólogos se separam
de forma independente na formação dos gametas”.

Atividades de aprendizagem
Qual a diferença básica entre a primeira e a Segunda Lei de Mendel?

Com todos os cruzamentos que realizou para pares de característica, Mendel


obtinha a proporção de 9:3:3:1 na F2. E se fosse pensar no princípio de segre-
gação independente, sua Segunda Lei, realmente estes números faziam sentido.
Usando o exemplo de cor e forma da semente, os parentais puros dominantes
seriam representados por VVRR, em que os genes V e R estão situados em pares
de homólogos diferentes. Já os parentais puros recessivos seriam representados por
vvrr, e seus genes v e r também estariam em pares de homólogos diferentes. No
caso da segregação independente, em F1 todos os descendentes seriam VvRr, pois
cada planta teria de possuir dois alelos que codificariam cada característica e as
plantas parentais teriam V ou R e v ou r. Desta forma, os descendentes de F1 seriam
heterozigotos para as duas características e teriam o fenótipo de amarelo e liso. Já
na autofecundação de F1 para produzir F2, os alelos de cada lócus separariam, com
um alelo diferente indo para cada gameta, aleatoriamente. Levando-se em conta o
princípio de segregação independente, que aqui se faz muito importante, em F2.
Quatro tipos de gametas podem ser combinados e a prole consistiria em 9/16 ama-
relas e lisas, 3/16 amarelas e rugosas, 3/16 verdes e lisas e 1/16 verdes e rugosas:
P: Lisa (RR) × Rugosa (rr)
F1: Lisa (Rr) × Lisa (Rr)
F2: 3/4 Lisa: 1/4 Rugosa
P: Amarela (VV) × Verde (vv)
F1: Amarela (Vv) × Amarela (Vv)
F2: 3/4 Amarela: 1/4 Verde
Probabilidade para duas características:
Lisa e Amarela: 3/4 × 3/4 = 9/16
Rugosa e Amarela: 1/4 × 3/4 = 3/16
Lisa e Verde: 3/4 × 1/4 = 3/16
56 GENÉTICA

Rugosa e Verde: 1/4 × 1/4 = 1/16

2.2 Relações com a meiose e formação dos gametas


Da mesma forma que a Primeira Lei, a Segunda Lei de Mendel está in-
timamente relacionada com a meiose. Na anáfase I da meiose, cada par de
cromossomos homólogos se separa de forma independente e aleatória. Desta
maneira, os genes situados nos diferentes pares de homólogos também se se-
param independentemente e cada gameta recebe um tipo de alelo. No entanto,
aqueles genes situados no mesmo cromossomo, ao contrário, não se separam
de forma independente e são levados juntos até a formação dos gametas.

2.3 Alelos múltiplos


Até agora, vimos que cada característica é determinada por somente um par
de alelos. Por exemplo, na cor da semente nas ervilhas estudadas por Mendel,
o gene V determina a cor amarela e o gene v determina a cor verde. No en-
tanto, um gene que sofreu muitas mutações pode originar múltiplos alelos
para uma mesma característica. Este fenômeno é chamado de polialelismo ou
alelos múltiplos.
O exemplo mais conhecido de alelos múltiplos é o caso dos coelhos. A cor
da pelagem é controlada por quatro alelos que, fenotipicamente, podem atribuir
as cores: selvagem ou aguti, chinchila, himalaia e albino. Genes diferentes de-
terminam cada uma destas cores e apresentam dominância na seguinte ordem:
C (selvagem/aguti) domina os demais; cch (chichila) domina ch (himalaia) e ca
(albino); ch (himalaia) domina ca (albino), ou simplesmente C > cch > ch > ca.

Questões para reflexão


Quando se trata de um gene com alelos múltiplos, quantos alelos um
indivíduo diploide tem?

No entanto, cada indivíduo possui apenas um par de cromossomos ho-


mólogos, ou seja, um par de alelos. Por isso, os casos de polialelia podem ser
tratados como os casos de monoibridismo, temos somente de nos lembrar de
respeitar a ordem de dominância.
Bases da hereditariedade 57

Quando comparamos os genes que determinam as cores na pelagem de


coelho com os genes das cores das sementes de ervilhas, a principal diferença
está na quantidade de genes envolvidos na determinação das cores dos pelos
dos coelhos, quatro genes em relação aos dois genes que determinam a cor em
ervilhas. Mas, como foi dito anteriormente, podemos tratar casos de polialelismo
como monoibridismo, isto é, o padrão de segregação dos genes obedecem à
Primeira Lei de Mendel, em que o coelho terá dois dos quatro genes que de-
terminam sua cor. Outra diferença encontrada é a quantidade de genótipos e
fenótipos, maiores nesse tipo de herança.

Para saber mais


Veja como ocorre a herança da cor da pelagem em coelhos acessando o link a seguir:
<http://www.biomania.com.br/bio/conteudo.asp?cod=1215> .

2.4 Estudo de herança nos grupos sanguíneos


Um caso de polialelismo em humanos é o sistema sanguíneo ABO. O lócus para
o tipo sanguíneo é responsável por codificar antígenos nas hemácias: pessoas do
grupo A apresentam o antígeno aglutinogênio A; pessoas do grupo B apresentam
o antígeno aglutinogênio B; pessoas do grupo AB apresentam os dois tipos de
aglutinogênio A e B; e pessoas do grupo O não apresentam nem A nem B.
Os antígenos são proteínas nas membranas das hemácias que são sinteti-
zadas a partir da expressão de três genes alelos: o gene A ou IA que determina
a formação do aglutinogênio A, o gene B ou IB que determina a formação do
aglutinogênio B e a expressão do gene O ou i que não forma nenhuma destas
proteínas. Em relação à dominância, os genes IA e IB são dominantes sobre i,
no entanto, entre IA e IB há codominância, podendo os dois fornecerem seus
efeitos, o que ocorre em pessoas do grupo AB.
No plasma sanguíneo, são encontrados anticorpos contra os agentes exóge-
nos. Estes anticorpos são chamados de aglutininas, devido ao fato destes anticorpos
causarem aglutinação das hemácias. No caso de uma pessoa do tipo sanguíneo
A, ela produzirá anticorpos do tipo B, pois o antígeno B é estranho a ela. Da
mesma forma, uma pessoa do tipo B produzirá anticorpos do tipo A; já uma pes-
soa do tipo AB, esta não produzirá anticorpos, pois têm ambos os antígenos. O
que acontece com uma pessoa do tipo O então? Ela, não tendo os antígenos A e
58 GENÉTICA

B, produzirá os dois tipos de anticorpos, A e B. É a partir desses conhecimentos


que as transfusões de sangue são bem sucedidas, pois somente entre sangues
compatíveis que é possível realizá-las.

Para saber mais


Entenda melhor os tipos sanguíneos e as compatibilidades de transfusão entre os diferentes
tipos, acessando o link a seguir:
<http://www.sobiologia.com.br/conteudos/Genetica/leismendel11.php>.

Atividades de aprendizagem
Existe algum perigo de se fazer uma transfusão de sangue de uma pessoa
tipo B para uma pessoa tipo A? E de uma pessoa tipo B para outra do tipo
AB? Explique.

Apesar de serem três alelos, os cruzamentos do sistema sanguíneo são de


monoibridismo, pois cada pessoa apresenta somente um par de cromossomos
homólogos portadores destes genes. Antigamente, os casos de paternidade eram
resolvidos analisando os tipos sanguíneos dos pais e da criança em questão.

Questões para reflexão


Uma mãe tipo A tem um filho tipo B e um dos possíveis pais é do tipo O.
Esse homem pode ser o pai desta criança?

Em primeiro lugar, se a mãe é A, ela pode ser homozigota (IA IA) ou hetero-
zigota (IA i); o sangue tipo B de seu filho pode ter sido produzido pelo genótipo
IB IB ou pelo genótipo IBi. A criança não pode herdar o alelo IB de sua mãe que
é tipo A; isto sugere que a mãe deve ter passado para seu filho o seu alelo i, sendo
então, a mãe, heterozigota. Agora, o suposto pai, sendo do tipo O e, portanto, com
o genótipo ii, não pode, neste caso ser o pai desta criança, pois não tem como
passar o alelo IB que ela apresenta.
Bases da hereditariedade 59

Mas em relação à paternidade, não podemos confirmar com certeza quem


é o pai ou não. Por exemplo, se um homem e uma mulher tipo O tiverem
um filho, este não poderá ser dos grupos A, B ou AB, mas se a criança é do
tipo O isto não prova totalmente que este homem em questão seja o pai, pois
qualquer outro indivíduo do tipo O ou A ou B heterozigotos podem ser o pai
desta criança.
Atualmente, com o avanço e o barateamento de novas tecnologias, o teste
de DNA é aquele que mais se aproxima, com graus de certeza, da paternidade
de uma criança.
Além do sistema ABO, nas hemácias humanas pode ocorrer também outro
tipo de antígeno, chamado de fator Rh. Pessoas que possuem este fator são
chamadas de Rh positivo e pessoas que não possuem são chamadas de Rh
negativo. O tipo de herança do sistema Rh se deve a um par de alelos com
relação de dominância completa: indivíduos Rh– são homozigotos recessivos
(rr) e indivíduos Rh+ podem ser homozigotos dominantes (RR) ou heterozigotos
(Rr). O organismo por si só não produz anticorpos anti-Rh como no caso do sis-
tema ABO. Este anticorpo só é produzido se uma pessoa Rh– entrar em contato,
numa transfusão, por exemplo, com sangue Rh+. É por causa do fator Rh que
se tem a doença eritroblastose fetal ou doença hemolítica do recém-nascido.
Isto pode acontecer se a mãe é Rh– e tem filhos com um homem Rh+, po-
dendo haver duas possibilidades, sendo o homem homozigoto ou heterozigoto:
Se o homem é homozigoto — todos os filhos serão heterozigotos (Rr),
pois os genótipos dos pais serão: rr (mãe) × RR (pai).
Se o homem é heterozigoto — metade dos filhos poderá ser Rh+ e metade
poderá ser Rh–.
Se o primeiro filho for Rh–, não haverá problema, pois como a mãe, ele não
apresenta os anticorpos nem estimulará a sua produção. O problema está se o
primeiro filho desse casal for Rh+, pois no parto pode haver trocas de sangue
entre criança e mãe e as hemácias da criança podem estimular que a mãe
passe a produzir anticorpos anti-Rh. Se em uma segunda gestação a criança for
novamente Rh+, a mãe sensibilizada no primeiro parto, ao entrar em contato
com o sangue da criança, provocará a destruição de suas hemácias podendo
levá-la a morte. Para que isso não ocorra, uma mãe Rh–, a cada parto de filhos
Rh+, deverá tomar um soro contendo anti-Rh, que destruirá as hemácias que
passaram do filho para o sangue da mãe, evitando sua sensibilização.
60 GENÉTICA

Outro tipo de antígeno encontrado no sangue humano faz parte do sistema MN.
O gene LM produz o antígeno M e o gene LN produz o antígeno N. Com isso, há
três genótipos e fenótipos diferentes, em uma relação de codominância: LM LM
(tipo M); LN LN (tipo N) e LM LN (tipo MN). Como no sistema Rh, não há espon-
taneamente anticorpos para estes antígenos, a não ser que haja um estímulo,
em uma transfusão, por exemplo.

Para saber mais


Compreenda melhor os mecanismos de hereditariedade dos grupos sanguíneos, acessando os links:
<http://www.brasilescola.com/biologia/heranca-grupos-sanguineos.htm>;
<http://www.sobiologia.com.br/conteudos/Genetica/leismendel12.php>.
Bases da hereditariedade 61

Seção 3 Extensões e alterações das bases da


hereditariedade
Até agora, vimos como os princípios de Mendel comprovavam a segrega-
ção das características observadas nos fenótipos das proles. Outros cientistas
passaram a cruzar diferentes organismos e comprovar a segregação proposta
pelos resultados de Mendel, porém, em alguns casos, descobriram-se fenô-
menos genéticos que não produziam as proporções previstas pelos princípios
mendelianos de hereditariedade. Isso não significa que Mendel estava errado,
mas demonstra que os princípios de Mendel não são capazes de explicar a herança
de todas as características genéticas. O desenvolvimento da genética levou
a descobertas de várias alterações e extensões das bases da hereditariedade
propostas por Mendel, que serão tratados nessa seção.

3.1 Interação gênica


Até agora, vimos que para cada característica que Mendel analisou havia
uma par de alelos responsáveis pela resposta fenotípica. No entanto, para
muitas outras características, em plantas e animais, uma mesma característica
é determinada pela ação de dois ou mais pares de alelos, e a isto se dá o nome
de interação gênica. Há dois tipos de interação gênica, as interações não epis-
táticas e as interações epistáticas. Primeiro, vamos conhecer as interações não
epistáticas.
Um caso conhecido de interação gênica e que obedece à proporção de
9:3:3:1 de Mendel é a forma das cristas das galinhas. A crista das galinhas
depende de dois pares de alelos diferentes, conferindo os tipos: rosa, simples,
ervilha e noz. O gene E determina a crista ervilha e o gene R determina a
crista rosa. Os dois genes são dominantes e se ambos estão presentes há uma
interação gênica e isso determinará a crista noz. Se ambos estiverem ausentes,
ou seja, se forem representados por seus alelos recessivos, isto determinará a
crista simples.
A proporção 9:3:3:1 é um indício de que há dois pares de alelos agindo,
o que nos remete aos casos de di-hibridismo de Mendel. Mas, diferentemente
dos casos clássicos de di-hibridismo, em que cada alelo confere uma caracte-
rística distinta da outra, nos casos de interação gênica os dois alelos conferem
a mesma característica, como a forma da crista. Assim, o número 9 indicaria
os indivíduos com pelo menos um gene dominante (E_R_), o número 3 indica
62 GENÉTICA

os indivíduos com um gene dominante em um dos dois alelos (E_rr; eeR_) e


o número 1 indicaria os indivíduos com nenhum gene dominante (eerr). Com
isto, a proporção fenotípica ficaria: 9 noz : 3 ervilha : 3 rosa : 1 simples.
No caso das interações gênicas epistáticas, um dos genes envolvidos “es-
conde” o efeito do outro gene em lócus diferente. Há dois tipos de epistasia,
como é conhecido este tipo de interação: a epistasia dominante e a epistasia
recessiva. Os genes responsáveis por “esconder” o efeito de outro são chamados
de epistáticos, e aqueles que são mascarados, hipostáticos.
Epistasia dominante — neste caso, um gene dominante impede o efeito de
outro gene não alélico. Como exemplo, a interação de dois loci que determina
a cor do fruto em abóbora, que apresenta três colorações possíveis: amarela,
branca e verde. O alelo W inibe a produção de pigmento e produz abóbora
branca, enquanto seu alelo w permite o pigmento, produzindo abóboras verdes
ou amarelas. O que determinará de qual cor será a abóbora é o outro alelo: o
alelo Y é responsável por produzir uma enzima que permitirá a cor amarela;
já o alelo y não produz esta enzima e mantém a cor da abóbora verde. Assim:
abóboras brancas terão genótipos W_Y_ ou W_yy; abóboras amarelas terão
genótipos wwY_ e abóboras verdes terão genótipos wwyy. A proporção feno-
típica para a epistasia dominante é de 12:3:1.
Epistasia recessiva — agora é um dos alelos recessivos em homozigoze que
impede a deposição de pigmentos, por exemplo, na pelagem de labradores.
Estes cães podem apresentar a pelagem preta, marrom ou amarela. O alelo
dominante B determina o pigmento preto, enquanto o recessivo b determina
o pigmento marrom. Outro alelo E permite a deposição do pigmento nos pelos
(preto ou marrom); já o alelo recessivo e impede esta deposição e determina
a pelagem amarela aos pelos. Assim, cães pretos terão genótipo B_E_; cães
marrons terão genótipo bbE_ e cães amarelos terão genótipos B_ee ou bbee.
A proporção fenotípica para a epistasia recessiva é de 9:3:4.
Epistasia recessiva duplicada — este caso de epistasia ocorre quando ambos
os pares de alelos recessivos de cada lócus inibe a ação de genes do outro par.
Assim, em alelos hipotéticos, o par de alelos aa é epistático sobre os genes B
e b, e o par de alelos bb é epistático sobre os genes A e a. Isto pode ser obser-
vado na coloração de caramujos, em que o alelo dominante A é responsável
por uma enzima que transforma um composto 1 em um composto 2; no en-
tanto, para se ter a coloração, o composto 2 deve ser transformado, pela ação
de outra enzima, no composto 3, e isso é feito pelo outro alelo dominante B.
Bases da hereditariedade 63

Assim, o genótipo de caramujos pigmentados deve ser A_B_. Os caramujos


se mantêm albinos (ausência de coloração) na ausência de qualquer uma das
enzimas (ou de ambas), que ocorre quando os alelos de um ou dos dois loci
estão em homozigose recessiva (aaB_; A_bb; aabb). A proporção fenotípica
para a epistasia recessiva duplicada é de 9:7.
Outro caso de interação gênica é a herança quantitativa, também conhe-
cida como herança poligênica ou poligenia. A herança poligênica pode ser
exemplificada em humanos como a cor da pele, a altura e a cor dos olhos.
Como podemos perceber com estes exemplos, a resposta da ação de pares de
genes não alelos somam ou acumulam seus efeitos, permitindo uma série de
fenótipos gradativamente diferentes, sem relações de dominância entre eles.
Nestes casos, também sabemos, hoje, que não somente dois pares de alelos
estejam envolvidos, mas, como no caso da cor da pele, entre três e seis pares.
Para determinar o número de fenótipos possíveis nos casos de herança
quantitativa, basta somar +1 ao número de genes envolvidos. Por exemplo, caso
tenha quatro genes atuando para determinada característica, então o número
de fenótipos será de 5 (4+1). Também, podemos fazer o caminho contrário:
sabendo que em determinada característica há sete fenótipos, então, podemos
deduzir que o número de genes envolvidos será seis, ou três pares.
O efeito contrário da interação gênica é chamado de pleiotropia, quando
um único gene é responsável por mais de uma característica de um organismo.
Como no caso da doença genética fenilcetonúria, um único gene é responsável
pela produção de uma proteína, assim, a sua ausência ou a sua presença pode
causar efeito em vários locais ou tipos de células.

Para saber mais


Saiba sobre a fenilcetonúria e seus efeitos acessando este link:
<http://dtr2001.saude.gov.br/sas/dsra/protocolos/do_f20_01.pdf>.

3.2 Genes ligados


Um indivíduo di-híbrido (AaBb) produz quatro gametas diferentes na mesma
proporção, levando em consideração que os alelos Aa situam-se no mesmo par
de homólogos e os alelos Bb em outro par de cromossomos homólogos, esses
64 GENÉTICA

pares de alelos se segregam independentemente na meiose, todos em igual


proporção, obedecendo à Segunda Lei de Mendel.
Agora, quando temos os genes A e B em um mesmo cromossomo e seus
respectivos alelos a e b no outro cromossomo homólogo, sem permutação,
ocorre a formação de apenas dois tipos distintos de gametas, em igual propor-
ção entre eles — esse evento é caracterizado como ligação gênica, linkage ou
genes ligados.
Portanto, os gametas formados através da meiose do di-híbrido podem ser:
Segregação independente Genes ligados
¼ — AB ½ — AB
¼ — Ab ½ — ab
¼ — aB
¼ — ab
Mesmo quando os genes estão ligados, existe a possibilidade da forma-
ção dos gametas semelhantes aos obtidos por segregação independente do
di-híbrido. Isso acontece quando ocorre a permutação entre os genes ligados,
ou seja, o crossing-over, a troca de material genético entre os cromossomos
homólogos, promovendo a recombinação gênica.
Quando ocorre a permutação além dos gametas AB e ab, esperados em
genes ligados, aparecem outros dois tipos, Ab e aB, confirmando o evento de
permuta. Esses gametas são chamados de recombinantes, por terem se originado
da recombinação entre os genes ligados. Os gametas AB e ab são chamados
de parentais, pois apresentam os genes originalmente ligados, como na célula
inicial ou parental.

Questões para reflexão


Como diferenciar casos de genes ligados, em que houve permutação,
dos casos de segregação independente?

Para responder a essa questão, é necessário atentar ao fato de que a per-


mutação não ocorre sempre entre os mesmos segmentos dos cromossomos em
todas as células germinativas que entram em meiose, mas em apenas algumas
delas. Por exemplo, imagine que 100 células germinativas com genótipo AaBb
entrem em divisão meiótica — leve em consideração que os genes A e B estejam
Bases da hereditariedade 65

ligados no mesmo cromossomo e que não aconteça permutação. Teremos com


resultado a formação de 400 gametas na proporção de ½ AB e ½ ab, ou seja,
200 gametas AB e 200 gametas ab.
Agora, pense que dessas 100 células do exemplo anterior, 20 apresentem
permutação na meiose entre os genes considerados. Vamos fazer essa simulação
passo a passo, para não perder a linha de raciocínio.
1. Lembre-se de que na meiose cada célula germinativa formará 4 game-
tas, portanto, de 20 células germinativas, teremos 80 células gaméticas.
2. Na permuta ocorrem o pareamento dos cromossomos homólogos e a
troca dos alelos entre as cromátides-internas dos pares de homólogos.
3. As cromátides mais externas não se comunicam na permutação e man-
têm intacta sua composição alélica, ou seja, se os genes são ligados, a
disposição dos alelos permanece a mesma.
4. Na separação dos cromossomos homólogos na meiose I, teremos a for-
mação de duas células com um cromossomo de cada par de homólogo,
esse cromossomo ainda está duplicado, com as cromátides-irmãs unidas
pelo centrômero.
5. Cada cromátide-irmã, depois da permuta, torna-se diferente. Uma delas,
com a mesma constituição alélica da célula germinativa parental e a
outra, recombinante. Lembrando que isso ocorre nos dois cromossomos
homólogos.
6. Na meiose II, quando se separam as cromátides-irmãs, teremos, então,
quatro células cada uma com um cromossomo-filho. Desses cromos-
somos-filhos, dois terão a mesma constituição da célula parental e dois
serão recombinantes, formando quatro gametas diferentes.
7. Nesse caso, teremos a formação dos seguintes gametas, oriundos da
célula germinativa com o genótipo AaBb:

Gametas parentais
Gametas AB à 20 + 160 = 180
Gametas ab à 20 + 160 = 180
Veja que, para ambos, os gametas possuem 20 originados das células que
sofrem permuta e 160 das células que não sofrem permuta.
66 GENÉTICA

Esses valores mostram que dentro do processo de recombinação a propor-


ção de formação de gametas se assemelha à da segregação independente
de 1:1:1:1.
Gametas recombinantes
Gametas Ab à 20 Gametas aB à 20
O percentual de gametas recombinantes é menor que a dos parentais e cor-
responde ao que se chama de taxa de permutação ou taxa de recombinação.
No caso do exemplo usado, 20 células de 100 sofreram permuta, formando
80 células filhas, das quais 20 possuem 1 cópia de um cromossomo idêntico
ao parental AB, outras 20 células com cópias do outro cromossomo do par da
célula germinativa parental ab. As células recombinantes possuem 20 com um
cromossomo recombinante Ab e outras 20 com o genótipo aB.
O pesquisador Thomas Morgan, junto com sua equipe de pesquisadores,
executou vários experimentos que contribuíram para o entendimento da ligação
gênica. Estudaremos um de seus experimentos para entender melhor como se
determina a taxa de recombinação.

Atividades de aprendizagem
Quando ocorre permutação, por que a frequência de gametas recombi-
nantes é a metade da frequência de permuta?

Morgan avaliou a herança de dois caracteres em moscas drosófilas, um que


determinava a cor do corpo, e outro, o tipo de asa. Para entender a herança des-
sas características, ele realizou cruzamentos-testes entre fêmeas heterozigóticas
(PpVv) e machos birrecessivos (ppvv). O alelo P determina a cor castanha, e o
alelo p, a cor preta. Já o alelo V determina tipo de asa normal e v asa vestigial.
As proporções encontradas nos descendentes e os percentuais observados
refletem a constituição dos diferentes gametas das fêmeas diíbridas, pois os
machos produzem apenas um tipo de gameta pv.
Os resultados encontrados na prole foram:
41, 5% castanha, normal — PpVv
41,5% preto, vestigial — ppvv
8,5% castanha, vestigial — Ppvv
8,5% preto, normal — ppVv
Bases da hereditariedade 67

Analisando os gametas formados, temos:


Parentais: 41, 5% de gametas PV e 41,5% pv
Recombinantes: 8,5% Pv e 8,5% de pV
Com esses resultados, podemos concluir, por meio da prole e da quantidade
de gametas formados pelo di-híbrido, em proporções diferentes, que esses
genes estão ligados e sofrem permutação. Se fosse um caso de segregação
independente, teríamos os mesmos gametas, mas na mesma proporção. Os
gametas que ocorreram em maior porcentagem são os parentais, os gametas
que ocorreram em menor porcentagem são os recombinantes.
A taxa de recombinação é dada pela soma das porcentagens dos gametas
recombinantes, neste caso 8,5% + 8,5% = 17%. Essa taxa de recombinação in-
dica a distância entre os genes, quanto mais distantes estiverem os genes, maior
será sua taxa. Vale lembrar que a taxa de recombinação não pode ultrapassar
50%, pois corresponde a 100% de meioses com crossing. Porém, quando dois
genes estão muito próximos, não há recombinação; nesse caso, há uma ligação
completa, formando apenas dois diferentes tipos de gametas.
A disposição dos alelos nos cromossomos homólogos determina quem são
os gametas parentais e quem são os gametas recombinantes na ligação gênica.
Quando temos dois genes dominantes ligados em um mesmo cromossomo e
os recessivos no outro, ocorre a posição cis. Se os genes ligados são um domi-
nante para determinada característica e outro recessivo para outra caracterís-
tica, acontece a posição trans. Para diferenciar os dois casos, usa-se a notação
AB/ab (cis) e Ab/aB (trans).

Questões para reflexão


Como diferenciar os gametas parentais dos recombinantes?

A diferenciação pode ser feita através do cruzamento-teste. As classes de


recombinação serão sempre as menos frequentes. Na posição cis, os duplos do-
minantes e duplos recessivos aparecem em maior quantidade. Já na posição trans,
eles formam classes de recombinação e aparecem em menores quantidades.
A possibilidade de recombinação aumenta na proporção da distância entre
os genes no cromossomo, ela pode ser usada como uma medida de distância
relativa entre eles. Por convenção, a porcentagem de permuta é o número que
fornece a distância entre os genes localizados no mesmo cromossomo.
68 GENÉTICA

Se observarmos os dados do cruzamento das drosófilas, as distâncias entre


os genes P e V é de 17 (8,5% + 8,5%) unidades de recombinação (UR) ou
unidades de mapa (UM). Portanto, se a porcentagem de permutação for de
1% a distância entre eles será de 1 UR. Essa unidade também é chamada de
morganídeo ou centimorgam (cM), em homenagem a Morgan, cujos experi-
mentos com as drosófilas explicaram as causas da ligação.
Com base nas diferenças nas taxas de crossing entre os genes, foi possível
estabelecer mapas cromossômicos. Veja o exemplo a seguir:
Os genes A, B e C estão ligados e as taxas de recombinação entre eles são:
Permuta entre A e B = 21%;
Permuta entre A e C = 2%;
Permuta entre B e C = 19%.
A distância entre eles:
A e B será de 21 centimorgans;
A e C será de 2 centimorgans;
B e C será de 19 centimorgans.
Com essas informações, podemos mapear os genes no cromossomo:

Figura 2.2 Genes nos cromossomos

2 19

A C B

Fonte: Do autor (2014).

Para saber mais


Aprofunde seus conhecimentos sobre ligação gênica acessando o link a seguir:
<http://www.uel.br/pessoal/rogerio/genetica/respostas/pratica_10.html>.
Bases da hereditariedade 69

Seção 4 Determinação sexual e herança


genética
Existem alguns tipos de herança que não estão relacionados aos padrões
mendelianos nem às extensões tratadas até aqui. A determinação do sexo e as
heranças genéticas ligadas ao sexo são determinadas pelos diferentes sistemas
de cromossomos sexuais existentes nos seres vivos. Nesta seção, veremos como
esses sistemas dos cromossomos sexuais determinam o sexo de um indivíduo,
quais genes existem nesses cromossomos e como eles causam diferenças na
herança de determinadas características relacionadas ao sexo.

4.1 Cromossomos sexuais


Grande parte dos animais tem o sexo determinado pelos genes. Em geral,
esses genes estão localizados em cromossomos especiais que têm outros ca-
racteres associados a eles, além dos determinantes sexuais, e a transmissão
dessas informações guarda uma relação direta com o sexo do indivíduo. Ao
longo desta seção, estudaremos os mecanismos de determinação do sexo nos
seres vivos, por meio dos cromossomos sexuais, dos sistemas XY, XO, ZW e ZO.

4.2 Sistema XY
A maioria dos vertebrados, muitos invertebrados e plantas com flores, nos
quais os sexos são separados, a determinação do sexo é feita pelo sistema XY,
em que as fêmeas apresentam dois cromossomos sexuais idênticos (XX), e
os machos, um cromossomo idêntico ao da fêmea e outro diferente (XY). Em
mamíferos, o cromossomo Y tem um gene responsável pelo desenvolvimento
dos testículos, determinando o sexo masculino do indivíduo.
Didaticamente, podemos representar os cromossomos de um organismo
da seguinte forma: os machos por 2AXY e as fêmeas por 2AXX, em que A
representa o conjunto haploide de autossomos. Lembrando que nas células
diploides há dois cromossomos autossômicos de cada tipo, por exemplo, na
espécie humana, temos 44 cromossomos autossômicos e 2 sexuais, feminino:
46, XX; masculino: 46, XY.
Na formação dos gametas, no macho, metade desses gametas terão o cro-
mossomo X e outra metade o cromossomo Y. Nas fêmeas, todos os gametas terão
o cromossomo X. No sistema XY, as fêmeas são homogaméticas, pois produzem
70 GENÉTICA

apenas um tipo de gameta, levando em consideração apenas os cromossomos


sexuais, e os machos são heterogaméticos, produzindo dois tipos de gametas.

4.3 Anomalias e cromossomos sexuais humanos


Em humanos, durante a meiose, pode ocorrer a não disjunção dos cromos-
somos homólogos, promovendo o aparecimento de gametas anormais.

Questões para reflexão


O que poderia ocasionar a não disjunção dos cromossomos homólogos
na meiose?

Levando em consideração os cariótipos, representação dos cromossomos


das células humanas, uma fêmea 2AXX (46, XX) sofre uma meiose anormal
formando gametas AXX e A0, ou seja, não houve disjunção dos cromossomos
X, indo os dois para o mesmo polo da célula, deixando um gameta com os dois
cromossomos X e outro sem nenhum. O macho 2AXY (46, XY) sofre meiose
normal, formando gametas AX e AY. Veja no Quadro 2.1 os cariótipos possíveis
após a fecundação dos gametas formados:

Quadro 2.1 Formação genótipos


Gametas formados
Gametas AX AY
por meiose normal
Gametas formados
na meiose anormal
AXX 2AXXX 2AXXY Cariótipos possíveis
A0 2AX0 2AY0 após fecundação

Fonte: Do autor (2014).

O zigoto 2AY0 (45, Y) formado após a fecundação não chega a se desenvol-


ver. Mas indivíduos com o cariótipo 2AXXX (47, XXX) são do sexo feminino,
férteis e geralmente não apresentam anomalia.
Indivíduos com o cariótipo 2AXXY (47, XXY) são do sexo masculino e apre-
sentam a síndrome de Klinefelter. Os portadores são altos, acima da média,
apresentam fertilidade baixa, ou esterilidade, pois a produção de esperma-
tozoides é baixa ou inexistente, com os testículos atrofiados. Pode ocorrer o
desenvolvimento exagerado das glândulas mamárias, ginecomastia. Uma forma
Bases da hereditariedade 71

de remediar os efeitos dessa síndrome é o tratamento com hormônios que pode


ajudar a diminuir os sintomas, indivíduos com Klinefelter vivem normalmente.
Pessoas com o cariótipo 2AX0 (45, X) são do sexo feminino e possuem a
síndrome de Turner. A portadora apresenta baixa estatura, órgãos e caracteres
sexuais secundários pouco desenvolvidos. Possuem o tórax largo, pescoço
alado, maior frequência de problemas no rim e no coração, geralmente esté-
reis. Como muitos desses problemas são ocasionados pela falta de hormônio
sexual feminino, o tratamento hormonal pode ser indicado quando a mulher
atingir a puberdade.

Atividades de aprendizagem
Qual o sexo do indivíduo com síndrome de Klinefelter e qual o seu cariótipo?
E com relação à síndrome de Turner?

Já o cariótipo 2AXYY (47, XYY) é do sexo masculino, tem estatura acima


da média, fertilidade normal. Normalmente são muito ativos fisicamente, mas
apresentam amadurecimento mental mais lento, sendo compensados mediante
do aumento dos estímulos e atividades.

4.4 Cromatina sexual


Existe uma particularidade nos cromossomos sexuais em células somáticas
de fêmeas de mamíferos. O pesquisador Murrey Barr, em 1949, descobriu um
corpúsculo que se corava muito forte no núcleo das células. Mas quando pro-
curava o mesmo corpúsculo nas células dos machos, não encontrava.
Ao longo dos anos, vários estudos comprovaram que esse corpúsculo cor-
respondia ao cromossomo X que permanece condensado na intérfase, estando,
assim, inativo. A inativação parece estar relacionada com um mecanismo
chamado compensação de dose, que compensaria a dose dupla dos genes lo-
calizados no cromossomo X das fêmeas em relação à cópia única encontrada
nos machos. Portanto, deve existir apenas um cromossomo X ativo nas células
somáticas. Como os machos possuem apenas um X, não contêm esse corpús-
culo, chamado de corpúsculo de Barr, em homenagem ao pesquisador que o
descobriu, ou cromatina sexual. Já as fêmeas com duas cópias do X apresentam
a cromatina sexual, ficando apenas um X funcional.
72 GENÉTICA

A presença do corpúsculo de Barr permite verificar síndromes relacionadas


aos cromossomos sexuais. Pessoas com síndrome de Klinefelter (XXY) possuem
cromatina sexual, mesmo sendo do sexo masculino. Indivíduos com síndrome
de Turner (X0) são do sexo feminino e não possuem corpúsculo de Barr.

Atividades de aprendizagem
O que é a compensação de dose?

Uma consequência interessante da compensação de dose é o mosaico em


células femininas dos mamíferos. Como ocorre a inativação de um cromossomo
X nas células somáticas das fêmeas, essa inativação acontece de forma aleatória,
ou seja, pode ocorrer tanto no cromossomo X de origem materna quanto no de
origem paterna. Portanto, a fêmea terá seu corpo formado por regiões onde as
células tem o X materno ativo misturado com regiões com o X paterno ativo.
Um exemplo da mistura formando o mosaico pode ser constatado em mu-
lheres portadoras de um gene defeituoso responsável pela formação das glân-
dulas sudoríparas. As mulheres heterozigotas para esse gene possuem regiões
da pele com e sem glândulas sudoríparas.

4.5 Herança ligada ao sexo


Os cromossomos X e Y possuem pequenas regiões de homologia, que se
emparelham durante a meiose. Portanto, é possível ver duas regiões nesses
cromossomos, em função do emparelhamento nas células masculinas:
Região homóloga, onde ocorre o emparelhamento entre os cromossomos
X e Y.
Região não homóloga, onde não há o emparelhamento entre os cromossomos.
Na região não homóloga de X existem vários genes responsáveis por contro-
lar diversas funções no organismo, como a produção de pigmentos pela retina,
que permitem a visualização de algumas cores e a síntese de uma proteína
importante no processo de coagulação sanguínea. Mutações nesses genes acar-
retam perda de função e provocam distúrbios como o daltonismo, dificuldade
em diferenciar certas cores, e a hemofilia, dificuldade em coagular o sangue.
Os genes que se encontram na região não homóloga do cromossomo X são
chamados de genes ligados ao X ou genes ligados ao cromossomo X. Esses
Bases da hereditariedade 73

genes apresentam um tipo de herança chamada de herança ligada ao sexo ou


herança ligada ao cromossomo X.
Nos machos que possuem apenas um cromossomo X, não existem alelos
para os genes localizados na região não homóloga do cromossomo X e recebem
o nome de hemizigóticos. As fêmeas podem ser homizigóticas ou heterozigó-
ticas; por terem um par de cromossomos X, e pareiam-se completamente.
Os genes recessivos se manifestam com maior frequência nos machos,
quando localizados na região não homóloga do cromossomo X, pois basta
o alelo estar presente para seu efeito se manifestar. Nas fêmeas, esses alelos
recessivos só se manifestam em dose dupla.
No cromossomo Y também existem regiões não homólogas; os genes dessas
regiões são chamados de genes holândricos, que caracterizam uma herança cha-
mada de herança restrita ao sexo ou herança ligada ao Y, que só ocorre nos machos.
A partir de agora, estudaremos as particularidades das heranças ligadas ao
X e, depois, as heranças ligadas ao Y
O daltonismo é um exemplo de herança ligada ao cromossomo X na espécie
humana. Há vários tipos de daltonismo, mas a forma mais comum consiste na
dificuldade em distinguir o verde do vermelho, pela presença de alelos defei-
tuosos, que não formam os pigmentos necessários para a percepção dessas
cores, pela retina.
Essa forma de daltonismo é provocada pelo alelo defeituoso d, ligado ao
sexo. E o alelo D, responsável pela visão normal. Para uma mulher manifestar o
daltonismo, ela precisa ser homozigótica recessiva, ou seja, o alelo d precisa estar
em dose dupla. Já no homem, uma vez presente o alelo d, o daltonismo se ma-
nifesta. Isso resulta em maiores frequências de homens daltônicos na população.
Veja no Quadro 2.2 os possíveis genótipos para o daltonismo:

Quadro 2.2 Possíveis genótipos para o daltonismo

Sexo masculino Sexo feminino


XdY XdXd
Fenótipo: daltônico Fenótipo: daltônico
XDY XDXD; XDXd
Fenótipo: normal Fenótipo: normal
Fonte: Lopes e Rosso (2005).
74 GENÉTICA

Outra anomalia determinada por um gene ligado ao X é a hemofilia. A


característica dessa anomalia hereditária é a dificuldade em coagular o sangue
causada por uma deficiência em uma globulina anti-hemofílica, uma proteína
que age na coagulação.
O padrão de herança da hemofilia é idêntico ao do daltonismo, pois essa
doença também se deve à presença de um gene recessivo ligado ao sexo.
Para entendermos melhor o padrão da herança, suponha que uma mulher
heterozigótica para hemofilia se cruza com um homem normal. As mulheres
resultantes desse cruzamento serão todas normais (XHXH, XHXh), mas 50% delas
serão heterozigóticas (XHXh), portadoras do gene para hemofilia. Já os homens
poderão ser normais (XHY) ou hemofílicos (XhY) em igual proporção.
Acompanhe os possíveis genótipos para esse cruzamento no Quadro 2.3:

Quadro 2.3 Genótipos possíveis em hemofilia

Gametas XH Y
H H H H
X X X X Y
h H h
X X X XhY

Para saber mais


Para compreender mais sobre as heranças ligadas ao sexo, segue o link de um vídeo explicativo
sobre o tema:
<https://www.youtube.com/watch?v=OBJjpqrv8-M>.

Nas heranças ligadas ao cromossomo Y, os genes localizados nesse cromos-


somo não têm homologia no X. O cromossomo Y humano tem poucos genes,
a maioria deles ligados à formação e ao funcionamento dos testículos.
Existem manifestações fenotípicas que só aparecem em determinado sexo, porém,
os genes responsáveis por essas características podem estar localizados em
qualquer cromossomo autossômico, podendo estar presente nos dois sexos. A
manifestação diferencial nos sexos está ligada à presença de hormônios sexuais.
A herança limitada ao sexo envolve genes que ocorrem nos dois sexos,
porém, só se manifesta em um deles. Um exemplo são os caracteres sexuais
secundários no homem e na mulher. Outro é a hipertricose auricular, que
Bases da hereditariedade 75

consiste no crescimento de pelos na orelha. É um gene autossômico dominante


com efeito limitado ao sexo. Os genes estão presentes tanto em homens quanto
em mulheres, mas só se manifestam nos homens.
Já a herança influenciada pelo sexo caracteriza-se pela variação na do-
minância e recessividade de alelos em função do sexo do indivíduo. Um
alelo tem efeito dominante em um sexo e recessivo em outro. A calvície é um
exemplo desse tipo de herança em humanos. Esse fenótipo é manifestado por
um alelo C1, em um cromossomo autossomo, sendo dominante nos homens e
recessivo nas mulheres. Através das diferenças hormonais, o mesmo genótipo
heterozigótico, se comporta de forma diferente em cada sexo. Vale lembrar
que a calvície pode ser causada também por outros fatores, que não genéticos,
como doenças e radiações.
Veja no Quadro 2.4 os genótipos e fenótipos da calvície:

Quadro 2.4 Genótipos e fenótipos da calvície

Genótipo Fenótipo
Homem: calvo
C1C1
Mulher: calva
Homem: calvo
C1C2
Mulher: não calva
Homem: não calvo
C2C2
Mulher: não calva
Fonte: Lopes e Rosso (2005).

4.6 Sistema X0
No sistema X0 os machos são 2AX0 e as fêmeas são 2AXX. Sendo assim os
machos são os heterogaméticos, produzem dois tipos de gametas, quanto aos
cromossomos sexuais: um com o cromossomo X; o outro não tem cromossomo
sexual. As fêmeas são homogaméticas, pois todos os seus gametas possuem
um cromossomo X.
Esse sistema é visto em alguns insetos. Observe, no quadro a seguir, o cru-
zamento entre (fêmea) 2AXX 3 2AX0 (macho):

Gametas AX A0
2AXX 2AX0
Genótipos na F1 AX
Fêmea Macho
76 GENÉTICA

4.7 Sistema ZW
Nesse sistema, as fêmeas apresentam dois cromossomos sexuais diferentes,
sendo o sexo heterogamético, enquanto os machos apresentam dois cromos-
somos sexuais iguais, sendo o homogamético. Os cromossomos sexuais são
denominados Z e W, lembrando que a utilização dessas letras é uma convenção
a fim de diferenciar esse sistema do sistema XY. Esse tipo de sistema ocorre em
aves, borboletas, mariposas e alguns peixes.
Observe a formação dos gametas e dos genótipos após fecundação, por
meio do cruzamento entre (fêmea) 2AZW x 2AZZ (macho):
Gametas AZ
2AZZ
AZ
Macho
2AZW
AW Genótipos na F1
Fêmea

4.8 Sistema Z0
A fêmea é Z0, heterogamética e o macho é ZZ, homogamético, o que ocorre
em algumas espécies de mariposas. Observe o quadro abaixo com a formação
dos gametas e dos possíveis genótipos em F1:
Gametas AZ
2AZZ
AZ
Macho
2AZ0
A0 Genótipos na F1
Fêmea

Fique ligado!
Vamos relembrar quais os principais tópicos abordados nesta unidade:
Primeira e segunda lei de Mendel.
Interação gênica.
Genes ligados, permutação e segregação independente.
Cromossomos sexuais e herança ligada ao sexo.
Bases da hereditariedade 77

Para concluir o estudo da unidade


Vimos que o meticuloso trabalho de Mendel nos leva a concluir que
existiam unidades (os genes) que sempre atuavam em pares, um de cada
genitor. Após um tempo, percebeu-se que tais genes poderiam atuar de
forma dominante ou recessiva, o que explicava como uma característica
se ausentava por várias gerações até reaparecer.
De fato, Mendel não conseguia explicar nem reconhecer todos os
padrões de herdabilidade, mas vimos ao longo desta unidade que outros
pesquisadores auxiliaram no entendimento dos padrões e proporções en-
contradas ao longo das gerações, através de experimentos e cruzamentos-
-teste que comprovaram, por exemplo, a ligação entre os genes.

Atividades de aprendizagem da unidade


1. O gene autossômico que condiciona pelos curtos em coelhos é
dominante em relação ao gene que condiciona pelos longos. Do
cruzamento entre coelhos heterozigotos nasceram 480 filhotes, dos
quais 360 apresentavam pelos curtos. Entre estes filhotes de pelos
curtos, qual seria o número esperado de heterozigotos?
2. Na mandioca, raízes marrons são devidas ao alelo dominante B e
raízes brancas são devidas ao alelo recessivo b. Folíolos estreitos são
devidos ao alelo dominante L e folíolos largos são devidos ao alelo
recessivo l. Uma planta de raízes marrons e folíolos estreitos foi cru-
zada com outra de raízes brancas e folíolos largos, produzindo 40
descendentes com folíolos estreitos, dos quais a metade tinha raízes
marrons e a outra metade tinha raízes brancas. Quais os genótipos
dos genitores (parentais)?
3. Uma mulher tem o tipo sanguíneo A/M. Ela tem um filho com o tipo
sanguíneo AB/MN. Entre os indivíduos a seguir, qual poderá ser o
pai da criança?
( ) Jorge — O/N
( ) Cláudio — A/N
78 GENÉTICA

( ) José — B/MN
( ) Henrique — AB/M
4. Explique a diferença entre interação gênica e pleiotropia.
João tem hemofilia clássica, que é uma doença recessiva ligada
ao X. Poderia João ter herdado o gene da doença das seguintes
pessoas? Justifique.
( ) A mãe de sua mãe.
( ) O pai de sua mãe.
( ) A mãe de seu pai.
( ) O pai de seu pai.
Bases da hereditariedade 79

Referências
ALBERTS, B. Biologia molecular da célula. Porto Alegre: Artmed, 2010.
HIB, J.; DE ROBERTIS, E. M. Biologia celular e molecular. 16. ed. Rio de Janeiro:
Guanabara Koogan, 2014.
JUNQUEIRA, L. C.; CARNEIRO, J. Biologia celular e molecular. 9. ed. Rio de Janeiro:
Guanabara Koogan, 2012.
LINHARES, S.; GEWANDSZNAJDER, F. Biologia: volume único — livro do professor. São
Paulo: Ática, 2005.
LOPES, S.; ROSSO, S. Biologia. São Paulo: Saraiva, 200. 480 p.
PIERCE, B. A. Genética: um enfoque conceitual. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2011.
SNUSTAD, D. P. Fundamentos da genética. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2013.
WEESLER, S. R. et. al. Introdução à genética. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2013.
Unidade 3
Citogenética e genética
do câncer
Graziela dos Santos Barni

Objetivos de aprendizagem: Nesta unidade, apresentaremos os


princípios de citogenética básica, seus agentes mutagênicos, como
acontecem as mutações e a importância de algumas delas para garantir
a biodiversidade biológica. Vamos támbem obter uma visão geral das
bases genéticas do câncer, proliferação celular e alterações cromossô-
micas que podem levar ao surgimento de determinadas síndromes.

Seção 1: Citogenética humana


A citogenética é o estudo dos cromossomos, sua
estrutura e sua herança, sua constituição genética.
Muitas vezes, esses cromossomos podem estar al-
terados, tanto morfológica como numericamente.
Essas alterações podem gerar patologias e síndro-
mes. Nesta seção, iremos tratar das características
citogenéticas e todos os processos que podem levar
ao surgimento de mutações e erros na separação dos
cromossomos na divisão celular.

Seção 2: Bases genéticas do câncer


O câncer é a segunda maior causa de mortes nos
países ocidentais, sendo superado apenas pelas
doenças cardíacas. Ele atinge pessoas de todas as
idades e, em alguns momentos de sua vida, uma
em cada três pessoas receberá um diagnóstico de
câncer. Nos últimos anos, os cientistas descobriram
que o câncer é uma doença genética, caracterizada
por uma combinação de formas mutantes de onco-
genes e de genes supressores de tumor, o que leva
ao crescimento e à disseminação descontrolada de
células cancerosas. Nesta seção, vamos conhecer
algumas das características genéticas envolvidas no
surgimento e diagnóstico do câncer.
Citogenética e genética do câncer 83

Introdução ao estudo
Caro(a) acadêmico(a)! Por meio do estudo desta unidade, você irá aprimo-
rar seus conhecimentos sobre genética. Estudaremos, os princípios básicos da
citogenética e as principais causas de mutações gênicas causadoras dos mais
diversos problemas, dentre eles, o câncer.
No final de cada seção, você encontrará atividades de aprendizagem que
o(a) ajudarão a fixar os conceitos.
Vamos iniciar?

Seção 1 Citogenética humana


Por meio do estudo da Seção 1, será possível entender os aspectos que le-
varam ao surgimento de fatores que alteram o cariótipo e, consequentemente,
o aparecimento de síndromes em humanos.

1.1 As células
Com exceção das células que desenvolvem os gametas (germinativas), todas
as células do corpo são chamadas de células somáticas. O genoma contido no
núcleo das células somáticas humanas consiste em 46 cromossomos, arranjados
em 23 pares (Figura 3.1). Desses 23 pares, 22 são semelhantes em homens e
mulheres e são denominados autossomos, numerados do maior para o menor.
O par restante compreende os cromossomos sexuais: dois cromossomos X
nas mulheres, e um cromossomo X e outro Y nos homens. Cada cromossomos
carrega genes que são arranjados linearmente no DNA. Os membros de um par
de cromossomos (cromossomos homólogos) carregam informações genéticas
equivalentes, isto é, elas possuem os mesmos genes na mesma sequência. Em
qualquer lócus específico, entretanto, elas podem ter formas idênticas ou leve-
mente diferentes do mesmo gene, chamados de alelos. Um membro de cada
par de cromossomos é herdado do pai, e o outro, da mãe. Normalmente, os
membros de um par de cromossomos são microscopicamente indistinguíveis uns
dos outros. Nas mulheres, os cromossomos sexuais, os dois cromossomos X, são
igualmente indistinguíveis. Nos homens, os cromossomos sexuais são diferentes.
Um deles é um cromossomo X, idêntico ao X das mulheres, herdado por um
84 GENÉTICA

homem a partir de sua mãe e transmitido às filhas dele; o outro, o cromossomo


Y, é herdado de seu pai e transmitido a seus filhos (NUSSBAUM et al., 2008).
Além do genoma nuclear, uma pequena, mas importante, parte do genoma
humano reside nas mitocôndrias. O cromossomo mitocondrial, possui várias
características incomuns que o diferenciam do restante do genoma humano.

Figura 3.1 Genoma humano

As histonas são
proteínas nas quais o
DNA está enrolado

Célula

Núcleo
O núcleo O DNA é composto de bases nitrogenadas
das células que são as letras do código genético
humanas
Os cromossomos
contém 46
são formados por
cromossomos
fibras de Adenina
cromatina
Timina
Guanina
Citosina

constituídas de um conjunto
de histonas e DNA

Cada 3 letras Vários códons formam um gene, que


formam um códon, corresponde a uma palavra
Cromossomo espécie de sílaba que
é associada a um
determinado
aminoácido

Fonte: <http://www.cursoobjetivo.br/vestibular/roteiro_estudos/projeto_genoma.aspx>. Acessado em:


31 de março de 2014.

1.2 Organização dos cromossomos humanos


A partir da época em que se reconheceu que os cromossomos são impor-
tantes para a mecânica da hereditariedade, tratou-se de determinar seu número
na espécie humana. Assim, em 1956, Tijo e Levan mostraram que há 46 cro-
mossomos nas células humanas.
Podem-se ver claramente os cromossomos humanos de células cultivadas
em laboratório, provenientes de medula óssea, da pele ou, mais rotineiramente,
de sangue. O método mais usado para cultivar células sanguíneas é o descrito
por Moorhead et al. (1960), com ligeiras modificações de acordo com as ne-
cessidades de cada laboratório. A técnica atende a três aspectos fundamentais:
Citogenética e genética do câncer 85

Como os cromossomos só são visíveis em células que estão em divisão,


é necessário recorrer a tecidos que têm naturalmente muitas células em
divisão (como o da medula óssea) ou induzir as células a se dividirem
com agentes que estimulam a mitose.
Nas células em metáfase, os cromossomos são mais distinguíveis porque
ficam mais condensados; portanto, é preciso acumular células em metá-
fase para o estudo.
A técnica deve fazer que os cromossomos fiquem bem separados uns dos
outros, para uma boa identificação.
O sangue é colhido da veia com seringa esterilizada e transferido para
tubos contendo heparina, que evita sua coagulação, e é deixado à tempera-
tura ambiente, enquanto se dá a sedimentação das hemácias. Algumas gotas
do plasma que fica sobrenadante (e contém os leucócitos em suspensão) são
misturadas ao um meio de cultura líquido, ao qual se adiciona soro sanguí-
neo (geralmente soro fetal bovino) e fitoemaglutinina. Esta última substância
promove a desdiferenciação dos linfócitos, fazendo com que eles retornem à
sua forma blástica, em que são capazes de se dividir por mitose. Assim, é pre-
enchido o primeiro requisito — grande número de células em divisão (OTTO;
NETTO; OTTO, 2013).
Após cerca de 70 horas na estufa a 37 ºC, adiciona-se colchicina ao meio
de cultura. A colchicina é um alcaloide que evita a formação das fibras do fuso,
que unem os cromossomos aos centríolos, na metáfase. Por isso ela paralisa a
divisão celular nessa fase. Esta propriedade permite atender ao segundo requi-
sito — acumular células em metáfase.
Cerca de uma hora depois, tratam-se as células com uma solução salina
hipotônica. Isso faz que absorvam água (por osmose) e aumente o volume, o
que ajuda a separar os cromossomos uns dos outros, preenchendo o terceiro
requisito (OTTO; NETTO; OTTO, 2013).
O material é, então, fixado (com uma solução de três partes de álcool
metílico para uma parte de ácido acético), pingando sobre lâmina de micros-
copia, que é deixada para secar. Quando se pinga a preparação na lâmina,
núcleos são rompidos e os cromossomos se espalham sobre ela, facilitando a
sua visualização. Assim, os cromossomos, já fixados, ficam aderidos ao vidro
da lâmina. Faz-se, então, a coloração para que eles possam ser visualizados.
Ao microscópio, procuram-se metáfases com cromossomos bem espalhados
86 GENÉTICA

e se usa a objetiva de imersão (que amplia em 1.000 vezes o material a ser


analisado) (OTTO; NETTO; OTTO, 2013).
Na Figura 3.2, podemos observar um campo de microscópio com várias
células em metáfase e, logo abaixo, com um aumento maior, o conjunto de
cromossomos em metáfase.

Figura 3.2 Células em metáfase

Fonte: Otto, Netto e Otto (2013).

Para estudos detalhados, faz-se a montagem dos cromossomos aos pares.


Esse arranjo é o chamado cariograma e revela o cariótipo, ou seja, o conjunto
cromossômico do indivíduo estudado. Os 46 cromossomos humanos foram 23,
pares nas células femininas e, nas masculinas, 22 pares mais dois cromossomos
dissimilares, o X e o Y.
A composição dos genes no genoma humano, bem como os determinantes
da sua expressão, é especificada no DNA dos 46 cromossomos humanos no
Citogenética e genética do câncer 87

núcleo junto com o cromossomo mitocondrial. Cada cromossomo humano con-


siste em uma dupla-hélice de DNA contínua e única; isto é, cada cromossomo
no núcleo é uma molécula de DNA de fita dupla linear e longa, e o genoma
nuclear consiste, além disso, em 46 moléculas de DNA, totalizando mais de
seis milhões de nucleotídeos (NUSSBAUM et al., 2008).
No entanto, os cromossomos não são duplas-hélices de DNS desprotegidas.
Dentro de cada célula, o genoma é armazenado como cromatina, na qual o
DNA genômico está conjugado com várias classes de proteínas cromossômicas.
Exceto durante a divisão celular, a cromatina está distribuída por todo o núcleo
e é relativamente homogênea em sua aparência microscópica. Quando a célula
se divide, no entanto, seu genoma condensa-se e aparece microscopicamente
como cromossomos visíveis. Os cromossomos estão, então, visíveis como es-
truturas discretas somente nas células em divisão, embora eles mantenham a
integridade entre suas divisões celulares (NUSSBAUM et al., 2008).

Questões para reflexão


Existem diferentes etapas no processo de divisão celular (mitótica e
meiótica)?

A molécula de DNA de um cromossomo existe na cromatina como um


complexo com uma família de proteínas cromossômicas básicas denominadas
histonas e com um grupo heterogêneo de proteínas não histonas que são menos
caracterizadas, mas que parecem ser críticas para o estabelecimento de um
ambiente adequado para assegurar o comportamento cromossômico normal e
a expressão do próprio gene.
Cinco tipos principais de histonas desempenham um papel crítico no acon-
dicionamento adequado da cromatina. Duas cópias de cada uma das quatro
histonas H2A, H2B, H3 e H4 constituem um octâmero, ao redor do qual um
segmento da hélice dupla de DNA se enrola, como uma linha ao redor do
carretel (Figura 3.3). Aproximadamente, 140 pares de bases de DNA estão
associados a cada cerne de histona, formando quase duas voltas ao redor do
octâmero. Cada complexo de DNA com histonas centrais é chamado de
nucleossomo, que é a unidade estrutural básica da cromatina, e cada um dos
46 cromossomos humanos contém várias centenas de milhares até mais de um
milhão de nucleossomos (NUSSBAUM et al., 2008).
88 GENÉTICA

Figura 3.3 Níveis hierárquicos do acondicionamento da cromatina no cromossomo humano


~10 nm
2 nm

Proporção de um
cromossomo em
intérfase

Octâmero
de histona

~140 dp
de DNA

Cada alça contém


~100.000 bp de DNA

Hélice dupla Fibra do nucleossomo Solenóide Núcleo em


(“colar de contas”) intérfase

Fonte: Nussbaum et al. (2008).

Além dos tipos principais de histonas, várias histonas especializadas podem


substituir a H3 e H2A e conferir características específicas ao DNA genômico
naquela localização. As histonas H3 e H4 podem também ser modificadas
por alterações químicas para as proteínas codificadas. Essas modificações,
chamadas de pós-tradução, podem alterar as propriedades dos nucleossomos
que as contêm.
A morfologia geral e a organização dos cromossomos humanos, assim como
a sua composição molecular e genômica, foram apresentadas nas unidades
anteriores. Para serem examinadas por análise cromossômica para propósitos
clínicos de rotina, as células devem ser capazes de crescer e de se dividir rapi-
damente em cultura. As células mais prontamente acessíveis que preenchem
essas exigências são os leucócitos, especificamente os linfócitos T. Para preparar
uma cultura de curto prazo que seja adequada à análise citogenética dessas
células, uma amostra de sangue periférico é obtida, geralmente por punção
venosa, e misturada à heparina a fim de prevenir a coagulação. Os leucócitos
são coletados, postos em um meio de cultura de tecidos e estimulados a se di-
vidirem. Após uns poucos dias, as células em divisão são paradas em metáfase
com agentes químicos que inibem o fuso mitótico, coletadas e tratadas com
uma solução hipotônica a fim de liberar os cromossomos. Os cromossomos
Citogenética e genética do câncer 89

são, então, fixados, estendidos em lâminas e corados por uma das diversas
técnicas, dependendo do procedimento diagnóstico particular que esteja sendo
realizado. Eles estão, então, prontos para análise.
Cada vez mais, a análise de rotina do cariótipo em nível citogenético está
sendo complementada pelo que pode ser denominado cariotipagem molecular,
a aplicação de técnicas genômicas para avaliar a integridade e a dosagem da
totalidade do cariótipo genômico. A determinação de quais abordagens são mais
adequadas para diagnósticos particulares ou propósitos de pesquisa constitui
uma área em rápida evolução, à medida que a resolução, a sensibilidade e a
facilidade da análise genômica aumentam.

1.3 Indicações clínicas para a análise cromossômica


A análise cromossômica é indicada como um procedimento diagnóstico de
rotina para uma série de fenótipos específicos encontrados em medicina clínica.
Além disso, também existem situações clínicas não específicas e achados que
indicam a necessidade de analise citogenética.

1.3.1 Problemas precoces de crescimento e de desenvolvimento


A falta e o retardo do desenvolvimento, uma fácies dismórfica, malforma-
ções múltiplas, baixa estatura, genitália ambígua e retardo mental são achados
frequentes em crianças com anomalias cromossômicas, embora elas não se
restrinjam àquele grupo. A menos que haja um diagnóstico não cromossômico
definitivo, a análise cromossômica deveria ser realizada nos pacientes que se
apresentam com uma combinação de tais problemas.

1.3.1.1 Natimortos e morte neonatal


A incidência de anomalias cromossômicas é muito mais elevada entre os
natimortos (até aproximadamente 10%) do que entre os nativivos (até apro-
ximadamente 0,7%). Ela também é elevada entre as crianças que falecem no
período neonatal (cerca de 10%). A análise cromossômica deveria ser realizada
em todos os natimortos e óbitos neonatais para que pudesse apresentar uma
base citogenética a fim de identificar uma possível causa específica ou, alterna-
tivamente, descartar uma anomalia cromossômica como o motivo para a perda.
Em tais casos, a cariotipagem (ou outros modos abrangentes de exploração do
genoma) é essencial para uma consulta genética precisa, podendo fornecer
importantes informações para o diagnostico pré-natal em gestações futuras.
90 GENÉTICA

1.3.2 Problemas de fertilidade


Os estudos cromossômicos estão indicados para as mulheres que apresentam
amenorreia e para casais com história de infertilidade ou abortos recorrentes.
A anomalia cromossômica é observada em um ou outro genitor em uma pro-
porção significante (3% a 6%) dos casos nos quais existe infertilidade ou dois
ou mais abortos.

1.3.3 História familiar


Uma anomalia cromossômica conhecida ou suspeita em um parente de
primeiro grau constitui uma indicação para a análise cromossômica em algu-
mas circunstâncias.

1.3.4 Neoplasia
Praticamente todos os cânceres estão associados a uma ou mais anomalias
cromossômicas. A avaliação dos cromossomos e do genoma na amostra teci-
dual adequada (o próprio tumor, ou a medula óssea na hipótese de neoplasias
hematológicas malignas) pode fornecer um diagnostico útil ou informações
prognósticas.

1.3.5 Gestação em uma mulher em idade avançada


Existe um risco aumentado de anomalia cromossômica nos fetos concebi-
dos por mulheres com mais de 35 anos. A análise cromossômica fetal deveria
ser oferecida como parte da rotina dos cuidados pré-natais nessas gestações.
Conquanto ideais para uma rápida análise clínica, as culturas celulares pre-
paradas a partir do sangue periférico apresentam a desvantagem de sua curta
vida (3 a 4 dias). Culturas de longa duração, adequadas para armazenagem per-
manente ou para estudos moleculares, podem ser derivadas de uma variedade de
outros tecidos. A biópsia de pele, um procedimento cirúrgico menor, pode for-
necer amostras de tecido que, em cultura, produzem fibroblastos, que podem
ser usados para uma diversidade de estudos bioquímicos e moleculares, assim
como para análise cromossômica e genômica. Os leucócitos também podem
ser transformados em cultura para formar linhagens celulares linfoblastoides,
que são potencialmente imortais. A medula óssea só pode ser obtida pelo
procedimento relativamente invasivo da biópsia de medula, mas possui a van-
tagem de conter uma elevada proporção de células em divisão, de modo que
pouca ou nenhuma cultura é necessária. Seu principal uso é no diagnóstico
Citogenética e genética do câncer 91

da suspeita de neoplasias hematológicas malignas. A sua desvantagem é que


as preparações de cromossomos obtidas da medula são relativamente pobres,
com cromossomos curtos, mal separados que são mais difíceis de analisar do
que os do sangue periférico. As células fetais derivadas do líquido amniótico
(amnióticos) ou obtidas através de biópsias de vilosidades coriônicas também
podem ser cultivadas com sucesso para análises citogenéticas, genômicas
bioquímicas, ou moleculares. As células das vilosidades coriônicas também
podem ser analisadas diretamente, sem a necessidade de cultura.
A análise molecular do genoma pode ser realizada em qualquer material
clínico adequado, desde que um DNA de boa qualidade possa ser obtido. As
células não têm de estar se dividindo para este propósito, sendo, desse modo,
possível a realização dos exames em amostras de tecido e de tumores, por
exemplo, assim como no sangue periférico.

1.4 Identificação cromossômica


Os 24 tipos de cromossomos encontrados no genoma humano podem ser
prontamente identificados citologicamente por uma série de procedimentos
específicos de coloração. Existem três métodos de coloração comumente
utilizados que podem distinguir os cromossomos humanos. O método mais
utilizado em laboratório é o padrão de bandas Giemsa (padrões de bandas G),
em que os cromossomos são primeiro tratados com tripsina para desnaturar as
proteínas cromossômicas e, então, corados com Giemsa (Figura 3.4).

Figura 3.4 Cariótipo humano obtido pela técnica de bandas G

Human female
G-bands

1 2 3 4 5

6 7 8 9 10 11 12

13 14 15 16 17 18

19 20 21 22 X Y

Fonte: Nussbaum et al. (2008).


92 GENÉTICA

Outros procedimentos utilizados em alguns laboratórios ou para propósitos


específicos incluem os seguintes:
Padrão de bandas Q: este método exige a coloração pela quinacrina mos-
trados ou compostos relacionados e o exame pela microscopia de fluorescência
(Figura 3.5). Os cromossomos se coram em um padrão específico de bandas
brilhantes ou turvas (bandas Q), as bandas Q brilhantes correspondem quase
exatamente às bandas escuras observadas após o padrão de bandas G. O pa-
drão de bandas Q, assim como o padrão de bandas C, é particularmente útil
na detecção de variantes ocasionais da morfologia ou da coloração cromossô-
mica, denominadas heteromorfismos. Essas variantes geralmente são benignas
e refletem as diferenças entre a quantidade ou o tipo de sequências de DNA
satélite (DNA que contém muitas repetições em série de uma unidade básica de
repetições curta), em uma localização particular ao longo de um cromossomo.

Figura 3.5 Cariótipo humano obtido pela técnica de bandas Q

Fonte: Nussbaum et al. (2008).

Padrão de bandas R: se os cromossomos recebem um tratamento especial


(tal como o aquecimento) antes da coloração, as bandas escura e clara resul-
tantes são o reverso daquelas produzidas pelo padrão de bandas G ou Q e são
consequentemente denominadas bandas R. Especialmente quando regiões
se coram mal pelos padrões de bandas G ou Q são examinadas, o padrão de
bandas R fornece um padrão que é mais fácil de ser analisado do que aquele
Citogenética e genética do câncer 93

oferecido pelos padrões das bandas G ou Q. Ele é o método-padrão em alguns


laboratórios, particularmente na Europa.
Um sistema uniforme de classificação cromossômica é internacionalmente
aceito para a identificação os cromossomos humanos corados por qualquer dos
três procedimentos de coloração. O padrão de bandas em cada cromossomo é
numerado em cada braço a partir do centrômero para o telômero. A partir do
emprego desse sistema de numeração, a localização de qualquer banda em par-
ticular, assim como das sequências de DNA e de genes dentro dela, e o seu en-
volvimento em uma anomalia cromossômica podem ser descritos com precisão.
Os cromossomos humanos são muitas vezes classificados pela posição do
centrômero em três tipos que podem ser facilmente diferenciados na metáfase:
cromossomos metacêntricos, com um centrômero mais ou menos central e
braços de comprimento aproximadamente igual; cromossomos submetacêntri-
cos, com um centrômero fora do centro e braços de comprimentos claramente
diferentes; e cromossomos acrocêntricos, com o centrômero próximo a uma
extremidade. Um potencial quarto tipo de cromossomo, o telocêntrico, com
o centrômero em uma extremidade e somente um único braço, não ocorre
no cariótipo humano normal, mas é ocasionalmente observado em rearranjos
cromossômicos, sendo um tipo comum em outras espécies. Os cromossomos
humanos acrocêntricos (cromossomos 13, 14, 15, 21 e 22) possuem massas
cromatínicas pequenas e distintas, conhecidas como satélites, fixadas aos seus
braços curtos por finas hastes (constrições secundárias). As hastes desses cinco
pares de cromossomos contêm centenas de cópias de genes que codificam
RNA ribossômico (o principal componente dos ribossomos), assim como uma
diversidade de sequências repetitiva (NUSSBAUM et al., 2008).

1.5 Mutações e seus efeitos sobre o fenótipo


A transmissão da informação genética de geração pra geração geralmente
é perfeita, mas às vezes, ocorrem erros ou modificações no material genético.
Estas modificações são chamadas de mutações. Podemos dizer que mutação é
qualquer alteração na sequência nucleotídica do DNA perpetuada nas células-
-filhas (OTTO; NETTO; OTTO, 2013).
A incorporação de nucleotídeos errados, na fase de duplicação, bem como
quebras no DNA, sempre ocorre ao acaso. As células têm mecanismos de
reparo do DNA, reações executadas por um conjunto de enzimas que atuam
em sequência para remover bases inseridas erroneamente, inserir as corretas
94 GENÉTICA

e reunir extremidades quebradas do DNA. Vários dos mecanismos de reparo


dependem da existência de duas cópias da informação genética, uma em cada
cadeia da dupla-hélice de DNA. Quando esses mecanismos de reparo falham,
a informação genética fica definitivamente alterada, isto é, mutada (OTTO;
NETTO; OTTO, 2013).
Mutações que alteram uma ou algumas bases da sequência nucleótidica
do DNA, afetando o funcionamento de um ou poucos genes, são chamadas
de mutações gênicas. Os rearranjos maiores do material genético, que acarre-
tam alterações grandes na estrutura e no número de cromossomos (portanto,
englobando muitos genes simultaneamente), são chamados de mutações ou
alterações cromossômicas (OTTO; NETTO; OTTO, 2013).
Quanto ao tipo de células em que ocorrem as mutações, elas podem ser
chamadas de somáticas ou germinativas. As mutações somáticas são as que
surgem nos tecidos que não vão originar gametas. Elas não são transmitidas às
gerações seguintes, mas podem acarretar doenças, como o desencadeamento
do câncer, que veremos mais adiante nesta unidade. Já as mutações que acon-
tecem na linhagem germinativa, ou seja, em células que vão originar os game-
tas, podem ser transmitidas à gerações futuras, se gametas contendo mutações
forem fecundados. Elas são a base da diversidade genética das populações e
da evolução (OTTO; NETTO; OTTO, 2013).
As mutações, ao serem transmitidas às gerações seguintes, são a fonte básica
de toda a variabilidade genética. Sem mutação, todos os genes existiriam apenas
em uma única forma, sem alelos alternativos. Quando ocorre uma mutação,
surge uma nova sequência nucleotídica no DNA. Parte das mutações se dá em
regiões externas aos genes. Uma fração das mutações pode ocorrer na região
codificadora de aminoácidos de um gene ou em uma região muito importante
para a regulação do funcionamento correto de um ou mais genes. Essas alterações
podem não ter efeito algum sobre a biologia do organismo, sendo consideradas
neutras. Também podem acarretar modificações benéficas à sobrevivência e
reprodução do organismo. No entanto, o resultado pode ser adverso ao orga-
nismo, manifestando-se na forma de doença e/ou reduzir a probabilidade de o
organismo se reproduzir. Dependendo do seu efeito, as mutações podem causar
doenças hereditárias (OTTO; NETTO; OTTO, 2013).
Algumas mutações são tão prejudiciais ao funcionamento de um orga-
nismo, que são chamadas de letais, pois resultam na eliminação do embrião
ou feto ou na morte pós-natal do indivíduo que as recebe. Historicamente,
Citogenética e genética do câncer 95

a adjetivação letal foi usada de início para descrever apenas aquelas mutações
que originavam eliminação pré-natal do concepto. Uma mutação que resulta em
esterilidade é, geneticamente, tão letal quanto aquela que causa a eliminação
do embrião ou feto sob a forma de abortamento, ou a morte de indivíduos em
fase pré-reprodutiva, de modo que essa segunda categoria também é incluída
no conceito de mutação letal. É importante salientar, ainda, as diferenças entre
mutações letais de acordo com a sua natureza. Mutações dominantes letais
são aquelas que, em heterozigose (ou excepcionalmente em homozigose),
determinam a inviabilidade, a morte em pré-reprodutiva ou a esterilidade de
seus portadores. As letais recessivas são as que, em homozigose, tem o mesmo
efeito. As recessivas ligadas ao X, que impedem a reprodução de hemizigotos.
As dominantes ligadas ao X, que, em hemizigose ou em heterozigose, exercem
esse efeito drástico (OTTO; NETTO; OTTO, 2013).
A recombinação genética pode rearranjar a variabilidade presente nos or-
ganismos, embaralhando diferentes tipos de mutações em novas combinações.
A seleção natural simplesmente tratará de preservar as combinações mais bem
adaptadas às condições ambientais existentes ou eliminar os genótipos ou
combinações de genótipos que resultem em indivíduos afetados, com proba-
bilidade baixa de se reproduzir.
As mutações ocorridas ao acaso, por erros acidentais no mecanismo de
perpetuação das células, são ditas espontâneas. Na realidade, muitas decorrem
de fenômenos físico-químicos naturais conhecidos, como isomeria dinâmica
por tautomeria das bases nitrogenadas do DNA (OTTO; NETTO; OTTO, 2013).
Já as mutações decorrentes de algum agente indutor extrínseco, químicos
ou físicos, são chamadas de induzidas. Parte dessas mutações, no entanto,
surge por causa da radiação naturalmente presente na natureza. Apesar de uma
certa ambiguidade, vamos falar um pouco desses dois termos que adjetivam
mutações (OTTO; NETTO; OTTO, 2013).
Em todos os organismos estudados, verificou-se que cada gene tem uma taxa
de mutação característica, isto é, a cada n cópias, uma conterá um erro, ao acaso.
A maioria dos genes humanos apresenta uma mutação em 100.000 a uma mutação
em 1.000.000 de gametas por geração. A taxa de mutação é, por natureza, uma
entidade heterogênea, pois pode tanto se referir a uma alteração em um único có-
don de DNA como um conjunto de centenas ou milhares de alterações diferentes
no interior de um único gene de tamanho muito grande. Todas elas conduzindo a
fenótipos mais ou menos indistinguíveis entre si, como é o caso dos genes corres-
96 GENÉTICA

pondentes às distrofias musculares de Duchenne e Becker e da neurofibromatose


tipo I. Mas, de maneira geral, a taxa de mutação de um gene é diretamente pro-
porcional ao seu tamanho (OTTO; NETTO; OTTO, 2013).

Questões para reflexão


A distrofia muscular de Duchenne tem recebido muita atenção das
comunidades médicas e científicas, por ser um distúrbio relativamente
comum, grave e atualmente intratável.

As mutações podem ser induzidas por alguns agentes ambientais, como


radiação ionizante penetrante e nêutrons de reatores nucleares, entre os agentes
físicos, e gás mostarda, formaldeído e ácido nitroso, entre os químicos. Esses
agentes mutagênicos são responsáveis apenas por um aumento na taxa de
mutações espontâneas, ao contrário da ideia disseminada de que as mutações
decorrem exclusivamente desses fatores. Se uma mutação ocorrer por causa de
radiação naturalmente presente na natureza (radiação de fundo), ela deve ser
referida como espontânea. A adjetivação induzida deve ser reservada apenas
aos casos em que os agentes ambientais usuais estejam anormalmente elevados
(OTTO; NETTO; OTTO, 2013).
Os agentes mutagênicos produzem mutações apenas nas células em cujos
núcleos conseguem penetrar. A radiação UV, por exemplo, não causa mutações
nos gametas de muitos organismos simplesmente porque não os pode atingir.
Certas substâncias, como a cafeína, presentes em nossa dieta, revelaram-se
mutagênicas em bactérias, mas não se sabe ainda se, circulando na corrente
sanguínea, têm condições de atravessar as barreiras naturais para tingir os genes
em concentrações suficientes para originar mutações.
Em geral, os agentes mutagênicos não são específicos para determinado
loco, ou grupo de loco, mas alguns interagem preferencialmente com deter-
minadas bases, prejudicando os genes mais ricos nessas bases. Por exemplo, a
luz UV é absorvida com maior facilidade pelas pirimidinas (timina e citosina),
e tal absorção rompe ligações nessas bases, fazendo com que elas se unam
duas a duas, formando dímeros, o que impede o seu pareamento normal com
as purinas (Figura 3.6) (OTTO; NETTO; OTTO, 2013).
Citogenética e genética do câncer 97

Figura 3.6 Formação de um dímero de timinas no DNA


por radiação UV

Fonte: Otto, Netto e Otto (2013).

1.6 Agentes mutagênicos químicos


Com a finalidade de melhorar a qualidade de vida, a ciência e a indústria
vêm cada vez mais introduzindo compostos químicos, como remédios, pes-
ticidas, aromatizantes, corantes e conservantes. Os benefícios são evidentes,
porém, estes não são os únicos efeitos de tais compostos químicos. Algumas
dessas substâncias podem causar mutações no material genético, recebendo
o nome de mutagênicos químicos. Alguns quebram o DNA. Outros, como a
acridina, o brometo de etídio e a proflavina, intercalam-se entre as bases e
distorcem a estrutura do DNA. Essa alteração é compensada pela adição ou
eliminação de bases, o que, por sua vez, pode resultar em modificação no
quadro de leitura dos códons, alterando os aminoácidos e, consequentemente,
as proteínas produzidas. Certos mutagênicos tomam o lugar da base correta
e, assim, alternam o pareamento no ciclo de duplicação. O metano sulfonato
(SEM), por exemplo, age diretamente sobre a guanina, adicionando grupos me-
tila, o que resulta no enfraquecimento de certas ligações químicas, originando
uma falha na cadeia de DNA (OTTO; NETTO; OTTO, 2013).
98 GENÉTICA

1.7 Agentes mutagênicos físicos


A elevação da temperatura aumenta a energia, o que causa a quebra das
ligações entre os átomos. Por essa capacidade de alterar moléculas, a tempera-
tura é um agente mutagênico cuja ação é discutida principalmente em relação
às células germinativas dos machos de mamíferos, pois os testículos não têm
isolamento térmico tão eficiente quanto o os ovários OTTO; NETTO; OTTO,
2013).
A radiação eletromagnética, representada pela luz visível, por raios infra-
vermelhos e micro-ondas, não produz efeitos graves. Os raios UV da luz solar
têm muito pouca energia e não penetram os tecidos, de modo que a luz UV é
mutagênica apenas para organismos unicelulares e para as células superficiais
dos organismos multicelulares, como as da pele. Radiações eletromagnéticas
mais energéticas que a luz UV, como os raios X e os raios gama, têm energia
suficiente para causar alterações estruturais nas moléculas e são penetrantes,
de modo que o interior do corpo está praticamente tão exposto a elas quanto
a superfície (OTTO; NETTO; OTTO, 2013).
A maioria dos elementos químicos tem núcleos estáveis. Mas existem al-
guns cujos núcleos podem se desintegrar e emitir prótons e nêutrons (radiação
alfa), elétrons (radiação beta) ou energia (radiação gama). Raios X e raios gama
incidindo sobre um átomo qualquer, arrancam elétrons deste, fazendo que ele
fique eletricamente carregado, ou seja, transformado em íon. Por tal motivo,
esses tipos de radiações se chamam ionizantes OTTO; NETTO; OTTO, 2013).

Questões para reflexão


Sabemos que a exposição a agentes mutagênicos possibilita a forma-
ção de alterações cromossômicas. Os raios ionizantes dos raios X e
aparelhos de ultrassom podem emitir ondas que, em excesso, trazem
prejuízos. Há indicações de que a irradiação pélvica materna no pré-
-natal tenha efeito sobre o feto. Seria isso uma mentira?
Citogenética e genética do câncer 99

1.8 Classificação das mutações com base no tipo de


alteração molecular
De modo geral, as mutações ocorridas no DNA podem ser molecularmente
classificadas da seguinte maneira:

1.8.1 Substituições
Em geral, são alterações de um único par de bases, por isso são comumente
chamadas de mutações de ponto. São trocas de um nucleotídeo por outro di-
ferente na molécula do DNA

1.8.2 Deleções
Correspondem à perda de um ou vários nucleotídeos na molécula do DNA.

1.8.3 Inserções
Correspondem à introdução de um ou vários nucleotídeos na molécula de
DNA. Um tipo especial de inserção é a duplicação, surgida quando a porção in-
serida tem sequência de bases repetida em outra região do gene ou do genoma.

1.8.4 Mutações dinâmicas ou instáveis


Caracterizam-se pela variação do número de cópias de pequenas sequências
de nucleotídeos repetidas, que passam a ser transmitidas de forma instável com
o passar das gerações. Na maior parte das doenças decorrentes desse meca-
nismo mutacional, os indivíduos afetados apresentam número de cópias de
trinucleotídeos repetidos anormalmente expandidos (síndrome do cromossomo
X frágil, distrofia miotônica de Steinert, doença de Huntington).

Questões para reflexão


A síndrome do X frágil é uma forma hereditária mais comum de re-
tardo mental moderado, que muitas vezes é percebida e diagnosticada
quando a criança está na idade escolar e apresenta dificuldades de
aprendizado. Quais as alterações cromossômicas destas síndromes e
quais intervenções podem ser realizadas?
100 GENÉTICA

1.9 Alterações cromossômicas


O material genético (DNA) de qualquer célula é responsável por guardar
toda a informação necessária para a sobrevivência, desenvolvimento e repro-
dução do organismo. O genoma é a informação genética total armazenada no
DNA de uma célula. O DNA de organismos eucarióticos está contido essencial-
mente no núcleo das células, constituindo o genoma nuclear. O DNA nuclear
dos eucarióticos está dividido em dois ou mais cromossomos. A maioria dos
organismos eucarióticos é diploide, isto é, possui dois conjuntos complexos
de cromossomos em cada célula somática; são haploides quando possuem um
único conjunto de cromossomos nas células sexuais. 
Muitas das anormalidades cromossômicas encontradas em pacientes com
fenótipo anormal não são herdadas da geração anterior e surgiram somente
nesses indivíduos afetados, como mutações novas. Isso acontece porque, em
muitos casos, as anormalidades cromossômicas levam seus portadores à morte
pré-natal, e muitos dos que sobrevivem geralmente não as transmitem para a
prole, porque são estéreis ou apresentam um quadro clínico muito grave, inúme-
ras vezes acompanhado de retardo metal. No entanto, as alterações estruturais
podem ocorrer na forma equilibrada, ou seja, há mudança da posição de seg-
mentos cromossômicos sem que ocorram perdas ou ganhos significativos, que
produzam efeitos clínicos. Esses indivíduos podem passar tais alterações para
a geração seguinte, na forma equilibrada ou não, mas entre eles pode haver
casos de esterilidade, por efeito do rearranjo cromossômico na gametogênese
(OTTO; NETTO; OTTO, 2013).

1.9.1 Alterações numéricas dos cromossomos


Os erros nos processo de separação dos cromossomos ocorridos na divisão
celular, na mitose ou na meiose podem resultar em células ou indivíduos com
constituição cromossômica numericamente errada.
As alterações numéricas dos cromossomos que afetam somente determi-
nado par são chamadas de aneuploidias. Na espécie humana, descrevem-se
pacientes com: monossomias — ausência de um dos componentes de um
par de cromossomos homólogos. A única monossomia total viável na espécie
humana parece ser a do cromossomo X, os demais caos descritos referem-se a
monossomias parciais; trissomias — um cromossomo a mais, que transforma
determinado par de homologia em uma trinca; tetrassomias — dois cromosso-
Citogenética e genética do câncer 101

mos extras que transformam o par de cromossomos X de uma mulher em um


grupo de 4 ou cromossomos X (OTTO; NETTO; OTTO, 2013).

Para saber mais


Durante a meiose, existem algumas consequências genéticas, entre elas a redução do número
de cromossomos e o embaralhamento adicional do material genético pelo crossing over, que
não só está envolvido como um mecanismo para aumentar a variação genética, mas também
é essencial para assegurar a disjunção normal dos cromossomos.

1.9.2 Alterações estruturais dos cromossomos


Os cromossomos podem se quebrar acidentalmente. No entanto, podem
se ressoldar, reconstituindo, sem defeito, o cromossomo de que se originaram.
Ainda, a extremidade de um fragmento pode se unir à ponta de outro fragmento
oriundo de cromossomo diverso, formando, assim, um cromossomo anômalo.
Vários agentes físicos, químicos e biológicos podem aumentar a frequência de
quebras nos cromossomos e, portanto, provocar lesões transitórias ou perma-
nentes no cariótipo (OTTO; NETTO; OTTO, 2013).
Outro mecanismo que pode originar rearranjos cromossômicos é a per-
mutação errada entre segmentos do genoma que têm sequências parecidas,
mas não estão situadas na mesma posição em cromossomos homólogos. Esse
processo difere da recombinação que acarreta troca de segmentos exatamente
correspondentes, normalmente na meiose, e gera cromossomos alterados como
resultado (OTTO; NETTO; OTTO, 2013).
Na meiose normal, dá-se o emparelhamento dos cromossomos homólogos.
Quando os cromossomos são estruturalmente anormais, o emparelhamento
também é anormal. Na Figura 3.7, estão esquematizados os emparelhamentos
em casos de deleções, duplicações e inversões.
102 GENÉTICA

Figura 3.7 Emparelhamentos nos cromossomos homólogos

MEIOSE I

EMPARELHAMENTO DOS CROMOSSOMOS


HOMÓLOGOS E PERMUTAÇÃO
PRÓFASE I METÁFASE I ANÁFASE I

Fonte: <http://www.cursoobjetivo.br/vestibular/roteiro_estudos/projeto_genoma.aspx>.
Acessado em: 28 de março de 2014.

1.9.3 Doenças produzidas por defeitos dos autossomos


1.9.3.1 Síndrome de Down
É uma alteração genética causada por um erro na divisão celular durante a
divisão embrionária. Os portadores da síndrome, em vez de dois cromossomos
no par 21, possuem três (Figura 3.8). Em alguns casos, pode ocorrer a trans-
locação cromossômica, isto é, o braço longo excedente do 21 liga-se a outro
cromossomo qualquer. Mosaicismo é uma forma rara da síndrome de Down,
em que uma das linhagens apresenta 47 cromossomos e a outra é normal.
Alterações provocadas pelo excesso de material genético no cromossomo
21 determinam as características típicas da síndrome:
Olhos oblíquos semelhantes aos dos orientais, rosto arredondado, mãos
menores com dedos mais curtos, prega palmar única e orelhas pequenas.
Hipotonia: diminuição do tônus muscular responsável pela língua protusa,
dificuldades motoras, atraso na articulação da fala e, em 50% dos casos,
cardiopatias.
Comprometimento intelectual e, consequentemente, aprendizagem mais lenta.
Citogenética e genética do câncer 103

Figura 3.8 Cariótipo de um indivíduo com síndrome de Down

Fonte: Da autora (2014).

1.9.3.2 Síndrome de Edwards


Descrita em 1960 por John H. Edwards, hoje, a trissomia do 18 apresenta
trissomia regular sem mosaicismo, isto é, cariótipo 47, XX ou XY, +18. Pode haver
uma translocação envolvendo todo ou a maior parte do cromossomo 18, capaz de
ser original ou herdada de um genitor portador balanceado. A trissomia também
pode estar presente na forma de mosaico, com uma expressão variável, mas ge-
ralmente mais leve. Ainda não se identificou a “região crítica” da trissomia do 18,
mas a trissomia parcial de todo o braço longo produz o fenótipo típico da trissomia
do 18 (Figura 3.9). A incidência é de cerca de 0,3 por 1.000 nascimentos. Acredita-
-se que a trissomia do 18 possa estar associada à idade materna, pois grande parte
dos casos são originados de mulheres com mais de 35 anos de idade.
Os portadores apresentam retardamento físico e mental e defeitos cardíacos.
O crânio é muito alongado na região occipital. O pescoço é curto. O pavilhão
das orelhas é dismórfico, com poucos sulcos. A boca é pequena e triangular.
Grande distância intermamilar. Os genitais externos são anômalos. O dedo
indicador é maior do que os outros e flexionado sobre o dedo médio. Os pés
104 GENÉTICA

têm as plantas arqueadas. As unhas costumam ser hipoplásticas e atrofiadas. A


morte ocorre, em geral, antes da primeira infância, aos 3 ou 4 meses de idade,
mas pode ser protelada até quase 2 anos.

Figura 3.9 Cariótipo da síndrome de Edwards

Fonte: Departamento de Genética — UFRGS.

1.9.3.3 Síndrome de Patau


Reconhecida em 1960 por Klaus Patau observando um caso de malformações
múltiplas em um neonato, sendo trissômico para o cromossomo 13. Tem como
causa a não disjunção dos cromossomos durante a anáfase I da mitose, gerando
gametas com 24 cromátides. Cerca de 20% dos casos resultam de uma translo-
cação não balanceada. A sua incidência foi estimada em cerca de 1 caso para
6.000 nascimentos. Aproximadamente 45% dos afetados falecem após 1 mês
de vida; 70%, aos 6 meses e somente menos de 5% dos casos sobrevivem mais
de 3 anos. A maior sobrevida relatada na literatura foi a de 10 anos de idade.
Geralmente ocorrem defeitos cardíacos congênitos e defeitos urogenitais,
incluindo criptorquidia nos meninos e útero bicornado e ovários hipoplásti-
cos nas meninas, gerando infertilidade e rins policísticos. Com frequência,
encontram-se fendas labial e palato fendido, os punhos cerrados e as plantas
arqueadas. As orelhas são malformadas e baixamente implantadas. As mãos
e pés podem mostrar quinto dedo (polidactilia) sobrepondo-se ao terceiro e
quarto, como na trissomia do 18 (Figura 3.10).
Citogenética e genética do câncer 105

Figura 3.10 Cariótipo da síndrome de Patau

1 2 3 4 5

6 7 8 9 10 11 12

13 14 15 16 17 18

19 20 21 22 X Y

Fonte: Nussbaum et al. (2008).

1.9.3.4 Síndrome do “Miado de Gato” (Cri Du Chat)


A síndrome Cri-Du-Chat foi originalmente descrita em 1963 pelo Dr. Lejeune,
na França. Esta síndrome recebe esse nome pelo fato de seus portadores pos-
suírem um choro semelhante ao miado agudo de um gato. Trata-se de uma
anomalia cromossômica causada pela deleção parcial (quebra) do braço curto
do cromossomo 5, apresentando um cariótipo 46, XX, 5p– e 46, XY, 5p– (Figura
3.11). Por isso é também chamada de síndrome 5 p– (menos). A estimativa é
que esta síndrome afeta cerca de 1 em 50.000 casos de crianças nascidas no
mundo, e 1% dos indivíduos com retardamento mental. Esta síndrome, na
maioria das vezes, não é herdada dos pais, aproximadamente em 85% dos casos
resultam de novas deleções esporádicas, enquanto 5% dos casos se originam
secundariamente a uma segregação desigual de uma translocação parental.
Esses casos são causados pela translocação equilibrada nos cromossomos de
um dos pais (material genético de um cromossomo que se uniu a outro). As
pessoas com translocações equilibradas são perfeitamente normais porque ne-
nhum material genético foi perdido, assim sendo, provavelmente não saberão
que são portadores até que tenham uma criança afetada com CDC na família.
106 GENÉTICA

Figura 3.11 Cariótipo da síndrome de Cri-Du-Chat


A B

1 2 3 4 5

6 7 8 9 10 11 12

D E

13 14 15 16 17 18

F G

19 20 21 22 X X

Fonte: Da autora (2014).

Atividades de aprendizagem
1. A síndrome de Down caracteriza-se pela presença de um cromossomo 21
a mais nas células dos indivíduos afetados. Esse problema pode ser decor-
rente da não disjunção do cromossomo 21 em dois momentos durante a
formação dos gametas. Esquematize uma meiose normal e uma com não
disjunção, utilizando-se somente do cromossomo 21. Lembre-se de que
a não disjunção pode ocorrer na meiose I ou II.
2. Descreva sucintamente como se prepara uma lâmina para observação
de cromossomos humanos.
Citogenética e genética do câncer 107

Seção 2 Bases genéticas do câncer


Caro(a) acadêmico(a)! Através do estudo da Seção 2, você será levado a co-
nhecer as desordens que acontecem em nível molecular e que podem causar uma
proliferação acelerada e desenfreada das células, mutações gênicas e epigenética.

2.1 Proliferação celular e o câncer


O câncer é uma doença genética que pode estar associada a alterações em
genes específicos, mas na maioria dos casos não é uma doença hereditária.
Na doença hereditária, o defeito genético está presente nos cromossomos do
pai ou da mãe e é transmitido ao zigoto. Ao contrário, as alterações genéticas
que levam à maioria dos cânceres surgem do DNA de uma célula somática
durante o período da vida do indivíduo acometido. A formação de neoplasias
se dá pelo desequilíbrio entre a proliferação celular (ciclo celular) e a apoptose
(morte celular programada). Estes eventos são controlados por uma grande quan-
tidade de genes, que, ao sofrer mutações, podem ter seus produtos expressos
de maneira alterada, iniciando a formação de um tumor.
As mutações em duas grande classes de genes — oncogenes (por exemplo,
rãs) e genes supressores de tumores (por exemplo, APC) — têm papel funda-
mental na indução do câncer. Esses genes codificam vários tipos de proteínas
que controlam o crescimento e a proliferação celulares. Praticamente todos os
tumores humanos apresentam mutações inativadoras nos genes que, normal-
mente, atuam em diversos pontos de verificação do ciclo celular que param a
progressão da célula pelo ciclo, caso uma etapa anterior tenha ocorrido incor-
retamente ou se houve lesão no DNA. Os genes supressores de tumores atuam
como freios das células; eles codificam proteínas que retardam o crescimento
celular e impedem as células de tornarem-se malignas. Os oncogenes, por outro
lado, codificam proteínas que promovem a perda do controle do crescimento
e a conversão de uma célula normal para um estado maligno; como resultado,
os oncogenes atuam como aceleradores da proliferação celular e tumorigênese.
Na série de eventos que resulta no crescimento de um tumor, os oncogenes
associam-se com as mutações nos supressores tumorais, para gerar a grande
diversidade de propriedades das células tumorais (WEINBERG, 2008).
Os oncogenes são genes que sofreram mutações ativadoras, ou seja, que
passaram a ter ganho de função ou hiper expressão. Uma característica impor-
tante dos oncogenes é que eles têm efeito dominante na célula, ou seja, um
108 GENÉTICA

único alelo mutado é suficiente para alterar o fenótipo de uma célula normal
para maligna. Esses genes são responsáveis por aumentar a proliferação celu-
lar, ao mesmo tempo que inibem a apoptose, eventos que dão início a uma
neoplasia (WEINBERG, 2008).

2.2 Genômica e genética do câncer


O câncer é uma das doenças mais comuns e graves vistas na medicina clí-
nica. As características mostram que o câncer, de alguma forma, ataca mais de
um terço da população, sendo responsável por mais de 20% de todas as mortes,
e, em países desenvolvidos, é responsável por mais de 10% do custo total em
cuidados médicos. O câncer, se não tratado, é invariavelmente fatal. O diag-
nóstico precoce e o tratamento imediato são vitais, assim como a identificação
de pessoas com risco aumentado de câncer, antes do seu desenvolvimento,
constitui um importante objetivo da pesquisa do câncer.
Neste tópico, descreveremos como os estudos em genética molecular de-
monstram que o câncer é fundamentalmente uma doença genética. Descreve-
remos os tipos de genes que têm sido implicados na iniciação do câncer e os
mecanismos pelos quais a disfunção desses genes pode resultar em doença. Em
segundo lugar, revisaremos várias síndromes herdadas e demonstraremos como
os conhecimentos obtidos na sua patogênese têm esclarecido a base das formas
mais comuns e das formas esporádicas de câncer. Examinaremos, também,
alguns dos desafios especiais que tais síndromes herdadas apresentam para a
genética médica e a consulta genética. Em terceiro lugar, mostraremos que a
genética e a genômica têm mudado o modo como pensamos sobre as causas do
câncer e como diagnosticamos e tratamos a doença. A genômica — em particular
a identificação da duplicação e deleção de segmentos do genoma da célula
cancerosa e análise da expressão e da mutação em células cancerosas — é, de
fato, a mudança do diagnóstico e do tratamento do câncer.
O câncer não é uma doença única, mas um nome usado para descrever as
mais virulentas formas de neoplasia, um processo de doença caracterizado por
proliferação celular descontrolada, que leva a uma massa ou tumor (neoplasma).
Entretanto, para que um neoplasma seja um câncer, ele deve ser também ma-
ligno, o que significa que seu crescimento não é mais controlado e o tumor é
capaz de progredir invadindo tecidos vizinhos ou espalhando-se (metastati-
zando) para locais mais distantes, ou ambos. Os tumores que não invadem ou
metastatizam não são cancerosos, mas são referidos como tumores benignos,
Citogenética e genética do câncer 109

embora seu tamanho e localização possam torná-los tudo, menos benignos ao


paciente. Existem três formas principais de câncer: os sarcomas, nos quais o tu-
mor surge em um tecido mesenquimal, como o osso, músculo, tecido conjuntivo
ou no sistema nervoso; os carcinomas, que se originam de tecido epitelial, como
as células que revestem os intestinos, os brônquios ou os ductos da mama; e
os neoplasmas malignos hematopoéticos e linfoides, como as leucemias e os
linfomas, que se espalham por toda a medula óssea, pelo sistema linfático e
pelo sangue periférico. Dentro de cada um dos grupos principais, os tumores
são classificados de acordo com o local, o tipo de tecido, a aparência histoló-
gica e o grau de malignidade.

2.3 Base genética do câncer


A neoplasia é um acúmulo anormal de células que ocorre em razão de um
desequilíbrio entre a proliferação celular e o desgaste celular. As células pro-
liferam à medida que passam pelo ciclo celular e sofrem mitose. O desgaste,
devido à morte celular programada, remove células de um tecido (NUSSBAUM
et al., 2008).
O desenvolvimento do câncer (oncogênese) resulta de mutações em um ou
mais do vasto arranjo de genes que regulam o crescimento celular e a morte
celular programada. Quando o câncer ocorre como parte de uma síndrome de
câncer hereditário, a mutação inicial causadora do câncer é herdada através
de linhagem germinativa e, portanto, já presente em cada célula do corpo.
Entretanto, a maioria dos cânceres é esporádica, porque as mutações ocorrem
em uma única célula somática, que então se divide e prossegue para desen-
volver um câncer. Não é surpresa que as mutações somáticas podem causar
câncer. Um grande número de divisões celulares, a partir de uma única cé-
lula, que é o zigoto, é necessário para produzir um organismo adulto de cerca
de 1014 células. Considerando-se uma frequência de 10-10 erros de replicação
por base de DNA, por divisão celular, e cerca de 1.015 divisões celulares du-
rante o tempo de vida de um adulto, apenas os erros de replicação resultam em
milhares de mutações do DNA no genoma, em cada célula do organismo. As
mutações nos cromossomos e no genoma adicionam-se à carga mutacional. Os
genes alterados no câncer não são inerentemente mais mutáveis que os outros
genes. Muitas mutações ocorrem, sem dúvida, nas células somáticas e fazem
que uma célula, entre muitas, perca a função ou morra, mas essas mutações
não têm efeitos fenotípicos, porque a perda de uma célula é mascarada pela
110 GENÉTICA

grande maioria de células saudáveis em um órgão ou tecido. O que distingue


as mutações oncogênicas é que, por sua natureza, elas permitem que uma cé-
lula mutante se desenvolva em uma doença que ameaça a vida (NUSSBAUM
et al., 2008).

Para saber mais


O filme Decisões extremas é baseado em fatos reais e relata o drama de um casal e dois de
seus três filhos que sofrem de uma doença congênita. Através de várias pesquisas, descobrem
que existe uma enzima que pode amenizar e talvez até curar essas patologias, porém o valor
econômico da pesquisa está longe das condições sociais da família. Este filme é uma dica de
reflexão sobre alguns conceitos estudados em genética.

2.4 Mutações e a base genética do câncer


A maioria dos agentes mutagênicos, como radiações ionizantes, com luz
UV e produtos químicos, são também carcinogênicos, isto é, indutores de
câncer. A correlação entre mutagenicidade e carcinogenicidade é maior que
90%. Existem vários tipos de tumores malignos (câncer), dependendo do local
no organismo, do tipo de tecido e do grau de malignidade (capacidade de se
espalhar). Todos os tipos de câncer, no entanto, advêm de um descontrole das
divisões celulares, que sempre resulta de mutações ocorridas no DNA (OTTO;
NETTO; OTTO, 2013).
Quando as células se multiplicam de maneira anormal, pode surgir um tu-
mor benigno, que cresce até determinado tamanho e para (ou regride), como é
o caso de pólipos e verrugas. Outras vezes, isso evolui para um tumor maligno,
que apresenta crescimento ilimitado, capacidade de se infiltrar e destruir tecidos
anormais, e também de se espalhar pelo organismos (metástases). Os tumores
existem em todas as espécies animais e vegetais (OTTO; NETTO; OTTO, 2013).
Existem alguns tipos de câncer cuja causa é claramente ambiental, isto é, a
mutação somática que os origina é induzida por agentes mutagênicos, como
acontece com corantes de anilina, relacionados ao câncer de bexiga; cloreto de
polivinil (PVC), associados ao angiossarcoma de fígado; e o asbesto, relacionado
ao câncer de pulmão. São também bastante conhecidos os efeitos das radiações
ionizantes na gênese das leucemias e os efeitos carcinogênicos de vários vírus.
Os vírus oncogênicos são aqueles que possuem genes que induzem a divisão
celular (oncogenes virais) e que são transcritos na célula hospedeira. Após a
Citogenética e genética do câncer 111

infecção, dá-se a integração do DNA viral ao genoma da célula infectada. No


caso do vírus de RNA (os retrovírus), o RNA viral sintetiza DNA, com a ajuda
da transcriptase reversa, e esse DNA se integra e pode se expressar na célula
hospedeira (OTTO; NETTO; OTTO, 2013).
Outros tipos de câncer são familiares, isto é, existem casos (do mesmo
tipo ou de tipos diferentes) entre parentes biológicos. Nessas ocorrências, os
indivíduos biologicamente aparentados com um afetado têm maior predispo-
sição ao câncer que a população geral, principalmente nos casos de câncer
de mama e de intestino. Muitas vezes, essa predisposição provavelmente seja
regida por mecanismos multifatoriais. Existem, ainda, formas hereditárias de
câncer, transmitidas de maneira mendeliana como o retinoblastoma (OTTO;
NETTO; OTTO, 2013).
Em qualquer dessas situações, o câncer originou-se de mutações ocorridas
em uma célula e que afetam principalmente dois tipos de genes: os genes su-
pressores de tumor e os proto-oncogenes. Os genes supressores de tumor têm
como função normal evitar o crescimento descontrolado das células. Para que
haja formação de um tumor, em geral, é preciso que ambos os alelos de um
loco sejam alterados por mutação e sejam incapazes de exercer seus efeitos
sobre o controle do ciclo celular. Muitas vezes, um dos alelos com mutação
foi herdado da geração anterior, de modo que basta uma segunda mutação,
agora somática, para desencadear o processo de crescimento tumoral. Por isso,
alguns tipos, como certos cânceres de mama e o retinoblastoma, são herdados
com transmissão autossômica dominante e penetrância incompleta. O segundo
evento que leva à manifestação do câncer costuma ser um segundo evento
mutacional no mesmo loco, levando a completa perda de função do supressor
do tumor. Um gene supressor de tumores muito estudado é o que codifica a
proteína p53, responsável por vários tipos de câncer, em especial os de bexiga,
mamas e pulmão (OTTO; NETTO; OTTO, 2013).
Os proto-oncogenes são genes que normalmente estimulam a multiplicação
e a diferenciação celulares. Quando um deles sofre uma mutação, transforma-se
em um oncogene, que passa a estimular a multiplicação exagerada das células.
Os proto-oncogenes podem ser transformados em oncogenes por mutações que
resultam em alterações quantitativas ou qualitativas do funcionamento desses
genes. Uma mudança de posição de um proto-oncogene, por exemplo, em uma
translocação cromossômica, pode justapor esse gene à região promotora de
um gene que transcreve muito, aumentando a sua taxa de transcrição. Também
112 GENÉTICA

podem ocorrer alterações cromossômicas que resultam no aumento do número


de cópias de um proto-oncogene e, portanto, da quantidade do seu produto,
como é o caso de neuroblastoma e carcinomas de pulmão e da mama (OTTO;
NETTO; OTTO, 2013).
No mecanismo qualitativo, o produto do proto-oncogene pode estar alterado
em decorrência de mutações diversas. A porção de código de um proto-onco-
gene pode ficar justaposta à sequência de código de outro gene, codificando
uma proteína quimérica. Isso acontece porque a justaposição de dois genes
específicos, um de cada cromossomo, dá origem a um RNAm anormal, que,
por sua vez, produz proteínas anormais, com função qualitativamente diferente
da executada pelo gene normal (OTTO; NETTO; OTTO, 2013).

2.5 Condições para que ocorra o câncer


Por causa de mutações que ocorrem no DNA por agentes mutagênicos,
proteínas com perda de função acabam sendo expressas por esses genes. À
medida que não há um reparo por partes de mecanismos moleculares nessas
células, há o aumento da probabilidade do surgimento de neoplasias que pos-
sam dar origem ao câncer.
As células as quais sofrem esse processo estão associadas ao processo de
divisão celular e hereditariedade, ou seja, ao entrar em divisão celular, a célula é
capaz de repassar mutações adquiridas para suas descendentes. Há dois aspec-
tos importantes em relação ao tipo celular em que erros no DNA podem gerar
células anormais: células-tronco presente nos tecidos, que são responsáveis
pela manutenção da população de células de determinado tecido, e também
células com diferenciação acentuada, como células do tecido nervoso, que
por serem renovadas tão constantemente (ou não serem renovadas), acumulam
mutações que podem gerar células tumorais (WEINBERG, 2008).
Com relação à base genética que influencia na proliferação celular de
forma descontrolada, os oncogenes que participam de forma mais ativa do
estabelecimento e maturação da massa tumoral envolvem genes responsáveis
por fatores de crescimento e receptores de superfície de membrana. Como
consequência, essas células não sofrem ação de estímulos externos para entrar
em apoptose, multiplicando-se descontroladamente e liberando fatores neces-
sários para que a angiogênese (vascularização de tecidos) ocorra envolta do
tumor (WEINBERG, 2008).
Citogenética e genética do câncer 113

Esse processo de angiogênese envolve principalmente fatores de degradação


da lâmina basal e matriz extracelular por metaloproteinases, cujos efeitos secun-
dários são um reação inflamatória e, devido a fatores de crescimento liberados
pelas células tumorais, é estimulada a migração de pericítos, células epiteliais
e musculares, a fim de promover a formação de novos vasos sanguíneos.
Dentre os fatores que proporcionam essa condição para as células tumorais se
expandirem, estão as mutações de receptores de membranas presentes nessas
células, que podem gerar respostas intracelulares tanto no sentido de promover
a proliferação celular quanto de inibi-la (WEINBERG, 2008).
Após estabelecimento desses processos, há o estabelecimento clínico pro-
priamente dito do tumor, muitas vezes também associado à metástase dessas
células, as quais podem migrar para outros tecidos e colonizá-los.

Para saber mais


Muitos fatores externos contribuem para a manifestação do câncer. Sabemos que os genes que
predispõem o câncer podem se manifestar ou não, dependendo desses fatores. Faça a leitura
do artigo: “Câncer: uma doença genética” disponível em: <http://geneticanaescola.com.br/
wp-home/wp-content/uploads/2012/10/Genetica-na-Escola-31-Artigo-02.pdf>.

Atividades de aprendizagem
1. Discuta os possíveis motivos pelos quais o câncer colorretal é um
câncer adulto, enquanto o retinoblastoma afeta crianças.
2. Cite dois eventos que possam contribuir para o aparecimento do
câncer.
114 GENÉTICA

Fique ligado!
Nesta unidade, vimos que citogenética é a ciência que estuda a consti-
tuição genética das células através dos estudos com cromossomos. Os
cromossomos, por sua vez, são moléculas longas de DNA constituídas
por duas cadeias de nucleotídeos emparelhadas por meio de ligações de
hidrogênio entre bases nitrogenadas complementares. Esses cromossomos
apresentam uma região especial, o centrômero, e é em relação à posição
do centrômero que eles podem ser classificados em metacêntricos, sub-
metacêntricos, acrocêntricos e telocêntricos.
O cariótipo humano é formado por 23 pares de cromossomos, e exis-
tem várias técnicas laboratoriais para visualização destes cromossomos,
como padrão de bandas G, Q e R, entre outras.
O tamanho e a forma dos cromossomos são constantes entre os indi-
víduos da mesma espécie, porém, alterações numéricas, quando afetam
o número de cromossomos da célula, ou estruturais, quando afetam a
estrutura de um ou mais cromossomos, podem acontecer em função de
vários fatores mutagênicos, levando a modificações no cariótipo e ao
aparecimento de síndromes genéticas.
As divisões celulares são rigorosamente controladas, de modo a ga-
rantir o bom funcionamento do organismo. Ao longo do desenvolvimento
embrionário e das fases jovens da vida, as divisões celulares devem so-
brepujar a morte das células, para que os diversos órgãos se formem e
cresçam até atingir seu tamanho definitivo. Entretanto, podem acontecer
alterações genéticas que danificam esse sistema de controle da divisão
celular, levando a célula a crescer e se multiplicar de forma desenfreada,
dando origem a células cancerígenas.

Para concluir o estudo da unidade


Caro(a) estudante! As informações sobre genética crescem a cada dia. Pro-
cure ler artigos científicos para entender e se manter informado sobre este
campo do conhecimento. Você fez grandes avanços chegando ao final desta
etapa, não pare agora! Continue progredindo em seus estudos.
Citogenética e genética do câncer 115

Atividades de aprendizagem da unidade


1. Os telômeros compõem-se de sequências curtas de nucleotídeos
repetidas centenas de vezes em leveduras e vários milhares de vezes
em vertebrados. Nos cromossomos humanos a sequência é [5’ — TTA-
-GGG — 3’], formando um segmento de DNA de aproximadamente
10kb no extremo do cromossomo. A fita complementar, rica em C,
termina um pouco antes da fita rica em G, de modo que a última forma
uma fita terminal monocatenaria no extremo do cromossomo. Como
a síntese de DNA avança somente na direção 5’ → 3’ e depende da
presença de um iniciador, a síntese de DNA no extremo do cromos-
somo é interrompida. A duplicação cromossômica normal produz um
encurtamento progressivo de telômeros, até que, depois de um número
de divisões celulares os cromossomos se tornam instáveis e a célula
morre. Em cada ciclo de replicação cromossomal, perdem em torno
de 150 pares de bases na porção 5’ do DNA; isso reflete a inabilidade
das DNAs convencionais de replicar as extremidades dos telômeros
(BORGES-OSÓRIOS; ROBINSON, 2007 apud ANTONIALLI JUNIOR,
2014).Existem um conjunto de patologias, onde as células somáticas,
possuem telômeros curtos. Essas patologias são conhecidas como:
a) Progerias.
b) Sindrome do X frágil.
c) Distrofia de Duchenne.
d) Mutações aleatórias.
e) Síndrome de Down.
2. O câncer é uma das doenças mais comuns e graves vistas na medicina
clínica. As estatísticas mostram que o câncer, de alguma forma, ataca
mais de um terço da população, sendo responsável por mais de 20%
de todas as mortes e, em países desenvolvidos, é responsável por
mais de 10% do custo total em cuidados médicos. O câncer, se não
tratado, é invariavelmente fatal. O diagnóstico precoce e o tratamento
imediato são vitais, assim como a identificação de pessoas com risco
aumentado de câncer, antes do seu desenvolvimento, constitui-se
um importante objetivo da pesquisa do câncer. O câncer não é uma
116 GENÉTICA

doença única, mas um nome usado para descrever as mais virulen-


tas formas de neoplasias, um processo de doença caracterizado por
proliferação celular descontrolada, que leva a uma massa de tumor
(neoplasma). Entretanto, para que um neoplasma seja câncer, ele
deve também ser maligno, o que significa que o seu crescimento não
é mais controlado e o tumor é capaz de progredir invadindo tecidos
vizinhos ou espalhando-se (metastatizando) para locais mais distan-
tes, ou ambos (NUSSBAUM et al., 2008). Independentemente de o
câncer ocorrer esporadicamente em uma pessoa, como resultado de
uma mutação somática, ou repetidamente em muitas pessoas de uma
família, como uma característica hereditária, o câncer é uma doença
genética, em que os genes nos quais as mutações causam câncer são
classificados como:
a) Genes Tumorais.
b) Oncogenes e Genes Supressores tumorais.
c) Oncogenes e o gene XIST.
d) Supressores tumorais e Telomerases.
e) Mutação reguladora e mutação estrutural.
3. A mutação é definida como uma mudança na sequência de nucleo-
tídeos ou arranjo no DNA. As mutações podem ser classificadas em
três categorias: mutações que afetam o número de cromossomos da
célula (mutações genômicas), mutações que alteram a estrutura de
cromossomos específicos (mutações cromossômicas) e mutações que
alteram genes individualmente (mutações gênicas). As mutações genô-
micas são alterações no número de cromossomos intactos (chamada
de aneuploidia) que surgem de erros na segregação cromossômica du-
rante a meiose ou mitose. As mutações cromossômicas são mudanças
envolvendo apenas uma parte do cromossomo, tais como duplicações
ou triplicações parciais, deleções, inversões e translocações durante a
meiose. As mutações gênicas são mudanças da sequência do DNA dos
genomas nucleares ou mitocondriais, variando desde uma pequena
mudança, como em um único nucleotídeo, até alterações que podem
afetar muitos milhões de pares de base (NUSSBAUM et al., 2008). As
mutações gênicas podem surgir quando:
Citogenética e genética do câncer 117

a) Acontecem erros durante a replicação do DNA.


b) Ocorrem apenas deleções.
c) Ocorre a não disjunção meiótica.
d) Acontecem erros durante o processamento do RNA mensageiro.
e) Aminoácidos essenciais não são produzidos.
4. Embora existam numerosos distúrbios cromossômicos raros em que a
perda ou ganho de um cromossomo inteiro ou de um segmento cro-
mossômico tenham sido relatados, muitos deles vêm sendo descritos
apenas em fetos abortados espontaneamente ou envolvem segmentos
relativamente curtos de um cromossomo. Existem apenas três distúr-
bios cromossômicos bem definidos, sem mosaico, compatíveis com
a sobrevida pós-natal em que ocorre a trissomia de um autossomo
inteiro: trissomia do 21, trissomia do 18 e trissomia do 13. Cada uma
dessas trissomias autossômicas está associada a retardo do desenvol-
vimento, retardo mental e anomalias congênitas múltiplas. Apesar
disso, cada uma tem seu fenótipo claramente distinto. As anorma-
lidades do desenvolvimento das características de qualquer estado
trissômico são determinadas pela dose extra de genes específicos do
cromossomo adicional. De maneira geral, em qualquer desequilíbrio
cromossômico que envolve a adição ou perda de genes, espera-se ter
um efeito fenotípico específico determinado pela dosagem específica
de genes no segmento cromossômico extra ou ausente (NUSSBAUM
et al., 2008). Na síndrome de Down, os indivíduos apresentam um
fenótipo distinto, caracterizado por:
a) Hipotonia, observada já no recém-nascido, além de aspectos
faciais dismórficos.
b) Hipertonia, a cabeça tem um occipúcio proeminente e retrognatia.
c) Fronte inclinada; há microcefalia com espaço amplo entre as suturas.
d) Lábio leporino e fenda palatina estão frequentemente presentes.
e) Ausência de tecido nervoso, sendo um quadro incompatível com a vida.
5. Várias categorias diferentes de DNA repetitivo são reconhecidas.
Uma característica útil de distinção é se as sequências repetidas
(“repetições”) estão ou não agrupadas em um ou poucos locais ou
118 GENÉTICA

se elas estão intercaladas, por todo o genoma, com sequências de


cópia única ao longo do cromossomo. Sequências repetidas agrupadas
constituem 10% a 15% do genoma e consistem em séries de várias
repetições curtas organizadas aleatoriamente em um padrão “cabeça-
-para-cauda”. Os tipos diferentes de tais repetições em tandem são
coletivamente chamados de ___________________________, e são
assim denominados porque muitas famílias de repetições em tandem
originais podem ser separadas por métodos bioquímicos a partir do
tamanho do genoma como frações diferentes de DNA (NUSSBAUM et
al., 2008). A sentença que completa a informação acima é:
a) DNA micro.
b) DNA mitocondrial.
c) DNA satélite.
d) DNA nuclear.
e) Família Alu.
Citogenética e genética do câncer 119

Referências
ANTONIALLI, W. F. Mecanismos básicos e moleculares da senescência celular. Disponível
em: <http://igce.unesp.br/ib/biologicas/meca.html>. Acesso em: 19 jul. 2014.
CURSO OBJETIVO. Projeto Genoma. Disponível em: <http://www.curso-objetivo.br/
vestibular/roteiro_estudos/projeto_genoma.aspx>. Acesso em: 31 mar. 2014.
GENÉTICA NA ESCOLA. Câncer: uma doença genética. Disponível em: <http://
geneticanaescola.com.br/wp-home/wp-content/uploads/2012/10/Genetica-na-Escola-31-
Artigo-02.pdf>. Acesso em: 16 fev. 2014.
MOORHEAD, P.S., et al. Hungerford: Chromosome preparations of leucocytes cultures
from human peripheral blood. Exp. Cell. Res., v. 20, p. 613-616, 1960.
OTTO, P. A.; NETTO, R. C. M.; OTTO, P. G. Genética médica. São Paulo: Roca, 2013.
NUSSBAUM, Robert L. et al. Thompson & Thompson genetica médica. 7. ed. Rio de
Janeiro: Elsevier, 2008
WEINBERG, R. Does imagery work? Effects on performance and mental skills. Journal of
Imagery Research in Sport and Exercise, n. 3, p. 1-20, 2008.
Unidade 4
Biologia molecular,
biotecnologia e
evolução
Gabriel Marcos Domingues de Souza

Objetivos de aprendizagem: Nesta unidade, iremos compreender


os mecanismos celulares responsáveis pela replicação, transcrição
e tradução do material genético.
Aprenderemos como a descoberta e avanços nos conhecimentos des-
ses processos têm auxiliado o homem na manipulação da informação
genética através de técnicas de biologia molecular.
E, por fim, trabalharemos com as variações moleculares e suas impli-
cações na evolução dos genomas nos organismos.

Seção 1: Conceitos fundamentais


Nesta seção, serão apresentados os processos de
replicação do DNA, transcrição do RNA e tradução
de uma proteína, usando como modelo de aprendiza-
gem os organismos procariotos. Uma breve compara-
ção desses processos em eucariotos será apresentada.

Seção 2: Biotecnologia
Esta seção abordará conceitos e técnicas utilizadas
em biologia molecular para cortar, isolar, identificar
e manipular o material genético. Serão apresentadas
diferentes metodologias utilizadas para identificar
sequências de DNA de interesse, como as reações
de restrição, clonagem gênica, reação em cadeia da
polimerase e sequenciamento de DNA.
Seção 3: Genética evolutiva
A seção sobre genética evolutiva irá descrever os
processos que contribuem para a variabilidade mo-
lecular e sua implicação na evolução dos genomas
nos diferentes seres vivos.
B i o l o g i a m o l e c u l a r, b i o t e c n o l o g i a e e v o l u ç ã o 123

Introdução ao estudo
A biologia molecular é uma área da genética em constante ascensão. O
desenvolvimento de tecnologias que auxiliam no aprofundamento dos conhe-
cimentos sobre os principais processos que ocorrem em nível molecular, nos
seres vivos, colabora para o aumento dos estudos e importância dessa área.
Ao longo desta unidade, estudaremos os conceitos básicos necessários para
compreender essa grande área do conhecimento. Veremos as particularidades
no processo de replicação do DNA, os mecanismos envolvidos na transcrição,
na formação do RNA e como a informação é codificada de um gene e traduzida
em uma proteína.
Os conhecimentos sobre esses processos de transmissão e transformação
da informação genética possibilitou o desenvolvimento de técnicas que têm
revolucionado a ciência. Veremos como a utilização da informação contida no
genoma dos seres vivos são manipuladas e usadas no tratamento de doenças,
melhoramento de espécies vegetais e animais de importância econômica, na
produção de fármacos e na indústria alimentícia.
O genoma detém toda a informação para a formação de um organismo. É
através dessa informação que as características peculiares de cada ser vivo se
manifestam. Portanto, cada espécie existente difere uma da outra, inicialmente
pelo seu conteúdo genético. Essas diferenças se manifestam na capacidade
de adaptação aos ambientes, estruturas morfológicas, complexidade etc. Para
entendermos como ocorrem as variações moleculares, suas implicações na
evolução dos genomas e formação dos mais diferentes seres vivos deste planeta,
precisamos compreender as bases e origens moleculares dessas mudanças.
Contudo, ao final desta unidade teremos condições de compreender a
importância dos conhecimentos em biologia molecular no desenvolvimento
dos organismos, manutenção da vida, na evolução e na utilização desses co-
nhecimentos para o desenvolvimento biotecnológico.

Seção 1 Conceitos fundamentais


Ao longo desta seção, veremos como uma célula replica o seu material
genético e quais os mecanismos responsáveis pela duplicação do DNA. Estuda-
remos também como o DNA é transcrito em RNA, quais as enzimas envolvidas
124 GENÉTICA

nesse processo, os tipos de RNA e como essa molécula pode ser processada.
Ao final da seção, veremos como o RNA é traduzido formando os peptídeos.

1.1 Replicação do DNA


O processo de síntese do DNA é muito complexo, porém, é fundamental
para o funcionamento da célula. No entanto, para uma boa saúde de um indi-
víduo é necessário que tudo funcione bem, e assim chegamos ao nível celular,
pois toda célula deve estar em harmonia para seu bom funcionamento. A nível
molecular, uma gama de proteínas, enzimas e estruturas próprias da molécula
de DNA devem estar sincronizadas para que a duplicação do material genético
seja realizada sem grandes perturbações.
Sabemos que um organismo multicelular adulto é formado a partir de um
grande número de divisões celulares, além de carregar uma enorme quantidade
de informações genéticas. Com tantas divisões assim, erros na informação que
é copiada podem ocorrer, mas para formar nosso organismo, mesmo uma baixa
taxa de erro durante a cópia seria catastrófico. Vejamos o exemplo do zigoto
humano unicelular: ele pode conter 6,4 bilhões de pares de base de DNA. Se
um erro de cópia for feito uma vez por milhão de pares de base, teríamos 6.400
erros a cada divisão da célula, que seriam compostos em cada uma das divi-
sões dos milhões de divisões que a célula sofre ao longo do desenvolvimento.
Além da cópia precisa, o processo também tem de ocorrer em alta veloci-
dade. A uma velocidade de mais de 1.000 nucleotídeos por minuto, a repli-
cação de todo o cromossomo precisaria de quase três dias. No entanto, um
único cromossomo circular da bactéria E. coli contém 4,6 milhões de pares de
base e pode ser replicado a cada 20 minutos, ou seja, este organismo conse-
gue replicar seu DNA a uma velocidade de 1.000 nucleotídeos por segundo e
com alta precisão. Como este processo é realizado de forma rápida e precisa,
demonstraremos a seguir.
Uma célula que duplica seu material genético necessariamente é uma célula
que entrará em divisão. Toda célula tem uma história de vida, ou seja, um ciclo
celular. É dentro de um ciclo celular que a célula passa de uma divisão para a
seguinte, e é através dele que as instruções genéticas para todas as caracterís-
ticas são passadas da célula genitora para suas células-filhas. Como visto em
citologia, o ciclo celular consiste em duas fases importantes: a intérfase, em
que ocorrerá a replicação do material genético, e a fase M (fase mitótica),
na qual ocorrerá a divisão celular propriamente dita. Então, é dentro do ciclo
B i o l o g i a m o l e c u l a r, b i o t e c n o l o g i a e e v o l u ç ã o 125

celular que o material genético irá se duplicar para que as células-filhas rece-
bam a mesma quantidade de DNA que a célula-mãe.
Também é importante destacar que a replicação do DNA ocorre de maneira
semiconservativa. Como visto na Unidade 1, a molécula de DNA é constituída
de duas cadeias de nucleotídeos que se enrolam, originando a dupla-hélice,
sendo estas cadeias de nucleotídeos antiparalelas, ou seja, de polaridade in-
versa. Relembrando que cada cadeia conserva em uma ponta com um grupo
fosfato livre no carbono 5 do açúcar (5’) e em outra com o grupo OH livre no
carbono 3 (3’); isto significa que a ponta 5’ de um filamento é oposta à ponta 3’
do outro, sendo mantidas por ligações químicas fracas (pontes de hidrogênio),
entre as bases nitrogenadas de cadeias diferentes. Essa polaridade inversa de
filamentos complementares tem um papel importante na replicação, transcri-
ção e recombinação do DNA. A natureza complementar dos dois filamentos
de nucleotídeos em uma molécula de DNA sugere que, durante a replicação,
cada uma das fitas parentais serve de molde para a formação de uma nova fita
completa. Assim, cada uma das duas células-filhas tem seu DNA constituído
por um filamento antigo e um novo, e por este motivo a replicação é chamada
semiconservativa.
Cada vez que o DNA é sintetizado, ele só ocorrerá em um único sentido, 5’
a 3’, em ambos os filamentos. Isto significa que novos nucleotídeos são sem-
pre adicionados à ponta 3’ do filamento crescente. Primeiro, o DNA precisa
se desenrolar para que os filamentos sejam expostos a toda a maquinaria da
replicação. À medida que ele se desenrola, o filamento molde que é exposto no
sentido 3’ a 5’ permite que um novo filamento seja sintetizado continuamente,
no sentido 5’ a 3’. Este novo filamento é denominado de replicação contínua
ou leading. Já no filamento exposto no sentido 5’ a 3’, denominado replicação
descontínua ou lagging, a síntese de DNA começa e continua no sentido oposto
do desenrolar da fita dupla, porém, é um processo que é repetido sucessiva-
mente, pois é realizado em pequenos trechos descontínuos.
A replicação ocorre em quatro estágios, cada um deles com diferentes
enzimas e proteínas próprias: iniciação, deselicoidização, alongamento e tér-
mino. Para todos estes estágios, a replicação do DNA de bactérias foi mais bem
estudada e compreendida, assim, ela será utilizada como modelo de estudo
para entendermos este processo.
O processo de iniciação é marcado pelo reconhecimento de sítios de ini-
ciação na molécula do DNA por um complexo de proteínas. Em eucariontes,
126 GENÉTICA

haja vista sua complexidade e tamanho, estes sítios são encontrados em muitos
lugares do genoma. Em bactérias como a E. coli, devido à natureza circular de
seus cromossomos, existe apenas um sítio de iniciação, o OriC. Proteínas ini-
ciadoras se ligam ao OriC fazendo que um curto trecho de DNA se desenrole
utilizando a hidrólise de ATP, que fornece a energia necessária para separar
os filamentos.
A deselicoidização, ou o desenrolar da fita, faz que outras proteínas de
ligação unifilamentar se liguem ao filamento nucleotídico. A proteína DNA
helicase quebra as pontes de hidrogênio existentes entre as bases dos dois
filamentos de uma molécula de DNA. No entanto, não é ela que inicia, mas
sim os fatores de iniciação, que primeiro separam um curto trecho do DNA
para a DNA helicase continuar a quebrar as demais ligações. Outras proteínas,
chamadas de ligação unifilamentar, ligam-se ao DNA unifilamentar exposto e
impedem que este se re-helicoidize, estabilizando a molécula.
A proteína que de fato realiza o alongamento da fita de DNA, a DNA po-
limerase, necessita de um nucleotídeo com um grupo 3’- OH livre para atuar.
Outra enzima, chamada primase, fornece trechos curtos de nucleotídeos, ou
primers, para iniciar a replicação. A primase é uma RNA polimerase, o que
significa que ela não necessita de um grupo 3’- OH livre para adicionar novos
nucleotídeos, mas ela fornece à DNA polimerase este grupamento livre para
ela iniciar a replicação. Estes primers de RNA, posteriormente, são removidos
e substituídos por nucleotídeos de DNA.
O processo de alongamento é iniciado após o DNA ser desenrolado e um
primer ter sido inserido. Com estes pré-requisitos, as DNA polimerases podem
alongar o filamento de polinucleotídeos, catalisando a polimerização do DNA.
Em bactérias, há pelo menos cinco DNA polimerases diferentes, sendo duas
(DNA polimerase I e III) específicas para a síntese na replicação e as outras três
com funções especializadas no reparo do DNA.
Enquanto o molde ou filamento está disponível, a DNA polimerase adiciona
novos nucleotídeos à ponta 3’ de um filamento crescente. Os nucleotídeos de
RNA que serviram de primer são, então, removidos e substituídos por nucleo-
tídeos de DNA pela DNA polimerase I. Após o último nucleotídeo do primer
de RNA ter sido substituído, ainda resta um corte no arcabouço açúcar-fosfato
do filamento que é fechado pela DNA ligase, com uma ligação fosfodiéster
entre o grupo 5’- P do nucleotídeo inicial adicionado à DNA polimerase III e
o grupo 3’- OH do nucleotídeo final adicionado pela DNA polimerase I. Em
B i o l o g i a m o l e c u l a r, b i o t e c n o l o g i a e e v o l u ç ã o 127

E. coli uma proteína chamada Tus liga-se às sequências específicas no DNA,


que determina o término e bloqueia uma replicação posterior. Tus bloqueia
o movimento da helicase, parando e evitando mais replicação do DNA. Este
processo caracteriza o estágio de término da replicação.

Atividades de aprendizagem
Qual a importância da replicação?

Como já foi dito, a replicação em eucariotos não é tão bem compreendida


como a bactérias, mas elas assemelham-se em muitos aspectos. As principais
diferenças estão:
Nas múltiplas origens de replicação em seus cromossomos.
No maior número de DNA polimerases e suas funções.
Na montagem de nucleossomos imediatamente após a replicação do DNA.
Nos cromossomos, que são lineares e, portanto têm pontas, chamadas
de telômeros.

Para saber mais


Para você entender como ocorre a replicação nas pontas de cromossomos eucarióticos, acesse o link:
<http://coral.ufsm.br/blg220/hide/telomeros.pdf>.
Cientistas dizem tempo de através dos telômeros
<https://www.youtube.com/watch?v=IIMEvqJpjXQ>.

A maioria dos erros que surgem no momento de escolha dos nucleotídeos


que foram adicionados à nova fita é corrigida numa revisão. Quando é adicio-
nado um nucleotídeo errado, ele não é pareado para aceitar o próximo, pois
a reação de polimerização para e a atividade de exonuclease 3’ a 5’ da DNA
polimerase remove o nucleotídeo incorreto e insere o correto. Outro processo
chamado de reparo de mau pareamento corrige erros após o término da re-
plicação. Um erro após a replicação produz uma deformidade na estrutura
secundária do DNA, que é reconhecida por enzimas que a corrigem. Essas
128 GENÉTICA

enzimas conseguem distinguir o filamento de DNA antigo do novo, pois em E.


coli algumas sequências do filamento de DNA antigo são metiladas.

1.2 Transcrição
O objetivo central da transcrição é a síntese seletiva de uma molécula de
RNA. Também caracterizada como um processo complexo, a transcrição exige
uma gama de proteínas, precursores de nucleotídeos de RNA e um molde de
DNA para, ao final desta fase, obter a primeira etapa na via de informação, que
é o dogma central a biologia: o DNA é transcrito em RNA, e este, traduzido
em uma proteína.

Questões para reflexão


Quais as diferenças entre as moléculas de DNA e RNA?

Como visto na Unidade 1, a molécula de RNA é um tanto diferente da


molécula de DNA, apesar de ambas serem classificadas como polímeros de
nucleotídeos unidos por ligações fosfodiéster. A diferença está no açúcar, na
existência de um grupo hidroxila livre no átomo de carbono 2’ do açúcar e
na substituição da base timina (T) pela base uracila (U). Estruturalmente, o
RNA difere-se do DNA pois, geralmente, é uma molécula unifilamentar. No
entanto, podem ser formadas estruturas secundárias de RNA caso curtas regiões
complementares dentro de um filamento venha a se parear. A formação destas
estruturas secundárias é importante para determinar as diferentes funções que
uma molécula de RNA possa vir a ter.
Por apresentarem diferentes funções, as moléculas de RNA podem ser
classificadas em: RNA ribossômico (rRNA), que com outras subunidades
proteicas constitui o ribossomo.
RNA mensageiro (mRNA), que leva as instruções codificantes para as
cadeias polipeptídicas do DNA para o ribossomo.
RNA transportador (tRNA), que se liga a um aminoácido particular e o
ajuda na sua incorporação a uma cadeia polipeptídica.
E outros como os pequenos RNAs nucleolares, os pequenos RNAs cito-
plasmáticos, os microRNAs e os pequenos RNAs de interferência, que
B i o l o g i a m o l e c u l a r, b i o t e c n o l o g i a e e v o l u ç ã o 129

têm outras funções celulares que não serão discutidas nesta unidade ou
funções ainda pouco estudadas.
O que é, então, a transcrição? Ela pode ser resumida na síntese de RNA a
partir de um molde de DNA. Comparando este processo ao que acabamos de
ver, a replicação, a diferença está no tamanho deste molde. No caso da repli-
cação, toda a molécula serve de molde, mas na transcrição apenas um trecho
(ou poucos trechos) da molécula de DNA servirá de molde, ou seja, apenas
um gene (ou alguns genes) será transcrito em RNA.
É importante salientar que apesar de o molde para a síntese de RNA ser o
mesmo para a síntese de DNA, o que difere o processo de transcrição da repli-
cação neste sentido, é que apenas um dos filamentos da dupla-hélice do DNA,
o filamento molde, é que de fato será usado na transcrição. O outro filamento,
denominado filamento não molde, geralmente não é transcrito. Durante o
processo de transcrição a molécula de RNA sintetizada é complementar e de
polaridade inversa ao filamento molde de DNA; assim, o RNA transcrito tem
as mesmas polaridade e sequência de bases que as do filamento não molde,
com uma diferença: ao invés da base T ele tem a base U.
O trecho na molécula de DNA que irá codificar, ou seja, sintetizar uma
molécula de RNA, é chamado de unidade de transcrição. Cada unidade de
transcrição é composta por um promotor, uma sequência codificante de RNA e
um finalizador. É no promotor que há o reconhecimento do trecho a ser trans-
crito por um complexo de proteínas, conhecido como aparato de transcrição.
Além disso, ele indica qual dos dois filamentos da molécula do DNA servirá
de molde e também determina o ponto de início da transcrição. A sequência
codificante é uma sequência de nucleotídeos de DNA que será copiada em uma
molécula de RNA. Já a região conhecida como finalizador compreende uma
sequência de nucleotídeos que indica onde a transcrição deve parar.
Como na replicação, a transcrição acontece no sentido 5’ a 3’, mas ao con-
trário da síntese de DNA, a síntese de RNA não precisa de primer. O aparato
de transcrição tem como enzima principal a RNA polimerase, que juntamente
com outras proteínas, em etapas diferentes, catalisa a síntese na nova molécula
de RNA. Em bactérias, há um tipo de RNA polimerase que é responsável pela
síntese das diferentes classes de RNA já apresentadas. Em eucariotos, a RNA
polimerase I transcreve rRNA, a RNA polimerase II transcreve pré-mRNA e ou-
tros pequenos RNAs e a RNA polimerase III transcreve tRNA e pequenos rRNA.
130 GENÉTICA

A RNA polimerase de bactérias é formada por cinco subunidades que


constituem o cerne da enzima: duas subunidades alfa (α), uma subunidade
beta (β), uma subunidade beta primo (β’) e uma subunidade ômega (ω), esta
última auxiliando na estabilidade da enzima. Este cerne é responsável pelo
alongamento da molécula de RNA pela adição de nucleotídeos de RNA. Em
estágios determinados, outras subunidades podem se ligar a este complexo,
como o fator sigma (σ), que controla a ligação da RNA polimerase ao promotor,
marcando o lugar propício para o início da transcrição.
A transcrição ocorre em três estágios: iniciação, alongamento e término.
A seguir veremos o que acontece em cada um.
Na iniciação, o aparato de transcrição deve reconhecer o promotor e se ligar
a ele; é no promotor que está a informação de onde começa a transcrição, de
qual filamento do DNA será lido e de qual sentido a RNA polimerase deverá
se mover. Dentro do promotor, há sequências comuns, ou seja, que se repetem
em muitos promotores, chamadas de sequências consenso. A mais comum
encontrada, sequência consenso – 10, que está a 10 pares de bases antes do
ponto de início. Outra também importante, a sequência consenso – 35 fica
aproximadamente a 35 nucleotídeos antes do ponto de início. Ambas são im-
portantes, pois são sítios de ligação da holoenzima cerne da RNA polimerase +
fator sigma. A ligação desta holoenzima faz que a dupla-hélice do DNA se
deselicoidize e marca o início da síntese de RNA.

Atividades de aprendizagem
Qual estrutura e/ou molécula está relacionada com o início da transcrição,
quando se liga a sequência consenso – 10 encontrada nos promotores
bacterianos?
a) A holoenzima (cerne da enzima + sigma).
b) Fator sigma.
c) Cerne da enzima.
d) mRNA.
B i o l o g i a m o l e c u l a r, b i o t e c n o l o g i a e e v o l u ç ã o 131

Após o reconhecimento e abertura da dupla-fita, a RNA polimerase chega


ao sítio de início, onde coloca pares de base complementar ao sítio de início
e a partir dele, sintetiza a fita de RNA.
Após a iniciação, a RNA polimerase muda de forma, não sendo mais ca-
paz de ficar ligada às sequências consenso do promotor. Isto permite que ela
se desloque e comece a fase de alongamento, movendo-se na fita molde e
unindo os nucleotídeos à nova molécula de RNA. À medida que ela se des-
loca, a dupla-hélice do DNA se deselicoidiza e, após a adição do nucleotídeo
complementar à fita, ela se re-elicoidiza. Este trecho de DNA deselicoidizado
corresponde a 18 nucleotídeos.
A adição de novos nucleotídeos deve ser bem precisa, no entanto, erros
podem aparecer durante este processo. Recentemente, descobriu-se que a RNA
polimerase pode revisar caso há adição de uma base incorreta na nova fita.
Se o último nucleotídeo adicionado não corresponde ao DNA molde, a RNA
polimerase volta e retira os dois últimos nucleotídeos adicionados e retoma
sua função de síntese.
O que caracteriza o término da transcrição é a transcrição da sequência do
finalizador. Esta sequência está antes do sítio de término, onde a transcrição
realmente para. Alguns eventos que acontecem ao mesmo tempo determinam
a finalização:
Transcrição do finalizador.
Parada da síntese de RNA.
Liberação do RNA recém-sintetizado da RNA polimerase.
Dissociação da RNA polimerase do molde de DNA.
Em bactérias, há dois tipos de finalizadores: os finalizadores dependentes
de Rô e os finalizadores independentes de Rô.
Os finalizadores dependentes de Rô precisam de uma proteína auxiliar,
chamada de fator Rô, para parar a transcrição. No momento em que a RNA
polimerase encontra um finalizador, ela para e permite que o fator Rô se ligue.
Esta proteína tem atividade de helicase, ou seja, ela consegue deselicoidizar
o híbrido RNA-DNA levando a transcrição ao fim. Já os finalizadores inde-
pendentes de Rô apresentam duas características comuns: eles têm repetições
invertidas, ou seja, sequências no filamento que são invertidas e complemen-
tares, e seguindo a segunda repetição invertida, uma sequência de aproxima-
damente seis nucleotídeos adenina. No primeiro caso, as repetições invertidas,
132 GENÉTICA

quando são transcritas, complementam-se e formam uma estrutura secundária


em grampo; no segundo caso, a transcrição da região com adenina gera um
filamento de nucleotídeos uracil após o grampo no RNA transcrito.
O grampo faz que a RNA polimerase trabalhe mais devagar ou pare; já o
pareamento das bases uracil-adenina é instável, fazendo que haja a dissociação
do RNA do seu molde de DNA. Se isso ocorre, pela junção dos dois fatores, a
transcrição não pode mais continuar.
Usamos novamente como modelo as bactérias para o processo de transcri-
ção. Para os eucariontes, os estágios são os mesmos, mas há algumas diferenças,
tais como:
Três RNA polimerases diferentes, cada uma reconhecendo tipos diferentes
de promotores e transcrevendo diferentes RNAs.
Reconhecimento do promotor, pois há diferentes tipos de promotores, e
por isso sítios diferentes para o reconhecimento do aparato transcricional.
Iniciação, pois há várias proteínas chamadas de fatores de transcrição
que são recrutadas para os diferentes tipos de RNA polimerases.
No entanto, uma diferença importante está em como as proteínas necessá-
rias à transcrição conseguem chegar ao filamento molde de DNA, relembrando
que em eucariotos o DNA está associado às proteínas histonas, formando com-
plexos altamente condensados. Neste sentido, a estrutura da cromatina (DNA
associado a proteínas) deverá sofrer modificações de modo que a maquinaria
da transcrição possa acessar a molécula de DNA. Nesta etapa, que antecede
a transcrição, são várias as proteínas atuantes.

Para saber mais


Para entender mais da transcrição em eucariotos, acesse o link:
<https://www.youtube.com/watch?v=jwKtoJF6fGg>.

Falamos de replicação, transcrição e de como elas acontecem. Mas onde


precisamente, na célula elas ocorrem? Nas aulas de citologia, vimos que existem
células procarióticas e células eucarióticas e que existe entre elas uma diferença
fundamental: procariontes não têm seu material genético armazenado dentro
de um envoltório ou membrana, que em eucariontes chamamos de carioteca.
B i o l o g i a m o l e c u l a r, b i o t e c n o l o g i a e e v o l u ç ã o 133

A presença do núcleo marca outra diferença, tanto na replicação quanto na


transcrição, entre eucariontes e procariontes.
Nosso modelo, E. coli, trata-se de uma bactéria, então, seu material genético
está disperso no citoplasma. Os processos de replicação, transcrição e, como
veremos a seguir, tradução acontecem no mesmo local: o citoplasma. Também
os três processos celulares podem ocorrer ao mesmo tempo, pois o ambiente
proporciona isto. Já no caso de eucariontes, a replicação e a transcrição ocorrem
no núcleo, onde se encontra o DNA. A tradução, como será mostrada, ocorre,
em células eucariontes, no citoplasma.
O RNA mensageiro, como o nome já diz, levará a informação da sequência
que será traduzida em uma proteína nos ribossomos. Em eucariontes, o RNA
mensageiro transcrito é chamado de pré-mRNA, pois, após a transcrição, ele
sofre algumas mudanças para que passe para a próxima etapa, no citoplasma —
tradução.
Para entendermos o que ocorre, antes é necessário conhecer a estrutura de
um gene. Em genes eucarióticos existem regiões codificantes, chamadas éxons,
e regiões não codificantes, chamadas íntrons.
Ser codificante ou não está relacionado ao fato de essa região, na tradução,
ser uma sequência na proteína. Em genes procarióticos, os íntrons são muito
raros, apenas algumas eubactérias e bacteriófagos descobertos recentemente
apresentaram esta região. No genoma dos eucariotos, a quantidade e o tama-
nho dos íntrons são relacionados ao aumento da complexidade do organismo.
Embora haja algumas exceções, os íntrons não codificam proteínas. Então, de
alguma forma, na tradução, o RNA mensageiro não apresentará estas regiões,
pois logo após a transcrição ele passará por um processamento.

Para saber mais


Acesse o link abaixo para visualizar a estrutura geral de um gene eucarioto e as funções de
cada componente dessa estrutura.
<http://www.ufpe.br/biolmol/Genetica-Medicina/genes-estrutura_e_organizacao.htm>.

A retirada dos íntrons é uma das etapas do processamento do RNA. Antes


de passarmos para o processo de tradução, vamos ver de modo simplificado
que etapas consistem este processamento.
134 GENÉTICA

Adição do Cap 5’: logo após o início da transcrição, um nucleotídeo


guanina é adicionado na ponta 5’ do mRNA, depois de o primeiro
nucleotídeo do mRNA perder um grupo fosfato, além de também ser
adicionado um ou mais grupos metila ao 2’- OH na ponta 5’. Primeiro,
isto é importante porque aumenta a instabilidade do mRNA e a remoção
dos íntrons. Depois, no início da tradução, como veremos, o Cap 5’ será
muito importante.
Adição da Cauda Poli (A): após a transcrição, na outra ponta do mRNA
(3’), são adicionados de 50 a 250 nucleotídeos de adenina, em um pro-
cesso chamado de poliadenilação. Antes, porém, há uma clivagem em
sítios específicos da molécula de mRNA, então, os nucleotídeos adenina
são adicionados. Uma das funções da cauda poli A é a estabilidade do
mRNA, além de facilitar a ligação do ribossomo a molécula durante a
tradução.
Recomposição do RNA: também chamada de Splicing, esta é a etapa de
remoção dos íntrons. Aqui, é importante lembrar que o processamento
está ocorrendo dentro do núcleo, e após todas as etapas citadas ele vai
para o citoplasma para ser traduzido. O íntron é composto por três regi-
ões: sítio de corte 5’, sítio de corte 3’ e ponto de ramificação. O grande
complexo proteico chamado de spliceossomo é que realiza os cortes nos
sítios de corte e religa os éxons adjacentes.

Para saber mais


Visualize, no link a seguir, como o processamento da molécula de mRNA acontece:
<https://www.youtube.com/watch?v=eWPOzNVyocs>.

1.3 Tradução
O processo de tradução é a leitura, pelos ribossomos, da molécula de mRNA
que foi transcrita (e processada, em eucariotos), e como resultado teremos a
formação de uma proteína. Como este processo ocorre será demonstrado a
seguir, mas antes vamos relembrar: o que é uma proteína?
Proteínas são polímeros de aminoácidos unidos por ligações peptídicas.
Existem 20 aminoácidos diferentes que compõem as mais diversas proteínas.
Também as proteínas têm níveis de organização: a estrutura primária corres-
B i o l o g i a m o l e c u l a r, b i o t e c n o l o g i a e e v o l u ç ã o 135

ponde à sequência dos aminoácidos que a compõe; a estrutura secundária


corresponde ao dobramento na cadeia por interações de aminoácidos vizi-
nhos; e a estrutura terciária corresponde à interação de proteínas de estrutura
secundária. Há, ainda, uma estrutura quaternária, em que algumas proteínas
em duas ou mais cadeias polipeptídicas se associam.
Sabendo que as proteínas são formadas por aminoácidos e que estes cor-
respondem a sequências no mRNA, surgiu a dúvida: quantos nucleotídeos
são necessários para cada aminoácido? O grupo de bases que codificam um
aminoácido é chamado de códon, a unidade básica do código genético.
Estudos feitos propuseram que cada códon deveria conter no mínimo três
nucleotídeos, pois a partir das quatro bases existentes (A, G, C e U) existiram
64 códons possíveis (4x4x4), quantidade mais do que suficiente para espe-
cificar os 20 aminoácidos conhecidos. Francis Crick et al., em um estudo
datado de 1961, confirmaram, então, que realmente o código genético é
composto de códons de trinca.
A partir daí, viu-se a necessidade de relacionar quais três nucleotídeos
determinariam cada aminoácido. Outros estudos responderam a esta questão
e, hoje, temos como saber que, por exemplo, GCA codifica o aminoácido ala-
nina. Descobriu-se também que dos 64 códons disponíveis, três são códons de
término, o que especifica o fim da tradução. Os códons com sentido, ou seja,
que codificam aminoácidos, corresponde então a 61 códons. No entanto, temos
somente 20 aminoácidos diferentes, assim, o código tem mais informações do
que é necessário, sendo então chamado de código genético redundante. A
redundância significa que alguns aminoácidos são codificados por mais de um
códon; mas um códon só codifica um determinado aminoácido.
A estrutura principal envolvida no processo de tradução é o ribossomo. Cada
ribossomo é formado por muitas proteínas diferentes e moléculas de RNA. O ribos-
somo funcional é formado por duas subunidades proteicas: subunidade maior
e subunidade menor, além de RNA e proteínas.
Outra molécula importante para o processo de tradução é o RNA transpor-
tador (tRNA), pois é ela quem carrega o aminoácido para o ribossomo. Antes
mesmo de isso ocorrer, há a ligação do aminoácido específico para cada tRNA,
chamada de carga do tRNA, com gasto de energia fornecida por uma molécula
de ATP. Esta especificidade é fornecida por uma região no tRNA conhecida como
anticódon, que corresponde aos três nucleotídeos complementares à molécula
de mRNA. A interação do códon com seu anticódon ocorre dentro do ribossomo.
136 GENÉTICA

Para saber mais


Veja como a informação transcrita em RNA é traduzida em aminoácidos para formar os peptí-
deos através do código genético, a entenda os códons, os estrutura dos tRNAs e anticódons
acessando o link a seguir:
<http://www2.iq.usp.br/docente/nadja/QBQ3401-aula5.pdf>.

A tradução também ocorre em três etapas: iniciação, alongamento e término.


Na iniciação, em primeiro lugar, o mRNA liga-se à subunidade menor do
ribossomo; depois, o tRNA liga-se ao mRNA pareando seu anticódon ao códon;
com isso, a subunidade maior do ribossomo une-se ao complexo de iniciação.
Sítios no mRNA permitem a ligação da subunidade menor do ribossomo, mas
ele fica parado nestes sítios. Uma sequência consenso no mRNA é comple-
mentar a uma sequência complementar na subunidade menor, o que permite
esta ligação. É também esta ligação que posiciona o ribossomo diretamente
com o códon de iniciação AUG. Vários fatores de iniciação, proteínas que
auxiliam a ligação, estão envolvidos quando o tRNA se liga ao mRNA. Após
isso, a subunidade maior do ribossomo é ligada ao complexo.
Durante o alongamento, os aminoácidos são unidos por ligações peptídicas
para formar uma proteína. Cada ribossomo apresenta três sítios onde um tRNA
pode se ligar: sítio A, sítio P e sítio E. O primeiro tRNA ocupa o sítio P, pois o
códon de início está aí posicionado, mas os outros que vêm depois dele ocu-
pam o sítio A. A primeira etapa do alongamento consiste na ligação do tRNA
iniciador ao sítio A. Depois que um novo tRNA ocupa o sítio A, acontece a
formação de uma ligação peptídica entre os dois aminoácidos que cada tRNA
carrega. Uma terceira etapa é o movimento do ribossomo pela molécula de
mRNA, posicionando-o no códon seguinte; no entanto, os primeiro dois ami-
noácidos ainda estão ligados ao ribossomo, só mudam de posição dentro dos
sítios. Aquele tRNA que ocupava o sítio P agora está no sítio E e aquele que
estava no sítio A agora ocupa o sítio P. Desta forma, o sítio A agora fica livre
para receber um novo aminoácido, especificado pelo códon o qual foi posi-
cionado. Assim, o ciclo se repete até o ribossomo percorrer toda molécula do
mRNA ou até ser encontrado o códon de parada ou término.
E é o códon de término que determina o fim da tradução. Isto ocorre por-
que não existem tRNA com anticódons complementares ao códon de término
B i o l o g i a m o l e c u l a r, b i o t e c n o l o g i a e e v o l u ç ã o 137

e o sítio A, para este códon, fica vazio. Quando isto ocorre, várias proteínas
chamadas de fatores de liberação se ligam ao ribossomo e clivam o tRNA do
sítio P e dissociação do ribossomo, liberando o mRNA.
Usamos aqui, também, para explicar a tradução, o modelo E. coli, ou como
isto ocorre em bactérias. Para eucariotos, o processo é semelhante, porém com
algumas diferenças:
Na iniciação, a subunidade menor não identifica uma sequência consenso
na molécula de mRNA, mas sim ao Cap 5’ do mRNA que foi processado.
Tanto na iniciação, quanto no alongamento e no término, são outros os
fatores de iniciação envolvidos.
A principal delas é que a tradução em eucariotos ocorre, relembrando,
no citoplasma; em bactérias, como não há núcleo tal qual em eucario-
tos, a tradução pode ocorrer ao mesmo tempo em que a transcrição. Em
eucarioto isto já não é possível.
Vários ribossomos podem associar-se à molécula de mRNA, tanto em
procariotos como em eucariotos. Podendo ser vista a partir de microscopia
eletrônica, esta estrutura é chamada de polirribossomo.
Após a tradução, as proteínas recém-produzidas podem, tanto em euca-
riotos como em procariotos, sofrer algumas modificações, chamadas de pós-
-traducionais. Algumas são inicialmente sintetizadas como precursoras, que são
maiores e precisam ser clivadas para se tornarem funcionais. Outras necessitam
de outras proteínas auxiliares para se dobrar corretamente, acontecendo, muitas
vezes, junto à tradução. Em eucariotos, certas proteínas sofrem remoção de 15
a 30 aminoácidos em uma de suas pontas, o que irá auxiliar a proteína a se
direcionar para um local específico dentro da célula. 
138 GENÉTICA

Seção 2 Biotecnologia
Após compreendermos os processos básicos de transmissão da informação
gênica através da replicação, transcrição e tradução, iremos discutir, nesta seção,
a utilização dos conhecimentos obtidos em biologia molecular. As constantes
descobertas e avanços nas tecnologias têm possibilitado aos cientistas isolar,
manipular e utilizar a informação genética na indústria alimentícia, farmacêu-
tica e no estudo sobre doenças. Veremos as principais técnicas usadas para
identificar sequências de interesse e usá-las para o desenvolvimento da ciência
e da genética.

2.1 Técnicas em biologia molecular


Com o desenvolvimento do conhecimento sobre os processos de replicação,
transcrição e tradução, os estudos avançaram com relação à manipulação da
informação genética.
Os cientistas utilizaram das características observadas nos processos de
transmissão da informação gênica para encontrar formas, elaborar técnicas
onde fosse possível manipular os genes e seus produtos.
A tecnologia do DNA recombinante consiste em um conjunto de técni-
cas, responsáveis por manusear o material genético. Com o objetivo de isolar,
recortar e colar uma região específica do DNA de um organismo para outro,
a também chamada de Engenharia Genética, auxilia na análise, manejo e re-
combinação de qualquer sequência de DNA.
Os estudos nessa área possibilitaram o conhecimento das sequências dos
nucleotídeos, composição e funcionamento dos genes e o desenvolvimento
biotecnológico, criando novos fármacos, otimizando a produção de hormônios,
como a insulina humana, usada no tratamento de diabetes, no melhoramento
genético de animais e plantas, aumentando a produtividade agropecuária. Em
outras áreas, como na indústria, os avanços nas pesquisas, principalmente na
indústria de alimentos, têm aumentado a capacidade de utilizar seres vivos,
como os microrganismos em seus produtos, melhorando a qualidade e funcio-
nalidade na produção. Em medicina, o conhecimento e o emprego das técni-
cas de biologia molecular têm aperfeiçoado o conhecimento, entendimento,
diagnóstico e prognóstico de doenças como a AIDS e o câncer.
B i o l o g i a m o l e c u l a r, b i o t e c n o l o g i a e e v o l u ç ã o 139

Para compreender como toda essa mudança foi possível, nas mais diferentes
áreas do conhecimento, estudaremos as bases das principais técnicas usadas
na tecnologia do DNA recombinante: técnicas para cortar a molécula de DNA
em locais específicos, localizar sequências de interesse no material genético,
amplificar essas sequências, inserir um fragmento de DNA em um vetor de clo-
nagem, transferir o vetor com o fragmento inserido para uma célula receptora.

2.2 Enzimas de restrição


No final da década de 1960, pesquisadores descobriram em bactérias al-
gumas enzimas, endonucleases de restrição, responsáveis por um mecanismo
de defesa da bactéria contra vírus. Essas enzimas degradavam o DNA dos vírus
através de cortes feitos nas ligações químicas, em posições específicas, dos
nucleotídeos, impedindo sua proliferação. Esses sítios específicos, presentes
no vírus, também existem no DNA de todos os outros organismos, inclusive na
própria bactéria que produz a enzima. Com essa descoberta, essencial para a
tecnologia do DNA recombinante, as enzimas de restrição foram amplamente
estudadas e, com isso, aumentou-se o conhecimento sobre suas propriedades.
Existem três tipos de enzima de restrição. As enzimas de restrição do Tipo
I reconhecem sequências específicas e fazem cortes em sítios aleatórios na
molécula de DNA, com mil bases ou mais de distância. As de Tipo II também
reconhecem sequências específicas, porém, fazem cortes dentro dessa sequ-
ência de reconhecimento. Já as de Tipo III reconhecem sequências específicas e
cortam o DNA a 25 pares de base de distância. Para os trabalhos usando a téc-
nicas de DNA recombinante, são usadas apenas enzimas de restrição do tipo II.
Atualmente, são conhecidas mais de mil enzimas de restrição que reconhe-
cem e cortam o material genético em sítios específicos diferentes. As sequências
reconhecidas pelas enzimas têm de 4 a 8 pares de bases e grande parte delas
são palindrômicas, são chamadas assim porque lembram palíndromos, por
exemplo, como as palavras “arara”, “ana” e “omo” que pode ser lida tanto em
um sentido como no outro, se tratando de sequências nucleotídicas, GGCC//
CCGG, por exemplo, é uma sequência palindrômica. Todas as enzimas de tipo
II reconhecem sequências palindrômicas.
As enzimas de restrição fazem cortes diferentes na molécula de DNA. Os
cortes desencontrados são aqueles caracterizados por deixarem pontas coe-
sivas, pois são quebradas em pontos diferentes nas duas fitas da molécula de
DNA. Esse tipo de corte permite que fragmentos, cortados pela mesma enzima,
140 GENÉTICA

possam se parear através das suas pontas complementares. Outras enzimas


fazem cortes abruptos, onde as duas fitas de DNA são quebradas no mesmo
ponto não formando extremidades coesivas.
Como dito anteriormente, todas as enzimas de restrição utilizadas na tec-
nologia do DNA recombinante, para clonagem molecular, são do tipo II. As
enzimas são identificadas por uma nomenclatura específica: a primeira letra
maiúscula representa o gênero da bactéria, de onde foi isolada a enzima de
restrição, outras duas letras minúsculas que representam a espécie, uma quarta
letra maiúscula adicional que representa a cepa da bactéria e um número em
algarismo romano para representar o número da enzima, em ordem de desco-
berta, na espécie descrita.
Exemplo: EcoRI
E= gênero à Escherichia;
co= espécie à E. coli;
R= cepa, estirpe, linhagem;
I= número da enzima descoberta, primeira enzima de restrição identificada
na espécie.

Para saber mais


Conheça mais detalhes sobre o funcionamento, os tipos e funções das enzimas de restrição:
<http://www.ibmc.up.pt/cfp-biologiasintetica/documentos/ENZIMAS_DE_RESTRICAO.pdf>;
<http://www.biomedicinabrasil.com/2012/02/enzimas-de-restricao.html>.

Na tecnologia do DNA recombinante, chamamos de reação de restrição a


técnica utilizada para cortar o material genético em fragmentos. A reação de
restrição, sucintamente, ocorre na união de uma solução contendo a amostra de
DNA, concentrada em conjunto com a enzima de restrição do tipo II escolhida
e uma solução tampão. Essa reação ocorre a uma temperatura de 37 °C por
algumas horas em que, no final, temos os fragmentos de DNA clivados pelas
enzimas em seus sítios específicos.
B i o l o g i a m o l e c u l a r, b i o t e c n o l o g i a e e v o l u ç ã o 141

Atividades de aprendizagem
Qual tipo de enzima de restrição é usado na tecnologia do DNA recom-
binante?

Após a digestão pelas enzimas de restrição, ou seja, os cortes efetuados


através da reação de restrição na amostra de DNA, os fragmentos resultantes
precisam ser visualizados, possibilitando a seleção de possíveis genes de
interesse.
Para visualizar e localizar esses fragmentos, iremos utilizar a técnica de se-
paração por eletroforese em gel de agarose. Esse processo de separação ocorre
com base nos tamanhos e carga elétrica dos fragmentos de DNA.

2.3 Eletroforese
A eletroforese consiste em uma técnica que se utiliza das características bio-
químicas das moléculas. Existem vários tipos de eletroforese, porém, trataremos
aqui apenas da que separa moléculas de DNA. Como citado anteriormente, a
eletroforese em gel de agarose é a responsável pela separação dos fragmentos
obtidos da reação de restrição. O gel é uma substância porosa composta por
poços ou canaletas, feitos em sua extremidade, para receber soluções com
fragmentos de DNA. Na eletroforese, ele é colocado em uma solução tampão
dentro de uma cuba de eletroforese. A cuba é composta por dois polos, onde
cada um recebe a ligação de uma fonte de energia para gerar corrente elétrica.
Como o DNA tem uma carga negativa, oriunda do grupamento fosfato presente
em cada nucleotídeo, os fragmentos de DNA migram do polo negativo para o
positivo do gel. Nessa migração, o gel atua como um crivo para os fragmen-
tos, que irão se deslocar, ao longo da malha formada pelo gel, de acordo com
seus tamanhos. Fragmentos menores se deslocam com maior velocidade no
gel do que os maiores, com o passar do tempo, os fragmentos se separam pela
diferença de tamanho.
Para saber o tamanho dos fragmentos separados, normalmente se aplica uma
solução, em um dos poços, onde são conhecidos os tamanhos dos fragmentos,
142 GENÉTICA

podendo ser usada como marcação para os fragmentos da amostra com tamanhos
desconhecidos que migraram na separação por eletroforese.

Para saber mais


Como ocorre a separação de moléculas por eletroforese:
<http://www2.ufpel.edu.br/biotecnologia/gbiotec/site/content/paginadoprofessor/uploadspro
fessor/881b6a85d5945a95ec2969687abe49ac.pdf?PHPSESSID=faaa31248d8149ee235c5eb
0cb54830e>;
<http://www.infoescola.com/bioquimica/eletroforese/>.

Apesar de separados, os fragmentos de DNA ainda não podem ser visuali-


zados. Para conseguir enxergar, é necessário o uso de técnicas para corar esse
gel, utilizando corantes específicos para ácidos nucleicos, como por exemplo,
o cloreto de etídio. Após coloração, são visualizados no gel muitos fragmentos
de DNA, oriundos da reação de restrição, em forma de bandas.

Questões para reflexão


Na reação de restrição, são formados muitos fragmentos; quando
separados por eletroforese, vários fragmentos aparecem separados
como bandas no gel, como saber e localizar nesse gel o fragmento,
que contenha a sequência de um gene de interesse?

2.4 Sondas
Para encontrar um fragmento de interesse, podemos usar uma sonda. A
sonda consiste em uma molécula de DNA ou RNA contendo sequências
complementares às sequências do gene buscado. A sonda irá fazer a ligação,
hibridização, com as bases complementares da sequência a ser encontrada,
portanto, é necessário marcar essa sonda, radioativa ou quimicamente, para
localizar um gene específico ou uma sequência de interesse.
B i o l o g i a m o l e c u l a r, b i o t e c n o l o g i a e e v o l u ç ã o 143

Questões para reflexão


Como obter uma sonda sem o conhecimento prévio da sequência de
um gene?

Uma das formas é usar um gene similar de outro organismo como sonda.
Por exemplo, se queremos isolar o gene que sintetiza a insulina humana e o
gene já foi isolado em outros animais, podemos usar a sequência desse gene
como sonda para encontrar o mesmo gene para insulina em humanos. A ligação
complementar entre a sonda e o alvo não requer, necessariamente, correlação
completa, isto é, uma sequência parecida, com pequenas diferenças, pode ser
usada como sonda.
Outra forma de se obter uma sonda é através do isolamento da proteína
codificada pelo gene. Usando o código genético e a sequência de aminoácidos
da proteína, podemos deduzir a sequência de DNA que codifica essa proteína
e confeccionar sondas sintéticas. Porém, sabemos que a mesma proteína pode
ser obtida por diferentes sequências de nucleotídeos, devido à redundância
do código genético, onde mais de uma trinca de bases nucleotídicas podem
ser sinônimas para um único aminoácido. Para reduzir esse problema, usa-se
uma mistura de todas as possíveis sequências de nucleotídeos possíveis como
sonda. Uma forma de reduzir o número de sequências possíveis na mistura é
utilizar uma região da proteína com pouca redundância em seus códons.
Agora, quando se conhece a sequência de uma região de interesse, um
conjunto de sondas pode ser elaborado através de um sintetizador de oligonu-
cleotídeos. As sondas resultantes são usadas para triar e localizar a sequência
procurada.
Até agora, aprendemos como cortar a molécula de DNA, separar os fragmen-
tos cortados, visualizar esses fragmentos e como obter sondas para localizá-los.
Mas como ocorre a ligação da sonda com os fragmentos separados, formando
as bandas, no gel de agarose?
Para isso os fragmentos precisam passar por um processo de desnaturação e
ser transferidos para um meio sólido permanente. A técnica, conhecida como
transferência de Southern, transfere fragmentos desnaturados e unifilamentares
de um gel para um meio sólido permanente. Após a transferência, ocorre a
144 GENÉTICA

hibridização com a sonda marcada. A sonda irá se ligar com qualquer fragmento
unifilamentar que contenha sequências complementares a ela.

2.5 Transferência de Southern


De forma simples, a transferência de Southern ocorre pela imersão do
gel, contendo os fragmentos clivados por enzimas de restrição e separados
por eletroforese, em uma solução alcalina para desnaturar o DNA, separando
a dupla-fita e tornando-o unifilamentar. Após a desnaturação gel passa para
uma plataforma em um recipiente contendo um tampão. Uma membrana de
nitrocelulose ou náilon é colocado em cima do gel. Tanto embaixo do gel
como em cima da membrana são colocados papéis de absorção que irão mo-
vimentar o tampão do recipiente, que atravessa o gel carregando o DNA para
a membrana, até atingir a camada superior do papel de absorção. O DNA é
fixado na membrana e transferido para um recipiente contendo uma solução
composta pela sonda marcada radioativa ou quimicamente; nessa etapa ocorre
a hibridização, processo pelo qual o DNA unifilamentar da membrana se une
à sonda com a sequência complementar ao fragmento de interesse procurado.
A membrana sofre uma lavagem para eliminar qualquer vestígio de sondas que
não se ligaram. A partir daí, a membrana é tratada de acordo com o tipo de
marcação utilizada na sonda para detectar, visualizar e localizar o fragmento
ligado com a sonda, como a autorradiografia no uso de sondas radioativas.
Vale lembrar que existem técnicas similares que transferem outras moléculas
do gel para uma membrana, por exemplo, a transferência de Northern, na qual
ocorre a hibridização de uma sonda com moléculas de mRNA, podendo obter
informações como a abundância dessa molécula e os tecidos onde esse mRNA
é transcrito. Já a transferência de Western faz a passagem de proteínas de um
gel para uma membrana, as sondas utilizadas nessa técnica são normalmente
anticorpos que avaliam o tamanho e o padrão de expressão de uma proteína.
Através das técnicas estudadas até agora, conseguimos chegar até a lo-
calização da nossa sequência e/ou gene de interesse. Mas, para avançar nos
estudos, muitos métodos usados na tecnologia do DNA recombinante precisam
de várias cópias desse gene.
Portanto, precisamos aprender como amplificar o nosso gene encontrado.
Uma forma de obter mais cópias do gene é colocar esse trecho de DNA em uma
bactéria e deixar que a célula bacteriana replique-o, essa técnica é chamada
de clonagem gênica.
B i o l o g i a m o l e c u l a r, b i o t e c n o l o g i a e e v o l u ç ã o 145

2.6 Clonagem gênica


O processo de clonagem gênica envolve uma série de técnicas moleculares e,
para compreender todo o processo, discutiremos cada uma delas sucintamente.
O primeiro passo para a clonagem gênica é a escolha de um vetor. O ve-
tor é uma molécula de DNA replicante que tem a função de carregar o nosso
gene para uma célula receptora. Portanto, o vetor de clonagem a ser escolhido
precisa obedecer a alguns critérios, como: possuir uma origem de replicação,
na qual a célula hospedeira reconheça essa origem de modo a replicar esse
vetor; apresentar marcadores de seleção, ou seja, características peculiares
em que possamos identificar e localizar as células receptoras que possuem
o vetor, com o nosso gene inserido; e ter sítios únicos de restrição para uma
ou mais enzimas. Os vetores mais utilizados em clonagem são os plasmídeos,
moléculas circulares de DNA existentes naturalmente em bactérias. Para clonar
fragmentos de DNA, os plasmídeos naturais foram modificados para conter as
três características citadas acima, vários sítios únicos de restrição, origem de
replicação e marcadores selecionáveis. Essas modificações resultam em resul-
tados satisfatórios na amplificação por clonagem.

Atividades de aprendizagem
Quais são os três critérios básicos para a escolha de um vetor de clonagem?

Escolhido o vetor, agora é necessário unir o fragmento, o gene, selecionado


e localizado pela sonda, com esse vetor. A maneira mais simples de inserir
o fragmento no vetor é cortar as duas moléculas com a mesma enzima de
restrição. Usando enzimas que fazem cortes desencontrados, pontas adesivas
complementares irão se formar nas duas moléculas e, quando misturados, po-
dem se parear. Entra em cena outra enzima, importantíssima nesse processo,
a DNA ligase.
Após o pareamento das pontas coesivas complementares do vetor plasmi-
deal com o fragmento de DNA exógeno, a ligase fecha os cortes feitos pelas
enzimas de restrição, restabelecendo as ligações químicas do DNA, formando
um plasmídeo recombinante, onde o DNA plasmideal recebe um fragmento
de DNA externo, exógeno, de outro organismo, formando uma molécula de
DNA diferente, recombinante.
146 GENÉTICA

Com o fragmento inserido no vetor, essa molécula de DNA recombinante


deve ser introduzida na célula receptora, para amplificar o nosso gene. Essa
etapa é conhecida como transformação, quando a célula receptora, normal-
mente uma bactéria, é induzida química ou fisicamente e se torna apta a cap-
tar DNA do meio externo. Depois de captados pelas células, os plasmídeos
recombinantes, se replicam e multiplicam dentro da célula, consequentemente
aumentando o número de cópias do fragmento inserido.
Depois de amplificado, precisamos recuperar os fragmentos. Primeiramente
temos que identificar as células que possuem o plasmídeo com o nosso frag-
mento, como proceder?
Quando escolhemos o vetor, uma das características para sua determinação
é a presença de marcadores selecionáveis. É usando essa característica que
iremos encontrar as células que possuem o vetor, com o nosso fragmento in-
serido. Usaremos, aqui, para exemplificar, o modelo mais famoso de marcador
presente nos vetores plasmidiais, o gene lacZ. Esse gene tem vários sítios únicos
de corte para as enzimas de restrição, onde pode se inserir um fragmento de
DNA a ser clonado. Quando na mistura do plasmídeo com o fragmento não
ocorre o pareamento e inserção desse DNA exógeno, no sítio de corte, dentro
do gene lacZ, o gene não sofre alteração, e se mantém ativo, produzindo uma
enzima chamada beta-galactosidase. Agora, quando a ligação entre plasmídeo
e fragmento ocorre, esse fragmento é inserido no sítio de restrição, dentro da
sequência do gene lacZ, tornando-o inativo, deixando de produzir a beta-
-galactosidase. Outro marcador normalmente utilizado, junto com o gene lacZ
é um gene que confere resistência a antibióticos, como a ampicilina.
Na técnica de transformação, algumas bactérias não conseguem captar o
DNA do meio externo, outras se transformam e carregam o plasmídeo recombi-
nante, enquanto muitas outras conterão o plasmídeo intacto. Para selecionarmos
as recombinantes, vamos utilizar as características dos marcadores. Cultivando
as bactérias em meio de cultura contendo ampicilina e X-gal, uma substância
que produz uma coloração azul, quando clivada, pela beta-galactosidase,
conseguiremos identificar corretamente as bactérias que possuem o fragmento.

Questões para reflexão


Como identificar as bactérias com o fragmento de interesse?
B i o l o g i a m o l e c u l a r, b i o t e c n o l o g i a e e v o l u ç ã o 147

Analisando as características dos marcadores selecionáveis contidos em


nosso vetor plasmideal, o gene lacZ e o gene de resistência à ampicilina,
podemos chegar às seguintes conclusões: somente as células transformadas
com o plasmídeo que têm o gene de resistência a ampicilina irão sobreviver e
crescer no meio de cultura. Assim, eliminamos as bactérias que não possuem
o plasmídeo.
Agora, analisando o gene lacZ as células com o plasmídeo intacto, que
não recebeu o fragmento, tem o gene ativo, funcional, produzindo a enzima
beta-galactosidase, que degrada o X-gal e torna a bactéria azul. Já a bactéria
com o plasmídeo recombinante, tem o fragmento inserido dentro da sequência
que codifica a enzima beta-galactosidase, inativando o gene lacZ, isso inibe
a produção da enzima, não ocorrendo a lise do X-gal, mantendo as células
bacterianas brancas.
Portanto, a cor das colônias de bactérias no meio de cultura é uma forma
rápida e eficaz de localizar as células que apresentam o plasmídeo recombi-
nante com as colônias brancas, diferindo das colônias azuis onde as células
bacterianas possuem os plasmídeos intactos.
Os plasmídeos são excelentes vetores pra clonagem, porém, eles são limi-
tados quanto ao tamanho do fragmento que podem carregar normalmente até
15 mil pares de base (15 kb). Existem outros tipos de vetores com capacidade
de receber fragmentos de DNA maiores, como o fago lambda (23 kb), cos-
mídeo (44 kb), cromossomo artificial bacteriano — BAC (300 kb). Há outros
vetores que carregam fragmentos de DNA para células eucariontes, como o
YAC (600-1000 kb).
Concluímos, aqui, as etapas necessárias para amplificar um fragmento de
interesse através da clonagem.

2.7 Reação em cadeia da polimerase (PCR)


Com os avanços nos estudos e conhecimento das propriedades bioquímicas
do material genético, tecnologias para manipular o DNA não pararam de se
desenvolver. Embora a clonagem seja muito eficiente para amplificar fragmen-
tos de DNA, principalmente fragmentos grandes, existe uma nova técnica de
amplificação, que revolucionou a mundo da genética e biologia molecular: a
reação em cadeia da polimerase — PCR.
A manipulação e análise de genes requer a amplificação dessas sequências
de DNA. Vimos a eficiência da clonagem em exercer essa função de amplifi-
148 GENÉTICA

cação, porém se trata de um processo trabalhoso, como vimos anteriormente,


com várias etapas onde há necessidade de cultivar células bacterianas, e isso
demanda tempo.
Com a reação da cadeia da polimerase, é possível amplificar pequenos
fragmentos de DNA, um bilhão de vezes em poucas horas, utilizando pequenas
quantidades de DNA como amostra inicial.
A PCR tem como base a replicação mediada por uma DNA polimerase,
utilizando a amostra de DNA como molde e um iniciador com um grupo 3’ —
OH livre para que a amplificação possa ocorrer. Os iniciadores são fragmentos
curtos de DNA, possuem em média 17-25 nucleotídeos e são complementares
às sequências do gene ou do fragmento que se deseja amplificar. A reação de
PCR ocorre através do prepara de uma solução que contenha todos os substratos
necessários para a confecção de uma molécula de DNA: o molde (amostra) de
DNA, a enzima DNA polimerase, o cofator enzimático (íons de magnésio), os
dNTPs, que são substratos para a DNA polimerase, os iniciadores e outros sais
para que a reação ocorra.
Normalmente, a reação ocorre em três fases: na primeira fase, a solução
é aquecida a uma temperatura entre 90-100 °C para desnaturar a dupla-fita
de DNA e produzir moldes unifilamentares, por um período de no máximo
2 minutos. Na segunda etapa, a solução é resfriada a uma temperatura que
pode variar de 30 a 65 °C, fase essa responsável pela ligação do iniciadores
nos filamentos molde unifilamentares que dura 1 minuto ou menos. Na última
fase, a solução é aquecida até atingir 60-70 °C, onde a DNA polimerase tem
atividade catalítica e sintetiza os novos filamentos de DNA a partir dos inicia-
dores, ligados aos moldes.
No final desse ciclo, são produzidas duas novas moléculas bifilamentares do
fragmento determinado pelos iniciadores, oriundo do DNA molde, da amostra.
Esse ciclo é repetido em média 30 vezes, e como a cada ciclo o fragmento é
duplicado, ele aumenta numa progressão geométrica, tendo em média 1.000
moléculas após 10 ciclos, mais de 1 bilhão de moléculas em 30 ciclos. Lem-
brando que cada ciclo se completa em poucos minutos, levando, então, a
uma amplificação de muitas moléculas de DNA dentro de poucas horas. Todo
esse processo utiliza uma máquina, para automatizar os ciclos, chamada de
termociclador.
B i o l o g i a m o l e c u l a r, b i o t e c n o l o g i a e e v o l u ç ã o 149

A PCR é amplamente usada, substituindo a clonagem gênica. Ainda que


essa reação tenha marcado uma revolução nas técnicas de manipulação de
DNA, ela apresenta várias limitações. Uma delas é a necessidade de conheci-
mento prévio de pelo menos uma parte, da sequência do fragmento ou gene,
a ser amplificado para a confecção dos iniciadores. Outra é a facilidade de
contaminação, quando na solução pequenas quantidades do DNA da pele da
pessoa que manipulou a amostra ou até pequenas partículas no ar podem ser
amplificadas, graças à habilidade da PCR em amplificar pequeníssimas quan-
tidades de DNA. Uma terceira limitação é a imprecisão na replicação, a DNA
polimerase usada na reação, geralmente, não tem a capacidade de revisão e
acaba incorporado nucleotídeos errados uma vez a cada 20 kb, mas para solu-
cionar esse problema novas DNA polimerases, termoestáveis e com capacidade
de revisão foram descobertas e empregadas na técnica. Outra fragilidade da
PCR é o tamanho dos fragmentos que podem ser amplificados, usando uma
DNA polimerase padrão, a taq polimerase, não chega a 2 kb. Pesquisadores
otimizaram as condições da reação, usaram outras DNA polimerases e con-
seguiram aumentar a capacidade da PCR em amplificar fragmentos maiores,
porém, esses fragmentos não passam de 50 kb.
Mesmo com essas limitações, a PCR é usada rotineiramente nas técnicas
que envolvem biologia molecular e amplificação do material genético. Um
exemplo é a utilização como ferramenta de diagnóstico. Como os iniciadores
são sequências específicas para uma região especifica de um DNA, a PCR
pode ser usada para detectar a presença de um fragmento particular de DNA
em uma amostra.
A PCR é usada para detectar vírus em amostras de sangue, fazendo a reação
com iniciadores complementares para uma sequência conhecida no DNA viral.
Em testes de HIV, pode ser aplicada essa técnica para detectar a presença do
vírus no sangue, onde os iniciadores irão se ligar no DNA viral, se estiver pre-
sente, e a PCR irá amplificar um fragmento de DNA, de tamanho conhecido.

Questões para reflexão


Para visualizar o resultado da PCR, como saber se o fragmento foi
amplificado no final da reação?
150 GENÉTICA

Na visualização dos resultados, usaremos novamente a eletroforese em gel


de agarose, em que colocaremos a amostra no gel e aplicaremos uma corrente
elétrica. Ao separar a amostra resultante da PCR, se não houver contaminação,
aparecerá uma banda, contendo o fragmento de tamanho conhecido, como
dito acima, indicando a presença do vírus no sangue.

2.8 Sequenciamento
As metodologias para descobrir mais sobre a informação genética não param
de evoluir. Uma poderosa ferramenta para analisar o DNA é o sequenciamento.
Ele permite extrair a informação do material genético, fornecendo suporte na
obtenção de conhecimentos sobre a estrutura e função dos genes.
A primeira estratégia usada para sequenciar o DNA foi criada por F. Sanger et
al. nos anos 1970, com base na replicação, alongamento do DNA, usando um
nucleotídeo especial, o trifosfato de didesoxirribonucleosídeo (ddNTP), usado
como um dos substratos. Os ddNTPs são idênticos aos dNTP, mas não têm o
grupo 3’ – OH livre, quando são incorporados na cadeia de DNA outros nucleotídeos
não conseguem se ligar ao filamento crescente pela ausência do grupo 3’ – OH
que estabelece a ligação fosfodiéster com o nucleotídeo que chega.
Essa técnica necessita de uma quantidade considerável de DNA, e para isso,
são usados métodos já vistos anteriormente, como a clonagem e amplificação
por PCR. Os fragmentos amplificados são divididos em quatro tubos diferentes.
Em cada tubo são adicionadas cópias de um iniciador (primer) complementar
a uma ponta do DNA a ser sequenciado, os 4 dNTPs, com as bases adenina,
timina, guanina e citocina, uma pequena quantidade de apenas um dos ddNTP,
responsável por finalizar a síntese de DNA, em que cada um dos quatro tubos
recebe um ddNTP diferente e a DNA polimerase.
Nessa reação, o primer ou o dNTP recebe uma marcação química ou ra-
dioativa, para que o DNA recém sintetizado posse ser detectado. Nos quatro
tubos a polimerase amplifica o DNA e, ao longo do processo, em cada tubo,
ocorre ocasionalmente a adição de um ddNTP ao filamento que interrompe a
síntese. Portanto, a incorporação dessa molécula no filamento de DNA recém-
-sintetizado ocorre de forma aleatória, em diferentes posições, cópias, formando
um grupo de sequências de DNA com tamanhos diferentes. Por exemplo em
um dos tubos o ddNTP adicionado foi o que contém a base Adenina (A); nesse
caso, todos os fragmentos, de diferentes tamanhos, formados nesse tubo são
terminados por um nucleotídeo que tem a base A. Nos outros três tubos ocor-
B i o l o g i a m o l e c u l a r, b i o t e c n o l o g i a e e v o l u ç ã o 151

rem processos semelhantes, porém com os outros tipos de ddNTP, timina (T),
guanina (G) e citosina (C). Quando terminam as reações de síntese de DNA,
todas as moléculas nos tubos são desnaturadas e o DNA unifilamentar de cada
reação é separado por eletroforese em gel.
Os resultados da amplificação em cada tubo são colocados em poços, um
ao lado do outro no gel submetido à eletroforese. Essa disposição permite, ao
final da eletroforese, distinguir a localização e os tamanhos de cada filamento de
DNA, podendo se observar diferenças de tamanho de apenas um nucleotídeo.
Para interpretar o gel, é só lembrar-se das características da eletroforese, em
que moléculas menores se deslocam mais e rapidamente no gel e as maiores
se deslocam menos e mais devagar. Portanto, ao visualizar o gel, localizamos
o fragmento mais próximo do fundo, ou seja, no final do gel, ele é o menor
fragmento, o mais leve, e se esse fragmento é oriundo das amostras do tubo
onde o ddNTP era, por exemplo, composto pela base guanina, isso significa
que o primeiro nucleotídeo incorporado na sequência complementar ao seu
molde de DNA tinha G. E, assim, vamos avaliando o gel: qual o segundo
menor fragmento? Em qual tubo estava? O terceiro menor? Quarto? Com isso,
conhecemos a sequência complementar do nosso fragmento e podemos, então,
descobrir qual a ordem das bases do filamento original do nosso fragmento.

Para saber mais


Conheça melhor a estrutura e diferenças entre as moléculas de dNTP e ddNTP e compreenda
cada etapa no sequenciamento didesoxi:
<http://blog.cca.ufscar.br/lamam/files/2010/07/sequenciamento.htm>.

Por muito tempo, essa técnica foi executada de forma manual, era um
processo demorado, trabalhoso e muito caro. Atualmente, as técnicas de se-
quenciamento são automatizadas, usam marcadores fluorescentes, detectores
a laser e sequenciam milhares de pares de bases em algumas horas. Outras
tecnologias, além do princípio do didesoxi, têm se desenvolvido, aumen-
tando a capacidade de sequenciamento e diminuindo as etapas demoradas e
trabalhosas do processo, por meio do sequenciamento direto do DNA, sem a
necessidade de clonar fragmentos em bactérias ou por PCR. Essa abordagem,
aliada às novas tecnologias, baixam drasticamente o tempo e o preço da técnica
de sequenciamento de DNA.
152 GENÉTICA

O desenvolvimento, a automatização e a capacidade de gerar informações


sobre os genes, características dos genomas e funcionamento dos organismos,
impulsionaram os pesquisadores no desenvolvimento de imensos projetos de
sequenciamento. A demanda crescente no uso dessa técnica provocou avanços
nas tecnologias e na capacidade em gerar dados biológicos.
O aumento na quantidade de informação obtida, através da evolução das
tecnologias de sequenciamento, provocou uma nova revolução na biologia
molecular chamado de era das ômicas.

2.9 Era das ômicas


Com o advento e a evolução das tecnologias de sequenciamento, a ciência
da biologia molecular entrou em uma nova era. Essa era é marcada pela pro-
dução de dados biológicos em larga escala, a era das ômicas.
A primeira é a genômica e como o nome sugere, essa área do conhecimento
estuda a informação genética de um organismo. A genômica buscar compreender
o design dos organismos, a descoberta de novos genes, diagnóstico e controle
gênico de doenças etc.
Contudo, a genômica foi pioneira, pois os primeiros estudos em larga escala
são oriundos das novas tecnologias de sequenciamento de DNA, Next Genera-
tion Sequencing (NGS). Essa área vai se dividindo em subáreas, de acordo com
a evolução dos conhecimentos e das tecnologias para a obtenção de dados e
análise. A genômica estrutural é responsável por caracterizar fisicamente os ge-
nomas, ou seja, determinar a sequência correta de nucleotídeos de um genoma.
Já a genômica comparativa correlaciona um genoma com outros conhecidos,
alinhando sequências e inferindo relações filogenéticas.
A genômica funcional busca descrever funções e interações entre genes, e
essa subárea da genômica acabou estimulando o surgimento de outra grande
área, a transcriptômica.
A transcriptômica é o estudo em larga escala das variações nos transcrip-
tomas, ou seja, na quantidade de mRNA transcritos nos diferentes tecidos, em
condições normais comparadas com estados fisiológicos anormais dos orga-
nismos, como estresse ambiental, doenças etc.
Já a proteômica estuda a variabilidade de proteínas em um organismo, ana-
lisando e identificando as quantidades de proteínas sintetizadas nos diferentes
tecidos, alterações pós-traducionais e a interação entre proteínas.
B i o l o g i a m o l e c u l a r, b i o t e c n o l o g i a e e v o l u ç ã o 153

Neste tópico, abordamos apenas as principais ômicas, levando em consi-


deração o fluxo da informação gênica.
Existem outros ramos da ciência que abordam diferentes particularidades das
interações moleculares e bioquímicas, em larga escala. Como a metagenômica
responsável pelo estudo em larga escala de uma microbiota específica, como
a microbiota intestinal, do sistema digestório humano, a microbiota de uma
amostra de solo, em que se podem identificar, por meio do sequenciamento
direto do DNA total da amostra, microrganismos que não são cultiváveis em
laboratório. Temos a metabolômica, responsável pela análise em larga escala da
interação de todos os metabólitos produzidos por um organismo. A farmacoge-
nômica estuda as interações bioquímicas em larga escala dos fármacos usados
em tratamentos de doenças. E a epigenômica, uma ciência que busca esclare-
cer como o genoma funciona estruturalmente, avaliando as modificações nas
proteínas histonas, padrões de metilação do DNA, RNAs não codificadores etc.
Como vimos, as ômicas são ramos da ciência em continua expansão. Surgem
da necessidade de seguir o fluxo do conhecimento iniciados em outras áreas
já existentes. Portanto, iremos nos deparar com inúmeros ômicas ao longo
dos nossos estudos, pois com a capacidade cada vez maior de gerar dados
biológicos, maiores serão os desafios para desvendar e integrar esse volume
imenso de informação.
154 GENÉTICA

Seção 3 Genética evolutiva


Para finalizar nossa unidade, estudaremos como ocorrem as variações mole-
culares nos seres vivos. Quais as diferenças entre a quantidade, complexidade e
funcionalidade do material genético. Quais são os mecanismos que promovem
a diversidade molecular e suas implicações nos processos evolutivos.

3.1 Variações moleculares


Todos os organismos vivos — mamíferos, aves, répteis, bactérias etc. —
evoluíram de um mesmo ancestral que viveu nesse planeta há cerca de 3,8
bilhões de anos. A maior evidência desse fato é que a maioria dos seres vivos
compartilha de um mesmo grupo de moléculas para armazenar a informação
genética, o DNA, e para transcrever e traduzir essa informação em peptídeos,
os diferentes tipos de RNA.
Porém, quando comparamos o genoma de uma bactéria como a E. coli com
de um mamífero, o tamanho do genoma de mamíferos é geralmente 1.000 vezes
maior que o da bactéria. Imediatamente, podemos chegar à conclusão de que
as diferenças nos tamanhos dos genomas estão diretamente relacionadas com
a complexidade dos mamíferos com relação a E. coli. Veremos, ao longo desta
seção, que as variações moleculares nem sempre estão diretamente relacionadas
com a complexidade e tamanho dos genomas dos seres vivos.
Após o sequenciamento do genoma humano e de outros organismos eu-
cariotos e procariotos, descobriu-se que uma pequena quantidade do DNA
no genoma continha genes responsáveis pela codificação de peptídeos, no
caso do homem aproximadamente 27%, em A. thaliana, planta dicotiledônea,
31% e na D. melanogaster, inseto, 33%. Mas em procariotos como a E. coli,
praticamente todo o seu genoma codifica algum produto proteico. Analisando
essas descobertas, podemos levantar alguns questionamentos, por exemplo, se
todos os seres vivos tiveram um ancestral comum, de onde vem essa diferença
no tamanho do DNA nos eucariotos? Se a quantidade de DNA codificante não
chega nem a 50% do tamanho do genoma em eucariotos, qual seria a função
desse DNA extra?
B i o l o g i a m o l e c u l a r, b i o t e c n o l o g i a e e v o l u ç ã o 155

Para saber mais


Conheça mais sobre a complexidade dos genomas, acessando o link:
<http://www.moodle.ufba.br/mod/book/view.php?id=84116>.

Para tentar compreender essas questões, é necessário entender como o DNA


está organizado dentro dos genomas. Os genomas possuem regiões codificantes
ativas e inativas, outras com mais de uma cópia de determinadas sequências
ou genes e também possuem regiões com semelhança estrutural.
As regiões que possuem genes ativos no genoma de eucariotos são com-
postas por éxons e íntrons, associadas a regiões flanqueadoras regulatórias,
como os promotores e acentuadores. O DNA funcional também exerce papel
estrutural e na transmissão do material genético, relacionados aos centrômeros
e telômeros.
Já as partes do DNA transcricionalmente inativos compreendem longos
trechos de sequências, presentes entre os genes e dentro dos íntrons. Dados
moleculares têm evidenciado que a maior parte do genoma de organismos
pluricelulares é formado por regiões de DNA não codificante, isto é, não ativo.
Porém, isso não garante que esse material genético seja inerte ou que não possua
alguma interação com as regiões de transcrição ativa do DNA, sobre o fenótipo
dos organismos ou sobre a própria evolução das espécies.
Algumas sequências que compartilham homologia com uma ou mais regiões
genômicas são chamados de DNA repetitivo ou multicópia. O grau de homo-
logia que pode existir entre os diferentes segmentos de DNA é extremamente
variável. Normalmente, sequências homólogas não são totalmente idênticas,
pois cada cópia acabou evoluindo para exercer funções específicas.
Essas sequências parcialmente idênticas são chamadas de famílias gênicas,
se estão associadas às regiões codificantes ativas, e de famílias repetidas, quando
associadas a elementos não funcionais. As famílias podem ser classificadas
quanto ao número de cópias, tamanho e distribuição das sequências dentro
dos genomas. As sequências relacionadas podem ser encontradas ligadas, for-
mando grupos conhecidos como segmentos, repetições em tandem, separadas,
distantes umas das outras e até em cromossomos diferentes.
Ao avaliarmos essas formações que compõem o genoma, podemos imagi-
nar um aglomerado confuso, composto por todos esses tipos de sequências.
156 GENÉTICA

Mas o genoma, visto com uma atenção especial, apresenta uma organização
compreensível, dando a possibilidade de conhecermos a relação dos diferentes
arranjos genômicos e os mecanismos pelos quais eles evoluíram.

3.2 Evolução molecular


Desde os anos 1970, os pesquisadores já davam indícios de que a duplica-
ção de sequências de DNA era o principal evento responsável pela evolução
nos genomas. Com o avanço nas tecnologias de sequenciamento de DNA,
pode-se comprovar que realmente os genomas aumentam seu tamanho e sua
complexidade através de duplicações recorrentes e da divergência genética.
As duplicações gênicas parecem dar oportunidade para o aumento da com-
plexidade do plano corporal, diferenciação e adaptação dos organismos, pela
capacidade em formar novos genes com novas funções. Isso pode acontecer
pelo fato de que segmentos duplicados contêm uma ou mais cópias de um
gene, portanto, uma das cópias continua desempenhando sua função original
enquanto a outra pode acumular modificações, mutações ao longo do tempo
e passar a exercer uma nova função.

Atividades de aprendizagem
Quais os mecanismos que auxiliam os genomas a aumentarem seus ta-
manhos e sua complexidade?

Entretanto, mecanismos evolutivos, como a seleção natural, podem favore-


cer a manutenção da estrutura dos genes originais duplicados. Principalmente
de genes codificadores de transcritos essenciais pelas células, rRNA, tRNA
proteínas histonas etc.
Eventos de duplicação podem ocorrer em todo o genoma aleatoriamente.
Os tamanhos das sequências duplicadas podem variar de alguns nucleotídeos
até centenas de megabases. Mas existe uma forma de duplicação mais extrema,
a duplicação de um genoma inteiro, chamada de ploidias. A duplicação do
genoma tem sido relacionada como importante passo na evolução das plantas
e, provavelmente, dos primeiros vertebrados.
Os genes duplicados são encontrados dentro de uma espécie ou em espécies
diferentes. Genes duplicados, presentes na mesma espécie, são chamados de
B i o l o g i a m o l e c u l a r, b i o t e c n o l o g i a e e v o l u ç ã o 157

parálogos, em espécies diferentes, ortólogos. Por exemplo, as cadeias alfa e


beta, da hemoglobina humana, são codificadas por genes parálogos. Já o gene
da cadeia beta humana e da cadeia beta de galinha são ortólogos.
A classificação desses genes em parálogos ou ortólogos indica uma relação
de homologia entre esses genes, ou seja, estavam presentes no ancestral comum
dos organismos comparados. Os genes ortólogos podem fornecer informações
importantes sobre a história evolutiva das espécies, enquanto os genes parálogos
sobre as histórias evolutivas dos próprios genes.

Questões para reflexão


As duplicações estão diretamente relacionadas com a evolução dos
genomas. Após o evento de duplicação, quais caminhos essas novas
cópias presentes no genoma percorrerão para provocar eventos evo-
lutivos significantes?

Novas regiões duplicadas têm origem no genoma individual de um orga-


nismo. A manutenção dessas cópias nas próximas gerações, mesmo quando
conferem vantagens adaptativas, dependem simplesmente do acaso. Nessas
cópias, a ação da deriva genética pode extingui-las passadas algumas gerações
do seu surgimento.
Porém, outras forças evolutivas podem atuar sobre essas duplicações. A
seleção natural pode favorecer a presença de um número elevado de cópias de
genes, cujos produtos são exigidos em grandes quantidades pelos organismos,
como é o caso das moléculas de RNA ribossômicos (rRNA) e dos genes que
codificam as proteínas histonas, mantendo as estruturas originais desses genes
intactas. Em algumas situações, no entanto, as cópias extras dos genes deixam
de ser funcionais ou podem, ao longo do tempo, adquirir novas funções.
Quando uma região duplicada consegue sobreviver por um período signi-
ficativo de tempo, algumas mutações aleatórias nas cópias extras de um gene
normalmente levarão à perda de função dessa sequência, tornando o gene du-
plicado um pseudogene.
158 GENÉTICA

Atividades de aprendizagem
O que são pseudogenes?

Os pseudogenes não representam a fase final na evolução dos genes du-


plicados. Diversos estudos demonstram a importância deles no controle e re-
gulação da expressão de genes funcionais. Além disso, podem emergir desses
pseudogenes novas funções, em que um gene pode passar por um período de
não funcionalidade no qual ocorrem várias modificações em sua estrutura, e
posteriormente ressurgir com uma nova função.
Adquirir uma nova função pode ser resultado de mutações seriadas em
uma cópia de um gene duplicado, como dito anteriormente. Frequentemente,
o novo gene terá função semelhante à do gene original, mas com diferenças
nos padrões de expressão, provocadas por mutações, alterações nas sequências
reguladores desses genes.
Grande parte da diversidade molecular dos organismos parece ter surgido
por diferenças estruturais e funcionais de genes duplicados. O processo de du-
plicação total ou parcial dos genes fornece oportunidade de ocorrer proteínas
com novas estruturas e funções.
Um exemplo disso são os genes responsáveis pela produção de anticorpos.
Eles adquiriram, ao longo do tempo, um mecanismo especial de processamento,
durante o processo de maturação dos linfócitos, que promove a geração de
uma imensa variedade de anticorpos — característica fundamental para defesa
dos organismos contra diferentes tipos de patógenos.
Os eventos de duplicação de um gene parecem afetar a adaptabilidade de
um organismo devido à variação da quantidade de um produto gênico especí-
fico e não pelo aumento do conteúdo de DNA. Se um excesso de produto gênico
diminui a adaptação, a seleção pode favorecer mecanismos de compensação
de dose pelos quais a atividade de uma ou mais cópias gênicas é reduzida.
Um exemplo desse processo ocorre com carpas tetraploides (Cyprinus carpio),
em que as quantidades de RNA e de enzimas são regulados para os mesmos
níveis expressos em espécies diploides, filogeneticamente relacionadas. Esses
peixes tetraploides possuem taxa de degradação do mRNA mais elevada,
quando comparadas com as espécies diploides. Outra forma de adaptação,
B i o l o g i a m o l e c u l a r, b i o t e c n o l o g i a e e v o l u ç ã o 159

a bioquímica, ocorre através das modificações na regulação, na estrutura dos


produtos proteicos ou em ambos.
Como vimos até agora, a duplicação do DNA é o evento principal para a
evolução molecular acontecer. Existem três mecanismos envolvidos nesse pro-
cesso — a dispersão de sequências correlatas por transposição, o agrupamento
de sequências por permuta desigual e a duplicação de genomas inteiros.
A duplicação por transposição ocorre através da mudança de um trecho
de DNA para uma nova região cromossômica. Ela se origina pelo movimento
direto de uma sequência de DNA de um local para outro ou por intermediário
de RNA, que mantém o local da sequência intacto. O processo de transposi-
ção pode causar mutações, aumentar ou diminuir a quantidade de material
genético no genoma. Existem três tipos de elementos de transposição capazes
de movimentar fragmentos de DNA.
Os elementos de classe I, compostos pelos retrotransposons e retroposons,
são particularmente abundantes nas plantas, representando a maior parte do
genoma desses organismos. Em milho, cerca de 50% a 80% do genoma é
composto por retrotransposons e, em trigo, podem chegar a 90%. Em humanos
esses elementos representam cerca de 40% do genoma.
Nessa classe, o DNA é transcrito em RNA, servindo de molde para a trans-
criptase reversa produzir uma copia de cDNA que será inserido em outra região
do genoma. Os retrotransposons são segmentos com tamanhos que variam de
100 pb até 5 kb, conhecidos como LTRs (long terminal repeats), possuem vários
genes envolvidos no processo de transposição, incluindo a transcriptase reversa.
Já os retroposons não possuem LTRs e são divididos em dois grupos, os
LINEs e os SINEs. Os LINEs (long interspersed elements) são grandes, 5 a 9 kb, e
possuem uma cauda poli(A) na extremidade 3’. Possuem dois genes, um para a
transcriptase reversa e outro para a integrase, permitindo que esses elementos de
transposição façam cópias de si mesmos e de outros elementos, se espalhando
para diferentes regiões, aumentando o tamanho do genoma.
Os SINEs (short interspersed elements), são formados por pequenos seg-
mentos, 100 a 400 pb, oriundos da ação da transcriptase reversa sobre rRNA,
tRNA e outros RNAs nucleares pequenos. São moléculas que não codificam
genes, como o da transcriptase reversa, mas possuem sequências Alu, sítios de
restrição reconhecidos por endonucleases isoladas da bactéria Arthrobacter
luteus, a sequência tem cerca de 300 pb de comprimento e compreende um
160 GENÉTICA

grupo de DNA moderadamente repetitivo bem comum no genoma humano,


cerca de 11% do total do genoma.
Os elementos de transposição de classe II são os transposons. Esses segmen-
tos foram descobertos no milho em 1948 e, atualmente, sabe-se que compõem
50% do genoma desse vegetal. São elementos de DNA com repetições terminais
invertidas e se movem diretamente de uma região para outra, através da ação
da enzima transposase. Esse tipo de elemento é predominante em bactérias,
sendo chamado nesses microrganismos de sequências de inserção. Algumas
bactérias possuem, além do gene para a transposase, genes para uma ou mais
proteínas que conferem resistência a antibióticos, quando inseridos em plas-
mídeos, esses transposons podem se transferir de uma bactéria para outra. Esse
mecanismo está diretamente relacionado com o desenvolvimento de resistência
bacteriana à muitos fármacos.
Os elementos de classe III são conhecidos por MITEs (miniature inverted-
-repeats transposable elements), são pequenas sequências de DNA flanqueadas
por repetições invertidas quase idênticas com 15 pb de comprimento, apro-
ximadamente. Por serem muito pequenos, esses elementos não codificam
proteínas e não se tem conhecimento de como eles são copiados e deslocados
para outras regiões do genoma. Outros transposons maiores, provavelmente,
sejam os responsáveis pela codificação de enzimas que executam essas tarefas,
reconhecendo as sequências repetidas invertidas.
A maioria dos elementos genéticos móveis não carrega informação genética
para o fenótipo dos organismos, mas são sequências com grande capacidade
de se manterem ao longo das gerações. Essas sequências apresentam uma
vantagem seletiva, graças à seleção em nível de genes replicados.
Outra vantagem desses elementos seria a geração de variantes genéticas
que podem servir como alternativas adaptativas sobre as quais a seleção irá
atuar. Alguns cientistas acreditam que esses elementos podem ser responsáveis,
parcialmente, pelos surtos de especiação em registros fósseis de alguns períodos
geológicos. Contudo, a transposição é um mecanismo que promove a plastici-
dade genômica responsável pela adaptação a situações ambientais inesperadas.
A duplicação por permuta desigual acontece quando erros no pareamento
das cromátides nos cromossomos homólogos, no paquíteno, da prófase I da
meiose, promovem a permuta de sequências de DNA não equivalentes. Isso
pode ocorrer quando são encontrados trechos de DNA correlacionados, al-
tamente repetitivos, localizados em regiões adjacentes do genoma. Apesar
B i o l o g i a m o l e c u l a r, b i o t e c n o l o g i a e e v o l u ç ã o 161

do pareamento desigual, esse evento é mediado pela existência de alguma


homologia entre dois locais não equivalentes.
Agrupamentos de segmentos repetidos, resultantes da duplicação inicial,
podem ou não ser homólogos. Mas se essas sequências estiverem duplicadas,
estiverem presentes em tandem, ciclos adicionais de permuta desigual homó-
logas podem ser facilmente iniciados entre pares cromossômicos não equiva-
lentes, promovendo a expansão desses agrupamentos podendo originar muitas
cópias de uma sequência original de DNA. Portanto, uma região duplicada
pode variar de alguns pares de bases até centenas de kb, sem a necessidade
de conter genes ativos nesses fragmentos.
A poliploidização dos genomas — duplicação dos genomas inteiros — tem
grande importância evolutiva. Essa duplicação pode ocorrer por diversos meca-
nismos, todos eles relacionados a erros no processo de divisão meiótica. Eventos
de poliploidia são comuns na evolução dos vegetais, em que estudos revelam
que 50% das plantas atuais possuem um ancestral que sofreu poliploidização.
A formação de poliploides é praticamente tão frequente quanto às mutações
pontuais em locos individuais, colocando esse evento como uma importante
fonte de variação genética nas populações vegetais.
Animais poliploides ocorrem em organismos com menos grau de comple-
xidade, como alguns platelmintos e crustáceos. Vertebrados poliploides podem
ser encontrados em algumas espécies de salamandras e lagartos, bem como
em peixes como o salmão. Já mamíferos poliploides são raros, pois a maioria
sofre aborto nas fases iniciais do desenvolvimento embrionário.

3.3 Homologia e filogenia


Filogenia é um termo usado para determinar as relações evolutivas entre os
diferentes grupos de organismos.
Atualmente, com a disponibilidade de dados moleculares, incluindo sequências
de proteínas e de DNA, as reconstruções de filogenias não dependem somente
das informações de origens fósseis nem das características fenotípicas dos
organismos.
Para fazer uma inferência filogenética, levamos em consideração as mu-
danças ocorridas nas características homólogas, que evoluíram de um mesmo
ancestral comum. Um exemplo clássico para entendermos o conceito de ho-
mologia são as asas do morcego e as patas dianteiras dos camundongos —
ambas evoluíram dos membros anteriores de um ancestral comum para esses
162 GENÉTICA

dois organismos. Mesmo que pareçam diferentes e tenham funções diferentes,


ao analisar de forma mais atenta essas estruturas anatômicas, podemos concluir
que são, de fato, homólogas, junto com outros caracteres em comum, e não é
à toa que os dois são classificados como mamíferos.
Quando pensamos nas sequências de
DNA, podemos dizer que são homólogas se
Para saber mais duas sequências evoluíram de uma sequência
Tipos de sequência: ancestral comum.
<http://adi-38.bio.ib.usp.br/sismo/ Para fazer a reconstrução filogenética, se-
tipos.html>. quências homólogas de DNA são comparadas
através do alinhamento de suas bases nucleotí-
dicas. Depois de obter o melhor alinhamento entre as sequências, levando em
consideração o modelo evolutivo e métodos numéricos usados para a recons-
trução filogenética, são construídas as árvores filogenéticas. Essas árvores nos
permitem visualizar de forma clara as correlações e auxiliam na classificação
correta dos seres vivos.

Para saber mais


A reconstrução filogenética através do alinhamento de sequências de DNA e construção de
árvores filogenéticas não é uma tarefa fácil. Todas essas etapas exigem uma análise ponto a
ponto de cada nucleotídeo das sequências comparadas. Acesse o link a seguir e descubra mais
sobre esse processo:
<http://bioinfo.esalq.usp.br/web/downloads/category/6-aulas_curso?download=25%3
Aaula-11-introduo--filogenia>.

Para saber mais


Fica aqui uma sugestão de leitura complementar para compreender melhor a biologia molecular.
É importante entender a formação e a estrutura dos genomas. Para isso, precisamos aliar os
conhecimentos de biologia molecular com os conceitos de evolução e suas implicações mole-
culares. O material disponível no link a seguir nos leva a compreender melhor a interação da
evolução com a biologia molecular.
<http://www.biologia.ufrj.br/PDF_GENETICA/Evolucao%20Molecular.pdf>.
B i o l o g i a m o l e c u l a r, b i o t e c n o l o g i a e e v o l u ç ã o 163

Fique ligado!
A seguir, os principais tópicos abordados nesta unidade:
A replicação do DNA.
Transcrição e processamento do RNA.
Tradução — síntese proteica.
Técnicas em biologia molecular.
Genética evolutiva.

Para concluir o estudo da unidade


Ao longo desta unidade, estudamos os conceitos básicos necessários para
compreender as particularidades nos processos de replicação do DNA,
transcrição, na formação do RNA e como a informação genética é tradu-
zida em uma proteína.
Vimos como as técnicas de biologia molecular são importantes para a
manipulação da informação genética e podem ser usadas no tratamento
de doenças, melhoramento de espécies vegetais e animais de importância
econômica, na produção de fármacos e na indústria alimentícia.
E, no final da unidade, compreendemos como os genomas se dife-
renciam nos organismos, quais processos evolutivos estão envolvidos nas
alterações genômicas e como eles interagem. Por fim, aprendemos como
utilizar dados de sequência de DNA para determinar relações evolutivas
entre os seres vivos, através de inferências filogenéticas.
164 GENÉTICA

Atividades de aprendizagem da unidade


1. Descreva sucintamente as semelhanças e diferenças entre a replicação
eucariótica e procariótica.
2. Com relação aos processos de transcrição e replicação, assinale a
alternativa correta:
( ) A replicação se difere da transcrição por sair síntese em apenas
um sentido de um único filamento de ácido nucleico.
( ) Na transcrição é necessário um primer para fornecer um grupo
3’ – OH em que a polimerase reconhece e inicia a síntese do
ácido nucleico.
( ) Ambos os processos usam molde de DNA e sintetizam o fila-
mento no sentido 5’ a 3’, trifosfatos de nucleotídeos como subs-
trato e complexos proteicos e enzimáticos para catalisar a síntese.
( ) Nos dois processos as DNA polimerases são usadas para forma-
ção dos filamentos de ácidos nucleicos.
3. Quais os tipos de processamento que podem ocorrer no pré-mRNA?
4. Levando em consideração a diferença na estrutura celular de proca-
riotos e eucariotos, qual a implicação da presença ou ausência do
núcleo no processo de transcrição?
5. Quais são as características necessárias para um vetor de clonagem?
B i o l o g i a m o l e c u l a r, b i o t e c n o l o g i a e e v o l u ç ã o 165

Referências
ALBERTS, B. Biologia molecular da célula. Porto Alegre: Artmed, 2010.
CRICK, F. H. C. et al. General nature of the genetic code for proteins. Nature, v. 192, p.
1227–1232, 1961.
HIB, J.; DE ROBERTIS, E. M. Biologia celular e molecular. 16. ed. Rio de Janeiro:
Guanabara Koogan, 2014.
JUNQUEIRA, L. C.; CARNEIRO, J. Biologia celular e molecular. 9. ed. Rio de Janeiro:
Guanabara Koogan, 2012.
LINHARES, S.; GEWANDSZNAJDER, F. Biologia: volume único — livro do professor. São
Paulo: Ática, 2005.
PIERCE, B. A. Genética: um enfoque conceitual. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2011.
SNUSTAD, D. P. Fundamentos da genética. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2013.
WEESLER, S. R. et. al. Introdução à genética. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2013.
Anotações
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