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pedagogias
Iolanda Montano dos Santos1
Resumo
Neste texto, proponho uma discussão sobre algumas campanhas de saúde realizadas na escola,
problematizando o caráter curativo/terapêutico da Pedagogia. O trabalho aqui apresentado, a
partir da perspectiva foucaultiana, possibilita pensar algumas práticas de controle dos sujeitos na
escola. Refiro-me a algumas práticas disciplinares, corretivas e psicológicas como forma de
assegurar a normalização e a regulamentação das crianças na escola. Nesse sentido, o objetivo
deste artigo é discutir a Pedagogia como um campo cuja lógica estará diretamente associada
com a produção dos sujeitos, como um conjunto de práticas fundamentais para agir sobre os
cidadãos. Dessa forma, tais práticas favorecem o desenvolvimento de sujeitos cada vez mais
capazes de se autorregular e se autodeterminar de maneira consciente. Dirigir, moldar, guiar a
conduta dos indivíduos de forma que eles se tornem indivíduos de um certo tipo (ideal, educado,
consciente, enfim, cidadão) tem haver com aquilo que Foucault chamou de vontade de poder:
estruturar o eventual campo de ação dos outros.
Palavras-chave: pedagogias, corpos infantis, disciplinamento, normalização
1
Doutora em Educação pela UFRGS. Coordenadora do Curso de Pedagogia das Faculdades
Integradas São Judas Tadeu
O ESPAÇO-TEMPORAL
Pode-se dizer que os espaços educativos constituem nossas maneiras de
pensar e de viver e, por isso, as categorias de espaço e de tempo não são
estruturas neutras, são espaços que estão carregados de significados e
transmitem valores, conteúdos, impõem normas e hierarquias e uma série de
símbolos estéticos, culturais e ideológicos. Considerando que o espaço escolar
é um desses elementos do currículo, Rocha (2000, p.117) acrescenta:
[...] é justamente o espaço escolar, seja ele edificado ou não,
aberto ou fechado, amplo ou mínimo, com funções e lógicas
específicas (ou não), que permite ou não movimentos de
ocupação e limitação, que institui práticas ou sequer as permite.
Mais do que isto: espaço de produção e reprodução de saber e
poder na medida em que, ao ser convencionalmente considerado
como (senão único, um dos) local privilegiado e legitimado de
concentração do saber (visto como) cientificamente organizado,
delimita usos, provoca rupturas, mantém hierarquias, disciplina,
controla, vigia e produz subjetividades.
2
Este texto foi apresentado na II Semana de Extensão, Pesquisa e Pós-Graduação – II Colóquio
de Pós-Graduação (II SEPesq) - e publicado no CD do evento, realizado no Centro Universitário
Ritter dos Reis/UniRitter, Porto Alegre, em outubro de 2006.
Com isso, o que Varela (1996) nos aponta é para o fato de que, com a
constituição dos Estados Modernos, o processo de individualização se
intensifica devido à crescente divisão social do trabalho, ao aumento da
densidade da população nas zonas urbanas, à acumulação primitiva do capital,
ao desenvolvimento da propriedade privada, à influência da ética protestante e
ao impulso da Administração3.
3
Max Weber analisou, em relação ao surgimento da Administração, como o Estado Moderno, ao
exigir de uma parte importante de seus funcionários a superação de provas e exames nos quais
deviam demonstrar que possuíam conhecimentos e capacidades para desempenhar o cargo a
que aspiravam, inaugura, assim, uma vida individual —meritocrática— oposta à do sangue e da
linhagem que até então havia dominado (Varela, 1996).
4
De acordo com Foucault (1999a, p. 302), a norma é o elemento que circula entre o disciplinar e
o regulamentador e que se aplica tanto ao corpo quanto à população e, assim, permite “controlar
a ordem disciplinar do corpo e os acontecimentos aleatórios de uma multiplicidade biológica, esse
elemento que circula entre um e outro é a norma. A norma é que pode tanto se aplicar a um corpo
quanto a uma população que se quer regulamentar”. Esse autor salienta que “a norma está em
jogo no interior das normalidades diferenciais. O normal é que é o primeiro, e a norma se deduz
dele [...]” (Foucault, 2008, p. 83).
5
Segundo Varela (1996), em numerosos momentos históricos parece entrecruzar-se e reforçar-
se as tecnologias pedagógicas e militares no âmbito escolar, tal como sucede concretamente no
ensino dos jesuítas. E, de fato, Foucault, em Vigiar e Punir, dedica algumas páginas ilustrativas
para mostrar a forma que adotou o ensino nos colégios dos jesuítas.
Aqui, cabe recorrer a Rousseau porque foram as suas idéias que, de certa
maneira, influenciaram algumas sistematizações acerca das atividades físicas
nos métodos ginásticos. Isto é, foi sua preocupação com o corpo de Emílio que
inspirou muitos dos pedagogos, médicos, fisiologistas e até militares a
elaborarem propostas metodológicas para a prática de exercícios de forma
sistematizada e, portanto, educativa.
6
Foucault (2002, p.285; 288) relaciona a estatística —a ciência do Estado— ao “desenvolvimento
da arte de governar”, ou seja, a uma arte de governo que encontrou sua dimensão própria na
conexão com a emergência do problema da população. Ao permitir quantificar e isolar os
fenômenos específicos da população, a estatística constituiu-se no principal fator técnico desse
“desbloqueio”.
REFERÊNCIAS
DURKHEIM. Èmile. Educação e sociologia. São Paulo: Melhoramentos,
1975.